revisitando o prefácio ao recordel, do poeta virgílio maia

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Ao dono, indelegável, personalíssimo, o direito de ferrar. Algo solene, quase místico, manhãzinha, que de tarde o sol, a poeira e a fadiga do gado seriam por demais. O proprietário, tomando nas mãos o ferro- quente - um cabo bem comprido, com uma madeira na ponta ou um sabugo de milho a protegê-lo. O ferro em ponto de brasa, marcava, de próspero, as reses recentes: as de compra e as de nascido. O vaqueiro, no quinhão que lhe tocava (de cada cinco bezerros nascidos e criados, um para si; ou um em cada quatro; a variar, condições da terra), havia de ferrar, ele mesmo, com as mãos dele, a sorte dele. E com sua própria marca. Mas, de marca comum, no outro lado da rês, da banda esquerda, ferravam-nas, proprietário e vaqueiro, com a marca do santo, dita também da freguesia. Conta-nos Euclides, em Os Sertões, sobre aquelas gentes, nós, iletrados, que sabíamos "ler" fluentemente qualquer marca de gado. Para os meninos da cidade grande: marca de gado, meu jovem, um ferro em brasa, o boi ali, subjugado; o ferro, rapidamente à perna-alta da rês, até fumacear num olor de carne-couro, chiante, queimante. Uns esturros de dor, no bicho. Passa-se-lhe, a “desinfetar”, um óleo rápido de carrapateira. É soltar... a ver criar e recriar — graças a Deus! Estas, parece, algumas notícias das mãos. Catálogos. E suas serifas. Arte. A arte dos ferros, tão vasta como a arte de decifrar o catálogo das naus dos aqueus, em Tróia, contra Tróia. E cavalos. Reparava, meninote, na perna esquerda dos bois. Se um A ali, era de Anastácio, santo, o padroeiro de Tamboril, de lá, a rês. Um Q? De Quitéria, santa, padroeira, cidade do mesmo nome, vizinhança. Um S? Es- Estudos & Catálogos – Mãos* Soares Feitosa * Prefácio ao livro Recordel, de Virgílio Maia

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Page 1: Revisitando o prefácio ao RECORDEL, do poeta Virgílio Maia

Ao dono, indelegável, personalíssimo, o direito de ferrar. Algosolene, quase místico, manhãzinha, que de tarde o sol, a poeira e a fadigado gado seriam por demais. O proprietário, tomando nas mãos o ferro-quente - um cabo bem comprido, com uma madeira na ponta ou um sabugode milho a protegê-lo. O ferro em ponto de brasa, marcava, de próspero, asreses recentes: as de compra e as de nascido.

O vaqueiro, no quinhão que lhe tocava (de cada cinco bezerrosnascidos e criados, um para si; ou um em cada quatro; a variar, condiçõesda terra), havia de ferrar, ele mesmo, com as mãos dele, a sorte dele. E comsua própria marca. Mas, de marca comum, no outro lado da rês, da bandaesquerda, ferravam-nas, proprietário e vaqueiro, com a marca do santo,dita também da freguesia.

Conta-nos Euclides, em Os Sertões, sobre aquelas gentes, nós,iletrados, que sabíamos "ler" fluentemente qualquer marca de gado. Paraos meninos da cidade grande: marca de gado, meu jovem, um ferro embrasa, o boi ali, subjugado; o ferro, rapidamente à perna-alta da rês, atéfumacear num olor de carne-couro, chiante, queimante. Uns esturros dedor, no bicho. Passa-se-lhe, a “desinfetar”, um óleo rápido de carrapateira.É soltar... a ver criar e recriar — graças a Deus! Estas, parece, algumasnotícias das mãos. Catálogos. E suas serifas. Arte. A arte dos ferros, tãovasta como a arte de decifrar o catálogo das naus dos aqueus, em Tróia,contra Tróia. E cavalos.

Reparava, meninote, na perna esquerda dos bois. Se um A ali,era de Anastácio, santo, o padroeiro de Tamboril, de lá, a rês. Um Q? DeQuitéria, santa, padroeira, cidade do mesmo nome, vizinhança. Um S? Es-

Estudos & Catálogos –

Mãos*

Soares Feitosa

* Prefácio ao livro Recordel, de Virgílio Maia

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pere aí, meu caro, este boi é "meu" — Sebas-tião naturalmente; São Sebastião, «Ó mártirde Cristo,/ ó santo varão,/ livrai-nos da pes-te,/ São Sebastião!» —, janeiro, 20, padroei-ro da Serra das Matas, dita outrora Vila daTelha, hoje Monsenhor Tabosa.

Os modelos da Ferrari, o catálo-go de todos os filmes, o relato completo dasgrifes de marca, roupas de vestir — sabe-ostodos, meu jovem? Pois sabíamo-los aos fer-ros, os nossos ferros. E berros. Um chocalhonum timbre alto; outro mais soturno, outro chocalho, e outro e outro. Tro-pel. De galos e auroras, meu caro engenheiro. Tecem a manhã os teus ga-los. Tecem os bois e seus chocalhos a tarde chegante.

Arte, coisas — o catálogo das letras finamente desenhadas. Nemtão grandes a não inutilizarem o couro do animal com uma mancha exage-rada; nem tão miúdas a ponto de o vaqueiro não as "ler" à média luz, demédia distância. E sabíamo-las de cor, a reproduzi-las no chão com umgraveto fino. E suas serifas. Arte! Aqueles pequenosrabichos que rebatem a perna do A ou repuxam umpequeno rabinho duplo na ponta baixa do P. Experi-mente, na tela do seu computador, com a fonte Arial,que é um modelo tipicamente sem serifa. O A será umV de cabeça para baixo, atravessado por um garran-chinho sem nenhum enfeite. Cabral. Retas. Arial.

Veja, agora, no modelo Times, o mesmo A. Repare que no finalde cada perna da letra há um rebate, um acabamento a mais, uma pequenasapata. Esse enfeite é a serifa. Rabichos. Rebatido. A proporção justa, da

divisão áurea. A haste maior e seu acabamento, eis a be-leza das marcas de ferrar. Catálogos. Virgílio Maia, poe-ta, é especialista em marcas de bois. E Socorro Torquato,a mulher dele, sabe desenhá-las em pedra & fogo. Assi-na-as: Côca.

Há, dentre muitos outros, o catálogo dos lei-tes. As coisas de gerar, parir, alimentar e comprar - gado -

são minhas. Coisas d'Ela, as vasilhas impecavelmente lavadas, enxutas; ospanos de coar, com uma marca vermelha, em ponto-de-cruz, serifas, o mes-mo "ferro" do ferro dos bois. Coisas minhas: "espichar" os úberes (sem

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aniquilar os bezerros, evidentemente), levar para dentro de casa, ao fabricodos queijos, os baldes de leite, sempre dizendo que estão bem leves, masem tempo de me arrebentarem o espinhaço. Dali para frente porém o traçodo coalho, os utensílios, as formas de moldar, mãos, levíssimas mãos, ograu de cozimento da coalhada, estas coisas são d'Ela, um catálogo fêmeo.

A prensagem do queijo, d'Ela. Um rápido torque no cabo daprensa. Toque, nem por demais para não ressecar ou espatifar a massa (eperder no peso, na hora de vender), nem de menos para não azedar o pro-duto, de tanto soro, a perder na qualidade... Sim, um apertar de braços,abraços, Ela. Também do catálogo fêmeo, o desenformar do queijo, de-sembrulhando-o, alvíssimo (tomando-lhe o sal), úmido, lúbrico, uma tare-fa da noite cedo. De mais um pouco, as coalhadas e suas terrinas, ceia erezas - d'Ela, minha. E a noite.

Levá-los, queijos, à feira; negociá-los em açúcar, querosene ealguns álcoois são coisas de minha lavra, numa tropa de burros. No cavalomais dócil, de parelha com a burra Faceira comigo em cima, Ela. Na volta,um cálice de Imperial. Ou do Porto. Sem esquecer o nome das reses. Elaquem ajuda a escolher. Flor do Pasto à vaca “mais bonita do lugar”, Eladisse. [Eu disse: Flor, tu!] O touro Canário, lhe botei este nome, aos caná-rios de um certo alpendre. Ela sorriu. Mas zombou que noutras casas, dealpendres e saias, havia canários. Eu disse que não seriam amarelos tantoquanto.

Ah! o catálogo das águas?! Aquele cavar, escolher onde cavar,recavar (porque tudo que um dia eu cavo, a cheia vem e entope), coisasminhas, catálogo meu. Encher os cântaros — cabaças, roupas, lajedos,moitas de melão São Caetano, perfumar as redes em sol de capim-santo...falem com Ela, digam que fui eu que disse. Mas o fabrico da moringa desola, dita também borracha-de-sola, curtindo antes o couro em cinza e cas-cas de angico... Assovelar cada uma das peças em paciência. E Arte. A artedos couros; selas, gibões, peitorais, chinelos, inclusos os d’Ela (com asvaquetas mais tenras); sim, estas coisas estão comigo, sempre estiveram.Botar a moringa de sola a limpar o gosto e o cheiro da sola com tantas etantas águas, falem com Ela. Também os canecos-de-beber, potes, jarras,bandejas, toalhas e ornatos de fino crochê; rendas e bilros; linhas brancas ede matiz.

Ainda no catálogo das águas, reparar no tempo, no "olho" dosformigueiros, "profetizar" se vai chover ou não, poupem-na. Se sabe, tal-

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vez saiba, mas de puro recato, Ela não diz. E o catálogo dos animais. Dize-mos animais tão-só aos cavalos, burros e jumentos - e dalgum político mal-abuzado. Gado é gado! Peá-los a campo, encabrestá-los, montá-los bravi-os, a pulso e ordem — cavalos e burros; jumentos não, que são dóceis ecalmos de natureza — não remetam a Ela, tarefa minha, só minha.

Aos animais miúdos, patos, galinhas, pavões, perus, e os pássa-ros de dentro de casa — "assum-preto" — soltos, Ela quem os dirige. Ni-nhos — pô-los a pôr, deitá-los, tirá-los, o primeiro xerém, falem com Ela,por favor, que não entendo dessas artes. Espingardear os inimigos, costurá-los à faca? Ela está inocente, mas saberá desembrulhar seus mortos.

Ia-me esquecendo, uma tarefa muito d'Ela: fazer, em letra cal-ma, uns papeluchos «Ave Maria concebida sem pecados, rogai por...», aapregá-los (com um grude ligeiro, de goma, feito no bico da colher, nachapa do fogão de lenha); isto mesmo, pregá-los pelo lado de dentro, emtodas as portas, em todas as janelas. Também nos currais quando os bichosadoecem, nos moirões da porteira, protegendo a nós todos, brutos e viven-tes. Contra os de fora! Por dentro. E "esquecer" um desses papéis no fundodo bolso do meu gibão. Percebo que Ela o troca quando o suor do rosto...mãos... papel. Um longo aboio. Amarfanhado.

Nada melhor para assustar as aves de arribação que um aboiobem longo. Ferros de bois. Hoje, os computadores e as máquinas de saté-lite nomeiam e rastreiam os bois. Naqueles tempos, um chocalho, umapisada mais arisca, uma cor de pelagem, o formato dos chifres e orelhas ou,irrefreável, a marca de ferros. Desaparecemos?

Dizem que sim, tal qual os livros-copistas e seus monges foramsumindo. Também os palimpsestos. Mas o poeta Virgílio me mandou osoriginais deste livro embrulhados num pedaço de couro de bode, todo es-crito em letra de fino traço. Como haveremos pois de sumir com todasessas coisas?!

Catálogos! O catálogo dos Doze - tribos e apóstolos. Trivium equatrivium, ou, digamos... uma lista... a lista dos galos. Galos? Sim, galos,manhãs e auroras. Ou da tarde rubra (Gular), num saguão de sombras, ci-mento, o olho em riste, desafiante, galo-galo: — De que me defendo?

O catálogo das cercas. Somos terra e cercas. Daqui para frente,não! Um risco no chão e se levantam marcos. Cercas. O catálogo abrangea cerca de jangarela, dita também de rama ou de ramada; as de lombo; asde arame de três pernas mais os estacotes na vertical; as de arame com doze

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fios, à prova de bodes e bacorinhos; as de fachina (de fachos, verticais,especantes) com moirões de sabiá a insultar com o tempo; mais as cercasmodelo Piauí: quatro fios de arame por sobre uma muralha justaposta, exata,construída à eternidade com as pedras de Piracuruca, léguas e léguas, videestrada de rodagem Altos-Campo Maior-Piripiri.

Dizem que ninguém mais sabe fazer uma muralha inca. As pe-dras talhadas à mão destra, justas, sem emendas, nem cimentos; ou, pelocontrário, as mãos é que já nasciam talhadas em pedra. O que fazer agorado nosso catálogo de hinos do santo padroeiro, dos desenhos das farinhadas,dos engenhos da rapadura, caieiras, tijolos, telhas, cal, piões, cumeeiras,biqueiras — o que mais, meu Deus? — se do sertão, dizem que acabou,resta apenas um juazeiro com a gente debaixo (INSS) jogando sinucas?

Não! Não e não! Quem saberá, daqui mais uns dias, no catálogodas coisas de comer, notícias de um chouriço, que era apenas um estranhodoce de sangue de porco? Um doce de sangue de porco? Talvez fosse nos-sa herança marrana a desmentir ao mundo uma possível condição de cris-tãos-novos.

Lubricamente matávamos o porco: as mãos viajando no quentedas vísceras... Só quem já matou é quem sabe como é. A festa, os rins dobicho, assando-os ligeiros, afogueando-os ao primeiro trago. E a matutagem,um ritual de amizades em que metade ou mais das carnes saíam gratuitas,de puro gáudio, à certeza da retribuição quando do próximo porco do vizi-nho.

Falemos agora da sorte. Sorte devaqueiros, sorte de leitor. Há de ter sorte paraabrir um livro. Abri-lo na página certa, nopoema certo. De gostar ou não gostar. Noprimeiro lance, um lance de mãos. Foi as-sim que abri este. A esmo. O poema As Ho-ras do Dia. Comecei pela Hora Uma:

O dia vai começandoe diante d'Ele me calo.No seio da escuridãose escuta assim um abalo:toda a caatinga estremece,pois mais parece uma preceo primo cantar do galo.

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A emoção me disse que o fechasse imediatamente. Nessa maniade achar as coisas com as mãos como sói acontecer com os cegos, reabro-o, momentos depois, bem em cima da estrofe da quinta hora, que, noutrocanto, um dia, cantei (Antífona):

Pontualmente,de manhã bem cedo, pontualmente:

o sol,o galo,a aurora,a lufada do vento,a manhãzinha,o café forte,a porta aberta.

Mais um entalo. E outro silêncio, a suspendê-lo só bem depois,

para correr, na calma, o livro inteiro. Um defeito gravíssimo, a droga destelivro: é um só! Devia ser cem, um cento. Em multi. Sons. Aboios. Poeiras.Cinzas e memória. Pior é o seuautor: também único. E os jua-zeiros fervilhando de sinucas...

Ah, meu caro Vergilius— Nunes Maia ou Publius Maro,tanto faz —, a legitimidade donosso canto é tão-só a sustentar ojúbilo. Se cantamos a vida,cantemo-la como a não-morte; secantamos a morte, que seja umpsalmo de ressurreições.

Poeta Virgílio, creia-me, o catálogo das mãos é inesgotável porque asmãos dos novos hão de garantir as nossas mãos. Por sobre, sempre porsobre; assim tem sido.

QUADROS: Página inicial: logotipo do Jornal de Poesia: www.jornaldepoesia.jor.br Página inicial: A Morte de César, Jean Léon Gérôme (França, 1824-1904) Página 3: Soares Feitosa, dez anos Página 5: Estudo das Mãos em Oração, Albrecht Dürer, 1515-1585 Página 6: poeta Virgílio Maia, autor de Recordel, 2003

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7ESTUDOS & CATÁLOGOS - MÃOS

ADAIL SOBRAL: Enumeraçãoborgiana, construçãocabralina, vertigemdo frontispício de ONome da Rosa, em quea descrição em pala-vras tem mais vigor,

nestes tempos de desatenção, do quea vaga imagem do filme. Percorro ma-ravilhado o inventário do impossível.Prefácio intermetalingüístico-leitura-pessoal-coletiva, vertigem. Gado égado, mas vaca é flor e boi é canário.Listas e listas, correntes listas, emlista de Web. A alta tecnologia traz do“mato” a estranheza a quem não viuas personagens que desfilam emVirgílio e Soares, e evoca, para quemviu, o embate anti-antigonal, pró ge-ração, pois, num prefácio de griffe, demarca, de bois, de poesia, de amor. Háesperança. Adail

DA GENEROSIDADE DOS LEITORES

ALCIR PÉCORA: Caro Soares Feito-sa, acabo de receber oJornal de Poesia como seu prefácio do livrode Virgílio Maia, queinfelizmente não co-nhecia. Sorte que hágente como você apli-cada a destruir igno-râncias. Obrigado. Alcir.ADELINO BRANDÃO: Caro amigo So-ares Feitosa, rRecebi e agradeço o seuCatálogos & Estudos - Mãos, EdiçõesCururu. É de arreglar os olhos de puroespanto, ver como você sabe fazer ascoisas. Parabéns! Obrigado. Continueem frente. Eu também conheço mui-tos sapos barbudos que pulam daqui,pulam dali, roncam e coaxam muitomas não vão além do charco. E quan-do se agarram a uma pedra, não a lar-gam nem mortos. É o mundo. Quemnasceu para sapo, não chega a ando-rinha. Continuo gostando de sua poé-

tica e espero recebersempre suas notícias.Um grande abraçodeste seu irmão maisvelho, Adelino Bran-dão.ADELAIDE LESSA: Soares Feitosa,poeta comovido e comovente/ Passeinoites no campo ouvindo o bezerro des-mamado./ Bebi leite quente do ubreda vaca madrugadora./ Queijo é meucompanheiro a qualquer e, se nãohouver, coalhada. Quem lava meu fil-tro de água, repassada no carvão, soueu./ Em menina, dei milho a galos egalinhas do alto de um pé de louro./Sempre estampei versos em portas,janelas, armários, malas de viagem/Além de colecionar poesia dos outros./Ainda agora rezo de mãos postas./Mãos de mulher, ativas e contempla-tivas, comovem,/ Se as contemplarquando vivas, comuma lágrima no can-to do olho,/ e depois,nos retratos de bisa-vós, avós e mães fa-lecidas, comovem./Suavizam os cora-ções pensantes./ Vi-vamente agradeçopor seu estudo das mãos/ d’Ela, mu-lher-mulher comoção. Adelaide Les-saALBERTUS MARQUES: Meu caro So-ares Feitosa, obrigado pelo envio doteu “Estudos & Catálogos – Mãos”, textoque é prefácio do livro “Recordel”, deVirgílio Maia. Depois de muitas leitu-ras, e enormes e profundas observa-ções, a gente pensa, e com razão, quejá leu tudo que podia ser bom, e já viutanto que, no mundo de todos os mun-dos de cada um, nada há mais o quedestacar. Mas aí nos chega esse “Es-tudos & Catálogos”, e todas as cria-ções, já criadas, ficam devendo aindaum pouco muito, em termos de con-

O COMENTÁRIO DE ADAIL SOBRAL, O 1º A CHEGAR.OS DEMAIS, EM ORDEM ALFABÉTICA.

