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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

REINALDO SOUSAFERNANDO ANTONIO DA SILVA 

(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

Maceió, Eduneal, 2011

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

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CAPAReinaldo Sousa

REVISÃO ORTOGRÁFICAEudes da Silva Santos

Tiragem: 300 exemplaresCopyright © Reinaldo Sousa, Fernando Antonio da Silva e Uneal

Esse livro poderá ser reproduzido, parcial ou integralmente, desde que sem fins lucrativos.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

“Quando cada homem despertar, nele mesmo, efor procurando escapar de todas as formas de

alienação religiosa, moral, material, estará emconstrução um novo homem e será possível

alcançar-se uma sociedade de direitos eigualdade comum a todos”.

(Friedrich Nietzsche) 

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

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Aos Nossos Pais

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Universidade Estadual de AlagoasBiblioteca –  Campus Zumbi dos Palmares

Bibliotecária responsável –  Katianne de Lima 

S725rSOUSA, Reinaldo(Re)Pensando a Geografia: História, Objeto, Método e Práxis /Reinaldo Sousa, Fernando Antônio da Silva. - Maceió: Eduneal,

2011. 180 p.Bibliografia: p. 165-175ISBN 978-85-911309-1-71. Geografia - História 2. Geografia - Objeto 4. Geografia -Método

5. Geografia - Práxis

CDU 910.1 

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

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SUMÁRIO

PRIMEIRA PARTEDA HISTÓRIA DA GEOGRAFIA À CIÊNCIA GEOGRÁFICA 

Prefácio 08

Uma Pequena História da Geografia 12

A Geografia Alemã 20

A Geografia Francesa 29

A Renovação da Geografia 33SEGUNDA PARTE

GEOGRAFIA: OBJETO E MÉTODO 

O Método e sua Importância para a Geografia46

Em Busca do Concreto Pensado50

As Possibilidades do Método Dialético53

Da Totalidade à Análise: uma necessidade de método58

Uma Breve Caracterização do Período Histórico Atual

71

A (Re)emergência do Território no Período da Globalização80

O Território Usado como Construção Dialética84

Em Busca da Operacionalidade88

Como Interrogar o Lugar no Interior da Totalidade do Mundo?93

TERCEIRA PARTEA PRÁXIS 

As Práticas de Ocupação de Vazios Urbanos Pelos Movimentos de Sem-Teto de

Maceió –  Alagoas 100

Uso do Território e Processos de Resistências: Uma Análise da (Des)construçãoda Cidadania no Circuito Inferior de União dos Palmares-AL a Partir daProdução/Distribuição de CDs e DVDs

127

Referências 164

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

PREFÁCIO

Os estudos que contemplam a história, a teoria e, porconseguinte, o método e a práxis da Geografia no Brasil, constituihoje, uma preocupação que tende a alargar-se em face a premência derevisitar e discutir questões históricas, teóricas e epistemológicas quedeem aporte à compreensão da trajetória da disciplina nos interstíciosque precederam ou se seguiram a sua institucionalização em 1934.

 Nessa perspectiva, especialmente no que diz respeito aos

estudos sobre a história do pensamento geográfico no país, o decêniode 1980 aparece como um momento por demais significativo.Importantes trabalhos vêm à luz trazendo consigo uma necessidadecada vez maior de repensar o que teria sido essa trajetória, implicandodessa forma em discussões de natureza teórico-metodológicas. Éimportante perceber que este despertar coincide com o momento emque o país começava a vivenciar o processo de abertura política apósquase vinte anos de ditadura militar, bem como com a eclosão domovimento que aqui ficaria conhecido como Geografia Crítica.

Desde então, parodiando o geógrafo Armen Mamigonian,muitos foram os „avanços e os recuos‟. Contudo, é inegável o nível dequalidade alcançado pela geografia brasileira nesse caminhar. E aqui,vale destacar a fecunda contribuição da Geografia Nova proposta porMilton Santos naquele momento. Uma das bases da já mencionadaGeografia Crítica, bem como, das proposições futuras desse autor,contidas, mormente nos livros „A Natureza do Espaço: técnica etempo, razão e emoção‟ e „Por uma Outra Globalização: do

 pensamento único à consciência universal‟ –  duas obras de referênciageográfica do derradeiro quartel do século passado e início do atual.Objeto, método e práxis da geografia são debatidos lucidamente à luzdo mundo do presente, mundo da tecnociência, mundo daglobalização.

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Ancorados nesse referencial, Reinaldo Sousa e FernandoAntonio da Silva nos brindam com (Re)Pensando a Geografia:

 História, Objeto, Método e Práxis. Conforme sugere o título, umarevisão da história da nossa disciplina. Entretanto, convém destacarque não consiste simplesmente em revisitar ou reconstituir umahistória, mas vai além e traz à discussão um tema essencial àgeografia, trata-se do método. Assim, dialogando com o próprioMilton Santos, afora outros autores, a exemplo do filósofo theco KarelKosik, que como bem mostram, inspirou a compreensão de totalidadecomo categoria filosófica subjacente a sua obra, Reinaldo Sousa e

Fernando Antonio da Silva contribuem para clarificar a necessidadedo método no fazer geográfico.

Dessa forma, este livro constitui um ganho significativo, partindo do pressuposto que não obstante os avanços anteriormentealudidos, no Brasil ainda são insuficientes os textos que discutem aquestão do método na Geografia. A clareza mostrada pelos autoresem relação ao método, propicia o desenvolvimento de uma leituraelucidativa e invulgar do período histórico vigente à luz do território.

Mais uma vez dialogando com a teoria miltoniana, avançamna análise do território usado, humano, sinônimo de espaçogeográfico, instância social, e dialético, por conseguinte. Logo,imprescindível à compreensão do mundo do presente, ou ainda para

 pensar e projetar o futuro, tendo como referência a materialização domeio técnico-científico e informacional que media a relação doslugares com o mundo, ao mesmo tempo em se confunde com ambos.

 Nessa perspectiva o lugar emerge como categoria concreta e

fundamental à analise do período atual, seja por possibilitar a suarealização, seja por se constituir em resistência às perversidades porele impostas. Como bem mostram Reinaldo Sousa e FernandoAntonio da Silva, consiste em uma „unidade da diversidade, namedida em que recebe intensamente determinações externas, mastambém impõe uma dinâmica interna‟. Daí o seu caráter dialético.

De posse dessa compreensão, quando tratam da práxis, nãoapenas desvelam os usos do território, como analisam os seus

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

 processos, engendrado reflexões que sinalizam significativos avanços

teóricos e crescimento intelectual.Por tudo isso, podemos assegurar que muitos são os méritos

de Reinaldo Sousa e de Fernando Antonio da Silva na desafiante e bem sucedida tarefa de elaborar/organizar este livro. Depois doavanço teórico, o maior deles, é certamente, a capacidade de trazer a

 público um texto refinado, elegante, mas também acessível a todos.Ademais, trabalhos dessa natureza e dessa qualidade são

sempre bem vindos e só contribuem para o engrandecimento da

geografia no Brasil e em Alagoas, em particular, que nos últimos anosvem despontando no cenário nacional com uma produção de elevadonível. Nesse sentido vale parabenizar os autores e também aUniversidade Estadual de Alagoas que através da sua reitoria não temmensurado esforços no sentido valorizar e mostrar a capacidade dosseus profissionais.

Antonio Alfredo Teles de CarvalhoProfessor Adjunto da Ufal/Uneal

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

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PRIMEIRA PARTE

DA HISTÓRIA DA GEOGRAFIA À CIÊNCIA

GEOGRÁFICA

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

UMA PEQUENA HISTÓRIA DA GEOGRAFIA

A pesar do uso recorrente da expressão “Geografia”, esse

rótulo é bastante antigo. Enquanto saber oficial, sua origem se

associa às figuras de Alexander Von Humboldt (1769-1859) e

Karl Ritter (1779-1859), ambos alemães. Mas o uso dessa

expressão remonta à antiguidade clássica.

Os gregos antigos nos deixaram um legado de

conhecimentos que hoje poderíamos denominar, mesmo que em

uma perspectiva tradicional, de Geografia. Segundo Sodré, “ A

Geografia é talvez a ciência de história mais longa. Ela começa,

na verdade, com as primeiras comunidades gentílicas”

(SODRÉ, 1976, p. 13). Ainda conforme o autor, “[...] os gregos

 foram os primeiros a registrar de forma sistemática os

conhecimentos geográficos. Foram os gregos, aliás, que

batizaram os conhecimentos sobre a superfície da Terra como

Geografia” (SODRÉ, 1976, p. 14).

Para Sodré, Heródoto não foi apenas o “ Pai da História”,

como trazem os livros de História e como nos ensinam na

educação básica. Teria sido também o primeiro a tratar de

aspectos geográficos nas suas obras, bem como o primeiro a

discutir as relações deterministas entre o meio e o homem.

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Outros gregos também contribuíram para os primeiros

 passos da ciência que hoje denominamos Geografia.Eratóstenes, por exemplo, teria, segundo ele, levantado a

 primeira discussão acerca da imagem geométrica da Terra.

Matemático e astrônomo, foi responsável pelo cálculo da

circunferência da Terra com um erro de apenas 5%. Ptolomeu,

também matemático e astrônomo, propôs o „geocentrismo‟,teoria que pregava que a Terra era o centro do universo e que o

sol, as estrelas e os planetas giravam ao seu redor.

Ptolomeu também contribuiu, significativamente, para a

cartografia e, por conseguinte, para a geografia, ao propor

mapas com latitudes e longitudes, Tales e Anaximandro privilegiaram as medições e formas da Terra e Aristóteles

dedicou-se às análises em torno do lugar.

Vê-se, assim, que, mesmo com passos lentos ou às vezes

com pequenas falhas, esses pensadores já contribuíam,

sobremaneira, para a construção de um arcabouço teórico emtorno daquela que se tornaria a ciência geográfica.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

 No dizer de Sodré, “ A Geografia, na antiguidade, valeu

 pelos passos dados, às vezes vagarosamente, às vezes

erradamente, seja no sentido da informação sobre a superfície

da Terra [...], seja no sentido do dimensionamento, da

quantificação, da localização relativa de pontos [...]” (SODRÉ,

1976, p. 18).

 Nesse sentido, a geografia, apesar de ter sido

reconhecida como ciência apenas no século XVIII, já permeava

as várias ciências há muitos séculos. Através da filosofia e de

observações astronômicas, os filósofos, matemáticos, entre

outros, descreviam paisagens, faziam deduções acerca do

formato da Terra e propunham conceitos básicos. Afinal, “[...] a

 geografia tem suas raízes na busca e no entendimento da

diferenciação de lugares, regiões, países e continentes,

resultante das relações entre os homens e entre estes e a

natureza” (CORRÊA, 1986, p.8).

Se houvesse necessidade de fixação, paraefeitos comemorativos, por exemplo, de umadata assinalando a autonomia da geografia, asua constituição como área específica deconhecimentos e de sua análisesistematizada, esse ano seria o de 1845,quando Humboldt iniciou a publicação doCosmos (SODRÉ, 1976, p. 30).

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Contudo, é importante dizer que o valor dado à

Geografia naquele momento não era dos melhores. Ela aparecia,“[...] antes de definir o seu campo, os seus métodos, as suas

técnicas, como tributária, e desimportante, de outras áreas do

conhecimento, científicas ou não. Estava ainda carregada de

mitos, lendas e deformações, que escondiam o que, em seus

rudimentos, havia de verdadeiro e duradouro” (SODRÉ, 1976, p. 19). Quanto à origem do termo, quase sempre ela é atribuída a

Strabo. Para muitos autores, a sua obra, „Geographicae‟, marca,

 pela primeira vez, o uso do termo. Isso nas primeiras décadas

antes de Cristo.

Como ciência, a geografia vai emergir no contextoeuropeu do final do século XVIII e início do século XIX. Até

então a “[...]  geografia compunha um saber totalizante, não

desvinculado da filosofia, das ciências da natureza e da

matemática” (CORRÊA, 1986, p.8). Mas, “ A Geografia, ao fim

do século XVIII, havia reunido condições para emancipar-se.

 Podia compor seus elementos, espalhados nos mais diversos

campos do conhecimento, e sistematizá-los” (SODRÉ, 1976, p.

29). E isso foi feito ao longo de dois séculos, sobretudo, e

continua sendo feito até os dias atuais.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Mas o que é geografia afinal? Alguns autores definem a

geografia como o estudo da superfície terrestre. Definição,

todavia, por demais simplória para uma ciência da envergadura

da geografia. Kant (1724-1804), mesmo não sendo um geógrafo

de formação, apenas um filósofo do iluminismo, vai dar uma

contribuição significativa para a afirmação da geografia

(MOREIRA, 2008). Segundo Moraes, “[...] a tradição kantiana

coloca a Geografia como uma ciência sintética (que trabalha

com dados de todas as demais ciências), descritiva (que

enumera os fenômenos abarcados) e que visa abranger uma

visão de conjunto do planeta” (MORAES, 2007, p.32). Para ele,

[...] seria, por excelência, uma disciplina decontato entre as ciências naturais e ashumanas, ou sociais. Dentro dessaconcepção aparecem, pelo menos, trêsvisões distintas do objeto: alguns autoresvão apreendê-lo como as influências danatureza sobre o desenvolvimento dahumanidade. [...] outros autores, mantendo a

ideia da Geografia como estudo da relaçãoentre o homem e a natureza, vão definir-lheo objeto como a ação do homem natransformação deste meio”  (MORAES,2007, p. 35).

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Kant não realiza grande transformação na Geografia,

mas confere à percepção geográfica do mundo físico o rigor dadescrição e da taxonomia que a sua compreensão de espaço

 permite. Para ele, o espaço é um dado a priori da percepção, um

 plano de extensão geométrica preexistente ao olhar humano

(MOREIRA, 2008).

Outra proposta encontrada “[...] é daqueles autores que

 propõem a Geografia como estudo da individualidade dos

lugares. Para estes, o estudo geográfico deveria abarcar todos

os fenômenos que estão presentes numa dada área, tendo por

meta compreender o caráter singular de cada porção do

 planeta”  (MORAES, 2007, p. 33). Há, ainda, autores que,segundo Moraes, definem a geografia como a ciência do espaço.

 Neste caso, outro problema aparece: o que é o espaço? Essa é

uma discussão que será levantada em outro momento. Há

também aqueles que definem a geografia como o estudo das

relações homem/meio. Nessa perspectiva, diz Moraes (idem), ageografia seria uma disciplina de contato entre as ciências

naturais e humanas, ou sociais. Para tantos outros, a geografia

aparece como uma ciência de síntese, ou seja, seria ela

responsável pela conjugação dos mais diversos saberes em uma

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só ciência. Essa perspectiva é, por demais, prepotente. Não se

concebe uma ciência que dê conta de todas as particularidades,

que abarque todo o conhecimento. No dizer de Moraes, “[...]

revelando enorme imodéstia, tornar-se-ia a Geografia como a

culminância do conhecimento científico, isto é, como a

disciplina que relacionaria e ordenaria os conhecimentos

 produzidos por todas as demais ciências” (MORAES, 2007, p.

41).

Segundo ele, a ideia de uma “ciência de síntese” servia

apenas para encobrir uma suposta vaguidade e indefinição do

seu objeto. Em outras palavras, pela falta de um objeto preciso,

a geografia acabava por tentar abarcar o mundo e não dava conta

dessa perspectiva. Vê-se, assim, uma enorme dificuldade de se

conceituar geografia.

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A partir do século XVIII, vários autores irão se destacar

nas discussões de cunho geográfico. É claro que eramdiscussões específicas, mas que tratavam de temas geográficos.

Por exemplo,

[...] Kant e Leibniz enfatizaram a questão doespaço. [...] Hegel e Herder destacaram ainfluência do meio sobre a evolução das

sociedades. [...] Outra fonte dasistematização geográfica pode ser detectadanos pensadores políticos do iluminismo(MORAES, 2007, p.54).

Esses autores, afirma Moraes, já discutiam temas próprios da

Geografia. Questões como Relação de Poder e Organização do Estado

 já estavam na pauta das discussões. Rousseau, para exemplificar, já

discutia, naquela época, a relação entre a gestão do Estado e as formasde representação e extensão do território de uma dada sociedade

(MORAES, 2007).

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

A GEOGRAFIA ALEMÃ

Foi na Alemanha, sobretudo com Humboldt e Ritter, que

a geografia tomou a forma de ciência. As condições históricas

do início do século XIX neste país contribuíram, sobremaneira,

 para o estabelecimento e afirmação dessa ciência. A combinação

entre o capitalismo e a aristocracia agrária da época culminou noque Moraes (2007) chamou de “ Feudalismo modernizado”, ou

seja, não houve mudança na estrutura fundiária alemã que

continuou, segundo o autor, altamente concentradora. Segundo

ele,

[...] as relações de trabalho não se alteram  –  a servidão (forma de relação de trabalhotípica do feudalismo) permanece como basede toda a produção. Assim, mesclam-seelementos tipicamente feudais com outros

 próprios do capitalismo: produção para omercado, com trabalho servil [...] É nestecontexto que a geografia vai despontar.Dessa forma, [...] temas como domínio e

organização do espaço, apropriação doterritório, variação regional, entre outros,estarão na ordem do dia na prática dasociedade alemã dessa época (MORAES,2007, p.60-91).

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Os dois grandes nomes da geografia dessa época foram

Alexandre Von Humboldt e Karl Ritter. O primeiro de formaçãonaturalista e o segundo de base filosófica e histórica, além de

geógrafo. Segundo Moreira, o ponto de referência para Ritter foi

a corografia, transformada por ele no método comparativo. “ A

visão corográfica parte da noção do recorte paisagístico que

materializa a arrumação da superfície terrestre numa ordem de

classificação taxonômica ao tempo que propicia ao geógrafo

organizar sua descrição” (MOREIRA, 2008, p. 15). Essa nova

fase e forma da geografia, implementada por Ritter, vai ser

denominada, segundo Moreira (2008), de Geografia Comparada.

Humboldt vai se orientar nesse novo fundamento para ofereceroutra matriz para esta ciência.

Segundo Moraes (2007), Humboldt via a Geografia

como a ciência do cosmos, ou seja, como uma síntese de todo o

conhecimento da Terra, uma perspectiva geral desta ciência. Já

Ritter a enxergava como uma ciência que se preocuparia comuma área delimitada, individualizada, com o estudo dos arranjos

individuais que seriam, posteriormente, comparados. Dessa

forma, estruturava-se uma geografia do estudo dos lugares, bem

distinta daquela de Humboldt.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Enquanto Humboldt propunha uma geografia que

 privilegiava o globo em detrimento do homem, Ritter propôs o

antropocentrismo. Em termos de método, Humboldt vai propor

o chamado “empirismo raciocinado”, que seria a intuição a

 partir da observação e Ritter vai propor a análise empírica

(MORAES, 2007). Mas, apesar da grande contribuição de

Humboldt e Ritter para o que viria a ser a ciência geográfica,

eles caíram, segundo Moreira, no ostracismo “[...]  passando-se

um período de quase cinquenta anos antes que a geografia

voltasse ao cenário do mundo científico” (MOREIRA, 2008, p.

15).

Além deles, outra grande contribuição alemã dada à

geografia partiu de Friedrich Ratzel. Sua geografia caracterizou-

se, sobretudo, pela legitimação do poder do Estado para com os

territórios e seu povo. Para Moraes,

Ratzel vai ser um representante típico do

intelectual engajado no projeto estatal; [...] aGeografia de Ratzel expressa diretamenteum elogio do imperialismo, como ao dizer,

 por exemplo, “semelhante à luta pela vida,cuja finalidade básica é obter espaço, aslutas dos povos são quase sempre pelomesmo objetivo. Na história moderna arecompensa da vitória foi sempre um

 proveito territorial” (MORAES, 2007, p.69).

