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Realismo e Naturalismo A partir da segunda metade do século 20, as concepções estéticas que nortearam o ideário romântico começaram a perder espaço. Uma nova tendência, baseada na trama psicológica e em personagens inspirados na realidade, toma conta da literatura ocidental. Estava inaugurado o Realismo-Naturalismo. No Brasil, essa passagem ocorre em 1881, com a publicação de Memória Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis (1839-1908), e de O Mulato, de Aluísio Azevedo (1857-1913). Enquanto o livro de Machado apresenta acentuado viés realista, o de Aluísio é claramente naturalista. Realismo O Realismo brasileiro é completamente diferente do europeu. A obra de seu principal autor, Machado de Assis, escapa de qualquer tentativa de classificação esquemática. Na fase madura, Machado produz uma literatura essencialmente problematizadora. Com minuciosa investigação psicológica, ele indaga a existência humana. Ele ainda substitui o determinismo biológico por acentuado pessimismo existencialista e discute temas como a relatividade da loucura e a exploração do homem pelo próprio homem. A intertextualidade e a metalinguagem marcam o estilo de Machado. O uso da linguagem poética, do jogo proposital de ambigüidades, da recuperação de lugares comuns e do microrrealismo psicológico também são características fundamentais da obra machadiana. Dom Casmurro, Esaú e Jacó eMemorial de Aires são alguns romances do autor. Naturalismo O principal autor naturalista no Brasil é Aluísio Azevedo. O determinismo social predomina em sua obra, construída através de observação rigorosa do mundo físico e da zoomorfização das personagens. Aluísio é autor de O mulato, Casa de pensão e O cortiço, obras com acentuado caráter investigativo e cuidadosa análise de comportamentos sociais. Com o que ficar atento? A riqueza literária do Realismo-Naturalismo no Brasil não se restringe à prosa de ficção. A dramaturgia também evolui e consolida a comédia de costumes como um gênero maior na obra de França Júnior e Artur Azevedo, por exemplo.

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Revisao

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Realismo e Naturalismo

A partir da segunda metade do sculo 20, as concepes estticas que nortearam o iderio romntico comearam a perder espao. Umanova tendncia, baseada na trama psicolgica e em personagens inspirados na realidade, toma conta da literatura ocidental. Estava inaugurado o Realismo-Naturalismo.No Brasil, essa passagem ocorre em 1881, com a publicao deMemria Pstumas de Brs Cubas, de Machado de Assis (1839-1908), e deO Mulato, de Alusio Azevedo (1857-1913). Enquanto o livro de Machado apresenta acentuado vis realista, o de Alusio claramente naturalista.RealismoO Realismo brasileiro completamente diferente do europeu. A obra de seuprincipalautor, Machado de Assis, escapa de qualquer tentativa de classificao esquemtica.Na fase madura, Machado produz uma literatura essencialmente problematizadora. Com minuciosa investigao psicolgica, ele indaga a existnciahumana. Ele ainda substitui o determinismo biolgico por acentuado pessimismo existencialista e discute temas como a relatividade da loucura e a explorao do homem pelo prprio homem.

A intertextualidade e a metalinguagem marcam o estilo de Machado. O uso da linguagem potica, do jogo proposital de ambigidades, da recuperao de lugares comuns e do microrrealismo psicolgico tambm socaractersticas fundamentaisda obra machadiana.Dom Casmurro,Esa e JaceMemorial de Airesso alguns romances do autor.

NaturalismoO principal autor naturalista no Brasil Alusio Azevedo. O determinismo social predomina em sua obra, construda atravs de observao rigorosa domundo fsicoe da zoomorfizao das personagens. Alusio autor deO mulato,Casa de pensoeO cortio, obras com acentuado carter investigativo e cuidadosa anlise decomportamentos sociais.

Com o que ficar atento?A riqueza literria do Realismo-Naturalismo no Brasil no se restringe prosa de fico. A dramaturgia tambm evolui e consolida a comdia de costumes como um gnero maior na obra de Frana Jnior e Artur Azevedo, por exemplo.

Vale lembrar que o Realismo-Naturalismo brasileiro oferece amplo painel de uma poca em que o pas era monrquico, escravocrata, patriarcalista e passava por profundas mudanas socioeconmicas e culturais.

Como pode cair novestibular?Muitos vestibulares tem cobrado conhecimentos sobre a obra de Machado de Assis e os temas problematizados pelo autor, como a prpria vida e a literatura.

Como j caiu no vestibular?(PUC-SP) No romanceDom Casmurro, o narrador declara: "O meu fim evidente era atar asduas pontasda vida, e restaurar na velhice a adolescncia". Entre as duas pontas, desenvolve-se o enredo da obra. Assim, indique a seguir a alternativa cujo contedo no condiz com o enredo machadiano.

a) A histria envolve trs personagens, Bentinho, Capitu e Escobar, e trs projetos, todos cortados quando pareciam atingir a realizao.b) O enredo revela um romance da dvida, da solido e da incomunicabilidade, na busca do conhecimento da verdade interior de cada personagem.c) A narrativa estrutura-se ao redor do sentimento de cime, numa linha de ascenso de construo de felicidade e de disperso, com a felicidade destruda.d) A narrativa se marca por digresses que chamam a ateno para a inevitabilidade do que vai narrar, como o que ocorre na analogia da vida com a pera e em que o narrador afirma "cantei um duo ternssimo, depois um trio, depois um quattuor..."e) O enredo envolve um tringulo amoroso aps o casamento e todas as aes levam a crer na existncia clara de um adultrio.GabaritoResposta correta:EComentrio:Narrado sob a perspectiva viciada e unilateral de um narrador personagem tendencioso, o romance Dom Casmurro construdo sob o signo da incerteza.

