revista de história da matemática para professores, natal

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Page 1: Revista de História da Matemática para Professores, Natal
Page 2: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Revista de História da Matemática para Professores, Natal

(RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

ISSN 2317-9546 EXPEDIENTE Sociedade Brasileira de História da Matemática (SBHMat) Presidente: Iran Abreu Mendes Vice-Presidente: Marcos Vieira Teixeira Secretário Geral: Carlos Roberto de Moraes 1º Secretário: Lígia Arantes Sad Tesoureiro: Mariana Feiteiro Cavalari Editoras Responsáveis Bernadete Morey Ligia Arantes Sad Comitê editorial Iran de Abreu Mendes Sergio Roberto Nobre Comitê Científico - Iran de Abreu Mendes - Sergio Roberto Nobre - Ubiratan D’Ambrosio (UNIBAN / USP) - Carlos Henrique Gonçalves Dr. (USP-ABC) - Antônio Henrique Pinto Dr. (IFES) - Giselle Costa de Sousa Drª. (UFRN) - Circe Mary Silva da Silva Dynnikov (UFES) - Rosa Sverzut Baroni, Drª (UNESP) - John Andrew Fossa, Dr (UFRN) - Lucieli Maria Trivizoli da Silva Drª (UEM) - Wagner Valente, Dr (USP) - Romélia Mara Alves Souto, Drª (UFSJ) - Tércio Gireli Kill Dr (UFES) - Moysés Gonçalves Siqueira Filho, Dr (UFES) - Antônio Carlos Brolezzi Dr (USP) - Antônio Vicente Marafiotti Garnica (UNESP) ASSESSORIA Projeto gráfico Fabrício Ribeiro

Diagramação Gerson Eugenio

Page 3: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Editorial................................................................................................................................................ 4

Bernadete Morey e Ligia Arantes Sad

Diálogo com um educador.................................................................................................. 5

Entrevistado: Professor Severino Carlos Gomes

Entrevistador: Valdenise Lopes do Nascimento

Artigo 1: Gelosia: um método de multiplicação medieval.............................. 12

Ana Caroline Frigéri Barboza, Lucieli M. Trivizoli

Artigo 2: A história dos números primos........................................................................ 18

Rafael Bonifácio de Andrade

Artigo 3: Sobre a Matemática Recreativa.................................................................... 29

Chamada para submissão de artigos..................................................................... 37

Ligia Arantes Sad e Bernadete Morey

Page 4: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Caro Leitor,

Em nome da Sociedade Brasileira de História da Matemática –

SBHMat, temos a satisfação de trazer a luz mais um número da Revista de

História da Matemática para Professores (RHMP), referente a 2018.

Infelizmente, o número de 2017 não foi publicado, pelo que pedimos

desculpas aos nossos leitores.

O entrevistado neste número da RHMP na sessão Diálogo com um

educador e o Prof. Dr. Severino Carlos Gomes, professor do Instituto Federal

do Rio Grande do Norte. Ele nos conta sobre sua trajetória acadêmica e

profissional e fala sobre como a História da Matemática se insere em sua

sala de aula.

Os dois textos publicados neste número versam sobre um antigo

algoritmo de multiplicação (Gelosia: um método de multiplicação medieval)

e sobre os números primos (A história dos números primos) podem ser uma

boa leitura para os professores de matemática da escola básica.

Mas há uma novidade: nossa intenção é implementar a publicação

de material de natureza recreativa e histórica. Sendo assim, começamos por

publicar neste número da RHMP um artigo que versa sobre a matemática

recreativa. Com este artigo, queremos iniciar uma série de publicações que

mostrem que a temática de entretenimento na matemática é bastante

antiga. O artigo é rico em referências e esperamos que nossos leitores

aproveitem a oportunidade para ir atrás da matemática divertida!

Renovamos nossa expectativa de que professores com experiências

de sala de aula, relacionadas a História da Matemática, possam valorizar

esta revista e torna-la cada vez mais significativa aos colegas leitores,

aceitando o convite para submeter propostas que sejam pertinentes às

seções das futuras publicações.

Bernadete Morey e Ligia Arantes Sad

Page 5: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Entrevista com o Prof. Dr. Severino Carlos Gomes (IFRN)

Valdenise Lopes do Nascimento

(UFERSA)

Foto1: Professor Severino Carlos Gomes (IFRN), o entrevistado, a

professora Bernadete Morey (UFRN) e o professor Luis Radford

(Laurentian University)

1 É nosso costume colocar somente a foto do entrevistado. No entanto, o professor

Severino nos disse que tem especial apreço por esta foto e nos pediu que fosse ela a

foto escolhida.

Page 6: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Professor, gostaria que você iniciasse nos falando sobre sua formação

acadêmica.

Concluí o Ensino Médio na antiga Escola Técnica Federal do Rio Grande

do Norte (ETFRN), integrado ao Curso Técnico em Mecânica. A partir da

graduação, toda a minha formação acadêmica foi realizada na

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Sou Licenciado

em Matemática, com Aperfeiçoamento em Ensino de Matemática e

Especialização em Educação de Jovens e Adultos. Sou Mestre em Ensino

de Ciências Naturais em Matemática e Doutor em Educação.

Em relação a sua atuação profissional, nos fale um pouco sobre sua

trajetória.

Após concluir o Ensino Médio em 1986, dividi meu tempo entre o

trabalho na área de Mecânica Industrial e o curso de Licenciatura em

Matemática. Em 1996 iniciei minha carreira como professor de

Matemática em escolas particulares. Em 1998 ingressei nos quadros da

rede de ensino do município de Natal no estado do Rio Grande do Norte.