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 No seu clássico  Antropogeografia   –    fundamentos da

aplicação da Geografia à História  (1882), Ratzel formula os princípios fundamentais do que mais tarde seria denominado

 pelos seus sucessores de “Determinismo Geográfico”. Ratzel

[...] começou seus estudos pela Geologia e pela Paleontologia; após longas viagens pelaEuropa e na América, dedicou-se à

etnografia e daí passou à Geografia. Em1882, apareceu o primeiro volume de suaobra Antropogeografia [...]. Nela, procuravamostrar que a distribuição do homem nasuperfície da Terra havia sido mais oumenos determinada pelas forças naturais,descrevendo, no volume final, a distribuiçãoexistente (SODRÉ, 1976, p. 48).

De acordo com seu postulado, as condições naturais

exerceriam uma grande ou talvez determinante influência no

 processo de desenvolvimento dos povos. Assim, um povo só se

desenvolveria em sua plenitude se as condições naturais lhes

fossem favoráveis.

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 Na realidade, o determinismo ambiental

configura uma ideologia, a das classessociais, países ou povos vencedores, queincorporam as pretensas virtudes e efetivamas admitidas potencialidades do meio naturalonde vivem. Justificam, assim, o sucesso, o

 poder, o desenvolvimento, a expansão e odomínio” (CORRÊA, 1986, p. 10).

Mas, apesar de a ideia de Determinismo ser atribuída atéhoje a Ratzel, muitos estudiosos acreditam que esta prática já

havia sido postulada muito antes dele. Aristóteles, por exemplo,

 já havia, segundo Sodré, definido bem sua posição determinista

ao escrever que “[...] os habitantes das regiões frias são cheios

de coragem e feitos para a liberdade. Aos asiáticos faltaenergia, assim são feitos para o despotismo e para a

escravidão” (SODRÉ, 1976, p.38). Mas é, indiscutivelmente,

com Ratzel que a ideia vai ser propagada, sobretudo com seus

discípulos.

A partir da real dependência ou relação com os recursosnaturais disponibilizados pelo território, Ratzel também formula

a ideia de Espaço Vital  “[...] uma proporção de equilíbrio entre

a população de uma dada sociedade e os recursos disponíveis

 para suprir suas necessidades [...]” (MORAES, 2007, p. 70).

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

25

Segundo ele, “[...] o território representaria o equilíbrio entre a

 população ali residente e os recursos disponíveis para as suas

necessidades, definindo e relacionando, deste modo, as

 possibilidades de progresso e as demandas territoriais 

(CORRÊA, 1986, p. 11). A noção de Espaço Vital seria,

conforme apontado por Moreira (2008, p. 41),

[...] o modo como Ratzel chama a atenção para a importância da terra e do território  –  unificados no conceito genérico de solo –  naconstituição dos modos de vida dos povos eo caráter político da atitude de construir suassociedades levando em conta o fato de ter defazê-lo num processo de ação geográfica,lançando, assim, as bases da Geografia

Política, não da Geopolítica, portanto, umavisão de Geografia que hoje se veria comoteoria da ação. Nada tendo a ver com osentido de uma geopolítica de rés-do-chãoque a interpretação da Geografia de escolasviria a popularizar e difundir.

Essa discussão em torno das categorias política e

geopolítica irá perdurar até os dias de hoje. Há, entre muitos

autores, a aceitação de que o conceito de geografia política,

como se conhece hoje, é atribuído a Friedrich Ratzel a partir da

obra  Politische Geographie  [Geografia Política] de 1897. Mas,

na verdade, Ratzel não é o dono do rótulo. Ele apenas redefiniu

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

a forma de se discutir o conceito, dando um caráter mais

geográfico, pode-se assim dizer.

Segundo Castro (2005), o termo „geografia política‟ foi

usado pela primeira vez em 1750, por Turgot, filósofo francês.

Essa teoria foi apresentada, segundo a autora, como um tratado

de governo e sua preocupação, afirma ela, era demonstrar que o

governo começa no estudo dos fatores geográficos da política.

Mas qual é o campo de ação da geografia política?

Para Castro (idem), é na relação entre a política  –  

definida por ela como a expressão e modo de controle dos

conflitos sociais  –   e o território  –   por ela definido como base

material e simbólica da sociedade –  que se pode definir o campo

da geografia política (CASTRO, 2005). Para ela, essa ciência se

 preocuparia com o controle e definição dos limites do cotidiano

das sociedades, com o território enquanto materialidade e arena

dos interesses e das disputas dos atores sociais e com as relações

de poder. Uma concepção bem próxima da que hoje se conhece

 por geopolítica.

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

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Lévy apud Castro (2005, p. 91) afirma que “[...]  para

que possa existir, a política impõe um território fechado e

estável, delimitado por unidades políticas superpostas e

encaixadas”. Contudo, continua ele, o espaço não se reduz a

essa territorialidade da política, e os atores sociais, mesmo

atuando como cidadãos, inventam espacialidades singulares,

 podendo pertencer a espaços diferentes. Assim, segundo Castro(idem), é possível afirmar que como objeto da geografia política

ou de uma geografia do político há o espaço político.

Entenda-se, como assinala Lacoste, que por político não

se deve entender o homem de Estado ou mesmo a política, seja

ela discurso ou exercício de poder. Mas, uma certa categoria defenômenos sociais (LACOSTE, 1988).

A utilização do termo geopolítica deve-se ao jurista

sueco Rudolf Kjellén. Ele teria sido, segundo Sodré, “[...]   o

 primeiro a empregar a expressão Geopolítica” (SODRÉ, 1976,

 p. 59), em livro intitulado O Estado como Forma de Vida de1916 (MOREIRA, 2007). Para Sodré, “Se o Determinismo

Geográfico é um dos traços mais característicos da Geografia

da época do imperialismo, a Geopolítica assinala a deformação

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

levada à monstruosidade  –   é a Geografia do fascismo”

(SODRÉ, 1976, p. 54).

Isso porque para Kjellén, aos Estados pequenos, “[...]

 parece estar reservada, no mundo da política, sorte idêntica à

que têm os povos primitivos, no mundo da cultura. São

repelidos para a periferia, mantidos nas áreas marginais e

 zonas fronteiras, ou desaparecem” (SODRÉ, 1976, p. 60). Essa

visão acerca da geopolítica é reforçada por Pierre George ao

afirmar que “ A pior das caricaturas da Geografia aplicada da

 primeira metade do século XX foi a Geopolítica [...]” (Apud

SODRÉ, 1976, p. 70).

Para Kjellén apud Sodré (idem), a geopolítica se

 preocuparia com as relações de poder existentes entre os mais

variados Estados Nacionais. Assim, questões do tipo “Que

Estado exerce mais poder no cenário continental?” ou “Como

um Estado -  Nação se torna uma potência global”? associam-se

a essa categoria. Ou seja, o termo não é apenas uma contração

de Geografia Política, mas uma nova categoria cuja temática

central é a relação de poder.

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A GEOGRAFIA FRANCESA

Segundo Moraes (2007), a França teria sido o país, de

forma mais pura, teria realizado uma revolução burguesa.

Segundo ele, os resquícios feudais foram completamente

varridos e a burguesia havia instalado seu governo, dando ao

Estado uma roupagem que mais atendia a seus interesses, à

lógica burguesa. Esta nova classe, instalada no governo, “[...]

formulou e comandou uma transformação radical da ordem

existente, implantando o domínio total das relações capitalistas”

(MORAES, 2007, p. 75).

A principal escola francesa que fez oposição à alemã foi,

indiscutivelmente, a lablachiana. O seu principal objetivo era

combater a legitimação estatal pregada por Ratzel na escola

alemã. Segundo Moraes, a “[...] Geografia de Ratzel legitimava

a ação imperialista do Estado bismarckiano. Era mister, para

França, combatê-la. O pensamento geográfico francês nasceu

com esta tarefa. Por isso, foi, antes de tudo, um diálogo com

Ratzel” (MORAES, 2007, p. 77). O principal artífice desta

empresa foi Paul Vidal de La Blache (1845-1918).

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

As ideias propostas por La Blache incutiam,

indiscutivelmente, uma semântica mais liberal. Isso talvez tenha

sido motivado pelos princípios liberais da revolução por que

 passava a França. Segundo Moraes, uma primeira crítica,

[...] efetuada por Vidal às formulações deRatzel, dizia respeito à politização explícitado discurso deste. Isto é, incidia no fato deas teses ratzelianas tratarem abertamente dequestões políticas. Vidal, vestindo uma capade objetividade, condenou a vinculaçãoentre o pensamento geográfico e a defesa deinteresses políticos imediatos, brandindo oclássico argumento liberal da „necessárianeutralidade do discurso científico(MORAES, 2007, p. 78).

Mas isto não quer dizer, como aponta o próprio Moraes

(2007), que a Geografia pregada por La Blache não possuísse,

também, uma legitimação ideológica dos interesses franceses.

Contudo, aponta o autor, esta vinculação ou legitimação era

mais dissimulada. Os temas políticos não eram tratados

abertamente e a legitimação do imperialismo era, segundo ele,

mais mediatizada e sutil.

Outra crítica apontada por Moraes (idem) incidiu no

caráter naturalista proposto por Ratzel. La Blache criticou a

„minimização‟ do homem, que era visto como um ser passivo

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nas teorias de Ratzel. Para combater, La Blache propõe um

componente criativo, a liberdade (MORAES, 2007). Isso,entretanto, não quer dizer que La Blache ignorou os estudos na

 perspectiva naturalista, ele apenas minimizou a extrema

importância dada por Ratzel ao naturalismo.

Uma terceira crítica de Vidal à Antropogeografia “[...]

atacou a concepção fatalista e mecanicista da relação entre os

homens e a natureza. Atingindo diretamente a ideia da

determinação da História pelas condições naturais”

(MORAES, 2007, p. 80). A proposta de Ratzel exprimia,

segundo Moraes (idem), autoritarismo e o agente social

 privilegiado em sua análise era o Estado. Já a proposta de LaBlache manifestava um tom mais liberal, ou seja, que refletia,

segundo Moraes, os ideais da Revolução Francesa.

La Blache definiu o objeto da geografia como sendo a

relação homem-meio e apresentou o homem como ser ativo, ou

seja, que sofre a ação do meio, mas que também interfere neleao seu favor. Na “[...] perspectiva vidalina, a natureza passou a

 ser vista como possibilidade para a ação humana; daí o nome

de Possibilismo dado a esta corrente por Lucien Febvre”

(MORAES, 2007, p. 81). Para Corrêa (1986, p. 11/13)

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

[...] a visão possibilista focaliza as relações

entre o homem e o meio natural, mas não ofaz considerando a natureza determinante docomportamento humano. [...] para Vidal deLa Blache, o mestre do possibilismo, asrelações entre o homem e a natureza eram

 bastante complexas. A natureza foiconsiderada como fornecedora de

 possibilidades para que o homem a

modificasse: o homem é o principal agentegeográfico.Além disso,

A Geografia vidalina fala de população, deagrupamento, e nunca de sociedade; fala deestabelecimentos humanos, não de relaçõessociais; fala das técnicas e dos instrumentosde trabalho, porém não do processo de

 produção. Enfim, discute a relação homem-natureza, não abordando as relações entre oshomens. É por essa razão que a carganaturalista é mantida, apesar do apelo àHistória, contido em sua proposta(MORAES, 2007, p. 84).

Todas essas discussões irão contribuir para a elaboração

do cabedal teórico do que hoje se conhece por  Geografia. Darão

corpo à disciplina que mais tarde se transformaria numa das

mais complexas ciências: a Ciência Geográfica.

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33

A

 RENOVAÇÃO DA GEOGRAFIA

Após a Segunda Guerra Mundial verifica-se, no contexto

europeu, uma nova configuração do capitalismo. A Europa,

dividida em função da Guerra Fria, passa a investir pesado em

 pesquisas científicas e na reconfiguração de grandes empresas

capitalistas. O medo de expansão do socialismo era evidente.

 Nesse contexto,

[...] uma nova divisão social e territorial dotrabalho é posta em ação, envolvendointrodução e difusão de noções espaciais.[...] Estas transformações inviabilizariam os

 paradigmas tradicionais da geografia  –   odeterminismo ambiental, o possibilismo e o

método regional - suscitando um novo,calcado em uma abordagem locacional: oespaço alterado resulta de um agregado dedecisões locacionais (CORRÊA, 1986. p.17).

Assim, a geografia que nasce nesse período tem um

 papel ideológico muito importante. Ela irá contribuir “[...] para

dar esperanças aos „deserdados da terra”, acenando com a

 perspectiva de desenvolvimento a curto e médio prazo [...]”

(CORRÊA, 1986. p. 17). Esse movimento nasce da ruptura de

alguns geógrafos com a perspectiva tradicional desta ciência.

Isso advém da consideração de que esta perspectiva carecia de

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

uma nova forma de se enxergar as coisas. A forma como a

geografia tradicional via e descrevia as coisas já não dava mais

respostas satisfatórias à sociedade. Esse movimento vai ter

início já na década de 1960 e vai atingir seu ápice na década de

1970.

Mas para entender todo esse processo de renovação é

 preciso primeiro compreender os fatores da crise, como salienta

Moraes (2007). Para ele, a base social, que engendrara os

fundamentos e as formulações da Geografia Tradicional havia se

alterado, ou seja, “[...] o desenvolvimento do modo de produção

capitalista havia superado seu estágio concorrencial, entrando

na era monopolista. [...] O liberalismo econômico estava já

enterrado; a grande crise de 1929 havia colocado a necessidade

da intervenção estatal na economia” (MORAES, 2007, p. 104).

Em segundo lugar, continua ele, “[...] o desenvolvimento

do capitalismo havia tornado a realidade mais complexa. A

urbanização atingia graus até então desconhecidos. [...] O

quadro agrário também se modificara, com a industrialização e

a mecanização da atividade agrícola, em várias partes do

mundo” (MORAES, 2007, p.104). Enfim, as condições

materiais de existência dos indivíduos eram outras

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

 Nessa atualização do discurso burguês a

respeito do espaço, que se poderia chamarde renovação conservadora da Geografia,ocorre a passagem, ao nível dessa disciplina,do positivismo clássico para oneopositivismo. Troca-se o empirismo daobservação direta [...] por um empirismomais abstrato, dos dados filtrados pelaestatística [...]. Do trato direto com o

trabalho de campo, ao estudo filtrado pela parafernália da cibernética. [...] da contageme enumeração direta dos elementos da

 paisagem, para as médias, os índices e os padrões. Da descrição, apoiada naobservação de campo, para as correlaçõesmatemáticas expressas em índices(MORAES, 2007, p. 110/111).

Isto é, diferentemente das correntes possibilista e

hartshorniana, essa nova geografia

[...] procura leis ou regularidades empíricassob a forma de padrões espaciais. Oemprego de técnicas estatísticas, dotadas demaior ou menor grau de sofisticação  –  média, desvio-padrão, coeficiente decorrelação, análise fatorial [...] caracterizamo arsenal de regras e princípios adotados porela. É conhecida também como geografiateorética ou geografia quantitativa(CORRÊA, 1986, p. 18).

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Para Moraes (2007), a Geografia Pragmática seria um

instrumento a serviço da Burguesia e do Estado. Seus princípiose fundamentos estão, indissoluvelmente, ligados ao

desenvolvimento do capitalismo monopolista. Dessa forma, os

interesses por ela defendidos seriam a maximização dos lucros,

a ampliação da acumulação de capital, a manutenção da

exploração do trabalho. Dessa forma, “[...] mascara as

contradições sociais, legitima a ação do capital sobre o espaço

terrestre” (MORAES, 2007, p.116). Essa nova Geografia

[...] e os paradigmas tradicionais sãosubmetidos à severa crítica por parte de umageografia nascida de novas circunstâncias

que passam a caracterizar o capitalismo.Trata-se da geografia crítica, cujo vetor maissignificativo é aquele calcado nomaterialismo histórico e na dialéticamarxista (CORRÊA, 1986, p. 19).

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Esta denominação advém, segundo Moraes (idem), de

uma postura crítica mais radical que vai de encontro à Geografia

existente (Tradicional/Pragmática). Segundo ele,

[...] são os autores que se posicionam poruma transformação da realidade social,

 pensando o seu saber como uma arma desse processo. São, assim, os que assumem o

conteúdo político de conhecimentocientífico, propondo uma Geografiamilitante, que lute por uma sociedade mais

 justa. São os que pensam a análisegeográfica como um instrumento delibertação do homem (MORAES, 2007, p.119).

Os teóricos da perspectiva crítica da Geografia vão

aprofundar a análise das razões da crise. Segundo Moraes (2007, p. 119) “[...] além de um questionamento puramente acadêmico

do pensamento tradicional, buscando as suas raízes sociais”.

Além disso, criticaram a estrutura acadêmica que

[...] possibilitou a repetição dos equívocos:[...] o apego às velhas teorias, o cerceamentoda criatividade dos pesquisadores, oisolamento dos geógrafos, a má formaçãofilosófica etc. E, mais ainda, a despolitizaçãoideológica do discurso geográfico, queafastava do âmbito dessa disciplina adiscussão das questões sociais. Assim, aonível da crítica de conteúdo interno da

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

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Geografia, não deixam pedra sobre pedra(MORAES, 2007, p. 119/120).

Essa perspectiva da geografia vai ter em Ives Lacoste,

Milton Santos, entre outros, seus principais teóricos. Com Yves

Lacoste, discípulo de Pierre George, sairá tanto o polêmico

Livro “ A Geografia Serve, Antes de mais Nada, para Fazer a

Guerra”, quanto o clássico “Geografia do

Subdesenvolvimento”.

 Nessa perspectiva da geografia, “[...] o  homem já não

mais é visto pela geografia segundo suas diferenças de ordem

natural, como o clima ou a topografia. O que distingue os

homens não são os elementos naturais, ma suas condiçõeseconômicas e sociais existentes (MOREIRA, 2007, p. 52). Para

Lacoste,

[...] o saber geográfico manifesta-se emdois planos: a “geografia dos Estados –  Maiores” e a “Geografia dosProfessores”. Para ele, a primeira sempreexistiu ligada à própria prática do poder.[...] A “Geografia dos Professores” seriaa que foi aqui denominada de tradicional.Esta, para Lacoste, tem uma duplafunção: em primeiro lugar, mascarar aexistência da “Geografia dos Estados-Maiores”, [...] Em segundo lugar, a“Geografia dos Professores” serve para

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

levantar, de uma forma camuflada, dados

 para a “Geografia dos Estados-Maiores[...] (Apud MORAES, 2007,

 p.121/122).

Milton Santos, por sua vez, chamaria a atenção da

comunidade geográfica com o seu livro “ Por uma Geografia

 Nova”. Nele, Santos faz uma análise mais detalhada da ciência

geográfica, do seu objeto e de seus métodos. Ou seja, “Trata-se,

no caso, de ir além da descrição de padrões espaciais,

 procurando-se ver as relações dialéticas entre formas espaciais

e os processos históricos que modelam os grupos sociais”

(CORRÊA, 1986, p. 21). Nesse trabalho, afirma Moraes (2007,

 p.128), “[...] depois de avaliar criticamente a Geografia

Tradicional, a crise do pensamento geográfico e as principais

 propostas de renovação, efetivadas pela Geografia

 Pragmática[...]”, Milton Santos expõe sua concepção do objeto

da geografia, tentando dar uma resposta para as questões: O que

é a Geografia? Como deve ser a análise do geógrafo?

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Para Santos, “[...] com o desenvolvimento das forças

 produtivas e a extensão da divisão do trabalho, o espaço é

manipulado para aprofundar as diferenças de classes. Essa

mesma evolução acarreta um movimento aparentemente

 paradoxal: o espaço que une e separa os homens” (SANTOS,

2004, p. 32). Para ele, o espaço, enquanto soma dos resultados

da intervenção humana sobre a terra, é formado[...] pelo espaço construído que é tambémespaço produtivo, pelo espaço construídoque é apenas uma expectativa, primeira ousegunda, de uma atividade produtiva, eainda pelo espaço não  –   construído, massuscetível –   face ao avanço da ciência e dastécnicas e às necessidades econômicas e

 políticas ou simplesmente militares  –   detornar-se um valor, não  –   específico ou

 particular, mas universal, como o dasmercadorias no mercado mundial(SANTOS, 2004, p. 29/30).

