responsabilidade social e marketing social dois

174
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA CENTRO DE FORMAÇÃO ACADÊMICA E PESQillSA CURSO DE MESTRADO EXECUTIVO RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS ESTUDOS DE CASO DISSERTAÇÃO APRESENTADA À ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE FABIANO CHRISTIAN PUCCI DO NASCIMENTO Rio de Janeiro 2002 .: , ,

Upload: vucong

Post on 14-Feb-2017

219 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA CENTRO DE FORMAÇÃO ACADÊMICA E PESQillSA CURSO DE MESTRADO EXECUTIVO

RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL

DOIS ESTUDOS DE CASO

DISSERTAÇÃO APRESENTADA À ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO

PÚBLICA PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE

FABIANO CHRISTIAN PUCCI DO NASCIMENTO

Rio de Janeiro 2002

.:

, ,

Page 2: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

CENTRO DE FORMAÇÃO ACADÊMICA E PESQUISA

CURSO DE MESTRADO EXECUTIVO

E

TÍTULO

RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL

DOIS ESTUDOS DE CASO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APRESENTADA POR:

FABIANO CHRISTIAN PUCCI DO NASCIMENTO

APROVADO EM 27 /02 /2002

PELA COMISSÃO EXAMINADORA -----c~,~~ ,~

FERNANDO GUILHERME TENÓRIO

M ENGENHARIA DA PRODUÇÃO

GENHARIA DA PRODUÇÃO -----------,---'~~/~ .

ILKA CAMAROTTI

DOUTORA EM COOPERAÇÃO INTERNACIONAL

Page 3: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

o destino aniquila muitas espécies; só uma ameaça a si mesma.

W. H. Auden

Ao ideal de Nan

III

)

Page 4: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

AGRADECIMENTOS

À Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação

Getúlio Vargas, nas pessoas de seus professores, funcionários e coordenadora do

mestrado.

Às empresas Bosch, Inepar e AD3 Comunicação, nas pessoas de seus

dirigentes e funcionários, pelo apoio na coleta de dados e nas entrevistas.

Aos meus colegas de mestrado pelo companheirismo e apoio durante a

realização da pesquisa.

Aos meus alunos da graduação pelo incentivo e estímulo.

Ao Professor Fernando Guilherme Tenório pelo interesse e orientação deste

trabalho.

Ao meu amigo José Carlos Rocha pelo incentivo e colaboração.

Aos meus tios, primos e demais familiares, em especial às minhas afilhadas,

Dharyemne e Carolina, pelo apoio e estímulo, nas suas diferentes formas de

expressá-los.

Aos meus irmãos Francyelle, Flaviano, Favliano e Fabyelle por todos esses

anos de convívio e aprendizado conjunto.

Aos meus pais, José Paulino e Eliane, e aos meus avós, Itamar e Erika, sem

os quais essa realização não seria possível, a quem agradeço o amor incondicional.

À minha esposa Heloisa pelo amor, respeito, paciência e suporte emocional

durante todo o curso e desenvolvimento deste trabalho.

À Deus que sempre me acompanha.

Muito Obrigado!

IV

Page 5: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

SUMÁRIO ..

LISTA DE ABREVIATURAS E SiGLAS ............................................................................................... vii

LISTA DE FIGURAS ......•........•••...............................•.....................•.................................................... viii

RESUMO ......•.................•........•......................•••••.•.......................•.............................•........................... ix

ABSTRACT ...•................•........•............................................................................................................... x

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................... 01

BASE TEÓRICO-EMPíRICA

1 GESTÃO SOCiAL ..................•..................................................•.......................•................................ 08

1.1 UM NOVO PARADIGMA .................................................................................................... 08

1.2 O PAPEL DO ESTADO, DA SOCIEDADE CIVIL E DO EMPRESARIADO ....................... 12

1.3 A CARACTERIZAÇÃO E O ENTENDIMENTO DA GESTÃO SOCIAL. ............................. 16

1.4 O TERCEIRO SETOR ........................................................................................................ 23

2 RESPONSABILIDADE SOCiAL ......•..........•..................•....................•..........•.......•....•.......•.............. 26

2.1 O CONCEITO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL. ........................................................... 27

2.2 RESPONSABILIDADE SOCIAL E CIDADANIA CORPORATIVA ..................................... 30

2.3 RESPONSABILIDADE E ÉTICA NOS NEGÓCiOS ........................................................... 32

2.4 O DESENVOLVIMENTO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL: DAS ORIGENS NA

FILANTROPIA AOS DIAS ATUAiS .......................................................................................... 34

2.5 COMPONENTES DA RESPONSABILIDADE SOCIAL. ..................................................... 37

2.6 DIMENSÕES DA RESPONSABILIDADE SOCiAL ............................................................ .40

2.7 AS DIFERENTES VISÕES E OS FOCOS DA RESPONSABILIDADE SOCIAL. .............. .42

2.8 LINHAS DE MOTIVAÇÃO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL. ........................................ 44

2.9 O BALANÇO SOCIAL ......................................................................................................... 46

2.10 A INTEGRAÇÃO E O TRABALHO VOLUNTÁRIO .......................................................... .49

3 MARKETING SOCiAL ...•••......................•...................•..................•......................•.....•......•.............. ;52

3.1 A ORIGEM DO TERMO ...................................................................................................... 53

3.2 O CONCEITO DE MARKETING SOCIAL. .......................................................................... 58

3.3 MODALIDADES DO MARKETING SOCIAL E SUAS CARACTERísTICAS ...................... 62

3.4 CRíTICAS AO MARKETING SOCIAL. ................................................................................ 64

3.5 A IMPORTÂNCIA DA ADOÇÃO DE UMA POLíTICA DE MARKETING SOCIAL. .............. 65

3.6 DESAFIOS, OBJETIVOS E ESTRUTURAÇÃO DO MARKETING SOCIAL. ...................... 70

ESTUDOS DE CASO

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGiCOS ...................................................•..............................•..••.... 79

4.1 ESPECIFICAÇÃO DO PROBLEMA DA PESQUiSA ......................................................... 79

4.1.1 PERGUNTAS DA PESQUiSA ........................................................................... 79

4.2 DELIMITAÇÃO E DESIGN DA PESQUiSA ....................................................................... 80

4.2.1 UNIVERSO E AMOSTRA ................................................................................... 80

v

Page 6: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

4.2.2 DELINEAMENTO DA PESQUiSA ...................................................................... 81

4.2.3 FONTE E COLETA DE DADOS ......................................................................... 82

4.2.4 TRATAMENTO DOS DADOS ............................................................................ 84

4.3 LIMITAÇÕES DA PESQUISA. ............................................................................................ 85

5ABOSCH .....................•......••...•.............................................................•..................•........................ 87

5.1 A EMPRESA ....................................................................................................................... 89

5.2 O EXERCíCIO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL. .......................................................... 90

5.3 A PRÁTICA DO MARKETING SOCIAL. ............................................................................. 97

5.4 A VISÃO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL. ................................................................. 1 00

5.4.1 A VISÃO DO 1° NIVEL. ..................................................................................... 101

5.4.2 A VISÃO DO 2° NíVEL. ..................................................................................... 103

5.4.3 A VISÃO DO 3° NlvEl ...................................................................................... 1 06

5.5 A VISÃO DO MARKETING SOCIAL.. ............................................................................... 1 06

5.5.1 A VISÃO DO 1° NíVEL. ..................................................................................... 107

5.5.2 A VISÃO DO 2° NlvEl ...................................................................................... 1 08

5.5.3 A VISÃO DO 3° NívEL ...................................................................................... 11 O

5.6 A GESTÃO SOCiAL ......................................................................................................... 111

5.7 A PRÁTICA E O DISCURSO: ANÁLISE E CONSIDERAÇÕES ....................................... 114

6 A INEPAR ...•..............•..•••••..••..........••..........•..................•••.••......•.......•..............•....•....•.................... 118

6.1 A EMPRESA ..................................................................................................................... 120

6.2 O EXERCíCIO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL. ........................................................ 121

6.3 A PRÁTICA DO MARKETING SOCIAL. ........................................................................... 126

6.4 A VISÃO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL. ................................................................. 130

6.4.1 A VISÃO DO 1° NlvEl ...................................................................................... 131

6.4.2 A VISÃO DO 2° NívEL ...................................................................................... 133

6.4.3 A VISÃO DO 3° NlvEl ...................................................................................... 135

6.5 A VISÃO DO MARKETING SOCIAL. ................................................................................ 135

6.5.1 A VISÃO DO 1° NívEL ...................................................................................... 136

6.5.2 A VISÃO DO 2° NívEL ...................................................................................... 137

6.5.3 A VISÃO DO 3° NívEL ...................................................................................... 139

6.6 A GESTÃO SOCiAL ......................................................................................................... 140

6.7 A PRÁTICA E O DISCURSO: ANÁLISE E CONSiDERAÇÕES ....................................... 142

CONCLUSÃO •.......•.•.••.•••••••••••••••••.•..•.••.•••..•.•.••••.••••••.••••••.••..•..•.................•.................•..................... 147

BIBLIOGRAFIA .........................................................................................................•......................... 157

ANEXOS ............••.......••....•.••..•........•....•.....•...........•........•.........................................•.....•................... 162

Vl

Page 7: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABRINQ - Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos

ABRH - Associação Brasileira de Recursos Humanos

ACP - Associação Comercial do Paraná

AFISA - Associação de Funcionários Inepar

AIDS - Síndrome da Imuno-Deficiência Adquirida

APAE - Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais

BANESPA - Banco do Estado de São Paulo

CBN - Central Brasileira de Notícias

CIC - Cidade Industrial de Curitiba

FENAJ - Federação Nacional dos Jornalistas

IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas

INMETRO - Instituto Nacional de Metrologia e Qualidade Industrial

ONG - Organização Não-Governamental

PAE - Programa de Assistência ao Empregado

PAMI - Plano de Assistência Médica Inepar

PENSE - Projeto de Ensino e Saúde Especial

PIMA - Programa Integrado de Meio Ambiente

PROBEIN - Programa de Benefícios da Inepar

RH - Recursos Humanos

SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial

SESI - Serviço Social da Indústria

ULI - Universidade Livre Inepar

VIl

Page 8: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Estágios da Responsabilidade Social Corporativa ................................. 42

Vll1

Page 9: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

RESUMO

o objetivo desta pesquisa foi a identificação e a determinação dos principais elementos presentes no desenvolvimento de ações de responsabilidade social e programas de marketing social em unidades industriais de duas empresas, da iniciativa privada, localizadas em Curitiba: Bosch e Inepar. Na base teórico­empírica, foram analisados os aspectos referentes à gestão social sob o paradigma da Sociedade Pós-Industrial, à responsabilidade social e ao marketing social. Especificamente nestes dois últimos temas foi aprofundada a análise de suas bases de formação e a evolução de seus conceitos, bem como suas diferentes interpretações, tratamentos, usos e motivações para a efetivação de programas de cunho social. O método que caracteriza esta pesquisa é o de dois estudos de caso distintos. Os dados foram obtidos mediante pesquisa bibliográfica, análise de documentos internos e peças de comunicação externas, observação direta e por meio de entrevistas semi-estruturadas, realizadas com os dirigentes e funcionários das organizações estudadas, envolvidos na condução e organização de práticas sociais. A análise foi efetuada de forma descritivo-qualitativa. Os dados coletados revelaram a existência de consonâncias e dissonâncias entre a prática da responsabilidade social e do marketing social e o discurso apresentado pelas empresas. O objetivo maior do estudo foi ampliar o entendimento acerca da responsabilidade social e do marketing social praticado pela iniciativa privada, tendo como referência a visão de seus integrantes, dentro das atuais racionalidades econômica e social que estabelecem um novo modelo de relacionamento entre Estado, empresas e sociedade civil.

IX

Page 10: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

ABSTRACT

lhe objective of this research was to identify and to determine the foremost elements present in the development of social responsibility actions and social marketing programs in industrial units of two enterprises, located in Curitiba: Bosch and Inepar. Aspects related to the social management under the Post-Industrial 80ciety paradigm, the social responsibility and the social marketing were analyzed on the theoretical-empirical basis. 8pecifically in the these last two subjects, its basis formation and concepts evolution were deeply analyzed, as well as the different interpretations, treatments, uses and motivations to accomplish social character programs. lhe method that characterizes this research is the study of two distinct cases. lhe data were obtained through bibliographical analysis, internai documents analysis and externai communications, advertisements and brochures, direct observation and by semi-structured interviews, with managers and personnel of the studied enterprises, involved in the organization and conduction of social practices. lhe analysis was realized in a descriptive-qualitative formo lhe collected data revealed the existence of consonance and dissonance between the social responsibility and social marketing practice, and the enterprises discourse. lhe study main objective was to amplify the understanding about the social responsibility and social marketing practiced by the private sector, having as a reference their players vision within present social and economical rationalities that establish a new relationship model between the 8tate, enterprises and civil society.

x

Page 11: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

1

INTRODUÇÃO

Na era da informação e da nova economia globalizada são profundas as

mudanças no modo das sociedades se organizarem. Inúmeras alterações políticas,

econômicas e sociais determinam transformações no indivíduo e na sociedade.

Cientes da dificuldade do governo em lidar com questões decorrentes do

desequilíbrio socioeconômico, as empresas brasileiras tem assumido um importante

papel na formação de uma sociedade mais igualitária. A gestão empresarial que

tinha como referência apenas os interesses dos acionistas revela-se insuficiente

nesse novo contexto. Ela requer uma gestão balizada pelos interesses e

contribuições de um conjunto maior das partes envolvidas. O desafio das empresas

em conquistar níveis cada vez maiores de competitividade as leva a uma

preocupação crescente e irreversível com a legitimidade social de sua atuação. A

busca da excelência pelas empresas passa a ter como objetivos a qualidade nas

relações e a sustentabilidade econômica, social e ambiental. Paralelo a isso tudo, a

sociedade civil, refém de uma acentuada degradação do tecido social, mobiliza-se,

objetivando a reversão de quadros há muito insustentáveis e a minoração de seus

problemas e dificuldades. Redefine-se a noção de cidadania e por conseqüência há

um crescimento acentuado do chamado terceiro setor com a proliferação das

organizações não-governamentais.

A gestão social das organizações é um processo de aprendizado, de

percepção de valores e crenças, de revisão de muitos posicionamentos e

tratamentos, quer sejam dos processos, dos sistemas, das pessoas ou dos grupos.

Implica numa nova postura de dirigentes, empresários, gerentes, trabalhadores,

fornecedores e demais membros da comunidade. Não se trata de algo imediato,

pois, para que sua prática reflita coerência, necessita de vivência, de maturação e de

conhecimento. Sendo assim, a gestão social está profundamente ligada ao tema da

responsabilidade social.

Page 12: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

2

Muitas vezes o termo responsabilidade social evidencia um peso que este

não possui. Afinal, quando pautado em ações consensuais, respaldadas na ética e

nas bases da cidadania, é algo que fluirá quase que naturalmente nas organizações

e nas relações humanas. Da mesma forma, inúmeras vezes, o termo marketing

social sugere uma superficialidade distante do seu real significado. No contexto

atual, são necessários instrumentos para que cada vez mais pessoas acreditem

numa nova forma de conduzir suas decisões e também para que as empresas,

sejam elas públicas, privadas ou do terceiro setor, profissionalizem ainda mais seus

quadros e suas ações. O marketing social deve ser utilizado para impulsionar, ligar,

educar, divulgar, persuadir, instigar. Internamente, comunica as bases dos

programas, estimula e motiva os participantes. Externamente às fronteiras da

empresa divulga não somente as ações, mas principalmente os propósitos e suas

conseqüências. Esse marketing social precisa nascer e crescer com as ações de

responsabilidade social para que, à medida que estas ações vão ganhando

notoriedade com o passar do tempo, sua simbiose seja reforçada. Não se trata de

garantir somente a sobrevivência da empresa, mas sim de assegurar o ambiente no

qual ela está inserida. Uma relação de dependência mútua que garantirá ganhos de

imagem, retornos financeiros e principalmente a manutenção e até mesmo a revisão

e reversão dos quadros sociais existentes.

Nesse cenário, no caminho da gestão social, no qual empresários buscam

formas de integrar a responsabilidade social à cultura de suas atividades e no qual o

marketing social aparece com um papel determinante na sustentação e

disseminação de tais práticas é que se desenvolve esta dissertação, com base em

dois estudos de caso, enfocando duas diferentes empresas e sua condução de

ações sociais.

Este trabalho propõem-se a analisar as ações de cidadania corporativa e

marketing social da empresa Robert Bosch, uma das pioneiras no Paraná no

Page 13: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

3

desenvolvimento e aplicação de projetos voluntários que demonstram não somente

uma preocupação com sua responsabilidade social, mas também sua ativa

participação nas mudanças culturais necessárias para um melhor desenvolvimento

dos nossos cidadãos. Especificamente, no caso da Bosch, refere-se a sua Unidade

de Curitiba e ao Programa 'Somos Herdeiros de Nossas Ações', que possibilitou a

criação do Grupo Voluntários Bosch e do Projeto 'Peça por Peça' implantado junto à

Vila Verde, comunidade carente do subúrbio curitibano. Em paralelo será também

avaliado o caminho adotado por outra empresa paranaense, a Holding Inepar,

especificamente através dos trabalhos da Fundação Inepar ligados a uma das

unidades industriais da empresa em Curitiba, a Inepar S/A Indústria e Construções,

na condução de atividades referentes à responsabilidade social e ao marketing

social. O estudo desses dois casos possibilitará a visualização da concepção das

empresas acerca dos temas, bem como a interpretação destinada aos mesmos por

parte dos atores que conduzem as ações sociais dentro de cada organização. A

comparação das duas diferentes soluções adotadas para a condução das práticas

sociais permitirá a identificação de elementos (comuns e distintos) apresentados

pelas duas empresas, a classificação e a avaliação do atual estágio de suas

atividades com base na responsabilidade social e no marketing social, além do

surgimento de algumas recomendações que possam incrementar suas atuações.

Em face aos elementos apresentados nesta primeira parte da introdução, o

tema da pesquisa constitui a responsabilidade social e o marketing social praticados

por empresas da iniciativa privada. Nesse sentido, formulou-se o seguinte problema

de pesquisa: Como a responsabilidade social e o marketing social são

compreendidos e trabalhados em duas diferentes empresas de grande porte,

representativas em seus diferentes ramos de atuação, instaladas em Curitiba?

O objetivo da dissertação será a determinação e identificação dos principais

elementos presentes no desenvolvimento de ações de responsabilidade social e

Page 14: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

4

programas de marketing social. Três são as principais questões: a) Como os

diferentes atores que participam elou conduzem as ações sociais da organização

compreendem a responsabilidade social e principalmente, o papel e o potencial do

marketing social? b) Quais as implicações dessas interpretações na efetivação de

programas sociais? c) Como o marketing social pode contribuir para a gestão social

e a melhor disseminação e profissionalização de práticas que assegurem uma

melhoria das condições sociais atuais ? Surge ainda, decorrente da formatação de

dois estudos de caso e das questões já expostas, uma quarta questão: se a atuação

dessas empresas está em consonância aos discursos por elas apresentados. "Além

das diversas variáveis que acompanham seu trabalho social, a empresa também

necessita deixar bem claro qual é seu entendimento sobre responsabilidade social e

em que dinâmica ele se aplica. Isso fortalece a integração coerente entre a teoria

(retórica) e a prática, ou seja, o que está presente no discurso e o que está sendo

feito no campo prático da ação" (ASHLEY, 2002, p. 81).

Entre os objetivos intermediários decorrentes de tais questões está a

identificação de elementos (comuns ou distintos) para o desenvolvimento de um

programa de marketing social em empresas de diferentes portes e ramos de

atuação. A percepção do público interno e externo sobre as ações de marketing

social e a conseqüente valorização das marcas de bens ou serviços associados à

postura ética e social das empresas também interessa e motiva este estudo, muito

embora sua efetiva avaliação não seja contemplada nesta pesquisa. Além do

desenvolvimento de uma revisão da literatura também objetiva-se ainda a

possibilidade de extensão de tais ações de marketing social a outras organizações

que possuam interesse na gestão socialmente responsável.

Os beneficiários serão inicialmente as empresas estudadas que poderão

melhor compreender a amplitude de suas ações, revendo, desenvolvendo ou

mantendo certas condutas e posturas. Segundo estudos da Kanitz & Associados,

Page 15: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

5

empresa que desenvolve programas de planejamento estratégico no Brasil, "grande

parte das empresas apresenta uma política filantrópica sem foco e acaba gastando

dinheiro em muitos projetos diferentes, sendo que boa parte deles não chega ao

destino previsto, seja porque as entidades beneficiadas não são as mais bem

administradas do país, seja porque as causas apoiadas não são necessariamente as

prioritárias" (ARAÚJO, 2000, p. 43). Também outras empresas interessadas no

desenvolvimento de ações de marketing social podem ainda ser consideradas

beneficiárias, bem como os funcionários dessas empresas e a comunidade como um

todo.

Entre as justificativas do estudo podemos citar:

a necessidade do desenvolvimento e disseminação de ações de gestão

social na iniciativa privada face as dificuldades do governo em lidar com

questões como a má distribuição da renda, o analfabetismo e a exclusão

social, por exemplo;

a compreensão de que ações de marketing social precisam estar

respaldadas na responsabilidade social das empresas para que não se

caracterizem como atos de cinismo ou atitudes de frágil sustentação;

a necessidade de se definir e compreender os termos responsabilidade

social e marketing social, não somente em sua interdepedência, mas

evidenciando seus reais significados, suas abrangências e seus papéis no

alinhamento dos discursos com as práticas sociais das organizações.

a alteração dos papéis e da atuação do Estado, da iniciativa privada e da

sociedade civil no tratamento de temas envolvendo a problemática social;

a mudança de comportamento dos consumidores (e também funcionários

e membros das organizações) que esperam uma ação socialmente

responsável por parte das empresas.

Page 16: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

6

A relevância do estudo se deve não somente ao fato da atualidade da

discussão de temas como a responsabilidade social e o marketing social, mas

principalmente em razão da carência de referencial teórico e de estudos de casos

em nosso país com respeito a gestão social. A tradução de livros estrangeiros para a

língua portuguesa é uma solução que não atende plenamente à busca pelo

conhecimento da produção nacional nessa temática, em parte decorrente do

necessário entendimento que se faz das especificidades culturais e das práticas de

negócios no contexto brasileiro (ASHLEY, 2002). Também, embora os países

subdesenvolvidos ou em desenvolvimento necessitem amplamente da atuação da

iniciativa privada na minimização ou redução de problemas sociais, no Brasil essa

prática é recente, inexpressiva e ainda um tanto desordenada se comparada a

países como Estados Unidos ou Inglaterra. O marketing social precisa estar

sustentado pela responsabilidade social que deve ser cultivada nos diferentes

escalões da empresa. Sem uma intenção, sem uma causa, torna-se uma estratégia

fragilizada. É preciso ir além: para ser eficiente não basta a intenção, o marketing

social precisa trabalhar também por resultados.

Considerando o problema de pesquisa exposto, o objetivo geral e os

específicos, a dissertação está dividida basicamente em duas grandes partes, além

da Introdução, Conclusão e Bibliografia.

A primeira parte, refere-se à base teórico-empírica, dividida em três capítulos

principais. No primeiro são abordados e discutidos os principais elementos

componentes da gestão social, a flexibilização organizacional como o paradigma

que contextualiza o processo, as alterações nos papéis desempenhados pelo

Estado, sociedade civil e empresariado, além de uma atenção especial ao terceiro

setor e às ações que promovem a valorização da cidadania.

O segundo capítulo refere-se à responsabilidade social, discutindo seu

conceito, a cidadania corporativa e ética nos negócios, o desenvolvimento da

Page 17: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

7

responsabilidade social desde suas origens na filantropia até os dias atuais, além de

seus componentes, dimensões e foco.

No terceiro capítulo, são apresentados os conceitos que definem o marketing

social, as origens do termo, suas modalidades e características, seus desafios,

objetivos e estruturação além da importância da adoção de uma política de

marketing social para o sucesso das organizações.

A segunda parte novamente divide-se em três capítulos. No primeiro são

descritos os procedimentos metodológicos que nortearam o estudo, tendo em vista o

alcance dos objetivos propostos. Com a especificação do problema de pesquisa,

argumenta-se sobre a utilização de estudo de caso como estratégia de pesquisa,

delimitando o design da mesma, a obtenção e tratamento dos dados, bem como

salientando as limitações do presente estudo.

No quinto e sexto capítulos são apresentados, de maneira independente, os

casos estudados, Bosch e Inepar respectivamente. Estes capítulos estão

subdivididos numa breve apresentação da situação de cada empresa, avaliação e

classificação das ações desenvolvidas e programas já existentes referentes à

responsabilidade social e ao marketing social. A seguir, dentro destes capítulos são

apresentadas as diferentes visões dos componentes das organizações estudadas e

as implicações dessas interpretações na condução das ações.

Ao final, na Conclusão, são apresentadas as considerações pertinentes e a

comparação (dificuldades, instrumentos utilizados, avaliações) entre os dois estudos,

extraindo elementos comuns para aplicação de programas de responsabilidade

social e marketing social em outras empresas interessadas e para a avaliação do

estágio atual do desenvolvimento dessas práticas nas organizações estudadas.

Page 18: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

8

1 GESTÃO SOCIAL

o paradigma da sociedade pós-industriaI1, no qual o fenômeno da

globalização apresenta-se como uma das principais características, tem acelerado

os processos de transformação nas mais diferentes áreas da vida humana e acirrado

as discussões acadêmicas em torno de suas causas, conseqüências, modelos,

instrumentos e dimensões. Cercado de inúmeras observações e ressalvas

distribuídas entre seus admiradores e opositores, defensores e críticos contumazes,

esse tema traz consigo a discussão de uma nova questão, ou melhor, de uma nova

prática presente em algumas organizações: a gestão social. A gestão social associa­

se a uma programação de mudança na condução dos negócios - o que a coloca

plenamente de acordo com um cenário de profundas modificações atualmente

estabelecido. "A sociedade industrial produzia sobretudo meios de produção, bens a

serem consumidos, capital. A sociedade pós-industrial produz sobretudo

conhecimento, administração de sistemas, capacidade de programar a mudança"

(DE MASI, 1999, p. 59).

1.1 UM NOVO PARADIGMA

Este trabalho desenvolve-se sob o paradigma do Pós-Fordismo, ou da

chamada Sociedade Pós-Industrial. "Um paradigma de gestão perde seu sentido se

considerado fora da realidade em que surgiu" (FERREIRA et alli, 1997, p. 239). Na

verdade, a terminologia ou a aceitação dos termos, bem como a definição exata das

características que regem esse novo paradigma de gestão ainda não fazem parte de

um consenso. "No plano das reflexões não existe a certeza cientificamente

necessária quanto ao elemento que caracterizará o sistema social que vai se

1 Para Domenico de Masi, "o conceito de sociedade pós-industrial diz respeito essencialmente às mudanças na estrutura social, às transformações que se produzem na vida econômica e na estrutura profissional, e por fim às novas relações que se estabelecem entre a teoria e a prática experimental, entre a ciência e a tecnologia" (DE MASI, 1999, p. 33).

Page 19: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

9

esboçando; tampouco sabemos se existirá esse fator hegemônico, assim como

existiram - em épocas passadas - a caça, o pastoreio, a agricultura, o mercado, a

indústria" (DE MASI, 1999, p. 31).

A globalização dos mercados e a competição criam novas oportunidades e

novos problemas (DE MASI, 1999; DI NALLO, 1999). "Entre os processos estruturais

que caracterizam a transformação do mapa social assumem grande importância na

economia do nosso discurso: a crescente automação, a flexibilização e a

diversificação das atividades econômicas; que sintetizam o declínio do modelo

fordista de produção, processos que levaram a uma reorganização dos tempos de

trabalho e a uma inédita valorização dos 'tempos plurais do não trabalho'" (DI

NALLO, 1999).

Inúmeras ferramentas modernas de gestão se devem ao que se chama a

Terceira Revolução Industrial, que se caracterizou pelo progresso cientifico-técnico e

pelo crescimento da tecnologia da informação. Esses conjuntos de recursos

tecnológicos estabelecem o processo de flexibilização das organizações. A

globalização da economia é que consolida a ocorrência do processo de flexibilização

organizacional. "A flexibilização organizacional seria um paradigma em gestão da

produção que preconiza a diferenciação integrada da organização da produção e do

trabalho sob a trajetória de inovação tecnológica em direção à democratização das

relações sociais nos sistemas-empresa" (TENÓRIO, 2000, p. 15).

Esse entendimento é extremamente importante pois determinará muitos dos

fatores de sucesso ou fracasso das organizações e mais adiante, será fator influente

nos relacionamentos apresentados entre os indivíduos que as compõem. A

preocupação com o ser humano e sua individualidade reside no fato de que "[ ... ] a

imersão total de milhões de indivíduos em um sistema dominado pela tecnologia,

pela mídia, pela ocupação na área administrativa, pela mobilidade, não pode deixar

de influir na psicologia dos indivíduos e das massas, determinando, a longo prazo,

Page 20: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

10

uma profunda mutação antropológica" (DE MASI, 1999, p. 45). Alteram-se entre

outras coisas os relacionamentos, os princípios e os modelos teóricos.

Atualmente, somos submetidos a um progressivo aumento no fluxo de

informações das mais diferentes áreas. Entretanto, diminui sensivelmente nossa

certeza quanto ao futuro. O dilúvio de informações e a complexidade da economia

global pressionam o Estado e a iniciativa privada (MCINTOSH et alli, 2001). Além de

governos e empresas, a degradação do tecido social pressiona ainda mais a

sociedade e os indivíduos que a compõem. "O que, na verdade ocorre, é um

verdadeiro desmonte do social através de diversos processos-chave: a banalização

dos problemas sociais, a quebra da solidariedade social, a generalização da

violência, a ampliação do medo e do desamparo, a exacerbação das desigualdades,

o agravamento do empobrecimento e a contaminação do caráter das pessoas"

(MELO NETO e FRÓES, 2001, p. 14).

A globalização determina uma nova racionalidade econômica que penaliza

ainda mais o já fragilizado lado social. "O grito das necessidades sociais não pode

ser ouvido; o social desmantela-se na nova racionalidade econômica. Há o

desaparecimento dos movimentos sociais, o esvaziamento da solidariedade social e

a perda de poder das forças sociais. Com isso, o foco das ações sociais migra do

Estado e da sociedade para as estruturas de poder geridas pelas empresas

transnacionais2 e multinacionais3" (MELO NETO e FRÓES, 2001, p. 4). É preciso

ressaltar que da alocação de recursos produtivos por parte dessas empresas

decorrem custos sociais e ecológicos elevados e muitos dos problemas descritos

anteriormente.

2 Segundo Mclntosh et alli, "empresa transnacional é a empresa que tem sua matriz em um país, mas opera em grande parte em outros países" (MCINTOSH et alli, 2001, p. 28). 3 Segundo Mclntosh et alli, "empresa multinacional é a empresa que pode estar baseada em um país, mas ter bases em outros países para fins de gerência, fabricação ou distribuição" (MCINTOSH et alli, 2001, p. 28).

Page 21: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

11

Mclntosh et alli (2001), citando David Korten4, argumentam que "estamos

criando um mundo que está se tornando, cada vez mais, profundamente dividido

entre os privilegiados e os miseráveis, entre aqueles que têm o poder de se colocar

acima das forças de mercado prevalecentes e aqueles que se tornaram oferendas

sacrificáveis sobre o altar da competição global" (MCINTOSH et alli, 2001, p.17). De

fato, cada vez mais observa-se a concentração de tecnologia de ponta nos países

ricos e nas suas corporações internacionais, bem como a dificuldade de obter

soluções para questões referentes a temas como o desemprego e a deterioração

das condições de vida que se agravam continuamente no mundo (BORBA et alli,

2001 ).

A desproporção entre privilegiados e miseráveis aumenta não só

. qualitativamente como quantitativamente. A coletividade e o estado-nação perdem

força e tornam-se reféns de inúmeros problemas. "Estados perdem a sua soberania.

Espaço e território, do povo, categorias formadoras de nacionalidade, perdem seu

valor. Sob a nova lógica produtiva global, eles são vistos como espaços produtivos,

aproveitáveis ou não, segundo a lógica dominante e o processo de gerenciamento

das cadeias produtivas globais" (MELO NETO e FRÓES, 2001, p. 03). É preciso que

se busquem caminhos e alternativas para, pelo menos, minimizar os efeitos de tais

disparidades e desigualdades de nossa sociedade. Tal situação impõe ao

empresariado uma nova maneira de realizar suas ações, repensando o

desenvolvimento econômico, social e ambiental. As empresas então investem em

novos processos de gestão na busca por diferenciais competitivos (ASHLEY, 2002).

A gestão social aparece como uma reação elou conseqüência a essa nova

lógica vigente. "Os rigores e os efeitos socialmente perversos desta nova

racionalidade econômica levam à descoberta de uma nova racionalidade social. ( ... )

4 KORTEN, David. When corporations rufe the worfd. Londres: Earthscan, 1995.

Page 22: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

12

Melhor dizendo, é possível afirmar que a nova racionalidade social é o contrapeso

da nova racionalidade econômica" (MELO NETO e FRÓES, 2001, p. 05).

Sendo assim, o tema gestão social tem sido colocado nos últimos anos para

dimensionar a importância das questões sociais em todos os segmentos, e nesse

caso, principalmente nos sistemas-empresa na condução de seus negócios

(TENÓRIO, 2000). Observa-se uma radical mudança nas relações entre Estado,

sociedade civil e empresas, bem como alteram-se profundamente as expectativas de

cada um desses setores em relação ao outro.

1.2 O PAPEL DO ESTADO, DA SOCIEDADE CIVIL E DO EMPRESARIADO

As características e os problemas da Sociedade Pós-Industrial determinam

inúmeras mudanças. Na busca por uma resposta a esse desafio crescente,

governos, sociedade e empresas organizam-se para disponibilizar novas soluções

visando um desenvolvimento sustentável que englobe não somente aspectos

econômicos como também aspectos sociais e ambientais (ASHLEY, 2002). A

mudança do relacionamento entre governo, sociedade civil e empresas reflete um

novo equilíbrio de poder e influência (MCINTOSH et alli, 2001).

"Líderes de negócios e de governos agora reconhecem que governos

sozinhos não podem resolver os problemas da pobreza e da degradação ambiental.

O dedo da culpa pelo estado em que o mundo se encontra hoje, no fim do século

XX, não pode ser apontado a um único sistema político, a um único setor industrial

ou a uma única filosofia" (MCINTOSH et alli, 2001, p. 17). O enfraquecimento estatal

e o agravamento dos problemas sociais faz com que a sociedade reformule sua

visão em relação ao papel do Estado.

Toda expectativa de melhores serviços sociais foi canalizada para o papel do Estado como o órgão regulador desses serviços e para o crescimento da pobreza e da exclusão social. A baixa qualidade dos serviços e os seus altos custos só fizeram aumentar a legião dos excluídos e dos desassistidos. Milhões de cidadãos tornaram-se órfãos do estado do bem­estar social, morto, enterrado e esquecido pelos escombros deixados pela onda liberal que,

Page 23: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

13

tendo começado na Inglaterra, alastrou-se por todo o mundo (MELO NETO e FRÓES, 1999, p.2).

Com o Estado perdendo força e tamanho e com a sociedade subjugada pelos

interesses das empresas, os problemas sociais tendem a atingir limites intoleráveis.

Como reação a isso, o papel de principal gestor da racionalidade econômica

tradicional, anteriormente a cargo do Estado, através de suas políticas

macroeconômicas, migra para as empresas (MELO NETO e FRÓES, 2001).

A falta de vontade política e a má gestão, aliadas a uma provável visão

equivocada do Estado frente a solução de problemas sociais também contribuem

para essas alterações nos papéis. Tudo indica que a principal causa da má atuação

do governo reside nos erros de formulação, implementação e gestão de políticas

públicas que determinam falta de foco e má qualidade dos gastos no setor. Fato é

que, a partir da entrada de novos atores (as próprias empresas, além de ONGs e

entidades sem fins lucrativos), predomina hoje um Estado menos atuante, mais

diretivo e fiscalizador das ações sociais (MELO NETO e FRÓES, 2001).

Tal fenômeno mundial tem caráter determinante no Brasil e na América

Latina, especificamente em função dos acontecimentos dos últimos anos. "Os

processos de democratização vivenciados na América Latina nos anos 80 têm como

idéias nucleares a sociedade civil e a cidadania. Com esses conceitos, os

movimentos sociais adotam um horizonte universalista e passam a se considerar

como partes de um conjunto maior, uma sociedade legalmente constituída" (MELO

NETO e FRÓES, 1999, p. 15). Para Melo Neto e Fróes (1999), nos anos 90, as

políticas sociais de conteúdos neoliberais geraram uma nova conjuntura de lutas e

de movimentos sociais, nos quais destacam-se o crescimento da economia informal,

o aumento do desemprego, a perda de poder dos sindicatos e as alterações

substanciais na organização do trabalho, frutos da nova redivisão internacional e da

incorporação de tecnologias contínuas.

Page 24: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

14

Reapropriando-se de algumas funções estatais, a sociedade civil assume

então um importante papel na solução de problemas sociais complementando o

papel do Estado na formulação e implementação de políticas públicas de caráter

universalista (MELO NETO e FRÓES, 2001). Para a comunidade (e por extensão

para toda a sociedade) o social surge como um espaço de afirmação de sua

capacidade de mobilização e de eficiência operacional (MELO NETO e FRÓES,

1999).

Assim como muitos acreditam que o Estado deveria ser responsável pelas

pessoas, atualmente cresce o número de pessoas desejando que os negócios sejam

responsáveis por suas ações (MCINTOSH et alli, 2001). Nos vários setores da

sociedade está cada vez mais difundida a idéia de que a atual situação do mundo

requer atenção especial das empresas para sua dimensão social (SOUZA, 1997). "É

isto que se espera das empresas. Assumir um papel criativo, desenvolver uma

cultura sustentável. Enfim, contribuir de forma mais direta na solução dos problemas

sociais, o que somente será possível através do exercício da responsabilidade social

corporativa" (MELO NETO e FRÓES, 2001).

As empresas são entidades concretas, imersas em ambientes com os quais

mantém transações. Constituem elementos integrantes de uma realidade maior. Não

se tratam de abstrações teóricas isoladas e não devem ser compreendidas como

circunscritas a si mesmas (ASHLEY, 2002). Sendo assim, num cenário de profundas

alterações, é natural que governo, sociedade e o próprio empresariado alterem suas

expectativas também em relação ao papel da empresa.

O social emerge para as empresas como um novo e promissor campo de

oportunidades onde elas poderão obter mais competitividade através da agregação

de valor social aos seus negócios. O novo paradigma engloba a busca de solução

de problemas sociais, empenho na melhoria da qualidade de vida e apostas

significativas de cidadania (MELO NETO e FRÓES, 1999).

Page 25: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

15

Vale ressaltar que o papel e o escopo dos negócios nas questões mundiais

são maiores agora do que jamais foram5 (MCINTOSH et alli, 2001).

Fica clara a necessidade de união de forças entre sociedade civil, empresas e

Estado. Para Mclntosh et alli (2001) deve haver uma compreensão de que apenas

com governo, sociedade civil e negócios trabalhando em conjunto será possível

construir comunidades sadias e seguras. "Da mesma forma pela qual os governos

não podem solucionar os problemas do mundo sozinhos, sem mercados para

motivar, inovar e inspirar, não se pode esperar que os negócios o façam sozinhos.

Como diz Handl, o capitalismo não tem capacidade de fornecer uma vida boa para

todos, nem uma sociedade decente. Não penso que devemos esperar que o faça.

Ele é um meio, não é o fim" (MCINTOSH et alli, 2001, p. 19).

Nesse cenário, as empresas ampliam seu papel e o foco das ações sociais

pulveriza-se no todo, intensificando-se em cada novo ponto de atuação. "As

empresas atuam como os principais agentes desta nova racionalidade. O foco das

suas ações sociais não é a sociedade, considerada amplamente, como o seria se

fosse o Estado este agente, mas a comunidade local" (MELO NETO e FRÓES,

2001, p. 07).

Compete às empresas exercer um importante papel no combate à pobreza em nosso país. De suas ações sociais inovadoras, fundadas na técnica, no cuidado e na valorização da vida em suas diferentes manifestações e exigências, vão, através de mais ações, menos conceitos e melhor visão, certamente, emergir uma nova 'praxis' socialmente responsável e, com isso, gerar soluções eficazes (MELO NETO e FRÓES, 2001, p. 50).

Um dos indicadores de que a prática social tende a estar cada vez mais

incorporada no elenco de atividades da iniciativa privada é o crescente

reconhecimento de iniciativas empresariais em áreas sociais (ASHLEY, 2002).

Também cada vez mais consumidores têm punido empresas envolvidas em

questões de má conduta social e ambiental (MELO NETO e FRÓES, 1999;

5 Segundo Mclntosh et alli (2001), atualmente as 100 maiores empresas do mundo tem giros de capital maiores que o PIS da metade dos países do mundo. 6 Handy, Charles. "What's it for ali ? Re-inventing capitalism for the next century", RSA Journal, dez. 1996.

Page 26: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

16

PRINGLE e THOMPSON, 2000; MCINTOSH et alli, 2001; ASHLEY, 2002). Cabe as

empresas reconhecerem os princípios de acordo com os quais a sociedade civil

opera e que os princípios de mediação, negociação, responsabilidade e justiça

precisam ser apoiados e estimulados e não minados por elas (MCINTOSH et alli,

2001 ).

o desafio da gestão está em administrar as diferenças das duas

racionalidades vigentes. "São, portanto, relações de diversos tipos: complementares,

de contraposição, compensatórias e substitutivas. Porém, jamais conflituosas. Esta é

a essência da administração de ambas as racionalidades" (MELO NETO e FRÓES,

2001, p. 12).

1.3 A CARACTERIZAÇÃO E O ENTENDIMENTO DA GESTÃO SOCIAL

Na condução paralela das racionalidades econômicas e sociais que se

desenham, a gestão social emerge como um dos possíveis caminhos a serem

adotados para a reversão dos atuais quadros indesejáveis que por hora se

apresentam, principalmente nas sociedades dos países periféricos.

"A gestão social é o processo intersubjetiv07 que preside a ação da cidadania

tanto na esfera privada quanto na esfera pública" (TENÓRIO, 1998, p. 22). Sua

proposta é a reconstrução do conhecimento a partir da produção social. A gestão

social deve atender ao bem comum da sociedade, atuando por meio da esfera

pública.

Para contrapor gestão social (comunicativa)8 e o exercício da cidadania com

gestão estratégica9 deve-se salientar o confronto entre a teoria crítica e a teoria

7 centrado na intersubjetividade da pessoa humana (TENÓRIO, 1998, p. 20). 8 "Falo de ação comunicativa quando as ações dos atores participantes não ficam coordenadas através de círculos egocêntricos de interesses, mas sim através do entendimento (Verstãndigung). Na ação comunicativa os agentes não se orientam primariamente pelo seu próprio êxito, mas sim pelo entendimento" (HABERMAS apud TENÓRIO, 2000, p. 84).

Page 27: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

17

tradicional. A teoria tradicional, enfatizando o empirismo, visa o conhecimento puro

antes da transformação social. Trabalha os fatores sociais como quase neutros.

Com relação à teoria tradicional a teoria crítica tece inúmeras observações:

Resumindo, poderíamos dizer que as observações que a teoria crítica faz à teoria tradicional desenvolveram-se em três aspectos: a) a teoria tradicional é inadequada para analisar ou entender a vida social; b) a teoria tradicional analisa somente o que vê, aceita a ordem social presente, obstruindo qualquer possibilidade de mudança, o que conduz ao quietismo político; c) a teoria tradicional está intimamente relacionada e é fator de sustentação da dominação tecnológica na sociedade tecnocrática em que vivemos (TENÓRIO, 2000, p. 40).

Essa contraposição à teoria tradicional é clara. "[ ... ] os teóricos críticos têm

focado na distorção e no estreitamento do discurso histórico por meio da reificação,

da universalização de interesses de segmentos sociais, da dominação da

racionalidade instrumental e da hegemonia" (ALVESSON e DEETZ, 1996, p. 233).

Seus objetivos estendem-se à totalidade dos indivíduos. "A meta central da teoria

crítica nos estudos da organização tem sido criar sociedades e lugares de trabalho

livres de dominação, em que todos os membros têm igual oportunidade para

contribuir para a produção de sistemas que venham ao encontro das necessidades

humanas e conduzam ao progressivo desenvolvimento de todos" (AL VESSON e

DEETZ, 1996, p. 238).

