representaÇÕes sociais e formaÇÃo de professores

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VANIA LOUREIRO SILVA REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES: CONSTRUINDO POSSIBILIDADES PARA A INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM PARALISIA CEREBRAL Belo Horizonte 2008

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Page 1: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

VANIA LOUREIRO SILVA

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES:

CONSTRUINDO POSSIBILIDADES PARA A INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM

PARALISIA CEREBRAL

Belo Horizonte

2008

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Vania Loureiro Silva

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES:

CONSTRUINDO POSSIBILIDADES PARA A INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM

PARALISIA CEREBRAL

Dissertação apresentada ao curso de Mestrado da Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Enfermagem.

Área de concentração: Educação em Saúde e Enfermagem

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria Flávia Carvalho Gazzinelli Universidade Federal de Minas Gerais

Co-orientador: Prof.º Dr. Lúcio José Vieira Universidade Federal de Minas Gerais

Belo Horizonte

Escola de Enfermagem da UFMG

2008

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Universidade Federal de Minas Gerais Escola de Enfermagem Programa de Pós-Graduação

Dissertação intitulada “Representações sociais e formação de professores: construindo

possibilidades para a inclusão escolar de alunos com paralisia cerebral”, de autoria da

mestranda Vania Loureiro Silva, aprovada pela banca examinadora constituída pelos

seguintes professores:

___________________________________________________________________________

Profª. Drª Maria Flavia Carvalho Gazzinelli – UFMG – Orientadora

___________________________________________________________________________

Prof. Dr. Fernando Lefevre – Faculdade de saúde Pública – USP- examinador

___________________________________________________________________________

Profª Drª Rita de Cássia Marques – UFMG – examinadora

Belo Horizonte, 30 de abril de 2008

Av. Prof. Balena 190 – Belo Horizonte, MG - 30130-100, Brasil

Tel: 31- 34099836

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Dedicatória

Para Clara, minha querida filha, meu amor maior, minha luz, minha inspiração e força.

Page 6: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Agradecimentos

Às professoras que aceitaram o desafio de participar desta pesquisa e que sem a participação delas este trabalho não seria possível. Muito obrigada pela aprendizagem que me proporcionaram Aos pacientes e suas famílias com quem aprendo a ser pedagoga hospitalar a cada dia A todas as equipes escolares das crianças, jovens e adultos que acompanho no hospital pelas constantes trocas vivenciadas nesta trajetória À minha mãe pela torcida e apoio constante em toda minha trajetória profissional e acadêmica, tantas vezes cuidando da Clara, para que eu pudesse levar adiante meus sonhos Ao meu pai (in memorian), que sempre incentivou,valorizou e possibilitou minha formação acadêmica À minha irmã Leila pela enorme ajuda e torcida em toda esta trajetória À minha irmã Vera, minha “co-orientadora carioca”, por tantas leituras, preciosas sugestões, torcida e incentivo À Profª.Flavia Gazzinelli por acreditar na possibilidade deste estudo Ao Profº. Lucio pela disponibilidade e acolhimento Ao Hospital Sarah BH, em especial ao Dr. Paulo de Freitas Guimarães por possibilitar este estudo e apoiar as idéias embrionárias dele À Rede Sarah de Hospitais, especialmente ao Comitê de Ética em Pesquisa, pelas valiosas sugestões Ao amigo e enfermeiro Eduardo pelo incentivo, pelas infinitas trocas, pela disponibilidade e pelo apoio durante todo este percurso Ao Vitório e Olímpia pelas sugestões, disponibilidade e pelo apoio À fisioterapeuta Adriana Penna, à psicóloga Sheila Amoedo, ao pediatra Alexandre Araújo e à Profª Flávia Gazzinelli pela participação fundamental nos debates do Ciclo de Cinema. À Profª Ana Carla por todo apoio, troca e colaboração durante esta caminhada À Liliane Goulardins pela torcida, pelo apoio, pelas sugestões e dicas À Equipe da reabilitação infantil pela compreensão e apoio As equipes da biblioteca, da comunicação, da higiene e apoio, da manutenção, da nutrição, dos recursos humanos, da segurança, do Hospital Sarah BH pelo apoio durante este projeto

Page 7: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Ao Núcleo de Inclusão Escolar da Pessoa com Deficiência da Secretaria Municipal de Educação de BH (SMED), no nome da Patrícia e Elaine por possibilitarem este estudo. E a todas as pessoas que tive oportunidade de conhecer e com quem aprendo sobre processos de inclusão escolar no núcleo, nas regionais e nas escolas. Aos amigos queridos – Lucy, Nilzinha, Lucimara, Mônica (baiana), Adriana (nutri), Dri (TF), Liliane Baia, Isa, Sheila, Renata, Leonardo, Fabiana, por tantas palavras de apoio e incentivo nos momentos de desânimo e cansaço e também pela torcida. Valeu!!!!! À Helena pela compreensão por tantos papéis e livros espalhados pela casa, por ouvir tantos desabafos e pela torcida constante Ao CEAT, minha escola do coração, fundamental na minha formação e aos 4 alunos do Ceat, Filipe, Felipe, Renata e Giuliana, com quem ampliei minha visão de educação e de aprendizagem. Ao Moa que esteve sempre presente com a torcida e com palavras de incentivo nos momentos mais difíceis

Aos professores, funcionários e colegas do mestrado pelo convívio e pela aprendizagem A todos que direta ou indiretamente contribuíram para a realização deste estudo/sonho, muito obrigada!

Page 8: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

“A vida inventa! A gente principia as coisas, no não saber por que, e desde aí perde o poder de continuação – porque a vida é mutirão de todos, por todos remexida e temperada”.

Guimarães Rosa

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RESUMO

SILVA, Vania Loureiro. Representações sociais e formação de professores: construindo possibilidades para a inclusão escolar de alunos com paralisia cerebral. 2008. 121 f. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) - Escola de Enfermagem, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2008. Esta pesquisa diz respeito ao diálogo entre educação e saúde. A idéia de uma sociedade inclusiva fundamenta-se numa filosofia que reconhece e valoriza a diversidade como característica constituinte da sociedade. O movimento mundial de inclusão enfatiza a necessidade de alcançarmos uma educação para todos. A educação inclusiva é antes de tudo uma questão de direitos humanos, pois combate a segregação da pessoa como conseqüência de sua deficiência, dificuldade de aprendizagem, gênero, pertencimento a minoria étnica, etc. Desta forma, pensar a inclusão escolar de todos os educandos significa reivindicar uma ação educativa que responda de forma eficaz à diversidade dos alunos. O objetivo foi analisar os efeitos de uma intervenção educativa na mudança das representações sociais dos professores sobre o processo de inclusão escolar de seus alunos com paralisia cerebral. Apresenta abordagem qualitativa, orientada pelo referencial teórico da Teoria das Representações Sociais. Os sujeitos pesquisados foram 14 professoras da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte, que tinham, cada uma delas, um aluno com paralisia cerebral acompanhado pelo Hospital Sarah de Belo Horizonte. Como instrumentos de coleta de dados antes da intervenção educativa, foram utilizados questionários descritivos sobre os alunos e entrevista individual semi-estruturada e, após a intervenção, utilizamos a técnica do grupo focal. Como instrumento de organização dos dados, utilizamos a técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) e o software QualiQuantiSoft. Os resultados foram definidos e organizados nas seguintes categorias temáticas: Paralisia cerebral - desconhecimento do diagnóstico, preconceito e medo, insegurança pelo desconhecido e expectativa de cura; Inclusão escolar – precariedade do processo, direito à escola, desafio profissional, construção coletiva, solidão do professor e necessidade de formação pedagógica; Aprendizagem e desenvolvimento – a paralisia cerebral impede o processo; aprendizagem através da repetição e memorização; perspectiva de normalização e cura e ênfase no papel do meio; Comunicação, linguagem e escrita – impossibilidade na fala dificulta a comunicação; confusão entre déficit motor e cognitivo; alfabetização/aquisição da escrita como atividade motora e descoberta de novas formas de comunicação. Os dados obtidos foram confrontados com a teoria, permitindo-nos compreender como os professores significam o processo de inclusão escolar de seus alunos com paralisia cerebral. A utilização das representações sociais nas ações de formação de professores pode ser uma estratégia para promover mudanças nas representações destes profissionais e, consequentemente, aprimorar o trabalho pedagógico realizado com os alunos com paralisia cerebral nas escolas regulares. PALAVRAS-CHAVE: Representações Sociais, Formação de Professores, Inclusão Escolar, Paralisia Cerebral, Pedagogia Hospitalar.

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ABSTRACT

Silva, Vânia Loureiro. Social representations and teachers’ professional development: Creating possibilities for school inclusion of students with cerebral palsy. 2008, 121 f. Dissertation - (Master’s Degree in Nursing) – School of Nursing - Federal University of Minas Gerais, Belo Horizonte, 2008. This research concerns about the dialogue between education and health. The idea of an inclusive society is based on the belief which recognizes and values the diversity as a characteristic of society. Thus, the social inclusion movement emphasizes the need for an education for all people. First and foremost, inclusive schooling is a human rights issue, once it tackles segregation in schools in regard to consequences of their disadvantage, learning difficulties, gender, belonging to an ethnic minority, etc. Therefore, the possibility of inclusive school for all learners means a demand for an educational methodology which understands, effectively, students’diversity. The objective of this research was to analyse the effects of an educational intervention on the teachers’ social representations concerning the inclusive schooling process of their students with cerebral palsy. It presents a qualitative approach guided by concepts of social representations theory. The subjects researched were 14 female primary and high school teachers of Belo Horizonte’s Municipal Department of Education who had a student with cerebral palsy in their classes, monitored by Hospital Sarah of Belo Horizonte. Data collection material was obtained from questionnaires and semi-structured individual interviews conducted with the fourteen teachers, from educational intervention with the same teachers and from focal group technique. For data collection organization, it was used the technique of the collective subjective discourse (CSD) and the software QualiQuantiSoft. The results have been defined and organized in the following thematic categories: cerebral palsy - unknown diagnosis, prejudice and fear, insecurity with the unknown and expectation of a cure; inclusive schooling– precariousness of the process, right to school learning, professional challenge, collective construction, teacher’s loneliness and the need for a pedagogical formation; Learning and Development – cerebral palsy condition prevents the process; learning through repetition and memorization; expectation of normalization and cure, and emphasis on the individual environmental role; Communication, language and writing – speaking difficulties interferes with communication; confusion between sensory-motor deficit and cognitive deficit; literacy/writing acquisition as motor activity and the discovery of new methods of communication. The data obtained were compared with the theory, which allowed us to understand how the teachers give meaning to the inclusive schooling process of their students with cerebral palsy. The use of social representations in teachers’ professional training can be a strategy to promote changes in the representations of these professionals, and consequently, improve the methodology used with students with cerebral palsy in the regular school system. KEY-WORDS: Social Representations, Teachers’ Professional Training, Inclusive Schooling, Cerebral Palsy, Hospital Pedagogy.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Licença acadêmica para utilização do software QUALIQUANTISOFT.............. 70

Quadro 1 – Informações sobre as professoras........................................................................ 63

Quadro 2 – Informações sobre os alunos................................................................................ 64

Quadro 3 – Representações sociais das professoras sobre inclusão escolar........................... 75

Quadro 4 – Representações sociais das professoras sobre paralisia cerebral......................... 82

Quadro 5 – Representações sociais das professoras sobre aprendizagem e desenvolvimento. 89

Quadro 6 – Representações sociais das professoras sobre comunicação/linguagem/escrita...98

Page 12: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ACs – Ancoragens

AP – Amapá

APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais

BA – Bahia

CE – Ceará

COEP – Conselho de Ética em Pesquisa

CNE – Conselho Nacional de Educação

CNS – Conselho Nacional de Saúde

CPS – Centro de Políticas Sociais

DF – Distrito Federal

DSC – Discurso do Sujeito Coletivo

E-Ch – Expressões-Chave

FGV – Fundação Getulio Vargas

IBC – Instituto Benjamin Constant

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

ICs – Idéias Centrais

IESAE – Instituto de Estudos Avançados em Educação

INEP – Instituto Nacional de Educação e Pesquisas

INES – Instituto Nacional de Educação de Surdos

LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC – Ministério da Educação

MG – Minas Gerais

NEE – Necessidades Educacionais Especiais

PA – Pará

PC – Paralisia Cerebral

PNE – Plano Nacional de Educação

RME BH – Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte

RJ – Rio de Janeiro

RS – Representação Social

Page 13: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

SEESP – Secretaria de Educação Especial

SMED – Secretaria Municipal de Educação

TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

TRS – Teoria das Representações Sociais

UFJF – Universidade Federal de Juiz de Fora

UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais

UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

UNICEF – Fundo das Nações Unidas para Infância

USP – Universidade de São Paulo

Page 14: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

LISTA DE ANEXOS

ANEXO A – Carta de autorização para o estudo da Secretaria Municipal de Educação BH

ANEXO B – Parecer da Câmara Departamental de Enfermagem Aplicada da Escola de

Enfermagem da UFMG

ANEXO C – Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa da UFMG - COEP

ANEXO D – Termo de consentimento livre e esclarecido

ANEXO E – Carta convite enviada às escolas

ANEXO F – Roteiro de entrevistas

ANEXO G – Questionário descritivo sobre os alunos

ANEXO H – Ciclo de palestras sobre Inclusão e Paralisia Cerebral

ANEXO I – Ciclo de Cinema e Inclusão

ANEXO J – Questionário de avaliação da Intervenção Educativa

ANEXO K – Registro do curso: Educação inclusiva: construindo possibilidades-

CENEX – Centro de Extensão da Escola de Enfermagem da UFMG

Page 15: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 15

2 OBJETIVOS 22

2.1 Objetivo geral 22

2.2 Objetivos específicos 22

3 PC E PROCESSOS DE INCLUSÃO ESCOLAR 23

3.1 Paralisia cerebral 23

3.2 Processos de inclusão escolar 30

4 FORMAÇÃO DE PROFESSORES E REPRESENTAÇÃO SOCIAL 33

5 INTERVENÇÃO EDUCATIVA E CONCEPÇÃO DE APRENDIZAGEM

E DESENVOLVIMENTO NA ABORDAGEM SÓCIO-HISTÓRICA

5.1 Intervenção educativa 40

5.2 A concepção de aprendizagem e desenvolvimento na abordagem sócio-histórica 44

6 PERCURSO METODOLÓGICO 48

6.1 Abordagem teórico-metodológica 48

6.2 Cenários da pesquisa 51

6.3 Sujeitos da pesquisa 53

6.4 Aspectos éticos 58

6.5 Instrumentos e procedimentos para coleta de dados 58

6.6 Procedimentos para organização e sistematização dos dados – Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) e o QualiQuantiSoft 61

Page 16: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

7 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE O UNIVERSO DE ALUNOS COM

PARALISIA CEREBRAL 65

7.1 Representações sociais das professoras sobre paralisia cerebral 67

7.1.1 Paralisia cerebral é igual catapora 67

7.1.2 Tudo jóia num corpo que não mexe 68

7.1.3 O menino não tinha condição nem de raciocinar 69

7.1.4 Eu tinha medo da paralisia cerebral 69

7.1.5 E se fizesse mais fisioterapia estaria andando? 70

7.1.6 Nem sempre... há casos e casos 71

7.1.7 Descoberta de diferentes práticas pedagógicas 72

7.1.8 Hoje eu entendo que a paralisia cerebral não é igual para todos 72

7.2 Representações sociais das professoras sobre inclusão escolar 73

7.2.1 Todos da escola aceitam bem a inclusão 74

7.2.2 A inclusão é um processo precário, é construção, demanda tempo 75

7.2.3 Inclusão é responsabilidade de todos 76

7.2.4 Aos poucos percebemos que ele tem progredido e temos aprendido com ele 77

7.2.5 A parte pedagógica precisa ser melhorada 78

7.2.6 Inclusão é um processo solitário 79

7.2.7 As crianças com PC têm direitos 81

7.2.8 Meu aluno tem mudado... e eu também 82

7.3 Representações sociais das professoras sobre aprendizagem e desenvolvimento 83

7.3.1 As crianças têm limites e possibilidades 84

7.3.2 O desenvolvimento das crianças com paralisia cerebral é totalmente diferente dos outros alunos 84

7.3.3 Ele aprendeu, eu sei, mas não sei bem o quê 85

7.3.4 Ele tem dificuldade em guardar, você repete e depois ele não lembra mais 86

7.3.5 Eu tenho visto que ele está melhorando 87

7.3.6 É um ser humano que precisa de estimulação 88

Page 17: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

7.3.7 Meu olhar para as crianças com paralisia cerebral mudou 88

7.3.8 Eu vi que meu aluno é capaz 89

7.3.9 No início era só cópia mesmo... agora ele produz dentro de sala 89

7.3.10 Meu aluno foi uma escola de vida 90

7.4 Representações sociais das professoras sobre comunicação, linguagem escrita 91

7.4.1 Me dá um desespero...ele tentando me contar algo e eu não entendendo 92

7.4.2 Será que ele está me ouvindo? 93

7.4.3 Escrita é desenho da letra, treino da coordenação 94

7.4.4 O significado é muito difícil de copiar 95

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS 97

REFERÊNCIAS 101

ANEXOS 109

Page 18: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

1 INTRODUÇÃO

A mente que se abre a uma nova idéia jamais volta ao seu tamanho original.

(Albert Einstein)

Este estudo insere-se no contexto de uma reflexão sobre a inclusão de alunos com

paralisia cerebral nas escolas municipais regulares de Belo Horizonte e também na possibilidade

de interlocução saúde e educação, no contexto da educação inclusiva. Collares e Moisés (1987)

enfatizam a relação entre saúde e educação, afirmando que ambas trabalham com o mesmo

sujeito - o ser humano – e com o mesmo propósito: propiciar-lhe seu pleno desenvolvimento e

bem estar. Estes dois campos conseguem, então, potencializar suas ações quando buscam

trabalhar em conjunto.

A idéia de uma sociedade inclusiva fundamenta-se numa filosofia que reconhece e

valoriza a diversidade como característica constituinte de qualquer sociedade. O movimento

mundial de inclusão destaca a necessidade de alcançarmos uma educação para todos. A educação

inclusiva é antes de tudo uma questão de direitos humanos, pois combate a segregação da pessoa

como conseqüência de sua deficiência, dificuldade de aprendizagem, gênero, pertencimento a

minoria étnica etc. Desta forma, pensar a inclusão escolar de todos os educandos significa

reivindicar uma ação educativa que responda de maneira mais eficaz à diversidade dos alunos. Se

a vida humana caracteriza-se pela diversidade e multiplicidade de formas de existência, a

formação dos professores, neste contexto da inclusão, precisa incluir reflexões acerca do trabalho

pedagógico na diversidade.

Nesta perspectiva, a Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação

(SEESP/MEC), no documento Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da

Educação Inclusiva, define que

A educação inclusiva constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à idéia de eqüidade formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola (BRASIL, 2008). Mantoan (2006, p.20) afirma que é necessário “reconhecer a igualdade de aprender como ponto de partida e as diferenças no aprendizado como processo e ponto de chegada”.

Page 19: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Esta pesquisa foi motivada por constantes indagações referentes a minha prática de

pedagoga em ambiente hospitalar, acompanhando o processo pedagógico de alunos com paralisia

cerebral, junto a suas famílias e escolas. Atuo como pedagoga na área hospitalar desde 1997, com

crianças, jovens e adultos que, em conseqüência de diagnósticos que envolvem o aparelho

locomotor, apresentam “dificuldades” no processo de aprendizagem. Essas “dificuldades” me

ajudaram a perceber, conhecer, descobrir potencialidades humanas e possibilidades de trajetórias

singulares de aprendizagem, e a descortinar um universo de alunos/sujeitos aprendizes que, até

então, não faziam parte da minha experiência de vida e profissional. Quais são os fatores

determinantes para que os professores ampliem a visão sobre educação, sobre os alunos e suas

trajetórias de aprendizagem?

Entendendo que as ações e práticas dos professores estão fundamentadas por suas

crenças, tentar identificar quais os marcos na minha história de vida pessoal e profissional que

contribuíram para rupturas com crenças antigas e ampliação dos horizontes profissionais talvez

seja uma possibilidade de identificar caminhos para o trabalho que realizo hoje com os

professores das crianças com paralisia cerebral acompanhadas no Hospital Sarah de Belo

Horizonte.

Quando iniciei minha formação como educadora, em 1976, no antigo Curso Normal,

nunca tive interesse ou curiosidade pela educação especial. Durante todo o meu curso de

formação de professores falava-se apenas de uma infância única, de um “padrão normal” de

criança e desenvolvimento. Posteriormente, na Faculdade de Educação, uma outra visão de

infância e a possibilidade de contribuição da educação para a transformação social começavam a

se delinear.

Anos mais tarde, no curso de especialização em Filosofia da Educação, no Instituto

de Estudos Avançados em Educação - IESAE, na Fundação Getúlio Vargas (FGV), em 1988,

minha preocupação central era entender como uma gestão democrática nas escolas poderia

contribuir de forma efetiva para a formação dos alunos. Uma gestão democrática na escola seria

determinante para a formação de valores democráticos dos alunos? Estaríamos assim formando

cidadãos mais conscientes e críticos e, conseqüentemente, mais participativos socialmente?

Paralelamente a minha formação, iniciei minha atuação como professora e

supervisora pedagógica. No entanto, durante 17 anos de atividade profissional em escolas, o

universo das crianças com necessidades educacionais especiais me foi totalmente desconhecido.

Page 20: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

No meu “saber e prática pedagógica” ainda não existia lugar para elas, talvez por

acreditar que só poderiam ser tratadas e educadas por “especialistas”, aqueles que tinham se

preparado para este trabalho. Hoje, pergunto: se só os especialistas em educação especial estavam

preparados para a diversidade na escola e se a condição da vida humana é múltipla e plural, para

quais alunos e quais salas de aula estariam os professores preparados? O que os leva a aprofundar

determinado aspecto de sua formação? O que os instiga a mudar caminhos, rotas, olhares

profissionais? Como as questões profissionais vão surgindo em suas vidas e como vão tentando

superá-las? Quais são os disparadores para as mudanças de crenças, para tirarmos nossas

“viseiras” educacionais, profissionais e pessoais? Quais os determinantes para nos sentirmos

preparados para os desafios profissionais que se colocam?

A partir do contato diário com quatro crianças com necessidades educacionais

especiais (uma com paralisia cerebral, uma com Síndrome de Down, uma surda e uma criança

autista) em uma escola comum, meu olhar para o desenvolvimento infantil, para o processo de

aprendizagem e, as questões que esse dia-a-dia suscitava sobre o trabalho pedagógico, se

ampliaram. Em pesquisa anterior, com professores da Rede Pública de Belo Horizonte, da qual

participei, identificamos que o professor ter contato com crianças com paralisia cerebral foi fator

relevante para considerar que essas crianças poderiam aprender e freqüentar escola regular (SILVA e

RIBEIRO, 2000).

Desde então, busco conhecer, entender e trabalhar com crianças com necessidades

educacionais especiais, reconhecendo que o lugar delas é na escola e na sociedade. Minha visão

de educação ampliou-se, comecei a trabalhar com um novo paradigma, o da inclusão de todas as

crianças numa única escola de qualidade, como afirma MANTOAN (1997, 2003).

Hoje, como pedagoga hospitalar atuando nos programas de reabilitação infantil do

Hospital Sarah/Belo Horizonte, busco contribuir para o processo de inclusão escolar das crianças

com paralisia cerebral e para a formação de seus professores, entendendo que este trabalho

conjunto hospital/escola é fundamental para a efetiva construção de uma escola para todas as

crianças: justa, acolhedora das diferenças infantis, democrática, adaptada às diferentes

necessidades do universo plural infantil. Neste novo universo profissional, outras interrogações

surgem: em que dimensão a prática da pedagogia hospitalar, dentro de sua especificidade, está

contribuindo para o processo de construção de uma nova escola fundamentada no paradigma da

Page 21: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

inclusão? Em que medida o trabalho da pedagogia hospitalar pode ser fomentador de práticas de

acolhimento da diversidade e não práticas pedagógicas discriminatórias e excludentes?

O compromisso dos educadores no contexto hospitalar é fundamentalmente com o

acompanhamento do processo ensino-aprendizagem das crianças, jovens e adultos e envolve

também a troca com as equipes escolares (BARROS, 1999; SANTOS, 2000; SILVA, 2001).

Através de intervenções psicopedagógicas, os educadores podem contribuir na

descoberta e no desenvolvimento das potencialidades dos sujeitos. É preciso que a diferença seja

percebida como mais uma possibilidade no universo plural da existência humana, e não como a

marca da falta, da desvalorização e do preconceito. Sobre a significação da diferença, Marques e

Marques (2003, p.234) elucidam que:

...ser diferente não significa mais ser o oposto do normal, mas apenas ser diferente. Este é, com certeza, o dado inovador: o múltiplo como necessário, ou ainda, como único universal possível, o que deriva em práticas sociais de reconhecimento e respeito pelo outro.

Sendo assim, a função do educador no hospital é oportunizar diferentes situações

significativas de aprendizagem que contribuam no processo de reabilitação e no desenvolvimento

dos sujeitos.

Ceccim (1997) considera que o objeto de uma escuta pedagógica em ambiente

hospitalar é afirmar positivamente a experiência da doença ou hospitalização e não marcá-la

como ruptura com os laços interativos da aprendizagem de si, do mundo, das relações.

