relatÓrio final do 1º seminÁrio para construÇÃo de …

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conass . progestores RELATÓRIO FINAL DO 1º SEMINÁRIO PARA CONSTRUÇÃO DE CONSENSOS Preocupações e prioridades dos Secretários Estaduais de Saúde quanto à organização, gestão e financiamento do SUS Sergipe, 10 a 12 de julho de 2003

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conass . progestores

RELATÓRIO FINALDO 1º SEMINÁRIO

PARA CONSTRUÇÃODE CONSENSOS

Preocupações e prioridades dos Secretários Estaduais deSaúde quanto à organização, gestão e financiamento do SUS

Sergipe, 10 a 12 de julho de 2003

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2 relatório final

Seminário do CONASS para construção de Consensos (1. : 2003 : Aracaju, SE)

Relatório final do 1º Seminário do CONASS para a construção de Consensos:preocupações e prioridades dos Secretários Estaduais de Saúde quanto àorganização, gestão e financiamento do SUS / Conselho Nacional deSecretários de Saúde. - Brasília : CONASS, 2003.116 p.

ISBN 85-89545-05-9

1. SUS (BR). I. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. II. Título.

NLM WA 525

CDD - 20.ed. - 362.1068

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3conass . progestores

© 2003 CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE - CONASSÉ permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte e a autoria.

PROGESTORES - Programa de Informação e Apoio Técnico às Equipes Gestoras Estaduaisdo S U S

tiragem deste livro: 2000 exemplares

O Progestores é uma parceria do CONASS com o Ministério da Saúde

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4 relatório final

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5conass . progestores

O processo de construção do SUS exige dos gestores, nas três esferas de governo, o usode estratégias para construção de consensos que possam dar sustentabilidade às propostas epolíticas de saúde em implementação no País.

Agregue-se para a análise deste cenário a recente renovação das equipes gestoras noâmbito estadual e federal e o conseqüente surgimento de novas idéias, novas propostas,mudanças de rumos, de políticas, tornando fundamental o aprimoramento de estratégias paraobtenção de consensos. Destaque-se ainda, a realização já prevista da 12 ª Conferência Nacionalde Saúde para o estabelecimento de diretrizes gerais para o setor, e, na qual, o CONASS deverámanifestar-se apresentando propostas políticas e técnicas com vistas à consolidação dosprincípios do SUS.

Neste contexto, os Secretários Estaduais de Saúde das 27 unidades da Federaçãoreuniram-se em Aracajú, Sergipe, entre 10 e 12 de julho de 2003, no 1º Seminário do CONASSpara a Construção de Consensos. O presente livro traz o resultado desta construção, com aspreocupações e prioridades dos gestores estaduais quanto à organização, gestão, modeloassistencial e financiamento do Sistema Único de Saúde (SUS).

A busca incansável do CONASS é pela integração entre as três esferas de governo, e odever será sempre defender os interesses da população e especialmente a garantia de acesso àsações e serviços de saúde, nos diferentes níveis de complexidade, no âmbito regional e estadual.Isto requer o fortalecimento de parcerias com o Ministério da Saúde e com as SecretariasMunicipais de Saúde.

O 1º Seminário do CONASS para a Construção de Consensos foi certamente um marcohistórico na organização dos gestores estaduais, fortalecendo não só a sua interlocução com asoutras esferas de governo, como também a capacidade gerencial de cada Secretaria Estadual deSaúde a partir da identificação de problemas comuns e do compartilhamento de propostas esoluções.

Fruto do 1º Seminário, foi lançada a Carta de Sergipe, uma síntese dos principais pontosdo consenso construído entre os Secretários. O texto da Carta de Sergipe, aprovado naAssembléia do CONASS de 23 de julho de 2003, está anexado a esta publicação, que apresentao resultado completo das discussões.

O CONASS propõe dar seqüência a esta dinâmica inicial realizando novos Seminários,selecionando e priorizando temas tais como Atenção Básica e Recursos Humanos, entre outros.

Gi l son Cantarino O’Dwye rPresid en te do C ONASS

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6 créditos

Gilson Cantarino O’Dwyer - RJ

presidente

Osmar Terra - RSJoão Paulo Barcellos Esteves - MSÁlvaro Antonio Melo Machado - AL

Fernando Agostinho Cruz Dourado - PA

vice-presidentes

Ricardo F. Scotti

secretário executivo

Gisele Onete Marani BahiaHeloiza Machado de Souza

Júlio Strubing Müller NetoLucimeiry Lima Cardoso

Regina Helena Arroio NicolettiRené José Moreira dos Santos

Rita de Cássia Bertão CataneliViviane Rocha de Luiz

assessoria técnica

Sheyla Cristina Ayala MacedoLuciana Toledo Lopes

Júlio Barbosa de Carvalho FilhoPaulo Arbués CarneiroCarolina Abad Cunha

Adriano Salgado de Farias

apoio administrativo

conass

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7conass . progestores

Secretáriosde Estado da Saúde

AC - CASSIANO FIGUEIRA MARQUES DE OLIVEIRA

AL - ÁLVARO ANTÔNIO MELO MACHADO

AM - LENY NASCIMENTO DA MOTTA PASSOS

AP - SEBASTIÃO FERREIRA DA ROCHA

BA - JOSÉ ANTÔNIO RODRIGUES ALVES

CE - JURANDI FRUTUOSO SILVA

DF - ARNALDO BERNARDINO ALVES

ES - JOÃO FELÍCIO SCÁRDUA

GO - FERNANDO P. CUPERTINO DE BARROS

MA - SUELI TONIAL

MG - MARCUS VINICIUS CAETANO PESTANA DA SILVA

MS - JOÃO PAULO BARCELLOS ESTEVES

MT - MARCOS HENRIQUE MACHADO

PA - FERNANDO AGOSTINHO CRUZ DOURADO

PB - JOSÉ JOACIO DE ARAÚJO MORAIS

PE - GUILHERME JOSÉ ROBALINHO

PI - JOSÉ NAZARENO CARDEAL FONTELES

PR - CLAUDIO MURILO XAVIER

RJ - GILSON CANTARINO O’DWYER

RN - IVIS ALBERTO LOURENÇO BEZERRA

RO - MIGUEL SENA FILHO

RR - ALTAMIR RIBEIRO LAGO

RS - OSMAR TERRA

SC - CARLOS FERNANDO CORUJA AGUSTINI

SE - EDUARDO ALVES AMORIM

SP - LUIZ ROBERTO BARRADAS BARATA

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8 créditos

Secretaria Executiva do Conasscoordenação do Progestores

Eduardo Alves do Amorim(Secretário de Saúde de Sergipe)

Maria José de Oliveira Evangelista(Secretária de Saúde Adjunta de Sergipe)

Cristina M. V. da Rocha(Diretoria de Saúde - SES/Alogoas)

Gisele Onete Marani BahiaHeloiza Machado de Souza

Júlio Strubing Müller NetoSecretários, Dirigentes e Assessores

Técnicos das 27 Secretarias de Estado daSaúde

comissão organizadora do 1º seminário do CONASS paraconstrução de consensos

André FalcãoHeloiza Machado de Souza

René José Moreira dos SantosRicardo Scotti

comissãõ de relatoria

Fernanda Goulartprojeto gráfico

André Falcãoedição e revisão

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9conass . progestores

agradecimentosO Conselho Nacional de Secretários de Saúdeagradece ao Governo do Estado de Sergipe e àtoda equipe dirigente, técnica eadministrativa da Secretaria de Estado daSaúde de Sergipe pelo apoio imprescindívelpara a realização do Seminário

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índice

METODOLOGIA DO SEMINÁRIO.................................14

O PAPEL DAS SECRETARIAS ESTADUAIS DE SAÚDE NAREORGANIZAÇÃO DO MODELO DE ATENÇÃO E DE GESTÃO

1

2 COMANDO ÚNICO ................................44

4 RECURSOSHUMANOS..............................49

5 GESTÃO E SISTEMA DESAÚDE............................51

3 FINANCIAMENTO DO SISTEMA DESAÚDE.....................................46

1.1. Promoção da Saúde .......................................................................................171.2. Inserção e incorporação das Vigilâncias ........................................................ 191.3. Atenção Básica / Atenção Primária como estratégia organizativa dos sistemas de saúde ..........................................241.4. Ações e serviços de Média e Alta Complexidade .......................................... 35

5.1. Instâncias de Negociação e Deliberação ....515.2. Habilitação dos Estados .............................51

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índice

CARTA DE SERGIPE................................54

ANEXOS

1. PRESSUPOSTOS PARA A CONSTRUÇÃO DE CONSENSOS ........62

2. REFLEXÕES SOBRE A NOA/SUS 01/02 ....................65

3. RESPONSABILIDADE E PAPEL DO ESTADO NA GESTÃO DO SUS ......................................... 101

4. DIRETRIZES PARA A REFORMULAÇÃO DOS MODOS DE GESTÃO E DE ATENÇÃO À SAÚDE – O PAPEL DO MINISTÉRIO DA SAÚDE.......................................................110

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RELATÓRIO FINAL

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14 relatório final

METODOLOGIA DO SEMINÁRIO

Considerando a impossibilidade de abordar e/ou aprofundar todos os temas relacionadosao SUS neste 1º Seminário, a opção tomada pelo CONASS foi a de eleger temas prioritários eselecionar aqueles que exigem, com urgência, o posicionamento técnico, político e operacional dosgestores estaduais.

Os oob jetivos traçados para o 1ºSeminário foram:

Analisar o cenário sócio-sanitário e da atual conjuntura política nacional;

Estabelecer consensos sobre as responsabilidades e atribuições da gestão estadual eestratégias para viabilização das mesmas;

Debater e produzir consensos entre os Secretários Estaduais de Saúde, sobre temasprioritários selecionados, para a organização, gestão e financiamento da atenção asaúde, no âmbito estadual.

Buscar subsídios para elaboração de propostas a serem levadas para discussão na 12ªConferencia Nacional de Saúde a ser realizada no período de 7 a 11 de Dezembro de2003

Para alcançar estes objetivos, utilizou-se uma dinâmica de trabalho que deu oportunidadepara discussão em grupos e subsidiou a elaboração do presente relatório, que traduz aspreocupações dos gestores estaduais, as posições técnico-político-operacionais e as estratégiaspara solucionar os problemas evidenciados.

A dinâmica dos trabalhos teve início com a realização de uma mesa redonda sobre o tema“Responsabilidades e Papel do Estado na Gestão do SUS”. Para abordar este tema foramconvidados palestrantes que têm produzido estudos e análises sobre o processo dedescentralização do setor saúde nas ultimas décadas.

Anexas a esta publicação estão os textos entregues previamente aos participantes, e queserviram de subsídio aos debates.

Em seguida, foi promovida a discussão em grupos de trabalho e em uma plenária final. Nosgrupos de trabalho foram retirados os primeiros consensos sobre os temas selecionados epriorizados. Estes foram apresentados na plenária em busca do consenso do coletivo dosSecretários.

Os Secretários e seus assessores foram distribuídos em três grupos de trabalho, cada umcontemplando nove Secretarias Estaduais de Saúde.

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15conass . progestores

Um roteiro para discussões dos grupos de trabalho foi distribuído com antecedência, paranortear as discussões, com questões previamente elaboradas pela Assessoria da SecretariaExecutiva do CONASS, visando:

Registrar os pontos de estrangulamento ou questões já identificadas pelos gestoresque necessitam de aprofundamento em busca de consenso para tomada de decisões.

Participação efetiva dos gestores e da sua equipe na preparação desses temas, deforma a objetivar as discussões durante o seminário.

Consolidar um relatório final para subsidiar a elaboração de um documento oficialcontendo as preocupações e propostas dos Gestores Estaduais

Registrar subsídios e posições do CONASS a serem levadas para discussão eaprofundamento nas Conferências Estaduais e na 12º Conferência Nacional de Saúde.

Os temas para os trabalhos em grupo foram organizados em blocos:

Bloco 1: O papel das SES na reorganização do modelo de atenção e de gestão

Temas:

Promoção da saúde

Inserção e incorporação das vigilâncias

Atenção Básica como estratégia organizativa dos sistemas de saúde

Ações e serviços de média e alta complexidade

Bloco 2 : Comando único

Bloco 3: Financiamento do sistema único de saúde

Bloco 4: Recursos humanos

Bloco 5: Gestão do sistema de saúde

T emas:

Instâncias de Negociação e Deliberação

Habilitação dos Estados

Para discussão de cada tema os participantes observaram as competências estabelecidasno Art. 17, do Capitulo IV, da Lei n. 8080 de 19 de setembro de 1990; as responsabilidades,prerrogativas e os requisitos estabelecidos pela NOAS/SUS 01/2002; e as macro funções abaixorelacionadas:

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16 relatório final

Formulação de políticas

Planejamento e programação

Coordenação, regulação e avaliação (do sistema / redes e dos prestadores públicos ouprivados).

Cooperação técnica

Cooperação financeira

Prestação direta de serviços

Desenvolvimento e capacitação de recursos humanos

Os capítulos a seguir trazem os resultados das discussões organizados segundo a divisão detemas para os grupos de trabalho do 1º Seminário. Trazem, graficamente destacados, os textosde apoio oferecidos aos grupos, as dificuldades identificadas pelos gestores e as propostas desuperação destas dificuldades, além de considerações e observações anotadas durante osdebates.

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17conass . progestores

1. O PAPEL DAS SECRETARIAS ESTADUAIS DE SAÚDE NAREORGANIZAÇÃO DO MODELO DE ATENÇÃO E DE GESTÃO

1.1 PROMOÇÃO DA SAÚDE

A saúde como um recurso para a vida

“Promoção da Saúde é o nome dado ao processo de capacitação da comunidade para atuarna melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle desteprocesso. Para atingir um estado de completo bem-estar físico, mental e social, tanto os indivíduose grupos devem saber identificar aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmenteo meio ambiente. A saúde deve ser vista como um recurso para a vida e não como o objetivo deviver. Nesse sentido a saúde é um conceito positivo, que enfatiza os recursos sociais e pessoais,bem como as capacidades físicas. Assim a promoção da saúde não é responsabilidade exclusiva dosetor saúde, e vai para além de um estilo de vida saudável, na direção de um bem estar global”1.

Seja no campo individual ou coletivo, a promoção da saúde nos remete para um enfoquesempre mais abrangente do conceito de saúde e de seus múltiplos determinantes, com todo o seudinamismo e interatividade, do homem ao ambiente e suas relações. É um contínuo identificar dedeterminantes do processo saúde doença visando sua transformação em direção à saúde. Mesmoindivíduos considerados saudáveis poderiam migrar para um estado ainda mais saudável ou menospropenso ao adoecimento.2

Prioridade para a Promoção da Saúde

Os gestores estaduais defendem a valorização e a priorização das atividades de Promoçãoda Saúde, com ênfase na articulação intersetorial, através de parcerias intra e extra-governamentais, devendo constar das políticas, planos e orçamentos estaduais de saúde como umdos eixos para a mudança do modelo de atenção à saúde.

Entre as ppr incipais d ificuldades encontradas pelos gestores estaduais para a real priorizaçãodas ações de promoção da saúde estão:

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18 relatório final

A pressão da área assistencial – demanda da população por serviços de urgência eemergência, demanda reprimida, pressão social, política e da imprensa –, que consomerecursos e tempo, gerando a baixa priorização da Promoção da Saúde nas três esferasde governo.

A falta de clareza conceitual: o que é e como se articulam as ações de promoção,prevenção, informação, educação e comunicação em saúde.

A indefinição dos papéis das Secretarias Estaduais e das Secretarias Municipais deSaúde nas atribuições e competências para execução das ações de Promoção daSaúde, com tendência a caracterizar o município como executor e o Estado apenascomo financiador.

A baixa utilização de critérios epidemiológicos no processo de planejamento eprogramação da área de saúde.

A baixa capacidade da Secretarias Estaduais de Saúde (SES) para desenvolver açõesintersetoriais com órgãos governamentais e não-governamentais, e o baixo poder deintervenção e participação na elaboração de políticas globais (a exemplo dos PlanosPlurianuais - PPA e da Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO).

A ausência de políticas de financiamento para saneamento básico, água, lixo eesgoto - fundamentais para o fortalecimento das ações de promoção da saúde.

A inadequação quantitativa e qualitativa de Recursos Humanos para a Promoção daSaúde, com permanente evasão e migração dos técnicos das SES.

A baixa visibilidade dos bons resultados obtidos na área de promoção da saúde.A eventual incompatibilidade entre estados e municípios nas estratégias de

comunicação, principalmente durante a realização de campanhas ou de intensificaçãode ações.

Para a superação das dificuldades identificadas, oos Secretár ios Estaduais de Saúdep ropõem:

Aprofundar a discussão para delimitar o conceito, o campo de ação e as atribuiçõesdo gestor estadual na Promoção da Saúde.

Valorizar os cenários epidemiológicos na definição de prioridades de investimentosna área da saúde.

Buscar articulação intersetorial no âmbito do governo estadual. As SecretariasEstaduais de Saúde devem atuar como catalisadoras das ações intersetoriais,promovendo parcerias intra e extra-governamentais, como por exemplo a integraçãocom o sistema educacional para que a escola seja um lócus da promoção à saúde.

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19conass . progestores

Adotar atitude propositiva em projetos de Promoção, oferecendo aos municípiospropostas que possam ser reproduzidas, não se limitando ao cumprimento da agendafederal.

Trabalhar institucionalmente a Promoção da Saúde com usuários e servidores,pautando o tema de forma transversal em todos os processos de capacitação, bemcomo na agenda de informação e comunicação.

Compatibilizar as estratégias de comunicação estaduais com as iniciativas municipaisvisando a potencialização dos resultados de campanhas ou ações de intensificação.

Convencer os governantes para priorização de recursos para ações de Promoção daSaúde.

Fortalecer e divulgar iniciativas estaduais de promoção da saúde, a exemplo doprograma “Agita São Paulo”.

1.2. INSERÇÃO E INCORPORAÇÃO DAS VIGILÂNCIAS

Ampliando conceitos para os modelos assistenciais

Na última década, a preocupação com a construção de um modelo assistencial quearticulasse os conhecimentos e técnicas provindos da epidemiologia, do planejamento e dasciências sociais em saúde se expressou na utilização do termo “vigilância à saúde” (Teixeira et al,1999), definindo-se que esta “trabalha com a conceituação mais ampla do papel da epidemiologianos serviços de saúde, incluindo avaliação e pesquisa” e que “em suas propostas de ação, deveapreender a desigualdade social e, portanto a distribuição desigual de agravos à saúde”,representando um “deslocamento da base conceitual do exclusivo controle e/ou erradicação dosagentes para a compreensão das relações sociais que definem a desigualdade” (Mendonça et al.,1994).3

A Vigilância Sanitária é uma organização, e, neste sentido, faz parte do SUS – uma rede depessoas, equipamentos, recursos –, com autoridade legal para intervir sobre ambientes e sobre osetor produtivo. É também um conjunto de conhecimentos (uma parte da Saúde Coletiva) sobre aprodução de saúde e de doenças, e um conjunto de regras (procedimentos técnicos) consideradaspotentes para assegurar saúde às pessoas: uma organização com poder legal e um campo deconhecimento especializado, ao mesmo tempo (Campos, 2002).4

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20 relatório final

Termo de Ajuste e Metas da Vigilância Sanitária

A regulamentação do financiamento das ações de média e alta complexidade da VigilânciaSanitária deu-se somente em setembro de 2000, como resultado da pactuação do Termo de

Ajuste e Metas. A política de financiamento destas ações em Vigilância Sanitária busca areversão da lógica do pagamento por produção que remunera atividades/procedimentosrealizados, individualmente, baseadas em tabelas de pagamentos na maioria das vezes com valoresfixados que não representam os custos reais das ações executadas.

Em relação ao cumprimento do Termo de Ajuste e Metas, os gestores estaduais identificaram quehá dd ificuldades:

Na descentralização das responsabilidades de média e alta complexidade, devido àinsuficiente estrutura tecnológica e de recursos humanos dos municípios para odesenvolvimento das ações e à baixa capacidade das Secretarias Estaduais de Saúdepara desenvolver a função de cooperação técnica.

No cumprimento das exigências da Agência Nacional de Vigilância Sanitária(ANVISA), devido à incompatibilidade de algumas normas com a realidade regional elocal.

No cumprimento das metas de média e alta complexidade em todo o estado; e nocumprimento dos prazos estabelecidos nos Termos de Ajuste.

Os principais pproblemas apontados pelos gestores estaduais com relação ao cumprimento doTermo de Ajuste e Metas da Vigilância Sanitária são:

A grande quantidade de indicadores.A relação direta da ANVISA com as áreas técnicas da Vigilância Sanitária estadual,

não envolvendo os gestores estaduais nas discussões e decisões sobre a área,reproduzido estruturas centrais verticalizadas.

A baixa integração da área técnica da Vigilância Sanitária com demais áreas daSecretaria Estadual de Saúde, dificultando a articulação de ações para o cumprimentodas metas.

A insuficiência quantitativa e qualitativa de recursos humanos, dificultando ocumprimento da exigência de equipe mínima nos municípios.

A resistência à descentralização da Vigilância Sanitária nos municípios – entravepolítico na ação da Vigilância.

A priorização de ações de fiscalização.A fragilidade dos sistemas de informação, com baixo retorno aos executores das

ações.

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21conass . progestores

Para a superação das dificuldades identificadas com relação ao cumprimento do Termo de Ajustee Metas da Vigilância Sanitária, os SSecretários Estaduais de Saúde devem:

Recomendar ao Ministério da Saúde que revise, com participação dos estados emunicípios, o marco regulatório da Vigilância Sanitária, tendo como parâmetro apreservação da qualidade e a adequação às realidades locais e regionais.

Assegurar a integração da área técnica da Vigilância Sanitária com os demaissetores da Secretaria Estadual de Saúde.

Fortalecer o papel da Vigilância Sanitária nas ações de Promoção da Saúde.Adequar os prazos para cumprimento do termo de ajuste.Demandar ao Ministério da Saúde o aperfeiçoamento dos sistemas de informação.Fortalecer a política de desenvolvimento de recursos humanos na área das

Vigilâncias.

Financiamento da Vigilância Sanitária

As dd ific uldades id en tif icadas pelos gestores estaduais para a utilização dos recursos federaisda Vigilância Sanitária são:

O mecanismo vigente de transferência de recursos federais aos municípios, viaEstado. Devido à inexistência de mecanismos de transferência fundo a fundo, osrecursos são repassados por meio de convênios. Dado o baixo valor de repasse,alguns municípios não prestam contas, ficam inadimplentes e não podem recebernovos recursos, o que gera a baixa execução estadual.

Entraves administrativos e burocráticos para a execução dos projetos, tais como:dificuldades no processo licitatório, na contratação de recursos humanos, naaprovação dos projetos, e, em alguns estados, a situação de conta única dos fundosestaduais de saúde.

Para superar as dificuldades identificadas na utilização dos recursos federais da Vigilância Sanitária,os Secretários Estaduais de Saúde devem:

Solicitar ao Ministério da Saúde que proceda a alteração na forma de transferênciade recursos federais aos municípios, implantando a modalidade fundo a fundo,mediante programação estadual.

Buscar alternativas de superação das dificuldades administrativas no processolicitatório, a exemplo da utilização do pregão.

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22 relatório final

Programação Pactuada Integrada de Epidemiologia e Controle deDoenças (PPI/ECD)

As ações de Epidemiologia e Controle de Doenças são desenvolvidas de acordo com umaProgramação Pactuada Integrada de Epidemiologia e Controle de Doenças (PPI-ECD). O Ministérioda Saúde estabelece as atividades a serem realizadas e metas a serem atingidas na área deEpidemiologia e Controle de Doenças, em caráter nacional, especificadas para cada unidade daFederação. As atividades e metas estabelecidas servem de base para que a Comissão IntergestoresBipartite estabeleça a PPI-ECD estadual, reavaliando as metas definidas pelo Ministério da Saúde eretornando para pactuação as metas a serem atingidas pelo Estado e o conjunto dos municípios,especificando ainda para cada atividade proposta o gestor que será responsável pela sua execução.As atividades e metas pactuadas na PPI-ECD são acompanhadas por intermédio de indicadores dedesempenho, envolvendo aspectos epidemiológicos e operacionais.

Em relação ao cumprimento de metas da Programação Pactuada Integrada de Epidemiologia eControle de Doenças (PPI/ECD), os pproblemas id en tif icados pelos gestores estaduais foram:

A insuficiente estrutura tecnológica e de recursos humanos dos municípios para odesenvolvimento das ações e a baixa capacidade das Secretarias Estaduais de Saúdepara desenvolver a função de acompanhamento e cooperação técnica junto aosmunicípios.

A baixa integração da área técnica de Vigilância Epidemiológica com demais áreas daSecretaria Estadual de Saúde, com reprodução das estruturas centrais verticalizadas,dificultando a articulação de ações para o cumprimento das metas e de ações deacompanhamento e avaliação.

A predominância na PPI/ECD de indicadores operacionais em detrimento deindicadores de processo e de resultados.

A multiplicidade e superposição de instrumentos de programação e pactuação, cominadequação de indicadores e atraso no desencadeamento do processo de pactuaçãoanual.

A não incorporação de mudanças propostas pelos Estados na pactuação.A ausência qualitativa e quantitativa de recursos humanos, com especial carência de

profissionais adequados às especificidades regionais (ex: entomologistas na regiãoNorte).

A desmotivação do quadro de servidores da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA)para implementação da descentralização do controle de endemias.

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23conass . progestores

Como pp roposta d e superação dos problemas identificados, as Secretarias Estaduais de Saúdedevem:

Assegurar a integração da área técnica da Vigilância Epidemiológica com demaisáreas da Secretaria Estadual de Saúde, possibilitando articulação de ações para ocumprimento das metas e para o acompanhamento e avaliação dos municípios.

Solicitar ao Ministério da Saúde a integração dos instrumentos de programação epactuação (PPI Saúde), com incorporação dos indicadores propostos pelos Estados.

Solicitar ao Ministério da Saúde as providências para integração dos sistemas deinformação de base nacional.

Solicitar ao Ministério da Saúde que se retome, em fórum tripartite, a discussão paraimplantação do Incentivo de Valorização de Resultados - IVR.

Fortalecer a política de desenvolvimento de recursos humanos na área dasVigilâncias.

Financiamento da Vigilância Epidemiológica

O repasse dos recursos federais do Teto Financeiro de Epidemiologia e Controle de Doenças(TFECD) é feito, mensalmente, por intermédio do Fundo Nacional de Saúde para os FundosEstaduais e Municipais de Saúde, em conta específica, podendo ser utilizado somente nasfinalidades especificadas em suas atribuições.

Para os gestores estaduais mais importante que as dificuldades para utilização dos recursos,é a própria insuficiência dos recursos do TFECD. A recente atualização dos valores do teto, a partirda base populacional, foi defasada e insuficiente para a abrangência das ações de VigilânciaEpidemiológica e controle de doenças.

As ddificuldades apontadas pelos gestores estaduais para a utilização dos recursos federais doTFECD foram:

A ausência de instrumento normativo que oriente Estados e municípios na utilizaçãodos recursos.

Dificuldades relacionadas ao processo licitatório.A interpretação dada, pela gestão anterior do Ministério da Saúde, de que os

recursos do TFECD estariam destinados somente para o combate à Dengue.