A busca por uma análise menos superficial das relações é uma das bases da

Teoria Crítica. "Pôr ser reflexiva a teoria crítica investiga as interconexões recíprocas

dos fenômenos sociais e observa-os numa relação direta com as leis históricas do

momento na sociedade estudada; ela tem a sociedade como objeto de estudo e,

para compreendê-Ia, as suas interconexões estruturais devem ser analisadas para

evitar a superficialidade da análise" (TENÓRIO, 2000, p. 37). O destino do indivíduo

e as ações sociais que o determinam são objetos da análise. "O que significa dizer

que as leis objetivas do movimento da sociedade são a essência que determina o

9 "Denominamos de estratégica uma ação orientada ao êxito quando a consideramos sob o aspecto de observância de regras de eleição racional e avaliamos o grau de eficácia obtido no intento de influir sobre as decisões de um oponente racional" (HABERMAS apud TENÓRIO, 2000, p. 82). A gestão estratégica está assim definida como uma política que concentra esse conjunto de ações e condutas.

Page 28: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

18

destino do indivíduo. Na dialética da teoria crítica, a totalidade (a sociedade) tem

primazia sobre o particular, isto é, a sociedade precede o sujeito, mostrando a

diferença entre o geral e o particular e a determinação deste pelo geral" (TENÓRIO,

2000, p. 37).

A Teoria Crítica surgiu com a Escola de Frankfurt, a partir dos trabalhos de

Horkheimer, Adorno e Marcuse, entre outros. "A Escola de Frankfurt não negava a

tendência à racionalização burocrática e ao formalismo legal da sociedade. O que

condenava era a redução da racionalidade a seu aspecto instrumental, formal e

dominador que coisifica o homem" (TENÓRIO, 2000, p. 44). O entendimento do

termo 'racionalidade instrumental' faz-se necessário. "A racionalidade instrumental

ou funcional vai fomentar o processo de burocratização da sociedade, processo que

está relacionado ao conceito, também weberiano, de autoridade racional-legal, que é

um sistema baseado em normas, estabelecido por acordo ou imposição e

implementado por uma equipe burocrática" (TENÓRIO, 2000, p. 43). É na razão

instrumental que se alicerça a gestão estratégica, uma ação racional voltada para o

êxito a partir do cálculo de meios e fins, no qual transparecem a autoridade formal de

uma pessoa sobre a outra evocada na hierarquia (TENÓRIO, 1998).

Ainda que evidentes as contribuições da primeira geração frankfurtiana,

especial atenção deve ser voltada ao trabalho de Jürgen Habermas, que iniciou sua

relação com o Escola de Frankfurt como assistente de Adorno. "O objetivo de

Habermas é, portanto, desenvolver uma teoria que, diferentemente da teoria

tradicional denunciada por Horkheimer, permita uma práxis social voltada para um

conhecimento reflexivo e uma práxis política que questione as estruturas socio­

político-econômicas existentes" (TENÓRIO, 2000, p. 50). Habermas incita o

questionamento. Não se satisfaz simplesmente com considerações a respeito das

dominações presentes nas relações entre indivíduos, mas discute a aceitação e a

participação dos dominados nesse processo todo. "O ponto central disso é a crítica

Page 29: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

19

de dominação e os modos pelos quais aqueles subjugados participam ativamente da

própria subjugação" (ALVESSON e DEETZ, 1996, p. 233). Habermas apoia sua

teoria na racionalidade comunicativa. "Finalmente, a ação comunicativa, a mais

importante ação social, na perspectiva habermasiana, é aquela na qual duas ou

mais pessoas procuram chegar ao entendimento sobre determinado objetivo"

(TENÓRIO, 2000, p. 72). Constitui-se assim um novo paradigma. "Sob este novo

paradigma - racionalidade comunicativa - em uma ação social, somente pode ser

considerado capaz de responder pelos seus atos aquele que seja capaz, como

membro de uma comunidade de comunicação, de orientar sua ação por pretensões

de validade intersubjetivamente reconhecidas" (TENÓRIO, 2000, p. 76).

As propostas de Habermas conduzem a um homem emancipado. "Habermas

defende a tese de que 'todo o conhecimento é posto em movimento por interesses

que o orientam, dirigem-no, comandam-no'." (TENÓRIO, 2000, po 54). Explica-se

esse posicionamento através das relações de dominação identificadas. "Portanto, o

homem, através do trabalho, tem interesse em dominar a natureza mediante o

planejamento e controle de seus processos produtivos; o trabalho por sua vez, é

implementado socialmente através de processos organizativos. No primeiro caso -

trabalho - existe um interesse técnico, e no segundo - interação - existe um

interesse prático, moral" (TENÓRIO, 2000, po 54). Nesse contexto é que abre-se a

necessidade da racionalidade comunicativa. É nessa interação que se dá a ação

comunicativa.

[ .. 0] em uma ação comunicativa, os atores, ao fazerem suas propostas, têm de apresentá-Ias sob bases racionais, quer dizer, nenhuma das partes pode impor suas pretensões de validade sem que haja um acordo alcançado comunicativamente, no qual todos os participantes expõem os seus argumentos. Existe argumento quando os requisitos de validade se tornam explícitos em termos de até que ponto podem ser oferecidas boas razões para eles em lugar de coação ou força (TENÓRIO, 2000, p. 76).

Somente a ação comunicativa permite um 'acordo verdadeiro' entre as partes,

algo cujo significado possa ser verdadeiramente reconhecido como proveniente de

um entendimento.

Page 30: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

20

[ ... ] dizer que alguém está atuando racionalmente ou que um enunciado é racional é como dizer que a ação ou enunciado pode ser criticado ou defendido pela pessoa ou pessoas implicadas, de tal modo que estas possam justificá-Ias ou fundamentá-Ias. Nesse tipo de ação social, as pessoas envolvidas entram em acordo para coordenar seus planos de ação, no qual o ajuste alcançado é avaliado pelo reconhecimento intersubjetivo das pretensões de validade do discurso de cada um dos atores envolvidos (TENÓRIO, 2000, p. 77).

Assim sendo, "[ ... ] em um agir comunicativo não existe hegemonia decisória

daqueles que ocupam cargos de direção, mas sim uma esfera pública na qual todos

os agentes envolvidos têm participação ativa no processo de tomada de decisão"

(TENÓRIO, 2000, p. 16). ° consenso é oriundo da discussão. "Na ação

comunicativa, a verdade só existe se todos os participantes da ação social admitem

sua validade, isto é, verdade é a promessa de consenso racional, ou a verdade não

é uma relação entre o indivíduo e a sua percepção do mundo, mas sim um acordo

alcançado por meio da discussão crítica" (TENÓRIO, 2000, p. 77). Essa discussão

por sua vez baseia-se em argumentos 10.

Só assim que indivíduos libertam-se ou podem ser identificados como livres

de dominação. "Os indivíduos sob o processo de argumentação devem reconhecer­

se livres, com os mesmos direitos e obrigações, devendo também negar a validade

de toda a coação que não seja a do melhor argumento" (TENÓRIO, 2000, p. 83).

Ciente do seu valor, pode o indivíduo valorizar-se na participação e reconhecer a

importância de suas ações, seja frente a uma organização, seja frente a outros

indivíduos. "[ ... ] a liberdade de manifestar-se e exprimir-se constitui o núcleo central

do desenvolvimento do homem" (BROCCHIERI, 1999, p. 431).

A atualidade da proposta da teoria crítica é evidente. "[ ... ] a flexibilização

organizacional, o caminhar para uma situação pós-fordista de gestão da produção,

depende da interação dos elementos progresso científico-técnico, globalização da

economia e valorização da cidadania" (TENÓRIO, 2000, p. 245). A difusão da

10 Argumento é a fundamentação racional daqueles que participam de uma ação comunicativa. A argumentação, na perspectiva habermasiana, não é um processo de tomada de decisão que seja concluído através de resoluções, mas um procedimento de solução de problemas, que conduza a convicções dos atores da ação, no qual só está obrigado a reconhecer certos padrões de racionalidade quando se encara com seriedade a dialogicidade (TENÓRIO, 2000, p. 83).

BIBLlor::::CA MAf~IJ HEI~,-~iQUê ~lWCrtSE" FUNDACAo GETULIO VARGAS

Page 31: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

21

informação e conhecimentos perante o indivíduo contribuem decisivamente. "Cada

vez mais importante para os estudos críticos é o enriquecimento da base de

conhecimento, a melhoria do processo de decisão e os aumentos na 'aprendizagem'

e na adaptação" (ALVESSON e DEETZ, 1996, p. 238). Dessa forma, "[ ... ] a

efetivação do pós-fordismo somente seria concretizada se, e somente se, a atitude

gerencial estivesse centrada nos pressupostos habermasianos da ação

comunicativa ou, como denominamos, da ação gerencial dialógica" (TENÓRIO,

2000, p. 245). Entre outras implicações compreende-se que "o fato dessa política

propor que a informação seja utilizada de forma descentralizada qualifica uma ação

social na qual os empregados têm o direito de participar do processo decisório, isto

é, de uma tendência a ação gerencial dialógica" (TENÓRIO, 2000, p. 258). Isso

permitiria a efetivação de uma profunda mudança: uma alteração das posturas dos

indivíduos mediante uma melhor formação da base de conhecimentos e melhoria

das inter-relações. Brocchieri (1999), comentando a obra de Jungk11 reforça essas

considerações acrescentando mais elementos ao tema: "[ ... ] o trabalhador deverá ter

a sensação da totalidade do próprio trabalho, seguir o seu itinerário produtivo, saber

por que, como e onde o seu 'produto' será avaliado, comercializado e utilizado. Esse

novo estilo de trabalho poderá realizar-se somente se as exigências da produção

estiverem em harmonia com os princípios ético-sociais de uma melhor qualidade de

vida" (BROCCHIERI, 1999, p. 435).

A gestão social, portanto está direcionada pela racionalidade comunicativa12,

onde se preserva a negociação e o entendimento entre as partes envolvidas. A

11 Robert Jungk nasceu em Berlim em 1913, estudou filosofia e psicologia. Após 1933 deixou a Alemanha para se estabelecer na França e depois na Suíça, nos Estados Unidos e na Áustria. As suas principais obras são: /I futuro é già cominciato (1954), GIi appendisti stregoni (1958), Hiroshima iI giomo dopo (1960), La gande macchina. I nuovi scienziati atomici (1968) (BROCCHIERI, 1999, p. 425). 12 "Esse conceito de racionalidade comunicativa carrega consigo conotações baseadas, em última instância, na experiência central da força de uma fala argumentativa desprovida de constrangimento, unificadora, geradora de consenso, na qual diferentes participantes superam suas visões meramente subjetivas e, devido à mutualidade de convicção racionalmente motivada, asseguram-se ao mesmo

Page 32: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

22

argumentação é vista como essencial conduzindo as convicções dos envolvidos a

um processo de solução de problemas.

A caracterização da valorização da cidadania fica evidenciada na abordagem

de Habermas sobre racionalidade comunicativa.

Confonne essa concepção [cidadania deliberativa] a razão prática se afastaria dos outros direitos universais do homem (liberalismo) ou a eticidade concreta de uma detenninada comunidade (comunitarismo) para se situar naquelas nonnas de discursos e de fonnas de argumentação que retiram seu conteúdo normativo do fundamento da validade orientada para o atendimento, e, em última instância, portanto, da própria estrutura de comunicação lingüística (HABERMAS apud TENÓRIO, 2000, p. 184).

Nessa concepção, a cidadania deliberativa13 nas relações de trabalho irá

ocorrer quando o trabalhador tiver consciência da importância de seu papel nas

organizações, passando a reivindicar, além dos ganhos materiais, um maior poder

de participação em decisões e melhorias contínuas nas condições de trabalho.

Outro conceito importante que vem consolidar essa análise é o da cidadania

social que é " ... a conquista de significativos direitos sociais, no domínio das relações

de trabalho, da segurança social, da saúde, da educação e da habitação por parte

das classes trabalhadoras das sociedades centrais e, de um modo muito menos

característico e intenso, por parte de alguns setores das classes trabalhadoras em

alguns países periféricos e semiperiféricos" (SANTOS, 1999, p. 243). Tal afirmação

ressalta ainda mais a importância de práticas que reflitam o exercício da

responsabilidade social em países como o Brasil.

Às considerações relativas ainda aos períodos fordista e pós-fordista vale

acrescentar os conceitos de ação gerencial monológica e dialógica. Na ação

gerencial monológica, sob o período fordista, as ações sociais são de caráter

estratégico apenas, inibindo a livre expressão dos trabalhadores. É uma ação social

tempo da unidade do mundo subjetivo e da intersubjetividade do seu mundo vivido" (HABERMAS apud ALVESSON e DEETZ, 1996, p. 244). 1 "( ••• ) essa concepção de cidadania deve ser entendida como uma ação política deliberativa, na qual o indivíduo deve participar de um procedimento democrático decidindo, nas diferentes instâncias de uma sociedade e em diferentes papéis, o seu destino social como pessoa humana, quer como eleitor, trabalhador ou consumidor, ou seja, a sua autodetenninação não se dá sob a lógica do mercado mas da democracia social: igualdade política e decisória" (TENÓRIO, 2000, p. 184).

Page 33: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

23

hierarquizada e autoritária. Por outro lado, a ação gerencial dialógica visa a

negociação e o entendimento, levando em consideração um novo perfil do

trabalhador, mais esclarecido e evoluído no processo produtivo e decisório. A

gerência dialógica atua com o cidadão-trabalhador. Deve, portanto, ter uma

capacidade de entender o relacionamento com os indivíduos da força produtiva,

tanto do ponto de vista técnico quanto do relacional com conhecimento crítico­

reflexivo.

1.4 O TERCEIRO SETOR

Uma alternativa de gestão social que está sendo apontada como saída para

muitos problemas sociais é o terceiro setor14 através do trabalho de parcerias entre

entidades não governamentais e os sistemas-empresas para atender deficiências

sociais. "A definição de terceiro setor surgiu já na primeira metade do século nos

Estados Unidos15. Ele seria uma mistura dos dois setores econômicos clássicos da

sociedade: o público, representado pelo Estado, e o privado, representado pelo

empresariado em geral" (MELO NETO e FRÓES, 1999, p. 5).

Segundo a tenninologia dos especialistas, o terceiro setor é o conjunto de iniciativas particulares, sem fins lucrativos, que geram bens e serviços de caráter público, composto por fonnas tradicionais de ajuda mútua (atividades assistenciais e beneficentes), movimentos sociais e associações civis (associações de bairro, etc.), filantropia empresarial (fundações ligadas a empresas privadas) e ONGs (organizações não-governamentais), cujas ações são voltadas a um público específico, a uma comunidade ou a toda uma sociedade (SINA e SOUZA, 1999, p. 17).

Com a fragilização do Estado, muitas das questões sociais passaram a ser

discutidas e tratadas também por membros e grupos da sociedade civil e pelo setor

privado. O terceiro setor cresceu a partir da ineficiência do Estado e é formado por

14 Os setores da economia estão assim classificados: Primeiro setor: Estado - poder público; Segundo setor: Mercado - iniciativa privada; Terceiro setor: Organizações sem fins lucrativos (SINA e SOUZA, 1999, p. 17). 15 Segundo o professor Luís Carlos Merege, coordenador do Centro de Estudos no Terceiro Setor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, a noção vem do comportamento filantrópico que a maioria das empresas norte-americanas sempre manteve ao longo da história (MELO NETO e FRÓES, 1999, p.5).

Page 34: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

24

entidades da sociedade civil, organizações não-governamentais (ONGs), igrejas,

associações e fundações que atuam em diversas áreas: no combate à pobreza e à

exclusão social, na prevenção e assistência à saúde, na assistência às crianças,

deficientes, idosos, jovens e famílias, enfim na luta pelos direitos humanos e pela

eqüidade social. São instituições comprometidas com melhores condições de vida

da população e democracia no país (BORBA et alli, 2001).

Trata-se, portanto, de um setor amplo e de grande diversidade. "As principais

características do terceiro setor são a natureza específica de suas ações, de caráter

filantrópico e de investimentos em programas e projetos sociais, e o alto grau de

diversidade das entidades que dele fazem parte" (MELO NETO e FRÓES, 1999, p.

18). O terceiro setor diferencia-se do primeiro setor (setor público) e o segundo setor

(setor privado) na medida que desenvolve atividades públicas através de

associações profissionais, voluntárias, entidades de classe, fundações privadas,

instituições filantrópicas e movimentos sociais organizados.

"O agora chamado terceiro setor sempre existiu no Brasil, tendo início com as

Casas de Misericórdia, em 1570, mas entrou em relativo declínio após 1940, quando

muitas de suas funções passaram a ser preocupação exclusiva do Estado, a fase do

'tudo pelo social'" (KANITZ, 2001, p. 74). Segundo Kanitz (2001), somente a partir de

1994 o terceiro setor voltou a ganhar força no Brasil, com a falência do Estado e a

transferência de nossos líderes empresariais para escritórios centrais no exterior -

efeito da globalização, afastando-os dos problemas locais que antigamente

ajudavam a resolver.

"O Estado, a iniciativa privada e os cidadãos reunidos em benefício de causas

sociais. Essa definição aparentemente ingênua representa um dos mais modernos

conceitos econômicos surgidos no Brasil nos últimos anos: o Terceiro Setor" (MELO

NETO e FRÓES, 1999, p. 06). As organizações e empresas interessadas em atuar

junto ao terceiro setor precisam investir num aprendizado, pois este é um terreno

Page 35: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

25

ainda desconhecido pela maioria. "É um ramo de atividade que tem racionalidade

econômica própria, regras de atuação específicas. A economia deste setor não gira

em torno de indicadores econômicos, mas de indicadores sócio-econômicos,

internos e externos" (MELO NETO e FRÓES, 2001, p. 23). O crescimento e a

sobrevivência das empresas estará condicionado ao estabelecimento dessa parceria

junto ao Estado e a sociedade civil. "O ponto de partida para o desenvolvimento do

Terceiro Setor, no qual as empresas socialmente responsáveis têm uma atuação

relevante, foi o esgotamento do modelo welfare state tradicional" (MELO NETO e

FRÓES, 2001, p. 53).

o crescimento e expansão dos negócios em diferentes partes do mundo serão cada vez menos baseados em fusões e aquisições ou mesmo na abertura de novos negócios. Eles terão de ser apoiados em alianças, parcerias, empreendimentos conjuntos e todos tipos de relações com organizações localizadas em outras jurisdições políticas. Em outras palavras, eles terão de ser fundamentadas em estruturas que sejam unidades econômicas e não legais, isto é, políticas (DRUCKER, 1999, p. 61).

Nesse novo contexto, ocorre a valorização das inter-relações, tanto as de

caráter macro envolvendo diferentes esferas e organizações, como as dos

indivíduos nas comunidades que freqüentam ou acessam. Não é possível dissociar

esse cidadão trabalhador ou a busca por esse entendimento entre as partes, das

questões que envolvem a responsabilidade social. A cidadania empresarial precisa

refletir todas as ações e práticas da cidadania deliberativa, as conquistas desses

crescimentos de atitude e de capacidade crítica e reflexiva. A responsabilidade

social das organizações e a questão da cidadania corporativa estão fortemente

alicerçadas pelos conceitos expostos anteriormente da gestão social e da

racionalidade comunicativa, razão pela qual merecem um estudo detalhado que

evidencie sua ampla compreensão.

Page 36: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

26

2 RESPONSABILIDADE SOCIAL

o tema da responsabilidade social das organizações só vem sendo

desenvolvido recentemente no Brasil embora não se trate de um conceito totalmente

novo. A responsabilidade social está associada à postura e ao comportamento

socialmente responsáveis da empresa, tanto no cumprimento de suas obrigações

legais quanto no atendimento de necessidades sociais de seus trabalhadores e

familiares, e também no que se refere ao seu ambiente social e comunitário.

Sendo assim, a nova visão da gestão social nos últimos anos passou a

influenciar significativamente as relações empresariais e sua gestão dos negócios.

No Brasil, o movimento de valorização da responsabilidade social ganhou forte

impulso na última década do século passado através da ação de entidades não

governamentais, institutos e empresas sensibilizadas para a questã016. As enormes

carências e desigualdades sociais existentes em nosso país dão à responsabilidade

social empresarial, relevância ainda maior. A sociedade brasileira espera que as

empresas cumpram um novo papel no processo de desenvolvimento: sejam agentes

de uma nova cultura, sejam atores de mudança social, sejam construtores de uma

sociedade melhor. O empresariado nacional tem demonstrado essa preocupação,

crescendo o interesse em fazer parte deste processo que vem gradativamente se

desenvolvendo, vindo ao encontro das expectativas da sociedade brasileira. liA mão

visível, como diria Adam Smith, está transformando o conceito de boa cidadania

corporativa - ou de responsabilidade social - numa questão de estratégia e de

sobrevivência a longo prazo no mundo dos negócios" (VASSALO, 2000, p. 9).

16 Para Célia Rosemblum (2000) no Brasil, o conceito é relativamente novo e ainda não foi incorporado ao dia-a-dia da maior parte das empresas do país.

Page 37: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

27

2.1 O CONCEITO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL

A definição do termo diverge opiniões e suscita uma série de diferentes

interpretações. Alguns o compreendem através da noção de responsabilidade e de

obrigação legal. Outros o vêem como um dever fiduciário pelo qual é imposto à

empresa um comportamento superior ao do cidadão médio. São observadas

traduções que remetem a idéia de papel social, de prática social e de função social.

Outros autores interpretam o termo baseados em um comportamento eticamente

responsável, em um critério de legitimação do exercício da organização ou ainda em

uma simples contribuição caridosa (ASHLEY, 2002).

Trata-se de um conceito novo, que praticamente somente nos últimos dez

anos começou a ser incorporado ao dia-a-dia das empresas brasileiras. Sendo

assim, a responsabilidade social carece de uma definição mais precisa e

amplamente aceita pelos profissionais da área e empresários (MELO NETO e

FRÓES, 2001; ASHLEY 2002). A literatura ainda diverge também quanto ao

posicionamento em relação ao tema: alguns defendem a responsabilidade social

como instrumento essencial à reversão dos atuais quadros sociais enquanto outros

indagam a legitimidade da aplicação de recursos na área social. A marcante

conotação ideológica (e política) do conceito o torna alvo de polêmicas e discussões

(ASHLEY, 2002).

Entre as críticas mais contundentes à responsabilidade social está a do

economista americano Milton Friedman ao afirmar que a empresa está sendo

socialmente responsável unicamente ao produzir bens e serviços com lucro17. Esta

seria a missão básica da empresa e também sua contribuição máxima à sociedade

(FERREL et alli, 2001). Para Friedman, a direção corporativa, vista como agente dos

acionistas, não tem o direito de fazer nada que não atenda ao objetivo de maximizar

17 FRIEDMAN, Milton. Social responsability of business is to increase its profits. New York Times Magazine. New York, NY, pp. 122-126, 13 set. 1970.

Page 38: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

28

os lucros através da otimização do uso dos recursos organizacionais e dentro dos

limites da lei. Ao desviar seus recursos para ações sociais, a empresa pode estar

prejudicando sua competitividade (ASHLEY, 2002).

Na mesma linha de ação, Henderson (2000) argumenta enfaticamente que a

postura de assumir uma responsabilidade social por parte da empresa é um engodo.

Por trás do discurso da responsabilidade social estaria a incessante busca pela

maximização dos lucros. Também seriam questionáveis os benefícios sociais

disponibilizados pelas ações desenvolvidas com a participação da iniciativa privada.

Rotulando a responsabilidade social como um 'modismo', o autor ainda aponta sua

crítica sobre dois alvos principais: os prejuízos intelectuais18 e o fato do exercício da

cidadania empresarial não ser gratuito - demanda recursos que, segundo ele,

certamente precisam ser obtidos a partir da elevação dos preços, ou seja, pagos

pela sociedade (HENDERSON, 2000).

Tais posicionamentos porém, têm sido confrontados pela grande maioria dos

autores e profissionais da área, mobilizados num entendimento da responsabilidade

social como uma postura pró-ativa da organização, que refletirá na sua

competitividade e na busca de um desenvolvimento auto-sustentável (MCINTOSH et

alli, 2001; MELO NETO e FRÓES, 2001; ASHLEY, 2002). Autores contemporâneos

têm descrito a responsabilidade social a partir de outras características como por

exemplo o investimento na preservação ambiental e na educação, englobando os

públicos interno e externo (MELO NETO e FRÓES, 1999; ASHLEY, 2002). "Sugerir

que uma empresa só tem que cumprir com suas obrigações financeiras e legais para

ser uma boa cidadã corporativa é compreender mal o papel dos negócios na

sociedade. ( ... ) Qualquer negócio é uma entidade tanto econômica quanto social"

(MCINTOSH et alli, 2001, p. 44). Mclntosh et alli (2001) alertam para o fato de que

18 Para Henderson (2000) os adeptos da responsabilidade social teriam uma incapacidade para entender a racionalidade do capitalismo, o que faz com que muitas concepções errôneas derivem do fato.

Page 39: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

29

as organizações que não compreendem as outras responsabilidades sociais são

mais prováveis de deixar de cumprir suas responsabilidades econômicas e legais.

Nos últimos anos, o termo responsabilidade social tem ganhado amplitude. O

que fortalece a discussão porém também contribui para uma gama maior de

possibilidades e diferentes interpretações. liA responsabilidade social no mundo dos

negócios consiste na obrigação da empresa de maximizar seu impacto positivo

sobre os stakeholders (clientes, proprietários, empregadores, comunidade,

fornecedores e governo) e em minimizar o negativo" (FERREL et alli, 2001, p. 68).

Na concepção de Ferrei et alli (2001) trata-se de uma obrigação assumida pela

empresa para com a sociedade. Lewis e Littler (2001) concordam com esta

definição, salientando que "0 geralmente aceito como responsabilidade social varia

em diferentes sociedades e também se altera no decorrer do tempo" (LEWIS e

LlTTLER, 2001, p. 282).

Para D'Ambrosio e Mello (1998) a responsabilidade social de uma empresa

consiste na sua "decisão de participar mais diretamente das ações comunitárias na

região em que está presente e minorar possíveis danos ambientais decorrente do

tipo de atividade que exerce" (D'AMBROSIO & MELLO, 1998, p. 1).

Melo Neto e Froes (1999) desenvolvem o conceito de forma semelhante a

Ferrei et alli (2001) e Lewis e Littler (2001), argumentando que a empresa precisa

oferecer algo para a sociedade em troca ao que por ela (empresa) foi usurpado. liA

responsabilidade social é vista como um compromisso da empresa com relação à

sociedade e à humanidade em geral, e uma forma de prestação de contas do seu

desempenho baseada na apropriação e uso de recursos que originalmente não lhe

pertencem" (MELO NETO e FRÓES, 1999, p. 84).

No centro da questão está o fato de que as ações de responsabilidade social

corporativa buscam o aprimoramento das relações das empresas com seus diversos

Page 40: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

30

públicos, inserindo-as no âmbito social das comunidades vizinhas e, sobretudo,

reforçando a atuação junto a seus principais parceiros - ONGs, associações

comunitárias, entidades filantrópicas e o governo local (MELO NETO e FRÓES,

2001 ).

Para efeito desse trabalho compreenderemos a responsabilidade social a

partir da definição exposta por Ashley (2002, p. 6): "Responsabilidade Social pode

ser definida como o compromisso que uma organização deve ter para com a

sociedade, expresso por meio de atos e atitudes que a afetem positivamente, de

modo amplo, ou a alguma comunidade, de modo específico, agindo proativamente e

coerentemente no que tange a seu papel específico na sociedade e a sua prestação

de contas para com ela."

Nessa visão, outras obrigações, que não somente as descritas em lei ou

diretamente vinculadas as atividades da empresa, mas sim aquelas de caráter

moral, que possam efetivamente contribuir para a melhoria da qualidade de vida da

sociedade e para um desenvolvimento sustentável, são assumidas pela

organização. Reconhece-se que a responsabilidade social é um conceito ainda em

construção, em meio as discussões e debates referentes ao tema (ASHLEY, 2002).

2.2 RESPONSABILIDADE SOCIAL E CIDADANIA CORPORATIVA

Juntamente com a questão da responsabilidade social surge o conceito de

cidadania corporativa. Embora muito próximos e, na maioria das vezes, utilizados

indistintamente, alguns autores evidenciam diferenças entre esses termos. "A

cidadania corporativa diz respeito ao relacionamento entre empresas e sociedade -

tanto a comunidade local que cerca uma empresa e cujos membros interagem com

seus funcionários, quanto a comunidade mundial mais ampla, que atinge todas as

Page 41: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

31

empresas através de seus produtos, sua cadeia de suprimentos, sua rede de

revendedores, sua propaganda e assim por diante" (MCINTOSH et alli, 2001, p. 16).

Para Melo Neto e Fróes (2001), a "responsabilidade social é um estágio mais

avançado no exercício da cidadania corporativa" (MELO NETO e FRÓES, 2001, p.

26). Quando a empresa socialmente responsável insere-se na comunidade que

existe em sua vizinhança, ela introduz um novo elemento na sociedade: a cidadania

empresarial ou a responsabilidade social corporativa. Consciência social e dever

cívico relacionam-se assim à responsabilidade social (MELO NETO e FRÓES,

2001 ).

Quando utiliza-se a expressão cidadania corporativa, traça-se um paralelo

entre o cidadão individual com seus direitos e deveres como membro de uma

comunidade e a empresa que, mesmo sendo formada por inúmeras pessoas, age tal

como um sujeito. Assim, as empresas, tal como os indivíduos, revelam suas

responsabilidades no exercício de seus deveres e direitos, em meio a constantes

mudanças (MCINTOSH et alli, 2001).

Se a diferença entre os termos cidadania corporativa e responsabilidade

social é evidenciada por alguns autores e desprezada por outros, fato é que

responsabilidade social e cidadania dificilmente podem vir a ser separadas. "A ação

de responsabilidade social não é individual. Reflete a ação de uma empresa em prol

da cidadania. A empresa que a pratica demonstra uma atitude de respeito e estímulo

à cidadania corporativa; consequentemente existe uma associação direta entre o

exercício da responsabilidade social e o exercício da cidadania empresarial" (MELO

NETO e FRÓES, 2001, p. 26).

o exercício da responsabilidade social é um esforço coletivo mobilizador

exatamente porque valoriza a cidadania e promove a inclusão social buscando

restaurar a civilidade (MELO NETO e FRÓES, 2001). Para efeitos desse trabalho,

Page 42: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

32

entendemos que responsabilidade social como instrumento de valorização e resgate

da cidadania, praticada com esta legítima intenção, não deve ser dissociada da

cidadania corporativa. O exercício de um pressupõe a existência do outro.

Mclntosh et alli (2001) sugerem a interpretação da cidadania corporativa

como formando um continuum, delineado a partir da cidadania mínima - com o

cumprimento única e exclusivamente das leis que governam a operação da empresa

- até um relacionamento complexo, de direitos e responsabilidades interligados de tal

forma que o relacionamento entre uma organização e suas comunidades passe a ter

participação integral no funcionamento da empresa. No futuro, as empresas ao

descobrirem como melhor utilizar esse relacionamento caminharão em direção à

plena cidadania19. Assim, contrariando Friedman, ser vista como cidadã corporativa

é também uma questão de competitividade. "Cidadania corporativa não é filantropia,

não é escrever um anexo sobre ações comunitárias no relatório financeiro anual.

Não é uma idéia posterior ao negócio, entregue ao departamento de recursos

humanos. É a cidadania no coração do planejamento" (MCINTOSH et alli, 1998, p.

63).

2.3 RESPONSABILIDADE SOCIAL E ÉTICA NOS NEGÓCIOS

Ferrei et alli (2001) alertam para o fato de que os conceitos de ética nos

negócios e responsabilidade social são muitas vezes usados como sinônimos.

Tratam-se de expressões estreitamente vinculadas que, entretanto, possuem

significados diferentes.

"A responsabilidade social, portanto, pode ser considerada um contrato com a sociedade, ao passo que a ética empresarial envolve regras de conduta da empresa, cuidadosamente pensadas que orientam a tomada de decisões da organização. A ética empresarial diz respeito a regras e princípios que pautam decisões de indivíduos e grupos de trabalho; a

19 Empresas expostas ao escrutínio da mídia global, como a Shell e o McDonald's, sabem que o relacionamento entre negócios e a sociedade está mudando radicalmente e com muita rapidez (MCINTOSH et alli, 2001, p. 4).

Page 43: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

33

responsabilidade social refere-se ao efeito de decisões das empresas sobre a sociedade" (FERREL et alli, 2001, p. 8).

Para Rosemblum (2000, p. 1), "a responsabilidade social corporativa é uma

conduta que vai da ética nos negócios às ações desenvolvidas na comunidade,

passando pelo tratamento dos funcionários e relações com acionistas, fornecedores

e clientes."

Embora não possam ser utilizadas como sinônimos, responsabilidade social e

ética nos negócios também dificilmente poderão vir a ser desvinculadas. "A

responsabilidade social como conceito só poderá ser incorporada ao processo diário

de tomada de decisões se as empresas incluírem em sua filosofia preocupações de

natureza ética. A descrição da responsabilidade ética da empresa deve incluir

direitos e deveres2o, conseqüências e valores, todos os quais se referem a fatores

estratégicos específicos" (FERREL et alli, 2001, p. 79). Some-se à ética e à

responsabilidade social a integridade21. A base ética do comportamento da empresa

socialmente responsável é a integridade, que pode ser compreendida como sua

dimensão de maior amplitude. Ela não somente envolve a ética aplicada aos

negócios ao desviar-se do uso de propaganda enganosa, da prática de vendas

casadas e demais instrumentos de um marketing desonesto (mais facilmente

percebidos), como também aplica essa ética em todo o ambiente organizacional

(MELO NETO e FRÓES, 2001).

Ashley (2002) argumenta que os conceitos de ética e responsabilidade social

corporativa vêm amadurecendo quanto a suas capacidades de mensuração e

operacionalização, subdividindo-se em vertentes de conhecimento.

20 Histórica e culturalmente, as sociedades ocidentais tendem a identificar mais direitos corporativos do que responsabilidades. Mas esta é uma situação que está mudando. Por uma série de razões espera-se mais da empresa como cidadã (MCINTOSH et alli, 2001, p. 16). 21 Integridade compreendida aqui como retidão e imparcialidade, como a qualidade de ser inatacável.

Page 44: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

34

2.4 O DESENVOLVIMENTO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL: DAS ORIGENS NA FILANTROPIA AOS DIAS ATUAIS

Embora hoje a responsabilidade social revele muito mais amplitude, suas

origens remetem à filantropia e também aos movimentos comunitários. A filantropia

desenvolveu-se a partir do entendimento, por parte de alguns, da idéia de que

aqueles que recebem e/ou tiram da sociedade como as empresas fazem, têm o

dever de retribuir em parte. Como não conseguem fazer isso oferecendo mais

empregos e melhores salários, já que estas duas linhas de ação nem sempre são

condizentes com os preceitos básicos de sua racionalidade econômica, as

organizações descobriram o filão da inserção social (MELO NETO e FRÓES, 2001).

Tecnicamente a filantropia não deve ser utilizada como sinônimo de

responsabilidade social, uma vez que traduz apenas em parte este conceito. liA

atividade de negócios filantrópica é a distribuição do excesso de lucros após outras

pessoas que tenham direito, como acionistas, terem sido pagas. É uma atividade

voluntária da parte da empresa e normalmente não faz parte do seu funcionamento

diário de negócios" (MCINTOSH et alli, 2001, p. 310).

Para Melo Neto e Fróes (2001), a responsabilidade social é uma ação

estratégica da empresa que busca retorno econômico, social, institucional e

tributário-fiscal, enquanto que a filantropia não busca retorno algum, apenas o

retorno pessoal e moral de quem a pratica. A base da filantropia é o

assistencialismo, ao auxiliar aos pobres, aos miseráveis, aos excluídos ou aos mais

desfavorecidos, entre outros. Já a responsabilidade social objetiva estimular o

desenvolvimento do cidadão, fomentando a cidadania individual e coletiva. Enquanto

a filantropia é centrada no dever moral, a responsabilidade social tem no dever

cívico sua ética. As ações de responsabilidade social tem ainda maior raio de ação,

não privilegiando um único segmento isoladamente, sendo extensivas a todos os

que participam da vida em sociedade - indivíduos, Estado, empresas, grupos sociais,

Page 45: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

35

movimentos sociais, igreja, partidos políticos e demais instituições (MELO NETO e

FRÓES, 2001).

"A visão mais clássica de responsabilidade social dava importância ao que o

empresário realizava, em termos de ações filantrópicas, fora de seu expediente

normal de trabalho, sendo, portanto, a responsabilidade social da empresa creditada

aos atos beneméritos de seu proprietário" (ASHLEY, 2002, p. 87). Ashley (2002)

destaca porém não haver nenhuma similaridade entre a visão contemporânea sobre

responsabilidade social nos negócios e a filantropia típica do passado praticada em

países como Inglaterra, Estados Unidos e Alemanha.

"As ações de filantropia correspondem à dimensão inicial do exercício da

responsabilidade social. Sua característica principal é a benemerência do

empresário, que se reflete nas doações que faz para entidades assistenciais e

filantrópicas" (MELO NETO e FRÓES, 1999, p. 79). A temporalidade é uma das

principais características que difere a filantropia da responsabilidade social.

Enquanto a primeira pode ser feita aleatoriamente e esporadicamente, as ações de

responsabilidade social exigem periodicidade, método e sistematização, aliados a

um efetivo gerenciamento por parte das empresas-cidadãs e a um comprometimento

no estabelecimento de relações de longo prazo (MELO NETO e FRÓES, 2001;

ASHLEY 2002).

Segundo Melo Neto e Fróes (1999) a evolução histórica da responsabilidade

social apresenta dois níveis: ao primeiro corresponde a filantropia e ao segundo as

ações sociais com a comunidade; estas últimas sim, permitem que a empresa

coloque a serviço da comunidade seus recursos financeiros, produtos, serviços e

know-how de seus funcionários. Sendo assim, a filantropia é hoje apenas um dos

tipos de ação que se insere no contexto mais amplo da responsabilidade social, a

ponto de alguns especialistas a considerarem um estágio de pré-responsabilidade

social (MELO NETO e FRÓES, 2001).

Page 46: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

36

Quanto aos movimentos comunitários, também para Melo Neto e Fróes

(2001) a responsabilidade social corporativa sucedeu à ética da responsabilidade

comunitária, a primeira tendo como principais agentes as empresas, as ONGs, as

associações comunitárias e filantrópicas e os governos locais, e a segunda centrada

na ação dos movimentos e grupos sociais.

A diferença é clara: a ética da responsabilidade social comunitária enfatiza o voluntariado social dos movimentos sociais, a sua luta contra o Estado, e é baseada, se for corretamente recuperado o seu contexto histórico, nos conflitos ideológicos do tipo direita x esquerda; a ética da responsabilidade social corporativa de gênese não busca o confronto ideológico e nem tampouco se baseia no conflito da sociedade civil com o Estado. Seu objetivo é desenvolver a sociedade e a comunidade a partir de novas inserções e parcerias envolvendo outros agentes, tais como: as empresas, ONGs, entidades filantrópicas, associações comunitárias e o próprio Estado (MELO NETO e FRÓES, 2001, p. 21).

Claramente percebe-se uma nova postura pois as empresas socialmente

responsáveis objetivam o aprimoramento de suas relações com seus públicos

diversos, inserindo-se no âmbito social das comunidades próximas e reforçando a

atuação de ONGs, entidades filantrópicas, associações comunitárias e governo

local. Tais entidades passam a ser compreendidas como parceiros (MELO NETO e

FRÓES, 2001).

Foi somente na década de 60 que a idéia de responsabilidade social ganhou

maior importância, como reação aos valores sociais em mutação, quando muitas

empresas tentaram determinar quais relações, deveres e obrigações seriam

apropriados entre elas e a sociedade (FERREL et alli, 2001). Sucupira (1999) e

Borba et alli (2001) localizam a intensificação da responsabilidade social nos

Estados Unidos dos anos 60, a partir do surgimento de movimentos populares,

fortalecidos pelos movimentos pacifistas contra a Guerra do Vietnã, em defesa de

um equilíbrio ecológico e contrários a discriminação racial, o que acentuou

profundamente as lutas sociais.

No Brasil, a prática da responsabilidade social teve forte impulso com o

trabalho do Ibase. "O movimento iniciado pelo Ibase foi responsável pelo

fortalecimento da sociedade civil, pelo desenvolvimento da sensibilidade cidadã e

Page 47: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

37

pela difusão de valores centrais como democracia e justiça." (MELO NETO e

FRÓES, 2001, p. 19). Ashley (2002) salienta que a entrada de novos competidores

estrangeiros, em meados da década de 90, intensificou a velocidade de lançamento

de novos produtos e serviços e com eles novas práticas de gestão e de

relacionamento com funcionários, fornecedores, clientes, colaboradores e

comunidades tiveram que ser buscadas pelas empresas.

Para Dunn (1998) a manifestação da responsabilidade social por parte das

organizações pode ser compreendida dentro de um processo de evolução de suas

atuações. Depois de começarem com a filantropia e atribuírem a responsabilidade

pelo comportamento ético da companhia a alguns setores - como o de recursos

humanos, por exemplo - as empresas têm repensado seus procedimentos e mesmo

sua função, alterando conceitos e agindo em parceria com o Estado e ONGs.

2.5 COMPONENTES DA RESPONSABILIDADE SOCIAL

Ferrei et alli (2001) afirmam que são quatro os tipos de responsabilidade

social: legal, ética, econômica e filantrópica, os quais são também chamados de

"degraus da responsabilidade social". "Carroll (1981) identificou quatro áreas

específicas de responsabilidade social corporativa: a econômica, a legal, a ética e a

discricionária" (LEWIS e LlTTLER, 2001, p. 281).

Similannente, Davis22 et alo (1980) representaram a responsabilidade social como três círculos concêntricos, novamente indicando a prioridade: o círculo interior referia-se aos aspectos de responsabilidade social do papel econômico tradicional da empresa, como as questões sociais e éticas decorrentes do desempenho de suas funções básicas; o círculo intennediário envolvia questões como a ecologia, a qualidade ambiental e o consumerismo; e o círculo exterior, os problemas sociais gerais que empresa pode ajudar a aliviar (LEWIS e LlTILER, 2001, p. 281).

A dimensão primária da responsabilidade social corresponde às

responsabilidades econômicas. "As responsabilidades econômicas da empresa

22 DAVIS, K.; FREDERICK, W. C., BLOMSTROM, R. L. Business and society. Boston, MA: Little Brown, 1981.

Page 48: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

38

consistem em introduzir bens e serviços de que a sociedade necessita, e quer, a um

preço que possa garantir a continuação das atividades da empresa e satisfazer suas

obrigações com os investidores" (FERREL et alli, 2001, p. 7).

Logicamente, todas as ações da empresa devem objetivar, em primeira

instância, a manutenção de suas atividades. Seja qual for a origem da receita,

proveniente de vendas de bens ou serviços, de doações ou caridade, ou de fundos

governamentais, todas as organizações devem ser econômicas, mantendo-se

viáveis e operando dentro do estabelecido em seu contrato social. Divulgar

prestações de contas certificadas a partir de critérios previamente acordados é tarefa

de todas as organizações (MCINTOSH et alli, 2001).

Outro componente refere-se à responsabilidade legal. "As responsabilidades

legais da organização estão consignadas nas leis que ela é obrigada a cumprir. No

mínimo, espera-se que as empresas sejam responsáveis pela observância das leis

municipais, estaduais e federais, por parte de seus funcionários" (FERREL et alli,

2001, p. 7). Tal consideração não encerra o entendimento das responsabilidades

legais já que sua compreensão pode ir além. "Todas as organizações devem

trabalhar dentro da lei de estar conscientes de suas restrições legais. Isto não se

limita apenas a seus contratos sociais, mas engloba também saúde e segurança,

normas comerciais, a legislação ambiental, leis trabalhistas e outras áreas de vida"

(MCINTOSH et alli, 2001, p. 43).

Esse estudo ocupa-se principalmente dos outros dois componentes da

responsabilidade social, uma vez que é difícil imaginar uma organização que

trabalhe exclusivamente com base em suas obrigações financeiras e legais. De fato

são muito poucas as organizações que operam exclusivamente nesta base

(MCINTOSH et alli, 2001). Merece ser registrado entretanto que muitas

organizações, em todos os setores, não cumprem sequer suas obrigações

econômicas e legais. "Muitos empresários e estudiosos questionam o papel da ética

Page 49: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

39

e da responsabilidade social nos negócios. As dimensões legais e econômicas são

em geral aceitas como os determinantes mais importantes do bom desempenho"

(FERREL et alli, 2001, p. 78). O objetivo deste estudo são os tipos de

responsabilidade social que vão além dos aspectos econômicos elou legais.

