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CONVERSAS SOBRE AVALIAÇÃO EM GEOGRAFIA NAS 5ªs A 8ªs SÉRIES DO ENSINO FUNDAMENTAL E NO ENSINO MÉDIO Shoko Kimura Profª Adjunta da Faculdade de Educação Universidade Federal de Minas Gerais 1. APRESENTAÇÃO : Raras vezes encontramos uma oportunidade como esta para dialogarmos com você, professor de Geografia. Sendo assim, pretendemos transformar este encontro em uma conversa cujo centro é a avaliação, pois estamos integrando um projeto a esse respeito. Antes de entrarmos no assunto que nos cabe tratar, apresentamos uma questão inicial para ser discutida. Convém, resumidamente, referirmo-nos à questão da identidade , em que sentimos a necessidade de nos colocarmos e, ao mesmo tempo, de expressarmos o nosso olhar a seu respeito, que você pode considerar enviesado ou não, o que, entretanto, já é um motivo mais do que justificado para estabelecermos uma interlocução. De nossa parte, integrantes do curso universitário que você freqüentou, temos a dizer que ele é o ponto de partida para tentarmos situar o nosso trabalho frente ao Ensino Básico. Quer dizer, o acervo de que dispomos para desencadear a presente discussão, é composto, de um lado, pela nossa origem nas chamadas escolas de 1º e 2º graus, nas quais foram desenvolvidas e vivenciadas várias das situações que julgamos ser integrantes do universo de práticas e intenções do professor de Geografia atualmente e, de outro lado, pelas inserções e experiências no Ensino Superior no qual o tratamento do ensino de Geografia no Ensino Básico tem sido o objeto de nossos estudos e trabalhos. Esperamos que o desgaste maior ou menor de nossas raízes (isto sim é natural, ao passo que a permanência das características das coisas desde seu o nascedouro não o é), não tenha sido tal que possamos ter alcançado uma alienação comprometedora acerca das condições concretas em que se desenvolve o Ensino Básico. Podemos teorizar e estabelecer análises e elos com os Ensinos Fundamental e Médio, porém, isto não significa sua vivência concreta, “na carne”, como dizem os professores em geral. Entretanto, o “distanciamento” com que a

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CONVERSAS SOBRE AVALIAÇÃO EM GEOGRAFIA NAS 5ªs A 8ªs SÉRIES DO ENSINO FUNDAMENTAL E NO ENSINO MÉDIO

Shoko Kimura Profª Adjunta da Faculdade de Educação Universidade Federal de Minas Gerais

1. APRESENTAÇÃO:

Raras vezes encontramos uma oportunidade como esta para dialogarmos com você, professor de Geografia. Sendo assim, pretendemos transformar este encontro em uma conversa cujo centro é a avaliação, pois estamos integrando um projeto a esse respeito.

Antes de entrarmos no assunto que nos cabe tratar, apresentamos uma questão inicial para ser discutida. Convém, resumidamente, referirmo-nos à questão da identidade, em que sentimos a necessidade de nos colocarmos e, ao mesmo tempo, de expressarmos o nosso olhar a seu respeito, que você pode considerar enviesado ou não, o que, entretanto, já é um motivo mais do que justificado para estabelecermos uma interlocução.

De nossa parte, integrantes do curso universitário que você freqüentou, temos a dizer que ele é o ponto de partida para tentarmos situar o nosso trabalho frente ao Ensino Básico. Quer dizer, o acervo de que dispomos para desencadear a presente discussão, é composto, de um lado, pela nossa origem nas chamadas escolas de 1º e 2º graus, nas quais foram desenvolvidas e vivenciadas várias das situações que julgamos ser integrantes do universo de práticas e intenções do professor de Geografia atualmente e, de outro lado, pelas inserções e experiências no Ensino Superior no qual o tratamento do ensino de Geografia no Ensino Básico tem sido o objeto de nossos estudos e trabalhos. Esperamos que o desgaste maior ou menor de nossas raízes (isto sim é natural, ao passo que a permanência das características das coisas desde seu o nascedouro não o é), não tenha sido tal que possamos ter alcançado uma alienação comprometedora acerca das condições concretas em que se desenvolve o Ensino Básico. Podemos teorizar e estabelecer análises e elos com os Ensinos Fundamental e Médio, porém, isto não significa sua vivência concreta, “na carne”, como dizem os professores em geral. Entretanto, o “distanciamento” com que a

universidade se nutre pode ser um elemento vantajoso no sentido de que ela pode ser mais “isenta”, fria o suficiente para conseguir falar com menos traumas e conflitos, com menos sentimentos de gratificação e realização. Pessoalmente, como a trajetória esteve carregada desses componentes ligados à subjetividade, cremos que eles são de grande valia como instrumental para discutirem-se objetivamente as questões do ensino. De sua parte, é comum encontrar-se uma situação em que você ministre aulas tanto no Ensino Fundamental como no Ensino Médio, em razão de uma qualificação alcançada com a conclusão da Licenciatura Plena em Geografia ou em Estudos Sociais. Ora lhe é atribuída ou vocês escolhe para compor sua jornada de trabalho, somente aulas no Ensino Fundamental. Ou no Ensino Médio. Ou, então, em ambos, conjuntamente. E por vezes, raramente ou com freqüência, tanto nas escolas públicas municipais como nas escolas estaduais, juntando-se outras tantas aulas ministradas em escolas particulares (podemos, ainda, referirmo-nos ao desempenho de atividades profissionais fora do magistério, numa tentativa de aumentar os proventos) . Tal quadro resulta da forma como o professor do Ensino Fundamental de 5ª a 8ª séries e do Ensino Médio nestes se insere do ponto de vista da carreira, da condição de trabalhador horista, diferente em nosso país em relação a países onde se constitui um professor de uma determinada escola e nela desenvolve seu trabalho docente. Esta é uma questão que, por si, merece uma discussão aprofundada, porém, não sendo o nosso escopo neste momento, não nos deteremos nesse assunto, embora deva vir à tona pois interfere no trabalho do professor e na avaliação que este se desenvolve. Em decorrência desse quadro, devemos, por exemplo, apontar para uma situação na qual o professor se encontra freqüentemente, em que, diante de um vasto contingente de alunos seus, mal consegue realizar o que muitas vezes lhe tem sido colocado como a necessidade de desenvolver uma avaliação processual, quando, põem-se-lhes, infelizmente, apenas casos em que ele consegue identificar as condições extremas de um “bom” ou “mal” aluno ou condições particulares por alguma determinada peculiaridade do aluno. Cremos que todo esse vasto e árduo campo de trabalho permitiu-lhe acumular experiências as mais diversificadas que, em termos pedagógicos, podem ser vistas por você como qualitativamente ricas ou não e, em termos existenciais, como subjetivamente gratificantes ou não. Cremos, assim, que é esse o patamar que cada um de nós pode trazer à baila para mobilizar as questões sobre a avaliação em Geografia. Julgamos que muitas questões pertencentes ao Ensino Fundamental de 5ª a 8ª séries também se encontram no Ensino Médio. Outras questões são específicas de cada um deles, daí, merecerem uma discussão à parte e integrarem o que pensamos refletir na identidade de professor de Geografia de um ou outro nível do Ensino Básico. Nas docência das 5ªs a 8ªs séries do Ensino Fundamental, o professor se encontra em uma situação delicada e complexa que é a de dar-se a tarefa de integrar a passagem de um aluno oriundo das séries iniciais, nas quais, na maior parte das vezes, o tratamento do ensino de Geografia esteve em mãos de professor polivalente não especialista. Nas chamadas 5ªs e 6ªs séries, mais acentuadamente nas 5ªs séries, encontra-se uma situação considerada

freqüentemente pelo professor especialista em Geografia como o lócus da iniciação ao conhecimento geográfico, uma vez que ele considera não terem sido desenvolvidos os pré-requisitos nas séries iniciais. Assim como esse professor integra aquela passagem, cabe-lhe, na continuidade, acompanhar a travessia dessa aprendizagem até uma terminalidade específica, pondo-se-lhe as muitas discussões sobre esse aspecto ligado aos objetivos do Ensino Fundamental, cuja especificidade requer um tratamento diferente da do Ensino Médio. O que nos interessa registrar é que a identidade do professor do Ensino Fundamental como que “flutua”, ora propenso a considerar com mais consistência o que ele toma como as questões pedagógicas estrito senso, ora praticamente absolutizando o campo conceitual da Geografia. Já, no Ensino Médio, põe-se ao professor uma situação diferenciada pois, ao mesmo tempo que ele acolhe os alunos oriundos dos últimos anos do Ensino Fundamental, cabe-lhe a inserção o ensino de Geografia tendo em vista alguns desdobramentos que levam tanto à formação de, em princípio, um profissional técnico de nível médio, assim como ao ingresso do aluno no ensino superior. Isto significa que, a priori, seus alunos estejam de posse de algumas das condições colocadas como básicas no desenvolvimento e aquisição de conhecimentos geográficos, uma vez que o ensino de Geografia foi ministrado por um especialista da área. Ao mesmo tempo, põe-se no Ensino Médio um imperativo que lhe é cobrado, a da preparação para estudos posteriores. Trata-se da discussão das finalidades ou objetivos. Não iremos analisar detalhadamente o que os documentos legais encaminham, apenas lembraremos que a LDB (1) coloca-os nos seguintes termos: “Artigo 32 – O ensino fundamental, com duração mínima de oito anos, obrigatório e gratuito na escola pública, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante: I – o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo; II – a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, dasx artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade; III – o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimento e habilidades e a formação de atitudes e valores; IV – o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social” . “Artigo 35 – O ensino médio, etapa final da educação básica, com duração mínima de 3 anos, terá como finalidades: I – a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;