Page 23: RELATÓRIO FINAL DO 1º SEMINÁRIO PARA CONSTRUÇÃO DE …

24 relatório final

Para superar as dificuldades identificadas na utilização dos recursos federais do Teto Financeiro deEpidemiologia e Controle de Doenças (TFECD), aas S ec reta r ias Estaduais d e Saúde devem:

Propor ao Ministério da Saúde a construção de uma nova pactuação, que amplie asações de Vigilância Epidemiológica e contemple novos cenários epidemiológicos.

Propor a revisão da lógica de elaboração dos estratos e dos critérios de inserção dosestados no TFECD, considerando as diferenças e especificidades regionais.

Solicitar ao Ministério da Saúde que conclua, com participação da representação dosestados e municípios, a publicação que orienta a aplicação dos recursos do TFECD.

Integração das Vigilâncias

Os gestores estaduais acreditam na possibilidade de integração das ações de Vigilância(Epidemiológica, Sanitária e Ambiental) nos espaços microrregionais, na elaboração e coordenaçãodo Plano Diretor de Regionalização (PDR).

Para isso, aas S ec reta r ias Estaduais d e S aúde devem:

Adotar medidas para induzir a integração destas ações.Adotar medidas para integrar e capacitar os recursos humanos das respectivas áreas

das Secretarias Estaduais de Saúde.

1.3. ATENÇÃO BÁSICA / ATENÇÃO PRIMÁRIA COMO ESTRATÉGIAORGANIZATIVA DOS SISTEMAS DE SAÚDE

O primeiro nível de atenção à saúde

“(...) Há que se destacar que as denominações atenção primária e atenção básica nãodispõem de uma base conceitual estruturada. Atenção primária é uma expressão encontrada naliteratura internacional, com vários significados: primeiro nível de atenção, um tipo de serviços,uma filosofia de atendimento (seria uma racionalidade?), uma estratégia de organização dossistemas de saúde. Entretanto, as diversas noções de atenção primária em saúde parecem estarsustentadas em princípios assistenciais como universalidade do acesso e integralidade da atenção.Atenção Básica parece ser uma formulação do SUS para designar o primeiro nível de atenção àsaúde, sustentada no princípio da integralidade, compreendido como a articulação de ações depromoção da saúde e prevenção, tratamento e reabilitação de doenças e agravos. Pode-seconcluir, provisoriamente que há convergência entre as noções de atenção primária em saúde eatenção básica em saúde. As diferenças parecem estar relacionadas com distintos contextos

Page 24: RELATÓRIO FINAL DO 1º SEMINÁRIO PARA CONSTRUÇÃO DE …

25conass . progestores

históricos da organização dos sistemas de saúde que, por sua vez, estão vinculados às relaçõesestabelecidas entre Estado e sociedade para responder aos problemas e necessidades em saúdeme cada experiência em particular5”.

A Atenção Primária em Saúde, enquanto estratégia organizativa da atenção à saúde,compreende os seguintes princípios e diretrizes:

Atenção generalizada, sem restrição a grupos de idade, gênero ou problemas desaúde;

Atenção acessível, integrada e continuada;

Trabalho em equipe;

Atenção centrada nas pessoas e não na enfermidade;

Atenção orientada à família e à comunidade;

Atenção coordenada, incluindo o acompanhamento do usuário nos outros níveis deatenção;

Apoio constante aos usuários nos aspectos relacionados à saúde e bem estar.6

“Ofertar Atenção Primária à saúde com qualidade exige uma interação constante comcidadãos e cidadãs usuários dos serviços, a responsabilização por sua saúde, a utilização deprocedimentos promocionais e preventivos, a resolução de 85% dos problemas e a coordenaçãodos fluxos e contra-fluxos na rede de serviços...

A atenção primária à saúde exige um conjunto de conhecimentos, atitudes e habilidadesmuito mais amplos que aqueles solicitados nos procedimentos de média e alta complexidade. Aatenção primária à saúde convoca conhecimentos e habilidades nos campos da biologia, damedicina, da psicologia, da sociologia e os utiliza numa perspectiva de intersetorialidade, que atorna, inquestionavelmente, muito mais complexa que as ações catalogadas como de média e altacomplexidade na NOAS SUS 01/02.

Os procedimentos de média e alta complexidade apresentam, sem dúvida, maior densidadetecnológica, incorporando maior quantidade de tecnologias de produtos, enquanto osprocedimentos de atenção primária à saúde são mais intensivos em cognição. Conseqüentemente,aqueles têm maior custos em relação a estes.”7

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26 relatório final

A porta de entrada do serviço de saúde

Os gestores estaduais propõem o fortalecimento da Atenção Primária entendendo-a comoeixo fundamental para a mudança de modelo assistencial. Defendem a responsabilidade inerentedo gestor municipal pela organização e operacionalização da Atenção Primária, mas entendemcomo da esfera estadual as macrofunções de formulação da política, de planejamento, de co-financiamento, de formação, capacitação e desenvolvimento de recursos humanos, de cooperaçãotécnica e de avaliação, no âmbito do território regional e estadual. A Atenção Primária deve serorientada para o cidadão e sua autonomia, para a família e a comunidade e ser qualificada nosentido de também prover cuidados contínuos para pacientes portadores de patologia crônica eportadores de necessidades especiais.

Os gestores estaduais concordam que a efetiva organização dos sistemas de saúdepressupõe o fortalecimento do nível primário de atenção (Atenção Básica). Os SecretáriosEstaduais de Saúde têm posição unânime e firme com relação ao entendimento de que a atençãobásica é a principal porta de entrada do serviço de saúde, ressalvadas as situações de atendimentode urgência/emergência. Para fortalecer esta posição, aas S ec reta rias Es taduais de Saúdedevem:

Buscar a adequação do financiamento para a Atenção Básica, sem prejuízo para ofinanciamento dos serviços de média e alta complexidade.

Adotar medidas técnicas e políticas para fortalecer e divulgar a atenção básica comoporta de entrada do sistema de saúde.

O papel do gestor estadual na Atenção Básica

Os gestores estaduais concordam que a gestão e a execução das ações e serviços deAtenção Básica são responsabilidades inerentes ao gestor municipal.

Para os gestores estaduais, o papel das Secretarias Estaduais de Saúde na Atenção Básica é:

Co-financiar a Atenção Básica, a partir de critérios e de plano de investimento,definidos pela gestão estadual.

Garantir a equidade na oferta de serviços de Atenção Básica.Promover cooperação técnica com os municípios, com orientação para organização

dos serviços de Atenção Básica que considere a incorporação de novos cenáriosepidemiológicos.

Promover a capacitação e o desenvolvimento de recursos humanos na AtençãoBásica, com ênfase em:

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27conass . progestores

Educação permanente;Assessoramento aos municípios nas questões legais de contratação de pessoal

(discutir normas, salários regionais, execução de concursos).Realizar o acompanhamento, avaliação e regulação dos serviços de Atenção Básica,

visando sua qualificação.Executar ações da Atenção Básica, de forma suplementar ou transitória, nos

municípios que não desempenham sua responsabilidade na área.

Para exercer este papel, aas Secretari as Estaduais de Saúde d evem:

Definir e implantar, no âmbito de cada Estado, propostas de co-financiamento para aAtenção Básica, de acordo com critérios definidos pela gestão estadual.

Aperfeiçoar o processo de cooperação técnica e financeira com os municípios, nosentido de garantir o acesso com equidade, a resolutividade e a integralidade naatenção à saúde.

Adotar medidas de indução para que os municípios assumam efetivamente suasresponsabilidades na Atenção Básica.

Adotar medidas para sensibilização dos gestores, das instituições de formação derecursos humanos em saúde, dos profissionais, da população usuária e dos formadoresde opinião para a importância da organização dos serviços de Atenção Básica.

Conduzir a política de recursos humanos no âmbito dos Estados, coordenando ainstalação e implementação dos Pólos de Capacitação.

Recomendar ao Ministério da Saúde que a discussão sobre a política de AssistênciaFarmacêutica Básica seja inserida no contexto da Atenção Básica, como uma dascondições necessárias para se atingir níveis adequados de resolutividade.

Para fortalecer o papel das Secretarias Estaduais de Saúde na Atenção Básica, oo ConselhoNacional d e Secretár ios d e Saúde d eve:

Constituir um grupo de trabalho com o objetivo de discutir metodologias einstrumentos para acompanhamento, avaliação e regulação da Atenção Básica noâmbito dos Estados.

Realizar seminário de Secretários Estaduais de Saúde específico para oaprofundamento das questões relativas à Atenção Básica, paralelo com a realizaçãode uma oficina de trabalho com participação de técnicos das SES responsáveis pelacoordenação da área de Atenção Básica.

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28 relatório final

Incorporação da Atenção Básica na estrutura das SES

O conjunto das Secretarias Estaduais de Saúde apresenta estágios diferenciados deincorporação da Atenção Básica em sua estrutura. Muitas secretarias já conseguiram integrar asáreas técnicas (saúde da mulher, da criança, área técnica de tuberculose e hanseníase, saúdebucal, entre outros) e a coordenação do Programa de Saúde da Família em uma estrutura única deAtenção Básica.

No entanto, uma situação que ainda predomina diz respeito a um relativo isolamento daAtenção Básica na própria estrutura das Secretarias Estaduais de Saúde, onde não ocorre interaçãocom as áreas de planejamento, de controle e avaliação e com as Vigilâncias Epidemiológica,Sanitária e Ambiental.

No que diz respeito à inserção da Atenção Básica na estrutura da Secretaria Estadual de Saúde,garantindo articulação com as demais áreas (como planejamento, controle e avaliação,epidemiologia, entre outros), as ddif iculdades são:

A influência da lógica e da dinâmica de organização fragmentada da Atenção Básicado Ministério da Saúde na estrutura das Secretarias Estaduais de Saúde.

A cultura institucional das Secretarias Estaduais de Saúde que historicamentetrabalham de forma compartimentalizada.

A cultura de valorização apenas das ações de execução direta. Como as SecretariasEstaduais de Saúde não executam a Atenção Básica, isso se reflete em baixapriorização, equipes insuficientes e áreas desagregadas.

A baixa compreensão das áreas técnicas, especialmente das VigilânciasEpidemiológica e Sanitária, sobre a importância da Atenção Básica como lócus deviabilização das ações de saúde.

No que diz respeito à inserção da Atenção Básica nas suas estruturas, aas Secretari as Estaduaisde Saúde devem:

Tomar medidas para a readequação da área de Atenção Básica no âmbito das suasestruturas, garantindo:

A integração das diversas áreas técnicas e programáticas de intervenção nocampo da Atenção Básica;

A integração da coordenação do PSF;A articulação com as Vigilâncias Epidemiológica, Sanitária e Ambiental.

Adotar estratégias para que todos os setores da Secretaria Estadual de Saúdecompreendam as possibilidades e potencialidades da Atenção Básica na viabilizaçãodas ações de saúde.

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29conass . progestores

Formulação da política de Atenção Básica

Com relação à formulação da política de Atenção Básica, as ddif iculdad es apontadas pelosgestores estaduais foram:

A formulação centralizada no Ministério da Saúde, com rigidez de normatização.Distinguir o Programa de Saúde da Família, que é uma estratégia organizativa da

Atenção Básica, do âmbito de atuação geral da Atenção Básica.

Para superar as dificuldades com relação à formulação da política de Atenção Básica, aa sSecreta rias Estaduais de Saúde devem:

Participar ativamente do processo de formulação da política de Atenção Básica juntoao Ministério da Saúde, apresentando propostas de compatibilização das prioridades epolíticas estaduais e municipais.

Aprofundar o entendimento conceitual no âmbito da Atenção Básica e do Programade Saúde da Família.

Cooperação técnica com municípios

No que se refere à cooperação técnica com municípios para organização da Atenção Básica, asdif iculdad es apontadas pelos gestores estaduais são as seguintes:

Falta de cultura institucional das Secretarias Estaduais de Saúde, com pouca clarezado escopo das atividades passíveis de cooperação técnica, agravada pela altarotatividade de profissionais nos municípios.

Baixa disponibilidade quantitativa e qualitativa de técnicos nas Secretarias Estaduaisde Saúde.

Exclusão dos Estados devido à prática de relacionamento direto do Ministério daSaúde com os municípios.

Baixa valorização da Atenção Básica pelos profissionais e pelos usuários.Ausência de financiamento, por parte do Ministério da Saúde, para a capacitação de

técnicos das Secretarias Estaduais de Saúde.

Para superar as dificuldades com relação à cooperação técnica com municípios para organizaçãoda Atenção Básica, aas Secretar ias Es taduais d e S aúde d evem:

Compor e qualificar equipe para desenvolver cooperação técnica com os municípios.Elaborar plano de cooperação técnica que atenda as necessidades dos municípios.

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30 relatório final

Propor ao Ministério da Saúde e aos gestores municipais a pactuação de uma agendana área de cooperação técnica.

Adotar estratégias de informação e comunicação junto aos profissionais de saúde eusuários para o reconhecimento da importância da Atenção Básica.

A Atenção Básica e a NOAS/SUS 01/2001

Pretende-se inserir a Atenção Básica de forma articulada à toda rede de serviços de saúdedos municípios, e como parte indissociável dessa. Sabe-se que muitas vezes a conformação de umarede de serviços com diversos níveis de hierarquia extrapola o território de um município, sendonecessária a articulação intermunicipal, independente da forma de gestão em que o município seencontra. Para apoiar essa articulação, tanto para municípios em Gestão Plena da Atenção Básicacomo para municípios em Gestão Plena do Sistema Municipal, existem instrumentos operacionais,a exemplo da Programação Pactuada e Integrada, onde poder-se-á buscar a explicitação dos pactosintergestores que visam garantir o acesso da população aos níveis mais complexos do sistema.Também o Plano Diretor de Regionalização e o Plano Diretor de Investimentos, ao contemplarem anecessidade de instalação de serviços, poderão ser instrumentos na busca de maior eqüidade nadistribuição dos recursos, apontando para a ampliação do acesso e para maior integralidade dosistema.

Com relação à inserção da Atenção Básica no Plano Diretor de Regionalização – PDR (NOAS SUS01/2002), as ddif iculdad es apontadas pelos gestores estaduais foram:

Baixa integração entre os níveis de atenção à saúde, com ausência de mecanismoseficientes de referência e contra-referência.

Indefinição do papel de alguns serviços de saúde dentro da micro e macroregião, emespecial das pequenas unidades hospitalares.

Não reconhecimento da importância da Atenção Básica no conjunto das prioridadesdefinidas no Plano Diretor de Regionalização, na programação Pactuada Integrada e noPlano Diretor de Investimentos.

Para superar as dificuldades com relação à inserção da Atenção Básica no Plano Diretor deRegionalização, aas Secretari as Es taduais de Saúde d evem:

Inserir a Atenção Básica no processo de elaboração e implementação do PlanoDiretor de Regionalização, da programação Pactuada Integrada e do Plano Diretor deInvestimentos.

Garantir os fluxos de referência e contra-referência para a Atenção Básica no âmbito

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31conass . progestores

do Plano Diretor de Regionalização e da programação Pactuada Integrada;Adotar medidas corretivas no Plano Diretor de Regionalização, na programação

Pactuada Integrada e no Plano Diretor de Investimentos, que foram elaborados semcontemplar a Atenção Básica.

Acompanhamento, controle, regulação e avaliação da AtençãoBásica

Relativamente ao acompanhamento, controle, regulação e avaliação da Atenção Básica, asdif iculdad es apontadas pelos gestores estaduais foram:

A formulação de um instrumento para a avaliação da Atenção Básica.A falta de iniciativa própria e de cultura institucional da Secretaria Estadual de Saúde

para desenvolver métodos e instrumentos de avaliação, mantendo dependência àsiniciativas do Ministério da Saúde.

O relacionamento direto do Ministério da Saúde com os municípios, dificultando ainserção das Secretarias Estaduais de Saúde no processo de acompanhamento,controle e avaliação da Atenção Básica.

Para superação das dificuldades relativas ao acompanhamento, controle, regulação e avaliação daAtenção Básica, aas Secretar i as Es taduais d e Saúde d evem:

Aprofundar o debate sobre competências e responsabilidades da Atenção Básica,com incorporação das Vigilâncias.

Criar instrumentos que permitam a integração e coordenação das ações de AtençãoBásica.

Priorizar e qualificar a celebração do Pacto da Atenção Básica, utilizando-o comoinstrumento pedagógico de avaliação e acompanhamento da Atenção Básica.

Recomendar ao Ministério da Saúde o aprimoramento do Sistema de Informação daAtenção Básica – SIAB e valorizá-lo como instrumento de acompanhamento eavaliação.

No mesmo âmbito, oo CONASS d eve:

Constituir um grupo de trabalho para discussão de metodologias e instrumentospara acompanhamento e avaliação da Atenção Básica.

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32 relatório final

Recursos humanos para a Atenção Básica

A inadequação dos recursos humanos atualmente disponíveis no mercado de trabalho e aformação fragmentada dos profissionais recém-egressos das universidades dificultam a inserçãodesses novos profissionais na proposta de Atenção Básica.

No que se refere à contratação e capacitação dos recursos humanos para a Atenção Básica, asd ificu ldades apontadas pelos gestores estaduais foram:

A ausência de um processo de educação permanente.A indefinição do papel das Secretarias Estaduais de Saúde na implantação e

coordenação dos Pólos de Capacitação.A insuficiência na ação dos Pólos de Capacitação, tanto nas ações voltadas ao

Programa de Saúde da Família quanto no âmbito geral da Atenção Básica.A insuficiência de recursos financeiros para contratação de recursos humanos.A indefinição de mecanismos adequados de vinculação dos recursos humanos para a

Atenção Básica e, principalmente, para o Programa de Saúde da Família.Os limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.Dificuldades de interiorização de profissionais de saúde.A alta rotatividade de profissionais nos municípios.

Para superação das dificuldades relativas à contratação e capacitação dos recursos humanos paraa Atenção Básica, aas S ec reta r ias Estaduais d e S aúde devem:

Conduzir a política de recursos humanos no âmbito dos Estados, coordenando ainstalação e implementação dos Pólos de Capacitação.

Recomendar aos Ministérios da Saúde e da Educação que sejam estabelecidasnormas para a formação dos profissionais de saúde, observando as prioridades dosetor público.

Recomendar ao Ministério da Saúde que proceda a reavaliação do Programa deInteriorização do Trabalho em Saúde - PITS no sentido de superar conflitos naorganização dos serviços de Atenção Básica para atuar efetivamente na interiorizaçãode profissionais de saúde.

Recomendar aos Ministérios da Saúde e da Educação o estudo de novas alternativaspara interiorização de profissionais, a exemplo do serviço civil obrigatório ouvoluntário.

Recomendar aos Ministérios da Saúde e da Educação o estudo da possibilidade decontratação de residentes para atuação na Atenção Básica.

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33conass . progestores

Recomendar ao Ministério da Saúde que efetue estudo sobre a situação de exercíciode profissionais estrangeiros no País.

Apoiar os municípios na identificação de alternativas de contratação que sejamcompatíveis com as distintas realidades e com a Lei de Responsabilidade fiscal.

No mesmo âmbito, oo CONASS d eve:

Organizar um seminário específico para aprofundar este tema, onde se discuta opapel do Estado na gestão, formação e desenvolvimento de recursos humanos e sedefina a base para construção de uma agenda de recursos humanos em cada Estado.

Programa de Saúde da Família

Os gestores estaduais concordam com a definição do Ministério da Saúde de que o Programade Saúde da Família (PSF) é a principal estratégia organizativa da Atenção Básica no âmbito doSUS.

Os Secretários Estaduais de Saúde consideram, no entanto, que o PSF precisa deaperfeiçoamento para que atinja níveis adequados de qualidade na atenção à saúde dos indivíduos,das famílias e das comunidades.

Para os Secretários Estaduais de Saúde, qualquer estratégia alternativa que venha a serincorporada à Atenção Básica deve obedecer aos princípios e normas do SUS e ser orientada pelosprincípios norteadores da Atenção Primária em Saúde (contato, longitudinalidade, integralidade,coordenação, foco na família, orientação comunitária e territorialidade).

Com relação aos princípios orientadores do Programa de Saúde da Família, quais sejam: aterritorialização, a adstrição de clientela, a equipe multiprofissional e a dedicação integral dosprofissionais, os gestores estaduais consideram o que se segue.

O princípio de territorialização deve ser mantido, e aas Secretar ias Es taduais d e S aúded evem:

Propor alternativas de territorialização que considerem as especificidades locais, taiscomo situações de populações pequenas e/ou isoladas.

Considerar a possibilidade de equipes móveis de PSF em regiões de difícil acesso ecom grandes distâncias entre os equipamentos de saúde e vazios populacionais.

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34 relatório final

O princípio de adstrição de clientela deve ser mantido e aas Secretar i as Es taduais de Saúdedevem:

Propor ao Ministério da Saúde revisão da proporção de população por Equipe deSaúde da Família – ESF, em área urbana e rural.

Propor ao Ministério da Saúde revisão da proporção de pessoas sob aresponsabilidade de cada Agente Comunitário de Saúde.

Observar as diferentes realidades locais e estabelecer critérios a serem aplicados nassituações de utilização de equipes móveis de PSF em regiões de difícil acesso e comgrandes distâncias entre os equipamentos de saúde e vazios populacionais.

O princípio da equipe multiprofissional deve ser mantido e as equipes mínimas devem ser mantidase ampliadas de acordo com as necessidades e possibilidades das diferentes realidades locais. AAsSecretar i as Es taduais d e Saúde d evem:

Observar as diferentes realidades locais e estabelecer critérios a serem aplicados nassituações de utilização de equipes móveis de PSF em regiões de difícil acesso e comgrandes distâncias entre os equipamentos de saúde e vazios populacionais.

Recomendar ao Ministério da Saúde que considere a questão da rotatividade deprofissionais nas equipes do PSF e proceda a alteração na normatização que define atransferência de recursos de incentivo financeiro do PSF no sentido de manter atransferência mensal do incentivo nas situações de ausência temporária de um dosprofissionais da equipe de saúde da família, por um prazo definido, a ser pactuado deforma tripartite.

O princípio de dedicação integral (40 horas) dos profissionais deve ser mantido.

Financiamento do Programa de Saúde da Família

O Ministério da Saúde (MS) anunciou uma proposta de co-financiamento do Programa deSaúde da Família entre as três esferas de governo: 25% Estados, 25% municípios e 50% MS. OsSecretários Estaduais de Saúde têm posição unânime: o financiamento como contrapartida embase percentual não deve ser considerado.

Os Secretários Estaduais de Saúde consideram que o Estado deve participar dofinanciamento da Atenção Básica. No entanto, a alocação de recursos do tesouro do Estado nasaúde é prerrogativa do Governo Estadual e as políticas e prioridades devem ser definidas pelasSecretarias Estaduais de Saúde.

Para os gestores estaduais, as ppossibi l idades e alternat ivas mais relevantes para aparticipação do Estado no financiamento da Atenção Básica são:

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35conass . progestores

A implantação de incentivo financeiro para o PSF, com acompanhamento e avaliaçãodas ações e com utilização de critérios de discriminação positiva com consideração,por exemplo, de IDH, IDI, localização geográfica, entre outros.

A utilização de critérios de distribuição do bolo tributário.A capacitação de recursos humanos.A contratação e/ou municipalização de recursos humanos.A manutenção das unidades básicas.A cooperação técnica com os municípios.

Articulação das unidades básicas de saúde da família

Quanto ao Programa de Saúde da Família, para garantir a articulação das unidades básicas de saúdeda família com o restante da rede assistencial, os ggestores estaduais p ropõem:

A implantação do Plano Diretor de Regionalização com incorporação da AtençãoBásica e com definição dos fluxos de referência e contra-referência.

A organização de sistemas de regulação municipal, microrregional e estadual quepromovam e garantam a articulação do PSF com a rede assistencial.

A implantação do Cartão SUS e efetivação das Centrais de Regulação.A revisão do papel e do financiamento das pequenas unidades hospitalares.A sensibilização e capacitação dos profissionais de toda a rede assistencial.A criação de centros regionais para discussões/orientações de casos clínicos.A garantia da articulação das áreas de Atenção Básica, entre elas o PSF, com as

demais áreas da rede assistencial na própria estrutura das Secretarias Estaduais deSaúde.

1.4. AÇÕES E SERVIÇOS DE MÉDIA E ALTA COMPLEXIDADE

Um dos mais agudos problemas da gestão do SUS

As pesquisas de opinião pública evidenciam que uma das maiores queixas dos usuários doSistema Único de Saúde refere-se, sobretudo, ao excessivo tempo de espera e às filas para acessoaos serviços da denominada média complexidade, a exemplo de alguns procedimentosespecializados, diagnósticos ou terapêuticos.

Se acrescentarmos alguns problemas também existentes, como a baixa qualidade de muitos

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36 relatório final

serviços e a generalizada “desresponsabilização pelo usuário”, chegaremos à conclusão queestamos frente a um dos mais agudos problemas da gestão do SUS.Sabemos também que entre as razões geralmente apontadas para explicar tal situação está aprópria organização do modelo assistencial estadual e municipal – os municípios em gestão plenaincorporaram, com estímulos do Ministério da Saúde e das Secretarias Estaduais de Saúde, omodelo herdado do antigo INAMPS: curativo e com base na assistência hospitalar – e oplanejamento das ações faz-se a partir da oferta dos serviços e não a partir da demanda ou dasnecessidades do atendimento integral ao usuário. Desse modo, a organização das ações voltadaspara os problemas cardiovasculares (1ª causa de morte no país e na maioria dos Estados), porexemplo, obedece à lógica de “programar” procedimentos e serviços disponíveis de média e altacomplexidade sem nenhuma preocupação de articulá-los em uma rede que seja referência para arede básica e que atenda e se responsabilize pelo usuário e suas necessidades.

Frente a este problema é importante que se reflita sobre o papel das SES no territórioestadual/regional e no âmbito da cooperação com cada um dos seus municípios para areorganização das ações da atenção e da gestão da média e da alta complexidade.

Regulação, Controle e Avaliação

Uma diretriz fundamental do SUS é a descentralização de ações e serviços de saúde,conforme prevê a Lei nº 8.080/90. A gestão descentralizada do SUS tem desafiado os gestoresdas três esferas de governo no sentido de configurar uma rede de ações e serviços de saúde,capaz de garantir o acesso, a circulação e o acompanhamento dos pacientes entre os diversosníveis de atenção, orientados por um sistema de referência e contra-referência municipal eintermunicipal.

Os mecanismos para que isso ocorra fundamentam-se em um sistema de Planejamento,Controle e Avaliação integrado entre os três níveis de governo, que garantam o direcionamento econdução do SUS, conforme estabelece a Constituição Brasileira.

Nesta nova lógica os gestores precisam desenvolver novos métodos de controle e avaliaçãoque avancem para a avaliação da organização do Sistema e do modelo de gestão, das facilidadesde acesso, da qualidade assistencial e do impacto das ações e serviços sobre a saúde dapopulação, privilegiando a perspectiva de avaliação da satisfação do usuário com as ações eserviços a ele destinados.

A Regulação foi definida pela NOAS 01/2002 como “disponibilização da alternativaassistencial mais adequada à necessidade do cidadão, de forma equânime, ordenada, oportuna equalificada”. Abrange dois níveis distintos, ainda que articulados: a regulação das referênciasintermunicipais e a regulação sobre os prestadores de serviços.

