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RELATO DE PESQUISA: A INFLUÊNCIA DA AUTOMAÇÃO EM TRABALHADORES DE UMA LAVANDERIA INDUSTRIAL. 1 Bruno Stramandinoli Morencr RESUMO O presente estudo enfatizou o trabalho humano mobilizado em uma organização automatizada e a impor- tância da Psicologia atuando como agente de mudanças frente aos conflitos da organização. Os objetivos do trabalho: analisar a organização identificando fatores subjacentes para se interpretar melhor a realidade organizacional e propor/realizar uma intervenção frente às questões levantadas. Foi investigada uma empresa do ramo têxtil e de confecção, de médio porte. Sujeitos: profissionais da área de produção. A coleta de dados se deu através de entrevistas, questionários, observações e contatos informais. Categorias de análise: políticas de recur- sos humanos, relacionamentos, ambiente físico, trabalho em si, comunicação, acidentes de trabalho e fluxo de trabalho. A intervenção se deu pela de procedimentos e práticas para o trabalho, bem como, identi- ficação de oportunidades de melhoria da Comunicação e Fluxo de Informações; maior envolvimento dos cola- boradores; maior comprometimento dos colaboradores; melhoria do relacionamento interpessoal e intersetorial; redução de eventuais desperdícios. Palavras-chave: comportamento organizacional, comprometimento, automação, psicologia organizacional. Research Account: the influence of automation by industrial laundry workers. ABSTRACT The present study emphasized motivated human work at an automatized organization and the importance of psychology while acting as an agent of changes towards organizational conflicts. The ma in goals of this study were the analysis of an organization while identifying subjacent factors in arder to make a better interpretation of the organizational reality and to suggest/intervene in respect to the aroused questions. The researched enterprise was medium size industrial laundry linked to the textile branch. The subjects were workers of its production sector. lnterviews, questionnaires, observations and informal contacts were used to collect data. Human resource policies, relationships, the work itself, physical environment, communication, work accidents and workflow were the analysing categories. The intervention occurred in the following ways: by the creation of work practices and procedures; by the identification of opportunity improvement for communication and information flows; by increasing worker's involvement and commitment; by improving interpersonal and intersectorial relation and by the reduction of potential wastes. Key-words: organizational behavior, commitiment, automation, organizational psychology 1 Pesquisa apresentada como requisito para a conclusão do Curso de Psicologia, orientada pela Professora do Departamento de Psicologia Social e Institucional da Universidade Estadual de Londrina- UEL, Drª. CRISTIANE VERCESI CRUCIOL. 2 Universidade Estadual de Londrina. Acadêmico do curso de Especialização em Psicologia Organizacional e do Trabalho. E-mail: besamo@ uol.com.br Revista de Psicologia, Fortaleza, V.20(2), p. 71-81 I jul./dez. 2002 m I -a

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RELATO DE PESQUISA: A INFLUÊNCIA DA AUTOMAÇÃO EM TRABALHADORES DE UMA

LAVANDERIA INDUSTRIAL. 1

Bruno Stramandinoli Morencr

RESUMO

O presente estudo enfatizou o trabalho humano mobilizado em uma organização automatizada e a impor­tância da Psicologia atuando como agente de mudanças frente aos conflitos da organização. Os objetivos do trabalho: analisar a organização identificando fatores subjacentes para se interpretar melhor a realidade organizacional e propor/realizar uma intervenção frente às questões levantadas. Foi investigada uma empresa do ramo têxtil e de confecção, de médio porte. Sujeitos: profissionais da área de produção. A coleta de dados se deu através de entrevistas, questionários, observações e contatos informais. Categorias de análise: políticas de recur­sos humanos, relacionamentos, ambiente físico, trabalho em si, comunicação, acidentes de trabalho e fluxo de trabalho. A intervenção se deu pela elabor~ção de procedimentos e práticas para o trabalho, bem como, identi­ficação de oportunidades de melhoria da Comunicação e Fluxo de Informações; maior envolvimento dos cola­boradores; maior comprometimento dos colaboradores; melhoria do relacionamento interpessoal e intersetorial; redução de eventuais desperdícios.

Palavras-chave: comportamento organizacional, comprometimento, automação, psicologia organizacional.

Research Account: the influence of automation by industrial laundry workers.