II – a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; III – o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; IV – a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina” . Fizemos a transcrição literal para verificarmos que, se o Ensino Fundamental focaliza a formação geral básica no caput do artigo, o Ensino Médio é tido, também no caput, como etapa final de algo (o Ensino Básico), porém, sem definir o que realizar nessa terminalidade, abrindo-se imediatamente para os seus dois “pés”: consolidar o que antes ocorreu (Ensino Fundamental) e permitir que haja prosseguimento de estudos, ou seja, no ensino superior.Estes são os dois dilemas do professor de Geografia no Ensino Médio. Também não nos deteremos nas questões estruturais do ensino escolar, hoje, em que, por exemplo, a organização em ciclos ou em séries acaba por interferir na própria concepção e prática da avaliação, assim como apenas nos referiremos a inúmeras outras variáveis que deixam suas marcas no processo de ensinar e aprender, cada uma delas merecedoras de discussões específicas. Na realidade, elas todas estão contribuindo para uma des/re/significação da identidade do professor. Fizemos estas considerações iniciais muito em função de esboçarmos os traços de nossos possíveis perfis, tendo em vista constituir um patamar que seja o nosso ponto de partida, como se estivéssemos dizendo: é com esse sujeito/ator que estamos conversando. Esperamos que, com este espírito, realizemos nossas respectivas acolhidas.

2. PARA INÍCIO DE CONVERSA: Como consideramos a avaliação um processo amplo, nosso objetivo é o de fazermos uma tentativa de apresentar outras questões para serem discutidas conjuntamente.Talvez esse encaminhamento permita articular avaliação e a aprendizagem, avaliação e a educação, avaliação e a sociedade, quer dizer, talvez assim possamos enxergá-la em um contexto mais amplo da produção do nosso saber/fazer pedagógico interessado no ensino de Geografia que acontece das 5ªs às 8ªs séries do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Se não realizarmos essas articulações, corremos o risco de fazer da

SUGESTÃO DE ATIVIDADE: APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE NOSSAS IDENTIDADES

avaliação uma esfera isolada que se reivindique, mesmo, a condição de entidade, o que significa tornar-se reificada como se fosse um fetiche, tal qual se transformam aqueles aspectos da realidade que ganham autonomia isolada e subordinadora. À primeira vista, pode parecer-lhe que, de novo, será feita uma fiscalização camuflada e a cobrança pedagógica de uma série de procedimentos considerados como lacunas em seu trabalho de ensinar Geografia. Ou, então, que, utilizando-se de estratégias também pedagógicas, estar-se-ia tentando obscurecer as lacunas, desta vez postas em um contexto concreto caracterizado pela precariedade funcional não solucionada pelos poderes constituídos, como geralmente os professores costumam, não sem razão, cobrar. Na verdade, convenhamos, o tema proposto dá margem a esses entendimentos pois, em geral, o tratamento dispensado aos professores freqüentemente caminha naquelas direções apontadas, restando-lhes, posteriormente, a estratégia que podemos resumir em uma frase que não é desqualificadora, pelo contrário, expressa a força da ironia contida no “uni-vos e virai-vos”. Os professores podem estar lançados à essa deriva, ao esquecimento em que eles ficam relegados. Tratar-se-ia de um pseudo esquecimento, podendo encarar-se a displicência institucional e sistêmica como uma das estratégias de uma política educacional pouco identificada ou mesmo contrária à construção do saber voltado para uma realização humana por parte do aluno. Se for o caso de predominar-se esse quadro concreto nas escolas, pensamos que os professores podem até desenvolver estratégias para reverter ou contrapor-se às artimanhas do poder, criando as suas outras próprias artimanhas. Nas escolas onde é praxe o pequeno ou nenhum acompanhamento pedagógico (qualquer que seja a linha desse acompanhamento) do trabalho dos professores, fato de que muitos destes se queixam, existe um vasto campo de produção de saberes e práticas no ensino de Geografia que podem ser seu instrumento pedagógico, no instante em que ele fecha as portas de sua sala-de-aula para desenvolver seu trabalho com autonomia. Isto não significa que seja um campo tranqüilo de ser cultivado, pelo contrário, é uma tarefa que requer um debruçar-se sobre a artesania docente. Nas escolas onde existe esse acompanhamento pedagógico, põe-se ao professor uma outra tarefa dialógica com os profissionais da educação responsáveis por esse trabalho, com os quais pode-se estar caminhando pelas mesmas trajetórias ou, mais penoso, caminhando para direções divergentes ou opostas. São tarefas de dificuldades diferentes, porém, cremos serem sempre dificuldades, pois o processo dialógico é, por si, uma prática das relações sociais que exige o esforço da mediação entre identidades e alteridades. Daí que, no trabalho docente, os desafios são sempre imensos, qualquer que seja o contexto. Então, o desafio que colocamos é: vamos encará-los?

Podemos, então, tornar também a avaliação em um aliado do professor enquanto parte do processo de ensinar-aprender. Com freqüência nós nos deparamos diante de análises girando em torno dessa abordagem e, como conclusão, julgamos esse discurso vago. Daí, você pode estar também concluindo como, em geral, os professores concluem a respeito do discurso das universidades, imputando-lhe a vagueza, o excesso de teoria, quando consideram que, na realidade, são necessárias as medidas práticas. Pensamos que podemos estabelecer um diálogo com ambos os braços da produção do conhecimento humano, ou seja, estaremos fazendo um convite para analisarmos, mesmo que rapidamente, algumas facetas de cunho mais teórico cuja validade esteja na sua possibilidade de esclarecer uma prática concreta e, ao mesmo tempo, estaremos apresentando situações concretas referendando uma fundamentação teórica que possa servir de instrumento de trabalho mais abrangente, menos dependente do contexto escolar espaço-temporal. 3. NOSSA CONVERSA É SOBRE AVALIAÇÃO MESMO MAS, QUAL AVALIAÇÃO? O trabalho docente contém uma variedade e complexidade de momentos ou situações, cada um eles voltados para um certo tipo de fazer relaciona a um certo tipo de pensar. Não precisamos nos alongar muito sobre o plano de curso de Geografia, sobre o por quê dele ter sido elaborado dessa ou daquela forma, as aulas planejadas e seu acontecimento cotidiano exitoso ou frustrante por causa disso ou daquilo.., a escolha dos materiais didáticos e sua utilização de um jeito ou de outro jeito, questões bastante discutidas nos diversos encontros temáticos dos professores. Porém, na presente oportunidade, nossa conversa é mesmo sobre o tema da avaliação. Embora na pretendamos nos alongar nas diversas abordagens sobre avaliação, resultantes de ela ser vista sob diversos ângulos (2), não podemos deixar de nos referir a esse fato pois, além de circularem nos diversas discussões dessa temática, elas precisam vir à baila pois interferem no processo avaliatório em Geografia, que é o objeto central desta nossa conversa. Podemos, por exemplo, falar, sob um ângulo bastante particular, a respeito de uma dessas abordagens que se refere ao fato de um professor encarar a avaliação como uma instrumento de punição e controle, um aspecto já bastante analisado e geralmente condenado do fazer/pensar pedagógico, freqüentemente apontado como uma prática usual de muitos professores. Se esse tipo de avaliação é tão real, e parece-nos que sim, cabe-nos remetê-la para vastos e diversos campos de discussão que cobrem desde as subjetividades das quais estamos impregnados, expressando-se em sua dimensão pessoal e social, até as discussões da antropologia cultural que pode nos iluminar, ao apontar os diferentes contextos sócio-culturais nos quais existem diferentes concepções sobre o julgamento da conduta humana nas mais diferentes esferas do existir das pessoas.