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37conass . progestores

As funções de Controle, Avaliação e Regulação da assistência requerem a utilização deinstrumentos de apoio tais como:

Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES).

Central de Regulação: destinada à análise e deliberação imediata sobre problemas deacesso do paciente aos serviços.

Protocolos Clínicos: define o elenco de recursos terapêuticos mais adequados para cadasituação clínica.

Centrais de Leitos, Consultas Especializadas e Exames: destinadas ao atendimento dademanda de consultas, exames e internação de pacientes, garantido oacompanhamento da PPI e das referências.

Comissões autorizadoras de procedimentos de Alta Complexidade e de Internações:organiza os processos, mecanismos de controle e avaliação, e as referências desteelenco de procedimentos.

Manuais dos Sistemas de Informação.

Indicadores e Parâmetros Assistenciais de cobertura e produtividade.

Instrumentos de avaliação da qualidade assistencial e da satisfação do Usuário8.

O papel das Secretarias Estaduais na organização das Redes deUrgência e Emergência

Para os gestores estaduais, as Secretarias Estaduais de Saúde devem exercer o papel decoordenar e arbitrar o Sistema de Urgência e Emergência de forma a garantir o acesso dapopulação aos serviços. A Secretaria Estadual de Saúde deve ser o principal agente de regulaçãonesta área.

A Central de Regulação deve ser estadual, porque esta é uma área de abrangência estaduale regional. A Secretaria Estadual de Saúde deve identificar as necessidades da população paragarantir o acesso aos serviços de urgência e emergência no âmbito regional e estadual, propondoo Plano Estadual de Urgência e Emergência que deve ser construído de forma participativa e combase no Plano Diretor de Regionalização. Deve apoiar sua operacionalização, inclusive no que dizrespeito ao seu financiamento (investimento e/ou custeio). A forma de organização da Central deregulação deve ser flexível para melhor se adequar à realidade de cada Estado.

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38 relatório final

Financiamento dos Sistemas de Urgência e Emergência

O Ministério da Saúde (MS) anunciou uma proposta de co-financiamento dos serviços deurgência e emergência entre as três esferas de governo: 50% MS, 25% Estados e 25% municípios.Os Secretários Estaduais de Saúde tem posição unânime: o financiamento como contrapartida embase percentual não deve ser considerado.

Os Secretários Estaduais de Saúde consideram que o Estado deve participar dofinanciamento dos serviços de urgência e emergência. No entanto, a alocação de recursos dotesouro do Estado na saúde é prerrogativa do Governo Estadual e as políticas e prioridades devemser definidas pelas Secretarias Estaduais de Saúde.

As SES reconhecem a sua responsabilidade no financiamento dos serviços de urgência eemergência e entendem que a sua participação deve atender às especificidades de cada Estado edeve estar inserida na definição global da questão do financiamento com o Ministério da Saúde.

O financiamento deverá ocorrer sempre dentro de um modelo que trabalhe os serviços deurgência e emergência em forma de rede no âmbito do SUS, regulados pelo Estado e implantadosde acordo com as prioridades definidas pela Comissão Intergestores Bipartite (CIB).

Sistema de controle, regulação e avaliação

Os pproblemas enfrentados pelos gestores estaduais para operar o sistema de controle, regulaçãoe avaliação são:

A falta de clareza no entendimento conceitual destas funções, que devem ser vistasnão como um único sistema, mas como dimensões complementares de gestão.

A inexistência de um sistema de regulação, controle e avaliação eficiente.A insuficiência de recursos financeiros para implantação do Sistema Regulador, para

compra e manutenção de equipamentos de informática e para contratação derecursos humanos especializados, tais como teledigitadores e médicos reguladores.

A insuficiência de recursos para o financiamento da média complexidade.A dificuldade na negociação com os gestores municipais e prestadores da rede

privada, principalmente nas capitais.O excesso de normatização por parte do Ministério da Saúde e o perfil inadequado

da auditoria.

Para a superação desses problemas, oos ges tores es taduais propõem:

A implantação e implementação do Sistema de Regulação.

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39conass . progestores

A definição e implementação de política de capacitação de recursos humanos.A negociação e a pactuação entre os gestores.A negociação com os prestadores, utilizando instrumento de contratação.A articulação da regulação com o controle e a avaliação.A criação de sistemas regionais, facilitando o processo de referência e contra-

referência.A definição de uma política de financiamento para a operacionalização dos Sistemas

Reguladores na assistência hospitalar e ambulatorial que garanta recursos das trêsesferas de governo para a aquisição de equipamentos e insumos e contratação derecursos humanos, para o funcionamento das Centrais de Regulação nas regiões desaúde e microrregiões.

Quanto à execução das ações de regulação, oos gestores estaduais têm o s eguinteen tend imento sobre a divisão de responsabilidades:

Responsabi lidade da esfera estadu al

A Secretaria Estadual de Saúde regula o acesso das populações referenciadas paramunicípios habilitados na condição de Gestão Plena do Sistema Municipal, emarticulação com o gestor municipal.

É responsabilidade da Secretaria Estadual de Saúde a regulação das referênciasintermunicipais e dos prestadores de serviços nos municípios não habilitados nacondição de Gestão Plena do Sistema Municipal.Responsabi lidade da esfera municipal

O município em Gestão Plena do Sistema regula o acesso da sua população aosserviços localizados no seu território e a Secretaria Estadual de Saúde regula o acessodas populações referenciadas de outros municípios independente de onde estejamlocalizados os serviços.

A regulação da rede de serviços, inclusive os de urgência e emergência deabrangência municipal deve ser de responsabilidade do gestor municipal que contrataos serviços e controla os recursos.Responsabi lidade da esfera f ederal

O Ministério da Saúde deve realizar a regulação das referências interestaduais.O MS deve regular (definir e coordenar) os sistemas de alta complexidade, conforme

definido no artigo 16 da Lei 8.080/90

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40 relatório final

Para os gestores estaduais, a relação entre as Centrais de Regulação Nacional, Estaduais eMunicipais deve se dar respeitando-se as responsabilidades e competências nas abrangênciashierárquicas de cada esfera de gestão, com intercâmbios periódicos, assessoria e cooperaçãotécnica quando necessário. Deve considerar um sistema regulatório único, compatibilizado entre si,partindo de um marco regulatório construído de forma pactuada, visando um Modelo RegulatórioNacional.

Deve, ainda, contar com um sistema adequado de comunicação e com transparência deinformação, de modo que gestores e usuários obtenham com facilidade o rápido atendimento dassuas demandas. Deve procurar dar garantia de eficiência e eficácia para alcance de bons resultadose para utilização racional dos recursos disponíveis.

As Secretarias Estaduais de Saúde devem recomendar ao Ministério da Saúde a agilização ea simplificação da implantação do cartão SUS, como condição facilitadora para o adequadorelacionamento entre as centrais de regulação, com a criação de um site na Internet com asinformações sobre regulação e os relatórios resultantes das atividades reguladoras.

Oferta de procedimentos de Média Complexidade

Já existe consenso de que um dos principais pontos de estrangulamento do SUS está naoferta de procedimentos de Média Complexidade.

Do ponto de vista do gestor estadual, os principais pproblemas identificados a esse respeito são:

A insuficiência do limite financeiro da assistência de Média Complexidade.Os baixos valores e a ausência de procedimentos relevantes nas tabelas dos

Sistemas de Informação Ambulatória e Hospitalar (SIA e SIH-SUS).A não implantação dos valores para o financiamento do M1 previsto na NOAS/SUS

01/02.O pagamento por produção de serviços.As dificuldades de pactuação de parâmetros de atenção à saúde, principalmente na

área da Média Complexidade.A falta de planejamento e definição das necessidades por parte do gestor publico,

prevalecendo a lógica da oferta e não a da demanda.A baixa capacidade instalada de serviços próprios no setor público e a baixa oferta

no setor privado.A rede básica e a rede hospitalar (pequenos e médios hospitais) com baixa

resolutividade, gerando excesso de internações hospitalares por causas que poderiamser resolvidas na assistência ambulatorial.

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O excesso de exames de diagnostico com alta taxa de “normalidade”.A ausência de critérios para incorporação tecnológica.

Para a superação desses problemas, aas Secretar ias Es taduais d e S aúde d evem:

Solicitar ao Ministério da Saúde o aumento dos limites financeiros dos Estados paraassistência de Média Complexidade.

Solicitar ao Ministério da Saúde o aumento dos valores dos procedimentos dastabelas SIA e SIH/SUS.

Solicitar ao Ministério da Saúde a incorporação de novos procedimentos nas tabelasSIA e SIH/SUS.

Propor a substituição da forma de pagamento de procedimentos por contrato demetas.

Condicionar a contratação de serviços de Alta Complexidade à oferta deprocedimentos de Média Complexidade.

Adaptar, junto com os municípios em gestão plena de sistema, os parâmetrosassistenciais e adotá-los para a programação e contratação de serviços.

Regularizar a situação de contratação da prestação de serviços.Propor a integração das estruturas hospitalares de baixa resolutividade na rede

básica, transformando hospitais de pequeno porte em unidades mistas.Adotar mecanismos para melhorar a resolutividade da Atenção Básica.Propor ao Ministério da Saúde a implantação, em conjunto com as Secretarias

Estaduais de Saúde, de centros de avaliação de incorporação tecnológica.

Fundo de Ações Estratégicas e Compensação – FAEC

O Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (FAEC) foi criado pelo Ministério da Saúde(MS) em abril de 1999, por meio da portaria GM/MS nº 531. O objetivo foi o de garantir ofinanciamento pelo gestor federal de procedimentos de Alta Complexidade em pacientes comreferência interestadual ou procedimentos decorrentes de ações consideradas estratégicas peloMS. O Ministério da Saúde estabelece em uma tabela de procedimentos ambulatoriais ehospitalares, o valor a ser pago aos prestadores de serviços.

Em relação aos procedimentos financiados pelo FAEC, para realização de ações estratégicasdefinidas pelo Ministério da Saúde, os principais pproblemas identificados pelos gestores estaduaisforam:

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42 relatório final

As datas dos repasses do FAEC diferentes do repasse dos recursos da Gestão PlenaEstadual.

Os baixos valores de tabela de alguns procedimentos.A ausência das Secretarias Estaduais de Saúde no processo de definição das ações

estratégicas pelo Ministério da Saúde.

Para a superação desses problemas, aas S ec reta rias Estadu ais de Saúde devem:

Participar da definição de procedimentos que devem ser incluídos como açõesestratégicas a serem financiadas pelo FAEC.

Exigir que a definição das ações estratégicas considere as necessidades locais esejam pactuadas em fórum tripartite.

Solicitar que o Ministério da Saúde proceda à revisão da tabela de procedimentos eeleve os recursos financeiros.

No que se refere aos procedimentos financiados pelo FAEC com limite financeiro estadualdefinido, os gestores estaduais identificaram como os principais pproblemas os seguintes:

Limite financeiro insuficiente para o atendimento da demanda por procedimentosfinanciados pelo FAEC (ex: Terapia Renal Substitutiva – TRS), levando aocomprometimento dos recursos do teto dos Estados e municípios referentes à médiacomplexidade.

Recursos financeiros insuficientes para atender à demanda e ao aumento progressivodo número de pacientes que necessitam de TRS.

Medicamentos de dispensação em caráter excepcional/alto custo: tabela deprocedimentos com valores defasados; repasse de recursos financeiros federaisinsuficientes; patologias não previstas nos protocolos clínicos do MS.

Para a superação dos problemas referentes aos procedimentos financiados pelo FAEC comlimite financeiro estadual definido, aas Secretari as Es taduais de Saúde d evem:

Solicitar que o Ministério da Saúde proceda a atualização dos valores da tabela deprocedimentos (ex: TRS) e os valores transferidos do FAEC para os Estados, de formaa não onerar os limites financeiros da assistência de Média e Alta Complexidade.

Propor ao Ministério da Saúde a realização de um seminário sobre Hepatites,abordando diagnóstico, terapia e incorporação de tecnologia visando à construção deconsenso e a elaboração de protocolo clínico.

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Propor a unificação da sistemática de financiamento do FAEC, de forma à não oneraros limites financeiros da assistência de média e alta complexidade.

No mesmo contexto, oo Conselho Nacional de Secretá r ios d e S aúde d eve:

Propor ao Ministério da Saúde um debate para definição de responsabilidades naaquisição de medicamentos de dispensação em caráter excepcional.

Tratamento fora do domicílio – TFD

Para os gestores estaduais, o processo de regulação do tratamento fora do domicílio (TFD)intermunicipal e interestadual precisa ser eficiente para agilização dos atendimentos e deve serexecutado através das centrais de regulação para utilização racional dos recursos disponíveis.

Os gastos com transporte aéreo representam o elemento que mais onera o TFD para osEstados, não estando incluídos no limite financeiro de repasse de recursos federais.

Termos de Compromisso entre Entes Públicos

Quanto à elaboração, implantação, acompanhamento e efetiva avaliação dos Termos deCompromisso entre Entes Públicos previstos na NOAS/SUS 01/2002, o principal problemaidentificado pelos gestores estaduais foi o fato de o Termo de Ajuste exigir, na clausula terceira,item II, letra a, a apresentação das faturas referentes aos serviços prestados.

Para superar esse problema, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde deve solicitar aoMinistério da Saúde que proceda a alteração na Minuta do Termo de Compromisso entre EntesPúblicos para que os repasses financeiros pactuados para o Estado, respeitando o comando únicodo Município em Gestão Plena do Sistema, sejam baseados em metas e prioridades estabelecidasde acordo com as necessidades identificadas e nunca atreladas a produção de serviços, a pontode ser necessário apresentar faturas referentes aos serviços prestados.

Assim, os recursos financeiros pactuados deverão ser relacionados às prioridadesidentificadas pelos gestores de acordo com o Plano de Saúde, PDR, PDI, PPI, colocados no Termode Compromisso e inseridos dentro da visão sistêmica da saúde do Estado e não de forma isolada,segmentada e contrária à atual política de financiamento do SUS. A comprovação da utilizaçãodesses recursos deve se dar através dos resultados obtidos, expressos no correspondenteRelatório de Gestão.

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44 relatório final

2. COMANDO ÚNICO

Responsabilidades e atribuições de cada gestor

O Sistema Único de Saúde é, por definição constitucional, um sistema público, nacionale de caráter universal, baseado na concepção de saúde como direito de cidadania e nasdiretrizes organizativas de: descentralização, com comando único em cada esfera degoverno; integralidade do atendimento; e participação da comunidade.

Os conceitos estabelecidos sobre o comando único têm possibilitado diferentesinterpretações. Evidentemente o processo de descentralização exige o aprofundamentodesses conceitos de forma a impedir que haja sobreposição ou mesmo ingerências entre asesferas gestoras. Também é importante estabelecer as responsabilidades e atribuições decada gestor com relação ao “Comando Único”.

Redefinindo o comando único

É urgente e necessária uma ampla rediscussão quanto ao entendimento de “comando único”nos termos da NOAS/SUS 01/02 e do conceito de “direção única em cada esfera de governo”, nostermos do artigo 7º da Lei 8.080/90. O comando único deve ser uma diretriz organizativa do SUSvoltada para a garantia do direito à saúde do cidadão, independente do município onde resida. Éfundamental a redefinição de comando único, não só em relação aos prestadores de serviço, mastambém em relação às macrofunções de cada gestor.

O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) deve manter a defesa intransigentedo fortalecimento e do desenvolvimento da capacidade de autoridade sanitária estadual e regionaldas Secretarias Estaduais de Saúde no exercício de suas macrofunções, bem como dos demaisgestores nas suas respectivas esferas de governo.

Com relação ao Comando Único, oos Secretár ios Es taduais de Saúde consideram que:

A gestão das referências intermunicipais e das unidades de referênciaregionais/estaduais deve ser de responsabilidade do nível estadual, ou conformepactuado na Comissão Intergestores Bipartite e homologado no Conselho Estadual deSaúde.

Na esfera da gestão municipal a responsabilidade pela saúde deve ser municipal deserviços de abrangência intramunicipal (hospitais que atendem a população local).

O comando único na esfera da gestão federal deve ser relativo aos serviços de

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referência nacional, com garantia da referência da população supraestadual.Um mesmo prestador de serviços (público ou privado) deve estar sob comando de

um único gestor (municipal ou estadual), bem como um gestor municipal só podecontratar serviços nos limites de seu território. Da mesma forma, um gestor estadualnão pode contratar serviços em outro Estado.

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3. F INANCIAMENTO DO SISTEMA DE SAÚDE

A vinculação dos recursos orçamentários para a saúde

Segundo a Constituição Federal o financiamento do SUS é uma responsabilidadecomum da União, dos Estados, Distrito Federal e Municípios. A Emenda Constitucional nº 29,em 13 de setembro de 2000, vinculou os recursos orçamentários dessas instâncias a seremaplicados obrigatoriamente em ações e serviços públicos de saúde.

Ao determinar a vinculação, a Emenda Constitucional nº 29 estabeleceu a base decálculo e os percentuais mínimos de recursos orçamentários que a União, os Estados, DistritoFederal e Municípios são obrigados a aplicar em ações e serviços de saúde.

Visando esclarecer aspectos conceituais e operacionais da Emenda Constitucional nº29, o Conselho Nacional de Saúde aprovou a Resolução no 322, homologada pelo Ministro daSaúde. Além disso, essa Resolução estabelece orientações no caso de preceitos da Emendaque ainda carecem de regulamentação, como por exemplo, as normas de fiscalização,avaliação e controle de despesas e a definição precisa do conceito de ações e serviços desaúde que sirva de referência para a avaliação da vinculação de recursos à área. Assim, alémdos aspectos referentes à base de cálculo e aos percentuais mínimos dos recursosvinculados, essa Resolução estabelece uma diretriz sobre que tipos de ações e serviços desaúde podem ser efetivamente considerados como tais para efeito do determinado pelaEmenda Constitucional nº 29.

A referência para o acompanhamento da aplicação dos recursos vinculados em açõese serviços públicos de saúde é o Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos emSaúde do Ministério da Saúde – SIOPS.

O Ministério da Saúde editou a Portaria GM/MS 2.047, de 5 de novembro de 2002,aprovando as diretrizes operacionais para a aplicação da EC 29. O Conselho Nacional deSecretários de Saúde – CONASS encaminhou o ofício nº 291, de 7 de novembro de 2002,com as observações e preocupações da entidade em relação à referida portaria. O CONASSdestaca no referido ofício o seu compromisso com o cumprimento da EC 29, questiona se osaspectos apontados na referida portaria podem ser objeto de regulamentação por portaria doMS, e reafirma que considera como caminho mais adequado para que isto aconteça a suaregulamentação por Lei Complementar.

O orçamento de 2003 do MS (Lei 10.640) traz parte dos recursos previstos alocadospor unidade da federação. Entre a Proposta Orçamentária e a Lei Orçamentária aprovada,foram acrescidos recursos para as ações de Atendimento Ambulatorial, Emergencial e

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Hospitalar em Regime de Gestão Plena do SUS, e Atendimento Ambulatorial, Emergencial eHospitalar Prestado pela Rede Cadastrada no SUS. Esse acréscimo destinou-se especialmentepara as regiões Norte e Nordeste e visava a redução das desigualdades regionais.

A regulamentação da EC 29

O Conselho Nacional de Saúde, através da Resolução CNS/322, definiu os itens que nãodevem ser considerados como despesas para efeito de aplicação da EC. Os Secretários Estaduaisde Saúde defendem a ampliação dos recursos para o setor saúde e, assim, defendem ocumprimento da EC 29. Consideram urgente a necessidade de regulamentação da EC 29 atravésde lei complementar. Defendem a demonstração, com transparência, dos gastos estaduais,municipais e federal em saúde. Defendem, ainda, o incremento da participação dos Estados nofinanciamento do SUS.

Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde doMinistério da Saúde- SIOPS

A operacionalização do Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde doMinistério da Saúde (SIOPS) e a utilização de suas informações têm apresentado problemas egerado reclamações para muitas Secretarias Estaduais de Saúde.

Os principais pproblemas ident ificados pelos gestores estaduais são:

A ausência de registro de pagamentos do exercício anterior.A inconsistência dos dados.A complexidade dos instrumentos – planilhas de difícil manuseio e difícil

preenchimento pelos municípios.A ausência de mecanismo de comunicação entre o SIAFEM e o SIOPS.A dificuldade de entendimento e descompasso entre as Secretarias Estaduais da

Fazenda e Saúde para alimentação do SIOPS.A utilização do SIOPS pelo Ministério da Saúde como um instrumento de aferição do

cumprimento da EC 29 e não como um sistema de informação.

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48 relatório final

Para a superação dos problemas identificados, aas Secretar ias Es taduais d e S aúde d evemrecomendar ao Ministério da Saúde que:

O SIOPS passe a registrar pagamentos de exercício anterior.O SIOPS evolua para um sistema de acompanhamento de gestão orçamentária.

A política alocativa de recursos federais

A Lei orçamentária nº 10.640 (Orçamento 2003 Ministério da Saúde) prevê a redução dasdesigualdades regionais através de uma distribuição mais eqüitativa dos recursos orçamentários doMinistério da Saúde. Os Secretários Estaduais de Saúde consideram a política alocativa de recursosfederais praticada pelo Ministério da Saúde equivocada e altamente regressiva para os Estados dasRegiões mais pobres.

As S ec reta rias Estad uais de Saúde p ropõem ao Ministério da Saúde:

A construção de uma nova política de alocação de recursos visando à redução dasdesigualdades macroregionais e interestaduais.

Que cumpra a lei, publicando portaria que define os novos recursos (por unidade daFederação) e libere os recursos estaduais mediante apresentação de um PlanoOperativo que seja aprovado pela CIB e que demonstre a capacidade de gasto doEstado com base nos PDR, onde já estiver sido aprovado.

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49conass . progestores

4. RECURSOS HUMANOS

O tema Recursos Humanos (RH), dada a sua importância será objeto de um seminárioespecífico dos Secretários Estaduais de Saúde.

Apontando para a discussão futura, os gestores estaduais iident ificaram as s eguintesdif iculdad es na área de gestão, formação e desenvolvimento de Recursos Humanos.

A defasagem no quantitativo de pessoal, face à ausência de concurso público;A não reposição de profissionais e o baixo investimento para expansão da força de

trabalho nos EstadosA precarização das relações de trabalho.As limitações decorrentes da Lei de Responsabilidade Fiscal.A diversidade de origem dos profissionais, com cultura pluri-institucional.A remuneração diversificada entre os profissionais de saúdeAs dificuldades para a interiorização de profissionais.A ausência de processo de avaliação sobre capacidade e atuação do profissional de

saúde no SUSA falta de clareza sobre o tipo e categorias de RH necessárias para o SUS.A falta de pessoal qualificado para muitas áreas.A deficiência das estruturas estaduais na área de RH.O desconhecimento do SUS pelos profissionais da saúde.A falta de humanização no atendimento da população.A formação inadequada para as necessidades do novo modelo assistencial.O distanciamento entre as propostas de formação provenientes da academia e as

necessidades e demandas dos serviços públicos de saúde.

Como propostas de superação das dificuldades identificadas, oos ges tores es taduais p ropõem:

Que o profissional de saúde seja considerado como carreira típica de Estado.Atrelar a expansão de serviços à garantia antecipada de contratação dos recursos

humanos necessários ao seu funcionamento.Desenvolver capacitação interna e permanente, para todos os seus servidores, sobre

os princípios do SUS.

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50 relatório final

Incorporar nos processos de capacitação a dimensão ética como uma das formas demelhorar a relação da equipe de saúde como a população usuária

Defender o concurso público como forma de provimento das vagas ofertadas pelosgestores do SUS.

Apoiar a constituição das Mesas de Negociação como fórum privilegiado dediscussão das questões relativas a RH em todos os níveis da gestão do SUS.

Além disso, o CConselho Nacional de S ec retá r ios d e S aúde deve:

Organizar e realizar um seminário específico, onde se discuta o papel do Estado nagestão, formação e desenvolvimento de RH e se defina as bases para construção deuma agenda de RH em cada Estado.

Realizar e divulgar entre as SES um levantamento de propostas de Plano de cargos esalários existentes ou em fase de elaboração.

Propor que seja pautado na Comissão Intergestores Tripartite – CIT, a análise dodocumento “Princípios e Diretrizes para elaboração da NOB/RH-SUS”.

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51conass . progestores

5. GESTÃO DO SISTEMA DE SAÚDE

5.1. INSTÂNCIAS DE NEGOCIAÇÃO E DELIBERAÇÃO

Na opinião dos gestores estaduais, as diferentes atribuições das instâncias de gestãocolegiada (Comissões Intergestores Bipartites e Tripartite) e das instâncias de controle social(Conselhos de Saúde) estão claras. As Comissões Intergestores discutem e definem os aspectosoperacionais e os Conselhos de Saúde formulam e avaliam a execução da política de saúde.

No entanto, os Secretários Estaduais de Saúde consideram que, no momento, existe riscode esvaziamento da Comissão Intergestores Tripartite (CIT) em função da postura do Ministério daSaúde, que tem levado ao Conselho Nacional de Saúde (CNS) assuntos da alçada da CIT. Estaatitude pode inclusive comprometer o papel do CNS como instância de recurso. O esvaziamentoda CIT pode trazer reflexos na relação das Comissões Intergestores Bipartites (CIB) com osConselhos Estaduais de Saúde.

Com esta preocupação, os Secretários Estaduais propõem o fortalecimento de todas asinstâncias de gestão (CIB E CIT) e dos Conselhos Nacional Estaduais e Municipais, com a respectivacapacitação dos conselheiros.

Para os gestores estaduais, as dificuldades na relação entre as instâncias de gestãocolegiada e de controle social ocorrem quando não há clareza quanto ao papel e competências decada instância. Os Secretários Estaduais de Saúde manifestam sua preocupação com a observânciadas distintas atribuições, responsabilidades e prerrogativas tanto das instâncias intergestorasquanto dos Conselhos, com o objetivo e o cuidado de serem evitados conflitos de competências.

5.2. HABILITAÇÃO DOS ESTADOS

Em relação à habilitação dos Estados nas condições de gestão previstas pela NOAS/SUS01/2002, os gestores estaduais consideram como uma vantagem a maior autonomia na gestão,o que permite a discussão com gestores municipais para realização da programação financeira ede alocação de recursos de forma mais adequada. Por outro lado, há a desvantagem da

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52 relatório final

impossibilidade de negociação com o Ministério da Saúde nas situações onde a produção supera oteto definido e fragmentação da transferência dos recursos, condicionados à gastos específicos.

Os Secretários Estaduais de Saúde, considerando a importância da Norma OperacionalBásica 01/96, que buscou a integração de todos os segmentos da saúde; que a NOAS/SUS01/2002, apesar de promover alguns avanços na organização e oferta de serviços de assistência,não tem apresentado incentivos suficientes para a adesão de Estados e municípios às modalidadesde habilitação propostas; e que não estão sendo cumpridos os critérios para habilitação propostospela NOAS/SUS 01/2002, propõem a elaboração de uma nova Norma Operacional. Esta novanorma deve estar voltada para a construção de um modelo de atenção que contemple os princípiose as diretrizes do SUS, em substituição à Norma Operacional da Assistência à Saúde (NOAS SUS01/ 2002).