Nem todas as condutas e práticas empresarias que a sociedade e o Estado

esperam de uma empresa estão contempladas na legislação. "As responsabilidades

éticas são definidas como comportamentos ou atividades que a sociedade espera

das empresas, mas que não estão codificadas em leis. Muitos empresários referem­

se a esse conjunto de responsabilidades como o espírito da lei" (FERREL et alli,

2001, p. 7). Inicia-se aqui a responsabilidade social em sua visão mais ampla pois

são envolvidos os diversos públicos da organização em relação ao que consideram

justo, legítimo, correto, ou de acordo com suas expectativas e direitos morais.

"Essas responsabilidades éticas correspondem a valores morais específicos. Valores

morais dizem respeito a crenças pessoais sobre comportamento eticamente correto

ou incorreto, tanto por parte do próprio indivíduo quanto com relação aos outros. É

dessa maneira que valores morais e ética se complementam (ASHLEY, 2002, p. 51).

"A obrigação final que a empresa assume com a sociedade constitui as suas

responsabilidades filantrópicas23. Estas significam os comportamentos e atividades

desejados pela sociedade e que são ditados pelos valores empresariais. Fazer

doações a obras beneficentes e contribuir financeiramente para projetos

comunitários, por exemplo, são formas de filantropia ou atividades voluntárias na

empresa" (FERREL et alli, 2001, p. 8). Mclntosh et alli (2001) constatam que as

organizações atuam em um ambiente social no qual considerações éticas e

filantrópicas são essenciais à sua capacidade de operar. "É estranho que apesar das

23 Embora anteriormente tenhamos desvinculado filantropia de responsabilidade social, caracterizando a primeira como um pré-estágio de responsabilidade social, persiste a terminologia que utiliza a expressão "responsabilidades filantrópicas" na qual estão incutidas não somente ações de filantropia propriamente ditas, como também ações de médio e longo prazo, educativas e de auto­sustentabilidade.

Page 50: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

40

empresas serem responsabilizadas financeira e legalmente, somente agora existe

um movimento para responsabilizar as empresas por suas operações que tenham

um impacto ambiental e social (MCINTOSH et alli, 2001, p. 44).

2.6 DIMENSÕES DA RESPONSABILIDADE SOCIAL

Todos os quatro componentes - econômicos, legais, éticos ou filantrópicos -

para serem efetivos no exercício da cidadania corporativa precisam ser trabalhados

em duas dimensões principais: a gestão da responsabilidade social interna e a

gestão da responsabilidade social externa (MELO NETO e FRÓES, 1999). Somente

atuando em ambas as dimensões é que a empresa adquire o status de empresa­

cidadã.

A responsabilidade social interna abrange todo o público interno da empresa,

incluindo aqui os empregados e seus dependentes. O exercício da responsabilidade

social nessa dimensão visa motivar os funcionários para um desempenho ótimo,

contribuindo para o seu bem-estar e criando um ambiente agradável de trabalho. A

conquista da dedicação, empenho e lealdade do público interno proporciona

enormes ganhos de produtividade (MELO NETO e FRÓES, 1999). Tem sido

comprovado que "quem não investe na educação e no progresso de seus próprios

funcionários e não está atento com a saúde e alimentação de toda equipe - pagando

baixos salários e exigindo longas jornadas de trabalho - só vai colher baixa

produtividade, pouco compromisso e dedicação. Além de muito desperdício de

materiais e matérias-primas" (TORRES, 1999).

De fato, a resposta do público interno às ações de responsabilidade social

praticadas internamente na empresa tem gerado lucros financeiros e sociais. "A

empresa lucra socialmente quando suas ações sociais internas dão bons resultados.

Isso pode ser percebido e identificado quando sua produtividade aumenta, os gastos

Page 51: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

41

com saúde dos funcionários diminuem, a organização consegue desenvolver o

potencial, habilidades e talentos dos funcionários, multiplicando as inovações"

(MELO NETO e FRÓES, 2001, p. 24).

Segundo Melo Neto e Fróes (2001) as áreas de avaliação do exercício da

responsabilidade interna abrangem os seguintes componentes: gestão de benefícios

e remuneração, gestão dos direitos dos empregados, gestão do trabalho, gestão do

ambiente de trabalho, gestão do crescimento e desenvolvimento pessoal dos

empregados, gestão da relevância social da vida no trabalho, gestão do trabalho e

espaço total de vida.

A responsabilidade social externa focaliza o local onde a empresa está

situada ou sua comunidade mais próxima (MELO NETO e FRÓES, 1999). As ações

nesse caso dividem-se em dois sub-grupos igualmente importantes: a gestão do

meio ambiente e a gestão das questões sociais.

A integração da empresa com seus ambientes no âmbito da responsabilidade

social a partir destas dimensões precisa ser tratada com extremo profissionalismo.

É difícil prever o que pode acontecer após inteNenções malsucedidas ou planos conduzidos e implementados de forma errada. A empresa precisa saber que ela influencia as sucessivas transações executadas e é influenciada por elas. É importante ter consciência de que as múltiplas transações, tanto num ambiente interno quanto no externo, possuem variáveis que se complementam entre si, preservando, é claro, suas devidas proporções (ASHLEY, 2002, p. 80).

Inúmeros efeitos danosos podem ser atribuídos quando o exercício da

responsabilidade social externa é mal gerenciado ou negligenciado, entre eles:

boicote de consumidores e perda de clientes, acusações de injustiça social,

reclamações de fornecedores e revendedores, queda nas vendas, ações judiciais e

inclusive risco de falência. Ao demonstrar insensibilidade aos problemas sociais da

comunidade externa a empresa perde o respeito de seus próprios empregados,

parceiros, clientes e demais cidadãos daquela comunidade (MELO NETO e FRÓES,

1999). Para Melo Neto e Fróes (2001) as áreas de avaliação do exercício da

Page 52: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

42

responsabilidade externa, na busca por uma certificação social abrangem os

seguintes componentes: avaliação do tipo e natureza da relação, avaliação do foco

de relação, avaliação do alvo de relação, avaliação da natureza das relações,

avaliação do escopo da relação e avaliação do impacto das ações.

"É fácil perceber o grau de complexidade que existe no processo de

integração da empresa com seus ambientes. A responsabilidade social surge como

um possível caminho para desatar esse nó ... " (ASHLEY, 2002, p. 86). Melo Neto e

Fróes (2001), evidenciando que a responsabilidade social é um processo dinâmico

que deve ser conduzido com uma permanente vigilância e ter sua origem em

motivações internas, representam também estas dimensões conforme três estágios

no tempo da responsabilidade social corporativa, expressos na figura 1.

Foco da ação

h

1° estágio

-Gestao social interna

2° estágio

Gestão social externa

3° estágio

Gestão social cidadã

-- Tempo

Figura 1. Estágios da responsabilidade social corporativa. (Melo Neto e Fróes, 2001, p. 81)

2.7 AS DIFERENTES VISÕES E OS FOCOS DA RESPONSABILIDADE SOCIAL

"O importante para empresa definir a sua visão de responsabilidade social é a

escolha do seu principal foco de atuação (meio ambiente, cidadania, recursos

Page 53: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

43

humanos, etc.), estratégia de ação (negócios, marketing de relacionamento,

marketing institucional ,etc.) e papel principal (difusora de valores, promotora da

cidadania, capacitadora, formadora de novas consciências, disseminadora de

conhecimentos, etc.)" (MELO NETO e FRÓES, 2001, p. 42).

Por tratar-se de conceito recente, uma das maneiras de abordar a

responsabilidade social é a partir da visão das empresas e das pessoas que

conduzem as ações ligadas ao tema. Nessa concepção, Melo Neto e Fróes (2001)

identificam 14 diferentes visões que podem ser trabalhadas de maneira isolada ou

ainda combinadas entre si. São elas: a responsabilidade social como atitude e

comportamento empresarial ético e responsável; a responsabilidade social como um

conjunto de valores; a responsabilidade social como postura estratégica empresarial;

a responsabilidade social como estratégia de relacionamento; a responsabilidade

social como estratégia de marketing institucional; a responsabilidade social como

estratégia de valorização das ações da empresa (agregação de valor); a

responsabilidade social como estratégia de recursos humanos; a responsabilidade

social como estratégia de valorização dos produtos/serviços; a responsabilidade

social como estratégia social de inserção na comunidade; a responsabilidade social

como estratégia social de desenvolvimento da comunidade; a responsabilidade

social como promotora da cidadania individual e coletiva; a responsabilidade social

como exercício da consciência ecológica; a responsabilidade social como exercício

da capacitação profissional; e, finalmente, a responsabilidade social como estratégia

de integração social.

O empresariado, a sociedade e o Estado conhecem profundamente os

nossos principais problemas sociais. Conhecê-los porém não é o bastante. É preciso

primeiramente priorizá-los, segundo as percepções do governo, dos empresários e

da própria sociedade (MELO NETO e FRÓES, 1999, p. 50).

Page 54: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

44

Para Melo Neto e Fróes (2001) o exercício da responsabilidade social

apresenta dois focos distintos: os projetos sociais e as ações comunitárias.

"A modalidade de ação de investimentos em projetos e programas sociais é a que mais cresce em nosso país. Empresas nacionais e muitas corporações multinacionais estão criando institutos sociais para gerir suas próprias ações sociais. Outras financiam diretamente projetos da comunidade, e algumas criam e desenvolvem seus próprios programas e projetos sociais. Cresce também o volume investido em patrocínio de programas e projetos sociais, sobretudo aqueles que contam com o apoio do governo e de outras entidades (MELO NETO e FRÓES, 1999, p. 19).

A compreensão das visões torna mais fácil a identificação das ações sociais a

serem desenvolvidas. A partir daí, a empresa deve definir seu foco e em seguida sua

estratégia social. Somente depois disso é que ficará claro o seu papel social (MELO

NETO e FRÓES, 2001). "Definidos e elaborados planos, programas e projetos, estes

devem ser implementados com base nos recursos disponíveis, num sistema de

gerenciamento eficiente e eficaz e nos prazos previstos" (MELO NETO e FRÓES,

1999, p. 63).

2.8 LINHAS DE MOTIVAÇÃO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL

Como já descrito, são inúmeras as motivações que determinam a opção por

ações que reflitam a responsabilidade social por parte da empresa. Segundo Ashley

(2002) os argumentos podem ser enquadrados em duas linhas básicas: ética e

instrumental. As normas sociais prevalecentes e princípios religiosos sustentam os

argumentos éticos determinantes para a realização de ações moralmente corretas,

mesmo que estas práticas envolvam algumas despesas improdutivas para a

empresa.

Do outro lado está a linha instrumental. "Para muitas pessoas, a cidadania

corporativa responsável é uma questão ética, mas há argumentos irrefutáveis para

se adotar uma abordagem responsável simplesmente por se tratar de um bom

negócio" (MCINTOSH et alli, 2001, p. 65). Os argumentos dessa linha consideram

haver uma relação positiva entre o comportamento socialmente responsável da

Page 55: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

45

empresa e seu desempenho econômico. A consciência maior sobre as questões

culturais, sociais e ambientais permitem uma antecipação às regulações restritivas

por parte do Estado e a diferenciação da empresa (e de seus produtos), perante

seus competidores menos responsáveis socialmente. Utilizar a responsabilidade

como forma de melhorar a reputação da empresa, identificando oportunidades de

testes de novas tecnologias e produtos e com isso obter vantagem competitiva

caracteriza a ação instrumental (ASHLEY, 2002).

A distinção destas duas bases motivadores para a prática da

responsabilidade social permite constatarmos que "a responsabilidade social

corporativa tende a ser considerada uma atividade destacada da lógica econômico­

financeira da empresa, categorizando-se a responsabilidade social como do tipo

pós-lucro. Haveria um foco na necessidade da corporação de realizar lucros para

sobreviver, em que a responsabilidade social corporativa torna-se, assim, uma ação

instrumental (ASHLEY, 2002, p. 24).

Tudo indica porém que a principal motivação parece ser a busca por uma

identidade própria. "O principal motivo para uma empresa ser socialmente

responsável é que isso proporciona a ela consciência de si mesma. Em um mundo

em que a realidade de mercado muda cada vez mais rapidamente, a empresa

precisa saber exatamente qual é sua missão, e a busca do sentido ético para sua

existência deve ir além do mercado" (ASHLEY, 2002, p. 81).

Ao buscar consciência de si mesma, a empresa entende melhor seus

relacionamentos. "Os negócios prosperam se compreendem os seus

relacionamentos principais: é de seu próprio interesse ampliar o círculo e ser mais

inclusivo. A transparência e a responsabilidade são virtudes dos negócios. A

cidadania corporativa tem a sua maior cinética em três áreas: inclusividade,

transparência e responsabilidade (MCINTOSH et alli, 2001, p.216).

Page 56: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

46

Consciência e cidadania empresarial ao lado de visão e missão são os

motivos mais apontados pelas empresas brasileiras para justificar a realização de

investimentos sociais.24 "A visão de uma empresa sobre suas responsabilidades

está relacionada a como ela mede o desempenho dos recursos comprometidos para

o atendimento desta visão" (ASHLEY, 2002, p. 28).

2.9 O BALANÇO SOCIAL

Dentro dessa necessidade crescente de se demonstrar à sociedade a

responsabilidade e as boas ações estimuladas e praticadas pelas empresas, um

importante recurso que tem sido utilizado pelas organizações é a publicação de

balanços sociais. O balanço social "é um documento publicado anualmente reunindo

um conjunto de informações sobre as atividades desenvolvidas por uma empresa,

em promoção humana e social dirigidas a seus empregados e a comunidade onde

está inserida. Através dele a empresa mostra o que faz pelos seus empregados,

dependentes e pela população que recebe sua influência direta" (SUCUPIRA, 1999).

Na definição de Cappellin e Giuliani (1999) o balanço social é um instrumento

que não somente evidencia a responsabilidade social das empresas como também

constitui um instrumento de planejamento e marketing social:

o balanço social é um documento que reúne um conjunto de informações sobre as atividades da empresa orientada para melhor gerência dos recursos humanos e naturais, e das relações com seus 'partners' externos. É, antes de tudo, um instrumento capaz de aperfeiçoar o planejamento da própria empresa que o redige. Sua publicação também pode contribuir para atrair a atenção e a simpatia dos que o lêem. Sua difusão nas mídias revela aspectos encobertos da cultura da empresa, qualifica as iniciativas orientadas a responder às demandas sociais, mostrando a disponibilidade desta para o diálogo com a sociedade (CAPPELLlN e GIULlANI, 1999, p. 11).

24 De acordo com o Perfil da empresa que investe em projetos sociais da comunidade, estudo realizado pelo Serviço Nacional do Comércio (Senac) de São Paulo entre as razões mais apontadas para a realização de investimentos sociais estavam consciência e cidadania empresarial (26,6%), visão e missão (26,2%) e o sentimento de que a empresa é uma extensão da comunidade, sendo responsável por sua qualidade de vida (23,5%) (ASHLEY, 2002, p.12).

Page 57: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

47

Também para Torres (1999), além de evidenciar sua responsabilidade social,

as empresas que o publicam tem o direito, antes do dever, de dar publicidade às

suas ações, pois trata-se de uma propaganda cada vez mais honesta e verdadeira,

que permite comparações entre as empresas por parte dos consumidores e

investidores, uma vez que utiliza parâmetros iguais de mensuração.

Sucupira (1999) alerta que, embora tenha suas origens na contabilidade, o

balanço social deve ser visto como uma forma de explicitar a preocupação das

empresas no cumprimento de sua responsabilidade social, e não como um

demonstrativo meramente contábil. O balanço social constitui um distintivo de

qualidade para aqueles que o elaboram e publicam.

A preocupação por parte das empresas em prestar informações ao público

sobre suas atividades no campo social remonta à década de 60, nos Estados

Unidos, a partir do repúdio de certos segmentos da população à Guerra do Vietnã e

o conseqüente boicote à aquisição de produtos e ações de empresas de alguma

forma ligadas ao conflito. As empresas norte-americanas foram as pioneiras na

prestação de contas ao público, mas foi na França, também como resultado de

pressões sociais, que as empresas deram início à publicação de quadros com dados

relativos às condições sociais e gestão de pessoal, juntamente com suas

demonstrações financeiras. Também foram os franceses os primeiros a tornarem

obrigatória sua publicaçã025 (SUCUPIRA, 1999).

"No Brasil, a idéia de Balanço Social surgiu no início da década de 80 e teve

no sociólogo Betinho o seu grande defensor. Através do Ibase, entidade a qual

presidia, Betinho iniciou uma verdadeira cruzada em prol do balanço social" (MELO

25 Pela lei francesa, desde 1977 é obrigatória a elaboração do balanço social das empresas com mais de 300 funcionários (a lei nO 77.769, de 12 de julho de 1977, incluiu as empresas com 750 ou mais empregados; em 1982, a obrigatoriedade passou a valer para aquelas com 300 ou mais empregados). Diversos países da Europa seguiram os passos pioneiros da França e hoje também exigem a elaboração do documento, entre eles, Alemanha, Holanda, Bélgica, Espanha, Inglaterra e Portugal (SUCUPIRA, 1999).

Page 58: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

48

NETO e FRÓES, 1999, p. 125). As primeiras publicações entretanto vieram somente

nos anos 9026. Em 16 de junho de 1997, foi lançada pelo sociólogo Betinho uma

campanha para divulgação do balanço social. Naquele mesmo ano, em parceria com

a Gazeta Mercantil, o Ibase lançou o Selo do Balanço Social para estimular a

participação das companhias.

"A função principal do balanço social da empresa é tornar público a

responsabilidade social da empresa. Isto faz parte do processo de por as cartas na

mesa e mostrar com transparência para o público em geral, para os atentos

consumidores e para os acionistas e investidores o que empresa está fazendo na

área social" (TORRES, 1999).

Também a questão da publicação social contribui com o aspecto de

mensuração, muitas vezes apontado como um dos pontos fracos das ações e

investimentos sociais. "Trata-se de uma avaliação para medir e julgar os fatos

sociais vinculados à empresa, tanto internamente - empresa/empregados - como

externamente (empresa/comunidades)" (SOUZA, 1997, p. 1).

A publicação do balanço social no Brasil é voluntária, embora existam

projetos de lei em tramitação com o objetivo de torná-Ia obrigatória27. A cada ano

cresce o número de empresas que publicam seu balanço social, que tem se firmado

como um instrumento de gestão das empresas (MELO NETO e FRÓES, 1999). O

principal modelo utilizado é o do Ibase. "Por entender que a simplicidade é a

garantia do envolvimento do maior número de companhias, o Ibase desenvolveu um

modelo que tem a vantagem de estimular todas as empresas a divulgar seu balanço

26 o primeiro Balanço Social de uma empresa brasileira foi publicado pela Nitrofértil em 1984. Na época constituiu um ato isolado. Oito anos depois o Banco do Estado de São Paulo - Banespa publicou um relatório completo divulgando todas as suas ações sociais. A partir de 1993, várias empresas de diferentes setores passaram a divulgar o balanço anualmente (SUCUPIRA, 1999). 27 Há um projeto de lei nO 3.116/97, que tramita no Congresso Nacional, de autoria das deputadas Marta Suplicy, Maria da Conceição Tavares e Sandra Starling, que prevê a obrigatoriedade do balanço social para as empresas privadas com cem empregados ou mais, e para as demais, independentemente do número de funcionários (SUCUPIRA, 1999).

Page 59: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

49

social independentemente de seu porte e setor de atuação" (SUCUPIRA, 1999). De

outro lado, o próprio Ibase reconhece não se tratar ainda do modelo ideal, uma vez

que empresas dos diversos setores deverão ter diferentes indicadores e que esse

modelo deverá evoluir com o passar do tempo (BORBA et alli, 2001).

2.10 A INTEGRAÇÃO E O TRABALHO VOLUNTÁRIO

"A responsabilidade social, além de sua importância intrínseca, agrega um

caráter de integração entre empresa e a sociedade, tendo a prática social e a

valorização humana como responsáveis pelo desenvolvimento do público interno e

externo, ou seja, pelo desenvolvimento da própria empresa" (ASHLEY, 2002, p. 86).

Na questão da integração com o público interno e com a comunidade,

especial atenção tem sido dada ao estímulo do trabalho voluntário e a conseqüente

valorização do elemento humano. "O voluntariado empresarial são ações realizadas

por empresas, que objetivaram incentivar e apoiar seus funcionários para que estes

se envolvam com atividades em instituições ou trabalhos comunitários, tendo como

característica o trabalho em grupo" (BORBA et alli, 2001, p. 58). O voluntariado

estimula a integração entre as pessoas incluindo as de diferentes níveis

hierárquicos, fortalece as relações e desenvolve habilidades de argumentação e

diálogo. As empresas que crescem a partir de relacionamentos e trabalhos

voluntários fomentam relações de confiança e comprometimento, são mais atentas

ao capital humano e extremamente criativas (MCINTOSH et alli, 2001).

As pessoas já têm revelado maior simpatia e atração por empresas que

estimulam o trabalho voluntári028. A recíproca neste caso é verdadeira. "Empresas

28 Em uma pesquisa conduzida pela IBM, 75% dos entrevistados disseram que uma empresa com responsabilidade social e com plano de trabalho voluntário atrai e mantém os melhores profissionais (ASHLEY, 2002, p. 81).

Page 60: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

50

procuram funcionários que foram voluntários porque mostram senso de equipe,

liderança e espírito de cooperação" (KANITZ, 2001, p.75).

No Brasil, o voluntariado empresarial é bastante recente, tendo tomado maior

vulto a partir de 1995. Em países desenvolvidos é prática comum. Até o momento

são as empresas de grande porte que estão mais engajadas num trabalho voluntário

organizado (BORBA et alli, 2001).

O voluntariado é importante para a empresa e para o desenvolvimento

pessoal e profissional de cada indivíduo. "Segundo pesquisa, voluntários vivem

mais, com menos doença. Isolamento social gera depressão. Ter alguém que

dependa toda semana de você melhora seu sistema auto-imune" (KANITZ, 2001,

p.75).

Sina e Souza (1999), citando Ken Young, argumentam que o setor voluntário

oferece três principais contribuições para a sociedade: representaçã029, inovaçã03o e

cidadania. Vale ressaltar que a cidadania tem mais chance de nascer do

voluntariado por que compartilha com este uma mesma base: a necessidade de ser

espontânea.

Também o modelo de Balanço Social do Ibase estimula a prática voluntária.

"É natural que os indicadores do balanço social estimulem a participação voluntária

dos empregados na escolha dos programas sociais da empresa, o que acarreta um

grau mais elevado de integração nas relações entre dirigentes e funcionários"

(SUCUPIRA, 1999).

Borba et alli (2001) enfatizam que é importante a divulgação por parte das

empresas praticantes de ações voluntárias para o marketing da empresa e

29 A ação voluntária nas circunstâncias atuais exerce um papel de maior importância social e política, sendo muito mais abrangente (SINA e SOUZA, 1999, p. 47). 30 Os corpos de voluntariados são uma fonte de inovação (SINA e SOUZA, 1999, p. 47).

Page 61: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

51

principalmente como instrumento a serviço do progresso e implementação do

voluntariado empresarial no Brasil.

Para Matias (1999) a responsabilidade social precisa constituir um processo

natural que flui tal como a responsabilidade individual de cada cidadão. Se uma

empresa está efetivamente preocupada em contribuir para a solução dos problemas

de base da sociedade espera-se que ela tenha uma política institucional ética, firme,

dinâmica e empreendedora.

"A empresa socialmente responsável assume uma postura proativa, ou seja,

considera responsabilidade sua buscar e implementar soluções para os problemas

sociais" (ASHLEY, 2002, p.12). Com a conscientização das organizações,

assumindo um papel mais amplo dentro da sociedade, a responsabilidade social

pode se constituir num importante elemento que alicerça desde planos de marketing

(voltados às questões sociais) até o desenvolvimento democrático do país (com a

valorização da cidadania). "( ... ) várias das atividades desenvolvidas pelo setor são

possíveis de realizar graças ao intenso trabalho de marketing, seja na divulgação

dos serviços da instituição/organização, seja na promoção de suas atividades ou de

seus produtos" (SINA e SOUZA, 1999, p. 23). Em função de sua amplitude, a

responsabilidade social não pode deixar de ser identificada como uma oportunidade

de marketing, razão pela qual este estudo desenvolve em paralelo esses temas.

Lewis e Littler (2001) chamam a atenção para o fato de que inúmeras

questões específicas de responsabilidade social foram, recentemente, discutidas na

bibliografia de marketing, incluindo assuntos relativos ao consumidor, ao apoio às

minorias, às relações comunitárias, entre outros. "A responsabilidade social

disseminada como uma atitude estratégica permite criar uma nova cultura dentro da

empresa, sendo praticada e incorporada na gestão e em atividades regulares

como produção, distribuição, recursos humanos e marketing" (ASHLEY, 2002, p.

13, grifos nossos).

Page 62: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

52

3 MARKETING SOCIAL

Aliado ao crescente interesse pelo tema da responsabilidade social das

empresas surge um conjunto de ações de marketing e comunicação destinadas

principalmente a difundir e disseminar na sociedade essas novas posturas e práticas

adotadas. Se, conceitos como a responsabilidade social, a cidadania corporativa e a

ética empresarial já necessitam de definições e considerações para sua melhor

compreensão e apreciação de suas dimensões, o termo marketing social exige ainda

um esforço maior nesse sentido, pois muitas vezes é distorcido, esquecido ou

desprezado pelos diretores, gerentes e demais funcionários, mesmo por parte

daqueles que conduzem ou participam das ações sociais da empresa, o que implica

num uso inadequado ou ainda num mau aproveitamento das suas reais

potencialidades.

Mesmo sendo bastante divulgado através de projetos nacionais e

principalmente internacionais, o que faz com que as organizações se familiarizem

com seus princípios, o termo ainda é constantemente mal utilizado. O conceito de

marketing social é freqüentemente mal-interpretado já que muitas pessoas usam

incorretamente o termo para representar qualquer tipo de marketing ou publicidade

feita por uma organização voltada ao quadro social, sem se importar com o

programa que foi desenvolvido ou mesmo com aqueles que se beneficiam dos

produtos disponibilizados (SINA e SOUZA, 1999).

Há de se ressaltar que o marketing social surgiu num cenário efervescente,

de mudanças significativas. Juntamente com o conceito, vieram todas as

interpretações errôneas que um tema tão novo pode suscitar. Também o marketing

social não deve ser encarado como modismo pois reflete uma personalidade social e

como tal não pode existir apenas pelo prazo de uma promoção (PINTO, 2001).

Page 63: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

53

Deve ser evitada uma interpretação incorreta para que o marketing social não

seja subaproveitado ou até mesmo evitado, e contribua com a discussão e

disseminação das questões de responsabilidade social e gestão social.

3.1 A ORIGEM DO TERMO

Para uma melhor compreensão do termo 'marketing social' é necessário um

entendimento mais abrangente do próprio 'marketing,31 em si. Essa tarefa no

entanto, imprescindível para as definições que serão expostas posteriormente neste

estudo, revela algumas dificuldades. Não há uma definição que seja mundialmente

aceita para 'marketing' e suas perspectivas, bem como sua natureza, têm se

modificado consideravelmente no decorrer do tempo (LEWIS e LlTTLER, 2001).

"Podemos definir o marketing como o processo social gerencial através do

qual indivíduos e grupos obtém aquilo que desejam e de que necessitam, criando e

trocando produtos e valores uns com os outros" (KOTLER e ARMSTRONG, 1998, p.

3). Kotler e Armstrong (1998) apoiam seu conceito, bastante abrangente, no

entendimento dos seguintes termos: necessidades, desejos, demandas, produtos,

valor, satisfação, qualidade, troca, transações, relacionamentos e mercados.

As principais definições apresentam marketing como um processo. Muitos

autores consideram a troca como o conceito central do marketing. Trata-se, em

primeira análise, de um processo de troca bilateral (LEWIS e LlTTLER, 2001). A

essência do marketing é o desenvolvimento de trocas em que organizações e

clientes participam voluntariamente de transações destinadas a trazer benefícios

para a ambos. Essas trocas não precisam estar caracterizadas apenas por produtos

ou serviços, podendo se constituir de idéias, ações, ideais, atitudes, posturas ou

31 Considera-se de fonna geral que o marketing assim como nós o entendemos hoje, nasceu nos Estados Unidos nos anos 50. Isto não quer dizer que a atividade do marketing, de qualquer fonna que a definamos, não estivesse presente também nos períodos precedentes da história da humanidade (DI NALLO, 1999, p. 26).

Page 64: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

54

práticas. Também o marketing pode ser utilizado para o desenvolvimento de trocas

que visam ou não lucros. A questão é que o marketing visando lucros é, em geral,

um campo de conhecimento mais desenvolvido que o marketing não lucrativo

(CHURCHILL e PETER, 2000).

Na busca por uma definição consensual a American Marketing Association,

em 1985, analisou 25 diferentes definições para estabelecer a sua. Para efeitos

deste trabalho, compreenderemos marketing com base nesta definição adotada

posteriormente por inúmeros autores. "Marketing é o processo de planejar e de

executar a concepção, estabelecimento de preços, promoção e distribuição de

idéias, produtos e serviços para criar trocas que satisfaçam metas individuais e

organizacionais" (CHURCHILL e PETER, 2000, p. 4).

Insatisfeito com as definições existentes, alegando que elas não conjugavam

a essência do marketing business-to-business32 e do marketing de serviços33, entre

outros tipos de marketing, Gr6nroos (1989) buscou o desenvolvimento de um

conceito alternativo (LEWIS e LlTTLER, 2001). Para o autor, marketing significa o

estabelecimento, o desenvolvimento e a comercialização de relacionamentos a

longo prazo com o cliente, de maneira que os objetivos de ambas as partes sejam

atendidos. É necessário, segundo Gr6nroos (1995, p. 164) que o marketing seja

compreendido também como "um estado de espírito" e como "uma maneira de se

organizar várias funções e atividades da empresa", muito além de um mero conjunto

32 Refere-se a marketing de produtos e serviços para organizações, em vez de para residências ou consumidores finais. ( ... ) Marketing business-to-business também recebe outros nomes: marketing industrial, marketing comercial, marketing institucional e marketing organizacional (LEWIS e LlTTLER, 2001, p. 168). 33 Marketing de serviços evoluiu como disciplina por várias razões, em particular pelo crescente reconhecimento de que todas as organizações participam da administração de marketing e com o crescimento do setor de serviços nas economias desenvolvidas. ( ... ) Tipicamente, os serviços são caracterizados por intangibilidade, heterogeneidade, inseparabilidade e perecibilidade. Além disso, a noção de interação de serviço é específica para o setor e envolve as interações entre as organizações fornecedoras, seus funcionários e os consumidores (LEWIS e LlTTLER, 2001, p. 172-173).

Page 65: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

55

de ferramentas, técnicas e atividades, como muitos autores procuram limitar o

conceito.

Quando considerado apenas como um conjunto de ferramentas, o marketing

permanece de responsabilidade apenas de um grupo de especialistas em marketing,

que estejam familiarizados com essas ferramentas e sejam dotados de know-how

para lidar com elas (GRONROOS, 1995). O resto da organização precisa estar

envolvido, caso contrário as atividades de marketing podem não conduzir a

resultados satisfatórios.

As inúmeras tentativas para se categorizar as definições de marketing foram

fundamentais à evolução do conceito e suas diferentes aplicações resultantes desse

desenvolvimento. Também permitiram estabelecer uma distinção entre definições

sociais e gerenciais. A primeira, mostra o papel desempenhado pelo marketing na

sociedade, enquanto que na definição gerencial o marketing é freqüentemente

descrito como 'a arte de vender produtos' (KOTLER, 2000). "Na prática, o que mais

caracteriza o marketing não é tanto sua especificidade teórica ou metodológica

quanto o papel e a importância que essa função adquire no âmbito da organização

empresarial" (DI NALLO, 1999, p. 37).

Crosier (1988) analisou cerca de 50 definições e classificou-as em três amplos grupos. O primeiro consistiu nas definições que concebiam marketing como um processo que conecta o produtor a seu mercado ( ... ) O segundo grupo consistiu nas definições que viam marketing como um conceito ou filosofia de negócio. ( ... ) A terceira categoria de definições de Crosier enfatizava marketing como uma orientação presente em algum grau no consumidor e no produtor: o fenômeno que torna o processo e o conceito possíveis (LEWIS e LlTTLER, 2001, p. 166).

Somente no início do século passado é que o marketing passou a ser

ensinado, primeiramente como assunto empresarial34. Halbert (1965) sugeriu que as

divergências e diferentes interpretações do conceito por parte dos diferentes autores

34 Nos Estados Unidos, a pátria do marketing por excelência, inaugura-se em 1905, na Universidade da Pennsylvania, um curso intitulado The marketing of products, e em 1910 R. S. Butler dá um curso denominado Marketing Methods na Universidade de Wisconsin. O início da literatura formal sobre o marketing tem origem no artigo de 1912 de A. W. Shaw, Some Problems in Market Distribution (DI NALLO, 1999, p. 32).

Page 66: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

56

deve-se ao fato do marketing não possuir uma base teórica central reconhecida,

como há em muitas outras disciplinas e nas ciências naturais em particular.

Mesmo com as discordâncias entre 05 acadêmicos apontadas por Halbert

(1965), o marketing já possui reconhecível corpo teórico. Hoje, o marketing constitui

uma disciplina acadêmica ensinada na maioria dos cursos de graduação e pós­

graduação de todo mundo (LEWIS e LlTTLER, 2001). Sua importância não pode

mais ser negligenciada por autores das mais diferentes áreas, incluindo aqui aqueles

que se dedicam aos temas da responsabilidade social e cidadania empresarial. Com

sua "complexidade e ambição", o marketing tornou-se mais do que uma técnica.

Suas idéias, conceitos, táticas, modelos, modismos e estratégias permeiam todos 05

segmentos da vida social. O marketing tornou-se um imperativo de sucesso

empresarial em qualquer setor de atividades, pois quando bem trabalhado, é

garantia de êxito. As empresas com um bom marketing divulgam sua liderança em

custo, vendas, gestão, tecnologia e enfoque, tornando-se mais competitivas (MELO

NETO e FRÓES, 2001).

Se tais divergências e diferentes interpretações por parte dos autores por um

lado prejudicaram o desenvolvimento de um corpo teórico unívoco, vistas por outro

ângulo, propiciaram a evolução dos conceitos, o surgimento de novos termos e

revelaram um caráter mutável - sinal evidente da continuidade e atualidade da sua

discussão.

O desenvolvimento do marketing é freqüentemente reconhecido em termos

das últimas três "eras". A primeira, é comumente denominada era da "produção",

quando o foco principal do marketing estava limitado a superar restrições da oferta,

compreendida entre 05 anos de 1870 e 1930. Tal era foi sucedida pela era de

"vendas", quando a responsabilidade do marketing era vender o que a organização

produzia, com um foco nas técnicas de vendas, a partir de 1930. Finalmente, após

1950 surge a era do "marketing" com uma ampla adoção da chamada "orientação

Page 67: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

57

para o consumidor", assumida geralmente como fazendo parte do moderno conceito

de marketing (DI NALLO, 1999; LEWIS e LlTTLER, 2001). Di Nallo (1999), faz notar

que, mesmo sendo uma periodização de aceitação corrente, nas três "eras" do

marketing desse modelo tripartido, alguns aspectos típicos de cada um dos períodos

convivem simultaneamente nos diferentes casos.

A chamada "orientação para o consumidor' exigiu novas perspectivas e

orientações para o conceito, entre elas, o marketing orientado para o social ou para

as causas sociais. A crítica e os questionamentos a um modelo que atendia

primeiramente somente as organizações e posteriormente apenas o consumidor na

sua individualidade, negligenciando as comunidades e a sociedade como um todo,

exigiram novas posturas. Também o fato de não abordar conflitos potenciais entre

desejos e interesses dos consumidores e o bem-estar a longo prazo culminaram

com a exigência de um novo termo que viesse a ampliar a orientação do marketing

(KOTLER, 2000).

Quando as empresas começaram a perceber a importância a longo prazo de

satisfazer os desejos do consumidor surgiu o conceito de marketing, já que de início,

a maioria das organizações tomava suas decisões com base nos lucros que

poderiam obter a curto prazo. Os interesses da sociedade tem peso maior

atualmente para muitas companhias quando estas tomam decisões de marketing

(KOTLER e ARMSTRONG, 1998).

Assim, o conceito de marketing social35 surgiu nos Estados Unidos, quando

Philip Kotler e G. Zaltman estudavam aplicações do marketing que pudessem

contribuir para a busca e o encaminhamento das questões sociais. Foi a partir daí

que o termo começou a se popularizar assumindo o caráter de um instrumento de

35 KOTLER, Philip e ZALTMAN, Gerald. Social marketing: an approach to planned social change. Journal of Marketing. 35, julho de 1971, pp 3-12.

Page 68: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

58

administração da mudança social36 (KOTLER e ROBERTO, 1992). Tal definição

orientará a compreensão inicial do termo marketing social no presente estudo.

o tenno "marl<eting social" apareceu pela primeira vez em 1971, para descrever o uso de princípios e técnicas de marketing para a promoção de uma causa, idéia ou comportamento social. Desde então, o tenno passou a significar uma tecnologia de administração da mudança social, associada ao projeto, à implantação e ao controle de programas voltados para o aumento da disposição de aceitação de uma idéia ou prática social em um ou mais grupos de adotantes escolhidos como alvo. ( ... ) A instituição patrocinadora persegue os objetivos de mudança na crença de que eles contribuirão para o interesse dos indivíduos ou da sociedade (KOTLER e ROBERTO, 1992, p. 25).

Embora o conceito tenha aparecido e se difundido apenas nos últimos anos, a

prática do marketing social não é recente. Desde o início do século passado,

algumas organizações já tem procurado utilizar esse recurso (KOTLER e

ROBERTO, 1992; PRINGLE e THOMPSON, 2000). Há de se ressaltar aqui que não

foi única e exclusivamente através da literatura específica que o conceito se

desenvolveu. Artigos e textos publicados a respeito do marketing social apenas

evidenciavam ou descreviam as práticas de responsabilidade social e cidadania

empresarial então intensificadas pelas empresas.

Mais uma vez a 'inteligência empresarial' funcionou, e muito bem. Surgiu a necessidade de comunicação dessas ações sociais para o mercado, o que culminou com a emergência do marketing social. As empresas aprenderam a obter retorno de seus investimentos na comunidade. Assim, de objeto de ações filantrópicas, a participação no sentido de prover condições para o melhor desenvolvimento social, tornou-se alvo de ações de comunicação e marketing social (MELO NETO e FROES, 2001, p. 10).

3.2 O CONCEITO DE MARKETING SOCIAL

Sir Dominic Cadbury, em 1996, quando presidente da Business in Comunity

Cause Related Marketing Leadership Campaign, definiu o Marketing Social como

"uma forma efetiva de melhorar a imagem corporativa, diferenciando produtos e

aumentando tanto as vendas quanto a fidelidade" (PRINGLE e THOMPSON, 2000,

36 Para Kotler e Roberto (1992) a mudança social pode ser vista de duas fonnas: a) as que ocorrem espontaneamente, no curso da vida, sem um planejamento deliberado ou uma intervenção humana racional; b) as planejadas e estruturadas por seres humanos, para atingir objetivos e metas específicas em torno das quais existe acordo. São principalmente as mudanças do segundo grupo que interessam ao marketing social.

Page 69: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

59

p. 3). Essa forma de aceitação do termo porém, já está bastante ampliada. Kotler e ··1 Armstrong (1998) afirmam que o conceito de marketing social exige que os

profissionais de marketing equilibrem três fatores ao definirem sua política de

mercado: os lucros da empresa, os desejos do consumidor e o interesse da

sociedade.

De acordo com Lewis e Líttler (2001) o marketing social relaciona-se às

atividades de marketing conduzidas por indivíduos e organizações para atingir

outras metas que não sejam somente o lucro, a participação de mercado e o retorno

sobre o investimento. Nessa perspectiva, o "marketing social trata do

desenvolvimento de programas destinados a influenciar a aceitação de idéia sociais,

e pode ser definido como um conjunto de atividades para criar, manter e/ou alterar

atitudes e/ou comportamentos em relação à idéia ou causa social,

independentemente de uma organização ou pessoa patrocinadora" (LEWIS e

LlTTLER, 2001, p. 183).

Nesses últimos anos o tema tem obtido mais profundidade com a

intensificação do seu debate. O próprio fortalecimento do debate é um dos objetivos

do marketing social37. Evidencia um significado muito mais amplo, descaracterizado

de superficialidades ou cinismos que o termo 'marketing social', a primeira vista,

possa sugerir.

O conceito social do marketing é uma orientação direcional com o objetivo de

produzir a satisfação e o longo bem-estar do consumidor e do público, como

pressuposto para satisfazer os objetivos e responsabilidades da empresa (ou de

qualquer outra entidade). Como ampliação do conceito tradicional de marketing, que

37 Por tratar-se de tema tão novo muitas vezes torna-se difícil defini-lo por todos os seus ângulos. Silveira (2000) antes de definir o termo marketing social procurou listar uma série de itens explicando o que o marketing social não é, para, somente a partir daí descrevê-lo. Segundo o autor o marketing social • ... visa mudar o comportamento de uma comunidade toda, criar consciência, gerar debates, levantar discussões. É, enfim, a forma que as empresas encontram para investir em programas de ajuda a comunidade, seja por campanhas, seja por serviços de utilidade pública" (SILVEIRA, 2000, p. 56).

Page 70: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

60

não percebe os possíveis conflitos entre os desejos a curto prazo do consumidor e o

seu bem-estar a longo prazo, consolida-se o marketing social ou a chamada

orientação social do marketing (KOTLER e ARMSTRONG, 1998; DI NALLO, 1999).

Nessa concepção, o marketing social pode ser definido a partir do uso das

técnicas e ferramentas do marketing tradicional, com o objetivo de promover a

adoção de um comportamento que desenvolverá a saúde e o bem-estar de um

público-alvo específico ou da sociedade como um todo (SINA e SOUZA, 1999).

Kotler e Roberto (1992, p. 25) avançam ainda mais com o conceito ao afirmarem que

o "marketing social é uma estratégia de mudança de comportamento" e que ele

combina os melhores elementos das abordagens tradicionais da mudança social

num esquema integrado de planejamento e ação, além de aproveitar os principais

avanços na tecnologia das comunicações e na capacidade de marketing.

A possibilidade de uma vida melhor através de mudanças em idéias e processos sociais não é amplamente percebida em muitas partes do mundo; pelo contrário, a resignação com a ordem vigente - uma atitude fatalista - é o que predomina. Por essa razão, as campanhas de mudança social e o marketing social não são simplesmente um conjunto de instrumentos para a consecução de mudança social. Representam uma nova ideologia, ou estado de espírito, cuja assimilação pode preparar o terreno para a mudança social generalizada e mais eficaz" (KOTLER e ROBERTO, 1992, p. 31).

A utilização de técnicas e padrões comunicacionais existentes para a

disseminação de uma idéia social, de novos modelos de procedimentos e atuações

nesse campo não pode ser vista como oportunismo. Sina e Souza (1999) salientam

que o marketing social é melhor utilizado para efetivar e sustentar mudanças de

comportamento no campo dos benefícios sociais ou da saúde para construir a

satisfação dos consumidores com os serviços existentes38.

As premissas da base do conceito social do marketing são as seguintes: (1) a

principal missão da empresa é criar clientes satisfeitos e saudáveis, e contribuir para

a qualidade de vida; (2) a empresa pesquisa de forma constante produtos melhores

38 Serviços existentes não se referem exclusivamente aos serviços prestados pela organização patrocinadora das ações do marketing social, mas principalmente aos serviços prestados ou disponibilizados pelos organismos do Estado.

Page 71: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

61

para atrair e promover vantagens que vão ao encontro do interesse dos

consumidores, mesmo se estes últimos ainda não tiverem consciência disso; (3) a

empresa foge dos produtos que, de qualquer forma, não correspondam ao interesse

dos consumidores; (4) os consumidores irão descobrir e encorajar as empresas que

demonstrem preocupação com a satisfação e o seu bem-estar (DI NALLO, 1999).

Alguns dos autores ligados ao tema, preferem os termos 'Marketing para

Causas Sociais' ou 'Marketing Relacionado a Causas'. Kotler (2000) menciona

também os termos 'marketing humanista' ou ainda 'marketing ecológico', este último

quando de orientação para a preservação ambiental. Embora compreendidos como

sinônimos, será aqui sempre utilizada a expressão marketing social, mais difundida e

sintetizada "como uma ferramenta estratégica de marketing e de posicionamento

que associa uma empresa ou marca a uma questão ou causa social relevante, em

benefício mútuo" (PRINGLE & THOMPSON, 2000, p. 3).

