resenhas do conc peb ii 2011

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LIBÂNEO, J. CARLOS; OLIVEIRA, JOAO FERREIRA ; TOSCHI, MIRZA. EDUCACAO ESCOLAR POLITICAS, ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO Educação e Educação escolar Muitas vezes nos deparamos com a indagação: o que é educação? Educação é a mesma coisa que sistema escolar? Antes responder à pergunta, vamos fazer uma breve caracterização e, com isso podemos melhor entender o alcance daquilo que se entende quando falamos em educação, sobre sistema educacional ou sistema escolar. Educação Podemos dizer que não encontramos um sentido unívoco para esse termo. Educação é algo tão abrangente quanto as relações humanas. Podemos confirmar isso a partir da afirmação de C. R. Brandão (1985) que, nas primeiras linhas de "o que é educação", afirma: "Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação." (BRANDÃO, 1985, p. 7. grifos nossos) Partindo dessa afirmação já constatamos que educação ultrapassa o ambiente escolar, pois ela ocorre "em casa, na rua, na igreja ou na escola". Além disso, "todos nós envolvemos pedaços da vida com ela". Por que não escapamos, e por que todos nós temos "pedaços de vida" envolvidos nela? Porque estamos todos os instantes realizando atos de aprendizagem e de ensino; pela educação desenvolvemos nossa capacidade e potencialidades para o "saber" e para o "fazer". Em tudo isso se manifesta uma de suas características que é o processo. Educação não é um ponto de chegada, mas um processo. Nesse processo está presente a dinamicidade das ações e relações entre as pessoas e grupos o que faz desse processo um mecanismo que pode produzir transformações sociais, mas que, em geral, reforça e mantém a sociedade estratificada. LIBANÊO, José Carlos. Educação Escolar: políticas, estrutura e organização. São Paulo-SP: Cortez, 2003. p. 59 a 95Educação Escolar: políticas, estrutura e organização.

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Resenhas compiladas de fontes indicadas pela SEE para auxilio aos professores estaduais que frão a Prova de Promoção por Mérito, em 2011

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LIBÂNEO, J. CARLOS; OLIVEIRA, JOAO FERREIRA ; TOSCHI, MIRZA. EDUCACAO ESCOLAR POLITICAS, ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃOEducação e Educação escolarMuitas vezes nos deparamos com a indagação: o que é educação? Educação é a mesma coisa que sistema escolar? Antes responder à pergunta, vamos fazer uma breve caracterização e, com isso podemos melhor entender o alcance daquilo que se entende quando falamos em educação, sobre sistema educacional ou sistema escolar.EducaçãoPodemos dizer que não encontramos um sentido unívoco para esse termo. Educação é algo tão abrangente quanto as relações humanas. Podemos confirmar isso a partir da afirmação de C. R. Brandão (1985) que, nas primeiras linhas de "o que é educação", afirma:"Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação." (BRANDÃO, 1985, p. 7. grifos nossos)Partindo dessa afirmação já constatamos que educação ultrapassa o ambiente escolar, pois ela ocorre "em casa, na rua, na igreja ou na escola". Além disso, "todos nós envolvemos pedaços da vida com ela". Por que não escapamos, e por que todos nós temos "pedaços de vida" envolvidos nela? Porque estamos todos os instantes realizando atos de aprendizagem e de ensino; pela educação desenvolvemos nossa capacidade e potencialidades para o "saber" e para o "fazer". Em tudo isso se manifesta uma de suas características que é o processo. Educação não é um ponto de chegada, mas um processo. Nesse processo está presente a dinamicidade das ações e relações entre as pessoas e grupos o que faz desse processo um mecanismo que pode produzir transformações sociais, mas que, em geral, reforça e mantém a sociedade estratificada.

LIBANÊO, José Carlos. Educação Escolar: políticas, estrutura e organização. São Paulo-SP: Cortez, 2003. p. 59 a 95Educação Escolar: políticas, estrutura e organização.

As transformações técnico – científicas, econômicas e políticas.

Segundo pesquisadores acerca do tema, revolução técnico-científica, também é denominada de revolução informacional, Terceira Revolução Industrial ou mesmo revolução tecnológica. Sendo que um dos diversos fatores que desencadearam tal acontecimento foi a globalização dos mercados, a produção flexível, o desemprego estrutural, ou seja, fatos tanto na área econômica quanto política.Tais transformações mostram a diversidade e os contrastes da sociedade, sendo que elas resultam da ação concreta do homem, ou

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seja, interesses conflitantes que se manifestam no Estado e no mercado.A revolução técnico-científica está fundamentada em três aspectos inovadores: a microeletrônica, a microbiologia e a energia termo nuclear. A energia termo nuclear pode ser comparada a primeira Revolução técnico - científica, a qual houve a descoberta e utilização da energia a vapor; a microeletrônica vem promovendo modificações nas necessidades, nos hábitos e nos costumes da sociedade através dos novos “instrumentos” apresentados, e a microbiologia é responsável por grandes descobertas da vida, mas também, por diversos perigos para a existência do homem e do planeta.Pode-se comprovar alguns fatos dessa tríade revolucionaria na sociedade, como por exemplo, o decaimento do trabalho humano na agricultura ou mesmo na indústria, o qual são substituídos por maquinários com um grande avanço tecnológico. É necessário também dar uma ênfase a Revolução Informacional a qual, foi possível promover o surgimento de uma nova linguagem comunicacional; divulgar os diferentes tipos de informação digital; ajudar no entretenimento e na educação social e também promover um maior acúmulo de informações acerca dos acontecimentos sociais. Sendo que tal revolução gerou uma nova forma de divisão social e de exclusão, de um lado os que possuem o monopólio de informação e do outro, os excluídos de tal acontecimento.O surgimento da globalização está diretamente ligado ao capitalismo, pois através dele muitos países do globo começaram a ter uma interação econômica, política, e em diversas outras áreas. Sendo que foi a partir da reestruturação do capitalismo ocorrida no Século XX que aconteceu um progresso técnico – científico em áreas como as telecomunicações e informática. E com esse processo de aceleração cientifica pode-se dizer que surgiu a globalização. De tal modo, considera-se que a globalização é uma estratégia de enfrentamento de crise do capitalismo e de constituição de uma nova ordem econômica mundial.Visualiza-se a globalização, por exemplo, nos processos de tramitação da economia mundial, através de mercados comuns, como o MERCOSUL, ou ainda por meio de blocos econômicos como a UNIÃO EUROPÉIA, NAFTA, entre outros. Com isso, a globalização pressupõe uma submissão a uma racionalidade econômica baseado no mercado global competitivo.Ela é fortemente percebida em manifestações como: produtos de identidade nacional, implementação de programas de qualidade total, desempregos, crise social, recessão e minimização das políticas publicas. A globalização traz consigo um conceito paradoxal, um conceito de inclusão, mas ao mesmo tempo de exclusão. A inclusão se dá pela idéia de união entre os países capitalistas orientada pela ideologia do livre mercado, contundo percebe-se que tal união realmente só ocorre com países desenvolvidos. Os países emergentes, conceito dado aos países em desenvolvimento, ficam excluídos de tal união direta, a participação dos mesmos ocorre de forma subjetiva, não

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possuem uma concreta participação nos acordos realizados entres os países desenvolvidos.Além da atuação econômica, a globalização também ocorre na esfera do poder. Como exemplo tem-se a política neoliberal iniciada nos Estados Unidos, que é também onde se inciou o capitalismo e consequentemente a globalização, a qual prega uma política de liberdade econômica, social e política, uma liberdade em todas as áreas da sociedade. Sendo que com essa política neoliberal, tem-se a possibilidade de haver uma maior intervenção dos países desenvolvidos, em relação aos subdesenvolvidos. Por um lado, tal fato é de relativa importância, pois promoveria uma maior abertura econômica para a sociedade subdesenvolvida, mas também impedira o crescimento da indústria nacional, fazendo com que o país ficasse refém de tal política.