Os desafios da construção de uma escola para todos, adaptada à humanidade real,

devem basear-se no entendimento de que os campos da saúde e da educação são práticas em

constante transformação.

Para o desenvolvimento desses objetivos, consideramos a interlocução entre o

hospital e a escola, o trabalho conjunto entre a saúde e a educação, meta fundamental deste

processo.

Os programas de reabilitação infantil do Hospital Sarah/BH vêm atuando junto às

escolas e Secretarias Municipais e Estaduais de Educação desde 1997, buscando contribuir para o

processo de inserção e reinserção escolar das crianças com paralisia cerebral e para a formação

dos professores das escolas nas quais as crianças estão inseridas.

Page 22: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Este trabalho conjunto entre a saúde e a educação, ou seja, entre o Hospital

Sarah/Belo Horizonte e as escolas, vem acontecendo de duas formas. O atendimento pedagógico

durante o período de internação dos pacientes, que objetiva minimizar os efeitos da

hospitalização na medida em que atende às necessidades básicas de desenvolvimento das crianças

hospitalizadas, possibilitando também que essas crianças mantenham o vínculo com suas vidas e

rotinas fora do hospital. Em relação às atividades escolares, a possibilidade da criança estudar no

hospital evita a defasagem de conteúdos e uma possível exclusão escolar (BARROS, 1999;

FONSECA, 1998; SANTOS, 2000). A outra forma de interlocução entre o hospital e a equipe da

escola acontece através do acompanhamento pedagógico para as crianças que são atendidas em

sistema ambulatorial. Nesses atendimentos, a equipe orienta a família sobre a importância da

inserção escolar da criança, o mais cedo possível. Um dos objetivos desse trabalho é acompanhar

a criança em sua escolarização, oferecendo suporte para a equipe escolar em relação ao

esclarecimento do diagnóstico, orientação quanto às adaptações e materiais necessários, e

sugestões de intervenções psicopedagógicas adequadas às suas necessidades.

Algumas das estratégias utilizadas para viabilizar este suporte à equipe escolar vem

sendo a realização de visitas escolares e estudos de caso com os professores das crianças

acompanhadas no hospital.

As visitas escolares são realizadas semanalmente, por demanda da família, da escola

ou da equipe hospitalar, e podem ser realizadas por vários profissionais do hospital (médico,

terapeuta funcional, psicólogo, pedagogo, enfermeiro), dependendo do objetivo específico das

mesmas.

Os estudos de casos são organizados pela pedagogia hospitalar e pela fisioterapia,

algumas vezes com a participação das Secretarias de Educação de Belo Horizonte e de outros

municípios da região metropolitana, reunindo as equipes pedagógicas e a equipe do Hospital

Sarah Belo Horizonte para discutir o processo pedagógico dos alunos acompanhados.

A escolha pelos alunos com paralisia cerebral, neste estudo, justificou–se pelo

número de alunos inseridos nas escolas públicas e, também, pelo relato de seus professores

durante as visitas escolares, sobre as dificuldades vivenciadas no processo pedagógico com estes

alunos, em função de suas alterações motoras e cognitivas.

Em muitas pesquisas sobre o processo de inclusão escolar de pessoas com

deficiências, um dos aspectos apontados pelos professores e pais como obstáculo à inclusão é a

Page 23: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

falta de preparo e formação para o trabalho escolar com estes alunos. Os professores sentem-se

inseguros e despreparados para esta nova tarefa e alguns ressaltam o descaso do poder público

com esta questão (BUENO, 1999; CARVALHO, 1997; DINIZ E RAHME, 2004; GLAT, 1995;

MANTOAN, 2003; SANTOS, 2000).

Considerando que o êxito da inclusão escolar depende da qualidade do trabalho

docente, buscar desvelar o pensar e o agir dos professores sobre seus alunos com paralisia

cerebral e sobre o processo de inclusão escolar em curso constituem uma necessidade no

processo de formação dos professores, assim como pensar uma formação em serviço, partindo

dessas crenças dos professores.

Desenvolver uma intervenção educativa a partir das representações dos professores

pode ser importante ferramenta para a elaboração de estratégias na formação de professores que

visem implementar a inclusão.

As representações sociais (RS) apresentam-se através da linguagem e determinam as

atitudes dos membros de um grupo. Partindo do pressuposto que as representações permitem uma

compreensão das práticas educativas no cotidiano das escolas, buscar conhecer e tentar

“ressignificar” as representações de um grupo podem constituir-se em recurso valioso no

processo de formação de professores. Minayo chama nossa atenção para o fato das

...representações sociais serem ao mesmo tempo ilusórias, contraditórias e “verdadeiras”, podem ser consideradas matéria-prima para a análise do social e também da ação pedagógico-política de transformação, pois retratam a realidade (MINAYO, 1993, p.174).

A Teoria das Representações Sociais (TRS) se coloca contra uma epistemologia do

sujeito “puro” ou do objeto “puro” e centra seu olhar na relação entre os dois. Desta forma a TRS

recupera um sujeito que, através de sua atividade e relação com o objeto-mundo, constrói tanto o

mundo como a si próprio (Guareschi e Jovchelovitch, 2003).

Moscovici (2003, p.46), ao formular a Teoria da Representação Social (TRS), destaca

que,

...as representações sociais devem ser vistas como uma maneira específica de compreender e comunicar o que nós já sabemos. Elas ocupam, com efeito, uma posição curiosa, em algum ponto entre conceitos, que têm como seu objetivo

Page 24: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

abstrair sentido do mundo e introduzir nele ordem e percepções, que reproduzam o mundo de uma forma significativa.

Esta pesquisa tem como tema o estudo dos processos de inclusão escolar de crianças

com paralisia cerebral, focalizando as representações sociais dos seus professores sobre paralisia

cerebral, inclusão escolar, aprendizagem e desenvolvimento, e comunicação, linguagem e escrita,

por reconhecer que estes significados interagem no fazer cotidiano dos professores.

O objetivo com a realização deste trabalho, motivado por questionamentos relativos a

minha prática profissional, é o de poder contribuir para a compreensão das representações sociais

dos professores sobre o universo de seus alunos com paralisia cerebral e de usar essas

representações nas ações de formação, almejando uma reflexão crítica sobre o trabalho

pedagógico na diversidade e a construção de uma escola para todos na perspectiva da educação

inclusiva. Sendo assim, o presente trabalho estrutura-se da seguinte forma:

No segundo capítulo definimos os objetivos geral e específicos deste estudo.

Iniciamos o terceiro capítulo fazendo uma breve descrição sobre a paralisia cerebral

e, em seguida, discutimos o conceito de inclusão e alguns processos de inclusão escolar de

crianças com deficiências.

O quarto capítulo aborda a possibilidade de usarmos as representações sociais dos

professores nas ações de formação docente e destaca alguns estudos sobre formação de

professores neste contexto da inclusão.

No quinto capítulo procedemos à descrição da proposta de trabalho sobre a

“Intervenção Educativa” desenvolvida com as professoras no ano de 2007, e uma apresentação

suscinta sobre a abordagem do processo de aprendizagem e desenvolvimento na teoria de

Vygotsky.

Descrevemos o percurso metodológico e o contexto desta investigação, no sexto

capítulo.

Dedicamos o sétimo capítulo à análise dos dados, buscando relacionar o

conhecimento teórico sobre o tema com as representações sociais das professoras sobre o

universo de seus alunos com paralisia cerebral, identificadas no Discurso do Sujeito Coletivo

(DSC).

Para finalizar, no capítulo oitavo apresentamos as considerações finais deste estudo e

possíveis sugestões de encaminhamentos para a formação de professores no contexto da inclusão.

Page 25: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

1 OBJETIVOS

O mais importante da vida não é a situação em que estamos, mas a direção para a qual nos movemos.

(Oliver Wendell Holmes)

2.1 Objetivo geral

• Analisar os efeitos de uma intervenção educativa na mudança das representações

sociais dos professores sobre o processo de inclusão escolar de seus alunos com

paralisia cerebral.

2.2 Objetivos específicos

• Analisar as representações sociais dos professores sobre: paralisia cerebral;

relação de aprendizagem e desenvolvimento; comunicação, linguagem, escrita; e

inclusão escolar de seus alunos com paralisia cerebral ao início e ao final da

intervenção educativa.

• Desenvolver uma intervenção educativa elaborada a partir das representações

sociais dos professores.

• Identificar possíveis mudanças nas representações sociais dos professores após a

intervenção educativa.

Page 26: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

3 PARALISIA CEREBRAL E PROCESSOS DE INCLUSÃO ESCOLAR

Os nossos limites reais não estão na possibilidade ou impossibilidade que temos de andar, enxergar, ouvir ou pensar da forma como acreditamos que todos fazem.

Os nossos limites estão na dificuldade que encontramos nas relações que travamos com o mundo. Por isso, os nossos limites reais estão na nossa alma.

Não existe nada mais deficiente do que um espírito amputado. E para esse espírito não há prótese. (João Ribas)

3.1 Paralisia cerebral

A encefalopatia crônica da infância foi descrita inicialmente por Little, obstetra

inglês, em 1843, como caracterizada principalmente por rigidez muscular. Em 1862, ele

estabeleceu relações entre as complicações do trabalho de parto e a síndrome por ele descrita.

A expressão paralisia cerebral (PC), sugerida por Freud em 1897 e consagrada por

Phelps, refere-se às crianças que apresentam transtornos motores, mais ou menos severos, devido

a lesão no sistema nervoso central (ROTTA, 1997, 2002). A paralisia cerebral descreve um grupo

de desordens do desenvolvimento do movimento e da postura que são atribuídos aos distúrbios

não progressivos que ocorreram no cérebro em desenvolvimento. As desordens motoras da

paralisia cerebral são freqüentemente acompanhadas por distúrbios da sensação, cognição,

comunicação, percepção, e/ou comportamento e/ou convulsão (BAX et al., 2005).

O cérebro comanda as funções do corpo. Cada área do cérebro é responsável por uma

determinada função, como os movimentos dos braços e das pernas, a visão, a audição e a

inteligência. Uma criança com PC pode apresentar alterações que variam desde leve

incoordenação dos movimentos ou uma maneira diferente para andar até inabilidade para segurar

um objeto, falar ou deglutir. O desenvolvimento do cérebro tem início logo após a concepção e

continua após o nascimento. Ocorrendo qualquer fator agressivo ao tecido cerebral antes, durante

ou após o parto, as áreas mais atingidas terão a função prejudicada e, dependendo da importância

da agressão, certas alterações serão permanentes caracterizando uma lesão não progressiva

(REDE SARAH, 2007).

As causas da paralisia cerebral dividem-se de acordo com o período de ocorrência da

lesão: causas pré-natais (infecções congênitas: citomegalia, toxoplasmose, rubéola; desordens

genéticas e hipóxia fetal); causas peri-natais (prematuridade, complicações durante o parto e

Page 27: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

hiperbilirrubinemia) e causas pós-natais (infecções do sistema nervoso central, traumatismo

crânio-encefálico e hipóxia cerebral grave).

De acordo com Imamura (2000), das crianças que nascem no Brasil estima-se que,

anualmente, cerca de seis mil terão diagnóstico de paralisia cerebral ao longo de seu

desenvolvimento.

O distúrbio no movimento é a principal característica da PC e o tipo de alteração do

movimento observado está relacionado com a localização da lesão no cérebro e a gravidade das

alterações depende da extensão da lesão.

A classificação da PC geralmente considera a topografia e o tipo de alteração de

tônus encontrada. A topografia refere-se aos membros afetados: monoplegia, hemiplegia,

diplegia, triplegia ou tetraplegia. A monoplegia é uma condição rara, na qual somente um

membro é envolvido, sendo este geralmente o membro inferior. A hemiplegia envolve o membro

superior e o inferior de um mesmo lado, direito ou esquerdo. A diplegia é o acometimento de

predomínio em membros inferiores, com envolvimento mais leve em membros superiores. Na

triplegia existe comprometimento de três membros, geralmente os membros inferiores e um

membro superior. Na tetraplegia o comprometimento é de todo o corpo: cabeça, pescoço, tronco

e membros. A alteração de tônus é classificada como espasticidade, movimentação involuntária,

ataxia, hipotonia e a forma mista (CAMPOS DA PAZ JR, BURNETT e NOMURA, 1996).

Campos da Paz Jr. e seus colaboradores (1996) classificam os distúrbios do

movimento em espasticidade, ataxia, movimentos involuntários, hipotonia e a forma mista. A

espasticidade representa a forma mais freqüente e nela observa-se aumento da resistência ao

movimento passivo das articulações, além de reflexos não esperados no desenvolvimento normal.

Relaciona-se com lesões do trato piramidal, usualmente no córtex motor ou giro pré-central.

A forma atáxica se caracteriza, principalmente, por deficiência do equilíbrio corporal.

Ocorre devido a lesão no cerebelo ou no trato cerebelar. Outros sinais encontrados na ataxia são o

nistagmo, a dismetria e a disartria.

Os movimentos involuntários são classificados em coreoatetósicos (associação de

movimentos coréicos e atetósicos) e distonias. Os movimentos distônicos caracterizam-se por

movimentos intermitentes de torção. Quanto aos movimentos coreoatetósicos, referem-se a

movimentos grosseiros, rápidos, arrítmicos e súbitos (movimentos coréicos), associados a

movimentos lentos e contínuos das extremidades (movimentos atetósicos). Ocorrem em lesões de

Page 28: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

gânglios da base, que em condições normais inibem movimentos rítmicos espontâneos iniciados

no córtex cerebral.

Quanto à hipotonia, verifica-se uma diminuição da resistência ao movimento passivo,

sendo uma condição rara na paralisia cerebral.

A forma mista é a combinação das diferentes alterações do movimento citadas acima

e o distúrbio do movimento predominante é que determinará sua classificação, por exemplo,

paralisia cerebral tipo tetraplegia com predomínio da movimentação involuntária ou da

espasticidade.

A paralisia cerebral é uma lesão cerebral de caráter irreversível, portanto, não

passível de cura, porém alguns de seus efeitos podem ser minimizados. O tratamento da PC

envolve uma equipe multiprofissional, o estabelecimento de objetivos viáveis e a participação da

família na busca de recursos que promovam independência, autonomia, expressão e melhora na

qualidade de vida da pessoa com paralisia cerebral.

O termo paralisia cerebral implica alterações do movimento, mas a presença de outros

distúrbios deve ser investigada e o sucesso do tratamento depende da abordagem correta de todos

os problemas associados, tais como: déficit cognitivo, alterações de fala, epilepsia, desordens

visuais e auditivas, alterações na mastigação e deglutição, constipação intestinal.

Um grande número de crianças com paralisia cerebral apresenta dificuldades para a

realização das atividades de vida diária e, dependendo do grau das limitações motoras, algumas

vezes são necessárias técnicas de execução, uso de adaptações e de dispositivos especiais para

favorecer o desempenho dessas atividades ou ajuda nas atividades por toda a vida.

Quanto à locomoção, dependendo do grau de envolvimento motor e do déficit de

equilíbrio serão necessários auxílios, tais como: andador, bengalas canadenses, carrinho ou

cadeira de rodas adaptada.

Muitas crianças com PC, apesar de terem inteligência normal, podem apresentar

dificuldades de movimento tão graves que prejudicam sua capacidade para escrever e falar.

Alguns recursos alternativos como sistemas de comunicação alternativa e adaptações como

apontadores de cabeça ou de queixo já foram desenvolvidos para ajudar na comunicação dessas

crianças. Atualmente, as pesquisas em engenharia de reabilitação têm procurado utilizar o

computador, interfaces (dispositivos que permitem o acesso aos comandos do computador) e

Page 29: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

softwares para viabilizar a comunicação e o processo de alfabetização e expressão escrita destas

crianças (REDE SARAH, 2007).

3.2 Processos de inclusão escolar

Eu preferia que meus filhos freqüentassem uma escola em que as diferenças fossem observadas, valorizadas e celebradas como coisas boas, como

oportunidades para a aprendizagem... eu gostaria de ver nossa compulsão para eliminar as diferenças substituída por um enfoque igualmente insistente em se

fazer uso dessas diferenças para melhorar as escolas. O que é importante sobre as pessoas – e sobre as escolas – é o que é diferente, não o que é igual”.

(Robert Barth)

A sociedade tem acompanhado as conquistas e avanços na luta pelos direitos e pela

cidadania das pessoas com deficiências. Essas conquistas exigem transformações nos serviços

públicos, especialmente nas áreas da educação, saúde e assistência. A pesquisa realizada pelo

Centro de Políticas Sociais (CPS), da Fundação Getulio Vargas (FGV), nos fornece um mapa de

conhecimento sobre o universo das pessoas com deficiências no Brasil, incluindo aspectos sobre

a escolarização. O documento aponta que até 2025 haverá um aumento de 30,6% da população

com deficiência, em relação ao ano de 2000 e, desta forma, será necessário preparar políticas e

práticas adequadas para esta demanda. A escolaridade média destas pessoas é um ano menor que

o grupo das pessoas sem deficiência. Enquanto a taxa da população em geral que nunca

freqüentou a escola é de 16,3%, entre as pessoas com deficiência esta taxa sobe para 21,6%. A

taxa de matrícula em curso de alfabetização de adultos é de 32% para as pessoas com deficiência

e 11% para o restante da população (FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS, 2003).

O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), em seu relatório sobre a

Situação da Infância e Adolescência Brasileiras, Diversidade e Eqüidade, em 2006, baseando-se

em dados colhidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para o Censo

Demográfico 2000, destaca a seguinte situação sobre escolarização das crianças e adolescentes

com deficiência:

Page 30: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

• As crianças e os adolescentes com qualquer tipo de deficiência, entre 7 e 14 anos, têm o

dobro de chance de estar fora da escola, em comparação com as crianças e os adolescentes

sem deficiência, no Brasil.

• 32,9% da população sem instrução ou com até três anos de estudo possuem alguma

deficiência.

• Os adolescentes com deficiência, entre 12 e 17 anos, que apresentam paralisia, falta ou

amputação de algum membro, ou aqueles que apresentam deficiência mental têm quatro

vezes mais possibilidade de estar fora da escola que os adolescentes sem nenhuma

deficiência.

• Onze milhões de pessoas com deficiência, com 15 anos ou mais, não têm nenhuma ou têm

baixíssima escolaridade.

Os dados do Censo Escolar de 2006 (MEC/INEP) registram que a participação do

atendimento inclusivo cresceu, no Brasil, passando dos 24,7% em 2002 para 46,4% em 2006

(BRASIL, 2006).

Desta forma, refletir sobre o trabalho pedagógico desenvolvido com os alunos que

apresentam diagnóstico de paralisia cerebral e buscar qualificar este processo constitui-se como

um dos desafios da inclusão escolar de alunos com deficiências, já em curso no nosso país.

Na história da educação para pessoas com necessidades educacionais especiais,

podemos identificar quatro fases: exclusão, segregação, integração e inclusão (BUENO, 1993;

FERREIRA, J., 1994; MAZZOTTA, 1996; MANTOAN, 1997; SASSAKI, 1999).

A fase da exclusão (anterior ao século XIX) caracteriza-se como uma pré-história da

educação, já que não há nenhuma proposta de atendimento educacional para essas pessoas.

Predominam o desconhecimento e a rejeição a esses sujeitos, negando-se até mesmo a sua

condição humana.

Na fase da segregação (final do séc. XIX), inicia-se o atendimento diferenciado para

esses sujeitos, marcando o início da educação especial. No Brasil, são inauguradas por D. Pedro

II, no Rio de Janeiro, o Instituto dos Surdos Mudos em 1856, atual Instituto Nacional de

Educação de Surdos (INES) e o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, em 1854, atual Instituto

Benjamin Constant (IBC). Na metade do século XX, em 1954, é fundada a primeira Associação

de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE). As pesquisas indicam que esse tipo diferenciado de

Page 31: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

atendimento não contribuiu para aumentar o acesso dessas crianças à escola, como também não

contribuiu para aumentar o índice de escolaridade. A maioria desses atendimentos revelou um

caráter mais assistencial do que educativo. Atribui-se também a este período uma contribuição da

escola especial na legitimação da segregação da criança com deficiência (HICKEL, 1995).

A fase da integração inicia-se no final da década de 1960 e início dos anos 1970, na

Dinamarca, nos Estados Unidos e no Canadá. A filosofia da integração defende o princípio da

normalização, ou seja, o indivíduo desenvolver uma vida tão normal quanto possível. Segundo

esta concepção, a inserção na escola regular e na sociedade vai depender do aluno, ele deve

adaptar-se às condições da escola sem que esta se modifique. Nesta fase, encontram-se vários

níveis de integração, desde a participação em algumas atividades (ex: aula de música, recreio),

até a inserção total na escola regular. Apesar de a proposta integradora buscar a inserção das

pessoas com deficiência em diversos espaços sociais, para Marques, C. (2001, p.67),

A integração acabou reduzida ao mérito de alguns “capazes” e ao demérito da grande maioria, considerada a parcela dos “incapazes”. Tal fato não se deve, certamente, à construção teórica do princípio, mas ao contexto cultural, político e ideológico em que foi formulado, ou seja, no contexto da Modernidade.

A proposta da inclusão é, desde o início, não deixar ninguém de fora do sistema

escolar. Reafirma o Direito à Educação para todos e defende o ensino centrado no aluno. Estas

idéias representam o atual consenso mundial sobre futuros rumos dos serviços educativos

especiais. A educação vem construindo desde 1994, a partir das diretrizes da Declaração de

Salamanca de 1996, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional- LDBEN, (BRASIL,

1996) e de 2001, com as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial (Resolução n° 2 –

9/2001), o processo de inclusão escolar de crianças e jovens com deficiências. Apesar das

Diretrizes Nacionais para a Educação Especial estarem em vigor desde dezembro de 2001,

observam-se diferentes políticas públicas, muitas ainda contrárias à inclusão escolar (BRASIL,

2001).

Um marco para a educação inclusiva foi a Declaração de Salamanca, elaborada na

Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais: acesso e qualidade, ocorrida na

Espanha, em 1994. Suas orientações apontam para uma reformulação da escola, que deve

adaptar-se a todas as crianças sem exceção, inspirando-se no princípio de que todas as diferenças

humanas são normais. As escolas devem reconhecer as diferenças, acolher todos, promover

Page 32: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

aprendizagens e atender às necessidades de cada um. Esta proposta preconiza a educação para

todos, propondo uma escola adaptada para todas as diferenças humanas (BRASIL, 1994).

Também a Convenção de Guatemala (1999), promulgada no Brasil pelo Decreto nº

3.956/2001 (BRASIL, 2001), reafirma que as pessoas com deficiência têm os mesmos direitos

humanos que as demais pessoas e define discriminação como:

...toda diferenciação, exclusão ou restrição baseada em deficiência, antecedente de deficiência, conseqüência de deficiência anterior ou percepção de deficiência presente ou passada, que tenha o efeito ou propósito de impedir ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício por parte das pessoas portadoras de deficiência de seus direitos humanos e suas liberdades fundamentais.

Este decreto trouxe repercussões importantes para a educação, pois a partir dele não

se pode anular ou impedir o direito à escolarização nas turmas de ensino regular, o que,

configuraria discriminação com base na deficiência.

Ainda na perspectiva da educação inclusiva, a Resolução CNE/CP nº1/2002, que

estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação

Básica, define que as instituições de ensino superior devem prever, em sua organização

curricular, formação docente voltada para o “acolhimento e o trato da diversidade”, que

contemple conhecimentos sobre “as especificidades dos alunos com necessidades educacionais

especiais” (BRASIL, 2002).

Ressaltamos, ainda, a importância do Plano Nacional de Educação (PNE), quando

afirma que “o grande avanço que a década da educação deveria produzir seria a construção de

uma escola inclusiva que garanta o atendimento à diversidade humana” (BRASIL, 2001).

A educação inclusiva situa-se no contexto da sociedade inclusiva, uma sociedade

centrada nas pessoas, que respeite a dignidade e a diversidade dos seres humanos. Como nos

lembra Mantoan (2006, p.16), “a inclusão escolar está articulada a movimentos sociais mais

amplos, que exigem maior igualdade e mecanismos mais eqüitativos no acesso a bens e

serviços”.

A inclusão é um processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir as

pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus

papéis na sociedade (SASSAKI, 1999). Segundo Stainback e Stainback (1999, p.30), “para

Page 33: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

nossas sociedades e comunidades serem ética, moral e legalmente justas, a inclusão é uma

necessidade”.

Inclusão é a garantia de todos ao acesso contínuo do espaço comum da vida em

sociedade, orientada para o acolhimento à diversidade humana e pautada em ações coletivas que

visem a equiparação das oportunidades de desenvolvimento das dimensões humanas. A ruptura

com a ideologia da exclusão visa a implementação de uma política de inclusão que vem sendo

debatida em vários países. Inclusão não se restringe apenas às pessoas com deficiências. Nesta

perspectiva,

...inclusão não é a proposta de um estado ao qual se quer chegar. Também não se resume na simples inserção de pessoas deficientes no mundo do qual têm sido geralmente privadas. Inclusão é um processo que reitera princípios democráticos de participação social plena. Neste sentido, a inclusão não se resume a uma ou algumas áreas da vida humana, como, por exemplo, saúde, lazer ou educação. Ela é uma luta, um movimento que tem por essência estar presente em todas as áreas da vida humana, inclusive a educacional. (SANTOS, 2003, p.81).