Trabalhei em diversas escolas públicas e particulares desta cidade até

2008, ano em que ingressei como docente no IFRN com dedicação

exclusiva. Atualmente, além do tempo dedicado ao ensino no IFRN,

também participo de projetos de Ensino, Pesquisa e Extensão e na

organização e execução de diversos eventos do Campus Natal Zona Norte.

Geralmente, atuo com um número maior de turmas no Ensino Médio

Técnico Regular, o chamado Técnico Integrado, nos cursos de Comércio,

6 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 7: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Eletrônica e Informática para Internet, mas também tenho turmas da

Licenciatura em Informática.

Como você descreveria as relações entre seus estudos e pesquisas e

sua atuação profissional?

Desde o início de meu trabalho como professor tenho me preocupado

constantemente com a aprendizagem matemática dos estudantes. Muito

me preocupa se eles estão realmente aprendendo, estou sempre refletindo

sobre o que posso fazer para auxiliá-los em seus processos de

aprendizagem. Diante desta preocupação decidi ir além da matemática e

procurar alcançar outros conhecimentos que entendo ser fundamentais

nesta profissão. Quando trabalhava na Rede Municipal de Ensino precisei

lecionar em turmas de educação de jovens e adultos sem nunca ter tido

contato ou estudado algo sobre como ensinar nesta modalidade de ensino.

Foi neste momento que decidi me especializar nesta área para aprender

sobre esta modalidade de ensino e seus estudantes e encontrar maneiras

de auxiliá-los em sua aprendizagem matemática. Conhecer como se

aprende Matemática foi uma curiosidade que me levou do mestrado ao

doutorado. Até o início do mestrado em 2008, eu não conhecia nenhuma

teoria sobre como se aprende Matemática e minhas aulas se baseavam no

ensino tradicional da Matemática, uma abordagem mecânica de

memorização de técnicas para resolver problemas. Atualmente procuro

conhecer as diversas tendências da Educação Matemática como por

exemplo, a utilização da História da Matemática no Ensino. Também

procuro estudar sobre teorias contemporâneas de aprendizagem,

7 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 8: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

principalmente as que versam sobre o ensino e a aprendizagem da

Matemática.

Na profissão docente, precisamos estar sempre buscando novas

alternativas que nos possibilite desenvolver um trabalho cada vez

melhor. Do que mais você sente falta para desenvolver um bom

trabalho?

O IFRN – Campus Natal Zona Norte, onde estou lotado atualmente,

fornece aos estudantes apoio psicológico, pedagógico e socioeconômico,

além de disponibilizar estudantes monitores em diversas áreas, inclusive

em Matemática. Ainda oferece curso sobre conteúdos matemáticos do

Ensino Fundamental para alunos novatos. Porém, os índices de

reprovação em Matemática no primeiro ano são preocupantes. Para fazer

um bom trabalho com estes estudantes, acredito que precisamos continuar

engajados na busca de novas formas de ensinar e aprender Matemática,

não na perspectiva interna da própria Matemática mas, buscar estratégias

voltadas para a construção de atitudes e valores éticos e fortalecimento

emocional. Do que mais sinto falta para fazer um bom trabalho é de uma

forma de encorajar os estudantes à encarar a Matemática de frente, sem

receio de errar, sem medo de expor-se.

Professor, você mencionou anteriormente o seu interesse pela

História da Matemática. De que forma ela tem estado presente no seu

dia a dia profissional? Você tem planos para o futuro quanto a isto?

8 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 9: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Meu interesse pela História da Matemática iniciou-se no mestrado, onde

desenvolvi trabalhos envolvendo a História da Trigonometria. Tenho

utilizado esses estudos até hoje em minhas aulas de Trigonometria.

Sempre que possível, tento integrar nas minhas aulas o conteúdo

matemático com sua história. No momento, estamos tentando desenvolver

material de História da Matemática baseado em estudos da antiga

Mesopotâmia. Nestes, além de utilizar a História da Matemática, temos

como um dos objetivos principais a utilização de elementos da Teoria da

Objetivação, uma das teorias de aprendizagem que estudamos no

momento. A idéia é produzir atividades de Matemática baseadas em sua

história. Para isto no momento estamos desenvolvendo uma experiência

com a História da antiga Mesopotâmia, voltadas para estudantes do

primeiro ano do Ensino Médio nas aulas de Matemática. Estamos

procurando casar nessas atividades a História da Matemática com os

pressupostos teóricos da Teoria da Objetivação do Conhecimento de Luis

Radford.

Para finalizar, que conselho você daria aos licenciandos, futuros

professores de Matemática?

Ao futuro professor de Matemática, o que tenho a dizer é que procure

sempre conhecer novas alternativas de ensino. Não estude somente

Matemática, procure conhecer sua profissão, procure capacitar-se

continuamente. Não se renda à simples reprodução do conhecimento com

acomodação e desleixo. Não espere que os outros venham valorizar sua

profissão, lembre-se que seu trabalho, sua postura pessoal e profissional

9 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 10: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

são suas melhores estratégias de marketing, são ferramentas primordiais

para o seu sucesso futuro.

Obrigada, professor Severino, por sua atenção.

