revista canto da iracema - edição dezembro 2011

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UMA PUBLICAÇÃO DO INSTITUTO DE COMUNICAÇÃO SOCIOCULTURAL CANTO DA IRACEMA | ANO 12 | Nº 73 | DEZEMBRO2011 Nº 11 > Dezembro 2011 a cultura cearense pertinho de você!

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UMA PUBLICAÇÃO DO INSTITUTO DE COMUNICAÇÃO SOCIOCULTURALCANTO DA IRACEMA | ANO 12 | Nº 73 | DEZEMBRO2011

Nº 11 > Dezembro 2011

a cultura cearense pertinho de você!

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ARES coordenação geralcoordenação geralcoordenação geralcoordenação geralcoordenação geral zeno falcão • coordenador adjunto • coordenador adjunto • coordenador adjunto • coordenador adjunto • coordenador adjunto pingo de fortaleza • jornalista resp.• jornalista resp.• jornalista resp.• jornalista resp.• jornalista resp. joanice sampaio - jp 2492-ce • produtor• produtor• produtor• produtor• produtor

executivo executivo executivo executivo executivo arnóbio santiago • assistente de produção • assistente de produção • assistente de produção • assistente de produção • assistente de produção tieta pontes • revisão• revisão• revisão• revisão• revisão rodrigo de oliveira - tembiu.pro.br • colaboradores nesta edição • colaboradores nesta edição • colaboradores nesta edição • colaboradores nesta edição • colaboradores nesta ediçãoaudifax rios | augusto moita | calé alencar | ítalo castelar | kazane | nilze costa | paula respira | ponto de cultura vidannça • conselho editorial• conselho editorial• conselho editorial• conselho editorial• conselho editorialaugusto moita | audifax rios | calé alencar | erivaldo casimiro • diagramação• diagramação• diagramação• diagramação• diagramação artzen • contatos• contatos• contatos• contatos• contatos> canto da iracema canto da iracema canto da iracema canto da iracema canto da iracema rua joaquim magalhães 331| cep 60040-160 | josé bonifácio | fortaleza | ceará | (85) 3032.0941 | [email protected] > solar solar solar solar solar av. da universidade 2333 |benfica | fortaleza | ceará | (85) 3226.1189 | [email protected] FOTO CAPA > ZENO FALCÃO

> Q U E M S O M O S !

Passou rápido. Aliás, o tempo está cada vez mais abreviado. 2011 chegou

ontem. Setembro passou com outubro e novembro e cá estamos: de-

zembro. O mês do balanço de vida, de realizações; fazer e renovar pro-

messas para o ano novo que já está às portas. Momento de festejar,

felicitar, reunir gente querida. Durante esses meses reunimos pessoas

queridas por nós, querida em nosso meio cultural para expressar e

registrar o desenrolar da cultura cearense em seus diversos matizes.

No quesito conquistas e realizações, compartilhamos com você, querido

(a) leitor (a), um sonho há muito acalentado: o Ponto de Cultura Canto

Cultural do Cedro; e a produção da revista em parceria com Associação

Cultural Solidariedade e Arte – Solar, fruto da premiação no Edital Prêmio

Literário para Autor Cearense 2010 da Secult.

E assim fechamos 2011: Audifax Rios, como lhe é peculiar, tem a nossa

querida Praia de Iracema como mote de suas crônicas. Nesta edição,

nosso iracemita tece memórias sobre acontecimento marcante de nos-

sa Iracema. Nosso contador de causos, Augusto Moita desta vez pega o

músico Nonato Natureza. Em seu passeio pela cidade, Nilze Costa e Silva

nos leva a um dos lugares mais peculiares do Centro de Fortaleza, a

Praça da Lagoinha, templo do consumo popular e de muitas histórias.

Acompanhe Calé Alencar numa viagem poética e estradeira em prosa,

verso e imagem indo do Ceará à Souza na Paraíba. Em Fortaleza, A Cia.

Vidança realiza trabalho social e por meio da arte busca mostrar novas

perspectivas à comunidade do bairro Vila Velha na Barra do Ceará.

Diante disso, só temos a agradecer pela leitura e pelo carinho sempre

prestado a este Canto ao longo destes 12 anos. Desejando um Natal farto

em cordialidade, fraternidade e solidariedade, bem como um 2012 repleto

de realizações, de paz e abençoado.