Gomes, CANDIDO ALBERTO. A EDUCAÇÃO EM NOVAS PERSPECTIVAS SOCIOLÓGICAS (TEMAS BASICOS DE EDUCAÇÃO E ENSINO)Este trabalho refere-se a uma pesquisa de Iniciação Científica realizada enquanto bolsista PIBIC3/CNPq4, período 2008/2009. Os objetivos foram investigar como as crianças daescolarização inicial percebem a instituição escolar, as professoras e as atividades escolares, além de exercitar a análise de dados coletados guiando-nos através dos referenciais que nos possibilitaram o descentramento da visão adultocêntrica sobre as crianças, permitindo a visão de mundo pelo olhar infantil. A Sociologia da Infância e a Antropologia da Criança foram os referenciais norteadores, através dos quais compreendemos a criança como sujeito social, analisadas como atores ativos no seu processo de socialização. Procuramos promover uma coleta e geração dedados através de desenhos, poesias, histórias, produção de textos e narrativas, meios pelos quais as crianças pudessem expressar-se fazendo uso de vários tipos de linguagens. As crianças, através de suas falas, nos mostram como poderiam participar na construção de um novo espaço escolar, mais lúdico, no qual elas e sua infância tivessem lugar. Constatamos que as crianças podem e têm muito a contribuir na gestão do espaço escolar, pois ainda são vozes ausentes dos currículos, dos planejamentos, das atividades, da organização dos espaços e dos tempos. Vimos que apenas deixara criança falar não é suficiente, ainda faz-se necessário garantir a sua efetiva participação na escola.Só assim, os projetos pedagógicos deixariam de ser apenas para as crianças, para serem definidos a partir das crianças e com elas, tornando o ambiente escolar mais democrático.Palavras-chave: escola, crianças, vozes infantis.O artigo apresentado é resultado de um trabalho de pesquisa de Iniciação Científica, realizado enquanto bolsista PIBIC/CNPq da Unijuí5. Nesse período, foram desenvolvidas atividades orientadas de pesquisa com vistas à qualificação da formação, universitária, com possibilidades de intensa participação nas atividades acadêmicas. O

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tema abordado no artigo tem origem nas discussões do projeto intitulado “‘Elas’ estão no Ensino Fundamental e na Educação Infantil:identidades culturais, vozes da escola”, desenvolvido e coordenado pela professora do Departamento de Pedagogia da Unijuí, Noeli V. Weschenfelder. Em tal projeto, “Elas” são as crianças, sujeitos da infância, mas também as professoras, sujeitos da instituição escolar investigada, sendo a infância e a docência elementos fundamentais do processo educativo. A discussão realizada no grupo de estudos ressalta a impossibilidade de se discutir a formação de professores/as sem ter como referência a criança, ambos sujeitos sociais, culturais e historicamente situados em seu tempo (WESCHENFELDER e BELTER 2009)6.Partindo destas discussões, foi desenvolvido o subprojeto “As atividades escolares e as professoras na visão das crianças da escolarização inicial”, a temática principal foi investigar comoas crianças na escola percebem a instituição escolar, as professoras e as atividades escolares e, ainda, procurou exercitar a análise de dados coletados guiando-se por referenciais que procuram repensar a escolarização inicial, tendo por base a visão de mundo através do olhar infantil. Ainvestigação seguiu a perspectiva que traz a criança como um ator social, reconhecendo que ela tem algo a dizer para contribuir com o debate pedagógico realizado no interior da escola. As questões que seguem explicitam alguns dos pontos de vista norteadores do estudo: Quais são os atributos deuma “boa” escola na visão das crianças? O que as crianças esperam das professoras? Quais seriamas atividades mais agradáveis e produtivas, na visão das crianças? Do que mais gostam na sala de aula e na escola? O que as desagrada? O que gostariam que fosse modificado na escola e na sala de aula?Com as leituras realizadas, tanto no curso de Pedagogia, quanto no decorrer do projeto, vimos aprendendo que é preciso romper com as “certezas” construídas sobre quem são e como são as crianças. Neste sentido, a Sociologia da Infância e a Antropologia da Criança são referenciais que estão nos trazendo um novo olhar sobre e para as crianças, um grupo considerado, pela própria Pedagogia moderna, como os “mudos” da história.Os referenciais com os quais vimos trabalhando, portanto, nos possibilitam entender as crianças como sujeitos sociais, sendo elas “analisadas como atores no seu processo de socializaçãoe não como destinatários passivos da socialização adulta...” (SARMENTO, 2008, p. 20). Seguimos a perspectiva cultural que considera a criança não apenas produto da cultura, mas tambémprodutora, pressuposto que permite o descentramento da visão adulta sobre as crianças e a consideraem seu protagonismo infantil. Vejamos o que ressalta o sociólogo acerca das transformaçõesculturais na interação entre adultos e crianças:(...) As crianças, na sua interação com os adultos, recebem continuamente estímulos para a sua integração social, (...) que, ao

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invés de serem incorporados em saberes, comportamentos e atitudes, são transformados,gerando juízos, interpretações e condutas infantis que contribuem paraconfiguração e transformação das formas sociais. Deste modo, não são apenas os adultos que intervêm junto das crianças, mas as crianças também intervêm junto dos adultos. As crianças não recebem apenas uma culturaconstituída que lhes atribui um lugar e papéis sociais, mas operam transformações nessa cultura, seja sobre a forma como a interpretam e a integram, seja nos efeitos que nela produzem, a partir das suas próprias práticas. (idem, p.29).O exercício investigativo vem exigindo uma mudança de atitude e reconhecimento do nosso não saber sobre as crianças e seus modos de ser. Fez-se necessário nos desvencilhar das imagens pré-concebidas e entender a criança e seu mundo através do seu próprio ponto de vista. Para nósadultos, é um desafio superar o entendimento que temos sobre a criança, construído desde a modernidade, sendo elas concebidas como seres que ainda não são, mas que virão a ser (quando adultos): “O que você vai ser quando crescer?”. Segundo Trevisan, “(...) a nova definição da criança e da infância implica deixar de ver a criança por aquilo que ainda não é, por aquilo que ainda não faz, mas, sim, por aquilo que já é e por aquilo que já faz” ( 2007, p.44).Baseando-nos em estudos recentes de educadores e sociólogos da infância, acreditamos que as crianças já são e são capazes de refletir, dar opiniões sobre assuntos do seu interesse, como a escola, as professoras e as atividades oferecidas. Para conseguirmos perceber essa capacidade, énecessário dar voz à criança, compreender o que dizem a partir da sua voz, pois não basta apenas ouvir, mas escutar para entender o que diz a criança. É necessária uma escuta atenta, interessada, sensível e de ser capaz de entender, nestas falas, “enunciados que supõe singularidades”(SILVEIRA, 2005), levando a sério o ator social que é a criança.Porém, isto implica “romper com as noções de poder unilaterais entre adultos e crianças e criar contextos de relação capazes de lhes permitir fazerem ouvir as suas vozes e serem escutadas”(FERREIRA, 2008). O novo paradigma da Sociologia da Infância nos dá suporte para pensarmosuma Pedagogia mais voltada para a Infância e o abandono do paradigma da criança objeto:A infância é uma construção social;A infância é variável e não pode ser inteiramente separada de outras variáveis comoclasse social, o sexo ou o pertencimento étnico;As relações sociais das crianças e suas culturas devem ser estudadas em si;As crianças são e devem ser estudadas como atores na construção de sua vida social e davida daqueles que as rodeiam;

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Os métodos etnográficos são particularmente úteis para o estudo da infância;A infância é um fenômeno no qual se encontra a “dupla hermenêutica” das ciências sociais, evidenciada por Giddens, ou seja, proclamar o novo paradigma no estudo da infância é se engajar num processo de reconstrução da criança e da sociedade (PROUT eJAMES, apud SARMENTO, 2008, p. 24).O desafio da investigação, portanto, foi fazer um estudo não sobre as crianças, mas com as crianças, reconhecendo-as como sujeitos, atores sociais. Tomamos todo o cuidado para sensibilizar nossa escuta, tornando-a mais atenta e sensível para acolher as vozes dos sujeitos da investigação, trabalhando com uma concepção de criança para além do aluno. As leituras mostraram a necessidade de descentrar a Pedagogia do ponto de vista dos adultos, para, então, considerar legítima a voz das crianças, além de considerá-las construtoras, em conjunto, dessas práticas.Trata-se de levar a sério a voz das crianças, reconhecendo-as como seres dotados de inteligência capazes de produzir sentidos e com o direito de se apresentarem como sujeitos de conhecimento ainda que o possam expressar diferentemente de nós, adultos (...); trata-se de romper com concepções queavaliam as suas ações e conhecimentos como imperfeitos e em erro,considerando-as como atores superficiais (FERREIRA, 2008, p. 147).Nossa intenção, com este estudo, foi colaborar para a reflexão sobre práticas pedagógicas desenvolvidas e planejadas por nós, adultos, junto às crianças, para que possamos contribuir com mudanças de paradigmas a respeito da infância, partindo da maneira pela qual elas percebem a instituição que frequentam.Durante o período da investigação, convivemos em duas instituições escolares, sendo uma rural e outra urbana, ambas do município de Ijuí/RS. A escola urbana é estadual e atende desde a Educação Infantil até o Ensino Médio noturno, num dos bairros da periferia urbana do município de Ijuí: os sujeitos infantis participantes da investigação foram crianças de uma segunda série com 23alunos/as, frequentando o turno da tarde, com idade entre 7 e 10 anos. Já a escola rural, igualmente estadual, atende a comunidade com uma turma de Educação Infantil, Ensino Fundamental e EJA e localiza-se no interior do município de Ijuí, região de pequenas propriedades agrícolas, mas com características urbanas no núcleo central da comunidade, e os sujeitos da pesquisa foram crianças com idade entre 7 e 10 anos. É importante observar que essa turma era composta por apenas 6 crianças, numa escola com o número cada vez mais reduzido de alunos, fato que está se tornandocomum entre as comunidades da zona rural do município de Ijuí.A inserção nas escolas, para fazer a investigação proposta, caracterizou-se como um grandedesafio para o exercício de escuta, um período de grandes aprendizagens. Para um adulto poderentrar no mundo das crianças, primeiro, precisa ser aceito por elas e para tanto é necessário criarlaços de confiança e amizade, dado que para