Verbos

Verbos se flexionam em:Pessoa 1, 2, 3;Tempo Presente, pretrito, futuro...;Modo Indicativo, Subjuntivo, Imperativo;Nmero Singular e Plural;Voz Ativa, passiva, reflexiva;Verbo a palavra essencial para exprimir uma ideia ou apresentar um enunciado.INDICA:Ao Vanilda andava pela escola.Estado Iago estava apaixonado.Desejo Queria muito uma escola na praia.Fenmeno da natureza Choveu sem parar naquele dia.

CONJUGAO O QUE ?

Trata-se do conjunto de formas dessa categoria gramatical para a estruturao de um pensamento. Tais como: pessoa, nmero, modo, tempo e voz.

PESSOA E NMEROO verbo concorda com o ser ou coisa que pratica a ao.As pessoa so trs e podem estar no singular ou no plural.Exemplo:Eu falo, Tu falas, Ele fala, Ns falamos, Vs falais, Eles falam.

TEMPOA flexo de tempo indica o momento em que se d o fato expresso pelo verbo:Presente. O fato ocorre no momento em que se fala: Ana Paula espera a filha na escola.

Pretrito (passado). O fato j ocorreu: Osalunoschegaram atrasados.

Futuro. O fato ainda vai ocorrer: Assistirei aofilmeno domingo.

Tempos compostos verbo auxiliar e um principal: Jssica estava vindo para a escola.

MODOIndica a maneira e a circunstancia em que o fato descrito. So trs:Indicativo O fato dado como certo, real, definitivo:Ex.: Francilio Pensa de maneira erradasobreesse assunto.

Subjuntivo O fato apresentado de modo duvidoso, incerto, hipottico: Ex.: No acredito que ele consiga fazer esse servio.

Imperativo A pessoa que fala manifesta umpedido, convite, determinao ou desejo: Ex.: Faa o que eu estou dizendo.

O imperativo pode ser positivo ou negativo:Chegue na hora./No perca a conduo.

FORMAS NOMINAISExistem formas verbais que podem desempenhar a funo de substantivos, adjetivos e advrbios (nomes) em determinadas situaes.

So:O infinitivo Havia muito para fazer.O gerndio O vero est chegando.O particpio Encerradoo espetculo, todos saram.

O infinitivo pode ser pessoal ou impessoal. Denomina-se:1. pessoal, quando tem sujeito:Para sermos vencedores preciso lutar. [sujeito: ns]2. Impessoal, quando no tem sujeito:Ser ou no ser, eis a questo. (Shakespeare)

O infinitivo pessoal ora se apresenta flexionado, ora no-flexionado:

1. flexionado: andares tu, andarmos ns, andardes vs, andarem eles2. no-flexionado: andar eu, andar eleV O ZDesigna o modo pelo qual o sujeito se relaciona com o verbo. So trs:1. Ativa. O sujeito o agente, pratica a ao expressa pelo verbo:Os laboratrios pesquisam substncias e fabricam remdios.2. Passiva. O sujeito sofre a ao expressa pelo verbo:Pesquisam-se substncias./ Os remdios so fabricados pelos laboratrios.2a.Analtica. a passiva formada pelos verbos ser e estar mais particpio do verbo principal: A escola foi elogiada por todos./ A rvore estava plantada.2b. Sinttica (ou pronominal). constituda pelo pronome se, com o verbo naterceira pessoa, e o verbo concorda com o sujeito: Ex.: Aluga-se apartamento, alugam-se apartamentos.3. Reflexiva. O sujeito pratica e recebe a ao: O jogador machucou-se num lance sem bola./Deitou-se bem cedo./ Lavou-se cuidadosamente.

ELEMENTOS ESTRUTURAIS DO VERBOO verbo pode apresentar, em sua estrutura ou formao, os seguintes elementos mrficos: radical, vogal temtica, tema e desinncias. Vejamos cada elemento.RADICAL o elemento mrfico bsico que contm a significao do verbo.Observe: falou/falo/falamos/falarei/falasseSe tirarmos as terminaes do infinitivo impessoal (-ar, -er ou ir) de um verbo, teremos o radical desse verbo. Veja:Fal-ar prend-er sorr-irradical radical radicalFORMAS RIZOTNICAS E ARRIZOTNICASFormas rizotnicas so aquelas em que o acento tnico recai no radical: compro, pensas, vendem, parte.Formas arrizotnicas so aquelas em que o acento tnico recai fora do radical: compramos, pensais, vendeis, partimos.VOGAL TEMTICATem como funo preparar o radical para ser acrescido pelas desinncias e tambm indicar a conjugao a que o verbo pertence.Exemplo: cantar, vender, partir.OBSERVAO:Nem todas as formas verbais possuem a vogal temtica.Exemplo: parto (radical + desinncia)TEMA o radical com a presena da vogal temtica. Exemplo: choro, canta.