Muitas vezes também o termo 'marketing societal' é usado indistintamente

referindo-se a questões de marketing social. Nesse caso é prudente salientar a

diferenciação dos dois termos, exposta no Dicionário Enciclopédico de Marketing:

( ... ) o marketing societal refere-se à extensão de marketing ao longo de sua dimensão substantiva, isto é, à ampliação das áreas concernentes a marketing para focar os interesses a longo prazo dos consumidores e da sociedade. Embora sejam expressões usadas alternadamente, marketing societal difere de marketing social, a primeira referindo-se às aplicações das técnicas de marketing pelas organizações que não visam o lucro, como as instituições de caridade (LEWIS e LlTTLER, 2001, p. 184).

Kotler e Armstrong (1998) afirmam que "o conceito de marketing social é a

mais recente das filosofias de administração de marketing" e que, somente a partir

da determinação das necessidades, desejos e interesses dos mercados-alvo é que a

organização terá condições de proporcionar aos clientes um valor superior de forma

a manter e melhorar o bem-estar do consumidor e da sociedade.

Page 72: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

62

3.3 MODALIDADES DO MARKETING SOCIAL E SUAS CARACTERíSTICAS

Face a dificuldade de se optar por um termo comum, a bibliografia

especializada ainda pouco se estende nos tipos ou subgrupos de marketing social.

As principais modalidades encontradas dentro do escopo do marketing social são: o

marketing da filantropia; o marketing das campanhas sociais; o marketing de

patrocínio de projetos sociais; o marketing de relacionamento com base em ações

sociais; e o marketing de promoção social do produto e da marca (MELO NETO e

FRÓES, 1999). Tais modalidades podem ainda ser trabalhadas independentemente

ou combinadas entre si.

Basicamente estruturado como um "programa de doações", entre as

características apresentadas pelo marketing de filantropia estão: a promoção da

imagem do empresário como o grande benfeitor e alguém dotado de grande

sensibilidade para os problemas sociais; a divulgação e o reforço da imagem da

empresa doadora como entidade benfeitora, dotada de espírito filantrópico; a busca

pelo apoio dos organismos do Estado, pela preferência do consumidor, pelo respeito

dos clientes e pela admiração de seus funcionários, além do apoio da comunidade.

Nem sempre tais ações estão direcionadas ou alinhadas ao marketing da empresa.

Também atenuam o estereótipo social de empresa que obtém lucro final (MELO

NETO e FRÓES, 1999).

Outra modalidade é o marketing das campanhas sociais39. Nesse caso a

empresa ganha mais visibilidade e publicidade, admiração por parte do público e

estreita seus laços com os órgãos do governo. Em geral tais campanhas estão

alicerçadas por forte apelo emocional e pela contribuição para um movimento sério,

que rapidamente obtém adesão de empresas, governo e sociedade civil.

Essa modalidade geralmente conta com o apoio da mídia, em especial da TV,

assegurando grande retorno publicitário para as empresas que participam das

39 Um exemplo dessa modalidade é o MeDia Feliz da rede de fasf food MeDonald's.

Page 73: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

63

campanhas, valorizando o produto que passa a dispor de maior visibilidade, o que

na maioria das vezes alavanca suas vendas no ponto de venda (PRINGLE e

THOMPSON, 2000).

Ainda é preciso destacar que o marketing das campanhas sociais mobiliza os

próprios funcionários, servindo como um poderoso instrumento de endomarketing e

constrói uma imagem simpática da empresa para o consumidor (MELO NETO e

FRÓES, 1999).

O patrocínio de projetos sociais também pode ser descrito como uma das

modalidades de marketing social. Existem, nesse caso, dois tipos de patrocínio de

projetos sociais: o patrocínio de projetos sociais de terceiros e o patrocínio de

projetos sociais próprios. Nessa modalidade a empresa busca não somente

alavancar, mas também desenvolver seu negócio em outras frentes, fazendo um uso

potencial das ferramentas e técnicas do marketing social. Tal modalidade propicia

um grande retorno de imagem e de vendas. As organizações, nesses casos,

utilizam o marketing social como uma modalidade de promoção da marca, do

produto e das vendas, valorizam as ações do seu projeto como instrumento de

fidelização de clientes, de captação de novos clientes, de aproximação com o

mercado, de melhoria do relacionamento com os fornecedores, distribuidores e

representantes e de abertura de novos canais de venda e distribuição. Além disso,

elas visam a maximização do retorno publicitário e a potencialização da marca. A

avaliação dos resultados de cada programa e projeto torna-se muito importante pois

irá contribuir na administração do instituto ou da fundação, como centro de custos e

de resultados (MELO NETO e FRÓES, 1999).

Às duas últimas modalidades correspondem o marketing de relacionamento

com base em ações sociais40 e o marketing de promoção social do produto e da

40 Um bom exemplo da prática do marketing social de relacionamento é a Avon, que usa suas representantes para fornecer informações sobre exames e orientar suas clientes nos procedimentos preventivos para evitar doenças como câncer de mama. Os representantes dão conselhos, distribuem

Page 74: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

64

marca, a primeira evidenciada pela utilização por parte da empresa de seu próprio

pessoal de vendas na orientação de seus clientes, como usuários de serviços

sociais. Já o marketing da promoção social de produtos e marcas consiste no

licenciamento do nome ou log041 de uma entidade sem fins lucrativos ou de uma

campanha social do governo para uma empresa privada em troca de uma

porcentagem do faturamento (MELO NETO e FRÓES, 1999).

Muitas pessoas, conhecendo apenas uma dessas modalidades, acabam

identificando como marketing social apenas uma parcela das inúmeras partes que

compõem o conceito. O desconhecimento da abrangência do termo pode levar a

usos ou interpretações incorretas, uma vez que cada modalidade possui diferentes

níveis de comprometimento, estruturação, elaboração e enfrentamento das questões

sociais (SINA e SOUZA, 1999).

3.4 CRíTICAS AO MARKETING SOCIAL

Em meio a inúmeras definições e modalidades é compreensível que o

entendimento do termo não seja consensual. Diferentemente porém dos conceitos

expostos anteriormente, como os de responsabilidade social e cidadania

empresarial, por exemplo, o termo marketing social chega a gerar certo

descontentamento e repúdio por parte de alguns líderes empresariais e autores

ligados ao tema.

Muitos autores e empresários acreditam que as iniciativas de uma empresa­

cidadã não devem fazer parte da estratégia de marketing, justificando que, como se

trata de uma ação social, precisa ser pautada pela ética (MATIAS, 1999). Existe uma

folhetos e divulgam endereços de hospitais e casas de saúde especializadas na prevenção desta doença (MELO NETO e FRÓES, 1999, p. 162). 41 A palavra "logo' é utilizada aqui como redução de logotipo ou logomarca, que é a particularização da escrita de um nome, combinado ou não a um símbolo gráfico, que irá representar a marca de uma organização.

Page 75: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

65

premissa de que empresas éticas não devem divulgar suas ações sociais. Para

muitos puristas, o marketing deforma a pol ítica social das empresas, distorcendo

suas ações. Alegam que a empresa tende a priorizar ações de impacto da mídia,

problemas sociais da moda e determinados segmentos populacionais que propiciem

maior visibilidade (MELO NETO e FRÓES, 2001).

É provável que o descontentamento de alguns com o tema do marketing

social seja conseqüência de sua aplicação oportunista e errônea por parte de

algumas organizações. Determinadas organizações entendem por marketing social

um proveitoso oportunismo ao acreditarem que basta desenvolver algum projeto

filantrópico para que sejam percebidas como marcas-cidadãs. Trata-se de um

grande engano, uma vez que uma marca-cidadã precisa expressar sua cidadania de

forma contínua, contribuindo para melhoria da qualidade de vida da comunidade

interna e externa (PINTO, 2001).

Cabe ao gestor e aos demais membros da sociedade a distinção dessas duas

vertentes, a de curto e a de longo prazo, a de frágil sustentação e aquela bem

calcada. Da mesma forma que existe um marketing social responsável e ético,

também é possível a existência, apropriando-se da denominação de marketing

social42, de ações oportunistas utilizadas como plataforma de negócios, apenas com

o intuito de destinar parte de suas arrecadações para atração do público e aumento

das vendas (MELO NETO e FRÓES, 2001).

3.5 A IMPORTÂNCIA DA ADOÇÃO DE UMA POLíTICA DE MARKETING SOCIAL

Há uma crescente pressão sobre as empresas para que reconheçam suas

responsabilidades sociais globais. As organizações conscientizam-se da existência

42 Melo Neto e Fróes (2001) utilizam as expressões 'marketing social ético' e 'marketing de causa' para distinguirem os dois tipos de marketing social que se contrapõem. Os autores posicionam-se a favor da utilização do marketing quando reflexo de ações e programas bem intencionados.

Page 76: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

66

de um mundo mais transparente no qual produtores podem se unir a organizações

não-governamentais, clientes e mídia ao redor do mundo. Sendo assim, a imagem e

reputação de uma marca se tornaram mais do que uma prioridade na economia

globalizada, em que um produto atua e participa de muitos mercados diferentes. A

oportunidade de poder vender uma marca para o mundo todo é contrabalançada

pela ameaça dessa marca vir a perder sua reputação43 (MCINTOSH et alli, 2001).

Inúmeras são as razões que justificam a adoção e implementação de políticas

e programas de marketing social pelas empresas, entre elas a atração e retenção de

melhores valores profissionais, além da valorização da marca e simpatia da mídia

(MCINTOSH et alli, 2001; MELO NETO e FRÓES, 2001). As organizações vem

descobrindo que a divulgação do social também incorpora valores e fortalece a

imagem corporativa de marcas e produtos. Com a divulgação, a empresa ganha

respeito, reconhecimento e simpatia de clientes, fornecedores, distribuidores e de

toda a população. A prática de ações de responsabilidade social pressupõe sua

disseminação, que por sua vez fortalece os vínculos da empresa com seu ambiente

interno e externo (PRINGLE e THOMPSON, 2000; MELO NETO e FRÓES, 2001).

Tanto as empresas como seus investidores preocupam-se em diminuir o risco

de exposição aos mais diversos problemas, entre eles os sociais. Os acionistas cada

vez mais desejam saber como as empresas estão protegendo os seus

investimentos, bem como organizações não-gQvernamentais (ONGs) e a mídia

interessam-se cada vez mais por histórias que revelem bons e maus exemplos de

responsabilidade social e cidadania empresarial (MCINTOSH et alli, 2001).

Nessa perspectiva, a empresa socialmente responsável torna-se cidadã

também porque dissemina novos valores que restauram a solidariedade social, a

coesão social e o compromisso social com a dignidade, a liberdade, a eqüidade, a

43 A Nike, marca líder do mercado de tênis em todo o mundo, viu suas ações despencarem após denúncia de exploração de trabalho infantil por fornecedores asiáticos (ASHLEY, 2002, p. 10).

Page 77: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

67

democracia e a melhoria da qualidade de vida de todos que vivem na sociedade

(MELO NETO e FRÓES, 2001). O marketing social passa a ser quase que uma

obrigação da empresa.

Não há como negar os benefícios internos ou externos para as empresas que

já adotam políticas de marketing social. Na parte externa, a empresa contabiliza

lucros sociais com a maior credibilidade e confiança nela depositada. Isso reflete um

aumento de sua visibilidade, com reforço de imagem e provável aumento nas

vendas, aliado a uma maior capacitação da mão-de-obra local (MELO NETO e

FRÓES, 2001). A imagem da marca44 não é apenas um valor externo, o que

aumenta a dimensão e as razões para se investir em marketing social (MCINTOSH

et alli, 2001).

Para Oded Grajew, diretor presidente do Instituto Ethos e presidente do

Conselho de Administração da Fundação Abrinq, é preciso que as empresas

invistam em marketing social por que o "exemplo é fundamental." "Em sua

comunicação, as empresas podem e devem ajudar na formação de valores de

responsabilidade social" (GRAJEW, 2001, p. 30).

A mídia, em grande parte nas mãos do setor privado, realmente tem mostrado

muito interesse no tema, cumprindo seu papel de promotora do terceiro setor, ao

divulgar iniciativas sociais, por parte de governos, empresas, associações e

comunidades, e ao publicar pesquisas sociais relevantes (MELO NETO e FRÓES,

1999). Isso significa menores investimentos em comunicação ou mesmo divulgações

e inserções gratuitas, muitas vezes de cunho editorial, que geram ainda mais

credibilidade. Também as intervenções pagas dentro do tema do marketing social

44 A imagem de uma marca funciona para uma empresa tanto interna quanto externamente. Internamente, a imagem da marca age como uma cola e um batimento cardíaco, persuadindo os funcionários de que o produto da empresa os une em seus esforços diários e que devem acreditar nisso. Externamente, a imagem da marca também dá aos clientes "algo em que devem acreditar", como diziam os anúncios da Volvo nos anos 90. Em ambos os casos, a marca significa mais do que o próprio produto - também representa estilo de vida, valores e ajuda para mudarem suas vidas (MCINTOSH et alli , 2001, p. 69).

Page 78: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

68

parecem gerar melhores resultados. Os apelos através da mídia de massa, quando

planejados eficazmente, conseguem informar, motivar e provocar comportamentos

saudáveis e duradouros, mesmo na ausência de intervenções interpessoais

complementares (KOTLER e ROBERTO, 1992).

Também a sociedade, impulsionada por alguns acontecimentos recentes,

como o advento da globalização gerando pessoas mais informadas e por esta razão,

mais insatisfeitas e exigentes, ou ainda o avanço considerável das desigualdades e

mazelas sociais, determinaram uma série de transformações nos comportamentos

dos indivíduos, que fortalecem as discussões e a motivação das empresas para

adoção de programas de marketing social. A ascensão dos consumidores ao topo

da hierarquia das Necessidades de Maslow45, comprovada por evidências

estatísticas, mostra que a riqueza material está se tornando cada vez menos

relevante para a satisfação e felicidade pessoal, à medida que o desejo de pertencer

ou fazer parte, de "auto-estima" e de "auto-realização", se tornam mais

proeminentes. Some-se a tudo isso o alarmante declínio por parte das pessoas dos

níveis de confiança nas instituições tradicionais46 (PRINGLE e THOMPSON, 2000).

Tais transformações nos comportamentos dos indivíduos determinam

modificações na própria abordagem do marketing quando voltado ao social. Nessa

nova orientação, o consumidor deixa de representar mais um território de conquista

sobre o qual as empresas se lançavam para plantar tantas bandeiras quantas

fossem possíveis. A empresa se vê no interior de fluxos de comunicação que

tendem a alterar ambos (a empresa e os próprios fluxos de comunicação dos quais

participa). O marketing passa a ser interpretado não mais como agressão, tampouco

45 Maslow, Abraham. Motivation and personality. Nova York, Harper & Row, 1954. 46 Aqui compreendidas como instituições tradicionais aquelas que formam os "pilares da comunidade, como a Igreja, o governo e a política, às quais as pessoas se acostumaram a "pertencer" ou fazer parte, das quais muitas derivaram a noção de direção social e autoridade moraL" (PRINGLE & THOMPSON, 2000, p. 12).

1

Page 79: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

69

como conquista ou ainda totalmente indiferente àquilo que o cerca, mas sim como

compartilhamento (DI NALLO, 1999).

Ao reconhecerem a responsabilidade social como um ativo competitivo,

Mclntosh et alli (2001) avaliam o marketing social como um aprendizado

compulsório. As empresas transparentes, responsáveis e a frente de seus negócios

estão aprendendo constantemente e estão cientes de que tem que fazer o uso da

economia da informação para continuarem bem-sucedidas, mesmo a frente de

condições externas mutantes (MCINTOSH et alli 2001).

Além de uma oportunidade, o investimento em comunicação e marketing

social fortalece as ações de responsabilidade social e atesta cidadania empresarial.

"( ... ) finalmente um último fator a maior participação das empresas que já

descobriram o filão do marketing social. Investem em programas e projetos sociais e

obtêm retorno social de imagem e de vendas. Tornam-se empresas cidadãs e

ganham o respeito de todos: funcionários, clientes, fornecedores, governo,

comunidade e opinião pública" (MELO NETO e FRÓES, 1999, p. 12).

Desprezar o potencial do marketing social, alegando que se trata de afronta

moral, oportunismo ou ainda que ele fere questões éticas, é ignorar parte do papel

social da empresa, impedindo que mais pessoas tomem conhecimento de ações

sociais tão necessárias (MELO NETO e FRÓES, 2001). A cidadania corporativa e o

gerenciamento das responsabilidades sociais de uma empresa são, portanto, tão

preocupadas com a opinião pública quanto com o gerenciamento moral (MCINTOSH

et alli, 2001). Quando sustentada por uma intenção e uma prática genuína, a

questão da responsabilidade social tem no marketing social um importante aliado. A

motivação precisa ser legítima, ligada intimamente aos valores da empresa e ao

sincero desejo de beneficiar a comunidade (PINTO, 2001).

Page 80: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

70

Para os adeptos do marketing social não há como ignorar sua ascensão, uma

vez que a questão social tornou-se ponto estratégico para as empresas nos dias de

hoje. Seu impacto na qualidade, produtividade e competitividade da empresa é

perceptível. Artigos técnicos e livros comprovam a efetividade das ações de

marketing na sociedade de consumo, do entretenimento e da informação (MELO

NETO e FRÓES, 2001). A adoção de uma política de marketing social conjuga as

novas posturas empresariais com o novo posicionamento do marketing. "Será

premiada, então, não a empresa agressiva, mas a receptiva e consciente, capaz de

entender as mudanças e transmiti-Ias com antecedência no produto, na imagem, em

outras palavras, na sua existência" (DI NALLO, 1999, p. 17).

3.6 DESAFIOS, OBJETIVOS E ESTRUTURAÇÃO DO MARKETING SOCIAL

Realizar ações em que todos saiam ganhando - empresa, funcionários,

comunidade e sociedade - é a idéia central por trás do conceito de marketing

social47. Para Kotler e Roberto (1992) tanto o desafio como o objetivo do marketing

social é a geração de mudança social para a melhora da vida.

Modificar as atitudes ou comportamentos do mercado-alvo é o primeiro

objetivo do marketing social. Na busca por esse objetivo sua principal meta é o

atendimento dos interesses de mercado ou da sociedade. A obtenção de tal

resultado se dá através da concretização de idéias e serviços. É importante que se

faça a distinção entre o marketing social e o marketing comercial (tradicional), já que

os benefícios do primeiro visam em primeira instância o indivíduo ou a sociedade

(SINA e SOUZA, 1999). Também Kotler e Armstrong (1993) demonstram que o

47 Para Silveira (2000), a idéia mestra é realizar ações em que todos lucram. "A comunidade, por receber apoio para resolver uma parte de seus problemas. O profissional de marketing social, que recebe um salário. E a empresa, por ter sua imagem associada ao bem-estar comum - sobretudo num ambiente de negócios, como o atual, em que gerar verdadeira admiração pública se torna um elemento cada vez mais importante para atrair consumidores e destacar-se da concorrência" (SILVEIRA, 2000, p. 56).

Page 81: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

71

conceito de marketing social gera inúmeros questionamentos sobre a efetividade e

adequação do conceito do marketing tradicional numa época de problemas

ambientais, escassez de recursos naturais, rápido crescimento populacional,

recessão mundial e principalmente negligência dos serviços sociais. Trata-se de

valiosa comparação para o entendimento dos objetivos e desafios do marketing

social e pode significar um avanço para que o conceito seja melhor compreendido e

menos discriminado por parte de alguns.

Os especialistas em marketing social promovem idéias e práticas sociais com

o objetivo último de gerar mudança em determinados comportamentos (KOTLER e

ROBERTO, 1992). Verifica-se aqui uma sensível diferença relativa ao marketing

tradicional: "uma das melhores coisas do marketing social é que ele não depende de

idéias mirabolantes para ser posto em prática. Idéias simples podem ter o mesmo

efeito" (SILVEIRA, 2000, p. 58).

Na verdade o marketing tradicional, como se observa nas suas definições,

está basicamente alicerçado por diversas ferramentas utilizadas pelos profissionais

para obter as respostas desejadas de seus mercados-alvo. Tal conjunto de

ferramentas constitui o mix de marketing (ou composto de marketing). "McCarthy48

classificou essas ferramentas em 4 grupos amplos que denominou o 4P's do

marketing: produto, preço, praça (ou ponto-de-venda) e promoção (do inglês

product, price, p/ace e promotion)" (KOTLER, 2000, p. 37). Para Kotler (2000)

decisões de mix de marketing devem ser tomadas para que se exerça influência

sobre os canais comerciais, bem como sobre os consumidores finais.

O marketing social amplia o escopo do composto de marketing. Aos

chamados 4P's do composto do marketing tradicional, deve-se adicionar outros

quatro elementos igualmente importantes para a estruturação do marketing social:

público, parceria, política e pagamento (SINA e SOUZA, 1999).

48 McCarthy, E. Jerome. Basic marketing: a managerial approach. 12 ed. Homewood, IL: Irwin, 1996.

Page 82: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

72

"O abandono de uma idéia ou comportamento adverso ou a adoção de novas

idéias e comportamentos é o objetivo do marketing social. O produto49 a ser

colocado no mercado são idéias e comportamentos" (KOTLER e ROBERTO, 1992,

p. 26). O produto do marketing social não deve ser compreendido simplesmente

como o produto (bem ou serviço) da empresa aliado a uma causa social. "O produto

do marketing social é o comportamento ou oferta que o programa quer que a

audiência50 adote" (SINA e SOUZA, 1999, p. 32).

Sendo assim o marketing social deve desenvolver o seu produto (que é a

idéia ou a prática social) de maneira quase que independente da produção

específica da empresa. "O primeiro requisito do sucesso em marketing social é criar

um novo produto social para satisfazer uma necessidade que não esteja sendo

satisfeita, ou projetar um produto melhor que os existentes" (KOTLER e ROBERTO,

1992, p. 29). Somente depois de implementado um programa que dissemine uma

prática social é que os resultados deverão ou poderão ser agregados ao( s)

produto(s) do patrocinador da ação. É essa visão que legitima o marketing social.

Aspectos referentes ao termo 'preço', no marketing social dão lugar a 'custo' e

principalmente a 'investimento'. Logicamente existe a troca monetária, porém, com

maior freqüência, no marketing social estão envolvidos valores intangíveis, como

tempo, esforço e mudança de velhos hábitos. Se, na maioria das vezes não há um

preço a ser pago pelos beneficiários primários da ação, a adoção de um programa

de marketing social certamente envolve custos, sejam internos ou externos. A busca

de recursos é um ponto importante para quem pretende implantar um projeto de

marketing social, seja essa captação desenvolvida internamente ou externamente ao

ambiente da empresa (SINA e SOUZA, 1999).

49 Segundo Kotler e Roberto (1992) os produtos sociais podem apresentar-se como uma 'idéia social' ou como uma 'prática social'. No caso da idéia social esta pode tomar a forma de uma crença, atitude ou valor. 50 Cabe ressaltar aqui que audiência, muitas vezes substituída pelo termo target, ou ainda por audiência-target, significa o conjunto de pessoas cujo comportamento o(s) criador(es) do programa de marketing social tem interesse em alterar, ou melhor, afetar (SINA e SOUZA, 1999, p. 29).

Page 83: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

73

A escolha do local de aplicação e divulgação das ações também precisa ser

planejada. Pelo fato de, no marketing social o produto se tratar de um

comportamento ou de uma prática mais do que um item físico, a questão principal

passa a ser onde tal comportamento será disponibilizado para a audiência target. A

escolha do local de aplicação da ação social bem como da sua comunicação é

crucial uma vez que a mudança desejada, quando alcançada, somente permanecerá

se o ambiente que envolve a audiência-alvo for favorável. Essa visão contempla a

política, a parceria e principalmente o público. Compreender e atender aos anseios

do público é uma tarefa das mais sensíveis que envolvem os profissionais que

atuam com o marketing social. É tarefa determinante para o sucesso ou fracasso

dos programas (SINA e SOUZA, 1999).

Em se tratando de marketing social, é preciso destacar a dimensão do termo

público:

Público se refere aos dois segmentos, o externo e o interno, ambos envolvidos no programa. São todos aqueles que o programa tem intenção de impactar de uma forma ou de outra. Além do público primário, que recebe o principal impacto da mensagem, pode, ainda, existir uma audiência secundária, que muitas vezes influencia o público primário. Em geral são seus parentes e amigos, membros da família, professores, médicos, entre outros. Outro público externo podem ser os formadores de opinião do setor, que têm a habilidade para criar um ambiente favorável conduzindo o público à mudança de comportamento (SINA e SOUZA, 1992, p. 35).

Muito provavelmente a primeira tarefa do marketing social é a especificação

da audiência para os programas o mais precisamente possível, uma vez que são

evidentes as diferenças entre os vários grupos que se pretende envolver (SINA e

SOUZA, 1999). "Como cada grupo de adotantes escolhidos como alvo possui seu

próprio conjunto de crenças51, atitudes52 e valores53

, os programas de marketing

social são elaborados e estruturados em torno das necessidades de cada segmento

51 Uma crença é uma percepção que se tem sobre uma coisa concreta; não implica avaliação ~KOTLER e ROBERTO, 1992, p. 26).

2 As atitudes são avaliações positivas ou negativas de pessoas, objetos, idéias ou acontecimentos ~KOTLER e ROBERTO, 1992, p. 26). 3 Valores são idéias gerais do que é certo ou errado (KOTLER e ROBERTO, 1992, p. 26).

Page 84: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

74

específico de uma população escolhida como alvo" (KOTLER e ROBERTO, 1992, p.

27).

Além do público externo, deve ser impactado o público interno desde o início do programa para que haja genuíno envolvimento e comprometimento em relação aos objetivos do mesmo. O público interno tem papel fundamental no sucesso de um programa. Se não houver por parte da alta administração, aceitação e apoio singulares, ou ainda, se o top management não souber o que é marketing social e que os procedimentos são diferentes dos modelos tradicionais, é provável que o programa jamais saia do papel (SINA e SOUZA, 1999, p.36).

São ações diferentes de comunicação e marketing, com abrangências e

motivações distintas que estimularão os públicos externo e interno. "O marketing cria

novos atributos aos produtos e suas marcas e induz o cliente a considerá-los como

vitais e de extrema utilidade. Com suas ações de comunicação, o marketing muda e

influencia a percepção do cliente e seus comportamentos. Através da sua versão

'endo' (endomarketing), motiva os funcionários e obtém ganhos de produtividade"

(MELO NETO e FRÓES, 2001, p. 73).

O endomarketing, também chamado de marketing interno, visualiza os

funcionários como clientes internos e as tarefas como produtos internos. Satisfazer

às necessidades dos clientes internos melhora a capacidade de satisfazer às

necessidades dos clientes externos, sejam tais clientes os consumidores dos

produtos da empresa ou a comunidade necessitada de determinada assistência

(LEWIS e LlTTLER, 2001).

Grõnroos (1985) destacou três objetivos do marketing interno: geral,

estratégico e tático. O objetivo geral procura manter os funcionários motivados e

bem orientados; o estratégico visa criar entre os funcionários um ambiente interno

propício ao atendimento dos clientes; por fim, o tático objetiva a "venda" de

campanhas de serviços e esforços de marketing aos funcionários, que são o

primeiro mercado da empresa.

No caso específico do marketing social, o objetivo tático assume papel

determinante. O alinhamento por parte dos funcionários aos objetivos gerais se dá

Page 85: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

75

compulsoriamente mesmo porque envolve questões de empregabilidade. Fazer com

que o funcionário participe de programas voluntários envolve adesão, que precisa

ser estimulada por maiores graus de solidariedade e responsabilidade social.

Inicialmente cabe aos gerentes de recursos humanos a tarefa do marketing

interno. Um marketing interno bem-sucedido porém, exige que os gerentes de

recursos humanos desenvolvam relacionamentos não apenas com os funcionários,

mas também com os gerentes de marketing e os gerentes operacionais (LEWIS e

LlTTLER, 2001). Fica clara a necessidade de compreensão do conceito de

marketing social por parte de todos os envolvidos. No estímulo do público interno é

fundamental a participação das lideranças (diretores, gerentes e chefes).

Em geral, quanto ao público interno, cada organização pode mais facilmente

mapear as características de seus colaboradores, para então orientar sua

comunicação (LEWIS e LlTTLER, 2001). Com maior grau de dificuldade, o mesmo

precisa ser feito para o público externo.

o marketing social exige conhecimento de cada grupo de adotantes escolhidos como alv054,

aí se incluindo: 1) suas características sócio-demográficas (atributos externos de classe social, renda, educação, idade, tamanho da família e assim por diante); 2) perfil psicológico (atributos internos, como atitudes, valores, motivação e personalidade) e 3) características comportamentais (padrões de comportamento, hábitos de compras e características de decisão)(KOTLER e ROBERTO, 1992, p. 28).

Sendo assim, cabe ao especialista em marketing social a tarefa de

diferenciação entre os grupos de adotantes escolhidos como alvo. Além de

selecioná-los, o profissional precisa identificar ainda os grupos que exercem

influência, também chamados de influenciadores, que podem afetar o êxito de um

programa (KOTLER e ROBERTO, 1992). Ao mencionar público interno e externo

não se pode esquecer de um público intermediário particularmente muito importante:

os formadores de opinião da mídia, responsáveis pela produção das notícias e pelo

filtro do que chega aos ouvidos dos públicos de interesse dos programas.

54 Conhecer os adotantes escolhidos como alvo dessas três maneiras relacionadas capacita o especialista em marketing social a fazer previsões mais exatas. Estas, por sua vez, são pré-requisitos da capacidade de influenciar os resultados (KOTLER e ROBERTO, 1999, p. 28).

Page 86: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

76

Demonstrar a esse público a importância e os detalhes dos programas de marketing

social pode ser interessante (SINA e SOUZA, 1999).

As parcerias também constituem elementos-chave para o sucesso de um

programa de marketing social. Com o estabelecimento de parcerias na comunidade,

a organização pode estender seus recursos e conseguir atingir um público, que de

outra forma não poderia. Nesse caso, o que deve ser feito é o estabelecimento de

parcerias com organizações que têm objetivos ou público-alvo similares aos da

empresa patrocinadora do programa de marketing social e a identificação de

caminhos através dos quais possam trabalhar em conjunto para que ambos

obtenham benefícios (SINA e SOUZA, 1999).

A importância de um adequado tratamento e comunicação das ações que

envolvem a cidadania corporativa exige a estruturação de um departamento ou setor

especializado na estruturação de programas de marketing social. liA nova cidadania

corporativa não é algo secundário a ser gerenciado pelas relações públicas. A nova

cidadania corporativa trata de cidadania no cerne do planejamento estratégico. A

magnitude da mudança necessária para que isso ocorra pode parecer esmagadora,

um pouco como tentar manobrar um superpetroleiro em um pequeno porto"

(MCINTOSH et alli 2001, p. 37). Se, de início, estruturar tais ações pode parecer

tarefa difícil ou não apropriada, na prática, revela-se algo possível e imprescindível.

Todo programa de marketing social precisa ser tratado como um processo de

gestão de mudanças no comportamento da sociedade ou da comunidade na qual

está inserido. Para isso, é preciso que todos os envolvidos num programa de

marketing social ampliem sua compreensão a respeito do tema, já que ele trabalha

um conceito mais amplo que apenas a realização de publicidade e promoção. 55

o marketing social gira em torno do conhecimento adquirido através das práticas empresariais: o estabelecimento de objetivos mensuráveis, pesquisa sobre as necessidades humanas, o direcionamento de produtos para grupos especializados de consumidores, a

55 ARAÚJO, Anna Gabriela. "A hora e a vez do marketing social", Revista Marketing, n. 331, agosto de 2000. Editora Referência.

Page 87: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

77

tecnologia de produtos que atendam a necessidades e desejos humanos e a comunicação eficaz de suas vantagens, a constante vigilância de alterações do meio ambiente e a capacidade de se adaptar à mudança (KOTLER e ROBERTO, 1992, p. 27).

As ações de responsabilidade social e cidadania empresarial servirão de base

para o desenvolvimento de programas de marketing social, que, embora possa

parecer uma fase posterior do processo, deve caminhar em paralelo com as duas

primeiras. "O processo de administração do marketing social consiste em analisar o

meio ambiente; pesquisar a população de adotantes escolhidos como alvo; definir o

problema ou a oportunidade de marketing social; elaborar estratégias de marketing

social; planejar os programas do complexo de marketing social; e organizar,

implantar, controlar e avaliar o esforço de marketing social" (KOTLER e ROBERTO,

1992, p. 39).

O processo de planejamento de marketing social consiste de cinco estágios

gerais, com vários diferentes tipos de atividades: planejamento; desenvolvimento da

mensagem e dos materiais a serem enviados; pré-teste do programa e campanha;

implementação; e avaliação e controle (SINA e SOUZA, 1999).

Inúmeras são as dificuldades da implementação de um programa de

marketing social. "As organizações dedicadas ao marketing social muitas vezes não

encontram seu pessoal ou seus esforços de marketing em um único lugar, mas via

de regra, dispersam-nos nos por vários departamentos" (KOTLER e ROBERTO,

1992, p. 37). Isso pode dificultar na consecução dos objetivos e implementação dos

programas e ações de comunicação.

A dispersão de pessoal pode constituir problema maior quando demandar

maiores tempos de elaboração ou de implantação. Ainda nessa perspectiva, o

caráter mutável das ações de marketing social precisa ser ressaltado. "O marketing

social requer contínuas alterações ou adaptações de ajustes e de acordo com a

circunstâncias. Por esta razão, ele pode ser visto como um processo administrativo

Page 88: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

78

que requer uma administração ativa e vigilante, além do planejamento" (KOTLER e

ROBERTO, 1992, p. 37).

Dentro desta perspectiva, estruturado e tratado com profissionalismo, a partir

de uma responsabilidade social consistente, o marketing social recebe a

denominação de 'marketing social ético'.

o verdadeiro marketing social atua fundamentalmente na comunicação com os funcionários e seus familiares, com ações que visam aumentar comprovadamente o seu bem-estar social e o da comunidade. Essas ações de médio e longo prazos garantem sustentabilidade, cidadania, solidariedade e coesão social. A comunicação dos resultados alcançados por tais ações sociais e os ganhos da empresa resultantes da maior visibilidade dessas ações constituem o que denominamos de marketing social ético (MELO NETO e FRÓES, 2001, p. 74).

A partir da estruturação e comunicação destas ações, a empresa ganha

produtividade, credibilidade, respeito, visibilidade e incremento nas vendas.

"Associar práticas sociais a problemas prioritários e a parcelas da população em

situações de risco e carência, divulgar os resultados obtidos e com isso capitalizar o

chamado 'lucro social' são ações justas e legítimas de marketing social. Outros tipos

de ações, que revelem inconsistência, não devem ser relevadas" (MELO NETO e

FRÓES, 2001, p. 74).

Page 89: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

79

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Nesta etapa do trabalho, apresenta-se a metodologia de pesquisa adotada.

Tal metodologia é coerente com o problema de pesquisa, objetivos gerais e

específicos, expostos na introdução, bem como está de acordo com o quadro de

referência conceitual estabelecido na base teórico-empírica.

4.1 ESPECIFICAÇÃO DO PROBLEMA DA PESQUISA

Na base teórico-empírica procurou-se estabelecer os aspectos relevantes que

definem os termos de gestão social, responsabilidade social e marketing social, com

especial atenção às variadas interpretações e aos entendimentos relacionados a

cada um desses temas, que determinam diferentes conduções e objetivos na prática

de ações sociais. A seguir, são apresentadas as principais questões de estudo.

4.1.1 PERGUNTAS DA PESQUISA

• Como os diferentes atores que participam e/ou conduzem a prática

das ações sociais da organização compreendem a responsabilidade social?

• Como os diferentes atores que participam e/ou conduzem a prática

das ações sociais da organização compreendem o papel e o potencial do

marketing social?

• Quais as implicações dessas interpretações na efetivação de

programas sociais?

• Como o marketing social pode contribuir na busca por uma gestão

social e na melhor disseminação de práticas que assegurem uma melhoria

das condições sociais atuais?

Page 90: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

80

• Quais os elementos (comuns ou distintos) para o desenvolvimento de

um programa de marketing social em empresas de diferentes portes e ramos

de atuação?

4.2 DELIMITAÇÃO E DESIGN DA PESQUISA

4.2.1 UNIVERSO E AMOSTRA

Foram escolhidas para o estudo duas significativas unidades industriais de

empresas instaladas em Curitiba que optaram pelo desenvolvimento de soluções

caseiras, estruturando seus próprios programas de gestão da responsabilidade

social.

A escolha da Robert Bosch deveu-se ao fato de se tratar de uma empresa

multinacional centenária, representativa no cenário global e comprometida com as

transformações tecnológicas mundiais experimentadas no último século. A Unidade

de Curitiba da Bosch é citada em grande número de eventos, palestras e encontros

regionais envolvendo o tema da responsabilidade social, constituindo um exemplo

que recentemente ganhou ainda mais notoriedade com a adoção do seu programa

'Somos Herdeiros de Nossas Ações' como modelo corporativo a ser estendido para

as outras unidades da Bosch no Brasil.

De outro lado, a escolha da Inepar para o segundo estudo de caso deveu-se

ao fato de se tratar de uma organização genuinamente paranaense que

experimentou um forte crescimento e expansão de seus negócios. Na última década,

passou de empresa regional para tornar-se um grupo com atuação em todo o

cenário nacional e também em diversos outros países da América Latina. A Inepar,

por suas atividades, está muito comprometida com projetos e obras que

transformaram o cenário brasileiro nos últimos anos.

Page 91: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

81

As duas empresas, Bosch e Inepar, são sempre apontadas regionalmente

como referências de responsabilidade local no exercício de suas atividades, servindo

de modelo para inúmeras outras iniciativas. Coincidentemente, suas unidades são

vizinhas na Cidade Industrial de Curitiba.

4.2.2 DELINEAMENTO DA PESQUISA

A presente pesquisa caracteriza-se por dois estudos de caso distintos,

também chamados de estudos de casos múltiplos. "Em geral, os estudos de caso

representam a. estratégia preferida quando se colocam questões do tipo 'como' e

'por que', quando o pesquisador tem pouco controle sobre os eventos e quando o

foco se encontra em fenômenos contemporâneos inseridos em algum contexto da

vida real" (YIN, 2001, p. 19). Yin (2001) alerta para as tradicionais críticas passíveis

ao método, salientando porém sua acentuada adoção, como ferramenta de

pesquisa, por parte das escolas de administração e sua inigualável contribuição,

como esforço de pesquisa, para a compreensão de fenômenos individuais,

organizacionais, sociais e políticos.

Tomando-se por base a taxionomia apresentada por Vergara (2000), a

presente pesquisa pode ser qualificada em relação a dois aspectos: quanto aos fins

e quanto aos meios.

Quanto aos fins, a pesquisa é descritiva e exploratória. Descritiva, porque

objetiva descrever não somente as efetivas práticas de responsabilidade social e

marketing social, como também as compreensões, interpretações, percepções,

expectativas e sugestões dos atores destas organizações envolvidos na

estruturação e/ou condução das ações envolvendo o exercício dos temas citados.

Exploratória porque, embora as duas unidades de análise caracterizem empresas há

muito tempo estabelecidas, suas ações mais contundentes referentes a

Page 92: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

82

responsabilidade social e ao marketing social são bastante recentes. Sendo assim,

não se verificou a existência de estudos que abordem os referidos temas nas

unidades estudadas com o ponto de vista pelo qual esta pesquisa procura enfocá­

los.

Quanto aos meios, a pesquisa é de campo, além de bibliográfica e

documental. "Pesquisa de campo é investigação empírica realizada no local onde

ocorre ou ocorreu um fenômeno ou que dispõe de elementos para explicá-lo. Pode

incluir entrevistas, aplicação de questionários, testes e observação participante ou

não" (VERGARA, 2000, p. 47). Este estudo inclui a aplicação de questionários semi­

estruturados e a realização de entrevistas. Para a fundamentação teórico­

metodológica do trabalho foi realizada investigação sobre diferentes assuntos em

material acessível ao público em geral, como livros, periódicos, artigos e outros

materiais publicados ou veiculados, como balanços sociais, anúncios e campanhas

publicitárias. Caracteriza-se assim a pesquisa bibliográfica. Por fim, a investigação é

também documental, já que apoia suas análises em inúmeros documentos internos

da Bosch e da Inepar, como relatórios, memorandos, arquivos, entre outros, ligados

ao objeto de estudo.

4.2.3 FONTE E COLETA DE DADOS

A pesquisa, de acordo com a metodologia adotada, contou com a coleta de

dados primários e secundários.

FONTES SECUNDÁRIAS

Para a descrição da prática da responsabilidade social e do exercício do

marketing social foram analisados inúmeros documentos disponibilizados pelas

empresas, tanto internos como também materiais de comunicação externa. Grande

Page 93: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

83

parte das informações adquiridas foi confirmada posteriormente nas entrevistas

informais, nas entrevistas semi-estruradas, ou ainda por meio do simples

cruzamento das informações obtidas.

Nas duas empresas foram analisados: manuais, regimentos internos,

informativos gerais, memorandos, documentos fixados em editais, comunicações

disponibilizadas na intranet, matérias jornalísticas, notícias e releases desenvolvidos

pelas respectivas assessorias de imprensa (publicados ou não em diferentes

veículos de comunicação), house organs, estrutura e apresentação dos diversos

programas e projetos sociais, arquivos, apresentações eletrônicas, relatórios e

registros. Também foram avaliadas peças de publicidade como anúncios de jornal e

spots de rádio. Especificamente na Bosch foram analisados ainda a sua 'Política da

Qualidade' e o estatuto da recém-criada ONG do Grupo de Voluntários Bosch. Na

Inepar foram analisados também os últimos balanços sociais publicados e o site

oficial da empresa na internet, bem como matérias jornalísticas veiculadas na

imprensa.

FONTES PRIMÁRIAS

Os dados foram obtidos por meio de entrevistas semi-estruturadas com

diretores, gerentes e demais funcionários das organizações estudadas, visando a

confrontação entre discurso e prática e o estabelecimento de um quadro referencial

representativo das diferentes visões em relação aos temas abordados. "Uma das

mais importantes fontes de informação para estudos de caso são as entrevistas. ( ... )

Informantes-chave56 são sempre fundamentais para o sucesso de um estudo de

caso" (YIN, 2001, p. 112). Os entrevistados foram selecionados mediante seu grau

de envolvimento na condução e/ou organização das práticas sociais, a partir de

56 YIN (2001) ressalta que, quanto mais o respondente apresentar suas próprias interpretações de certos acontecimentos, mais o papel dele se aproximará do papel de um "informante" do que o de um mero respondente.

Page 94: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

84

informações iniciais obtidas visando a escolha de participantes comprometidos e

bem-informados. Em cada uma das empresas, os integrantes foram divididos em

três diferentes níveis de acordo com suas funções, permitindo uma visualização

mais clara dos interesses de cada grupo. Tal medida, estabelecendo um modelo

único, facilitou ainda a comparação entre os dois estudos realizados. No início de

cada estudo de caso esta subdivisão foi explicada mais detalhadamente, com a

identificação dos entrevistados das respectivas empresas.

A entrevista semi-estruturada constitui um instrumento de extrema valia para

o presente estudo dada a sua flexibilidade, que permite opiniões, percepções e

interpretações da realidade organizacional adaptadas às diferentes circunstâncias.

"No geral, as entrevistas constituem uma fonte essencial de evidências para os estudos de caso, já que a maioria delas trata de questões humanas. Essas questões deveriam ser registradas e interpretadas através dos olhos de entrevistadores específicos, e respondentes bem-informados podem dar interpretações importantes para uma determinada situação. Também podem apresentar atalhos para se chegar à história anterior da situação, ajudando-o a identificar outras fontes relevantes de evidências" (YIN, 2001, P.114).

As entrevistas foram realizadas nas sedes das empresas estudadas, com

duração média de 80 minutos e foram gravadas com a permissão dos entrevistados.

Posteriormente, por meio de entrevistas complementares, e-maíls e telefonemas

foram acrescidas algumas informações. Também a observação direta muito

contribuiu para a determinação e confirmação de determinadas características. A

dificuldade de agenda foi o principal obstáculo, muito embora não tenham sido

verificados maiores problemas durante a realização das entrevistas.

4.2.4 TRATAMENTO DOS DADOS

Os dados obtidos foram analisados com a utilização de procedimentos

descritivo-qualitativos. A análise dos dados secundários deu-se com a utilização da

pesquisa documental e da análise de conteúdo. Os dados primários também foram

analisados mediante análise de conteúdo visando confirmação e complementação

Page 95: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

85

de determinadas questões. Posteriormente, a triangulação entre dados secundários

e primários permitiu a identificação de dissonâncias e consonâncias entre a prática

e o discurso. A apresentação dos resultados foi desenvolvida da mesma maneira

para os dois casos estudados, permitindo a confrontação entre eles, tanto na prática

efetiva dos temas como na visão de seus respectivos atores.