10 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 11: Revista de História da Matemática para Professores, Natal
Page 12: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

••• Artigo 1 •••

Gelosia: Um Método de Multiplicação Medieval

Ana Caroline Frigéri Barboza

(UEM)

Lucieli M. Trivizoli

(UEM)

Multiplicação Medieval: Método Gelosia de multiplicação

Acredita-se que o método gelosia de multiplicação tenha se

originado na Índia e se expandido para a Europa. Este método foi muito

utilizado pelos árabes, devido a sua simplicidade e facilidade. Também

fora utilizado por outros povos, como por exemplo, chineses e persas. De

acordo com Reis (1996, p. 82), “dos árabes passou para a Itália nos séculos

XIV e XV e lá o nome gelosia lhe foi associado por causa da semelhança

com os gradeados colocados em frente as janelas em Veneza e em outros

lugares.”.

Segundo o dicionário Dicio, dicionário online de português, a

palavra gelosia significa “Rótula de fasquias de madeira com que se tapa

o vão de uma janela”; “rótula, janela de rótula”. E, complementar, o

dicionário Aulete traz como significado da palavra, “Grade de ripas de

madeira cruzadas no vão de porta ou janela, que permite a quem está no

interior ver o exterior sem ser visto com clareza”; “Rótula”.

Page 13: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Tem-se, ainda, que a palavra gelosia é relacionada à palavra

jealousy, do inglês, em que a tradução significa ciúmes. Esta relação tem

ligações com as definições expostas anteriormente, já que, naquele tempo,

muitos maridos queriam resguardar suas esposas de olhares alheios,

mantendo-as no interior de suas habitações.

Conhecidos a origem do método e o significado da palavra, vamos

expor agora o funcionamento do método e porquê funciona. A

multiplicação por gelosia envolve somas parciais para encontrar a

operação de multiplicação em questão. Vamos tomar como exemplo, a

própria explicação do método abordada na atividade de Swetz (1994).

Seguindo as indicações da atividade “Multiplicação Medieval”,

vamos apresentar os passos a serem seguidos.

➢ Primeiro, vamos construir uma grade composta de células

quadradas. Para esta grade, o número de colunas corresponde ao

número de dígitos em um fator do produto, e o número de linhas

corresponde ao número de dígitos do outro fator. Cada célula

pequena é dividida por uma linha diagonal estendendo da parte

superior direita à inferior esquerda.

13 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 14: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

➢ Para encontrar o produto de 372 × 431, o número (372) é escrito

no topo da grade; o outro (431) é escrito no lado direito.

➢ O produto de cada número da linha pelo número da coluna é

calculado e escrito na célula compartilhada pela linha e a coluna

específicas. Os produtos individuais são escritos com seus dígitos

de dezenas acima da linha diagonal e seus dígitos de unidades

abaixo da linha.

➢ Iniciando na parte inferior direita da grade, somamos as entradas ao

longo de cada caminho diagonal dentro da grade. Escrevemos o

resultado das unidades no fim de cada caminho diagonal e levamos

o dígito das dezenas ao caminho acima e procedemos da mesma

maneira em seguida. Quando terminamos de somar, o produto é

então lido ao longo da borda esquerda e inferior da grade: 160.332.

14 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 15: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Em alguns casos as somas encontradas excedem dez unidades,

fazendo com que o dígito da dezena seja levado para a próxima diagonal

e somado com os números que pertencem a ela.

Mas por que este método funciona?

Segundo Zonzini (2015), a explicação deste método se dá pela

decomposição dos fatores a serem multiplicados e somados. Vamos

analisar a multiplicação feita precedentemente, 372 × 431:

Decompondo a multiplicação, temos:

15 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 16: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Podemos verificar que cada uma das multiplicações realizadas

condiz a uma célula da tabela. Realizam-se todas as multiplicações

necessárias e, ao final, efetuam-se as somas parciais.

Ao executar certos procedimentos, é comum meras reproduções

de cálculos sem significados e entendimentos, todavia, é importante

entender o porquê e o que se está fazendo. Ao entender o método, seja ele

qual for, nos apropriamos de saberes que nos proporcionam um

aprendizado com compreensão e raciocínio diante das operações de

cálculos, nesse caso, das operações no que diz respeito às multiplicações.

Considerações

Conhecer e apresentar diversos procedimentos para realizar as

operações pode ser uma estratégia para que os professores possam

dinamizar suas aulas ao mostrar que essas operações matemáticas

surgiram da necessidade de aprimorar os cálculos. Nesse sentido, a

atividade “Multiplicação Medieval” (SWETZ, 1994) traz consigo a

possibilidade de se trabalhar com outro método para o procedimento da

multiplicação, de ver diferentes formas com que diversos povos

desenvolveram procedimentos para lidar com a matemática, e como

podemos nos deparar com soluções e métodos muito originais.

Referências

REIS, Ismael. Fundamentos da Matemática. Volume 6. Editora

Moderna, 1996.

SWETZ, Frank J. Learning Activities from the History of

Mathematics. Portland: J. Weston Walch Publisher, 1994.

16 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 17: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

ZONZINI, Cleudiana dos Santos Feitoza. Método gelosia: facilitando a

multiplicação. Brasília: Universidade de Brasília, 2015.

17 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 18: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

••• Artigo 2 •••

A História dos Números Primos

Rafael Thé Bonifácio de Andrade

(IFRN)

O objetivo deste trabalho é mostrar um pouco da história e da

trajetória dos números primos, com o intuito de conectar a Matemática

teórica com os assuntos cotidianos ensinados em sala de aula.

Este trabalho mostrará um pouco de como os números primos

surgiram, foram construídas e generalizadas normas, lemas, teoremas e

conclusões, nos permitindo ir além do ensinado em sala de aula (como

MMC e MDC) e nos embasando para outros campos como a Teoria dos

Números, Álgebra Abstrata e a Criptografia. Além disso, tentarei reunir

resultados importantes que, geralmente, encontram-se espalhados mas

desempenham papel importante nas áreas correlatas.