DESINNCIA o elemento final do verbo que designa o modo e o tempo (desinncia modo-temporal), o nmero e a pessoa (desinncia nmero-pessoal), em que o verbo est flexionado.A DESINNCIA MODO-TEMPORAL indica o modo e o tempo do verbo.Exemplo: cant va mos Radical v.t d.m.t d.n.pv.t vogal temticad.m.t desinncia modo-temporald.n.p desinncia nmero-pessoalnamoravam d. m. t. do pret. Imp. do indicativoDissramos d.m.t. do pret. Mais-que-perfeito do indicativoOuvirias d.m.t. do fut. do pret. do indicativoA desinncia modo-temporal no est presente em todos os tempos verbais; alguns apresentam apenas a desinncia nmero-pessoal, como ocorre no pretrito perfeito do indicativo: beija-ste, beija-mos.A DESINNCIA NMERO-PESSOAL indica o nmero e a pessoa do verbo. Exemplo:namorvamos desinncia nmero-pessoal (1 p. do pl.)disssseis d. nmero-pessoal (2 p. do pl.)Ouviriam d. nmero-pessoal (3 p. do pl.)

Memrias Pstumas de Brs Cubas

Ao criar um narrador que resolve contar sua vida depois de morto, Machado de Assis muda radicalmente o panorama da literatura brasileira, alm de expor de forma irnica os privilgios da elite da poca.

ResumoA infncia de Brs Cubas, como a de todo membro da sociedade patriarcal brasileira da poca, marcada por privilgios e caprichos patrocinados pelos pais. O garoto tinha como brinquedo de estimao o negrinho Prudncio, que lhe servia de montaria e para maus-tratos em geral. Na escola, Brs era amigo de traquinagem de Quincas Borbas, que aparecer no futuro defendendo o humanitismo, misto da teoria darwinista com o borbismo: Aos vencedores, as batatas, ou seja: s os mais fortes e aptos devem sobreviver.

Na juventude do protagonista, as benesses ficam por conta dos gastos com uma cortes, ou prostituta de luxo, chamada Marcela, a quem Brs dedica a clebre frase: Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de ris. Essa uma das marcas do estilo machadiano, a maneira como o autor trabalha as figuras de linguagem. Marcela prostituta de luxo, mas na obra no h, em nenhum momento, a caracterizao nesses termos. Machado utiliza a ironia e o eufemismo para que o leitor capte o significado. Brs Cubas no diz, por exemplo, que Marcela s estava interessada nos caros presentes que ele lhe dava. Ao contrrio, afirma categoricamente que ela o amou, mas fica claro que, naquela relao, amor e interesse financeiro esto intimamente ligados.

Apaixonado por Marcela, Brs Cubas gasta enormes recursos da famlia com festas, presentes e toda sorte de frivolidades. Seu pai, para dar um basta situao, toma a resoluo mais comum para as classes ricas da poca: manda o filho para a Europaestudarleis e garantir o ttulo de bacharel em Coimbra.

Brs Cubas, no entanto, segue contrariado para a universidade. Marcela no vai, como combinara, despedir-se dele, e a viagem comea triste e lgubre.

Em Coimbra, a vida no se altera muito. Com o diploma nas mos e total inaptido para o trabalho, Brs Cubas retorna ao Brasil e segue sua existncia parasitria, gozando dos privilgios dos bem-nascidos do pas.

Em certo momento da narrativa, Brs Cubas tem seu segundo e mais duradouro amor. Enamora-se de Virglia, parente de um ministro da corte, aconselhado pelo pai, que via no casamento com ela um futuro poltico. No entanto, ela acaba se casando com Lobo Neves, que arrebata do protagonista no apenas a noiva como tambm a candidatura a deputado que o pai preparava.

A famlia dos Cubas, apesar de rica, no tinha tradio, pois construra a fortuna com a fabricao de cubas, tachos, maneira burguesa. Isso no era louvvel no mundo das aparncias sociais. Assim, a entrada na poltica era vista como maneira de ascenso social, uma espcie de ttulo de nobreza que ainda faltava a eles.

Lista de personagensBrs Cubas:filho abastado da famlia Cubas, o narrador do livro; conta suas memrias, escritas aps a morte, e nessa condio o responsvel pela caracterizao de todos os demais personagens.

Virglia:grande amor de Brs Cubas, sobrinha de ministro, e a quem o pai do protagonista via como grande possibilidade de acesso, para o filho, ao mundo da poltica nacional.

Marcela:amor da adolescncia de Brs.

Eugnia:a flor da moita, nas palavras de Brs, j que era filha de um casal que ele havia flagrado, quando criana, namorando atrs de uma moita; o protagonista se interessa por ela, mas no se dispe a levar adiante um romance, porque a garota era coxa.

Nh Lo L:ltima possibilidade de casamento para Brs Cubas, moa simples, que morre de febre amarela aos 19 anos.

Lobo Neves:casa-se com Virglia e tem carreira poltica slida, mas sofre o adultrio da esposa com o protagonista.

Quincas Borba:terico do humanitismo, doutrina qual Brs Cubas adere, morre demente.

Dona Plcida:representante da classe mdia, tem uma vida de muito trabalho e sofrimento.

Prudncio:escravo da infncia de Brs Cubas, ganha depois sua alforria.

Sobre Machado de AssisJoaquim Maria Machado de Assis nasceu em 21 de junho de 1839 na cidade do Rio de Janeiro. Neto de escravos alforriados, foi criado em uma famlia pobre e no pode frequentar regularmente a escola. Porm, devido a seu enorme interesse por literatura, conseguiu se instruir por conta prpria. Entre os seis e os quatorze anos, Machado de Assis perdeu sua irm, a me e o pai.