Para os Secretários Estaduais de Saúde, a nova NOB/SUS deve ser elaborada sob a égide daresponsabilidade sanitária, adequada à realidade de cada Estado e região do País, e integrar açõesde promoção à saúde, Atenção Primária, assistência de Média e Alta complexidade/custo,Epidemiologia e controle de doenças, Vigilância Sanitária e Ambiental.

Os Secretários propõem, ainda, o estabelecimento de uma nova modalidade das relaçõesintergestores com base em um tipo de contrato de gestão, cujo eixo seja o reconhecimento dacapacidade de condução e reitoria do SUS no âmbito estadual.

Do ponto de vista dos gestores estaduais, o Ministério da Saúde pode estimular a habilitaçãodos Estados com as seguintes atitudes:

Ser flexível na avaliação dos pleitos estaduais, inclusive aceitando as pactuacõesfeitas na CIB.

Alocar recursos financeiros adicionais que viabilizem o “fechamento” da PPI.Prestar cooperação técnica aos Estados antes e após o Estado entrar em gestão

plena do sistema estadual.Reforçar o papel da SES como gestor estadual do SUS.

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53conass . progestores

NOTAS

1. Carta de Ottawa. In: Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde 1. 1986 nov 17-21; Ottawa,Canadá. Brasília: Ministério da Saúde; 1996.

2. Reorientação do modelo assistencial. In: Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Paraentender a gestão do SUS. Brasília: Conass; 2003. p.130.

3. Epidemiologia e controle de doenças – parte V. In: Conselho Nacional de Secretários de Saúde.Para entender a gestão do SUS. Brasília: Conass; 2003. p.194.

4. Vigilância sanitária – parte VI. In: Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Para entender agestão do SUS. Brasília: Conass; 2003. p.208.

5. VillasBoas ALQ. Marco referencial e conceitual da Atenção Básica e Saúde da Família no Brasil– Notas preliminares. [Documento elaborado a pedido do Departamento de AtençãoBásica/SAS/MS, a partir da sistematização dos documentos apresentados na OficinaMS/DAB/OPAS, Brasília 14 de maio de 2003].

6. Atenção básica: a atenção primária à saúde no SUS. In: Conselho Nacional de Secretários deSaúde. Para entender a gestão do SUS. Brasília: Conass; 2003. p.137.

7. Mendes EV. Reflexões sobre a NOAS SUS 01/ 02. Mimeo.

8. Controle, regulação, avaliação e auditoria In: Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Paraentender a gestão do SUS. Brasília: Conass; 2003. p.87-98.

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CARTA DE SERGIPE

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56 carta de sergipe

Aracajú, SE, 12 de julho de 2003.

Os Secretários Estaduais de Saúde das 27 unidades da Federação, reunidos em Aracajú,Sergipe, entre 10 e 12 de julho de 2003, em Seminário do Conselho Nacional dos Secretáriosde Saúde (CONASS), apresentam, como resultado consensual das discussões, suaspreocupações e prioridades quanto à organização, gestão e financiamento do Sistema Únicode Saúde (SUS).

1. Os Secretários Estaduais de Saúde reafirmam o seu compromisso com os princípios e diretrizesconstitucionais do SUS, cuja implantação representa um movimento de reforma setorial dos maisexpressivos realizados no Brasil. Reconhecem os significativos avanços alcançados nos últimos 15anos e os grandes desafios a serem enfrentados.

2. Propõem o fortalecimento da AAtenção Pr imár ia, entendendo-a como a principal porta deentrada da rede de serviços integrados e como eixo fundamental para a mudança de modeloassistencial. Defendem a responsabilidade inerente do gestor municipal pela organização eoperacionalização da Atenção Primária, mas entendem como da esfera estadual as macrofunçõesde formulação da política, de planejamento, de co-financiamento, de formação, capacitação edesenvolvimento de recursos humanos, de cooperação técnica e de avaliação, no âmbito doterritório regional e estadual. A Atenção Primária deve ser orientada para o cidadão e suaautonomia, para a família e a comunidade e ser qualificada no sentido de também prover cuidadoscontínuos para pacientes portadores de patologia crônica e portadores de necessidades especiais.Os Secretários consideram que o Programa de Saúde da Família deve ser a principal estratégiaorganizativa da Atenção Primária no âmbito do SUS.

3. Defendem a valorização e a priorização das atividades de PPro moção d a Saúde, que deve serentendida a partir de um enfoque mais abrangente do conceito de saúde e de seus múltiplosdeterminantes, com ênfase na articulação intersetorial, através de parcerias intra eextragovernamentais, devendo constar das políticas, planos e orçamentos estaduais de saúdecomo um dos eixos para a mudança do modelo de atenção à saúde.

4. Consideram urgente e necessária uma ampla rediscussão quanto ao entendimento de“comando ún ico” nos termos da NOAS/SUS/2002 e do conceito de “direção única em cadaesfera de governo”, nos termos do artigo 7º da Lei 8.080/90. O comando único deve ser uma

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diretriz organizativa do SUS voltada para a garantia do direito à saúde do cidadão, independentedo município onde resida. Em função disso, e considerando o papel das Secretarias Estaduais deSaúde, entendem que a gestão das referências intermunicipais deve ser de responsabilidade dogestor estadual, observadas as pactuações nas Comissões Intergestores Bipartites e deliberaçõesdos Conselhos Estaduais de Saúde.

5 . Afirmam como prioritário e necessário o fortalecimento do papel regulador dos Estados,notadamente na rregulação do acesso das populações referenciadas para municípios habilitadosna condição de Gestão Plena do Sistema Municipal, em articulação com o gestor municipal, e naregulação das referências intermunicipais e dos prestadores de serviços nos municípios nãohabilitados na condição de Gestão Plena do Sistema Municipal. Defendem a configuração de umarede de ações e serviços de saúde capaz de garantir o acesso, a circulação e o acompanhamentodos pacientes entre os diversos níveis de atenção, orientados por um sistema de referência econtra-referência municipal, intermunicipal e interestadual.

6 . Os Secretários de Saúde reafirmam seu compromisso histórico de lutar pelo cumprimento daEm enda Const itucional nº 2 9 e ressaltam a necessidade de sua imediata regulamentação pormeio de lei complementar. Propõem a revisão urgente dos LLimites Financeiros Federa is d aAssistência de M éd ia e Alt a Complexidade contemplando as reais necessidades de cadaunidade da Federação e observando o disposto no orçamento do Ministério da Saúde que prevêalocação de recursos com o objetivo de reduzir desigualdades regionais. É necessária a construçãode uma nova política de alocação de recursos visando a redução das desigualdadesmacrorregionais, interestaduais e intermunicipais. Demandam a revisão dos valores das ttabela sd e proc edimen tos ambulatoriais e hospitalares (SIA e SIH - SUS), de modo a corrigir a enormedefasagem entre os custos reais e os valores remunerados pelo SUS.

7 . Afirmam a prioridade da discussão das questões referentes à política de rrecursos humanospara a saúde. Apóiam a constituição das Mesas de Negociação como fórum privilegiado dediscussão das questões relativas a RH em todos os níveis da gestão do SUS. Defendem o concursopúblico como forma prioritária de provimento das vagas ofertadas pelos gestores do SUS, epropõem que seja pautado na Comissão Intergestores Tripartite a análise do documento “Princípiose Diretrizes para a Elaboração da NOB/RH-SUS”.

8 . Os Secretários de Saúde reafirmam a importância da Comissão Intergestores Tripartite (CIT) edas Comissões Intergestores Bipartites (CIB) como instâncias de nnegociação e pactuação dosaspectos operacionais do SUS. Ressaltam como fundamental o ccontro le social exercido por meiodos Conselhos de Saúde. Manifestam, contudo, sua preocupação com a necessária observância dasdistintas atribuições, responsabilidades e prerrogativas tanto das instâncias intergestoras quantodos Conselhos, evitando-se conflitos de competências.

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58 carta de sergipe

9. Propõem a elaboração de uma nova nnorma voltada para a construção de um modelo deatenção que contemple os princípios e as diretrizes do SUS, em substituição à Norma Operacionalda Assistência à Saúde (NOAS/SUS 01/2002). Esta nova norma deve ser elaborada sob a égideda responsabilidade sanitária, adequada à realidade de cada estado e região do país, integrandoações de promoção à saúde, atenção primária, assistência de média e alta complexidade/custo,epidemiologia e controle de doenças, vigilância sanitária e ambiental e políticas de recursoshumanos. Propõem que esta norma estabeleça uma nova modalidade nas relações intergestorescom base em um tipo de “contrato de gestão”, cujo eixo seja o reconhecimento da capacidade decondução e reitoria do SUS no âmbito estadual, e o pleno exercício das macro-funções estaduais,com ênfase na cooperação técnica descentralizada e permanente, junto aos municípios.

10 . As propostas aqui apresentadas em consenso pelos Secretários Estaduais de Saúderepresentam o estabelecimento de compromissos para o enfrentamento das desigualdades sociaise regionais e a promoção da inclusão social, buscando o permanente aperfeiçoamento do SUS, como olhar voltado para o futuro e a construção da cidadania.

G i lson Cantarino O’DwyerP res idente do CONASS

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59conass . progestores

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ANEXOS

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62 anexos

1. PRESSUPOSTOS PARA A CONSTRUÇÃO DE CONSENSOS 1

A tecnologia da interlocução política parte do princípio de que sempre é possível construirconsensos entre propostas em conflito. Esse princípio é materializado por meio de igualtratamento às diferentes opiniões que os atores têm sobre o tema, de tal modo que todos o vêemna mais completa adversidade. A importância desse espaço para o diálogo democrático permiteaceitar como legítimas visões políticas, propostas e ideologias geralmente conflitantes. Se aspessoas aceitam a legitimidade das demais, que têm pontos de vista diferentes, elas têm maiscondições de aceitar como algo inerente à pluralidade social e ao processo democrático o conflitoque pode decorrer dessa diferença. Dessa aceitação decorre um modo não violento de regulaçãodo conflito.

Existem duas maneiras democráticas de regular o conflito pacificamente. Uma delas, quetodos conhecemos, é o processo de votação. Por meio dele aferimos qual é a posição majoritáriae, a partir daí, dizemos que todos devem obedecer às decisões da maioria.A outra maneira de regular o conflito pacificamente é estimulando a construção de consensos. Sea convivência entre as pessoas que discordam for mantida, será sempre possível, mais cedo oumais tarde, encontrar um meio-termo e construir progressivamente uma proposta que todosaceitem. É possível contar com o consentimento das pessoas que, embora não concordando como consenso majoritário obtido, deixam registrada sua posição discordante, mas acatam a posiçãoconstruída. Isso significa apostar no processo político de construção de consensos. Quando issonão for possível, poder-se-á sempre recorrer à maneira anterior, isto é, à votação.

Desse modo, estabelece-se uma relação que leva à formação de uma vontade comum queresulta de uma comunicação voltada à obtenção do acordo. A construção de consensos éresultado da capacidade do agir em conjunto e é, ao mesmo tempo, recurso gerado pela formaçãoda vontade comum.

A diferença entre as duas maneiras é que na votação obtém-se a vitória de uma posiçãosobre outras e alguém sempre ganha quando consegue convencer mais pessoas para formas umamaioria. Mas muitas vezes não se consegue convencer aqueles que perderam: eles aceitam aderrota porque aceitam as regras do jogo. Intimamente, porém, ficam contrariados e, às vezes,preparam-se para uma revanche. Neste caso, mantém-se uma “inimizade” política dentro docoletivo.

Na maneira democrática de regular os conflitos pela construção dos consensos, a posiçãovencedora não vence sobre ou contra ninguém, porquanto todos concordam com a soluçãocoletivamente encontrada. Podem existir perdedores, num determinado momento, mas, com oprocesso de diálogo e negociação de uma agenda prioritária é contínuo, é possível obter resultadostambém para aqueles que se consideram perdedores.

A aceitação da legitimidade do outro leva, também, à liberdade de opinião. Sereconhecemos que o outro é legítimo, temos de garantir que ele possa manifestar o seu ponto de

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vista sobre qualquer assunto. A democracia está baseada na liberdade e na igualdade de opinião,na valorização dos diversos pontos de vista, na aceitação da imprevisibilidade, no desfecho aberto.Ninguém pode saber, de antemão e com certeza, qual será a resultante do entrechoque demúltiplas opiniões.

Por último, além da aceitação da legitimidade do outro e da valorização da opinião, ademocracia também se baseia no exercício do diálogo. A democracia surgiu, entre os gregos, apartir desse conversar coletivamente sobre os assuntos comuns num espaço que não era privado,num lugar onde pessoas livres e iguais interagiam com visibilidade, onde todos podiam ver o queacontecia. Assim nasceu o que chamamos público, ou espaço público.

Arent, em A condição humana2, retoma os gregos em sua concepção de espaço público.Política para ela é o diálogo entre iguais, faz parte da condição humana de agir e interagir. Paraela, liberdade e política surgem do diálogo plural. É preciso existir liberdade para que se possaparticipar democraticamente do espaço público e da ação da qual nasce o poder – entendido comoum recurso gerado pela capacidade de a comunidade política concordar com um curso comum daação. Pressupõe que todos têm alguma forma de conhecimento, mesmo não sendo o “saberespecializado”, e que participem em igualdade de condições. A burocratização da vida pública eseus segredos, a vulnerabilidade do sistema e a monopolização e hierarquização do poder gerama opacidade, impedindo a criatividade e a capacidade de agir em conjunto.

O exercício da conversação na “praça”, combinado com a aceitação do outro e com avalorização da opinião, gera uma rede pactuada de conversações. Essa rede se baseia em projetoscomuns. Só que, no caso da democracia, não se trata de um propósito específico e, sim, de apostarna viabilidade da própria vida em comum entre diferentes. A democracia, como rede pactuada deconversações, baseia-se na aposta de gerar projetos comuns de convivência.

O exercício da conversação na “praça” pode ser aperfeiçoado a ponto de gerar aquilo quePierre Lévy3 comparou a um “coral polifônico improvisado”. Segundo ele, em contraposição aossistemas de convivência nos quais se enunciam proposições monótonas, repetições de palavras deordem em manifestações e jargões de identidade de militantes do mesmo partido, a democraciapode tomar como modelo o coral polifônico improvisado.

Para os indivíduos - escreve Lévy – o exercício é especialmente delicado, pois cada um échamado ao mesmo tempo a: escutar os outros coralistas; cantar de modo diferenciado; encontraruma coexistência harmônica entre sua própria voz e a dos outros, melhorando o efeito deconjunto. Nessa sinfonia, praticam-se as regras da conversação civilizada, da polidez, ou do savoir-vivre – que consiste em não gritar, em não repetir o que acabam de dizer, em responder, em tentarser pertinente e interessante, levando em conta o estágio da conversa.

Essa nova democracia poderia assumir a forma de um grande jogo coletivo, no qual ganhriam(mas sempre provisoriamente) os mais cooperativos, os mais urbanos, os melhores produtores devariedade consonante. E não os mais hábeis em assumir o poder, em sufocar a voz dos outros ouem captar as massas anônimas em categorias molares (por exemplo, através de técnicasmidiáticas e procedimentos burocráticos não-interativos).

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NOTAS

1 Texto retirado do documento: Seis anos de interlocução política: metodologia, resultados eavaliação de 1996-2002 / Conselho da Comunidade Solidária. Brasília, 2002.2 ARENT, Hannah. A condição humana. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1983.3 LÉVY, Pierre. A inteligência coletiva. Por uma antropologia do ciberespaço. São Paulo: Loyola,1998.

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2. REFLEXÕES SOBRE A NOAS SUS 01/02 1

Eugênio Vilaça Mendes2

1 - INTRODUÇÃO

O SUS, foi criado pela Constituição Federal de 1988 e regulamentado pelas Leis nº 8.080/90 e nº8.142/90, o que configurou, num momento de “janela histórica” representado pelaredemocratização do País, uma reforma sanitária do tipo bbi g-bang (Ham, 1997). A partir daí,vem sendo socialmente construído num movimento de tipo incrementalismo lento, especialmenteatravés de normas operacionais, consensadas pelos três níveis de governo e materializadas emPortarias Ministeriais.

A primeira norma operacional, NOB nº 01/91, editada pela Presidência do INAMPS, através daResolução nº 258, de 7 de janeiro de 1991, foi escrita segundo a cultura prevalecente naquelainstituição de assistência médica, tal como se percebe em sua introdução: “Pretende-se queatravés do conhecimento e domínio total das instruções aqui contidas e da familiarização com osistema de financiamento implantado possa ser adotada a política proposta, baseada na concessãode um crédito de confiança aos Estados e Municípios, sem prejuízo do acompanhamento a serexercido pelos mecanismos de controle e avaliação que estão sendo desenvolvidos” (Ministério daSaúde, 1991). Apesar de seu viés centralista, essa norma instituiu a transferência de recursosdiretamente da União para os municípios, abrindo caminho para a municipalização dos serviços desaúde.

Seguiu-se a NOB 0192, editada pela Portaria nº 234, de 7 de fevereiro de 1992, que manteve aestrutura da anterior e criou o Pró-Saúde, o Programa para a Reorganização dos Serviços de Saúde.

A IX Conferência Nacional de Saúde, realizada em agosto de 1992, cuja lema foi “a municipalizaçãoé o caminho” marcou fortemente as normas operacionais subseqüentes, especialmente a NOB01/93, editada em 24 de maio de 1993. Essa norma operacional institucionalizou as ComissõesIntergestores Tripartite e Bipartite criando, dessa forma, um sistema decisório compartilhado pelasdiferentes instâncias federativas, ademais de impulsionar a municipalização através dashabilitações em gestão incipiente, parcial e semiplena.

A NOB 01/96 consolida a política de municipalização estabelecendo o pleno exercício do podermunicipal da função de gestor da atenção à saúde. Essa norma operacional instituiu a gestão plena

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do sistema municipal e a gestão plena da atenção básica e redefiniu as responsabilidades da Uniãoe dos Estados.

Os resultados da NOB 01/96 são inquestionáveis. Ao final de 1996, havia 3.078 municípioshabilitados em alguma forma de gestão e, em dezembro de 2000, cerca de 99% dos municípiosbrasileiros se encontravam habilitados a receber diretamente recursos do Governo Federal. A NOB01/96 consolidou como modelo de descentralização do sistema público de serviços de saúdebrasileiro, a municipalização autárquica (Mendes, 2001).

As NOB´s produziram resultados positivos. Houve um incremento da oferta de serviços municipais,aumento da capacidade institucional nos estados e nos municípios e uma expressiva transferênciade recursos federais para estados e municípios. Ao final de 2000, 63% dos recursos federais paraa assistência à saúde eram repassados diretamente aos estados e municípios.

Por outro lado, surgiram problemas. Dentre eles destacam-se as dificuldades de gestão eficaz, adifusão das responsabilidades pela saúde dos cidadãos, o incremento dos custos de administraçãodo SUS, a atomização dos serviços com deseconomias de escala e de escopo, a incorporaçãotecnológica irracional, a imposição de barreira de acesso a usuários e a baixa qualidade dosserviços.

Para superar esses problemas instituiu-se a Norma Operacional da Assistência à Saúde, NOAS SUS01/01, em 26 de janeiro de 2001, com o objetivo de “promover maior eqüidade na alocação derecursos e no acesso da população às ações e serviços de saúde em todos os níveis de atenção”(Ministério da Saúde, 2001). Para isso, estabeleceu que “ a macroestratégia deverá contemplaruma lógica de planejamento integrado de maneira a conformar sistemas funcionais de saúde, ouseja, redes articuladas e cooperativas de atenção, referidas a territórios delimitados e a populaçõesdefinidas e dotadas de mecanismos de comunicação e inter-relacionamento que garantam o acessodos usuários às ações e serviços de níveis de complexidade necessários para a resolução de seusproblemas de saúde, otimizando os recursos disponíveis” (Ministério da Saúde, 2001).

Chama a atenção que não se trata de uma norma operacional do SUS, mas de uma normaoperacional da assistência à saúde. Isso significa, na prática, que se reduziu o objeto danormalização para fixá-lo exclusivamente nas ações de assistência à saúde.

A NOAS SUS 01/01 estruturou três estratégias que transferiram o foco descentralizatório damunicipalização para a regionalização: a elaboração do Plano Diretor de Regionalização (PDR), coma instituição de módulos assistenciais, micro e macrorregiões, e do Plano Diretor de Investimentos(PDI); o fortalecimento da gestão pública estadual e municipal e do comando único em cada nívelde governo; e a instituição de novos critérios e de novas formas de habilitação de estados e

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municípios (Souza, 2001). Além disso a NOAS SUS 01/01 ampliou o conceito de atenção básica àsaúde e incrementou o espectro dos recursos federais transferidos por capitação aos estados emunicípios.

Durante uma curta existência, a NOAS SUS 01/01 mostrou problemas operacionais como adificuldade de estabelecer o comando único, de assegurar a totalidade da gestão municipal nassedes dos módulos assistenciais e de superar a fragilidade da efetivação da gestão estadual paraas referências intermunicipais. Por essas razões, foi substituída pela NOAS SUS 01/02, de 27 defevereiro de 2002, que, contudo, manteve as propostas centrais da norma anterior.

O principal problema da NOAS SUS 01/02 consiste no seu foco, dirigido para a gestão da oferta,no que reproduz o erro de concepção das normas operacionais anteriores. Derivam desseproblema fundante uma série de disfunções que impedirão a NOAS SUS 01/02 de cumprir seusobjetivos.

Por isso, urge reescrever a NOAS para que os objetivos de um SUS mais democrático, maiseficiente e com serviços de melhor qualidade possam ser obtidos através da regionalização daatenção á saúde. Reescrevê-la sim, mas com o foco na gestão da demanda dos serviços de saúdee com coerência entre suas normas e os melhores fundamentos da gestão dos sistemas deserviços de saúde.

2 – OS FUNDAMENTOS DA REGIONALIZAÇÃO DA ATENÇÃO À SAÚDE

A mudança essencial colocada pela NOAS SUS 01/02 está na constituição de redes funcionais deserviços de saúde, de forma regionalizada, buscando superar a visão autárquica da municipalizaçãoda saúde.

A idéia de regionalização dos sistemas de serviços de saúde não é nova. Na realidade, surgiu noReino Unido, na segunda década do século XX, com a proposta de regionalização dos serviços desaúde feita pelo Relatório Dawson (Lord Dawson of Penn, 1920). Mas para ser realizada comeficácia exige a obediência aos fundamentos da gestão dos sistemas de serviços de saúde que adeterminam.

Há uma consciência crescente de que os sistemas de serviços de saúde constituem um dossistemas sociais de maior complexidade, o que os torna de governança muito difícil (Gloubermane Mintzberg, 2001).Esses sistemas apresentam singulares teleológicas, econômicas, tecnológicas e organizacionais, a

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par de serem governados por princípios e leis universais próprios (Mendes, 2002a). Assim, aregionalização da atenção à saúde deve fazer-se em coerência com esses fundamentos dossistemas de serviços de saúde, sem o que o processo tenderá a fracassar.

Nos processos de regionalização da atenção à saúde é particularmente importante conhecer eaplicar os fundamentos relativos à descentralização dos sistemas de serviços de saúde, à economiade escala, à economia de escopo, às relações entre escala e qualidade e ao acesso aos serviços desaúde. São esses fundamentos que devem orientar uma regionalização conseqüente da atenção ásaúde. De um lado, porque a regionalização é uma estratégia de descentralização e, por outro,porque uma descentralização ótima deve ser guiada pelos princípios da economia de escala eescopo, da qualidade e do acesso aos serviços de saúde.

2.1. A descentralização dos sistemas de serviços de saúde

Há que se precisar bem o que é descentralização porque há entendimentos diversos sobre estesignificante e porque a descentralização não constitui um movimento discreto, mas um processosocial cujo ritmo e conteúdo são estabelecidos pelas determinações políticas das realidadesnacionais (Mendes, 1998).

A descentralização, enquanto processo, não constitui conceito unívoco, articulado como opostoà centralização. Ao contrário, apresenta-se, na realidade política, como unidade dialética que seexprime, empiricamente, pela convivência de tendências de centralização e descentralização,ainda que o vetor de maior peso deva ser o descentralizatório.

Torna-se difícil buscar uma conceituação geral que dê conta da descentralização. Entretanto astentativas de buscar um significado unívoco para a descentralização, articula-a com odeslocamento do poder para a periferia das instituições e dos fatos administrativos. Daí serpreferível uma interpretação conceitual referida pela unidade dialética dacentralização/descentralização e por uma visão processual que admite que a descentralizaçãoapresenta-se, na prática social, com graus ou formas distintas.

Na literatura, aparecem tipologias distintas de graus ou formas de descentralização, sendo umadas mais abrangentes a que identifica quatro formas de descentralização (Rondinelli eet a lii,1983): desconcentração, devolução, delegação e privatização.

A desconcentração consiste no deslocamento de algumas responsabilidades administrativas paraníveis hierárquicos inferiores, dentro de uma mesma organização, sem a correspondenteredistribuição do poder decisório. A criação de organismos regionais por Ministérios, Secretarias

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Estaduais ou Prefeituras Municipais é exemplo de desconcentração.A devolução consiste na transferência de poder decisório de uma organização governamental paraoutra de nível subnacional que adquire, assim, autonomia política e administrativa. O componentemais relevante da descentralização do SUS e que está incorporado nas normas operacionais é adevolução da União para os estados e municípios, a municipalização da saúde.

A delegação dá-se em outro âmbito, envolvendo as relações entre Estado e sociedade civil, ondeo Estado transfere responsabilidades gerenciais para organizações não governamentais quecontinuam com financiamento e regulação estatais. Aqui, dá-se a desconstrução do espaço estatale o surgimento de entes públicos não estatal. Os contratos entre o SUS e prestadores privadosde serviços de saúde é exemplo de delegação.

A privatização é a transferência de instituições estatais para a iniciativa privada, sob o domínio dasregras de mercado. Ela refere-se à substituição de entes estatais por organizações privadas,normalmente sob a forma de venda de ativos estatais. Nos sistemas de serviços de saúde aprivatização se dá quando se retiram do Estado, ainda que parcialmente, as macrofunções deregulação e financiamento dos sistemas de serviços de saúde, passando-as ao setor privado.

A descentralização dos sistemas de serviços de saúde constitui uma tendência inequívoca nocenário internacional como contraposição aos modelos centralizados. Mas essa descentralização,como processo social, apresenta, na sua consecução prática, fortalezas e debilidades, havendo,pois, que se buscar uma maximização das suas fortalezas e uma minimização das suas debilidades.

As fortalezas da descentralização dos sistemas de serviços de saúde são: uma maior eficiênciaalocativa pela influência dos usuários locais; a inovação e a adaptação às condições locais; umamaior qualidade, transparência, responsabilidade e legitimidade derivadas da participação dapopulação no processo de tomada de decisão; uma maior integração entre agênciasgovernamentais e não governamentais; e melhoria das atividades intersetoriais (Mills et alii, 1990).Por outro lado, as principais debilidades são: um enfraquecimento das estruturas centrais; umadificuldade de coordenação; o incremento dos custos de transação; a fragmentação dos serviços;a ineficiência por perda de economia de escala e de escopo; a escassez de recursos gerenciais; oclientelismo local; e a desestruturação de programas verticais de saúde pública ( Prud´homme,1995).