Cabe-nos, por exemplo, discutir o fascismo como uma produção humano-social do mundo contemporâneo que concebe e realiza a subordinação dos homens pelos homens, desdobrando-se inclusive no processo escolar. Alojada no interior de uma sociedade que, na esteira das revoluções gestadas a partir do Ocidente nos últimos séculos e colocadas como diferentes desejos em diferentes contextos globais, temporais e espaciais, a contemporaneidade está prenhe de processos de equalização em várias manifestações do acontecer dos homens, embora estejamos nos acostumando e nos acomodando a afirmar o contrário. Daí que a avaliação escolar, inserida nessas vertentes de discussão, requer um tratamento no mínimo multidisciplinar. No extremo dessa abordagem, podemos derivar para o seu oposto, que seria a possibilidade infinita de os alunos se expressarem em todas as direções e de todas as formas que se lhes vão aparecendo, encarando o processo do ensinar-aprender como guiada apenas pelo espontaneísmo. Do ponto de vista das discussões educacionais, cremos que ainda podemos nos pautar pela tensão não resolvida entre diretividade e não-diretividade, uma questão muito discutida e colocada na década de 80. Apontamos mas, também, não é o caso de verificarmos mais detalhadamente, neste momento, a maior ou menor funcionalidade de um outro tipo de registro formal de avaliação como um procedimento pedagógico-administrativo. Não se trata de negar a importância do registro de nossas próprias experiências, ainda mais para nós, que temos uma relação tão forte com a Geografia que é, ela mesma, a geo-grafia, o registro da Terra. É que tanto esta questão como as questões anteriores nos remetem a discussões de diversas ordens e do âmbito geral, dizendo respeito a todos os professores. Queremos nos referir, aqui, àquele momento ou situação do seu trabalho de professor de Geografia voltado para o que, neste nosso encaminhamento, consideramos como a criação de ações destinadas precipuamente para esclarecer a condição em que se encontra a aprendizagem do aluno diante do ensino desenvolvido, que dizer, esclarecer se ele está aprendendo ou não. Será muito ou pouco? Será que se trata de quantificar a aprendizagem? Ou será que se trata de qualificá-la? Sendo isto, o que significa uma aprendizagem de qualidade? Se algumas dificuldades se põem, onde elas estão situadas? 4. EXISTE UM BURACO MAIS EMBAIXO... Antes de nos referirmos às questões acima apontadas, precisamos lembrar-nos de uma questão anterior, que vamos secundarizando ou esquecendo na rotina do dia-a-dia. O filósofo Henri Lefebvre (3) chamou de cotidianidade a uma característica do mundo moderno de repetição incessante que faz as coisas perderem o sentido e adquirirem uma característica banalizadora. Lefebvre nos lembra como essa cotidianidade é corrosiva. Tentando dar conta dessa desconstrução operada pelo nosso cotidiano repetitivo e destituidor do sentido as coisas, precisamos lembrar-nos que, sempre quando avaliamos, o fazemos em relação a alguma coisas. Dito de uma maneira que pode ser encarada até como bastante simplória, o que antes consideramos seria correspondente à

situação em que nos encontramos quando avaliamos a beleza física de alguém, quando o fazemos segundo um padrão, algum modelo, alguma referência. Trata-se, na verdade, de uma situação nada simples para analisarmos uma questão de aparenta simplicidade. Daí, pensar-se nesta questão tão corroída no ensino atual: quais serão os nossos padrões, modelos e referências para avaliar uma aprendizagem em Geografia desenvolvida pelo nosso aluno do Ensino Fundamental e Médio? A partir de quais referenciais podemos considerar que o aluno expressa o conhecimento geográfico cuja apropriação consideramos importante? Na cultura urbano-industrial que vai se globalizando, a realidade vai se transformando em uma compressão espaço-tempo, como o geógrafo Milton Santos (4) analisou, contribuindo à sua moda para que compreendamos com mais clareza as mudanças freqüentes e efêmeras inclusive no nosso cotidiano. Assim, também, cremos, acontece com as nossas referências. Qual é o nosso padrão de avaliação escolar para a verificação da aprendizagem geográfica? Se não as constituímos ou as esquecemos, precisam ser (re)construídas ou (re)significadas a fim de que a avaliação possa desenvolver-se a bom termo ou, no mínimo, sem tantas tensões. 4.1. Ainda um velho buraco... Muitas questões discutidas no âmbito das ciências da educação nem chegam às escolas dos Ensinos Fundamental e Médio, assim como existem outras que nestes são candentes e continuam incisivas e, no entanto, são até tidas nas considerações teóricas como já vencidas. Entendemos que devemos ainda nos referir à dualidade o quê/quanto se ensina/aprende – quem aprende, pois ela continua posta e é atual no Ensino Básico, embora, tratada intensamente nos anos de 1970 e 1980, pareça ter sido meio que deixada de lado nos atuais estudos teóricos. Nossos referenciais de avaliação seriam definidos tomando por base esses aspectos? Na verdade, eles espelham o tratamento do ensinar-aprender e, daí, verificarmos situações avaliatórias medindo-se quais e quantas informações foram retidas ou não pelo aluno. É comum que muitos pais de alunos se queixem de projetos pedagógicos de algumas escolas que não se pautam por essa referência, argumentando que seus filhos “não estão aprendendo nada”, ao concluírem, à sua maneira, que inexistem conteúdos ou estes são pouco tratados nos diferentes componentes curriculares, implicando uma situação de desvantagem, na seqüência dos estudos porventura a serem desenvolvidos pelos seus filhos futuramente. Não podemos escamotear esse aspecto pois, muitas vezes, constatamos que também professores, do Ensino Superior ao Ensino Básico, buscam para os seus filhos as chamadas escolas de qualidade que significa, se não a prevalência dos conteúdos, no mínimo a presença deste aspecto de uma maneira significativa. Profissionais do ensino que são, almejam para seus filhos uma escolaridade completa até o Ensino Superior, de preferência nas grandes universidades públicas extremamente concorridas, implicando uma passagem por um tipo de Ensino Médio para depois submeterem-se a um vestibular cujas vinculações com a quantidade/quantidade de conteúdos são evidentes,

dada o alto índice da relação candidato/vaga. Muitas vezes, parece até existir uma discrepância entre o discurso voltado para o outro e a prática voltada para si. Não se trata de querermos, aqui, equacionar e resolver aquela dualidade mas de levantarmos alguns pontos importantes para a nossa discussão sobre a avaliação e de buscarmos entendê-la em sua complexidade e articulação com âmbitos mais abrangentes da realidade. Em uma sociedade produtora de mercadorias, onde “tudo o que sólido desmancha no ar”, no dizer de Karl Marx (5), a educação e a escolarização também correm o risco de se tornarem também uma mercadoria que se vende e se compra. Daí, identificarmos cada vez mais instituições de ensino particular que vão crescendo e se disseminando pelo país, como se fossem, também, verdadeiros conglomerados, grandes supermercados que fabricam pacotes de ensino constituindo-se em “grifes” adotadas por escolas de cidades do interior. Estas acabam por comprar os modelos pedagógicos com os respectivos materiais instrucionais e os respectivos instrumentos de avaliação, cuja credibilidade é conferida pela credibilidade da instituição de origem, transformada em cartão de apresentação da escola do interior que pretende acolher alunos dos segmentos sociais dispostos a adquirir este tipo de padrão pedagógico, fugindo da escola pública estigmatizada como não dotada de um padrão satisfatório para preparação ao ingresso futuro em um ensino superior de qualidade. Não podemos, a priori, analisar o padrão de qualidade dessas escolas, porém, cabe-nos apontar que, além do aspecto quantitativo dos conteúdos embutido na concepção de qualidade, estão evidentes a constituição de mercadorias e sua condição concorrencial que vão marcando a instituição escolar, já desde os primeiros anos de escolarização. Daí, cremos estar fazendo estas análises para encontrar alguns elementos para uma maior inteligibilidade da avaliação, para entendê-la em seus dilemas diante da dualidade o quê/quanto ensinar/aprender – quem aprende, uma tensão permanente com que o professor do Ensino Fundamental também se depara. Cremos, mesmo, que se trata de um dilema mal resolvido, restando, na prática, ao professor a tarefa de trabalhá-lo na sua contraditoriedade. Apontando para essa tarefa do professor, não queremos dizer que devemos a priori nos colocar no imperativo de dobrar-se diante da primazia da realidade posta. Diante desta, cabe-nos torná-la afirmativa, encarando o desafio de tornar suas possibilidades em construções à serviço do ensinar e aprender, de tal forma que ela ganhe novas perspectivas. 4.2. Novos (?) buracos