Segundo Santos, a realização do homem, seja material ou

imaterial, não depende apenas da economia, como hoje é pregado por muitos teóricos, sobretudo economistas, mas é

resultado de um quadro de vida, material e não material, que

inclua, além da economia, a cultura (SANTOS, 2007). Para ele,

[...] é necessário discutir o espaço social, ever a produção do espaço como objeto. Este

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

espaço social ou humano é histórico, obra do

trabalho, morada do homem. [...] Diz que sedeve ver o espaço como um campo de força,cuja energia é a dinâmica social. Que ele éum fato social, um produto da ação humana,uma natureza socializada, que pode serexplicável pela produção. Afirma,entretanto, que o espaço é também um fator,

 pois é uma acumulação de trabalho, uma

incorporação de capital na superfícieterrestre, que cria formas duráveis, as quaisdenomina “rugosidades (SANTOS apudMORAES 2007, p. 128).

Essa corrente da geografia prega uma geografia mais

social, preocupada com as relações sociais de produção que

alteram o espaço e impõem nova forma de vida à sociedade.

Uma geografia que se importe com o homem em essência e com

as relações entre si e com o meio. A preocupação dos geógrafos

críticos é a relação entre a geografia e a superestrutura de

dominação de classe na sociedade capitalista (MORAES, 2007).

Ou seja, ela

[...] agrupa aqueles autores imbuídos de uma perspectiva transformadora, que negam aordem estabelecida, que vêem seu trabalhocomo instrumento de denúncia e como armade combate; enfim, que propõem aGeografia como mais um elemento na

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

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superação da ordem capitalista (MORAES,2007, p.121/122).

Esse modo de ver a realidade vai contribuir para um

ostracismo da perspectiva tradicional. Segundo Moraes,

A partir de 1970, a Geografia Tradicionalestá definitivamente enterrada; suasmanifestações, dessa data em diante, vão

soar como sobrevivências, resquícios de um passado já superado. Instala-se, de formasólida, um tempo de críticas e de propostasno âmbito dessa disciplina. Os geógrafosvão abrir-se para novas discussões e buscarcaminhos metodológicos até então nãotrilhados. Esta crise é benéfica, pois introduzum pensamento crítico, frente ao passado

dessa disciplina e seus horizontes futuros(MORAES, 2007, p. 103).

Finalmente poderíamos afirmar, concordando com

Moraes (2007, p. 131), que

[...] a Geografia Crítica é uma frente, ondeobedecendo a objetivos e princípios comuns,

convivem propostas díspares. Assim, não setrata de um conjunto monolítico, mas, aocontrário, de um agrupamento de

 perspectivas diferenciadas. A unidade daGeografia Crítica manifesta-se na postura deoposição a uma realidade social e espacialcontraditória e injusta, fazendo-se do

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

conhecimento geográfico uma arma de

combate à situação existente.

Em outras palavras, trata-se de uma nova postura de

outra geografia e, naturalmente, de outros geógrafos. São

geógrafos que “[...] em suas diferenciadas orientações assumem

a perspectiva popular, a da transformação da ordem social.

 Buscam uma Geografia mais generosa e um espaço mais justo,

que seja organizado em função dos interesses dos homens” 

(MORAES, 2007, p. 132).

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SEGUNDA PARTE

GEOGRAFIA OBJETO E MÉTODO  

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

O MÉTODO E SUA IMPORTÂNCIA PARA GEOGRAFIA 

“O método científico é o meio peloqual se pode decifrar os fatos” 

(Karel Kosik)

A busca pela apreensão científica da realidade social é

algo extremamente complexo. Não se resume a captar a

aparência das coisas, isto é, aquilo que chega através dossentidos, pois, isto é apenas um dos aspectos do conhecimento.

De fato, como observa Felício (2008), a explicação articulada e

coerente do real exige que se ultrapasse o imediato, partindo da

compreensão que a estrutura concreta da coisa, que é a realidade

como totalidade em curso, não se apresenta à primeira vista. Naverdade, esta árdua tarefa passa, inevitavelmente, pela abstração

no bojo do exercício do pensamento, pois supõe a elaboração de

conceitos e o pleno domínio do método.

Para Milton Santos, “um método é um conjunto de

 proposições –  coerentes entre si –  que um autor ou um conjuntode autores apresenta para o estudo de uma realidade, ou de um

aspecto da realidade” (2009b, p.156). Neste sentido, o autor

concorda com Gurvith (1987), quando este afirma que o método

é uma maneira de conhecer, de compreender a realidade,

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

existe independente de mim” (idem, p.156). Por conseguinte, o

método não pode ser inerte, estático, uma vez que deve refletir o

real. Este, por sua vez, no tangente à realidade social, não

aparece em qualquer período histórico como algo dado,

acabado, ao contrário, é mutável, circunstancial, momentâneo.

Segundo as expressões de Bernardes (2007, p.243), “os

conceitos significam que o todo se decompõe para permitir

compreender a própria estrutura do todo”. Trilhando nessa

 perspectiva, é o método que permite operacionalizar os

conceitos de forma articulada e, destarte, caminhar à análise. Ou

seja, o método como “conjunto de proposições” permite o

estudo de uma realidade sistematicamente, tornando uma teoria

aplicável na elucidação de determinado fenômeno. É neste

sentido que, “a prova de coerência de uma teoria   é dada pela

operacionalidade, isto é, pela escolha dos elementos de análise

que revelem a capacidade de enfrentar com o conceito”

(SILVEIRA, 2000, p.21).

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Destarte, o método fornece os instrumentos necessários à

interpretação da realidade, significando que sua importância nãoé secundária, ao contrário. Destacar o papel que ele exerce

traduz a preocupação com o rigor e a coerência na análise, posto

que “[...] sem método não há possibilidade de investigar a

realidade em bases racionais. O método é o caminho para o

conhecimento estruturado” (SANTOS e FERNANDES ApudVALE 2001, p.10). Por esse fio condutor, pensar um método e

toda complexidade dos pressupostos teóricos que o

consubstancia é, ao mesmo tempo, abrir possibilidades a um

estudo mais consistente da realidade.

Portanto, para conhecer a realidade cientificamente deve-se recorrer ao método. Este, por sua vez, traz consigo duas

 premissas principais intimamente relacionadas,

interdependentes, a saber: a abstração, mediante a utilização de

conceitos, para alcançar o concreto; e a cisão da realidade em

 partes, para compreender como ela se estrutura. Se por um ladoa abstração sugerida pelo conceito permite entender as relações

existentes entre as coisas, por outro a fragmentação é exigida

 pela análise. Deveras, conforme sintetiza Karel Kosik (1987,

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 p.30), “[...] o concreto se torna compreensível através da

mediação do abstrato, o todo através da mediação da parte”. 

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EM BUSC DO “CONCRETO PENS DO” 

Conforme ensina Marx apud  Quaini (1979), os conceitos permitem penetrar nas relações concretas que ocorrem no

âmbito de uma dada sociedade ao longo da história. Com efeito,

constituem o ponto de partida de um estudo que objetiva

ultrapassar as abstrações e alcançar o real concreto como

conjunto de múltiplas determinações articuladas organicamente. Nesse sentido, é fundamental enfatizar que os conceitos

formulados para alcançar o comportamento concreto do real, à

maneira elucidada pelo autor, não constituem uma abstração

 pura e simples, pois o real tem sua própria organização cuja

coerência é legada pela história.Kosik, por seu turno, mostra que “o método científico é

mais ou menos eficiente segundo a maior ou menor riqueza de

realidade  –   contida objetivamente neste ou naquele fato  –   que

ele é capaz de descobrir, explicar e motivar” (KOSIK, 1976,

 p.45. Grifos do autor). Isso significa que o método precisaemparelhar a realidade, expressando assim a coerência desta no

 plano do pensamento. O cerne dessa questão foi elucidado por

Milton Santos com as seguintes palavras:

Olhem qualquer coisa, olhem qualquerterritório, olhem qualquer situação. Essas

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

situações todas são coerentes. Nada que

existe deixa de ser coerente. Em outras palavras, tudo o que existe é coerente. Onosso trabalho de intelectuais é encontrar nainteligência a forma de exprimir o que narealidade é coerente (1997, sem página).

 Não obstante, para Kosik (1987), a realidade social é

inesgotável, não sendo possível alcançá-la de uma vez para

sempre, já que novos fatos podem ser acrescentados. Ora, a

realidade humana é um processo contínuo, uma vez que a

história é dinâmica, e, desta forma, não podemos apreendê-la de

uma vez por todas em toda sua complexidade e manifestações.

Desse modo, o objetivo, quando se envereda por uma

 pesquisa, esboçado mediante o uso do método, é atingir o

“concreto pensado” na acepção marxista (VALE, 2001), isto é,

uma  parcela do real expressa num sistema de ideias, sendo, ao

mesmo tempo, lei do real e lei do pensamento (LEFEBVRE,

1983). Para tanto, se busca estudar, a partir de um sistema de

ideias, determinados aspectos da realidade, mas sem esquecer a

interdependência com o todo em movimento. Portanto, o que

incansavelmente se persegue, através de um rigoroso esforço

metodológico, é a reprodução espiritual e intelectual da

“totalidade concreta”, no dizer de Karel Kosik (1976). 

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AS POSSIBILIDADES DO MÉTODO DIALÉTICO

O método dialético é uma forma de pensar a realidade

orientada pelo próprio comportamento histórico desta. Em

outras palavras, esse método não consiste na simplificação da

realidade complexa, como já fizeram muitos outros que

nortearam o fazer geográfico, mas em considerá-la tal como é.Por isso, em face do contexto atual,  depreende-se que essa

concepção pode contribuir na árdua tarefa de explicar os novos

 problemas colocados à Geografia, se tornando, quiçá,

imprescindível para esta disciplina. No entanto, diante da

 pluralidade de abordagens no que concerne ao método dialético,cabe, de antemão, esclarecer o escopo objetivo desta análise.

Segundo Georges Gurvitch (1987), a concepção de

dialética pode ser encontrada em formulações da Grécia Antiga.

Pode ser vista em construções filosóficas de pensadores como

Platão, por exemplo. De lá para cá o termo ou o método foimodificado substancialmente, sobretudo a partir de pensadores

como Hegel e Marx.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Karel Kosik (1976) considera que o objetivo central da

dialética é a reprodução espiritual e intelectual da realidade a

que ele chama de “totalidade concreta”. Nesse caso, esse

método não é mero produto do pensamento ou uma simples

abstração, mas sim uma maneira de alcançar o movimento do

real, partindo do pressuposto de que é necessário caminhar do

abstrato ao concreto.

Corroborando com essa inferência, Melgaço (2008)

entende que, mediante a complexidade do período histórico

atual, a Geografia pode ousar compreender a realidade desde

que trabalhe na perspectiva dialética. A propósito da temática,

esse autor, apoiado em Löwy (1985), explica três atributos

fundamentais da dialética, também apontados por Kurka (2008,

 p.11), a saber: “[...] o movimento permanente da realidade como

estrutura, a totalidade e a relação com as contradições na relação

com as partes”. Esses três elementos, de acordo com a autora, se

incorporados à abordagem territorial, podem ajudar,

sobremaneira, na construção de um entendimento consistente da

realidade que procure atingir a essência dos fenômenos

espaciais, por três motivos principais.

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O método dialético vai contra toda concepção de uma

realidade estática, inerte, na medida em que concebe a históriacomo um movimento perpétuo de transformação. Desse modo,

não se pode cristalizar os conceitos, uma vez que estes devem

refletir o movimento. No século da velocidade e da pressa,

usando uma expressão de Santos (2009a, p.66), essa

compreensão é condição sine qua non para elucidar os processossocioespaciais, haja vista que “[...] o tropel dos eventos

desmente verdades estabelecidas e desmancha o saber”

(SANTOS, 2009a, p.18). Há, durante todo momento, uma

grande circulação de pessoas, mercadorias e, sobremodo, de

informação, ainda que a densidade desses fluxos varie de acordocom as possibilidades técnicas e políticas de cada subespaço.

Decerto, o corpo teórico utilizado precisa dar conta do

movimento caso não queira ficar rapidamente desatualizado.

A ideia de totalidade permite enxergar, de modo

diferenciado, o movimento. Porém, como adverte Kosik (1976),totalidade não significa todos os fatos, todas as coisas. Esse

autor é enfático ao dizer que totalidade significa a realidade

como um todo estruturado, em que “cada coisa sobre a qual o

homem concentra o seu olhar, a sua atenção, a sua ação ou a sua

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

avaliação emerge de um determinado todo que o circunda [ ...]”

(idem, p.25).

O conceito de totalidade não pretende enveredar por um

estudo exaustivo de tudo o que existe, um quadro geral, mesmo

 porque isso, nos dias atuais, seria praticamente impossível.

Trata-se de explicar os nexos das coisas, dado que:

El sentido de una cosa es la forma supremade su coexistencia con las demás, en sudimensión de profundidad. No, no me bastacontener la materialidad de una cosa,necesito, además, conocer el sentido quetiene, es decir, la sombra mística que sobreella vierte el resto del universo (ORTEGA YGASSET, 1996).

Isso significa que todos os lugares e elementos do

espaço agem de maneira articulada como funcionalidade de um

todo. Em outras palavras, cada pedaço do território, a despeito

de sua enorme escassez ou abundância, reflete, em sua essência

ontológica, a totalidade espacial. Destarte, a visão holística nos permite uma discussão contextualizada dos diversos problemas

colocados à Geografia atualmente, sem a qual eles perdem o

sentido de existência, logo de explicação e solução.

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Por fim, a contradição entre as partes presente no métododialético, no sentido proposto por Kosik (1976), é um atributo

 próprio da totalidade concreta, assim como os dois elementos

expostos precedentemente, e não um simples produto do

 pensamento. Assim, ela se torna condição essencial para o

movimento, posto que, conforme assinala Lefebvre (1983, p.240), “[...] na contradição encontra-se a raiz, o fundamento de

todo movimento”. Portanto, a conflitualidade e dialogicidade

sociais são os elementos dinamizadores do espaço geográfico.

Contudo, cabe ressaltar que a contradição expressa pelo

método dialético não caracteriza uma dualidade entre as partes,como se cada uma delas fosse constituída de realidades distintas.

Ao contrário, a oposição resguarda certa coerência, porque faz

 parte de um único todo. No dizer de Kosik (1976), a totalidade

do mundo é revelada pelo homem na história e vice-versa. Pode-

se inferir, por conseguinte, que num mundo ditado pelas regrasda globalização, cada lugar, apesar de sua diferença no que

concerne ao grau técnico, científico e informacional reflete a

totalidade mundo, daí o seu valor explicativo.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

DA TOTALIDADE À ANÁLISE: UMA NECESSIDADE DE

MÉTODO

“O conhecimento não é contemplação”(Karel Kosik)

A importância que o conceito de totalidade assume no

método dialético, e por consequência nas proposições

metodológicas de cunho geográfico da atualidade, merece uma

reflexão especial. Ele surge no seio da filosofia clássica alemã,

nas formulações de Hegel, Kant e Schelling, com o intuito de

diferenciar a dialética da metafísica. Kant (apud Quaini, 1979,

 p.28), por exemplo, mesmo pautado numa abordagem pouco

explicativa, argumenta que “a descrição do mundo ou da terra

deve referir-se à ideia de con junto e “reportar -se sempre a esta”

[...]”.

Portanto, dito de forma simplificada, o principal partido

de método que o conceito de totalidade quer mostrar é que para

compreensão de determinado fenômeno é necessário recorrer às

relações nas quais ele está inserido, pois é isso que lhe confere

sentido e, por conseguinte, possibilidades de explicação

coerente.

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Dentre os autores supracitados, há um destaque para

Hegel, por aprofundar a concepção dialética da realidade quemais tarde inspiraria Marx. Na verdade, Hegel introduz na

filosofia uma dialética da razão e, desta forma, promove grande

avanço no que concerne à visão da realidade a partir da

 perspectiva totalizante, a despeito das críticas conduzidas

 posteriormente, sobretudo pela abordagem materialista dahistória, em contrapartida a sua filosofia.

De acordo com as concepções Hegelianas, a vida

humana é nada mais que a busca da liberdade na superação das

contradições postas ao espírito (HEGEL, 1980). Para ele,

totalidade é a oposição e, ao mesmo tempo, a unidade entre vidae consciência no movimento do espírito. Assim, concebe

totalidade como unidade de opostos.

Porém tal oposição não configura um dualismo, haja

vista que perspectivas distintas (vida e consciência) convergem

na esteira de um movimento unitário, qual seja, o desenrolar do processo histórico, já que, segundo Hegel, a história do mundo é

a representação da ideia do espírito. Por conseguinte, essa

unidade dos opostos se dá, devido às concepções da realidade

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

que norteiam sua filosofia, no plano do pensamento (HEGEL,

1980).

Para Marx, por outro lado, com o seu materialismo

histórico e dialético, a totalidade é unidade da diversidade,

 porém concreta e histórica porque é resultante da

indissociabilidade dialética homem-natureza. Coloca-se,

 portanto, no sentido inverso ao de Hegel, procurando desvendar

as contradições “Concretas” no seio do modo de produção

capitalista.

 Nesta direção da totalidade marxista, o que interessa

discutir não são as coisas vistas isoladamente, mas “[...] as

feições e situações [...]” inseridas num “sistema de relações em

que se totalizam e unificam” (PRADO JUNIOR, p.8), ou seja, as

relações concretas que engendram o movimento da totalidade.

 Na Geografia, a incorporação desta categoria se dá,

efetivamente, mediante a Renovação Crítica do século passado,

notadamente na década de 1970, sob a égide do materialismo

histórico dialético. Mas, principalmente nos últimos três

decênios, a noção de totalidade vem sendo muito divulgada e

aceita dentro da Geografia.

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Pode-se dizer que a produção geográfica que se

fundamenta nesta perspectiva diferenciada de se enxergar arealidade se mostra bastante fecunda, pois inaugura um debate

que abre novas possibilidades de elucidação dos fenômenos

espaciais. Evidentemente não agrada a todos, revelando a

 pluralidade teórico-metodológica latente no âmbito da própria

Ciência Geográfica na contemporaneidade. Na trajetória epistemológica de Milton Santos, a

categoria totalidade aparece como recurso de método que, a bem

dizer, norteia toda sua produção científica. Isso resulta de um

amplo debate filosófico com autores clássicos que abordaram tal

concepção1.Outra contribuição importante para a visão holística da

realidade geográfica, de grande influência na Geografia

Dialética de Milton Santos, encontra-se em Sartre (1978). Este

autor infere que a realidade como totalidade histórica se revela

no permanente processo de totalização que é, ao mesmo tempo,movimento da história e do conhecimento. A totalidade é um

dinamismo constante que aparece, concomitantemente, como

1 O entendimento de totalidade que norteia a produção geográfica de Milton

Santos é inspirado, principalmente, em Karel Kosik (Dialética do Concreto) eGeorg Luckács (História e Consciência de Classe). 

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

resultado de totalizações anteriores e como totalização do

 presente em direção ao futuro. Assim, as “novas” totalidades

não são inteiramente novas, uma vez que a história é feita de

continuidades e descontinuidades, não podendo ser assimilada

lineamente.

Desta maneira, a ideia de totalização chama atenção para

o fato de que falar de totalidade implica evocar a noção de

movimento. Neste, a totalidade evolui e muda de significado

 porque na esteira do processo de totalização passado e futuro se

entrelaçam num movimento único. E, conforme acrescenta o

filósofo francês, tomar algo em sua totalidade significa

apreendê-lo partindo das circunstâncias concretas que o

explicam (SARTRE, 1978).