ALGUNS, SUCESSIVAS FORMATAÇÕES DO COMPUTADOR, PERDI-OS.SE O SEU NÃO ESTÁ, REENVIE-O, POR OBSÉQUIO.E SE QUISER COMENTAR, REMETA, POR FAVOR:

[email protected]

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tados, todos os sentimentos ficamsombreados pelo sentir forte de quemnarra, e qualquer escrita fica compa-rada a menor, diante dessa autenti-cidade. Sabe, Feitosa, todas as letrasjá estão mais do que conhecidas, poisé com elas que se gravam as palavrasdo nosso pensamento, as palavras to-das já existem nos dicionários, poissão veículos da composição dos senti-mentos. São os poetas, que fazem dequalquer letra um significado especi-al; são os poetas que dão às palavras –conhecidas, um valor maior, um va-lor além, fazendo com que suas signi-ficações virem “significâncias” alémdo léxico, com o sentimento, com aarte do uso, e o emprego da beleza.Poesia. Com o “A”, da marca dos bois.O “A”, da marca dos bois, não uma sim-ples letra, está uma história, às ve-zes, muitas histórias. É uma outra lei-tura, para quem a sabe ler, e um tan-to de vivência – muito especial -, umuniverso de “coisas” naturais, que sejuntam, se conjugam, se completam.Mas elas existem porque existem, emuita gente nem sabe. É preciso quealguém fale delas, mas tem que seralguém que bem as entenda, e queesteja bem enquadrado, nesse mun-do. E mesmo assim, se disser só, ficatudo parecendo pouco. É preciso al-guém, que diga mais que o comum,que traduza esse comum para suaimportância. É preciso um poeta. Umpoeta narrador. De vaca mais bonita,ao touro nomeado. Ferros de bois. Equem sabe das coisas, conhece oscatálogos. Dos ferros, das águas, o ca-tálogo dos leites. Coisas especiais, dequeijos e coalhadas, seu fabrico, seuscuidados. Sua arte. A arte dos couros,o catálogo das cercas (“somos terras ecercas”). E as mãos? As mãos que fa-zem, que dominam, que acessam, quedistribuem seus cumprimentos. Mãosde tarefas. Como diz Feitosa, é um ca-tálogo inesgotável e a poesia, a poe-sia de todas as coisas, em todas as coi-sas. A poesia de todas as mãos, deautenticidade de um Soares Feitosa.As coisas sempre foram, mas só as co-nhecemos quando alguém fala delas.Nos seus catálogos infinitos. Com aarte de dizer. Essas mãos sempre seencontram, pois a poesia viaja qual-quer distância, nos sentimentos di-

tados por um poeta. Eos dizeres têm os seuscatálogos; catálogos debeleza, de poesia. QueSoares Feitosa conhe-ce bem, quando diz ”omel não pode ser pordemais espesso, nem muito fino, nema farinha, peneirada, ou por demaiscaroçuda”. Parabéns, Soares Feitosa,por toda essa poesia feita escrita, pa-rabéns por essa exposição de auten-ticidade. Parabéns por esse “Estudos& Catálogos – Mãos” tão no ponto.

pelas minhas mãospassam poeiras intencionais;nelassinto os pésde outros quens,suas gotas de suoré satisfaçãopingar-me sobre eles;sinto mãos nas minhas mãos;sujas de terras,limpas de terra.Um abraço do Albertus.

ALFREDO FRESSIA: Obrigadíssimo,Feitosa, por esse texto belo, muitobelo. Tem muito de épi-co, especialmente dehomérico, sim, nessasenumerações. Valeu apena você fazer essaedição, o texto a mere-cia. Parabéns, amigo.AlfredoÁLVARO CEIÇA NEVES: Feitosa, umbater de coração primordial, seme-lhante a uma batida dentro do útero,apoderou-se quando recebi castanhoenvelope e dobrado na minha caixa decorreio. Estudos & Catálogos - Mãos -impressionado. A poeira e a fadiga dogado transportaram-me para um pla-nalto de origens - carne-couro a cho-calhar dentro de mim. Mãos. Mãoscomo vasilhas abertas àcriação! Tudo parece tãoperfeito assim. A ques-tão da serifa não deixade ser menos inquie-tante - existirá a dese-jada sapata debaixo de

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cada um de nós? Mas, sobretudo, ficaa promessa de um Recordel anuncia-do, espero! No final, a renovação é sem-pre a continuação no ciclo pródigo davida - “as mãos dos novos hão de ga-rantir as nossas mãos. Por sobre, sem-pre por sobre; assim tem sido.” Lem-bra-me a infância da amizade pura,mãos ensinando amor... Um convite -Edições Cururu... Teria todo o gostoem participar, diga-me se, caso tenhalido Hidra, gostaria de a ver publicadaem Cururu? Abraço grato, ÁlvaroAMÉLIA MARCIONILA: Para o gran-de escritor Soares Feitosa. Que textoafinado! Que beleza de prosa! Fez-melembrar infância, o "Ele", o "Ela", o "diade matar o porco", vivências minhas...Ao lê-lo viajei em emoção: pisei a ter-ra, chão de Minas, vi o sol, o mato, ocheiro de choupana de colono, a águade mina, a reza no cruzeiro, a alegriade folia em apresentação na FazendaSantana, do meu avô Mário Rapôso. Oseu texto, na verdade, tem gosto decafé de rapadura (que nunca me es-quecerei), tem o aroma da rainha-da-noite, em floradas, em noites de lua,como tem os matizes de uma alvora-da nas Alterosas. Li-o numa tardemorna de domingo, nas Gerais, cir-culada por montanhas misteriosas eprotetoras... Deu-me vontade de su-bir no Pico da Bandeira e lê-lo em altavoz para que todo o Brasil me ouvisse.Obrigada pelo presente, Soares Feito-sa. Ele deveria sim, ser lido, relido,divulgado, publicado, comentado e,sobretudo, sentido e saboreado! Aqui,tão longe, às margens do Paraiba doSul fico a meditar os mistérios dessanossa linguagem brasileira e a gran-deza dessa nossa abençoada terra. Naminha mineirice-nordestina posso di-zer que temos um só coração literá-rio quando me encanto com os seusgemidos de escritor nato, albatroz dacaatinga, a me premiar com tanta ri-queza. Agradeço "Estudos & Catálogos

- Mãos. Continue ame enviar suasmaravilhas. Conta-me como faço paraadquirir Recordel,de Virgílio Maia.Abraços. AméliaMarcionila

ANA BEHRENS: Obrigada pelo texto.Estranho foi tê-lo encontrado junto ànotícia da morte da Hilda Hilst. Não éestranho que assim mesmo, eu tenhasorrido com a tua prosa deliciosa epoética. Há uma usina elétrica emteus textos, Francisco. Teus parágra-fos são fios de energia que tomam adireção da tomada dos olhos. As luzesacesas. Beijos, AnaANA CABRERA: Caríssimo sr. Feito-sa, mas que coisa, hein? Aquilo quefinge ser catálogo de miudezas, per-cebidas e por descobrir, é na verdadefórmula de encantamento, dessas quepegam de tal jeito que o coração ficagrudado, feito passarinho em visgo.Mas olha (posso usar o tu, não é?), em1975, Borges, o Argentino, fez publi-car um livro só de Prólogos, lembras?E ali havia ainda um "prólogo de pró-logos", sugerindo uma cadeia ad infi-nitum. Pois é... Fiquei aqui imaginan-do uma coletânea de teus Prólogos -esses catálogos tão substanciosos eviscerais. Que tal? Um grandeabraço. AnaANA CAROLINA ELIAS PEDRETTI:Olá Soares! Fiquei surpresa ao che-gar em casa após uma viagem e en-contrar um envelope seu. E fiqueimais surpresa ainda ao ler o conteú-do! Conforme lia, po-dia sentir o cheirodos bois, da terra e domato! Mais uma vezpude perceber que euainda tenho muito oque aprender parame tornar uma boaescritora! Muito obri-gada por ter me man-dado sua obra e parabéns pelo seu óti-mo trabalho! Ana CarolinaANDERSON BRAGA HORTA: Meu caroSF: Seu prefácio ao Recordel de Vir-gílio Maia é inventivo, é poético, é ricoem virtudes intrínsecas, além da vir-tude primacialmente de-sejável — mas nem sem-pre encontrável nos prefá-cios —, que é a de atiçar ointeresse do leitor no li-vro apresentado. Meuabraço. Anderson

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10ESTUDOS & CATÁLOGOS - MÃOS

ANDRÉ SEFFRIN: Meu caro Feitosa:Estudos & Catálogos — Mãos não éprefácio, é obra autônoma. Para quemnavega nas águas de um Euclides daCunha, de um Raul Pompéia, de umGuimarães Rosa, de um Pedro Nava.Feliz mesmo é o Virgílio Maia que podejuntar ao seu livro um outro livro depoeta. Prefácio? Uma leitura apaixo-nante e inesquecível. Parabéns e omelhor dos abraços, com tudo de bompara 2004, do seu amigo André.ANDREA CRISTINA LOPES: Caríssi-mo Soares Feitosa: Estava ansiosapela chegada dos "papé" que em e-mail você havia antecipado que che-gariam. Cumprimento-lhe pela rique-za do material recebido. Confesso queviajei à minha infância. Revi cenas

mágicas já esqueci-das com a correriados dias atuais. A lidacom o gado, os quei-jos sendo prensados ea matança dos porcos.Só se viam criançassaindo pela vizinhan-ça oferecendo peque-nas porções da carne

do bicho, costume local, que mais tar-de seria retribuído da mesma forma.Agradeço imensamente a gentileza doenvio dos "papé". Não posso expressara satisfação em receber a dedicatóriana capa à mão. Poeta, eu? Quem dera!Nada sou diante de tão grandes mes-tres e, ainda assim, em minha enor-me falta de conhecimento e vivência,mas não restrita paixão pela Litera-tura (especialmente a poesia), senti-me profundamente entusiasmada. Lie reli para ter certeza. O prefácio estámaravilhoso, (cadê o livro) ele provo-ca um conjunto de sensações sines-tésicas que surpreende, são muitasimagens poéticas ao mesmo tempo.Você domina o mundo das palavras(conheço uma parte da sua poesia),prende definitivamente o leitor quevai se inserindo psicologicamente notexto e ao final resta a sensação deuma viagem fantástica e prazerosa.Gostaria de unir-me aos demais nahomenagem ao grande Poeta Ascen-dino Leite, felicitando-o pelos seusnoventa anos, quem me dera chegara essa idade, principalmente com um

tiquinho assim da bagagem que eletem, no entanto quero também pres-tar minha homenagem a você pela bri-lhante iniciativa de Estudos & Catá-logos - Mãos e Jornal da Poesia ondeeu agraciadamente te descobri. Umgrande abraço e sinceros Parabéns.Andrea Cristina Lopes - Araucária -ParanáANDRÉA SANTOS: Caro Soares Fei-tosa, que tenhas um 2004 cheio derealizações! Bem... Li e reli as voltasdo gado, das letras, dossinônimos à moda cél-tica – mas sem as obs-curidades, entretantocom a profundeza dohomem de letras queés. Seus jogos de pala-vras me impressio-nam, afinal é só umprefácio, e a composição “cava” e “re-cava” com “Ela” a curiosidade catin-gueira, as emoções que em algumasocasiões somente as mãos podem nosdar. Estudos e Catálogos – Mãos che-garam-me em boa hora, pois pude ca-talogar com as minhas mãos a ine-xaurível fascinação pelas criaçõesalheias e minhas. Obrigada pela sur-presa e vos confesso: espero mais!!Andréa Santos.ANTERO BARBOSA: Poeta Soares Fei-tosa, conforme prometido, venho aquihoje para falar um pouco e informal-mente de seus textos. Sem qualquerintuito de contrabalançar a generosi-dade que tem tido comigo. Faço-o vo-luntariamente e por merecimento.Apreciei seus prefácios, em especialo que tem por título "Estudos & Catá-logos - Mãos". Estamos demasiadocansados de prefácios técnicos, recor-rendo abusivamente a linguística, ateorias da literatura, a citações mas-sivas, a tudo isso. É refrescante lerum prefácio não técnico, coloquial, di-dáctico e que envolve o leitor nos ador-nos de uma "estória".Excelente. De seuspoemas eu diria quesão todos óptimos.Não cabe aqui espa-ço para falar de todos,nem esse é o objecti-vo. Já havia lido al-

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guns no JP com agrado e emoção. Por-que em tudo na vida há lugar a sínte-se e gosto pessoal, falarei apenas dedois: "Réquiem em sol da tarde" e "Fe-mina". Apesar da distância, das vivên-cias, das gerações que nos separamaos dois, apesar do substracto semân-tico e cognitivo que nos distinguem,por vezes é possível a aproximação ea osmose. É o que acontece com "Ré-quiem", que me lembra e integra emsítios e situações de minha vida, ondea nostalgia e a emoção são rigorosa-mente iguais às suas. Neste caso,percutida de si para mim. "Réquiem"apela ao conteúdo, "Femina " apela àforma. Literariamente é, para mim,o melhor de todos, quase que não foiescrito mas já existia. De facto, o en-caixe demasiado perfeito das palavrase a musicalidade que dali se ergue es-tabelece o tipo de poema que eu diriater chegado por intercedência de po-der divino. Abraços, Antero. ANTÔNIO CARLOS SECCHIN: Caro

Soares Feitosa: obriga-do pelos textos de Mãos,em especial seu beloprefácio, com direito ao“retrato do artistaquando jovem”! Para-béns! Você, de fato, pôs“mãos à obra”, e Virgí-lio deve ter ficado mui-

to contente. Um grande abraço e osvotos de um feliz 2004 do Secchin.ANTÔNIO LAURI DE OLIVEIRA: ES-TUDOS & CATÁLOGOS-MÃOS. Deli-ciei-me com a leitura desse prefácio.Deliciei-me com a beleza da enge-nharia literária, com a escolha daspalavras, com a descrição da marca-ção do gado, com os nomes das pesso-as. Deliciei-me especialmente com amaneira como você falou das comi-das, do "doce de sangue de porco", ochouriço. Que maravilha é o chouri-ço! Depois do chouriço, você me falado mel de engenho com farinha. Coi-sa dos Deuses. Que bom, poeta, foi leresse belo prefácio que você escreveupara seu amigo(suponho) VirgilioMaia. Eu, no lugar de Virgilio, estariamuito feliz, por esse presente tão ge-neroso. E certamente ele está. Comodisse um dos que escreveram a você

(eu li todos, incluindo o econômicoAffonso Romano de Sant'Ann-Valeu!ars-), seu prefácio é uma peça literá-ria. E vou mais longe. Acho que esseprefácio tem vida prípria. Parabénspor seu trabalho, por suas palavras,por sua poesia. Obrigado pelo "papé".Grande abraço, LauriANTÔNIO MARIANO DE LIMA: Soa-res, li com prazer seu prefácio ao Re-cordel, novo livro do poeta cearenseVirgílio Maia. É um exemplo curiosode como se pode construir um textocom identidade própria, que funciona-ria independente da obra da qual é in-tertexto. Tem estilo, tem alma, respi-ra mesmo. Que a velha academia co-mece a beber também em mostras deleitura como estas. Oprefácio cumpre tam-bém o importante papelque é o de provocar o in-teresse do leitor sobrea obra que apresenta.Onde posso encontrar olivro? Um forte abraço,muita poesia, parabénsao poeta prefaciado e aoprefaciador. Antônio MarianoASCENDINO LEITE: Mestre SoaresFeitosa, poeta,Você me retirou, poraudaciosos inventos, da cova “sadhâ-mica” em que me tem metido a ve-lhice avançada. Não estou pasmo. Es-tou ferrado. Grande feito! Precisei vi-ver tanto para merecê-lo. Depois de ter exami-nado várias crateras ro-seanas, vi que você éum mestre ousado epode passar da invençãodas coisas com retum-bante êxito. Gratíssimo.Ascendino - 6.1.2004PS: Pergunto a Soares Feitosa: quemé Conceição Paranhos? Soares, repi-to: quero saber quem é essa Concei-ção eclética! Professora, Literata, En-saísta, Crítica de ofício? Fã ou tietepedindo novo Sagarana para formarnovo triunfalismo sobre nosso idiomaagonizante?! Muito mais que tudoisso, estou sentindo uma pessoa sá-bia, uma escritora admirável!Nota do Editor: Ascendino, à épocadesse escrito, quase noventa

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(21.6.1915), um entusiasmo de ado-lescente. Deixou-nos, aos 95, em ple-na atividade literária, em 13.6.2010.Foi uma pena não ter ido conhecê-lo.Veja neste arquivo a viagem a visitá-lo: http://www.jornaldepoesia.jor.br/Francisco204.htmlASTRID CABRAL: Meu caro SoaresFeitosa, que bom receber um presen-te vindo de você! Li com extremo de-leite Estudos & Catálogos — Mãos.Além de bom poeta, você é um prosa-dor primoroso. Tem rarodomínio linguístico e oolhar voltado para o es-sdencial telúrico, tãoameaçado pela abusivaurbanização do Brasilcontemporâneo. Paramim esse mundo ruraldo Nordeste arcaico éfascinante, e o retrato que você empoucas páginas nos dá é conciso e per-feito. Se vivo, Mário Andrade bateriapalmas. Ao produzir literatura da me-lhor, você também faz sociologia. Per-gunto: Emile Durkheim, ao tratar dadivisão do trabalho, examinou comtanta argúcia esses dois universosdistintos onde atuam as mãos do ho-mem e as mãos da mulher? Se exa-minou, certamente não se valeu dalinguagem literária, pois esta é que“ferra” para sempre a lembrança. Oprefácio alvoroça seus leitores paraconhecer o Virgílio cearense, manu-sear-lhe as novas geórgicas. AstridAUGUSTO BARBOSA COURA NETO:Prezado Soares Feitosa, sensibilizadoagradeço a remssa de Estudos & Ca-tálogos - Mãos, que veio me enrique-cer intelectualmente. Confesso quemeu dia frio foi aquecido pela espe-rança de tê-lo como amigo e paredro,para conhecimento melhor da litera-tura nordestina, que muito aprecio.O prefácio sobre o livro Recordel, de

Virgílio Maia, foi de-veras enriquecedor.Senti invadir emmim uma gama in-tensa de saudades,pois eu nasci no in-terior de Minas Ge-rais (Ponte Nova), oumelhor, na roça,

como diz o mineiro que não nasce nacidade, tendo a cidade apenas comoreferência no registro de nascimen-to. Assim pude penetrar de coração noâmago e vivência do que o nobre ami-go prefaciou. Quero parabenizá-lo tam-bém pelo Joelhos & Mel. Na minha in-fância muitas vezes dosei erradamen-te o mel e a farinha (eu era muito ara-do). Esperando a sua amizade, aindaque por epístolas, despeço-me com umforte abraço. Augusto Barbosa CouraNetoAURA REGINA SORRENTINO: CaroPoeta Soares Feitosa, Que alegria foipara mim receber o Estudos & Catá-logos - Mãos impresso em papel, po-der tocá-lo com meus dedos sentir atextura e cheiro, poder carrega-lo paratodo canto, adoro mexer em papel,quanto ao seu prefácio, que textomaravilhoso,que fluência que vocêtem, e que prazer foi poder viajar pelasua mente nesse espaço do nordesteque só conheço via autores e muitopouco por turismo. Adorei receber tam-bém Da caixa postal aos corrós de açu-de. Que linda homenagem fizeste aoPoeta Ascendino Leite! Obrigada portua generosidade ao enviar-me tãolindos presentes. Um abraço, AuraRegina SorrentinoBERNADETTE LYRA: [...] e já que de-satei a escrever na lista (a vinda praSampa faz dessas coisas comigo: ficolouca pra fazer contato com as pesso-as!), digo que já li o papé do Soares.Deslumbramento! Soufã de carteirinha des-se senhor e até sonhocom ele (às vezes, ar-rodeado de cabras, be-zerros e demais bi-chins e de chapéu decouro; às vezes de ter-no e gravata, folhean-do um ror de leis e pe-tições e mais quejan-dos)! Bem, caro escritor e amigo, voulhe enviar uma orrespondência emseparado, para seu endereço postal.Assim, aproveito e mando um livrinhomeu, coisinha pouca, nonada, de fren-te a seu traquejo com as palavras.Bernadette, a boquiaberta.