Com o intuito de diminuir ou minimizar as distâncias entre teoria

e prática, espero que esse artigo possa servir como fonte de pesquisa de

professores e alunos que se interessem pelo tema ou que, por ventura,

possam vir a se interessar.

Page 19: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

A história dos números primos

A nossa história começa na Grécia Antiga. Grandes pensadores

gregos debruçaram-se para formalizar pensamentos sobre assuntos

concretos e abstratos. E, talvez, a construção de maior importância tenha

sido a definição de número, bem como sua representação. A partir desse

conceito, começou-se a formular o conceito dos conjuntos numéricos. Aí

surgiu um grupo de números especiais, que só possuíam dois divisores

naturais (pode-se pensar também como quatro divisores inteiros) e não

podiam ser decompostos com o auxílio de nenhum outro número. A esse

grupo de números deu-se o nome de números primos.

Estudos relatam que a Escola Pitagórica, por volta de 530 a.C.,

estudava a “mística numérica” e já conhecia e estudava o conjunto dos

números primos, mas sem essa nomenclatura. Eles estudavam os números

perfeitos e os números amigáveis. Números perfeitos são números que a

soma dos divisores desse número (com exceção do número) é o próprio

número, como por exemplo o 6 (ao somar os divisores 1, 2 e 3, o resultado

é o próprio 6). Números amigáveis são números que a soma dos divisores

de um é igual ao outro número, como o 220 e o 284 (a soma dos divisores

de 220: 1+2+4+5+10+11+20+22+44+55+110 = 284, e a soma dos

divisores de 284: 1+2+4+71+142 = 220). Os pitagóricos referiam-se aos

números primos como números lineares, enquanto os números compostos

eram chamados de números não-lineares, e eram representados por

retângulos, dando a ideia de que os números lineares os formaram.

19 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 20: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Figura 1: representação por retângulos.

Fonte: acervo do autor (2016).

Como pode ser observado no retângulo acima, o mesmo possui 6

pontos colocados em um retângulo, cujos lados são formador por 2 pontos

e 3 pontos (mais tarde chamados de números primos).

Mais tarde, Euclides (por volta de 300 a.C.) trouxe referência aos

números primos no seu livro Os Elementos no que diz respeito a: cálculo

de MDC entre dois números, determinação de números primos menores

que um inteiro dado, e a infinidade de números primos existentes. Os

Elementos são uma coleção de treze livros, dos quais os livros VII, VIII e

IX trazem noções de teoria dos números. É no livro VII que Euclides traz

a definição de números primos “Números primos é todo aquele que só

pode ser medido através da unidade”, ou seja, não pode ser colocado em

função de nenhum outro número (outro divisor) com exceção do 1. No

livro IX, Euclides fala da infinidade de números primos, quando diz

“Números primos são mais do que qualquer quantidade fixada pelos

números primos”, ou seja, não importa o quão grande seja o número primo

(valor fixado), sempre vai existir mais números primos que esse valor.

20 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 21: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Assim como Euclides, outro grego também dedicou-se a estudar

os números primos: Erastóstenes de Cirene. Ele foi o primeiro a formular

uma tabela que sintetizasse os números primos, chamado de Crivo de

Erastóstenes (por volta de 200 a.C.), com uma regra bem simples de

eliminação dos números compostos. Essa tabela ainda é utilizada nos dias

de hoje, no ensino fundamental, pela facilidade de produção e de

compreensão. O 1 não é primo, pois não tem outro divisor. Destaca-se o

próximo (2) como primo e, ao passo desse número (de 2 em 2) corta-se os

números (em vermelho) pois serão números múltiplos de 2. Seleciona-se

o próximo não cortado (3) que será primo e corta-se os números de 3 em

3 que serão seus múltiplos. A partir desse momento, verifica-se que

números múltiplos de 3 já foram cortados pelo 2 (como o 6, 12, 18 e os

demais), e começa a surgir a ideia de “múltiplos comuns” e, mais tarde, o

MMC. O procedimento de repete com os próximos números, até o 50

(pois o próximo já seria o 100, e depois do 50 o próximo múltiplo não

consta no Crivo). Feito todo esse procedimento, os números destacados:

2, 3, 5, 7, 11, 13, 17, 19, 23, 29, 31, 37, 41, 43, 47, 53, 59, 61, 67, 71, 73,

79, 83, 89 e 97 são os números primos (de 0 a 100) e os números

eliminados por serem múltiplos dos destacados serão os números

compostos.

21 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 22: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

11 12 13 14 15 16 17 18 19 20

21 22 23 24 25 26 27 28 29 30

31 32 33 34 35 36 37 38 39 40

41 42 43 44 45 46 47 48 49 50

51 52 53 54 55 56 57 58 59 60

61 62 63 64 65 66 67 68 69 70

71 72 73 74 75 76 77 78 79 80

81 82 83 84 85 86 87 88 89 90

91 92 93 94 95 96 97 98 99 100

Figura 2: Crivo de Erastóstenes.

Fonte: acervo do autor (2016).

Mas foi somente por volta de 500 d.C. que os números primos

saíram da Grécia e foram sendo estudados em outras partes do mundo. O

romano Boethius, no seu livro De Institutione Arithmetica, que surgiu pela

primeira vez a expressão númerus primus. Durante a Idade Média, esse

livro foi praticamente a única fonte de estudo sobre o tema.

Somente no início do renascimento científico, por volta de 1200

d.C., é que começam as obras árabes e traduções de outras obras, sendo

complementadas pelos estudos hebraicos, hindus e egípcios. Foi nessa

época que surge a principal obra da época: Liber Abacci, livro do

Fibonacci.