4.3 LIMITAÇÕES DA PESQUISA

A metodologia escolhida para esta pesquisa apresenta algumas dificuldades e

limitações quanto à coleta e ao tratamento dos dados. É possível que as pessoas

selecionadas para as entrevistas não constituam o grupo mais representativo do

universo estudado para tais questões. Entretanto, este é um risco ao qual todo

processo de investigação está exposto.

A primeira limitação refere-se à seleção dos principais atores condutores das

práticas de responsabilidade social e do marketing social, face a impossibilidade de

se entrevistar todos os envolvidos nessas ações em cada uma das organizações

estudadas (comunidade interna e externa). Também, por razões diversas, os

entrevistados podem fornecer respostas falsas, não condizentes com suas

concepções e perspectivas reais. Pode ainda o entrevistador, por inabilidade ou

pouca vivência nesse campo, influenciar de certo modo alguma resposta dos

entrevistados. A limitação da abrangência da pesquisa aos respectivos

departamentos também pode ter negligenciado outras áreas igualmente importantes.

Também, em função do tamanho das empresas estudadas, não é possível

estender esses resultados para outras unidades industriais das respectivas

organizações, mesmo porque o grau de implantação e disseminação das práticas,

além das próprias atividades desempenhadas e culturas internas, difere em cada

Page 96: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

86

uma das plantas das duas corporações. Na pesquisa documental alguns dados

considerados confidenciais também não foram disponibilizados.

Outra limitação refere-se a uma melhor avaliação da percepção do público

interno e externo sobre as ações de marketing social e a conseqüente valorização

das marcas de bens ou serviços associados à postura ética e social das empresas.

Tal análise, mereceria um estudo qualitativo e quantitativo que inferisse as

comunidades externas e internas, o que nesse estudo, demandaria tempo e poderia

gerar perda de foco. Além disso exigiria um marketing social mais ativo ou melhor

estruturado que o encontrado nas empresas estudadas. Também a questão da

gestão social, embora sirva como elemento teórico de contextualização na base

teórico-empírica, não será aqui avaliada na mesma proporção que as questões de

responsabilidade social e marketing social, uma vez que o aprofundamento dentro

do tema exigiria procedimentos específicos e uma maior interatividade entre o

pesquisador e outras áreas das empresas nem sempre disponibilizadas para a

pesquisa.

Como última limitação cita-se ainda que as impressões obtidas pelo

pesquisador podem refletir determinados aspectos pessoais que influenciem a

interpretação dos dados obtidos.

Page 97: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

87

5ABOSCH

Este capítulo objetiva a apresentação do primeiro estudo de caso

desenvolvido a partir dos resultados da pesquisa de campo, que contou com uma

detalhada pesquisa documental e bibliográfica, séries de entrevistas e observação

direta. Inicialmente há uma rápida descrição das atividades desenvolvidas pela

empresa que permite um breve entendimento de sua evolução, situação atual,

escala e áreas de atuação.

A seguir, de acordo com a base teórico-empírica, são apresentados os dados

obtidos a partir da pesquisa documental (confirmados pelas entrevistas e pela

observação direta) referentes ao efetivo exercício da responsabilidade social da

empresa e da sua atual prática do marketing social. Somente após tais

apresentações é que são demonstradas as diferentes opiniões e perspectivas,

colhidas junto aos entrevistados, com o objetivo de se elaborar um quadro

referencial representativo das percepções dos diferentes atores internos em relação

à responsabilidade social e ao marketing social. Tal ordem permite também a

confrontação entre a ação das empresas e seu discurso. Também nessa parte são

feitas considerações a respeito da gestão social.

Na Unidade de Curitiba da Bosch foram realizadas, ao todo, 15 entrevistas,

com 7 diferentes entrevistados, totalizando mais de 10 horas de gravações, além de

um sem número de e-mails e telefonemas para revisão e confirmação de

determinadas questões. Procurou-se entrevistar os principais atores envolvidos na

condução, coordenação e/ou direção das ações sociais da Bosch, contemplando os

diferentes níveis, da alta direção às funções operacionais. A partir de entrevistas

semi-estruturadas, objetivou-se, não somente verificar a real compreensão por parte

destes atores dos temas da responsabilidade social e do marketing social, como

principalmente identificar as implicações dessas diferentes visões, seus

envolvimentos com tais práticas e as bases motivadoras para tais ações.

No caso da Unidade de Curitiba da Bosch, a estruturação das atividades que

envolvem a prática da responsabilidade social está centralizada no Departamento de

Recursos Humanos, incluindo a comunicação e o marketing social. Sendo assim, a

escolha dos entrevistados, deu-se com base nas informações iniciais obtidas junto a

Page 98: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

88

este departamento. Na apresentação de suas diferentes avaliações, concepções e

comentários, estes entrevistados foram divididos em três níveis em função dos

cargos exercidos dentro da empresa. Tal subdivisão objetiva também a

uniformização dos dados obtidos nos dois diferentes estudos de caso. Assim sendo,

atribuiu-se as seguintes denominações: 10 nível - representado pelos diretores; 20

nível - representado pelas chefias elou gerências; 30 nível - representado pelos

auxiliares administrativos e assistentes responsáveis pela operacionalização das

práticas sociais. Embora separados em diferentes níveis, os autores das citações

que aparecem nesse estudo de caso não foram diretamente identificados. Tal

medida visa preservá-los de eventuais críticas particulares, bem como objetiva

garantir maior transparência e imparcialidade, tanto da parte dos entrevistados,

como também por parte do pesquisador.

Edson Chiari Grotloli

José Antônio Fares

Juvenal Correia Filho

Rosana Cargnin

Fernanda Vieira Rocha dos Santos

Elisabete Grande Friebe

Jorge Ornar França

Diretor Administrativo

Gerente de Recursos Humanos e

Relações Institucionais1

Chefe de Seção do Núcleo de

Qualidade de Vida

Jornalista Responsável

Assistente Social

Presidente do Conseho de Voluntários

Distribuidora de Serviços

administrador de empresas

psicólogo

psicólogo

jornalista! marketing

serviço social

3° grau incompl. processamento de

dados

Vice-presidente do 20 grau Conselho de Voluntários técnico em mecânica

Oficial em Máquinas CNC

27 anos

20 anos

20 anos

2 anos e 9 meses

3 anos

8 anos e meio

13 anos

1 Atualmente, o Sr. José Fares também acumula o cargo de Diretor de Assuntos Corporativos da Bosch do Brasil.

Tabela 1 - Entrevistas Bosch

Page 99: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

89

5.1 A EMPRESA

A Robert Bosch Ltda. é uma empresa multinacional que iniciou suas

atividades em 1886, em Stuttgart, Alemanha57. Hoje presente em 145 países, ela

conta com mais de 200.000 funcionários em suas diversas unidades espalhadas por

todo o mundo. Basicamente, a Bosch é uma indústria produtora de componentes e

equipamentos elétricos e eletrônicos para veículos, som automotivo, ferramentas

elétricas, equipamentos hidráulicos e pneumáticos para a indústria, setor de

telecomunicações e eletrodomésticos.

No Brasil, a Bosch conta com 5 unidades instaladas. A matriz, localizada em

Campinas (SP), produz ferramentas elétricas e equipamentos de injeção eletrônica

empregando 4.035 pessoas. Há uma outra unidade também localizada em

Campinas (SP) produtora de sistema de freios que emprega outras 780 pessoas.

Outras duas unidades estão instaladas em São Paulo (SP), com 1.013 funcionários

produzindo alternadores e motores de partida e em Aratu (BA), com 574 funcionários

que produz velas de ignição e bobinas.

Em Curitiba, a Robert Bosch instalou-se no biênio de 1975/76. Iniciou suas

atividades de produção numa fábrica provisoriamente instalada na Rua Marechal

Floriano e em 1978 transferiu-se em definitivo para a Cidade Industrial de Curitiba.

Atualmente a unidade de Curitiba, objeto desta análise, produz sistemas de injeção

diesel58. A fábrica reúne 3.150 funcionários e é a maior empregadora da região.

A Robert Bosch é uma empresa de capital fechado de propriedade da

Fundação Robert Bosch, entidade sem fins lucrativos, com sede na Alemanha.

Anexo à fábrica de Curitiba, está o Clube Bosch, que abriga a Associação de

Funcionários Robert Bosch, uma associação corporativa também sem fins lucrativos,

com representações em todas as unidades Bosch do Brasil, tendo sua sede principal

na matriz de Campinas.

57 o dia 15 de novembro de 1886 é considerado como dia oficial de fundação, quando Robert Bosch recebeu a autorização do Controle Industrial para a abertura de uma "Oficina para Mecânica de Precisão e Eletrotécnica". Inicialmente, Robert Bosch contava com um mecânico e um moço de recados, tendo investido 10.000 marcos na abertura da sua empresa.

Page 100: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

90

5.2 O EXERCíCIO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL

As ações de responsabilidade social desenvolvidas pela Unidade de Curitiba

da Robert Bosch podem ser melhor compreendidas a partir de sua evolução

cronológica. Quando da sua instalação no final da década de 70, a Bosch procurou

dirigir suas ações prioritariamente ao seu público interno. Tais ações ou benefícios,

focavam os temas de saúde, meio ambiente, segurança do trabalho e segurança

externa. Até o final da década de 80 porém, esses benefícios constituíam algo

discretamente acima dos oferecidos pelo mercado, basicamente de acordo com o

previsto na legislação brasileira em vigor9. Já nessa época, a empresa desenvolvia

algumas ações de filantropia. Tratavam-se entretanto de ações pontuais a partir de

solicitações da comunidade, uma vez que nunca houve internamente a formalização

de um programa que contemplasse tais ações filantrópicas6o.

Nacionalmente, a primeira ação forte, de maior repercussão e estendida a

comunidade foi desenvolvida pela Associação Robert Bosch da fábrica de

Campinas. Numa parceria com o hospital da cidade, a Associação gerou um

programa de conscientização e combate à AIDS. O Programa resultou na publicação

de um livro e as palestras percorreram as fábricas da Bosch em todo o Brasil.

No início da década de 90, a questão da responsabilidade social externa

ganhou maior dimensão na fábrica de Curitiba, inicialmente com uma preocupação

de caráter ambiental. A partir de uma orientação da direção de Recursos Humanos é

que programas e projetos sociais puderam ser melhor implementados. Em 1992 foi

estruturado pelos funcionários da fábrica de Curitiba o PIMA - Programa Integrado

de Meio Ambiente - especificamente estabelecido para a unidade paranaense.

Inicialmente, o programa procurou levantar os diversos interesses internos em

relação ao meio ambiente. A partir daí a Bosch, em parceria com a Universidade

58 Entre os produtos fabricados na Unidade Curitiba estão: Bomba distribuidora VE, Bomba em linha A e P, Bicos Injetores, Porta-injetores, Válvulas, Elementos, além da Injeção do Common Rail (CRI) e Unit Pump. 59 Segundo informações fornecidas pelo chefe de seção do núcleo de qualidade de vida. 60 Nesse período a diretoria avaliava pedidos isolados oriundos da comunidade, que eram atendidos conforme a disponibilidade de recursos da época. Exemplos foram a solicitação de uma bancada para trabalho de equipamentos de motores à diesel para o Curso de Engenharia Mecânica feita pela UFPR e a solicitação de um equipamento de hemodiálise feita pelo Hospital Evangélico. Especificamente estas duas solicitações foram analisadas e atendidas. Não há registro documental da maioria das ações filantrópicas desse período.

Page 101: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

91

Livre do Meio Ambiente, mobilizou todo o corpo gerencial da fábrica Curitiba que

passou a freqüentar um curso especialmente organizado para esse fim. A Bosch

liberava seus gerentes metade do tempo de trabalho e a outra metade das horas do

curso eram retiradas do tempo livre de cada gerente. A partir daí estabeleceu-se

uma parceria funcionário/empresa na qual os gerentes estavam incumbidos de

transmitir mais tarde os conhecimentos obtidos às suas respectivas equipes.

o PIMA mobilizou e integrou toda a empresa. Gerou internamente nove

grandes grupos de trabalho, cada qual responsável pelo desenvolvimento de um

tema específico como segurança, comunidade, lazer, entre outros. O programa

mereceu a atenção de toda a diretoria e do corpo gerencial, além das autoridades

públicas locais da época. Seu lançamento coincidiu com a realização da ECO-9261.

Muitas mudas de árvores foram plantadas, o chão da fábrica recebeu tratamento

espelhado nas ruas da cidade, houve exibições de coral e da orquestra sinfônica,

entre outras ações. Tal iniciativa foi bastante valorizada. Contudo, externamente,

persistiam ações isoladas de caráter filantrópico e sem continuidade. Os grupos de

trabalho ainda agiam a partir de uma estruturação vertical, dirigindo suas atividades

segundo a orientação de um gerente.

Em 1994 a Bosch desenvolveu o Projeto Bosch Vai à Escola com o objetivo

de melhor integrar a empresa à comunidade através do apadrinhamento de uma

escola e com a intenção de levar aos alunos e suas famílias programas que

pudessem ser trabalhados com o conteúdo curricular de cada disciplina. Na época

optou-se pela Escola Municipal Albert Schwitezer, na Vila Nossa Senhora da Luz,

próxima à fábrica. Tal escolha deveu-se não somente a proximidade mas também

em função desta escola contar com muitos filhos de funcionários da empresa no seu

corpo discente. Durante 1 ano, a Bosch conduziu seu relacionamento com a escola

para decidir realmente pela efetivação da parceria. O primeiro programa

desenvolvido levou profissionais da Bosch para palestras expositivas sobre as

diversas profissões, informando, incentivando e motivando os alunos na escolha de

61 A ECO-92, como ficou conhecida a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, foi realizada no Rio de Janeiro, Brasil, em junho de 1992. Durante o evento, que discutiu as perspectivas e os rumos ambientais do planeta, foi realizada a maior reunião de chefes de estado da história e também o Fórum Global de Organizações Não-Governamentais e Movimentos Sociais. Estimativas apontaram a participação de 22.000 pessoas e 9.000 organizações.

Page 102: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

92

suas atividades futuras. A partir do segundo ano passou-se à elaboração conjunta

(funcionários da Bosch, diretores e professores da escola) de um cronograma com o

objetivo de se trabalhar campanhas educativas relacionadas aos conteúdos

disciplinares. Dentro deste projeto, através do setor de medicina do trabalho da

empresa, a Bosch criou a Brigada de Primeiros Socorros, formada por alunos de 6 •

série que recebem treinamento para realizar o primeiro atendimento em caso de

acidentes leves62. Ainda na Escola Albert Schwitezer foram desenvolvidas

campanhas de proteção ao meio ambiente, de prevenção e combate às drogas, de

informação à respeito de doenças sexualmente transmissíveis e AIDS e de

relacionamento entre pais e filhos, todas conduzidas pelos profissionais da Bosch.

Algumas campanhas de nutrição e de reaproveitamento/desperdício de alimentos

também foram desenvolvidas junto a esse público, informando sobre a necessidade

de uma alimentação saudável. Em 2000, uma forte campanha foi realizada pelas

nutricionistas da Bosch para evitar o desperdício da merenda escolar na qual os

alunos conseguiram a alteração de alguns itens do cardápio elaborado pela empresa

tercerizada pela Prefeitura Municipal de Curitiba. Outro trabalho, derivado deste

projeto, foi o curso de trabalhos manuais para os alunos da Albert Schwitezer que,

no período do dia no qual não têm aulas, podem freqüentar a escola para

aprenderem a desenvolver trabalhos capazes de auxiliar no orçamento doméstico.

Os alunos da escola também participam de algumas atividades da Associação dos

Funcionários da Robert Bosch, podendo freqüentar o Clube Bosch nas tardes

recreativas e de aprendizagem ou participando de escolinhas de diversas

modalidades esportivas. A partir do seu segundo ano, o SESI passou a incentivar e

a participar do projeto, divulgando a iniciativa. Tal ação contou com reconhecimento

internacional63. Nos 84 meses de duração, o projeto contou com o envolvimento de

60 professores e beneficiou mais de 1.500 alunos.

Em 1995, procurando estimular a criação e o desenvolvimento interno, foram

catalogados os talentos da empresa nas mais diferentes áreas64. Essa iniciativa

62 Esses alunos recebem treinamento, além de uma maleta de primeiros socorros e equipamentos como maca, ataduras, luvas, entre outros. 63 O projeto foi destaque durante sua apresentação no I Seminário Internacional de Parceria em Educação realizado em Foz do Iguaçu - PR, Brasil, nos dias 14, 15 e 16 de maio de 2001. 64 Os funcionários eram estimulados a demonstrar seus talentos em diversas áreas como música, canto, escultura, pintura, artes cênicas, artes gráficas, entre outras.

Page 103: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

93

gerou a 1 a Mostra Interna de Talentos realizada no Clube Bosch e mais tarde levada

ao SESI. Na comemoração dos 20 anos da Bosch, em 1998, foi organizada uma

grande exposição nas dependências de um dos maiores shoppings da cidade65.

Alguns dos talentos revelados descobriram em seus hobbies novas profissões e,

mais tarde, optaram por desligar-se da empresa para dedicar-se às suas novas

atividades.

No biênio de 1995/96 houve um problema mais grave de produção

envolvendo a fábrica de Curitiba. Chegou-se a questionar se as iniciativas do

departamento de Recursos Humanos desenvolvidas até então não poderiam estar

impactando negativamente na produção. O setor de RH preferiu assim repensar o

modelo praticado. Nesse período foi criado o Conselho de Qualidade do qual

derivaram a programação do 5S66, a obtenção das certificações QS 9000 e QS 9001

e da ISOITS 16949. Também por iniciativa própria, a Unidade Curitiba da Bosch

enxugou e reduziu seus níveis hierárquicos com o objetivo de tornar a empresa mais

horizontal izada.

Em 1996 foi organizado um grande retorno dos funcionários após as férias

coletivas com o objetivo de mobilizar 100% da força de trabalho. Uma pesquisa de

clima interno permitiu uma série de constatações e sugeriu mudanças.

Em 1999 optou-se pelo estímulo ao trabalho voluntário. Novamente, a

empresa reuniu todos os funcionários para ouvi-los à respeito das prioridades que

deveriam ser trabalhadas. Foram apontados os temas criança, educação, meio

ambiente e terceira idade como prioritários. Sendo assim, a evolução de todos os

projetos e ações desenvolvidas pela Bosch culminou com o lançamento do

Programa "Somos Herdeiros de Nossas Ações". Esse programa tem por objetivo

"estimular a consciência e responsabilidade social nos colaboradores e seus

dependentes, desenvolvendo atividades que estimulem o trabalho voluntário e que

65 Estação Plaza Show, localizado no centro de Curitiba. 66 O Programa 5S, consolidou-se no Japão a partir da década de 50. Seu nome provém de palavras que, em japonês, começam com S: sei ri, seiton, seisou, seiketsu e shitsuke. ( ... ) No Brasil, os 5Ss foram interpretados como 'sensos' não só para manter o nome original do programa, mas porque refletem melhor a idéia de profunda mudança comportamental. É preciso 'sentir' a necessidade de fazer. Assim, adotou-se: senso de utilização, para sei ri; senso de ordenação, para seiton; senso de limpeza, para seisou; senso de saúde para seiketsu e senso de autodisciplina, para shitsuke (SILVA, 1994, p. 14).

Page 104: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

94

valorizem a importância da qualidade nas relações profissionais e pessoais." Ao

todo, o programa já envolveu mais de 3.200 pessoas trabalhando em caráter

voluntário. As atividades são desenvolvidas fora do horário de trabalho e sem

nenhuma remuneração. As pessoas são estimuladas a doar seu tempo e talento. No

total, o programa já atendeu a 106 entidades. Entre as atividades desenvolvidas

merecem destaque a coleta de 280 toneladas de lixo reciclável que,

comercializadas, garantiram a compra de 1.000 cobertores e 400 cestas básicas

distribuídas à comunidade carente. Essa comunidade recebeu ainda 89

computadores resultantes de um up grade na fábrica da Bosch. Também a

implantação do programa 5S nas Escolas Municipais merece ser lembrada. Essa

ação, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação de Curitiba, contou com

o envolvimento de 560 voluntários que atuaram em 28 Escolas Municipais, atingindo

18.800 alunos e envolvendo 56.400 pessoas na comunidade.

o Programa "Somos Herdeiros de Nossas Ações" permitiu o surgimento do

Conselho de Voluntários Bosch, bem como do Projeto "Peça por Peça".

o Conselho de Voluntários administra os grupos que implementam as ações

sociais, como o projeto Peça por Peça por exemplo. Já no seu primeiro ano os

Voluntários realizaram uma série de ações como reformas, pinturas e manutenção

em creches e asilos, doações de produtos alimentícios, artigos de vestuário e

medicamentos para mais de 20 entidades, recebendo 2 prêmios externos por suas

ações67. Atualmente são mais de 600 funcionários voluntários que com seus

dependentes totalizam mais de 2.000 pessoas envolvidas no desenvolvimento das

atividades. Segundo o estatuto, a missão dos Voluntários Bosch é "melhorar a

qualidade de vida da comunidade através de ações voluntárias que oportunizem o

seu desenvolvimento sustentável, desenvolvendo no ser humano a consciência de

que somos todos herdeiros de nossas ações. A partir da organização de seu

estatuto e com a intensificação de suas atividades, surgiu em 20/09/2001 a ONG

denominada "Voluntários Bosch - Grupo de Trabalho pela Sustentabilidade do

Terceiro Setor".

67 Prêmio Dignidade Solidária 99 por suas ações junto a comunidade e Prêmio Paraná Ambiental 1999 pela campanha de reciclagem do lixo.

Page 105: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

95

o Projeto Peça por Peça constitui o mais representativo e ambicioso conjunto

de ações sociais até então desenvolvido pela Unidade Curitiba da Bosch, tanto em

relação ao seu planejamento, como em relação a amplitude dos beneficiários

externos e a continuidade das ações a médio e longo prazo. Através da eleição pela

comunidade interna escolheu-se como foco a educação. A opção por este foco

reflete o entendimento por parte da Bosch de que "o desenvolvimento da

comunidade define-se como um processo educativo em função da organização

social da população comunitária para enfrentamento dos seus interesses e

preocupações, com a conseqüente ampliação das suas condições de cidadania".

Escolheu-se o bairro vizinho da Vila Verde68 para tais ações. O projeto divide-se em

sete sub-projetos69, todos coordenados pelo Conselho de Voluntários, que tem nos

alunos das duas escolas municipais de 10 grau e da escola estadual de 20 grau da

vila seus principais agentes de transformação, cada qual contando ainda com

parcerias externas. Todos os sub-projetos possuem uma pesquisa inicial e um

acompanhamento rigoroso que permitirá a medição de seus resultados. No rol de

parceiros externos encontram-se órgãos públicos, representantes da sociedade civil

e empresas privadas.7o Entre os resultados de maior destaque estão, além da

melhoria do visual das vias públicas da Vila Verde, a alteração nos índices de saúde

e violência, o surgimento (e consolidação) da Cooperativa de Panificação e da

recém-formada Cooperativa de Costureiras. A Cooperativa de Pães reúne senhoras

moradoras da vila, antes sem ocupação, que receberam treinamento e

equipamentos fornecidos pelo Conselho de Voluntários. Hoje, ela comercializa seu

produto por toda a região fornecendo diariamente mais de 1.000 unidades de pães

somente para a fábrica da Bosch.

68 A Vila Verde surgiu decorrente de processos de invasão numa área vizinha à fábrica da Bosch de Curitiba. Hoje conta com uma população carente de 11.896 habitantes vivendo em situação precária. Destes, 3.467 são crianças de O a 14 anos, de acordo com dados da Unidade de Saúde da Vila Verde. . 69 Os sub-projetos são: Projeto Educação pelo Ensino, Projeto Educação pelo Esporte, Projeto Educação pela Proteção ao Meio Ambiente, Projeto Educação pela Comunicação, Projeto Educação Pcela Saúde, Projeto Educação pela Cultura e Projeto Educação para Geração de Renda. o Entre as parcerias já consolidadas encontram-se: Secretaria Municipal de Educação, Secretaria

Municipal de Saúde, Fundação Cultural de Curitiba, SESI, SENAI, SENAC, SEBRAE, estudantes de Administração (FAE) , de Pedagogia, de Educação Física (Tuiuti), de Jornalismo (UFPR) e de Belas Artes, Ziraldo, Maurício de Souza, Irmãos Quierolo, Marcos Curitibinha, Rexona, Centro de Ginástica Olímpica de Curitiba, Orquestra Sinfônica de Curitiba, diversos cursos pré-vestibular de Curitiba, escolas de informática e academias de dança, entre outros.

Page 106: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

96

Atualmente, a responsabilidade social interna é exercida primeiramente a

partir do cumprimento das responsabilidades previstas em lei. Além disso, todos os

funcionários e seus dependentes possuem planos de assistência médica e

odontológica gratuitos. Através do programa Supletivo, a Bosch já formou 1.200

funcionários em 10 e 20 graus. A empresa dispõe de uma ampla biblioteca, de livre

acesso a todos os funcionários, com acervo de livros, fitas de vídeo e material de

apoio do supletivo e pós-médio. A Subvenção Escolar faz com que a empresa

forneça um adiantamento para auxiliar nas despesas escolares, que tem variação de

acordo com a média das notas. O Programa de Idiomas garante auxílio de até 40%

dos custos nos cursos de inglês e alemão. Também há o Programa de Auxílio à

Educação de Crianças Especiais que contribui com 50% das despesas em escolas

especiais e com o transporte especial de dependentes de funcionários.

Ao final de cada ano, a Bosch distribui cestas de Natal e material escolar para

todos os funcionários e seus dependentes. Além disso, o PLR (Participação nos

Lucros e Resultados) estende-se a todos os funcionários, quando são alcançadas as

metas e resultados estabelecidos. O pagamento deste benefício é feito em duas

etapas - um adiantamento e uma complementação.

Alguns setores da fábrica fazem diariamente a ginástica laboral, que de

maneira preventiva procura atuar na redução de índices de doenças de trabalho. A

Bosch, através do Programa Clic, incentiva as manifestações de sugestões de

funcionários, recompensando com dinheiro e prêmios as idéias aprovadas. Dentro

desse programa ainda, todos os funcionários que fazem sugestões recebem um

cartão numerado, o Loto Clic, para concorrer no final do ano ao sorteio de carros e

outros prêmios, como televisores e videocassetes.

Através do Programa Menores Aprendizes Administrativos, em parceria com a

Guarda Mirim de Curitiba, a Bosch preenche seu quadro de funcionários contratando

30 menores carentes, entre 16 e 18 anos, cursando no mínimo a 4a série primária.

Os menores recebem ensino profissionalizante e têm seus direitos trabalhistas

assegurados. Ao final, muitos dos meninos são contratados.

Ao lado da fábrica, localiza-se o Clube Bosch, ligado a Associação de

Funcionários Robert Bosch, com salão, quadras esportivas e churrasqueiras, que

Page 107: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

97

proporciona diversas atividades esportivas como futebol, ginástica, aulas de

capoeira, condicionamento físico, taekwondo e caminhadas ecológicas aos seus

freqüentadores. A Associação ainda organiza colônias de férias, bailes, festas e

demais eventos. Desde 1984 a empresa realiza no Clube Bosch cursos de

desenvolvimento de habilidades manuais para esposas e filhas de funcionários71.

Também numa parceria com a Secretaria Municipal de Abastecimento, através do

Programa Roça no Clube, a Bosch fornece frutas e verduras para seus funcionários

com preços abaixo dos praticados pelo mercado. Há 8 anos existe o Grupo de

Teatro que organiza peças com cenas do cotidiano da empresa.

A preocupação com o meio ambiente também é evidente. A empresa mantém

na entrada da fábrica latões para o recolhimento de lixo perigoso72, incentivando

seus funcionários a essa prática de seleção dos resíduos. A Bosch trata a água

utilizada dentro da fábrica e a devolve limpa ao meio ambiente. Atualmente, a Bosch

fornece diariamente a alimentação da Creche Sol do Amanhã e desenvolve, em

sistema de parceria, o Programa de Treinamento para Aprendizes do SENAI, no

qual menores passam meio período na empresa e meio período no SENAI

recebendo treinamento e informações para seu desenvolvimento técnico e

comportamental.

5.3 A PRÁTICA DO MARKETING SOCIAL

Não existe um setor responsável pelo atendimento do marketing social na

Unidade de Curitiba da Bosch. Como a estruturação das atividades, programas e

projetos envolvendo ações sociais está a cargo do Departamento de Recursos

Humanos, esse setor acaba acumulando tal função.

A área de comunicação da Unidade de Curitiba - subordinada ao setor de RH

- está a cargo de uma jornalista trabalhando nesse departamento, contando com a

ajuda de uma estagiária. Há ainda o suporte de uma pequena agência local73 de

co~unicação externa, que é acionada esporadicamente, em determinados assuntos

71 São oferecidos cursos como corte e costura, tricô, crochê, bordado, pintura em tecido, produção de chinelos, produção de sachês, entre outros. 72 O lixo perigoso inclui lâmpadas, baterias, remédios com prazo de validade vencidos, tintas, solventes e demais substâncias com maior poder de contaminação.

Page 108: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

98

de maior complexidade. Quando trata-se de assuntos corporativos porém nada é

feito por Curitiba. Matérias na imprensa referentes à corporação Bosch são

disponibilizadas pela assessoria de imprensa de Campinas. Anúncios e publicações

em jornais, revistas, rádio e TV também são feitos somente pela matriz, não sendo

autorizadas iniciativas locais.

A comunicação interna com os funcionários se dá primeiramente através do

Regulamento Interno e do Manual de Integração, que todos recebem quando da sua

admissão na empresa. O Regulamento Interno, válido para todas as unidades Bosch

do Brasil, é elaborado em Campinas. Já o Manual de Integração, por tratar de

assuntos locais é elaborado em Curitiba, com o auxílio da agência externa. A

agência também participa da elaboração das informações disponibilizadas no dia a

dia dos funcionários através dos murais, da intranet e do Bosch Informa, um

informativo mensal distribuído a todos na empresa. A criação dos materiais e a

divulgação dos projetos internos tem a apreciação da diretoria. Mesmo na

assessoria de imprensa a diretoria é muito consultada, tanto na parte técnica como

na administrativa.

Como a Unidade de Curitiba é a mais avançada no trabalho voluntário e na

implantação de programas sociais, os materiais internos74, de estímulo e motivação

para a participação nos projetos sociais, são desenvolvidos com maior liberdade,

contando novamente com a participação da agência local. Estes materiais são

aprovados pela gerência de RH. Tratam-se ainda de materiais exclusivamente de

uso interno.

Apesar da inexistência de um setor formalizado, a empresa pratica o

marketing social ainda que de uma maneira não organizada para este fim. A Bosch -

Unidade de Curitiba - consegue irradiar e disseminar sua prática social. Tanto o

gerente de Recursos Humanos, como também outros colaboradores em menor grau,

participam ativamente de eventos como debates, palestras e encontros referentes ao

tema da responsabilidade social, divulgando as ações da Bosch. Também parcerias

com universidades e faculdades têm sido intensificadas com esse fim.

73 DMS Grupo de Comunicação. 74 Convites, banners, frontlights na área da fábrica, faixas, cartazes, camisetas, entre outros.

Page 109: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

99

Por suas ações sociais a Bosch - Unidade de Curitiba já recebeu os

seguintes selos e premiações: Selo Abrinq - Empresa Amiga da Criança, Prêmio

Paraná Ambiental 1999, Prêmio Dignidade Solidária - Empresa Socialmente

Responsável 1999, Prêmio Destaque em Cidadania 2000 da ABRH, Título da

Amigos da APAE 2000, Prêmio SESI de Qualidade de Vida e Produtividade 2000

(fase municipal), Menção Honrosa do Instituto Pró-Cidadania, Selo Empresa

Socialmente Responsável 2000 da ACP, Selo Empresa Socialmente Responsável

2001 da ACP, Prêmio Dignidade Solidária - Empresa Socialmente Responsável

2000 na área de Educação.

Externamente a Bosch não utiliza regularmente a mídia de massa para a

divulgação de suas ações sociais. Toda ação publicitária, como já vimos, está

concentrada na sua matriz em Campinas. Campinas conta com um departamento de

marketing que, entretanto, não trata das questões sociais.

A empresa, porém, já percebeu a importância da divulgação de suas ações.

Sistematicamente, a Unidade de Curitiba da Bosch realiza encontros com seus

fornecedores, colocando na pauta questões que envolvem qualidade e cidadania

corporativa, exigindo não somente excelência técnica de seus parceiros como

também ética e responsabilidade social perante suas comunidades internas e

externas. Em 2001, com a apresentação de alguns excelentes resultados

conquistados no campo das ações sociais, o gerente de Recursos Humanos e

Relações Institucionais da fábrica de Curitiba, Sr. José Antônio Fares, passou a

acumular o cargo de diretor de Assuntos Corporativos da Bosch no Brasil, com o

objetivo de estender a experiência paranaense às outras unidades nacionais. Assim,

o Programa "Somos Herdeiros de Nossas Ações" passou a ser corporativo. Também

no final de 2001, foi contratada uma agência paulista75 com o objetivo de

desenvolver a comunicação externa das ações sociais, agregando-as à imagem

corporativa. A partir dessa contratação, em dezembro, num caderno especial da

Gazeta Mercantil, foi publicado o primeiro anúncio corporativo enfocando a prática

social. O título trazia a seguinte sentença: "Robert Valorizar o Ser Humano e

Preservar o Ambiente Bosch. Essa é a nossa razão social."

75 M51.

Page 110: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

100

Na Unidade de Curitiba, a partir da transformação do Grupo de Voluntários

em ONG, no final de 2001, os voluntários instalaram uma loja que comercializa

produtos junto aos públicos interno e externo. Os objetos comercializados, tais como

canecas, canetas, blocos, faqueiros, chaveiros, camisetas, entre outros, destacam o

nome do Conselho de Voluntários e foram obtidos mediante a parceria com

fornecedores de brindes que atendem a Bosch. A verba arrecadada reverte para o

Conselho de Voluntários que a utiliza de acordo com as necessidades das ações

sociais propostas.

Por fim, vale ressaltar que, embora bem aceito pela comunidade interna,

apenas 600 funcionários participam ativamente das atividades do Grupo Voluntários

Bosch. Este número representa apenas 19% de todo o pessoal da Unidade de

Curitiba da empresa. Também, por razões específicas, a Bosch não organiza (e não

publica) seu balanço social76. A partir do final de 2002, conforme previsto no seu

estatuto, a ONG do Grupo de Voluntários estará obrigada a publicar um balanço

social, segundo o modelo do Ibase.

5.4 A VISÃO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL

A visão e a missão da empresa não estão claramente especificadas na

concepção da Bosch. Em lugar delas existe a chamada política da qualidade,

revelada no Manual de Integração e reproduzida a seguir:

"A Bosch - Fábrica de Curitiba - assume o compromisso de praticar, em todos os níveis da empresa e por todos os colaboradores, os seguintes princípios:

- atender às solicitações dos clientes;

- atingir as metas de qualidade, melhorando continuamente;

- estimular o treinamento e desenvolvimento."

A compreensão da responsabilidade social por parte dos diferentes atores

que conduzem as ações sociais da empresa, em parte, decorre da visão de seu

fundador, Sr. Robert Bosch, expressa nas "Regras de Robert Bosch para a

76 Por se tratar de uma empresa de capital fechado, ligada a uma fundação mundial, a empresa não é obrigada a publicar balanços financeiros ao final de seus exercícios fiscais. Assim sendo, sua direção optou também pela não realização de balanços sociais, que poderiam gerar questionamentos indevidos sobre a inexistência de balanços financeiros.

Page 111: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

101

Administração Patrimonial Bosch", publicadas em 19 de julho de 1935: "Meu objetivo

é, além do alívio de necessidade, atuar, acima de tudo, na elevação das forças

morais, sanitárias e mentais. ( ... ) Serão promovidas: saúde, educação, formação,

promoção de talentos, reconciliação dos povos e tais ... "

No livro contendo o histórico da empresa - em material interno da Bosch -

especificamente no capítulo dedicado à memória de Robert Bosch, podem ser

encontradas algumas citações do fundador da companhia que sinalizam para o

conjunto de impressões resgatados na empresa:

"Fui criado democraticamente. Trabalhei como mecânico e cresci sob o povo. O movimento socialista que poderosamente e energicamente começou nos anos 70 do século passado, me atraiu muito. A municipalidade tendo medo do socialismo com sua postura divisória, era cada vez mais incapaz de entender o que seria justo no socialismo, que criou a lei socialista. Em vez de criar válvulas de segurança social, ela fechou as aberturas que apareceram inevitavelmente que poderiam deixar de ter escapado à fumaça perigosa.· (Robert Bosch)

"Introduzi já cedo - no ano de 1906 - o horário de trabalho de 8 horas por que eu considerei mais econômico e mais suportável para conservação da mão-de-obra humana77

: (Robert Bosch)

Essa visão formou a cultura Bosch amplamente disseminada nas diversas

unidades instaladas da corporação nos diferentes países. Tal orientação, reforçada

pelas práticas da Bosch, contribui para que haja uma perspectiva comum ou uma

ótica quase consensual a respeito da responsabilidade social da empresa.

5.4.1 A VISÃO DO 10 NíVEL

Na visão da alta administração, a responsabilidade social de uma empresa

está alicerçada pelo seu envolvimento responsável e ético com as comunidades

internas e externas, indo desde suas responsabilidades econômicas até suas

dimensões mais amplas (filantrópicas ou discricionárias). Dentro desta perspectiva,

as ações sociais precisam contemplar as características de auto-sustentação e

contribuir para mudanças na sociedade.

"Responsabilidade social de uma empresa é a realização completa do papel para o qual a entidade existe, ou seja, a realização do objetivo econômico para o qual ela é criada através

77 Na Alemanha, o horário de trabalho de oito horas diárias foi consolidado somente em 1919, na Constituição de Weimar.

Page 112: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

102

de produtos e serviços que contribuam para a solução de problemas/necessidades da sociedade, realizando essa atividade de forma a contribuir com a sociedade sob sua influência (público interno e externo)."

Também a crescente relevância dada à responsabilidade social nos meios

acadêmicos e empresariais é observada, bem como a necessidade de se adequar o

discurso à prática. Na verdade, a responsabilidade social é vista aqui como algo

essencial na concepção de uma empresa, porém mais valorizada nos dias de hoje a

partir do agravamento das distorções e disparidades sociais que determinam a

necessidade de um maior envolvimento da organização com as comunidades

próximas. O caráter assistencialista ou puramente filantrópico cede seu espaço para

uma visão de longo prazo, de caráter educacional, envolvendo a formação de

cidadãos.

"Eu compreendo [referindo-se à responsabilidade social] como um papel que antes era um papel secundário mas sempre foi um papel da empresa a sua acão externa. ( ... ) Hoje isso toma uma forma mais básica, é uma necessidade premente que as empresas têm de dar a sua contribuição social para a comunidade onde elas estão. Isso não é demagógico, isso é uma necessidade do mercado, uma necessidade que se impõe às empresas. Ao fazer isso, as empresas devem tentar se organizar para que não fique uma coisa muito assistencial, muito curto prazo, que ela não entenda que faz responsabilidade social fazendo pequenas doações, pequenos projetos, sem focar numa linha de médio e longo prazo. Eu entendo que responsabilidade social da empresa portanto, é ela ensinar a comunidade a evoluir, é dar autonomia para essa comunidade. Assim, as ações de responsabilidade social devem gerar desenvolvimento sustentável. Isso é responsabilidade social. A partir do momento que as empresas ajudam a ensinar a comunidade a crescer. Qualquer outra coisa, qualquer outro foco de ação, ou pode ser uma estratégia para se chegar a esse fim, ou é simplesmente uma visão assistencialista - que hoje há muitas dúvidas se isso é pior ou melhor de ser feito."

Com relação ao exercício da responsabilidade social pela empresa, a alta

direção acredita que no caso da Bosch, isso se dá a partir de uma produção

adequada e de uma valorização do elemento humano.

"Acredito que a Bosch exerce sua responsabilidade social baseada em três elementos principais. Primeiro, por oferecer produtos/servicos que buscam solucionar demandas da sociedade com conteúdo tecnológico adequado ao meio ambiente (consumo energia, consumo de combustível, poluição ambiental, nível de ruídos dos veículos, etc.). Segundo, por realizar isso de forma a respeitar as regras de boa conduta profissional e de negócios. Terceiro, por propiciar nesse processo o crescimento profissional. pessoal e social de seus colaboradores, assim como levando à comunidade externa os benefícios de seu conhecimento e poder econômico. Na prática significa: programas de treinamento e desenvolvimento, ações de benemerência (quando adequadas), incentivo ao trabalho voluntário, etc."

Page 113: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

103

A alta direção reconhece que uma vocação socialmente responsável decorre

da postura de seu fundador como valor incorporado à empresa.

"A Bosch, ela começou a fazer esse trabalho, na verdade ela faz esse trabalho há muitos anos, por que seu fundador Robert Bosch era uma pessoa voltada para a questão social. Evidentemente em outros níveis, ou de outras formas, porque em países que evoluíram mais rapidamente que o nosso, a ação social ela é concentrada de outra maneira. De qualquer maneira ele sempre manifestou-se favorável ao exercício dessa ação externa. Então isso é um valor incorporado na Bosch.

Também a evolução do conceito e da aceitação da responsabilidade social,

tanto interna como externamente, fica evidenciada com a constatação de que as

ações da empresa alteraram seus rumos nos últimos anos. A mudança de caráter

assistencialista para projetos de auto-sustentação ratifica o comprometimento de

longo prazo ressaltando a importância da existência de um foco e da aferição de

resultados.

Aqui em Curitiba, nós começamos um grande projeto em 94, no sentido de estimular nossos funcionários a trabalharem como o voluntários, a desenvolverem ações de maior efetividade. Não fomos bem sucedidos. Os funcionários não entenderam, nem a própria comunidade entendeu bem o que a empresa tinha a ver com isso. Então foi muito interessante esse processo. O que hoje é uma necessidade, há oito anos atrás era uma coisa estranha, mal compreendida. (OI') Então o que aconteceu: nós não conseguimos levar esse projeto para a frente. Nós criamos uma estrutura e acabamos desenvolvendo ações mais assistencialistas, trabalhando em creches, asilos. Então nós tivemos uma etapa com uma ação social bem básica, bem assistencial. A partir de 99, nós resolvemos mudar esse conceito, tentar já incorporar essa natureza da responsabilidade social, que se refere a fazer uma influência de maior impacto na sociedade. Havia portanto um ambiente favorável tanto externo quanto interno. Esse tema já estava bem assimilado pela sociedade. Então nós começamos a fazer um trabalho um pouco mais elaborado. Hoje, nós estamos num estágio que eu posso dizer que a Bosch pratica a sua responsabilidade social com um foco efetivo de auto-sustentação. Nós não estamos fazendo mais ações de curto prazo, não queremos mais fazer. Às vezes você faz uma ou outra. Mas, não precisamos mais fazer, não queremos mais fazer isso. Nós queremos que a comunidade tenha autonomia, nós estamos indo para a Vila Verde, mas nós estamos indo para lá para sair de lá. Nosso objetivo é: entrar na Vila Verde para sair de lá o mais rápido possível. Sair de lá o mais rápido possível significa dar condições para que aquele lugar evolua por si. Todas as ações hoje, ou melhor 90% das nossas ações, estão concentradas portanto na Vila Verde. Isso é uma premissa importante das ações sociais, não dá para você dispersar muito, você tem que concentrar mais as ações, fazer projetos, medir projetos, avaliá-los."

5.4.2 A VISÃO DO 2° NíVEL

Nos níveis intermediários percebe-se também que a visão de

responsabilidade social tem um amplo escopo de atuação e que está bastante

caracterizada pelo desenvolvimento sustentável. O esforço conjunto entre sociedade

Page 114: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

104

civil, governo e empresas também é reconhecido como um instrumento legítimo para

que as ações sejam desenvolvidas.

"Eu entendo que a responsabilidade social de uma empresa é bem abrangente. Não fica apenas na questão da preocupação com o resultado do seu produto ou o que ele vai trazer em termos de conforto para a sociedade. Ela vai além. Ela vai nas acões que a empresa poderá estar implementando. seja com impacto nos órgãos públicos. seja na própria comunidade com ações culturais. ações educativas. e até. numa menor escala. com alguma ação filantrópica. desde que essa ação filantrópica seja o início de uma preparacão para a realização de ações que vão gerar sustentabilidade dessa sociedade ou dessa comunidade. As possibilidades de como estar atuando com a responsabilidade social são bem abrangentes. Tudo aquilo que vá trazer um determinado benefício para a comunidade pode ser visto como responsabilidade social. Desde que seja em conformidade com a atitude ética dessa empresa perante a sociedade, caso contrário não tem nenhuma validade."