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elas a relação com os adultos é sinônima de poder eautoridade, principalmente em contexto escolar. Portanto, para relativizar as relações pedagógicaspredominantes, geralmente baseadas em fortes e desiguais relações de poder entre adultoprofessores/professores/as e crianças/alunos/as, coletar e gerar dados com elas foi necessária muitasensibilidade, desprendimento da visão adultocêntrica, paciência e, principalmente, estudo sobremetodologia de pesquisa com crianças.Durante a pesquisa, foi possível perceber e confirmar que a fala não é a única maneira pelaqual as crianças se comunicam, pois são usuárias de várias outras formas de linguagem, expressando-se por gestos, desenhos, comportamentos, brincadeiras, interpretando uma históriaouvida, etc. Entendemos que há uma grande aprendizagem a ser feita e a observação sensíveltornou-se uma ferramenta de pesquisa muito importante, assim como registro das falas, dasinterações e relações entre as crianças e adultos que as ensinam, torna-se também uma importantefonte de análise.A metodologia utilizada para a geração de dados neste exercício investigativo tem por basepesquisas já realizadas com crianças por educadores, sociólogos e antropólogos que se dedicam aestudar a infância nas escolas e em outros contextos socioculturais. Reafirmamos, com talmetodologia, a concepção teórica assumida, ou seja, a concepção de criança como sujeito, atorsocial, pois são vistas como “protagonistas e repórteres competentes das suas próprias experiênciase entendimentos” (FERREIRA, 2008).Inicialmente, adotamos uma “estratégia de entrada reativa”, descrita por Corsaro (2007) emseus estudos com crianças. Esta estratégia ensina a nos inserirmos no cotidiano das crianças parapodermos ouvi-las sem forçar a interação. Esperávamos que as crianças reagissem à nossa presença,diferenciando-nos, assim, de um adulto típico, o qual geralmente controla o início de uma interaçãocom as crianças.Após o período de observações e inserção no grupo, momento em que criamos os laços deconfiança indispensáveis para coletar e gerar dados com crianças, outras estratégias metodológicasforam adotadas. Procuramos promover uma coleta e geração de dados utilizando-nos de desenhos,poesias, histórias, produção de textos e narrativas, meios pelos quais as crianças pudessemexpressar-se fazendo uso de vários tipos de linguagens e, por último, a realização de entrevistas.Como complemento dos dados coletados e gerados com as crianças, efetuamos registrosfotográficos dos espaços utilizados pelas crianças na escola em seus momentos de lazer, recreio e aoar livre.Exercitando a escuta das vozes: direito das crianças...As leituras realizadas nos revelam que, historicamente, as escolas são instituições preparadaspor adultos para receber as crianças, havendo pouco lugar para sua participação na gestão deste

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espaço. Quase não há espaço para escuta de suas vozes, como também há restrição para outrasformas expressivas, outras linguagens. A cultura infantil, muitas vezes, acaba inclusive sendoinvisibilizada na escola, apesar de ela estar presente nos documentos, objetivos e intenções. A faladas crianças, ao dizerem sobre o que gostariam de fazer na sala de aula, nos faz refletir sobre opapel de pedagoga. Constatamos, no interior da escola, nos anos iniciais, que os processos deaprendizagem da leitura e escrita, tomam muito tempo nas atividades propostas, sobrando poucotempo para outras linguagens. Nesta escuta, as crianças/alunos expressam seus desejos, agrados edesagrados, o que nos faz pensar sobre a necessidade da participação infantil na escola e na gestãoda sala de aula.Não defendemos que as crianças sejam donas de verdades inquestionáveis, mas defendemosa ideia de respeito ao ser criança e a defesa de seus direitos nas escolas. “O lugar da criança comoterritório da infância ainda está por ser construído na escola, e só o será com a participação daspartes interessadas” (WESCHENFELDER e BELTER, 2009).Para fazer a escuta de vozes infantis sobre a escola e os direitos da criança, a estratégiametodológica utilizada foi a contação de história,pois percebemos que as crianças sentem falta dehistórias, canções, jogos e brincadeiras. Utilizando aparelho de multimídia, projetamos num telãohistórias digitalizadas, situação em que as crianças tiveram a oportunidade de ver os slides dashistórias contadas, cuja temática foi a defesa dos seus direitos: Declaração Universal dos Direitosda Criança, de Maria Helena Zancan Frantz e Os direitos das crianças segundo Ruth Rocha, deRuth Rocha. A discussão feita com as crianças teve, como questão central, quais seriam os direitosdelas na escola? Feita essa discussão, a proposta foi que as crianças se reunissem livremente empequenos grupos para que pudessem conversar mais sobre o assunto e, após, registrassem porescrito suas representações sobre o tema.Desta forma, coletamos e geramos dados significativos no decorrer da pesquisa de campo ea análise revelou que, para as crianças, o mais importante na rotina escolar são os amigos e obrincar, em momentos de lazer como o recreio, a Educação Física e os passeios ao redor da escola.A discussão sobre os seus direitos na escola, além de fazer a escuta sensível do que pensam,objetivou realizar leituras e participar do debate sobre um novo paradigma de participação dascrianças, presente nos textos e pesquisas, especialmente dos sociólogos da infância, tanto dePortugal, como do Brasil.O paradigma da participação cidadã ainda é recente no meio educacional. Ele “defende quea criança tem e pode expressar diferentes concepções, necessidades e aspirações relativamente aosadultos” (TOMÁS, 2007, p. 48). A autora assinala que existem muitas concepções e experiências nomundo da participação e alerta para o caráter ilusório de algumas práticas, nas quais apenas as

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crianças decidiriam sobre as atividades escolares. A socióloga concebe a participação das criançasem níveis, como, por exemplo:Primeiro, a partilha de poderes entre adultos e crianças; segundo, aintrodução de métodos e técnicas que permitam às crianças a participar, na esteira da tradição de democracia participativa; terceiro, a consideração deque a formulação de regras, direitos e deveres feitos por todos osparticipantes do processo; e quarto, o condicionamento efetivo dos meios,métodos e resultados do processo de participação (TOMÁS, 2007, p. 48).Os sujeitos da pesquisa nos mostraram também, através de desenhos, como poderiamparticipar na construção de um novo espaço escolar, mais lúdico, no qual a criança e sua infânciateriam lugar. Mais uma evidência de que as crianças nos dizem, através de várias linguagens, comogostariam de obter maior participação na escola. As vozes infantis merecem e têm o direito deserem ouvidas e consideradas para que possamos, como educadoras, incluir a participação infantilnos planejamentos escolares, exercitando os direitos da criança na escola. Sarmento também nosajuda a refletir sobre tais direitos:Os direitos das crianças no contexto educacional podem ser definidos como:1) o direito à realização pessoal (enhancement), isto é, o direito ao desenvolvimento pessoal, intelectual e material, e “à experimentação dos limites”, através da qual se realiza a compreensão crítica do mundo e se descobrem novas possibilidades; 2) o direito à inclusão social, intelectual, e cultural, que permita a cada criança ser autônoma no interior da respectiva comunidade, sendo nela aceita e acolhida; 3) o direito à participação na prática e decisões coletivas. Esses direitos situam-se nos níveis individual, interativo e social e neles se realizam as dimensões, respectivamente, da confiança, da autonomia e da prática cívica As duas escolas em que convivemos localizam-se em locais geograficamente distintos, uma em um contexto rural e outra de periferia urbana, ambas do município de Ijuí. Nesses territórios de pesquisa, também procuramos conhecer um pouco mais sobre os contextos de vida das crianças, na perspectiva proposta por Sarmento e Pinto. Exercitamos a “recolha da voz das crianças, a partir delas próprias” (1997, p.26), nos momentos de conversas informais, entrevistas e observação das brincadeiras. As crianças investigadas disseram de si, de suas famílias, de suas vidas e sonhos, seus agrados e desagrados, falaram sobre o mundo e a escola em seus tempos e espaços e mostraram que criam ou reivindicam espaços para viver a infância.Novamente, buscamos outras linguagens como estratégia utilizada para desencadear as narrativas infantis. Escolhemos um livro para crianças, intitulado Crianças como Você, de Barnabas e Anabel Kindersley, produzido em associação com o Unicef, que retrata de maneira alegre o dia adia e o contexto sociocultural de crianças em variadas regiões do planeta, nos cinco diferentes continentes e países. Nele as crianças contam como é sua vida na escola, mostram seus materiais de aula, as suas casas, apresentam as famílias, o