Se é importante assinalar a trajetória que iremos esboçar muito preliminarmente neste trabalho, é importante adiantar que ela não resolve o conflito entre, de um lado, os processos que se põem no ensinar e aprender e, de outro lado, os produtos desse

processo vistos de diversas maneiras mas que, em geral, são cobrados em seu aspecto quantitativo. Com tais cautelas, devemos nos referir às mudanças no tratamento do que tem sido colocado como um ensino qualitativo que não se prenda à aquisição de quais e quantos conteúdos e informações curriculares e, derivativamente, às avaliações ligadas a outros referenciais. Nas décadas de 1960 e 1970, os instrumentos formais/legais e os estudos educacionais referiam-se à necessidade de o professor tornar o “aluno capaz de”, o “aluno apto a”, ou seja, um ato do professor. Posteriormente, em especial nos anos de 1990, passou-se a enfatizar a construção pelo aluno de “competências/habilidades”, mudando o foco do ensinar-aprender, centralizando no aluno um processo em desenvolvimento ou a desenvolver. Ao nosso ver, ambas abordagens não se excluem, colocando-se, ousamos dizer, como uma falsa questão. O que nos interessa apontar, para esta oportunidade, é a importância dos processos a acontecerem como o eixo do ensinar-aprender, muito mais do que uma qualidade que se basta pela quantidade de conteúdos informados pelo professor ou em constituição pelos alunos. A qualidade foi sendo atribuída ao processo de construção do conhecimento, muito mais do que ao próprio conhecimento objetivamente estabelecido como aquisição. Tais mudanças refletem-se inclusive nos Parâmetros Curriculares Nacionais (6), que apontam a necessidade de serem desenvolvidos os “conteúdos procedimentais” e os “conteúdos atitudinais”, além dos “conteúdos conceituais”, bem com a explicitação de suas concepções de avaliação. Embora seja indispensável colocarmos nossos alertas diante de inovações que podem ser apenas aparentes, também não iremos nos deter na análise de tais concepções, uma vez que elas são uma das que circulam na atualidade, o que implicaria a necessidade de também abordarmos as demais. Referimo-nos a essas diferentes abordagens temporais e conceituais a título de inserir o campo do desenvolvimento das capacidades, aptidões, competências, habilidades como o privilégio do que podemos denominar, neste trabalho, de aspecto processual no ensinar e aprender e, em decorrência, na avaliação.

SUGESTÃO DE ATIVIDADE: DESENVOLVIMENTODAS ANÁLISES DAS QUESTÕES A SEREMAPRESENTADAS, ATRAVÉS DELÂMINAS/RETROPROJETOR

Algumas questões que integraram o sistema de avaliação geral do governo, aplicado nas escolas mineiras, o SIMAVE, podem servir para exemplificar alguns dos aspectos acima considerados. (REPRODUZIR A QUESTÃO H04109MG COM AS ALTERNATIVAS) Tratou se de questão aplicada junto aos alunos das 4ªs séries do Ensino Fundamental, cujos índices percentuais de indicação de respostas foram: Alternativas Alunos do estado de Minas Gerais Alunos de Belo Horizonte A 16.3% 16.8% B 8.7% 7.8% C 5.8% 4.7% D 69.2% 70.6% Total 100.0% 100.0% Algumas conclusões que podemos tirar a partir dessas informações:

- Não vimos diferenças significativas entre as formas de percepção dos alunos do estado e da capital.

- O que nos parece importe reter, neste momento, é que uma grande parcela deles tem

desenvolvida a lateralidade, uma das condições para serem construídas as noções de localização espacial. Ou seja, em torno de 70% discrimina esquerda de direita, considerando a figura central de Bruno como referência, na qual o aluno se projeta. O fato da figura de Bruno estar de costas facilita para apontar-se o seu lado direito, que coincide com o lado direito do quadro apresentado.

- O que pode nos preocupar é que cerca de 30% dos alunos ainda não indica estar

discriminando a lateralidade encaminhada pela questão. Dentre eles, cerca de 16% confunde a esquerda da direita, ao apontarem Ana ocupando o lado direito.

Passemos a algumas considerações tomando por base outra questão do SIMAVE aplicada junto aos alunos das 8ªs séries do Ensino Fundamental e do Ensino Médio: (REPRODUZIR A QUESTÃO H08021MG COM AS ALTERNATIVAS)

Índices percentuais das respostas indicadas pelos alunos das 8ªs séries: Alternativas Alunos do estado e Minas Gerais Alunos de Belo Horizonte A 11.9% 12.9% B 17.0% 16.0% C 12.2% 12.8% D 58.9% 58.2% Total 100.0% 100.0% Iremos analisar somente os dados dessa série, uma vez que não no foram fornecidos os dados dos alunos do Ensino Médio. Tratando-se de uma questão que procura realizar o diagnóstico de um aspecto da aprendizagem mais específica das séries iniciais do Ensino Fundamental, os índices apresentados pelos alunos das 8ª s séries nos remetem a algumas análises e reflexões: - os percentuais dos alunos do estado e da capital não trazem diferenças

significativas. - As figuras apresentadas na ilustração oferecem algumas desvantagens, porque são

menos claras do que aquelas da questão da 4ª série. Daí, ser necessário maior cuidado para realizar as análises e relativizá-las. Entretanto, um detalhe merece registro, que é o das figuras das mesma pessoa indicarem-na em posições diferentes, configurando-se uma situação mais dinâmica em relação à da questão da 4ª série.

- A inexistência de alternativas que apontem somente uma figura cria alguma

dificuldade para analisar-se mais seguramente o desenvolvimento ou não da lateralidade.

- Por exemplo, uma alternativa que indicasse a figura B permitiria a identificação do

aluno com ela, apenas através da projeção direta do seu corpo com o da figura, sem realizar reversão; essa alternativa permitiria expressar o domínio ou não dos seus lados direito e esquerdo.

- A indicação da figura A também permitiria essa expressão da lateralidade, porém,

com a realização de uma reversão, na qual, o aluno, olhando para a figura colocada de frente, necessita encará-la em uma posição que não é a sua, enquanto lê a questão colocada no papel.

- A indicação da figura C também permitiria essa expressão da lateralidade, porém,

com a realização de duas reversões, seja observá-la de frente, seja observá-la de ponta cabeça.

- Apesar das dificuldades apresentadas pela formulação da alternativas, os dados são indicativos de que a lateralidade ainda está mal resolvida para significativa parcela de 40% de alunos. Sabemos das importância dessa inserção corporal no espaço para o desenvolvimento das noções de localização espacial.

- Cerca de 40% dos alunos expressam dificuldade em projetar-se, através da figura da

menina, em situações diferentes através de posições diferentes. Esta talvez seja a conclusão mais genérica que possa ser tirada.

Podemos refletir sobre as implicações dessas dificuldades tanto no aspecto da localização espacial considerando o espaço em seu sentido geométrico, como no aspecto de realizarem-se operações de reversibilidade e de descentração, se quisermos nos apoiar nas análises de Piaget. Outras reflexões que extrapolam o dado visível fornecido pela questão em si, feitas com cautela, propiciariam um enriquecimento do nosso pensar/fazer . Por exemplo, que ações e estratégias devemos criar para o aluno colocar-se em situações diferentes das daquelas em que se encontra em termos de um olhar para si e para o outro, significando, talvez, os possíveis desenvolvimentos das alteridades? Não são transposições automáticas a serem realizadas, mas trata-se de mecanismos concatenados dentro do aluno que podem ser estimulados, acreditando e investindo para que ele, na sua elaboração interna, processando os dados, incorpore-os no sentido literal, ou seja, torne-os parte de seu corpo carnal e mental. Com o tratamento que sugerimos, julgamos que podemos tomar a avaliação no sentido que lhe é conferido enquanto avaliação diagnóstica. Seria um instrumento para realizarem-se atividades na direção de se privilegiarem os processos de desenvolvimento de competências e habilidades à serviço da aquisição de conhecimentos. O privilegiamento acima ressaltado deixa abertas aos alunos as possibilidades de eles realizarem seus processos de desenvolvimento da aprendizagem a partir de algumas situações que lhes forem apresentadas o que, como antes colocamos e ainda reiteramos com toda a franqueza, deixa pendente os aspectos ditos quantitativos dos conhecimentos a serem adquiridos. Conhecimentos esses que se pretende conferir por meio de um tipo de avaliação bastante conhecida, chamada de “provão”, ou seja, a aplicação de inúmeras questões, geralmente de múltipla escolha, rastreando o rol de conteúdos que devem ser desenvolvidos para os alunos. Talvez as considerações que se seguem possam oferecer algumas pistas para discutirmos as relações entre esses nossos referenciais colocados para o processo avaliatório. Podemos relacionar a situação posta pela questão acima analisada com a questão que se segue.