Desejamos à tod@s, uma Boa leitura!

| AS MATÉRIAS PUBLICADAS SÃO DE INTEIRA RESPONSABILIDADE DOS AUTORES!

...editorial...editorial...editorial...editorial

FALHANOSSANovembro 2011

| Na página 07, o correto no iní-cio do primeiro parágrafo é: A se-gunda edição FestCineMaracanaú-Festival de CinemaDigital e Novas Mídias. O créditodas fotos é de Arlindo Barreto.

| Na página 10, o nome corretodo autor do texto é José LeiteNetto.

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A PRAIA DO PEIXE ERA BEM MAIS DISTANTE DO CALÇADÃO DE HOJE E NO ANO DE 1944 FORAM COLOCA-DAS AS PRIMEIRAS PEDRAS PARA CONTER O AVANÇO DO MAR TENEBROSO DE JANEIRO. MESMO ASSIMA RESSACA DO ANO SEGUINTE ENGOLIU DEZENAS DE CASAS LEVANDO DE ARRASTO O FAMOSO RES-TAURANTE DO RAMOM, NA RUA PACAJUS. INCONTINENTI, LUIS GONZAGA ASSUNÇÃO PUXOU PELO ESTROE IMORTALIZOU A PRAIA DE IRACEMA NUM SAMBADO ADEUS. LULA ERA DO MARANHÃO MAS GANHOUCIDADANIA FORTALEZENSA (ESTAVA NO NOME) EM 1976 E AQUI MORREU EM 1987, AOS 85 ANOS. PORMUITOS ANOS FOI DIRIGENTE DA ESCOLA DE SAMBA QUE LEVAVA SEU NOME E TAMBÉM PIANISTA OFICI-AL DA CEARÁ RÁDIO CLUBE, A INESQUECÍVEL PERRENOVE. A PRAIA DE IRACEMA SEMPRE RENASCEUDAS CINZAS E FOI REDUTO DA BOEMIA CULTURAL QUE SE ALASTRAVA PELO ESTORIL, LIDO, ALABAMA,PIRATA, CAIS BAR, OPÇÃO E MUITOS OUTROS PONTOS AMORÁVEIS. NA ATUAL ADMINISTRAÇÃO TEMSIDO OLHADA COM CARINHO ESPECIAL, ESTÁ DE ROUPA NOVA, VOLTA A SER FESTIVA E ALEGRE COMODANTES. SEMPRE BEM-VINDA, PRAIA DOS AMORES.

Mestre Lula

e O [email protected]

05

A ONDA PROIBIDA – Meu pai só conseguia ver o mar de Iracemaatravés das frestas das venezianas do casarão (era pecado) da MonsenhorTabosa, o Seminário da Prainha, onde esteve internado durante três anos,nos idos de 1920 e lá vai pedrada. Depois disso muito frequentou a Volta daJurema onde os sócios do Centro Santanense promoviam animados piqueni-ques para a colônia. Depois foi morar em Santana porque havia assumidocargo de tabelião do Cartório de Registro de Imóveis daquela comarca; e asvisitas à Capital, sempre penosas, passaram a rarear. Antes de morrer mani-festava a vontade de voltar a Fortaleza para rever o velho Seminário, a Séinconclusa, a Praça do Ferreira, que deixara com o único prédio alto, oExcelsior, a que ele chamava simplesmente de Edifício... e o mar de Iracemacom sua Ponte Metálica, seus coqueirais, seu extenso areal. Antonio SalesRios faleceu há cinquenta anos, no dia 14 de novembro, com 65 anos deidade. Em 1961, o ano em que deixei Santana para, a pretexto de continuaros estudos, assumir a postura de cidadão iracemista.