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trabalho que seus pais realizam e seus brinquedos preferidos. É um livro muito rico e estimulante que proporcionou muitas possibilidades de fala para as crianças entrevistadas. A utilização de tal estratégia permitiu trazer à tona contextos pessoais e familiares, contarem sobre si e seu mundo cotidiano.Tanto na escola urbana, como na rural, o cenário escolhido pelas crianças para a realização das entrevistas e, bem como para muitos dos momentos de observações e fotos, foi a pracinha, por ser o principal ponto de encontro entre as crianças, durante o recreio, nos horários de espera de transporte para ir para casa no final do turno, ou na espera por professores. Visivelmente, as crianças não apenas se sentiam muito mais à vontade neste local como expressavam-se com mais facilidade.Percebemos que o espaço da pracinha, entre tantos outros, foi transformado em um “lugar”para conversas, brincadeiras e refúgio, longe do controle dos adultos. Entendemos tratar-se de um“território de crianças”, assim como vimos em Coelho (2007), sendo que “o próprio ‘lugar’ é construído por intermédio das interações afetivas que são impregnadas de valor, sentimentos e simbolismos, no instante em que o indivíduo vive o espaço pelos processos perceptivos”.Acreditamos ser nas escolas acompanhando o recreio, espaço de tempo no qual têm mais liberdade para brincar na pracinha, como sendo um dos lugares escolhidos para as interações afetivas das crianças, e por isso tão focado por elas. Outras situações significativas foram vivenciadas nos momentos de “recolha das vozes infantis”, as quais confirmam a pracinha como o espaço mais significativo na escola para as crianças. Algumas dessas situações permitem refletir sobre o cuidado especial na seleção do local e do horário para realizar as entrevistas. Ainda é necessário por parte do adulto, maior sensibilidade diante das crianças, o que possibilitará maior ou menor participação delas também no que se refere à investigação.As crianças, ao falarem sobre a escola, pouca ou nenhuma referência fizeram sobre seus relacionamentos com os adultos com quem ali convivem, ou seja, as professoras. Uma questão nos faz pensar porém, se tal ausência poderia ser um indício da falta de “acolhimento” por parte da escola às culturas infantis. Acreditamos que, quando as crianças têm boa relação com os adultos ensinantes na escola, sentem-se melhor, e têm a aprendizagem facilitada. Nas falas e representações das crianças, em ambas as escolas, a preferência é por espaços abertos, motivo pelo qual buscamos compreender porque elas preferem falar mais da pracinha, do recreio, dos amigos e do pátio e,menos, da sala de aula e das professoras. Seria em função de que, no minúsculo tempo do recreio,com os amigos e as brincadeiras livres, as crianças encontram na escola o seu “lugar de afetividade”, do qual nos fala Coelho (2007)?Nos territórios de pesquisa, rural e urbano, pudemos constatar também que a dicotomia entre campo e cidade, nos últimos anos, é cada vez menor. Essa é uma questão sobre a qual precisamos refletir

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no contexto da escola, especialmente com relação ao mundo infantil. As crianças do meio rural hoje têm acesso a muitos dos bens culturais e informações disponíveis às crianças da cidade. A televisão é algo comum, por isso, se não possuem acesso aos bens de consumo, têm conhecimento deles através da mídia. Outro fator marcante é o deslocamento de crianças na escola, tanto rural,quanto urbana. Durante esse exercício investigativo, conhecemos crianças, nas duas escolas, que já realizaram, com suas famílias, transferência de residência entre bairros, ou entre municípios. Na escola rural, encontramos um caso de deslocamento de família da periferia da cidade para o centroda vila do distrito onde se situa a escola rural. Trata-se de uma pequena "favela rural" que está se constituindo, parecida com a periferia do município de Ijuí.Embora não seja o foco de interesse neste texto o debate sobre a questão, registramos nossa preocupação, pelo fato de que os sujeitos/crianças que moram ali frequentam a escola e precisam ser acolhidos e compreendidos, por isso consideramos importante conhecer os contextos sócio culturais. As falas das crianças nos ajudam a compreender as culturas infantis, bem como as culturas locais e globais em interação no contexto da cultura escolar. Além disso, sociólogos, como Sarmento e Corsaro, auxiliam no entendimento da concepção de outro conceito de socialização das crianças, assumindo a “alteridade” da infância enquanto categoria geracional, por isso é importante prestar atenção ao processo de construção de como as crianças se inserem nos espaços, de modo muito especial no espaço escolar.As culturas das crianças são “um conjunto estável de atividades ou rotinas,artefatos, valores e idéias que as crianças produzem e partilham em interação com os seus pares” (CORSARO & ÉDER, 1990 apud SARMENTO, p. 373, 2005). Estas atividades e formas culturais não nascem espontaneamente; elas constituem-se no mútuo reflexo das produções culturais dos adultos para as crianças e das produções culturais geradas pelas crianças nas suas interações (SARMENTO, p.373, 2005).As crianças atribuem significado aos fatos, momentos, espaços. Revelam forte relação afetiva com o lugar e expressam seus desejos e sonhos no que se refere ao que gostariam que mudasse na escola, como, por exemplo, o aumento do tempo livre para o recreio.Durante o período de coleta de dados nas escolas, imagens fotográficas também foram utilizadas como instrumento de pesquisa. As poses foram registradas com uma máquina fotográfica digital e mostram vários momentos das crianças na escola, em diferentes espaços, dentre eles a pracinha, sala de aula, quadra esportiva, corredores e prédios da escola. As imagens fotográficas foram utilizadas como recurso para mostrar os espaços da escola e sua estruturação física, como prédios e salas de aula, uma vez que o espaço foi o tema mais enfocado pelas crianças ao falar da escola. Foi concedida uma autorização individual de cada sujeito da pesquisa,

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para além do consentimento livre e esclarecido por parte dos familiares e da escola para realizar a pesquisa.Ao provocar e acolher a fala da criança sobre a escola e seu cotidiano, lidamos com um procedimento de pesquisa com limitações, pois as falas das crianças são tão limitadas e polissêmicas quanto à dos adultos (SILVEIRA, 2005). Neste sentido, as fotografias serviram como complemento daquilo que era dito por elas, e, mais, confirmaram não ser por acaso que a pracinha é o lugar preferido, território das crianças, pois neste local obtemos inúmeros registros fotográficos que nos diziam que as crianças sempre conseguem adaptar-se ao contexto, recriando as possibilidades para a brincadeira.Compartilhamos das ideias de Pinto (2007) ao assinalar que, “na sociedade capitalista, onde a vida dos indivíduos é conduzida pela lógica do trabalho, a escola acaba assumindo uma importância significativa na socialização das crianças”. A autora nos convida a “rever o papel social da escola na nossa sociedade e revalorizá-lo enquanto espaço privilegiado da infância nos nossos tempos”. Para tanto, seria importante relativizar nossas concepções sobre a infância e o brincar na escola, uma vez que elas refletem nosso modo de tratar a criança, as atividades propostas e a organização do espaço escolar.Débora Silveira (2005) enfatiza que saber como as crianças veem a escola talvez possa nos ajudar na tarefa de pensarmos em melhorias nas instituições ou em uma nova forma de atendimento,organizado para que as crianças possam ser mais felizes, vivenciando um processo educativo com mais qualidade.Os dados gerados e coletados nos mostram elementos importantes sobre o modo como as crianças veem a si, à sala de aula, à professora e à escola, o que nos faz refletir sobre o esquecimento, por parte dos educadores, da sua condição de criança e, também, dos tempos e espaços adequados para brincar e estudar na escola. Ao ouvirmos as crianças, refletimos sobre os silêncios gerados na escola e as possibilidades de escuta das vozes infantis, sua participação na gestão da sala de aula, na organização dos espaços e dos tempos institucionais.Os dados obtidos através da escuta das vozes infantis, nos quais consideramos o contexto social em que estão inseridas, nos mostram como ainda temos que avançar nas discussões sobre a infância e as crianças nas escolas. Que apenas deixar a criança falar não é suficiente, ainda faz-se necessário garantir a sua ativa participação.Efetivamente, ao garantir a escuta das vozes e a participação das crianças na gestão escolar os projetos pedagógicos deixariam de ser apenas para as crianças, para serem definidos a partir das crianças e com elas (Rocha, 2008, p.47), tornando o ambiente escolar mais democrático, mediante o diálogo entre os sujeitos da escola, adultos e crianças, os quais ocupam diferentes lugares sociais.Neste sentido, as crianças envolvidas em nosso exercício de pesquisa nos mostram como poderiam participar na construção de um novo

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espaço escolar, mais lúdico, no qual a criança e sua infância tenham lugar.Como vimos, é comprovado que as crianças têm contribuições a dar para a melhoria das relações pedagógicas em instituições preparadas, somente pelos adultos, para recebê-las. As vozes infantis merecem e têm o direito de serem ouvidas, consideradas e refletidas, para que possamos,como educadoras, incluir a participação infantil nos planejamentos escolares, exercitando os direitos da criança na escola, promovendo um ambiente mais democrático e apropriado para receber e educar crianças.