(REPRODUZIR A QUESTÃO H08006MG E AS ALTERNATIVAS) Trata-se de uma questão aplicada nas 8ªs séries do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Também neste caso, dispomos apenas dos índices das 8ªs séries: Alternativa Alunos do Estado de Minas Gerais Alunos de Belo Horizonte A 24.8% 24.8% B 21.3% 20.7% C 16.4% 14.8% D 37.4% 39.7% Total 100.0% 100.0% Podemos fazer, preliminarmente, algumas análises e reflexões:

- Trata-se de uma questão cujo “conteúdo” versa essencialmente sobre localização espacial. É uma questão que costuma ser tratada até com uma certa intensidade nas 5ªs séries, sendo considerada como um dos chamados pré-requisitos eleitos pelos professores de Geografia, enquanto conceitos básicos sem os quais eles concluem que a continuidade da aprendizagem geográfica fica comprometida.

- Não são verificadas diferenças substantivas entre os índices do estado e da capital.

- Será que o índice relativamente baixo de acertos tem alguma relação com os índices

acontecidos na questão anterior?

- Se há uma correlação, cremos que alguns dos pré-requisitos destes pré-requisitos merecem ser considerados. Colocamos em termos interrogativos e no condicional

pois não temos pistas, além das suposições e informações advindas de experiências observadas, para concluirmos sobre o tipo de tratamento com que esses conteúdos, em geral, são trabalhados. Entretanto, a situação com que nos defrontamos merece que apontemos as seguintes contingências:

. Os professores das séries iniciais do Ensino Fundamental costumam realizar atividades que procuram desenvolver a lateralidade, ao passo que os professores especialistas de Geografia costumam não fazê-las, talvez por considerarem-nas impróprias para as suas séries e faixas etárias e, mesmo, extemporâneas à sua competência. . Os professores especialistas de Geografia têm como praxe, em termos gerais, encaminhar o desenvolvimento dos “conteúdos” geográficos não levando em conta a inserção corporal (e existencial) dos alunos nos tópicos de localização espacial, considerando-se, neste caso, o espaço em seu sentido geométrico.

- Numa outra vertente de explicação e interpretação dos processos de ensinar e

aprender, há aqueles que consideram que as aprendizagem realizadas são aquelas significativas, isto é, dotadas de algum significado para a realidade concreta do aluno. Será esta questão significativa? Possivelmente, entre alunos de 5ªs séries seja pois, dentre outros motivos, muitas vezes esses conteúdos que tratam das coordenadas geográficas são acompanhados de atividades lúdicas (importantes para a faixa etária dos alunos dessa fase) do tipo “batalha naval”. Porém, com relação aos alunos de 8ªs séries, junto aos quais esta questão foi a aplicada pelo SIMAVE, podemos considerar que esse tópico dos conteúdos geográficos contempla seu universo de interesses?

Os dados relativos do Ensino Médio seriam extremamente úteis para realizarmos análise comparativas mais detalhadas, porém, na sua impossibilidade, nossas considerações estão versando sobre o Ensino Fundamental da 5ª a 8ª série: a aquisição de uma variedade de informações, conceitos, enfim, dos tradicionais e chamados conteúdos geográficos estaria relacionada a uma série de variáveis que intervêm no ensinar e aprender, chegando ao extremo (aliás, bastante usual) da memorização mecânica e compulsória dos mesmos. Acompanhando essa maneira de proceder, a avaliação caminha na direção de verificar se os alunos são capazes de reproduzir o montante de informações e conceitos que conseguiram reter. Retornando àquela análise de ordem geral que antes fizemos acerca da sociedade da competição e da necessidade de preparação dos alunos, tendo em vista sua inserção em um ensino superior considerado de qualidade, entende-se alguns dos porquês de avaliações voltadas para a verificação quantitativa dos conteúdos dos quais os alunos se apossaram ou não. Muitas vezes, os professores são questionados sobre a finalidade e a utilidade desse tipo de ensino e avaliação em Geografia, em especial no Ensino Médio. Pensamos que a questão

não está de todo bem colocada pois o que se põe no centro desse questionamento é a sua inserção no contexto de uma sociedade que vai pondo algumas necessidades, anulando algumas e recolocando outras, num constante processo em que “tudo o que é sólido desmancha no ar” que, por sua vez, nos prensa na necessidade de superá-lo. 5. OS NOSSOS BURACOS GEOGRÁFICOS: COMO SE FOSSEM CRATERAS A SEREM (RE)DESCOBERTAS Gostaríamos, em decorrência do que expusemos, de entrar em um tema que nos parece central, que é a Geografia da qual nos ocupamos nas escolas do Ensino Fundamental e Médio. Como vemos exaustivamente nos cursos superiores, existem as chamadas tendências, as teorias da Geografia, enfim as concepções que estão na base de um pensar/fazer geográfico. É costume que essa temática seja desenvolvida, tendo como patamar teórico básico da produção do pensamento geográfico, os chamados clássicos da Geografia, cuja leitura, hoje, leva-nos a chamá-los de deterministas e possibilistas, tomando, como questão a ser respondida, a maneira como acontece a relação sociedade-natureza. Percorrendo rapidamente os diferentes modos de fazer uma geografia, passamos, grosso modo, pela chamada Geografia quantitativa, pela Geografia Crítica para, hoje, ser colocada na ordem do dia o que se tem denominado de Geografia Humanista, Geografia do Cotidiano, enfim, novas abordagens que enfatizam os processos de percepção espacial (7). Podemos exemplificar algumas dessas formas de tratar a Geografia no Ensino Fundamental expressa na avaliação e tecer algumas considerações sobre a sua pertinência ou não. (REPRODUZIR A QUESTÃO H08027MG E AS ALTERNATIVAS)

Nessa questão aplicada nas 8ª s séries, as alternativas foram assinaladas com os seguintes índices percentuais: Alternativa Alunos do estado de Minas Gerais Alunos de Belo Horizonte A 12.9% 10.8% B 14.0% 12.7% C 18.3% 18.1% D 54.9% 58.4% Total 100.0% 100.0% Fazemos as seguintes considerações: 1. A questão gira em torno da relação sociedade-natureza, ao colocar três alternativas apontando para os dados naturais da paisagem apresentada e uma alternativa versando sobre a atividade humana, antecipando no seu enunciado uma interpretação, pode-se dizer, “possibilista” dessa relação. 2. Essa interpretação é induzida pela justaposição de dois momentos expressos em duas paisagens de um mesmo local, não havendo como deixar de realizar tal interpretação e, portanto, alimentar uma grande expectativa quanto ao índice de indicação da alternativa correspondente. 3. O que nos intriga é que cerca de 40%, tanto dos alunos de Minas Gerais como de Belo Horizonte, não aponta para a obviedade identificada pelo olhar do professor especialista de Geografia. Podemos levantar algumas hipóteses a serem conferidas pelos professores que estão na prática da docência de 5ª s a 8ª s séries do Ensino Fundamental:

a- Será um problema das ilustrações apresentadas?

b- O aluno não identificou e discriminou os conceitos mobilizados na questão como paisagem natural, paisagem humanizada, cadeia de montanhas, rios, cobertura vegetal, atividades econômicas, ao responder ao que lhe foi solicitado.

c- Trata-se de conceitos que integram um tema usualmente desenvolvido nas 5ªs

séries. Ao chegar nas 8ªs séries, momento da aplicação da questão, o aluno não expressou que reteve esses “conteúdos”, ou seja, que ele não os incorporou como uma análise da realidade que tenha sido compreendida e, portanto, registrada e em condições de ser mobilizada para a interpretação de paisagens geográficas.

d- Quais seriam os procedimentos a serem feitos para que a aprendizagem seja uma aquisição mais estável de conhecimentos/competências/habilidades de que o aluno necessita, seja enquanto desenvolvimento e posse de um instrumento de análise e interpretação da realidade, seja como condição para compor o seu acervo de informações e conteúdos de que irá necessitar para sua carreira discente rumo ao ensino superior de qualidade?

e- Haveria uma relação entre os resultados mostrados pelos alunos e o não

desenvolvimento desses conteúdos geográficos? Ou, sendo desenvolvidos, como geralmente costumam ser, de que maneira eles tem sido feitos? Existiriam outras estratégias para que aconteça uma aprendizagem significativa?

f- O tema e sua abordagem são relevantes?