Aos 16 anos, Machado conseguiu um emprego como aprendiz em uma tipografia, vindo a publicar seus primeiros versos no jornal A Marmota. Em 1860 passou a colaborar para o Dirio do Rio de Janeiro e dessa dcada que datam quase todas suas comdias teatrais e Crislidas, um livro de poemas.

Em 1869 Machado de Assis casou-se com Carolina Augusta Xavier de Novais sem o consentimento da famlia da moa, devido m fama que Machado carregava. Porm, este casamento mudou sua vida, uma vez que Carolina lhe apresentou literatura portuguesa e inglesa. Mais amadurecido literariamente, Machado publica na dcada de 1870 uma srie de romances, tais como A mo e a luva (1874) e Helena (1876), vindo a obter reconhecimento do pblico e da crtica. Ainda na dcada de 1870, Machado iniciou sua carreira burocrtica e em 1892 j ocupava o cargo de diretor geral do Ministrio da Aviao. Atravs de sua carreira no servio pblico, Machado de Assis conseguiu sua estabilidade financeira.

A obra literria de Machado era marcadamente romntica, mas na dcada de 1880 ela sofre uma grande mudana estilstica e temtica, vindo a inaugurar o Realismo no Brasil com a publicao de Memrias Pstumas de Brs Cubas (1881). A partir de ento a ironia, o pessimismo, o esprito crtico e uma profunda reflexo sobre a sociedade brasileira se tornaro as principais caractersticas de suas obras. Em 1897, Machado funda a Academia Brasileira de Letras, sendo seu primeiro presidente e ocupando a Cadeira N 23.

Em 1904, Machado perde a esposa aps um casamento de 35 anos. A morte de Carolina abalou profundamente o escritor, que passou a ficar isolado em casa e sua sade foi piorando. Dessa poca datam seus ltimos romances: Esa (1904) e Jac Memorial de Aires (1908). Machado morreu em sua casa no Rio de Janeiro no dia 29 de setembro de 1908. Seu enterro foi acompanhado por uma multido e foi decretado luto oficial no Rio de Janeiro.

Seus principais romances so: "Ressurreio" (1872), "A mo e a luva" (1874), "Helena" (1876), "Iai Garcia" (1878), "Memrias Pstumas de Brs Cubas" (1881), "Quincas Borba" (1891), "Dom Casmurro" (1899), "Esa e Jac" (1904) e "Memorial de Aires" (1908). Alm dessas obras, Machado de Assis possui uma extensa bibliografia que abrange poemas, contos e peas teatrais. AnaliseAo criar um narrador que resolve contar sua vida depois de morto, Machado de Assis muda radicalmente o panorama da literatura brasileira, alm de expor de forma irnica os privilgios da elite da poca.

NarradorA narrao feita em primeira pessoa e postumamente, ou seja, o narrador se autointitula um defunto-autor um morto que resolveu escrever suas memrias. Assim, temos toda uma vida contada por algum que no pertence mais ao mundo terrestre. Com esse procedimento, o narrador consegue ficar alm de nosso julgamento terreno e, desse modo, pode contar as memrias da forma como melhor lhe convm.

Foco NarrativoCom a narrao em primeira pessoa, a histria contada partindo de um relato do narrador-observador e protagonista, que conduz o leitor tendo em vista sua viso de mundo, seus sentimentos e o que pensa da vida. Dessa maneira, as memrias de Brs Cubas nos permitiro ter acesso aos bastidores da sociedade carioca do sculo XIX.

TempoA obra apoiada em dois tempos. Um o tempo psicolgico, do autor alm-tmulo, que, desse modo, pode contar sua vida de maneira arbitrria, com digresses e manipulando os fatos revelia, sem seguir uma ordem temporal linear. A morte, por exemplo, contada antes do nascimento e dos fatos da vida.

No tempo cronolgico, os acontecimentos obedecem a uma ordem lgica: infncia, adolescncia, ida para Coimbra, volta ao Brasil e morte. A estranheza da obra comea pelo ttulo, que sugere as memrias narradas por um defunto. O prprio narrador, no incio do livro, ressalta sua condio: trata-se de um defunto-autor, e no de um autor defunto. Isso consiste em afirmar seus mritos no como os de um grande escritor que morreu, mas de um morto que capaz de escrever.

O pacto de verossimilhana sofre um choque aqui, pois os leitores da poca, acostumados com a linearidade das obras (incio, meio e fim), veem-se obrigados a situar-se nessa incomum situao.

No-realizaesPublicado em 1881, o livro aborda as experincias de um filho abastado da elite brasileira do sculo XIX, Brs Cubas. Comea pela sua morte, descreve a cena do enterro, dos delrios antes de morrer, at retornar a sua infncia, quando a narrativa segue de forma mais ou menos linear interrompida apenas por comentrios digressivos do narrador.

O romance no apresenta grandes feitos, no h um acontecimento significativo que se realize por completo. A obra termina, nas palavras do narrador, com um captulo s de negativas. Brs Cubas no se casa; no consegue concluir o emplasto, medicamento que imaginara criar para conquistar a glria na sociedade; acaba se tornando deputado, mas seu desempenho medocre; e no tem filhos.