A abordagem à diferença, à diversidade apresenta-se como central no paradigma da

inclusão. Para Prieto (2005, p.102), “outro conceito que começa a se fortalecer e vai se somando

ao da educação inclusiva é o da diversidade como condição humana, importantíssimo também

porque faz com que pensemos num ser humano com uma gama de possibilidades de ser sujeito”.

A escola, historicamente, vem cumprindo um papel de exclusão social, na medida em

que busca a homogeneidade, um padrão de “aluno normal”, capaz de acompanhar uma sala de

aula. Não seria exagero pensar que a organização escolar buscou o apagamento das diferenças,

encaminhando para o ensino especial aqueles alunos cujos ritmos de aprendizagem, de raciocínio,

de movimentos, de processamento da informação, de comunicação, de percepção ou de reflexão

fossem diferentes do “esperado”.

Amaral (1998), em sua abordagem sobre a deficiência física, aponta para a

necessidade de pensarmos a deficiência de forma inovadora: não mais como patologia, individual

ou social, mas como expressão da diversidade da natureza e da condição humana.

Ribas (2007) enfatiza que não haverá sociedade humana sem pessoas com

deficiência, assim como, também, não haverá sociedade na qual a diversidade humana não esteja

presente.

Page 34: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Inclusão exige rupturas e busca de alternativas, pois todos os educandos têm o direito

de alcançar índices maiores de escolarização e aprendizagem.

Mantoan (2006, p.196) salienta “a radicalidade da inclusão oriunda do fato de exigir

uma mudança de paradigma educacional”. Nesta nova perspectiva, as escolas atendem às

diferenças, sem discriminar.

Desta forma, pensar a educação inclusiva, hoje, significa, necessariamente, repensar a

escola que temos. O paradigma da inclusão reivindica a construção de uma nova escola:

democrática, que reconheça e valorize a diversidade e as minorias; solidária, aberta à

multiplicidade, livre de preconceitos; enfim, uma educação voltada para a cidadania global.

Aquino (1998) nos fala da escola como lugar não só de acolhimento das diferenças

humanas e sociais, mas fundamentalmente lugar a partir do qual se engendram novas diferenças,

se instauram novas demandas, se criam novas apreensões sobre o mundo já conhecido. Desta

forma, a escola é uma instituição da alteridade, do estranhamento, da mestiçagem, marcas

indeléveis da medida da transformabilidade da condição humana.

Para pensar as bases da construção desta educação do futuro, que já está sendo

gestada no cotidiano das escolas, encontramos no pensamento de Morin alguns indicadores

(2005, p.65):

A educação deve contribuir para a autoformação da pessoa (ensinar a assumir a condição humana, ensinar a viver) e ensinar como se tornar cidadão. Um cidadão é definido, em uma democracia, por sua solidariedade e responsabilidade em relação a sua pátria. O que supõe nele o enraizamento de sua identidade nacional.

A educação inclusiva no Brasil vem sendo tema de discussões polêmicas e de várias

intervenções. Representa um desafio para profissionais da educação e da saúde, para as crianças e

suas famílias.

Rodrigues (2006) salienta que uma das principais razões para a polêmica em torno da

educação inclusiva é a contradição entre a legislação e a prática das escolas.

A garantia legal é necessária, porém não suficiente para promover o atendimento das

demandas escolares dos alunos, conforme aponta Prieto (2006). A autora ainda ressalta que a

garantia apenas da matrícula pode acentuar a resistência de alguns professores ao processo de

inclusão escolar.

Page 35: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

2 FORMAÇÃO DE PROFESSORES E REPRESENTAÇÃO SOCIAL

A nova realidade social a ser parida também por nós é mais do que uma espera ( nostalgia do futuro); é um escavar no hoje de nossas práticas à procura daquilo

que hoje pode ser feito. Esse hoje é uma das pontas do nó do futuro a ser desatado, fruto de situações que não se alteram por si mesmas...Nosso tempo é este hoje em que já se encontra, em gestação, o amanhã. Não um qualquer, mas um amanhã intencional, planejado, provocado agora. Um amanhã sobre o qual não possuímos certezas, mas sabemos possibilidade. (Mário Sérgio Cortella)

Considerando que os professores, antes mesmo de iniciarem seu trabalho docente com

alunos com paralisia cerebral, já possuem representações sobre esse alunos e que estas

representações poderão facilitar ou dificultar o processo de inclusão escolar, torna-se urgente a

discussão sobre a formação de professores que promova a reflexão sobre suas representações

sociais.

Mazzillo (2003), salienta que pouco autores têm a pessoa com paralisia cerebral como

objeto de estudo, o que resulta em desconhecimento na área da educação sobre o verdadeiro

potencial dos alunos com PC. Refere que a inclusão dos alunos com paralisia cerebral acontece

de acordo com a representação que cada professor faz de seu aluno. A autora destaca ainda a

necessidade de estudos com mais profundidade sobre a representação social dos professores

sobre a PC.

Melo (2006), em estudo realizado em escola particular, regular, salienta o

entendimento dos professores de que não estão preparados para o trabalho com a diversidade e

sim com alunado pseudamente homogêneo, que não existe.

Mendes et al (2002), em seu trabalho sobre a análise das teses e dissertações em educação e

psicologia sobre formação de recursos humanos para educação especial, apontam para a necessidade de

busca de formação que não se restrinja à mera “inclusão/integração física” da pessoa com deficiência

nos espaços sociais. Reforça ainda a necessidade e pertinência do debate e da pesquisa sobre a formação

de profissionais de diferentes áreas, que atuam com a clientela da educação especial.

Rossetti-Ferreira (2004) enfatiza a pouca colaboração entre saúde e educação no processo

de inclusão escolar de crianças com deficiências. A possibilidade de uma interlocução/articulação

entre a educação e a saúde para pensar a formação dos professores no contexto da educação

inclusiva constitui um desafio a ser superado por ambas as áreas do conhecimento. Esta

Page 36: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

articulação não significa limitar o problema da saúde como uma “questão educacional”, nem

limitar o problema da educação como uma “questão médico-assistencial”, mas, sim, possibilitar

troca de práticas e saberes.

Rossi (1999), em seu estudo sobre a educação da criança com paralisia cerebral, no

Maranhão, nos aponta para a necessidade de diálogo estreito entre o hospital e a rede de ensino

para romper com idéias pré-fixadas sobre as possibilidades de desenvolvimento humano e buscar

meios de ampliar as oportunidades educacionais da criança com deficiência.

Santos (2000) também observa a importância do trabalho conjunto hospital/escola, no

qual os professores hospitalares estabelecem uma mediação com os professores escolares,

compartilhando saberes no acompanhamento do desenvolvimento dos alunos com deficiência.

O acúmulo de conhecimentos pelos profissionais da saúde no atendimento a pessoas

com deficiências pode auxiliar na formação em serviço dos profissionais da educação. Torna-se

urgente a produção de conhecimentos que possam orientar as práticas e políticas públicas

dirigidas à formação dos professores no contexto da educação inclusiva, assim como apontar

caminhos para a parceria entre as áreas da educação e da saúde.

A Rede Sarah de Hospitais vem desenvolvendo estudos que contribuem para o debate

sobre a interlocução escolas/hospitais no processo de inclusão escolar de crianças com deficiências

(BARROS, 1999; ROSSI, 1999; SANTOS, 2000), e o presente estudo na unidade de Belo Horizonte

justificou-se pelas diferenças regionais e também pela especificidade da política de inclusão da

Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte (SMED BH), descrita em suas diretrizes político-

pedagógicas.

Silva (2005), em seu estudo sobre os sentidos que as equipes pedagógicas das escolas

municipais de Belo Horizonte constroem a respeito dos princípios da escola Plural e da relação

com a escola inclusiva, constatou uma revisão de práticas pedagógicas e a construção de

estratégias educacionais mais condizentes com as necessidades dos alunos. Ainda nesta

dissertação de Mestrado em Educação, defendida na Universidade Federal de Juiz de Fora -

UFJF, as ações de formação realizadas por profissionais do Hospital Sarah/BH, nas escolas ou na

sede do hospital foram apontadas por alguns professores como uma das iniciativas que melhor

atenderam a seus anseios de formação.

Alguns aspectos da desarticulação entre saúde e educação no atendimento de crianças

com necessidades educacionais especiais já foram estudados e indicam a urgência da superação

Page 37: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

de alguns impasses, tais como: o processo de patologização e medicalização das dificuldades de

aprendizagem, a valorização diferenciada entre os profissionais da saúde e da educação, a

dicotomia entre o cuidar e o educar presente nas práticas da educação infantil (COLLARES,

1992; MACHADO, 2005).

Roriz (2005), em seu estudo sobre a inclusão/exclusão de crianças com paralisia

cerebral sob a ótica dos profissionais da saúde, constata que este processo não é naturalizado,

pontual e linear. Refere que ele merece ser analisado com base em diversos aspectos, já que, por

seu entrelaçamento em situações específicas, irá contribuir para configurar esta ou aquela

possibilidade de atuação, circunscrevendo muitas das práticas discursivas que permeiam o

processo de inclusão.

Alves (2005) em sua pesquisa sobre as representações sociais dos professores acerca

da inclusão de crianças com distúrbios globais do desenvolvimento, na cidade de Santa Maria,

RS, destaca o desconhecimento dos professores sobre o tema e identifica a representação social

do aluno-modelo.

Como Ferreira, W. (2006) destaca, as formações docentes devem caracterizar-se

como ações de desenvolvimento e aperfeiçoamento profissional, tendo como ponto de partida e

reta de chegada o repertório de conhecimentos e habilidades dos professores. É com base neste

repertório que a prática pedagógica pode ser revisitada e aperfeiçoada.

Ainda sobre a importância de a formação docente partir das concepções, crenças e

saberes dos professores, ou seja, suas representações sociais, Kramer (1984, p.189) diz que:

As políticas públicas voltadas à construção pelos professores do saber e do saber-fazer necessários a uma ação escolar de qualidade, crítica e que beneficie as crianças, não podem jamais desconsiderar o que sabem e fazem os professores...É preciso, ainda, que se supere a sistemática transmissão da palavra autoritária porque esta – embora possa ser recitada de cor – dificilmente se torna uma palavra com a qual se pode conversar.

Para a reflexão sobre as diretrizes na formação de professores faz-se necessário,

então, conhecer as representações sociais dos professores.

Minayo (1993) define representações sociais (RS) como um termo filosófico que

significa a reprodução de uma percepção anterior ou do conteúdo do pensamento e são definidas

como categorias de pensamento, ação e de sentimento que expressam a realidade, a explicam,

justificando-a ou questionando-a.

Page 38: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Já para Jodelet (2001), as representações sociais são uma forma de conhecimento

socialmente elaborado e compartilhado, com um objetivo prático, e que contribuem para a

construção de uma realidade comum a um conjunto social.

Segundo Bauer (2002), as representações sociais são relações sujeito-objeto

particulares, ligadas a um meio social. As relações sujeito-objeto são observadas através das

opiniões, atitudes, crenças, sentimentos, discursos, ideologias, hábitos e práticas.

Sá (1998) entende a representação social como uma modalidade de saber gerada

através da comunicação na vida cotidiana, com a finalidade prática de orientar os

comportamentos em situações sociais concretas. A representação social é sempre de alguém (o

sujeito) e de alguma coisa (o objeto), desta forma precisamos considerar, simultaneamente, o

sujeito e o objeto da representação que desejamos pesquisar.

Sendo a inclusão escolar de alunos com deficiência uma nova demanda para a

maioria dos professores, conhecer as representações destes profissionais apresenta-se como

elemento fundamental neste processo. Como as práticas pedagógicas são determinadas pelas

crenças, valores e representações sociais dos professores, qualquer mudança que se pretenda

nesta prática envolve, necessariamente, levá-las em consideração. A representação que o

professor faz de seu aluno e de suas possibilidades de aprendizagem definirá a forma da relação

entre eles e dará sentido às experiências vivenciadas.

Fróes (2007), em sua dissertação, a partir de dez pesquisas produzidas nas

universidades federais, no ano de 2001, analisa como os discursos das autoras produzem sentidos,

considerando-as sujeitos de uma sociedade, levando em conta que o discurso tanto pode dar

continuidade quanto pode promover a transformação do homem e de sua realidade.

Amaral (1996) define a deficiência como um fenômeno global, distribuído em dois

sub-fenômenos: deficiência primária (incapacidade) e secundária (desvantagem). Ressalta que a

deficiência primária não impede o desenvolvimento, mas já a deficiência secundária, por

aprisionar a pessoa com deficiência numa rede constituída e constituidora de barreiras atitudinais

(preconceitos, estereótipos e estigmas), pode impedir o desenvolvimento e a vida plena desses

sujeitos.

Satow (1995), buscando compreender a construção da identidade de pessoas

socialmente ativas, com paralisia cerebral, destaca que o estigma e o desconhecimento da

Page 39: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

realidade destas pessoas têm sido responsáveis pela exclusão deste segmento do meio social em

que vivem. Reforça ainda que a identidade é construída apenas na diversidade.

Podemos observar um crescimento gradual e contínuo no país sobre da produção

científica nacional sobre a identificação dos alunos com necessidades educacionais especiais e as

implicações de determinadas condições sobre a aprendizagem e o desenvolvimento dessa

população. Esse crescimento foi apontado por Mendes et al (2002) na pesquisa sobre a descrição

e análise da produção discente dos programas de pós-graduação em educação, produzidos entre

1981-1998, sobre a identificação e diagnóstico dos alunos com necessidades especiais.

Batista e Enumo (2004) salientam a necessidade de compreender as contradições que

permeiam a prática da educação inclusiva. Reforçam a importância dos professores que lidam

diariamente com alunos com necessidades educacionais especiais, sendo, portanto, os principais

agentes no processo de inclusão escolar.

O estudo de Souza (2005) abordando a concepção do professor sobre a inclusão

escolar do aluno com seqüela de PC, no Rio de Janeiro, aponta para o desconhecimento do

professor sobre paralisia cerebral, a preservação dos estigmas e a falta de capacitação profissional

para o processo de inclusão escolar destes alunos. Evidencia ainda a falta de pesquisas e trabalhos

científicos voltados para a inclusão deste alunado.

Em estudo realizado anteriormente com a Rede Pública de Ensino Municipal de Belo

Horizonte (SILVA E RIBEIRO, 2000), no qual o objetivo foi conhecer o que sabiam e pensavam

os professores sobre a paralisia cerebral e sobre o processo de inclusão escolar de seus alunos,

acreditava-se que esclarecimentos sobre o diagnóstico do aluno contribuiriam para modificar suas

práticas pedagógicas. Quanto às noções sobre PC, 40% dos educadores não conheciam, enquanto

60% conheciam ou conheciam parcialmente. Em 53% dos casos foi declarada alguma informação

acerca de PC, seja através de leitura, mídia ou discussão de caso. Embora 38% relatassem contato

com pessoas com PC, apenas 6% referiam experiência profissional. A capacidade de aprender

dessas crianças estava preservada para 75% dos participantes, mas apenas 39% achavam que elas

poderiam freqüentar escola comum. Não houve associação entre conhecer a definição de PC e

considerar que elas poderiam aprender ou freqüentar escola regular, mas constatou-se uma

associação entre ter contato com PC e achar que poderiam aprender, assim como freqüentar

escola comum.

Page 40: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Os estudos nos remetem à insuficiência de uma formação de professores

fundamentada apenas na informação sobre a paralisia cerebral, pois, apesar de vários

esclarecimentos sobre o diagnóstico de seus alunos, alguns professores mantêm-se presos às

primeiras dificuldades relatadas. Na fala dos professores sobre a falta de preparo para realizar o

trabalho pedagógico com essas crianças, aparecem algumas crenças e concepções sobre

educação, sobre a função da escola, sobre a relação desenvolvimento/aprendizagem, sobre a

inteligência, sobre o sujeito-aprendiz, sobre a relação comunicação/linguagem/escrita, e sobre a

condição humana, que colaboram para que o professor não modifique sua prática.

Rodrigues (2006) apresenta pesquisa realizada em 2001, sobre conteúdos ministrados

nos cursos de formação de professores sobre necessidades educacionais especiais em Portugal,

concluindo que a maioria centrava-se na descrição exaustiva das condições da deficiência e

destaca que nem todo conhecimento da diferença conduz a sua aceitação, pois pode-se conhecer

para melhor segregar. Defende então, a idéia de que o conhecimento da diferença seja integrado à

compreensão da diversidade.

Plestch (2005) afirma que a política de inclusão no Brasil exige mudança de postura

na atuação prática e no discurso sobre desenvolvimento humano, pois é necessário possibilitar

aos professores conhecimentos sobre a proposta de educação inclusiva, já que a maioria deles não

se sente preparada para trabalhar com alunos com necessidades educacionais especiais.

Partimos do princípio de que é necessário ampliar o conhecimento dos professores

sobre PC, na perspectiva da educação inclusiva, porém só isso não é suficiente. Faz-se necessário

reconhecer a limitação de ações pontuais de formação de professores, realizadas junto às escolas

e baseadas apenas na informação dos diagnósticos dos alunos.

Braga (1995), em seu estudo sobre desenvolvimento cognitivo em crianças com

paralisia cerebral do tipo coreoatetose grave, indica que a deficiência pode ser entendida como

um desafio a ser superado por meio de um processo criativo individual e conjunto. A criança

pode encontrar caminhos intra e intersubjetivos para superar as barreiras decorrentes da

deficiência. Por ser a educação um processo que envolve relação entre pessoas, duas ou mais

pessoas podem compartilhar significados e criar novos caminhos, objetivando o desenvolvimento

e apropriação da cultura.

Para Amaral (1996) os produtos culturais participam da construção da representação

da deficiência no imaginário coletivo e os produtores culturais, entre eles profissionais e

Page 41: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

cientistas, são sujeito e objeto de sua história e cultura, sendo por elas construídos e delas

construtores.

A partir dos resultados do presente trabalho, poderemos identificar estratégias para o

aprimoramento da formação profissional dos professores, na perspectiva da educação inclusiva; e

identificar as atitudes que vêm contribuindo para criar possibilidades de sucesso escolar das

crianças com paralisia cerebral e conhecer quais limites/obstáculos que vêm sendo enfrentados,

ao longo deste processo de escolarização, pelas crianças, suas famílias e escolas. Este estudo

pode também contribuir para melhor compreendermos como trabalhar com as representações

sociais em educação, especificamente na formação de professores. Incluir a representação social

dos professores na formação em serviço pode significar um avanço na criação de novas práticas.

Page 42: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

5 INTERVENÇÃO EDUCATIVA E CONCEPÇÃO DE APRENDIZAGEM E

DESENVOLVIMENTO NA ABORDAGEM SÓCIO-HISTÓRICA

5.1 Intervenção Educativa – Metodologia e estratégias

Tudo isso é aprender. E aprender é sempre adquirir uma força para outras vitórias,

na sucessão interminável da vida”.(Cecília Meireles)

Moscovici (1978) postula que uma representação é constituída de “informação”,

“atitude” e “campo de representação”, sendo assim, a intervenção educativa, proposta para os

professores da rede municipal de BH pretendeu abordar estes três aspectos do fazer pedagógico.

Uma intervenção é constituída pelo conjunto de meios (humanos, físicos,

simbólicos), organizados em um contexto específico, em dado momento, para produzir bens ou

serviços com o objetivo de modificar uma situação problemática (CONTANDRIOPOULOS,

1992).

A intervenção educativa, desenvolvida no Hospital Sarah/BH, totalizou 15 encontros,

divididos da seguinte forma: três palestras sobre inclusão e paralisia cerebral (“Ciclo de

palestras” - Anexo H), quatro encontros para discussão de filmes (“Ciclo Cinema e Inclusão” –

Anexo I) e oito encontros que foram planejados a partir da análise das entrevistas e questionários,

objetivando a reflexão sobre as representações sociais das professoras.

O trabalho com representações sociais em educação nos aproxima da vivência das

pessoas, permitindo ir além da informação, do trabalho intelectual, na medida em que permite

trabalhar com as emoções. Desta forma, o trabalho educativo foi planejado através de múltiplos

olhares: as dimensões prática, afetiva e cognitiva. Considerando que os significados do mundo

vivido são afetivos e subjetivos, a abordagem das imagens favorece o surgimento e a reflexão

desses significados (GAZZINELLI; REIS, 2006).

Portanto, neste trabalho educativo com as professoras, enfatizamos as dimensões

cognitiva, subjetiva e afetiva, presentes nas práticas pedagógicas. A metodologia utilizada

pressupõe que não há uma correspondência direta entre saber instituído e mudança de práticas,

pois a mudança nas práticas educativas envolve subjetividade, ou seja, valores, crenças,

Page 43: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

representações simbólicas, presentes em todas as fases do processo educativo (GAZZINELLI;

PENNA, 2006).

Segundo Morin (2005), para compreender não basta apenas explicar. Na explicação

utilizamos todos os meios objetivos do conhecimento, que são insuficientes para compreender o

ser subjetivo. Ainda em suas palavras (2005, p.51), “a compreensão humana nos chega quando

sentimos e compreendemos os humanos como sujeitos; ela nos torna abertos a seus sofrimentos e

alegrias. É a partir da compreensão que se pode lutar contra o ódio e a exclusão”.

Guareschi e Jovchelovitch (2003, p.20) afirmam que “a construção da significação

simbólica é, simultaneamente, um ato de conhecimento e um ato afetivo. Tanto a cognição como

os afetos que estão presentes nas representações sociais encontram sua base na realidade social.”

Desta forma, a intervenção educativa partiu das representações dos professores,

construídas em suas trajetórias de vida e expressas em suas práticas educativas. Na medida em

que as representações orientam e justificam práticas sociais, elas contribuem para a compreensão

e a modificação de práticas docentes. As RS constituem, assim, um instrumental para

compreender o percurso escolar de crianças com deficiências, pois permitem identificar conflitos

entre os sentidos atribuídos ao mesmo objeto, pelos diferentes atores envolvidos na relação

pedagógica.

Para fundamentar o planejamento da intervenção educativa, consideramos a

concepção de que o conhecimento é construído na relação entre o sujeito e o objeto de

conhecimento, como resultado das interações sujeito e meio. Ao longo de todo o processo

educativo, dialogamos com alguns autores, fundamentando a perspectiva da educação enquanto

prática social, a relação dialógica entre educadores e educandos e a dimensão do ser humano

presente nas práticas educativas. Como Paulo Freire (2006) nos ensina, pensar certo é ato

comunicante, é entendimento co-participado e, por isso, dialógico.

Nesta intervenção educativa partimos da concepção de educação como ação

intersubjetiva, mediada pela linguagem e situada em um contexto sócio-histórico. A concepção

de sujeito da aprendizagem, foi embasada na teoria de Vygotsky (1987), quando enfatiza a

dimensão sócio-histórica do desenvolvimento humano que ocorre nas interações sociais.

Optamos por uma metodologia que incentivasse a reflexão sobre a prática,

possibilitando troca de experiências e opiniões e estimulando a participação das professoras e

evitando utilizar uma pedagogia de “transmissão de conteúdos”. Buscamos desenvolver

Page 44: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

estratégias educativas que privilegiassem ações dialógicas e compartilhadas. Algumas escolhas

para as estratégias utilizadas tinham como objetivo a vivência e a reflexão do professor a partir de

algumas dificuldades enfrentadas por seus alunos no espaço escolar.

Gostaríamos de destacar ainda que a escolha dos temas e conteúdos desenvolvidos

partiram da análise dos conhecimentos prévios das professoras.

A dimensão cognitiva do processo de aprendizagem foi enfatizada no “Ciclo de

“Palestras sobre Inclusão e Paralisia Cerebral”. As palestras se caracterizaram como espaços de

formação e buscaram a troca de saberes e experiências, objetivando contribuir para a reflexão da

prática pedagógica e abordaram os seguintes temas: inclusão social; perspectivas de inclusão

escolar para crianças com deficiências e a abordagem para a diversidade na educação; marcos

legais no âmbito da educação e direitos humanos para pessoas com deficiências; esclarecimento

do diagnóstico de paralisia cerebral; sugestões de adaptações para as atividades de vida diária no

espaço escolar; alternativas para o trabalho pedagógico com crianças que apresentem alterações

motoras; abordagem da comunicação alternativa¹ (alternativas para fala e escrita) no trabalho

escolar destes alunos com dificuldades na expressão verbal ou escrita em função de seu quadro

motor; processos de aprendizagem e avaliação; adaptações curriculares e as possibilidades de

inclusão da criança com alterações motoras nas atividades de educação física escolar. Durante

esses encontros, realizou-se também uma exposição de materiais adaptados, acessíveis para

escolas por serem construídos com material alternativo e de baixo custo, que permitem ao aluno

com alterações motoras, que não consegue segurar o lápis, falar ou manipular alguns materiais da

escola, participar das atividades escolares. As dimensões subjetiva e afetiva do processo de

aprendizagem foram enfocadas através do “Ciclo de Debates Cinema e inclusão” e dos encontros

planejados a partir da análise das representações sociais dos professores.

Com o “Ciclo de debates Cinema e Inclusão”, buscou-se dialogar, a partir dos filmes

e reflexões dos mediadores convidados, sobre aspectos relacionados à paralisia cerebral, como

também à abordagem educacional para a diversidade entre educandos, à construção da identidade

do sujeito, ao pertencimento, às possibilidades de comunicação humana para além da palavra

falada e escrita, às perspectivas de integração e inclusão escolar, ao discurso da normalização,

enfim, à concepção de ser humano.