EMENDANDO OS BIGODES – Dois iracemistas dos bons tempos:Lúcio Brasileiro e Lustosa da Costa. Amigos de boemia, colegas de trabalho.Atuaram juntos na antiga TV Ceará no programa “Eles fazem a cidade”produzido pelo saudoso Tarcísio Tavares. A partir daí vieram o TelejornalCrasa, Dimensão Total, ainda parceiros. Lustosa mantinha coluna políticano jornal Correio do Ceará e fez na televisão o “Política quase sempre”. Lúcioescrevia sobre sociedade no mesmo vespertino associado e na TV fazia “SpotLight”, posteriormente “Dois minutos com Lúcio Brasileiro”. Os Associadossumiram do mapa, Lustosa foi para Brasília e ficou escrevendo no Diário doNordeste. Brasileiro (que é Newton Cavalcante) foi para O Povo e TV Janga-deiro. Durante anos Lustosa fez das mesas do Ideal Clube o seu birô detrabalho, olhando para o mar de Iracema. Lúcio, por muitos anos, residiu àcobertura do Iracema Plaza Hotel, em frente ao Lido. Amigos e iracemistaspara sempre, palavra de honra, avalizada por fios de bigode.

O HUMANISTA MARESIADO – Isso aí ao lado é um desenho baseadonum retrato de término de curso ginasial. Fui orador oficial da turma dehumanistas, e, desde já, perdoem o desastre nunca superado. Antes, quan-do cursava o primeiro ginasial em colégio da CNEG (depois CNEC – Campa-nha Nacional de Educandários da Comunidade) vim a Fortaleza pela pri-meira vez. No dia seguinte à chegada fui levado a conhecer a Praia deIracema. Amor à primeira vista, nunca mais abandonei pedaço. Mesmo nosanos de decadência que coincidiram com minha renúncia às lides etílicas.Saudades dos bons tempos do Estoril e sua tribo engajada; da Ivone e asrodadas sobre o tronco náufrago; do El Paredón e sua biquara sapecada; doOpção animado pela gaitada sonora do Haroldão; do Cais Bar e a ruma decompositores, sua feijoada com choro do Macaúba e Pardal; E mais, BaixoIdeal dos publicitários, Cirandinha, Madrugada e todos os botecos de taipacheirando a peixe e samba-canção. Escrevo estas olhando para o livro doLuciano Maia (Estoril) e uma antologia que organizei (Iracemar), esgotadoscomo a geografia e a força dos velhos jangadeiros. Mas o monumento doZenon acena com o arco retado que são dunas como diz outro Maia, o poetae amigo Virgílio.

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○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

PONTO DE CULTURA VIDANÇAAções de ponto de cultura promovem encontro

de gerações e o multiculturalismo para ampliaros horizontes de comunidades da Barra do Ceará

A arte como meio de emancipação do ser huma-no. É com este princípio que a Cia. Vidança atua

há 30 anos em Fortaleza, mas precisamente nobairro Vila Velha, na região da Barra do Ceará,mostrando uma nova realidade aos jovens e adul-

tos do local.

O começo se deu quando a Escola do SESI (Ser-viço Social da Indústria) da Barra do Ceará foiextinta. Sentindo a necessidade de continuaçãodeste trabalho de ensino da Dança, a coreógrafaAnália Timbó e um grupo menor de participan-tes da escola, então chamado corpo de baile, fun-daram a Associação Vidança Cia. de Dança doCeará. Anália, permanece até hoje na direção eos integrantes do corpo de baile se tornaram edu-cadores do projeto, que envolve a comunidade

em aulas de ballet para crianças, jovens, adoles-centes e idosos. Envolve também jovens no estu-

do da percussão, em curso de corte e costura,

carpintaria, artes manuais, além de diversos ou-

tros cursos profissionalizantes que acontecem comfrequência.

“A arte tem uma força imensa como universo desímbolos que ajudam a viver e enfrentar a vida.No esforço de dar sentido ao que se vive na parti-lha do mundo da dança, muda-se imaginariamenteo que se viveu e, portanto, efetivamente se trans-

forma sensibilidades e se prepara novas escolhas

concretas de vida”, avalia a coreógrafa e diretoraAnália Timbó.

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WWW.VIDANCA.ORGPor: Joanice Sampaio | Jornalista

Vidança nos palcos

A Cia. Vidança alcança os palcos montando es-petáculos que envolvem dança, música e teatro.

O grupo já se apresentou em festivais tanto emnível local como internacional. Entre seus espe-táculos, um dos mais conhecidos é Quintal deMangue. O espetáculo retrata a vida dos mora-dores da região onde o grupo é sediado.