Para Kosik (1976), totalidade não significa simplesmente

que tudo está em relação com tudo e que o todo é mais que a

soma das partes. Nem muito menos seriam todos os fatos, todas

as coisas, todos os aspectos. Para ele, totalidade é a própria

realidade em curso de desenvolvimento e autocriação, isto é,

uma “Totalidade Concreta”. Dizendo de outra maneira  

totalidade significa: realidade como um todoestruturado, dialético, no qual ou do qual umfato qualquer (classe de fatos, conjuntos de

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fatos) pode vir a ser racionalmentecompreendido (KOSIK, 1976, p.35).

Souza, por sua vez, coaduna com esta concepção

quando afirma que:

A totalidade é uma totalidade orgânica.Donde, explicar um fenômeno é integrá-lona totalidade das suas determinações, àsquais ele se refere, situá-lo no seio da

ligação global constituinte de sua realidade ede seu sentido, o todo de que se trata sendoum todo orgânico, a ligação uma ligaçãoorgânica (SOUZA, 2006, p.172).

Essa compreensão permite, como explicita a autora

acima, uma discussão contextualizada dos fatos e, portanto, um

salto qualitativo no método geográfico, sobretudo considerando

que em sua evolução teórica a Geografia não se preocupou

devidamente com este aspecto. Como observou Armando

Correia da Silva, a totalidade “[...] se manifesta na articulação

ontológica dos pedaços”, compreendendo que uma coisa só tem

status ontológico quando existe (HARVEY, 1980), numa visão

totalizante em que as partes só têm existência dentro do todo.

Para a Geografia, esse entendimento aponta, em primeiro

lugar, a real necessidade de um conceito de espaço que consiga

incorporar esses aspectos de maneira coerente, sem perder de

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

vista a identidade geográfica. No contexto em que Milton Santos

formulou sua primeira proposta de método de maior

repercussão, ou seja, no livro “ Por uma Geografia Nova” (1978,

2004), esse era um dos grandes problemas. Não foi por acaso

que esse autor, em um dos capítulos desta obra, se referiu à

ciência geográfica como viúva do espaço, ressaltando, dessa

forma, que este conceito, que é o core  da geografia, ainda não

havia recebido a devida atenção dos geógrafos.

Em 1996, em sua obra mais madura, Santos afirma que o

Espaço Geográfico deve ser considerado como “[...] um

conjunto indissociável, solidário e também contraditório de

sistemas de objetos e de sistemas de ações [...]” (SANTOS,

2009a, p.51). Coroando essa ideia, ele apresenta, também, a

concepção de espaço banal, considerado o espaço de todos os

homens não importando as diferenças entre eles. Seria das

instituições, sem importar sua força. O espaço das empresas, não

importando seu poder (SANTOS et al, 2000, p.2), inspirado em

François Perroux2.

2 Segundo Silveira (2010), no tempo em que se privilegia uma Geografia dos

 pontos, onde se destaca apenas os atores hegemônicos, este conceito leva emconsideração todos os agentes justamente porque trabalha com a noção detotalidade.

 

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Lefebvre (1983), em seu livro “Lógica Formal/Lógica

Dialética”, deixa claro que para se chegar ao conhecimento pleno de qualquer objeto, o único caminho é a análise que

implica, inevitavelmente, a decomposição, pois, a mera

contemplação enquanto todo não permite compreender suas

estruturas e leis de funcionamento. Nessa concepção, a

fragmentação da totalidade é inerente à tarefa analítica. Como se pode notar nas palavras do próprio autor, “[...] a análise  se

esforça por penetrar no objeto. Oposta a toda contemplação

 passiva, ela não respeita esse objeto” (LEFEBVRE, 1983, p.117.

Grifo do autor).

 Neste sentido, Kosik (1976) está plenamente de acordo evai mais além ao destacar que a fragmentação se torna condição

 sine qua non para alcançar a realidade concreta, a qual o autor

se refere como a “coisa em si”, e, por conseguinte, é enfático ao

dizer que “sem decomposição não há conhecimento”. Nesta

 perspectiva, a cisão da totalidade é uma questão metodológicacrucial quando se trabalha num viés dialético. Conforme

acrescenta o autor,

A característica precípua do conhecimentoconsiste na decomposição do todo. Adialética não atinge o pensamento de fora

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

 para dentro, nem de imediato, nem

tampouco constitui uma de suas qualidades;o conhecimento é que é a própria dialéticaem uma das suas formas; o conhecimento éa decomposição do todo (1976, p.14).

As contribuições que estes autores trazem permitem

outra compreensão no que se refere à categoria totalidade na

Geografia, ou seja, incorporar uma visão holística significa, ao

mesmo tempo, procurar maneiras de fragmentar o todo se a

 pretensão for ultrapassar a mera descrição. É importante, então,

dizer que a Geografia miltoniana tem muita influência destes

autores.

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 Não obstante, os recortes dados ao objeto, necessários ao

conhecimento, encontram suas explicações dentro da totalidade,inatingível enquanto tal, posto que

[...] os fatos isolados são abstrações, sãomomentos artificiosamente separados dotodo, os quais só quando inseridos no todocorrespondente adquirem verdade e

concreticidade. Do mesmo, o todo de quenão foram diferenciados e determinados osmomentos é um todo abstrato e vazio(KOSIK, 1976, p.41).

Esse ir e vir entre as partes e o todo reforça o

entendimento proposto por Kosik quando ressalta a necessidade

de se considerar a dialética como um movimento em espiral, que

vai da contradição à totalidade e desta à contradição. Esse

método, segundo Gurvitch (1987), mantém o pesquisador em

alerta, pois também vai da afirmação à negação.

Por isso, a análise de determinados aspectos da realidade

deve ser remetida ao contexto que os geraram, dado que “[...]

todo conhecimento parcial ou isolado dos homens ou de seus

 produtos deve ser superado em direção da totalidade ou ser

reduzido a um erro por parcialidade” (SARTRE, 1978, p.112).

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Esse quadro metodológico tem como evidente que não há o todo

sem as partes e vice-versa. Ou seja,

a fragmentação do real e a mente divididasão complementos de uma mesma

 possibilidade: a dimensão ôntica do método.Este se põe, assim, como síntese da análise eanálise da síntese, num movimento

intelectivo que vai do todo à parte e desta aotodo (SILVA, 2000, p.12).

Em sintonia com este pensamento, Lefebvre (1983)

argumenta que análise e síntese devem ser utilizadas de maneira

indissociáveis, pois não se trata de uma simples

complementação de uma para com a outra. Na verdade, no dizerdo autor, a análise só tem sentido porque o real se apresenta de

maneira sintética, enquanto a síntese se faz necessária, uma vez

que a totalidade une momentos contraditórios.

Desta forma, para se chegar à “coisa em si”, à luz do

grande legado marxista de análise e síntese, o esforço envolveos movimentos do pensamento tentando esposar a realidade

concreta.

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 Nesse caminho,

 parte-se do abstrato pensado e pela análise esíntese chega-se ao concreto pensado. Oconcreto, portanto, não se confunde com oempírico embora o envolva. O concreto [...]é concreto porque é síntese de múltiplasdeterminações, isto é, unidade do diverso(VALE, 2001, p.11).

Com efeito, a totalidade sócioespacial num viés

miltoniano, onde coexistem diferentes objetos com diferentes

usos, nos desafia, provoca. Analisá-la e apreendê-la supõe o

domínio de categorias. Certamente, o que deve balizar a escolha

de tais categorias é o movimento real das estruturas internas do

objeto, isto é, a “dialética do concreto”, na denominação de

Kosik (1976). Em outras palavras, o processo de análise deve

expressar a essência dos fenômenos espaciais. Para tanto, a “[...]

análise dever ser “concreta”: se ela “quebra” o objeto, e o nega,

deve quebrá-lo de um modo tal que convenha apenas a esse

objeto” (LEFEBVRE, 1983, p.120. Grifos do autor).

Contudo, para ser eficaz, o método, indubitavelmente,

 precisa esposar as texturas do atual período histórico, definido

 por Milton Santos como meio técnico-científico-informacional.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Precisa explicar o que, paradoxalmente, parece inexplicável, ou

seja, as contradições do atual período.

 Não se trata aqui de uma simples descrição dos

fenômenos, mas da busca pelo entendimento da sua própria

razão de ser, da sua essência. Trata-se, a rigor, da tentativa de

compreensão da realidade não fragmentada, mas constituída do

todo e de suas partes. Vê-se, assim, tratar-se de uma realidade

complexa, de uma compreensão que apenas a dialética permite

ter.

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UMA BREVE CARACTERIZAÇÃO DO PERÍODO HISTÓRICO

ATUAL

O período histórico atual, muito distinto dos que os

 precedeu, tem como fundamento marcante o tripé técnica,

ciência e informação, sendo por isso denominado por Milton

Santos de meio Técnico-Científico-Informacional, no dizer do

autor (2009b), a expressão geográfica da globalização. Esta proposta emerge nas formulações do autor como resultado de

uma periodização dividida em três períodos: meio natural,

técnico e técnico-científico-informacional. Cada um deles é

definido por um sistema técnico especifico que, por sua vez,

autoriza determinadas formas de fazer, isto é, de organizar,concomitantemente, a sociedade e o território.

Ancorado neste pensamento é que se pode afirmar que a

técnica, na atualidade, passa a ser solidária universalmente, de

tal maneira que é possível estar presente em cada lugar de forma

 potencial. A velocidade de difusão desse novo sistema técnico, pautado nas possibilidades das telecomunicações, o que permite

sua unicidade (SANTOS, 2006), abala todas as facetas do

cotidiano, introduzindo e fazendo surgir diversas racionalidades

em todos os lugares. A racionalidade hegemônica, com a

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

intolerância do “pensamento único”, se defronta com diversos

contextos nos lugares, donde emergem outras formas de fazer,

 pautadas na pluralidade econômica, cultural como também

espacial.

Para os agentes de maior poder de atuação, mormente as

grandes empresas, a ciência é o motor do desenvolvimento, o

trabalho intelectual ganha importância primária e as

informações em massa se processam vertiginosamente. Esses

são os principais fatores que resultam na eficácia das ações

desses agentes. Sobre a informação, Santos (2006) adverte ser

uma informação não face a face, mas mediada, preparada e

servida pelos atores hegemônicos do sistema.

O processo de globalização é entendido por Santos

(2009a) como ápice da internacionalização do capital, visto que

se concretiza a pretensão do capitalismo de tornar-se um sistema

mundial. Isso quer dizer que as texturas atuais diferem da

internacionalização, pois esse novo processo, que ganhou corpo

a partir do fim da Segunda Guerra Mundial, gerou grandes

metamorfoses no espaço enquanto totalidade, com implicações

diretas nos lugares que passam a ser reflexos do mundo,

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impedindo que espaços distantes fiquem isolados e causando um

hibridismo cultural nunca antes presenciado na história humana.Sob a égide de uma nova divisão do trabalho, em que a

informação desempenha um papel singular, o território se

transforma para cooperar com os atores hegemônicos. Para

Santos e Silveira (2005), as mudanças são percebidas até mesmo

na arquitetura dos objetos, que tendem a ser cada vez maistécnico-científico-informacionais.

Esse mesmo processo permite articular as diversas partes

que compõem a totalidade, alargando contextos e encurtando

distâncias, pois as tecnologias de ponta geram novas

 possibilidades de fluidez, base de expansão e de intercâmbio.Há, a todo momento, uma grande circulação de pessoas,

mercadorias e, sobretudo, de informações, ainda que a

intensidade varie de uma região para outra, pois irá depender

das possibilidades técnicas e políticas disponíveis.

Em outras palavras, o meio técnico-científico-informacional, enquanto configuração territorial da

globalização, não se apresenta de forma homogênea no espaço

visto como totalidade. Deveras, algumas parcelas do território

são dosadas com maior intensidade pelas variáveis do período,

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

autorizando assim ações comandadas pelos agentes

hegemônicos (SILVEIRA, 2009). Desse modo, a divisão

territorial do trabalho dos dias de hoje aprofunda as

desigualdades entre os lugares, de modo que as diferenças

socioespaciais tornam-se mais nítidas, haja vista que não são

mais um dado natural, mas da “segunda natureza”, como

chamara Marx, inserida no movimento da totalidade social.

Contudo, a globalização não é conhecida por todos

(SOUZA, 2008), sendo, sobretudo, um processo paradoxal e

fragmentador, pois, ao tempo em que cria novas possibilidades é

uma fábrica de perversidades. Esta nova fase da acumulação

capitalista tem na informação e nas finanças duas de suas

 principais representatividades (SILVEIRA, 2009). Assim, para

Santos,

A mundialização que se vê é perversa [...].Concentração e centralização da economia edo poder político, cultura de massa,

cientifização da burocracia, centralizaçãoagravada das decisões e da informação, tudoisso forma a base de um acirramento dasdesigualdades entre países e entre classessociais, assim como da opressão edesintegração do indivíduo (1997, p.17).

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As possibilidades trazidas pelo processo de globalização,

como a de tudo conhecer num curto lapso de tempo, têm seapresentado apenas como fabulações para a grande maioria das

 pessoas, pois as contradições no tocante à distribuição do capital

se acentuam e as perversidades impostas podem ser vistas em

todos os lugares (SANTOS, 2006). Se por um lado os sistemas

de engenharia modernos, juntamente com as ações velozes queos animam, são aspectos representativos da época, por outro, a

escassez das necessidades mais básicas para grande parte da

sociedade grita a essência contraditória da mesma.

Mas, retomando a questão da técnica, é necessário

compreender a particularidade atual que, aliada à ciência, é a principal responsável pelas rápidas e grandes mudanças

 presenciadas a partir do segundo pós-guerra3.

3  Na vasta obra de Milton Santos o papel que a técnica desempenha é central.

O autor a encara de forma abrangente, ou seja, enquanto “fenômeno técnico”.Essa perspectiva tem como corolário que é necessário considerar todas asmanifestações técnicas, inclusive a técnica da própria ação.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Em “ A Natureza do Espaço” ,  Santos (2009a) assinala

que no decorrer da história as diversas sociedades se utilizaram

de diferentes técnicas para intervenção no ambiente físico, com

o intuito de suprir as necessidades de sobrevivência, o que

desenvolve, paulatinamente, um avanço que, na realidade, não

era contínuo. Tal avanço nas técnicas, objetivando maior

utilização da natureza, resultou na complexidade de algumas

sociedades. Essa complexidade se revela, sobretudo, na forma

de organização e distribuição do trabalho.

Assim, depreende-se que o avanço no conjunto das

técnicas (re)define o andar da sociedade, posto que, gera novas

 possibilidades até então desconhecidas. Entretanto, o conjunto

de técnicas utilizadas em períodos anteriores não era o mesmo

em todos os lugares, ou seja, se na Europa dominava-se as

técnicas de navegação, aqui na América os índios não

imaginavam a existência de um objeto muito pesado, mas que

flutuava sobre as águas.

É importante ressaltar que a expansão do sistema

capitalista resultou na grande difusão das técnicas, que agora

 possui características singulares. Para Santos, “[...] essa técnica,

cuja realização se tornou relativamente independente, é chamada

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 pesquisa” (1985, p.27). Essa “[...] técnica de fazer técnica” é o

grande “pincel que desenha” o espaço geográficocontemporâneo. Pois,

 por meio das comunicações, o período afetaa humanidade inteira e todas as áreas daterra. Espaços que escapamtemporariamente às forças são raros nestafase da história. As novas técnicas,

 principalmente aquelas para processar eexplorar inovações, trazem, como nuncaantes, a possibilidade de dissociaçãogeográfica de atividades (SANTOS, 1985,

 p. 28).

A técnica universalizou as relações, os gostos, o

consumo, as culturas e tantas outras coisas mais (SANTOS,1997). Mais que isso, o que se presencia, principalmente nas

metrópoles, é a “sucessão alucinante dos eventos”, para usar

uma expressão miltoniana. Vive-se, hoje, o ápice da

concentração do capital e ao mesmo tempo da busca frenética

 pelo seu domínio. A riqueza convivendo, paradoxalmente, lado

a lado com a pobreza, o que se poderia chamar de “doença desse

 período histórico”.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Compreender o lugar, nesse contexto, supõe

(re)conhecer que este se tornou, ao mesmo tempo e

estranhamente, singular pelas influências do contexto e

mundializado por ser ele mesmo receptáculo das possibilidades

trazidas pela globalização. Nesse sentido, a noção de lugar-

mundo e mundo-lugar deve perpassar a todo tempo o

entendimento do espaço contemporâneo.

Balizado pela própria condição de ser parte e, também, o

todo que compõe, dialeticamente, o espaço, o lugar emerge

como categoria capaz de sintetizar a complexa ligação do todo e

suas partes. Trata-se de uma categoria síntese das condições

materiais e das ações que compõem, indispensavelmente, o

espaço geográfico. Assim, pensar essa categoria a partir do

método miltoniano de análise pressupõe uma possibilidade real

de compreensão

Em meio a toda essa complexidade, novas e grandes

 problemáticas se colocam à Geografia; e a análise descritiva que

vê o território como simples palco das ações humanas é, no

mínimo, insuficiente, posto que esta ciência tem a enorme e

difícil tarefa de compreender os processos de desigualdade que

se acentuam nesse período da globalização, tarefa alcançada

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apenas com o rigor metodológico necessário, pois, as questões

que caracterizam o espaço atual não podem ser desconsideradasno fazer científico.

Portanto, a definição de um método capaz de dar conta

da análise geográfica nesse contexto precisa considerar,

sobretudo, a atualidade e o movimento. Do contrário, será

insuficiente ou correrá o risco de ficar desatualizado antesmesmo de sua aplicabilidade.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

A RE)EMERGÊNCIA DO TERRITÓRIO NO PERÍODO DA

GLOBALIZAÇÃO

Conforme fica evidente, refletir atualmente acerca do

 propósito da Geografia e, particularmente, dos principais

conceitos e categorias que a balizam, emparelhando os

 processos do mundo do presente, pressupõe rigor

epistemológico. Esse rigor perpassa, sobretudo, pelo próprio

questionamento do método.

Com a intensificação do processo de globalização e as

(re)modelações que ele causa no conteúdo dos lugares, por

intermédio de nexos extra-locais ou extra-regionais, muitas

vezes pautados no capital internacional, o debate sobre território

tem merecido destaque na Geografia. Em face das

transformações nas instâncias política, econômica e cultural que

caracterizam o período em marcha, a questão do território

(re)emerge fundamentada em outros paradigmas que não os

“deixados” pela modernidade, pois, certamente, não está imune

a tais mutações.

 Na verdade, o território ganha novas configurações,

agregando sistemas de engenharia complexos para atender aos

ditames do capital, sendo assim preparado, material e

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 juridicamente, para o mercado. Contudo, devido à seletividade

espacial desses vetores, emergem outras racionalidades,calcadas em outras maneiras de ver e praticar o território.

Por conseguinte, assevera Silveira (1999), os lugares

atualmente, e, sobretudo, as grandes cidades, podem ser

 pensados como superposição de diferentes divisões territoriais

do trabalho, diferentes lógicas, diferentes valores e escalas, mastambém distintas ideologias e discursos.  Neste sentido, Santos

(2009) deixa claro que a Globalização não se realiza sem o meio

Técnico – Científico – Informacional, que é sua expressão

geográfica. Em 1992, quando o debate sobre o tema começou a

tomar corpo, esse autor já chamava atenção para esse fato comas seguintes palavras: 

A fase atual, chamada também de períodocientífico, do nosso ponto de vista

 particular, é, em primeiro lugar, a fase naqual se constitui, sobre territórios cada vezmais vastos, o que se chamará de meio

científico-técnico, isto é, um momentohistórico no qual a construção ou areconstrução do espaço se dará com umconteúdo de ciência e de técnica (SANTOS,1992, p.14).

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Ou seja, as diversas lógicas e valores difundidos pelas

variáveis do período não se realizam alheios ao território, daí a

importância desta categoria. O espaço como instância da

sociedade, imprescindível ao funcionamento do mundo, é o

 princípio de método adotado. Isso quer dizer que a compreensão

do território é imperativa para entender os novos valores, escalas

e ideologias, bem como a questão da cidadania.