Nesse nível também reconhece-se que o movimento da responsabilidade

social está em fase inicial no Paraná, ficando evidente uma preocupação com sua

continuidade. Rechaça-se aqui mais uma vez o caráter puramente filantrópico e

descompromissado.

"( ... ) eu vejo assim esse início do movimento pela responsabilidade social: hoje, eu acho que as empresas estão ainda bem devagar, principalmente aqui no Paraná. São ainda empresas com ações pontuais, somente empresas grandes. A gente vê que em São Paulo e Rio tudo isso é muito mais divulgado e trabalhado. Então aqui a gente ainda tem algumas restrições na questão de abrir um pouco mais o balanço da empresa. na questão de doação mesmo. As empresas muitas vezes doam mas não querem nem saber para onde foi o dinheiro. Nisso tem que haver mais responsabilidade."

Reconhece-se a prática da responsabilidade social a partir da compreensão

dos anseios internos, do incentivo à educação, da atuação junto à comunidade

objetivando melhorias na sociedade e na valorização do trabalho voluntário.

"A Unidade Curitiba da Bosch vem exercendo [sua responsabilidade social] de uma forma bem abrangente. Vem buscando junto à comunidade a forma de sempre estar realizando essa responsabilidade social, observando e entendo as informações que a comunidade vai emitindo. Mas não só a comunidade externa, principalmente a comunidade interna, os colaboradores, o que eles vem trazendo, tem sido muito bem utilizado pela Bosch. Então, pode se chamar de uma parceria. Essa forma que a Bosch acaba traduzindo os anseios internos em relação as ações externas. ela tem capitalizado de uma maneira que tem feito um somatório positivo. que aparece principalmente no trabalho voluntário. Só que não fica só aí o trabalho que a Bosch vem fazendo. Ela vem fazendo um esforço muito grande na área da educação junto principalmente a grande maioria das faculdades e universidades aqui do Paraná. Isso complementa bastante a participação. Outra coisa é o favorecimento dos seus quadros gerenciais e mais especializados, que passam a ter a facilidade de estarem organizando grupos informais, que é uma outra forma também de estarem contribuindo com seu know-how interno para a melhoria da sociedade."

Page 115: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

105

A questão de planejamento e mensuração é destacada como essencial para a

efetividade do exercício da responsabilidade social. Também a utilização de

programas próprios, concebidos internamente, é valorizada.

"Eu acho que a Bosch está exercendo hoje, em Curitiba, sua responsabilidade social com muita clareza. Trata-se de um projeto que teve um início e que tem todo um planejamento para ter um resultado. Isso está sendo muito estudado. Não é uma coisa do tipo vamos fazer e ver no que vai dar. Esse projeto 'Peça por Peça', no qual trabalhamos a responsabilidade social, que na minha opinião é o que melhor caracteriza a nossa responsabilidade social, tem um foco: a educacão. E dentro desse foco a gente tem todo um planejamento. as acões são sempre muito bem planejadas. a gente quer trabalhar com indicadores. a gente vai trabalhar com metas. Então, eu acho que o projeto da Bosch vem com bastante cautela e ele vai se desenvolvendo a partir das ações. Cada intervenção é estudada, repensada se necessário. E um diferencial grande que eu vejo na Bosch, que eu sempre coloco, é essa coisa do investimento das empresas. A Bosch. ao contrário de outras, está disponibilizando cada vez mais seus colaboradores a trabalhar nesse projeto. Isso faz com que ele fique muito mais amarrado. As pessoas ficam mais comprometidas com o trabalho. Não é externo, como quando vem uma consultoria e vende um produto. Aí o público interno nem sabe o que está acontecendo, o setor de Recursos Humanos não está nem aí com isso. Aqui não. Tem um setor da empresa que está trabalhando especificamente com isso. E todas essas ações são vistas por todos que estão aqui dentro. Isso torna a coisa mais forte, isso é um diferencial importante que está fortalecendo ainda mais o trabalho."

Na parte responsável pela comunicação da empresa, a responsabilidade

social é vista como um conjunto de ações que precisa gerar ganhos para todos os

sfakeholders, aliando aqui responsabilidade com melhores resultados comerciais e

pela primeira vez, com ganhos de imagem.

"A responsabilidade social de uma empresa é a forma como ela busca o sucesso e a sustentação de seu negócio. São atitudes que exigem o mínimo de comprometimento e cumplicidade com as aspirações da sociedade, dos funcionários, dos clientes e dos acionistas. São atitudes que despertam a admiração do mercado. o respeito da sociedade. São os melhores resultados que um negócio pode esperar para si próprio."

A visão do setor de comunicação em relação ao exercício da

responsabilidade social da Bosch sintetiza os principais elementos presentes nas

afirmações expostas anteriormente:

"A Bosch Curitiba sempre, desde a sua fundação, realiza atividades sociais, tanto as voltadas para seus funcionários, quanto as voltadas à comunidade. Antes de 1999, as ações desenvolvidas tinham mais um cunho filantrópico e assistencialista, não se pensava no desenvolvimento sustentável e na educação continuada. A partir de 99, com o programa 'Somos Herdeiros de Nossas Ações', com os funcionários envolvidos, conseguimos modificar o pensamento dos funcionários e a Bosch aprendeu que o desenvolvimento e a auto­sustentação através da educacão é um bom modelo de responsabilidade social."

Page 116: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

106

5.4.3 A VISÃO DO 3° NíVEL

Nos níveis operacionais78, a visão de responsabilidade social também

ultrapassa os limites da empresa estendendo-se à comunidade.

"Responsabilidade social de uma empresa eu entendo que são empresas que colaboram com creches, orfanatos, ajudam, como o nosso caso, em trabalhos de auto-sustentação para instituições. Também ajudam na conservação da Mata Atlântica, de rios ... Tudo isso aí constitui a responsabilidade social de uma empresa."

Quanto ao exercício da responsabilidade social por parte da Bosch,

especificamente valoriza-se a responsabilidade social externa.

"A Bosch vem exercendo sua responsabilidade social através de ações como as da Vila Verde onde trabalhamos com escolas, fazendo exames médicos em crianças que nunca fizeram algum exame, ajudando ou simplesmente dando idéias de como melhorar as instituições, entre outros. Basicamente trabalhando em cima de crianças, pois o forte é trabalhar sobre as crianças, porque elas são o futuro. Lógico que temos que ajudar também o adulto, mas os investimentos maiores devem ser sobre as crianças."

o pleno exercício da responsabilidade social externa só pode ser feito

mediante respaldo da empresa.

"Na minha opinião ela vem exercendo a sua responsabilidade através do projeto 'Peça por Peça' e de mais alguns outros projetos que a gente vem fazendo dentro da empresa junto com os colaboradores. São os fallyes de ações sociais ou outros fallyes específicos de competição que temos como as coletas de alimentos, a arrecadacão de roupas, enfim tudo o que a gente faz e que a Bosch dá suporte. Para mim, é dessa maneira que ela está exercendo a sua responsabilidade social."

5.5 A VISÃO DE MARKETING SOCIAL

A visão destinada ao marketing social - contrariamente a um conjunto quase

consensual referente a responsabilidade social - é bastante diversificada, não

somente entre os diferentes níveis, como entre as pessoas componentes de um

mesmo nível, o que revela variadas compreensões pessoais do termo. Tais

posicionamentos podem decorrer das diferentes formações e vivências dos

entrevistados, mas também constituem um reflexo dos escassos, variados e até

mesmo contraditórios tratamentos destinados ao termo por parte da literatura e da

comunidade empresarial.

Page 117: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

107

5.5.1 A VISÃO DO 10 NíVEL

A alta administração aborda o tema de maneira cuidadosa acreditando que o

marketing social é pouco utilizado pela Bosch. Nesta perspectiva, o marketing social

não está conjugado a alguma estratégia do negócio.

"A empresa tem por cultura uma atitude de pouca exposição na mídia (Iow-profile) , portanto, não faz o marketing social como instrumento de negócios. Normalmente a empresa busca veicular suas ações com o objetivo de torná-Ias referência externa (empresa boa para se trabalhar, exemplo para fornecedores, etc.) bem como exemplo interno para os colaboradores (construção do sentimento de orgulho interno, motivação, clima, etc.)."

Na visão da alta direção, o marketing social é compreendido como uma

estratégia de marketing interessada basicamente na construção ou em ganhos de

imagem. Reconhece-se a inexistência da implementação de uma estratégia de

marketing para fins sociais.

"Eu não entendo que nós pratiquemos o marketing social como estratégia do negócio da empresa. Nós temos ações pontuais, ações isoladas, de alguma área que organiza esse assunto dentro da organização e que, percebendo algumas oportunidades, tenta aproveitá­las. Mas não é uma estratégia da empresa a atuação do marketing social. Ela não tem essa estratégia implementada."

Reconhece-se aqui que, para que os programas e projetos ganhem maior

dimensão e notoriedade, é preciso que se opte por uma política de comunicação

adequada.

"Falta a empresa decidir divulgar suas ações e sua postura já existentes. Quando essa opção for feita talvez os resultados sejam ainda maiores, mais expressivos... Mas teria que ter alguém, um grupo com essa incumbência .. ."

Tal reconhecimento sugere perspectivas para a evolução do marketing social

como instrumento de divulgação das ações sociais desenvolvidas pela empresa.

78

"Hoje aqui em Curitiba nós temos uma aceitação, um conhecimento, uma visibilidade importante, acredito, no cenário empresarial da região. Somos reconhecidos como uma empresa focada no social. que detém uma política de recursos humanos diferenciada. Isso é o que a gente ouve. Internamente, nós podemos dizer que esse tema trouxe uma relação de trabalho mais consistente, as pessoas se respeitam mais, dificilmente nós temos algum clima de mobilização, acontecimentos inesperados. Temos problemas, mas a essência da relação

Nas entrevistas foram ouvidas pessoas do nível operacional que, no entanto, coordenam e participam da prática de ações sociais, na administração das atividades do Conselho de Voluntários.

Page 118: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

108

permanece, as pessoas se respeitam. Eu acho que a empresa deveria ter como uma perna na sua estratégia saber ganhar mais com isso. Hoje ela tem tudo isso sem investir em nada. Se ela fizesse um pequeno investimento. de alguma maneira. em alguma ação de marketing social, como forma de considerar ou colocar essas atividades. enfatizando mais o que acontece. acredito que os resultados seriam muito melhores. Se ela estiver estruturada também para esse fim ela consegue ter um grande retorno de imagem. Se ela fizesse um pequeno investimento acredito que esse retorno seria fantástico."

Juntamente com a preocupação por uma maior divulgação, a busca por uma

mensuração dos resultados das ações sociais é destacada, sinalizando para a

necessidade de estruturação de um modelo de marketing social. Essa visão salienta

a importância dos temas da responsabilidade social e do marketing social serem

tratados como prioritários na agenda dos principais dirigentes.

"Quando você não mensura uma coisa dentro de uma empresa você sempre tem a sensação de estar fazendo mais do que deve. Tem muita gente que atua na área social que não quer medir porque se fizer isso a empresa não libera mais nenhum recurso. Quando na verdade deveria ser o contrário. Deveria ser medido para a empresa ver o quanto isso é barato. O custo disso é pequeno comparado ao efeito. Então um ponto fraco ainda é essa postura. essa visão secundária que o empresário tem desse tema. A falta de mensuração é questionada por todos. Qualquer coisa que você faz na sua vida e que você não mensura, fica inconsistente. Em algum momento alguém vai questionar. Evidente que a alta direção está mais próxima disso porque ela tem essa meta de resultados. Mas eu tive surpresas muito agradáveis agora com essa minha nova função, ao ouvir o diretor-geral da empresa [referindo-se à matriz de Campinas] liberar por conta dele, algo que eu nem havia pedido, um valor que eu nem havia pedido. Então a gente percebe que há resultados. Quando você deixa a coisa mais consistente, quando você trata a responsabilidade social como um projeto, como um projeto da empresa, ligado a estratégia, o que vamos ganhar, quais as oportunidades e ameaças, pontos fracos e pontos fortes, ela se mantém. Corre-se mais riscos, mas ela se mantém. 6 acão social não pode ser escondida. Ela tem que transparecer. Tem muita gente que trabalha escondida. Não mostra para empresa que está fazendo isso porque eles não vão gostar. Isso é bobagem."

5.5.2 A VISÃO DO 20 NíVEL

Nos níveis intermediários, percebe-se uma postura mais enfática. Nega-se o

marketing social por compreendê-lo unicamente como ações de comunicação

externa (publicidade e propaganda), presentes na mídia de massa. No entanto, a

ética é colocada como base para as ações de responsabilidade social, sendo o

marketing social entendido como uma conseqüência desse processo.

" Eu digo que a fábrica Curitiba não pratica o marketing social. Baseado na seguinte questão: os nossos produtos aqui da fábrica Curitiba, que é uma fábrica de equipamento diesel, bombas injetoras, bicos, elementos, válvulas, e agora o common rai/, são produtos direcionados para as montadoras de veículos diesel, ou montadoras de motores a diesel. Nós temos um grupo pequeno, um repertório pequeno de clientes. 70% estão no exterior. Então,

Page 119: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

109

você não vai ver na nossa mídia propaganda do produto que é fabricado em Curitiba. São propagandas bem especializadas para aquele grupo de pessoas, para aquele grupo de empresas. Assim, nós não teríamos porque ter que fazer alguma coisa apenas para ajudar a vender o nosso produto. Eu digo assim, a fábrica Curitiba realiza as ações de responsabilidade social pelo verdadeiro sentido ético da responsabilidade social das empresas. Se surge algum entendimento, algum trabalho, alguma ação que se caracterize como marketing social. ela é pura conseqüência de uma atitude ética, de uma postura ética da fábrica Curitiba."

Outra percepção, ainda no nível intermediário, embora reconhecendo pouca

compreensão do termo, acredita na necessidade de se estruturar uma política de

marketing social, de se trabalhar o tema tal como um processo, o que revela um

entendimento do termo em seu sentido mais amplo.

"Eu não entendo bem o que seja marketing social. Eu acho assim: a Bosch tem toda a estrutura, o trabalho tem toda uma estrutura, até em marketing também. Só que, eu acho que isso ainda não é desenvolvido da maneira que deveria ser. A gente tem a visibilidade. Existe isso. Mas não da maneira que deveria ter. Esse foco na educação no trabalho ainda não está muito evidente. As próprias pessoas que se beneficiam desse trabalho ainda não tem essa visão adequada. Até mesmo os nossos funcionários. Os que estão mais perto, que são os voluntários, que sabem qual é a nossa missão, quais são nossos objetivos, estes entendem. Mas eu acho que ainda precisa muito, ainda é necessário muito trabalho nessa questão de marketing. Não se trabalha ainda isso como um processo, estou falando do 'Peça por Peça'. Outra coisa é saber efetivamente o que é o marketing social. A gente precisava estar tendo uma definição talvez mais estudada ou elaborada do que é o marketing social. Só assim poderíamos entender um pouco mais e trabalhar o marketing social. Eu, confesso que não sei se faco ou se não faco marketing social no 'Peca por Peca'."

Nesse nível, a compreensão sobre as possibilidades de desenvolvimento de

um programa de marketing social ultrapassam os limites da Unidade de Curitiba.

Também ressalta-se o oportunismo de muitas ações de marketing que determinam

ações sociais.

"Na fábrica Curitiba nós temos recebido, como consequencia das propnas ações, um reconhecimento muito forte da comunidade curitibana. Se fala muito, se procura saber muito a respeito do que a Bosch está fazendo, mesmo com ela não focando a divulgação permanente do que ela está fazendo. Ela não está fazendo isso como marketing social, hoje ela não faz. Acredito que, se, respeitadas as proporcões, a Bosch, não só Curitiba, mas corporativamente quiser ter um impacto mais forte na sociedade brasileira com o que ela faz de responsabilidade social - e eu acho que isso já está sendo desenvolvido pela empresa -será preciso um comprometimento maior da área de marketing da empresa, mas com o verdadeiro entendimento do que é responsabilidade social, dando foco para o social e não para o marketing, usando o marketing apenas como uma ferramenta. O que a gente vê hoje no mercado, nos outros locais é o contrário. Cria-se uma ferramenta de marketing e daí você vai buscar alguma ação social para encaixar ali. O marketing determina a ação. E deve ser o contrário. A ação social, é ela que deve ter a sua estrutura para mostrar o que ela é realmente e a conseqüência vai ser mais positiva porque ela terá mais consistência, será mais permanente. Não vai ficar como uma coisa efêmera só do marketing, como uma propaganda que veio, fez sucesso e passou."

Page 120: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

110

Uma outra percepção, queixando-se do baixo envolvimento da comunidade

interna, também aponta para a necessidade de se estruturar um marketing social

que contribua para maior mobilização das partes.

Muitas ações já apresentaram bons resultados. Mas parece que ainda não tocou. Eu não sei o que falta. talvez mais marketing. mais visão. mais sensibilidade. Ainda não pegou todos. Porque a gente já trabalha com ações sociais desde 99, e foram ações grandiosas, bem grandes. Você vai numa palestra onde tem um gerente da Bosch falando. ou numa faculdade onde tem um aluno que é chefe da Bosch. a gente sempre escuta ele falar daquilo que é feito pela empresa. Mas nem sempre você vê que eles estão ali. Eles levam para fora. mas nem sempre participam. Eu vejo que já tem uma notoriedade externa maior do que interna. infelizmente. As parcerias que a gente fez nesse projeto social são grandes porque envolvem todo o poder público, as universidades, o SESI, que é uma instituição muito grande e poderosa do Paraná. Então essas parcerias dão a notoriedade, mas a gente precisa trabalhar um pouco mais internamente para que isso saia daqui, de dentro para fora."

De maneira contrária às posições que não identificam a prática do marketing

social, o setor responsável pela comunicação da empresa reconhece claramente a

sua existência, embora evidencie suas limitações no caso da Bosch. Reconhece que

o aprendizado das questões sociais tem mostrado a importância da divulgação de

tais ações e que o marketing social, ainda que de maneira empírica, tem buscado

sua estruturação dentro da empresa.

"Sim [respondendo afirmativamente à questão sobre a prática do marketing social], mas não com todas as suas facetas. Na hora do planejar. somos bons nas ações e extremamente criativos. mas não temos verba programada e definida. Na hora do fazer os funcionários e a empresa dão um show e acredito que poucas empresas no Paraná possuem tantos programas e benefícios para funcionários e comunidade. Na hora de divulgar pecamos um pouco. por que não é da cultura Bosch falar sobre o que faz. Desde 1999 estamos quebrando um pouco este paradigma e mostrando que é bom divulgar. Desde este período. nosso corpo gerencial realiza mais palestras. atende com mais freqüência a imprensa. obtém melhor feedback dos funcionários e outros. S6 que esta divulgação peca em alguns aspectos. sendo o endomarketing muito melhor que a divulgação externa. Como a Bosch está aprendendo a não ter medo de divulgar o que faz, é provável que ainda nesta área tenhamos muita evolução. Somente acredito que não fazemos marketing social totalmente porque isto que expliquei não é programado na sua totalidade e ainda não existem políticas escritas sobre a responsabilidade social."

5.5.3 A VISÃO DO 3° NíVEL

No nível operacional percebe-se uma visão simples, que acredita na prática

do marketing social, embora reconhecendo o pouco conhecimento do termo.

"Pratica sim o marketing social por que onde a gente vai, onde temos encontros, sempre se ouve falar dos 'Voluntários Bosch", dos trabalhos e dos projetos que a Bosch vem fazendo.

Page 121: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

111

Isso é uma divulgacão tanto da marca. como também do nome e dos seus produtos. E para o cliente isso também irá gerar uma visão diferente porque ele vai comprar um produto de uma empresa que pratica a responsabilidade social. n

Embora não haja aqui preocupação com o planejamento e com a

implementação das ações sociais, os ganhos de imagem estão atrelados à

percepção do marketing social.

"Eu não entendo muito sobre o termo marketing social mas acredito que a Bosch o pratica. pois quando sai o nome da Bosch em algum evento. eu acredito que isso é marketing social. n

"Na minha opinião pessoal eu acredito que as empresas que no futuro não fizerem um trabalho social serão cobradas pela população. A medida que a população vai se conscientizando " ... aquela empresa ganha tanto e não é capaz de plantar uma árvore, de ajudar a um asilo ... ", isso vai diminuir a aceitação dos produtos daquela empresa. Eu acho que a Bosch optou por isso. Pela falta que havia de um maior envolvimento. Eu acho que eles queriam se envolver e ajudar mais as pessoas. No futuro isso para a marca Bosch será excelente. n

No nível operacional, percebe-se a intensificação do marketing interno com a

conseqüente valorização do local de trabalho e do sentimento de pertencer à

organização por parte dos seus funcionários.

"Hoje, a gente sai lá fora, qualquer lugar que você entre, se você fala que trabalha na Bosch alguém já ouviu sobre algum trabalho que a gente fez, ou já liga com a Vila Verde porque a repercussão da Vila Verde é muito grande. Já houve ~essoas perguntando quando a Bosch ia terminar com a Vila Verde e ir lá para o Tatuquara 9, por exemplo. Já há uma divulgação grande. Eu vejo o impacto assim, eu digo por mim, que me sinto muito orgulhosa, quando chego lá fora e alguém vem me falar que a Bosch está fazendo um trabalho bonito. Me sinto orgulhosa de trabalhar aqui. n

5.6 A GESTÃO SOCIAL

A questão da gestão social mereceria outro estudo mais aprofundado, uma

vez que a observação direta constitui a principal forma de sua avaliação e para tanto

exige um relacionamento mais intensivo e a participação mais efetiva no dia-a-dia da

organização. Por ser um tema não tão trabalhado como a responsabilidade social,

as observações e afirmações referentes à gestão social precisam ser identificadas

nas entrelinhas das entrevistas. Entretanto, alguns posicionamentos interessantes

podem ser destacados.

79 o Tatuaquara é um bairro da região sul da cidade, no subúrbio de Curitiba, com uma grande parcela de sua população vivendo em condições econômicas e sociais precárias.

Page 122: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

112

A capacitação dos profissionais da Bosch e o incentivo dado pela empresa na

educação de seus funcionários sem dúvida permite um avanço nas questões que

necessitam ou envolvem um maior poder de argumentação. Também a recente

restruturação da empresa, diminuindo seus níveis hierárquicos permite uma troca

maior de informações.

A alta direção avalia a gestão social e o trabalho de responsabilidade social,

tanto no ambiente interno como externo.

" .... tudo isso contribui [referindo-se as práticas da empresa] para a formação de clima interno favorável que resulta também em melhoria de qualidade no trabalho, e por fim, melhoria no negócio; estabelece, no mínimo, um padrão de decisão/pensamento que vai além daquele unicamente dos negócios (foco no resultado monetário, curto prazo, etc.) permitindo uma visão mais holística do papel da empresa na sociedade; geração de postura receptiva por parte de instituições, governo, etc., na discussão de temas críticos/polêmicos em vista da atitude socialmente responsável que a empresa apresenta, etc. ( ... ) A gestão social da Bosch têm lhe garantido, perante a comunidade, a imagem de empresa séria, ética e responsável. Esses atributos têm garantido o respeito da comunidade, instituições e órgãos governamentais. "

Os funcionários são apontados como os principais beneficiários pela adoção

do modelo de gestão social.

"Considero que os empregados são os maiores beneficiados porque eles tem a chance também de crescer enquanto pessoas e desenvolver um papel social mais amplo em um processo crescente."

A diretoria destaca a integração dos funcionários como o grande avanço

proporcionado pelas novas medidas e o melhor entendimento do papel da empresa

por parte das pessoas que compõem a organização. Ressalta-se novamente a

dificuldade de mensuração.

"Internamente tem uma grande vantagem: você consegue estabelecer uma certa integração natural das pessoas, você não "força a barra", as pessoas se integram entre elas, e entre cada uma delas para com a empresa. Elas entendem mais o que a empresa faz ou deixa de fazer, porque se tomam algumas decisões. Entre os pontos fracos, como uma atividade ainda não mensurável, ela é sempre muito questionada:

O 2° nível destaca a gestão social como um instrumento de maior aceitação e

eliminação de barreiras.

"Eu diria que um dos pontos fortes quando você trabalha numa gestão focada no social é a fácil aceitação da comunidade, seja interna ou externa. O apelo do social gera uma eliminação de resistências possíveis quando os argumentos são outros. Então isso é um ponto forte que favorece o encaminhamento. Um ponto fraco que pode advir também daí é a

Page 123: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

113

dificuldade da manutenção desse tipo de gestão. Você tem que estar se atualizando permanentemente, tendo uma grande força de criatividade para ir gerando isso e uma rede forte. Ainda é necessário um trabalho forte na área da comunicação para que isso seja realmente compartilhado, divulgado, multiplicado e que venha abrir, a transformar num ponto forte toda essa ação que você está realizando.·

Uma especial avaliação referente a melhora nos relacionamentos internos

veio da assistente social, que evidencia a importância do comprometimento das

chefias para a evolução das ações sociais. Também o confronto entre discurso e

prática é exposto nas suas argumentações.

·Outro ponto que eu vejo crescer a cada ano é a questão dos relacionamentos, das relações internas. As pessoas ficam muito mais abertas para as relações. começam a discutir e a conversar mais, a colocar seus pontos de vista e ter seu espaço. Quando entrei aqui na Bosch ouvia que tudo era muito democrático, que as pessoas falavam o que achavam, etc. Mas aí a gente vê que não é bem assim, é uma empresa, tem toda uma hierarquia. Com todo esse trabalho, não só dos voluntários, a gente consegue facilitar as relações. A gente vai, a gente conversa. Numa mesma mesa sentam-se todas as pessoas que queiram trabalhar naquela a ação, seja chefe, gerente ou operador. Isso vem se fortalecendo cada vez mais dentro da Bosch. As conquistas também. Aos poucos, esse pessoal que trabalha mais nas ações sociais vêm conquistando muita coisa, e, pelo que percebo - e eu só tenho 3 anos aqui na Bosch - tem-se conseguido muita coisa. Coisas que sempre se quis há muito tempo. Essas conquistas estão ficando muito fortes. A empresa vem valorizando as ações que o pessoal faz. Isso faz com que o pessoal fique mais fortalecido ainda. Tanto na questão do trabalho da empresa, como pelo fato de ser da empresa.( ... ) Na questão dos pontos fracos ainda há a falta de comprometimento das lideranças. das chefias, dos gerentes. A Bosch infelizmente ainda não fez com que esse pessoal percebesse todo esse movimento. Eles até perceberam mas ainda ficam de fora. Parece que esperam para ver no que vai dar, pensando que pode ser que isso acabe e nesse caso a pessoa não se comprometeu. Isso ainda dificulta muito o trabalho."

o apoio da diretoria é destacado com especial valorização à divulgação dos

projetos e a necessidade de maiores investimentos no público interno.

·Sabemos que em muitas empresas, os programas não conseguem decolar porque a chefia da empresa não apoia, mas na Bosch o apoio é grande. Como pontos fracos cito o medo de divulgar números e dados importantes para o projeto caminhar. Também sempre faço críticas porque não nos inscrevemos em órgãos que podem dar apoio tanto nos projetos, quanto na divulgação, como é o caso da Ethos e similares. Até hoje não consegui me convencer porque não participamos destas instituições. Um outro ponto fraco é a faHa de mais programas que visem o desenvolvimento do funcionário e de sua família. No ano que vem, estaremos com o Programa "Construir o Amanhã", que tem como objetivo dar formação técnica básica para filhos de funcionários.·

Também no nível operacional (3° nível), o espaço dado ao funcionário é

reconhecido.

·Um dos pontos fortes é o espaço que a empresa dá para a gente participar, para nós fazermos o nosso trabalho. E o fraco ainda é a gente trazer voluntários para o nosso grupo,

Page 124: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

114

para o nosso trabalho. Nós temos poucos voluntários hoje que participam disso. Então, eu acho que esse é o ponto fraco. É difícil você chegar na pessoa, porque não são todos que tem o espírito de voluntário. E alguns precisam ser desenvolvidos. Só que para você desenvolver esse espírito é difícil. Você tem que conseguir chegar até a pessoa ou fazer com que ela acompanhe uma ação social. E a pessoa tem que ir, tem de participar, para poder sentir-se atuante. n

5.7 A PRÁTICA E O DISCURSO: ANÁLISE E CONSIDERAÇÕES.

A responsabilidade social da Bosch pode ser identificada no discurso e na

prática. Em relação ao discurso, os principais atores apresentam visões similares e

complementares a respeito do tema de acordo com as definições contemporâneas,

principalmente aquelas expostas por O'Ambrósio e Mello (1998), Melo Neto e Fróes

(1999), Mclntosh et alli (2001) e Ashley (2002). O exercício da responsabilidade

social extrapola as dimensões econômicas e legais destacadas por Ferrei et alli

(2001), atingindo os níveis éticos e filantrópicos. Na empresa, a compreensão da

responsabilidade social deriva da ética empresarial e da postura de seu fundador,

Robert Bosch, na busca pela cidadania empresarial. Tal concepção parece ter sido

estendida para as inúmeras unidades da empresa e comprovada na Unidade de

Curitiba.

O exercício da responsabilidade social da Unidade de Curitiba da Bosch

também foi iniciado com base na filantropia, evoluindo mais recentemente para

ações menos assistencialistas e de auto-sustentabilidade. Essa mudança de

direcionamento coincide com a intensificação do tema nas discussões empresarias e

acadêmicas e na literatura específica ocorrida a partir dos anos 90. A cronologia da

responsabilidade social da empresa contemplou primeiramente a gestão social

interna para, em seguida, valorizar a gestão social externa, plenamente de acordo

com o gráfico de Estágios da Responsabilidade Social Corporativa exposto por Melo

Neto e Fróes (2001). Nessa visão, a Bosch já está migrando para o 3° estágio, o da

gestão social cidadã. Na avaliação da responsabilidade social interna a empresa

parece ter dado maior ênfase à gestão de benefícios e remuneração, gestão dos

direitos dos empregados, gestão do trabalho, gestão do ambiente de trabalho e

gestão do crescimento e desenvolvimento pessoal dos empregados. Cabe agora

maior atenção à gestão da relevância social da vida no trabalho e à gestão do

trabalho e espaço total da vida. O trabalho de valorização dos talentos internos,

Page 125: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

115

destacando as habilidades individuais de cada funcionário, merece ser registrado.

Como o trabalho externo ainda está em franco desenvolvimento, as etapas de

avaliação do tipo e natureza da relação com a comunidade, do foco e do alvo da

relação, bem como do escopo e do impacto das ações deverão ser promovidas num

futuro próximo.

Em relação às 14 diferentes visões de responsabilidade social expostas por

Melo Neto e Fróes (2001) puderam ser identificadas na Bosch as seguintes: a

responsabilidade social como atitude e comportamento empresarial ético e

responsável; a responsabilidade social como estratégia de relacionamento; a

responsabilidade social como estratégia de agregação de valor; a responsabilidade

social como estratégia de recursos humanos; a responsabilidade social como

estratégia social de inserção na comunidade; a responsabilidade social como

estratégia social de desenvolvimento da comunidade; a responsabilidade social

como promotora da cidadania individual e coletiva; a responsabilidade social como

exercício da consciência ecológica; a responsabilidade social como exercício da

capacitação profissional; e, finalmente, a responsabilidade social como estratégia de

integração social.

É difícil identificar se a motivação para o exercício da responsabilidade social

tem seu maior componente derivado da linha instrumental ou da linha ética, como

propõe Ashley (2002). Se as ações e o discurso sinalizam mais especificamente

para a linha instrumental, da adoção de uma prática social objetivando uma maior

consciência da empresa e de seu desempenho econômico aliado a uma

diferenciação da Bosch perante suas empresas pares, não há como ignorar o

componente ético encontrado nos registros centenários da empresa. De fato, neste

caso, não há como avaliarmos a responsabilidade social dissociando-a da lógica

econômico-financeira da organização. A Unidade de Curitiba da Bosch parece

realmente ter encontrado uma identidade própria (ainda em formação), capaz de

destacá-Ia inclusive perante as outras unidades nacionais da empresa, o que fez

dela um modelo corporativo que agora pretende ser compartilhado e estendido nas

demais. Nesse caso, também será necessário extremo cuidado pois as

características dos públicos interno e externo, bem como as necessidades socais,

variam sensivelmente nas diferentes regiões.

Page 126: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

116

Vale ressaltar aqui a eleição do tema 'educação' como foco das ações, que

envolveu todos os funcionários, sinalizando para uma democratização das relações.

Também referente a gestão social, se, de início, o Departamento de Recursos

Humanos conduzia estrategicamente as ações sociais, tal qual destacado por Lewis

e Littler (2001), atualmente boa parte dessas ações, principalmente as externas, já

está nas mãos dos funcionários através da ONG do Conselho de Voluntários. A

transferência de responsabilidade na condução das ações sociais tem sido

verificada. A Bosch optou por um caminho de projetos próprios e não pelo patrocínio

de projetos de terceiros. Algumas parcerias tem sido feitas com os organismos do

Estado, sociedade civil e entidades não-governamentais, porém a empresa tem

valorizado o potencial criativo interno no desenvolvimento de projetos e na

implementação de soluções sociais. Nas entrevistas, todos os níveis valorizaram os

aspectos de integração e a maior liberdade de diálogo e argumentação promovidos

na Bosch. O trabalho voluntário, muito mais que uma estratégia localizada de

recursos humanos, tem servido de base para as demais atividades da empresa.

A questão do marketing social demanda um cuidado maior. As diferentes

visões a respeito do tema comprometem seu claro entendimento, revelando uma

percepção difusa. Embora a Bosch pratique o marketing social, ainda que não de

maneira intensiva, o discurso muitas vezes não condiz com sua prática.

Freqüentemente o marketing social foi negado nas entrevistas temendo ser

associado a uma conduta oportunista ou afastada da ética. Outras vezes, a falta de

implementação de uma política de marketing social foi apontada como um

desperdício real dos resultados já obtidos nas práticas sociais, sinalizando para uma

percepção da necessidade de estruturação desse setor. Na prática, as ações até

aqui desenvolvidas estão adequadas ao conceito de marketing social exposto por

Kotler e Roberto (1992).

Ainda não há uma estrutura profissionalizada capaz de cumprir todas as

etapas de administração do marketing social, principalmente em relação a

mensuração, planejamento de diferentes projetos simultâneos e ações de

comunicação externa. Entre as modalidades de marketing social citadas por Melo

Neto e Fróes (1999), a Bosch pratica o marketing de filantropia, o marketing de

patrocínio de projetos sociais próprios e, em menor grau, o marketing de

Page 127: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

117

relacionamento com base em ações sociais. Se, por um lado, todo o trabalho social

desenvolvido já gerou resultados positivos e até inesperados, a falta de mensuração

já despertou alguns questionamentos. A opção pela não estruturação de um balanço

social parece estar sendo revista, ainda que de maneira cautelosa. É visível que a

ausência do Balanço Social diminui a exposição na mídia e enfraquece os

resultados das ações, que acabam por ultrapassar pouco os limites da empresa.

Através de palestras e da participação em eventos específicos, a Bosch já é

destaque regional no tema da responsabilidade social. Isso tudo poderia ser

intensificado a partir de uma melhor condução do marketing social, tornando-se

referência e/ou modelo para muitas outras organizações interessadas em contribuir

socialmente.

No caso da Bosch, a manifestação dos entrevistados comprova que a

imagem da marca não é apenas um valor externo, verificado pelo alto grau de

adesão e de identificação do público interno com a causa social. Percebe-se ainda

que não há uma deliberada intenção em associar o nome Bosch às ações sociais

como um objetivo estratégico, uma vez que a marca do Grupo de Voluntários Bosch

predomina sobre a marca da própria Bosch nos projetos de cunho social. Além da

necessidade de ampliação da compreensão do conceito de marketing social nos

diferentes setores da empresa, seria interessante uma maior liberdade de

comunicação para a Unidade de Curitiba, uma vez que a distância da assessoria de

imprensa de Campinas ou da agência externa pode vir a significar maiores tempos

para o desenvolvimento das mensagens e a perda de valores relevantes não

vivenciados por lá. Especificamente no projeto desenvolvido na Vila Verde, a Bosch

estabeleceu um genuíno envolvimento com a comunidade, transferindo para todos

os participantes daquelas ações sociais - funcionários, dependentes e membros da

comunidade - um alto grau de comprometimento com a causa social. Internamente,

será necessário ainda um maior estímulo junto aos gerentes e às lideranças para

que a prática social passe a ser mais disseminada, já que muitas áreas ainda não

participam ou não se sentiram motivadas a fazê-lo.

Page 128: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

118

6AINEPAR

Este capítulo objetiva a apresentação do segundo estudo de caso

desenvolvido a partir dos resultados da pesquisa de campo, que contou com uma

detalhada pesquisa documental e bibliográfica, séries de entrevistas e observação

direta. Inicialmente há uma rápida descrição das atividades desenvolvidas pela

empresa que permite um breve entendimento de sua evolução, situação atual,

escala e áreas de atuação.

A seguir, de acordo com o referencial teórico, são apresentados os dados

obtidos a partir da pesquisa documental (confirmados pelas entrevistas e pela

observação direta) referentes ao efetivo exercício da responsabilidade social da

empresa e da sua política atual de marketing social. Somente após tais

apresentações é que são demonstradas as diferentes opiniões e perspectivas,

colhidas junto aos entrevistados, com o objetivo de se elaborar um quadro

referencial representativo das percepções dos diferentes atores internos em relação

à responsabilidade social e ao marketing social. Tal ordem permite também a

confrontação entre a ação das empresas e seu discurso. Também nessa fase são

feitas considerações a respeito da gestão social.

Na Inepar foram realizadas, ao todo, 10 entrevistas, com 6 diferentes

entrevistados, totalizando mais de 8 horas de gravações, além de um sem número

de e-mails e telefonemas para a revisão de determinadas questões. Procurou-se

entrevistar os principais atores envolvidos na condução, coordenação elou direção

das ações sociais da Inepar, contemplando os diferentes níveis, da alta direção às

funções operacionais. A partir de entrevistas semi-estruturadas, objetivou-se não

somente verificar a real compreensão por parte destes atores dos temas da

responsabilidade social e do marketing social, como principalmente identificar as

implicações dessas diferentes visões, seus envolvimentos com tais práticas e as

bases motivadores para tais ações.

No caso da Inepar, a estruturação das atividades que envolvem a prática da

responsabilidade social está centralizada nos projetos desenvolvidos pela Fundação

Inepar com base nas diretrizes do Projeto Quero-Quero. A comunicação interna

também está a cargo da fundação, enquanto que a comunicação externa é

Page 129: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

119

desenvolvida pelo Departamento de Marketing Corporativo. Marketing e fundação

são os setores responsáveis pelo marketing social da empresa. Sendo assim a

escolha dos entrevistados, deu-se com base nas informações iniciais obtidas junto à

Fundação Inepar. Na apresentação de suas diferentes avaliações, concepções e

comentários, estes entrevistados foram divididos em diferentes níveis em função dos

cargos exercidos dentro da empresa. Tal subdivisão objetiva também a

uniformização dos dados obtidos nos dois diferentes estudos de caso. Assim sendo,

atribuiu-se as seguintes denominações: 1 ° nível - representado pelos diretores; 2°

nível - representado pelas chefias elou gerências; 3° nível representados pelos

auxiliares administrativos e assistentes responsáveis pela operacionalização das

práticas sociais. Embora separados em diferentes níveis, os autores das citações

que aparecem nesse estudo de caso não foram diretamente identificados. Tal

medida visa preservá-los de eventuais críticas particulares, bem como objetiva

garantir maior transparência e imparcialidade, tanto da parte dos entrevistados,

como também por parte do pesquisador.

Gennaro Moretti

Renato Requião Munhoz da Rocha1

Marcelo Sirnas Cattani

José Luiz Capella

Ana Paula Dõring

Patrícia Del Claro

Diretor Corporativo

Diretor Industrial e Presidente da

Fundação Inepar

Gerente de Marketing

Corporativo

Consultor em Operações

Assistente da Presidência

Assistente Administrativa

perito industrial 28 anos

engenheiro eletricista

26 anos

jornalista / ma rketing

4 anos e meio

engenheiro 10 anos

relações públicas e direito 3 anos2

relações públicas 1 ano

1 O Sr. Renato Requião trabalhou de 1972 a 1975 na Enco, vindo a partir do ano seguinte a integrar a Inepar. Ocupa a presidência da Fundação Inepar desde 1995.

2 A sra. Ana Paula Dôring deixou a empresa no 2° sem. de 2001, durante a realização desta dissertação.

Tabela 2 - Entrevistas Inepar

Page 130: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

120

6.1 A EMPRESA

A Holding Inepar é um conjunto de empresas paranaense de capital aberto,

com sede em Curitiba, formado pela Inepar S/A Indústria e Construções, Inepar

Energia S/A e Inepar Telecom S/A. O grupo iniciou suas atividades em 1968, com a

fundação da Inelco Indústrias Elétricas e Comércio Ltda. Em 1976, com a fusão da

Inepar com a Enco Engenharia e Comércio Ltda.8o é formada a Inepar Indústria e

Construções.

Ao longo de mais de 30 anos, mediante a aquisição e venda de unidades

industriais, joínf-venfures, alianças estratégicas, participação em projetos e

consórcios, a empresa experimentou um acelerado crescimento que alterou bastante

sua configuração81. Em 1989, a empresa adquiriu as instalações industriais da Sony

na Cidade Industrial de Curitiba. Em 1990, a Inepar separou as fábricas de produtos

seriados e semi-seriados da de produtos sob encomenda. A partir de 1996, com a

compra de unidades industriais nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro e com a

participação em consórcios de telecomunicações, quando das privatizações do setor

de telefonia, a Inepar deixou de ser uma empresa regionalizada e passou a atuar

em todo o cenário nacional. Hoje, a Holding Inepar é um grupo internacional, com

negócios em diferentes países e com aproximadamente 4.000 funcionários.

Esse estudo desenvolve-se apenas com base na Inepar Indústria e

Construções S/A, que conta atualmente com 4 unidades instaladas82 em seu parque

industrial. Refere-se especificamente a Unidade de Curitiba, com sede na Cidade

80 A Enco, foi fundada em 1953. ( ... ) A empresa prestava serviços de engenharia elétrica, elaborava e realizava projetos de instalações elétricas e hidráulicas e construía redes de distribuição e linhas de transmissão. A Enco teve seu momento áureo até o ano de 1960, com o processo de eletrificação do estado do Paraná, época em que executou diversos projetos pioneiros (ROCHA, 1998, p. 19). 81 Em 1990, a Inepar optou por uma política de crescimento que pretendia multiplicar por dez o seu faturamento anual de U$ 8 milhões nos cinco anos seguintes. Nesse ano, criou-se a Inepar Eletroeletrônica. Em 1994, a empresa atingiu um faturamento de U$ 90 milhões (ROCHA, 1998, p. 21-22). 82 As 4 unidades são: Curitiba (PR), que é objeto deste estudo, Araraqura (SP) e Jacareí (SP), além de outra unidade em Curitiba, a partir da aliança estratégica com a Siemens Metering .

Page 131: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

121

Industrial de Curitiba, com cerca de 400 funcionários, mais adiantada na implantação

de programas sociais. A Inepar Indústria e Construção possui alianças estratégicas

com a General Electric, com a Siemens, com a norte-americana Mastec e com a

Lucent Technologies, atuando no desenvolvimento de projetos de engenharia,

fornecimento de equipamentos e sistemas elétricos, transmissão, bens de capital,

construções e montagens. Sendo assim, presta serviços, integrando soluções nos

setores de energia, petróleo e gás, transporte (metrôs e ferrovias), estruturas

metálicas e telecomunicações. Especial atenção será dada neste estudo ao trabalho

desenvolvido pela Fundação Inepar, componente sem fins lucrativos da holding, que

atua nas questões sociais internas e externas.

6.2 O EXERCíCIO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL

o exercício da responsabilidade social da Inepar é derivado do programa de

qualidade e produtividade implantado com maior ênfase no início da década de 90

que, pretendendo a mobilização e o envolvimento de todas as pessoas da empresa,

originou diversos projetos83. Tais projetos foram reunidos em três sub-programas:

Comunicação, Cultura e Comprometimento. Juntos, os três sub-programas

formaram um processo global denominado Programa Quero-Quero84.