Bachet, em 1621, traduziu e publicou o texto original da

“Aritmética de Diofanto”. Através dessa tradução, Pierre de Fermat

desenvolveu algumas conclusões e estudos acerca dos números primos,

algumas sendo de tamanha importância, que deu-lhe o título de “pai da

22 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 23: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

teoria dos números moderna”. Uma das conjecturas de Fermat dizia que

todo número na forma 22𝑛 + 1 era primo, ficando os resultados da

expressão conhecidos como “números de Fermat”. Mais tarde, Euler

provou que para n=5, o número de Fermat seria composto, derrubando

então tal conjectura. A partir de então, começou um estudo de vários

matemáticos para mostrar que os demais números de Fermat (com n>5)

também eram compostos.

Fermat escreveu várias conclusões para Mersenne e, em uma

delas, adotou a expressão “números de Mersenne” para todo número

primo na forma 2p - 1 (onde p é um número primo). Mais tarde, Fermat

alavancou um dos mais importantes teoremas da teoria dos números, o

“Pequeno Teorema de Fermat”, que diz que um número primo p, primo

entre si com a, divide o número na forma 𝑎p - 1 − 1.

Após derrubar a conjectura de Fermat, Leonhard Euler dedicou-se

também a estudar os números primos. Após provar a veracidade do

Pequeno Teorema de Fermat, Euler generalizou mais esse teorema: “se a

e m são números naturais maiores do que 1, primos entre si, então 𝑎𝜑(𝑚) −

1 é divisível por m (onde 𝜑 é a função fi de Euler, isto é, 𝜑(𝑚) é a

quantidade de números naturais entre 0 e m – 1 que são primos com m)”.

Apesar de seus estudos por diversos anos, comprovando e derrubando

conclusões, Euler não chegou a lançar nenhum livro de autoria própria.

Por último, no que diz respeito a prova de teoremas, Gauss tentou

provar o teorema de Euclides sobre a infinidade de números primos, dado

um número inteiro n muito grande, com a conclusão: “Indiquemos por 𝐴𝑛

o número de primos abaixo de n. O teorema dos números primos assegura

que 𝐴𝑛 𝐥𝐨𝐠𝑒 𝑛

𝑛se aproxima de 1 conforme n cresce indefinidamente. Em

23 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 24: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

outras palavras, 𝐴𝑛

𝑛 , chamada densidade dos primos entre os primeiros n

inteiros, aproxima-se de 1

𝐥𝐨𝐠𝑒 𝑛, tanto mais quanto maior for n”. Essa

conclusão foi tão importante na matemática moderna, que ficou conhecido

como “Teorema dos Números Primos”. Gauss também conjecturou, mais

tarde, a quantidade de números de primos (𝜋(x)) através da expressão

𝜋(𝑥) ≈ ∫1

ln 𝑡𝑑𝑡

𝑥

2.

Legendre (por volta de 1800) estimou que 𝜋(𝑥) ≈1

ln 𝑥−1,08366.

Mas, ao substituir o valor 1,08366 por 1, essa aproximação se equivalia a

de Gauss através do Teorema do Número Primo, segundo a igualdade

𝐥𝐢𝐦𝑥→∞

𝜋(𝑥).ln 𝑥

𝑥= 1.

Os números primos eram estudados, até a idade Moderna, apenas

por razões teóricas. Até surgir a Criptografia. Os números primos são

responsáveis por vários modelos criptográficos. Atualmente, um dos

maiores avanços foi feito por Manindra Agrawal, em 2001, que elaborou

um algoritmo computacional para testar se o número é primo ou

composto, mas não fornece (no caso de ser composto) os divisores, nem

a quantidade deles.

Com ele, já é possível encontrar números primos com até 17 milhões de

algarismos. O maior primo conhecido até hoje é o 257885161 − 1, encontrado

pela Universidade Central do Missouri.

Durante a Idade Moderna, muitos teoremas foram lançados sem

demonstrações, como as funções f(n) = n² - n + 41, que fornece 40

números primos maiores ou iguais a 41, precisando somente adotar n no

intervalo natural [1;40]. Outra função semelhante a esta, é a f(n) = n² - 79n

+ 1601 que apresenta valores primos sempre que n<80. Existe também a

24 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 25: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

conjectura dos primos gêmeos, que diz que “existem infinitos pares de

primos do tipo p e p+2”. Essas conjecturas sem demonstrações atraem

muitos matemáticos pelo aspecto financeiro, pois é oferecido dinheiro

(além da fama) a quem conseguir provar tais afirmações. A Eletronic

Frontier Foundation oferece prêmio de 100 mil dólares para quem

encontrar um número de Mersenne com 10 milhões de algarismos, e o

Instituto Clay oferece 8 mil dólares para quem provar (ou refutar) a

hipótese de Riemann.

Números primos no ensino da Matemática atual

Atualmente, os números primos estão em diversas partes dos mais

diversos conteúdos ensinados em sala de aula.

Inicialmente, utilizamos os números primos para o cálculo do

MMC e do MDC (6º ano). Para isso, é necessário que o aluno conheça o

dispositivo prático da decomposição em fatores primos (ou fatoração) e,

antes disso, o aluno precisa conhecer e saber quem são os números primos,

sendo então mostrado e ensinado a construção e utilização do Crivo de

Erastóstenes. Mais tarde essa fatoração servirá para a simplificação de

expressões e frações algébricas.