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CARLOS FELIPE MOISÉS: CaríssimoFeitosa: Perdoe-me a demora em res-ponder. Estive umas semanas fora,tentando recarregar as baterias e, logoem seguida, foi o início do ano letivo,afobado e conturbado como sempre (aspobres velhas baterias já estão quasedescarregadas)... E sou-lhe grato, tam-

bém, pela riqueza e ovigor do Estudos & Ca-tálogos – Mãos. (O Vir-gílio Maia – mande-lhe,por favor, meus cumpri-mentos – deve estar pralá de feliz com o magní-fico prefácio.) Sintoque, nesse texto, você

domou todos os potros selvagens dasua fala, a fim de que eles possam,paradoxalmente, correr livres e soltos.É a “paixão medida”, de que fala oDrummond, aquela fusão paradoxal,acima referida – ambição de todo es-critor. Caso eu não tenha sido tocadopor alguns temas e subtemas que mesão especialmente caros, acho quevocê o conseguiu, mais do que nas re-alizações anteriores que cheguei aler. Receba o forte, forte abraço doCarlos FelipeCARLOS GILDEMAR PONTES. Prefá-cio pai d'égua. Nós, urbanóides vicia-dos em técnica e moleza, engordamosnossos corpo e mente diante da TV edo computador. Tudo bem! Ficamosinformados e não precisamos ir ao su-permercado-capital para escolher acor da lua. Na aldeia global o sinal defumaça nos previne ou nos aniquila.Vimos estupefatos o 11 de setembrode transformar em pesadelo digital,vimos um menino iraniano de corpoe cabeça, e só, ceifado de pernas e bra-ços pelas bombas estúpidas do inteli-gente Bush ou o contrário dá no mes-mo. Agora vai para o reformatório sa-crossanto do capitalismo em algumhospital livrar-se do pesadelo: vão lhebotar pernas novas, braços novos, pése mãos novinhos e vão substituir suamemória e seu olhar por fotografias,aos poucos seu cérebro será substi-tuído por um chip minúsculo e ele ver-terá lágrimas de óleo singer, até queum curto-circuito lhe mostre o mun-do que perdeu. do horror ao estuporvamos arquivando nossas relações de

amor e megabytes.Sou do tipo urbanói-de, litorâneo e esco-larizado. Lei e escre-vo para não morrerde tédio ou para dei-xar outros mundos deherança para minhas filhas. Mundoscomo os que pude ver e sentir na mi-nha infância. Sorte minha meus paisterem nascido na Serra do Baturité,Mulungu, Catolé, Trapiá, Riacho doMeio et adjacências. E o vovô tinhauma moagem na Serras e uma fazen-dinha no Canindé, Caridadade, Cama-rão, lugares bem pertinho do paraíso.Pude com isso saber das coisas domato, dos cheiros da autora, das co-res que inverno deixa quando parte enão se sabe se volta tão cedo. Bois ecavalos, jegues e cachorros, gatos egalinhas, perus e bodes, leite mungi-do, pão de milho, panqueca, jerimumamassado ao leite, coalhada, canjica,arroz doce, pamonha, fubá, mangarosa, sapoti, siriguela, estia gosto detudo isso na boca! Dizem que os ve-lhos costumam esquecer o passadohá-pouco e lembrar do passado remo-to, na infância. Antecipei um dia des-ses a lembrança de velho. Escondi-menas locas de pedra, espreitando pas-sarinhos de baladeira estirada. Pei!,lá se foi uma rolinha. Corre, que acorre-campo vem aí doida por umaperna de menino. E nós, a primarada,afobada batendo o pé na bunda de tan-to correr. A vovó gritava de longe «Chi-co, deixa de fazer medo a esses meni-nos!» Ela nem sabia que era de vera.Tudo isso escorreu sobre mim quan-do li o prefácio de Soares Feitosa parao livro de Virgílio Maia. Eita prefáciopai d’égua! Aí lembrei do que disse umdesses críticos enfastiados. Tem pre-fácio que é melhor do que a obra. Ora,um e outro são uma coisa só, senão oautor não pedia ao amigo que o apre-sentasse. E todos nós temos os nos-sos pares de prefácio e escolhemos oslivros que queremos prefaciar. Apos-to que o Virgílio Maia ficou feliz e oSoares ficou orgulhoso. Eu fiquei aquicom uma pontinha de inveja saudá-vel, que se cura sem doer nem fazermal, porque conheço os dois. Talen-tos, têm de sobra. E boa literatura étalento agregado a uma dosesinha de

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inspiração. Eita prefácio pai d’égua!GildemarCARLOS HERCULANO LOPES: CaroFeitosa, muito obrigado pelo Estudos

& Catálogos — Mãos,que li com o maior in-teresse. Precisamossempre de gente as-sim, com sua garra,para manter sempreaceso o pavio da poe-sia. O Ceará nuncafalha. Um grande

abraço e parabéns. Carlos HerculanoLopes, BH/jan/2004CARLOS NEJAR: Poeta-Amigo SoaresFeitosa: Há muito devo-te mais de uma palavra.Desde antes de nossoencontro fraterno emSalvador. Quero abra-çar-te, comovido, pelofulgor e inventividadedo teu prefácio ao admi-rável Virgílio Maia (co-nheço-o de outro livro, não deste). Oprefácio é um poema de belíssima fei-tura, com o estalo e o catálogo do ser-tão, o que fica: coração aprumado naluz. Parabéns pelo trabalho pioneiro emaravilhoso de divulgador de poesiana internet: operário inumerável dapalavra. Despertei tarde a este veícu-lo, cada dia mais útil. Foi-me uma es-pécie de retardança de progresso, aocontrário do que sou na linguagem.Aliás, mandar-te-ei alguma coisa mi-nha. Seu irmão pampeano, o CarlosNejarCIDA SEPÚLVEDA: Po-eta, recebi "Estudos eCatálogos - Mãos". Im-pressionante comovocê consegue agluti-nar tanta gente em tor-no da poesia. Para mim,que tantas vezes mesinto à deriva (enquan-to poeta), é um alento entrar em con-tato com este planeta cujo sol é você.Desejo que a editora Cururu tenhapapel tão relevante para divulgação daliteratura produzida aqui e agoraquanto o tem o Jornal da Poesia nainternet. Sua linguagem se constrói

em camadas de concreto e sonho, tra-çadas e trançadas duro. Concreto é osubstrato humano que aduba o Sonho– desejo de poetar. Dá-se então, umareação química cujo produto é umajoia delicada e complexa que embele-za o trágico e dele se extrai. Ao tentarexplorá-la, me perco em suas forma-ções rochosas e luzes multicores. Eme deleito qual criança a olhar as nu-vens que correm céu, ao léu, véus denoiva, tensões de águas vivas. Sim,poeta, escrevamos, não há outro sen-tido agora! E espero para breve um li-vro seu, não eletrônico, que se possacarregar na bolsa, ler na cama, sen-tir o corpo adensado pela mágica lin-guagem - a poesia. Carinhosamente,Cida SepulvedaCLÁUDIO AGUIAR: Meu caro SoaresFeitosa, agradeço a remessa de Estu-dos & Catálogos — Mãos, pelo que de-duzi, prefácio a livro do nosso queridoamigo Virgílio Maia. Há na sua lavraaquele rumor poético que ultrapassaa delimitação dosgêneros que pareceprescindir da forma,porque se apresen-ta pura, cristalina,gerando emoçõesambivalentes eplúrimas. Obrigadopela lembrança.Um própero 2004! Abraça-o CláudioAguiarCLEBERTON SANTOS: Caro poeta So-ares Feitosa. Saudações e muita saú-de! Espero que esta encontre-o em ple-na força criativa. Seuprefácio ao Recordel, deVirgílio Maia, Estudos &Catálogos - Mãos, é nomínimo "interessantís-simo". Para mim sooucomo um longo aboio damemória (sua/minha).Através do seu outro tex-to, Da caixa postal aoscorrós de açude - uma visita ao poetaAscendino Leite, despertei para umafutura leitura desse poeta, o Ascendi-no. No mais, os projetos continuam.Arte! Sempre. Um fraternal abraço doCleberton Santos

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CLOTILDE TAVARES:Caro amigo, Recebi seuEstudos & Catálogos —Mãos, que li enlevada.Imagine que estou es-crevendo as antigashistórias da minha fa-

mília, passadas no meio de fazendas,criação de gado, essas coisas dasquais você fala... A leitura caiu comoágua em terra seca. A delicadeza do“Ele" e do "Ela"… Obrigada por ter en-viado essa preciosidade pelo Correio.Fico sua devedora. ClotildeCRISTIANE FRANÇA:Caro Soares. Sorte?"Há de ter sorte paraabrir um livro. Abrin-do-o na página certa,no poema certo." O quehá em mim que pediuencontrar a poesia?Desafiamos por vezes a sorte... Poe-ma certo, lugar incerto... Segure ovento... Segure o vento... Minha que-rida sobrinha de pouco mais de umano, aperta os olhinhos de estrela eestica a mão pequenina: em deleiteapodera-se! Chama-se Beatriz, iguala de Dante. Recebi sua lembrança nodia de hoje. Estou segurando o vento,página 7, chama-se página 7. Pareium pouquinho para agradecer suadelicadeza em soprar na minha dire-ção «o sol, o galo, a lufada de vento...»Pensei agora como é bela a escritanão virtual. Algumas palavras, umaassinatura... O texto enviado torna-semagnífico com o desenho das letrasfeito pela tinta da caneta. Obrigada,pelo cuidado do gesto. Agora sou euquem sopra em sua direção:

Ladeando o desequilíbrio e a normalidade.Não sou feita de nenhum destes mundos.Não é a loucura, não é a adaptação que me

[inscrevem.Meu ser é a improbabilidade, a indefinição.É sentido da intuição mais pura.É a vida levando a si.A alma sem o corpo.A paixão sem a razão.O amor pelo amor.Se me fez de tal forma,Sustenta-me ou salva-me!És ou não o Deus da misericórdia?

Um abraço,Cristiane França.

DAVID MEDEIROS OLIVEIRA: CaroPoeta, Quedou-se reforçada a minhaprimeira impressão, de quando li"Adoles-cíamos": suas palavras sãoimagens, são como um roteiro. Pro-va? São várias: as ferradas nos bois, ofumacear das marcas, os catálogos, asmarcas, os "as" em times e arial... oscatálogos. Lê-lo, Feitosa, é como via-jar. Seu estilo: roteirista; suas pala-vras: movimentos... ah, os cavares erecavares de nossa vida! Visualmen-te, um detalhe que me impressionou(e como vc me impressiona!): as fo-tos. Sua foto jovem, no início, e a deVirgílio, ainda novo, mas atual, no fimdo texto. O catálogo das letras dese-nhadas no couro de outrora, e o catá-logo das grifes de hoje; as marcas nosbois, as letras no PC. Indago: basta aviagem no espaço? Não, a viagem éno tempo. Forte abraço, DavidDEISE ASSUMPÇÃO:Caro Soares Feitosa:Muito gostoso chegar emcasa e encontrar o “Jor-nal de Poesia” versãopapel. Tem outro sabor.Obrigada. Tomo a liber-dade de fazer duas considerações so-bre seu Estudos & Catálogos - Mãos,mesmo correndo o risco de ser repe-titiva frente aos inúmeros comentá-rios já elencados. A agilidade da lin-guagem atrai o leitor, mas isso é ape-nas juro sobressalente. Rende mes-mo é a crítica forte sem ser pesada,ironia lírica. O texto salta dos ferrosem brasa, com direito a um passeion’Os Sertões de Euclides e pelas ora-ções populares, para “os meninos dacidade grande”. E quando a diferençaentre os mundos se insinua e pareceestabelecer juízo de valor e envere-dar para o tão decantado saudosismodos tempos e lugares idos, essa agili-dade aproxima-os. A crítica não se fazopondo-os, mas aproximando-os ines-peradamente pela via estética. No jogoentre as marcas de bois e o times e oarial, os dois mundos colocam-se empé de igualdade. O lirismo toma contado texto num outro jogo: masculinoversus feminino. Mais uma vez é alinguagem que mostra a diferençahomem-mulher, valorizando um e ou-tro. Derruba num passe poético ma-

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chismos e feminismos. Lembrou-meEça no conto Adão e Eva no paraíso,quando a narrativa vai justamentemostrando a função do homem e damulher na formação do humano. E os“papeluchos” de oração em “letra cal-ma”? Você os escolheu para fechar orol das funções da mulher. Lembrou-me a Otacília, de Riobaldo. Bem, fi-quemos por aqui. E aguardemos no-vas surpresas como Estudos & Catá-logos - Mãos. Um abraço. DeiseDIMAS MACEDO: Meucaro Soares Feitosa.Estudos & Catálogos —Mãos é um texto paramatar. Clássico, bomgosto de marca literá-ria e de estilo. Erudito.Feito léguas de memó-rias e de crença na ancestralidadeedificante. E mais: sem reticências.DimasDOMI CHIRONGO: Estimado SoaresFeitosa, Recebi o abraço em forma de

mundo e o conviteque não sei se me-reço. Sim, o que re-cebi é mais do queum envelope do JPcom um belíssimoprefácio do livro Re-

cordel. É mais do que comentários deintelectuais que já devia conhecer(Confesso aqui a minha ignorância).É mais do que homenagem ao poetaAscendino Leite… O que recebí hádias transcende a minha imaginação.Foi por isso que demorei reagir. CaroSoares, o seu gesto de me mostrar umpouco do universo literário a que per-tence transforma-se em solidarieda-de com uma forte carga de criativida-de indescritível. Até aqui estou con-fuso. Ainda não sei se devo respon-der. Por isso me desculpe a eventualincoerência no conteúdo. É que naverdade recebí um universo em mi-nha casa. Imaginem um universo “in-vadindo” uma moradia! Estou aindaperplexo e tentando me restabelecer.Repare que sempre estive distante, asvezes electronicamente perto. Masquando o imaginado começa ser reallogo começamos a acreditar vivamen-te em nossos sonhos. E que seria da

vida sem sonhos!… Vê, caro Feitosa,o efeito que provocou no meu horizon-te idiossincrático? Não, você não podever. Olha, eu sou do País de Mashon-guezy, do Rosa-Rosa, e tantos outrosdesconhecidos do Índigo. E quando meaparece uma pessoa com tamanhaproeza a dar sinal de vida artística éalgo para ficar sem palavras! É de pes-soas com seu espírito que o mundoprecisa. É de pessoas assim que a li-teratura necessita. É da sua criativi-dade que os leitores merecem. PARA-BÉNS!!!! Saudações Literárias. DomiChirongoEDIVALDO DE JESUS TEIXEIRA:Caro Soares Feitosa. Recebi Estudos& Catálogos — Mãos com surpresa ealegria. A sua poesia insere-se, efe-tivamente, no real. É possível perce-ber que sua preocupação não se res-tringe à matéria seca dapalavra; não, supera-a,para expor com intensi-dade a vida e suas cir-cunstâncias. Agradeçopela lembrança. Envio-lhe um exemplar do meupequeno livro Das Con-siderações Inominadas.Edivaldo TexeiraEDNA MENEZES: Senti-me meio per-dida, são palavras que gritam, ecoam,mugem e cantam canariamente. Pre-ciso de tempo para absorver, sensa-ção estranha essa que estou sentin-

do, só o velho Guima(Guimarães Rosa) fezisso comigo. Esse sem-pre me faz sentir-menuma densa floresta depalavras e, nesse texto...não consigo encontrarcaminho, isso é uma"gravanha", diria Mano-

el de Barros. Acho que preciso abrirmeu horizonte de leitura... Gosto dis-so. Abraços, Edna MenezesEDUARDO DIATAHYB. DE MENEZES:Chico Feitosa dos ser-tões dos Inhamuns!Você é o demiurgo quetransforma um sim-ples prefácio num tex-

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to evocativo de nossos sertões. Bele-za que nos salva da neurose da Ver-dade, como nos ensinava Nietzsche!Abraço de felicitação para você, Virgí-lio e Côca. DiatahyEDUARDO GOMES A. MACIEL: MeuQuerido Amigo Feitosa! Foi com mui-ta alegria que recebi o envelope envi-ado por você e mais alegria aindaquando apenas percebi o conteúdo. Daívocê pode imaginar o deleite que foilê-lo novamente. Mas aquela sua fra-se acerca do defeito gravíssimo do li-vro resenhado - o de ser um só - tam-bém me lembrou dodefeito gravíssi-mo da escrita: não poder, por maiorque seja o gênio do escritor, trazer apresença, o magnetismo, a sonorida-de de personalidade tão singular comoa sua e cujo defeito reside exatamen-te aí, em ser único. Talvez isso expli-que o fato de você também conseguirreconhecer aqueles que, como você,também são únicos. Abraço saudosodo EduardoÉRIKA JANE: Receber o teu presentefoi como ouvir música clásssica emnoite insone. Tuas palavras têm chei-ro de flor de umburana e um gostinhounico de umbu! Obrigada por fortale-cer a minha esperança nas letras epalavras... E espero um dia poder com-partilhar os meus rabiscos com vocêe todos aqueles que vivem a poesia...Mais uma vez obrigada e aguardo con-tato. Erika JaneFernando MatosO IMPOSTO DO AMOR

Para o tributaristaSoares Feitosa

Quem disse que o amor tem insumos?Gera crédito, gera débito, afins, cofins, sem fins.Está inscrito n’Ela, o amor é imune.Não há medida que o modifique, o transforme,Nem que seja provisória, MP.O Amor não é imposto, nem posto; chega,achega-se,Aliás está escrito na Lei d’Ele, a maior:Amá-Lo sobre todas as coisas.O amor não é presumido, é real,Não pode ser medido, nem cobrado,Não há o que ganhar, nem o que perder,Perdões. Absolvido, remido, anistiado.Não! Parcelado, não!

Sem outros cálculos, palavra de engenheiriohá de ser íntegro, intacto.

Madrugada de 18 de fevereiro de 2004FOED CASTRO CHAMMA: Poeta So-ares Feitosa, os moços da Padaria Es-piritual seja de onde estão hão de re-gozijar-se com o veneno de cura dasEdições Cururu e os Estudos & Catá-logos - Mãos, prefácio/ensaio, que olivro de Vergílio Maia enseja, lem-brando os ferros do Bode Alado de Ari-ano Suassuna e Guilherme da Fon-te, ou Uma Burra, da Heráldica Ser-taneja, em anúncio publicado no jor-nal "A República" de Fortaleza, Cea-rá, edição de 2 de novembro de 1898,e reproduzido e no nº 51 de 0 PÃO, dostesso redator-chefe Vergílio Maia...O emaranhado de etinerário de fogãode lenha, gibões e morin-ga de sola no "catálogadas águas" dentre outrositinerários é um convitepremonitório à leiturade Recordel. Muito agra-deço "ao dono, indelével,personalíssimo" essesEstudos & Catálogos - Mãos de SoaresFeitosa. Sinceramente, FoedFRANCISCO CARVALHO: Caro poetaSoares Feitosa. Não conheço Recor-del, mas, pela saraivada de elogios detodos os lados, deve ser coisa de pri-meira. O seu prefácio. Bem, o seu pre-fácio é uma longa história deFrancis-co Carvalho erudição esculpida na epi-derme dos papiros. "Sem esforço, pode-se perceber a veracidade do que foidito e a eloqüência do que se calou".Esta frase de Luiz Tavares Júnior so-bre minha poesia aplica-se como umaluva sobre o seu arrazoado. Os depoi-mentos do que o leram me deixaramcompletamente nocauteado. Você jor-ra sabedoria grega e troiana por todosos "poros da semântica" (Jorge Tufic)do seu prefácio. Em certos momentos,chega-se a ter a impressão de que vocêescreveu um tratadosobre as origens le-gendárias de Tróia.Você há de convirque tudo isso é umoverdose para um po-eta de beira de rio,

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igual a este que lhe escreve estas maltraçadas linhas. De um simples pre-fácio sobre coisas que dizem respeitoa ferros que identificam a genealogiados bois, você faz um ensaio ecumê-nico, coisa para letrados e demiurgosque foram beber sabedoria nas fontesmais remotas da cultura universal. Ascartas e os artigos que fazem remis-são ao seu trabalho, esses escritos sãoda mesma têmpera e profundidade. Detal modo que os elogios ao livro e aodito prefácio se fundem num só nú-cleo.

Fico por aqui, caro poeta SoaresFeitosa, pois estou com receito de es-corregar nalguma casca de banana,haja vista que me sinto destituído delastros racionais para acompanhá-lonesta viagem altaneira pelos labirin-tos da transcendência. Convencido es-tou de que me acho entre aqueles quejá "não sabem fazer uma muralhainca, sem emendas, nem cimentos".Fraterno abraço do seu admirador,Francisco CarvalhoFRANCISCOFRANCIJÉSI FIRMINO:Fiquei tão maravilhado com a sua

escrita que até tive ver-gonha de ter-lhe man-dado o que escrevi. Nãoquero lhe dizer nadaenjoativo e que pareçademagogia, mas vocême proporcionou mo-mentos de muito prazercom a sua escrita. Fran-cijési

FRANCISCO JOSÉ AGUIAR MOURA:Caro Soares. O sangue latino-ameri-cano que corre em minhas veias meproporciona momentos de recorrentesaudade. Ora disto, ora daquilo, oradaqule(a). De repente me deu sauda-de do colega bentanista amigo-irmãoSoares Feitosa, agradável companhiae papo não menos, e seu Jornal dePoesia. Procuro no site da Secrel etomo um susto logo tranqüilizado peloGoogle. Lá estava, no mesmo lugar, oJornal de Poesia. Navego aleatório eencontro Um Cronômetro para pici-nas. Leio, releio, tresleio, entre em-bevecido e admirado, tentanto enten-der de quanto é capaz a imaginaçãocriadora do artista. “O artista enche o

mundo de beleza”, tira do nada o belo;o detalhe que ninguém vê, como a pôrem pé sucessivos Colombos. Nisto aArte! Vejo uma “lufada de vento ao con-trário”, “um corisco teria sido maislerdo” e “um olhar tão doce e gentilque, imediato, lancei-lhe o perdão”. Evejo que tudo é belo! No mais, comopode minha vã e comum filosofia pers-crutar os miolos geniais? Telepatia,coincidência, chegando em casa noi-tinha, vejo um envelope e, no sobres-crito eu reconheci: É ele! O poeta, ogênio que se dignou mimar este ple-bou com sua Arte e, fosse pouco, ain-da votos de feliz 2004. Tudo me dei-xando na mais comovente gratidão elisonjeado. Retratinho de bom meni-no já prenunciando o gênio futuro,emoldura Estudos & Catálogos: Mãos.Sustente meu júbilo, caro amigo! Fe-liz 2004! Deste seu colega-betanista-amigo-irmão, que (com licença deLuia Carlos Lemos) nem aprendiz deaprendiz é. Aguiar Moura.FRANCISCO MIGUEL DE MOURA:Meu caro poeta Soares Feitosa. Rece-bi seu Estudos & Catálogos - Mãos. Ex-celente depoimento poético de umaépoca e de uma lingua-gem que vai-se acaban-do entre as bugigangasda língua inglesa, ago-ra através do computa-dor (internet). Mas feliz-mente também é umagrande invenção. Vocêescreveu coisas que mefizeram lembras de mi-nha mãe. Não esqueceu das cercasdo Piauí. E os poemas? A gente seguesem vontade de imitá-los. Ao contrá-rio dos outros poetas, você não permi-te emendas; está completo. Glória anós enquanto o mundo não se acabade todo. A literatura e a linguagem...Abraços. Chico MiguelGEORGINA ALBUQUERQUE: Feitosa,Aqui estou com o ma-ravilhoso Es-tudos eCatálogos - Mãos queme enviou. Nele, umgarotinho de óculos,expressão pra lá de in-teligente, me convida (ou impinge?): “Vem!...