Uma avaliação da descentralização dos sistemas de serviços de saúde na Europa indica que ela,sempre, traz vantagens e desvantagens, e que não é possível estabelecer relações entredescentralização e eqüidade, que para haver ganhos de eficiência não se pode criar deseconomiasde escala e que várias formas de descentralização aumentam as possibilidades de escolha porparte dos usuários (Hunter, Vienonen e Wlodarczyk, 1998). Estudos comparativos dadescentralização dos sistemas de serviços de saúde, realizados no Chile, na Colômbia e na Bolívia

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( Bossert, 2000) concluíram que no Chile e Colômbia houve algum aumento de eqüidade e que,nos três países, não se pode evidenciar resultados favoráveis em relação à eficiência e à qualidadedos serviços.

No Brasil, faltam-nos estudos avaliativos sistemáticos e rigorosos que permitam estabelecer deforma mais definitiva os resultados da descentralização do SUS. Pode-se, contudo, hipotetizar queos ganhos em eqüidade no acesso ocorreram com a municipalização do SUS, mas houve problemasde eficiência, efetividade e da qualidade dos serviços.

As avaliações internacionais da descentralização dos sistemas de serviços de saúde não indicamevidências definitivas e apontam para a necessidade de aprofundá-las para obter evidências. Masapontam, também, no sentido de que os processos descentralizatórios sempre apresentarãofortalezas e debilidades e que a questão central está em desenvolver processos dedescentralização dos sistemas de serviços de saúde que maximizem as suas fortalezas eminimizem as suas debilidades e que minimizem os tt rade- off s entre eqüidade, eficiência,efetividade e qualidade dos serviços de saúde.

Para concretizar essa descentralização ótima, uma das propostas mais consistentes está eminstituir, entre os níveis centrais e locais dos sistemas de serviços de saúde uma instânciamesorregional, tal como proposto por Mills et alii (1990) com o nome de distritos sanitários e porMendes (2001) como microrregiões de saúde. A instituição deste nível mesorregional podeconduzir a uma descentralização mais racional porque permitiria compatibilizar o acesso pronto aserviços eficientes, efetivos e de qualidade com a proximidade dos problemas locais e dapopulação. Esta é uma proposta subjacente à regionalização da saúde, normatizada pela NOAS SUS01/02.

Além de operar num âmbito microrregional, a descentralização dos sistemas de serviços de saúdedeve tornar o sistema mais democrático. Nessa perspectiva, há que se construir um sistema deresponsabilização onde os cidadãos possam reconhecer e interagir com um único e inequívocoresponsável pelas ações e serviços públicos de saúde. Num sistema público federativo de serviçosde saúde esse responsável há de ser ou a União, ou o estado, ou o município. E, também, permear-se crescentemente ao controle social da cidadania, organizada em conselhos de saúde, e atuandonum sistema de forte ambiência democrática. O que pressupõe, no mínimo, um poder judiciárioindependente, um ministério público atuante e uma imprensa livre.

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2.2 A dialética da concentração/dispersão na organização dossistemas de serviços de saúde

Os serviços de saúde, como outras formas de produção econômica, podem ser organizados emarranjos híbridos que combinam a concentração de certos serviços com a dispersão de outros. Emgeral, os serviços de atenção primária à saúde, devem ser dispersos; ao contrário, serviços demaior densidade tecnológica, como hospitais, unidades de processamento de exames de patologiaclínica, equipamentos de imagem etc, tendem a ser concentrados (World Health Organization,2000).

O modo de organizar os serviços de saúde define a singularidade de seus processosdescentralizadores frente a outros setores sociais. Os serviços de saúde estruturam-se numa redede pontos de atenção à saúde, composta por equipamentos de diferentes densidades tecnológicasque devem ser distribuídos espacialmente, de forma ótima. Essa distribuição ótima vai resultar emeficiência, efetividade e qualidade dos serviços.

Economia de escala e de escopo, grau de escassez de recursos de maior densidade tecnológica oude maior concentração cognitivo-tecnológica e acesso aos diferentes pontos de atenção à saúde,determinam a lógica fundamental da organização racional dos sistemas de serviços de saúde.

Os serviços que devem ser ofertados de forma dispersa são aqueles que não se beneficiam deeconomias de escala e de escopo, para os quais há recursos suficientes e em relação aos quais adistância é fator fundamental para a acessibilidade; diferentemente, os serviços que devem serconcentrados são aqueles que se beneficiam de economias de escala e escopo, para os quais osrecursos são mais escassos e em relação aos quais a distância tem menor impacto sobre o acesso(Mendes, 2001).

As economias de escala ocorrem quando os custos médios de longo prazo diminuem à medida emque aumenta o volume das atividades e os custos fixos se distribuem por um maior número dessasatividades, sendo o longo prazo um período de tempo suficiente para que todos os insumos sejamvariáveis. As economias de escala são mais prováveis de ocorrer quando os custos fixos são altosrelativamente aos custos variáveis de produção, o que é comum nos serviços de saúde.

A teoria econômica assume que as relações entre custos médios e tamanho de certosequipamentos de saúde, tende a ter uma forma de U. Assim, aumentos de escala implicam fontesadicionais de custos, de tal forma que além de um determinado volume crítico, os custos médiosde longo prazo começam a elevar-se, configurando uma situação de deseconomia de escala.

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A economia de escala nos serviços de saúde decorre de vários fatores: a divisão do trabalho; a altarelação entre custos fixos/custos variáveis; a natureza singular das tecnologias de saúde, que astornam particularmente sensíveis à escala (Albuquerque e Cassiolato, 2000); as reservas decapacidade da força de trabalho ou de outros insumos; e as economias de custo de capital.

As economias de escopo ocorrem quando um determinado serviço de saúde aumenta a variedadedos equipamentos que podem ser utilizados numa mesma função. Economias de escopo podemresultar quando se evita a duplicação de equipamentos médicos numa mesma unidade deprodução; por exemplo, quando vários serviços especializados de um hospital utilizam o mesmotomógrafo computadorizado.

As economias de escopo são relevantes nas unidades hospitalares. Os hospitais operam com umconjunto complexo de funções inter-relacionadas e parece adequado colocar diferentes serviçosdentro de uma mesma unidade hospitalar. Há fortes argumentos para criar grandes unidadesoperacionais que facilitem as ligações entre especialidades, fortaleçam o trabalho multidisciplinar,assegurem o ótimo uso de equipamentos de alta densidade tecnológica e dêem suporte àeducação permanente dos profissionais (McKee e Healy, 2000).

Um exame da literatura universal, identificou aproximadamente cem estudos que mostramevidências de economias de escala e de escopo em hospitais. E revelaram que as economias deescala só podem ser encontradas em hospitais de mais de 200 leitos, que o tamanho ótimo doshospitais pode estar entre 200 a 400 leitos e que as deseconomias de escala vão tornar-seimportantes em hospitais de mais de 650 leitos (Aletras, Jones e Sheldon, 1997).

Uma singularidade dos serviços de saúde é que parece haver uma relação estreita entre escala equalidade, ou seja, entre quantidade e qualidade.

Esta relação estaria ligada a uma crença generalizada de que serviços de saúde ofertados em maiorvolume são mais prováveis de apresentar melhor qualidade; nessas condições, dentre outrasrazões, os profissionais de saúde estariam melhor capacitados a realizar os serviços de saúde(Bunker, Luft e Enthoven, 1982). Por isso, os compradores públicos de saúde, devem analisar otamanho dos serviços e o volume de suas operações como uma pproxy de qualidade.

Na Holanda, a busca de escala levou à regionalização e concentração de certos serviços de saúde.Por exemplo, cirurgias cardíacas abertas só podem ser realizadas em hospitais que façam, nomínimo, 600 operações anuais (Banta e Bos, 1991). Similarmente, nos Estados Unidos, o ColégioAmericano de Cirurgiões recomendou que as equipes de cirurgia cardíacas abertas façam, nomínimo, 150 operações por ano (American College of Surgeons, 1984).

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Uma ampla revisão de evidência, realizada em 220 estudos que relacionam escala e qualidade,sugere que pode haver ganhos de qualidade com aumento de volume das atividades para algunsserviços mas que essas evidências são menos significativas quando se faz um ajuste do cc as e-mixdos diferentes serviços (Sowden, Watt e Sheldon, 1997). Outros estudos encontraram umarelação entre resultados e o volume de atividades dos hospitais, mas não encontraram a mesmarelação entre os resultados e o volume de médicos, sugerindo que o eexpert is e da equipe cirúrgicaé mais importante que a capacidade de cirurgiões individuais (McKee e Healy, 2000).

Essa busca por eficiência e qualidade tem levado ao incremento do tamanho das unidades desaúde, dentro de um movimento mais amplo de instituição de sistemas integrados de serviços desaúde (Mendes, 2001). E isso tem sido feito pelo processo de integração horizontal, ou seja, aintegração de unidades de saúde que produzem serviços similares. Na prática, a integraçãohorizontal, tem levado a fechamentos de unidades de saúde pequenas ou desnecessárias e àfusão ou jjo int v en tures de unidades similares.

No Reino Unido, bem como na maioria dos países ricos, há uma crescente concentração dehospitais (Ferguson, Sheldon e Posnett, 1997). O incremento da escala dos hospitais, juntamentecom uma racionalização das internações hospitalares, tem sido responsável por uma notáveldiminuição dos leitos por habitantes, em países da Europa Ocidental, nas duas últimas décadas(Edwards, Henshe e Werneke, 1998).

Um outro ponto que merece ser analisado, em termos de concentração de serviços de saúde, sãoas fusões de serviços. Nos Estados Unidos as fusões hospitalares têm levado à instituição degrandes cadeias hospitalares; isso levou a que 300 grupos empresariais administrem 50% doshospitais daquele país (Dowling, 1997). Algo semelhante ocorre no campo dos laboratórios depatologia clínica, onde um único laboratório, o Quest, faz 1 milhão de exames por dia e alcançando50% desse mercado naquele país (Valor, 2001).

A necessidade de operar sistemas de serviços de saúde, com eficiência, efetividade e qualidadetem levado alguns estudiosos a propor uma escala mínima populacional para se organizarracionalmente esses sistemas. Só a partir de uma determinada base populacional, os sistemas deserviços de saúde poderiam operar com eficiência e qualidade e ratear adequadamente os riscos.Nesse sentido, Bengoa (2001) fala de uma escala mínima de 100.000 a 150.000 pessoas. Essaconstatação está na base da proposição dos Sistemas Microrregionais de Serviços de Saúde(Mendes, 2001).

Diante dessas evidências, os sistemas de serviços de saúde, devem configurar-se em desenhosinstitucionais que combinem elementos de concentração e de dispersão.

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Esses critérios de organização dos sistemas de serviços de saúde podem apresentar, entre si,trade-offs. Muitas vezes um ganho eficiência e de efetividade, dado por uma maior escala dosserviços, pode ser acompanhado pelo exercício de poder monopólico, com conseqüente dano naresponsabilização, ou por dificuldades de acesso, especialmente de grupos mais vulneráveis dapopulação. Por isso, o arranjo ótimo de um sistema de serviços de saúde deve procurar equilibraresses diferentes critérios (Ferguson, Sheldon & Posnett. 1997).

O acesso aos serviços de saúde está em função de quatro variáveis: o custo de oportunidade dautilização dos serviços de saúde; a severidade percebida da condição que gera a necessidade debusca dos serviços; a efetividade esperada dos serviços de saúde; e a distância dos serviços desaúde. Outras condições sendo iguais, quanto maior o custo de oportunidade, menor a severidadeda condição, menos clara a percepção da efetividade e maior a distância, menor será o aceso aosserviços de saúde.

Uma revisão sobre o acesso aos serviços de saúde mostrou algumas evidências (Carr-Hill, Place ePosnett, 1997): a utilização da atenção primária à saúde é sensível à distância, tanto parapopulações urbanas quanto rurais; isso é particularmente importante para serviços preventivos oupara o manejo de doenças em estágios não sintomáticos; há evidência de uma associação negativa,também para serviços de urgência e emergência; não há evidência de associação entre distânciae utilização de serviços de radioterapia, de seguimento de câncer de mama; não há associaçãoentre distância e a acessibilidade a serviços hospitalares agudos.

3. OS PARADIGMAS DA REGIONALIZAÇÃO DA ATENÇÃO À SAÚDE

Os sistemas de serviços de saúde podem organizar-se, no âmbito microeconômico, de duas formasprincipais: sistemas que se organizam com base populacional, o que necessariamente leva àdefinição de um sistema territorial e sistemas que se organizam por demanda aberta, onde umabase territorial não é imprescindível. Em outros termos, sistemas dawsonianos, com baseterritorial, e sistemas não dawsonianos, sistemas abertos, de livre demanda, sem base territorial.

Nos sistemas dawsonianos, a experiência internacional mais comumente encontrada é a daregionalização da atenção á saúde através do paradigma da regionalização autárquica. Nesseparadigma, a instância de gestão de um sistema local de serviços de saúde, é exercitada por umamesorregião sanitária autônoma que funciona como financiadora e reguladora do sistema. É o casoda Autoridade Sanitária, no Reino Unido; da AAzienda, na Itália; do CCounty Council, na Suécia; edo Distrito Sanitário, no Canadá. Neste paradigma, o papel dos municípios, ou inexiste, ou ésecundário, limitando-se a algumas ações de saúde pública.Ainda que este paradigma tenha vantagens significativas, especialmente no que concerne à

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economicidade e aos menores custos de transação, sua aplicabilidade ao nosso país é improvável.De um lado, porque a legislação constitucional e infra-constitucional estabeleceu os municípioscomo entes federativos, com claras responsabilidades na gestão do SUS; de outro, porque amunicipalização dos sistemas de serviços de saúde no País é uma realidade política, administrativae tecnoassistencial, que não será revertida.

Por isso, a reforma sanitária brasileira instituiu um paradigma próprio, o da municipalizaçãoautárquica. Nele, a gestão do sistema de serviços de saúde, no âmbito local, é responsabilidadedos municípios, ainda que com algumas competências concorrentes com União e estados. Estemodelo organizacional constitui a vertente polar da regionalização autárquica. Além do Brasil só foiadotado na Finlândia, país que o abandonou ao instituir os JJoint Comissions Boards (Bengoa,1998).

Ainda que apresente algumas fortalezas é um sistema que, no limite, transforma cada municípionum sistema fechado que deveria oferecer todos os serviços aos seus cidadãos. Isso leva àfragmentação, às deseconomias de escala e de escopo e à perda de qualidade dos serviços desaúde. É o paradigma que tem prevalecido na construção social do SUS e que foi estimulado pelasNOB´s.Suas debilidades é que levaram à elaboração e implantação da NOAS SUS 01/02.

Se não é possível estruturar o paradigma da regionalização autárquica – o que implicaria umareestadualização ou uma refederalização - e se não se pode permanecer no paradigma damunicipalização autárquica, a solução está em instituir uma solução intermediária para aregionalização da atenção à saúde no SUS, proposto e definido por Mendes (2001) como oparadigma da microrregionalização cooperativa.

O paradigma da microrregionalização cooperativa será operacionalizado pela construção social dosSistemas Microrregionais de Serviços de Saúde, com base na cooperação gerenciada. Tendo comoparâmetro a obediência aos preceitos constitucional e infra-constitucionais de municipalização dossistemas de serviços de saúde, procurará maximizar as fortalezas dessa devolução municipalizadae minimizar suas debilidades.

Assim, na microrregionalização cooperativa os municípios continuariam como os gestoresprincipais dos sistemas de serviços de saúde no âmbito local, mas organizar-se-iam emmicrorregiões, de forma cooperativa. A microrregião de saúde seria transformada num espaçodialógico de negociação e pactuação. Isso significa que os municípios são os responsáveisinequívocos pela saúde de seus cidadãos e, para tal, financiam (como ffundhold ers) e regulam,solidariamente com outros municípios da microrregião e com a Secretaria Estadual de Saúde, osistema de serviços de saúde.

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A cooperação gerenciada materializar-se-ia-se nas Comissões Intergestores BipartiteMicrorregionais (cooperação) e em programações pactuadas e integradas (gerenciada).

Este paradigma não tem similar na experiência internacional e, no Brasil, está sendo implantado noestado do Ceará, numa experiência inovadora, coordenada pela Secretaria Estadual de Saúde e comparticipação das 184 Secretarias Municipais de Saúde daquele estado. Para o desenvolvimentodesse processo, o estado do Ceará foi dividido em 21 microrregiões e três macrorregiões sanitárias(Secretaria Estadual de Saúde do Ceará, 2000a).

A análise crítica da NOS SUS 01/02, bem como as propostas de sua modificação, consideradasneste trabalho, têm como referencial o paradigma da microrregionalização cooperativa.

4. O FEDERALISMO BRASILEIRO

Uma análise da NOAS SUS 01/02 deve ter como pano de fundo a natureza singular do federalismobrasileiro.

O Brasil é um país continental, com uma área 8,5 milhões de quilômetros quadrados, e com umapopulação de aproximadamente 170 milhões de habitantes. Além de grande é um país complexoe muito desigual, onde manifestam-se nítidas diferenças econômicas, sociais, culturais,demográficas e sanitárias entre suas diferentes regiões e, dentro delas, entre seus distintosgrupos sociais. Isso, por si só, já coloca a imprescindibilidade da descentralização comoviabilizadora das políticas públicas.

Além disso, constitui um sistema federativo, estruturado em três níveis político-administrativos:a União, os estados e os municípios. O país está dividido em 26 estados, o Distrito Federal e 5.563municípios. O federalismo brasileiro é especial no quadro mundial porque os municípios são entesfederativos, com autonomia política, administrativa e financeira e com competênciasconstitucionais e infra-constitucionais bem estabelecidas. E apresentam, entre si, à semelhança doPaís como um todo, altíssimos diferenciais de tamanho, de população e de desigualdades sócio-econômicas.

A descentralização política brasileira pós-regime militar, consolidada pela Constituição de 1988,gerou o fenômeno do federalismo municipal, caracterizado pelo ss ta tu s de membros da Federaçãoconcedido aos municípios e pela repartição de recursos da União e estados para os municípios.

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O federalismo municipal conduziu a alguns resultados, analisados por Gomes e Mac Dowell (2000):intensa criação de municípios, 1.405 novos municípios, no período de 1984 a 1997, umincremento de 34,3% neste período; concentração dos novos municípios nas regiões Sul (405) eNordeste (402); proliferação de pequenos municípios: dos 1.405 novos municípios, 1.329(94,5%) têm menos de 20.000 habitantes, 1.095 (78%) têm menos de 10.000 habitantes e 735(52%) têm menos de 5.000 habitantes; um porcentual enorme de pequenos municípios: 25,4%com menos de 5.000 habitantes, 50% com menos de 10.000 habitantes e 74,8% com menos de20.000 habitantes; disso decorre que a criação de novos municípios tem sido feita através damultiplicação dos pequenos municípios e, especialmente, de micromunicípios, aqueles com menosde 5.000 habitantes; aumento da receita disponível dos municípios que, em relação à da União, foimultiplicada por um fator próximo a três; associação entre receita própria e tamanho dosmunicípios: 8,9% nos municípios de menos de 5.000 habitantes, 10,1% nos municípios com menosde 10.000 habitantes, 38,1% nos municípios com 500.000 a 1.000.000 de habitantes e 55,9%nos municípios de mais de 1.000.000 de habitantes; forte dependência dos pequenos municípiosde transferências, especialmente do Fundo de Participação Municipal; transferência líquida derecursos dos mega e grandes municípios para os pequenos e médios municípios; em 1996, areceita pper c apit a foi maior nos municípios de menos de 5.000 habitantes (R$ 431,30) que nosmunicípios de 500.000 a 1.000.000 de habitantes (R$ 307,90) e que nos municípios de mais de1.000.000 de habitantes (R$ 405,80); os grandes beneficiários do sistema tributárioredistributivo são os pequenos municípios nos quais vivem apenas 19,6% da população do país;proporcionalmente, os gastos com os legislativos municipais são maiores do que esses gastos nosestados e na União; em 1996, os gastos pper cap ita/ano com o legislativo foram maiores nosmunicípios com menos de 5.000 habitantes (R$ 20,60) que nos municípios de mais de 1.000.000de habitantes (R$ 15,60).

Esses autores tratam de destruir um mito da literatura municipalista brasileira, o de que osmunicípios menores são aqueles em que está localizada a população mais pobre. Trabalhandodados do Censo de 1991 mostram que os municípios de até 5.000 habitantes estão distribuídosem todos os decis de renda , com uma concentração nos decis cinco, seis e sete, ou seja, nametade superior da distribuição de renda pper cap i ta; nos municípios de 5.000 a 10.000habitantes, a concentração se dá nos decis seis, sete e oito.

Este país federativo, grande, complexo e desigual e sua forma muito especial de descentralizaçãopolítica, devem ser permanentemente considerados ao discutir e propor as normas deregionalização da atenção à saúde.

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5. ANÁLISE CRÍTICA DA NOAS SUS 01/02

5.1. O processo de elaboração da NOAS SUS 01/02

As normas operacionais têm sido fortemente influídas pelo lugar hegemônico do Ministério daSaúde, ou seja, pelo llocus institucional da assistência à saúde. É emblemático que a primeira, aNOB 01/91, e a última, a NOAS SUS 01/02, tenham como objeto a assistência à saúde e derivem,respectivamente, do INAMPS e da Secretaria de Assistência à Saúde.

O SUS, em função de sua precocidade, não conseguiu, ainda, articular e consolidar uma culturaregulatória própria, coerente com os princípios e diretrizes desse sistema. As doutrinas e práticasde regulação são fortemente influídas pela cultura inampsiana que insiste em perdurar, tal comoprofeticamente previ em texto preparado para justificar o fim do INAMPS (Mendes, 1993).

Esse hibridismo cultural expressa-se numa normatividade extensiva, numa ponta de desconfiançanos processos de descentralização e numa fé inabalável nos mecanismos de planejamento econtrole centralizados. Como resultado processual dessa cultura regulatória surgem normasamplas e minudentes, nem sempre redigidas na melhor técnica legislativa, de altíssimacomplexidade e de difícil interpretação operacional. Enfim, verdadeiras catedrais burocráticas.

A crítica recorrente sobre a complexidade dos textos das NOB´s e, agora, da NOAS-SUS 01/02,reflete a impossibilidade de articular e enunciar, de forma racional e simples, um sistema de saúdeplanejado pelo lado da oferta.

Seus redatores, em geral, são técnicos de alto espírito público e com grande intimidade com o SUS.Entretanto, falta, a muitos deles, um conhecimento mais aprofundado dos fundamentos da gestãodos sistemas de serviços de saúde, o que os aproxima da engenharia social. A simbiose dessesengenheiros sociais com a máquina burocrática, dificulta-lhes um distanciamento necessário parapropor rupturas epistemológicas, às vezes imprescindíveis nos processos de reforma. Daí oprocesso de mudança pelo incrementalismo lento, onde os movimentos são contidos, de um lado,por um método excessivamente prudente de micro-alterações por tentativa/erro, e, de outro, pelainércia que a própria máquina burocrática impõe.

Por fim, as normas têm períodos de gestação e de experimentação extensos; em parte, isso sedeve à natureza dos mecanismos decisórios do SUS, as Comissões Intergestores. Esse é uminstrumento fantástico de compartilhamento e democratização de decisões num sistema públicofederativo, que tem se mostrado eficaz na experiência do SUS. Mas, por outro lado, a necessidade

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de formar permanentemente consensos, num sistema decisório do tipo ganha-ganha, leva acomposições de interesses complexos que acabam por cristalizarem-se nos textos das normas.A sistemática processual de construção das normas operacionais está entranhada na NOAS SUS01/02 quando recolhe elementos do hibridismo cultural regulatório e apresenta texto extenso ecomplexo, um típico produto da engenharia social.

O resultado final são páginas e páginas de normalização detalhada; a profusão de neologismoscomo gestão plena do sistema municipal, gestão plena da atenção básica ampliada, município-sede,município-pólo, unidade territorial de qualificação, ações mínimas de média complexidade, atençãode média complexidade, atenção de alta complexidade; fluxos de recursos financeiros muitocomplicados; e numerosos e abundantes anexos. Tudo isso cria uma burocracia infernal naoperacionalização do SUS: PPI, centrais de regulação, habilitações diversas para estados emunicípios, termos de compromisso de garantia de acesso, câmaras de compensação etc.

5.2. O pecado original da NOAS SUS 01/02

O problema essencial da NOAS SUS 01/02 , no que reincide em relação a todas as normasoperacionais anteriores, é o seu foco na gestão da oferta dos serviços de saúde.

A experiência internacional de reformas sanitárias evidencia a inferioridade dos sistemas planejadoscom base na oferta de serviços, em relação àqueles orientados pela demanda. É de notar que asnormas operacionais do SUS avançaram, ainda que de forma contida, por esse caminho quandoinstituíram o Piso Assistencial Básico (PAB) e quando, na NOAS SUS 01/02, estendem o subsídioà demanda para a atenção básica ampliada e para a média complexidade (M1).

Mas, na prática operacional, a NOAS SUS 01/02 acolhe e consolida o foco na oferta quando vinculaa habilitação dos municípios à existência física dos equipamentos de saúde em seu território. Issoé que define a gestão plena municipal e a gestão plena da atenção básica ampliada, tal comoexplicita: “com capacidade de ofertar com suficiência a totalidade dos serviços” (Ministério daSaúde, 2002a). E, também, quando tipifica como mando único a gestão sobre o conjunto deserviços de saúde de seu território.

De outra forma, o foco na oferta está determinado pela sistemática de financiamento que sematerializa na estratégia de “o dinheiro segue o gestor”. Isso significa que os recursos para aatenção à saúde dos cidadãos dos municípios satélites são transferidos para o gestor do municípioonde os serviços estão localizados.

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É esse foco na oferta dos serviços de saúde que gera uma normalização complexa, estabelecefluxos complicados de pessoas e dos recursos financeiros, consolida a responsabilização difusa edificulta o acesso pronto a serviços eficientes e de qualidade.

Se esse equívoco seminal não for superado, os objetivos da NOAS SUS 01/02 não serãoalcançados. A hipótese aqui levantada é de que os resultados dessa norma, não obstante osesforços meritórios que vêm sendo colocados em sua implementação, poderão ser poucorelevantes, até mesmo negativos, tendo em vista esse erro de concepção.

5.3. A NOAS SUS 01/02 e organização da rede funcional dosserviços de saúde

A NOAS propõe a organização de uma rede funcional regionalizada – módulos assistenciais,microrregiões, macrorregiões e regiões - com base em territórios autosuficientes em atençãobásica à saúde, em atenção mínima de média complexidade (M1), em atenção de médiacomplexidade (MC) e em atenção de alta complexidade.

Essa proposta decorre de uma visão prevalecente do sistema de serviços de saúde como estruturapiramidal, organizado por níveis que são hierarquizados por suas complexidades relativas, indo daatenção primária à saúde, que seria a menos complexa, até a atenção terciária, à saúde, que seriaa mais complexa. Esse enfoque da atenção à saúde, intrínseco à NOAS SUS 01/02, é teoricamenteerrado e sua adoção tem, na prática social, implicações muito graves.