ABSTRACT

The present study emphasized motivated human work at an automatized organization and the importance of psychology while acting as an agent of changes towards organizational conflicts. The ma in goals of this study were the analysis of an organization while identifying subjacent factors in arder to make a better interpretation of the organizational reality and to suggest/intervene in respect to the aroused questions. The researched enterprise was medium size industrial laundry linked to the textile branch. The subjects were workers of its production sector. lnterviews, questionnaires, observations and informal contacts were used to collect data. Human resource policies, relationships, the work itself, physical environment, communication, work accidents and workflow were the analysing categories. The intervention occurred in the following ways: by the creation of work practices and procedures; by the identification of opportunity improvement for communication and information flows; by increasing worker's involvement and commitment; by improving interpersonal and intersectorial relation and by the reduction of potential wastes.

Key-words: organizational behavior, commitiment, automation, organizational psychology

1 Pesquisa apresentada como requisito para a conclusão do Curso de Psicologia, orientada pela Professora do Departamento de Psicologia Social e Institucional da Universidade Estadual de Londrina- UEL, Drª. CRISTIANE VERCESI CRUCIOL. 2 Universidade Estadual de Londrina. Acadêmico do curso de Especialização em Psicologia Organizacional e do Trabalho. E-mail: besamo@ uol.com.br

Revista de Psicologia, Fortaleza, V.20(2), p. 71-81 I jul./dez. 2002 m ~--~~~~~--

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Revista de Psicologia Bruno Stramandinoli Moreno

INTRODUÇÃO

Desde o seu surgimento a humanidade, para sa­tisfazer as suas necessidades, precisa colocar-se em mo­vimento transformando coisas, seja se relacionado, extraindo, plantando, caçando ou construindo para ga­rantir sua sobrevivência e convívio em sociedades. Mas somente depois dos tempos da Revolução Industrial até os dias atuais, os indivíduos têm sido impelidos a tra­balhar no sentido que conhecemos hoje.

Parte da relação do ser humano com o trabalho continua a mesma. O trabalho que se realiza, desde muito tempo até nossos dias, também atende a fins fu­turos: nossas tarefas são programadas previamente e nossos ganhos só são recebidos ao final de um perío­do. O conceito de trabalho sempre esteve relacionado à satisfação de necessidades, onde sua natureza social tem se condicionado, e vem sendo entendida como a capacidade de obter lugar relativamente permanente no mercado de trabalho, isto é, à necessidade de so­brevivência do trabalhador.

O trabalho tem como o ponto de conexão princi­pal com a realidade. É nele que se desenvolve o significa­do de pertencimento nas pessoas, uma consciência prática de se representar individualmente naquilo que faz.

E é por isso que as pessoas, depois de um dia de trabalho, querem "desligar-se" de tudo aquilo que diga respeito ao trabalho que fazem, em busca de um cotidi­ano mais prazeroso. Porém, o trabalho é "indesligável", mesmo porque o mundo produtivo não está representa­do apenas pela empresa em que trabalhamos, mas nas demais dimensões da vida social: o lugar onde se estu­da, onde se faz lazer.

CONSIDERAÇÕES SOBRE O TRABALHO

O trabalho, enquanto categoria fundamental de or­ganização da dinâmica social, construiu a necessidade con­creta da instituição do ser social. Através dele, inferimos as dimensões através do qual tem se constituído o caráter político da consciência de si mesmo na sociedade.

O trabalho humano aparece cada vez mais níti­do quanto mais clara for a intenção e a direção does­forço. É neste ponto que incutimos um sentido mais ativo a ele: sentido de um esforço afirmado e desejado, para a realização dos objetivos; onde até mesmo o objetivo realizado, ou seja, a obra assume o nome tra­balho. Assim podemos entender o trabalho como sen­do o esforço e também seu resultado: a construção enquanto processo e ação, e o edifício pronto.

Segundo CARVALHO & SERAFIM (1995), o tra­balho humano mobiliza a organização como um todo. Partindo então para a idéia de que o "rendimento (ren­dimento = trabalho: tempo) da empresa" se pauta, pri­meiramente, na força humana, a qual utiliza o equipamento tecnológico como um meio auxiliar.

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Entretanto no caso de uma fábrica automatizada, o rendimento se fundamenta no resultado técnico e na atuação do trabalhador, o qual surge como elemento auxiliar, presente apenas para atuar onde a máquina não pode alcançar. Todavia, mesmo uma organização total­mente automatizada está disposta (arranjada/ organiza­da) segundo um plano determinado pela sua função.

Mesmo nas condições de uma organização automatizada, o que move a produção é "( ... ) a inter­venção do homem não da máquina. O homem é quem projetou e construiu o equipamento, bem como elabo­ra seu programa. O homem decide as novas séries de programas e montagem" (RIEDEL, citado por CARVA­LHO & SERAFIM, 1995).