Teixeira e Lopes (2003) definem educação e cinema como artes diferentes. A

Educação, como arte de tecer vidas e identidades humanas, e o Cinema, como forma de

Page 45: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

circulação de afetos, como certa maneira de olhar, de recriar a vida. Enfatizam a importância do

cinema na formação da sensibilidade dos sujeitos, destacando sua possibilidade de contribuição

na formação de educadores.

Morin (2005) nos fala que o cinema, a poesia e a literatura não devem ser

considerados principalmente objetos de análises gramaticais, sintáticas ou semióticas, mas

também, escolas de vida, em seus múltiplos sentidos. O autor destaca que o filme e o romance

põem à mostra a relação do ser humano com o outro, com a sociedade e com o mundo. Refere

ainda que em toda grande obra, de cinema, de literatura, de música, de pintura, de escultura, de

poesia, há um pensamento profundo sobre a condição humana.

Louro (2000) procura valorizar a dimensão pedagógica do cinema, enfatizando-a

como instância formativa importante, ao mobilizar energias afetivas e emocionais. Rosália Duarte

(2002) considera o cinema um instrumento precioso para ensinar respeito aos valores, crenças e

visões de mundo de diferentes grupos sociais. Saber apreciar filmes, saber avaliar, criticar e

identificar elementos de reflexão sobre a própria vida, suas experiências e a sociedade em que se

vive são algumas das contribuições da utilização do cinema na formação de professores.

Os filmes participam na formação de valores por se constituírem como parte de uma

expressão social e histórica, na sociedade contemporânea e são uma fonte de formação humana

repletos de crenças, valores, comportamentos éticos e estéticos da vida social

(LOUREIRO, 2006).

A possibilidade de rever filmes, de vê-los em grupo, aprofundando alguns aspectos da

obra, pôde permitir leituras diferentes do mesmo filme, quando visto mais de uma vez. Como nos

fala Betton (1987), “o cinema permite que cada espectador conte-se a si próprio, veja-se viver,

julgue-se. Revela-nos inúmeros desejos insuspeitos”.

Ainda Morin (2000), grande amante dos filmes, um “cinemáfogo” como ele mesmo

se define, cita que o cinema desempenhou papel muito importante em sua vida e em aprendizado.

O cinema era interessante porque, a partir da projeção na tela, vemos seres que vivem: nós vivemos através deles assim como eles vivem através de nós. Existe este fenômeno bem conhecido da participação e da identificação que é muito complexo: rimos, choramos, tememos pelos nossos heróis, porém conscientes de que estamos no cinema. Temos uma dupla consciência, uma consciência vigilante que sabe que não estamos presentes fisicamente na tela e uma outra consciência que nos faz viver a vida dos personagens do filme, contrariamente a

Page 46: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

uma idéia muito simplista que diz estarem os espectadores alienados e que não percebem a diferença entre real e imaginário.

A terceira etapa da intervenção educativa constituiu-se de encontros planejados a

partir das análises das representações sociais das professoras, como “laboratórios” de questões

levantadas pelo grupo e através dos quais buscávamos soluções coletivas. Nesses encontros

exercitávamos a reflexão teoria/prática, entendendo, como Paulo Freire (2006, p.22), que

“ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção e a sua

construção”.

5.2 Concepção de aprendizagem e desenvolvimento e linguagem na abordagem sócio-histórica

“UBUNTU UNGAMNTU NGANYE ABANTU” “Pessoas são pessoas através de outras pessoas”

(Ditado Xhosa – língua materna de Nelson Mandela)

A obra de Vygotsky traz contribuições essenciais para a educação na medida em que

possibilita a reflexão sobre elementos fundamentais para as práticas pedagógicas, como por

exemplo: a relação pensamento e linguagem, relação aprendizagem e desenvolvimento, o papel

da linguagem em relação aos processos cognitivos e o papel da mediação no processo de

aprendizagem.

Vygotsky nasceu e viveu na Rússia, no início do século XX e se dedicou ao estudo da

psicologia, literatura, lingüística, filosofia, artes, educação e ciências sociais.

Neste breve capítulo nos deteremos apenas em alguns aspectos de sua teoria

discutindo a relação aprendizagem e desenvolvimento, a importância da mediação na

aprendizagem humana e a função da linguagem no processo de ensino-aprendizagem.

O autor postula a historicidade do desenvolvimento humano e define o sujeito como

produto das relações sociais. Para ele a atividade humana transforma a natureza e a sociedade.

Sobre os processos de aprendizagem e de desenvolvimento, Vygotsky destaca que

são processos centrais, especialmente, em relação às funções mentais superiores (linguagem,

memória, atenção), e que estão interrelacionados durante toda a vida humana.

Page 47: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

As formas superiores de comportamento (lembrar, falar, pensar, comparar) devem ser

estudadas a partir das relações sociais que os sujeitos estabelecem com o meio. Vygotsky reforça

a importância da vida social no desenvolvimento das pessoas afirmando que este não é apenas um

processo de maturação espontânea. No desenvolvimento cultural as funções mentais acontecem

duas vezes. Inicialmente no nível social, entre as pessoas (nível interpsicológico), primeiro de

fora para dentro, ou seja, nas relações entre os indivíduos. Depois ocorrem no nível individual, ou

seja, no interior da pessoa (nível intrapsicológico).

Nos processos psicológicos tipicamente humanos a interação do sujeito com o mundo

se dá pela mediação com outro. Desta forma, também a aprendizagem, não é fruto apenas da

interação com o meio, pois ocorre sempre na interação dos sujeitos. De acordo com Vygotsky

(1989, p.33),

“O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações entre história individual e história social”.

Segundo o autor, o desenvolvimento humano é desenvolvimento social envolvendo

interação e mediação qualificadas. No espaço escolar esta mediação é realizada por professores e

colegas. Salienta ainda que, sem parceiros, não há aprendizagem, já que a construção de

conhecimentos passa sempre pela mediação do outro. Nas palavras do autor,

...o aprendizado humano pressupõe uma natureza social específica e um processo através do qual as crianças penetram na vida intelectual daqueles que as cercam e é um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas (Vygotsky, 1989, p.99).

O processo de aprendizagem é central na sua concepção sobre o homem. Para

Vygotsky, a aprendizagem movimenta os processos de desenvolvimento, ou seja, resulta em

desenvolvimento. Sendo assim, o bom ensino é aquele que se adianta ao desenvolvimento.

De acordo com a teoria de Vygotsky existem dois níveis de desenvolvimento:

desenvolvimento real e o desenvolvimento potencial. O desenvolvimento real corresponde ao que

a pessoa já é capaz de realizar sozinha, corresponde a ciclos de desenvolvimento já completos, às

funções que já amadureceram. Sendo assim, o desenvolvimento real caracteriza o

Page 48: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

desenvolvimento mental de forma retrospectiva. Já o desenvolvimento potencial representa o que

o aluno consegue realizar com ajuda de outras pessoas (adultos ou crianças). Para ele o

desenvolvimento potencial pode ser mais indicativo do desenvolvimento mental do aluno por

caracterizá-lo prospectivamente.

Este olhar prospectivo de Vygotsky (1989) é fundamental para a educação, pois

abarca a idéia de transformação, enfatiza a necessidade de observarmos no percurso do

desenvolvimento a emergência dos “brotos” ou “flores” do desenvolvimento (aquilo que é novo

na trajetória do sujeito) e não seus “frutos”. Desta forma, o mais importante no desenvolvimento

são os processos que já estão presentes embrionariamente no indivíduo, mas ainda não se

consolidaram.

A Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), conceito fundamental na teoria

vygotskyana, pode ser definida como a distância entre o nível de resolução de uma tarefa que

uma pessoa é capaz de realizar sozinha (desenvolvimento real), e o nível que pode alcançar

com ajuda de outra pessoa mais experiente nesta tarefa (desenvolvimento potencial). Ou seja,

ZDP é o espaço no qual, com ajuda de outras pessoas, o aluno pode realizar uma tarefa de uma

forma que não seria capaz de realizar sozinho. Em suas palavras (Vygotsky,1989, p.97), “são

aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação, funções

que amadurecerão, mas que estão presentes em estado embrionário”.

Sobre o processo de ensino aprendizagem o autor afirma que este inclui sempre

aquele que aprende, aquele que ensina e a relação entre as pessoas. Enfatiza que a aprendizagem

impulsiona o desenvolvimento e destaca a escola como agência social, que tem papel essencial,

na promoção dos indivíduos que vivem em sociedades letradas. (Vygotsky, 1989).

Em seus estudos, Vygotsky buscou compreender a origem do funcionamento

tipicamente humano e a linguagem é uma destas funções “tipicamente humanas”.

Para o autor aprendizagem e desenvolvimento ocorrem na interação entre as pessoas

e pela mediação da linguagem. É através da linguagem que o homem se comunica, constitui

interações e categoriza o mundo pela abstração e generalização.

De acordo com Vygotsky (1987) o surgimento da linguagem é um “marco”

fundamental para o desenvolvimento humano. Segundo o autor o sujeito se constitui à medida

que o outro atribui significados às ações e palavras da criança e, sendo assim, os interlocutores

têm papel essencial no funcionamento intrapsicológico do sujeito. Desta forma, a subjetividade é

Page 49: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

constituída nas relações sociais e através da linguagem. A linguagem é o principal mediador entre

o biológico e o social, entre os homens entre si e dos homens com o mundo. Neste sentido, a

função primordial da linguagem é o contato social e a comunicação, sendo este sistema

simbólico, imprescindível na formação das funções psicológicas superiores.

Outro tema também central na obra de Vygostsky (1987) é a relação entre

pensamento e linguagem. Para o autor, pensamento e linguagem teriam origens diferentes e se

desenvolveriam de forma independente até certo momento e, quando da inserção social da

criança, se encontrariam dando origem ao funcionamento psicológico mais sofisticado,

aproximadamente aos dois anos de idade. Para ele a linguagem é mediadora do pensamento e,

desta forma, apresenta papel fundamental no desenvolvimento do mesmo.

Em relação à linguagem escrita o autor define como um sistema simbólico com

princípios organizadores. É a possibilidade humana de registro, transmissão, recuperação de

idéias, conceitos e informações. Desta forma, a escrita é, então, uma ferramenta que estende a

potencialidade do ser humano para fora de seu corpo. Através da escrita ampliamos nossa

capacidade de registro, de memória e de comunicação.

O domínio da escrita pela criança é o culminar de longo processo de desenvolvimento

de funções comportamentais complexas. É necessário compreendermos a história do

desenvolvimento dos signos na criança para uma intervenção educacional intencional. Vygotsky

salienta que a mediação dos outros é essencial para promover avanços no domínio desse sistema

culturalmente desenvolvido e compartilhado, que é a escrita. Ressalta ainda que a escrita deve ter

significado para as crianças e ser relevante para a vida. Ainda em suas palavras “ela se

desenvolverá não como hábito de mão e dedos, mas como uma forma nova e complexa de

linguagem” (Vygotsky, 1989, p.133), e ainda nos diz que devemos “ensinar as crianças a

linguagem escrita, e não apenas a escrita das letras” (Vygotsky,1989, p.134).

Page 50: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

6 PERCURSO METODOLÓGICO

Digo: o real não está na saída nem na chegada; ele se dispõe é no meio da travessia. (Guimarães Rosa)

6.1 Abordagem teórico-metodológica

Este estudo foi realizado por meio de uma pesquisa qualitativa. A abordagem

qualitativa encontra-se comprometida com a realidade histórica e com a construção de

conhecimentos sobre aspectos da realidade em busca de soluções para os problemas nela

percebidos. Esta abordagem permite o confronto entre os dados, as evidências, as informações

coletadas sobre determinado assunto e o conhecimento teórico acumulado a respeito dele. O

ambiente natural é a fonte dos dados. O pesquisador tem contato direto com a situação

investigada e sua observação e análise não são neutras, envolvem princípios, valores e

pressuposições próprias. Os dados coletados são descritivos e sua análise é indutiva, não havendo

busca de evidências para comprovação de hipóteses (ANDRÉ, 1998). Segundo Minayo (1993,

p.10),

A abordagem qualitativa é capaz de incorporar a questão do significado e da intencionalidade como inerente aos atos, às relações e às estruturas sociais, sendo estas últimas tomadas, tanto no seu advento quanto na sua transformação, como construções humanas significativas.

Utilizamos como abordagem teórico-metodológica a Teoria das Representações

Sociais (TRS). Como define Farr (2003, p.31), “A Teoria das Representações Sociais é uma

forma sociológica de psicologia social, originada na Europa com a publicação, feita por

Moscovici, em 1961, sobre a representação social da psicanálise”.

Para Moscovici (2003), o conceito de representação social (RS) tem origem na

sociologia e na antropologia, através de Durkheim e Lévi-Bruhl. Também contribuíram para a

criação da teoria das representações sociais, a teoria das representações infantis de Piaget e a

teoria do desenvolvimento cultural de Vygotsky. Estes dois autores destacam a relação entre a

atividade representacional e o sujeito. Segundo Jovchelovitch (1998, p.57), Vygotsky e Piaget

contribuíram para a TRS, pois “Mocovici buscou a origem profundamente social da construção

do saber e resgatou o entendimento de que o saber social é simbólico e, enquanto tal, é de uma só

Page 51: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

vez produto da ação, da comunicação e da construção do sujeito”. Ainda para este autor (1978), a

representação social é uma modalidade de conhecimento particular que tem por função a

elaboração de comportamentos e a comunicação entre os indivíduos. É a representação de um

objeto para alguém.

Segundo Spink (2003, p.118),

As representações, enquanto formas de conhecimento, são estruturas cognitivo-afetivas e, desta monta, não podem ser reduzidas apenas ao seu conteúdo cognitivo. Precisam ser entendidas, assim, a partir do contexto que as engendram e a partir de sua funcionalidade nas interações sociais do cotidiano.

Para Jodelet (2001), as representações sociais são muito importantes na vida

cotidiana, pois nos guiam no modo de nomear e definir conjuntamente os diferentes aspectos da

realidade diária, no modo de interpretar esses aspectos, tomar decisões e, algumas vezes, nos

posicionarmos frente a eles de forma defensiva.

Jovchelovitch (2003) destaca que a teoria das representações sociais se articula tanto

com a vida coletiva de uma sociedade como com os processos de constituição simbólica, nos

quais os sujeitos lutam para dar sentido ao mundo, entendê-lo e nele encontrar seu lugar através

de uma identidade social. A autora enfatiza que as representações se constroem sobre a

capacidade representacional de um sujeito psicológico e são engendradas nas práticas sociais

através da comunicação: diálogos, discurso, arte, rituais, enfim, na cultura. Desta forma, podemos

dizer que as representações sociais que emergem do processo social são, ao mesmo tempo,

constituídas e constituintes deste social.

Compreender como e por que as representações são construídas, mantidas ou

transformadas e recriadas é fundamental para a educação, pois buscamos transformações de

atitudes, opiniões, crenças, valores, idéias e conceitos através de práticas pedagógicas.

Sendo assim, este estudo buscou analisar os conteúdos sobre inclusão escolar

expressos nos discursos dos professores, tendo como ponto de partida o fazer pedagógico do

professor com seu aluno com paralisia cerebral e compreendendo que a construção desses

significados é elaborada socialmente e funciona no sentido de interpretar, pensar e agir sobre a

realidade.

Moscovici (1978) nos diz que a representação social é uma preparação para a ação,

tanto por conduzir o comportamento, como por modificar e reconstituir os elementos do meio

Page 52: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

ambiente. Para ele o ser humano é um ser pensante que formula questões, busca respostas e

compartilha realidades.

Buscar conhecer as representações dos professores sobre o processo de inclusão

escolar de seus alunos com paralisia cerebral significou tentar desvelar o agir e o pensar dos

professores, elaborados coletivamente a partir da realidade cotidiana de suas salas de aula e das

intervenções com seus alunos.

A realidade da sala de aula, da interação professor-aluno, não é só uma construção

individual deste professor, mas está também marcada histórica, social e culturalmente e é fruto de

correntes filosóficas que embasam sua prática. Desta forma, evidenciamos estreita relação entre

as representações sociais e o contexto de vida dos sujeitos. Para Rouquette (1998, p.43), as

representações sociais devem ser vistas “como uma condição das práticas e as práticas como um

agente de transformação das representações”.

Para entendermos de que forma as práticas educativas interferem na construção das

representações sociais e como estas influenciam as práticas pedagógicas, será necessário

compreendermos que as representações são fenômenos sociais elaborados e compartilhados entre

os atores sociais.

As representações sociais são constituídas por meio de dois processos principais

postulados por Moscovici: objetivação e ancoragem. A objetivação e a ancoragem são as formas

específicas em que as representações sociais estabelecem mediações, trazendo para um nível

quase material a produção simbólica de uma comunidade e dando conta da concreticidade das

representações sociais na vida social (JOVCHELOVITCH, 2003). Segundo Moscovici (2003), a

ancoragem e a objetivação operam o processo pelo qual a RS passa a se tornar familiar ao sujeito,

tornando-se real e socialmente conhecida e compartilhada. A ancoragem é “um processo que

transforma algo estranho e perturbador, que nos intriga, em nosso sistema particular de categorias

e o compara com um paradigma de uma categoria que nós pensamos ser apropriada”

(MOSCOVICI, 2003, p.61). O processo de objetivação é descobrir a qualidade icônica de uma

idéia, é reproduzir um conceito em uma imagem. “Une a idéia de não familiaridade com a de

realidade, torna-se a verdadeira essência da realidade” (MOSCOVICI, 2003, p.71). Para que estes

dois processos se efetivem, cada sujeito baseia-se em observações e testemunhos que se

acumulam ao longo do tempo e em relação a um acontecimento (MOSCOVICI, 1978).

Page 53: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Para Arruda (2002), a representação social não é uma cópia nem um reflexo, uma

imagem fotográfica da realidade: é uma tradução, uma versão desta. Ela está em transformação,

assim como o objeto que tenta elaborar. É dinâmica e móvel.

Reconhecer o processo de inclusão escolar de alunos com paralisia cerebral nas

escolas municipais regulares de Belo Horizonte como objeto de representação social é entender

como este processo vem sendo construído a partir das crenças dos professores. As representações

sociais têm caráter dinâmico e são negociadas através da interação social e do diálogo, e também

modificadas e recriadas à medida que são incorporadas pelo indivíduo em sua concepção de

mundo.

O acesso às representações sociais só se torna possível por meio de instrumentos e

técnicas que enfoquem o caráter dinâmico do contexto social e que possibilitem o conhecimento

do meio social em que as representações emergem, circulam e se transformam.

A opção por trabalhar com as representações sociais se caracteriza pela oportunidade

que esta teoria traz de compreensão dos significados atribuídos pelos professores sobre o

processo de inclusão escolar de alunos com PC, levando em consideração crenças e valores

compartilhados, assim como conhecer a formação das representações através de suas práticas

cotidianas e da comunicação entre eles.

6.2 Cenário da pesquisa

“Feliz é aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina”. (Cora Coralina)

O cenário desta investigação envolveu o Hospital Sarah de Belo Horizonte e algumas

escolas da Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte.

A escolha pelas escolas da Rede Municipal de Educação de BH apoiou-se no número

de crianças com PC inseridas nesta rede e acompanhadas pelo hospital.

O Hospital Sarah/BH é uma das oito unidades que compõem a Rede Sarah de

Hospitais de Reabilitação. Esta rede de hospitais é uma instituição dedicada ao tratamento de

deformidades, traumas, doenças do aparelho locomotor e problemas do neurodesenvolvimento.

Page 54: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Os casos atendidos no hospital envolvem alterações de graus variados no movimento e podem

envolver, também, alterações na comunicação, na linguagem, no desenvolvimento cognitivo e na

escrita. Atualmente, a Rede Sarah é constituída por oito unidades hospitalares localizadas em

Brasília (DF), Salvador (BA), São Luís (MA), Belo Horizonte (MG), Fortaleza (CE), Rio de

Janeiro (RJ), Macapá (AP) e Belém (PA). Norteia-se por alguns princípios, tais como: atuar na

sociedade para prevenir a incapacidade e a deformidade, combatendo, ao mesmo tempo, preconceitos

quanto à deficiência física, pois o que caracteriza a vida é a infinita variação da forma que no tempo

muda e defender o princípio de que nenhum homem pode ser discriminado por ser diferente da média

em sua forma física ou maneira própria de realizar uma atividade (REDE SARAH, 2006).

As escolas nas quais as professoras da pesquisa trabalhavam fazem parte da Rede

Municipal de Ensino em Belo Horizonte que adota a proposta de “Escola Plural” como eixo norteador

do fazer pedagógico. A Escola Plural foi implantada em 1995, nas escolas municipais da cidade,

visando garantir o direito à educação para todos e tendo a inclusão social como princípio. O ensino é

organizado em ciclos de idade e formação. O tempo escolar é flexível, respeitando-se os ritmos

diferenciados de aprendizagem dos alunos, e a formação do professor é orientada para a reflexão sobre

a prática pedagógica e pela interação com o aluno e a família A comunidade participa da gestão

democrática da escola. Para garantir a qualidade na inclusão de alunos com deficiência, a prefeitura da

cidade investe na construção da intersetorialidade, adotando uma política articulada entre o poder

público e os movimentos sociais (SMED BH).

Vale ressaltar que a Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte iniciou o

atendimento aos alunos com deficiência baseado no paradigma da integração, mas, desde 1997,

esta rede de educação trabalha a partir do paradigma da inclusão, buscando, então, adaptar suas

escolas às necessidades de todos os alunos com deficiência. Destacamos ainda que esta rede

nunca trabalhou com escolas-pólo para inclusão ou classes inclusivas, implementando a política

de inclusão na totalidade de suas escolas, de acordo com a demanda do alunado.

A inclusão escolar vem sendo construída por meio de ações pedagógicas

comprometidas com o direito à educação e, atualmente, esta rede conta com aproximadamente

1.878 alunos com deficiência, com destaque para crianças matriculadas na Educação Infantil e no

1º Ciclo. Deste total de alunos, 506 apresentam deficiência intelectual; 426, deficiência física;

331 são crianças com condutas típicas; 264 têm surdez; 157 possuem cegueira; e 194 apresentam

deficiência múltipla. O crescimento gradativo do atendimento à pessoa com deficiência se deve à

Page 55: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

procura, cada vez maior, por parte dos próprios familiares que buscam matricular seus filhos em

escolas mais próximas de suas residências. Hoje, todas as crianças com deficiência podem ser

matriculadas em qualquer escola da Rede Municipal de Educação mais próxima de sua residência

(SMED BH).

6.3 Sujeitos da pesquisa

"O conhecimento do próximo tem isto de especial: passa necessariamente pelo conhecimento de si mesmo”. (Italo Calvino)

Os sujeitos da pesquisa foram 14 professoras das escolas regulares da rede municipal

de Belo Horizonte que tinham um ou mais alunos com paralisia cerebral acompanhados no

Hospital Sarah Belo Horizonte e que aceitaram participar do estudo. Foram convidados

professores de crianças com diagnóstico de paralisia cerebral, apresentando dificuldades na

movimentação e/ou alterações na comunicação verbal e/ou impossibilidade de escrita manual

e/ou defasagem entre sua idade e seu processo de aprendizagem. Estas são algumas das maiores

dificuldades para o trabalho pedagógico desenvolvido com estes alunos, relatadas pelos

professores durante as visitas escolares, estudos de casos e seminários.

Convidamos os professores de crianças com diagnóstico de paralisia cerebral

avaliadas pela pedagogia hospitalar nos últimos dois anos. A partir de um levantamento

realizado, selecionamos 50 pacientes com os critérios descritos acima e convidamos seus

professores para participar da pesquisa, através de carta enviada às escolas (Anexo E) e também

por contato telefônico. Realizamos três reuniões com os professores interessados, para explicitar

os objetivos e finalidades do estudo e, como a maioria dos interessados trabalhava no turno da

tarde, optamos por este horário para desenvolver a intervenção educativa. Desta forma,

poderíamos contar com maior participação. Foram incluídos todos os professores que aceitaram

participar da pesquisa, totalizando, então, quatorze professoras. Oito professoras tinham cursos de

especialização completo, uma estava cursando e as outras cinco eram licenciadas em pedagogia.

Apenas cinco professoras já tinham experiência prévia com alunos com diagnóstico de PC e

quatro com alunos com outras necessidades educacionais especiais. O tempo de magistério

variava de três a trinta e um anos, sendo que onze professoras apresentavam mais de dez anos de

Page 56: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

experiência. Quanto ao tempo na rede municipal de ensino, este variava de um a trinta e um anos

de experiência em sala de aula, sendo que nove professoras iniciaram sua vida profissional na

RME BH. Cabe destacar que duas professoras que participaram do estudo assumiam também a

função de coordenação em suas escolas, não sendo, portanto, as professoras das crianças

acompanhadas no hospital, mas acompanhavam todo seu processo pedagógico junto com a

professora regente. Das nove regionais que compõem a Rede Municipal de Educação, contamos

com a participação de professoras das seguintes regionais: Barreiro, Centro-sul, Nordeste,

Noroeste, Oeste e Venda Nova. As professoras que fizeram parte da pesquisa receberam

certificado de participação no curso: “Educação inclusiva: construindo possibilidades”, do Centro

de Extensão da Escola de Enfermagem da UFMG – CENEX (Anexo K).