A fora da obra est justamente nessas no-realizaes, nesses detalhes. Os leitores ficam sempre espera do desenlace que a narrativa parece prometer. Ao fim, o que permanece o vazio da existncia do protagonista. preciso ficar atento para a maneira como os fatos so narrados. Tudo est mediado pela posio de classe do narrador, por sua ideologia. Assim, esse romance poderia ser conceituado como a histria dos caprichos da elite brasileira do sculo XIX e seus desdobramentos, contexto do qual Brs Cubas , metonimicamente, um representante.

O que est em jogo se esses caprichos vo ou no ser realizados. Alguns exemplos: a hesitao ao comear a obra pelo fim ou pelo comeo; comparar suas memrias s sagradas escrituras; desqualificar o leitor: dar-lhe um piparote, cham-lo de brio; e o prprio fato de escrever aps a morte. Se Brs Cubas teve uma vida repleta de caprichos, em virtude de sua posio de classe, natural que, ao escrever suas memrias, o livro se componha desse mesmo jeito.

O mais importante no a realizao ou no dessas veleidades, mas o direito de t-las, que est reservado apenas a uns poucos da sociedade da poca. Veja-se o exemplo de Dona Plcida e do negro Prudncio. Ambos so personagens secundrios e trabalham para os grandes. A primeira nasceu para uma vida de sofrimentos: Chamamos-te para queimar os dedos nos tachos, os olhos na costura, comer mal, ou no comer, andar de um lado pro outro, na faina, adoecendo e sarando, descreve Brs. Alm da vida de trabalhos e doenas e sem nenhum sabor, Dona Plcida serve ainda de libi para que Brs e Virglia possam concretizar o amor adltero numa casa alugada para isso.

Com Prudncio, v-se como a estrutura social se incorpora ao indivduo. Ele fora escravo de Brs na infncia e sofrera os espancamentos do senhor. Um dia, Brs Cubas o encontra, depois de alforriado, e o v batendo num negro fugitivo. Depois de breve espanto, Brs pede para que pare com aquilo, no que prontamente atendido por Prudncio. O ex-escravo tinha passado a ser dono de escravo e, nessa condio, tratava outro ser humano como um animal. Sua nica referncia de como lidar com a situao era essa, afinal era o modo como ele prprio havia sido tratado anteriormente. Prudncio no hesita, porm, em atender ao pedido do ex-dono, com o qual no tinha mais nenhum tipo de dvida nem obrigao a cumprir.

Os personagens da obra so basicamente representantes da elite brasileira do sculo XIX. H, no entanto, figuras de menor expresso social, pertencentes escravido ou classe mdia, que tm significado relevante nas relaes sociais entre as classes. Assim, "Memrias Pstumas de Brs Cubas", alm de seu enorme valor literrio, funciona como instrumento de entendimento desse aspecto social de nossas classes, como se ver adiante nas caracterizaes de Dona Plcida e do negro Prudncio.

A sociedade da poca se estruturava a partir de uma diviso ntida. Havia, de um lado, os donos de escravos, urbanos e rurais, que constituam a classe mandante do pas. Esto representados invariavelmente como polticos: ministros, senadores e deputados. De outro, a escravido a responsvel direta pelo trabalho e pelo sustento da nao e, por assim dizer, das elites. No meio, h uma classe mdia formada por pequenos comerciantes, funcionrios pblicos e outros servidores, que so dependentes e agregados dos favores dos grandes privilegiados.

Comentrio do professorO prof. Roberto Juliano, do Cursinho da Poli, ressalta que "Memrias Pstumas de Brs Cubas" uma obra que revolucionou o romance brasileiro. De cunho realista, mas sem ter as caractersticas da crtica agressiva de outros escritores do Realismo (como Ea de Queirs em Portugal), a fora da obra de Machado de Assis est na crtica sutil e na grande inteligncia do autor. Ao contrrio do j citado escritor portugus Ea de Queirs, que batia de frente com a burguesia, em Memrias Pstumas a crtica feita focando a burguesia por dentro, ou seja, o escritor parte de um ponto de vista mais psicolgico. Atravs disso, consegue-se fazer um combate ao Romantismo em sua essncia atravs de personagens verossmeis que cabe ao leitor julgar e colocando-se em reflexo, por exemplo, a questo da ociosidade burguesa.

Alm disso, o prof. Roberto chama a ateno para o fato de que com esta obra Machado de Assis revolucionou o formato do romance atravs da subverso de padres do Romantismo. Se no romance de praxe escrever uma dedicatria, por exemplo, ele o faz a um verme; ao verme que o corroeu. Outro ponto que pode ser citado como exemplo a quantidade de captulos do livro. Se era comum ter cerca de trinta captulos em um romance, Machado de Assis faz um livro que ultrapassa cem captulos. Porm, alguns deles so extremamente curtos ou so vazios. O aluno deve, ento, ficar atento a estes aspectos formais e em como se faz uma crtica social na obra, finaliza o prof. Roberto.

Dom Casmurro

Publicado pela primeira vez em 1899, "Dom Casmurro" uma dasgrandes obrasde Machado de Assis e confirma o olhar certeiro e crtico que o autor estendiasobre todaa sociedade brasileira. Tambm a temtica do cime, abordada com brilhantismo nesse livro, provoca polmicas em torno do carter de uma das principais personagens femininas da literatura brasileira: Capitu.