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desestrutura! (e re-estrutura meio àperplexidade...)”. A regionalidade daleitura que ora faço, aos poucos vaidando mostra de universalidade meioà vivência anárquica da minha gran-de metrópole. Não temos acesso aogado, mas fica constatada a possibili-dade de “marcar” as nossas produçõescom ferro em brasa. Não temos galospor aqui, mas persistem os gritos quetambém tecem a manhã. Basta quehaja paciência para absorver o dife-rente através de iniciativas culturaiscomo a sua, que tanto ampliam os nos-sos horizontes criativo e lingüístico.Um beijo carinhoso. Maria GeorginaAlbuquerque. Em tempo: Desejo aoVirgílio Maia muito sucesso com o seu“Recordel”, que já dispõe de tão belo einstigante prefácio.GILBERTO ALVES JR: Poeta Soares,Permita-me fazer uma leitura menosteórica do “papé”. Além disso, vale di-zer que é a leitura de alguém que nãotem saudade de todas as coisas quevocê narrou, mas, talvez, vontade deconhecê-las algum dia. Alguém da ci-dade, muito da cidade. Até demais. Asmãos, a forma rústica e ao mesmotempo doce como elas são desenha-das nas suas linhas, e nas entreli-nhas, ficam na mente. O couro do boi,meu avô tinha um como tapete nasala, eu me lembro bem disso. E é oúnico contato que eu ja tive com cou-ro de boi. Mas o universo do qual vocêfala é, para mim, outro mundo, o quetorna a obra muito mais interessan-te. Vai sendo uma descoberta atrás daoutra. O único contato com queijo queeu já tive: vê-lo no supermercado, em-balado. Com o leite, em caixinhas lon-ga-vida. A impressão que dá é que agente esquece que o leite vem davaca, que alguém cuida da vaca, quea va-ca come pasto e tudo isso no cam-po. A impressão que dá é que as cai-xas de leite dão em arvores, e são co-lhidas e levadas para o supermerca-do. As duas histórias seriam iguaispara mim; eu nunca vi uma vaca dan-do leite, tanto quanto nunca vi umaarvore de leite longa-vida.Assim, esseuniverso novo e diferente vai sendoaberto, jogado na minha cara, de umaforma que causa muita estranheza.E beleza! Eu li seu “papé” no trepidar

do ônibus, na avenida Marginal do sujoTietê, não numa rede às margens dealgum rio que corra devagar e limpo.Assim, minha leitura é bem diferen-te da de alguém que passou pelas ex-periências que você conta. E se quersaber: achei tudo muito lindo. Umabraço. Gilberto Jr [da cidade]GIZELDA MORAIS:Caro Soares, fui agra-ciada com o seu textoEstudos & Catálogos -Mãos, que eu encon-trei em casa na voltade uma viagem de co-meço de ano. Foi otexto mais lindo, mais bem plasma-do, que li ultimamente. A princípiopensei que fosse um conto, só depoisvi que era um prefácio. É mais queum prefácio. Ah, se tivéssemos tan-tos prefácios assim! Você precisa es-crever um romance sobre o tema. Eas apreciações? Como temos genteboa neste Nordeste, neste país! Leveiseu texto para o meu grupo literário,foi sucesso. Um forte abraço com to-das as louvações. Gizelda MoraisGLÁUCIA LEMOS: Quesaudade, meu amigo,dize-mos nós, seus ami-gos da Bahia, por onde opoeta passou rapidinhoe deixou um cheiro gos-toso de ami-zade. Feliz-mente faz chegar-nos, de quando emquando, um fruto de sua sensi-bilida-de. Bem aventurados os que o mere-cem! Cururu é bicho nordestino, bi-cho do mato mesmo, batráquio quegosta de lagoa. O ferro e concreto dasterras do Sul, o diesel e o neon e osareais salgados das “beaches” sulis-tas não têm cururu. Bem vindas asEdições Cururu! O bicho não mora lá,mas as Edições viajam, sim. E o pre-fácio, mas que prefácio, menino?! Otexto todo é miolo prin-cipal, razão deser de publicação à parte, esse que mefez revisitar um cheiro de terra mo-lhada no receber um pé-d’água emcima da quentura do chão. Resgatou-me da infância o can-tar da chuva no-turna em telhado de telha-vã feita debarro. Conto que só quem conhece équem viveu em cida-de do Nordeste,

Desde Portugal, exactamente de Viana do Alente, o abraço afectuoso e agradecido

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que a chuva não canta assim em cimade cobertura de laje. O texto, seu Soa-res, é mais uma impressão digital dopoeta Soares Feitosa. Um coração nor-destino tem o formato do mapa de todaa sua região. Altera a anatomia. Quesaudade me deu de um tre-cho da in-fância vivido em uma capital maisnordestina que esta capital da Bahiaonde nasci e que amo extre-mamen-te! Quem me dera retornar à Paságar-da onde não sou amiga do rei, masmereço andar pelas ruas sem o deverde me cuidar de uma possível armame ameaçando as costelas. A gentecansa desse universo de portões e gra-des, e da paisagem rígida de espigõesque tapam o sol e escondem as águasda baía. E pensa no mato. Por isso, umviva! Aos aboios das manhãzinhas edos entardeceres ecoando em distân-cias imensu-ráveis... apenas ecoan-do. Viva! ao poeta que vive tão inten-samente essa sua raiz e nos faz evo-car um mundo que talvez nem existamais. E ao “Francisquinho de dezanos”, que até dá vontade de carregarno colo. O instinto materno é aindamais forte que raiz; privilégio femini-no ou... sentença de servidão. Penseiem retribuir o envio do seu texto. Na-turalmente haveria de ser com umtexto meu. Envio-lhe Luaral, um delí-rio meu. Talvez uma prosa poéticacomo disse Mário Calmon. Nada nor-destino, ao contrário, de uma univer-salidade que impossível, por inalcan-çável, filho da febre em que deliramos.E um abraço, bem abração.Gláucia LemosGRAÇA GRAÚNA: Poet'amigo SoaresFeitosa. Congratulações pelo Estados& Catálogos — Mãos e pela fortuna crí-tica em torno do seu prefácio e da po-esia do Virgílio Maia. Concordo com oleitor Adail Sobral que fala de Espe-rança à luz do seu texto. Pois bem,apesar destes tempos nus, é coisabonita de ver e sentir a Esperança quebrota de uma tríade poética/afetiva/semiótica, particularmente nas pas-sagens em que você expressa admi-ração ao poeta Virgílio e à desenhistaSocorro Torquato - Côca. Gosto dascoisas que você rein-venta para me-lhorar o mundo; coisas de quem car-

rega no nome Ars Poética; que o digaConceição Paranhos: "Você está cres-cendo mais do que um jequitibá".Também pergunto: cadê o livro do Vir-gílio? Nem li Recordel, mas pela lei-tura de Hora Uma que ilustra o seuprefácio, dá mesmo vontade de rece-ber o sol, a aurora e o café quentinhoe forte da caatinga que nos dá forçano amor e na guerra. Seu Catálogoschega em boa hora. Acabo de receberum convite de Sébastien Joachimpara participar em junho próximo, naUFFPE, do seminário A cidade o cam-po: cidadania e nomadismo. Confor-me Sébastien, nesse evento será dadauma atenção especial ao índio (autore personagem) e aos poetas — dois em-blemas do nomadismo. Abordareiquestões relacionadas à identidade napoesia indígena e brasileira. Citareiseu Catá-logos. Final de dezembro, depassagem pela região central do Bra-sil, vi muitas daquelas marcas nasquais "aprendemos a ler". É exata-mente como você diz: "marca de gado,meu jovem, um ferro em brasa, o boi,ali subjugado; [um] olor de carne-cou-ro, chiante, queimante; uns esturrosde dor". No interior de Goiás conhecio Rio das Por-teiras onde ecoam es-ses esturros, em Tropas e boiadas, deCarvalho Ramos. Fico por aqui, car-regando saudades dos sertões. Dêsempre notícias a estasua amiga, GraçaGraúna.ILDÁSIO TAVARES. OPrefácio de Recordel:Impressiona à primei-ra vista o texto do pre-fácio de Recordel, obrado escritor Virgílo Maia, pela sua in-teireza de linguagem, engendrando oque podíamos chamar de uma sadiaorganicidade do discurso literário —os signos, os símbolos, a imagísticaguardam entre si uma estrita coerên-cia semântica, traçando o quadro ge-ral de uma expressividade nordesti-na, rural (basicamente) forte e que de-manda uma acurada percepção paraque o leitor se deixe impregnar pelostons, entretons e sentido geral do tex-to, captando a inter-relação precisa dotexto com o contexto. Acresce que o

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texto é bifronte. Por um lado, cumprecom perícia sua missão de portal, deum saber prévio a outro saber: a ou-tro fazer; de prefácio. O texto de Soa-res Feitosa pode ser considerado comouma peça literária individual, um en-saio “tout court”. Nisto, o autor esgri-me sua inteligência no profundo sen-tido de um ato de compreensão, aotempo em que faz uso de todo seu po-tencial de arte-sania para costurar oseu discurso, estribado, sem duvida-mente, numa aguda perceptibilidadedos signos que maneja, porque bemos conhece, e os distribui com plenaconsciência do seu lugar e de sua sig-nificabilidade no tabuleiro de uma li-teratura nordestina íntegra — come-cei falando em inteireza e.vejam, vima terminar neste território conceitu-al. É isto, Soares Feitosa, um escritorpor inteiro. Ildásio TavaresJACKSON DA SILVA LIMA: Meu caroSoares Feitosa, Recebi, há dias, Es-tudos & Catálogos – Mãos (Jornal dePoesia, Edições Cururu), que veio con-firmar o que a profª Gizelda Morais mehavia falado sobre o seu trabalho. Ex-celente material de divulgação literá-ria, que encerra um esforço culturaldos mais louváveis: dá ao leitor, nabandeja, um painel variado de notíci-as literárias e estudos críticos sinté-ticos sobre escritores conterrâneosespalhados por todas as partes do ter-ritório nacional, além de fornecer umexpressivo álbum iconográfico. É pre-ciso muita força de vontade e despren-dimento para realizar uma tarefa detal monta. Estou impressionado. Meusparabéns, e obrigado. Do seu maisnovo admirador, Jackson da SilvaLima.JAUMIR VALENÇA: Olá, Francisco![...] Bem, tudo isto para dizer que de-morei a ler a sua apostila mas final-mente li. E o Catálogo parece um pre-

sente que chega as-sim inespe-rado, dotipo "a vizinha man-dou este pedaço debolo quentinho…".Uma surpresa agra-dável, obrigado pelopresente. O Coronel ébastante generoso

em deixar os seus cupinchas tiraremuma lasquinha da coisa toda e entra-rem na brincadeira. "O catálogo éisto…", o catálogo é aquilo…". É, sim.Há uma certa ternura que permeia opensamento ao ler aquelas páginas;vêm-me à cabeça a frase "nossos pe-quenos sistemas têm seus dias". Lem-bro daquela letra do Renato Russo, quediz "quero minha nação soberana,com espaço, nobreza e descanso". Umabraço. JaumirJERÔNIMO FAGUNDES DE SOUZA:Caríssimo Poeta. Jánão bastava o doce desangue de porco. Ago-ra cantas o mel e afarinha. Passaste doslimites. Penso que,no futuro, lerei teusversos sobre as delí-cias do jiló. Conse-gues transformar o asqueroso em lí-rico. O revoltante em sublime. Tenso poder da palavra, de que não dispo-nho. E, nem por isso, me farás comerpratos tão exóticos. Isso posso jurar.Mel me lembra võmito, de abelha. Afarinha ataca essas paredes, já tão fra-quinhas, de meu estômago. De qual-quer forma, lembrei de minha infân-cia. Ilha de Floripa, 1975. A mãe pre-parando o caldo de peixe e a farinha.O pirão. O caldo de feijão e a farinhade rõsca. O pirão. A cola de farinha detrigo. As figurinhas Copa 70. O pião.O Bumba-meu-Boi. O Bal e a Aninha.O bonequinho do Zorro. Nossas infân-cias, pobres, se tocam em muitos sen-tidos. No Ceará, Floripa ou no ABC...Jerônimo.JON TONUCCI: Caro senhor Feitosa,sou-lhe muito grato por haver recebi-do em casa, durante um dia costu-meiro qualquer, um pacote de senti-mentos tão belos como os que o se-nhor me enviou. Um verdadeiro apa-nhado da alma: lembranças dos finaisde semana que passava na fazenda domeu avô. Toda a produção honra a pa-lavra escrita, magistral e tocante.Obrigado por me proporcionar momen-tos de recanto e fuga: como dizia Gui-marães Rosa, é nas coisas pequenasque Deus se esconde. Abraços de Mi-nas, Jon Tonucci.

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JORGE TUFIC: Recebi,ainda sob o foguetóriode ontem, o Jornal dePoesia, contendo a sagaintrodutório de umaoutra saga, esta de Vir-gílio Maia, encimada

pelo título Recordel. Agradeço-lhe portudo. Você tem linguagem própria, cul-tura sertaneja visível, ensinada comapuro. Na paisagem urbana, eu nãosei recortar o Vigílio sem ter na men-te um sertão de paletó e gravata. Nemde ver Soares Feitosa sem lembrar umpeão da caatinga educado em Paris.Com todo o respeito, portanto, eu mecurvo diante de ambos como quem securva a um remanescente pajé daságuas pretas, guardador da sabençaamazônica. Meu grande abraço. Jor-ge TuficJOSÉ AUGUSTO DE CARVALHO:Francisco José Soares Feitosa é umpoeta contemporâneo, brasileiro denascimento, poeta de toda a LínguaPortuguesa. Falar de Soares Feitosa,quer como poeta, quer como divulga-dor de outros poetas ou candidatos apoetas, é falar da Poesia. Ainda queseja um lugar comum, aqui digo quea melhor maneira de falar de SoaresFeitosa é ler a sua poesia, é amar aPoesia. O Brasil, a grande Pátria Irmãdeste Portugal já vestido das neves daanciania, foi e será a terra prometidados portugueses deserdados e verga-dos às intempéries de uma pátriaexausta e sempre adiada no objectivode se cumprir. O povo português foi àIndía, mas não provou as especiari-as; foi ao Brasil, mas nunca comprouo pão com o ouro. Esta é a verdade. JáJoão de Barros, nas suas décadas, noséculo XVI, lastimava haver nas ruasde Goa portugueses estendendo a mãoà caridade. Portugal foi sempre assim!Como disse o poeta José Duro, portu-guês-alentejano como eu, falecido naúltima década do século XIX, «o ourode um palácio é a fome de um case-bre». A história de um povo foi sem-pre a história da sua classe possiden-te. Até quando? Como sucede com amaioria dos portugueses, palpita emmim uma saudade de África, uma sau-dade do Brasil, uma saudade do mun-do além... Dos meus antepassados pró-

ximos, há descendentes em Moçam-bique e no Brasil. Por lá tive tios e te-nhos primos que nãoconheço e de quemnem sei o rasto.

Vim ao mundo nadécada de trinta. Mor-ria-se em Espanha, nadita Guerra Civil, ondemataram os sonhos dePicasso, de Lorca, deAlberti, de Dolores Ibar-ruri, e onde vilipendiaram a vontadee a dignidade do povo espanhol. Na dé-cada seguinte, tive o privilégio de co-nhecer as primeiras obras da Litera-tura Brasileira. Na minha estante,conservo e releio, até hoje, um poucodo que se escreve no Brasil. Recente-mente, já com a disponibilidade da In-ternet, tive e tenho também o privi-légio de ler diariamente os tentamesliterários de tanta gente e de convi-ver virtualmente com alguma dessamesma gente. E foi pela Internet queconheci o Poeta Soares Feitosa e aseu Jornal de Poesia. Em Janeiro úl-timo, exactamente no dia 24, SoaresFeitosa presenteou-me com o seu tra-balho «Mãos». É-me apresentado comoum prefácio do livro «Recordel», de Vir-gílio Maia, autor que, indelizmente,não conheço, mas espero vir a conhe-cer quando tiver o prazer de ler a suaobra. «Mãos» é um trabalho que nãopode nem deve ficar subordinado aooutro que é «Recordel». E não pode, digoeu, porque tem vida própria, porquedeve ter vida própria. E ao ousar afir-mar isto, outrossim afirmo que quemadquirir «Recordel», necessariamen-te adquirirá duas outras em um só vo-lume: «Mãos» e «Recordel». Ao ler e re-ler «Mãos», senti as veias do BrasilNordestino, vivo e perene, afirmandouma presença, hoje, do que, ontem,eu lera, em Guimarães Rosa, Lins doRego, Amado, etc. Obrigado amigoFrancisco José. (24.3.2004)JOSÉ BATISTA DE LIMA: Dom Soa-res Feitosa. Recebiseus Estudos casadoscom os Catálogos masprincipalmente asMãos. Sempre que vouà casa do meu avô, en-tro em contato com as

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mãos dele, que permanecem latejan-do nas cadeiras, na mesa e nas por-tas. Li seu trabalho como quem bebeum copo de garapa de cana e depoislambe os beiços. O seu texto não deu“raposa”! “Raposa” é uma gastura quea gente sente quando bebe muita ga-rapa sem colocar limão. Mas é preci-so ter cuidado com limão, pois se cairum pingo que seja no parol azeda tudoe não dá rapadura que preste.Sim, “xi-xilar” é fal-tar fogo na fornalha. Vocêé o poeta que não “xixila”. José Batis-ta de LimaJOSÉ CARLOS A. BRITO: O poema-prosa, ou prosa poé-tica “Estudos & Catá-logos – Mãos”, nãome levou tanto –como eu previa apósa primeira leitura –à procura das razõesemotivas que teriammobilizado o escritora um diálogo da almacom arquétipos derecordações passadas. A interpretaçãopoderia iniciar-se, atribuindo-lhe,igualmente, uma imagem de confli-tos simbólicos vindos do próprio mun-do interior do poeta. E acrescentaría-mos a isso, um funcionamento, tam-bém, como imagem coletiva. Ou ima-gem primordial, que solicita explica-ção no presente, isto é, o poeta recla-ma porque foi violentado junto comaquilo, pois, se sua alma é de outranatureza. À primeira vista soa comoreprodução mitológica de torturas, deimolação, em animais (ou desejosaniquilados, imolados a um deus depoder egoísta?) que seriam submeti-dos à posse desse ego (o “eu” dilatadoe inflamado, sem a mediação doamor). Parecem ser, os animais sub-metidos, reprodução simbolizada denosso ser repartido, desde épocas doinicio de vida no mundo. Mas tudopassado no âmbito das imagens cria-das pelo inconsciente vivo, de hoje, nareclamação dura (ou lírico-dura) dopoeta. Será que sua obra pretenderesgatar a parte da alma roubada? Noentanto, a consciência do poeta vaitransformando cada impulso desme-dido da reclamação de alma (ou do fer-ro em brasa) em expressões simbóli-

cas dessa tortura que fazemos às ima-gens representativas de nossa própriavida, através da escravidão dos bezer-ros e da energia reprimida, compen-sada no ferrar (nossos próprios dese-jos) na parte dos outros corpos. E serámais ameno o símbolo, do poeta, doque a marca de fogo na pele do ani-mal, que é nossa parte separada, apartir de certo momento da evolução?As letras cravadas com o ferro-em-bra-sa na carne dos bezerros são no poe-ma o símbolo da nossa palavra engoli-da, para dentro, e não expressada comofruto da liberdade (ou da liberaçãoenergética da libido)? Assim é essaação coletiva de compor letras ( A, Q,S, etc.) marca de fogo avassaladorasufocante da individualidade criativae se afoga no coletivo torturante, da-quele que, sem criar o poema, preci-sa reproduzir essa energia ao inver-so – transformada em poder – e trans-ferida no sangue coalhado da parte daalma submersa; o animal. Nossa par-te primordial. Trata-se de uma arteao contrário; a arte de submeter o re-banho do Céu, que precisa pedir em-prestado ao Demônio seu fogo criati-vo, para negá-lo em seguida, ao im-pedir a vida livre do animal rebanha-do. O poeta, no entanto, tenta recri-ar-se, desentalando de sua memória(tão marcada em brasa pertencente)as atrocidades da mesmice coletiva(que tanto mata animais, como ju-deus, iraquianos, vietnamitas, po-bres, etc.) para limpar a alma dessasimagens das quais todos nós somoscúmplices. E que atordoam os senti-mentos do poeta. Na forma literáriaem que procura a composição do belo,com novas letras redentoras; no lu-gar do “ferro-quente-com-sabugo-de-milho”, o poeta, tenta libertar-se. É in-teressante observar que a vaca temuma simbologia extraordinária na fi-losofia hindu, por ter sido ela a gera-dora do mundo e, portanto pode-se atri-buir-lhe a função feminina de grandemãe. Lembrando Jung sobre o assun-to, quando a energia está acumuladacorrespondente à concentração espe-cifica de libido, na expressão popular“estou de saco cheio” ou “não agüen-to mais”, “estou a ponto de transbor-dar” fazendo refluir a libido dos esta-dos psíquicos, dos contrastes. “a cisão