Vê-se então que qualquer organização, automatizada ou não, reduz-se ao fato de ser um meio auxiliar criado pelo homem com a finalidade de ampliar seu potencial de rendimento no trabalho.

Em vista disto, antes de ser considerado como empregado, o indivíduo é membro de um grupo, pas­sando pelos processos de socialização e de conformis­mo aos valores dominantes. Ou seja, a cultura imprime importantes marcas no modo de ver, de ser e de agir no indivíduo. Não sendo diferente para o espaço do tra­balho, o qual é influenciado pelos traços culturais da sociedade da qual o indivíduo faz parte.

Desconsiderar a transformação que ocorreu com o trabalho seria um equívoco muito grave, visto que a partir deste fato tem-se condições de entender o que são as organizações, como elas se apresentam.

A economia da nova Era do Conhecimento estabelece por premissa as novas fontes de riqueza que são a informação, o co­nhecimento e a comunicação e não mais os recursos naturais ou o trabalho físico. Essa nova Era está surgindo em meio a uma grande revolução, fruto de forças po­derosas e incontroláveis; as forças da globalização. A abertura de mercado trou­xe atrelada um aumento significativo de concorrentes que, ao lado da dissemina­ção da tecnologia da informação e das re­des, contribuiu para a destruição de parcela significativa do emprego, tal como o conhecemos na Era Industrial. Não se trata mais apenas de máquinas que fazem o trabalho de dezenas, centenas de ho­mens; trata-se do intangível- um software, por exemplo -gerando produtos e servi­ços que podem não ter realidade física , mas que certamente representam a mais refinada 'matéria prima' do séc. XXI: a in­formação que gera o conhecimento que produz inovação que se traduz em competitividade. (BITTENCOURT, 2000)

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O trabalho vai além do conceito de serventia para a subsistência humana. Claro, todos querem con­quistar uma vida digna para a família, mas deve-se entender que é necessário valorizar o trabalhador, haja vista o trabalho não ser, somente, uma forma de garan­tir sua vida, e sim uma forma de sentir-se não um es­cravo feliz, e sim um trabalhador satisfeito.

AS ORGANIZAÇÕES

Partamos do pressuposto de que a sociedade seja tão-somente um tecido de instituições que se interpenetram e se articulam entre si para regular a pro­dução e a reprodução da vida humana sobre a terra e a relação entre os homens. Entretanto, para fazer cumprir esta função de regulação da vida humana, as institui­ções têm de se constituir fisicamente. Mas como o fa­zem? Em dispositivos concretos que são as organizações. Tais organizações, sendo muito variáveis, compreendem desde um grande complexo organizacional até um pe­queno estabelecimento (BAREMBLIT, 1992).

A sociedade moderna é uma sociedade de organizações. Nascemos em organizações, somos educados em organizações, e qua­se todos nós passamos a vida a trabalhar para organizações. Passamos muitas horas de lazer a pagar, jogar e a rezar em organi­zações.( ... ) Neste sentido, a sociedade moderna valoriza a racionalidade, a efici­ência e a competência, virtudes essas que são alcançadas pelas organizações. (ETZIONI, 1989, pág.7).

As organizações, significariam, dessa forma, fun­damentalmente a mola propulsora do desenvolvimen­to econômico, político e social dos grupos humanos. A eficiência destas seria avaliada direta e proporcional­mente à sua condição de existência e sobrevivência material.

Para CHANLAT (1992), em um mundo essenci­almente dominado pelo economicismo e pelo determinismo tecnológico, os homens e mulheres que povoam as organizações são considerados, na maio­ria das vezes, apenas quantidades materiais, "( ... ) re­cursos ( ... ), cujo rendimento deve ser satisfatório do mesmo modo que as ferramentas, os equipamentos e a matéria-prima" (p. 25). Para o autor, a sociedade moderna inverteu, ao longo do tempo, a importância e a valorização das relações entre as pessoas, à pri­mazia da relação entre pessoas e coisas. A principal causa dessa primazia, segundo CHANLAT (1992), pode ser atribuída à subordinação das relações soci­ais ao universo dos objetos-mercadorias e à racionalidade econômica.