 Neste contexto, em 1994, Milton Santos falava do

 Retorno do Território  para ressaltar a importância que este

conceito teria na interpretação do período histórico atual.

Contrariamente às leituras que concebem território como mera

divisão político-administrativa ou simples palco das ações

humanas, as possibilidades reais de compreensão das texturas

atuais acenam à outra perspectiva, pois,

é o uso do território, e não o território em simesmo, que faz dele objeto de análisesocial. Trata-se de uma forma impura, um

híbrido, uma noção que, por si mesmo,carece de constante revisão histórica. O queele tem de permanente é ser nosso quadro devida. Seu entendimento é, pois, fundamental

 para afastar o risco de alienação, o risco da perda do sentido da existência individual ecoletiva, o risco de renúncia ao futuro(SANTOS, 1994, p.5).

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Com efeito, o complexo quadro de heterogeneidade

socioespacial exige uma maior preocupação com este conceitotão caro à Geografia, visando discutir de maneira mais

aprofundada os processos contraditórios dessa nova fase da

acumulação capitalista. Depreende-se, portanto, que uma noção

de território fundada no método dialético pode contribuir com

este propósito.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

O TERRITÓRIO USADO COMO CONSTRUÇÃO DIALÉTICA

O território, usado como lei do real e lei do pensamento

(LEFEBVRE, 1983), ou seja, como “concreto pensado” na

acepção marxista, onde o real é expresso num sistema de ideias,

está fundamentado no método dialético. Assim, enxerga-se o

território de maneira conjunta, apesar da grande diferença entreos diversos agentes que o usam desigualmente, explicitando

assim vários projetos sociais. Por isso, pode revelar realmente

como a sociedade está organizada, pois

[...] incluye todos los actores y noúnicamente el Estado, como en la acepción

heredada de la modernidad. Abriga todos losactores y no sólo los que tienen movilidad,como en la más pura noción de espacio deflujos. Es el dominio de la contigüidad, y nosolamente la topología de las empresas ocualquier otra geometría. Se refiere a laexistencia total y no sólo a la noción deespacio económico. Incluye todos losactores y todos los aspectos y, por ello, essinónimo de espacio banal, espacio de todaslas existencias. La historia se produce contodas las empresas, todas las instituciones,todos los individuos, independientemente desu fuerza diferente, apesar de su fuerzadesigual (SILVEIRA, 2008, p.3).

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 Nesta perspectiva, o território como base material da

vida, um conjunto de objetos, não tem significado em si mesmo, pois quem o atribui valor é a sociedade. Porém, como a

globalização tornou mais nítida a desigualdade espacial, a partir

de espaços opacos  e luminosos, cria-se uma tendência a

desprezar os agentes de menor poder de atuação no território.

 No entanto, como mostra Ortega y Gasset (1973), o“uso” é coletivo, isto é, um atributo da vida em sociedade, da

“gente”, jamais individual. Nesse sentido, trabalhar com alguns

agentes, num contexto de desigualdades como o atual, como se

fossem a totalidade do território, significa trabalhar com uma

noção abstrata, desprovida de valor explicativo real(SILVEIRA, 1995).

Por outro lado, o território usado expressa as diferentes

intencionalidades que coexistem, mesmo frente à difusão de um

“pensamento único” da globalização perversa (SANTOS, 2006).

Assim, é sinônimo de espaço geográfico “[...] que pode serconsiderado como a junção de materialidade e vida social”

(SILVEIRA, 2010, p.74). Só a partir dessa hibridez composta

 por objetos e ações, indissociavelmente, é possível pensar o

contexto dos dias de hoje, uma vez que “afirma-se, ainda mais, a

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

dialética no território e, ousaria dizer, a dialética do território, já

que usado o território é humano, podendo, desse modo,

comportar uma dialética” (SANTOS, 1994, p.8).

Para Milton Santos, “o território usado, visto como uma

totalidade, é um campo privilegiado para a análise, na medida

em que, de um lado, nos revela a estrutura global da sociedade

e, de outro lado, a própria complexidade do seu uso” (SANTOS,

2000, p.09). Desta forma, o autor deixa claro que este conceito

não concebe o território como algo estático. “[...] é tanto o

resultado do processo histórico quanto a base material e social

das novas ações humanas” (Idem, p.02).

Destarte, Melgaço (2008) compreende que o conceito de

território usado é o que mais consegue expressar os elementos

do método dialético, por levar em conta a totalidade, a

contradição entre as partes e o movimento constante de

transformação. Não se trata aqui de ver estes três principais

elementos do método dialético de maneira isolada para

compreender o movimento concreto das variáveis do período

técnico-científico-informacional porque isso significaria negar o

 próprio método. Conforme ressalta Kosik:

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O progresso da abstratividade àconcreticidade é, por conseguinte, em geralmovimento da parte para o todo e do todo

 para a parte; do fenômeno para a essência eda essência para o fenômeno; da totalidade

 para a contradição e da contradição para atotalidade; do objeto para o sujeito e dosujeito para o objeto (KOSIK, 1976, p.30).

Esse movimento circular demonstra que a apreensão da

realidade em todas as suas manifestações é algo complexo,

mormente em face dos processos atuais. Portanto, os novos

arranjos conferidos aos lugares colocam também outras

 preocupações para pensá-los. A questão das novas escalas,

ideologias e discursos que se superpõem nos lugares, bem como

a cidadania não podem ser discutidas fora da perspectiva

totalizante, isto é, sem o território visto como um todo dialético,

o território usado.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

EM BUSCA DA OPERACIONALIDADE

Conforme pontuado ao longo dessa discussão, a

incorporação do método dialético à ciência geográfica sugere o

uso de conceitos adequados que consigam expressar a totalidade

das relações socioespaciais contraditórias. Tais conceitos

 precisam estar sintonizados com as características do meio

técnico-científico-informacional e, ademais, permitirem

caminhar da totalidade à análise.

Em outras palavras, a questão que se coloca é como,

diante dos desafios concretos que a história põe nesse começo

de século, aplicar o conceito de território usado e outros

subjacentes a esta proposta. Essa é a busca por operacionalidade

da teoria da qual falava Silveira (2001). Com essa preocupação

Milton Santos indica que

[...] um caminho possível seria partir datotalidade concreta como ela se apresentanesse período da globalização  –   uma

totalidade empírica  –   para examinar asrelações efetivas entre a Totalidade-Mundoe os Lugares. Isso equivale a revisitar omovimento do universal para o particular evice-versa, reexaminando, sob esse ângulo,o papel dos eventos e da divisão do trabalhocomo uma mediação indispensável (2009a,

 p.115).

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Essa abordagem, balizada pelo movimento da totalidade

espacial, reforça o papel dos lugares na interpretação geográficado período atual, pois se fundamenta no pressuposto de que “El

lugar no es un fragmento, es la propia totalidad en movimiento

que, a través del evento, se afirma y se niega, modelando un

subespacio del espacio global” (SILVEIRA, 1995). Ou seja,

mesmo inserido no movimento da globalização que articula olocal com o global, os lugares não se tornam iguais, ao

contrário, suas diferenças são reforçadas e ganham novos

contornos.

É nesse contexto que a noção de evento referenciada pela

autora ganha sentido e, ao mesmo tempo, importância naelucidação dos processos espaciais, posto que

se consideramos o mundo como umconjunto de possibilidades, o evento é umveículo de uma ou algumas dessas

 possibilidades existentes no mundo. Mas o

evento também pode ser o vetor das possibilidades existentes em uma formaçãosocial, isto é, num país, ou num região, ounum lugar, considerados esse país, essaregião, esse lugar como um conjuntocircunscrito e mais limitado que o mundo(SANTOS, 2009a, p.144).

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

 Nessa perspectiva, o tempo é incorporado à compreensão

do espaço geográfico, sendo ele que acentua as desigualdades

entre os lugares que a Globalização propiciou ressaltar. O lugar

é, assim, unidade da diversidade, na medida em que recebe

intensamente determinações externas, mas também impõe uma

dinâmica interna. Eis o comportamento dialético dos lugares no

atual período histórico. Esse papel central do lugar nos dias de

hoje configura o Retorno do Território aludido por Milton

Santos.

A busca por operacionalizar a teoria do espaço

geográfico como um conjunto indissociável de sistema de

objetos e sistema de ações parece ser também a preocupação de

Silveira (1999), quando faz uma releitura da noção de situação

 para aplicá-la à Geografia no contexto atual. A autora nos

mostra como essa ideia, atrelada à de eventos, pode ser eficaz na

compreensão do lugar como uma totalidade no interior da

totalidade mundo e das formações socioespaciais.

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O objetivo principal dessa proposta é enfrentar “[...] a

necessidade de produzir um esquema metodológico que permitaelaborar um retrato dos lugares na história do presente”

(SILVEIRA, 1999, p.22). Em outros termos,

trata-se [...] de cindir a geografia do mundoem subtotalidades, que se tornam estruturassignificativas para cada conjunto de eventos.

Uma cisão da totalidade é uma novatotalidade com um significado, umaestrutura num conjunto mais abrangente,uma estrutura e um sistema porque suarealidade é dada pelo movimento(SILVEIRA, 1999, p.24).

Assim, leva-se em consideração, concomitantemente, o

movimento da totalidade espacial e as singularidades doslugares, dotados de um arranjo particular que é tanto material

como imaterial. Num viés Sartriano (1978), poder-se-ia dizer

que o processo de transformação da totalidade-mundo

desemboca na cristalização desigual de alguns momentos no

âmbito local. Mais uma vez, o conceito de situação geográficase mostra eficaz quando a abordagem é totalizante, pois

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

a situação é um resultado do impacto de um

feixe de eventos sobre um lugar e contémexistências materiais e organizacionais.Inovações técnicas e novas ações deempresas de força diversa, dos váriossegmentos do Estado, de grupos ecorporações difundem-se num pedaço do

 planeta, modificando o dinamismo preexistente e criando uma nova

organização das variáveis (SILVEIRA,1999, p.25).

Por conseguinte, a partir da situação geográfica

evidencia-se como são diversas as ações que atravessam os

sistemas de objetos nos lugares. Assim, fica claro que o

 princípio de método adotado nesse caminho é a história em

 processo refazendo a dinâmica socioespacial do presente. Em

consequência, a noção de situação geográfica está fundamentada

na Dialética do Concreto, uma vez que é substanciada pelo uso

do território nos diferentes contextos, encarnando a diversidade

de ações, intencionalidades, normas, etc. 

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

93

COMO INTERROGAR O LUGAR NO INTERIOR DA

TOTALIDADE MUNDO?

A partir do lugar, com a noção de situação geográfica, a

 proposta de território usado se torna empiricizável, uma vez que

salta aos olhos o entendimento do espaço como “[...] um

conjunto indissociável, solidário e também contraditório de

 sistemas de objetos e de sistemas de ações, não considerados

isoladamente, mas como um quadro único no qual a história se

dá” (2009a, p.51).

Este conceito infere que o espaço possui arranjos visíveis

que se relacionam entre si, com e por meio da sociedade em

movimento. Ou seja, a essência do espaço geográfico é humana,todavia os objetos que compõem a paisagem são necessários à

reprodução social.

 Nesse sentido, os objetos e arranjos de objetos são

construídos, (re)construídos e (des)construídos para atender a

dinâmica social, produtiva e espacial de um dado período passível de contextualização. Os interesses e necessidades da

sociedade variam, qualitativa e quantitativamente, com o passar

do tempo. Com efeito, mudam os objetos bem como as ações.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Com a preocupação de analisar essa totalidade composta

 por objetos e ações, esse autor propõe um leque de categorias

que visam à análise do espaço por intermédio do lugar. Dentre

elas, Forma, Função, Estrutura e Processo merecem destaque,

 pois, no dizer de Silva, “[...] elas fornecem um modelo analítico

concreto num viés dialético-marxista” (2010, p.36). 

Silva (2009), porém, oportunamente nos lembra que é

imprescindível considerar o contexto histórico dessa proposta,

 posto que em Milton Santos o conceito de espaço sofre

alterações significativas, sempre balizadas pelo diálogo com

outros autores, a despeito da prevalência da ideia central. Aqui

depreende-se, em virtude dos caminhos trilhados pelo autor em

suas obras, que Forma, Função, Estrutura e Processo continuam

latentes para interrogar o lugar, considerado-o como um

conjunto indissociável de sistema de objetos e sistema de ações,

ou, como quer Souza (apud   MELGAÇO, 2005, p.37), “[...] a

materialização da ideia abstrata de Território Usado”.

Para Santos (1985), a Forma  é o aspecto visível de uma

determinada coisa. São os objetos e arranjos de objetos que

compõe o espaço, isto é, casas, condomínios, parques, escolas,

avenidas e etc., tudo gerado historicamente, organizando o

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

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 presente e projetando o futuro. A consideração da  Forma  na

análise revela que a sociedade não paira sobre o espaço, isto é,não há sociedade a-espacial. A vida humana em suas diversas

realizações supõe a existência de formas, materialidade, por isso

esta categoria se torna tão importante para assimilar a dinâmica

sócio-espacial.

Evidentemente ela não revela tudo, posto que nos deixano campo do aparente que é a representação da realidade. Se

“[...] constatar não é compreender” (MELGAÇO, 2007), é

necessário ir além da Forma, ademais porque a realidade como

totalidade não se apresenta à primeira vista (FELICIO, 2008).

A Função   é a atividade desempenhada pela forma. Eladá sentido à forma visto que um objeto no espaço não subsiste

desprovido de tarefa e, por outro lado, a tarefa não pode ser

desempenhada sem a  Forma, daí a relação direta entre as duas.

Mais tarde, Santos introduz a noção de forma-conteúdo para

demonstrar a íntima relação que existe entre Forma e Função.Um terceiro aspecto da análise é a Estrutura . Santos

assinala que “[...] estr utura implica a inter-relação de todas as

 partes de um todo; o modo de organização ou construção”

(1985, p.50). É o aspecto “invisível” construído pela inter -

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

relação das diversas funções desempenhadas pelas/nas formas.

Como ensina Ortega Y Gasset “[...] las cosas trabadas en una

relación forman una estructura (p.50). Por isso, para

compreendê-la é preciso sempre considerar a dinâmica social de

cada período.

A estrutura espacial de um dado lugar é o resultado da

interação de várias estruturas que subsistem indissociavelmente.

Como nos lembra Santos,

a estrutura espacial é algo assim: umacombinação localizada de uma estruturademográfica específica, de uma estrutura de

 produção específica, de uma estrutura de

renda específica, de uma estrutura deconsumo específica, de uma estrutura declasses específica e de um arranjo específicode técnicas produtivas e organizativasutilizadas por aquelas estruturas e quedefinem as relações entre os recursos

 presentes (1985, p. 17).

Para apreensão da realidade, a geografia não pode se

interessar mais pela forma das coisas do que pela sua formação.

Por isso, outro fator inerente ao estudo do espaço, que nos

 permite ter em consideração o movimento, é o Processo . Este

seria o constante devir   social que constrói, (re)constrói e

(des)constrói as formas ao longo da história. O  Processo  é

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dinâmico, ou seja, processa e é processado, modifica e é

modificado. É ao mesmo tempo resultado e condição da história.Desse modo, o estudo do processo se faz necessário na

medida em que se busca entender a gestação das formas, o que

facilitará a compreensão das funções por elas exercidas. Nesse

sentido, a história se constitui numa ferramenta muito

importante a qual é preciso recorrer constantemente.À primeira vista, o geógrafo pode ser induzido a estudar,

 pura e simplesmente, a forma. Porém, não se pode separá-la

concreta e conceitualmente das demais categorias sob pena de

não se compreender a contento os diversos aspectos que compõe

o espaço. Afinal, como afirma Santos,Para se compreender o espaço social emqualquer tempo, é fundamental tomar emconjunto a forma, a função e a estrutura,como se tratasse de um conceito único. Nãose pode analisar o espaço através de um sódesses conceitos, ou mesmo de umacombinação de dois deles. Se examinarmosapenas a forma e a estrutura, eliminando afunção, perderemos a história da totalidadeespacial, simplesmente porque a função nãose repete duas vezes. Separando estrutura efunção, o passado e o presente sãosuprimidos, com o que a ideia detransformação nos escapa e as instituiçõesse tornam incapazes de projetar-se no

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

futuro. Examinar forma e função, sem a

estrutura, deixa-nos a braços com umasociedade inteiramente estática, destituídade qualquer impulso dominante. Como aestrutura dita a função, seria absurdo tentaruma análise sem esse elemento (1985, p.56).

Assim, forma, função, estrutura e processo, este último

sinônimo de tempo, quando consideradas em conjunto impedem

a compreensão superficial e descritiva dos fenômenos, que

ignora sua essência e, por conseguinte, deve ser evitada,

sobretudo mediante a dinâmica do processo de globalização.

Portanto, esse método constitui uma base forte que auxilia o

Geógrafo na leitura e interpretação da realidade. Trata-se,

 portanto, de uma ferramenta eficaz na construção/desconstrução

de uma discussão teórica mais sólida, coesa e o mais importante

 pautada numa metodologia que é, antes de tudo, a busca de uma

outra Geografia.

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Terceira Parte

A Práxis

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

AS PRÁTICAS DE OCUPAÇÃO DE VAZIOS URBANOS PELOS

MOVIMENTOS DE SEM-TETO DE MACEIÓ, ALAGOAS

4

 

Comumente, os estudos sociológicos têm tratado os

movimentos sociais, bem como as demais ações humanas, como

se estes estivessem descolados do espaço, e mais

especificamente, do território. Sem em uma precisa

contextualização temporal e espacial a análise se apresenta

empobrecida e, muitas vezes, deturpada. Por isso entendemos

que não se trata somente de historicizar, mas também de

espacializar. Tampouco se trata somente de descrever, mas de

analisar dialeticamente. Assim, a partir de Santos et al.

(2000), propomos uma análise centrada no uso do território  a

fim de contextualizarmos as disputas, os conflitos e as

negociações em torno do uso da cidade no que se refere a

questão habitacional.

4 Texto organizado por Carlos Eduardo Nobre com base na sua Dissertação intitulada

“A Emergência de Outras Racionalidades: As Ocupações de Vazios Urbanos pelosMovimentos de Sem-Teto de Maceió - Alagoas (1999-2009)”. Carlos Eduardo Nobreé Graduado em Geografia e Mestre em Arquitetura pela Faculdade de Arquitetura eUrbanismo da Universidade Federal de Alagoas e Professor da Universidade Estadualde Alagoas. 

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101

 No Brasil, o direito à moradia é reconhecido

 juridicamente através do artigo 6º da Constituição Federal de1988. O artigo 2º, inciso I, da lei 10.257/2001, intitulada

 Estatuto da Cidade, dispõe que “a política urbana tem por

objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais

da cidade e da propriedade urbana, mediante [...] garantia do

direito [...] à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental,à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao

trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações [...]”. 

 No entanto, constatamos, no cotidiano das cidades

 brasileiras, que esses direitos não são universalmente garantidos,

visto que grande parte da população urbana não dispõe dessesatributos espaciais e, em um caso extremo, não dispõe de

moradia. Nesse sentido há uma contradição entre o que exige a

lei e o que existe na realidade no que toca o direito à moradia.

Essa contradição não é de fácil apreensão, mas talvez seja

 possível fazê-la através da análise do uso do território a partir daleitura das práticas espaciais, engendradas por distintos agentes

sociais, a fim de se compreender esse processo contraditório

entre inclusão e exclusão. Nesse sentido, destacamos, de modo

geral, três práticas espaciais que entendemos serem úteis a

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

compreensão da exclusão socioespacial, mais especificamente,

da exclusão habitacional.

A primeira diz respeito à política urbana que não

incorpora, salvo raras exceções, os princípios sociais contidos na

Constituição e no Estatuto da Cidade a fim de promover a

função social da cidade e da propriedade. Ao contrário, a gestão

 pública, através do planejamento urbano, racionaliza o espaço

segundo os interesses e direitos individuais, negando,

constantemente, os interesses e direitos coletivos.