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da percepção sensível e a extinção doconteúdo da consciência conduzem vi-olentamente a um transbordamentoda própria consciência” (...) “tonificamos conteúdos do inconsciente, querdizer, as imagens primordiais que, porsua universalidade e sua idade ilimi-tada, revestem-se de um caráter cós-mico e sobre-humano.”(...) “ a idéia deum principio universal criador é umapercepção do ser vivo no próprio ho-mem”.Para Jung esse conceito é concebidoabstratamente como sendo energia,e assim fica implícito também o con-ceito de contraste, pois, não haveráfluência energética sem pólos opos-tos. E dessa forma o conceito de con-traste é inerente ao conceito de libi-do. Jung encontra essa associação delibido e contraste no símbolo de Brah-man, da filosofia hindu, como forçacriadora pré-cósmica “resolvida noscontrastes de sexo”, citando um tre-cho num hino de Rigveda, onde apa-rece a vaca como um dos pólos do con-traste.Existe uma palavra fundamental nasimbologia hindu: Prajâpati, criador domundo. Para Jung é o principio cria-dor cósmico = libido, que “às criatu-ras, depois de havê-las criado, impreg-nou de amor”, na seqüência, a gran-deza de Prajâpati o estimulou a sacri-ficar-se, e disso dividiu-se em sol evento. O sacrifício que supõe renun-cia transforma-se em nova forma delibido (vital), a criação do sol e o ven-to.Prajâpati, também se dividiu em tou-ro e vaca e nos princípios manas (en-tendimento) e Vâc (verbo). Um dos vâcera seu eu e o outro vâc era seu se-gundo (alter ego). Um vâc a quem cha-mou cridor, libertou-o (transcendên-cia dos espaços) para que enchesse omundo de vida. Assim concluímos, aocriarmos o símbolo mórbido que escra-viza as vacas, seremos a anti nature-za, própria da barbárie, que mata o ver-bo (vâc), e nesse caso reafirma-se oseguinte pensamento de Jung: “a nos-sa suficiência ocidental, perante asconcepções hindus, revela a nossaessência bárbara”. Mas isto tambémserve de pólo extremo para um renas-cimento simbólico, pelo caminho domeio, a transcendência do objeto

novo; a obra de arte, ou o próprio re-nascimento. Quantos já não tivemosa intuição da alma para trilhar essecaminho? O poeta neste caso, comsua tentativa de renovar o verbo, éuma confirmação disso. E não esque-çamos esta frase do Atharvaveda,“Oferecendo a vaca aos Brahmanesconquistam-se todos os mundos...”Lembrei-me, por associação de ima-gem, que também intuí esse caminho,através de um soneto meu, onde ten-tei traduzir o mesmo sentimento.Igualmente, o ato de “lubricamentematávamos o porco” (...) “as mãos via-jando no quente das vísceras” – comoeu também assisti meus parentes fa-zerem – dizê-lo em poesia faz-nos, domesmo modo, limpar a alma para re-conciliar-nos com a parte de nossosentimento, assassinado genetica-mente quando violentávamos partesde nosso ser, nessas carnes sublimesda natureza. A natureza da qual umdia fizemos parte carnal e coesa (oPrajâpati). Evidentemente, como vive-mos a carência do ser completo, quefomos em épocas ancestrais, hoje,assumir as partes, por um processoamoroso, significaria recuperar nos-sa “alma – grande” ou a “grande-mãe-cósmica”, isto é, a vaca. E ela preten-de salvar-se com vida, através daenergia transbordada para o poema.Por intermédio de vâc, o transborda-mento poderá tonificar os conteúdosdo inconsciente, revestidos de cará-ter cósmico e sobre-humano. Por ou-tro lado o Céu, que concebemos, sóentendeu de castigos, disciplinando aespécie, tanto em matadouro comoem campos de batalha, onde se estra-çalha com bombas a seres humanos,essa outra versão dos animais. Essesseres, também domesticados comuma “cultura” de ferro-em-brasa. Tudoporque se insiste em reprimir a libi-do, o fogo sedutor do Daimon. Mas atra-vés da palavra (vâc = verbo) lírica, oCéu compreenderá que a chama vin-da do Inferno ao transformar-se empoema será manjar mais delicioso doque carne chamuscada, ou nossaalma presa. É assim fui convivendopela linguagem simbólica entendida(manas) no “Estudo & Catálogos –Mãos”, de Soares Feitosa. José Car-los A. Brito.

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JÚLIO RODRIGUES CORREIA. Caropoeta, Recebi Estudos&Catálogos-Mãos. Adorei. Manaus noite alvaquando me foi entregue pelo porteirodo condomínio. O prefácio de Recor-

del, sincera-mente é de umac o n s t r u ç ã obelíssima.Trazcheiro de terra.Pode-se dizerque é um prefá-cio telúrico.Achei vestígiosde Guimarães

Rosa e de Paulo Jacob, um escritoramazônico, hoje hóspede da GrandeLuz. No poema Nunca direi que te amovocê envereda pela mesma trilha deestesia do Architetura. Belíssimo.Poeta, vou continuar lendo e relendoesses opúsculos com muita sofregui-dão. Parabéns, irmão.Continue suacaminhada pelos caminhos e alame-das coruscantes da poesia e da prosa.Adorei Hanna.LAURO MARQUES: Caro Feitosa. Acu-so o recebimento do pri-meiríssimorebento das Edições Cururu. Pausa.Parêntesis. Vou também repisar natecla da memória. Lembro de ter vis-to, no quintal de minha casa, em Mos-soró, RN, no tempo da minha infância,uma cobra prestes a engolir um, achoque era, cururu. Afastamos, eu, comajuda de familiares, a cobra a tempo.Assim espero. Essa morreu, matamos,com certeza. O cururu eu não sei.Lembro dele parado lá, respirando.Mais não lembro porque na época ti-nha mais o que fazer do que ficar cui-

dando da saúde do bi-cho. Já bastava termatado a maldita. Fe-cha parêntesis. Obri-gadíssimo pelo enviodo jornal impresso.Mantenha-me infor-mado de prossegui-mentos idem de textos

ibidem. Escrevo rápido, como um cu-ruru on line, desculpe a falta de tem-po, mas queria lhe escrever logo. Ma-tou-me a saudade da língua nordesti-na. E ativou memórias como a dochouriço (sic). A iguaria esteve pre-

sente na minha casa, trazida pelo pai,da feira, mas foi recusada por todos,menos o mesmo. O sertanejo é antesde tudo um punk. Se bem que meupai era brejeiro. Encerro por enquan-to. Saudações brejeiras e campi-nei-ras de um paraibano-potiguar em SãoPaulo. E um abraço no primo Maia. Epor aí vai. Outro abraço do amigo Lau-roLÊDO IVO: Meu caro poeta e amigoSoares Feitosa.Aplaudi, num silênciointimamente rumo-roso, o seu primorosoensaio sobre muitasartes: a de ferrar ca-valos e bois, a de fa-zer cercas; a de tirarleite de vaca ou fazerqueijo; a arte de ver e ler as águas...E obervar formigueiros. Curiosamen-te, em minha poesia, há muitas cer-cas, um ferrador de cavalos, águas echuvas; e em minha prosa há muitacomida, de modo que me senti emcasa lendo o seu texto instigante. Um2004 eletrônico e planetário, a servi-ço da poesia, é o que lhe deseja o seuamigo, Lêdo Ivo.LEONARDO ALDROVANDI: Caro So-ares Feitosa, foi com imensa surpre-sa e enorme fascínio que recebi seustextos. Para tornar a poesia algo maisabragente é preciso organizar os es-forços desse modo. Eu, um típico pau-listano de classe média, nada conhe-ço deste universo tão forte e coloridodo Norte e, no entanto, a cada descri-ção, a cada palavra lida, o sangue fri-bilava levemente. Estava acostuma-do com aqueles poetas que circundamo MASP procurando algum interessenos passantes que invevitavelmenteos consideram extremamente enfado-nhos ao se apresentar. Poetas que ce-lebram um certo desejo franciscanode trocar suas palavras pelas miga-lhas executivas de nossos motoresmais violentos. Nada contra a atitu-de, mas seu gesto prova mais uma vezque poesia é essencialmente um atode doação da vida. Um grande abraço,Leonardo Aldrovandi

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LEONTINO FILHO: Estimado amigoSoares Feitosa, felicidades. Recebi,sim, na quarta-feira, ESTUDOS &CATÁLOGOS - MÃOS. De pronto, agra-deço-lhe pela gentileza da remessa.Li, com entusiasmo e interesse, o seuprecioso prefácio (quase-livro-ensaio-total) para RECORDEL, obra do poetaVir-gílio Maia, autor que muito admi-

ro, pelo talento e pelagrande inventivida-de artística. Seu tex-to MÃOS, em brevís-simas palavras, nosoferece o pão aben-çoado da poesia, enos aponta para amaior das utopias: oencontro do sertãocom o mar, encontro

esse que desnudará toda a beleza douniverso. Parabéns pela esmerada po-esia que emana das páginas de MÃOS,um verdadeiro tratado de amor à arte.Louvo, também, o nascimento das Edi-ções Cururu, que outros saltos lumi-nosos aportem por estas redon-dezas.Mais uma vez, muito grato pelo cari-nho da remessa. Dê notícias, sempreque puder. Receba o abraço fraternodo amigo Leontino FilhoLUCIANO TOSTA: Caro Soares, depoisde parado no meu escritório durantealguns dias, finalmente li o tal “papé”.Li e gostei muito. Gostei de como vocêcompõe a realidade através da frag-mentação, como conecta o tempo, apaisagem e a linguagem, e de comotira-se vida puríssima como o ar des-te teu Ceará ou da minha Bahia des-tas linhas. Aí está um Brasil ainda

desconhecido de mui-tos; um Brasil que temmemória com cheiro,gosto, cor e força, atépara “ferrar”. Eu, queescrevo daqui da “es-tranja”, duma América

que não e “nuestra”, como queria ocubano José Marti, muito menos “nos-sa”, como, iludidos, pensam algunsdos muitos brasileiros que hoje habi-tam esta Nova Inglaterra onde estou,mas sempre “deles”, senti saudade decasa, do meu Brasil. Senti no seu tex-to tambem uma certa inquietação elembrei-me de Pessoa, mas não o do

Guarda-dor de Rebanhos, pois seus be-zerros, cavalos, burros e jumentos,mesmo “dóceis”, tem a vitalidade in-superavel de nossa terra e nosso povo,mas sim do seu tardio e fragmentado“Livro do Dessassossego”. Então, de-pois deste prefácio, que venha o restoda sua angústia, saudade, história! Eserá bem-vindo! Abracos. LucianoTostaLUCIUS MATOS: Por que não dizer?Muito obrigado! Fiquei contente aosaber que chegou. Li, mas nem todosos comentários. Fui até o fim. Pen-sei: será que ele é rico?! Todos quequerem participar do Jornal de Poe-sia recebem um ‘troço’ desses? As fo-tos estão coloridas! Na semana pas-sada, quantas edições foram envia-das? Não seria prático tê-las on-line?Com certeza! Mas que palavras pode-ria escolher para transfigurar o quesenti quando chegou? E o meu nome,na capa, escrito a mão, de tinta pre-ta? Não. Se fosse on-line, não! Con-fesso: nem li o prefácio! Abri bem nomeio e comecei a ler. Assustei-me.Fotos?! Cadê os... os... os poemas?! Fuipara o fim. Continuei lendo. Acho quepeguei a conversa pelo meio! Tive quevoltar para a página 1 e só então per-ceber que era um prefácio. Se não fos-sem a nota e os vários comentários,imaginaria um trecho de algum livroseu. Sou simples e humilde nos mo-dos. Não tenho o dom da escrita, daspalavras. Mas espero que entenda aminha ignorância: se for um prefácio,um chamariz, será julgado bom seconseguir despertar o desejo de quemlê. Cabe ao leitor julgar a obra. Ele nãogostará de tudo, ‘ou não’, como dizemos sábios baianos. Quase todos comen-tam o seu prefácio como uma obra dearte, desejando ler o tal livro. Pela re-ceptividade, talvez, deseje agora lan-çar um livro com outros prefáciosseus. Iniciei o meu argumento comum se, a lógica exige um então. Sefor um prefácio, um chamariz... En-tão podem os prefácios serem tão co-nhecidos e comentados quanto os li-vros que os hospedam? Se sim: quebeleza! Quando vai sair?!!! Se não:Este programa executou uma opera-ção ilegal e será fechado. Se o proble-ma persistir, entre em contato com o

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seu fornecedor. Muito obrigado poresta edição! Lúcius Matos.LUIZ COSTA DE LUCCA SILVA: Poe-ta Feitosa, Estudos & Catálogos -Mãos: Muitíssimo agradecido pelo con-teúdo poético que tive a satisfação dereceber ontem. Ha no texto um exem-plo clássico do estilo da prosa poéticanordestina, na sua expressão mais au-

têntica, naquelegênero que iden-tifica a verve doNordeste pelasua maneira ca-racterística, sejano verso, seja naprosa "verseja-da", que nos dáuma impres-

são direta de uma conversa à sombrade alguma árvore de jenipapo, ou nacalma de algum alpendre imperial dasregiões mais brasileiras deste Brasil.Sim porque, de um modo ou de outro,mais ou menos, absoluta ou relativa-mente, tenho a sensação de que o Nor-deste e Minas Gerais são os ambien-tes em que já se pode sentir um Bra-sil definido, em todos os aspectos. Umgrande abraço e, mais uma vez, mui-to obrigado! de LuccaLUIZ PAULO SANTANA: Poeta SoaresFeitosa: "Ao dono, indelegável, perso-na-líssimo, o direito de ferrar." Sim.E você o faz com a marca inconfundí-vel de seu estilo e de seu talento. Ca-talogando catálogos que catalisam oprocesso alquímico da leitura, cata-pultando o leitor para dentro do livroque, pela pequena amostra, que pena,dá a pista de outra talentosa ferrada.

A estrofe citada, do po-ema As Horas do Dia,deixou-me em grandeexpectativa: pareceu-me uma abertu-ra, delicada e premoni-tória preparação para a

grande aventura poética que seseguirá. Recordel. Você certamentenos dirá onde e como conseguir olivro.Grande abraço. Luiz Paulo San-tanaLUIZIR DE OLIVEIRA: Amigo Soares(acho que já posso chamá-lo assim,

pois nos une omesmo amorpela língua e pe-las expressões,poéticas, sincré-ticas, prosopo-péicas das nos-sas emoções, não é mesmo?) Recebios “papé” que você ficou de enviar. Nãoposso expressar suficientemente aminha satisfação ao ler Mãos. E vocêainda o chama de prefácio?! É umapeça literária da mais alta qualidade,como raramente tenho tido a oportu-nidade de ler em dias de aridez espi-ritual como os que temos vivido. Suaspalavras não foram escritas para se-rem apenas lidas, mas sorvidas comraro deleite. elas têm cor, cheiro, sa-bor. Trazem as sensações à flor dapele. Brincam com elas. Tratam-nascom afeição. Você respeita o seu lei-tor-confidente-amigo. Não faz conces-sões ao mau gosto, não é gratuito, nãovisa apenas ao agradar. e consegue,com mãos de mestre, conduzi-lo pe-las sendas sempre gratificantes davida do espírito. Lamento estar tão dis-tante geograficamente. Senão, acaba-ria por me infiltrar nas suas reuni-ões, para compartilhar de alguns mo-mentos junto a você e outros amigos.O Arthur da Távola costuma encerrarseus programas dizendo que músicaé vida espiritual. E que tem vida espi-ritual nunca está sozinho. Concordocom ele. Mas quando é possível com-partilhá-lha com espíritos afins, o re-sultado é sempre mais proveitoso!Agradeço muitíssimo sua atenção. Es-pero poder continuar recebendo tudoo que você tiver pra enviar!!! Abraçosafetuosos. Luizir de OliveiraMAJELA COLARES: Querido Soares,que surpresa por essa bela e tão ori-ginalíssima edição! Você de fato, ins-pira em mim sin-ceramente umaadmiração poressa energia ousinergia profundaque imprime acada coisa quevocê faz e sonha.Realmente, isso éraro em temposescuros e estrei-

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tos como os nossos. Parabéns! Umabraço amigo, Majela ColaresMARCELO ARIEL: EvoéSoares! Recebi o Estudose catálogos — mãos O teuprefácio possui a mesmaaura libertária dos trêsprefácios do João Rosaem Tutaméia; nele sintoque é possível recuperaro aspecto encantatório e engraçado(refiro-me à graça de Simone Weil efalo da gra-ça incancelável de Proustreescrito por Oliveira de Panelas, ZéLimeira ou por sertanejos como você).Será que somos nós os bois e cavalosda palavra mundo e de todas as ou-tras partículas invisíveis do visível?(Palavras-átomos do mundo da alma?)Não estou sendo agora nele estas pa-lavras? (Esses fios engraçados e difí-ceis que se tocam através das mãosdos olhos?) Que se tocam na vida e namorte dos nomes todos que depois in-visivelmente ressuscitam como pala-vra e memória do mundo (mundos?).Voltando e indo, como faço para adqui-rir o Recordel? Ah, gostei do no-me!Edições Cururu... isso tem ma-gia!Aqui da minha margem, assim queterminar o trabalho de ourive-sariametafísica do meu Silêncio contínuo(reunião de poemas e insônias), teenvio o material. Até Lá. Um abraçocósmico... Marcelo.

MARIA CONSUELO CU-NHA CAMPOS: Soares,que beleza! Acabo de lero maravilhoso “pa-pé“ eainda sinto a vertigemda altura! Muito obriga-da pelo privilégio de lerseu texto de mestre! O

que existe de telúrico em meu dna ur-bano se energizou ao lê-lo e todas asminhas ancestralidades dedicadas àpecuária reviveram em mim, descen-dente que, como Drummond, já nãosabe mais dar nome a bois... SendoFigueiredo pelo lado materno, CunhaCampos, Prata e Soares também, pelopaterno, há motivos para crer, estan-do estes sobrenomes no dicionário se-faradita, que também possa ter algu-ma ancestralidade cristã-nova. Abra-ço grande e comovido, Consuelo

MARIA DA CONCEIÇÃO PARANHOS1. Num primeiro e-mail: Subject: Dor e júbiloMeu amigo,DOR: morreu um dos maiores po-

etas brasileiros, meuamigo Affonso Manta.Estou sofrendo muitocom isto. O meu mes-tre Tasso da Silveiradizia que quando umpoeta morre é como seum cofre de tesourostivesse submergido emalto mar para sempre. Affonso Mantaé um patrimônio da humanidade. De-pois lhe relatarei a vida deste grandepoeta. Estou em luto, poucas palavras.O poeta Inácio vai lhe enviar, a meupedido, material para você inserir emseu sítio (acho que é uma fazenda, naverdade, uma imensa fazenda, o seusite, e aqui já se inicia o júbilo).

JÚBILO: seu texto. É de uma be-leza confrangedora - foi o adjetivo queme veio. "Ah, meu caro Vergilius -Nunes Maia ou Publius Maro, tantofaz -, a legitimidade do nosso canto étão-só a sustentar o júbilo. Se canta-mos a vida, cantemo-la como a não-morte; se cantamos a morte, que sejaum psalmo de ressurreições. PoetaVirgílio, creia-me, o catálogo das mãosé inesgotável porque as mãos dos no-vos hão de garantir as nossas mãos.Por sobre, sempre por sobre; assimtem sido". — Diz você, com absolutapropriedade.

O que você realiza em seu texto éuma lúcida captura do mundo, nos ca-tálogos que tipifica. Ocorre uma vizi-nhança com a experiência individuale social espantosa. Mais que vizinhan-ça, uma co-percepção do mundo cria-do pelo homem, mundo cultural e poi-ético, à semelhança do gesto de Javéno início deste mundo em que nos édado o canto. E, ainda à semelhançade Deus, viu e vê o criado e achou eacha que era e é bom. Ato genésico, oseu.