83 Na verdade foi em 1977 que a Inepar começou a implantar seu Sistema de Garantia da Qualidade para poder fornecer equipamentos elétricos para as Usinas Nucleares de Angra, pois a Nuclen exigia que as empresas tivessem sistema de qualidade baseado em normas do setor de energia nuclear. A Inepar foi devidamente qualificada e assinou contratos de fornecimento para as Usinas Angra 11 e 111. Este sistema foi certificado em 1983 pela Nuclen e em 1984 pelo Inmetro. Em 1994 a Inepar adequou seu sistema aos novos requisitos normativos, sendo certificada pelo ABS - American Bureau of Shipping, uma empresa de certificação internacional. Em 2000 a Inepar obteve, em uma de suas unidades, através do NBIB - National Board of Boi/er & Pressure Vessel Inspectors, a autorização para uso do selo ASME - American Society of Mechanical Engineers nas categorias S, U e U2. Atualmente, a maioria das Unidades de Negócio da Inepar tem seu sistema da qualidade certificado também através do sistema ISO. 84 O nome foi inspirado nos pássaros que habitam os jardins da fábrica e que, pela proteção que dedicam ao local e a seus filhotes, espelham os objetivos que se pretende alcançar na fábrica. ( ... ) Além disso, a composição daria o real significado dessa nova relação entre capital e trabalho, por dispor lado a lado o quero do empregado com o quero do empregador, mostrando que os desejos de ambos são similares e convergem na busca dos mesmos resultados: o sucesso profissional de cada um e o sucesso empresarial (ROCHA, 1998, p. 30-31).

Page 132: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

122

Com o objetivo de fortalecer ainda mais as ações propostas ou estimuladas

pelo Quero-Quero, foi criada em 10 de setembro de 1991 a Fundação Inepar,

entidade sem fins lucrativos, ligada a todo o grupo, que desenvolve e implementa

programas internos e externos.

No exercício da responsabilidade social interna foram instituídos uma série de

benefícios, muito além das responsabilidades legais e econômicas. Em novembro de

1991 foi criado e implantado o PAMI - Plano de Assistência Médica Inepar - um

sistema de autogestão em saúde. Agregada ao plano de benefícios de saúde, a

Uniodont085 dispõe de consultório interno na empresa, para funcionários, e externos

para familiares e também funcionários. Através do PAE - Programa de Assistência

ao Empregado - os funcionários com problemas relacionados a álcool, drogas, stress

e desequilíbrio emocional são atendidos e devidamente encaminhados para

atendimento especializado. O programa é operacionalizado por uma equipe

multidisciplinar e supervisionado por uma consultoria externa.

A Inepar oferece bolsas de estudos a seus funcionários, os quais podem ser

subsidiados em até 50%, incentivando a participação destes em cursos de idiomas e

em cursos de ensino básico e superior. Em 2000, foram concedidas 295 bolsas, 20%

a mais que em 1999. Recentemente, a Fundação Inepar criou a Universidade Livre

Inepar - ULI. Para realizar suas atividades, atendendo os funcionários da Inepar e a

comunidade, a ULI possui parcerias com universidades, consultorias, profissionais

especialmente convidados e, principalmente, dispõe do trabalho de instrutores

internos, valorizando o potencial educador dos funcionários do Grupo Inepar. Ainda,

através do PROBEIN - Programa de Benefícios da Inepar, o compromisso da Inepar

com a educação se estende aos filhos dos funcionários, que podem receber bolsa

de estudos desde a pré-escola até a universidade (inclusive pré-vestibular), tendo

como requisitos a aprovação do aluno e o tempo mínimo de um ano do funcionário

85 A Uniodonto é uma cooperativa que presta serviços odontológicos através de uma rede de odontologistas credenciados, mediante a venda de planos mensais a seus usuários.

Page 133: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

123

nos quadros da empresa, bem como critérios de idade dos dependentes. Os alunos

que obtêm a maior média anual recebem uma caderneta de poupança como

premiação.

O PENSE - Projeto de Ensino e Saúde Especial - atende filhos de

funcionários que sejam portadores de deficiência mental e/ou física. Caracteriza-se

pela concessão de uma bolsa mensal, baseada num valor referência e variável

conforme a faixa salarial, tempo de serviço e assiduidade do funcionário. Há também

o Quero-Creche (vale-creche para funcionários), pelo qual é concedido um auxílio

mensal para as despesas com educação, alimentação e vestuário aos dependentes

com idade compreendida entre zero e seis anos. Esse programa é desenvolvido em

parceria com a Prefeitura Municipal de Curitiba. A Inepar contribui mensalmente com

o valor necessário para manter uma creche municipal e tem direito ao

preenchimento de 120 vagas, distribuídas entre crianças na faixa de 2 a 6 anos.

Para os funcionários o benefício é gratuito.

Em novembro de 1997, foi lançado o Projeto ParticipAÇÃO, desenvolvido pela

Fundação Inepar e pioneiro no Brasil. O objetivo do projeto é fazer com que todos

funcionários registrados na empresa recebam ações preferenciais com quantidades

que variam de acordo com o tempo de casa e avaliação de desempenho. Assim

todos os funcionários se tornam acionistas participantes. Também com o objetivo de

aumentar a motivação e o comprometimento, a empresa divide seu lucro no final do

exercício com seus funcionários. A Inepar foi a segunda empresa do Brasil a eliminar

o cartão-pont086.

Com o objetivo de incentivar e promover a cultura e integração entre os

funcionários, a Inepar criou, dentro da fábrica, a Praça 300 anos87, espaço que

86 Segunda empresa no Brasil a abolir o relógio de ponto (perdemos da primeira apenas por seis dias), a Inepar preferiu dar crédito à comunicação e deixar que o pessoal e as chefias se entendessem quanto à freqüência ao trabalho (ROCHA, 1998, p. 45). 87 O nome é uma homenagem aos 300 anos de Curitiba completados em 1993.

Page 134: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

124

abriga uma biblioteca com sistema de auto-empréstimo com mais de 300 títulos,

gibiteca, revisteca e painel informativo. A praça abriga diversas manifestações

culturais, como apresentações e encontros. Através do Projeto Visita das Famílias,

toda sexta-feira são sorteadas algumas famílias de funcionários, apanhadas de táxi

e levadas para conhecer as instalações da empresa.

Externamente são desenvolvidos uma série de projetos tanto para a

comunidade em geral como para os dependentes dos funcionários da Inepar. Os

projetos direcionados à comunidade dão prioridade às áreas de educação e saúde.

A Fundação Inepar administra o Departamento de Ação e Promoção Social VÓ

Durvina, instituição filantrópica que presta serviços de promoção e assistência social

para comunidades carentes de Curitiba e região metropolitana. Desde 1984, a

instituição VÓ Durvina vem atuando em assistência social e, a partir de 1995, iniciou

a promoção de cursos profissionalizantes, em parceria com a Fundação de Ação

Social de Curitiba e com a Prefeitura Municipal de Pinhais88. Através de filantropia, a

Fundação Inepar contribui com uma série de organizações carentes e organizações

não-governamentais89.

Merecem destaque ainda os projetos Profissional da Vez, Força & Cia.

Ilimitada e a Campanha do Agasalho. O Projeto Profissional da Vez é um bate-papo

que apresenta quinzenalmente, para grupos de 16 alunos da escola Cândido

Portinari, na CIC, diversas profissões, por meio da participação voluntária dos

funcionários da Inepar, os quais são entrevistados pelos estudantes sobre suas

88 São promovidos cursos de Higiene e Beleza, Limpeza de Pele e Maquiagem, Auxiliar de Cabeleireiro, Corte e Costura Geral, Cursos Administrativos (recepcionista, auxiliar administrativo, office-boy), Pintura em Tecido, Tapeçaria e Bordados, Arranjos Natalinos e de Páscoa, Informática, Telemark.eting, Vendedor Lojista, Contabilidade e Financeiro, Artesanato e Culinária Geral. Além dos cursos profissionalizantes, são ministradas palestras sobre relacionamento interpessoal, doenças sexualmente transmissíveis, alcoolismo e outros temas que afetam o bem-estar da comunidade. Pinhais é um município da região metropolitana de Curitiba. 89 São elas: Associação Lar da Criança Arteira - Criarte, Creche Sol do Amanhã, Instituto Pró­Cidadania de Curitiba, Associação Criança Renal, Associação Solidários pela Vida - Só Vida, Associação Paranaense Alegria de Viver, Associação Brasileira Qualidade de Vida, Federação Paranaense de Fundações Privadas.

Page 135: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

125

atividades profissionais na Praça 300 anos. O Força & Cia. Ilimitada é outro projeto

inovador, desenvolvido pela Fundação Inepar em parceria com a Secretaria

Municipal de Educação, pelo qual os funcionários da Inepar, por meio de uma troca

de experiências, capacitam os diretores das escolas públicas municipais com

conhecimentos mais aprofundados de gestão. O curso, ministrado em seis módulos,

foi desenvolvido entre agosto e setembro de 2001, com a participação de 41

voluntários e 138 diretores. Anualmente, os funcionários do Grupo Inepar unem-se

num esforço conjunto para arrecadar cobertores e agasalhos, que são distribuídos

para hospitais e albergues de Curitiba.

A Inepar mantém um coral (Coral Tom Inepar) e um grupo de teatro (Energia

Pura) internos, criados através da participação de funcionários. O grupo de

escoteiros "Araucárias Inepar", formado por jovens entre 7 e 18 anos, filhos de

funcionários da empresa, também utiliza a sede da Inepar para suas reuniões.

A Afisa é a Associação de Funcionários Inepar, que conta com cantina, salão

para festas com mesas de jogos, convênios com diversas empresas, quadras de

futebol, basquete e vôlei, churrasqueiras cobertas, academia de musculação,

estrutura para limpeza de veículos dos funcionários e professores de educação

física. Entre os principais eventos promovidos pela Afisa estão: campeonatos de

futebol suíço, de areia, veterano, torneio de bilhar, pebolim, truco, além da festa

julina e pagodes.

O Balanço Social, publicado todo o ano pela Inepar, permite uma fácil leitura

de indicadores de responsabilidade social. No ano 2000 o Grupo Inepar apresentou

uma receita líquida de R$ 505 milhões sendo R$ 88 milhões destinados a sua folha

de pagamento. Embora revelando uma receita operacional negativa da ordem de R$

214 milhões, os indicadores sociais internos90 totalizaram R$ 45 milhões em

90 Esses indicadores incluem gastos com alimentação, encargos sociais compulsórios, previdência privada, saúde, segurança e medicina do trabalho, educação, capacitação e desenvolvimento profissional, o auxílio creche e a participação nos resultados.'

Page 136: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

126

investimentos, os indicadores sociais externos91 outros R$ 41 milhões e os

indicadores ambientais92 R$ 680 mil. Do total de empregados, 10% estão acima de

45 anos, 3% dos cargos de chefia são ocupados por mulheres e a relação

maior/menor remuneração está em 45. Também a distribuição dos lucros da

empresa bem como o plano de previdência privada contempla todos os empregados.

É prudente ressaltar que os dados apresentados no Balanço Social 2000 referem-se

ao Grupo Inepar e não somente à Inepar S/A Indústria e Construções93.

6.3 A PRÁTICA DO MARKETING SOCIAL

Para melhor desenvolver, disseminar e divulgar os projetos e as ações

sociais, motivando o público interno e valorizando sua imagem perante o público

externo, a Inepar conta com a estrutura da Fundação Inepar. A Fundação Inepar é

formada por dez pessoas: o presidente, um assistente da presidência que cuida dos

projetos com a comunidade e do balanço social, um assistente administrativo da

presidência, três funcionários do PAMI, outros três funcionários, sendo um do

financeiro, um da previdência privada e um da cooperativa, além de um coordenador

da Universidade Livre Inepar. A fundação mantém contato com quase todos os

departamentos das empresas ligadas ao grupo, porém no desenvolvimento dos

projetos relaciona-se diretamente apenas com os setores de Recursos Humanos e

Financeiro (para doações), além do departamento de Marketing Corporativo para

divulgação de campanhas. A fundação transferiu-se recentemente para as

91 Esses indicadores incluem os gastos com educação, saúde e saneamento, contribuições para a sociedade e tributos (excluídos encargos sociais). 92 São incluídos nos indicadores ambientais aqueles diretamente relacionados com a operação da empresa e em programas e/ou projetos externos. 93 Empresas que integram o Balanço Social 2000 Inepar: Inepar S/A Indústria e Construções; Mastec Inepar S/A; Lucent Inepar; Siemens Metering Ltda.; Inepar Telecom S/A; Inepar Energia S/A; Inepar FEM - Equipamentos e Montagens S/A; lESA S/A; Inepar SRL; Sul Assessoria; Sade Vigesa Industrial e Serviços S/A (1° bim.); lESA (1° bim.)

Page 137: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

127

instalações da Unidade de Curitiba na Cidade Industrial. Até 2001, situava-se numa

casa no centro da cidade juntamente com a Diretoria Corporativa.

Paralelo às atividades da Fundação Inepar, ainda existe o trabalho

desenvolvido pelo Departamento de Marketing Corporativo, formado por um diretor e

três assistentes. Esse departamento responde por todo o marketing do Grupo

Inepar, fazendo a ligação da empresa com a assessoria de imprensa externa e com

a agência de publicidade94.

Para o público interno, a maioria dos materiais é desenvolvido pela própria

fundação ou até mesmo pelos demais funcionários em eventos e reuniões informais.

A Inepar não possui um regimento interno, um código de ética ou ainda um manual

de conduta fornecido aos seus funcionários. Toda a conduta de trabalho da Inepar

está baseada no Programa Quero-Quero, em seus valores95 e mandamentos96. O

enfoque à comunicação do Programa Quero-Quero se deu mediante a

implementação de diversos projetos que facilitam a troca de informações internas.

Entre esses projetos destacam-se:

a. Projeto Café com o Presidente, pelo qual são reunidos grupos de 20

pessoas que em determinado dia tomam seu café da manhã na

companhia de um diretor e do presidente da empresa;

b. Projeto Palavra do Presidente, segundo o qual o presidente, a cada três

meses, apresenta a situação da empresa para todos os funcionários;

94 Master Comunicação. 95 Os valores do Programa Quero-Quero são: competência, sinergia, inovação, respeito e paixão. 96 Os 10 mandamentos do Programa Quero-Quero são: 1. não reinventar a roda e ganhar tempo; 2. ouvir aqueles que fazem; 3. propiciar os meios necessários para fazer; 4. fazer coisas incomuns com pessoas comuns; 5. atacar o maior mal que aflige as organizações: a falta de comunicação - falar sempre a verdade; 6. estimular a educação e a cultura; 7. propiciar aos colaboradores satisfação profissional e pessoal; 8. criar na empresa um convívio familiar; 9. modificar a relação capital­trabalho, provando que é possível haver confiança mútua; 10. provar que tudo aquilo que é bom para o trabalhador, também é para a empresa, e vice-versa.

Page 138: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

128

c. Projeto Videojornal, que mensalmente produz um vídeo com o objetivo de

manter os funcionários atualizados sobre as mudanças ocorridas, com

entrevistas de funcionários, exibido nos restaurantes e nos ônibus da

empresa e que pode ser inclusive levado por empréstimo para casa.

d. Projeto Rádio Peão, pelo qual, a qualquer momento, auto-falantes

espalhados pela fábrica podem transmitir notícias a todos, além de um

programa transmitido regularmente às 15 horas na troca de turno.

e. Projeto Conhecendo Nossa Empresa, que por meio de palestras informa

os funcionários sobre quais são os negócios do Grupo Inepar, o local onde

estão situados e qual a relação entre eles. No ano 2000, o projeto contou

com 222 participantes.

Outras ações desenvolvidas com o objetivo de facilitar a comunicação interna

são os informativos nos banheiros, os jornais murais, os cartazes estratégicos

(colocados com avisos nos locais que ocorrem os problemas), o informativo de

tiragem mensal 'O Bacamarte' e a publicação da revista trimestral 'O Condutor'.

Também os crachás contam apenas com o nome ou apelido de cada funcionário

para proporcionar maior interação entre as pessoas.

Há um amplo trabalho de assessoria de imprensa, principalmente no sentido

empresa-comunidade, que pode veicular informações da empresa em todos os

veículos de comunicação necessários, sempre de acordo com os públicos

almejados. Na via oposta, a comunidade utiliza fax, cartas e acessa o site para

enviar sugestões e pedidos à Fundação Inepar. O presidente da fundação, Sr.

Renato Requião, participa ativamente de palestras e debates por todo o Brasil,

divulgando as ações sociais e os projetos da empresa97. Também, há mais de dez

anos, são organizadas visitas dirigidas à Inepar, levando estudantes universitários a

97 Somente em 2000, o Sr. Renato Requião proferiu 70 palestras em diferentes instituições de ensino, empresas privadas, órgãos públicos e instituições beneficentes.

Page 139: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

129

conhecer as instalações da empresa e seus métodos de gestão. Muitos estudantes

têm utilizado a empresa como foco de estudo e tema para seus trabalhos

acadêmicos.

Na utilização da mídia de massa, o marketing corporativo procura aliar as

questões de responsabilidade social à imagem da empresa. O programa Memória

Paranaense, levado ao ar pela CBN Curitiba98, teve não somente o patrocínio, como

todo o seu desenvolvimento estruturado pela Inepar. Através de pesquisa e

entrevistas foram resgatados nomes de destaque no Paraná nas áreas de política,

jornalismo, aviação, automobilismo, medicina, ciência, arte, geografia e história, e

apresentados ao público local. Em 2001, foi desenvolvida, junto a agência de

propaganda, uma campanha para rádio, elaborada em três fases. A primeira, com

tema "Onde tem desenvolvimento tem Inepar", buscava mostrar uma empresa

comprometida com os avanços tecnológicos. Na segunda fase, o tema utilizado foi

"Inepar e Brasil", enfocando as principais obras em andamento no país que contam

com a participação da Inepar, como a construção do metrô de Brasília, o

fornecimento de módulos para tratamento de óleo nas plataformas da Petrobrás na

Bacia de Campos e a instalação de equipamentos do Terminal do Porto de Santos.

A terceira fase, com o tema "Inepar, uma empresa cidadã" falava das ações internas

e externas da empresa. Em função de dificuldades financeiras, somente as duas

primeiras foram ao ar. A veiculação foi interrompida na metade da segunda fase da

campanha.

A Inepar patrocina ainda o Prêmio de Jornalismo Inepar, desenvolvido em

parceria com o Sindicato dos Jornalistas do Paraná e com a FENAJ - Federação

Nacional dos Jornalistas. O prêmio, em dinheiro, é concedido anualmente nas suas

duas categorias: a primeira para jornalistas da imprensa paranaense com tema

98 Central Brasileira de Notícias, emissora de rádio FM com programação jornalística ligada ao Sistema Globo de Rádio, que conta com inúmeras estações retransmissoras pelo Brasil.

Page 140: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

130

social e a segunda para jornalistas do país inteiro com temática específica ligada as

áreas corporativas.

o Grupo Inepar publica seu Balanço Social desde 1996. Ao tomar contato

com uma extensa matéria jornalística99 referente ao Balanço Social proposto pelo

Ibase, a administração interessou-se pela idéia. Após contatos com o próprio

Betinh01OO, a Inepar adotou o Balanço Social como uma publicação fixa. Os dados

são organizados pela Fundação Inepar que remete essas informações ao Marketing

Corporativo, que por sua vez, juntamente com a agência, desenvolve graficamente o

material. Por suas ações sociais a Inepar já recebeu os seguintes selos e

premiações: Selo Abrinq - Empresa Amiga da Criança, Selo Balanço Social Ibase

Betinho 97, 98, 99 e 2000, Selo Empresa Socialmente Responsável da ACP -

Associação Comercial do Paraná - em 2000 e 2001.

As matérias e dados para as publicações, como para o Guia Exame de

Cidadania Corporativa por exemplo, são enviadas pelo Marketing Corporativo, que

os desenvolve em parceria com a assessoria de imprensa. A Inepar tem aparecido

sistematicamente nos Guias de Cidadania Corporativa da Exame além de ter

figurado entre as 50 melhores empresas nos Guias Exame - As melhores empresas

para você trabalhar, nas edições de 1999 e 2001.

6.4 A VISÃO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL

A questão da responsabilidade social da Inepar, pode ser inicialmente

observada analisando-se a missão e a visão da empresa, expressas nos seus

materiais internos e nas suas instalações. Sua missão é "garantir e disseminar a

crença e o pleno exercício da visão e dos valores do Grupo Inepar, voltados

99 Gazeta Mercantil - 19/06/97. 100 O sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, um dos grandes incentivadores da adoção do atual modelo de Balanço Social, foi diretor geral do Ibase (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas) e articulador nacional da Ação Cidadania Contra a Miséria e Pela Vida.

Page 141: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

131

prioritariamente a perpetuidade do empreendimento, consolidando a sua imagem e

solidez, na busca constante do desenvolvimento, do respeito ao próximo e ao meio

ambiente". A Inepar acredita que a sinergia entre as várias atividades

desempenhadas pela empresa deve basear-se na competitividade e na rentabilidade

de multi-serviços e soluções integradas. Sua visão é "ser uma organização

preparada em recursos humanos e tecnológicos, capaz de oferecer soluções

inteligentes em produtos e serviços para infra-estrutura, e excelência na atuação

como concessionária em serviços na área de energia e telecomunicações". Num

adendo à visão encontra-se ainda a seguinte sentença: "assegurar através da

qualidade e da credibilidade de nossa marca, a satisfação de clientes e a agregação

de valor aos acionistas".

A Fundação Inepar possui uma missão própria que é "contribuir para o

alcance de padrões de excelência na satisfação do ser humano no ambiente

profissional e comunidade, concretizando uma eficaz relação capital e trabalho".

A compreensão da responsabilidade social por parte dos diferentes atores

que conduzem as ações sociais da empresa está ligada, parcialmente, a essas

visões apresentadas, embora revele bases e perspectivas bastante diversas.

6.4.1 A VISÃO DO 1 o NíVEL

Na visão da alta administração, a responsabilidade social de uma empresa

decorre da sua busca pela manutenção de seus negócios e condições que garantam

sua perpetuidade.

"A responsabilidade social pode ser resumida numa única palavra: sobrevivência. Esqueça competitividade, vantagem competitiva, questão ética, tudo isso ... É questão de sobrevivência mesmo. Quem não agir com responsabilidade social não estará aqui nos próximos anos. Lógico que além de garantir a nossa sobrevivência, você também pode garantir uma vida mais digna e justa. n

Outra visão compreende a responsabilidade social como uma conseqüência

natural do exercício responsável dos negócios.

Page 142: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

132

"Compreendo a responsabilidade social de forma natural..., o respeito aos funcionários e ao meio compartilhado (meio ambiente) é obrigação básica de todos."

Mais adiante, comentando sobre os principais beneficiários, a alta direção

endossa a questão da sobrevivência, exposta anteriormente, ao revelar o porque da

opção por um modelo que desse ênfase às questões de responsabilidade social. A

preocupação com o tema decorre da sensibilidade dos administradores motivados

por diferentes causas.

"Indiscutivelmente quem ganha mais com essa questão é quem adota esta postura. Falando em empresas é a organizacão como um todo, satisfazendo o empregado. o empregador. o acionista e tudo que orbita em volta. ( ... ) Numa relação convencional dificilmente conquista­se amizade, lealdade, respeito e admiração incondicional de parte à parte. É mera troca de interesses. Numa relação que leve em conta justiça, em primeiro lugar, e o respeito a si mesmo, ao próximo e ao meio compartilhado, interagem fatores morais de valor incomensurável, fora do âmbito material... Há um poder de realização que não conhece limites ... Foi por uma questão de visão dos administradores, como sempre digo: se não for por crença no espírito do respeito ao qual me referi anteriormente. tem que ser por uma questão de sobrevivência - oportunismo e inteligência."

Com relação ao exercício da responsabilidade social pela empresa, a alta

direção acredita que, no caso da Inepar, isso se dá de uma maneira mais intensa

quando comparado a outras empresas do setor.

"De forma geral exercemos nossa responsabilidade social num padrão acima da maioria das empresas pares."

Destaca-se, no exercício da responsabilidade social, a relação

empregado/empregador como instrumento de superação de obstáculos.

"Nestes anos, pude comprovar que os obstáculos e as dificuldades por que passam as organizações são superados com maior facilidade quando se estabelece uma relação entre empregado e empregador baseada na soma de esforços de ambos. Qualquer ser humano quer ser reconhecido e tratado como pessoa, com suas qualidades, seus defeitos e suas limitações. Portanto, a empresa deve tratar funcionários e colaboradores como pessoas. e não como números. meros registros de um quadro pessoal. Infelizmente, além de não considerar os funcionários como pessoas, boa parte das empresas ainda assume atividades que não agregam valor ao objetivo final do negócio, muitas vezes desencadeadas por costumes baseados em paradigmas ultrapassados, que comprometem a motivação da equipe, a produtividade, os custos e a competitividade do produto ou serviço. E a realidade de hoje lembra um pouco a lei da selva: quando pega fogo na floresta, o leão corre ao lado do veado. Se é questão a sobrevivência. a união dos níveis hierárquicos e de toda equipe torna­se imprescindível."

Page 143: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

133

o comprometimento da equipe de funcionários e a busca por uma visão

compartilhada por todos e efetivamente praticada, indo além do simples discurso,

sustentam as ações de responsabilidade social.

·Nosso maior desafio foi trabalhar no nível da interdependência, ou seja, com toda a equipe comprometida, com a mesma visão de futuro e participando ativamente dela. Posso garantir, sem medo de errar que, atualmente, todos estamos fartos de discursos. promessas mirabolantes. transferências de responsabilidade e pouca ação."

A busca por soluções geradas internamente, justificada por uma condenação

à bibliografia estrangeira como fonte de soluções para problemas tipicamente locais,

aparece na visão do 1° nível de gestores. Destaca-se a valorização da cultura

interna da empresa.

"Livros e conferencistas estrangeiros despejaram aqui idéias e experiências que quase nunca podem ser aproveitadas em nosso país. a menos que sejam devida e corretamente adaptadas à nossa cultura. Esse é um erro que cometemos continuamente, nos traz frustrações e nos faz desistir de ações de fato necessárias. Na Inepar não nos limitamos a copiar idéias e projetos que estejamos utilizando. Alguns projetos foram desenvolvidos intemamente, a partir das necessidades sentidas pelos próprios funcionários. Outros foram baseados nos de diferentes empresas, mas sempre adaptados à nossa realidade e cultura. Realizamos aqui programas com projetos desenvolvidos internamente. por gente bem brasileira. considerando sempre a cultura inepariana, que pode ser resumida no tripé simplicidade, criatividade e ousadia."

6.4.2 A VISÃO DO 20 NíVEL

Nos níveis intermediários a questão da responsabilidade social é

primeiramente comparada a caridade, porém desvinculada de uma atitude

assistencialista, muito associada à necessidade de um preparo interno para seu

pleno exercício, sem o qual perde sua validade.

• ... como disse há muito tempo para um amigo, as empresas não são casas de benesse, do lucro delas nós vivemos, portanto essa deve ser a base de todas relações. Logo, a responsabilidade social das empresas deve começar pela perfeita relação e discernimento entre as pessoas que compõem essas empresas. Somente quando isso for possível e que todos entendam que só quando a empresa for capaz de ter sua capacidade física e relacional interna é que poderá estar preparada para exercer a sua verdadeira responsabilidade social. Qualquer outra coisa, em minha opinião é pura manobra promocional. Portanto, o princípio é bem simples e até mesmo básico, 'Caridade começa em casa'."

Com relação ao exercício da responsabilidade social por parte da Inepar,

novamente procura-se desvincular a sua prática de uma mera questão de filantropia.

Page 144: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

134

"Sim. a Inepar exerce sua responsabilidade social (OI') O que se precisa entender é o que é verdadeiramente responsabilidade social. Precisa-se parar de confundir isso com caridade."

Reconhece-se a atualidade da proposta justificando-se que, há algum tempo

atrás, o tratamento atual dado à responsabilidade social era muitas vezes mal

compreendido. Aqui, a responsabilidade social é assumida como uma técnica de

gerenciamento de relações.

"Embora hoje muito se fale sobre esse assunto, há muito tempo atrás, empresas como a Inepar eram chamadas de loucas ou irresponsáveis, mas na verdade elas já optavam pela maior e melhor técnica de gerenciamento das relações, embora contrária à técnica de mais de 2000 anos. Essa téçniça de 2000 anos é conhecida como o "ver para crer" e a ousadia fez com que elas adotassem a técnica do "crer para ver". (OI') Popularmente falando, não importa colocar todas as bolas na caçapa de uma mesa de bilhar, mas sim afirmar com segurança: 'Bola preta na caçapa do canto!' - essa é, sem dúvida, mais difícil."

Ainda neste nível valoriza-se a importância da "saúde" da empresa, traçando­

se um paralelo entre a responsabilidade do funcionário perante a empresa e a

responsabilidade da empresa perante toda a sociedade.

"É necessário que todo o organismo da empresa esteja plenamente sadio. Uma relação assistencialista (sic), focada em 'emprego' e não em 'trabalho', faz com que as relações entre os profissionais (colaboradores) da empresa participem do sucesso da empresa e de seus programas sociais internos e principalmente os externos. No entanto, isso é facilmente absorvido por todos, quando as empresas estão em projeção ou no topo da escalada do sucesso. Os participantes dessa operação e os postulantes a tal, não se cansam de lutar para obter algum tipo de vínculo com essas empresas, principalmente sob à égide da "obrigação social dessas empresas". Porém, o que é preciso estabelecer, não só para a Inepar, é que a responsabilidade social de cada um dentro da empresa está intimamente ligada a capacidade da empresa em participar fortemente no dia-a-dia da sociedade."

No setor de marketing corporativo a responsabilidade social é colocada como

um conjunto de atitudes que precisa estar presente em todos os níveis da

organização para que seja reconhecida como tal, transformando-se num modelo

justo de transformação social.

"Responsabilidade social é uma atitude corporativa. Para ter sucesso mercadológico e obter lucro, as empresas planejam estrategicamente um conjunto de ações de mercado. ~ responsabilidade social deve permear todo esse conjunto de ações. deve estar impregnada como um valor intangível. deve ocupar o coracão e a cabeça de todos os colaboradores de uma empresa: do guarda ao CEO. Esse sentimento irá certamente recompensar a sociedade de uma forma em geral, pois a construção de um modelo mais justo de relacionamento entre diferentes camadas da população é o pilar mestre do desenvolvimento de uma nação."

Page 145: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

135

Também o marketing valoriza a prática da responsabilidade por parte da

Inepar, destacando sua adoção como política da empresa, embora reconheça

algumas limitações.

"A Inepar é uma empresa pioneira em ações de responsabilidade social. Nos últimos anos estamos enfrentando algumas dificuldades impostas pelo próprio mercado onde atuamos e essas dificuldades impedem que o investimento em projetos de responsabilidade social alcance os níveis desejados. Mas a forte cultura corporativa da Inepar, que mescla profissionais e talentos de várias vocações e diversos lugares do país (e até mesmo de fora do Brasil) facilita."

6.4.3 A VISÃO DO 3° NíVEL

Nos níveis operacionais, percebe-se uma visão de responsabilidade social

calcada no comprometimento e na busca por melhores resultados. Novamente é

destacada a importância do exercício interno da responsabilidade social, com ênfase

às responsabilidade legais e econômicas, como pré-condição à prática de ações

externas.

"Acredito que a responsabilidade social começa com ações na própria empresa. Primeiramente temos que fazer a lição de casa bem feita, ou seja, pagar os impostos corretamente, não poluir, ser transparente. garantir uma boa qualidade no ambiente do trabalho, respeitar os colaboradores, etc. ( ... ) Só dessa forma as empresas conseguirão obter resultados positivos, pois isso gera colaboradores mais comprometidos, clientes fiéis, acionistas satisfeitos. Aí sim, a empresa pode (e deve) colaborar com a comunidade, desenvolvendo projetos, uma vez que ela faz parte dessa comunidade."

o exercício da responsabilidade social por parte da Inepar é reconhecido

mediante a realização de ações internas e externas, ressaltando que a adoção

desse modelo é fundamental ao desempenho da empresa.

"Sim, a Inepar pratica sua responsabilidade social por meio das ações com os funcionários e com a comunidade. ( ... ) A Inepar optou por esse caminho por ser fundamental para um bom desempenho da empresa, proporcionar qualidade no ambiente de trabalho, investir nos colaboradores e na comunidade que ela esta inserida."

6.5 A VISÃO DE MARKETING SOCIAL

A visão referente ao marketing social revela variadas compreensões do

termo, constituindo um conjunto bastante heterogêneo no tratamento da matéria.

Enquanto a responsabilidade social é um tema assumido e discorrido pela maioria

Page 146: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

136

dos entrevistados com absoluta tranqüilidade, o marketing social é tratado com

extremo cuidado e certa inquietação, sendo até mesmo ignorado ou desprezado em

algumas afirmações. Talvez o desconhecimento ou as diferentes interpretações

dadas ao tema sejam as principais causas de posicionamentos distintos e

paradoxais bem como de argumentações contraditórias.

6.5.1 A VISÃO DO 10 NíVEL

A alta administração aborda o tema de maneira cuidadosa, acreditando que o

marketing social deve ser utilizado apenas como um instrumento de comunicação

interna e externa.

"Quanto ao marketing social ( ... ), eu diria que pratica de forma muito básica [referindo-se à Inepar], o suficiente para que este trabalho silVa de satisfação (informação) ao publico interno e externo. Acho que a ênfase deve ser dada à pratica e não ao discurso, o que é muito comum ocorrer. n

Na visão do presidente da Fundação Inepar, a prática do marketing é

rechassada num discurso que procura deliberadamente afastar o exercício da

responsabilidade social do marketing corporativo.

"Não, nós não fazemos marketing social. Se fazemos é conseqüência. Mas não queremos nada com marketing. queremos distância do marketing. Se eles [referindo-se ao marketing] não participam das ações sociais, como é que poderão comunicar devidamente? Fazemos nossas ações, nossos projetos em função da responsabilidade. Usar o marketing para sensibilizar é muito fácil, nós não queremos isso. O ganho de cada um de nós em cada projeto é muito maior, você cresce como pessoa, você melhora, ... é impagável, mas só quem participa sabe. Não adianta eu te contar ... n

Reconhece porém a importância do endomarketing como um instrumento

necessário ao fortalecimento da comunicação interna e o conseqüente crescimento

do conteúdo informado à força produtiva.

"Nunca necessitamos tanto da informação para viver bem como agora. No entanto precisamos de informação com qualidade. O excesso de cultura inútil, além de não agregar valor à sobrevivência, gera custos reais e ocultos insuportáveis na realidade atual do mercado ( ... ) Não é mais possível que as empresas admitam pessoas que não sabem o que fazem ou não conhecem a organização em que trabalham. Por isso investimos grande esforço no planejamento de diversas formas de comunicação dentro da empresa. Na Inepar não há como um funcionário dizer que não ficou sabendo de uma informação importante. Onde quer que ele vá existe algum tipo de veículo comunicador. Até no banheiro. ( ... ) Nosso programa necessitava de altas doses de comunicação, e daquelas bem claras, bem brasileiras, bem compreensíveis. íamos falar de qualidade, produtividade, competitividade, sobrevivência,

Page 147: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

137

crescimento e perpetuidade. Tínhamos de encontrar meios e formas de comunicar o que era preciso da maneira mais inteligível possível.·

6.5.2 A VISÃO DO 2° NíVEL

Nos níveis intermediários, reconhece-se a prática do marketing social por

parte da Inepar, condicionando sua legitimidade quando conseqüência da prática da

responsabilidade social e não como objetivo primeiro da organização.

"Tanto a Inepar, quanto a Siemens Metering 101, e algumas outras empresas, praticam o Marketing Social de maneira clara e objetiva. Há uma demagogia de várias pessoas ou empresas que trabalham esse lado dando a conotação de socialismo puro, doação ou caridade. No entanto essas empresas [referindo-se aqui especificamente à Inepar e à Siemens], procuram estabelecer uma relação clara e participativa e não um assistencialismo barato ou apenas o chavão de responsabilidade social. O marketing obtido pelo tipo de conduta de empresas responsáveis como as que mencionei, são condutas consideradas como conseqüência e não como objetivo."

o setor de marketing, em meio a indagações e questionamentos, afirma a

prática do marketing social por parte da Inepar, caracterizando-a como um complexo

conjunto de ações desenvolvidas pela empresa e desvinculando-a das questões de

filantropia e assistencialismo. Também os funcionários são envolvidos na prática do

marketing social.

"Mas, o que é marketing social? A percepção sobre essa atividade é muito confundida com filantropia e assistencialismo (políticas atreladas ao modelo imposto pelo Estado). Outro dia ouvi um spot na CBN, de uma incorporadora de condomínios horizontais onde ela enaltecia o fato de vender terrenos com araucárias e vista para a Serra do Mar, dizendo que era uma atitude cidadã ... 'isso é compromisso social, é a função social da empresa'. Veja que estupidez, como uma coisa tão séria e relevante é levada para a comunidade. A companhia faz marketing social sim. Ela está preocupada com a situação das famílias dos colaboradores, com as atitudes trabalhistas de seus fornecedores, atenta aos projetos de organizações de classe e ONGs onde o objetivo final é a elevação da qualidade de vida (saúde, alimentação, trabalho, educação ... ) daquele grupo atendido. Praticar marketing social não é patrocinar dois ou três bons programas. Uma companhia voltada pelo social tem que em primeiro lugar consolidar esse atitude internamente. Por isso posso afirmar que não só a Inepar faz marketing social. seus colaboradores são agentes importantíssimos nessa cruzada."

o uso das questões sociais para agregar valor à imagem do Grupo Inepar fica

evidente nas declarações do marketing corporativo.

"A evolução das transações mercadológicas, a globalização e a exigência cada vez maior do çliente em relação ao produto ou ao serviço fornecido foram os principais alavancadores. Não podemos esquecer também que um mercado mais desenvolvido compra mais. Mas a opcão

101 Refere-se aqui a Siemens Metering Ltda., instalada em Curitiba, que tem aliança estratégica com a Inepar.

Page 148: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

138

foi feita [referindo-se às questões de responsabilidade e marketing social] porque a Inepar é uma empresa que precisa constantemente de capital para investimentos e de manter sua posicão entre as principais empresas do seu mercado. Hoje, investidores chegam a pagar mais 20% por ações de empresas declarada e comprovadamente responsáveis: fatores que são bem analisados por instituições financeiras, grandes clientes e potenciais sócios e parceiros externos."

o departamento de marketing reconhece na Fundação Inepar a incumbência

da geração de programas e na atividade do departamento a missão de levar esses

programas ao conhecimento público.

" ... a Fundação Inepar é a locomotiva que gerencia todos programas de responsabilidade social da empresa. Nós somos a ferramenta, o meio de transporte desses projetos para levar até a comunidade, para a opinião pública, para os formadores de opinião. Nós utilizamos muitas das ações que a Inepar vem fazendo através da Fundação para conquistar oportunidades de mídia, interesses de outras empresas, participar de fóruns de discussões a respeito de qualidade total. A gente sempre procurou fazer essa ponte de relacionamento. liA Inepar tem coisas boas, voc6s nlJo querem conhecer?" Fazemos a atração desse interesse público para as ações da Fundação Inepar. Então, como que eu me proponho a trabalhar? Eu me proponho a trabalhar como um consultor de imagem dos próprios projetos da Fundação."

Proporcionar ganhos de imagem é o objetivo do marketing e o exercício da

responsabilidade social não está excluído desse processo.

"O que a gente busca? Busca as melhores oportunidades para alavancar a imagem. Então dentro das diversas ações que a fundação executa, vamos selecionar as melhores oportunidades que irão trazer diferencial para a gente crescer. Colocando isso no debate nos meios de comunicação você acaba atingindo um universo de formadores de opinião qualificados, que geram um share of heart favorável. O objetivo final é associar a marca a uma empresa que investe, que tem um compromisso social bem assumido e definido."

o marketing social é legitimado nas palavras do diretor de marketing

corporativo, que revela não somente uma postura favorável ao seu exercício,

defendendo-o como um instrumento de fomento a outros projetos e ações sociais

por parte de outras empresas, como também destitui a argumentação de posições

contrárias.

"Eu diria o seguinte [referindo-se ao marketing social e às ações de responsabilidade social]: sou totalmente favorável à você utilizar isso como ferramenta de marketing, como ferramenta necessária à valorização empresarial. P6 ... , voc6 está utilizando como arma de propaganda!? [dialogando consigo mesmo] Nada a ver. Ah, mas nlJo é legítimo! Como nlJo é legítimo? Não é questão de legitimidade, é questão de publicidade, tornar público, valorizar. Senão ninguém fica sabendo. Antes era assim: excelentes coisas eram feitas e muito poucas pessoas ficavam sabendo. Isso não é justo porque outras empresas, falando em benchmarking, você vê o que outras pessoas estão fazendo. Com isso você tem condições de ampliar muito mais

Page 149: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

139

as ações de responsabilidade social. Então se você leva isso a público tem grande chance de você estar fomentando outros empresários a fazerem uma parte. atrair políticos para essas questões. Eu combato os autores que querem essa reserva moral. Isso nada mais é que uma reserva moral: " ... nós fizemos isto mas nlJo queremos divulgar". Ótimo, maravilha, vamos estimular que outros façam! Isso não é dar prioridade a pessoas ou ações, é mostrar a essência da empresa, a filosofia progressista de uma companhia que poderia muito bem pegar todo esse investimento que está fazendo e distribuir entre seus sócios. Mas hoje há uma disposição clara de grandes investidores globais que procuram apostar mais em empresas que são socialmente responsáveis. Então. pode parecer sórdido. mas é muito mais importante para a empresa levar isso como uma ferramenta de alavancagem de negócios do que deixar isso adormecido. Divulgando. nós estamos colocando essa responsabilidade em discussão nos jornais. nas rádios."

Também os recentes espaços disponibilizados pela mídia para as questões

de responsabilidade social são valorizados.

"Há mais de uma década a Inepar atua fortemente dentro dessa filosofia, mas só nos últimos três anos a própria mídia - que é o principal agente de difusão - abriu novos espaços e entendeu que essas ações tinham um lado institucional mas tinham um lado social muito mais importante e relevante. Com certeza, dimensão e notoriedade estão diretamente ligados ao sucesso que a empresa pode alcançar em suas divulgações (tanto publicidade, quanto assessoria de imprensa). Na minha opinião, vencida a atual crise, devemos investir mais em publicidade. Não só em propaganda. mas em eventos que reunam outras empresas. em fóruns de discussão ... "

A atual imagem da marca Inepar é compreendida aqui como um reflexo dos

projetos desenvolvidos pela Fundação e o exercício do marketing interno e externo.

"O sucesso da marca Inepar - que vem sendo construída há mais de três décadas - é um reflexo das excelentes ações desenvolvidas pela Fundacão. O reconhecimento pela comunidade e pelos principais agentes de conscientizacão sobre responsabilidade social não poderia ser melhor. A imagem de marca Inepar está muito atrelada ao seu posicionamento como uma empresa cidadã. Nosso consumidor final é uma outra empresa, na maioria das vezes. Essa relação business to business sente ainda mais os reflexos positivos de atitudes socialmente responsáveis, porque o consumidor comum (o povo), ainda por falta de cultura, tem pouca percepção sobre a relevância dessas atitudes. Para o consumidor comum, tudo é obrigação do governo."

6.5.3 A VISÃO DO 30 NíVEL

No nível operacional percebe-se uma visão que avalia a prática do marketing

social a partir do planejamento, implementação e divulgação dos projetos sociais.

Tal concepção revela uma compreensão do termo na sua forma ampliada.

"Sim. com certeza praticamos o marketing social. A Inepar planeja e realiza diversas acões de responsabilidade social tanto para o seu público interno quanto para o externo (muitas delas

Page 150: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

140

inovadoras). Por isso, tomou-se conhecida como uma empresa responsável socialmente, o que consequentemente traz um retomo positivo para sua imagem. O enfoque parte da responsabilidade: o retomo em marketing é conseqüência natural.'

Para uma maior efetividade nesse campo, abre-se a possibilidade da adoção

de uma política de marketing social mais contundente e inclusiva.

"Para que o marketing social seja melhor trabalhado é preciso mais investimentos e o envolvimento de outras áreas da empresa.'

Destaca-se ainda uma familiaridade com o marketing, utilizado como

ferramenta de alavancagem e agregação de valor que pode ser utilizado também em

conjunto com as ações sociais.

"Já que atuamos em diferentes áreas, o que dificulta a compreensão sobre as atividades que efetivamente desenvolvemos por parte do público, nos habituamos a utilizar freqüentemente ferramentas de marketing. Eu acho que agora deveríamos utilizar mais isso para o que estamos promovendo no lado social.'

6.6 A GESTÃO SOCIAL

A questão da gestão social não pode ser avaliada tal como as questões de

marketing social e responsabilidade social desenvolvidas anteriormente com base

em análises documentais e respostas às entrevistas semi-estruturadas. No caso da

gestão social, a análise precisa ser desenvolvida com base nas entrelinhas destas

mesmas entrevistas e principalmente através da observação direta.