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LOPES, Alice Casimiro. Resenha do livro Disciplinas e integração curricular: história e políticas, organizado por Alice Casimiro Lopes e Elizabeth Macedo (Rio de Janeiro: DP&A, 2002). ** Professora do Departamento de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO).

A coletânea de textos organizada pelas professoras Alice Casimiro Lopes e Elizabeth Macedo reúne artigos elaborados por autores brasileiros da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Inclui também a contribuição latino-americana representada pela Argentina, Universidade de Buenos Aires, e européia, representada pelas contribuições portuguesa da Universidade do Minho e francesa do Centro de Pesquisas Históricas (CNRS) e da Escola Superior de Altos Estudos em Ciências Sociais (Paris).As organizadoras são reconhecidas pesquisadoras do campo do currículo e professoras em cursos de Graduação e Pós-Graduação na UFRJ e na UERJ, respectivamente. São também membros do Grupo de Trabalho de Currículo da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANDEP).Trata-se de uma coletânea composta por 8 artigos que têm em comum o foco no "conhecimento escolar" e sua organização nas políticas educacionais e no cotidiano das salas de aula. A intenção da obra é problematizar a relação entre integração curricular e disciplinas escolares com base na história e na política.Os autores dos textos discutem o conhecimento escolar organizado em disciplinas (vistas ainda como indispensáveis instrumentos de sistematização de saberes e habilidades), mas não se restringindo mais aos limites disciplinares. Analisam o discurso da integração curricular que está sendo proposto e justificado por mudanças dos processos de trabalho e de organização do conhecimento no mundo globalizado. Destacam que a possível identificação nas propostas curriculares de expressões comuns àquelas utilizadas em outros momentos históricos do passado não é garantia de que os mesmos sentidos e significados se reproduzam, nem que estejam sendo perseguidas as mesmas finalidades educacionais.A partir disso, faz-se urgente a interpretação dos discursos das atuais propostas curriculares oficiais, levando em conta a especificidade de cada um deles, assim como sua contextualização política, econômica, social e cultural. Fazer essa interpretação é uma das tarefas a que os autores dos artigos se propõem.Trabalhar com a História do Currículo é reconstruir a história a partir de múltiplas versões, analisar documentos, estabelecendo relações e correlações no sentido de reconstruir uma rede de significados. Ao fazer essa reconstrução os autores enfrentam a tensão entre aspectos macro-sociais e as dimensões micro-referentes instituições e as salas de aula onde o currículo se materializa. Se reduzirmos a análise a um desses aspectos, corremos o risco de minimizar a complexidade do fazer curricular, defendem os autores. Reler cada

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um dos documentos para reconstruir o cotidiano curricular não é tarefa fácil, pois ele se apresenta complexo, difuso, difícil de captar e desvelar o que está encoberto.A História do Currículo possibilita acompanhar a natureza das mudanças curriculares, compreendendo a gênese e o desenvolvimento de determinadas categorias que hoje estão presentes, muitas das vezes, com outros significados. Analisar políticas curriculares, tendo como pano de fundo a história do currículo, é um dos objetivos desempenhados com sucesso pela coletânea apresentada.Com base em nossa leitura e na introdução da obra feita pelas suas organizadoras, Lopes & Macedo, fazemos um breve resumo dos textos apresentados:O artigo de Luciano Mendes de Faria Filho, "Escolarização, culturas e práticas escolares no Brasil: elementos teórico-metodológicos", defende novas perspectivas para a pesquisa sobre a escola em História da Educação. O fenômeno da escolarização é estudado pelo autor: de uma sociedade sem escolas no início do século XIX ao início do XXI com a quase totalidade de nossas crianças na escola. Tempos, espaços, sujeitos, conhecimentos e práticas escolares são focalizados como elementos-chave dessa análise. Ao analisar a cultura escolar o autor mostra o surgimento no currículo brasileiro da seriação e da organização disciplinar e quais as suas conseqüências para a escolarização e, dessa, para a cultura social mais ampla. De acordo com o autor, "A escola vai-se constituindo, assim, não apenas no locus privilegiado da cultura e da formação humana, mas também como um grande mercado de trabalho e de consumo de inúmeros produtos da cada vez mais complexa e poderosa indústria editorial, entre outras" (p. 35).O artigo de Dominique Juliá, "Disciplinas escolares: objetivos, ensino e apropriação", por sua vez, discute a pesquisa em história das disciplinas escolares, argumentando que esse campo de estudos deve levar em conta os objetivos associados não apenas às referidas disciplinas, mas também às práticas reais de ensino e à apropriação dos conteúdos por parte dos alunos. O autor apresenta e discute os cuidados metodológicos que os historiadores do currículo devem ter ao substituir as análises macroscópicas pelo estudo dos funcionamentos internos específicos de cada escola. Essas duas instâncias vêm se complementar, oferecendo ao pesquisador um quadro de análise mais completo e abrangente. O autor conclui dizendo que resulta essencial relembrar que toda a história das disciplinas escolares deve, em um mesmo movimento, considerar as finalidades óbvias ou implícitas buscadas, os conteúdos de ensino e a apropriação realizada pelos alunos, tal como pode ser medida por meio de trabalhos e exercícios. Há uma interação constante entre esses três pólos que concorrem na constituição de uma disciplina e estaríamos incorrendo diretamente em graves erros se quiséssemos ignorar ou negligenciar qualquer um deles. (P. 51)Em seu artigo Dominique Juliá abarca esses três pólos.

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As organizadoras da obra, Alice Casimiro Lopes e Elizabeth Macedo, são também autoras do artigo "A estabilidade do currículo disciplinar: o caso das ciências". Nele, levantam a hipótese de que, mesmo em currículos transversais (em que a matriz do conhecimento não é disciplinar), a força dos processos de administração curricular acabaria acarretando a organização de disciplinas com finalidade de controle do trabalho docente e/ou para controle das atividades dos alunos. As autoras analisam o caso da disciplina ciências, em virtude de se tratar do exemplo de uma dessas tentativas de produzir uma integração pela via disciplinar. No artigo recorrem aos trabalhos de Ivor Goodson e Boaventura de Souza Santos, para argumentar que a disciplina escolar é diferente da disciplina científica.Silvina Givirtz et al., no artigo intitulado "A politização do currículo de ciências nas escolas argentinas (1870-1950)", argumentam que os conteúdos de ensino em ciências foram selecionados e organizados em disciplinas de modo a buscar resolver conflitos ideológicos. No sentido de sustentar sua argumentação, apresentam dois estudos sobre as formas como determinados assuntos são introduzidos e posicionados no currículo, buscando identificar os componentes ideológicos dessa seleção e organização. As autoras tratam especificamente dos campos da astronomia e da cosmografia e das teorias da evolução. Concluem os autores que "existem relações complexas entre as ciências naturais, a instituição escolar e a política" (p. 9).O artigo de Elizabeth Macedo, "Currículo e competência", analisa como a utilização da noção de competências vem respondendo, na teorização curricular, a novas formas de organização do saber e do trabalho na sociedade comtemporânea. A partir da análise dos documentos curriculares para a educação básica a autora identifica três inspirações principais: a tradição francesa de competência, o comportamentalismo americano das teorias de competência e as abordagens de conhecimento e mercado, que vêm dando destaque a saberes não-disciplinares. Compreendendo as políticas da elaboração curricular "como híbridos de muitas tradições em conflito", a autora defende a "necessidade de se buscar entender como se configuram os mecanismos de poder e quais as finalidades sociais de transição do currículo disciplinar para um currículo orientado por competências" (p. 9). A autora conclui o seu artigo defendendo que a centralidade na noção de competência, ainda que se utilizando variados elementos dos discursos educacionais construídos ao longo do último século e se apropriando de reivindicações do próprio campo, está alicerçada nas demandas postas à escola por um novo perfil do mercado produtivo (p. 141). O tema é instigante e a análise da autora é de extrema atualidade.