Em comparação com essa questão anterior, podemos analisar a questão seguinte: (REPRODUZIR A QUESTÃO H09049MG COM AS ALTERNATIVAS)

Índices apresentados: Alternativas Alunos do estado de Minas Gerais Alunos de Belo Horizonte A 4.3% 4.6% B 2.7% 3.5% C 90.4% 89.1% D 2.6% 2.8% Total 100.0% 100.0%

Essa questão foi aplicada nas 8ª s séries do Ensino Fundamental mas é considerada pelos seus autores como também pertinente à 3ª série do Ensino Médio.

Podemos assinalar os seguintes aspectos: - Trata-se de uma questão que pede ao aluno a expressão de algumas

competências/habilidades, ou seja, para ele realizar uma leitura de texto escrito identificando as características da problemática apontada, interpretá-la no sentido de entender a escassez futura da água para, finalmente, tirar conclusões. Em nenhum momento há o relato textual da necessidade de ter-se uma preocupação com o consumo de água e com a questão ambiental implicada, entretanto, cerca de 90% dos alunos, tanto no estado como na capital, chegaram a bom termo na consecução dessa questão.

- A temática dos recursos hídricos e desdobramentos ambientais, da maneira que o

texto de entrada da questão descreve, costuma ser enfocada no Ensino Médio. Ela aparece no Ensino Fundamental em forma de pequenos tópicos e itens a serem levados em conta pelo aluno, a fim deste estar atento e posicionar-se em forma de alertas induzidos (se formos levar em conta a análise de alguns livros didáticos).

- Podemos, de novo, concluir que deparamos-nos com um aluno realmente

intrigante? O tema ambiental é candente na atualidade, com o qual ele costuma mostrar-se bastante sensibilizado. Entretanto, no caso desta questão, podemos considerar preliminarmente que se trata da maneira instigante como ela foi apresentada e formulada e, daí, encontrar uma ótima acolhida na mobilização das habilidades/competências por parte do aluno das 8ª s séries frente a uma questão cuja formulação poderia ser apresentada também nas 3ªs séries do Ensino Médio?

Comparemos essa questão com a que se segue, também voltada para a temática da questão ambiental:

(REPRODUZIR A QUESTÃO H08167MG COM AS ALTERNATIVAS)

Os índices são os seguintes: Alternativas Alunos do estado e Minas Gerais Alunos de Belo Horizonte A 64.0% 59.3% B 7.6% 7.9% C 14.5% 16.2% D 13.9% 16.9% Total 100.0% 100.0%

- No presente caso, os resultados não apontam índices de acerto tão expressivos como na questão anterior, cerca de 64% e 60% entre alunos do interior e capital.

- A formulação desta questão é bastante simples, exigindo por parte do aluno a

observação da figura para identificar os conceitos postos nas diferentes alternativas e a conclusão mais coerente para cada uma das situações.

- As temáticas das duas últimas questões apresentadas caminham na mesma direção,

versando sobre a problemática ambiental. Esta questão foi considerada como específica de 8ª série, ao passo que a anterior permite inserções em ambas as modalidades.

- Podemos considerar que se trata de dificuldade criada pela formulação e impressão

gráfica desta questão?

- Identificam-se conceitos de difícil compreensão por parte do aluno, apesar de se considerar que eles são usualmente abordados no Ensino Fundamental?

- Tratar-se-ia, através de um encaminhamento mais simples, de ser apresentada uma

situação menos instigante?

- Podemos afirmar que o tratamento de temas dessa natureza, aos quais o aluno demonstra bastante empatia, requer a estratégia da inserção do mesmo de tal maneira que ele se sinta mobilizado e integrante da problemática apresentada?

Outra questão que coloca aspectos merecedores de algumas reflexões é a seguinte: (REPRODUZIR A QUESTÃO HO8107MG COM AS ALTERNATIVAS) Índices apresentados: Alternativas Alunos do estado de Minas Gerais Alunos de Belo Horizonte A 30.5% 28.6% B 12.4% 12.7% C 51.4% 54.0% D 5.7% 4.8%

Total 100.0% 100.0% Considerações:

- A questão é considerada pelos seus autores como específica de 8ªs séries do Ensino Fundamental. No nosso entender, entretanto, ela também é pertinente para o Ensino Médio. É um tema recorrente quando se pretende desenvolver os aspectos voltados para o estrutural e o econômico, colocando-os na base de uma análise que muitos professores consideram uma abordagem da Geografia Crítica, a partir da qual eles se propõem, por exemplo, a desenvolver estudos em torno das relações de (inter)dependência dos países e os desdobramentos de tal condição.

- A questão requer que o aluno esteja de posse de algumas habilidades/competências

como observação, comparação, interpretação de dados integrantes dos dois quadros esquemáticos, além da aquisição prévia de informações e conceitos específicos, sem os quais, apesar de aplicar aquelas habilidades/competências, dificilmente ele chegaria a bom termo. Por exemplo, acompanhando os fluxos apontados nas duas situações apresentadas e identificadas como DIT clássica e DIT nova, ele poderia inferir qualquer uma das alternativas colocadas, para chegar ao fator explicativo solicitado.

- A “performance” dos alunos está em torno dos índices mais usualmente encontrados

nas questões em geral, em torno de 50%, seja entre aqueles do estado de Minas Gerais, seja entre os de Belo Horizonte.

- A quase metade dos alunos demonstra ou a não aplicação daquelas

habilidades/competências, ou o não domínio daqueles conceitos e informações. A que recorreríamos para encontrarmos alguns pontos visando a uma melhor compreensão do ensinar-aprender-avaliar?

- Tais habilidades/competências não foram ainda desenvolvidas, apesar de elas serem

solicitadas costumeiramente?

- Os conceitos e informações colocados à disposição para os alunos utilizarem no movimento do seu pensar, aplicar e concluir não estão claros na formulação da questão? Ou, se estão claros, seria o caso deles não terem sido tratados no ensino de Geografia? Teriam sido desenvolvidos em realizando-se outras análises compreendidas nas variantes que o tema enseja?

- O desenvolvimento de um tema tão caro da Geografia Crítica pode, por si só,

realizar a aprendizagem que tanto se almeja, tendo em vista as proposições dos professores que se colocam como seus defensores? Em outros termos, será que o tema não requer outro tipo de tratamento?

- É possível um tratamento que caminhe na direção de uma inserção do aluno no âmago da questão colocada em nível teórico? A questão apresentada para avaliação propicia essa abordagem?

Colocamos algumas interrogações para o professor de Geografia, em sua prática e reflexão propiciada pelo fazer escolar, buscar respostas mais condizentes com a realidade concreta posta em sua trajetória junto ao seu aluno. Isto porque julgamos que não podemos, a partir de algumas análises de questões formuladas e dados estatísticos apresentados, estabelecer conclusões fechadas, apesar do esforço em fazer essas análises de forma atenta e contextualizada, buscando suscitar diversos ângulos e as possíveis variáveis para a compreensão dos resultados apresentados. Nossas considerações visam tão somente servirem como elementos para serem discutidos, a fim de subsidiar as intervenções que porventura o professor de Geografia possa desenvolver, pensando e escolhendo o tipo de Geografia que ele possa colocar à disposição para o aluno. Algumas considerações adicionais merecem ser registradas, quando nos referimos às diferentes tendências teóricas da Geografia e seus desdobramentos possíveis na Geografia real do Ensino Básico, a Geografia Escolar. Julgamos que esta é dotada de uma complexidade tal que se coloca como se estivéssemos diante de uma ponta de iceberg, escondendo uma imensidão de variáveis a serem postas para favorecer o desenvolvimento cognitivo do aluno, as habilidades de cognição, as competências tanto nos processos de conhecimento como nos conceitos incorporados. Quer dizer, o fazer pedagógico do professor de Geografia requer não só trazer à tona os referenciais teóricos da ciência geográfica como também as (pré)condições do aluno que realiza, encontrando-se em diferentes patamares, a compreensão geográfica do mundo. 6. AS PROPOSTAS DE ENSINO DE GEOGRAFIA PRESENTES NOS INSTRUMENTOS INSTITUCIONALIZADORES: (DES)CONSTRUÇÃO? (DES)ORIENTAÇÃO?