Já no ano seguinte (7º ano), o aluno compreende a finalidade dos

números primos quando é apresentado às frações. É introduzido o

conceito de primos entre si para frações irredutíveis. Novamente é revisto

o conceito de MDC para a maior simplificação possível das frações e o

MMC para operar frações com adição e subtração de denominadores

diferentes.

25 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 26: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

No 8º ano os números primos são novamente reutilizados para

fatorações quando se faz necessário a simplificações de raízes através do

agrupamento de fatores semelhantes para formação de potências. A noção

de irracionalidade para raízes de números primos é introduzida.

Como se pode observar, os números primos são de fundamental

importância para a formação intelectual e matemática dos nossos alunos.

Algumas curiosidades sobre os números primos

Abaixo, uma lista de algumas das curiosidades mais intrigantes

sobre os números primos:

• p = 2 é o único primo que pode ser escrito como nn + n;

• p = 3 é o único primo que p²+2 também é primo;

• Os primeiros 16208 dígitos de 𝜋 formam um número primo;

• p=353535...3535 (4157 dígitos) é o maior primo conhecido

com apenas 2 algarismos;

• A soma dos cem primeiros primos é 1111;

• p = 6173 é primo, e continuará sendo primo mesmo se for

apagado qualquer um dos algarismos;

Referências

HEFEZ, Abramo. Elementos da Aritmética. 2ª ed. Rio de Janeiro: SBM,

2011.

MELO, Rafael Pereira de. Números Primos. Publicado em

www.somatematica.com.br, 2015.

26 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 27: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

PROBST, Roy Wilhelm. Números Primos. Universidade Regional de

Blumenal. Santa Catarina, 2003.

Boyer, Carl Benjamin. História da Matemática. São Paulo: Edgard

Blücher, 1974.

DocumentarioCiencia. [4/10/13] A História dos Números primos –

Documentário 2007. Retirado de: www.youtube.com/watch?v=eHp0cQy

-2S4.

27 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 28: Revista de História da Matemática para Professores, Natal
Page 29: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

••• Artigo 3 •••

SOBRE A MATEMÁTICA RECREATIVA algumas contribuições iniciais

Maria da Conceição Alves Bezerra

(UFRN)

Gostaríamos de trazer para esta seção da RHMP alguma

contribuição que falasse do aspecto divertido da matemática. Uma vez que

esperamos que outras contribuições venham a seguir, traremos aqui

apenas algumas notas iniciais do que vamos chamar de Matemática

Recreativa.

Não queremos neste momento nos deter numa definição preciso

do que seria Matemática Recreativa. Dizer que matemática recreativa

seria uma matemática divertida, que entretém, não esclarece nada do

termo.

Trazendo aqui o exposto por em (Bártlová, 2016) sobre o que seria

matemática recreativa, em contraposição ao que seria uma matemática

“séria”, falaremos de quatro aspectos, um tanto sobrepostos, que cobrem

a maioria dos tópicos que poderiam ser rotulados como matemática

recreativa.

1. O aspecto científico-popular - a matemática

recreativa é aquela parte da matemática divertida e

popular. Ou seja, os problemas correspondentes

devem ser compreensíveis para um leigo interessado,

Page 30: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

embora as soluções possam ser mais difíceis. Por

matemática recreativa, podemos entender a

abordagem com a qual podemos tornar a matemática

séria compreensível ou, pelo menos, mais palatável.

2. O aspecto divertido - a matemática recreativa é uma

matemática que é usada como um desvio da

matemática séria para a diversão. Por exemplo, um dos

proeminentes matemáticos recreativos

contemporâneos, Ian Stewart, vê o papel da

matemática recreativa precisamente nesse sentido. Ele

está tentando ver a matemática como uma fonte de

inspiração e alegria. Ele frequentemente escreve em

seus livros que a matemática divertida é aquela parte

que não é ensinada na escola. O mesmo ponto de vista

foi defendido por Martin Gardner que, além disso,

acreditava que, mesmo na escola, a matemática

ensinada ali deveria ser divertida até certo ponto.

3. O aspecto pedagógico - a matemática recreativa

pode ser usada para fins de ensino. É visto como uma

grande utilidade pedagógica. Suas partes esteve

presente na mais antiga matemática conhecida e esta

situação continua até os dias atuais.

4. O aspecto histórico - a matemática recreativa

sempre desempenhou um papel muito importante na

história da matemática e foi responsável pela origem

de teorias e conceitos matemáticos inteiros

importantes que não existiriam sem ela.

(BÁRTLOVÁ, 2016, p. 4) (Trad. Nossa)

Bártlová (2016), destaca a Matemática Recreativa como uma área

ideal para trabalhar aspectos históricos e multiculturais da Matemática, e

permite o desenvolvimento da criatividade, o prazer em fazê-la, traz em

jogo emoções e nos faz sentir parte de um trabalho coletivo realizado pela

a humanidade há milhares de anos.

30 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 31: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

2. Matemáticos e obras que contribuíram para a divulgação da

Matemática Recreativa

Muitos matemáticos ao longo da história dedicaram-se ao estudo

de Recreações Matemáticas, como Leon Battisti Alberti (1404 – 1472),

Luca Pacioli (1445 – 1517), Leonhard Euler (1707 – 1788), Pierre de

Fermat (1601 – 1665), entre outros. Esses matemáticos têm sido citados

em estudos de História da Matemática, sobre alguns problemas

recreativos, por exemplo, o problema proposto por Euler, sobre a

possibilidade de percorrer as sete pontes da cidade de Königsberg, sem

passar pela mesma ponte duas vezes.