ResumoO romance inicia-se numa situao posterior a todos os seus acontecimentos. Bento Santiago, j um homem de idade, conta ao leitor como recebeu a alcunha de Dom Casmurro. A expresso fora inventada por um jovem poeta, que tentara ler para ele no trem alguns de seus versos. Como Bento cochilara durante a leitura, o rapaz ficou chateado e comeou a cham-lo daquela forma.

O narrador inicia ento o projeto de rememorar sua existncia, o que ele chama de "atar asduas pontasda vida". O leitor apresentado infncia de Bentinho, quando ele vivia com a famlia num casaro da rua de Matacavalos.

O primeiro fato relevante narrado tambm seu primeiro motivo de preocupao. Bentinho escuta uma conversa entre Jos Dias e dona Glria: ela pretende mand-lo ao seminrio no cumprimento de uma promessa feita pouco antes de seu nascimento. A me, que j havia perdido um filho, prometera que, se o segundo filho nascesse "varo", ela faria dele padre. Na conversa, dona Glria soubera da amizade estreita entre o menino e a filha de Pdua, Capitolina.

Bentinho fica furioso com Jos Dias, que o denunciara, e expe a situao a Capitu. A menina ouve tudo com ateno e comea a arquitetar uma maneira de Bentinho escapar do seminrio, mas todos os seus planos fracassam. O garoto segue para o seminrio, mas, antes de partir, sela, com um beijo em Capitu, a promessa de que se casaria com ela.

No seminrio, Bentinho conhece Ezequiel de Souza Escobar, que se torna seumelhor amigo. Em uma visita a sua famlia, Bentinho leva Escobar e Capitu o conhece.

Enquanto Bentinho estuda para se tornar padre, Capitu estreitarelaes comdona Glria, que passa aver combons olhos a relao do filho com a garota. Dona Glria ainda no sabe, contudo, como resolver o problema da promessa e pensa em consultar o papa. Escobar quem encontra a soluo: a me, em desespero, prometera a Deus um sacerdote que no precisava, necessariamente, ser Bentinho. Por isso, no lugar dele, um escravo enviado ao seminrio e ordena-se padre.

Bentinho vaiestudardireito no Largo de So Francisco, em So Paulo. Quando conclui os estudos, torna-se o doutor Bento de Albuquerque Santiago. Ocorre ento o casamento to esperado entre Bento e Capitu. Escobar, por seu lado, casara-se com Sancha, uma antiga amiga de colgio de Capitu. Capitu e Bentinho formam um "duo afinadssimo".

Essa felicidade, entretanto, comea a ser ameaada com a demora do casal em ter um filho. Escobar e Sancha no encontram a mesma dificuldade: tm uma bela menina, a quem colocam o nome de Capitolina.

Depois de alguns anos, Capitu finalmente tem um filho, e o casal pode retribuir a homenagem que Escobar e Sancha lhe haviam prestado: o filho batizado com o nome de Ezequiel.

Os casais passam a conviver intensamente. Bento v uma semelhana terrvel entre o pequeno Ezequiel e seu amigo Escobar, que, numa de suas aventuras na praia - o personagem era excelente nadador -, morre afogado.

Bento enxerga no filho a figura do amigo falecido e fica convencido de que fora trado pela mulher. Resolve suicidar-se bebendo uma xcara de caf envenenado. Quando Ezequiel entra em seu escritrio, decide matar a criana, mas desiste no ltimo momento. Diz ao garoto, ento, que no seu pai. Capitu escuta tudo e lamenta-se pelo cime de Bentinho, que, segundo ela, fora despertado pela casualidade da semelhana.

Aps inmeras discusses, o casal decide separar-se. Arruma-se uma viagem para a Europa com o intuito de encobrir a nova situao, que levantaria muita polmica. O protagonista retorna sozinho ao Brasil e se torna, pouco a pouco, o amargo Dom Casmurro. Capitu morre no exterior e Ezequiel tenta reatar relaes com ele, mas a semelhana extrema com Escobar faz com que Bento Santiago o rejeite novamente. O destino de Ezequiel infeliz: ele morre de febre tifide durante uma pesquisa arqueolgica em Jerusalm.

Triste e nostlgico, o narrador constri uma casa que imita sua casa de infncia, na rua de Matacavalos. O prprio livro tambm uma tentativa de recuperar o sentido de sua vida. No fim, o narrador parece menosprezar um pouco a prpria criao. Convence-se de que o melhor a fazer agora escrever outra obra sobre "a histria dos subrbios".

Lista de personagensBentinho (Bento Santiago):o narrador-personagem que conta suas memrias, membro da elite carioca do sculo XIX.

Capitu (Capitolina):grande amor de Bentinho, personagem de origem pobre, mas independente e avanada.

Escobar:o melhor amigo de Bentinho, a quem conheceu quando estudaram juntos no seminrio.

Dona Sancha:mulher de Escobar, ex-colega de colgio de Capitu.

Dona Glria:me de Bentinho, adora o filho e tambm muito religiosa. Quer que o garoto se ordene padre como cumprimento de uma promessa que fez.

Jos Dias:agregado que vive de favores na casa de dona Glria. Suposto mdico, tem o hbito de agradar aos proprietrios da casa com o uso de superlativos.

Tio Cosme:irmo de dona Glria, vivo e advogado.

Prima Justina:prima de dona Glria, que, segundo o narrador, no tinha papas na lngua.