Encontro de gerações

O grupo intergeracional Retalhos da Vida realiza

encontros e propicia a troca dos saberes entre asgerações, como forma também de envolver e for-

talecer os vínculos familiares e afetivos das crian-

ças, adolescentes, jovens e adultos da ação educativa

e artística do Vidança. O diálogo intergeracionaltem sua forma mais consciente, fundamental paraa elevação da autoestima de cada um. E paraselar o compromisso com a comunidade maior

desvela-se como descoberta pessoal e fortalece osgrupos que constituem o todo do Vidança. Parti-

cipam do grupo intergeracional mães e demaisentes familiares que desempenham diariamenteatividades de conscientização corporal e trabalhosmanuais, juntamente com as crianças, adolescen-tes e jovens, que partilham das criações viso-ma-nuais destes membros de sua constelação famili-ar.

Ainda no contexto do ensino da dança, entre osprogramas desenvolvidos está a Escola de Artese Ofícios Vidança, desenvolvendo trabalho vo-luntário ministrando aulas de ballet clássico, dan-ças dramáticas, laboratório de criação coreográfi-ca, dança criativa, alongamento, consciência cor-

poral, criações viso-manuais, criações literárias,capoeira, hip-hop, percussão, carpintaria, atenden-

do atualmente a 180 crianças e adolescentes.

O projeto agrega o grupo de percussãoTambatuques do Vidança, formado por criançase jovens, que é responsável pela música dos es-petáculos da Cia. e também possui sua autono-mia como grupo artístico.

Outras ações contemplam o estimulo à leitura,

como o acesso à biblioteca comunitária, contaçãode histórias e cortejos nas calçadas. Estas ativida-

des envolvem um diálogo entre literatura e dan-ça, música (percussão) e cena teatral (cortejo).“Esse dialogismo é a própria forma como nossagente, em suas matrizes multiculturais, se articu-

la, ao articular arte e culturas diversas em diálo-gos artísticos de extremo valor também comoexperiência humana”, define Anália Timbó.

Av. L, 761A | Conj. Nova Assunção | Vila Velha |

Barra do Ceará | Fortaleza / CE | Fone: (85)

3262.7599 | 9985.3687 | [email protected]

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Por:

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Minha querida Mamãe,

Sei que já faz muito tempo que não dou notícias.Espero que esta carta encontre você e as meninasgozando de boa saúde e que o inverno não tenhasido rigoroso.

Embora hoje em dia a comunicação se dê cadavez mais através de fios, que são mais uma prova

cabal do ilimitado engenho humano, o hábitoepistolar é mais adequado para pessoas comonós. Ainda mais porque, se a conheço bem, a

senhora ainda ignora as maravilhas da Telegra-

fia.

Após um bom tempo vagueando pela Europa,foi na América do Sul, numa aprazível cidade doNordeste do Brasil, que encontrei um lar. Fortale-

za foi o local escolhido para o meu desembarquedo navio onde, sem saberem quem eu era, fuitão bem tratado pelos brasileiros que aqui resi-dem.

Confesso que fiquei assustado ao desembarcarna ponte metálica que me deu acesso às terrasNovo Mundo. Anoitecia, mas logo esqueci meusmodos normalmente reservados e fiz muitas ami-

zades cujas boas informações me levaram a to-mar apartamento num bairro da zona leste dacidade. É escusado dizer que o dinheiro que trouxebem costurado na parte interna do colete ajudoumuito a me estabelecer confortavelmente.

Um pouco desconfortável com o epíteto de“gringo” que me pespegaram nos primeiros tem-pos, tratei logo de adaptar meu português lusita-no ao sotaque local. Com o tempo, e uma provi-

dencial renovação no vestuário, já passava por

fortalezense.

Os cearenses mostram-se ser, no trato diário, um

povo laborioso e muito cordial. Notei também

que zelam por algumas tradições referentes à va-lentia em tempos de batalha, à honra pessoal eao amor à terra que lembram-me muito as do

nosso país na gloriosa época dos senhores feu-dais.

Meus hábitos alimentares, sei que essa é de pas-mar, também mudaram muito. Adaptei-me intei-ramente à especial culinária desta terra. Apanelada, um prato similar ao haggis tão aprecia-do na Escócia, é um dos meus preferidos junta-mente com os feijões verdes, servidos bem quen-tes em panela de argila, acompanhado de paçocaou do sarapatel que são frequentes em minhamesa e cujas receitas vão em anexo.