Alcuino de York (735 – 804), no século VIII, foi um dos

matemáticos notáveis da sua época. Em 781, foi convidado por Carlos

Magno para ser responsável pela escola do palácio, onde ficou, até 796,

com o cargo de conselheiro educacional. Foi o responsável pela maior

reforma na educação no império Carolíngio.

Alcuino é autor de uma das mais antigas coleção de problemas

de Matemática Recreativa escrito em latim – Propositiones ad Acuendos

Juvenes (Problemas para Estimular os Jovens). “As Propositiones

consistem em 53 problemas de matemática e lógica recreativas, muitos

dos quais têm longa tradição na história da matemática, de origem egípcia,

árabe e europeia” (LOPES, 2017, p. 74).

Luca Pacioli (1445 – 1517), italiano, natural de Borgo di San

Sepolcro (Atual Sansepolcro), província da cidade de Arezzo, na região

da Toscana, na Itália – foi um frei e matemático renascentista do século

XV – escreveu diversas obras, dentre as quais destacamos as mais

importantes: “Summa de Aritmética, Geometria, Proportione et

31 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 32: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Proportionalitá” (1494) (coleção de conhecimentos de Aritmética,

Geometria, proporção e proporcionalidade), mais conhecido por Summa,

e “De Divina Proportioni” (A Divina Proporção) publicada em Veneza

em 1509 – e autor do primeiro manuscrito inteiramente dedicado à

Matemática Recreativa De Viribus Quantitatis.

Embora, Luca Pacioli tenha contribuído de forma significativa

para a Matemática no século XV, pouco se sabe sobre a obra De Viribus

Quantitatis (1496 – 1508), que segundo Hirth (2015), é um dos maiores

compêndio de Matemática Recreativa, no seu contexto histórico. Para o

autor a obra é certamente um marco no que hoje podemos chamar de

Ciência Popular (HIRTH, 2015).

Hirth (2015), realizou um estudo intitulado “Luca Pacioli and his

1500 book De Viribus Quantitatis”, cujo objetivo é fornecer uma melhor

compreensão do conteúdo De Viribus Quantitatis nos seus aspectos mais

recreativos da Matemática. O autor, afirma que a obra é de grande

interesse por seu impacto na Educação Científica e na transmissão da

Ciência.

Para Singmaster (2008), a obra configura-se como um livro de

entretenimento e de temas recreativos. De Viribus Quantitatis significa O

Poder dos Números, é uma coleção de jogos e recreações matemáticas

(recreações aritméticas, problemas geométricos e topológicos, contém

provérbios, poemas, adivinhações e truques de magia). O autor considera

o primeiro trabalho inteiramente dedicado à Matemática Recreativa.

Apresentamos a seguir, outros matemáticos que contribuíram para

a divulgação da Matemática Recreativa. Samuel Loyd (1841 – 1911),

(conhecido como Sam Loyd), americano, criador de enigmas e recreações

32 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 33: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

matemáticas, aprendeu a jogar xadrez entre 10 anos e 14 anos e teve o seu

primeiro problema de xadrez publicado na New York Saturday Courier,

escreveu problemas de xadrez para a revista Scientific American

Supplement, além de escrever vários quebra-cabeças, por exemplo, 14-15

Puzzle e Get Off the Earth (O’CONNOR; ROBERTSON, 2003).

Yakov Perelman (1882 – 1942), autor russo, publicou obras

recreativas como Física Recreativa; Álgebra Recreativa; Aritmética

Recreativa; Geometria Recreativa; Astronomia Recreativa; Matemática

Recreativa, dentre outras. Na Rússia os livros de Perelman, desde 1913,

alcançaram mais de 300 edições, traduzidos por várias línguas (espanhol,

alemão, francês, inglês, italiano, português, búlgaro, finlandês, dentre

outras) (O’CONNOR; ROBERTSON, 2011).

Martin Gardner (1914 – 2010) foi matemático e escritor americano

de destaque na área da Matemática Recreativa. Durante 25 anos o autor

escreveu para a revista Scientific American, com uma coluna intitulada

Mathematical Games, posteriormente, sendo esses conteúdos editados em

livros. Destacamos algumas de suas obras que apresentam recreações

matemáticas, como Aha! Insight (1978), Aha! Gotcha: Paradoxes to

Puzzle and Delight (1982), Mathematics, Magic and Mystery (1956),

Mathematical Puzzles of Sam Loyd (1959), More Mathematical Puzzles

of Sam Loyd (1960), Entertaining Mathematical Puzzles (1986),

Perplexing Puzzles and Tantalizing Teasers (1988), Puzzles from Other

Worlds (1984), (O’CONNOR: ROBERTSON, 2010).

Em Atlanta, Geórgia (EUA), desde 1993 no mês de março, se

realiza regularmente em honra a Martin Gardner, um encontro sobre

Matemática Recreativa e Magia. Trata-se do Gathering for Gardner

33 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 34: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

(G4G), realizado de 2 em 2 anos, (embora existe uma diferença entre o

primeiro e o segundo encontro tenha sido de três anos). A Fundação

Gathering 4 Gardner (G4G)2, tem como objetivo estimular a curiosidade

e o intercâmbio lúdico de ideias e pensamento crítico da Matemática,

magia, ciência, literatura e quebra-cabeças recreativos, com a finalidade

de preservar o legado do escritor Martin Gardner.

A vida de Martin Gardner é celebrada anualmente no dia 21 de

outubro (data do seu aniversário) no mundo, no evento global –

Celebration of Mind3 – o evento é desenvolvido pela Fundação Gathering

for Gardner (G4G) e tem como objetivo reunir pessoas para explorar e

desfrutar de quebra-cabeças, jogos, magia, dentre outras, ou seja, é um

evento para que as pessoas possam conhecer e compartilhar o legado de

Martin Gardner.