Pedro de Albuquerque Santiago:pai de Bentinho, faleceu quando o filho ainda era muito pequeno.

Senhor PduaeDona Fortunata:pais de Capitu, que viam no possvel casamento da filha com Bentinho uma possibilidade de ascenso social.

Ezequiel:filho de Capitu, sobre o qual o narrador sustenta forte dvida quanto paternidade, pois o garoto tinha grande semelhana fsicacom Escobar.

Sobre Machado de AssisJoaquim Maria Machado de Assis nasceu em 21 de junho de 1839 na cidade do Rio de Janeiro. Neto de escravos alforriados, foi criado em uma famlia pobre e no pode frequentar regularmente a escola. Porm, devido a seu enorme interesse por literatura, conseguiu se instruir por conta prpria. Entre os seis e os quatorze anos, Machado de Assis perdeu sua irm, a me e o pai.

Aos 16 anos, Machado conseguiu um emprego como aprendiz em uma tipografia, vindo a publicar seus primeiros versos no jornal "A Marmota". Em 1860 passou a colaborar para o "Dirio do Rio de Janeiro" e dessa dcada que datam quase todas suas comdias teatrais e "Crislidas", um livro de poemas.

Em 1869 Machado de Assis casou-se com Carolina Augusta Xavier de Novais sem o consentimento da famlia da moa, devido m fama que Machado carregava. Porm, este casamento mudou sua vida, uma vez que Carolina lhe apresentou literatura portuguesa e inglesa. Mais amadurecido literariamente, Machado publica na dcada de 1870 uma srie de romances, tais como "A mo e a luva" (1874) e "Helena" (1876), vindo a obter reconhecimento do pblico e da crtica. Ainda na dcada de 1870, Machado iniciou sua carreira burocrtica e em 1892 j ocupava o cargo de diretor geral do Ministrio da Aviao. Atravs de sua carreira no servio pblico, Machado de Assis conseguiu sua estabilidade financeira.

A obra literria de Machado era marcadamente romntica, mas na dcada de 1880 ela sofre uma grande mudana estilstica e temtica, vindo a inaugurar o Realismo no Brasil com a publicao de "Memrias Pstumas de Brs Cubas" (1881). A partir de ento a ironia, o pessimismo, o esprito crtico e uma profunda reflexo sobre a sociedade brasileira se tornaro as principais caractersticas de suas obras. Em 1897, Machado funda a Academia Brasileira de Letras, sendo seu primeiro presidente e ocupando a Cadeira N 23.

Em 1904, Machado perde a esposa aps um casamento de 35 anos. A morte de Carolina abalou profundamente o escritor, que passou a ficar isolado em casa e sua sade foi piorando. Dessa poca datam seus ltimos romances: "Esa e Jac" (1904) e "Memorial de Aires" (1908). Machado morreu em sua casa no Rio de Janeiro no dia 29 de setembro de 1908. Seu enterro foi acompanhado por uma multido e foi decretado luto oficial no Rio de Janeiro.

Seus principais romances so: "Ressurreio" (1872), "A mo e a luva" (1874), "Helena" (1876), "Iai Garcia" (1878), "Memrias Pstumas de Brs Cubas" (1881), "Quincas Borba" (1891), "Dom Casmurro" (1899), "Esa e Jac" (1904) e "Memorial de Aires" (1908). Alm dessas obras, Machado de Assis possui uma extensa bibliografia que abrange poemas, contos e peas teatrais.

Analise

Publicado pela primeira vez em 1899, "Dom Casmurro" uma das grandes obras de Machado de Assis e confirma o olhar certeiro e crtico que o autor estendia sobre toda a sociedade brasileira. Tambm a temtica do cime, abordada com brilhantismo nesse livro, provoca polmicas em torno do carter de uma das principais personagens femininas da literatura brasileira: Capitu.

Muitas leituras possveisH uma discusso em torno da obra que alimenta os espritos mais inflamados: Capitu traiu ou no seu marido Bento Santiago, o Bentinho?

O romance, entretanto, presta-se a muitas leituras, e interessante ver como a recepo ao livro se modificou com o passar do tempo. Quando foi lanado, era visto como o relato inquestionvel de uma situao de adultrio, do ponto de vista do marido trado. Depois dos anos 1960, quando questes relativas aos direitos da mulher assumiram importncia maior em todo o mundo, surgiram interpretaes que indicavam outra possibilidade: a de que a narrativa pudesse ser expresso de um cime doentio, que cega o narrador e o faz conceber uma situao imaginria de traio.

Machado de Assis, autor sutil e de penetrao aguda em questes sociais, arma o problema e testa seu leitor. impressionante como isso vale ainda hoje, mais de um sculo depois do lanamento do livro. O romance a histria de um homem de posses que ama uma moa pobre e esperta e se casa com ela. Em sua velhice, ele escreve um romance de memrias para compreender melhor a vida.

Capitu, at a metade do livro, quem d as cartas na relao. inteligente, tem iniciativa, procura articular maneiras de livr-lo do seminrio etc. Trata-se de uma garota humilde, mas avanada e independente, muito diferente da mulher vista como modelo pela sociedade patriarcal do sculo XIX. Nesse sentido, Capitu representa no livro duas categorias sociais marginalizadas no Brasil oitocentista: os pobres e as mulheres. A personagem acabar por "perturbar" a famlia abastada, ao casar-se com o homem rico.