A dulcíssima rapadura é um tônico solidificadoem barras. Como-a aos pedaços no desjejum ou,raspando-a até virar pó, adoço o forte café mati-nal que me ajuda a dissipar o sono ao alvorecer.

Infelizmente, ao contrário da grande variedadeque encontramos em França, só encontrei duasespécies de queijo produzidas nesta bela terra: Ode coalho e o de manteiga. Mas, neste caso, quan-

tidade não quer dizer qualidade: ambos são umadelícia.

E as frutas, mamãe? Ah, as frutas são um regalo

Fortaleza, 16 de dezembro de 1920.

Vida novaVida nova

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à parte: a manga, originária da Índia e tão bem adapta-da ao clima, assim como a goiaba e o maracujá típicosda América Tropical, são iguarias onde o sabor rivaliza

em encanto com a aparência e o aroma. O caju e acastanha são uma dupla delícia que, bem como o coco,

a senhora e as meninas só vão acreditar que é realquando o tocarem e provarem.

Com o milho, os nativos fazem uma série de pratos,

maxime no mês de junho, quando festejam a colheitanum evento que, embora pintado com as cores do cris-tianismo, é um retrato acabado dos antigos deuses dafertilidade no Velho Continente. Também fazem canji-ca, pamonha, pipoca e outros manjares que nem so-nhava existirem.

Sou obrigado a admitir que engordei um pouco.

Sinto falta de você e das meninas, mamãe. Ao encerrar

minhas andanças pelo mundo e após aquela péssimatemporada que passei em Londres, onde a mentalidadeprotestante e burguesa de alguns – bem, esqueçamos opassado – passei a pensar em assuntos que antigamen-

te não me passavam pela cabeça. Coisas como casa-mento e família, por exemplo. Sei que a senhora deve

estar ainda mais espantada, mas não se surpreenderiatanto se conhecesse a gentil criaturinha de pele acobreadae traços aquilinos que tive a sorte de encontrar dançan-do num forró (explicarei depois em que consiste estecurioso e excitante bailado) e que me trata, com umacomovente meiguice, de “Seu Vladimir”, tratamento

respeitoso que os nativos dão aos mais velhos. Tam-

bém penso em adotar crianças, mamãe. Há tantas pe-las ruas que precisam do amparo de um pai e, entendacomo lhe aprouver, do carinho de uma avozinha...

Pronto, agora a senhora já sabe o leitmotiv da minhacarta: estou apaixonado por uma cearense com quempretendo contrair núpcias. Porém, como a senhora bem

o sabe, sou um homem à moda antiga e não tomaria

tão importante decisão sem saber a opinião sua e dasmeninas.

Venham as quatro o mais rápido possível e em definiti-

vo. Essa terra nos proporcionará uma existência longa e

frutífera. Depois decidiremos com calma e ponderaçãoo que fazer com o castelo.

Seu filho, que vos ama,

Vlad Drácula.

...coisas que conto!conto!conto!

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Por:

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...COISAS QUE CONTO!CONTO!

CONTO!

O Sábio

NonatoNonato Natureza adotou esse nome artístico

quando ser ecologista ainda não estava namoda. Oriundo do bairro que é consideradoa Cornualha Brasileira, Prof. José Walter, é

um dos melhores compositores que aqueleafrodisíaco local já produziu.

Nonato foi dar com suas insapientes nádegas

nos altivos bancos universitários da nossa

magnífica Universidade Federal do Ceará,não através do seu disputadíssimo vestibular,

mas, por um motivo que tentarei explicar.

Pelo fim da década de setenta houve na nossa

Loura descaminhada pelo sol um congressoda Sociedade Brasileira para o Progresso da

Ciência. Era o começo da abertura política eo campus do Benfica fervilhou não só deuniversitários, mas de pessoas dos maisvariados segmentos da nossa urbe: músicos,secundaristas, pessoal do teatro, do cinema,artistas de vários matizes, todos ávidos emrespirar os novos ares da liberdade. E como

não poderia deixar de ser, tudo isso acaboucom muito forró na quadra do CEU. Forró, diga-se de passagem, com a autenticidade da sanfona,zabumba (não confundir com o chá de mesmo nome), triângulo e ganzá.