Existem, na atualidade, várias propostas de Geografia destinadas aos Ensinos Fundamental e Médio em nosso país, apresentadas grosso modo neste texto, tendo em vista trazer para a discussão o possível subsídio que possam trazer ao trabalho do professor. Algumas colocam suas formas de o quê ensinar, como ensinar, como verificar o que foi ensinado etc, transformando em interlocutor o professor que deve se pensar como ator central do processo ensino-aprendizagem. Outras propostas, especialmente para o Ensino Fundamental, entram para o campo dos processos envolvendo contextos e aspectos cognitivos dos alunos.

Durante a ditadura militar, o acesso desse tipo de documento curricular à escola se deu basicamente através dos livros didáticos, que desenvolviam seus conteúdos geográficos

acompanhando os compulsórios guias curriculares, inclusive trazendo em sua capa uma tarja expondo essa identidade.

A partir dos anos de 1980, acompanhando as mudanças políticas do país que saía da ditadura militar, surgiram vários documentos, todos eles colocando-se como propostas de ensino. Referindo-nos com franqueza ao contexto em que vivemos, sabemos que esses documentos, à parte sua pertinência teórica ou não, chegam ao professor de uma maneira bastante precária, na maior parte das vezes. Ou nem chegam, mesmo que tenham adentrado pela escola.

Esses documentos, bem ou mal, mesmo que parcialmente, estão espelhados em alguns livros didáticos que, a bem da verdade, buscaram uma renovação mais com a intenção de ir ao encontro de novas proposições teóricas da ciência geográfica que passaram a circular mais amplamente e a estabelecer uma polêmica dentro das universidades e entidades científicas, cujas repercussões junto aos professores de Geografia do Ensino Básico restringiam-se, em geral, à sua existência. A partir do momento em que concluíam a graduação, imersos na faina do seu fazer escolar e, na maior parte das vezes distanciados das discussões teóricas, esses professores conseguiam e ainda conseguem acompanhá-las, quando muito, nos momentos de Encontros e Congressos das suas entidades representativas. Assim, os documentos curriculares acabam por ter acesso ao professor, mesmo que expressos parcialmente, ainda através da leitura realizada pelos livros didáticos.

Colocamos a seguinte questão: em que medida tais documentos podem subsidiar o professor no seu ofício de ensinar Geografia? Eles, por si sós, podem levar à definição das formas de ensinar Geografia, sem que o professor tenha construído com consistência seu saber específico e pedagógico? ?

Um trabalho constante com as propostas de ensino mediante a discussão de seus pressupostos e de suas bases teóricas, acompanhadas da realização de diversas e indispensáveis oficinas que promovessem o intercâmbio das experiências desenvolvidas e em construção, articulando a teoria e a prática, poderia ser uma metodologia que suscitasse sua razão de ser, ou seja, as transformasse em um instrumento construtivo para o crescimento do saber/fazer do professor de Geografia em sua formação continuada.

7. ALGUMAS REFERÊNCIAS PARA A REALIZAÇÃO DA AVALIAÇÃO NO CONTEXTO DE UM PROJETO DE ENSINO

7.1. A construção de algumas referências:

O MEC/INEP/DAEB elaborou estudos procurando contemplar e sistematizar as diferentes propostas de ensino existentes no país, em nível federal, estadual e municipal, tendo em

vista estabelecer uma referência uniforme para a realização da avaliação. Esses estudos resultaram na elaboração das “Matrizes Curriculares de Referência para o SAEB (Sistema de avaliação do Ensino Básico)”.

O documento, que está anexo ao presente trabalho, expõe seus fundamentos e detalha os tópicos dos conteúdos curriculares de Geografia, denominados de descritores, segundo três níveis de competências cognitivas: nível básico, nível operacional e nível global. Referindo-se a ações específicas que podem ser desenvolvidas, esses níveis estão contidos nos diferentes modos de se desenvolver um determinado conteúdo/conceito geográfico. Trata-se, também de um “universo possível de cruzamentos entre conteúdos e competências referentes aos diferentes níveis (Básico, Operatório e Global) e aos diferentes ciclos de avaliação (4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e 3ª série do Ensino Médio).” (8)

Devemos prever a existência de possíveis dificuldades e de não concordâncias quanto a diferentes interpretações nos níveis cognitivos apontados para alguns tópicos geográficos apresentados nesse documento. Porém, eles permitem identificar e compreender a possibilidade de se estabelecerem ações em diferentes níveis de complexidade. Isto, por sua vez, nos apresenta elementos de como trabalhar os diversos conteúdos/conceitos nos diferentes momentos do ensino de Geografia. Quer dizer, tal procedimento pode constituir-se em pistas indicativas para o professor de Geografia criar alguns referenciais de níveis diferentes em seu pensar/fazer geográfico-pedagógico, refletindo-se diretamente no processo avaliatório.

Visando a discutir algumas possibilidades na direção acima apontada, utilizaremos como exemplo algumas questões elaboradas pelo SIMAVE sem, contudo, analisarmos sua receptividade pelos alunos, uma vez que dispomos de índices percentuais de poucas questões.

O tema da discriminação étnica no Brasil, tratado nas seguintes questões aplicadas nas 8ªs séries, permite discutir algumas competências e habilidades nelas mobilizadas em diferentes níveis:

(REPRODUZIR A QUESTÃO H08131MG E SUAS ALTERNATIVAS)

- Analisando apenas o enunciado da questão, ele já ultrapassa o nível básico das

competências e habilidades pois, de início, requer que o aluno faça uma leitura das informações contidas nos 3 gráficos e as compare internamente dentro de cada gráfico e externamente entre os 3 gráficos. Ou seja, solicita do aluno ações do nível operacional

- Uma questão estaria nesse nível básico se ela solicitasse “apenas” a identificação das características contidas nos gráficos. Na realidade, não se trataria de uma simplificação sem sentido, tratar-se-ia de encaminhar ao aluno algumas informações básicas dentro da temática.

- Por isso, pensamos que a pertinência de se solicitar um ou outro nível de competência cognitiva é definida pelo momento de em que se está desenvolvendo a temática. Entretanto, é importante que respeitemos esses “passos” no caminhar do pensamento e percepção pelo aluno e, ao mesmo tempo, que estejamos conscientes de nossas intenções ao lançarmos mão de uma estratégia.

Podemos comparar essa questão anterior com a seguinte: (REPRODUZIR A QUESTÃO H08165MG E AS ALTERNATIVAS)

- O aluno precisa estabelecer relações entre os dados apresentados pela questão e a realidade que o cerca, ou seja, identificar a discrepância entre os dados oficiais e a situação real da população brasileira em relação à cor da pele. Entendemos que a resolução desta questão mobiliza competências do nível global, pois seu enunciado não adianta os motivos pelos quais é pequeno o contingente de pessoas que se declaram como negros. -Vislumbramos a possibilidade de uma estratégia tornar-se bastante hábil se esta questão for aplicada após a questão analisada anteriormente, pois permitiria ao alunos desenvolver e incorporar conceitos importantes como o da discriminação e o imaginário de suas vítimas, estando de posse de informações/conhecimentos e mobilizando-se internamente de uma maneira objetiva, podendo basear-se em dados para estabelecer conclusões fundamentadas.

Julgamos, assim, que esses 3 níveis, não se circunscrevendo cada um deles em uma modalidade de ensino, estão articulados em uma estratégia de intervenção pedagógica que leve em consideração tanto os conteúdos/conceitos geográficos como as habilidades/competências cognitivas.

SUGESTÃO DE ATIVIDADE:IDENTIFICAÇÃO DOS NÍVEIS BÁSICO,OPERACIONAL E GLOBAL NAS DIVERSASQUESTÕES APRESENTADAS NESTETEXTO.

7.2. A avaliação e seu papel concreto em um projeto de ensino:

As nossas considerações anteriores tiveram a intenção de apresentar para a discussão alguns elementos para buscar compreender a avaliação no contexto do desenvolvimento de um projeto de ensino, podendo tomar-se como base uma proposta de ensino institucional ou um projeto construído pelo professor de Geografia, a partir de pressupostos por ele estabelecidos segundo determinados critérios, levando em conta algumas concepções geográficas e alguns processos educacionais e pedagógicos implicados. Em relação a estes últimos, tendo em vista contribuir para a sua reflexão de uma maneira concreta, apresentamos sinteticamente um projeto de ensino (9), a partir do qual podemos desenvolver diferentes temas e abordagens geográficas. E, como desdobramento, podemos nos perguntar: como a avaliação pode ser um instrumento de intervenção construtiva dentro desse projeto?