Minayo (1993) destaca que, ao definirmos os sujeitos da pesquisa em um estudo

qualitativo, devemos nos preocupar com o aprofundamento e a abrangência da compreensão, em

detrimento de uma representatividade numérica. Para a autora, “uma amostra ideal é aquela capaz

de refletir a totalidade nas suas múltiplas dimensões” (p.102). Consideramos este grupo de

professoras bastante representativo, pois, como destaca Sá (1998), o objeto de uma representação

social precisa ter relevância para os sujeitos para que eles possam formar uma representação do

objeto, ou seja, já tenham sido expostos àquele objeto de maneira sistemática, por estar

relacionado a suas práticas. No quadro da página a seguir, podemos observar algumas

informações das professoras que participaram da pesquisa.

Em relação aos alunos, a idade deles variava de quatro anos até dezessete. Em relação

à escolaridade, três crianças estavam na educação infantil, cinco no 1º ciclo, cinco no 2º ciclo e

apenas uma no 3º ciclo. Quanto à locomoção, sete crianças usavam cadeira de rodas, duas

utilizavam andador e cinco apresentavam marcha com independência. Sobre a comunicação

verbal, seis deles necessitavam de material alternativo para sua comunicação por não apresentar

fala funcional e oito alunos não apresentavam escrita manual, sendo necessário uso de materiais

alternativos para escrita, incluindo o uso do computador.

Vale destacar que o ensino municipal de Belo Horizonte é organizado em ciclos de

idade de formação, ou seja, da Educação Infantil ao Ensino Fundamental. As etapas de formação

são identificadas em ciclos, de acordo com a faixa etária do (a) aluno (a). Dentro dessa

estruturação da Educação Básica, os alunos agrupam-se por idade, conforme as seguintes etapas:

Educação Infantil - a partir de quatro meses a cinco anos e oito meses;

Page 57: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

1.º Ciclo do Ensino Fundamental - de cinco anos e oito meses a oito anos;

2.º Ciclo do Ensino Fundamental - agrupa alunos de nove a onze anos (pré-adolescência) e

3.º Ciclo do Ensino Fundamental - com didática específica para estimular o interesse de

estudantes de doze a quatorze anos, esse ciclo de formação é o da adolescência e da juventude

(SMED).

Após o quadro com as informações sobre as professoras, destacamos algumas

informações dos alunos cujas professoras participaram da pesquisa.

Quadro 1 – Informações sobre as professoras

Professor

Formação

Tempo de

magistério

Tempo

na RME BH

Experiência anterior

com alunos com

diagnóstico de PC

Experiência anterior com alunos com necessidades educacionais especiais -

NEE

Regional

P1 Especialização em Educação

Infantil

25 25 Sim Sim Oeste

P2 Pedagogia 31 31 Não Não Nordeste P3 Pedagogia 5 5 Não Não Nordeste P4 Pedagogia 18 1 Não Não Nordeste P5 Especialização

em psicopedagogia

12 6 Sim Não Venda Nova

P6 Pedagogia 24 4 Não Não Centro-sul P7 Especialização

em psicopedagogia, metodologia do ensino superior e fisiologia do

espaço

23 3 Não Sim Noroeste

P8 Especialização em

psicopedagogia

20 20 Não Sim Barreiro

P9 Especialização em

psicopedagogia

21 21 Não Não Venda Nova

P10

Especialização em

psicopedagogia e alfabetização

15 15 Não Não Barreiro

Page 58: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

P11

Especialização em educação infantil e

alfabetização

25

25

S

im – pouco tempo

Não

Oeste

P12 Cursando especialização

em alfabetização e

educação infantil

18 18 Sim Não Noroeste

P13 Especialização em

psicopedagogia

10 3 Não Não Noroeste

P14 Pedagogia 3 3 Sim Sim Oeste

Quadro 2 – Informações sobre os alunos

Aluno Idade Etapa/Ciclo Diagnóstico – quadro motor

Lingua-gem verbal

Escrita manual

Locomoção

C1 5 Educação infantil

PC - tetraplegia mista

Não Não Cadeira de rodas

C2 11 2ªet /2ºciclo PC - hemiplegia espástica à E

Sim Sim Marcha

C3

6 1ªet /1ºciclo PC – diplegia espástica

Sim Sim Andador

C4 11 2ªet/2ºciclo PC – hemiplegia espástica à E

Sim Sim

Marcha

C5 7 1ªet /1ºciclo PC – tetraplegia mista

Não Não Cadeira de rodas

C6 12 2ªet/2ºciclo PC – tetraplegia discinética

Não Não Cadeira de rodas

C7 17 1ªet/3ºciclo PC – tetraplegia discinética

Sim Sim Marcha

C8 12 1ªet/2ºciclo PC – tetraplegia espástica

Sim Não Cadeira de rodas

C9 9 3ªet/1ºciclo PC – tetraplegia espástica

Não Não Cadeira de rodas

C10 7 1ªet /1ºciclo PC – diplegia espástica

Sim Sim Marcha

C11 5 Educação infantil

PC – tetraplegia mista

Não Não Cadeira de rodas

C12 12 1ªet /2ºciclo PC – coreoatetose

Sim Não Marcha

C13 5 Educação infantil

PC – diplegia espástica grave

Sim Sim Andador/CR

C14 9 2ªet/1ºciclo PC – tetraplegia mista

Não Não Cadeira de rodas

Page 59: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

6.4 Aspectos éticos

A ética de que falo é a que se sabe afrontada na manifestação discriminatória de raça, de gênero, de classe. É por esta ética inseparável da prática educativa, não importa se trabalhamos com crianças, jovens ou com adultos, que devemos lutar. E a melhor maneira de por ela lutar é vivê-la em nossa prática, é testemunhá-la, vivaz, aos educandos em nossas relações com eles.

(PauloFreire)

Para o desenvolvimento deste estudo, seguimos as recomendações da Resolução

nº196/1996, do Conselho Nacional de Saúde (CNS) sobre pesquisa envolvendo seres humanos.

O projeto de pesquisa foi autorizado pelo Núcleo de Inclusão Escolar da Pessoa com

Deficiência, Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte - SMED (Anexo A), aprovado

na Câmara Departamental de Enfermagem Aplicada da Escola de Enfermagem da Universidade

Federal de Minas Gerais (Anexo B), no Comitê de Ética da Universidade Federal de Minas

Gerais – COEP UFMG (Anexo C).

O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE da pesquisa (Anexo D) foi

assinado pelos participantes, depois de esclarecidos sobre o tema e os objetivos do estudo,

garantindo seu anonimato e assegurando o tratamento sigiloso e utilização das informações

apenas para fins técnico-científicos.

6.5 Instrumentos e procedimentos para coleta de dados

O que me estimula é a preocupação de ocultar o menos possível a complexidade do real. (Edgar Morin)

Como instrumentos de coleta de dados da pesquisa, utilizamos questionário descritivo

sobre o desempenho escolar do aluno (Anexo G), entrevistas individuais, tipo semi-estruturada

(Anexo F), grupo focal e questionário de avaliação da intervenção educativa (Anexo J).

Os questionários com questões abertas sobre o dia-a-dia dos alunos buscaram

conhecer a realidade escolar destes, envolvendo aspectos tais como: participação das crianças nas

atividades, interação com colegas, utilização do espaço físico, necessidade de ajuda em algumas

atividades, atividades de escrita e também sobre as dificuldades das professoras no trabalho

Page 60: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

educativo com seus alunos. O questionário envolveu questões dirigidas por escrito, com o

objetivo de ter conhecimento sobre opiniões, crenças, sentimentos, interesses, expectativas,

situações vivenciadas, entre outros. As questões sobre os alunos que constavam neste

questionário tinham como objetivo identificar algumas representações sociais das professoras a

partir de elementos da realidade concreta de suas salas de aula. Os questionários foram entregues

impressos aos participantes e deixamos claro que manteríamos o sigilo das informações. Para

Bauer (2002), os textos referem-se aos pensamentos, sentimentos, memórias, planos e discussões

das pessoas e algumas vezes nos dizem mais do que seus autores imaginam.

As entrevistas tiveram como objetivo a compreensão de crenças, valores, motivações

e atitudes dos professores em seus contextos sociais específicos. A utilização das entrevistas

forneceu dados básicos para a compreensão das relações entre os atores sociais e sua situação. Na

primeira pergunta da entrevista solicitamos que as professoras falassem livremente sobre a

experiência com seu aluno com PC, para evitar perguntas indutoras.

Para Minayo (2004), a entrevista é uma conversa a dois com propósitos bem

determinados e através dela podemos obter dados objetivos e subjetivos. Esta técnica permite

combinar perguntas fechadas e abertas, em que o entrevistado discorre sobre o tema proposto,

sem respostas ou condições prefixadas pelo pesquisador. Desta forma a entrevista constitui um

lócus de interação entre pesquisador/pesquisado, uma relação intersubjetiva e é considerada um

“instrumento privilegiado de coleta de informações para as ciências sociais”.

Considerando que toda pesquisa é um processo social, uma interação ou um

empreendimento cooperativo, tanto entrevistador como entrevistado estão envolvidos na

produção de conhecimentos. Sendo assim, a entrevista é uma partilha, uma tarefa comum e uma

negociação de realidades (GASKELL, 2002). Cabe aqui ressaltar que, em algumas entrevistas,

foi necessário destinar um tempo para conversar sobre o aluno, assim como observá-lo em sala de

aula, em função da demanda das professoras. A maioria das entrevistas foi realizada na escola

municipal em que a professora trabalha, apenas uma foi realizada no Hospital Sarah/BH e outra

na casa da professora, pois ela estava de licença. As entrevistas tiveram duração média de

aproximadamente 40 minutos, sendo gravadas e transcritas na íntegra para análise posterior. As

entrevistas receberam códigos P1, P2, P3 e assim sucessivamente, até P14. As entrevistas foram

realizadas individualmente, em diferentes espaços possíveis nas escolas, tais como: biblioteca,

sala de aula, pátio. Inclusive uma delas foi realizada na porta da sala de aula, com a turma

Page 61: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

realizando uma atividade previamente organizada pela professora. Desta forma algumas situações

da realidade escolar foram vivenciadas durante a realização das entrevistas. As entrevistas

partiram de um roteiro-guia, objetivando identificar as representações sociais dos professores

sobre paralisia cerebral, aprendizagem e desenvolvimento, linguagem e inclusão do aluno com

PC e também sobre sua experiência no trabalho pedagógico com seus alunos.

Durante o percurso da intervenção educativa utilizamos ainda um caderno de campo

para registro de impressões pessoais, de dados da realidade observados durante o trabalho e que

foram incluídos na análise deste estudo.

Para o levantamento das representações sociais após a intervenção educativa,

utilizamos a técnica do grupo focal e o questionário de avaliação da intervenção educativa. O

grupo focal é uma técnica de entrevista direcionada a um pequeno grupo selecionado pelo

pesquisador e seu objetivo é estimular os participantes a falar e a reagir àquilo que outras pessoas

no grupo dizem. O grupo é mais do que a soma das partes, ele se torna uma entidade em si

mesma. Os sentidos ou representações que emergem são mais influenciados pela natureza social

da interação do grupo, em vez de se fundamentarem na perspectiva individual (GASKELL,

2002).

Sá (1998) destaca a pertinência do uso do grupo focal no campo das representações

sociais na medida em que ele simula as conversações espontâneas pelas quais as representações

são veiculadas na vida cotidiana.

O questionário de avaliação sobre a intervenção educativa teve como objetivo avaliar

e refletir sobre o processo educativo realizado e as estratégias e procedimentos pedagógicos

desenvolvidos.

Cabe destacar ainda que uma das professoras, no último dia da intervenção educativa,

antes de realizarmos o questionário de avaliação e o grupo focal, entregou espontaneamente oito

folhas contendo suas reflexões sobre todo o processo vivenciado. Algumas destas observações

também foram incluídas como material de análise e construção do DSC.

Page 62: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

6.6 Procedimentos para organização e sistematização dos dados – Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) e o QualiQuantiSoft

A realidade social é como uma floresta da qual não se tem um “ponto de vista aéreo”, que permita tudo ver, pelo contrário, é preciso decidir entrar na floresta,

tomar certos caminhos e trilhos particulares, sabendo que também outros itinerários são possíveis. (Tardif e Lessard)

Utilizamos como instrumento de organização e processamento dos dados a

metodologia do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC). Esta técnica permite uma análise qualitativa

dos discursos dos professores. Como afirmam os autores (SIMIONI et al, 1997, p.5):

Através deste modo discursivo é possível visualizar melhor a representação social na medida em que ela aparece (...) sob uma forma (mais viva e direta) de um discurso, que é o modo como os indivíduos reais, concretos, pensam.

O Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) é uma técnica com a qual podemos representar

a opinião coletiva, por meio de um discurso da realidade e que permite resgatar as representações

sociais de determinado grupo. Para Lefèvre et al (2002, p.7),

...o DSC como técnica de agregação de depoimentos nos permite conhecer o conjunto de RS sobre determinados temas prevalentes, numa dada coletividade que, sob a forma de um conjunto de discursos, configura uma determinada cadeia significante e argumentativa.

Segundo Fernando e Ana Lefèvre (2003), essa metodologia surgiu da necessidade de

responder à seguinte questão: se, no plano individual admite-se que o pensamento é, sempre,

composto de uma ou mais idéias, dos conteúdos destas idéias e dos argumentos que as sustentam,

por que não seria também, verdade na escala coletiva? Essa hipótese tem seus fundamentos na

sociologia e nas ciências sociais, que afirmam o compartilhamento de idéias, valores e crenças.

Os autores (2005) destacam ainda que, para resgatar o pensamento de uma coletividade sobre um

tema, é necessário considerar que a opinião dos indivíduos só pode ser vista como depoimento

discursivo, manifestação lingüística de um posicionamento sobre um tema, envolvendo uma idéia

central e seus respectivos conteúdos e argumentos.

Page 63: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Para elaboração do DSC, esta metodologia propõe a utilização de quatro figuras

metodológicas: expressões-chave (E-Ch), idéias centrais (ICs), ancoragens (ACs) e os discursos

do sujeito coletivo (DSCs).

As expressões-chave são trechos ou transcrições literais dos discursos dos professores e

que constituem o essencial do conteúdo das representações sociais presentes nos depoimentos.

As idéias centrais ou categorias são um nome ou expressão lingüística que revela e

descreve o sentido presente nas expressões-chave.

As ancoragens são fórmulas sintéticas que descrevem as ideologias, os valores, as

crenças presentes nas respostas individuais ou agrupadas, sob a forma de afirmações genéricas.

Os DSCs são então a reunião das E-Ch presentes nos depoimentos e que têm ICs e/ou

ACs de sentido semelhante ou complementar. Depois de analisar o material dos depoimentos,

compõe-se um ou vários discursos-sínteses na primeira pessoa do singular. Desta forma, o DSC é

um discurso coletivo, uma tentativa de resgate do “eu social ou coletivo”, do “eu ampliado”, é um

recurso para fazer emergir o inconsciente social que fala no indivíduo. De acordo com Lefèvre e

Lefèvre (2003), o DSC busca reconstruir, com pedaços de discursos individuais, tantos discursos-

sínteses quantos se julgue necessários para expressar a representação social sobre um fenômeno.

Desta forma é uma estratégia metodológica com objetivo de tornar mais clara uma representação

social e ou o conjunto das representações de um determinado grupo social.

Segundo Lefèvre&Lefèvre (2005, p.25),

...o DSC consiste, então, numa forma não-matemática nem metalingüística de representar (e de produzir), de modo rigoroso, o pensamento de uma coletividade, o que se faz mediante uma série de operações sobre os depoimentos, que culmina em discursos-síntese que reúnem respostas de diferentes indivíduos, com conteúdos discursivos de sentido semelhante.

Esta metodologia permite “uma soma qualitativa”, por agregar elementos de grande

especificidade que são os “diferentes fragmentos significativos de respostas discursivas de

conteúdo semelhante, emitidos por diferentes indivíduos que representam uma qualidade de

discurso” (Lefèvre e Lefévre, 2003).

Os autores utilizam a metáfora do “coral musical” para exemplificar a função de

ampliação ou complementação dos sentidos presentes no DSC.

Page 64: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

No coral, como no DSC, as vozes isoladas cantam, cada uma a seu modo, mas sempre a mesma música, que, no entanto, como fato coletivo, constitui produto diferente daquela música que soa em cada uma das vozes consideradas isoladas (Lefèvre e Lefèvre, 2005, p.56).

Para construir os discursos coletivos dos professores, utilizamos o “QualiQuantiSoft”,

um software desenvolvido pela Sales e Paschoal Informática, em parceria com a Universidade de

São Paulo (USP), por intermédio da Faculdade de Saúde Pública, nas pessoas dos professores

Fernando Lefèvre e Ana Maria Cavalcanti Lefèvre, criadores da metodologia do DSC. O uso do

software permitiu a construção dos discursos do sujeito coletivo (DSC), através das expressões-

chave das professoras. Vale ressaltar que neste estudo não utilizamos as informações

quantitativas que o software permite e analisamos, então, apenas as informações qualitativas.

FIGURA 1 – Licença acadêmica para utilização do software QualiQuantiSoft

Buscamos identificar as idéias centrais das professoras sobre suas concepções de

paralisia cerebral, relação aprendizagem-desenvolvimento, linguagem e inclusão de seus alunos

com PC na escola regular e as ancoragens (ideologias, valores e crenças) que fundamentam suas

idéias centrais. Desta forma,

Page 65: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

...a devolução para uma coletividade do DSC das ancoragens permitiria, ou aumentaria a chance da tomada de consciência por parte de uma coletividade de seus valores mais arraigados e abrangentes, dando condições para aumentar significativamente a eficiência e eficácia das ações educativas, na medida em que esta tomada de consciência poderia ensejar mudanças comportamentais de amplo alcance, que podem incidir sobre uma variada gama de comportamentos mais específicos que estão embasados nestes valores (LEFÈVRE et al, 2002, p.7).

A técnica do DSC busca resgatar a pluralidade dos discursos em uma coletividade.

Desta forma, os resultados que serão apresentados a seguir representam algumas idéias que

circularam no universo das professoras da pesquisa, e a forma como os professores da rede

municipal de Belo Horizonte vêm posicionando-se frente à inclusão escolar de seus alunos com

paralisia cerebral.

Para realizarmos a síntese interpretativa dos DSCs, utilizamos a análise de conteúdo

(AC), método de análise de texto desenvolvido nas ciências sociais. É uma técnica para produzir

inferências de um texto focal para seu contexto social, de maneira objetiva (BAUER, 2002).

Segundo o autor, a análise de conteúdo permite reconstruir indicadores, valores, atitudes,

opiniões, preconceitos, e compará-los entre comunidades. Os procedimentos da AC reconstroem

representações em duas dimensões principais: a sintática e a semântica. Neste trabalho realizamos

apenas a análise semântica. Neste procedimento semântico, buscamos o foco na relação entre

sinais e sentidos – sentidos denotativo e conotativo. A análise de conteúdo pode reconstruir

“mapas de conhecimento” e é uma construção social.

As representações encontradas foram interpretadas à luz do referencial teórico, com o

aprofundamento das discussões fundamentado na literatura voltada para o tema.

Page 66: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

7 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE O UNIVERSO DE ALUNOS COM PARALISIA CEREBRAL

Existem momentos na vida onde a questão de saber se se pode pensar diferentemente do que se pensa, e perceber diferentemente do que se vê, é indispensável para continuar

a olhar ou a refletir. (Foucault)

Neste capítulo apresentaremos as representações sociais das professoras através da

metodologia do DSC, buscando discutir as ancoragens que fundamentam as idéias centrais

encontradas. As representações sociais que serão discutidas envolvem: o conceito de paralisia

cerebral, a relação aprendizagem/desenvolvimento, a perspectiva de comunicação, linguagem e

escrita e a vivência de inclusão de seu aluno com paralisia cerebral, nas escolas regulares, da rede

municipal de BH. Analisando os conteúdos expressos nos discursos dos sujeitos da pesquisa

buscamos compreender as representações sociais que envolvem dimensões afetivas e cognitivas e

que têm como ponto de partida a vivência cotidiana das professoras com seus alunos no espaço

escolar.

Desta forma, o DSC é, então, uma maneira de acessar as realidades subjetivas das

representações sociais das professoras do estudo.

Gostaríamos de destacar ainda que apesar das noções de gênero não serem objeto

específico do presente estudo, estão implícitas na discussão, nas formas de construção social,

cultural e lingüística que fazem parte do processo de diferenciação entre mulheres e homens. O

conceito de gênero privilegia a discussão de como o comportamental, o psíquico e o biológico

produzem os corpos dotados de gênero, sexo e sexualidade, e como esses são percebidos entre

homens e mulheres. Neste trabalho, são representações de mulheres, professoras que estão

enfocadas, considerando-se que a abordagem nos leva a apreender crenças, valores e normas que

estão no senso comum e são construídas por representações de feminino e de masculino

(LOURO, 2003).

Falar das representações sociais nas quais percebemos que houve mudanças significa

também avaliar este trabalho que foi desenvolvido, nestes meses, com este grupo.

Não podemos estabelecer uma relação direta entre as mudanças nas RS e o trabalho

desenvolvido, mas acreditamos que ele possa ter contribuído para as mudanças, principalmente,

porque as professoras que aceitaram participar da pesquisa estavam abertas em seu trabalho e

também porque os encontros constituíram-se em espaços de reflexão do seu cotidiano.

Page 67: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Cabe destacar que nossa opção foi apresentar, em cada categoria, o conjunto das RS

que circularam neste grupo de professoras, envolvendo as representações que foram identificadas

ao início, durante e no final da intervenção educativa. Entendemos que para a teoria das

representações sociais não tem sentido falar em representações certas ou erradas, positivas ou

negativas e sim em diferentes representações sociais.

Durante o percurso da intervenção educativa observamos uma trajetória de

ressignificação sobre a PC e aspectos que envolvem o fazer pedagógico percorrida pelas

professoras, nas quais as representações foram sendo reorganizadas a partir das experiências e

significados delas. Esta ressignificação provavelmente, inicia no momento em que a professora se

depara pela primeira vez com seu aluno com PC. As representações sociais sobre a paralisia

cerebral estão ancoradas em representações das professoras sobre PC e sobre a deficiência, antes

mesmo de receber o aluno em sala de aula, e que são veiculadas ao longo da construção social

sobre a deficiência e a PC.

Observamos através do relato e da discussão no grupo, que algumas RS iam sendo

desestabilizadas e reconstruídas durante o processo da intervenção educativa, enquanto outras

permaneceram e, com certeza, outras ainda não foram identificadas pela pesquisadora. E como

nos fala Moscovici (1978, p.58), representar um objeto “não consiste simplesmente em desdobrá-

lo, repeti-lo ou reproduzi-lo, é reconstituí-lo, retocá-lo, modificar-lhe o texto.”

A análise dos dados nos permitiu identificar oito idéias centrais sobre paralisia

cerebral; oito idéias sobre inclusão escolar; dez sobre aprendizagem e desenvolvimento e quatro

sobre comunicação, linguagem e escrita.

A seguir discutiremos as representações sociais das professoras a cerca da paralisia

cerebral buscando subsídios teóricos para compreensão da práxis educacional.

Page 68: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

7.1 Representações sociais das professoras sobre a paralisia cerebral

O problema dele é tão pequeno e, às vezes, a escola faz parecer tão grande. (mãe de criança com PC)

A paralisia cerebral é um mistério. (mãe de um adulto com PC)

As questões que surgiram apontam para os diferentes modos de pensar e entender a

PC e envolvem conceitos, contradições, preconceitos, polêmicas, dilemas. Caracterizam como a

PC é interpretada e significada historicamente. Algumas significações revelam desconhecimento,

reafirmam esteriótipos, outras qualificam positiva e negativamente, algumas desconsideram

potencialidades e outras ampliam possibilidades.

O quadro abaixo representa a síntese das idéias centrais sobre paralisia cerebral

encontrada nos discursos das professoras.

Quadro 3 – Representações sociais das professoras sobre paralisia cerebral

1 - Paralisia cerebral é igual catapora 2 - Tudo jóia num corpo que não mexe 3 - O menino não tinha condição nem de raciocinar 4 - Eu tinha medo da paralisia cerebral 5 - E se ele fizesse mais fisioterapia, conseguiria andar? 6 - Nem sempre...há casos e casos 7 - Descoberta de diferentes práticas pedagógicas 8 - Hoje eu entendo que a paralisia cerebral não é igual para todos

7.1.1 Paralisia cerebral é igual catapora

DSC

A PC é uma doença e essa doença é comum, é igual pra todo mundo, igual catapora, toda criança com catapora vai ter erupção, vai ter febre, vai ficar de cama. Então eu achava que a PC era isso... uma criança que quase não dava conta de nada, não ia dar conta de nada, que os movimentos todos iam ser comprometidos, que não daria conta cognitivamente de desenvolver.

Page 69: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Caracterizar a PC como igual para todas as crianças e representá-la como grave, tanto

do ponto de vista motor quanto do cognitivo é uma imagem muito presente nos discursos das

professoras e que, muitas vezes, restringe o potencial deste aluno ao aspecto físico e cognitivo de

muito comprometimento. Nas palavras de Marques, C. (2001, p.17),

um fenômeno que afeta diretamente a construção social da imagem do deficiente é a categorização das características comportamentais, cognitivas, sociais e emocionais desses indivíduos. Constata-se uma tendência à generalização dessas características, como se todos os portadores de uma determinada deficiência fossem exatamente iguais.