Essa visão piramidal supõe que a atenção primária à saúde é menos complexa que osprocedimentos definidos como de média e alta complexidades. Não é correto esse suposto. Ouserá mesmo que ofertar uma atenção primária à saúde de qualidade, o que exige uma interaçãoconstante com os cidadãos e cidadãs usuários dos serviços, a responsabilização por sua saúde, autilização de procedimentos promocionais e preventivos, a resolução de 85% dos problemas e acoordenação dos fluxos e contra-fluxos na rede de serviços, é menos complexo que oferecerserviços de média e alta complexidades ambulatorial e hospitalar?

A atenção primária à saúde exige um conjunto de conhecimentos, atitudes e habilidades muitomais amplo que aqueles solicitados nos procedimentos de média e alta complexidade. A atençãoprimária à saúde convoca conhecimentos e habilidades nos campo da biologia, da medicina, dapsicologia, da antropologia, da sociologia e os utiliza numa perspectiva de intersetorialidade, quea torna, inquestionavelmente, muito mais complexa que as ações catalogadas como de média ealta complexidade na NOAS SUS 01/02.

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Os procedimentos de média e alta complexidade apresentam, sem dúvida, maior densidadetecnológica, incorporando maior quantidade de tecnologias de produtos, enquanto osprocedimentos de atenção primária à saúde são mais intensivos em cognição. Conseqüentemente,aqueles têm maior custo em relação a estes.Portanto, não é correto dividir as ações dos sistemas de serviços de saúde por níveis decomplexidade, tal como faz a NOAS SUS 01/02. As ações de média e alta complexidade são maisdensas tecnologicamente e mais custosas, mas definitivamente não são mais complexas.

Esse enfoque piramidal determina, nos sistemas de serviços de saúde, conseqüências desastrosas.Especialmente quando conduz a uma banalização da atenção primária à saúde ao transformar,equivocadamente, as ações mais complexas de um sistema de serviços de saúde em ações debaixa complexidade. Essa piramidalização da atenção à saúde leva a uma representação porpolíticos, por profissionais de saúde e pela própria população de uma atenção primária à saúdecomo algo muito simples, quase banal.

A expressão primária, instituída para marcar o princípio complexíssimo do primeiro contacto(Starfield, 1992) é interpretada, então, na prática social, como algo muito simples que pode serofertado de qualquer forma e em quaisquer circunstâncias. Essa banalização da atenção primáriaà saúde facilita a adoção de estratégias reducionistas do tipo da atenção primária seletiva (Ungere Killingsworth, 1986) ou da atenção primitiva à saúde (Testa, 1989). Nesse sentido, asubstituição na NOAS SUS 01/02 da expressão internacionalmente consagrada de atençãoprimária à saúde por atenção básica é bastante infeliz.

A apresentação da atenção primária à saúde como atenção básica de baixa complexidade reforçaa visão político-ideológica da atenção primária à saúde como programa destinado a populaçõespobres, a quem se oferecem tecnologias simples e de baixo custo (Mendes, 1999). O resultado éque a atenção primária à saúde passa a ser ofertada por equipes de profissionais sem formaçãofundamentada em saúde da família; com freqüência esses profissionais passam, exclusivamente,por um curso introdutório de 40 horas antes de serem incorporados como profissionais de saúdeda família; pode ser oferecida em espaço físico improvisado, muitas vezes uma casa alugada eadaptada precariamente para a atenção primária à saúde; as estruturas da atenção primária àsaúde (recursos humanos e físicos) não passam por processos rigorosos de certificação periódica;os profissionais podem ser submetidos a relações de trabalho de extrema precarização etc.

Tudo isso compõe um quadro de banalização da atenção primária à saúde onde tudo pode porqueé um nível de atenção sem complexidade. Pode inclusive, como é comum ocorrer, oferecer serviçossem qualidade à população. Nada disso é imaginável na oferta da atenção de alta complexidade,onde os critérios de certificação, ainda que não ideais, são mais rigorosos.

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A visão piramidal tem implicações negativas, também, no sistema de financiamento do SUS. De umlado, pela hegemonia do paradigma flexneriano na prática médica. De outro, porque os grupos deinteresse que se estruturam em torno da atenção primária à saúde estão menos organizados. Porfim, porque a menor densidade tecnológica, expressa numa incorporação maior de cogniçãofrente às tecnologias de produto, leva a uma desvalorização relativa das ações de atenção primáriaà saúde, o que reforça o ciclo vicioso dos programas de atenção primária seletiva e consolida odesfinanciamento da atenção primária à saúde no Brasil (Mendes, 2002b).

Um estudo comparativo das tabelas de pagamento do SUS em relação ao sistema MMedicai d emBoston, Estados Unidos, mostrou que essa relação variou de 1 para 3 em procedimentos de altacomplexidade até 1 para 300 em procedimentos intensivos em cognição, típicos da atençãoprimária à saúde (Janett, 2002). Essa estrutura perversa de preços relativos no SUS é fruto, emboa parte, da desqualificação da atenção primária à saúde em função da visão equivocada de suabaixa complexidade.

5.4. A NOAS SUS 01/02 e a democratização do SUS

O SUS foi concebido com uma intencionalidade clara de concretizar-se como uma política públicademocratizadora. É, assim, que persegue os objetivos da eqüidade, da universalização e daparticipação da comunidade. Infelizmente, a NOAS SUS 01/02 apresenta fragilidades que lesamgravemente o princípio da democratização das políticas de saúde.

Uma condição necessária para a democratização dos sistemas públicos de serviços de saúde é oprincípio da responsabilização única, pelo qual os cidadãos sabem que existe um único,identificável e inequívoco responsável por sua saúde. No Reino Unido é o Governo Federal e noCanadá são as províncias.

A NOAS SUS 01/02, rompe com o princípio da responsabilização única, reforçando o princípioinverso, o da responsabilização difusa no SUS. Essa norma aprofunda o princípio daresponsabilização difusa ao transferir mais recursos e responsabilidades de gestão para os estadose ao manter mecanismos de transferência de recursos e de responsabilidades de gestão de ummunicípio a outro.

O comando único sobre a totalidade da oferta existente num município significa, na prática, que omunicípio que fica sob a gestão plena da atenção básica ampliada perde a governabilidade sobreos recursos de média e alta complexidade. Esta é remetida ao governo estadual ou ao municípioem gestão plena do sistema municipal. Dessa forma, o Secretário Municipal de Saúde, ao programaras ações para outro município, perde sua governabilidade sobre aqueles recursos, ficando à mercêde um termo de compromisso de garantia de acesso, de eficácia duvidosa. É emblemático que esse

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termo de compromisso não é firmado entre o município gestor e o município satélite, mas entreaquele e a Secretaria Estadual de Saúde.Assim, quando o Secretário Municipal de Saúde do município-satélite transfere os recursos damédia e alta complexidade para o Secretário de Saúde do município-pólo ou para o SecretárioEstadual de Saúde, está, em parte, se desresponsabilizando pela saúde dos seus munícipes. Ocorreque esta responsabilização foi definida nas eleições municipais e não pode ser delegada a outrem,em nenhuma circunstância. Além disso, os cidadãos, pela responsabilização difusa, têmdificuldades de dirigir suas demandas e pleitos e de exercitar o controle social.

Não raro, os municípios-pólo impõem, aos cidadãos dos municípios satélites, cláusulas de barreiraque os impedem de ter acesso a determinados serviços. Esse fato, colide frontalmente com outroprincípio do SUS, a universalidade.

Por tudo isso, a NOAS SUS 01/02 não contribui para a democratização do SUS e, na prática,transforma os cidadãos dos municípios satélites em sub-cidadãos sanitários.

5.5. A NOAS SUS 01/02 e a heteronomia municipal

A NOAS SUS 01/02 ao definir, como critério de habilitação, a presença física de equipamentosnos municípios, teve de perpetrar uma acrobacia normativa, criando municípios em gestão plenado sistema municipal e em gestão plena da atenção básica ampliada.

Na prática, a norma divide os municípios em duas categorias, os que têm uma oferta extensiva deserviços de saúde e os que só oferecem serviços de atenção básica ampliada. Isso gera umadivisão perversa que institui municípios de primeira e segunda classes, consolidando umaindesejável heteronomia federativa.

Esse injusto tratamento dados aos municípios é resultado da visão míope da gestão da oferta, pelaqual o que importa é a existência da oferta e, não, a possibilidade de gerir a demanda dos cidadãospelos serviços, o que não depende da presença física dos equipamentos nos municípios.

5.6. O financiamento na NOAS SUS 01/02

No que concerne ao financiamento, os sistemas orientados pela gestão da oferta tendem asubsidiar a oferta, pagando por unidade de serviços ou por procedimentos; por outro lado, ossistemas voltados para a gestão da demanda subsidiam a demanda, tendendo a um pagamentopor capitação.

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No SUS, neste momento, dão-se duas formas de financiamento dos serviços de saúde: a atençãobásica ampliada e os serviços de M1 são financiados por subsídio à demanda, enquanto os outrosserviços são financiados por subsídio à oferta, através do pagamento por procedimentos segundoa Tabela SUS, ainda que esses valores sejam constrangidos por um teto financeiro. Além disso, osubsídio à oferta é fortemente influenciado por valores históricos inercializados.

A experiência do PAB reforça a evidência internacional de superioridade do financiamento porsubsídio à demanda. Por isso, é louvável a proposta da NOAS SUS 01/02 de ampliar o subsídio àdemanda para alcançar “as atividades de apoio diagnóstico e terapêutico (M1)” (Ministério daSaúde, 2002a). Ao mesmo tempo, há de se realçar que essa norma é pouco ousada quandomantém recursos substantivos transferidos por subsídio à oferta.

O subsídio à oferta, na prática do SUS, implica o mecanismo operacional “o dinheiro segue ogestor”, uma vez que os recursos são alocados, aa pr iori, para os diferentes gestores, através daPPI. É exatamente essa transferência de recursos do município satélite para o munícipio-pólo,determinada pelo enfoque da gestão da oferta, que reforça os princípios indesejáveis daresponsabilização difusa e da heteronomia municipal.

5.7. A NOAS SUS 01/02, a fragmentação dos serviços de saúde, aeficiência e a qualidade

O paradigma da municipalização autárquica significou um incentivo para a expansão dos serviçosmunicipais de saúde, dado que o enfoque de gestão da oferta, implicitamente, passa a mensagemde que para alcançar uma forma superior de gestão municipal dever-se-á instituir, no territóriomunicipal, o maior número de serviços de saúde.

Esse incentivo implícito, na realidade federativa brasileira onde 75% dos municípios têm menos de20.000 habitantes, levou a uma extrema fragmentação dos serviços de saúde, do que decorreramsignificativas deseconomias de escala e de escopo e baixa qualidade dos serviços ofertados.

Do ponto de vista das relações entre descentralização e eficiência, o processo de devoluçãomunicipalizado, com autarquização dos municípios e sem estruturação orgânica do espaçomicrorregional, está levando ao que, empiricamente, constatou-se na Região Metropolitana deCampinas, e que foi denominado de modelo de assistência municipalista (Oliveira,1995). Nestemodelo, o município expande a assistência à saúde sem nenhuma articulação regional, pulverizandorecursos públicos e gerando brutais ineficiências.

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Os resultados do paradigma da municipalização autárquica no SUS são inquestionáveis. A AMS/99mostrou que no período 1992/99 o número de estabelecimentos públicos cresceu 24,9%,enquanto que os estabelecimentos privados tiveram uma redução de 2,8%. Dentre os serviçospúblicos em geral – com e sem internação – destaca-se a participação dos estabelecimentosmunicipais que passaram de 69% em 1992 para 92% em 1999. Considerando apenas osestabelecimentos públicos com internação, a participação da esfera municipal, em 1999, foi de70%. No mesmo período de 1992/99, os leitos hospitalares, apesar de terem sofrido uma reduçãono seu número total, cresceram 3% no setor público e tiveram uma redução de 18,4% no setorprivado (IBGE,2000).

O incremento da rede hospitalar pública merece uma análise mais aprofundada porque vem sefazendo através de hospitais pequenos, conforme se vê na Tabela 1.

Tabela 1: Número de hospitais vinculados ao SUS por tamanho, medido em número de leitos, Brasil,2001.

NÚMERO DE LE ITOS NÚMERO DE HOSPITAIS %ATÉ 30 LEITOS 2.362 36,5DE 31 A 50 LEITOS 1.406 21,7DE 51 A 100 LEITOS 1.405 21,7DE 101 A 200 LEITOS 849 13,1DE 201 A 300 LEITOS 245 3,8DE 301 A 500 LEITOS 146 2,3DE 501 A 1.000 LEITOS 47 0,7MAIS DE 1.000 LEITOS 13 0,2TOTAL 6.473 100,0

Fonte: Mendes (2002b)

O exame da Tabela 1 denota um quadro de extrema irracionalidade. 58,2% dos hospitaisvinculados ao SUS têm menos de 50 leitos e somente 7% apresentam a escala mínima econômicade 200 leitos, referida na literatura internacional. Diferentemente do SUS, no Serviço Nacional deSaúde do Reino Unido, 63,5% dos hospitais têm mais de 200 leitos e 90,5% dos leitos disponíveisestão em hospitais de mais de 200 leitos (Posnett, 2000)

Pior ainda quando se sabe que a rede hospitalar vinculada ao SUS opera com baixa taxa média deocupação dos leitos; em 1995 esta taxa foi de 54%, tendo diminuído para 48% em 1999(Ministério da Saúde, 2000).

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A perda de escala, decorrente da municipalização autárquica, além de ineficiência, vem junto combaixa qualidade. Porque certos serviços, como os de atenção hospitalar e de apoio diagnóstico eterapêutico, para terem qualidade, necessitam de uma base quantitativa (Mendes, 2001).

Um dos indicadores mais potentes para medir a qualidade da atenção primária à saúde é oporcentual de internações hospitalares por condições sensíveis à atenção ambulatorial, umindicador de morbidade hospitalar. Este indicador capta aquelas condições que são internadasdesnecessariamente ou que poderiam ser evitadas na presença de uma atenção primária à saúdede qualidade (Billings, Anderson e Newman, 1996).

Estudo feito por Alfradique e Mendes (2002), examinando todas as internações do SUS no ano de2001, mostrou que de um total de 12.426.111 internações pagas pelo SUS, 3.405.452 foram porcondições sensíveis à atenção ambulatorial. Assim, nesse ano, as internações por condiçõessensíveis à atenção ambulatorial significaram 27,4% do total de internações; quando se retiram ospartos, que não são condições patológicas, esse porcentual sobe para 33,8%.

Essas internações desnecessárias ou evitáveis custaram ao SUS, em 2001, 1,036 bilhão de reaisdo total de 6,675 bilhões gastos com internações, no ano; isso representou um gasto ppercap it a/ano de aproximadamente R$ 6,00, mais da metade do valor do PAB fixo modal.

Quando se analisam as internações por condições sensíveis à atenção ambulatorial, por tamanhodos hospitais em que ocorreram, verifica-se uma alta concentração nos hospitais pequenosconforme se vê na Tabela 2.

Tabela 2: Internações por condições sensíveis à atenção ambulatorial (ICSAA) no SUS, por númerode leitos dos hospitais de ocorrência da internação e por valores pagos, 2001.

NÚMERO D E LEITOS % de ICSAA * % D E RECURSOS PAGOS A ICSAA *ATÉ 30 LEITOS 55,3 53,7DE 31 A 50 LEITOS 50,7 49,1DE 51 A 100 LEITOS 41,0 36,0DE 101 A 200 LEITOS 29,7 22,3DE 201 A 300 LEITOS 22,1 15,5DE 301 A 500 LEITOS 18,1 13,3DE 501 A 1000 LEITOS 14,5 10,7MAIS DE 1.000 LEITOS 13,6 10,4TOTAL 33,8 24,1

Fonte: Mendes (2002b)

(*) Internações por condições sensíveis à atenção ambulatorial , excluídos os partos

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As internações por condições sensíveis à atenção ambulatorial variam de 55,7% nos hospitais de até30 leitos, a 50,7% nos hospitais de 31 a 50 leitos, a 41,0% nos hospitais de 51 a 100 leitos, paraalcançar valores inferiores a 15% em hospitais de mais de 500 leitos. Constata-se, então, quesomente a partir de hospitais de mais de 100 leitos, os valores encontrados são inferiores à médianacional de 33,8%.

Observa-se que o porcentual de gastos com as internações por condições sensíveis à atençãoambulatorial chega a 55,3% nos hospitais de menos de 30 leitos, a 49,1% nos hospitais de 31 a50 leitos, a 36,0% nos hospitais de 51 a 100 leitos, caindo para valores de iguais ou menores de15,5% nos hospitais de mais de 200 leitos.

A análise dessas informações permite inferir que as internações por condições sensíveis à atençãoambulatorial no Brasil estão determinadas pela conjunção de dois fenômenos.

Primeiro, parte delas se deve à baixa resolutividade da atenção primária à saúde, o que leva ainternações desnecessárias ou evitáveis. Segundo, a variação por tamanho de hospitais, indica quehá uma manifestação clara da Lei de Roemer que diz que “se há leitos hospitalares, eles tendema ser usados”, independentemente das necessidades da população, um caso particular do princípiomais geral da indução da demanda pela oferta, característico dos sistemas de serviços de saúde(Roemer, 1993).

Parece ocorrer que os pequenos hospitais, que recebem um número determinado de AIH´s, vãosempre gastá-las, no limite, para cobrir seus custos fixos. Este fenômeno pode ser denominado de“queima de AIH´s”. Isso mostra que a expansão hospitalar, através de pequenos hospitais,provoca brutal ineficiência, sendo parte do problema e não da solução.

O caso da Bahia é emblemático: os leitos hospitalares públicos saltaram de 2.935 em 1990 para11.340 em 1997; parte significativa destes leitos são municipais; a maioria são hospitaispequenos; muitos hospitais apresentam taxas de ocupação baixa, taxas de permanência elevadase baixa atividade ambulatorial; baixa coordenação entre atividades ambulatoriais e hospitalares; einúmeras internações são realizadas sem encaminhamento ambulatorial (Spagnolo, 1998).

O estado do Ceará tem uma população de 7,4 milhões de habitantes e 220 hospitais vinculadosao SUS, 1 hospital para cada 33.600 habitantes; o estado de Massachussetts, nos Estados Unidos,tem 35 hospitais para uma mesma população, o que dá uma relação de 1 hospital para cada200.000 pessoas. Nesse estado americano há um processo de integração horizontal da redehospitalar, com vistas à obtenção de economias de escala e escopo, que deverá diminuir, aindamais, os hospitais disponíveis.

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A ausência de uma política hospitalar no SUS está levando a uma situação paradoxal: há muitoshospitais e faltam hospitais. Os hospitais modernos devem ser dirigidos para a atenção a eventosagudos e, para isso, necessitam de ter uma densidade tecnológica adequada, o que pressupõe umaescala adequada (McKee e Healy, 2002). Assim, faltam leitos para a atenção às condições agudasem todo o país, especialmente leitos de tratamento intensivo, enquanto sobram leitos parainternações por condições sensíveis à atenção ambulatorial.

Mas a fragmentação não se restringe aos hospitais. A Microrregião de Baturité, composta por oitomunicípios, no Ceará, é um exemplo emblemático da fragmentação causada pela municipalizaçãoautárquica: há oito hospitais que operam com uma taxa de ocupação média de 22%; há seteaparelhos de ultra-sonografia quando seriam suficientes apenas dois; e há oito laboratórios depatologia clínica operando em deseconomia de escala e sem controle de qualidade ( SecretariaEstadual de Saúde do Ceará, 2000b). Esta situação encontrada na Microrregião de Baturité estálonge de constituir uma exceção no SUS tendendo, muito mais, a aproximar-se de uma regra geral.

Pesquisa feita na Microrregião do Alto Rio Grande, em Minas Gerais, também composta por oitomunicípios, mostrou que, em 1998, havia dez pequenos laboratórios de patologia clínica. Naquelamicrorregião, 80% dos exames foram normais ou negativos, 40% não chegaram aos médicos queos solicitaram e todos, sem exceção, apresentaram confiabilidade discutível porque não foramsubmetidos a controles de qualidade, internos e externos (Núcleo de Sistemas e Serviços deSaúde, 1998).Recente publicação da SAS/Ministério da Saúde, propõe laboratórios de patologia clínica, debancada, realizados sem automação, para uma população em torno de 25.000 pessoas elaboratórios de semi-automação, para uma população de 25.000 a 50.000 pessoas (Ministério daSaúde, 2002b). Ainda que isso possa justificar-se em regiões de baixa densidade demográfica ede longas distâncias relativas, como ocorre no Norte do País, toda evidência internacional mostraque os laboratórios de patologia clínica devem apresentar grandes escalas de processamento paraserem econômicos. Por exemplo, três laboratórios privados de São Paulo detêm 25% do mercadoprivado daquela cidade e estão buscando avidamente aumentar suas escalas para sobreviverem nomercado (Valor, 2001).

Um bom desenho laboratorial implica a construção de uma rede de laboratório com a máximadescentralização da coleta e uma máxima centralização do processamento, as duas pontasinterligadas por eficazes sistemas logísticos, tal como se faz na Secretaria Municipal de Saúde deCuritiba.

Mais uma vez, a visão da gestão da oferta das normas operacionais leva a uma lógica política deinvestimentos em serviços de saúde, onde o importante é dispor do maior número de unidades desaúde no território municipal. Especialmente, os equipamentos de maior visibilidade política, oshospitais.

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Esse processo, na prática social, está conduzindo, também, a uma banalização da atençãohospitalar, onde os cidadãos são ludibriados por uma lógica política perversa de instituição daoferta local que redunda em hospitais que não têm condições técnicas para funcionar comohospitais. Uma combinação de enganação e desperdício, dois predicados indesejáveis nos sistemaspúblicos de serviços de saúde.

A NOAS SUS 01/02 não é responsável pela fragmentação dos serviços de saúde, que lhe éanterior. Mas continua a incentivar implicitamente esse processo quando mantém a visão dagestão da oferta na habilitação, o que é um convite à implantação de serviços nos territóriosmunicipais.

Além disso, ao instituir o módulo assistencial, exigindo que, nesse espaço, se ofereçam certosexames de patologia clínica, de radiodiagnóstico, de ultra-sonografia e de atenção hospitalar emclínica médica, pediátrica e obstétrica, pode levar a um incremento da fragmentação dos serviçosde saúde no SUS. Do que deverá resultar maior ineficiência e menor qualidade de serviços.

6. RESCREVENDO A NOAS SUS 01/02: POR UM SUS MAIS DEMOCRÁTICO,MAIS EFICIENTE E DE MELHOR QUALIDADE

A análise critica da NOAS SUS 01/02 mostra uma norma que apresenta um erro de concepção doque decorrem problemas que não permitirão que ela cumpra com seus objetivos.

Por isso, é preciso reescrevê-la para que o SUS possa, na sua caminhada incrementalista, tornar-se mais democrático, mais eficiente e prestar serviços de maior qualidade.

A nova norma operacional que deverá surgir estará focada na gestão da demanda dos serviços desaúde e procurará radicalizar a descentralização, pela via da microrregionalização cooperativa,mantendo os municípios como ffund-holders do SUS. O aumento da eficiência e da qualidade viriada construção de uma norma que estivesse em consonância com os princípios da gestão dossistemas de serviços de saúde, ou seja, que equilibrasse, na regionalização da atenção à saúde,os princípios da economia de escala e de escopo com o acesso pronto a serviços de qualidade.

A proposta que se encaminha representa uma mudança radical na forma como o SUS vem sendosocialmente construído através das normas operacionais. A radicalidadade é definida pela naturezae peso dos problemas constatados. Aqui não se procura a espetaculosidade da polêmica; aocontrário, procura-se apresentar uma base técnica que possa sustentar um debate democrático econseqüente sobre as mudanças no SUS e seu aprimoramento.

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Esse debate é fundamental para aqueles que acreditam que, no Brasil, há possibilidades de seinstituir um sistema público universal capaz de prestar serviços de saúde eficientes e de qualidadea todos os brasileiros. Alimentar esse debate oportuno e necessário é o objetivo destedespretensioso trabalho.

6.1. Da NOAS SUS 01/02 para a Norma Operacional Básica

A nova Norma Operacional Básica deveria ampliar seu objeto, além da mera assistência à saúde.

Assim, na mesma lógica da responsabilização única, da escala e da qualidade, haveria que seestruturar, no espaço microrregional, os sistemas de saúde coletiva, a vigilância epidemiológica, avigilância sanitária, a vigilância ambiental e saúde dos trabalhadores; os sistemas de apoio, ossistemas de informação e os sistemas de apoio diagnóstico e terapêutico; e os sistemas logísticos,o sistema de transportes sanitários e a central de regulação se for conveniente mantê-la.

6.2. Da gestão da oferta para a gestão da demanda

O pecado original da NOAS SUS 01/02, o enfoque na gestão da oferta, seria superado pela adoçãoda gestão da demanda. Isso implicará alinhar o SUS à melhor doutrina internacional, onde o focoda gestão dos sistemas de serviços de saúde está dirigido para o lado da demanda.

Do ponto de vista operacional isso significará que o importante para a gestão dos sistemas deserviços de saúde não é ter serviços próprios num território político-administrativo, mas dar acessoa serviços eficientes e de boa qualidade aos cidadãos, independentemente de sua localização e desua razão social, sob a efetiva gestão de quem é o responsável pela saúde dos cidadãos.

6.3. Da concepção piramidal para a rede horizontal de serviçosde saúde

A concepção piramidal vigente na NOAS SUS 01/02 será substituída pela concepção de uma redehorizontal integrada de serviços de saúde onde todos os pontos são importantes e formam umcontínuo de atenção, ainda que se reconheça que há diferentes complexidades e densidadestecnológicas em cada uma dos pontos de atenção à saúde.

Daí que não se operará com as categorias de atenção básica ampliada, média e alta complexidade,mas por níveis de atenção primário, secundário e terciário.

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O objetivo será desenvolver e implementar, em cada microrregião de saúde, um sistema integradode serviços de saúde que articulasse os serviços de atenção primária e secundária à saúde. E que,estes, por sua vez, estarão articulados, numa macrorregião, com os serviços de atenção terciáriaà saúde.

6.4. Da responsabilização difusa para a responsabilização única

O foco na gestão da demanda implicará o reconhecimento de que o SUS deverá ter um responsávelúnico e inequívoco pela saúde da população.

Essa falta de um único e identificável responsável pelas ações e serviços de saúde é inerente àgestão da oferta e, no limite, em nosso País, é manifestada pela dúvida se o mosquito é municipal,estadual ou federal. Essa dúvida hhamletiana vem, sempre, desqualificada pela afirmativacorriqueira de que não importa de quem é o mosquito, o que vale é resolver o problema. O que étotalmente errado porque para a população é fundamental saber, de forma inequívoca, de quem éa responsabilidade sobre o mosquito. Esta é uma condição necessária numa democracia para asolução dos problemas de saúde. Só assim poderá cobrar de seus governantes suasresponsabilidades e criar uma ambiência propícia ao controle social.

O rosto único do SUS deverá ser o município. Ou seja, em quaisquer circunstâncias, o responsávelpela saúde dos cidadãos será o Secretário Municipal de Saúde da cidade onde residem, não importaonde eles estejam sendo atendidos.