A segunda prática corresponde à apropriação e

manutenção, por agentes públicos e privados, de terrenos e

 prédios desocupados em áreas centrais da cidade reproduzindo a

“escassez” de terra e habitação, favorecendo a especulação

imobiliária ao tempo em que nega à população pobre o direito

de acesso e uso dos vazios urbanos para fins de habitação de

interesse social.

A terceira prática consiste na reprodução do uso privado

e desigual do espaço urbano em detrimento do uso coletivo

igualitário em que seja salvaguardado o direito à moradia e aos

demais atributos espaciais.

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103

Essas práticas apresentadas correspondem ao uso

corporativo do território urbano e respondem a uma lógicaeconômica global que contraria as necessidades sociais locais.

 Nesse sentido, existe um conflito entre interesse econômico e

interesse social em torno do uso de determinados espaços da

cidade destinados a fins habitacionais. Nesse processo de

dominação corporativa da cidade, restou à parcela da população,excluída da lógica econômica de acesso a terra e à habitação,

desenvolver táticas para suprir suas necessidades de moradia.

Alguns aderem a soluções próprias como a autoconstrução e a

ocupação de áreas inadequadas à habitabilidade. Outros se unem

e formam movimentos sociais que passam a atuar na cenaurbana a partir de uma multiplicidade de protestos contra o uso

corporativo do território urbano ao tempo em que reivindicam

 políticas públicas de combate à especulação e ao déficit

habitacional.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Talvez, as formas de protesto e reivindicação de moradia

que se tornaram mais evidentes a partir da década de 1990 e

com capacidade transformativa das relações político-espaciais

tenham sido as ocupações de vazios urbanos por sem-teto. Os

sem-teto de várias cidades brasileiras, excluídos dos benefícios

urbanos ou sem condições rentáveis para aquisição de terra e

habitação, formaram redes de movimentos sociais, com o

objetivo de exigir dos poderes públicos o uso de terras e prédios

desocupados para habitação de interesse social. Assim, foram

desenvolvidas táticas e estratégias de ocupação desses vazios

urbanos, contrariando à lógica hegemônica de apropriação

dominante desses objetos espaciais.

 Nesse sentido, é que ocorre a disputa pelo espaço urbano

seguida do conflito que envolve poder, proprietário, gestores

 públicos, movimentos de sem-teto e agentes da justiça. O fato é

que os gestores públicos negam constantemente estas práticas de

ocupação dos sem-teto como alternativa de luta reivindicatória,

de modo que deslegitimam constantemente a luta pelo direito à

moradia e ao lugar, reafirmando o interesse em manter as

 práticas de dominação seguidas da exclusão socioespacial.

Outro problema é o fato de que a memória das lutas

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105

reivindicatórias muitas vezes não é reconhecida pelos gestores

 públicos, principalmente aqueles a serviço das classesdominantes, de modo que as conquistas e as ações dos

movimentos sociais urbanos passam a não fazer parte do

 planejamento e das políticas públicas.

É desse modo que o poder público, apesar dos discursos

 progressistas e dos avanços jurídicos e políticos da últimadécada, no campo do planejamento e da gestão urbanos, acaba

 por reproduzir as práticas históricas e conservadoras como a

 periferização da população pobre acompanhada do não

atendimento das necessidades socioespaciais básicas. Apesar da

generalização da questão, entendemos que cada cidade em queocorre ocupação de vazio, bem como cada ocupação requer uma

compreensão histórica e espacial particular. Nesse sentido,

resolvemos estudar as ocupações de vazios urbanos pelos

movimentos de sem-teto de Maceió, Alagoas, a fim de

compreendermos melhor as reivindicações, os protestos, osconflitos e as formas de organização e de manifestação desses

movimentos na cena urbana.

Entendemos que a descrição, a análise e a crítica

contextualizada desses atos políticos bem como dos agentes

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

envolvidos nos conflitos podem contribuir para o

reconhecimento das formas de apropriação, organização e

gestão do espaço habitado de Maceió, de modo que outras

 possibilidades de uso da cidade, baseadas no ideário de justiça

social, possam ser consideradas.

As práticas dos movimentos sociais na luta pelo direito à

moradia e no contexto do uso desigual do território

Antes de explorar o tema, é preciso definir o que estamos

chamando de movimentos sociais neste trabalho.

Compreendemos esta categoria movimento social não em seu

termo amplo, mas específico, isto é, preocupamo-nos com os

movimentos de sem-teto que atuam na cena urbana através deuma multiplicidade de protestos e reivindicações que objetivam,

 para além do reconhecimento e efetivação do direito à moradia,

uma transformação nas formas de uso econômico da cidade

calcada no ideário de justiça urbana.

Também devemos prestar uma definição mais precisa aoque chamamos de movimentos de sem-teto. Frente à

complexidade com que se registra a conformação de tais

movimentos, é preciso entender que um movimento de sem-teto

não é composto apenas por sujeitos sem uma casa propriamente

dita. A atual concepção de moradia sugere que para além da

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

O fato é que, atualmente, as cidades têm se tornado

receptáculo de interesses econômicos/hegemônicos que emanam

de uma chamada ordem global (SANTOS, 1998, 2003, 2005,

2008). Assim, os interesses corporativos, de caráter privado, têm

marcado o uso e o funcionamento do território urbano. Pelo fato

dos agentes hegemônicos selecionarem as partes do território

aptas a atenderem seus interesses é que outras partes acabam por

ser excluídas. É por isso que certos direitos fundamentais não

são universalizados, dentre eles, o direito à moradia. Para que tal

fenômeno de segregação ocorra, é preciso que alguns

instrumentos e dispositivos sejam acionados. Assim, destacamos

três instrumentos que corroboram complementarmente para a

exclusão da população conferindo-lhe o status de sem-teto.

O primeiro instrumento diz respeito ao planejamento

urbano tal como ele é, atualmente, praticado no país. É preciso

dizer que o planejamento urbano não é um instrumento

meramente técnico, mas essencialmente político. Assim, ele

tanto pode servir a operações que dêem conta de atender aos

interesses coletivos, como pode servir às operações

exclusivas/seletivas, pautadas por interesses privados. Este

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109

segundo modelo é o que tem orientado a prática planejadora

 brasileira. Nesse sentido, a exclusão habitacional resulta de um

imperativo hegemônico em que os interesses das grandes

empresas e corporações ganham destaque. A terra e a habitação

tornam-se objetos de projetos caros em sua natureza produtiva,

inacessível à parte da população que já sofre com a falta deemprego e renda.

A política habitacional brasileira, pautada num

 planejamento de mercado, atua eficazmente para atendimento do

mercado imobiliário e deficitariamente para o atendimento da

sociedade. Poderíamos falar, portanto, de duas políticashabitacionais: uma voltada à população pobre e outra voltada às

classes ricas. O problema é que a primeira age conforme as

decisões da segunda. Assim sendo, criam-se espaços exclusivos

 para os pobres e espaços exclusivos para os ricos. É dessa forma

que o território urbano é segregado pelo próprio aparelho deEstado.

O segundo instrumento, estritamente relacionado ao

 primeiro, diz respeito ao mercado. A terra e a habitação, com

todos os atributos inerentes à moradia digna, são conferidos não

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

só um valor de uso, mas um valor de troca. Nesse sentido,

aqueles que se apropriam largamente da terra e da habitação

 podem mantê-las vazias a fim de restringir a oferta destes

 produtos no mercado. Assim, com a produção intencional da

“escassez” torna-se possível especular e lucrar. Os valores

destes produtos diferenciam-se conforme a localização. Assim,

quanto mais “digna” for à localização, mas cara são a terra e a

habitação. Nesse sentido, a população pobre é empurrada para

as partes mais desprovidas da cidade, fomentando o processo de

exclusão. Este processo especulativo contribui para a produção

do déficit habitacional e, contraditoriamente, o déficit

habitacional retroalimenta a especulação imobiliária. A

 perversidade do fenômeno encontra-se aí.

Os governos brasileiros, em resposta ao déficit

habitacional, buscam promover a construção de mais unidades

habitacionais. No entanto, a questão do estoque de terras e

 prédios vazios e a regulação do mercado imobiliário continuam

sem respostas práticas. Cabe indagar se o problema é tão

somente de falta de unidades habitacionais, ou se é da falta de

condições de acesso a terra e à habitação (através de uma

 política que regule o preço dos imóveis), ou mesmo de acesso

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111

aos milhares de vazios urbanos que servem tão somente à

especulação imobiliária.O terceiro instrumento, que normatiza e regula as

 práticas acima descritas, diz respeito às normas jurídicas. No

Brasil, constantemente, o direito põe-se a serviço dos interesses

econômicos/privados e contrariam os interesses

sociais/coletivos. É nesse contexto que especuladores eempresas imobiliárias encontram as condições para agir.

Em resposta a estes mecanismos de dominação e

controle e diante das condições precárias de habitabilidade, os

sem-teto brasileiros passam a se organizar em movimentos

sociais para protestar e reivindicar a efetivação de políticassociais urbanas pautadas no direito à moradia. Nesse sentido,

qualquer análise acerca das práticas dos movimentos de sem-

teto deve fazer referência ao contexto descrito anteriormente,

com o risco de anularmos o significado e o sentido da luta. A

análise dever partir, também, da compreensão do atual períodotécnico-científico-informacional como proposto por Milton

Santos (2008) e Santos e Silveira (2005), em que a técnica e o

território se tornam fundamentais à compreensão das práticas

hegemônicas e contra-hegemônicas.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Esse retorno dos sem-teto tem sido marcado pela

capacidade de articulação e organização das ações; pelo

respectivo alcance destas no território urbano e nacional; pelas

transformações jurídicas e institucionais conquistadas; mas,

 principalmente, pelo novo tipo de ação contra-hegemônica que

consiste nas ocupações de terrenos e prédios vazios públicos e

 privados localizados em áreas de interesse econômico.

 No atual período técnico-científico-informacional os

movimentos de sem-teto se apropriam das tecnologias da

informação e se articulam construindo verdadeiros espaços

reticulares, de modo que a abrangência das ações destes

movimentos aumenta consideravelmente pelos territórios

nacional e internacional. Essa apropriação dos objetos técnicos

(internet e telefonia móvel) pelos movimentos de sem-teto

 permitiu uma verdadeira organização política no território

 brasileiro, criando, assim, uma rede de ações contra-

hegemônicas. Agora, os sem-teto também elaboram um tipo de

informação que é privilégio, segredo e poder (típica das relações

hegemônicas) e que possibilita, por exemplo, as ações de

 protesto e ocupações simultâneas de vazios urbanos de

diferentes cidades brasileiras.

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

113

Isto significa uma transformação nas ações políticas dos

movimentos sociais, pois agora é possível articular, planejar eexecutar protestos e ocupações simultâneas e instantâneas que

 jogam com a ordem institutucional e jurídica impostas e travam,

no território urbano, verdadeiros conflitos políticos. Nesse

sentido, ao mesmo tempo em que “os sem” em suas localidades

mantêm relações orgânicas em que prima a comunicação, elestambém criam relações organizacionais em que prima a

informação5.

Esse processo de popularização da tecnologia permitiu a

articulação e unificação de movimentos sociais brasileiros de

diferentes matrizes de racionalidades, de modo que foi possívelexistir em Alagoas fragmentos desses movimentos originados

em outros territórios da Federação.

5  Conforme Santos (2008, p. 339), “a razão universal é organizacional, arazão local é orgânica. No primeiro caso, prima a informação que, aliás, ésinônimo de organização. No segundo caso, prima a comunicação”. 

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

O uso do território pelos movimentos de sem-teto de Maceió,

Alagoas

A luta pela moradia se manifesta cotidianamente. Mas

gostaríamos de chamar a atenção para um tipo de prática que

emerge no final da década de 1990 e adentra a década de 2000, e

que diz respeito às ocupações de terras e prédios “abandonados”

 pelos poderes públicos ou por proprietários privados. No entanto, essas ocupações não ocorrem em qualquer

 prédio ou terreno desocupado. Os sem-teto realizam uma leitura

do território urbano e selecionam os objetos desocupados a

sofrerem ocupações segundo os seguintes critérios:

 

 No caso de prédio, este pode pertencer tanto ao poder público como ser de domínio privado:

 

Prédios do poder público: dá-se preferência àqueles da

União localizados em áreas centrais. Nos centros das

capitais brasileiras há um significativo estoque de

 prédios vazios da União que foram abandonados apósmudanças das instituições para novas áreas. Em Maceió,

 por exemplo, há um prédio do INSS no centro comercial

que foi ocupado por sem-teto durante dois anos e que

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

115

voltou a ser abandonado após despejo ensejado pela

 justiça.

 

Prédios privados: dá-se preferência aqueles com dívidas

de IPTU há mais de anos e que não sofreu aplicação do

instrumento IPTU Progressivo no tempo, tampouco

desapropriação.

 

 No que tange à ocupação de terra urbana, esta também pode pertencer tanto ao poder público como ser de

 propriedade privada.

  Terras públicas: dá-se preferência àquelas de domínio

tanto da União, como de estados e municípios. Busca-se

as terras bem localizadas, infraestruturadas e próximas asáreas centrais, com melhor acessibilidade de transportes.

 

Terras privadas: o critério para seleção e ocupação é o

mesmo que para os prédios privados: devem estar

ociosas e com dívidas de IPTU.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

O que há de comum nestas ocupações é que elas

ocorrem, geralmente, nas áreas centrais, economicamente

 privilegiadas e valorizadas. Esta é uma novidade nas práticas

dos movimentos de sem-teto brasileiros, pois, o que eles

questionam é exatamente o uso econômico destes objetos que

 poderiam servir prioritariamente ao uso social. Questionam e

afrontam, desse modo, as práticas hegemônicas que normatizam

e regulam o uso e o funcionamento da cidade. Propõem,

 portanto, com suas práticas, o rompimento desta lógica. É nesse

sentido que ocorre constantemente o conflito entre interesse

 privado e interesse público. Em outros termos podemos falar de

um conflito entre uma ordem econômica e uma ordem social ou

mesmo de uma ordem externa à cidade e de uma ordem interna

a esta.

O fato é que estes conflitos são, geralmente,

acompanhados por uma criminalização das práticas dos

movimentos sociais. Estes são acusados constantemente de

violar os direitos de propriedade, mas respondem que o que está

sendo violado é o direito à moradia. Um dos lemas do

Movimento União de Movimentos de Luta por Moradia (UMM)

consiste no seguinte: “enquanto morar for um privilégio,

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

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ocupar é um direito”. Este lema traduz o significado e o sentido

da luta dos sem-teto, de modo que suas ações comportam não sóum sentido político, mas também simbólico.

Em síntese, o que estas práticas de ocupação sugerem é

que ao mesmo tempo em que se protesta contra a exclusão

habitacional, reivindica-se o direito de uso dos vazios urbanos

 para habitação da população pobre que, no atual contexto, nãoencontra condições de moradia em localidades apropriadas à

sobrevivência digna. Apontam, ainda, a urgente necessidade de

se (re)pensar as políticas públicas urbanas que devem voltar-se

aos interesses da sociedade, pautadas na efetivação de direitos

reconhecidos e que estão por efetivar-se. Nossa reflexão acercadas ocupações de vazios urbanos pelos movimentos de sem-teto

de Maceió possibilita algumas considerações a partir do que foi

exposto até aqui.

Em Maceió, foram estudadas seis ocupações

empreendidas pelos Movimentos Terra Trabalho e Liberdade(MTL) e União de Movimentos por Moradia (UMM). Frente a

um histórico de reivindicações e conflitos, estas ocupações

sofreram processo de reassentamento pelo poder público e pela

 justiça que não lhe conferiram o direito a permanecerem nos

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

vazios ocupados. As ocupações que ocorreram em áreas

centrais, mesmo de bairros periféricos, com exceção da

ocupação do INSS (que ocorreu no centro comercial da cidade),

foram realocadas para a periferia de Maceió: uma área

desprovida de transporte, escola, postos de saúde e distante de

 possíveis postos de trabalho.

As razões atribuídas pelo poder público para

reassentamento foram inúmeras. Mas ao confrontarmos a teoria

à realidade, constatamos que o principal motivo foi à

valorização imobiliária existente nas áreas ocupadas que iam de

encontro à possibilidade de uso do território por uma população

de baixa renda. O que os poderes públicos buscaram, a não

conceder o direito dos sem-teto permanecerem naquelas

localidades, foi não contrariar os interesses econômicos de

agentes que pretendiam lucrar com as terras.

Como exemplo, citamos a ocupação do Movimento

Terra Trabalho e Liberdade próxima ao shopping Pátio Maceió

antes da construção deste. Esta ocupação ocorreu em um terreno

de domínio do poder público estadual e após a construção do

shopping, os sem-teto foram transferidos para uma área

extremamente desprovida de equipamentos e serviços.

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119

A partir das considerações gerais apresentadas,

reafirmamos o fato de que há uma estreita relação entre gestão pública e interesses privados, visto que o Estado age

fundamentalmente para salvaguardar os interesses econômicos

de proprietários de terras e de agentes imobiliários.

Com relação às ocupações que estudamos em Maceió,

constatamos que o poder público e a justiça agiram no sentidode desfazê-las através de instrumentos jurídicos que despejaram,

em um primeiro momento, e reassentaram em um segundo

momento. Apesar dos sem-teto lutarem pela permanência nas

áreas centrais, mesmo sendo de um bairro periférico,

verificamos que as gestões públicas municipal e estadualreassentaram as populações nas áreas mais escassas dos bairros

 periféricos caracterizadas pela ausência ou incipiência de

infraestrutura e equipamentos de uso coletivo, bem como pela

dificuldade de acesso a possíveis empregos em áreas centrais da

cidade. Nesse cenário, em que se reproduziu a segregaçãosocioespacial, não é difícil imaginar a reprodução, também, dos

 problemas urbanos estruturais como falta de emprego e renda,

da violência como alternativa de vida e, possivelmente, da

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

formação de novos movimentos de protesto e reivindicação que

irão se apropriar, novamente, dos espaços hegemônicos.

 Nossa pesquisa se limitou a estudar as ocupações de

vazios pelos sem-teto maceioenses. Mas é preciso compreender

detalhadamente os limites e as possibilidades de uma política

habitacional nas cidades brasileiras que (re)organize o espaço

urbano em função de um uso de áreas desocupadas que atenda

aos interesses da sociedade como um todo, e não só de alguns

setores econômicos.

As ocupações de vazios urbanos por movimentos de

sem-teto denunciam, em última análise, “o esgotamento das

formas dominantes de construção das relações sociedade-

espaço” (RIBEIRO, 2009, p. 151). Nesse sentido, sugerimos

algumas ideias-força que poderiam servir a reconstrução dessas

relações no contexto das racionalidades contra-hegemônicas.

Seriam as seguintes ideias-força:

1. 

A política habitacional deve fazer parte de um

 planejamento territorial mais amplo que considere os

vazios urbanos em áreas centrais da cidade e dos bairros

como possibilidade de uso para combate ao déficit

habitacional. Para tanto, é preciso inverter a lógica de

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apropriação desses vazios, subordinando o uso

econômico e corporativo ao uso social e coletivo.2.

 

A gestão pública deve empreender “um projeto coletivo

de sociedade, que subordine os muitos interesses

 privados a um interesse público maior” (COUTINHO,

1991 apud RIBEIRO, 2000, p. 250) de modo que o

direito de propriedade, como direito privado, possa sersubordinado ao direito à moradia, como direito coletivo.

Para tanto, é preciso considerar o território usado como

 base para realização de todos os agentes sociais.

3. 

É preciso considerar as demandas sociais do lugar. Nesse

sentido, o planejamento urbano e a política habitacionaltêm de fazer um nexo com as práticas espaciais locais,

considerando as inúmeras alternativas de formas de

moradia apresentadas pelos usuários da cidade que não

 participam dos modelos econômicos e arquitetônicos

globais.4.

 

É preciso conhecer a formação territorial da cidade a fim

de compreender o processo de segregação e exclusão de

 parcela da população. Essa compreensão por parte dos

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

gestores públicos pode auxiliar o desvendamento de

novas formas de combate à reprodução desse processo.