Amaral (1998) também aborda o mito da generalização da deficiência nomeando-a

como “generalização indevida”, que é a transformação da totalidade da pessoa com deficiência na

própria condição da deficiência, na ineficiência global. O indivíduo não é uma pessoa com uma

condição, é apenas esta condição específica. Podemos dizer que este mito reforça uma imagem

superficial e restrita da pessoa, impedindo uma visão para além da deficiência.

Ao analisar o discurso das professoras podemos destacar a crença num

desenvolvimento homogêneo entre todas as crianças com PC, generalizando algumas

características e, consequentemente uma provável busca de trabalho pedagógico sem

diferenciação. Podemos, assim, inferir a dificuldade para transpor para um trabalho diferenciado

para este aluno.

7.1.2 Tudo jóia aprisionado num corpo que não mexe

DSC

Eu tinha muito forte na minha cabeça a paralisia como um impedimento motor e não cognitivo. Eu achava que era assim, está tudo jóia aprisionado num corpo que não mexe...aí eu achava que era isso, um corpo aprisionado, uma inteligência, uma possibilidade aprisionada ali na dificuldade só motora. Achei que meu aluno, se quisesse, podia dar alguma resposta.

O desconhecimento do diagnóstico, entendendo a PC como uma dificuldade apenas

motora, dificulta uma avaliação real das potencialidades e limites do aluno e colabora para gerar

e ou aumentar a frustração da professora pois, se a criança não está desenvolvendo, a culpa é dela

por não saber realizar o trabalho pedagógico.

Page 70: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

7.1.3 O menino não tinha condição nem de raciocinar

DSC

Na PC a criança não tem condição nem de raciocinar, entendeu? Não só, às vezes, o problema motor não, pra mim, não tinha como raciocinar, quer dizer, eu poderia falar com os meninos e eles não entenderiam. Olha, logo que eu peguei a turma, era um grande desafio, muito difícil, muito complexo entender o que acontecia com ele, mesmo porque eu não sabia que ele tinha paralisia cerebral. Eu achava que era um tipo de demência e isso dificultou muito até eu conseguir entender o que realmente acontecia.

A fala das professoras aponta para como o aluno com PC é visto no senso comum,

como um sujeito que não aprende, não raciocina e que, necessariamente, sempre apresentará

déficit cognitivo. Da mesma forma que considerar apenas o déficit motor no aluno com PC,

acreditar que ele sempre terá déficit cognitivo envolve desconhecimento do professor sobre a PC.

Muitas vezes o desconhecimento leva a associar a PC à infância, à demência e, portanto,

subestima a capacidade do aluno e fecha possibilidades de aprendizagem e desenvolvimento. Esta

dicotomia em relação à deficiência (pode tudo x não pode nada) corrobora com o estereótipo da

deficiência: ou são super homens ou sub homens (Sueli Satow, 1995). As pessoas com

deficiência, algumas vezes, são significadas como aqueles que superam todos os obstáculos ou

como sujeitos despotencializados.

7.1.4 Eu tinha medo da paralisia cerebral

DSC

Eu tinha medo da PC. Não sabia como agir diante de uma pessoa com PC e preferia me afastar. Os adultos na escola tem um pouco de receio de lidar com ele, tem medo, isto vai assim, quebrando alguns tabus até porque a gente não conhece bem a doença. As outras crianças que estão aqui comigo dão uma resposta imediata, eu percebo isto e com ele não consigo esta resposta e então gera esta insegurança. É outro tempo...É mais ou menos isso...Esta angústia de não saber a resposta, acho que isto é o que mais me incomoda, de não saber...às vezes eu até sei, até pelo convívio, a gente vai estabelecendo alguns códigos, que aí a gente percebe, mas esta angústia de não saber o que realmente ele quer, o que realmente eu posso fazer, é muito complicado.

O desafio do novo, do desconhecido, muitas vezes traz o medo e a angústia que

contribuem para reafirmar esteriótipos, mas o contato diário das professoras com seus alunos vai

Page 71: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

possibilitando a construção de novos referenciais. Para Beccon, “aceitar a deficiência significa

admitir a si mesmo como um ser limitado e provisório. Acolher quem é ou quem está deficiente

pressupõe respeitar as diferenças entre os indivíduos como algo tipicamente humano”.

Amaral (1995) destaca que o desconhecimento pode perpetuar atitudes

preconceituosas. Neste sentido, podemos considerar que as professoras estarem mais informadas

sobre as necessidades educacionais especiais de seus alunos pode ser uma abertura para o

processo de inclusão escolar.

7.1.5 E se fizesse mais fisioterapia conseguiria andar?

DSC

Eu pensava, mas e se ele fizesse mais fonoaudiologia, estaria falando? E se ele fizesse mais fisioterapia, estaria andando? O tratamento é pouco ou não é bom? Eu pensei isso sim, será que a família não investiu? Talvez se a mãe tivesse levado mais cedo para o tratamento...

Alguns professores questionavam se a família não teria investido o necessário ou se o

investimento foi tardio. Também algumas questionavam se o tratamento não teria sido bom o

suficiente para surtir efeito e o aluno melhorar ou mesmo curar-se. Nestes discursos observamos

o paradigma da integração, que baseado no modelo médico da deficiência, busca a cura e a

normalização das crianças, contribuindo para uma busca de homogeneização e não do

atendimento a diversidade.

A crença na possibilidade de cura, de normalização dos movimentos, de treino para

falar e realizar as atividades motoras nos remete ao discurso clínico que busca localizar no sujeito

as causas para o fracasso escolar.

Sassaki (1999) nos esclarece que o modelo médico da deficiência acredita que a

deficiência é um problema só da pessoa que precisa ser curada, tratada, reabilitada, enfim

adaptada à sociedade que não se modifica. Este é o conceito que fundamenta a integração e que

ainda está muito presente em nossas escolas. Entre o modelo médico e o modelo social da

deficiência há uma mudança na lógica da causalidade da deficiência que, para o modelo social,

está na estrutura social, definindo a deficiência não nos limites do corpo, mas sim na experiência

da desigualdade e da opressão.

Page 72: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Ao longo do processo da intervenção educativa foi possível observar mudanças

significativas nas RS acerca da paralisia cerebral que destacaremos a seguir.

7.1.6 Nem sempre... há casos e casos...

DSC

Nem sempre, há casos e casos. Então eu vim descobrindo que há possibilidades de trabalhar com este menino, que não necessariamente ele vai melhorar, não necessariamente ele vai andar, pode até ser que isto aconteça, mas não é por falta de investimento. É pela doença em si que ele desenvolve menos. Então eu passei a ver de outra forma. Eu achava que a mãe tinha sido ...negligente, não tinha feito tudo. Julguei mal a mãe. Eu achava que como ele tava no caminho, como ele tava caminhando, eu achava que ele por estar, na época com 10 anos, ele poderia estar melhor. Não, não é por aí. Há casos e casos. Tem casos que o menino dá conta de andar, mas tem casos que não vai andar nunca. Tem casos que o menino anda, mas não fala, então não vai falar nunca, né?

Observamos na fala das professoras maior compreensão sobre o diagnóstico de seus

alunos e, portanto, maior clareza no fazer pedagógico. Outro aspecto que destacamos se relaciona

com a postura profissional e diz respeito à mudança do paradigma da integração para a

perspectiva de inclusão. A compreensão da PC como uma lesão irreversível e o papel da escola

necessariamente tendo que adaptar-se às necessidades deste alunado jogam por terra a

expectativa de que o aluno deverá estar pronto para freqüentar escola regular. A educação

inclusiva força a construção de uma nova escola que busca adaptar-se a todas as necessidades

humanas e contrapõe-se à escola integradora que busca o ajustamento do sujeito a um modelo de

aluno e do processo de aprendizagem e desenvolvimento.

Segundo as professoras, assistir o filme King Gimp, que mostra uma pessoa com PC

dos 13 aos 25 anos com um quadro motor, pouco mudado da infância à vida adulta, mesmo com

muito empenho da família e diversos tratamentos, contribuiu para mudar a expectativa de cura e

normalização de seus alunos.

A esse respeito Morin (2005) nos diz que a literatura, o teatro e o cinema são os

melhores meios de compreensão e de inclusão do outro. Essa compreensão é que deveria ser

introduzida e desenvolvida em nossa vida pessoal e social, para melhorar as relações humanas.

Tornamo-nos humanos com a inclusão dos excluídos.

Page 73: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

O cinema pode então constituir-se em estratégia fundamental, utilizada na formação

de professores para promover a reflexão sobre as representações sociais. Dinis (2005, p.67)

nos diz que o cinema pode ser “um aliado da educação no exercício da alteridade que prepara o

sujeito para infinitas travessias que o levam em direção ao outro”.

7.1.7 Descoberta de diferentes práticas pedagógicas

DSC

Hoje eu tenho outra visão, outra forma de olhar. Se fosse antes eu tirava minhas crianças de perto, igual o pai quis fazer porque tinha uma criança com PC e outra com síndrome de Down, no clube. Antes a escola podia me exonerar que eu não ia trabalhar com estas crianças, agora eu faço questão. Como que eu ia fazer uma avaliação dele se eu não sabia que ele podia apontar pra mim com a ponteira, sabe? A ponteira eu usava mais para colorir e não para fazer esta busca do conhecimento dele mesmo. Me senti impotente, não sabia como lidar com a inteligência dele.

A partir de uma maior clareza sobre a paralisia cerebral algumas professoras

conseguiram qualificar as possibilidades de seus alunos com PC. Esta mudança contribuiu para a

construção do lugar social desses alunos, permitindo que fossem significados como criança,

como jovem, como aluno, como pessoa capaz de aprender. Crianças com PC com estatuto de

alunos – dignos de respeito e expostos às situações de aprendizagem na sala de aula. Gostaríamos

de ressaltar que as práticas educativas são fundamentais para esta construção do estatuto de

alunos.

7.1.8 Hoje eu entendo que a paralisia cerebral não é igual pra todos

DSC

Hoje eu entendo que a PC não é igual pra todos, que as crianças podem nascer com esse problema, podem ter movimentos limitados e nem sempre o cognitivo está sendo afetado. Ele simplesmente tem limitação dos movimentos, algumas podem ter dificuldade cognitiva, não vejo mais como uma regra, todos seguindo aquilo, eu vejo hoje assim. Eu tenho claro que não é uma regra. Em relação à parte cognitiva em alguns afeta mais outros menos, porque tem uns que não conseguem, eu acredito que deve ter casos de crianças que nunca vão conseguir ler, nem escrever, outras já vão conseguir ler e talvez vão conseguir escrever, depende do grau do comprometimento. É uma criança com PC, então 1º eu vou ter que ver o nível de

Page 74: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

desenvolvimento dele, para ver o que ele dá conta, o que não dá conta... Então não muda muito do que a gente faz com as crianças, a gente sempre com aquela coisa que tem que se diferenciado...

A perspectiva das diferenças entre as crianças do grupo: todas com diagnóstico de

PC, porém com características muito distintas em relação ao quadro motor, ao desenvolvimento

cognitivo, independência, comunicação e escrita contribuiu muito para a vivência da diversidade

entre as crianças com paralisia cerebral. A exposição da dificuldade de uma professora acabava

por tranqüilizá-la, na medida em que ela saía da situação de isolamento que se encontrava. Trocar

idéias, escutar atividades realizadas motivava e estimulava a busca de soluções. Algumas

dinâmicas utilizadas proporcionaram ao grupo perceber a riqueza das diferenças no próprio grupo

e, também através dos filmes selecionados, puderam observar esses diferentes quadros de pessoas

com PC. Estes relatos nos remetem a um dos saberes abordados por Morin (2005, p.50) quando

nos diz que “no âmago da leitura, no espetáculo cinematográfico, a magia do livro ou do filme

faz-nos compreender o que não compreendemos na vida comum.”

7.2 Representações sociais das professoras sobre o processo de inclusão escolar

“Pertencer é mais do que romper barreiras dos rótulos e dos estigmas produzidos na representação e no imaginário social;

pertencer é mais do que ter contemplados direitos à cidadania no âmbito jurídico-formal. Pertencer é, pois, estar engajado, qual sujeito ativo da história;

é exercer a condição de ator sem ser alvo da visão dualista que atribui à “diferença” a condição de anjo ou demônio, para garantir à média a condição de normais.

Pertencer é estar no palco sem ser herói ou vilão... (Paulo Ricardo Ross)

Considerando a análise dos DSCs observamos que as professoras constroem

representações sociais sobre inclusão escolar, em torno dos seguintes significados: a questão do

direito à escola, do desafio profissional e da construção coletiva desse processo. A necessidade de

avançar mais pedagogicamente é bastante destacada pelas professoras. Algumas enfatizam o

aspecto precário da inclusão apontando o que falta nas escolas para que a inclusão aconteça de

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fato. O destaque da inclusão, como um processo solitário do professor com seu aluno, esteve

muito presente em vários momentos do estudo.

O quadro abaixo representa a síntese das idéias centrais sobre inclusão escolar

encontradas nos discursos das professoras.

Quadro 4 – Representações sociais das professoras sobre inclusão escolar

1 - Todos da escola aceitam bem a inclusão. 2 - A inclusão é um processo precário, é construção, demanda tempo 3 - Inclusão é responsabilidade de todos. 4 - Aos poucos percebemos que ele tem progredido e temos aprendido com ele 5 - A parte pedagógica precisa ser melhorada. 6 - Inclusão é um processo solitário 7 - As crianças com paralisia cerebral têm direitos 8 - Meu aluo tem mudado...e eu também...

7.2.1 Todos da escola aceitam bem a inclusão

DSC

Os alunos da escola, os professores e todos da escola aceitaram bem a inclusão. É um processo tranqüilo. Todos sabem das dificuldades do aluno e respeitam. A inclusão ajuda no crescimento da criança e em sua socialização. Acho que a inclusão é também socialização e neste ponto, penso, é muito importante viver as diferenças. No convívio com toda a comunidade escolar devemos buscar sempre meios para que esta convivência seja prazerosa e produtiva fazendo das limitações um caminho para desenvolvimento seja ele social (escola) e de mundo (conhecimento).

A inclusão escolar iniciou de forma sistemática nas escolas municipais de BH a partir

de 1997 e, sendo assim, esta rede tem um acúmulo de experiências que possibilita que a inserção

escolar do aluno com PC, para algumas professoras, já não seja tão assustadora. Algumas escolas

mostram-se mais tranqüilas, porém, esta não é a realidade de todas.

Observamos que dentre as diferentes possibilidades de representar a inclusão, uma

ênfase encontrada nos discursos das professoras é na possibilidade de socialização. A

socialização pode ser entendida de duas maneiras. A primeira quando a escola se descompromete

com o processo pedagógico deste aluno, responsabilizando-o pela sua aprendizagem e fracasso e

Page 76: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

fica satisfeita apenas com os ganhos sociais. E outra perspectiva, quando destaca a vivência das

diferenças como fundamental para estruturação deste aluno/cidadão, tanto do ponto de vista da

troca com o outro, como também da ética.

Vygotsky nos ajuda a compreender a riqueza da heterogeneidade que possibilita a

troca pois, para o autor, o sujeito só aprende em interação com outros sujeitos, e os diferentes

níveis de desenvolvimento entre os alunos podem constituir-se em auxílio e não em obstáculo à

aprendizagem. “O que uma criança pode fazer hoje com assistência, ela será capaz de fazer

sozinha amanhã” (Vygotsky, 1989, p. 98).

7.2.2 A inclusão é um processo precário, é construção, demanda tempo

DSC

É um processo fraco, regular, bem precário, pois eu não fico satisfeita em garantir a vaga e nem só a socialização. É precário não por culpa da escola ou dos professores. É um trabalho bem difícil... Neste momento sinto que falta muito ainda a ser construído para que o processo de desenvolvimento do aluno avance, se fosse avaliar em conceito diria que é regular. Posso considerar que o processo de inclusão é lento. Tem melhorado com o passar do tempo, mas, percebo que ainda falta por parte dos professores e alunos um pouco mais de paciência e compreensão ao lidar com uma criança portadora de PC. Apesar de lento, tem caminhado para um lado bom. Como tudo, demanda tempo. O processo de inclusão precisa ser aprimorado, já que ainda faltam recursos.

A fala das professoras reforça o fato de que apenas a matrícula e a freqüência na

escola regular, não garantem a inclusão escolar.

A imagem da inclusão como um processo e uma construção encontra ressonância nas

palavras de Mittler (2003, p.21), quando afirma “...que a inclusão é uma estrada a ser viajada,

mas uma estrada sem fim, com todos os tipos de barreiras e obstáculos...”

Sobre esta dimensão do tempo observamos que família e escola vivenciam processos

semelhantes ao depararem-se com questões acerca do diagnóstico, prognóstico e possibilidades

futuras deste filho e deste aluno. O processo ocorre primeiro no âmbito familiar e quando a

criança chega à escola ele parece recomeçar com a equipe escolar. Podemos observar este

movimento na seguinte fala da mãe de uma criança com PC, registrada no caderno de campo,

quando em entrevista em uma escola: “agora, que eu levei tantos anos para entender que posso

Page 77: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

incentivar o desenvolvimento cognitivo independente das dificuldades motoras dele, e decidi

matriculá-lo na escola comum, a professora me disse “que sonha com o dia que ele irá andar,

falar e pegar no lápis para escrever.”

O fator tempo foi destacado em vários momentos da intervenção educativa pelos

professores. O tempo da adaptação do professor ao aluno e suas necessidades, da escola com o

aluno, da família com a escola, o tempo que este aluno necessita para realizar as atividades, o

tempo que ele gasta para fazer as refeições, a falta de tempo do professor em preparar atividades,

materiais e poder dar uma atenção individualizada. Enfim, esta dimensão tempo precisa, em

alguns momentos ser replanejada a partir das necessidades concretas dos alunos. Na discussão do

filme King Gimp com as professoras, salientamos que esta dimensão do tempo está representada

ao longo do filme, através do som de Dan digitando no teclado do computador, com a adaptação

que utiliza na cabeça. O ritmo constante e lento da digitação nos traz a dimensão do esforço, do

empenho e do desgaste que, muita vezes, é necessário para que alunos com paralisia cerebral

desempenhem algumas atividades em suas salas de aula. Ainda neste filme, destacamos um

diálogo entre o professor de escultura e Dan quando o professor lhe diz: “Acho que a coisa mais

poderosa do mundo é o espírito humano. Nossos corpos são prisões do espírito. Fiquei

surpreendido com sua força de vontade, seu espírito. Acho que muitas pessoas podiam ter um

pouco desse espírito em seus corpos saudáveis”.

7.2.3 A inclusão é responsabilidade de todos

DSC

O processo de inclusão está acontecendo aos poucos, porém, a comunidade escolar não se deu conta de que isso é responsabilidade de todos, não é um caso isolado... O aluno é só meu e da estagiária, ninguém mais desenvolve nenhuma atividade com ele. Caminhamos com passos miúdos, mas chegará o momento em que daremos realmente conta do serviço com um pouco menos de dificuldades. Já avançamos muito, mas ainda falta um tanto bem bom. Tinha que ser um trabalho conjunto da escola, de todo mundo ter responsabilidade sobre, não ficar só por conta do professor, ele fica muito sobrecarregado. Às vezes, ele tem uma turma complicada e não tem como ficar atendendo a criança. E eles precisam de mais atenção do que os outros, né?E a gente tem que ter esse tempo pra eles. Com informação, formação e participação de todos os envolvidos no processo, acredito muito na inclusão. Sinto falta de conversar mais sobre inclusão, não apenas com alguns, mas com toda a comunidade.

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Segundo as professoras o processo de inclusão escolar precisa ser assumido pelo

coletivo da escola e da comunidade, porém, não é o que elas têm vivenciado, e a falta desta

discussão foi muito apontada durante toda a pesquisa.

O processo de inclusão provoca questionamentos sobre o funcionamento da escola

implicando em modificações na dinâmica institucional e isso causa muitas resistências no âmbito

escolar. Algumas professoras da pesquisa relataram situações que vivenciam no cotidiano de

suas escolas, como por exemplo: uma professora que entrega atividade para todos na sala, exceto

para seu aluno com PC; outra professora que falou que não quer um aluno parasita na sala dela,

não está aberta a conhecer um aluno com PC. Relatam ainda sobre uma da professora que viu o

aluno caindo na quadra e passou por cima dele.

Apesar de não ser a escola a produtora das diferenças sociais, esta instituição pode

reproduzir preconceitos e injustiças. Enquanto local de interação social, a escola pode contribuir

para a conservação e perpetuação de estereótipos ou possibilitar a construção de novos

significados para a deficiência. A representação da pessoa com deficiência como incapaz é uma

construção social e para a escola superar este equívoco precisa de espaços de reflexão.

Giroux (1983) destaca que a educação convive com duas possibilidades

contraditórias: contribuir para a opressão humana e também para emancipação humana.

Encontramos também nas palavras de Freire (2006, p.16), a concepção da educação como uma

instância capaz de transformar a realidade, quando nos diz que “somos seres condicionados e não

determinados e portanto temos responsabilidade ética no nosso fazer cotidiano”. Desta forma,

podemos destacar o caráter emancipatório da inclusão, na medida que contribui para questionar e

ou romper com práticas excludentes no interior da escola. Para uma mudança de paradigmas nas

escolas faz-se necessário muitos espaços de reflexão e aprofundamento sobre o cotidiano escolar.

7.2.4 Aos poucos, percebemos que ele tem progredido e temos aprendido com ele

DSC

Avalio que o aluno está melhorando, mas eu, a estagiária e a equipe da escola ainda temos muito a aprender, mas estou feliz por ele estar demonstrando gostar tanto da escola e de estar evoluindo, embora lentamente... O aluno participa das atividades escolares e extra escolares, junto com a turma interagindo com os colegas e sendo receptivo às ajudas oferecidas. Demonstra carinho e sente-se inserido ao universo escolar. O processo de inclusão é muito

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importante, a escola avalia no seu comportamento nas atividades dadas. Depois fazemos reunião com as professoras, diretores e pais para tentar encontrar o melhor método. Ele não é excluído. É um aluno socialmente muito bem aceito entre os colegas, parece que se sente feliz em freqüentar a escola, está se desenvolvendo bem em sua comunicação com as pessoas. Ele está tendo oportunidade de crescer, de realizar atividades ao lado de crianças "normais" e da sua idade. Ele passou primeiro pela educação infantil e no início chegou no colo da mãe. Caía constantemente e quase não se entendia o que ele falava. Hoje ele consegue fazer quase tudo sozinho, a fala ainda é comprometida, mas se comunica com todos, basta que se tenha um pouco de paciência em ouvi-lo... Penso que o processo de inclusão dele trouxe para toda a escola no início, um pouco de medo e insegurança, mas aos poucos percebemos como ele tem desenvolvido e progredido, e como temos aprendido com ele.

A inclusão sendo reconhecida como processo de aprendizagem pelos colegas,

professores, e comunidade vai ao encontro da concepção ensino-aprendizagem de Vygotsky

(1989), quando refere que este processo é uma via de mão dupla em que o conhecimento é

construído pelos envolvidos num determinado contexto sócio- histórico.

7.2.5 A parte pedagógica precisa ser melhorada.

DSC

Este ano foi o 1º ano em toda a trajetória de 22 anos de trabalho na educação que eu me confrontei com o grande desafio de trabalhar com um aluno com PC. Estava angustiada, porque na escola onde trabalho as outras colegas também não tem experiências nesta área. Hoje estou mais calma, embora há ainda muito aprender. Na inclusão a parte pedagógica poderia ser melhor orientada... Vejo o lado positivo, pois, o aluno se sente inserido no seu grupo, não demonstra atitudes negativas em nenhum momento. Por outro lado, não sei avaliar como está sua aprendizagem em relação aos conteúdos. Eu não sabia o que ele dava conta. Sempre colocava pré-silábico, de onde eu tirei isso? Acho muito triste, não aprenderem por que não conseguem demonstrar em que nível conceitual se encontram. E se alguém já avançou neste aspecto, precisamos ser informados, formados, apoiados. Nós, professores, não temos muito conhecimento sobre o assunto e, às vezes, ficamos um pouco perdidos na hora de trabalhar com estas crianças, no sentido de como atendê-las contribuindo para o seu desenvolvimento, porque é doloroso não podermos trabalhar com essas crianças, porque não sabemos como. Cada vez mais percebo que é possível desenvolver um trabalho com esses alunos, mas falta consistência no trabalho. Ele está aprendendo, mas é aquilo que te falei, eu acho que estou atingindo, eu acho que vai dar certo, então esta insegurança é que a gente ainda não, eu pelo menos, falo por mim, não sei lidar com isso. Será que é isso mesmo, será que posso fazer mais, será que estou fazendo o suficiente... Penso que nós, professores, precisamos estar sempre à procura de formação para que essa inclusão aconteça de fato. Para mim, como professora, sinto insegurança e apreensão para lidar com a situação, pois não tenho preparação e formação para saber qual a melhor forma de ajudar este aluno, de como estimulá-lo para aprendizagem dentro de suas limitações.

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O que falta na verdade é capacitação e compreensão das pessoas que trabalharão com o processo de ensino-aprendizagem. Falta conhecimento a respeito do que é paralisia cerebral. Sinto falta de formação para nos sentirmos mais seguras no processo de realmente incluir. Na inclusão estar na sala com todos é só uma parte.

São os alunos que não conseguem mostrar o nível conceitual ou somos nós

professores que não temos ainda referencial suficiente para identificar o nível cognitivo de nossos

alunos?