Mais: com seu inventário articu-lado poiéticamente você erige uma ArsPoetica. Veja, no anexo, os trechosque destaquei do seu texto e se não éisto que você realiza - uma arte poé-tica encorpada e radical.

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Suas palavras sibilam e zunem,são como aríetes, às vezes, na percep-ção do mundo e da natureza da arte.Da Arte. Que texto, o seu! Parabénsmesmo, parabéns são poucos, vivavocê! Um beijo e um abraço de suaamiga, Conceição

2. Num segundo e-mail: Meu amigo, Ontem, escrevi um

longo mail para você, dizendo de DOR(morte de Affonso Manta, um dos mai-ores poetas brasileiros) e JÚBILO (peloseu texto, com amplo comentário. Mascomo meu Windows está acusando umerro desconhecido para mim, talveznão o tenha recebido. Quanto ao Man-ta, espero de você uma super-home-nagem a ele em seu sítio (que, comoo dissera antes, no primeiro mail, éfazenda e fazenda sem limites, semser latifúndio, graças a Deus! Pensoaté que os poetas do MST deveriamenviar suas con-tribuições...Veja bem:acho a causa justa e a ela adiro; soucontra alguns procedimentos de pes-soas isoladas - abusos). De qualquermodo, havia uma colagem do seu ex-cepcional texto para arquivo do Word,comentado seus catálogos e os subs-tratos aní-micos, e outros, destes, emalguns aspectos, que anexo agora,como já o fizera no outro. Parabéns!Estou feliz com sua performance ma-ximal. Você está crescendo mais doque um jequitibá. E, paralelamente àsua auto-construção como ser huma-no, a sua bela e ímpar contribuição auma literatura que encontra raquiti-zada cada vez mais neste País. Nosseus textos, corre o sangue da Vida, osangue quente do contato com as vís-ceras. Você dá as mãos ao expressio-nismo kafkiano, sim, e à sua condi-ção de judeu sefaradita. Afinal, osmarranos são irmãos destes, são "ra-pazes" da estirpe do Maimonides,Marx, Engels, Mendelssohn, Freud,Einstein, Wittgenstein, Henri Berg-son, Edmund Husserl, Martin Buber,Karl Popper, Einstein, do Freud, doSpinoza... Lembrei-me, também, dapiada dos "cinco rapazes judeus" quemudaram os rumos da história da hu-manidade, passada para mim por umamigo querido, o Roberto Ponczek, umdesses mesmos "rapazes", apaixona-do por Baruch Spinoza, com livro e

tese de doutorado sobre o filósofo con-siderado anárquico por seus irmãos:Moisés: "o mais importante é a lei, eesta se faz com a cabeça"; esus Cris-to: "o importante é o amor, e este sesitua mais em baixo, no coração";Marx: "o mais importante é a igual-dade social, e esta é sentida um pou-co mais em baixo, no estômago";Freud: "o importante fica ainda maisembaixo, no sexo, pois é neste localque se situam os desejos". Finalmen-te, o quinto, Einstein: "meus quatrocolegas judeus estão relativamenteequivocados pois o importante é quetudo é relativo". Envio-a para você sen-tir ainda mais a alegria de ser cria-dor de Criador e sua criatura. Foi Elequem disse, não foi mais ninguém:"Sede perfeitos, como eu osou".Continua a informação do Pon-czek, me dizendo que, certa vez, quan-do perguntado por um pastor se acre-ditava em D'us, Spinoza lhe teria res-pondido: "Eu não acredito em D'us, euconheço D'us". E, quando um rabinoamericano fez a mesma pergunta aEinstein, este lhe respondeu: "O D'usque acredito é o D'us de Spinoza". Poreste motivo, Spinoza é conhecidocomo "o filósofo embriagado de D'us".Depois de Spinoza e Einstein é per-feitamente possível conciliar o juda-ísmo com a ciência e a filosofia mo-dernas. Isto você faz no seu texto, istovocê É no seu texto, com a diferençade ser poeta. E poesia é verdade (Poe-sie ist Wahrheit, quem o disse foi Go-ethe). Poiésis: o mais alto conheci-mento, pois há o contato direto com omundo empírico, sem inter-media-ções da lógica causal. O Virgílio Maiadeve estar muito feliz com tudo isso.Que ele receba o meu abraço e as mi-nhas homena-gens.Vou tentar lheenviar os comentários sobre seu tex-to mais tarde, se for corrigido o errodo meu Windows. Abraço e beijo. Con-ceiçãoMARIA FORTUNA:Meu caro poeta Soa-res Feitosa: Com quesatisfação recebi oque vc. chama de"papé", contendo umtexto seu que muitome surpreendeu! "O

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que o tempo há de querer, já conhe-cia. Já havia lido suas inesquecíveispoesias no site Jornal de Poesia, ondenavego familiarizada com um terre-no em q minha alma teima construirsua morada eterna. Agora me vem asmãos algo que mexe com minha me-mória poética, pois meu pai, velho ce-arense João Evagelista de SouzaLima, autor de apenas um livro, trou-xe para minha infancia de criançamaranhense sonhadora e messiâni-ca, um linguajar daqueles que conhe-cem a caatinga, que presenciaramum boi morrendo de sede por causada seca. E tantas coisas mais que oprezado poeta tão bem invocou naque-le texto mágico onde deixou transpa-recer um parentesco, próximo a Be-leza, daquele intrigante neolologismono linguajar de Guimarães Rosa. "Háque ter sorte para abrir um livro. Abri-lo na página certa. De gostar ou nãogostar" . E eu gostei muito do que li.Senti o borbulhar da minha raiz cea-rense e agradeci a Deus por ter al-guem, com tanta sensibilidade, pre-servando a linguagem crepitante dosol da seca nordestina, aspergindo aàgua da poesia. Refrescando, deixan-do chover palavras de bom augúrio.Obrigada por entrar no site do FaustoWolff e ali ler meu artigo "O pivete".Parabéns! Um grande abraçoMariaFortunaMARIA GEORGINA ALBUQUERQUE:Feitosa, aqui estou com o maravilho-so Estudos e Catálogos - Mãos que meenviou. Nele, um garotinho de óculos,expressão pra lá de inteligente, meconvida (ou impinge?): " - Vem!... de-

sestrutura! (e reestru-tura meio à perplexida-de...)". A regionalidadeda leitura que ora faço,aos poucos vai dandomostra de universali-dade meio à vivênciaanárquica da minhagrande metrópole. Não

temos acesso ao gado, mas fica cons-tatada a possibilidade de "marcar" asnossas produções com ferro em bra-sa. Não temos galos por aqui, mas per-sistem os gritos que também tecem amanhã. Basta que haja paciênciapara absorver o diferente através de

iniciativas culturais como a sua, quetanto ampliam os nossos horizontescriativo e lingüístico. Um beijo cari-nhoso. Maria Georgina Albuquerque.Em tempo: Desejo ao Virgílio Maiamuito sucesso com o seu "Recordel",que já dispõe de tão belo e instiganteprefácio.MARIA DA GRA-ÇA ALMEIDA:Poeta, a certezada tinta que desua pena deslizatem magia ealumbramento.Deixa um rastrono papel, cujo per-curso é a própriavida, com as doa-ções e as maravilhas que só podemosencontrar na bênção dos imortais. Ma-ria da Graça AlmeidaMARIA LILIA MARTINS CARNEIRO:Estou sem palavras para de-monstrara minha alegria e perple-xidade coma recebimento do papé & tinta: ale-gria de ver o carteiro chegando com oenvelope do JP timbrado, coi-sa de cai-pira! (Mas é muito bom receber enve-lope do carteiro); perplexidade em verque o dito “prefácio” é na realidade umlivro completo de poesia em prosa,como só vejo semelhante em Guima-rães e em Saramago, em que as pala-vras soam melodiosas e nos envolvempor completo. Meu Deus, como alguémconsegue transformar o bruto ato deferrar bichos em um bailado diáfanoe contrito?! Estou pasma! Parabéns eobrigada pela oportunidade. Um abra-ço. Maria LiliaMARIGÊ QUIRINO MARCHINI: Preza-do Soares Feitosa, Estudos & Catálo-gos - Mãos é um maravilhoso ordena-mento de um Brasil existente nos bois,nos ferros cruéis, nas madrugadas.nos sertões, nas gentessertanejas que, nósaqui, nestas urbes —desenvolvidas, violen-tas e poluídas — mal co-nhecemos, mal ama-mos, mas bem recebe-mos, com júbilo, pois éum portal magnífico

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para adentramos nas tradições e di-ferentes formas de vida em nosso País.Sua vasta cultura, Soares Fei-tosa,direi mesmo erudição, está toda per-ceptível nesse prefácio encantador,humano e abrangente. E na divisãodos tempos d’Ele, d’Ela, que refina-mento de linguagem, que poesia! Esteprefácio está à altura da poesia de Vir-gílio Maia, que conheci quando esti-ve em Fortaleza. Você e ele, dois gran-des poetas. Com meu abraço de mui-ta ami-zade, estou-lhe mandandomeu livro Hierofanias, o religioso nalírica femi-nina, e um arquivo comDuas poé-ticas, sobre Aluysio Men-donça de Carvalho. Cordialmente,Marigê Quirino MarchiniMARIA DO SOCORRO CARDOSO: Ad-mirável escritor/poeta Soares Feito-

sa: Gostei deveras daprosa e projeto EdiçõesCururu. Lembrei-mede uma modinha queouvira e participara dosfolguedos de infância,nos terreiros em noitede lua cheia: ..."sapocururu da beira do rio,

quando o sapo canta, ó maninha, é queestá com frio"... Nordestina, dos ser-tões de Per-nambuco, porém meio ce-arense, devido a minha ancestralida-de materna: percorri no lombo de ca-valos léguas e léguas as plagas do ca-riri e outras cercanias do Ceará: Bar-balha (Sítio Cocos, Roncador), Brejodos Santos, Porteiras (Massapê), Jati.Por lá meus bisavós e avós maternospossuíam propriedades e engenhos.Este magnífico Estudos & Catálogos -Mãos, do escritor Soares Feitosa, - pre-fácio quase ensaio do livro Recor-delde Virgílio Maia, é sem dúvida algu-ma, uma obra de arte literária dasmais originais. O ludicismo, o liris-mo e o realismo do autor ao tratar dascoisas da ambiência nordestina, deforma tão profunda e autêntica, fez-me reportar qual quadro vivo aos idosda minha infância por aquelas para-gens. Soares Feitosa metafórica, in-consciente e ou conscientemente,resgata o universo sertanejo, nos fa-zendo ouvir o aboio do vaqueiro, o re-linchar dos cavalos, o chocalho do gadoe bodes, os bacorinhos, os bezerrinhos

desmamados, os burros e jumentos.Os baldes de leite e o cheiro dos cur-rais, a coalhada, as farinhadas, aprensagem do queijo de manteiga,cujo dia era uma festa: os fios de quei-jo no alguidar cozendo no fogo de le-nha, e a criada-gem disputando a ras-pa do alguidar para dali fazer uma boafarofa.. "Chouriço" era outra festa: odoce feito do sangue do porco com ger-gelim pilado no pilão e rapadura, tem-perado com pimenta e cravo. É de darágua na boca, tão delicioso doce! Nemtudo era uma festa e um doce: O mu-gido e berro do gado sendo ferrado como ferro quente em brasa, com o "logo-tipo" do fazendeiro. Como a proprieda-de privada traz berros e lágrimas!Meus avós maternos ficavam sôfregoscom aproximadamente mil cabeças degado na serra do Araripe, na iminên-cia de serem roubadas ou atacados porbandos de cangaceiros, e assim teri-am que vender diversas cabeças parapagar o resgate. Isto ocorreu com mi-nha avó materna em relação ao ban-do de cangaceiros, os Marcelinos. Doalpendre, ao levantar da rede, o avis-tar dos canários e assum preto, de LuizGonzaga, os gibões, selas e baús, he-rança dos artesãos da península Ibé-rica, o ecletismo cultural árabe, - po-vos pastores, estes, além de conduziros rebanhos de ovelhas, trabalhavammuito bem o couro. O crochê, rendade almofadas, com fios de algodão, apartir de bilros e espinhos de manda-caru, artesa-nava-se para enfeitar assertanejas, amenizando seu caráterrijo. Que sertões étnica e belamenteecléticos: portugueses, índios, negros,cristãos novos, árabes, tudo fundidonum caldeirão de cinco séculos - tra-vestidos de brasilidade, cujo lirismo erealismo ao mesmo tempo, imprimeuma magia inigualável. Tudo isto oautor, escritor e poeta Soares Feito-sa resgatou neste texto fantástico,quase prosa lírica: não fica a dever aGuimarães Rosa, Graciliano Ramos,Umberto Eco de O Nome da Rosa, Ga-briel Garcia Márquez em Cem Anosde Solidão. E ao escritor e teatró-logoparaibano, Ariano Suassuna. O autorfoge ao lugar comum, a intertextuali-dade de leve; entre o erudito e o popu-lar, tece milagrosamente a ficção e oreal; se abraçam para caracterizar as

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mil e uma noites dos contos nordesti-nos. Texto singular e rico, beirandoas margens do épico.

E assim encerro esta singelaapreciação, semioticamente quasesentindo o cheiro agradável do capim-santo, da terra quente molhada comas primeiras chuvas de janeiro, o somdo aboiar do vaqueiro; a coreografia daanágua rendada e gomada das moçascasadoiras, para ir a missa do domin-go e a festa do padroeiro.

Fechando estas breves impres-sões, pois longe de crítica literária,invoco o cientista social Euclides daCunha, com frase indelével e tão atu-al: "O sertanejo é antes de tudo umforte"! Com um abraço fraternal denordestina, meio cearense, Maria doSocorro CardosoMAURO MENDES: RECORDEL! O tí-tulo do livro já é um poema, pelo me-nos pra quem é, como eu, destas ter-ras! Mas falta ler o livro, vontade queo simples título desperta. Cadê o li-

vro? Cadê o meu? Oseu prefácio é origina-líssimo, sem recursosa estas coisas manja-das como "intertextu-alida-des", "polissemi-as", ou exdrúxulas,como "ale-xias", ou decompadrio, como "com

este livro o autor adquire, assim, olugar que, de há muito, lhe pertence,de pleno direito, no panorama literá-rio...". Ao contrário, o seu prefácio épuro sertão (onde, também, com cer-teza, se insere o livro), os bois mu-gindo, o tropel de tudo quanto é bicho,o canto da pas-sarada, os "cheiros" detudo, cada um, a seu lugar e hora, con-ferindo à gente (sem que disto a gen-te mesmo se aperceba...), um senti-do, ao mesmo tempo, de individuali-dade e de absorção total na nature-za... Você maneja, admiravelmente,estas lembranças! Vontade de me em-brenhar de novo nestas matas, deonde nunca deveria ter saído para es-tudar vãs filosofias! Um abraço! Mau-ro MendesNELLY NOVAES COELHO: Caro esempre lembrado poeta Soares Feito-sa. É sempre uma alegria receber no-

tícias dos amigos,principalmente quan-do vem em forma deatividade existencial,como é o seu caso...Desde que o conhecei,através das letras e dapoesia, senti isso: tudo que você es-creve, produz, projeta, etc, vem da pai-xão de viver e conviver. Que mundomaravilhoso seria este se "todos fos-sem iguais a você"! Recebi teu jornalde poesia com os Cátalogos. Sentiuma saudável inveja, pois meu com-putador continua sendo manipuladopor uma funcionária. Há entre mime ele uma incompatibilidade psicoló-gica. Continuo escrevendo à mão, de-pois datilografo na IBM elétrica; a fun-cionária digita tudo depois. É uma in-crível perda de tempo. Mas que fazer?!Já octogenária, permito-me só fazero que me dá prazer. Abraços, Nelly

PS: Vou lhe mandar o meu Dicio-nário Crítico de Escritoras Brasilei-ras. Todo escrito à mão e depois...

Nota do editor:O dicionário chegou no dia se-

guinte. O obra primorosa, de amar eguardar. Confesso que fico morto devergonha de ganhar presente tão rico.NERINO DE CAMPOS: Caro SoaresFeitosa, primeira-mente gostaria deagradecer este ma-ravilhoso presenteque me foi enviado.Senti muito prazerem ler, reler, relere reler o prefácio dolivro do VirgílioMaia, e em todas asvezes fui remetidoa um passado dis-tante, quando nasférias viajava para a fazenda de umamigo. Apesar de ser extremamenteurbano, de ter passado a infância e ajuventude em Belo Horizonte, e ter vi-vido e amadurecido no Rio de Janei-ro; em Ipanema para ser mais preci-so, sentia com intensidade as coisasda fazenda, aquela crueldade do ferroem brasa, do balde tão limpo para re-ceber o leite, em contrapartida comas mãos tão sujas do vaqueiro na horada ordenha. Tudo isso me voltou à

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mente e eu sei que outras imagensainda voltarão, pois, lerei o seu pre-fácio como leio, leio e leio certas poe-sias. Um grande abraço. Nerino.NICODEMOS DE SENA: Prezado Soa-res Feitosa. Foi com grande alegriaque recebi o belo e criativo texto paraprefácio de Recordel de Virgílio Maria.A leitura deu-me muito prazer, eis

que uma apresentaçãodo livro consegue esca-par da forma-clichê e seconstitui, ela mesma,peça autônoma comvida própria — isso pelainvenção do texto. Para-béns! Vontade imensade poder ler também o

livro do Maia, que mereceu a tua in-classificável — e tão original — apre-sentação. Onde consegui-lo? Abraçofraterno. Nicodemos SenaNILTO MACIEL: SOBRE PREFÁCIO. Aleitura do prefácio de Soares Feitosaao livro Recordel, de Virgílio Maia, meconduziu por veredas sertanejas e pre-téritas. Como um cego, fui vendo, comestupor, a ferradura do gado, o ferroem brasa, a fumaça a se evolar, es-turros do bicho, a marca no lombo.Tudo contado tim-tim por tim-tim. Oprefácio tem sabor de crônica. Não decrônica escrita às pressas, para o jor-nal do dia seguinte, por cronista pro-fissional. A crônica de Soares Feitosatem feitio de ensaio sociológico. Nãodesses ensaios que dão sono, pregui-ça, vontade de fechar o livro. O ensaiode Soares Feitosa é de quem viveu,presenciou a vida no sertão, a arte dosferros, as serifas. Como o outro poetaVirgilio Maia, o Vergilius Nunes Maia.O prefácio de Feitosa é de quem co-nhece as letras do gado muito antesde conhecer as letras dos livros. Comoo poeta Virgílio. E a feitura dos quei-jos, o fabrico das moringas, a profeciadas águas. Ler este prefácio-poema é

ler o sertão, a artesertaneja, e ter von-tade de ler o Recor-del desse tambémmaravilhoso poetado País do Jaguaribechamado VirgílioMaia. Nilto Maciel

PAULO CAUIM:Estudos & Catálogos - MãosSoaresserifavogaisd eRimbaud

a ferroErigeambiênciasTempoáguaqueijoscouro

Catálogod ecatálogoslogosgaloscabrais

Teu olharformigueirono catálogodas profeciasme remeteà caranguejeiraque atravessaa rodagem

Teu textoxadrezd exerémmiríaded eabois

Quentescatálogos das mãosentreasvícerasno catálogoacasodas mãos:as mãossão mais velozesque o mouse

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[De mãosdas como leitor]AtravessaFeitosao infernocontemporãneoe nos guiaaté o paraísodejuazeiros-livres-sem-sinucas

Asinucaé apenaso prefácio

Estudos & Catálogos - mãosum texto escritopor DoidinhoJosé Lins do Regodepois de adultoVocê inventouo prefácio-prelúdio (aquecimento) an-tesde o leitortodos osoutros movimentos

No prefácio-prelúdiotemos de ir de vau a vaua grande travessia[ R e c o r d e l ]

Soares,em que estante do tempovocê deixou arquivado o catálgode por-sobre-sempre-por-sobre[d'Ele d'Ela]?

Brasília, 2 de março de 2004Grande abraçoPaulo CauimPEDRO ROGÉRIO: Prezado SoaresFeitosa. Agradeço o envio do Jornal dePoesia, contendo o exuberante Estu-dos & Catálogos - Mãos. Maravilhosaviagem pelo sertão de nossa infância.Magnífico trabalho de artesanato dapalavra escrita. Mande-me mais. Fi-quei admirador do seu imagino-so tex-to guimaraesroseano. Abraço cordialdo Pedro Rogério.