No artigo de Alice Casimiro Lopes, "Parâmetros curriculares para o ensino médio: quando a integração perde o seu potencial crítico", o foco volta-se para as atuais políticas curriculares para o ensino médio. A autora defende que o potencial crítico do discurso sobre currículo integrado encontra-se recontextualizado nos Parâmetros Curriculares

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Nacionais do Ensino Médio (PCNEM) a partir de processos de deslocalização de suas matrizes teóricas originais e de relocalização por hibridização, especialmente, com os discursos derivados das matrizes dos eficientistas sociais (o currículo por competências), associados a princípios integradores completamente distanciados de uma perspectiva crítica (p. 148).No artigo de José Augusto Pacheco, "Área de projecto: uma componente curricular não-disciplinar", é analisada a recente reforma curricular portuguesa do ensino secundário, no que se refere às formas de organização curricular. O autor trata especificamente da área do projeto, que privilegia a interação entre escola e realidade e propõe a inversão da lógica curricular da transmissão para o questionamento. Esse artigo tem especial importância para nós, no Brasil, dado que os projetos têm sido propostos nas mais recentes reformas curriculares.Finalizando a coletânea, o interessante artigo de Alfredo Veiga-Neto, "Espaço e currículo", focaliza algumas questões relativas à contribuição do currículo para a constituição do sujeito moderno. Na análise do autor, "é também pelo currículo que aprendemos a conferir sentidos e fazer uso do espaço e, de maneira obrigatoriamente imbricado, do tempo" (p. 11). Segue o autor defendendo a idéia de que "a integração e a transversalidade devem ser entendidas como invenções curriculares que representam novas configurações" (p. 11). O tema é abordado com originalidade.Os estudos históricos sobre currículo transformam nosso foco de atenção colocando novos questionamentos e nos instigando a continuar a pesquisa, colaborando no desenvolvimento de outros estudos, na análise de propostas curriculares e na constante e necessária reflexão sobre as práticas escolares em diferentes níveis e contextos.Entre os méritos da obra destacamos, em primeiro lugar, a utilização de uma linguagem clara, portanto de fácil compreensão, mesmo para os não iniciados no campo do estudo e da pesquisa sobre currículo. Em segundo lugar, o desenvolvimento de uma análise profunda utilizando autores consagrados no campo da história e da política. Dentre eles, destacamos a referência ao autor clássico na história do currículo, Ivor Goodson, que tem tentado, com sucesso, construir um arcabouço teórico para o estudo da história das disciplinas. Seu trabalho desvela o processo pelo qual determinadas áreas do conhecimento são transformadas em disciplinas escolares. Finalmente, destacamos a importante e necessária reflexão sobre temas da atualidade no contexto atual de reformas. Nosso país vive hoje em processo de implantação de várias reformas curriculares e elas têm sido apresentadas como elementos fundamentais para o alcance da melhoria da qualidade da educação dada pelos sistemas de ensino. De um modo geral elas têm sido concebidas tendo como base a visão de especialistas e de consultores internacionais, deixando em segundo plano a experiência dos seus reais implementadores – os professores dos diferentes níveis de ensino. As dificuldades de implantação e até mesmo de entendimento dessas

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novas propostas nos fazem analisar com maior cuidado o papel e a importância do currículo, seu discurso e sua prática em nossa realidade. Ao buscar subsídios teóricos para a análise desse quadro encontramos na coletânea de Lopes & Macedo temáticas como "parâmetros", "competências" e "projetos" analisadas nos artigos com base em autores de currículo vinculados aos paradigmas críticos e pós-críticos.Pelas razões acima descritas, recomendo enfaticamente o livro por possibilitar um entendimento mais profundo dessas reformas, suas conseqüências na prática diária de nossas escolas e na busca de alternativas na superação dos impasses apresentados. O livro traz importantes subsídios para essa tarefa.Por se tratar de obra de conteúdo crítico, apresenta-se como leitura indispensável para pesquisadores da área, professores da disciplina Currículo, estudantes de Pós-Graduação e de Graduação. Lembrando que a história do currículo é parte da história da educação, recomendamos também o livro para professores e pesquisadores do campo. Sua leitura será certamente enriquecedora para sua reflexões e análises.

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SAVIANI, Dermeval. História das idéias pedagógicas no Brasil. 3ª ed. Campinas: Autores Associados, 2010. (Memória da Educação) O livro, que recebeu o prêmio Jabuti em 2008, na categoria Educação, constitui mais uma contribuição do professor Dermeval Saviani ao exame crítico do pensamento pedagógico brasileiro e é um fruto do amadurecimento intelectual do autor. Não se trata de simples exposição ordenada de resultados de pesquisa. É, na verdade, resultante de uma vida de intensa elaboração da teoria da educação sob perspectiva crítica, de pesquisas e reflexões geradoras de novos conhecimentos difundidos em aulas, grandes conferências, muitos livros e artigos, na trajetória desse educador. Oferecendo uma visão de conjunto das ideias pedagógicas na história da educação brasileira ao longo de cinco séculos, o texto discute suas implicações para a teoria e a prática educativas. As ideias pedagógicas diferem substancialmente da tradicional história do pensamento dos grandes pedagogos e, também, das educacionais, que se referem amplamente à educação. As ideias pedagógicas decorrem da análise do fenômeno educativo, na busca de explicá-lo, ou derivam de certa concepção de homem, mundo ou sociedade sob a qual é interpretado o fenômeno educativo. Segundo o autor, elas são "as ideias educacionais, não em si mesmas, mas na forma como se encarnam no movimento real da educação, orientando, mais do que isso, constituindo a própria substância da prática educativa" (p.6). Como exemplo, podem ser consideradas as ideias pedagógicas dos jesuítas no Brasil, especialmente no chamado Período Heroico; estas não se definem por simples derivação da concepção religiosa (católica) do mundo, sociedade e educação. Deram origem a práticas educativas que concretizaram o necessário ajuste entre as ideias educacionais e a realidade específica da colônia brasileira. São, portanto, as ideias pedagógicas ao longo da educação brasileira, o fulcro do estudo apresentado. O livro resultou de um acurado processo de pesquisa conduzido pelo autor, com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq –, cujo propósito foi compreender a "evolução do pensamento pedagógico brasileiro a partir da identificação, classificação e periodização das principais concepções educacionais (p.1-2). A investigação tomou como materiais básicos documentos escritos – livros, artigos e textos oficiais –, trabalhando com fontes primárias, no caso, documentos nos quais se encontravam as ideias pedagógicas dos principais protagonistas da educação brasileira, e fontes secundárias, como documentação bibliográfica. Foi obtido assim um conjunto de informações de grande vulto que, no livro propriamente dito, se evidencia em cada um dos capítulos e é registrado em um total de 351 fontes diretamente referidas e utilizadas na redação do texto. Além das obras mais conhecidas de história da educação brasileira, estão presentes, no decorrer dos capítulos, numerosas referências aos estudos feitos no Brasil nos últimos 20 anos por pesquisadores do campo históricoeducativo e

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publicados até 2006. São livros, artigos e outros materiais, inclusive os divulgados como teses, dissertações e até monografias de cursos de pós-graduação. Esses estudos de corte analítico, que incidiram sobre temas ou momentos específicos da educação brasileira, foram trabalhados pelo autor, e, somados a muitas outras leituras, possibilitaram reflexões e interpretações substantivas e sínteses amplas, com densidade explicativa, relativas às ideias pedagógicas existentes em longos períodos da história da educação brasileira ou em algumas de suas fases. Não foi relegado, contudo, o objetivo de oferecer aos leitores parte significativa das ricas informações obtidas pela pesquisa, que se referem a cada um dos momentos da educação brasileira; são apresentados assim, cuidadosos detalhamentos, tais como biografias dos protagonistas e datas completas de eventos marcantes, para melhor esclarecer o leitor. Como outro resultado do trabalho de pesquisa, o autor construiu uma original periodização da evolução das ideias pedagógicas no Brasil. Buscou superar tanto as divisões no tempo, cuja base é a história político-administrativa, quanto as que se cingiram principalmente ao critério da determinação econômica, no esforço de compreender com maior rigor a história da educação brasileira. Assim, ao elaborar a periodização proposta, esclarece ter partido das principais concepções de educação, guiando-se pelo movimento real das ideias pedagógicas presentes no curso da história da educação. A Pedagogia Tradicional, nas vertentes religiosa e leiga, a Pedagogia Nova, a Pedagogia Tecnicista e a concepção pedagógica produtivista, estudadas em suas características nos trabalhos anteriores do autor, são as categorias que delimitam quatro grandes períodos, dentro dos quais se identificam as diferentes ideias pedagógicas. Cada período é subdividido em duas ou três fases, de acordo com o movimento dessas ideias no seu interior. O início e o fim de cada período foram determinados por eventos fundamentais. Assim, por exemplo, o 2º período, que vai de 1759 a 1932, e em que ocorre a "coexistência entre as vertentes religiosa e leiga da Pedagogia Tradicional", tem início com a expulsão dos jesuítas pelo Marquês de Pombal, e o término marcado pela divulgação do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. Para demonstrar que o movimento das ideias pedagógicas foi o efetivo "divisor de águas", nada mais elucidativo que a afirmação de que "o princípio da periodização tem por base a hegemonia" (p. 20). Termos como configuração, desenvolvimento, predominância, monopólio, equilíbrio, coexistência, crise e articulação, com referência às pedagogias, passam a ser utilizados nos títulos dos períodos e capítulos. Essas denominações indicam o modo pelo qual as ideias pedagógicas se apresentam em determinado momento histórico, sob a forma de uma pedagogia, ou concepção, que nasce, firma-se, predominando ou coexistindo ao lado de outra, entrando em crise e sendo substituída ou não, pois pode ser reconfigurada sob novas bases, num movimento constante. São analisadas também as chamadas ideias e correntes não hegemônicas e as pedagogias contra-hegemônicas, de "esquerda", que, em alguns períodos e fases