Será que a dificuldade em identificar a aprendizagem de seus alunos não estaria

remetida ao descrédito do potencial de aprendizagem deles? Olhar para o sujeito enfocando o

aspecto orgânico pode levar a falta de expectativa sobre o processo de aprendizagem e

desenvolvimento. Identificar o déficit apenas na criança, sem fazer uma revisão das condições da

escola, das salas de aula e dos padrões do trabalho docente, coloca os professores como

espectadores que não acreditam que suas ações possam contribuir no que já está determinado

pelo déficit.

Ferreira, W, (2007), nos fala que um dos desafios do sistema público de educação no

Brasil é preparar professores para ensinar estudantes de todas as faixas etárias e estilos de vida,

com diferentes ritmos de aprendizagem e potenciais, buscando atender a diversidade da sala de

aula.

7.2.6 Inclusão é um processo solitário

DSC

É muito solitário. Tem que ter muita responsabilidade do professor que recebe a criança na sala, fica entre o professor e os alunos, entendeu? É assim, é, a experiência que eu tenho..., é muito, muito sozinha, você não tem uma assim... oportunidade de falar sobre a PC. Precisamos de material alternativo (prancha, brinquedos de causa e efeito, programas de computador) e profissionais bem informados e inteirados de processo de inclusão, estes poderiam nos orientar em alguns aspectos que temos dúvidas. Precisamos ainda ter mais conhecimento sobre o quadro clínico do aluno, para compreender como se processam as coisas no seu sistema nervoso. Ter maiores informações sobre as capacidades/ habilidades que ele consegue realizar. Acho que ajudaria um conhecimento maior sobre crianças com PC, porque é a primeira vez que tenho caso de inclusão em sala e eu gostaria de colaborar muito mais para o desenvolvimento do meu aluno. Gostaria também que ele tivesse auxílio externo com atendimento com fonoaudióloga, psicólogo e fisioterapeuta, um especialista. Também é necessário uma estagiária para fazer a ponte entre o professor, a matéria e a criança e este profissional ser mais preparado para este

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tipo de inclusão. Acho ainda que se a turma tivesse menos alunos seria mais fácil e também a questão da acessibilidade, pois nossa escola é cheia de escadas e não há rampas, banheiros adaptados entre outros. Faz falta que a rede pública tenha uma política que garanta um olhar mais individualizado e mais consistência no acompanhamento das escolas. Esse é o direito das crianças. Sinto falta de apoio pedagógico da equipe de inclusão de minha regional. Coloca-se o menino na escola e não tem, a gente não tem a quem recorrer, entendeu? Falta mais investimento da rede para que a chegada dessas crianças seja mais tranqüila. É uma caminhada muito solitária, quase perdi meu cargo na escola.

A solidão do trabalho escolar das professoras com seus alunos com paralisia cerebral

foi apontada com muita ênfase em quase todos os encontros. Observamos no relato delas uma

dicotomia entre o trabalho idealizado e o trabalho realizado. Esse distanciamento muitas vezes

gerou frustração, angústia e busca de soluções individuais e ressentimentos pela falta de decisões

e definições coletivas sobre o processo de inclusão escolar. A solidão e o desamparo no

acompanhamento dos alunos podem gerar a sensação de incapacidade do professor.

O espaço da intervenção educativa funcionou, muitas vezes, como espaço de

interlocução com outras professoras que estavam vivenciando situação semelhante e refletia a

ausência dessas discussões nos espaços escolares.

Houve questionamentos sobre a política de inclusão da SMED e sugestões para melhoria da

qualidade do trabalho pedagógico. As professoras se ressentiam da falta de condições estruturais

mínimas para o trabalho pedagógico com seus alunos. Alguns não tinham ainda acesso a todas as

atividades da turma pois a questão da acessibilidade a todos os espaços escolares ainda não estava

solucionada em várias escolas.

No filme King Gimp, o professor de escultura Gagik ao comentar um projeto de Dan

(personagem central do filme com PC cursando a faculdade de artes), realizado no computador,

analisa as relações dele com os espaços. Em suas palavras: “vejo alguns elementos,

provavelmente em desequilíbrio, escadas em diagonal, parece que estão caindo, se movendo.

Parece que querem nos tirar dessa clausura.” Cabe aqui uma reflexão sobre os alunos com PC e a

utilização dos espaços em suas escolas. Qual significado para os alunos que ficam privados de

participar de várias atividades em suas escolas por não ter acesso físico a elas? Algumas vezes,

existe a possibilidade de reorganização das salas de salas de aula para possibilitar a participação

dos alunos que utilizam auxílio locomoção, porém, em algumas escolas, ainda encontramos a

resistência a pequenas mudanças.

Page 82: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

A morosidade na resolução de impasses administrativos, seja no interior da escola,

no âmbito da regional ou da própria SMED, foi muito destacada. Segundo as professoras maior

agilidade na resolução de problemas, como por exemplo iniciar o ano com a estagiária em sala,

resultaria em melhor qualidade e atendimento mais adequado aos alunos.

Apesar desta rede de ensino (SMED) ser uma das redes pioneiras na implementação

de políticas públicas para a inclusão na totalidade das escolas, encontramos ainda muitos desafios

a serem superados como alguns levantados pelas professoras durante a intervenção educativa.

Acreditamos que esses desafios não signifiquem que a “inclusão não deu certo”, mas

sim, são implicações e conseqüências do processo de construção de um novo paradigma

educacional. Na medida em que alguns pilares da educação inclusiva vão consolidando-se no dia-

a-dia das salas de aula, “uma nova escola” (heterogênea, flexível, democrática, que respeite e

valorize as diferenças, que ofereça igualdade de oportunidades, cooperadora) vai ocupando o

lugar da “velha escola” (homogênea, excludente, autoritária). O fundamental é a explicitação e

discussões dessas necessidades nos espaços escolares. Os erros, acertos, questões, embates fazem

parte de um mesmo processo, o da construção da escola inclusiva.

A busca por conhecer as representações dos professores objetiva, também, criar

espaços de escuta, nos quais os professores tenham oportunidade de trocar experiências

constituindo núcleos de discussão, apoio e referenciais sobre o processo de inclusão escolar.

7.2.7 As crianças com paralisia cerebral têm direitos

DSC

Acho que as crianças têm o direito de ir à escola. Penso que sem a inclusão, não seria possível humanizar essas crianças, todas as demais e nós mesmas. Eu acredito que isso que estamos vivendo é um primeiro passo para uma sociedade mais digna, que respeita as diferenças e acredita no potencial de cada indivíduo. Acho a inclusão muito importante, uma vez que a escola é direito de todos e todos devem participar dela. As crianças com PC têm mais chance de serem felizes junto com outras crianças normais, pois, percebo em meu aluno essa satisfação. Ele não falta a aula de jeito nenhum. A inclusão é muito oportuna, porque as crianças têm condições de estudarem e se desenvolverem ao lado de crianças "normais". Eu acho que a escola regular certifica que ela é uma criança, aqui ó, na mesma idade de vocês e certifica isso, sabe?

Page 83: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Através do discurso das professoras identificamos a presença do paradigma da

inclusão afirmando a criança com deficiência como sujeito de direitos, como sujeito social,

reafirmando o direito de pertencer, o direito de ter os mesmos direitos das outras crianças,

“certificando” seu estatuto de criança. Nas palavras de Mantoan (2006, p. 80), “as propostas

educacionais inclusivas exigem uma atenção dos professores para que não seja ferido o direito

humano e indisponível de todos os alunos ao ensino regular comum”.

Prieto (2006, p.83) também ressalta que “um dos princípios da inclusão escolar é a

universalização do acesso, ou seja, é a garantia da educação como um direito para todos.”

Algumas representações das professoras parecem ancoradas nos princípios da

inclusão, que são destacados por Sassaki (1997, p.17),

“o movimento de inclusão social...tem por objetivo a construção de uma sociedade realmente para todas as pessoas, sob a inspiração de novos princípios, dentre os quais se destacam: celebração das diferenças, direito de pertencer, valorização da diversidade humana, solidariedade humanitária, igual importância das minorias, cidadania com qualidade de vida.”

Sobre o filme “Crianças invisíveis” algumas professoras destacaram a importância da

sociedade civil lutar contra a violência com a infância. O filme destaca situações de

vulnerabilidade em que muitas crianças, em várias partes do mundo se encontram, destituídas de

todos os direitos fundamentais e, mostra de forma contundente a relação entre

pobreza/exclusão/preconceito, que pelo relato das professoras também é vivido por vários de seus

alunos. Destacaram ainda a importância do debate após os filmes, que muitas vezes, envolvidos

de emoção por possibilitar a reflexão “sobre fatos que pensamos, mas nem sempre discutimos”.

Convém destacar que também foi possível observar algumas mudanças a respeito das

RS das professoras sobre o processo de inclusão escolar de seus alunos com PC.

7.2.8 Meu aluno tem mudado... e eu também

DSC

Então o meu aluno tem mudado gradativamente, porque eu também tenho mudado, eu tenho aprendido a lidar com ele, a entender as necessidades dele, coisa que antes eu não sabia, por onde passava a necessidade e a dificuldade. São as atitudes que melhoram a vida.

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Através deste discurso das professoras destacamos o papel da escola inclusiva na

construção de vidas singulares, para seus alunos, famílias e para elas mesmas, pois, essa nova

experiência - a convivência com a diversidade - tem promovido mudanças na sala de aula, na

dinâmica das turmas, na interação dos sujeitos e nas suas próprias vidas. O grande desafio

pedagógico e ético é a possibilidade de lidar com a diferença sem excluir. E a educação inclusiva

pressupõe mudanças valorativas, atitudinais e envolve abertura para mudanças de concepções e

crenças. Amaral (1987) nos fala da importância de uma revolução conceitual e micropolítica

exercida nas interações do cotidiano escolar.

7.3 Representações sociais das professoras sobre aprendizagem e desenvolvimento dos alunos com PC

Em relação ao modo como as professoras percebem a relação aprendizagem e

desenvolvimento dos seus alunos com paralisia cerebral foi possível identificar diferentes

concepções de aprendizagem e desenvolvimento presentes nos discursos. Algumas professoras

enfatizam o papel do meio em relação à aprendizagem quando destacam a necessidade de

estímulos. Outras consideram o aluno como “tábula rasa” que aprende só com muita

memorização e repetição.

Sobre a concepção de desenvolvimento destacamos a ênfase dada na idéia que a

paralisia cerebral impede o desenvolvimento do aluno. O desenvolvimento da criança com PC é

significado como totalmente diferente do das outras crianças e, radicalmente oposta a esta

representação, observamos o discurso que acredita que com treinamento e tratamento adequados

a criança com PC irá alcançar os marcos do desenvolvimento infantil.

Conseguir observar o desenvolvimento dos alunos é fator de constante satisfação das

professoras e provavelmente a maior frustração apontada no trabalho docente foi não conseguir

identificar a aprendizagem de seus alunos.

O quadro abaixo representa a síntese das idéias centrais sobre aprendizagem e

desenvolvimento dos alunos com PC encontradas nos discursos das professoras.

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Quadro 5 – Representações sociais das professoras sobre aprendizagem e desenvolvimento

1 – As crianças têm limites e potencialidades 2 – O desenvolvimento das crianças com PC é totalmente diferente dos outros alunos 3 – Ele aprendeu, eu sei, mas não sei bem o quê... posso ter errado demais com esse aluno 4 – Ele tem dificuldade de guardar... você repete, e depois ele não lembra... 5 – Eu tenho visto que ele está melhorando... um pouquinho cada dia 6 – É um ser humano que precisa de estimulação 7 – Meu olhar para as crianças com paralisia cerebral mudou 8 – Eu vi que meu aluno é capaz 9 – No início era só cópia mesmo...hoje ele produz dentro da sala 10 – Meu aluno foi uma escola de vida

7.3.1 As crianças têm limites e potencialidades

DSC

As crianças têm limites e potencialidades também. Penso que é mais lento, mas considero possível, principalmente se as condições materiais, humanas em diversas dimensões forem favoráveis. Acho que não podemos ficar ansiosos e compará-los com outras crianças e sim avaliar o desenvolvimento de cada criança em relação a si própria (o que vale para as pessoas que também não têm deficiência). Mas é difícil controlar a ansiedade às vezes.

A partir dos enunciados das professoras observamos um olhar para o aluno não

restrito apenas à sua deficiência, na sua limitação ou impedimento. Acreditamos que esse seja o

primeiro passo para uma abordagem pedagógica que parta das potencialidades dos alunos.

Nas palavras de Hickel, (1993, p.59), “cada aluno aprende a partir de sua

singularidade, porém como aprende, só pode ser visto se quem ensina acredita nisso e busca

detectar de que forma essas aprendizagens ocorrem para cada um”.

Segundo Ribas (2007, p.115) “olhar para as pessoas com deficiência e enxergar

apenas a deficiência é ter a deficiência de não conseguir enxergar a pessoa com todos os

elementos que compõem a sua identidade”. O autor reafirma a importância das classes

heterogêneas para todos por possibilitar a convivência com a diferença. Ressalta ainda que nas

Page 86: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

escolas especiais a razão que une os grupos são as restrições, impedimentos, limitações e não a

potencialidade para aprender (Ribas, 1996).

7.3.2 O desenvolvimento das crianças com PC é totalmente diferente dos outros alunos

DSC

O que uma criança com PC pode aprender? Não sei o que realmente ela aprende no processo pedagógico. Não sei como trabalhar com a criança, só tenho boa vontade. Elas têm potencialidades, mas, é preciso investir mais trabalho no trabalho com estas crianças, exigem um trabalho todo especial que ainda não temos.

Por acreditar que o trabalho pedagógico para o aluno com PC é muito específico e

diferente da sua prática até então, as professoras paralisam diante de seu aluno sem conseguir

definir objetivos para ele. Não se sentem capazes de ensinar este aluno supondo um trabalho

muito diferenciado que elas não sabem fazer, não sabem o que ensinar, como ensinar, como

avaliar.

Esse discurso pode nos remeter ao foco do olhar dos professores apenas na patologia

e não no sujeito integral, para quem o seu diagnóstico é apenas uma parte de sua vida e não a

totalidade dela. Esta atitude de alguns professores sobrepondo o diagnóstico à pessoa pode

contribuir para a paralisação diante do trabalho pedagógico.

Uma das questões abordadas pelas professoras é sobre o que trabalhar com seu aluno

e até onde ele irá aprender. Consideramos que o ponto de partida é o aluno concreto e o ponto de

chegada um universo infinito de possibilidades, que só a construção desta mediação

aluno/professor, aluno/alunos, aluno/equipes, aluno/comunidades vai nos mostrar.

A fala sobre a necessidade de um trabalho “especializado” com esses novos alunos e

a não preparação para esta tarefa, muitas vezes, associa-se a uma mudança na função do

professor, na perspectiva da educação inclusiva. Alguns professores dizem sentirem “super

professores” (assumindo a tarefa da fonoaudióloga, da psicóloga, da assistência social do

fisioterapeuta). Esta concepção mostra-se equivocada na medida em que retira do professor sua

principal tarefa – promover situações de aprendizagem em sala e colabora para o esvaziamento

do trabalho pedagógico com estes alunos. A inclusão não reivindica que os professores assumam

funções de outros profissionais, mas sim, que em suas salas de aula respeitem as diferenças no

Page 87: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

corpo, no pensamento, no ritmo, no desejo, no desenvolvimento, na ação e nos interesses de seus

alunos.

7.3.3 Ele aprendeu, eu sei, mas não sei bem o quê... posso ter errado demais com este aluno

DSC

Tenho dúvidas do que realmente ele sabe, às vezes dá uma resposta coerente, no outro dia não dá mais. Estou trabalhando alfabeto e ele conhece poucas letras. Como tenho trabalhado os mesmos objetivos desde o início do ano, e vejo que ele ainda não alcançou, não sei se posso dizer mas acho que o desenvolvimento dele é lento. Minimamente achei que tinha alguma coisa apreendida e que eu acho que não. Eu acho que ele dá muito conta de uma inteligência prática, de se relacionar, de se colocar, mas apreender algum conceito, eu acho que é muito pouco, muito pouco. Cor, em cima, embaixo, estas coisas assim que precisava, nas atividades, ele não dava resposta. Pros meninos essa semana vou dar o nome completo e ele não discrimina nem a ficha dele. Então... eu acho...nossa...e sem contar que até hoje ainda fico meio perdida, com o que realmente tem que trabalhar com ele, eu ainda tenho esta insegurança. Eu não sabia até onde o aluno fazia uma interpretação de um texto, eu não sabia como estava a compreensão dele... Eu escrevo o nome dele com a letra grande. Aí falo, eu falo não sei se vai resolver alguma coisa, mas eu falo: Aqui está escrito seu nome e aí vou e escrevo o nome dele, peço a ele para colorir as letrinhas. Ele aprendeu muito, tenho certeza que sim, mas eu não sei bem o quê. Como é difícil e angustiante pensar que mesmo com as melhores intenções posso ter errado demais com meu aluno. É muito difícil estabelecer o ponto de partida. Às vezes, a gente não volta lá na gênese do conhecimento.

O professor dá significado ao seu trabalho na medida em que se apropria dele. Na

situação observada durante a pesquisa, quando as professoras entram em contato pela primeira

vez, com um aluno com paralisia cerebral, observamos que, ora partem dos objetivos da turma,

ora dos objetivos da alfabetização e, algumas vezes, estes objetivos estão muito distantes da

necessidade da criança. A dúvida sobre os conhecimentos do aluno marca a insegurança das

professoras frente ao processo pedagógico.

Para que a aprendizagem promova desenvolvimento, para que as situações de

aprendizagem incidam na zona de desenvolvimento proximal (ZDP), é necessário que o professor

identifique o conhecimento real do aluno e os brotos do desenvolvimento, ou seja, o que ele é

capaz de fazer com ajuda (Vygotsky, 1989).

Page 88: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

7.3.4 Ele tem dificuldade de guardar...você repete, e depois ele não lembra...

DSC

É mais lento, mas ele consegue, às vezes, você repete mais com eles do que com os outros. Ele ficava dentro de sala só copiando, não tinha nenhuma atividade correspondente a necessidade dele, que ele desse conta. Eu não sinto muita diferença não, a não ser esta parte dos desenhos, hoje eu surpreendi, porque eu nem estava falando nada, então, de repente começou: BA, BE, BI, aí que eu suspeitei e falei b com a = ba, b com i = bi, mas assim, sabe, assim, mostro as vogais, as letras do nome dele todo dia, mas daí a dois dias ele não lembra pra mostrar, sabe, então não vi assim aquela autonomia de eu falar cadê o E e ele me mostrar. Algumas cores, mas é igual como é com letras também, ele tem dificuldade de guardar a cor laranja, aí você mostra 2, 3 vezes, depois você volta a perguntar ele não lembra. Eu pedia para pegar o M então e ele pega o A. Então assim, ele não grava muito bem, na hora a estagiária ensina, fala: esse é o M esse é o A. Aí pede para ele montar de novo, imediato ele monta. No dia seguinte já tem um pouco mais de dificuldade, às vezes ele esquece. Geralmente nesta atividade a gente pedia para ele mostrar, onde que tá o A, e o E, aí ele vai na letra, mas, às vezes ele se confunde. Então assim, eu percebo que ele dá conta de algumas coisas, na parte da memorização é um pouquinho complicada. Ele reconhece e depois parece que é uma memória recente.

Os problemas de desenvolvimento que estas crianças apresentam não são

incapacitadores de toda e qualquer aprendizagem, não os torna apenas “treináveis” (Hichel,

1993).

7.3.5 Eu tenho visto que ele está melhorando... um pouquinho cada dia

DSC

O que eu consigo trabalhar com ele individualmente, eu percebo que ele está aprendendo. Aqui são frases que ele mesmo criou, está conseguindo bastante coisa já. E pelo tempo que a gente tá trabalhando com ele considero um progresso bem grande já, porque ele só copiava não tinha uma estimulação, não tinha uma escrita, não tinha nada até então... Aqui fez sozinho, aí você vê que tem um desenvolvimento ele tem se esforçado bastante, apesar da dificuldade, ele é muito esforçado ele não é uma criança que fica... antigamente ele ficava parado, eu falo com ele faz, ele faz, se tiver errado ele pára, fica esperando, é o único probleminha que ainda está tendo é esse, ele parar e não falar, mas se eu mostro pra ele,está errado, vamos fazer de novo? Na mesma hora ele se dispõe a corrigir, ele não tem preguiça de fazer as coisas, isso me encanta com ele. Eu tenho visto que ele está melhorando, assim, neste aspecto pedagógico, um pouquinho a cada dia. Está muito aquém da turma, com certeza, ele não tem condição nenhuma, se for colocar em questão de aprovação de etapa, de ser aprovada, mas, dentro do que ele tinha até então, ele fez um progresso muito grande...Eu estou muito feliz com aprendizado dele, eu estava mostrando pro avô dele. A leitura melhorou muito, mas uma coisa que já reparei é mais fácil ler

Page 89: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

com a folha aqui, do que aqui, não sei se pelo movimento da cabeça. Eu fiquei muito feliz. Ele já está dando conta da multiplicação. Eu particularmente estou muito feliz, eu não esperava tanto dele agora. Saber que a gente está conseguindo isso com ele em pouco tempo. E assim, agora, este semestre, estou achando ele bem mais assim, integrado mesmo a turma, fazendo as atividades, gosta de colorir, de desenho, mais amigo da gente mesmo. Agora ele está avançando mais, acho que ele está com mais motivação mesmo. Eu posso pegar depois o caderno, você vai ver o desenho do esquema corporal, agora ele já tem a noção, faz o corpinho, o bracinho, eu acho assim, que ta sendo assim, gradativamente.

Observar o desenvolvimento, as conquistas de seu aluno, para planejar, traçar

objetivos e metas constitui parte fundamental da docência. Conhecer o aluno concreto, com suas

potencialidades e limites é necessário para o professor conseguir avaliar o que o aluno

desenvolveu e a partir daí definir novos objetivos.

Para Vygotsky, o desenvolvimento acontece na interação social já que sem parceiros,

a aprendizagem não é possível na medida em que a construção do conhecimento implica na

mediação do outro. Em suas palavras, “O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto

passa através de outras pessoas” (Vygotsky, 1989, p. 33).

7.3.6 É um ser humano que precisa de estimulação

DSC

Meu aluno não se comunicava com ninguém, o tempo todo sentado, não saía da sala, não ia na lixeira para apontar lápis, parecia que estava vegetando dentro de sala. Isto me incomodava muito, muito, porque eu olhava para ele e pensava, é um ser humano que precisa de estimulação. Então desde que tem estímulo eles aprendem, a gente precisa estar estimulando, por isso que eu falo que ainda a gente ta, fazendo muito pouco pelo aluno. Tudo depende dos estímulos dados. Só conheço meu aluno com PC, mas acredito que com estímulo, com atividades adequadas a essas crianças elas podem ir além do que costumamos ver.

Destacamos que no processo da intervenção educativa foi possível observar algumas

novas representações sobre o processo de aprendizagem e desenvolvimento tão central para o

fazer pedagógico.

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7.3.7 Meu olhar para as crianças com paralisia cerebral mudou

DSC

Primeiramente meu olhar com a criança com PC mudou. Ao invés de olhar para suas limitações, comecei a olhar para suas potencialidades e a maneira de se trabalhar essas potencialidades. Antes eu tinha medo das crianças com PC, medo de se aproximarem dos meus filhos, agora faço questão de estar próxima. As nossas atitudes fazem a diferença.

A ressignificação da paralisia cerebral e da deficiência aparece em vários discursos e

reafirma a necessidade de desconstruirmos mitos e estereótipos acerca da deficiência, pois estes

mitos colaboram para o desperdício de potencialidades.

Segundo Ribas (2007) a deficiência ainda é representada pelo indício da negação.

Não andar com as pernas, não ver com os olhos, não ouvir com os ouvidos indicam a ausência, a

inexistência, a falta que por sua vez apontam para o limite, o impedimento, a deficiência e

consequentemente deságuam no prejuízo, no dano, na diminuição da capacidade.

Satow (1995) aponta para a importância do papel “dos outros significativos” na vida

de pessoas com PC, que olham para eles como gente, incentivando suas trajetórias de vida,

afirmando possibilidades, não imobilizando, ajudando na auto–aceitação, interagindo de forma

significativa para sua transformação. Cabe ressaltar que os professores podem tornar-se o “outro

significativo” na vida de seus alunos contribuindo de forma positiva na construção de suas

identidades.

7.3.8 Eu vi que meu aluno é capaz

DSC

E hoje eu vejo que não é assim, que tem menino que tem a PC mas ele sabe muito bem o que é certo o que é errado, consegue fazer. Às vezes, ele pode ter dificuldade no escrever, alguma coisa assim, mas ele desenvolve, então é o que eu vejo do aluno, sabe? Eu antes pensava que não, que a gente não poderia... e muita gente que eu converso, fala ah não tem o que fazer não, tem uai... alguma coisa tem que tentar pra ajudar a pessoa. Porque eu vi que o aluno é capaz, o meu aluno é capaz, entendeu? As atividades que são realizadas com os alunos com PC não são diferentes dos demais alunos, elas precisam é serem adaptadas para incentivá-los a crescer. Passei a ver a PC com outros olhos. Antes, acreditava que pessoas com deficiências eram complicadas demais e preferia me manter bem longe delas. Hoje, percebo que fui uma tola, pois, essas pessoas são lindas, guerreiras e merecem todo o meu carinho e respeito.