R. ROLDAN-ROLDAN: Caro SoaresFeitosa, sim. Chegou seupapel e tinta. Com odoratávico de terra, de chu-va, de mato. Com luz devela - livros-copistas, pa-limpsestos e até "grimoi-res". Com som longínquode aboios. E fios deliqüescentes dereferência. RodamRAYMUNDO SILVEIRA: Feitosa, aA-cabei de ler agorinha Estudos & Catá-logos - Mãos e estou bes-ta, abes-talhado, abesta-do, bestificado e de quei-xo caído. Eu te conheciacomo um grande poetaversejador. E isto é maisdo que prosa poética, nomodo de entender desteteu amigo e colega de Seminário. Eute juro pelas minhas mãos postas - epelas mãos postas do “Estudo das Mãosem Oração”, de Dürer - que se eu ti-vese encontrado estas páginas, soltasem algum lugar, sem nenhuma indi-cação de autoria e de editoria, teriacerteza de que se tratava de um tre-cho de Grande Sertão: Veredas. Meusparabéns, meu amigo. Você tem muitomais tutano na cabeça do que imagi-na. E do que muita gente (culta) destegrande pequeno país imagina. Umabraço. Raymundo SilveiraREGINA SOUZA VIEIRA: Grande poe-ta amigo Soares: Estes versos de Car-los Drum-mond de Andrade, em lou-vor a João Guimarães Rosa: “Ficamossem saber o que era João/ e se Joãoexistiu,/ de se pegar?” (“Um chama-do João” in Versiprosa) ficariam bemajustados na paró-dia que eu gostariade fazer agora: Ficamossem saber o que é Fei-tosa/ e se Feitosa exis-te,/ de se pegar?. Ver-dade, poeta e amigo Fei-tosa! Admiro de há mui-to o seu trabalho no Jor-nal de Poesia; admiroainda mais a oportunidade que vocêdá a poetas e escritores neófitos queencontram, por um lado aquiescênciae incentivo para publicarem no seusite, por outro lado nele encontramum arcabouço de conhecimento de

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autores nacionais e estrangeiros.Recebi Estudos & Catálogos - Mãos eima-gino o prazer e o orgulho de Vir-gílio Maia, cuja obra não conheço nemtampouco a pessoa, mas que imaginoambos privilegiados por este prefácioseu. Se em lê-lo, sinto-me honrada,imagine-se o autor do livro, que teránas primeiras páginas de sua obra estaapresentação profunda!

Com Você, a gente se surpreendesempre. Nós, por exemplo, nem nosconhecemos diretamente e eu megabo de receber o seu convite parapublicar o meu livro A prosa à luz dapoesia em seu site. Que presentão! Oque eu fiz para merecê-lo? O que lhedizer para que as palavras correspon-dam ao meu agradecimento? E sabepor que o seu carinho me é tão im-por-tante? Há meses venho pensan-do em disponibilizar na internet estelivro, mas nunca me decidia a isto. Aísurge o seu convite, que surpresa!

O meu livro, à parte qualquer pre-tensão, contém uma vasta pesqui-sasobre a prosa drummondiana e, maisdo que isto, em analisando os gêne-ros praticados pelo autor mineiro, háuma parte teórica sobre crônica, en-saio e conto, que pode ser útil a ou-tros pesquisadores ou estudantes.

Garanto-lhe que fiz o que pudepara divulgar o meu trabalho: dei pa-lestra em Itabira, busquei e até con-segui o apoio da Fundação Casa de RuiBarbosa e do neto de Drum-mond,Luís Maurício, mas a divul-gação é di-fícil, o tempo passa e nós mesmos aco-modamo-nos ao que não foi feito.

Bem, vou enviar-lhe em anexo olivro, se puder disponibilizá-lo medará uma das maiores recompensasliterárias que posso almejar. Apesarde este e-mail já se fazer longo de-mais – será que sofro de gigantismoepis-tolar? – quero apenas colocar-meao seu dispor ou ao dispôr do JP paratudo ou qualquer coisa em que eupuder ser útil. Sou uma apaixonadapor literatura e me voluntário sem-pre a qualquer pesquisa ou a qualquerinformação. Uma última observação,quase um pedido: o meu site acolhidohoje no JP já não é o meu atual, sepuder alterar, será um muito obriga-da a mais que lhe fico devendo. Suasempre amiga. Regina Souza Vieira

REGINA LYRA: Meu CaroSoares, ler seu texto noleva para pontos de pra-zer e saber. A descriçãoda vida no campo do se-nhor e da senhora da fa-zenda é de uma maestriaímpar. Os catálogos tornam-se velhosconhecidos, ou de quem viveu no cam-po, ou pelas belas leituras dos nossosescritores, tais como: José Lins doRego, José Amé-rico de Almeida, Ra-chel de Queirós, Graciliano Ramos etantos outros. Sua leitura, meu que-rido Soares é praze-rosa, nos leva enos enleva, a momentos de reflexões.Parabéns Soares, não só por dá opor-tunidade da leitura de prefácio tãobelo, mas também, por fazer parar umpouco e pensar nos acontecimentosda vida ... Um grande beijo, ReginaLyraRENATO SUTTANA: Pre-zado Soares: Uma vez,durante uma viagem deônibus (não me lembroentre qual e qual cida-de, mas sei que foi numônibus), um amigo - queestudava a física, masque tinha certo interes-se por livros, principalmente roman-ces e poesias - me perguntou se euconhecia a prosa de Pedro Nava. Res-pondi-lhe que não a conhecia a fun-do, mas que tinha lido alguns trechos.Então ele me perguntou o que euachava dessa prosa, mesmo com apouca experiência que tinha dela.Como não me ocorresse nenhum ad-jetivo para qualifi-car a escrita desseautor, e na tentativa de dar uma idéiado que eu pensava de uma prosa quepara mim me parecia consistente,fundada numa vivência profunda domundo e das coisas — principalmen-te, uma escrita calcada na memóriae na ances-tralidade do ser e da pala-vra —, eu apenas lhe disse que aachava “subs-tanciosa”. O amigo riu,julgando inusitada a expressão, e re-dargüiu que o fazia pensar em qual-quer coisa como uma sopa, um caldoou uma iguaria qualquer, rica em pro-teínas. Mas tinha entendido o que euquisera dizer e por isso acrescentouque também achava a prosa de Nava

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bastante consistente, embora, de suaparte, como eu mesmo, a conhecessepouco e muito de ouvir falar. 

Leio agora o seu Estudos & Catá-logos - Mãos e esse breve episódio daalguns anos atrás me vem à memó-ria. Como qualificar essa prosa quevocê me envia, senão recorrendoàquele adjetivo, isto é, dizendo-a“subs-tanciosa” também - num sen-tido que implica agora não tanto o queeu tinha visto em Nava, mas numsentido que implica certa relação doespírito com a terra, com as coisas dochão e do mundo ao redor, que vocêtão bem consegue evocar nesse pre-fácio que não só é ele mesmo umapeça de grande interesse, mas que,ao apontar tão delicadamente paraa poesia do prefaciado, nos traz tam-bém um desejo imenso de mergulharnela, para descobrir mais tesouros,mais seiva, e nutrir o espírito com asubstância grossa da vida? Muitascoisas me evocou esse prefácio: nor-destes, Graci-liano Ramos, Guima-rães Rosa (no estilo entrecortado dasfrases e naquilo que João Cabral deMelo Neto chamaria de palavra “cola-da à coisa”, da qual extrai o seu ser ea sua substância e com a qual vocêconsegue lidar de maneira tão própriae pessoal, apesar de tudo) - mas meevocou principalmente a personalida-de do Feitosa, a cada dia mais da ter-ra, a cada dia mais à espera de que omundo se abra numa grande apariçãoreveladora.

Neste ponto, sou obrigado a repe-tir a expressão do Mauro Mendes:“Cadê o livro? Cadê o meu”? Assim,na expectativa de ler, além do beloprefácio, também o livro do VirgílioMaia propriamente dito (para o qual,acredito, o prefácio constitui um ex-celente chamariz), deixo aqui o meuelogio e o meu pedido de que, quandopossível, você nos dê a infor-mação decomo consegui-lo (o livro), impresso ouem versão digital (na eventualidadede que exista alguma), para que pos-samos conferir a coisa e ver se o pre-fácio não ultrapassou o objeto a prefa-ciar, o que estou certo - num bom sen-tido - não será o caso. 

Para aproveitar esta carta, gosta-ria ainda de lhe perguntar uma coi-sa. Conheci recentemente, no Jornal

de Poesia, alguns poemas de AffonsoManta, que muito me agradaram.

Leio, em seu Estudos & catálogos- Mãos, uma notícia, fornecida Mariada Conceição Paranhos, de que o poe-ta faleceu recentemente, o que terásido, com certeza, uma grande perdapara a poesia brasileira, conforme aprópria Paranhos comentou.

Assim, minha pergunta é: queacesso podemos ter a outros poe-mas do autor, para além do pequenovislumbre que tivemos de sua obra noJornal de Poesia? Existem livros pu-blicados dele e estão acessíveis nomercado ou, como receio seja o caso,tudo não passará de raridade - como,por exemplo, a poesia de Orides Fon-tela, que só podemos ler por fragmen-tos na Internet e que está, esta últi-ma, a esperar por uma boa edição com-pleta de seus poemas, já que se tratade uma presença tão nobre na poesiade língua portuguesa dos últimosanos? Você teria alguma informaçãoa me dar? 

Bem, com os votos de que outrosprefácios, outros poemas, catálogos,estudos e mãos venham por aí, numsempre crescente nível de qualidade,vai aqui o meu abraço. 

Renato SuttanaRICARDO ALFAYA: Caro Soares, re-gistro com satisfação recebimento doEstudos & Catálogos - Mãos, um tra-balho em que mais uma vez combinaeletrônica com artesanato. Importan-te também porque traz para o papelmaterial do Jornal de Poesia, aumen-tando com isso as chan-ces de sobrevivência domaterial. Quanto à qua-lidade do escrito e dos co-mentários dos autores,excelente, como sempre.

Desde o início vocêtem sido um dos que têmsabido melhor aproveitar os recursosde interatividade que a Internet ofe-rece, ao mesmo tempo promovendoseu próprio trabalho e o de outras pes-soas, com enorme talento. Os Catálo-gos evidenciam essa visão de conjuntoem que se tem o seu trabalho e o doscomentaristas bem demarcados, en-quanto que, simultaneamente, ocor-re a integração e interatividade des-

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ses textos, formando um conjunto úni-co. É muito interessante. Ricardo Al-fayaRITA BRENNAND: Po-eta, por favor não repa-re meu silên-cio. Ele éa minha homenagem,minha gratidão. Leiotantas vezes, tantasvezes leio, só me res-ta o corpo intenso, acarne trê-mula, o arrepio da alma.Meu beijo de sempre. RitaRODRIGO MAGALHÃES: "Saiba queos poetas como os cegos podem ver naescuridão", era o verso que, na can-ção Choro Bandido, dava uma voz desentença a quem cantava. E, do mes-mo modo, eles, os poetas, continuam:tateando e achando na escuridão. OCoronel Feitosa sempre foi um cegode bom faro nos dedos. Pega o livro,abre-o pelo peso da mão e, numa via-gem ligeira, eis o verso laureado. As-sim, pelas mãos, ele mesmo diz, en-controu os ouros de Virgílio. E ele, denovo, confirma, pelas mãos, a poéticado nosso canône. Pelas mãos - habitoagora apenas esta minha mão; souapenas esta mão - o coronel Feitosa

já vinha enxergan-do o mundo. Pelasmãos, ele já vinhalendo a casa, os ve-ludos e as superfí-cies dos homens. Eagora, pelas mãos,o enlace dos que seforam e dos queainda não chega-ram. A mão de Cas-tro Alves sob o peso

da mão dos novos condores. A mão deShakespeare, a mão de Flaubert, amão de Machado - todas, pesando sobe sobre. Espremidas, as mãos? Encos-tadas, num encaixe leve. Que eles, osantigos, só querem transmitir; quenós, gratos, não queremos esmagá-los. No mais, um texto para a quedado apartheid das escolas. Parnasia-nos, simbolistas, modernos, em umagrupamento pralém das razões ex-cluden-tes, pralém dos sistemas de Li-neu. O novo critério de divisão não di-vide, sobrepõe. O critério do coronel

nos colocou lado a lado. De mãos da-das. Abraços do Rodrigo Magalhães.RODRIGO MARQUES: Testemunhotáctil-ocular. Estava no escritório deSoares Feitosa quan-do o correio chegoucom o livro Recordelde Virgílio Maia. ViFeitosa abrindo o en-velope e retirando es-tranho papel de cou-ro de bode, leu paramim o pedido de pre-fácio. Em seguida passou os dedos cur-tos por sobre a textura do couro e abriua esmo o livro de Virgílio:

O dia vai começandoe diante d’Ele me calo.No seio da escuridãose escuta assim um abalo:toda a caatinga estremece,pois mais parece uma preceo primo cantar do galo.“Tem-se que ter sorte ao abrir um

livro - disseram-me”. O livro ficou poralguns dias no escritório, mas logodesapareceu. Passado um mês - maisou menos, Re-cordel retornou sob aforma de Estudos & Catálogos - Mãos,contendo quase tudo que, durante otempo em que trabalhei no escritório,comentamos (eu, Feitosa e o advoga-do Rogério Lima): o júbilo, a matançado porco, as mãos, a festa, o cururu, apoesia, a festa, o retorno do filho pró-digo, a festa. A minha primeira im-pressão foi de achar que tudo pode edeve ser escrito, pois o texto de SF,pensando bem, não passa de uma lis-ta, mas disposta de uma forma tal queo leitor não deixa de revisitar o seucatálogo pessoal, suas recordações,seus estudos. Logo, tudo pode ser es-crito, desde quê... Fui o primeiro (acre-dito) a ler o texto em voz alta, inici-ando, naquele instante, o debate vivoque se pode ver no livro-prefácio Es-tudos & Catálogos - Mãos, primeirorebento das Edições Cururu, que seganha, de repente, pelo correio ou pelaInternet. Com o circuito de comentá-rios e com a distribuição artesanal,Feitosa conseguiu resolver o proble-ma do livro de Virgílio: o de ser ape-nas um. Com o prefácio, Recordel tor-

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nou-se duplo; com os comentários, tri-plo; com o Jornal de Poesia, sem mar-gens. Só a Arte, Sr. Leitor, só a Arte!Rodrigo MarquesRODRIGO PETRONIO: Soares da gota!

Belíssima organizaçãode catálogos! Muito boamesmo. Gostei das ilu-minuras do sertão e dareflexão sobre as letras.Agora, minha mãe éQuitéria, de Afogadosde Ingazeira, Pernam-

buco. Onde fica a tal cidade? Ela, a pa-droeira, se chama Quitéria? Vou cor-rer falar pra ela. Aquele abraço! Ro-drigo PetronioRONALDO COSTA FERNANDES: Meucaro Soares Feitosa. Que belo prefá-

cio! É uma reinvençãodo mundo, a realidademágica do sertão e dosseus traços, serifas,bois, maneiras de ser-tão e ser o mundo! Felizdo prefaciado que juntaa sua poesia outro textode mágica poética e

análise da arte de ferras bois e mar-car a poesia do mundo. Abraços, Ro-naldo Costa FernandesRosalice Sherffius: Caro Poeta, rece-bi seu “papé” e não consegui deixarde lado até ter degustado cada minú-cia ali contida! Valeu a pena a espe-ra. Perdão pela minha impaciência deter cobrado de novo. Esse negocio demorar assim tão longe às vezes atra-palha. Mas posso reclamar não! espe-cialmente com a internet encurtan-do estradas do jeito que faz... Recor-del - Catálogo de catálogos - cem li-vros em um - Tudo verdade. E apre-sentado em palavras do mais laborio-so quilate! Esse seu sitio, tornado fa-zenda, evoluído a latifúndio é’ a meuver um monte de países que formamum mundo inteiro! E neste gigante“planeta de palavras’’, vivem tesourosincontados de historia, dignidade hu-mana, esperança, paciência, humil-dade, bom humor, e outras realidadesvarias porém não absolutas, que for-mam a fragilidade e também o gran-de poder da humanidade! E’ precioso

notar como Ele e Ela vivem lado a ladoe não em posições de jugo... Há espa-ço para todos e cada um tem suas ta-refas delineadas.Quando eu era pe-quena, mais ou menos uns oito anosde idade, eu detestava sapo-cururu!Mas ali na Estância - Aldeota, eles pa-reciam que eram abundantes mora-dores da região e não tinham nenhu-ma vontade de sair! Um dia eu tinhaacabado de chegar da escola e quasepisei num enorme cururu que come-çou a inchar e me deu o maior sustodo mundo! Essas criaturas podem atéduplicar seu tamanho quando estãocom raiva ou se sentem intimidadas.A empregada, tendo presenciado o queaconteceu, falou “saia de perto ou ocururu joga veneno em você”, o queme fez correr dali e procurar abrigoseguro. O problema é que o bicho fezresidência no jardim e não tinhacomo evitar passar por ele... mas euaprendi. E as poucos a coexistênciase tornou tolerável. Hoje dou risadasao lembrar do acontecido... alias, re-latando isto aos meus filhos, que brin-cam com sapinhos como se fosse a coi-sa mais natural do mundo, eles medisseram “mãe boba, você não perce-bia que aos olhos daquele sapo vocêera mesmo um gigante?” Em termosde tamanho físico sim, eu era muitasvezes maior que o sapo-cururu, masaos meus olhos de menina, eu nãoconseguia desrespeitar um ser assimtão ame-drontador e tão lendário...Sua Edições Cururu é essencial nes-te mundo digital e real. Prossiga! Obri-gada pelo convite ao JP. Este fim desemana irei reler o “papé” e, com cer-teza, terei muito mais a comentar.Um carinhoso abraço, RosaliceRUBÊNIO MARCELO: Prezado amigoe companheiro de arte Soares Feito-sa: Confesso que ainda estou exta-siado com a beleza estonteante daspaisagens imprevisíveis que vislum-brei nesta viagem através das sen-das feéricas das páginas feitosas deESTUDOS & CATÁLO-GOS - MÃOS. Que forçamágica e estupendacatalogada neste com-pêndio literário! Quantabeleza telúrica, espon-taneidade lírica, singe-

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leza, riqueza de lembranças-imagense limpidez de idéias! Soares... Sóares... solares lares... olhares, lua-res, pomares... sermões, sertões, se-rões... serão sempre os ícones do es-pírito envolvente e dialé-tico dos teusversos, dissecando os dogmas e os pos-tulados da essência, e lançando - comdesvelo - as mira-culosas sementesdo Parnaso nos sulcos estéreis dosnossos corações. Jogando magnifica-mente com as palavras, explorando-as, repoetizando a peculiar cepa ver-nácula, neologi-zando o cerne da lin-guagem e afagando com naturalidadeos nossos sentimentos mais recôn-ditos, mostras que teu mundo-interi-or é qual aquela terra feraz da idadedo ouro, cantada por Ovídio. Searalivre, intacta do ancinho e do arado,onde os sonhos e mandaca-rus fruti-ficam aos sóis dos trópicos e aos mu-gidos matinais. Terra antro-pomorfi-zada que pulsa em harmonia vitalcom os seres e seus destinos. Desti-nos ontogênicos tangidos, renhidos,suados, curvados, cingidos por cetrosoez; destinos-bovinos sofridos, tingi-dos, marcados na tez... Sinceros pa-rabéns, nobre menes-trel! És uma dasgrandes expressões da literatura bra-sileira contemporânea. Abraços poé-ticos e fraternos! Rubênio MarceloSANDRA REGINA SANCHES BALDES-SIN: Meu muito querido Francisco: Avocê, poeta, o direito indele-gável, per-sonalíssimo, de nos marcar, leitorescativos, com as suas palavras-gestos,palavras-bailarinas, que nos enredamnuma dança de leitura, intensa, in-trincada e muito, muito prazerosa...Recebi sua correspondência, a peque-na nota manuscrita, o seu abraço, oaconchego do seu carinho, tudo, guar-dado naquele envelope... Lembrei-meda poetisa russa, Anna Akhmatova:“(...) Assim não se esperam cartas;assim se espera a carta...” Agradeço,poeta, agradeço comovida! Hoje a tar-

de (sábado) lerei o seutexto na primeira reu-nião do ano do nossoCentro Literário, acre-dito que me permitafazê-lo. Saiba que eu ohavia lido no site e, in-clusive, escrevi-lhe um

mail, o qual você não acusa o recebi-mento e pediu-me que en-viasse no-vamente, porém, não guardei cópia,pois foi escrito no “calor” do impactoda leitura, no corpo mesmo do mail.Quem sabe você ainda o encontre,pois não foi devolvido. Sabe, Francis-co, você é uma dessas pessoas espe-ciais que, por algum milagre, cruzamo caminho da gente; sou feliz que te-nha cruzado o meu. Que 2004 seja ple-no de tudo que lhe faz bem. Beijo você,com o carinho de sempre. Sandra Re-gina