Com relação à Matemática Recreativa no Brasil, destacamos Júlio

César de Mello e Souza (1895 – 1974), sob o pseudônimo de Malba

Tahan, nasceu na cidade do Rio de Janeiro no século XIX, foi escritor,

matemático e educador brasileiro, publicou várias obras de divulgação

para a popularização da Matemática, dentre as quais, algumas são

referentes à Matemática Recreativa, como Matemática Divertida e

Curiosa; O Homem que Calculava; Histórias e Fantasias da Matemática;

Dicionário Curioso e Recreativo da Matemática; Matemática Divertida e

Pitoresca; Matemática Divertida e Diferente; Matemática Divertida e

2 http://www.gathering4gardner.org/

3 https://www.celebrationofmind.org/

34 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 35: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

Delirante; Matemática Recreativa; Didática da Matemática

(SEGANTINI, 2015).

A obra O Homem que calculava foi traduzida para vários idiomas.

É a obra mais popular de Malba Tahan, e traz união entre Matemática e

literatura, além de usar elementos da Matemática Recreativa, com

problemas recreativos inseridos em contos árabes, quebra-cabeças,

curiosidades, desafios e histórias. No Brasil, Malba Tahan é considerado

o principal nome da Matemática Recreativa (SEGANTINI, 2015).

Considerações

Na seção anterior deste artigo discorremos sobre autores e obras

que podem ser vir de fonte para futuros estudos sobre matemática

recreativa. O exposto até aqui de modo nenhum esgota o que poderia ser

dito sobre o assunto. Poder-se-ia falar sobre o valor pedagógico da

matemática recreativa, sobre experiências já aplicadas em sala de aula,

etc. No entanto, sendo este um primeiro artigo sobre o assunto, esperamos

poder voltar em breve com mais matéria sobre o tema ou, ainda melhor,

seria se outros professores e estudantes se aventurassem a ir a uma das

fontes citadas para trazer mais novidades para nós.

Referências

BÁRTLOVÁ, T. History and current state of recreational

mathematics and its relation to serious mathematics. Doctoral thesis.

Charles University in Prague. Faculty of Mathematics and Physics –

Department of Mathematical Analysis. Prague, 2016.

35 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 36: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

GARDNER, M. Divertimentos matemáticos. Tradução de Bruno

Mazza. São Paulo: IBRASA, 1998.

HIRTH, T. W. N. S. LUCA PACIOLI AND HIS 1500 BOOK DE

VIRIBUS QUANTITATIS. Dissertação de Mestrado em História e

Filosofia das Ciências. Universidade de Lisboa Faculdade de Ciências –

Secção Autónoma de História e Filosofia da Ciência. Lisboa, 2015.

LOPES, F. J. A. As Propositiones ad Acuendos Juvenes, de Alcuíno de

York – tradução. Revista Brasileira de História da Matemática - Vol. 17

nº 33, p. 73-90, 2017.

O’CONNOR, J; ROBERTSON, E. F. The MacTutor History of

Mathematics archives: Indexes of Biographies: Samuel Loyd. 2003.

O’CONNOR, J; ROBERTSON, E. F. The MacTutor History of

Mathematics archives: Indexes of Biographies: Martin Gardner. 2010.

O’CONNOR, J; ROBERTSON, E. F. The MacTutor History of

Mathematics archives: Indexes of Biographies: Yakov Perelman. 2011.

SEGANTINI, C. Problemas Recreativos na Obra o Homem que

Calculava, de Malba Tahan, e a Resolução de Problemas. Dissertação

de mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ensino na Educação

Básica. - Universidade Federal do Espírito Santo, Centro Universitário

Norte do Espírito Santo, 2015.

SINGMASTER, D. De Viribus Quantitatis by Luca Pacioli: The First

Recreational Mathematics Book. In Demaine, E. D. et al (Eds.). A

lifetime of puzzles: a collection of puzzles in honor of Martin

Gardner's 90th birthday (pp. 77-122). Editora A. K. Peters, 2008.

36 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

Page 37: Revista de História da Matemática para Professores, Natal

CHAMADA PARA SUBMISSÃO DE ARTIGOS

Ligia Arantes Sad

Bernadete Morey

A RHMP tem o objetivo de constituir-se num instrumento de

divulgação de trabalhos relativos à articulação entre a história da

matemática e a educação matemática. Publica artigos em história da

matemática, relatos de experiências educacionais envolvendo a história da

matemática, proposta de atividade envolvendo história da matemática

para sala de aula de matemática, curiosidades e aprofundamentos em

história da matemática, resenhas, jogos que envolvam a história da

matemática.

Todos os manuscritos devem ser encaminhados por e-mail, para m

dos endereços: [email protected] ou [email protected]. O

editor da revista encaminhará todo material submetido aos pareceristas.

Serão publicados apenas os manuscritos que obtiverem a aprovação de

dois pareceristas.

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formato "DOC", por via eletrônica.

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brincadeiras e curiosidades, obedecendo as normas da

ABNT.

• No final do trabalho, em ordem alfabética, devem ser

incluídas as referências bibliográficas do texto,

obedecendo às normas atuais da ABNT.

• Os textos submetidos já devem ser apresentados com

revisão vernacular e ortográfica realizada previamente.

38 RHMP, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018

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39 Revista de História da Matemática para Professores, Natal (RN), Ano 4, n. 1, Mar. 2018