Ora, atenciosos leitores, foi a sopa no mel para o nosso sedento por conhecimento herói. Com seu

consorte violão foi fazendo amizade com o corpo docente e discente daquela briosa instituição e porlá foi ficando. Entrava num curso, saía em outro até que adotou o curso de psicologia como seupreferido.

Aqui faço um parênteses para elogiar os abnegados estudantes que conseguiram concluir seus cursos

naquele certame. Sabe por quê? Existiu outrora um amaldiçoado bar chamado Quina Azul respon-sável por muita gente boa largar os estudos. Menos eu. Os meus ficaram irremediavelmente com-

prometidos nas plateias do Movimento Massafeira.

Tudo ia bem quando, por volta do fim do semestre, houve as verificações finais. Em determinada

cadeira, a maioria da turma se deu mal, só logrando êxito adivinhem quem? Raimundo Nonato. O

dedicado lente, após lamentar o insucesso da maioria, dirigiu-se ao nosso pseudo-acadêmico:

- Nonato, meus parabéns. Está havendo apenas um pequeno problema. Não encontro o seu nome

entre os outros alunos. Dirija-se à secretaria para dirimir esse equívoco.

- E nem é pra encontrar mesmo, não!

- Por quê? Você não faz este curso?

- Na realidade, não faço curso nenhum. Cheguei por aqui, gostei, e “fui que fui ficando”.

12

Por:

Nilz

e Co

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lva

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crito

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Praça da Lagoinha

No banco da Praça um velho medita. Sobre a

lentidão das coisas? A vida é longa e a praça é

enorme. Ao calor da tarde morna, algumalembrança o revolve, quem sabe um passado depraças abertas, quando levava para namorar

uma daquelas damas de peitos faceiros, no

tempo da sua juventude.

Logo em frente uma mulher arrasta o filho pelamão e o outro chora em seus braços. Noutros

bancos, casais de namorados se aconchegam e

os pardais se alvoroçam numa canção estriden-te.

Do outro lado, empresários andarilhos põem à

venda seus mais variados produtos: eletrodo-mésticos, panelas, pomadas japonesas, raízes,

confecções, produtos importados. São verdadei-

ros mestres da retórica na arte de seduzir o

freguês. Ganham no grito e na voz. São os

camelôs da famigerada “Feira dos Malandros”.Vindos dos bairros da periferia mais distantes,das favelas, de alguma cidade do interior, tangi-dos pela seca ou pelo desemprego, tornam-se

os destemidos guerreiros na arte de sobreviver.

Desenvolvem estratégias as mais diversas,

muitas vezes

longe da ética.Correm do

“rapa” e dapolícia, sãotinhosos e auda-

zes, falantes ebem humorados.

Bem próximodali existe ainda

uma beleza de

casa que eu

sempre admiravaquando tinha queme dirigir aocentro da cidade.

O prédio impo-nente da Fênix

Caixeiral de

estrutura

arquitetônicaneobarroca, foi construído para abrigar a socie-

dade recreativa “União Fênix Caixeiral”, quereunia comerciantes locais. Inaugurado em 1914,

foi durante muito tempo, ponto de encontro dasociedade fortalezense. Tempos depois foicomprado pela Caixa Econômica Federal em1955 e restaurado em 1984, mantendo a fachadaoriginal.

Num dos lados da Praça da Lagoinha, funcionao maior comércio ambulante de Fortaleza, o“Beco da Poeira”, sem dúvida o maior e maispopular centro comercial de Fortaleza. Amolecagem cearense já denominou este comér-cio de “Cupuar”. O que parece uma pronúnciafrancesa, na verdade significa a posição em quemuita gente fica para olhar os produtos que àsvezes são expostos no chão. Então fala-se queas pessoas ficam de “cu pro ar”, ou seja, abai-xadas.

Hoje, a Praça da Lagoinha está presa por

grades de ferro. Castro Alves parece tremer na

tumba a gritar: “Libertem a Praça! A praça é dopovo, como o céu é do condor”

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Os intestinos do Brasil pegando fogo um caminho varando três cidadesnordestinas veredas indo do Ceará no rumo da Paraíba pequeninamasculina mulher macho sim sinhô passando pelo Juazeiro do meuPadim Ciço Romão na direção de Sousa e depois Cajazeiras onde àsombra de mangueiras anduris e pés de cajá repousa a estação velhada R.V.C. ali plantada caminhos de ferro rasgando sertão chão pópoeira vento quentura lascada. Pastorada pelo menestrel NaldinhoBraga a estação velha serve de pouso a seres cantantes viajantescavaleiros andantes de voz e viola afiadas feito gume de faca amola-da na pedra água pingando dentro do sertão de dentro.