As razões da escolha dos municípios como o responsável pela saúde dos cidadãos são várias. Amunicipalização da saúde está no espírito da legislação do SUS; a municipalização da saúde selegitimou e seria politicamente impossível revertê-la; os gestores locais são melhor identificados ealcançados pelas demandas da sociedade; os gestores locais são mais proximamente controladospela cidadania organizada em Conselhos de Saúde.

Pode-se argumentar, não sem razão, que uma parte significativa dos municípios brasileiros nãodisporão de capacidade institucional para exercitarem a responsabilidade única. Mas resolver isso,envolve duas alternativas: uma primeira, reverter o movimento de municipalização voltando aoparadigma da regionalização autárquica, o que significaria reestadualizar ou refederalizar o SUS ou,outra, radicalizar a municipalização colocando, inequivocamente, sob responsabilidade dosmunicípios, as ações e serviços do SUS, para o que terão que preparar-se gerencialmente. Asegunda alternativa parece ser mais factível e viável.

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Dessa forma, os municípios constituirão o rosto exclusivo do SUS e serão os responsáveis únicospela saúde de seus cidadãos. Isso será mais democrático porque o Prefeito Municipal, através deseu Secretário Municipal de Saúde, é que deverá prestar contas do que realizou na saúde e serjulgado nas eleições municipais.

6.5. Da municipalização autárquica para a microrregionalizaçãocooperativa

Se a municipalização da saúde deve necessariamente ser radicalizada, o paradigma damunicipalização autárquica esgotou-se, devendo ceder lugar ao paradigma da microrregionalizaçãocooperativa. Isso se impõe porque a forma como o SUS vem sendo operacionalizado está levandoa uma extrema fragmentação dos serviços de saúde, com deseconomias de escala e de escopo eperda da qualidade dos serviços.

Assim, há que se maximizar as vantagens da municipalização e minimizar suas desvantagens, oobjetivo da microrregionalização cooperativa. Isso significará desenvolver e implementar sistemasmicrorregionais de serviços de saúde em que a lógica racional implicará uma descentralização dosserviços de atenção primária à saúde e a centralização relativa dos serviços de atenção secundáriae terciária, para que se tenha economia de escala e de escopo e serviços de qualidade.

6.6. Da heteronomia para a isonomia municipal

A mudança do foco na gestão da oferta para a gestão da demanda permitirá que se ponha fim àinjusta divisão entre municípios de gestão plena do sistema municipal e de gestão plena da atençãobásica ampliada.

Cada município brasileiro, independentemente de seu tamanho e número de habitantes, seráresponsável pela saúde de seus munícipes. Para isso, todos serão habilitados em gestão plena doSUS, exercitando-a através da gestão de contratos com os prestadores próprios (contratosinternos) e com os prestadores terceiros públicos ou privados (contratos externos).

A gestão da demanda implica que os prestadores poderão estar ou não no território municipal,serem ou não propriedade do município. O fundamental é que estejam conformando um sistemade prestadores articulados por contratos. A capacidade de gestão será dada pelas habilidades definanciar e regular, isso é, pela capacidade de exercitar a função de compra de serviços de saúdeatravés de contratos internos e externos com os prestadores de serviços.

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Pode-se argumentar que faltará, principalmente aos municípios menores, uma capacidadeinstitucional para exercitar essa função de compra dos serviços de saúde. Isso poderá ser superadopor sistemas de regulação microrregionais, compartilhados por vários municípios.

6.7. Um nova sistemática de financiamento

O sistema de financiamento atual seria modificado radicalmente.

Haverá que eliminar as diversas frações que constituem o financiamento federal vigente,substituindo-a por repasse direto, fundo a fundo, de um valor global pper cap ita. A capacidade dearticular políticas nacionais será expressa não em frações de recursos carimbados, tal como se fazatualmente, mas em contratos celebrados pela União com cada município. Os estados, também,deveriam definir um valor global pper c ap ita para ser repassado, fundo a fundo, aos municípios.Os repasses federal e estaduais serão feitos a partir de um valor pper cap it a ajustado porestrutura etária e por gênero.

O comando único do sistema municipal não será dado pela presença territorial do conjunto deequipamentos de saúde, mas pela posse e manejo de todos os recursos financeiros do SUS pelomunicípio.

O município, de posse de todos os recursos para a saúde – federal, estadual e dele próprio -,exercitará o financiamento sob o princípio “o dinheiro segue o cidadão”. Para isso, contratará, desi mesmo, os serviços que opera, e de terceiros, públicos ou privados, os serviços que não operadiretamente.

O pagamento dos serviços aos prestadores será feito pelos gestores municipais conforme oscontratos previamente assinados, segundo normas que procurassem estabelecer remunerações deacordo com as densidades tecnológicas e os custos dos diferentes prestadores ou por sistemasde pagamento capitados de pacotes de serviços. Essa normas de pagamento aos prestadoresseriam definidas pelo Ministério da Saúde e aprovadas na Comissão Intergestores Tripartite.

Pelo princípio de “o dinheiro segue o cidadão”, as pessoas, ao deslocarem-se de um município aoutro, levam consigo o recurso para o prestador que as atendem. Não conduzem, por certo, orecurso físico, mas uma autorização estabelecida em contrato previamente assinado entre oprestador e o Secretário Municipal de Saúde do seu município.

Dessa forma, os municípios não transferirão, aa p rio ri, recursos entre si. O que significa que omunicípio satélite (até porque não haverá município satélite e satelitizador num sistema orientado

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pela demanda) não tem que transferir os recursos de seus munícipes para outro gestor municipal.Se o prestador não atende bem ao seu munícipe, o Secretário Municipal de Saúde, o responsávelpela sua saúde, pode estancar imediatamente o fluxo de recursos para o prestador e, até mesmo,reorientá-lo para um outro prestador.

6.8. A regionalização da atenção á saúde

O PDR será feito através de regras mais precisas, mas mantendo-se os territórios municipal,microrregional, macrorregional e estadual.

O sistema de contratação municipal dos serviços de saúde estará constrangido dentro do territóriomicrorregional, para os serviços de atenção secundária, e, dentro do território macrorregional, paraas ações de atenção terciária à saúde.

Para que o SUS possa operar com eficiência e qualidade, as microrregiões deverão ter um mínimode 100 a 150 mil habitantes, o que corresponde, na experiência internacional, à escala mínima paraoperar sistemas de serviços de saúde econômicos e de qualidade. Essa escala mínima só serádesobedecida em regiões de baixa densidade demográfica e de distâncias relativas muito altas quedificultassem o acesso pronto aos serviços de saúde.

Os módulos assistenciais serão eliminados.

Cada município deverá obrigatoriamente ofertar, em seu território, os serviços de atenção primáriaà saúde. Os serviços de atenção secundária à saúde deverão ser contratados na microrregião,ofertados por prestadores, públicos ou privados, que cumprissem padrões de densidadetecnológica e de qualidade pré-definidos e estabelecidos por sistemas de certificação rigorosos.

Uma certificação mais rigorosa se imporá, apesar de que o foco na gestão da demanda eliminaráo incentivo implícito para a instituição de serviços nos territórios municipais, como condição dehabilitação na gestão plena do sistema municipal. Será importante porque a transferência diretados recursos federais e estaduais aos municípios poderá significar um incentivo para osinvestimentos em serviços ali localizados.

Esse processo de certificação será fundamental para garantir economia de escala e de escopo e,por conseqüência, serviços de qualidade. Um hospital deverá ser, de fato, um hospital, com aestrutura para dar atenção de qualidade a eventos agudos. Da mesma forma, um laboratório depatologia clínica deverá ser, de fato, um laboratório capaz de produzir serviços de qualidade e comcustos adequados; para isso, haverá que ter a coleta descentralizada nos municípios e o

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processamento centralizado na microrregião ou num conjunto de microrregiões.Todos os hospitais de menos de 30 leitos serão convertidos em hospitais locais de saúde dafamília, com um escopo de serviços articulados à atenção primária à saúde e pagos por orçamentoglobal.

Os serviços de atenção terciária serão contratados no município-pólo da macrorregião, mas serãogeridos pelas Secretarias Estaduais de Saúde. A razão é dada pela necessidade de ratear os riscosreferentes aos serviços de alto custo. Se se mantiver a sistemática atual em que os recursos paraesses serviços são alocados a cada município, o acontecimento de eventos catastróficos ao azarpoderão levar à insolvência financeira das Secretarias Municipais de Saúde.

Os recursos para a atenção terciária serão transferidos da União aos estados, onde ficarão numasub-conta do Fundo Estadual de Saúde.

O Plano Diretor de Investimentos (PDI) será modificado em função do novo desenho damicrorregionalização. A adequação da oferta será feita através de dois mecanismos: um, novosinvestimentos realizados em equipamentos estatais ou privados filantrópicos, com recursospúblicos; outro, pela indução de investimentos privados, lucrativos e não lucrativos, para absorvera demanda agregada dos municípios. Nesse sentido, um pagamento mais adequado dos serviçosaos prestadores privados poderá agir como estímulo aos investimentos próprios, sem queimplicassem inversões públicas.

Dada a situação do SUS, um bom PDI deverá, além de aumentar os investimentos em novosequipamentos estrategicamente situados, gerar um movimento inadiável de conversão,descredenciamento e/ou fechamento de equipamentos sem escala e qualidade, especialmentehospitais e laboratórios de patologia clínica.

O sistema de serviços de saúde assim construído será coerente com o paradigma damicrorregionalização cooperativa e estruturado segundo o princípio geral da cooperaçãogerenciada.

A cooperação terá duas dimensões: uma, de articular esforços comuns e de gerar um excedentecooperativo pela ação solidária da União, estado e municípios numa microrregião; outro, deconstituir uma marco conceitual em que a cooperação é definida pela ação planejada dos entesfederativos no espaço de uma microrregião e, não, pela estímulo a mecanismos competitivos entreos diferentes prestadores de serviços. Nesse sentido, será imprescindível a instituição, em cadamicrorregião de saúde, da Comissão Intergestores Bipartite Microrregional.

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A rigor, nessa nova norma, não haverá necessidade das centrais de agendamento das consultasespecializadas e das hospitalizações porque isso será regulado conforme contratos entre osprestadores e os municípios e através de mecanismos de comunicação bilaterais. Mas poderá havervantagens econômicas e operacionais em manter as centrais de regulação microrregionais e suaarticulação com centrais macrorregionais, especialmente o módulo de atenção às urgências eemergências.

Um sistema voltado para a gestão da demanda exigirá a instituição e operacionalização de umcartão nacional de saúde. Poderá ser o Cartão SUS que está em fase piloto, mas poderá ser umcartão menos sofisticado, tal como existe em outros países e em municípios como Curitiba queserão menos custosos e não dependerão de tanta infra-estrutura de telecomunicação.

7. CONCLUSÃO

O SUS vem sendo implementado através de movimento de incrementalismo lento expresso,operacionalmente, nas NOB´s e, mais recentemente, na NOAS SUS 01/02.

Ainda que não se possa desconhecer os avanços que o SUS tem experimentado, essas micro-reformas apresentam, desde suas origens, um grave equívoco de concepção, a sua fixação nagestão da oferta dos serviços de saúde.

Não é diferente na NOAS SUS 01/02. Ainda que despendendo enorme esforço organizacional,seus resultados poderão ser frustrantes se não se superarem os problemas decorrentes do focona oferta dos serviços de saúde. Essa distorção conceitual tem graves repercussões na prática doSUS: heteronomia municipal, burocratismo exagerado, responsabilização difusa, ineficiência ebaixa qualidade dos serviços.

Nesse sentido, impõe-se reescrever a NOAS SUS 01/02, reorientando-a para a gestão da demandados serviços de saúde. Assim, teremos um SUS mais democrático, mais justo, mais eficiente e commaior qualidade.

Esta é a singela proposta que se apresenta para uma reflexão dos que pretendem transformar oSUS num verdadeiro sistema único de saúde para os brasileiros. E aprimorá-lo para que possa, naprática social, concretizar o sonho de seus idealizadores: um sistema público mais democrático,mais justo, mais eficiente e com serviços de melhor qualidade.

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NOTAS

1 Segunda versão, produzida em 24 de outubro de 2002. Destina-se exclusivamente a recebercomentários, não podendo ser copiada ou distribuída sem prévia autorização do autor. Oscomentários devem ser enviados para: [email protected] Consultor em Desenvolvimento de Sistemas e Serviços de Saúde

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3. RESPONSABILIDADE E PAPEL DO ESTADONA GESTÃO DO SUSJúlio Strubing Müller Neto1

Bom dia a todos os companheiros e companheiras. Agradeço o convite do CONASS paraparticipar desse debate, onde pretendo contribuir para o entendimento da situação atual deconstrução do SUS e tentar, pelo menos, gerar algumas inquietações, dúvidas e questionamentos.

Eu gostaria de dizer que a minha fala não está sistematizada, eu diria mesmo que está aindabastante fragmentada, até porque é produto de uma encomenda de duas semanas atrás, quandoo Presidente Gilson Cantarino nos reuniu e pediu que a Assessoria Técnica procurasse abordaralgumas questões, mais da conjuntura, que estão preocupando o Conass, a Diretoria, a nossarelação com os outros gestores e a própria organização do sistema. Participaram da sua elaboraçãotodos os companheiros da Assessoria Técnica do Conass aos quais aproveito para agradecer,sobretudo ao Ricardo Scotti e ao René Santos, com quem debati os temas avaliados comoimportantes para estar trazendo aqui para o seminário. É evidente que a responsabilidade pela falaé toda minha.

Estou me situando a partir da visão do Estado, na perspectiva do gestor estadual, ou pelomenos como eu entendo o viés de quem ocupa a responsabilidade política, administrativa e técnicano âmbito das Secretarias Estaduais de Saúde. Muitas das questões levantadas aqui pelo EugênioVilaça estão implícitas na minha fala. Eu tenho uma concordância muito grande com muitas dascoisas, diria que com a maioria das questões que ele colocou aqui do ponto de vista do sistema eda organização dos serviços. Seria desnecessário abordá-las novamente. O documento é crítico epode parecer estranho para os mais desavisados. Até já me falaram “você é contra o SUS”,“falando mal do SUS...”. Porém, se não tivermos uma visão crítica do que estamos fazendo, nãovamos conseguir avançar.

Sou defensor do SUS, brigo pelo SUS, o que não me impede – ao contrário, me obriga–, decriticar o Sistema Único de Saúde. O mesmo pode ser afirmado sobre a municipalização, que oEugênio já abordou de modo crítico. Entre municipalização, estadualização, federalização, eu soupelo cidadão. É a questão de fundo e é por aí que temos que iniciar.

Na década de 90 houve um processo de construção acelerado do Sistema Único de Saúdeno País, que se iniciou a partir da Lei 8.080/90 e continuou posteriormente com as diversas NOBs.

Houve um movimento muito forte no sentido da municipalização em um primeiro momento,o que ficou mais explicitado na NOB/93. As Secretarias Estaduais de Saúde (SES) perderam

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algumas das suas funções e a sua identidade, ficaram sem saber qual o seu papel, quais as suasatribuições no Sistema Único de Saúde, porque elas deixaram de executar serviços. As antigasunidades sanitárias que as secretarias tinham foram municipalizadas. As SES tiveram dificuldade deentender e assumir o novo papel no sistema, mesmo porque o processo não estava claro paraninguém e foi sendo construído pouco a pouco, mas o seu foco foi a questão da municipalização.E aí, é importante dizer, as Secretarias Estaduais ficaram atrasadas ou retardatárias nesseprocesso de descentralização do sistema de saúde e de reorganização dos serviços. De outro ladoo processo de descentralização das ações e dos serviços da esfera federal foi muito lento, umprocesso com muitos embates e pressão política. Apenas no final da década de 90 é queconseguimos terminar de descentralizar, no sentido de passar para Estados e Municípios muitasdas funções e atribuições federais como, por exemplo, as funções de controle de endemias, coma descentralização da Funasa; da assistência farmacêutica, quando se conseguiu extinguir a CEME;o repasse, a transferência de recursos fundo a fundo, que é implantado e massificado na segundametade da década de 90. O processo de descentralização federal foi lento, mas eu diria que quasese completou até o final da década de 90.

Concomitantemente, na segunda metade da década, as SES começaram a discutir: o quesomos? O que vamos fazer? Quais são as nossas atribuições? O que compete ou não compete aosEstados? E assim por diante. O Conass, especialmente a partir de 1995, teve e vem tendo umpapel decisivo no processo de reestruturação e reorganização das SES, por meio de inúmerasiniciativas, entre as quais podemos destacar as oficinas de trabalho e as Câmaras Técnicas. Odebate ocorria especialmente nos fóruns intergestores, ou seja, com a participação do Ministérioda Saúde e dos municípios.

Nesse processo, muitas Secretarias Estaduais de Saúde conseguiram avançar no sentido deconsolidar, por exemplo, o seu papel, as suas macro-funções, aquelas essenciais, estratégicas, umpouco mais amplas que a proposta de “funções essenciais da saúde pública” da Organização Pan-americana da Saúde (OPAS), divulgada neste evento. Um parêntese: o documento da OPAS não dáênfase a um aspecto que nós temos aqui no Brasil, no SUS, que é a importante participação dosórgãos gestores da saúde pública na organização e na gestão dos sistemas assistenciais. Odocumento ainda tem um pouco daquele viés que separa a saúde pública da atenção individual.Fecha o parêntese. As secretarias estaduais começaram a desenvolver sua capacidade de formularpolítica, de planejar, de fazer a gestão do sistema como um todo. Muitas Secretariasdesenvolveram, pela primeira vez, as suas programações, seus planos integrados, coisa que até1996 nenhuma delas tinha. Foi realmente um processo de construção, lento. Na segunda metadeda década de 90 as SES desenvolveram os seus sistemas e mecanismos de controle e avaliaçãoe auditoria; implantaram e criaram sistemas de vigilância, tanto ambiental quanto sanitária eepidemiológica, de âmbito estadual e regional, fortalecidas com o processo de descentralização daFunasa. Simultaneamente, com a municipalização das unidades e dos serviços estaduais, houveuma gradativa e contínua diminuição da prestação de serviços diretos, por parte das órgãos

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estaduais. As SES foram especializando-se na prestação de serviços em alguns nichos, por dizerassim, como laboratório, a hemoterapia e a hematologia, a saúde mental. Em alguns lugares, osórgãos estaduais mantiveram e até ampliaram a sua atuação em áreas específicas da chamada altacomplexidade e da assistência hospitalar especializada, sobretudo das unidades que são referênciaestadual ou regional. Na região Norte, por outro lado, a maioria das SES ainda é responsável porserviços da atenção básica, e não é por vontade própria. A indefinição decorrente das diferentesformas de composição e organização do SUS nos Estados e regiões brasileiras tem gerado umaconfusão grande de competências e uma tendência, sobretudo por parte do Ministério da Saúde,de tentar criar um “modelo único” de SUS, no Brasil todo, como se todos os Estados e Regiõesbrasileiras fossem iguais, desconhecendo a autonomia federativa e comportando-se como Estadounitário. Eu estou falando isso porque quando se discute, por exemplo, essa questão do comandoúnico, ainda não vi ninguém brigando para ficar com os mega hospitais psiquiátricos, com adispensação dos medicamentos de alto custo, com as antigas colônias de hansenianos. Oproblema está aí, colocado, mas não se discute.

Um estudo recente da Organização Pan-Americana da Saúde sobre o desenvolvimentoinstitucional e a modernização gerencial das Secretarias de Estado da Saúde, que vai ser lançadobrevemente no Congresso da ABRASCO, retrata bem a situação. De acordo com ele, nós vivemosuma espécie de estágio de transição: as SES hoje não são órgãos sem identidade, eu diria que elasestão construindo a sua identidade, talvez vivendo uma espécie de conflito da adolescência, porassim dizer (afinal o SUS tem 15 anos!), da busca de uma definição mais clara de sua missão e deseus objetivos. Cuidam cada vez menos da prestação direta de serviços e assumem outrasfunções. Hoje essas diferentes funções estão imbricadas e em cada secretaria a relação entre elasé diferente, quer dizer, não é um processo uniforme. Por isso mesmo, em algumas secretarias, emalguns Estados se avançou mais, se consolidou o processo de planejamento, de gestão, de controlee avaliação, de regulação, de cooperação técnica e financeira com os municípios, enquanto que,em outras Secretarias, o processo é mais incipiente. O estudo da Organização Pan-Americana foirealizado com base em um trabalho de cooperação técnica com cinco Estados: Goiás, Bahia, RioGrande do Sul, Paraná e Rondônia.

Descrito o contexto, vamos dar um passo a frente: quais são os grandes problemas que agente tem no atual modelo que foi construído e chegou até aqui? Classificarei os problemas emdois tipos. Problemas relacionados ao usuário, em primeiro lugar O Eugênio, em sua fala, adiantoumuitas questões, mas gostaria de enfatizar algumas, começando pelo problema do acesso. Hojenós não estamos conseguindo garantir a universalidade de acesso ao conjunto da nossa populaçãoem muitas ações e serviços (por exemplo, na assistência farmacêutica e na saúde bucal), apesarda expansão bastante significativa da atenção primária no País. E mais, ainda não conseguimosgarantir um atendimento de qualidade, sobretudo na atenção primária, pela pouca qualificação queos serviços de atenção primária ainda têm no País, em seu conjunto, e daí decorre inclusive umadas questões que nós vamos estar propondo aqui neste Seminário.

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A outra questão é relacionada à equidade. A questão da equidade foi colocada também dediversas formas e na atualidade deveria assumir um aspecto importante na agenda de prioridadesdas SES, especialmente naqueles municípios menores, com pouca capacidade física instalada,aqueles municípios que pela Norma da Assistência (NOAS) foram relegados a ter menos autonomia(nunca poderão ser plenos de sistema), os de menores de cinco, dez, 15 mil habitantes e aquelesmunicípios das regiões metropolitanas além da população da periferia dos grandes centros urbanosque são exatamente as populações mais necessitadas. A desigualdade existe justamente comessas parcelas da população que têm menos acesso, não só à saúde, mas aos serviços e benssociais em geral. Se nós entendermos que hoje existe uma iniqüidade no sistema e que a iniqüidadeatinge exatamente essa parcela da população a que nos referimos, temos que incluir a questãoobrigatoriamente no nosso debate. Além disso, temos a iniqüidade entre as macro-regiõesbrasileiras, entre as diferentes regiões brasileiras que têm realidades e situações sócio-econômicase sanitárias bem diferenciadas.

O problema do acesso relaciona-se com a questão da integralidade das ações. Hoje o nossomodelo não garante nenhuma integralidade, pelo contrário, a gente não pode dizer que tem redede serviço, nós temos serviços dispersos e muito pouco articulados, descoordenados e que, o queé mais grave, não se responsabilizam pelo seu usuário, pelo cidadão. O cidadão estabelece ocontato com o serviço pela primeira vez numa unidade de saúde, uma equipe de saúde da família,e daí pra frente ele faz uma verdadeira via crucis para poder acessar outros níveis de assistência,os cuidados especializados dentro do sistema.

O sistema não se responsabiliza pelo cidadão, pelo usuário, e isso é gravíssimo. Resta saberse é realmente através das equipes da atenção primária, das equipes de Saúde da Família que nósvamos nos responsabilizar por esse cidadão, por essa cidadã ou se é de alguma outro modo.

Do ponto de vista do gestor, quais são os problemas? De modo bem resumido: aorganização e a gestão do sistema, além das questões já debatidas da indefinição de atribuiçõese conflito de competências, ainda tem uma outra dificuldade na relação entre os gestores. Há umparceiro muito forte, o gestor federal, dono da chave do cofre, e que trabalha de um modoextremamente normativo. O gestor federal faz com que, na prática, Estados e Municípios seenquadrem dentro de uma lógica programada centralmente, uniforme, que não considerafreqüentemente as diferenças e as heterogeneidades do País, das regiões, dos Estados. E o queacontece é que os Estados e os Municípios são cada vez mais executores dessa política e dessasnormas definidas centralmente e com uma visão isonômica do País. Um outro problema da relaçãoentre os gestores: os Municípios em gestão plena são em número de 500 e, destes,aproximadamente 200 municípios, aqueles com mais de 100 mil habitantes, relacionam-sediretamente com o Ministério da Saúde, normalmente desconhecendo a esfera estadual, como seo Ministério quisesse organizar um sistema único com duzentos municípios. São as capitais, são osmunicípios maiores, a população desse conjunto deve atingir uns 60 milhões de habitantes, cercade 40% da população do País. A lógica que orienta esta tendência é a seguinte: organizar o SUS

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nestas localidades maiores poderia dar legitimidade e resolução ao Sistema, considerando que elessão referências para populações maiores, nas suas áreas de influência. Só que nós não podemosorganizar sistema dessa forma. Para dar dois exemplos recentes a respeito disso – até porque issonão é um problema de orientação político-partidária mas do nível de inserção do gestor, da esferafederal, não importa quem esteja sentado lá. Evidentemente tal atitude está informada por umaconcepção, por uma ideologia. Nas comissões bipartites e na comissão tripartite, cada vez mais arepresentação política dos municípios é a representação dos que estão em gestão plena. AsSecretarias Estaduais tem assumido a representação dos Municípios sem plena – a grande maioria,no sentido de garantir o acesso, de diminuir a desigualdade, etc. Esta assimetria é extremamenteperniciosa para o sistema, na minha opinião, porque evidentemente não se vai construir um sistemade saúde justo e eficiente, sobretudo num país federativo como é o Brasil, com essascaracterísticas.

Daí decorre uma outra questão: dos três gestores a SES é o mais fraco, é vista assim e o érealmente. Imprensadas entre o gestor federal forte, com dinheiro, e os municípios fortes, emgestão plena, com recursos políticos e financeiros. As Secretarias Estaduais, apesar dos avançosa que me referi, têm formulado pouco, têm planejado pouco, não se ouve praticamente falar deum plano estadual de saúde, de uma experiência estadual bem sucedida. Até porque têm pesopolítico limitado, na medida em que só as prioridades nacionais são divulgadas e ocupam lugar namídia. A continuar tais práticas, mais um pouco as secretarias estaduais vão ser transformadas emescritórios regionalizados do Ministério da Saúde, o processo de descentralização será limitado aum processo de desconcentração administrativa e é fazer só o que seu mestre mandar. Essa é umarealidade que está colocada há algum tempo e precisa ser enfrentada. Nos últimos meses umasituação que vem nos preocupando, que é aparentemente um equívoco de condução, esperamosque se configure assim, estabelecido entre as competências do Conselho Nacional de Saúde e daComissão Tripartite. Em duas ou três oportunidades, situações que são típicas de pactuação entreos gestores foram levadas previamente ao Conselho, aprovadas, e depois trazidas já como fatosconsumados para a Tripartite. Tal prática inviabiliza essa grande construção que são as comissõesintergestoras, e a saúde é o único setor das políticas públicas no País onde se busca solidariamenteo consenso entre as três esferas da gestão pública.

Finalmente, do ponto de vista ainda do gestor, o problema decorrente da própriacontradição do modelo construído por nós – apesar da melhoria de cobertura da atenção primáriae do êxito de várias áreas específicas como cobertura vacinal, tratamento da AIDS, assistênciafarmacêutica e outros – que ainda é predominantemente baseado na oferta, curativo e apoiadofortemente na assistência médico-hospitalar. Ele foi transposto para os municípios plenados e écomo se tivéssemos criado o INAMPS municipal pleno, porque o modelo desenvolvido pelo antigoINAMPS hoje é municipalizado, não é mais uma estrutura centralizada. Podem não gostar dessacrítica, mas o modelo assistencial baseado na oferta está organizado hoje na esfera municipal,especialmente nos municípios em gestão plena. Tudo bem que a indução tenha sido federal, masesta já é outra discussão.