Na sociedade do trabalho a individualidade pas­sa a ser tratada de modo a realçar o caráter utilitário

das habilidades, além de destacar a natureza humana como essencialmente ativa e produtiva, voltada para a transformação do meio e para a criação de coisas úteis. O verdadeiro indivíduo era aquele que conseguia se manter ativo, prático, construtor, enfim, trabalhador. O indivíduo autêntico tornou-se sinônimo de "bom pro­fissional" (GHIRALDELLI JR., 2000). Como afirma o no­meado autor:

O ser pensante e inteligente, o sujeito epistemológico, aquele que reconhece o verdadeiro e o falso passou a ser o sujei­to ativo. A verdade passou a pertencer à ordem prática e, assim sendo, seu reco­nhecimento dar-se-ia ativamente, por ex­periência e experimentação. A pessoa, o sujeito moral, aquele que julga o certo e o errado, passou a ser aquele que faz jul­gamentos a partir dos valores postos pelo trabalho - uma ética do trabalho, que passou a punir duramente uma figura inexistente até então: o 'vagabundo' ( ... ) E, por fim, o cidadão, o sujeito político, passou a ser aquele que reconhecia di­reitos e deveres a partir de um discurso dos partidos trabalhistas (de esquerda e de direita) (pág. 21-22).

Na atualidade o emprego mudou radicalmente de forma. A erosão das normas tradicionais de assalariamento, fundadas em identidades ocupacionais ou de classe, e a paulatina perda das funções protecionistas do Estado têm como conseqüência o aumento da individualização na construção e valorização das próprias condições de empregabilidade.

Um desafio imenso à frente da psicologia de um modo geral, e da psicologia organizacional em parti­cular, é responder à questão das identidades das pes­soas e como estas são permeadas e afetadas pela flexibilidade do trabalho. As identidades se desenvol­vem e moldam as percepções e as chances que se tem no mercado. Assim, outro grande desafio interno à psi­cologia organizacional é tentar redefinir seus pressupos­tos de trabalho a partir das noções trazidas e levantadas pelo pensamento dito pós-moderno, principalmente aqueles que se referem aos questionamentos da noção de verdade, de epistemologia e de mente. Além disso, é fundamental entender como as alterações no mundo do trabalho podem ser conectadas com mudanças mais gerais, tais como mudanças na forma de subjetivação, mudanças na família, na cultura e também na política.

Tal cenário exige a presença da psicologia, pois acarreta novas experiências para o trabalhador obri­gado a uma abertura ao novo, configurado nas di­versas tecnologias e paradigmas. Como diz ROLNIK (1997): ( ... )essas mudanças implicam a conquista de uma flexibilidade para adaptar-se ao mercado em sua lógica de pulverização e globalização; uma abertu-

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rapara o tão propalado novo: novos produtos, novas tecnologias, novos paradigmas, novos hábitos etc. (pág.20-21)

A psicologia organizacional vem a contribuir no sentido de conhecer modos de pensar, apreciar e agir dos sujeitos acerca de temas emergentes da contemporaneidade, ao tomar contextos referentes ao mundo do trabalho que passa por reestruturações e ino­vações tecnológicas, e sobre ele repousar um olhar que se caracterize, ao mesmo tempo, crítico e criativo. Ain­da mais que:

( ... )para o indivíduo cujo trabalho é subi­tamente modificado; para uma dada pro­fissão (tipógrafo, bancário, piloto) bruscamente atingida pela revolução tecnológica, que torna obsoleto o savoir­faire tradicional e ameaça a própria per­manência da profissão; para as classes sociais ou para as regiões do mundo que não tomam parte na efervescência de con­cepção, produção ou apropriação lúdica das novas ferramentas digitais para todos estes, a revolução técnica manifesta-se como um 'outro' ameaçador. A bem dizer, nenhum de nós deixa de se encontrar mais ou menos nesse estado de despossessão (LÉVY, 1997, pág.3).

O papel da psicologia nas organizações se carac­teriza como a produção e a aplicabilidade do conheci­mento. À psicologia, do cenário apresentado, cabe imbuir-se da necessidade de abrir-se ao não enquadramento e a não dissociação sujeito/mundo, con­siderando a importância de dimensões outras até en­tão desconsideradas. Uma vez que a própria psicologia colaborou, por muito tempo, para práticas de gestão coercitivas e excludentes ao tomar os sujeitos sob a idéia do merecimento, que responsabiliza exclusiva­mente por sucessos e fracassos.

AUTOMAÇÃO E TRANSFORMAÇÃO ORGANIZACIONAL

A tendência à expansão é inerente à na­tureza da empresa ( ... )especialmente pri­vilegiada sob o impacto da automação. (MOTTA, 1990, p.1 08)

O primeiro passo ao se pesar esta questão é pen­sarmos que o acesso à tecnologia da automação é dife­renciado entre as empresas, visto que estas quando grandes levam vantagem sobre as menores. Isto se ex­plica em vista de que a automação é cara, onde são exigidos, conseqüentemente, grandes investimentos em máquinas modernas. Podem contratar técnicos, enge-

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nheiros, enfim especialistas de todos os tipos, os quais são altamente qualificados, e exigem uma boa remune­ração do mercado de trabalho.