5. 

O planejamento, apesar de consistir num instrumento

técnico, é essencialmente político. Portanto, é necessário

que a gestão pública permita a participação efetiva dos

movimentos sociais na elaboração dos projetos de

intervenção pública e incorporem as escolhas advindas

desses movimentos na apropriação e organização do

território urbano.

6.  Frente à capacidade organizacional dos movimentos

sociais urbanos e do alcance de suas lutas, estes não

 podem mais ser ignorados pela gestão pública como

 portadores de projetos de cidade. Nesse sentido,

acreditamos que a relação movimento social   gestão

 pública pode ser salutar à medida que suas ações

representem chances de mudanças conjunturais e

estruturais na conversão do processo de dominação da

terra urbana e da produção habitacional.

7.  Diante da apropriação corporativa do território urbano,

resta aos sem-teto se utilizarem de táticas para terem

acesso aos benefícios materiais disponíveis a apenas

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 parte da população urbana. Nesse sentido, as táticas dos

sem-teto devem ser contextualizadas territorialmente. Aocupação de vazio, como tática de luta, consiste na

reivindicação do direito à moradia constituindo uma

ação imprescindível à conquista da materialidade

espacial. Cabe a gestão pública realizar as devidas

contextualizações nos momentos em que aparece paramediar conflitos.

8.  Frente à insistente criminalização dos movimentos

sociais pelos agentes hegemônicos, é preciso considerar

o outro lado, isto é, ouvir e entender as razões que

orientam as práticas dos movimentos sociais. A buscadessa racionalidade contra-hegemônica deve partir da

análise do território usado, objeto de disputa e de

conflito de interesses entre agentes hegemônicos e

contra-hegemônicos.

9. 

Em Maceió não existe uma política de uso dos vaziosurbanos atrelada a uma política habitacional que vise

combater o déficit e a segregação socioespacial. As

intervenções da gestão municipal e da gestão estadual

 para resolução do problema habitacional dos

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

movimentos de sem-teto ocorreram em áreas periféricas

destituídas de infraestrutura e equipamentos de uso

coletivo. Desse modo, constatamos que apesar da crítica

largamente difundida pelos estudiosos do planejamento

urbano a respeito dos problemas da periferização da

 população pobre, a gestão pública local não a

considerou. Nesse sentido, é preciso, urgentemente, a

elaboração de um planejamento urbano, articulado

territorialmente, e que atenda às demandas de moradia

considerando o acesso aos benefícios urbanos.

A partir desses apontamentos, precisamos considerar as

ocupações de vazios urbanos não como ameaça à urbanidade e a

convivência social, mas como ação política que visa combater

os problemas socioespaciais vivenciados por grande parte da

 população que não tem acesso a transporte, emprego, educação,

saúde, etc. Como afirma Bitoun (1991, p. 44) “[...] a gestão da

cidade não pode prescindir da expressão política dos segmentos

sociais que fazem uso do espaço urbano”, e como diz Souza

(1997), “discutir projetos sociais, desprezando o território, é

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aprofundar as desigualdades, pois a gestão do território não pode

se distanciar dos desígnios da sociedade”.  Nesse sentido, concordamos com Ribeiro (2008)6 

quando se refere à justiça urbana. Ela nos diz que “não é só uma

questão de acesso a terra e a distribuição de renda, mas saber

como as injustiças não vão ser reproduzidas”. Uma alternativa,

no caso da questão habitacional, seria considerar as práticas dossem-teto quando estes se apropriam de determinados vazios

urbanos.

6  Conferência proferida pela Professora Ana Clara Torres Ribeiro, no

Seminário Política e Planejamento ocorrido em Curitiba, Paraná, em agostode 2008.

 

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Para concluir, gostaria de reafirmar a necessidade de se

analisar as práticas dos movimentos sociais partindo sempre de

um contexto territorial em que ocorrem as lutas, os conflitos e a

disputa em torno da busca da cidadania sonhada. O atual

 processo histórico/geográfico tem nos mostrado a necessidade

de se partir das práticas sociais cotidianas caso se queira

entender e combater as desigualdades largamente expressas

territorialmente.

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127

USO DO TERRITÓRIO E PROCESSOS DE RESISTÊNCIAS:

UMA ANÁLISE DA DES)CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA NO

CIRCUITO INFERIOR DE UNIÃO DOS PALMARES A PARTIR

DA PRODUÇÃO/DISTRIBUIÇÃO DE CDS E DVDS

7

 

Com a globalização, o território ganha uma nova

configuração para consolidar o meio técnico-científico-

informacional, que é a expressão espacial do ápice da

internacionalização do capital, de maneira desigual e combinada

(SANTOS, 2009a). Não obstante, malgrado os progressos

alcançados nos diversos campos, aumenta de forma exponencial

o fenômeno da pobreza, resultante da maneira perversa pela qual

atuam no território os atores hegemônicos do sistema. Assim, a

noção de cidadania encontra-se escamoteada frente ao quadro

geral de pobreza presente na organização sócio-espacial. Trata-

se, na realidade, de uma Pobreza Estrutural Globalizadas, ou

seja, generalizada e permanente (SANTOS, 2006). Esta noção

infere que o simples crescimento econômico não resultará na

distribuição da renda, como insistem algumas leituras da

realidade, pois a “Dialética do Concreto” (KOSIK, 1978) tem

7 Texto organizado por Reinaldo Sousa, Carlos Eduardo Nobre, Amistson

Lopes da Silva, Antonio Lopes da Silva Neto e Fernando Antonio da Silva,  junto ao Núcleo de Estudos do Pensamento Miltoniano –  NEPEM da Uneal.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

 provado justamente o contrário. Dessa forma, as perversidades

da globalização, manifestadas também na pobreza e perceptível

em todos os lugares, precisam ser consideradas no estudo da

organização sócio-espacial.

A globalização acentua os paradoxos, criando nas

cidades um meio ambiente uno e diverso ao mesmo tempo. Uno,

 por ser uma totalidade interconectada por um mosaico de

divisões territoriais do trabalho. Diverso, pelas desigualdades

gritantes que comporta lastreada numa lógica segregadora. É,

 paradoxalmente, o espaço que une e que separa as pessoas

(SANTOS 2009c).

Para analisar essa realidade, Milton Santos propôs um

método para os países subdesenvolvidos industrializados,

revelando a existência de dois circuitos da economia urbana: o

Circuito Superior   e o Circuito Inferior . Os dois circuitos

apresentam características muito singulares e na sua maioria

opostas. Tecnologia, organização, capitais, emprego, crédito,

margem de lucro, propaganda, reutilização dos bens, ajuda

governamental e dependência externa constituem alguns

exemplos dessas características. O Circuito Superior da

economia investe intensivamente em tecnologia, fazendo pleno

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129

uso dos meios técnico-científicos, posto que se vincula a divisão

internacional do trabalho. O Circuito Inferior, apesar de seroriundo do processo de modernização, não tem o mesmo acesso

aos bens e serviços, apesar das mesmas necessidades, devido ao

acesso raro ou insuficiente renda, resultando em diferenças de

consumo e, desse modo, está ligado ao conteúdo dos lugares.

A importância do território usado na compreensão da

Produção/distribuição de CDs e DVDs em União dos Palmares

A natureza complexa dos processos contemporâneos

confere ao território grande importância para interpretação

geográfica. Nele, imbricam-se nexos de natureza econômica,

 política e cultural. Ora, se por um lado esse contexto tem

demonstrado a potência do território para elucidar o

funcionamento da realidade atual, por outro lado sugere uma

abordagem totalizante por parte da Geografia no intuito de

elaborar explicações concatenadas com a dinâmica concreta da

realidade.

A análise do uso do território revela, portanto, as

desigualdades socioespacias materializadas na maneira como os

diversos agentes se apropriam dos subespaços da cidade de

União dos Palmares para morar, consumir, etc. Por meio desse

enfoque, evidenciam-se as diferentes divisões territoriais do

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

trabalho que a cidade comporta na atualidade derivadas do

mesmo movimento contraditório e combinado. Portanto, é a

 partir dessa categoria que se procura compreender as atividades

de produção, venda e distribuição de CDs e DVDs na cidade de

União dos Palmares  – AL. Para tanto, é necessário também

entender como essa atividade, ao entrar em cena, engendra uma

lógica particular na economia urbana. Nesse sentido, a proposta

dos Circuitos da Economia Urbana elaborada por Milton Santos

(2008) se mostrou eficaz.

A cidade fragmentada e os circuitos da economia urbana

 

As diferentes divisões do trabalho que as cidades

comportam na atualidade, cada qual com sua força peculiar de

uso do território, acenam a fragmentação espacial que nelas se

materializa. Para Milton Santos, se a abordagem é holística, é

necessário reconhecer que

Há, de um lado, uma economia

explicitamente globalizada, produzida decima, e um setor produzido de baixo, que,nos países pobres, é um setor popular e, nos

 países ricos, inclui os setoresdesprivilegiados da sociedade, incluídos osimigrantes. Cada qual é responsável pela

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instalação, dentro das cidades, de divisões

de trabalho típicas (2009, p.323).

Cada uma dessas economias encontra-se estruturada em

variáveis especificas, posto que revela, em sua essência, a lógica

e os interesses de uso do território dos agentes que as

engendram. Se por uma parte a economia globalizada funciona

mediante as variáveis do período, quais sejam, ciência,

informação e finanças; por outra parte a economia de baixo

emana das necessidades localmente vividas e, por conseguinte,

vincula-se aos conteúdos dos lugares.

Essas diferentes formas de organizar o trabalho se

entrelaçam nos subespaços da cidade, colocando em evidênciaas desigualdades dos agentes envolvidos. Para analisar essa

realidade, Milton Santos propôs um método para os países

subdesenvolvidos industrializados, revelando a existência de

dois circuitos da economia urbana, a saber: o Circuito Superior,

ou moderno, e o Circuito Inferior, ambos derivados damodernização tecnológica que incide sobre o território

 brasileiro, mormente no último quartel do século XX. Portanto,

os dois circuitos possuem a mesma origem.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Assim, a distinção central entre eles reside no grau de

capital e no nível de organização de cada um. Isso significa que

os dois circuitos apresentam características muito singulares e

na sua maioria opostas. Tecnologia, capitais, emprego, crédito,

margem de lucro, propaganda, reutilização dos bens, ajuda

governamental e dependência externa constituem alguns

exemplos dessas características.

O Circuito Superior da economia investe intensivamente

em tecnologia, fazendo pleno uso dos meios técnico-científicos,

 posto que vincula-se a divisão internacional do trabalho. Utiliza

capital-intensivo, alicerçado nos sistemas técnicos atuais, e

consegue abarcar um vasto território, geralmente utilizando as

 partes da cidade mais bem servidas de infraestrutura.

Por conseguinte, seu campo de atuação muitas vezes

escapa à escala do país, como no caso da produção direcionada

ao exterior, tendendo a aumentar seus mercados sob a égide da

 publicidade, situando-se nesse mesmo nível o campo de suas

relações. Assim, “[...] o circuito superior inclui bancos,

comércio de exportação e importação, indústria urbana

moderna, comércio e serviços modernos, bem como comércio

atacadista e transporte” (SANTOS, 2008, p.47).

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133

 Nos dia de hoje, o Circuito Superior se expande e atinge

cada vez mais territórios distantes, introduzindo novos vetoresnos arranjos locais, ou seja, refazendo a dinâmica socioespacial

dos lugares. Destarte, tem nos monopólios e oligopólios suas

 principais representações.

Resultante dele identifica-se o Circuito Inferior, que é

formado por uma multiplicidade de comércios e serviços bemcomo atividades de fabricação, onde os graus de capital e

tecnologia são relativamente baixos. Desse modo

O Circuito Inferior é formado de atividadesde pequena escala, servindo, principalmente,à população pobre; ao contrário do que

ocorre no circuito superior, essas atividadesestão profundamente implantadas dentro dacidade, usufruindo de um relacionamento

 privilegiado com a sua região (SANTOS,2008, p.43).

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

 Nesta perspectiva, depreende-se que o Circuito Inferior

detém uma lógica própria de organização, que muitas vezes é

estranha à ótica hegemônica, que está mais vinculada aos

conteúdos dos lugares. Não obstante, não deixa de ser,

outrossim, um resultado das texturas do período histórico atual,

embora que indiretamente, posto que em seus encaixamentos e

reencaixamentos sócio-espaciais, malgrado o progresso técnico-

científico e informacional, afasta cada vez mais os pobres do

acesso aos bens produzidos pelo circuito superior.

Com efeito, a teoria dos circuitos da economia requer

que se enxergue a cidade como uma totalidade. Essa ideia se

torna fundamental para compreender a dialética que perpassa o

território no atual período histórico, dado que, tal enfoque

 permite levar em consideração as intencionalidades de todos os

agentes, malgrado a diferença entre eles, inclusive as atividades

dos CDs e DVDs em União dos Palmares - AL.

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

135

Táticas, estratégias e resistência no território: uma leitura a

partir da produção/distribuição de CDs e DVDs

Para construir os argumentos que consubstanciam nossa

análise acerca da desconstrução da cidadania no Circuito

Inferior em União dos Palmares, a partir da

 produção/distribuição de CDs e DVDs, tomamos como ponto de

 partida algumas proposições que caracterizam, fundamentam e

explicitam o fenômeno estudado. Tais proposições são

formuladas a partir das noções de racionalidade hegemônica e

contra-racionalidade propostas por Santos (2008) e das noções

de tática e estratégia propostas por Certeau (1994). Estas noções

nos permitem ensaiar a compreensão de como a produção/distribuição de CDs e DVDs por comerciantes pobres

constituem um tipo de resistência à situação vigente marcada

 pelo desemprego estrutural e; como tais resistências são

empreendidas a partir do uso tático da técnica e do território.

Estas proposições apontam para a politização das práticas espaciais empreendidas por agentes pobres que

encontram no circuito inferior da economia urbana as

alternativas de combate à miséria e à pobreza, bem como a

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

(re)construção / (re)significação da cidadania, mesmo que esta

última advenha de forma parcial, não plena.

Como primeira proposição, afirmamos que a

 produção/distribuição de CDs e DVDs piratas em União dos

Palmares, como fenômeno marcadamente presente nas cidades

 brasileiras, consiste em um “submercado e subcircuito espacial

específicos da produção” com “sua racionalidade própria”

(SANTOS, 2008, p. 309). Esta racionalidade própria se instala e

se contrapõe ao que podemos chamar de racionalidade

dominante/hegemônica, esta última entendida como aquela

“desejosa de tudo conquistar” (ibidem), caracterizada pelo

relativo poder de controle e regulação do território.

O poder de controlar e regular o território advém das

circunstâncias estratégicas auferidas por determinadas empresas

que buscam, através de instrumentos jurídicos e econômicos,

 bem como a partir de suas ações, monopolizar o mercado

 produtor/distribuidor de determinados produtos. Não obstante,

esta tentativa de controle e dominação se demonstra ineficaz

frente à força e resistência empreendida pelos inúmeros

trabalhadores urbanos que encontram nas atividades

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

137

marginalizadas a possibilidade/alternativa de sobrevivência. É

neste sentido que podemos falar de contra-racionalidades.Como segunda proposição, afirmamos que estas

contrarracionalidades se manifestam através do uso tático do

território. Conforme Certeau (1994, p. 101), a tática “é

determinada pela ausência de poder ”, ao contrário da estratégia

que é “organizada pelo postulado de um poder” (grifos nooriginal). Nesse sentido, o uso tático do território corresponde às

 práticas empreendidas por aqueles agentes destituídos de poder

organizacional, caso dos produtores/distribuidores de CDs e

DVDs piratas. Estes agentes jogam com as circunstâncias

impostas pela racionalidade hegemônica, tirando partido dasvantagens técnicas da produção dominante. Nesse sentido, o uso

da técnica para produção/distribuição de CDs e DVDs piratas

 pressupõe uma “maneira de pensar investida numa maneira de

agir, uma arte de combinar indissociável de uma arte de utilizar”

(CERTEAU, 1994, p. 42).Os vendedores ambulantes, nesse sentido, praticam o

território a partir de objetos que lhes possibilitam uma maior

mobilidade, capacidade de fuga, visto que a tática “é

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

determinada pela ausência de um próprio”, isto é, “não tem por

lugar senão o do outro” (CERTEAU, 1994, p. 100-101).

Em nossas visitas de campo, constatamos o uso de

carrinhos de mão e de varais onde os CDs e DVDs são expostos

e facilmente recolhidos em caso de batida policial. Apesar da

utilização destes equipamentos, verificamos, também, a

utilização de barracas montadas no interior da feira de rua que

ocorre todas as quartas-feiras e sábados8. O fato é que, como

afirma Miranda (2005, p. 106), “a falta de alternativas faz com

que esses sujeitos pratiquem o território e desenvolvam ações

insubordinadas que jogam com a ordem estabelecida”.

Para Certeau (1994, p. 41-42), “esses modos de proceder

e essas astúcias de consumidores compõem, no limite, a rede de

uma antidisciplina”. A partir deste ensaio, apresentamos

algumas considerações. Identificamos, por exemplo, duas

categorias de comerciantes ambulantes que usam o território

diferentemente: uma categoria comercializa os CDs e DVDs

inseridos na área reservada à feira de rua. A outra categoria

8  O uso desses equipamentos móveis possibilita, também, um fluxo

 permanente pela cidade em busca da maior concentração de consumidores. 

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corresponde àqueles comerciantes que usam os carrinhos de

mão e os varais e que não pagam taxa ao poder público.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Caracterização dos agentes envolvidos com a divisão de

trabalho dos CDs e DVDs

Com a finalidade de apreender os nexos que colam o

circuito espacial produtivo dos CDs e DVDs ao território da

cidade de União dos Palmares, partimos de dois pressupostos

 basilares:

1- A partir da expansão da pirataria no contexto

 brasileiro, verifica-se que, em cada lugar, há uma propensão

maior por parte de determinados agentes em acolher os sistemas

de objetos e sistemas de ações que constitui tal uso do território.

Acreditamos que tal acolhimento explica-se pela

situação desigual dos agentes no território, visto que um novo

uso deste apoia-se sobre um uso preexistente, conformando,

assim, um arranjo inédito (SANTOS, 1985; SANTOS &

SILVEIRA, 2005). Por isso, segundo Tozi (2010), a pirataria se

aproveita das diferentes condições socioterritoriais intrínsecas à

armadura do período atual.

2  –  Baseados no primeiro pressuposto, advogamos que

no contexto da situação geográfica Palmarina a incorporação

desse uso do território se dá como uma das várias formas de

resistência à pobreza. Isso significa tomar o fenômeno da

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 pobreza e, consequentemente, do desemprego estrutural como

variáveis-chave para elucidação da dialética que envolve a produção, distribuição e consumo de CDs e DVDs em União

dos Palmares –  AL.

Assim, faz-se necessário entender a situação geográfica

dos agentes envolvidos com esta divisão social e territorial do

trabalho. Para tanto, foram aplicados questionários aoscomerciantes presentes nos principais locais de venda da cidade,

tendo em vista que estes eram os mais acessíveis para obtenção

de informações. A maior parte das pessoas que respondeu ao

questionário era do sexo masculino, tendo como estado de

origem a própria Alagoas. 86,96% dos entrevistados sãooriginários de Alagoas, enquanto que apenas 4,35% vieram do

estado de Pernambuco e 8,7% tem suas raízes no estado de São

Paulo, porém todos no momento vivem em União dos Palmares.

Demais, a parcela mais densa compõe-se de pessoas em idade

de trabalho, ou seja, entre 16 e 60 anos, como mostra o gráficoabaixo.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Observa-se a presença maciça de comerciantes do

 produto com idade entre 16 e 45 anos, total que corresponde a

69%, o que corrobora com a hipótese de que o desemprego

estrutural tem forçado a construção de alternativas de

sobrevivência, uma vez que não se trata de uma condição dedesemprego temporária.