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da educação brasileira, buscaram influenciar e ainda influenciam, de algum modo, a ação educativa, especialmente em anos recentes. Na estrutura geral do livro, a história das ideias pedagógicas no Brasil é apresentada com uma divisão em quatro períodos, com suas respectivas fases, em um total de 14 capítulos. Na introdução, o professor-pesquisador, que coordena há algum tempo o, nacionalmente reconhecido, Grupo de Estudos e Pesquisas "História, Sociedade e Educação no Brasil" – Histedbr –, procura dar esclarecimentos sobre a perspectiva teórico-metodológica adotada, cujo princípio é o "caráter concreto do conhecimento histórico-educacional" (p.3), que, para sua efetivação, exige ser complementado por outros. São ainda examinadas questões teóricas do campo da historiografia, entre elas, a tentação relativista e a sedução pela micro-história. Na análise de cada período há um capítulo introdutório que indica sinteticamente as linhas básicas do momento histórico determinante das ideias pedagógicas correspondentes ao espaço de tempo analisado; a ele seguem-se os capítulos que correspondem às diferentes fases examinadas. Quanto ao conteúdo dos períodos e fases, dada a sua extensão e profundidade, somente uma leitura atenta de toda a obra poderá permitir a apreciação de sua qualidade e riqueza, inclusive da beleza e pertinência das ilustrações. Alguns aspectos serão destacados aqui, mais como um estímulo, um convite ao leitor. No 1º período (1549-1759), em que ocorre o monopólio da vertente religiosa da Pedagogia Tradicional, são de se mencionar tanto as explicações históricas, no cap 1, relativas ao atraso do desenvolvimento capitalista em Portugal, quanto, no cap. 3, a apresentação da Ratio Studiorum jesuítica em sua complexidade. No 2º período (1759-1932), ainda sob a Pedagogia Tradicional, mas incluindo a coexistência de suas vertentes religiosa e leiga, a propalada "desertificação" educacional após a expulsão dos jesuítas é confrontada no cap. 5, seja no que se refere à melhor compreensão dos novos propósitos político-educacionais em vista da "máquina mercante", seja no que diz respeito às reformas educacionais do despotismo esclarecido e às iniciativas como o Seminário de Olinda, no Brasil. No cap. 6, um alentado estudo das ideias pedagógicas e circunstâncias em que se disseminaram no Império e início do período republicano é feito mediante análise das propostas contidas na reforma, dos métodos de ensino utilizados para expandir a precária escolarização, bem como, da nova organização das escolas. As ideias pedagógicas republicanas são vistas em seus fundamentos positivistas e laicos.

O 3º período (1932-1969) é aquele em que a Pedagogia Tradicional convive com a Pedagogia Nova e depois cede lugar a ela. Esta última predomina com ampla margem nesse intervalo de tempo. Já no final dos anos 60, a Pedagogia Tecnicista começa a articular-se. Esse movimento é descrito em quatro capítulos (7, 8, 10 e 14), com detalhamento de informações sobre as lutas político-educacionais

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então travadas e seus protagonistas e com o exame das questões pedagógicas que surgem. Pode ser considerado o mais abrangente. No 4º período (1969-2001), configurase a denominada concepção produtivista, mas também são examinadas as concepções pedagógicas, as contribuições e o papel histórico de Paulo Freire "referência de uma pedagogia progressista e de esquerda" (cap. 10) e, no cap. 12, os estudos crítico-reprodutivistas em seu papel de arma teórica nos anos 70 e no seu aporte para a compreensão dos limites da ação escolar. Também são mencionados explicitamente os trabalhos mais recentes e as lutas de seus principais representantes, Bourdieu, Baudelot e Establet, contra a invasão neoliberal, na defesa da educação pública. Para o autor, no entanto, a concepção pedagógica produtivista parece ser de fato a hegemonia das ideias e práticas pedagógicas, desde os 69 até os nossos dias, sendo que, nos impactantes anos 90, teria havido um surto eficientista em que a racionalidade econômica prevaleceu sobre a pedagógica. Aqui se faz apenas um único comentário crítico. Enquanto as análises dos três primeiros períodos, mais distantes do movimento atual, permitem uma compreensão aprofundada dos movimentos "orgânicos e conjunturais", o mesmo não parece ocorrer em relação ao 4º período, especialmente nos cap. 13 e 14. Julga-se ainda necessário, no processo de análise da história das ideias pedagógicas, aguardar um tanto mais a decantação pelo tempo das "impurezas" que impedem uma percepção mais nítida do real movimento de explicitação e prevalência de ideias. Quem sabe as ideias pedagógicas contidas nas pedagogias contra-hegemônicas possam ser mais reconhecidas, no seu alcance teórico e nas realizações práticas durante os anos 80 e posteriores, e nas esperanças depositadas no início do séc. XXI. Para isso, não só o tempo, mas também estudos, reflexões e pesquisas são imprescindíveis. De modo semelhante tornase uma exigência afinar a compreensão crítica quanto aos fundamentos e influências na prática pedagógica do chamado neoprodutivismo e suas variantes: neo-escalonovismo, neoconstrutivismo, neotecnicismo (cap.14). Cabe destacar ainda, no livro, a reiterada afirmativa do autor de que sua imensa tarefa de pesquisa e síntese das ideias pedagógicas no Brasil seria vã, caso os conhecimentos obtidos resultassem apenas em um relatório técnico, para especialistas, e não chegassem até as salas de aula pelos professores e diretores, e não conseguissem integrar programas escolares. Sendo assim, a obra persegue o propósito de trazer mais coerência e consistência à ação educativa, como, no dizer do autor, "um primeiro esforço no sentido de pôr ao alcance dos professores um recurso que lhes permita abordar a educação brasileira em seu conjunto, desde as origens até nossos dias" (p.18). Pelas razões apontadas e considerando de plena justiça o prêmio recebido pelo autor, é que se pode recomendar aos educadores a leitura de mais este livro do dr. Demerval Saviani, professor e orientador de grande número de professores e pesquisadores

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brasileiros que estão hoje produzindo teórica e praticamente a educação no Brasil.

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Informações •Para leitores•Para Autores•Para BibliotecáriosCapaSobreAcessoCadastroPesquisaAtualAnterioresNotíciasCapa > v. 3, n. 3 (2003) > Gatti Formação de professores, pesquisa e problemas metodológicosBernardete Angelina Gatti

Resumo

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GATTI, BERNARDETE ANGELINA. PROFESSORES DO BRASIL IMPASSES E DESAFIOSPara Unesco, situação do professor é crítica - mostra que cerca de 3 mil professores no país têm baixos salários e formação deficiente. Segundo o levantamento, elaborado pelas professoras Bernardete Angelina Gatti e Elba Siqueira de Sá Barreto, metade ganha menos de R$ 720.

No Nordeste, a realidade salarial é pior ainda: 50% do professorado ganham menos de R$ 450. Pelos dados, coletados na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2006, constata-se que escolas públicas pagam melhor que particulares. O salário mediano para o ensino médio é de R$ 1.300 nas públicas e de R$ 1.000 nas privadas. No ensino fundamental, de R$ 745 nas públicas e R$ 525 nas privadas, enquanto no ensino infantil é de R$ 568 (públicas) e R$ 400 (privadas). Responsável pela concepção e supervisão do projeto, o professor Célio da Cunha, assessor especial da Unesco no Brasil, elogia os esforços do governo federal que resultaram no Piso Nacional de Salários dos professores, de R$ 950, mas não respeitado em todos os estados. Para ele políticas desse tipo precisam ter continuidade, não só no plano federal, mas também nos planos estaduais e municipais. “Estados e municípios têm autonomia e nem sempre respondem a esses esforços do governo”, diz.Este artigo analisa tendências metodológicas na pesquisa em educação com ênfase na pesquisa sobre professores, descrevendo o movimento histórico das pesquisas em educação no Brasil: o tecnicismo dos anos 30, abrangendo o desenvolvimento psicológico das crianças e adolescentes; os estudos sobre as condições sociais de vida dos professores na década de 50; a natureza econômica das pesquisas da década de 60; o tecnicismo que chega aos anos 70 mesclado com abordagens humanistas para nos anos 80 serem desenvolvidas interpretações críticas do social, embora de rigor metodológico questionável; os anos 90, que trazem as questões de identidade do professor já com abordagem mais culturalista e antropológica. A autora aponta os problemas metodológicos de maneira geral na produção de conhecimentos em educação.Resumo - Este artigo expõe inicialmente alguns pressupostos que precisam ser considerados ao se discutir formação de professores: que o fato educacional é cultural; que o papel do professor é absolutamente central; que o núcleo do processo educativo é a formação do aluno; que é preciso considerar a heterogeneidade cultural e social de professores e alunos; que as práticas educativas institucionalizadas determinam em grande parte a formação de professores. Na seqüência, colocam-se questões relativas ao cenário social atual, de desigualdades culturais excessivas, e, aspectos do currículo escolar em sua relação com a formação de docentes, encaminhando para um balanço sobre a formação real de professores

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tal como se observa nas instituições formadoras, e, sobre sua carreira, delineando perspectivas para essa formação.