Percebe-se, por isso, o peso do possvel adultrio em suas costas. No se trata apenas de uma questo conjugal entre iguais, mas de uma condenao de classe. Bentinho utiliza o arbtrio da palavra para culpar sua esposa. Mas ele quem narra os acontecimentos e, por isso, pode manipular os fatos da maneira que melhor lhe convm. No se sabe at que ponto os fatos relatados correspondem ao que ocorreu, ou so uma interpretao feita pelo personagem, que, alm de tudo, escreve que no tem boa memria.

Nesse sentido, a questo central do livro no o adultrio, e sim como Machado introduz na literatura brasileira o problema das classes e, ainda, de forma inovadora, a questo da mulher. Dom Casmurro coloca no centro de sua temtica a menina que no se deixa comandar e, em virtude disso, perturba a ordem vigente naquele ambiente social estreito e conservador.

PardiaUma das formas mais clssicas que assume o humor e a ironia de Machado de Assis a pardia. Uma pardia seria uma imitao cmica de um outro texto literrio (pode ser tambm de uma msica, filme, estilo, filosofia, etc.) j consagrado pela tradio. Em "Dom Casmurro", temos trs grandes pardias:

1) "Ilada" de Homero: no captulo 125, "Uma comparao", Bentinho obrigado a fazer um discurso em honra do suposto amante de sua mulher. Em Ilada, o rei de Tria, Pramo, teve que beijar a mo de Aquiles, assassino de seu filho Heitor.

2) "Otelo", Shakespeare: a vida de Bentinho sempre narrada com o mesmo tom trgico de uma pera. Sua maior aproximao com a pea Otelo, devido ao tema do cime e traio presente nas duas obras.

3) O mito de Abrao e Isaac: no Velho Testamento, Deus pede que Abrao sacrifique seu filho Isaac em seu nome. Porm, na hora em que Abrao ia imolar seu prprio filho, o Anjo do Senhor aparece impedindo e um carneiro oferecido em lugar de Isaac. Em "Dom Casmurro", a me de Bentinho promete seu filho a Deus (ele seria padre) antes mesmo de o conceber. Porm, Bentinho se apaixona por Capitu e eles lutam para ficarem juntos. O amor de Capitu consegue anular a promessa feita pela me dele e assim os dois podem se casar.

NarradorO narrador Bento Santiago, transformado j no velho Dom Casmurro. O foco narrativo , portanto, em primeira pessoa e toda a narrativa uma lembrana do personagem sobre sua vida, desde os tempos de criana, quando ainda era chamado de Bentinho. Porm, trata-se de um narrador problemtico: primeiro porque o narrador um homem emotivamente arrasado e instvel; segundo porque ele narra fatos que no conhece bem, podendo ser tudo fruto de sua imaginao.

TempoO tempo da narrativa psicolgico, e no cronolgico. Esse recurso chamado impressionismo, porque o narrador se detm nas experincias que marcaram sua subjetividade. Seria usada pelo escritor francs Marcel Proust em sua obra Em Busca do Tempo Perdido. A falibilidade da memria surge como fator de complexidade, uma vez que uma lembrana s pode ser acessada de um momento presente.

Os acontecimentos, ento, passam pelo filtro da subjetividade presente. por isso que a descrio que o narrador faz de Capitu, como uma pessoa volvel e sensual, deve ser posta em dvida pelo leitor. O sentimento de cime exacerbado de Bento pode ter desvirtuado a figura da personagem.

Comentrio do professorA profa. Aparecida Augusta Barbosa, do Cursinho do XI, lembra que "Dom Casmurro" uma obra publicada na segunda metade do sculo XIX, perodo de desenvolvimento do cientificismo, que procura resultados exatos para explicar o mundo. Assim, h uma proposta artstica de desnudar o real e desvendar os contrastes do ntimo, tentando explic-los com os mtodos cientficos. Alm disso, dentro de um contexto histrico trata-se de um perodo repleto de mudanas scio-polticas e intelectuais, tais como a abolio da escravatura (1888), a Proclamao da Repblica (1889), a entrada de imigrantes no pas, e a modernizao do Brasil com a dinamizao da vida social e cultural, principalmente no Rio de Janeiro, sede do governo na poca. Assim, afirma a prof. Augusta, era um momento propcio para as artes absorverem as novas ideias vindas da Europa, tais como o liberalismo, o socialismo e as teorias cientificistas.

Dentro desse contexto histrico-cultural que precisa-se pensar a obra de Machado de Assis. "Dom Casmurro" uma obra narrada em primeira pessoa por um homem j velho e solitrio, que est tentando "atar das duas pontas da vida" (infncia e velhice). O tom do romance, que construdo em flashback, de uma pessoa desiludida e amargurada, e sua viso dos fatos narradas totalmente subjetiva e unilateral. Por conta disso, o livro adquire diversas leituras possveis e permanece-se com a dvida sobre o adultrio de Capitu, afirma a profa. Augusta.

Alm disso, a linguagem utilizada por Machado de Assis marcadamente acadmica e bem cuidada, sendo clssica e regida pelas normas de correo gramatical estabelecidas. Entretanto, h o registro em alguns pontos de aspectos tpicos da lngua utilizada pela personagem e registros mais informais e informais da lngua portuguesa. Assim, a linguagem usada pelas personagens e o nvel social dos protagonistas pode ser uma questo abordada pelos vestibulares, finaliza a profa. Augusta.