SÂNZIO DE AZEVEDO: Meu caro Poe-ta Soares Feitosa: Você, com seu pre-fácio ao livro do poeta eamigo Vrigílio Maia, fezmesmo foi um tratadode nordestinidade. Éuma bela mistura dememorialismo e de en-saio, sem falar na poe-sia. Fico aguardando olivro do Virgílio, do qualjá conheço o belo prefácio. Abraços,SânzioSÉRGIO GODOY: Prezado Soares Fei-tosaFoi com agradável surpresa queabro minha porta e recebo Estudos &Catálagos. O dia em Amsterdã ficoumais fácil... Gostei bastante do prefá-cio e fiquei intrigado com os textos;amavelmente, intrigado. Gostaria demais uma vez agradecer, ainda quena distância, toda sua atenção e ca-rinho. Um grande abraço, Sergio Go-doy - HolandaSÍLVIO ROBERTO SANTOS: Poeta So-ares. Curti muito a tua epifania dosCatálogos, rapaz. Lembrei do velho Le-opold comprando rim numa feira deDublin. É o que se poderia chamar devisceral. Ave, Soares! A propósito,esse Recordel já saiu? Sílvio R. San-tosSOCORRO CARNEIRO: Senhor Escri-tor Soares Feitosa. Agradeço sensibi-lizada o envio da obra literária Estu-dos & Catálogos – Mãos. Parabéns pelobelíssimo prefácio em que exalammuçambê e xique-xique cheirosos;leite espumante ao peito da vaca, bois

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e o aboio cantante do vaqueiro; a sela,os animais, o cachorro acuando quemtenta ultrapassar a soleira da porta;a lua bonita, o dia amanhecido, o or-valho que molha os meus pés. Inúme-ras coisas têm que ser ditas, quadrospintados da festa do sertão. Água quejorra agora, fevereiro deste grandeinverno de 2004, de açudes sangran-do, que “vai-não-vai”. Muito obrigadamesmo por ter re-cebido esta obra dearte. Tudo isto me traz lembranças dotempo de minha infância na casa dosmeus avós. Socorro CarneiroTERESA SCHIAPPA:Caro Soares Feitosa. Foium prazer inesperado egrande receber os seus"Estudos & Catálogos-Mãos", penso que sepa-rata do Jornal de Poesia.O Prof. Carlos Moisés,amigo de há longa data, deu-me a co-nhecer essa obra extraordinária queé o seu Jornal de Poesia electrónico(brasileiro mas também português,como pude verificar). Do pouco queainda consultei (além do site de Car-los Moisés, algums itens de passagem)encantaram-me não apenas excelen-tes momentos de poesia - incluo asapreciações que falam dela - mas tam-bém o bom gosto na organização dosmateriais e na disposição visual. Coma leitura do seu livrinho fico a com-preender melhor a dinâmica que per-mite um empreendimento tão vastoe ao mesmo tempo tão singularizado:está nele presente o mesmo amor àefabulação poética, a mesma atençãoao pormenor pitoresco e criativo, queassocia sem preconceitos o Virgílio"antigo" e o "moderno" e não deixasequer esquecidos os diferentes AAnas tarefas banais da "catalogação"(uma verificação ainda a fazer!). Acheimuito interessantes as apreciaçõesdos poetas referenciados (Virgílio Maiae Rogério Lima) pelo seu estilo exu-berante de humor e de riqueza huma-na, em que convive naturalmenteuma multiplicidade de registos; amesma que é sensível, nos poemas,entre o distanciamento lírico de "Ar-chitectura" e a proximidade excessi-va, e mesmo dolorosa, de "No céu temProzac" - para citar os dois poemas

que, por razões diversas, melhor reti-ve após a leitura. Como talvez saibaatravés do Carlos Moisés, sou umaplatonista (às vezes pessoanista), re-mediada com o ensino do Latim - que,aliás, gosto de ensinar; a dispersão deactividades e a acumulação de auto-res, que é o nosso tempo presente,torna assim mais preciosa a oportu-nidade de convívio com outros modosde exprimir poesia - como para mimfoi, flagrantemente, a leitura de Es-tudos & Catálogos-Mãos. Duplamentegrata por "este abraço" que os acom-panha, cumprimenta cordialmente aMaria Teresa AzevedoTEREZINHA CARVALHO DE MORAIS:Amigo-poeta: Quatro paredes,um goled’água,um galo calado,umas pontasquebradas,um riso esquecido,uns pa-peis amassados,uma cadeira amare-la e naquele amarelo não tingido apriori de mim encolhida, embebida,alimentando-me da tarde e da intros-peccão embriagadora nas horas dasquatro- era só um dia de sol, de ser-tão, de feijão, de abril e de poesia, ede carta. de carta?! sim, de carteiroe tudo com correspondência timbra-da: JP. No amarelo em mãos reconhe-ci o meu corajoso nome, era paramim(fiquei azul de curiosidade). comoum amarelo viajado poderia ter sidoenviado para mim? Como descobri-ram-me neste invólucro de poesias,sonhos e cajus? a tarde recolhia-se eabraçava a noite. Quem me desco-briu? quem? Foi ele,sim foi ele! O va-queiro que faz sua sorte, o dono dasmãos que tercem as manhas e quesabe fazer arte na vida, aquele que verferrar o boi dos sonhos de menino, avoz daquele que abóia aos ventos,odono do perfume que banha a aurorae que ler o mundo com a empiria dossábios. Sim foi ele, o meu amigo, umamigo sim que presenteou-me sur-presas e palavras colhida dos tempos,um amigo desconhecido e hábil queofereceu-me o cálice da doce sensa-ção de ser descoberta. Eu tinha umamigo e nem sabia. sim ele era, eleera um amigo-poeta. E o amarelo?! eo azul?! e o fim de tarde?! Tingiram-se todos de cores: de soares, de feito-sas, de terezas, de marias, rúis, vir-gílios, rosas e de poesias. Valeu mes-

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mo! Queria oferecer-lhe amigo-poetaalgo de pincelada minha mas não seise devo e fica a interrogação se dese-jarias algo assim tanto tempo enga-vetada no sonho de menina junto comos grilos, os aninhos, os sonhos e ocheiro de café de lenha da simplici-dade das horas.VALDIR ROCHA: Ca-ríssimo Poeta Feito-sa, recebi suas pala-vras impressas, comessa boa nova das Edi-ções Cururu. Alvíssa-ras! Pressinto quevem por aí algo quepoderá crescer - bas-ta que o seu editorassim o queira -,para resultar numa editora ímpar compés firmes na poesia e na ficção. Pen-se alto - ainda que sem ambi-ção pes-soal -, pois que poderá fazer à litera-tura brasileira impressa uma bonda-de igual à que fez virtualmente, comseu site tão apreciado. Quanto ao seuPrefácio, noto ne-le o sabor, tão bom,de seu estilo pes-soal, pois que “Aodono, indelegável, personalíssimo, odireito de ferrar”. Ora, se o Prefácio éseu, com justiça, nele deixou suamarca: SF Abraço grande do ValdirRocha.VICENTE FREITAS: Meu caro SoaresFeitosa, Acabei de ler agora medita-damente o seu Estudos & Catálogos -Vicente Freitas Mãos. Não vou perdertempo em elogios: quanto ao estilo —uma linguagem inventiva, enfim, umesplêndido Prefácio e não estou fazen-do a menor concessão para afirmaresplêndido. Estou com Mário de An-drade quando dizia que a arte é umelemento de vida e não de sobrevivên-cia; que a beleza não é a finalidademesma da arte, mas uma conseqü-ência. Quanto ao admirável VirgílioMaia tenho lido alguns poemas de sua

lavoura, inclusiveEsporas de Prata,que chegou-me àsmãos através deum encarte do jor-nal O Pão; poemaque se desenvolvedentro de uma te-

mática regional, com elmentos gráfi-cos que ressaltam essa temática. Eessa diferenciação gráfica tem um ob-jetivo: aproximar a grafia às marcarde ferrar gado.Pelo seu prefácio per-cebe-se que a o livro Recordel segue omesmo tema. Em tempo: ao receberEstudos & Catálogos - Mãos fiquei pas-mo e ao ler, como Mestre Ascendino:ferrado! Gratíssimo. Vicente FreitasWELINTON ALMEIDA PINTO: Preza-do Poeta, recebi e gostei do texto-pre-fácio do livro Recordel, de VirgílioMaia. Além de me desperar para aobra, me resgata o cheiro bom da vidano campo. Ah! Especialmente paraum mineiro que tem no mugido da "es-trela" uma das melhores lembrançasda infância na roça. Gostoso de ler.Existe um escritor goiano, Hugo Car-valho Ramos, que, se ainda não leu,vale a pena degustar. Morreu muitonovo mas deixou uma preciosidade daliteratura sertaneja, o livro TROPASE BOIADAS - com certeza bem apreci-ado por Guimarães Rosa. Com a esti-ma e o abraço, WelingtonXENIA ANTUNES: Caro Soares, rece-bi e agradeço o envio do Estudos e Ca-tálogos - Mãos. Desculpe a demora emresponder, mas estou (es-tamos todos) às voltascom uma praga de vírus(esse é brabo) e tenhoque ter cuidado triplica-do com tudo o que entrae sai, além dos procedi-mentos de rodar antiví-rus duas, três vezes por dia (já recebiuns 600 e-mails, barrados pelo AVG,felizmente). Fora o trabalho, que émuito, nada de férias. Eu fico “de cara”- é, só na gíria mesmo pra expressar -com a sua produção! E vai escreverbem assim na ...cê sabe onde! É umahonra partilhar escrituras com você.E ler o que você escreve é uma dádivaneste mundo literário tão medíocre.O Jornal de Poesia é essencial, vidalonga! Além disso, o seu trabalho dedivulgação dos outros poetas e escri-tores é de uma tremenda generosi-dade, coisa rara! Quando puder enviealgo pra publicarmos na revista A Con-fraria, vai ser um luxo! Um grandeabraço, Xenia. Brasília (Fev/2004)#

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MARIA DA CONCEIÇÃO PARANHOS ANALISA(TOMOGRAFIA CRÍTICA)

UM TEXTO DE SOARES FEITOSA

[…]Arte, coisas — o catálogo das

letras finamente desenhadas. Nem tãograndes a não inutilizarem o couro doanimal com uma mancha exagerada;nem tão miúdas a ponto de o vaquei-ro não as "ler" à média luz, de médiadistância. E sabíamo-las de cor, a re-produzi-las no chão com um gravetofino. E suas serifas. Arte! Aqueles pe-quenos rabichos que rebatem a per-na do A ou repuxam um pequenorabinho duplo na ponta baixa do P.

Conceição Paranhos:Aqui você inicia a inscripção da es-

crita. Leu e foi tomado do que se cha-ma em filosofia existencialista de “cho-que do reconhecimento”. Inicia a ob-servação da encriptagem. Decodifica nomundo empírico. Assim a Arte nos move.

Raciocínio indutivo-dedutivo. Atéaqui, atos do Homem. A partir daqui, atosda Mulher (a Mãe). Paixão e Res-surreição.

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[…] Também do catálogo fêmeo,o desenformar do queijo, desembru-lhando-o, alvíssimo (tomando-lhe osal), úmido, lúbrico, uma tarefa danoite cedo. De mais um pouco, as co-alhadas e suas terrinas, ceia e rezas- d'Ela, minha. E a noite.

Levá-los, queijos, à feira;negociá-los em açúcar, querosene ealguns álcoois são coisas de minhalavra, numa tropa de burros. No ca-valo mais dócil, de parelha com a bur-ra Faceira comigo em cima, Ela. Navolta, um cálice de Imperial. Ou doPorto. Sem esquecer o nome das re-ses. Ela quem ajuda a escolher. Flordo Pasto à vaca “mais bonita do lu-gar”, Ela disse. [Eu disse: Flor, tu!] Otouro Canário, lhe botei este nome,aos canários de um certo alpendre.Ela sorriu. Mas zombou que noutrascasas, de alpendres e saias, havia ca-nários. Eu disse que não seriam ama-relos tanto quanto.

Ah! o catálogo das águas?! Aque-le cavar, escolher onde cavar, recavar(porque tudo que um dia eu cavo, acheia vem e entope), coisas minhas,catálogo meu. Encher os cântaros —cabaças, roupas, lajedos, moitas demelão São Caetano, perfumar as re-des em sol de capim-santo... falemcom Ela, digam que fui eu que disse.Mas o fabrico da moringa de sola, ditatambém borracha-de-sola, curtindoantes o couro em cinza e cascas deangico... Assovelar cada uma das

peças em paciência. E Arte. A artedos couros; selas, gibões, peitorais,chinelos, inclusos os d’Ela (com asvaquetas mais tenras); sim, estascoisas estão comigo, sempre estive-ram. Botar a moringa de sola a limparo gosto e o cheiro da sola com tan-tas e tantas águas, falem com Ela.Também os canecos-de-beber, potes,jarras, bandejas, toalhas e ornatosde fino crochê; rendas e bilros; li-nhas brancas e de matiz.

Ainda no catálogo das águas, re-parar no tempo, no "olho" dos formi-gueiros, "profetizar" se vai chover ounão, poupem-na. Se sabe, talvez sai-ba, mas de puro recato, Ela não diz.E o catálogo dos animais. Dizemosanimais tão-só aos cavalos, burros ejumentos - e dalgum político mal-abuzado. Gado é gado! Peá-los acampo, encabrestá-los, montá-losbravios, a pulso e ordem — cavalos eburros; jumentos não, que são dó-ceis e calmos de natureza — não re-metam a Ela, tarefa minha, só minha.

Aos animais miúdos, patos, gali-nhas, pavões, perus, e os pássarosde dentro de casa — "assum-preto"— soltos, Ela quem os dirige. Ninhos— pô-los a pôr, deitá-los, tirá-los, oprimeiro xerém, falem com Ela, porfavor, que não entendo dessas artes.Espingardear os inimigos, costurá-losà faca? Ela está inocente, mas sabe-rá desembrulhar seus mortos.

Conceição Paranhos:Essa suspensão de palavras com

“E a noite” é a fonte da perdição e daculpa, da descoberta das saídas e dacompreensão dos mistérios da vida. DaVida. Conceição Paranhos:

Leo Spitzer fala de “enumeração caó-tica”, traço de estilo que imprime aoato assim enumerador uma nova formade percepção de mundo. Isto está aquino seu texto.

Conceição Paranhos:Lirismo e encantamento, da magia,

do oculto, do inconsciente e de suaprojeção em júbilo. Conceição Paranhos:

Ordenação do mundo incons-ciente,condução de seus lucros para oconsciente, abolido (felizmente) osuperego.

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Ia-me esquecendo, uma tarefamuito d'Ela: fazer, em letra calma, unspapeluchos «Ave Maria concebida sempecados, rogai por...», a apregá-los(com um grude ligeiro, de goma, feitono bico da colher, na chapa do fogãode lenha); isto mesmo, pregá-los pelolado de dentro, em todas as portas,em todas as janelas. Também nos cur-rais quando os bichos adoecem, nosmoirões da porteira, protegendo a nóstodos, brutos e viventes. Contra osde fora! Por dentro. E "esquecer" umdesses papéis no fundo do bolso domeu gibão. Percebo que Ela o trocaquando o suor do rosto... mãos...papel. Um longo aboio. Amarfanhado.

[…] O catálogo das cercas. So-mos terra e cercas. Daqui para fren-te, não! Um risco no chão e se le-vantam marcos. Cercas. O catálogoabrange a cerca de jangarela, ditatambém de rama ou de ramada; asde lombo; as de arame de três per-nas mais os estacotes na vertical; asde arame com doze fios, à prova debodes e bacorinhos; as de fachina (defachos, verticais, especantes) commoirões de sabiá a insultar com o tem-po; mais as cercas modelo Piauí: qua-tro fios de arame por sobre uma mu-ralha justaposta, exata, construída àeternidade com as pedras dePiracuruca, léguas e léguas, vide es-trada de rodagem Altos-Campo Mai-or-Piripiri.

Dizem que ninguém mais sabe fa-zer uma muralha inca. As pedras ta-lhadas à mão destra, justas, sememendas, nem cimentos; ou, pelo con-trário, as mãos é que já nasciam ta-lhadas em pedra. O que fazer agorado nosso catálogo de hinos do santopadroeiro, dos desenhos dasfarinhadas, dos engenhos da rapadu-ra, caieiras, tijolos, telhas, cal, pi-ões, cumeeiras, biqueiras — o quemais, meu Deus? — se do sertão, di-zem que acabou, resta apenas umjuazeiro com a gente debaixo (INSS)jogando sinucas?

Conceição Paranhos:Embora em todo o texto você

mostre semelhanças com Borges, émesmo de Kafka - mestre de Borges - oseu manejo da palavra em função de umasignificação que preserva o sentido darealidade empírica, todavia conduzida demodo lúdico e encan-tatório (mais umavez e sempre no seu texto).mesmo deKafka - mestre de Borges - o seu manejoda palavra em função de umasignificação que preserva o sentido darealidade empírica, todavia conduzida demodo lúdico e encan-tatório (mais umavez e sempre no seu texto).

Conceição Paranhos:Os limites. Escrita extremamente

erótica, mais ainda, lúbrica, aprisiona-da, para não se perder, nos limites dalinguagem que expressa uma percep-ção e experienciação violentas da vida.Séries metafóricas, todas fálicas.

Conceição Paranhos:Continua a trabalhar a lubricidade

— o delírio na linguagem — e sobrevéma queda na tragédia da história.

Conceição Paranhos:A origem de SUA poiésis. Ca-

tálogos! O catálogo dos Doze - tribos eapóstolos. Trivium e quatrivium, ou,digamos... uma lista... a lista dos galos.Galos? Sim, galos, manhãs e auroras.Ou da tarde rubra (Gular), num sa-guãode sombras, cimento, o olho em riste,desafiante, galo-galo: - De que medefendo?

Os catálogos. As Leis. A legisla-ção, o código, os códigos, a pólis - le-gislação eidética, a moira e a hýbrisconduzindo a palavra poética. Amplia-ção, redução, mergulho na memória in-dividual e histórica, bíblica. Os Dozeexorcizam os próximos passos na suaescrita.

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Não! Não e não! Quem saberá,daqui mais uns dias, no catálogo dascoisas de comer, notícias de um chou-riço, que era apenas um estranhodoce de sangue de porco? Um docede sangue de porco? Talvez fosse nos-sa herança marrana a desmentir aomundo a possível condição de cris-tãos-novos.

Lubricamente matávamos o por-co: as mãos viajando no quente dasvísceras... Só quem já matou é quemsabe como é. A festa, os rins do bi-cho, assando-os ligeiros, afogueando-os ao primeiro trago. E a matutagem,um ritual de amizades em que meta-de ou mais das carnes saíam gratui-tas, de puro gáudio, à certeza da re-tribuição quando do próximo porco dovizinho.

Falemos agora da sorte. Sorte devaqueiros, sorte de leitor. Há de tersorte para abrir um livro. Abri-lo napágina certa, no poema certo. Degostar ou não gostar. No primeiro lan-ce, um lance de mãos. Foi assim queabri este. A esmo. O poema As Horasdo Dia. Comecei pela Hora Uma:

O dia vai começandoe diante d'Ele me calo.No seio da escuridãose escuta assim um abalo:toda a caatinga estremece,pois mais parece uma preceo primo cantar do galo.

A emoção me disse que o fechas-se imediatamente. Nessa mania deachar as coisas com as mãos comosói acontecer com os cegos, reabro-o, momentos depois, bem em cima daestrofe da quinta hora, que, noutrocanto, um dia, cantei (Antífona):

Pontualmente,de manhã bem cedo,pontualmente:o sol,o galo,a aurora,a lufada do vento,a manhãzinha,o café forte,a porta aberta.

Mais um entalo. E outro silêncio,a suspendê-lo só bem depois, paracorrer, na calma, o livro inteiro. Umdefeito gravíssimo, a droga deste li-vro: é um só! Devia ser cem, um cen-to. Em multi. Sons. Aboios. Poeiras.Cinzas e memória. Pior é o seu autor:também único. E os juazeiros fervi-lhando de sinucas...

Conceição Paranhos:Lautréammont conhecia, como

você, este mundo de sangue e víscerasfumegantes.

Conceição Paranhos:A redenção operada pelo conhe-

cimento (no sentido bíblico) da palavracomo gatilho das emoções mais fortes,a partir do ato de abertura do mistériodo livro que, não tenho dúvidas, “cai” emdo livro que, não tenho dúvidas, “cai” emnossas mãos quando dele mais ca-recemos e nos ajuda a discernir algumas

Conceição Paranhos:Os cegos. São eles que têm o poder

da clarividência, personagens ou mo-tivos de sub-rogação, freqüentes na tra-dição literária / poética, para indica-rema ruptura com a visão comum, de su-perfície, e o ingresso no proto-, prete-,inter-, intra-, super- e hipernatural.

Conceição Paranhos:Ah, este entalo! Ah, este silêncio! Ah,

este porque se é “trezentos, trezentose cinqüenta” - e o poeta Mário de Andra-de só estava usando um eufemismo ouuma metonímia - e porque se tem acapacidade de ouvir e entenderestrelas.#

das faces da inominabilidade (do“indizível”, como preferiam os poetas doRomantismo, em seu movi-mento destreben ins Unendlich).