SARMENTO, Manuel; GOUVEIA, Maria Cristina Soares – ESTUDOS DA INFÂNCIA: EDUCAÇÃO E PRÁTICAS SOCIAISOs muitos jeitos de ser e de fazer das crianças: criação ou transgressão

O olhar das crianças permite revelar fenômenos sociais que o olhar dos adultos deixa na penumbra ou obscurece totalmente Sarmento e Pinto

Nos dias atuais são diversas as propostas que norteiam a prática de cuidado e de educação das crianças pequenas em espaços coletivos de educação. Dentre estas, pretendemos nos orientar, neste texto, pela proposta de construção de uma Pedagogia da Infância1, que tenta demarcar as especificidades do trabalho com as crianças, considerando-as como atores sociais e, portanto, sujeitos de direitos.

A partir da proposta supra referida, as práticas marcadas historicamente pela coerção e pelo dogmatismo na relação com as crianças, deveriam estar em um processo de superação, pois o que preconiza é que as crianças possam ocupar seu lugar na história como sujeitos competentes para dizer de si mesmo ativos e produtores de cultura, e não apenas consumidores. Compreendemos, naturalmente, que não se trata de uma cultura autônoma, descolada da cultura do mundo adulto, mas sim de uma produção que traz consigo os elementos pertencentes a esse mundo adulto e carrega também a invenção, reinvenção e recriação gerada a partir das relações que as crianças travam com os outros seres humanos (adultos ou crianças) e que são reinterpretados ativamente e reinscritos por elas no circuito da cultura em geral.

Em nosso entender, ao reinscreverem, de forma ativa, estes elementos na cultura global, as crianças criam cultura. Esse processo de “reprodução interpretativa” (Corsaro, 2002), reforça nossa convicção de tomar as crianças como atores sociais e nos situa em um paradigma diverso daquele em que elas seriam dotadas da não razão, pois apesar da constatação empírica das singularidades da infância e de um vasto cabedal teórico sobre essa categoria social, ainda permanecem posturas que insistem em colocar em segundo plano os desejos, aspirações e idéias das crianças com o argumento da necessidade da manutenção de uma certa “ ordem social”2. Ordem essa, muitas vezes, estabelecida unilateralmente e sem diálogo a partir do ponto de vista dos adultos que cuidam das crianças e as educam. Assim, qualquer manifestação contrária aos desígnios de tal ordem é considerada “subversiva”, impossibilitando, em muitos casos, que a criança “vire do avesso”3 a estrutura organizacional e temporal criada pelos adultos (e da qual esses adultos também são criaturas).

Nessa ótica, muitos espaços coletivos de educação ainda são marcados por rituais diários, nos quais o tempo cronológico se

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sobrepõe ao tempo da brincadeira. Ainda que não neguemos a necessidade de organizar-se a jornada cotidiana de tempo e espaço no trabalho pedagógico com as crianças, o que questionamos é a rigidez, a inflexibilidade e a formatação do dia-a-dia delas segundo moldes que não combinam com a vivência plena da infância.

Dentro de um esquema desse tipo, a defesa dos direitos das crianças torna-se paradoxal, pois se cerceiam em vários momentos suas ações, mesmo aquelas que parecem triviais, como correr, pular, gritar, discordar, experimentar; ou ainda os direitos, como o de não querer dormir, de não querer comer salada, de não querer parar de brincar. São ações e direitos dessa natureza que dão a elas o poder de se expressarem por meio das várias linguagens que as constituem, ou seja, de serem elas mesmas, ou só não serem, quando estiverem caracterizadas de algum personagem saído de seu repertório imaginativo e construído a partir de seu mundo simbólico, podendo ter assim, “o mundo que se quer, segredo das crianças e dos poetas”. (Schüler, 2005, p.60).4

Algumas vezes insistimos em fazer com que as crianças se comportem como “mocinhos”, que não se sujem, que não saiam da mesa sem antes comer tudo, que não conversem nos momentos das refeições, que não levem brinquedos para o refeitório ou para o parque, que falem somente quando autorizadas, que pintem apenas com a pontinha dos dedos, que se alegrem sem fazer barulho, que não fiquem conversando no banheiro, que não se toquem na “hora do sono”, que pesquisem e descubram apenas aquilo que lhes for permitido, enfim, que aprendam quando forem autorizadas, reforçando uma relação de subalternidade. Consideramos importante não aceitar estas relações de poder pura e simplesmente como “naturais”. Refletir se essa relação de poder não decorre, apenas, da necessidade do professor “facilitar” o controle sobre o grupo de crianças, muitas vezes, diante da inadequação dos espaços educativos, quer em relação à infra-estrutura física, quer em relação à sobrecarga de trabalho, carga horária, etc., que acabam por comprometer o cotidiano, embora muitas vezes não percebamos ou admitamos a importância desses problemas.As crianças não são simplesmente um “objeto de condicionamento passivo”5, porque se movimentam e criam formas de burlar e transgredir essas regras. Estamos entendendo esses jeitos, que as crianças encontram para transpor o que lhes é determinado, como uma das especificidades da infância e como o cerne do processo de inovação, de criação que, dialeticamente articulado ao processo de reprodução, é responsável pelas transformações sócio-culturais que empreendemos ao longo do tempo e, conseqüentemente, pela instituição do novo.

Nesse sentido, pode-se afirmar que os grandes aliados na luta pelo reconhecimento do direito das crianças viverem sua infância (inclusive o direito de transgredir) são elas mesmas, que resistem, reagem, questionam e discordam das imposições dos adultos, principalmente quando a justificativa para a manutenção da ordem é

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completamente arbitrária e contrária às necessidades e aos interesses das crianças. A não conformidade das crianças às normas pré-estabelecidas e a criação de outros jeitos de fazer são, justamente, o que as diferenciam dos adultos. A disposição de experimentar esses outros jeitos de fazer sem preocupar-se com as conseqüências dos seus atos a médio e curto prazo é, em nosso entender, um ponto central na diferenciação entre crianças e adultos, talvez a base principal dessa capacidade de reagir à “ordem social” que falávamos acima.Aquilo que as faz terem outros mundos, instituindo outros elementos e expressando, assim, uma cultura infantil. Esse jeito de compor novas modas, de inventar estratégias para atender seus interesses e imprimir sua marca, amiúde faz dela uma transgressora sob a ótica do adulto. Ora! Então é preciso se questionar: Por quem são criadas as regras? A que interesses atendem? Quem as deve seguir? Com quem se debate a pertinência ou não das normas estabelecidas? As diferenças são reconhecidas ou contempladas? Quais as justificativas para a criação dessas regras? Talvez as crianças, sujeitos de pouca idade, porém não com menos direitos, não se sintam contempladas naquilo que é estabelecido sem a sua participação mais efetiva e, portanto, busquem outros modos de fazer as coisas, e quem sabe não seja por isso que sorriem mais.

Compreendemos que o debate em torno das relações de poder travadas na escola entre adultos e crianças merece ser ampliado e aprofundado se de fato pensamos na educação como passo importante para a constituição de sujeitos autônomos e felizes. Para tanto faz-se necessário reconhecer a alteridade das crianças, ampliar os conhecimentos que elas trazem para o contexto educativo, respeitar e estimular o repertório imaginativo que expressam e percebê-las como produtoras ativas de cultura, dando visibilidade às ações das crianças, às suas mil maneiras de ser, e ao que as torna tão diferentes e tão singulares: sua simultaneidade, sua imprevisibilidade, sua originalidade, sua racionalidade, enfim, sua criatividade. Nesse sentido, organizar cenários para que as crianças possam ser crianças, possam ampliar suas experiências afetivas, sociais e cognitivas, possam viver seu tempo, e não o tempo do adulto. É preciso organizar e diversificar espaços para que as crianças possam se expressar com liberdade e não de maneira fortuita. É necessário valorizar as ações das crianças, tentando entender a lógica e a capacidade que elas têm de imitar uma minhoca, de observar o movimento das formigas, de se pintar como uma joaninha, ou ainda de perseguir uma lagarta, de se disfarçar como um casulo ou de se transformar numa borboleta, enfim, muito mais que isso, é preciso ouvi-las, conhecê-las, respeitá-las, e entender sua forma diferente de pensar, de imaginar, de criar, de sentir.Quem sabe assim possamos não mais entender como mera transgressão os jeitos de fazer das crianças. É urgente, portanto, buscar um melhor entendimento sobre os universos infantis,

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conciliando a conduta do professor com os interesses das crianças. Essa busca incessante de uma alteridade na relação com elas faz-se no sentido de melhor entendê-las, esforçando-se para nos abstrair do mundo adultocêntrico , para melhor compreendê-las e torná-las mais felizes, tentando garantir assim, um de seus direitos básicos: o de viver como criança.