Page 91: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Ribas (2007) salienta que é fácil subestimar o desconhecido e refere que alguns pais

se afastam de seus filhos com deficiência porque não conseguem enxergar o futuro. O que

ensinar a uma criança que pensamos que não conseguirá aprender a ler? Da mesma forma

podemos pensar que este processo pode ocorrer com os professores. Não poder andar, escutar,

ver, escrever ou desempenhar algumas tarefas não significa estar comprometido para todas as

realizações que a vida oferece. Desta forma, pais e professores podem não perceber

potencialidades de seus filhos e alunos e dificultar o desenvolvimento deles.

7.3.9 No início era só cópia mesmo... hoje ele produz dentro de sala

DSC

E quando eu entrei na sala, eu passava atividade no quadro e eu esperava que ele fizesse tudo que estava no quadro. Devagar, mas que fizesse, e hoje eu vejo que isto não é relevante, não tem significado ele ficar só copiando. Então, eu tenho feito atividades de interpretação de textos, de caça-palavras, de completar letras. No início ele só copiava e não conseguia fazer nada. E era só cópia mesmo, você não tinha uma atividade dele completa...nada...nada. Hoje, na apostila ele tem uma carta enigmática que ele tem que traduzir aquilo ali, tem o caça-palavras que tem que procurar aquele monte de palavras, né? Ele tem vocabulário, tem ortografia, tem produção de texto e ele produz dentro de sala.

A fala das professoras traduz dois momentos: o primeiro no qual ainda desconhecem

as possibilidades de seu aluno e esperam que ele realize as tarefas como todos da sala. Algumas

vezes, aceitam que as crianças façam a tarefa mais devagar, mas a expectativa é que faça igual da

turma. No segundo momento, já toma como ponto de partida o conhecimento real de seu aluno, o

que ele sabe, o que é capaz, o que realiza.

Durante a intervenção educativa uma estratégia utilizada foi uma dinâmica para que

as professoras refletissem sobre sua própria aprendizagem, e, em seguida, sobre aprendizagem de

seus alunos com PC. As professoras foram solicitadas a destacar as dúvidas que tinham sobre o

desenvolvimento de seus alunos e o que tinham certeza sobre a aprendizagem deles, e convidadas

a planejar atividades buscando conhecer a aprendizagem real de seus alunos.

Observamos que algumas professoras implementaram mudanças concretas nas suas

práticas propondo situações de aprendizagem mais significativas para seus alunos. Essas

Page 92: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

mudanças trouxeram mais prazer não só para os alunos, mas, também, para elas que conseguiam

observar os progressos na aprendizagem deles.

Vygotsky (1989), afirma que é no espaço da zona de desenvolvimento proximal

(ZDP) que as atividades escolares devem incidir para promover desenvolvimento. O autor

ressalta o papel central da escola no desenvolvimento dos sujeitos.

Destacamos o papel fundamental do professor que para atuar na ZDP de seus alunos

precisa conhecer suas competências. Cabe ao professor contribuir para que o aluno construa

significados provocando um desequilíbrio entre o que o aluno sabe e o que é novo em seu

processo de aprendizagem.

7.3.10 Meu aluno foi uma escola de vida

DSC

Quando eu peguei o aluno é que eu corri atrás dessas coisas, então eu fui buscar facilitadores. Porque hoje eu já sei quando ele faz: aaaaaa, ele está tentado se comunicar. Eu não sabia o que era isso que ele fazia, se era porque não estava agradando. É uma experiência boa, estou aprendendo. Mudei a minha prática, elaborei material adequado as necessidades apresentadas por ele. Foi muito importante para o meu processo profissional. Já tenho 25 anos de educação infantil e bem ou mal construí uma história profissional de “quem deu conta do recado”. O meu aluno foi o 1º desafio que realmente tive dificuldades reais, que dia após dia, não descobria o caminho, tive que lidar com a realidade do “não estou conseguindo”. Muita coisa que eu desconhecia eu aprendi com ele. Meu aluno para mim também foi uma escola de vida, sabe, ele pra mim foi uma escola muito grande.

Muitos professores relatam em seus depoimentos a importância dos novos

conhecimentos gerados a partir do convívio com o aluno e reafirmam a importância do contato

com o aluno concreto como central no processo de formação de professores.

Morin (2000), em sua concepção sobre a condição humana, nos fala sobre a

centralidade e do conceito de diversidade e para a vivência planetária. Em suas palavras,

“Quando pensamos no que é humano, temos de pensar em unidade e diversidade. Somos seres com coisas em comum do ponto de vista cerebral, genético, sentimental, e há uma grande diversidade individual e cultural. A riqueza de uma sociedade e da humanidade é essa

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diversidade. Qualquer destruição da diversidade é algo extremamente grave”.

7.4 Representações sociais das professoras sobre comunicação, linguagem e

escrita

A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros. (Bakhtin)

Dentre as questões que surgiram sobre linguagem, comunicação e escrita a maior

angústia relatada pelos professores foi a dificuldade em compreender seu aluno. Os dados aqui

apresentados também nos revelam ainda a confusão entre déficit motor e cognitivo. Algumas

vezes a dificuldade motora para falar e ou escrever é percebida como dificuldade cognitiva. E

observamos que a grafia, o desenho das letras ainda tem uma grande força sobre o processo

cognitivo da alfabetização. Se escrever é treino de coordenação motora, como o aluno que tem

alteração de movimentos vai aprender a escrever? Se a leitura é fala, como o aluno que tem

impedimentos motores para articular as palavras pode demonstrar seu nível de leitura?

Observamos ainda a dúvida presente sobre a melhor estratégia pedagógica a ser

realizada: os exercícios de coordenação motora, a cópia, o “treino da escrita” com o aluno com

PC ajudaria a desenvolver capacidades para sua escrita manual?

O quadro abaixo representa a síntese das idéias centrais sobre comunicação, linguagem e

escrita dos alunos com PC encontradas nos discursos das professoras.

Quadro 6 – Representações sociais das professoras sobre comunicação, linguagem e escrita

1 - Me dá um desespero... ele tentando me contar algo e eu não entendendo 2 - Será que ele está me ouvindo? 3- Escrita é desenho da letra, treino da coordenação. 4 - O significado é muito difícil de copiar

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7.4.1 Me dá um desespero... ele tentando me contar algo e eu não entendendo

DSC

Sinto dificuldades, me “comunico” sem saber se sou entendida. Como ele se comunica pouco e não sei “ler” bem outras linguagens que não a fala, às vezes, fica difícil saber em que ele está avançando. Aí eu pensei assim, será que ele está sentindo alguma coisa, será que está estranhando o ambiente e não está gostando, então assim, tudo ficava muito no esperar. Ele tenta se comunicar através destes gritinhos que ele dá de vez em quando, é isso que a mãe falou que ele não fazia. Eu percebo que ele comunica de todas as formas, com o corpo, com os olhos, com a palma, com os sons que ele emite. Já aconteceu dele tentar me contar alguma coisa e eu não entender, nossa...e isto dá um desespero...aí ele desistiu, eu fiquei triste também por não entender. Às vezes eu tentava adivinhar, ele falava que não, ele tentava me contar e eu não entendia. Com adesivo eu tive retorno, eu estava com uma cartela que eu sempre dou para os meninos, então eu falei assim, deixo eu dar o adesivo pra você, peguei um adesivo, foi o dia que eu mais percebi isto. Peguei o adesivo e colei na mesinha dele, aí eu vi que ele ficou olhando ainda para minha mão, aí depois ele viu que tinha um maior e ele ficou olhando para ele e eu perguntei você quer esse? E aí ele riu. Aí eu peguei o adesivo maior e colei na mesa dele, quer dizer ele teve uma escolha, né? Ele se manifesta como quis e quando quis, mas, mesmo assim, a comunicação foi muito ineficiente. Foram inúmeras perguntas sem respostas. Como foi angustiante...

Para Paulo Freire, (1975, p.73), “somente na comunicação tem sentido a vida

humana”.

A partir dos estudos de Vygotsky sobre o papel da linguagem na constituição dos

sujeitos podemos afirmar que a linguagem ocupa lugar central no processo de inclusão escolar de

crianças com paralisia cerebral, que têm alterações em sua expressão e consequentemente em sua

comunicação.

Vygotsky nos fala que a relação entre o pensamento e a palavra, é um processo vivo,

um movimento contínuo de vaivém do pensamento para a palavra, e vice-versa, passando por

várias transformações. “O pensamento não é simplesmente expresso em palavras, é por meio

delas que ele passa a existir” (1987, p.108). E ainda o autor nos diz que “uma palavra desprovida

de pensamento é uma coisa morta, e um pensamento não expresso por palavras permanece na

sombra” (1987, p.131). Através das palavras de Vygotsky gostaríamos de enfatizar a importância

para os alunos com PC que não apresentam linguagem verbal e ou escrita, que tenham outras

formas alternativas de expressão e elaboração de seus pensamentos.

Um dos filmes escolhidos para a intervenção educativa foi Gaby – uma história real,

pois possibilita a reflexão sobre a concepção de ser humano e de linguagem. O filme reconstrói a

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história da escritora mexicana, Gabriela Brimmer do seu nascimento até a vida adulta. Gaby

comunica-se apontando letras colocadas em uma prancha, com seu pé esquerdo. Durante um

diálogo com seu pai, quando Gaby diz que quer desistir, que nunca chega a lugar algum, seu pai

lhe diz que seus pés podem escrever qualquer palavra que qualquer filósofo também pode

escrever. Também enfatiza que as limitações humanas estão presentes em todos os seres

humanos.

Algumas professoras relataram que os filmes ajudaram a compreender melhor seu

aluno e refletir sobre suas necessidades.

7.4.2 Será que ele está me ouvindo?

DSC

Eu pensava assim, ficava sem saber se ele estava me ouvindo. Ele fala com dificuldades e precisa de ajuda de uma fonoaudióloga. Nossa vontade de investir na oralidade era porque ele faz algum som, e se eles falarem é mais fácil para todos. É o mais fácil para nós também. Também precisa de atividade motora para fortalecer os movimentos e principalmente deve ser orientado por alguém que tenha o conhecimento para trabalhar com essa criança.

Para as professoras a dificuldade para o aluno falar, muitas vezes, foi associada à

dúvida sobre audição, à dificuldade cognitiva e também ao impedimento na comunicação.

Um dos aspectos abordados durante a intervenção educativa através de vivências,

filmes e materiais foi a comunicação alternativa e suplementar¹, ou seja, que meios alternativos à

fala e à escrita manual os professores podem trabalhar com o aluno que tem alterações motoras?

Partindo do conceito de Vygotsky que a aprendizagem ocorre através da mediação da

linguagem, as dúvidas e o desconhecimento do professor a respeito do desenvolvimento da

linguagem de seu aluno, podem contribuir para dificultar o processo pedagógico, restringindo

tanto as situações de interação como de aprendizagem. Nas palavras de Vygotsky (1987, p.44),

“o desenvolvimento do pensamento é determinado pela linguagem, isto é, pelos instrumentos

lingüísticos do pensamento e pela experiência sócio-cultural da criança”. O autor (1987, p.33),

destaca ainda que “A linguagem não depende necessariamente do som...mas sim, do uso

funcional dos signos”. Neste sentido, a introdução da Comunicação Alternativa e Suplementar,

para crianças com alterações motoras que comprometem a fala e/ou escrita, afirma-se como

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condição fundamental para o desenvolvimento de suas potencialidades intelectuais e

comunicativas. Ressaltamos ainda que este aspecto deveria ser abordado na formação de

professores.

A baixa expectativa com relação ao potencial de aprendizagem dos alunos contribui

para o esvaziamento do sentido do trabalho pedagógico e transforma o espaço escolar em clínico

ou em busca de orientações clínicas e não pedagógicas. Qual profissional tem conhecimento para

o trabalho pedagógico? Neste aspecto, gostaríamos de destacar a importância da interlocução, do

diálogo da educação com outras áreas do conhecimento.

Se o sujeito se constitui a partir da linguagem podemos dizer que sem linguagem não

há sujeito e desta forma reforçamos a urgência do trabalho com a comunicação alternativa nas

escolas para as crianças que apresentam alterações para falar e ou escrever.

7.4.3 Escrita é desenho da letra, treino da coordenação

DSC

Oralmente consegue, mas a mão não consegue. Eu pegava na mão dele para ele escrever pois ele não dava conta sozinho. Colocava ele pra copiar para treinar e também comprei uma bolinha pra ele apertar e fazer exercício. Eu falava com a estagiária que podia pegar na mão dele para fazer a tarefa. E ele começou a reclamar: “ai tá apertando a minha mão”. Eu falava pra estagiária: não aperta a mão, só direciona. E começou uma guerra na sala entre a criança e a estagiária... Agora eu estou trabalhando com a letrinha B, cadê a bola, ele mostrava a bola. Aí a estagiária mostrava a palavrinha BOLA, escrevia com ele, fazia junto e deixava ele colorir depois. Então ele tem várias atividades coloridas assim e coladas no caderno.

Muitas professoras relatam que no momento das atividades escritas em sala usaram as

seguintes alternativas: estagiária segurar na mão da criança para direcionar a tarefa, colorir letras

e palavras, cópia de atividades do quadro. Todas essas situações nos remetem a uma ênfase na

alfabetização como atividade motora e não no processo de aquisição e construção de

conhecimentos. O tempo de atenção da professora com seu aluno e a possibilidade de mediação

no processo pedagógico, muitas vezes, centra-se mais nos aspectos motores que cognitivos,

aspectos esses nos quais as crianças têm uma alteração significativa.

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Será que por não acreditar na possibilidade de construção de conhecimentos de seus

alunos ou por desconhecer seu potencial, algumas professoras limitam-se a oferecer atividades de

habilidades motoras não investindo no processo de letramento?

A “cultura do lápis e da letra cursiva” ainda está muito presente em nossas escolas e

um dos objetivos da intervenção foi proporcionar situações para que as professoras pudessem

vivenciar e vislumbrar formas alternativas de escrita, experimentando programas no computador

ou pensando materiais que poderiam ser utilizados com seu aluno.

Também em relação à escrita observamos mudanças nos discursos das professoras

que discutiremos a seguir. Na medida em que compreendiam e significavam de forma diferente

algumas características de seus alunos puderam modificar suas práticas pedagógicas. Em seus

enunciados relataram que algumas dinâmicas realizadas e alguns filmes permitiram que elas se

colocassem no lugar dos alunos percebendo suas necessidades reais.

7.4.4 O significado é muito difícil de copiar

DSC

Eu estava deixando ele fazer a escrita do jeito dele aí ele fazia um tanto de rabisco, é uma escrita também, é uma garatuja Mas, ele não consegue, ele só consegue fazer assim por causa da mãozinha, mas eu estou achando tranqüilo colar as letras, acho que ele está ficando muito feliz dele fazer a atividade...Então eu entendi assim, que ele pega no lápis, ele usa o lápis assim, ele pega o lápis cera, então não tem, eu acredito que nunca vai ter aquela coordenação, então, eu acho que nesta parte ele não vai desenvolver muito não, seria mais no visual e aí ele pode ser alfabetizado, chegar a ler, mas assim falando, oralmente. O significado é muito difícil de copiar. Antes eu falava pra estagiária pegar na mão dele. Eu estava perdida, né? Agora na atividade de escrever eu peço pra ele apontar, ligar...eu fui adaptando.

O desconhecimento sobre a PC gerou, algumas vezes, confusão entre déficit motor e

cognitivo, entre ação mental e ação motora, entre fala e comunicação, entre audição e

compreensão. Através de várias dinâmicas buscamos trabalhar a dissociação entre os processos

motores e cognitivos envolvidos na aprendizagem, destacando que alguns alunos poderão ter

dificuldades nos aspectos motores, outros nos aspectos cognitivos e ainda o 3º grupo que poderá

ter dificuldades em ambos os aspectos. Para que a ação educativa incida na necessidade do aluno

é fundamental que a professora tenha clareza dos limites e do alcance de seu aluno.

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Outro aspecto bastante enfatizado na intervenção foi a dissociação entre o processo

de alfabetização e o desenho das letras, ou seja, entre o processo de letramento e a coordenação

motora fina que possibilita a escrita manual de letras. Destacamos o processo da escrita como

construção de significados. E realizamos dinâmicas com materiais pedagógicos alternativos,

experimentamos softwares com interfaces que são utilizados pelos alunos favorecendo uma

ampliação do trabalho pedagógico através do uso de materiais alternativos.

Vygotsky (1989, p.119), já nos apontava um equívoco sobre o processo de

alfabetização quando nos diz que:“ensina-se as crianças a desenhar letras e construir palavras

com elas, mas não se ensina a linguagem escrita”. O autor enfatiza também que a psicologia

considerava a escrita simplesmente como “uma complicada habilidade motora” (1989, p.120).

Em uma das cenas do filme King Gimp, Dan e um colega de classe trabalham juntos

na aula de escultura. O colega monta uma escultura projetada por Dan no computador, que vai

orientando essa construção. O colega empresta seu corpo para montar o projeto idealizado por

Dan. O colega realiza a ação motora e Dan planeja, tem objetivos, controla a ação, podemos dizer

que ele realiza a ação mental e o colega a ação motora. Podemos transportar esta estratégia para

nossas salas de aula num trabalho cooperativo.

A concretização dos princípios da educação inclusiva nas escolas tem permitido uma

reflexão dos professores sobre suas práticas, quando conseguem olhar para seus alunos e suas

salas de aula, e reorganizá-las a partir de suas necessidades.

Page 99: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na verdade, diferentemente dos outros animais, que são apenas inacabados, mas não são históricos, os homens se sabem inacabados. Têm a consciência de sua inconclusão.

Aí se encontram as raízes da educação mesma, como manifestação exclusivamente humana. Isto é, na inconclusão dos homens e na consciência que dela têm.

Daí que seja a educação um que fazer permanente. Permanente, na razão da inconclusão dos homens e do devenir da realidade. (Paulo Freire)

A realização desta pesquisa é fruto de reflexões acerca da minha prática profissional

como pedagoga hospitalar e das buscas de aperfeiçoamento nesta área. As mudanças na minha

compreensão sobre a deficiência, e mais especificamente sobre a paralisia cerebral e as propostas

pedagógicas para estes alunos, que vêm ocorrendo historicamente, fazem parte, também, da

minha própria experiência como professora, supervisora pedagógica e pedagoga hospitalar.

Quando iniciei minha trajetória de educadora em ambiente hospitalar, sendo esta área totalmente

desconhecida por mim, interrogava: qual seria a função de um pedagogo hospitalar? Que

aprendizagens poderiam circular em um hospital? Quais os caminhos de aprendizagem que

seriam percorridos por esses meus novos alunos, com necessidades tão específicas e diferentes da

minha prática profissional até então? De que forma a prática da pedagogia hospitalar poderia

contribuir para a discussão sobre a interlocução saúde e educação no processo de inclusão

escolar? Estaria eu jogando fora toda minha vivência e experiência em ambiente escolar?

A partir do contato concreto com a primeira criança com PC, em 1995, como

supervisora pedagógica em uma escola comum do RJ, algumas questões sobre seu processo

educativo me intrigavam, e foram tema de muitas reuniões pedagógicas com as professoras.

Interrogações acerca da relação entre a aprendizagem e o desenvolvimento infantil, do papel da

escola na inclusão ou exclusão social, da vivência da diversidade em sala e da desconstrução de

uma busca pela homogeneidade no espaço escolar, e acerca do processo de alfabetização. É

possível para a escola comum atender demandas de necessidades educacionais específicas de

todos os alunos? O que nos assustava, paralisava, mobilizava ao percebermos diferenças tão

significativas nos nossos alunos? Essas inquietações iniciais foram se transformando ao longo da

minha atuação profissional na escola, e depois no hospital, em necessidade de aprofundamento

teórico, e culminaram neste estudo.

Page 100: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Relembro aqui as palavras de Magda Soares (1991, p.40), quando nos diz que “a (re)

construção do meu passado é seletiva: faço-a a partir do presente, pois é este que me aponta o que

é importante e o que não é; não descrevo, pois; interpreto”.

Acredito que esta investigação possa oferecer subsídios para reflexões sobre a prática

de professores com seus alunos com PC e também em projetos que busquem a articulação dos

campos da saúde e educação numa perspectiva inclusiva. Desejo que estudos como este possam

contribuir para a formação permanente dos professores, com enfoque nas representações sociais,

aproximando os profissionais da área da saúde do imaginário dos professores sobre seus alunos

com deficiências.

Esperamos ainda, contribuir para um melhor entendimento das significações dos

professores sobre seus alunos com PC e, assim, apontar caminhos possíveis de serem trilhados na

formação de professores.

As experiências realizadas neste estudo não permitem generalizações, mas nos

possibilita indicar a viabilidade e pertinência de usar alguns princípios e estratégias utilizadas na

formação de professores.

Sem a pretensão de esgotar a análise do cotidiano de algumas professoras e seus

alunos com paralisia cerebral, no processo de inclusão escolar destes, gostaríamos de elucidar

algumas questões relevantes do estudo, salientando que esta é apenas uma compreensão possível,

mas não a única, dos sentidos produzidos por quem vivenciou e compartilhou este processo.

Essas considerações finais apontam para algumas reflexões, mesmo que provisórias, a

respeito do que foi observado e analisado neste processo. Importa-nos, fundamentalmente,

capturar mudanças ocorridas no processo.

Os dados revelam as reflexões e preocupações das professoras sobre o processo de

inclusão escolar de seus alunos com paralisia cerebral e apontam para a possibilidade de

utilizarmos as representações sociais nas ações de formação docente. Enfatizam também a

valorização da experiência cotidiana das equipes pedagógicas com seus alunos, no processo de

inclusão escolar. Vale ressaltar que não há modelos, nem receitas prontas, e sim, uma construção

cotidiana, na relação dos professores com seus alunos e comunidades.

A vivência e a escuta da diversidade dentro da escola, com as soluções que as

professoras vão criando, é o fundamento para a construção de uma nova escola – uma escola real,

porque inclui todos os seres humanos com suas especificidades. É uma escola que se tece na sua

Page 101: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

construção diária, a partir dos diálogos dos vários atores envolvidos: alunos, pais, professores,

comunidade, equipes pedagógicas e equipes que acompanham as crianças fora do âmbito escolar.

É na convivência do cotidiano da escola que a educação inclusiva se concretiza, perseguindo a

aprendizagem de todos os alunos através de novos olhares e busca de novos caminhos no

processo de aprender. Assim, podemos inferir que a educação inclusiva é o resultado da

transformação da escola como um todo, que já vem acontecendo, de formas diferentes e com

ritmos distintos, em várias escolas, e que essas mudanças começam no universo da sala de aula

através da seriedade, compromisso e coragem de alguns educadores.

À medida que essas professoras deste estudo e tantos outros professores em suas salas

de aula consigam observar, valorizar, e reconhecer as potencialidades de seus alunos com

paralisia cerebral poderão contribuir para a construção da escola inclusiva, garantindo a todos o

direito à aprendizagem.

Gostaríamos de destacar o caráter revolucionário e transformador da inclusão, na

medida em que afirma direitos e diferenças no espaço escolar. Não se trata de negar, disfarçar ou

escamotear a diferença dos alunos, mas sim, acolher e receber a diversidade como parte

fundamental do humano, portanto, da vida e da escola. Confirma-se assim a necessidade de

construção de uma nova escola – não homogênea – mas que desenvolva práticas pedagógicas que

superem desigualdades, ofereçam oportunidades e favoreçam o reconhecimento das diferenças.

Uma escola real que busca trabalhar com a humanidade real com todas as suas especificidades

construindo um mundo mais justo, mais ético e mais humano. As escolas que estão vivenciando o

processo de inclusão escolar de alunos com deficiências podem constituir espaços educacionais

inovadores na medida que impulsionam mudanças nas práticas educativas. Podemos falar de uma

expansão da escola e do fazer educativo inseridos na luta por uma escola de qualidade para todos.

Neste sentido, a educação inclusiva pode contribuir para ruptura com crenças e concepções

distorcidas sobre a deficiência no âmbito escolar.

Outro aspecto a ser salientado é que a vivência da educação inclusiva, a convivência

num universo escolar plural contribui para que os alunos reconheçam as infinitas formas de ser e

estar no mundo ampliando assim sua visão de humanidade. Este dia-a-dia escolar pode trazer

lições fundamentais de cidadania para formação de cidadãos menos preconceituosos.

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Enfatizamos também que a educação inclusiva é imprevisível, na medida em que se

constrói na interação (aluno/aluno; professor/aluno; professor/professor; educação/saúde), na

relação com o outro diferente de mim, numa perspectiva de uma pedagogia dialógica.

Há dez anos trabalho como pedagoga hospitalar, refletindo sobre processos

pedagógicos de alunos com paralisia cerebral incluídos nas escolas regulares. Nestes dez anos

tive oportunidade de conhecer muitos educadores, que apesar de todas as dificuldades, problemas

e desafios enfrentados no cotidiano escolar, estão construindo uma nova escola. São professores

que, através do acolhimento às necessidades e à diversidade de seus alunos, promovem rupturas

diárias de crenças, estigmas e preconceitos e colaboram assim, na construção diária de uma nova

forma de ver a deficiência.

Encerro, provisoriamente, este trabalho, recorrendo mais uma vez a Guimarães Rosa,

para falar da certeza que esta pesquisa envolveu uma construção constante da minha prática

profissional e de vida e que dela fazem parte vários atores sociais.

“O senhor... mire veja: o mais importante e bonito, do mundo,

é isso: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam e desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso que me alegra, montão.”

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