Algumas ações têm sido desenvolvidas na Inepar, como a capacitação de

seus profissionais e a abertura de canais de comunicação que permitem uma troca

mais sistemática de informações entre os diversos níveis hierárquicos. Exemplos

são a eliminação do cartão ponto, que permitiu que cada equipe de trabalho ou

célula produtiva melhor estruturasse seus horários e controlasse a assiduidade.

Também o Projeto Ouvir e o Projeto Café com o Presidente, são exemplos dessas

iniciativas. No Projeto Ouvir, uma vez por semana, num encontro de 45 minutos,

cada funcionário conta a seus colegas o que faz, quais são suas idéias e o que pode

ser modificado em seu trabalho, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida na

Page 151: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

141

empresa e aumentar a produtividade. O Projeto Café com Presidente, permite que

20 trabalhadores da fábrica, em grupos predeterminados, tomem seu café da manhã

em companhia do presidente, estimulando o diálogo. Essa iniciativa foi avaliada da

seguinte forma pelo presidente da Fundação Inepar:

"De início, o presidente falava sozinho. Havia receio. insegurança. Mas depois a atividade foi se tornando uma rica fonte de interação. ( ... ) Com uma nova postura, a equipe passa não só a conhecer o que está ocorrendo com os negócios da empresa em todo o mundo como também a colaborar mesmo com ações necessárias para manter a sobrevivência da organização e proporcionar condições de crescimento contínuo."

O discurso dos diretores revela uma predisposição para a adoção da gestão

social, e a conseqüente valorização do elemento humano, como um modelo de

gestão dos negócios da Inepar.

"Hoje está claro para nós da Inepar, que a empresa que ensina está sendo substituída pela empresa que ouve. Somente ouvindo muito podemos ensinar um pouco. Temos muito a aprender com as pessoas. ( ... ) Antigos valores tem sido redescobertos como se fossem novidade. Poucos percebem que a nova ordem mundial está resgatando ensinamentos antigos, que nossos pais, avós e professores já valorizavam. Acredito que as exigências do mercado global não mais permitem que substituamos profissionais experientes por principiantes, que terão de reinventar todas as rodas já consagradas."

O respeito é a base das relações. Tal concepção revela uma perigosa

aceitação do atual quadro, acreditando que este está próximo do ideal.

"Eu acho [referindo-se à interação entre funcionários, subordinados e chefes] que não falta nada. o tempo é quem corrobora qualquer prática de vida ou de gestão. Basta manter a disciplina e não cair em modismos. ( ... ) Não concordo com a sua colocação [referindo-se à questão da gestão social]. Não existe gestão focada nisto ou naquilo, a gestão deve ser focada em tudo que há de melhor, na proporção em que cada aspecto requer. ( ... ) Numa relação convencional dificilmente conquista-se amizade, lealdade, respeito e admiração incondicional de parte à parte. É mera troca de interesses. Numa relação que leve em conta justiça. em primeiro lugar. e o respeito a si mesmo. ao próximo e ao meio compartilhado. interagem fatores morais de valor incomensurável. fora do âmbito materiaL .. Há um poder de realização que não conhece limites ... "

As considerações referentes ao tema pelo pessoal do 2° nível estiveram mais

ligadas aos relacionamentos, mais especificamente às práticas de responsabilidade

social externa, com maior valorização da individualidade perante a interação.

" ... até mesmo o envolvimento dos funcionários... Que qualquer tipo de ação de responsabilidade social hoje, para ter sucesso, ela tem de ter muito mais que uma vontade da empresa, ela tem que ter o comprometimento dos funcionários. Você não faz nada hoje, nenhuma ação de verdadeira responsabilidade social - que tem muita falcatrua por aí - sem o comprometimento deles. O elemento de transformação social é o funcionário. Se você tem esse cara tranqüilo. conquistado. digamos com uma cultura corporativa sólida, cheio de valores definidos. você consegue ... "

Page 152: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

142

Já o 3° nível, quando consultado sobre o tema, revelou preocupação com o

distanciamento entre os diferentes atores e a continuidade das ações.

"Acredito que o comprometimento dos colaboradores e a credibilidade que a empresa conquista são os pontos fortes. Os programas e projetos devem ter continuidade. ( ... ) Muitas vezes não conseguimos o envolvimento dos diretores e gerentes com os demais.·

6.7 A PRÁTICA E O DISCURSO: ANÁLISE E CONSIDERAÇÕES.

A responsabilidade social da Inepar fica evidente tanto no seu discurso como

na sua prática. Embora as concepções a respeito da responsabilidade social

constituam um conjunto quase homogêneo, é possível observar visões um tanto

diferenciadas a respeito do tema. Talvez por tratar-se de uma empresa de capital

aberto, a preocupação com os stakeholders (acionistas, clientes, parceiros,

fornecedores, comunidade e governo) fica bastante evidenciada. Também o

posicionamento é mais enfático, não somente em relação à minoração do impacto

negativo e à maximização do positivo, como principalmente em relação a

sobrevivência da empresa e a perpetuação do negócio. Tais percepções aproximam­

se mais das definições expostas por Ferrei et alli (2001), Lewis e Littler (2001) e

Mclntosh et alli (2001).

o exercício da responsabilidade social novamente extrapola as dimensões

econômicas e legais destacadas por Ferrei et alli (2001), atingindo os níveis éticos e

filantrópicos. Na empresa, a compreensão da responsabilidade social deriva da

missão e visão, estabelecidas no planejamento estratégico, e também das diretrizes

estabelecidas pelo Programa Quero-Quero - marco do início do acelerado

crescimento da Inepar. Tal concepção ainda não se estende na sua totalidade para

as demais unidades da Inepar, reconhecidamente mais atrasadas nas conquistas

sociais internas e principalmente nas ações externas junto à comunidade.

A ênfase no exercício da responsabilidade social por parte da Inepar coincide

com a rápida expansão de seus negócios e áreas de atuação no início da década de

90. Nessa época o tema da responsabilidade social passava a merecer destaque

nas agendas empresariais, nas discussões acadêmicas e na literatura específica. A

opção da empresa foi a imediata estruturação de uma fundação - a Fundação

Inepar, em 1991, e também a criação de uma organização filantrópica sem fins

Page 153: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

143

lucrativos prestadora de serviços de promoção e assistência social para

comunidades carentes, o Departamento de Ação e Promoção Social VÓ Durvina. A

empresa investe paralelamente em ações de filantropia, assistenciais e de auto­

sustentabilidade, sendo estas últimas ainda não tão intensificadas.

A seqüência cronológica da responsabilidade social da empresa também não

coincide com o gráfico de Estágios da Responsabilidade Social Corporativa exposto

por Melo Neto e Fróes (2001), uma vez que as ações externas iniciaram-se quase

que simultaneamente às ações internas, com a implantação de programas de

benefícios para funcionários e seus dependentes. Nessa perspectiva, embora não

fique clara a passagem do 1 ° para o 2° estágio, a Inepar já estaria migrando para o

3° estágio, o da gestão social cidadã. Na avaliação da responsabilidade social

interna, a empresa parece ter dado maior ênfase à gestão de benefícios e

remuneração, à gestão dos direitos dos empregados, à gestão do trabalho e à

gestão do crescimento e desenvolvimento pessoal dos seus funcionários. É preciso

mais uma vez ressaltar que os avanços promovidos pelos programas implantados,

como o Quero-Quero, o PROBEIN, o PAMI, o ParticipAÇÃO, entre outros, não foram

disponibilizados na sua totalidade às outras unidades da empresa, o que faz com

que somente essa Unidade de Curitiba, tema deste estudo de caso, possa ser

avaliada, impossibilitando afirmações e constatações mais generalizadas. Merece

destaque a criatividade do Programa Quero-Quero, com soluções realmente

inovadoras - ainda que muitas vezes inexpressivas, desenvolvidas e implementadas

internamente por membros do quadro funcional da empresa. Também a Fundação

Inepar, coordenadora dos programas, atua ainda estrategicamente, isto é,

distanciada da força produtiva da empresa, estabelecendo soluções pouco

discutidas ou compartilhadas com o restante da organização. Somente nos últimos

meses é que a sede da Fundação Inepar foi transferida para dentro da unidade

industrial da Inepar, pois até então funcionava num outro local próximo ao centro da

cidade.

Embora a atuação junto a comunidade externa seja intensa, não há um

projeto de maior destaque, mas sim uma grande quantidade de projetos menores

desenvolvidos paralelamente. A atuação da Fundação Inepar conta com uma forte

parceria estatal, através das secretarias dos governos municipais e estadual no

Page 154: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

144

desenvolvimento, coordenação e implementação de seus projetos. A Fundação

Inepar é utilizada como instrumento de aproximação com o Estado e também com a

sociedade civil.

Em relação às 14 diferentes visões de responsabilidade social expostas por

Melo Neto e Fróes (2001) puderam ser identificadas na Inepar as seguintes: a

responsabilidade social como atitude e comportamento empresarial ético e

responsável; a responsabilidade social como postura estratégica empresarial

(bastante intensa); a responsabilidade social como estratégia de relacionamento; a

responsabilidade social como estratégia de marketing institucional; a

responsabilidade social como estratégia de valorização das ações da empresa

(agregação de valor); a responsabilidade social como estratégia de recursos

humanos; a responsabilidade social como estratégia de valorização dos

produtos/serviços; a responsabilidade social como estratégia social de inserção na

comunidade; a responsabilidade social como exercício da consciência ecológica; e,

finalmente, a responsabilidade social como exercício da capacitação profissional.

No caso da Inepar, a motivação para o exercício da sua responsabilidade

social aproxima-se mais da linha instrumental, de acordo com a categorização

proposta por Ashley (2002). A empresa utiliza claramente a responsabilidade social

como forma de melhorar sua reputação, despertar a atenção de investidores e

diferenciar-se de seus competidores menos responsáveis socialmente, buscando

não somente uma maior consciência sobre questões culturais, sociais e ambientais,

como também a atração de melhores profissionais para seus quadros e a sua

valorização quando do estabelecimento de parcerias. Na Inepar, a responsabilidade

social está fortemente atrelada à lógica econômico-financeira da empresa.

A questão do marketing social na Inepar é bastante delicada. Foram

constatadas visões diferenciadas e, em certos casos, até mesmo contraditórias. O

marketing social foi por vezes negado, criticado, apontado como mera conseqüência

do exercício da responsabilidade social, e por outro lado foi também ressaltado,

enaltecido e apontado como um poderoso instrumento de agregação de valor à

marca Inepar. Isso compromete um claro entendimento do tema e distancia sua

prática cotidiana do discurso de seus atores. As visões demonstradas pelo marketing

Page 155: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

145

e pela presidência da fundação são antagônicas. Na verdade, a percepção

demonstrada por um destes atores chega a ser paradoxal quando reivindica, em seu

discurso, um maior distanciamento do marketing como garantia de legitimidade das

ações de responsabilidade social e, na prática, compartilha decisões com o

Departamento de Marketing, como a elaboração do Balanço Social da empresa ou a

estruturação de campanhas publicitárias de cunho social.

Mesmo com estas distorções, é inegável a prática do marketing social como

estratégia corporativa. A existência do departamento de marketing e a proximidade

deste com a Fundação Inepar demonstra uma certa profissionalização e atesta este

tipo de opção por parte da empresa. Ainda não há uma estrutura aperfeiçoada capaz

de cumprir todas as etapas de administração do marketing social, principalmente em

relação a mensuração de alguns resultados de projetos específicos, planejamento

de diferentes projetos simultâneos, pré-testes e ações de comunicação externa.

Também as pessoas que compõem a estrutura da Fundação Inepar estão dispersas

por vários departamentos, o que pode dificultar a consecução dos objetivos e a

implementação de certos programas, conforme salientado por Kotler e Roberto

(1992). Entre as modalidades de marketing social citadas por Melo Neto e Fróes

(1999) a Inepar pratica o marketing de filantropia, o marketing de patrocínio de

projetos sociais (próprios e de terceiros), o marketing de relacionamento com base

em ações sociais - bastante intensificado, e, em menor grau, o marketing de

promoção social da marca.

o endomarketing é bastante trabalhado, não somente como instrumento de

promoção da causa social, mas principalmente utilizado na comunicação dos valores

da empresa a seus funcionários. A existência de um balanço social, publicado

sistematicamente nos últimos 4 anos, auxilia nos aspectos de avaliação e controle

das ações sociais. A mensuração, seguindo o modelo proposto pelo Ibase, é

estruturada de maneira a cumprir com suas exigências. Isso facilita a percepção por

parte de todos (acionistas, diretores, fornecedores, mídia, funcionários, entre outros)

dos resultados do exercício da responsabilidade social. A publicação de um balanço

social de cifras elevadas (no Balanço Social da Inepar são incluídas quase todas as

Page 156: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

146

empresas ligadas ao grupo) atrai a atenção da opinião pública e dos principais

veículos da mídia. Aliado a isso tudo, uma assessoria de imprensa bem organizada,

vigilante e ativa, fornece informações complementares e garante espaços gratuitos

para a divulgação de programas e projetos da empresa. Também a constante

participação do presidente da Fundação Inepar e, em menor grau, do diretor de

Marketing Corporativo em eventos, tais como palestras, conferências e debates,

ligados ao tema da responsabilidade social, contribuem para o fortalecimento da

imagem da Inepar como uma organização socialmente responsável. No caso da

Inepar, é visível a intenção em associar a imagem da empresa à causa social como

forma de atração de capital, valores, investidores, profissionais capacitados, enfim,

como instrumento estratégico de agregação de valor à marca.

Além da necessidade de ampliação da compreensão do conceito de

marketing social nos diferentes setores da empresa, aparece a necessidade de uma

estruturação mais profissionalizada do marketing social. Ressalta-se também a

importância da extensão das conquistas internas da Unidade Industrial de Curitiba

às outras unidades do Grupo Inepar como forma de aliar valores de eqüidade e

justiça à cultura corporativa, já que o discurso feito em nome do Grupo Inepar, serve

apenas à realidade da unidade instalada na CIC.

Page 157: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

147

CONCLUSÃO

Este capítulo é reservado à conclusão acerca dos resultados dos estudos

realizados. Com base nas percepções e deduções obtidas são feitas

recomendações no sentido de contribuir com a evolução da discussão referente aos

temas abordados e seu fortalecimento, não somente nas empresas estudas como

também em outras organizações que estejam vivenciando estágios similares da

prática social. Também são indicadas sugestões para o desenvolvimento de novas

pesquisas.

As novas racionalidades econômicas e sociais impostas pelo paradigma da

Sociedade Pós-Industrial estabelecem um novo modelo de relacionamento entre

governo, iniciativa privada e sociedade civil. O agravamento dos problemas sociais e

o reconhecimento da incapacidade do Estado no gerenciamento de soluções

eficazes exige uma revisão de conceitos e uma maior mobilização do segundo e

terceiro setores no enfrentamento de tais circunstâncias. A reversão dos atuais

quadros de violência, miséria, fome, desnutrição, analfabetismo, entre outros

problemas, mais agravados nos países periféricos, só é possível a partir de uma

união de forças e de um adequado planejamento dos esforços conjuntos. Muitas

empresas atuantes no mercado brasileiro já despertaram para esse novo

posicionamento, reconhecendo seu papel perante a sociedade, buscando soluções

inovadoras e transformadoras.

Novos conceitos, novas fórmulas, novos caminhos precisam ser

desenvolvidos para alicerçar essa nova configuração que determina, entre outras

coisas, uma profunda alteração nos relacionamentos. Entre os novos termos

encontram-se a gestão social, a responsabilidade social e o marketing social. A

noção de responsabilidade social difere no espaço e no tempo, variando conforme a

organização, a comunidade, a região, o país e principalmente de acordo com as

circunstâncias históricas e ambientais experimentadas. Na literatura específica, o

Page 158: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

148

tema vem ganhando amplitude e profundidade. Trata-se realmente de um conceito

em formação, que merece amplo debate e a abertura de novos canais de discussão.

Ainda que existam posicionamentos contrários, já é possível a identificação de

inúmeros pontos comuns entre os principais autores contemporâneos favoráveis ao

tema. Essas similitudes são muitas vezes verificadas na prática das empresas que,

na sua busca pelo exercício da cidadania corporativa, acabam por transferir,

exercitar e disseminar esse padrão de comportamento no seu cotidiano.

As unidades industriais estudadas, das empresas Bosch e Inepar, realmente

exercitam sua responsabilidade social, ainda que de maneiras distintas. Nas

empresas analisadas nestes estudos de caso, o exercício da responsabilidade social

é atestado a partir do desenvolvimento de ações que revelam suas

responsabilidades éticas e filantrópicas, extrapolando suas responsabilidades

econômicas e legais. Ambas investiram em programas de benefícios ligados à saúde

e à educação de seus funcionários e dependentes, programas de integração e

estímulo da força produtiva e programas de participação nos resultados da empresa.

Com isso foram além daquilo estabelecido por lei ou promovido por outras

organizações. E esse é o primeiro passo: a compreensão dos dirigentes da empresa

(e posteriormente de todos os seus integrantes) de que a organização precisa

expandir seus deveres perante a sociedade, precisa interagir com as comunidades

próximas provendo-as com iniciativas e soluções eficazes. Parece ser este o

caminho para a sobrevivência das empresas num ambiente competitivo e turbulento,

de racionalidades antagônicas e disparidades assustadoras. A corporação passa a

dedicar maior atenção a aspectos outrora desprezados, como a educação

continuada, a valorização da cidadania e o estímulo ao trabalho voluntário.

Fica claro que a busca pela cidadania corporativa inicia-se com o exercício da

responsabilidade social interna. Embora seja consensual a compreensão das

empresas como partes integrantes de um ambiente maior, peças fundamentais no

Page 159: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

149

cotidiano das comunidades, é na dimensão interna que devem ser fortalecidas as

bases para o desenvolvimento de programas sociais. É interessante que os níveis \

inferiores entrevistados nas organizações estudadas demonstram uma grande

valorização das ações externas, enquanto os níveis superiores concentram-se mais

especificamente nos resultados internos. Somente com seus funcionários satisfeitos,

seguros, motivados e comprometidos, a empresa torna-se capaz de exercitar sua

responsabilidade social além dos seus limites, com ações e práticas externas, na

busca pela gestão social cidadã.

A Unidade de Curitiba da Bosch revelou, através de suas ações e das

declarações de seus dirigentes e funcionários, uma percepção quase homogênea do

conceito de responsabilidade social. Tanto a alta administração, como os níveis de

chefia e operacionais acreditam que o exercício da responsabilidade social deve

contemplar as dimensões interna e externa. A empresa primeiramente enfocou a

dimensão interna, trabalhando numa série de benefícios e programas para seu

quadro funcional, para somente numa fase posterior investir em ações externas.

Também observa-se uma diminuição de suas ações puramente filantrópicas e

assistenciais ao lado de uma intensificação das ações de auto-sustentabilidade, o

que revela um amadurecimento do pensamento corporativo. Existe claramente um

foco - o da educação - nos programas mais recentes implementados pela empresa.

Observa-se que as ações vêm sendo aprimoradas e executadas sempre com muita

cautela, demonstrando uma visão de médio e longo prazos. O Projeto Peça por

Peça constitui um programa bastante denso, bem embasado e ambicioso, que

objetiva claramente uma profunda mudança social numa comunidade próxima. O

crescente envolvimento com a comunidade da Vila Verde tem processado

importantes mudanças internas. Nesse caso, a responsabilidade social e o

marketing social têm sido utilizados como estratégias sociais de inserção na

comunidade, despertando a consciência ecológica e levando noções de saúde,

Page 160: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

150

higiene, saneamento e cidadania para os moradores do bairro. A valorização da

capacidade criativa do público interno tem sido verificada a partir da clara opção por

projetos próprios. O fortalecimento dos programas possibilitou a criação de uma

ONG, o Grupo de Voluntários Bosch. Com isso, a gestão das ações de

responsabilidade social, principalmente das práticas externas, vem migrando do

Departamento de Recursos Humanos para o Conselho de Voluntários, administrado

por funcionários de diferentes setores. Os programas desenvolvidos pela Bosch têm

despertado a atenção de toda a comunidade e também das outras unidades

industriais da corporação espalhadas pelo Brasil, que passarão a adotar o exemplo

curitibano como modelo corporativo.

Também na Unidade de Curitiba da Inepar, a percepção do conceito de

responsabilidade social, revelada através de suas ações e das declarações de seus

dirigentes e funcionários, demonstrou uma visão quase consensual, em consonância

com o apresentado pela literatura atual. A rápida expansão dos negócios da

empresa fez com que as ações sociais internas e externas se desenvolvessem

simultaneamente. As bases do Programa Quero-Quero constituem os principais

alicerces das ações sociais. A empresa optou pela rápida estruturação de uma

fundação e de uma organização filantrópica sem fins lucrativos, profissionalizando o

gerenciamento da prática social. Também verifica-se uma forte parceria com o

Estado no desenvolvimento e patrocínio de ações. Entretanto, não há um foco

específico nas ações sociais desenvolvidas pela Inepar. A empresa investe em

diferentes programas simultâneos, de curto e médio prazos, bastante dispersos, que

acabam por não permitir a identificação de uma clara linha de ação. As ações de

auto-sustentabilidade junto às comunidades ainda não constituem um conjunto

representativo se comparado às ações puramente filantrópicas e assistenciais. Ainda

assim, a empresa tem se destacado regionalmente e nacionalmente aparecendo em

inúmeras publicações que ressaltam sua prática e seu comprometimento social.

Page 161: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

151

A motivação para o exercício da responsabilidade social parece ter seu maior

componente na linha instrumental, buscando de início a atração de profissionais

mais capacitados para os quadros funcionais, o surgimento de novos canais

motivadores internos, a diferenciação perante empresas menos responsáveis

socialmente e a agregação de valor à imagem da empresa. No caso da Inepar isso

fica muito evidente, principalmente na visão do Marketing Corporativo. No caso da

Bosch, embora inicialmente utilizada como estratégia de recursos humanos, a

responsabilidade social também revela um componente ético, derivado das posturas

adotadas por seu fundador, Robert Bosch. Contudo, qualquer que seja a linha de

motivação, as ações sociais desenvolvidas por ambas (Bosch e Inepar) são

autênticas e têm gerado resultados. Interna ou externamente os programas vêm

sendo sistematicamente implementados formando inúmeros grupos beneficiados. Há

uma predisposição para a continuidade e intensificação dos programas.

A questão do marketing social não pode ser avaliada da mesma maneira. O

tema ainda é abordado de forma superficial na literatura específica. Quando

aprofundado por determinado autor, refere-se a uma modalidade, como o marketing

de causa por exemplo, o que não permite um entendimento global do conceito.

Possivelmente em razão disso, aliado às constantes discussões sobre o escopo do

próprio 'marketing' em si e às críticas freqüentes sobre seu papel na sociedade,

surge um conjunto bastante heterogêneo de posicionamentos e opiniões a respeito

do marketing social. Enquanto todos os entrevistados revelaram posicionamentos

favoráveis ao tema da responsabilidade social, o marketing social foi negligenciado

ou desprezado por alguns, enaltecido e valorizado por outros e ainda por vezes

duramente criticado. Torna-se impossível a estruturação de uma política de

marketing social coerente e consistente se a visão a respeito do tema é difusa.

Verifica-se também que o marketing social está muito associado a visão de

publicidade e comunicação externa, que é apenas um de seus componentes.

Page 162: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

152

As duas unidades industriais estudadas praticam o marketing social, ainda

que muitas vezes revelem um desconhecimento do assunto ou neguem seu

exercício. Nesse aspecto, a prática e o discurso divergem não somente dentro de

cada uma das organizações como também entre elas. Possivelmente, práticas

oportunistas de marketing social sejam as principais responsáveis pela rejeição e

desconforto que o tema ainda provoca em algumas pessoas. Entretanto, nos casos

da Bosch e da Inepar o exercício de uma responsabilidade social autêntica,

interessada e comprometida com a transformação social, legitima o uso do

marketing social.

A Bosch tem desenvolvido ações como a análise do ambiente, pesquisa

acerca da população de adotantes escolhidos como alvo e o planejamento de

programas, que caracterizam etapas do processo de administração do marketing

social. Mesmo assim, os programas ainda não são tratados da maneira indicada

pela literatura. Não existe um setor ou uma estrutura profissionalizada para o

atendimento do marketing social. Os programas desenvolvidos pela Unidade de

Curitiba da Bosch contam, na sua comunicação, apenas com o suporte de uma

jornalista interna, que desenvolve o trabalho de assessoria de imprensa, e de uma

pequena agência de comunicação, acionada esporadicamente. Se tratados de

maneira adequada, os programas da Bosch poderiam ganhar maior dimensão e

notoriedade, conquistando melhores espaços na mídia, atraindo novos parceiros e

promovendo novas discussões sobre os temas sociais. Mesmo que essa não seja a

intenção da alta direção, um correto uso do marketing social poderia estimular outras

empresas a adotarem ou desenvolverem programas similares junto a seus

funcionários e comunidades próximas.

Também preocupa, no caso da Bosch, a centralização do marketing e da

assessoria de imprensa corporativa na matriz de Campinas. O fato daquela unidade

não vivenciar as ações sociais aqui praticadas e o seu distanciamento da unidade

Page 163: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

153

curitibana podem significar a perda de determinados valores na comunicação. A falta

de estruturação de um setor profissionalizado de marketing social também reflete no

endomarketing da empresa. Há ainda uma grande parcela de funcionários que não

participa das ações sociais externas. O marketing interno deveria intensificar seus

esforços para atrair as lideranças e as gerências que ainda não aderiram à causa

social e não estimulam suas equipes a participarem de tais ações. Por fim, a não

publicação de um Balanço Social também mereceria ser melhor avaliada como

instrumento de mensuração, aferição e divulgação das ações desenvolvidas pela

empresa.

O fato de ter seu desenvolvimento coordenado pelo trabalho conjunto da

Fundação Inepar e do Departamento de Marketing Corporativo, numa primeira

análise, pode induzir à constatação de um marketing social bem ordenado na Inepar.

Ainda assim, a estrutura atual não é suficiente para o cumprimento de todas as

etapas do processo de administração do marketing social. Mesmo apresentando

visões contraditórias a respeito do tema, a Inepar claramente utiliza o marketing

social como postura estratégica empresarial e como estratégia de agregação de

valor às ações da empresa. A publicação anual de um balanço social impõe a

necessidade de aferição de alguns índices, o que facilita a visualização dos

resultados. A comunicação interna é bastante desenvolvida, com a existência de

canais de comunicação diferenciados. Por outro lado percebe-se uma perda de foco

que reflete no marketing interno, com pouca mobilização de pessoal, dispersão e

descontinuidade das ações. Não há um ponto de convergência envolvendo os

principais programas, fazendo com que sejam desenvolvidas uma grande variedade

de práticas, muitas das quais apresentando resultados inexpressivos, efêmeros e

questionáveis. Algumas dificuldades financeiras experimentadas por parte do grupo

refletiram sensivelmente em algumas ações de marketing social inicialmente

planejadas, que precisaram ser interrompidas. Embora as conquistas sociais sejam

Page 164: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

154

mais avançadas na Unidade Industrial de Curitiba, na divulgação na mídia de massa

a marca Inepar é utilizada para representar todo o Grupo Inepar. Isso pode gerar

certo desconforto por parte dos funcionários (e seus dependentes) das outras

unidades e impossibilitar o fortalecimento de uma cultura corporativa sólida.

Em relação à gestão social, mesmo que ela não constitua a principal fonte de

motivação da prática social, as ações de responsabilidade social e marketing social

podem vir a constituir importantes instrumentos para seu fortalecimento. As

aceleradas mudanças processadas no ambiente provocam nas pessoas uma maior

incerteza em relação ao futuro. A necessidade de interação entre indivíduos de

diferentes setores, de diferentes níveis e com interesses variados, exige um melhor

preparo argumentativo, favorece o entendimento e a confrontação de perspectivas

diversas. Nessa linha, a prática da responsabilidade social tem provocado, seja por

meio do trabalho voluntário ou da integração de diferentes setores, no mínimo, um

aumento da percepção das condições sociais e dos mecanismos de reversão dos

quadros atuais por parte dos envolvidos.

Numa visão crítica os benefícios internos podem ser considerados paliativos,

mas deve-se reconhecer que, comparado ao passado, muito já tem sido feito. Se a

qualidade de vida pode melhorar através de benefícios e ações internas, sem

dúvida, a valorização da cidadania tem na prática da responsabilidade social externa

e do marketing social seus principais propulsores. A prática externa constitui uma

significativa aposta na cidadania, inibindo a coação, promovendo o agir comunicativo

e aumentando a base de conhecimentos. O marketing social, atuando interna ou

externamente, pode mobilizar um maior número de pessoas e acelerar esses

resultados. As questões sociais merecem e precisam ser tratadas com

profissionalismo em seu planejamento, implementação, controle, avaliação e

divulgação. Logicamente, a busca pela gestão social constitui um lento processo,

\

Page 165: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

155

mas a proposta de reconstrução do conhecimento a partir da produção social tem

sido aceita. Resta estendê-Ia a outros níveis e setores da organização.

O crescente exercício da responsabilidade social e da prática do marketing

social abre perspectivas para inúmeras pesquisas. Replicar o presente estudo em

outras unidades industriais permitiria a confrontação de novos pontos comuns ou

distintos. Em organizações mais avançadas no exercício do marketing social, podem

vir a ser desenvolvidas pesquisas quantitativas e qualitativas para se verificar o grau

de agregação de valor à marca da empresa a partir das práticas sociais, tanto junto

ao seu público interno como externo. Em maiores horizontes de tempo, também a

contribuição da responsabilidade social e do marketing social para a consolidação

da gestão social e tomada de decisões organizacionais apresenta-se como um tema

merecedor de investigações. Por fim, iniciativas que contribuam para o

aprofundamento global das questões referentes ao marketing social devem ser

consideradas, face a dispersão desse tema na literatura específica.

De maneira geral pode-se afirmar que o conceito de responsabilidade social é

melhor compreendido e trabalhado no ambiente das empresas. Já o conceito de

marketing social constitui um território praticamente inexplorado, carente de

melhores definições, muitas vezes injustamente criticado ou desprezado. O caminho

porém, para que responsabilidade social e marketing social constituam um conjunto

coeso a serviço da mudança social, parece estar aberto. O aprendizado da

responsabilidade social já foi iniciado pelas empresas e vêm se fortalecendo tanto

no ambiente empresarial como no acadêmico. O marketing social precisa acelerar

seu desenvolvimento dentro desta mesma trajetória, para que as práticas sociais

sejam melhor disseminadas e compreendidas, constituindo assim significativos

exemplos passíveis de serem replicados ou aprimorados.

Compreende-se que a cidadania corporativa é resultado da valorização da

cidadania de todos os indivíduos, não somente daqueles que compõem os quadros

\

Page 166: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

156

da empresa. Filantropia e ações assistenciais de curto prazo já não constituem a

melhor solução. É preciso o desenvolvimento de ações de auto-sustentabilidade,

com uma visão de longo prazo e um maior comprometimento entre as partes. A

responsabilidade social e o marketing social constituem elementos essenciais na

consolidação desse pensamento. Só assim, num país refém da degradação social,

pressionado por interesses políticos e econômicos diversos, pode-se visualizar uma

sociedade mais igualitária.

\

Page 167: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

157

7 BIBLIOGRAFIA

ALVESSON, Mats; DEETZ, Stanley. Teoria crítica e abordagens pós-modernas para estudos organizacionais. In: CLEGG, Stewart R. et aI. (Org.) Handbook de estudos organizacionais. 1 Ed. São Paulo, Atlas, 1998, Vol. 1. p. 227-266

ALVES-MAZZOTTI, Alda Judith; GEWANDSZNAJDER, Fernando. O método nas ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. São Paulo: Pioneira, 1999.

AMATO, Mário. Terceirizar o social. Folha de São Paulo. 13 jan. 2000.

ARAÚJO, Anna Gabriela. A hora e a vez do marketing social. Revista Marketing, São Paulo, n. 331, p. 42-51, ago. 2000.

ASHLEY, Patrícia Almeida (Org). Ética e responsabilidade social nos negócios. São Paulo: Saraiva, 2002.

BORBA, Elisabete Regina de Lima; BORSA, Lenyr Rodrigues; ANDREATTA, Roldite. Terceiro setor: responsabilidade social e voluntariado. Curitiba: Champagnat, 2001.

BROCCHIERI, Giovanna Scarpitti. Jungk: o homem do milênio. In: DE MASI, Domenico (Org.) A sociedade pós-industrial. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 1999. p. 425-436.

CAPPELLlN, Paola; GIULlANI, Gian Mario. Compromisso social no mundo dos negócios. Boletim do Ibase. Ano 6, nO 11, p. 10-11, fev. 1999.

CARDOSO, Adalberto Moreira. Trabalhar, verbo intransitivo: destinos profissionais dos deserdados da indústria automobilística. Rio de janeiro: Editora FGV, 2000.

CHURCHIL Jr., Gilbert A.; PETER, J. Paul. Marketing: criando valor para o cliente. São Paulo: Saraiva, 2000.

- D'AMBRÓSIO, D.; MELLO, P. C. A Responsabilidade que dá retorno social. Gazeta Mercantil. São Paulo, 10 novo 1998.

DE MASI, Domenico (Org.) A sociedade pós-industrial. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 1999.

DI NALLO, Egeria. Meeting Points. São Paulo: Marcos Cobra, 1999.

DINIZ, Eli. Globalização, reformas econômicas e elites empresariais. Rio de janeiro: Editora FGV, 2000.

Page 168: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

158

DRUCKER, Peter Ferdinand. Administração de organizações sem fins lucrativos. 4 Ed. São Paulo: Pioneira, 1997.

___________ . Desafios gerenciais para o século XXI. São Paulo: Pioneira, 1999.

___________ . O futuro já chegou. Revista Exame Digital, São Paulo, 22 mar. 2000.

DUNN, Robert. Quer uma vantagem competitiva? Revista Exame. Ano 32, nO 18, 26 ago.1998.

DUPAS, Gilberto. O lugar vazio do espaço público. Caderno Espaço Aberto. O Estado de São Paulo. São Paulo, p. 1, 12 jan. 2002.

EASTERBY-SIMITH, Mark; THORPE, Richard; LOWE, Andy. Pesquisa gerencial em administração: um guia para monografias, dissertações, pesquisas internas e trabalhos em consultoria. São Paulo: Pioneira, 1999.

FERREIRA, Ademir Antônio; REIS, Ana Carla Fonseca; PEREIRA, Maria Isabel. Gestão empresarial: de Taylor aos nossos dias. São Paulo: Pioneira, 1997.

FERREL, O. C.; FRAEDRICH, John; FERREL, Linda. Ética Empresarial. Rio de Janeiro: Reichmann & Affonso, 2001.

FONTANA, Alessandra; DE MARI, Juliana. Você é do bem? Revista Você 5. A. São Paulo, n. 30, p. 24-35, dez. 2000.

GRAJEW, Oded. O futuro está em nossas mãos. Guia para fazer o bem. Revista Veja, São Paulo, n. 51, p. 30, dez. 2001.

GRÓNROOS, Christian. Internai Marketing: theory and practice. In: BLOCH, T. M.; UPAH, G. D.; ZEITHALM, V. A. (Orgs.). Services marketing in a changing environment. Chicago: American Marketing Association, 1985, p. 41-47.

GRÓNROOS, Christian. Marketing: gerenciamento e serviços. Rio de Janeiro: Campus, 1995.

HALBERT, M. The meaning and sources of marketing theory. Marketing Science Institute Series. New York: McGraw-Hill, 1965.

HENDERSON, David. Misguided Virtue: False Notions of Corporate Social Responsability. IEA Hobart Paper. Londres, n. 142, 05 novo 2001.

íBIDE, Mário. Vale a pena investir nos projetos sociais e cativar o público. Caderno Empresa & Comunidade. Valor Econômico. São Paulo, nO 412, 20 dez. 2001. Disponível em: <http://www.valoronline.com.br/valoreconomico/materia.asp?id=988191 > Acesso em: 25 jan. 2002.

Page 169: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

159

KANITZ, Stephen. O manual da Cidadania. Guia da Cidadania. Almanaque Abril 2001. São Paulo, p. 74-75, 2001.

KOTLER, Philip. Administração de marketing: a edição do novo milênio. São Paulo, Prentice Hall, 2000.

KOTLER, Philip; ARMSTRONG, Gary. Princípios de marketing. Rio de Janeiro: Prentice Hall, 1993.

KOTLER, Philip; ROBERTO, Eduardo L. Marketing social: estratégias para alterar o comportamento público. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

LESSA, Ricardo. Marketing social melhora a imagem e aumenta o lucro. Gazeta Mercantil. São Paulo, p. 22, 7 fev. 2002.

LEVITT, Theodore. Marketing myopia. Business classics: fifteen key concepts for managerial success. Harvard Business Review. Boston, p. 1-12, 1991.

LEWIS, Barbara R; LlTTLER, Dale. (Org.) Dicionário Enciclopédico de Marketing. São Paulo: Atlas, 2001.

LOVELOCK, Christopher; WRIGHT, Lauren. Serviços: marketing e gestão. São Paulo: Saraiva, 2001.

MATIAS, Antônio Jacinto. A responsabilidade das empresas. Gazeta Mercantil. São Paulo, 30 set. 1999. Opinião, p. A-2.

MCINTOSH, Malcolm; LEIPZIGER, Deborah; JONES, Keith; COLEMAN, Gill. Cidadania corporativa: estratégias bem-sucedidas para empresas responsáveis. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2001.

MELO NETO, Francisco Paulo de, FROES, César. Responsabilidade social e cidadania: a administração do 3° setor. Rio de Janeiro: Editora Qualitymark, 1999.

___________________ . Gestão da responsabilidade social coorporativa: o caso brasileiro. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2001.

PINTO, Christina Carvalho. Valor ou Modismo? O marketing social deve ser um reflexo da personalidade da empresa. Guia Exame de Boa Cidadania Corporativa. Revista Exame, São Paulo, n. 754, p. 28, 29 novo 2000.

PIOVESAN, Flávia. Cidadania no Brasil: o que diz a lei. Guia da Cidadania. Almanaque Abril 2001. São Paulo, p. 12-13, 2001.

~("'" PRINGLE, Hamish; THOMPSON, Marjorie. Marketing social - marketing para .I causas sociais e a construção das marcas. 1. Ed. São Paulo: Maj<ron Books,

2000. //

Page 170: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

160

"J.-e- REINERT, Helô. Vale a pena investir nos projetos sociais e cativar o público. . Caderno Empresa & Comunidade. Valor Econômico. São Paulo, nO 412, 20

dez. 2001. Disponível em: <http://www.valoronline.com.br/valoreconomico/materia. asp?id=988191 > Acesso em: 25 jan. 2002.

RIFKIN, Jeremy. O Fim dos Empregos. São Paulo: Editora Markron Books, 1995.

ROCHA, Renato Requião Munhoz da. Caso Inepar: por que deu certo? 3. Ed. São Paulo: Editora Gente, 1998.

ROSEMBLUM, Célia. Imagem social da empresa influencia na hora da compra. Caderno Especial Empresa & Comunidade. Valor Econômico. São Paulo, n.31 , p.1, 13 jun. 2000.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de alice: o social e o político na pós modernidade. 5. Ed. São Paulo: Cortez, 1999.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 21. Ed. São Paulo: Cortez, 2000.

SILVA, João Martins da. 5S: o ambiente da qualidade. Belo Horizonte: Fundação Christiano Ottoni, 1994.

SILVEIRA, Mauro. Uma nova profissão à vista. Revista Você S. A., São Paulo, n. 20, p. 54-59, fev. 2000.

'7 _ SINA, Amalia; SOUZA, Paulo Sérgio Baptista de. Marketing social: uma . oportunidade para atuar e contribuir socialmente no terceiro setor. São

Paulo: Crescente Editorial, 1999.

SOUZA, Herbert de. Empresa Pública e Cidadã. Folha de São Paulo. 27 mar. 1997.

_______ . Balanço Social: voluntário ou obrigatório ? Folha de São Paulo. 07 abro 1997.

,-----SUCUPIRA, João. A responsabilidade social das empresas. Boletim do Ibase. Ano 6, nO 9, 1999. Disponível em: <http://www.balancosocial.org.br/bib05.html> Acesso em 14 fev. 2002.

TENÓRIO, Fernando Guilherme. O mythos da razão administrativa. Revista de Administração Pública, FGV/EBAP, Rio de Janeiro n. 27(3), p. 5-14, jullset. 1993.

. Gestão Social: uma perspectiva conceitual. Revista de Administração Pública, FGV/EBAP, Rio de Janeiro n. 32(5), p. 7-23, seUout. 1998.

Flexibilização organizacional, mito ou realidade? Rio de Janeiro: Editora FGV, 2000.

Page 171: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

161

-" TORRES, Ciro. Responsabilidade social e transparência. Boletim do Ibase. Ano 6, nO 10, 1999. Disponível em: <http://www.balancosocial.org.br/bib06.html> Acesso em: 14 fev. 2002.

VALLE, Rogério. A crise do taylorismo. Revista de Administração Pública, FGV/EBAP, Rio de Janeiro n. 27(4), p. 5-10, ouUdez. 1993.

VASSALO, Cláudia. Um novo modelo de negócios. Guia Exame de Boa Cidadania Corporativa. Revista Exame, São Paulo, n. 728, p. 8-11, 29 novo 2000.

VERGARA, Sylvia Constant. Projetos e relatórios de pesquisa em administração. 3. Ed. São Paulo: Atlas, 2000.

YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 2. Ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.

t Sites consultados:

www.balancosocial.org.br- Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas

www.bsr.org - Business for Social Responsability

www.ethos.org.br -Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social

www.filantropia.org - Stephen Kanitz

www.fundabrinq.org.br- Fundação ABRINQ

www.iea.org.uk - Institute of Economic Affairs

www.inepar.com.br- Grupo Inepar S/A

www.synethos.org - International Society of Business, Economics and Ethics

www.valoronline.com.br- Jornal Valor Econômico

Page 172: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

162

ANEXOS

Page 173: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

ANEXO 1 - Roteiro da entrevista semi-estruturada aplicada na Bosch.

A) IDENTIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO

Nome.

Qual(is) o cargo(s) que ocupa? Qual setor?

Qual a sua formação?

Há quanto tempo está na empresa?

B) PERGUNTAS

1. Como você compreende a responsabilidade social de uma empresa?

163

2. Na sua opinião, como a BOSCH vem exercendo a sua responsabilidade

social?

3. Como você compreende o termo 'marketing social' ?

4. Você considera que a BOSCH pratica o marketing social?

5. O que você entende por gestão social?

6. Quais os pontos fortes e fracos da gestão focada no social, da prática social

atual da sua empresa ?

7. Na sua opinião, o que falta para que os programas e ações hoje

desenvolvidos pela BOSCH, ganhem maior expressividade, dimensão e/ou

notoriedade?

8. Na sua opinião, quem são os maiores beneficiados pela adoção de um

modelo de gestão baseado em ações sociais?

9. Porque a BOSCH, na sua opinião, optou por esse caminho?

10. Qual o impacto da gestão social (dos programas e ações sociais

desenvolvidos pela BOSCH) para a imagem da BOSCH perante a

comunidade? Quais os reflexos dessas ações para a marca BOSCH perante

o consumidor final?

Page 174: RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING SOCIAL DOIS

ANEXO 2 - Roteiro da entrevista semi-estruturada aplicada na Inepar.

A) IDENTIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO

Nome.

Qual(is) o cargo( s) que ocupa? Qual setor?

Qual a sua formação?

Há quanto tempo está na empresa?

8) PERGUNTAS

1. Como você compreende a responsabilidade social de uma empresa ?

164

2. Na sua opinião, como a INEPAR vem exercendo a sua responsabilidade

social?

3. Como você compreende o termo 'marketing social' ?

4. Você considera que a INEPAR pratica o marketing social?

5. O que você entende por gestão social?

6. Quais os pontos fortes e fracos da gestão focada no social, da prática social

atual da sua empresa ?

7. Na sua opinião, o que falta para que os programas e ações hoje

desenvolvidos pela INEPAR, ganhem maior expressividade, dimensão e/ou

notoriedade?

8. Na sua opinião, quem são os maiores beneficiados pela adoção de um

modelo de gestão baseado em ações sociais?

9. Porque a INEPAR, na sua opinião, optou por esse caminho?

10. Qual o impacto da gestão social (dos programas e ações sociais

desenvolvidos pela INEPAR) para a imagem da INEPAR perante a

comunidade? Quais os reflexos dessas ações para a marca INEPAR perante

o consumidor final?

_.,_~g G_~ ___ 3~ ____ f; , ,u " t: ,; A

~" ",11: ~:MONSEN 000309403 , , (10 V.RJAS

.. _- ..... _---- 1111111111111111111111111111111111111