Momentos de um projeto de ensino centrado na investigação da realidade e nos sujeitos pedagógicos

1. Identificação sociocultural dos atores da cena de sala-de-aula – sujeitos fins. 2. Levantamento dos significados construídos sobre a(s) temática(s) em questão –

percepção.

3. Problematização – construção de questões, perguntas individuais e/ou coletivas.

4. Instrumentalização – utilização do instrumental sistemático para ampliar e responder à demanda do grupo.

5. Ressignificação - construção de sínteses parciais.

Vários desses “momentos” podem ser concretizados também elaborando-se algumas questões, seja de prospecção, quer dizer, sondando e diagnosticando, seja de projeção, quer dizer, apontando, encaminhando e construindo o próximo “passo”. Os formatos de questões abertas são mais favoráveis para essas intervenções didáticas. Contudo (trata-se de um ponto de vista estritamente pessoal), cremos que, na contingência de um professor com um intenso trabalho enquanto trabalhador horista submetido a uma imensa jornada de trabalho durante a qual ele ministra aulas para muitos alunos e de diferentes séries e modalidades de ensino (fato que não podemos nem temos o direito de deixar de lado, em razão do contexto em que vivemos), as avaliações realizadas através da elaboração de questões de múltipla escolha podem auxiliá-lo nos diferentes momentos do seu fazer pedagógico voltado para o ensino de Geografia.

8. PRECISAMOS CONCLUIR:

Podemos desdobrar esta nossa conversa para tantas outras facetas da avaliação, buscando inseri-la em contextos mais amplos e buscando suas vertentes específicas que sejam a concretude da preocupação anterior. Entretanto, precisando concluir, colocamos algumas análises feitas por Cleide do Amaral Terzi e Paulo Afonso Caruso Ronca, dois especialistas da Psicologia da Educação (10), considerando como bastante ricas as suas contribuições.

A questão que eles nos colocam é o desafio da avaliação no ensino básico, chamada por eles de prova, referindo-se a uma das modalidades concretas dos instrumentos e recursos da avaliação. Ela pode ser operatória no sentido de suscitar operações, considerando o significado que estes ganham através da teoria desenvolvimentista de Piaget. Evidentemente, as provas devem integrar a aprendizagem e o desenvolvimento de aulas também operatórias, caso contrário, iríamos, novamente, dotar a avaliação de uma existência autônoma, à parte de todo o processo de ensinar e aprender e, portanto, fictícia em seu poder de realização, à moda dos fetiches, como consideramos no início destas nossas reflexões.

SUGESTÃO DE ATIVIDADE: ELABORAÇÃO PELOSCURSISTAS DE QUESTÕES DOS DIFERENTESMOMENTOS DESSE ESQUEMA, IMPLICANDO ASESCALAS QUE VÃO DO NÍVEL BÁSICO AO NÍVELOPERACIONAL, DE UM DETERMINADO TEMA, EMUMA DETERMINADA SÉRIE OU MODALIDADE DEENSINO.

SUGESTÃO DE ATIVIDADE: ELABORAÇÃO NA MESMA DIREÇÃO, PORÉM, IMPLICANDO AS “MODULAÇÕES” DE UM DETERMINADO TEMA NOS DIFERENTES NÍVEIS (BÁSICO, OPERACIONAL, GLOBAL), AO LONGO DO ENSINO FUNDAMENTAL E DO ENSINO MÉDIO.

Julgamos que, assim como os autores, a prova operatória é melhor realizada quando se elaboram questões com um formato aberto, apresentando algumas características como uma “relação coloquial com o conhecimento”, uma “relação aluno-mundo”, uma “relação com o ler” e uma “relação com o escrever”. Trata-se de enunciados que abrem a possibilidade de uma expressão elaborada e particular por parte do aluno. Entretanto, contrariamente à posição daqueles autores, consideramos que questões com o formato de alternativas de múltipla escolha podem adquirir, também, algumas características operatórias, se seu enunciado apontar para o aluno realizar algumas operações que expressem estar de posse de habilidades e competências requeridas. Apresentaremos um exemplo utilizado por aqueles autores, referindo-se a questões aplicadas em exames vestibulares. Daí, ressalvarmos, dado o encaminhamento que sua elaboração faz, serem mais pertinentes ao Ensino Médio, ressaltando, também, que uma elaboração específica pode resultar em questões para o Ensino Fundamental: “Os Estados Unidos produzem cerca de 10 bilhões de toneladas de lixo sólido por ano. Cada norte-americano joga fora em média 300 quilos de embalagens anualmente. Especialistas da área advertem que na próxima década o país poderá enfrentar uma ‘crise do lixo’. (Folha de São Paulo, 10.03.89) Relacione o tipo de sociedade citada no texto com o(s) fator(es) que gera(m) a ‘crise do lixo’. Explique as suas características para o meio ambiente e para a preservação dos recursos naturais” Trata-se de uma questão aplicada no vestibular do Unicamp de 1990. Ela requer que o aluno realize algumas daquelas operações (podemos dizer, em termos pedagógicos, algumas habilidades/competências) apontadas por aqueles autores citados. Entretanto, ao nosso ver, é possível que, com exceção da habilidade/competência de expressar-se mediante a escrita, outras operações sejam mobilizadas, se formularmos alternativas hábeis. Colocamos para a discussão as seguintes alternativas para atender a primeira parte do que a questão solicita, ou seja, a relação: sociedade citada no texto - fatores geradores da problemática envolvida:

- sociedade produtora de descartáveis e intensa produção de mercadorias; - sociedade de consumo e sistema inadequado de coleta de lixo sólido; - sociedade produtora de descartáveis e inexistência de tecnologia para a reciclagem; - sociedade de consumo e organização espacial coerente com a saúde social.

Seria uma sugestão de como tratar a questão de modo a mobilizar no aluno uma leitura compreensiva do texto, a identificação da problemática e a relação entre as variáveis envolvidas. Porém, é necessário o dado técnico de dotar as alternativas de uma competitividade interna, quer dizer, que elas guardem uma maior equivalência possível em sua formulação, ao estabelecerem relações, mesmo que mobilizando informações/fatos incorretos.

Não fosse este senão, podemos considerar que tal característica operatória está presente na questão H09049MG que versa sobre o uso da água e sua conseqüência, antes analisada neste trabalho. E quanto à demais questões formuladas pelo SIMAVE e aqui apresentadas?

Notas: (1) Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. In Estrutura e Funcionamento da

Educação Básica. Vários autores. Ed Pioneira, São Paulo, 1998. (2) As obras de Cipriano C. Luckesi são uma das fontes às quais mais se recorre para o

aprofundamento dessa abordagem. (3) LEFEBVRE, Henri. A vida cotidiana no mundo moderno. Ed Ática, São Paulo,

1991. (4) É importante lembrar que Milton Santos escreveu várias obras analisando os tempos

atuais de globalização, da qual a compressão espaço-tempo seria uma das características. Considerações dessa ordem são feitas no contexto do pós-moderno por HARVEY, David. Condição pós-moderna. Ed Loyola, São Paulo, 1992.

(5) Marx comentou a sociedade capitalista de sua época, com imenso poder de realizar obras muitas delas dotadas de grande solidez e, ao mesmo tempo de, numa penada, desmanchá-las e delas se desfazer, na medida em que esta é a condição das mercadorias produzidas pelo capitalismo. Julgamos que tal característica ainda é presente na sociedade dos nossos tempos. Manifesto do Partido Comunista. In: Textos. Vol 3. Edições Sociais/Alfa-Omega, São Paulo, s/d.

(6) Ministério da Educação e do Desporto/Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 1998.

SUGESTÃO DE ATIVIDADE: ELABORAÇÃO DEALTERNATIVAS DO TIPO OPERATÓRIO PARA A 2ªPARTE DA QUESTÃO ACIMA APRESENTADA.

(7) Um aprofundamento dessa trajetória do pensamento geográfico pode ser feito de modo atualizado, por exemplo, com base em GOMES, P.C. da C. Geografia e Modernidade. Ed Bertrand Brasil, Rio de Janeiro, 1996.

(8) MEC/INEP/DAEB. Matrizes Curriculares de Referência para o SAEB. Brasília, 1999:11.

(9) Sistematização construída pela profª Rosalina Batista Braga, profª adjunta da FaE-UFMG, no Departamento de Métodos e Técnicas de Ensino, área de Ensino de Geografia.

(10)TERZI, C. do A. & RONCA, P.A.C. A prova operatório: contribuições da Psicologia do Desenvolvimento. PUC/São Paulo, 1991.