Passa de noite pirilampos pela estrada carreira carro risada cochichosno banco ao lado passa o tempo estrela brilha no infinito luz luzindo.Eu sento e deito no cambão da Guanabara pego a estrada sigo a rotade antigos cantadores plantando versos jardim música que alegra omundo leva eu leva Cadu leva palhaço Lulu Luiz Carlos e tambores.Passa de noite chega Quixeramobim Iguatu chega Jardim MissãoVelha Batateiras. Segue passando chega a Terra do Padim Juazeironão te alembras quando nosso amor nasceu Juazeiro me arrespondame diz mesmo se tu queres que eu te diga como foi que ele que te disseJuá.

Chega na pista chega na rua de asfalto o carro de aluguel emparelhacom o chofer Maradona paraguaio olho no olho pergunto se hablacastellaño o índio vai e responde bancando superstar hablo sim, yes,my boy. Pela calçada tem andu e tem pequi tem moto tem automóvelônibus até o Horto tem vela pra meu Padim. Hora do almoço hora dochá de cidreira tem laranja descascada na hora que fiz o filme. O filme

feito retratava a perna manca foi a queda na calçada foi fissurapatelar. Deu de escrever cearensês no gesso branco tome furico taman-co abestado adular. Não se avexe nem vá botando boneco malinoaperriado enxerido agoniado cu de grude Zé Bedeu. Ternanteontemiudim que faz carreira voado apapagaiado imbuança arengar.Catilogência intrigado mangue não não se bula fique frio pilôradesembestado tamborete tribufu magote encasquetar maracámaracatu.

Falando nisso deu de voltar pro caminho da música pé na estrada pranão ter porém ninguém atrás logo cedo. Deixe o Ceará falar. Chegandoem Sousa foi comprar um DVD na banca no mei da rua era MiltonNascimento cantando no Rock in Rio foi ver era Sepultura tudo negrotudo igual. Tudo era música e assim continua sendo pauta fusa semifusacolcheia semicolcheia notação e pentagrama. Quem mais me amadeu-me o mundo de herança. Estando eu em Sousa Paraíba veio amim o vereador em pessoa limpou os sapatos no engraxate apertoumãos e confessou ser rubronegro e tricolor de aço que nem eu. Acantoria seguiu nos levando a mim, Cadu e Luiz Carlos noite adentrono rumo de Cajazeiras onde braços abertos nos esperavam e mais umforrozim bom que só.

Em Cajazeiras tinha céu e estação beliche água da boa brega pop starbaião. No DVD morava Inácio Garapa primo irmão do Malazartes deJoão Grilo era irmão. A radiola troava na madrugada risco de estrelano céu o sono da meninada no café das nove horas teve até cuscuz comovo vitamina de abacate passeio pela cidade olho aberto e pé no chão.Na cantoria eu cantava e quem queria podia cantar também dançarbrincar ser feliz o cortejo passeava brilho de estrela passava pelo céupelo sertão pela rua na calçada moto carro caminhão. Meu coração seencheu de luz na dança dela bela estrela iluminada no céu azul dosertão.

Tinha um menino vestido de seleção tinha um pedaço de cama encos-tado na parede. O menino tinha máscara branca de caveira os meni-nos tinham máscara preta de maracatu. O maracatu de Fortalezaseguiu sua dança batuqueira rolando até altas horas foi varando amadrugada foi tambor na noite adentro madrugueiro baticum. Veio amenina veio a dança veio a noite veio tamborim baqueta veio cor ecoração. O amigo veio o poeta também veio veio gente veio vindo eassim ganhei um abraço. Bate um tambor no coração da eternidade.(Calé Alencar – cantor e compositor)

página13 páginaimagem>prosa>poesia>imagem>prosa>poesia>imagem>prosa>poesia

Paula Respira | Artista Plástica

artes plásticas

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> CAPAS DAS EDIÇÕES DE 2011