O atual período técnico-científico-informacional não

abarca a totalidade da população economicamente ativa,

tampouco os jovens trabalhadores. Em verdade, poderíamos

dizer que é o Circuito Superior, por natureza seletivo, que nãoadmite a contratação ampla e plena, pois o seu funcionamento

 parte de uma organização exigente de mão de obra qualificada e

especializada, atributo incipiente no caso da maioria dos

vendedores (conforme mostra o gráfico 2).

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 Nesse sentido, os jovens trabalhadores buscam e

inventam alternativas para se colocarem no circuito da economiaurbana e adquirirem alguma renda. Podemos dizer que o

Circuito Inferior é uma resposta a seletividade do circuito

superior. Mesmo o Estado e as grandes empresas, ao tratarem as

atividades do Circuito Inferior como crime, não podem negar a

sua legitimidade e eficácia no que toca a possibilidade doemprego. De fato, o circuito superior não oferta empregos para

todos, de modo que se faz necessário, em dadas situações,

utilizar-se das bases técnicas existentes nos lugares como

 possibilidade de reinvenção de novas formas de trabalho.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Ficou evidente, também, que uma grande parcela dos

agentes envolvidos tem uma baixa escolaridade, conforme

demonstrado pelo gráfico que segue.

A maior parte deles, ou seja, mais de 52%, não chegou a

concluir o nível fundamental ou é analfabeto. Pelo menos essa

atividade do circuito inferior da cidade de União dos Palmares

tem como característica marcante a pouca ou insuficiente

escolaridade. Ao que parece, há uma estreita relação, em União

dos Palmares, entre baixo grau de escolaridade, pobreza e

circuito inferior. Esta relação resulta de um processo

contraditório marcado pelo fato de que ao tempo em que o

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circuito superior, através dos discursos acionados, dispõe da

necessidade de mão de obra qualificada, é notável que o períodoatual de globalização é marcado por uma precarização funcional

e estrutural dos sistemas educacionais brasileiros e, mais

especificamente, alagoano. Nesse sentido, os jovens

trabalhadores, em idade produtiva, não são acolhidos pelo

mercado, mais especificamente, pelo circuito superior. Estes sãorejeitados sob a alegação da falta de preparo e qualificação,

mesmo sabendo que a questão não pode e não deve ser reduzida

a este alegação, visto que, como já dito, o circuito superior é,

 por excelência, seletivo.

 No entanto, se a seleção para o emprego já se constituiem um entrave para o sujeito adquirir um trabalho “formal”, no

dizer economicista, a falta de qualificação e preparo só

corrobora com a dificuldade. Há de se dizer que a falta de

qualificação e preparo não sugere, somente, um problema

individual, como o discurso economicista quer fazer crer aoculpar o sujeito pelo despreparo. Como já dito, este fato resulta

de um processo histórico e político assentado no atual fenômeno

de globalização que responde aos desígnios do próprio mercado.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

O que nos interessa, afinal, é apenas reafirmar a razão de

ser do circuito inferior frente às exigências organizacionais do

Circuito Superior que não admite, dentre outras qualidades, a

 baixa escolaridade. Portanto, os 52% que não concluíram o

ensino fundamental e os 26% que não concluíram o ensino

médio representam uma população alijada do mercado

especializado e que encontra, nas atividades piratas, a

 possibilidade para sobreviver.

Há de se constatar, ainda, os 4% de vendedores com

ensino superior completo que denuncia, a priori, um

esgotamento das possibilidades de absorção do Circuito

Superior de uma mão de obra mesmo supostamente qualificada

e especializada.

 No momento de aplicação do questionário, mais de 95%

identificaram-se apenas como vendedor dos produtos. Ao que

 parece, há uma divisão social do trabalho instituída. Todavia,

muitas informações sobre a procedência dos discos contrariam

tais dados, pois indicam que vários comerciantes citadinos

também estão envolvidos na produção. Dessa forma, concluí-se

que há certo receio por parte da maioria em fornecer

informações no que diz respeito à origem do produto.

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Buscou-se verificar há quanto tempo os agentes estão

envolvidos nesta divisão do trabalho para, assim, compreender avinculação desta com a expansão do meio geográfico

contemporâneo no Estado de Alagoas. O gráfico 3, traz à baila o

resultado obtido:

 Nota-se um aumento substancial na quantidade de

agentes envolvidos com os produtos no último ano, parcela que

representa 60,87%. Trata-se, portanto, de um fenômeno que vem

ganhando maior expressividade nos últimos meses, ainda queum percentual significativo já esteja na atividade durante alguns

anos. Comprovando isto, somando-se aqueles que estão a mais

de cinco anos tem-se pouco mais de 17% do total. Como o

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

 próprio termo flexibilidade tropical,9 cunhado por Santos (2008,

 p. 324), sugere, é possível admitir que o tempo de permanência

na atividade seja, também, flexível.

 No que concerne aos vendedores mais antigos, alguns

destes foram os primeiros a colocarem os produtos em União

dos Palmares. De acordo com informações do trabalho de

campo, na ocasião muitos já estavam envolvidos com o

comércio de discos “originais”, mas com a expansão da pirataria

no Estado passaram a incorporar a nova divisão do trabalho.

Tudo indica que muitos desses vendedores mais antigos

assumiram, recentemente, o papel de distribuidores dos produtos

 para outros agentes locais.

9  Para Santos  (2008 [1996], p. 324), “nas grandes cidades, sobretudo no

Terceiro Mundo, a precariedade da existência de uma parcela importante

(às vezes a maioria) da população não exclui a produção de necessidades,

calcadas no consumo das classes mais abastadas. Como resposta, umadivisão do trabalho imitativa, talvez caricatural, encontra as razões para se

instalar e se reproduzir. Mas aqui o quadro ocupacional não é fixo: cada

ator é muito móvel, podendo sem trauma exercer atividades diversas ao

 sabor da conjuntura. Essas metamorfoses do trabalho dos pobres nas

 grandes cidades criam o que [...]  denominamos de „flexibilidade tropical‟.

 Há uma variedade infinita de ofícios, uma multiplicidade de combinações em

movimento permanente, dotadas de grande capacidade de adaptação, e

 sustentadas no seu próprio meio geográfico, este sendo tomado como uma forma-conteúdo, um híbrido de materialidade e relações sociais”.

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Assim, parece estar havendo, com a introdução dessa

atividade, o alargamento da divisão social do trabalho à medidaque novas pessoas são solicitadas a participarem na

comercialização dos discos. De fato, a banalização técnica de

equipamentos originalmente usados pelos agentes hegemônicos

da produção e a facilidade de difusão do conteúdo informacional

 pela internet tem colaborado para o aumento da produção edistribuição de CDs e DVDs piratas. Portanto, esse uso do

território, mesmo não respondendo aos anseios de um trabalho

digno, mostra-se solidário com os conteúdos do lugar. Decerto,

isto ocorre porque os agentes locais detêm maior controle sob o

circuito espacial de produção dos discos, ou seja, este sistema produtivo estrutura-se, essencialmente, sobre relações

horizontais, para além dos interesses extrovertidos.

De fato, é a partir da situação concreta apontada acima

que se deve pensar os novos significados atribuídos às técnicas

emblemáticas do período por estes agentes quando nelas sãodepositados os valores sociais lugarizados. Dessa forma, poder-

se-á, talvez, captar o sentido concreto da participação das

 pessoas caracterizadas precedentemente no circuito espacial de

 produção dos CDs e DVDs. Pois vale sublinhar que embora seja

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

um fenômeno nacional, quando a pirataria é encaixada em

determinado contexto adquire uma tessitura peculiar. Conforme

Silveira apud Montenegro (2009, p.09), os usos das técnicas

decorrem da “[...] dialética entre as necessidades próprias de

uma situação geográfica e as soluções disponíveis no mundo

nesse período [...]” 

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O uso do território pelo circuito espacial produtivo dos CDs e

DVDs em União dos Palmares

Para realização da atividade de produção e distribuição

de CDs e DVDs em União dos Palmares são utilizados diversos

objetos técnicos de diferentes idades que, quando acionados,

adquirem formas bastante criativas. Para Montenegro,

“conforma-se assim, no período atual, um uso combinado das

técnicas do “futuro” e do “passado” pelos pobres” (2009, p.09).

Deveras, surgem maneiras singulares de organização que

emanam de uma racionalidade própria. Assim, tais objetos

ganham novas intencionalidades e temporalidades, incorporando

as racionalidades dos agentes da “pirataria”.

Com a visita de campo foi possível verificar que os

 principais instrumentos utilizados na comercialização dos

 produtos são: barraca, amplificadores e caixa de som. Os

vendedores móveis, por sua vez, comercializam seus produtos

de uma maneira bastante criativa: o próprio carro, feito

exclusivamente para a atividade, dispõe de caixa de som e

compartimentos na parte superior para armazenar os CDs e

DVDs.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

 No que concerne aos principais locais de

comercialização, vê-se a relação que se estabelece com os

fluxos. O centro da cidade guarda um jogo de relações que se

mostram importantes à sobrevivência desses agentes,

 principalmente nos dias em que ocorrem as feiras-livres, a saber,

segundas-feiras, quartas-feiras, sextas-feiras e sábados.

Igualmente, nesta localidade concentra-se um grande número de

consumidores.  No Bairro dos Terrenos, que aparece como

segundo principal ponto de comercialização com 13,04%, a

feira-livre acontece aos domingos, quando está presente um

grande número de vendedores.

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Por conseguinte, compreende-se que a divisão de

trabalho dos CDs e DVDs penetra nos meandros das cidades a

 partir das circunstâncias dos agentes envolvidos. Nesse sentido,a intensidade dos fluxos no centro da cidade e no Bairro dos

Terrenos é de relevância capital para a vendagem.

O baixo preço dos produtos comercializados permite que

a população local tenha fácil acesso a eles. Cada unidade custa,

em média, R$ 2,00, tanto de CDs como de DVDs. Não raro,com um pouco de pechincha é possível levar três unidades por

apenas R$ 5,00. Geralmente, o lucro obtido pelo vendedor por

cada unidade varia entre R$ 0,50 e R$ 1,50. Os que podem

auferir maior rendimento são aqueles que, além de vendedores,

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

também são fabricantes. Não obstante, de modo geral, o

rendimento mensal conseguido pelos comerciantes é

relativamente baixo conforme apresentado no gráfico.

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Levando-se em consideração que o rendimento obtido

mediante a atividade para a porção mais densa, isto é, 69,57%,situa-se abaixo de um salário mínimo (R$ 510,00)10, pode-se

dizer que o adensamento desse fenômeno constitui uma resposta

ao desemprego estrutural, correspondendo a uma das várias

maneiras de resistências empreendidas em face dessa situação

geográfica. Mas, contraditoriamente, perpetua-se a pobreza, posto que, mesmo que esta não se defina somente pelo aspecto

quantitativo, seria ilusório pensar que esse salário aponta uma

saída para tal fenômeno. Na verdade, sustentamos que a entrada

das pessoas nessa divisão do trabalho constitui uma alternativa

de   sobrevivência, substanciada num uso alternativo do

território, cujo lucro não é o objetivo principal. 

A despeito dessa lógica/racionalidade própria que as

características supracitadas apontam, mormente quando

 pensadas desde o arranjo do lugar, insiste-se, no contexto

 brasileiro, em difundir ideias que servem como subsídios àcriminalização da “pirataria”, a começar pelo uso deste termo.

Essa  psicoesfera  responde aos interesses hegemônico-

 10 O valor do salário mínimo é referente a fevereiro do ano corrente (2011),

quando os dados foram coletados in lócus. 

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

dominantes, sendo o entendimento de sua difusão importante,

visto que ela influência na aceitação ou recusa das pessoas para

com o consumo dos discos. Neste sentido, o aspecto normativo

ganha destaque, pois muitas vezes é usado para reprimir

intensamente a expansão dessa divisão do trabalho.

Assim, buscou-se reconhecer como o poder público tem

agido em União dos Palmares no tocante a este aspecto, ou seja,

na repressão aos vendedores e produtores de discos. O gráfico a

seguir representa o resultado obtido.

Esta repressão citada por 52,17% dos entrevistados

refere-se, certamente, à batida policial que ocorreu no ano de

2009 pela Polícia Federal. Na ocasião, houve diversas

apreensões de discos, porém não se tem relatos de prisões. Este

foi o único momento de r epressão “legal” à atividade, não

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havendo, de lá para cá, nenhuma outra ocorrência. Verifica-se

que há certa legitimidade por parte da população local, adespeito da ilegalidade apontada na legislação vigente. Como na

atualidade inexistem locadoras ou outras fontes de divulgação

de discos em União dos Palmares, a não ser os “piratas”, estes

são, a bem dizer, o principal meio de circulação da produção

musical e audiovisual nesta cidade. Isso significa que, de certaforma, os grandes agentes da cultura nacional têm se

 beneficiado dessa atividade no que tange à divulgação de suas

 produções. Mas, concomitantemente, constata-se a divulgação

intensa, pelo mesmo meio, da produção musical de pequenas

 bandas de alcance local e regional, sobretudo de Forró e Reggae.É o caso da Banda Show & Balanço, Roberto Rasta e inúmeros

Djs que organizam CDs e DVDs com Reggaes de diversos

cantores. É também nessa combinação de múltiplos interesses

que esse fenômeno deve ser interpretado.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Essa  psicoesfera11

  de legitimidade  pode ser apreendida

também no que diz respeito à relação do poder público local

com os comerciantes. Àqueles que comercializam a mercadoria

em barracas fixas nas feiras-livres, é cobrada uma taxa pela

 prefeitura decorrente da utilização do local no valor de 1,00 R$.

Ou seja, a compra e a comercialização dos discos são encaradas,

até o momento, como algo normal, a despeito da forte

 propagando no sentido contrário nos meios de comunicação de

massa. A porcentagem dos que pagam tal taxa está descrita no

gráfico que segue.

11  Esse termo foi cunhado por Milton Santos (2009) para referi-se aos

aspectos imateriais do território. Assim, a psicoesfera engloba o campo dosdesejos, ideias, leis, etc. 

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Dentre os 56,52% que não pagam nenhuma taxa, boa

 parte é composta pelos vendedores móveis que, por nãoutilizarem um ponto fixo com barraca, estão livres da taxa.

Ultimamente, o número destes tem aumentado, haja vista que,

com a mobilidade, alcança-se uma clientela maior. Desse modo,

surge a possibilidade de estarem presentes em vários pontos da

cidade, como em festas, bares, etc.A atividade de CDs e DVDs sobrevive, também, devido

à articulação com diversos territórios, daí porque se pode falar

de uma divisão territorial do trabalho específica que convida os

lugares a participarem, ao seu modo, desse circuito espacial

 produtivo. O fato é que há uma complementaridade territorial naatividade da pirataria (fornecimento de equipamentos, CDs e

DVDs virgens ou já gravados). São três os principais locais

donde provém a mercadoria para os vendedores, tanto discos

virgens como CDs e DVDs já gravados prontos para a

comercialização.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

Além da própria cidade de União dos Palmares,

aparecem Maceió e algumas cidades do Estado de Pernambuco,

sobretudo Caruaru. Mas a parte mais densa provém de Maceió.

Além da maior proximidade de União dos Palmares com a

capital alagoana, em relação a outras cidades do Estado de

Pernambuco, aqui, mais uma vez, a referência aos aspectos

 jurídico-normativos parece bastante elucidativa. O Estado de

Pernambucano tem, nos últimos anos, intensificado as ações de

combate à pirataria com a criação de uma delegacia especifica

 para isto12.

12  Existem vários relatos de apreensões policiais nas cidades de Pernambuco,

sobretudo em Caruaru. Um exemplo disto pode ser visto no site:http://ne10.uol.com.br/canal/cotidiano/pernambuco/noticia/2010/03/17/combate-a-

 pirataria-cinco-pessoas-presas-em-caruaru-216724.php. Na ocasião, houve apreensãode milhares de mídias, além do desmonte de uma fábrica e a detenção de cinco

 pessoas. Outros relatos de apreensões podem ser consultados no site:

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Por sua vez, em Maceió, a prática não encontra tanta

repressão, pois no centro desta cidade encontra-se um grandenúmero de vendedores que expõem seus produtos abertamente

nas ruas e nas paredes das lojas. Destarte, a circulação da

mercadoria por esta via torna-se mais fácil.

Ainda no mesmo gráfico, nota-se que União dos

Palmares contribui com uma parcela considerável nofornecimento total dos produtos, ou seja, com mais de 30%,

ficando atrás, apenas, da capital alagoana. Isso indica que nessa

cidade há diversas pessoas envolvidas com o processo de

gravação das mídias, sobretudo nos anos mais recentes. Porém,

o contato com as mesmas torna-se difícil, pois predomina certoreceio em se identificarem enquanto tais por conta da

 possibilidade de repressão.

As discussões, trazidas acima, permitem tecer algumas

considerações sobre a atividade de

 produção/distribuição/consumo de discos na cidade de Uniãodos Palmares-AL, ao passo que apontam, também, muitos

http://www.maisab.com.br/noticias/nv/15715/COMERCIO+PIRATA+DE+CARUARU+NA+MIRA+DA+POLICIA.html

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

aspectos que devem ser aprofundados futuramente, visando uma

melhor compreensão do uso do território Palmarino.

 No caso da situação geográfica de União dos Palmares-

AL, verificou-se que muitas etapas do circuito espacial dos

discos são solicitadas como resistência à pobreza. Isso se

confirma pelo baixo rendimento auferido com a venda do

 produto, bem como pelas características das pessoas que

responderam aos questionários aplicados.

Outro aspecto importante está relacionado à

 permissividade por parte do poder municipal. Em Alagoas e,

 particularmente, em União dos Palmares não há repressão

intensa à prática da pirataria. Assim, muitos usos do território

contrariam a regulação jurídico-normativa do mesmo, o que

chama atenção para a dialeticidade que prende o circuito

espacial dos discos às condições históricas do presente. No

entanto, ainda está por investigar como a composição técnica e

normativa desse território origina tais movimentos

contraditórios.

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Por fim, cabe assinalar que o uso das técnicas do período

 pelos agentes do Circuito Inferior amplia a divisão social eterritorial do trabalho, servindo à criação de novas atividades

que, na situação geográfica da cidade de União dos Palmares,

aparecem como resistência à pobreza. Se no Circuito Superior

os sistemas técnicos atuais contribuem para o desemprego

estrutural, no Circuito Inferior eles autorizam a construção deuma resistência cotidiana que ensaia a cada dia um novo projeto

de sociedade.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

SOBRE OS AUTORES

REINALDO SOUSA

Graduado em Geografia pela Universidade

Federal de Sergipe. Mestre em Geografia

também pela Universidade Federal de

Sergipe. Professor Assistente da

Universidade Estadual de Alagoas onde exerce a função de

Diretor do Campus Universitário Zumbi dos Palmares. Nesta

unidade é coordenador do Curso de Pós Graduação Lato Sensu

em Geografia e do Programa de Graduação de Professores  –  

PGP. É coordenador do Núcleo de Estudos do Pensamento

Miltoniano  –   NEPEM, onde desenvolve estudos acerca dos

circuitos da economia urbana e cidadania na cidade de União

dos Palmares-AL.

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(RE) PENSANDO A GEOGRAFIAHistória, Objeto, Método e Práxis

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FERNANDO ANTONIO DA SILVA

Graduado em Geografia pela Universidade

Estadual de Alagoas –  UNEAL. Integrante do

 Núcleo de Estudos do Pensamento Miltoniano

 –  NEPEM. Atualmente desenvolve pesquisas

sobre o uso do território e o Circuito Inferior

da Economia Urbana em União dos Palmares, bem como sobre

o método geográfico na perspectiva miltoniana. É, também,

 professor da rede particular de ensino de União dos Palmares.

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  Reinaldo Sousa e Fernando Antonio da Silva

CONTATOS:

Reinaldo Sousa

Tel. (82) 8122-3780 / [email protected]

@reinaldounealhttp://nepemuneal.blogspot.com/

Fernando SilvaTel. (82) 9980-4952

[email protected]