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Vejamos dois exemplos sobre isso. A organização da atenção ao paciente com um problemacardiovascular: hoje não existe uma rede articulada de cuidados contínuos, mas existem ações depromoção realizadas pela área de educação em saúde como a campanha do tabagismo; outrasações de atividade física em geral promovidas pela área da promoção social sem relação com aanterior; as equipes de atenção primária, quando muito, fazem um acompanhamento, cadastramos hipertensos, realizam algumas ações de prevenção como palestras, mas não sãosuficientemente preparadas nem capacitadas para fazerem o acompanhamento permanente dessepaciente crônico, não sabem lidar com as especificidades que tem esse tipo de paciente. Édiferente de um caso agudo, quando se dá um remedinho para cinco dias, melhorou, parou, alta.Quando é necessária a referência não se tem para onde mandar o usuário, não há ambulatóriosespecializados em número suficiente e os existentes não são articulados à rede básica de serviços.Finalmente, é atribuição das Secretarias Estaduais ou das Secretarias Municipais em gestão plenaa programação de cirurgias cardíacas e angioplastias, procedimentos de alta complexidade e altocusto, ação esta realizada sem nenhuma relação com aquele outro conjunto de atividades descritasanteriormente. A própria lógica da programação hoje existente induz a separação das ações daatenção básica da atenção especializada (média complexidade) e da atenção terciária (altacomplexidade). Programamos ações e serviços criando verdadeiros fossos entre eles.

A mesma coisa é a oncologia. Hoje nós gastamos uma fortuna, por exemplo, naquimioterapia e na radioterapia com procedimentos desarticulados da prevenção primária; aatenção secundária não existe organizada na área da oncologia. O resultado é que o portador dapatologia entra no sistema de saúde numa fase já adiantada da doença e quando muito só lhe restao tratamento cirúrgico, mutilador, e/ou com alto grau de efeitos colaterais e seqüelas. É o sistemaque nós temos e é a crítica que se faz quando se trabalha organizando a oferta. A gente programaquantas cirurgias cardíacas pode fazer no mês, a gente programa quantas quimioterapias podefazer no mês e desse jeito nós não vamos nunca conseguir fazer uma rede articulada de cuidadoscontínuos, orientada para o atendimento e o acompanhamento do usuário.

Um último exemplo: os denominados medicamentos excepcionais cuja dispensação é hojeuma atribuição das Secretarias Estaduais. O Ministério define a relação dos medicamentos, faz osprotocolos, define o valor de cada produto e depois transfere o dinheiro para as Secretarias deSaúde adquirirem os medicamentos. Habitualmente a dispensação é feita a partir da solicitação dequalquer profissional médico, integrante ou não da rede de serviços especializados do SUS (quandoexistem). É o típico exemplo de regulação do sistema feita pelo usuário ou pelo profissional,individualmente. O resultado é a avalanche de mandatos judiciais, intimações do Ministério Públicopor conta desta ou daquela receita não aviada. A demanda por essa relação de medicamentos éuma espécie de feira: uma lista de produtos, em geral caros, a serem fornecidos mediante pressãodo consumidor ou dos fabricantes.

A permanecer trabalhando nessa lógica, nós não vamos dar conta da demanda que vai sersempre maior e não há recursos suficientes e nem capacidade do SUS para responder a essasnecessidades da forma como estão hoje sendo colocadas.

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As SES têm uma responsabilidade grande pela permanência do atual modelo. Primeiroporque elas estiveram ausentes na condução, coordenação e cooperação com os municípios paraorganizar as ações, os serviços e as redes. A atitude das secretarias estaduais em relação aosmunicípios, ao processo de municipalização, sobretudo nos aspectos referentes à cooperação paraorganizar as ações e as redes de serviços, foi de desresponsabilização. Segundo porque a maioriados Estados ainda não compareceu com os recursos financeiros necessários, correspondentes àssuas responsabilidades na implantação e operacionalização do SUS. A maioria das SES ainda nãoestão cumprindo a Emenda 29. Além disso, em muitos Estados é necessário dar mais visibilidadee transparência ao gasto com a saúde para não passar a idéia, também equivocada, que não segasta nada.

Uma proposta para ser debatida e aprofundada pelo Conass seria estabelecer um contratocom base numa discussão pactuada do Ministério com cada um dos Estados tendo como base acooperação técnica e financeira para o funcionamento do sistema e apoiar o desenvolvimento dasmacro-funções estaduais. Qual o compromisso dos Estados nisso? Fazer o mesmo com osmunicípios, estabelecendo um modo completamente diferente de relacionamento entre osgestores. Hoje todos competem por recursos escassos, mal se discute o modelo, o único debateé sobre o preço da consulta, da tabelinha do PAB, disso e daquilo outro.

Qual seria esse novo modelo? Em linhas gerais, temos que enfatizar muito a questão daatenção primária, qualificar a atenção primária e fazer com que a atenção primária da saúde dêconta do que é hoje o maior problema de saúde do País, que são os problemas crônicosdegenerativos. O SUS não está organizado para enfrentar esses problemas: os cardiovasculares, osoncológicos, os problemas ligados, por exemplo, a trauma, violência, etc.. Qualificação não é sótreinamento, não é isso, é toda uma nova forma de organizar as ações e os serviços além decapacitar e fazer com que esse nível de atenção possa se responsabilizar pelo usuário/cidadão.Além disso, teremos que construir sistemas integrais, ou integrados. Não adianta só a atençãoprimária se não tivermos essa rede, com capilaridade e com responsabilização pelo usuário. Ousuário quando faz um primeiro contato com o posto de saúde não deveria mais ir a lugar nenhum,fazer fila para pegar a senha para fazer um exame de sangue, ir a outro lugar para pegar outrasenha para fazer um raio-X ou marcar uma consulta especializada. A partir do primeiro contato coma rede de serviços a responsabilidade pelo usuário tem que ser do sistema. Não basta ter o SUSter todos os princípios e diretrizes se não garantir o acesso integral e articulado ao conjunto deações e serviços. Outra característica do modelo é ter como foco o usuário e a família, como vemsendo discutido na promoção, na prevenção etc.

A construção do novo modelo passa pelo enfrentamento do problema dos recursoshumanos. Temos um grande nó na política de recursos humanos, igual ao problema dofinanciamento. Há uma situação de déficit, tanto quantitativo quanto qualitativo. O problema daprecariedade dos vínculos de trabalho é muito grande. É necessário que o Conass enfrente essaquestão com muita determinação se quiser avançar. O Ministério está propondo e nós julgamos

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uma proposta interessante a instalação das mesas de negociação estaduais. É necessário garantiro ingresso ao sistema através de concurso assim como regulamentar as diversas profissões, comoos agentes comunitários de saúde. O Conass poderia propor também a criação de um fundonacional de recursos humanos para compensar os servidores federais que foram descentralizados:hoje o Ministério gasta um bilhão de reais por ano para pagar os salários de 53 mil servidores doantigo INAMPS à disposição dos Estados e Municípios, sem contar os da FUNASA. Um terço dessesservidores está com os Estados e dois terços com os Municípios e este contingente estará todoaposentando nos próximos dez anos. Quem vai assumir a sua reposição? Esse debate precisa naagenda de prioridades do Conass.

O financiamento também não é suficiente. Diversos estudos realizados mostram queprecisaríamos, pelo menos, dobrar o nosso per capita, dobrar o que se gasta per capita hoje noPaís se quisermos ter melhores níveis de saúde. O que o SUS consegue fazer com o pouco dinheiroque tem é um verdadeiro milagre, porque o investimento na saúde é muito pequeno. Também énecessário termos critérios mais eqüitativos de alocação dos recursos. Há alternativas para isso. Épossível criar fundos regionais compensatórios para apoiar regiões, sobretudo aquelas com menorcapacidade instalada ou necessitada de maior investimento em recursos humanos. É o caso daregião Norte, com suas grandes distâncias e sua baixa densidade demográfica. O debate dofinanciamento e da alocação eqüitativa também deve compor a nossa agenda de prioridades.

O Conass tem um papel muito importante na definição da nova agenda. As nossas câmarasregionais e as câmaras técnicas devem aprofundar a discussão, o debate, porque é possíveltrabalhar estas questões, sobretudo se mudarmos a lógica que existe hoje. Devemos propor umnovo formato de relação entre os gestores, algo como um contrato de gestão, cuja agendaincorpore todas as questões definidas como prioritárias pelo Conass. Politicamente é muitoimportante os secretários e as secretarias estaduais assumirem com firmeza a luta pelocumprimento da Emenda 29. O Conass e o movimento sanitário podem aproveitar a própriareforma tributária para melhorar o financiamento da saúde. Está em discussão o PEC 41, que querperenizar a CPMF. Tudo bem, desde que ela possa ser transformada de contribuição em imposto,pois assim poderá ser transferida para Estados e municípios também; e aumentando atransferência de recursos constitucionais aumenta também o montante para a Saúde.

Os Estados precisam ter uma postura mais clara e mais explícita de financiamento dosmunicípios, inclusive com a implantação de mecanismos de transferências fundo a fundo tambémpara os municípios. A força política das SES e do Conass aumentará quando estas questõesestiverem incorporadas às práticas rotineiras do SUS.

Finalmente, para terminar, o novo modelo de relação intergestores que o Conass poderiaestar propondo é um modelo de relação do Ministério Único da Saúde com as Secretarias Únicasde Saúde, porque se termos cinco, seis ministérios, também temos cinco, seis, ou mais secretariase o mesmo ocorre nos municípios maiores. O que significa isso na prática? O estabelecimento deum novo formato de relação pode ser um contrato de gestão, ou equivalente, mas um pacto

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construído a quatro mãos, ou a seis mãos, o Estado, o Cosems de cada Estado e o Ministério. Naconstrução desse novo pacto, as secretarias definam as suas prioridades: “nós precisamos deapoio para desenvolver o planejamento ou a nossa área de regulação; estruturar melhor o setor decompras; implementar novos serviços de atendimento ao usuário ou de cooperação com osmunicípios” enfim, o que for necessário em cada secretaria. A diferença é que o processo precisaser pactuado e ser construído em conjunto. Desse modo ele poderá ser a base do novo modelo derelação entre os gestores, orientado pelos princípios da cooperação técnica descentralizada,aproveitando esse exemplo maravilhoso que é o da Organização Pan-Americana da Saúde. Aexperiência da OPAS de trabalhar junto, de cooperar é muito boa, pois não é exercida de formavertical, normativa, com a imposição de regras isonômicas, mas, ao contrário, é flexível e procurasempre incorporar as demandas dos cooperadores. O formato de relação entre os gestoresproposto pode ter como eixo a cooperação estratégica para o desenvolvimento das macro-funções: recursos humanos, financiamento, a gestão, planejamento, etc. E a partir daí ela poderiaacontecer também no plano tático, que atualmente é a única existente. O modelo de cooperaçãoexistente é pontual e todo fragmentado, herdeiro dos antigos programas especiais: implantar umaunidade aqui, fazer uma coisinha ali, e, desse modo, temos centenas ou milhares de atividades decooperação técnica para treinamento, totalmente desvinculadas da lógica de organização dosserviços. Uma proposta de cooperação estratégica integrada nessa lógica construída em conjuntopode favorecer e estimular os Estados a serem cooperadores com os municípios. Os Estados, assecretarias estaduais têm uma função, uma macro-função importantíssima que é trabalhar demodo cooperativo com os municípios.

Se conseguirmos implantar esta agenda de prioridades criaremos uma nova forma detrabalhar e de relação entre os gestores: seria o COOPERASUS, a favor dos nossos usuários, donosso cidadão.

NOTA1 Assessor do Conass. Este texto é a transcrição da fala do autor na mesa redonda que marcou oinício dos trabalhos do 1o. Seminário da Conass para construção de Consensos, daí o seu tomcoloquial. Além do autor, participou da mesa redonda Eugênio Vilaça Mendes, cuja exposição estárepresentada no texto “Reflexões sobre a NOAS/SUS 01/02”, distribuído entre os participantes etambém apresentado nesta publicação.

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4. DIRETRIZES PARA A REFORMULAÇÃO DOS MODOS DEGESTÃO E DE ATENÇÃO À SAÚDE – o papel do Ministério daSaúdeGastão Wagner de Sousa Campos

ISejamos dialéticos!

A consolidação do SUS depende de movimentos contraditórios na aparência, masque, na prática, podem vir a se complementar. Tudo dependerá de nossa habilidade em lidar comuma situação complexa, em que múltiplos interesses terão que ser articulados para que logremos,de fato, defender a vida do povo brasileiro. Se não, vejamos:

a. deveremos criar um modo de fazer política e gestão em que combinemos a construção de umMinistério da Saúde capaz de agenciar e de apoiar mudanças com a descentralização e a gestãoparticipativa do Sistema;

b. dar prosseguimento, em uma nova fase, ao processo de Reforma Sanitária (a reforma dareforma?), ampliando e modificando tanto as ações de promoção e de prevenção, quanto as deatenção clínica. Para lograrmos atenção integral, deveremos reformular e ampliar a clínica e asaúde coletiva; ao mesmo tempo, uma interagindo sobre a outra;

c. para assegurarmos atenção integral e eqüidade, deveremos apostar na reforma de todos osníveis de atenção (iniciou-se, com a saúde da família, uma reorganização da atenção básica; asaúde mental vem se reorganizando para além dos hospitais psiquiátricos, falta – e esta poderáser uma de nossas marcas – reformular a atenção especializada, hospitais, as vigilâncias etc).No entanto, esse compromisso com a integralidade não deve nos impedir de identificarproblemas de saúde que necessitem de projetos especiais de intervenção (concentração derecursos para enfrentarmos epidemias, endemias, ou para ações prioritárias voltadas a regiõesou a grupos com maior vulnerabilidade);

d. outro paradoxo refere-se a combinar a ampliação do acesso com a construção de eqüidade(políticas de inclusão). Nesse sentido, é importante considerarmos as diferenças relativas àvulnerabilidade e à desigual distribuição de recursos, desenvolvendo projetos específicos parapequenos municípios, área rural, regiões metropolitanas etc., ou seja, utilizar recursos para umequilíbrio adequado entre a extensão de cobertura e a qualidade da atenção;

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e. os dados de realidade (limites de financiamento, lei de responsabilidade fiscal, capacidadeinstalada de serviços de saúde não-estatais) nos obrigam a, ao mesmo tempo, ampliar eaperfeiçoar a gestão e o funcionamento da rede própria de serviços (municipais, estaduais ealguns federais), bem como a apoiar também a rede de serviços filantrópicos, comunitários eprivados dispostos a cumprir uma função pública (esta disposição pode e deve ser construída,e também regulada, não é um dado natural ou espontâneo). Para isso, é importante aconstrução de parcerias, estendendo para esses setores a lógica da co-gestão e do controlesocial;

f. combinar modos de financiamento com repasses automáticos segundo população enecessidades de saúde, com outros voltados para o volume de serviços prestados e paraestimular a qualificação da atenção. Tetos fixos e variáveis segundo padrões a serem acordados;

g. combinar uma política de racionalização de gastos (rever contratos, eliminar custosdesnecessários) com uma redefinição de prioridades (remanejamentos orçamentários) e comuma reordenação dos modos de atenção que diminuam os custos e ampliem a capacidade deatenção (estimular cirurgia ambulatorial etc), escapando ao imobilismo que poderia decorrer doaperto orçamentário.

I I

O Ministério da Saúde como agente e apoiadorda mudança e da reforma sanitária e do SUS

Qual modo de gestão conseguiria combinar um papel ativo, de liderança e decoordenação para o Ministério da Saúde, com a autonomia relativa de estados e municípios?

Dentro dessa perspectiva, há dois modos de operar que não nos servirão. Por umlado, o de pensar o MS como um banco financiador (com mecanismos financeiros indiretos deindução e ferramentas de avaliação a posteriori); nesse caso, desapareceria a rede e a lógica desistema e teríamos uma federação fragmentada de feudos sanitários. Por outro lado, no outroextremo, estaria o modo autoritário de o MS valer-se de seu poder financeiro, legal e técnico paracoagir parceiros de cima para baixo.

O SUS é uma rede, um sistema, em que todos têm autonomia relativa, portanto.Nesse sentido, cabe ao MS assegurar articulação entre os vários níveis. E mais: cabe ao MS valer-se de seu poder para agenciar e apoiar mudanças de interesse sanitário (critério máximo daprodução da saúde), e que consolidem o SUS. Para isso, deveremos acolher dd emandas e

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formulações de usuários, trabalhadores de saúde, prestadores, municípios, estados, bem comolh es o ferecer novas diretrizes, submetendo-as (demandas e ofertas) a processos de discussão,negociação e pactuação, construindo projetos do modo mais interativo possível.

Deveremos superar um padrão de relação entre os gestores do SUS, centrado nadiscussão pura e simples sobre a distribuição de recursos financeiros, para, nos contratos,também incluir objetivos e metas da atenção em saúde em todas as suas dimensões. Nesseaspecto, a avaliação sistemática do desempenho é fundamental.

Algumas formas para operarmos esse estilo de gestão, ao mesmo tempo ativa edemocrática:

a. reforçar a tomada de decisão sobre temas cruciais (tetos, financiamento, reformas etc.) emespaços coletivos institucionais: Conselho Nacional de Saúde, Comissão Intergestores Tripartite,Conferências; bem como montar outros espaços de caráter transitório e articulados comfinalidades específicas. Exemplos: seminários para analisar e reconstruir o programa de controleda dengue, projetos de saúde da família etc.;

b. identificar problemas estratégicos de gestão ou de atenção, sugerindo modos de atuaçãoinovadores e abrindo espaços para que sejam avaliados e transformados em objeto deintervenção;

c. ampliar a capacidade do MS para apoiar municípios, estados, prestadores, trabalhadores eusuários, de modo a envolvê-los ainda durante a identificação e a análise de problemas e naelaboração de projetos. Isso implica mudança radical na postura dos técnicos do MS, procurandoenvolver os interessados em todas as fases da elaboração de programas. Trabalho em equipe.Além disso, implica desenvolver projetos para reforçar e ampliar a capacidade de gestão deestados e municípios;

d. cuidar da gestão interna do Ministério, integrando diretrizes e projetos dos vários órgão do MS,de modo a potencializar e a racionalizar recursos. Especificamente, é importante integrarAgências e demais organizações vinculadas ao MS, resguardando o seu papel de coordenador ede definidor de políticas. Cabe também redefinir o papel e a estrutura dos órgãos regionais, bemcomo dos escritórios das Agências e da Funasa;

e. propor e contratar critérios claros, com base na eficácia (capacidade de produzir saúde e deevitar danos), eficiência (racionalidade gerencial), responsabilização inequívoca pela atenção(definição clara de quem se encarrega do quê), vínculo (abordagem integral dos problemas desaúde), direitos dos usuários e gestão participativa, para avaliação de municípios, estados eprestadores em geral. Vincular, em alguma medida, os tetos variáveis a esses critérios.

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I II

Algumas diretrizes para reformar os modos de produzir saúde

À nossa gestão, cabe um desafio que, se enfrentado com firmeza, serenidade eequilíbrio, abrirá uma nova etapa na história da saúde pública brasileira: o modo tradicional deassistência à saúde está em esgotamento; apresenta limites de eficácia (baixo impacto) e deeficiência (custos elevados).

Não nos cabe reinventar a roda. Há experiências nacionais e internacionais queacumularam indicações sobre como reformar conhecimentos e práticas em saúde. Compete-nos atarefa de recolher, integrar, aprofundar e reinventar esses saberes, adaptando-os ao nossocontexto. Então... Mãos à obra. Para isso, deveremos redefinir os modos de fazer promoção eprevenção, bem como os de realizar a atenção clínica.

Em relação à saúde coletivaEstimular a organização de Núcleos de Saúde Coletiva, que integrem a Vigilância

Sanitária, a Epidemiológica e a Ambiental, realizando tanto o controle de doenças,quanto a promoção e prevenção. Pensar a especificidade desses Núcleos, conformesejam territoriais, distritais, municipais, estaduais ou do MS.

Propor, para esses Núcleos, não apenas ações de diagnóstico ou de vigilância, mastambém o papel de realizar intervenções, tanto por meio de ações diretas, quantoarticulando – de modo matricial – as equipes de saúde da família, agentes, centros dereferência etc., bem como outros setores – intersetorialidade –, como a educação, aassistência social, o saneamento, as organizações da sociedade civil etc. É necessáriosuperarmos a visão tradicional de vigilância em dois sentidos principais: primeiro, nãoapenas vigiando, mas articulando projetos de intervenção (papel ativo dos Núcleos);segundo, considerando a população, os grupos vulneráveis, os estabelecimentos ouorganizações como sujeitos ativos, envolvendo-os desde a identificação de problemase a sua análise, até a definição e a implementação de projetos.

Integrar o MS e a rede do SUS ao Projeto Fome Zero, tanto aproveitando acapilaridade desta rede para apoiar atividades, quanto articulando programas da saúdeaos do Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar (Mesa). Da mesma maneira,articular-se com outros Ministérios, de modo intersetorial, para ampliar a nossacapacidade de desenvolver a promoção e prevenção.

Definir projetos prioritários de intervenção, com metas de controle ou deerradicação. Nesse sentido, sugerimos: eliminação da hanseníase como problema desaúde pública; controle da tuberculose, dengue, malária, leishmaniose, filariose,hepatites, epidemia de aids; enfrentamento da dependência química (drogas e álcool)

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e da violência; estímulo à prevenção do câncer e à vida saudável; promoção da saúdebucal, do trabalhador, do idoso, da mulher, da criança e de grupos vulneráveis ouportadores de patologias especiais. Para cada caso, há que se descobrir e reforçarações estratégicas específicas como, por exemplo: articular esses programas à saúdeda família, valorizar a educação em saúde e o autocuidado, bem como aregulamentação restritiva à propaganda de bebidas alcoólicas etc.

Em relação à reforma clínica

Deveremos orientá-la segundo duas perspectivas: primeira, buscar sempre a máximaeficácia, com o menor custo e o menor grau de iatrogenia possível (evitar danos decorrentes dasterapêuticas adotadas); segunda, ampliar a prática clínica, aumentando a capacidade deautocuidado e a autonomia dos usuários, considerando que o “objeto” da atenção não é somentea doença ou o risco de adoecer, mas pessoas que vivem em um contexto familiar, cultural,econômico e social específico. Ampliar o espectro terapêutico das equipes de saúde (não somentena saúde da família), incorporando no cotidiano ações de educação e promoção da saúde,valorizando o acompanhamento longitudinal (ao longo do tempo), com clara atribuição deresponsabilidade (vínculo) pelo processo de saúde e doença do sujeito e não apenas pela realizaçãodo procedimento “a” ou “b”. A humanização depende disso, da personalização do atendimento,considerando que cada caso é um caso singular e que exige um projeto terapêutico singular.

Para lograr esses objetivos, deveremos:qualificar e ampliar o acesso, bem como a capacidade de resolver problemas da

atenção básica, centrando-a na lógica de saúde da família, mas alargando seuespectro conforme a complexidade do quadro sanitário e a disponibilidade derecursos. Ampliar a saúde da família nos grandes centros, elaborando projetosconforme o contexto singular de cada cidade, e classificando-as segundo fase de“implantação, expansão ou consolidação” do PSF;

ampliar o processo de capacitação e de educação continuada conforme estratégiasde fortalecimento do SUS;

propor o debate e a implantação de um projeto de serviço civil centrado na atençãobásica, objetivando apoiar regiões com dificuldade para fixação de trabalhadores;

estimular modelos alternativos de atenção especializada, de modo a atenuar o papelcentral do hospital, bem como a fragmentação da atenção de casos complexos, oexcesso de exames complementares e de intervenções desnecessárias. Há algunscampos em que se acumularam evidências clínicas sólidas que nos dão base técnica epolítica para enfrentarmos interesses corporativos e econômicos indutores dessas

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distorções. Assim, toda cirurgia que puder realizar-se fora do centro cirúrgico deveráocorrer no modo ambulatorial; todo tratamento que puder realizar-se sem internaçãodeverá ser realizado em atenção básica, centros especializados ou atendimentodomiciliar etc; para isso, é preciso reforçar a implantação de uma rede comcapacidade para realizar cirurgias ambulatoriais, atenção domiciliar, em forma dehospital-dia etc.;

estimular a organização de Centros de Referência para atendimento especializado,em que ocorra uma síntese entre ambulatório, hospital-dia, centro de diagnóstico erecursos para a intervenção terapêutica, nos moldes dos Cacons (Centros de AltaComplexidade em Oncologia), com adensamento de tecnologia e equipesinterdisciplinares que assegurem atenção integral aos grupos de patologia;

estimular a constituição de Centros de Regulação regionais, articulados à área deinformação e informática, de modo a criar centrais de vagas, garantindo acessoregulado dos encaminhamentos da atenção básica e dos prontos-socorros aosserviços de alta e média complexidade;

organizar o acesso à alta e média complexidade, classificando os encaminhamentospor risco, variando a velocidade de acesso conforme o risco ( se for urgente, decomplicação imediata ou de fluxo normal);

valorizar a adscrição de clientela em todos os níveis do Sistema (exceto na urgênciae emergência): cadastro territorial na ABS (vínculo de longo prazo), cadastro por risconos Centros de Referência, hospitais e especialidades (vínculo enquanto durar o risco),de modo a implantar sistema de responsabilização passível de avaliação, e que faça aligação de pessoas com pessoas – usuários com equipes de saúde do PSF, ou deCentros de Referência ou de hospitais;

incluir como indicador de qualidade o grau de autonomia e de autocuidado dosusuários, valorizando a educação em saúde, o aconselhamento e a abordagem deaspectos subjetivos e sociais de cada caso;

estimular a abordagem interdisciplinar dos problemas de saúde, objetivando aampliação da clínica como, por exemplo, diabetes, hipertensão e doresosteomusculares; responsáveis por quase dois terços da demanda de adultos na ABS,deveriam ter uma abordagem ampliada, articulando-se aspectos orgânicos, subjetivose sociais – o que significa ofertar orientação medicamentosa, dietética, sobreatividade física, trabalho, sexualidade –, abrindo espaço para ampliação do arsenalterapêutico da equipe interdisciplinar, discutindo-se que atenção clínica realiza omédico generalista, o especialista, o dentista, o enfermeiro, o auxiliar de enfermagemetc.

estimular a organização de sistemas regionais de atenção pré-hospitalar, comregulação médica e acesso à rede de serviços, conforme a gravidade do caso.

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anexos116

Todas essas mudanças dependem de negociação, realização de novos contratos comestados e municípios, mas, fundamentalmente, dependem da capacidade de o Ministério da Saúdearticular um amplo movimento cultural de reforma sanitária, com seminários, debates, fóruns dediscussão e de elaboração de projetos, promovendo a divulgação de experiências em quemudanças estejam ocorrendo de fato.

NOTA

1 Secretário Executivo do Ministério da Saúde. Reprodução do texto cedido pelo autor parautilização no 1º Seminário do CONASS para Construção de Consensos