Segundo MOTTA (1998), é esperado de empre­sas que possuam equipamentos mais aperfeiçoados e especialistas mais qualificados que levem vantagem so­bre aquelas empresas que não possam dispor disto. Assim, à medida que a tecnologia vai mostrando resul­tados (redução de custos e aumento de produtividade) as empresas tendem a se expandir ainda mais e a ocu­par o lugar daquelas menores e mal equipadas.

A automação favorece, também, a superação de obstáculos técnicos e administrativos ao crescimento e diversificação da ·empresa. Visto que não se pode es­quecer que é mais fácil controlar máquinas do que ho­mens, principalmente quando em grande medida estas se auto-controlam. Logo a tecnologia da automação se mostra precisar de menos mão-de-obra.

O mundo de hoje caracteriza-se por um ambi­ente em constante mudança. O ambiente que envolve as organizações é extremamente dinâmico, exigindo delas uma elevada capacidade de adaptação como con­dição básica de sobrevivência. O processo de transfor­mação organizacional começa com o aparecimento de forças que vêm de fora ou de algumas partes da orga­nização. A transformação organizacional é necessária sempre que a organização concorra e lute pela sobre­vivência em condições de desenvolvimento.

A tendência natural de toda organização (MOTTA, 1998) é crescer e desenvolver-se. O desenvolvi­mento é um processo lento e gradativo que conduz ao exato conhecimento de si própria e à plena realização de suas potencialidades. A eficiência da organização rela­ciona-se diretamente com sua capacidade de sobrevi­ver, de adaptar-se, de manter sua estrutura e tornar-se independente da função particular que preenche.

AS PESSOAS E AS MUDANÇAS

Todas as mudanças são incômodas para a mente humana, especialmente as que vêm acompanhadas de grandes perigos e de efeitos incertos - john Adams.

Tomemos as pessoas como operários, funcioná­rios e outros trabalhadores que precisam alterar seu comportamento a fim de que os objetivos da mudança possam ser atingidos. Eles são trabalhadores que rapi­damente serão afetados pelos resultados da mudança, são os responsáveis pela implantação da mudança; en­fim toda a parte humana da organização. Os mais afe­tados são aqueles diretamente envolvidos na efetivação dos propósitos das mudanças. Entretanto, todos os mem­bros da empresa têm de alterar tanto as atitudes como o seu comportamento, até certo ponto, antes que todos os benefícios da mudança possam se evidenciar.

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O efeito mais notório de qualquer mudança são as alterações objetivas efetuadas por aqueles que exe­cutam o trabalho, nas rotinas físicas, por meios das quais o trabalho é feito. Os efeitos das mudanças sobre a conduta levam as pessoas a alterarem a maneira como fazem seu trabalho.

O impacto da automação, ou mesmo de uma transformação organizacional, qualquer que seja ela, pode se configurar no fato de o trabalho ter se tornado perigoso para o aparelho psíquico do trabalhador, frente à oposição do mesmo, quando da livre atividade. Isso acarreta um fechamento da via de descarga psíquica, onde a energia psíquica se acumula (carga psíquica negativa), o que se transforma em uma fonte de tensão e desprazer, e se corporifica em um trabalho fatigante (DEJOURS, 1994)

O processo de interação entre as pessoas induz o surgimento das relações interpessoais. Em situações de trabalho onde existem atividades predeterminadas a serem executadas existem também interações e sen­timentos recomendados (comunicação, cooperação, respeito e amizade). Com o prosseguimento das ativi­dades e interações, os sentimentos suscitados nos pri­meiros momentos de contato (primeiras impressões) podem diferir, e então, inevitavelmente, os sentimen­tos influenciarão as interações e as próprias atividades. Dessa forma, sentimentos positivos de simpatia e atra­ção provocarão interação e cooperação, repercutindo favoravelmente nas atividades, o que produzirá maior produtividade. Da mesma forma, sentimentos negati­vos de antipatia e rejeição provocarão diminuição das interações, tendência de afastamento e menor comu­nicação, repercutindo de forma negativa nas ativida­des a serem desempenhadas com provável e previsível queda de produtividade.

Segundo BEATRIZ (1988), a competência técni­ca individual dos membros do grupo não está relacio­nada diretamente com o ciclo atividade a interações a sentimentos. Situações de trabalho ou influência do gru­po podem fazer com que profissionais competentes in­dividualmente possam render muito aba ixo de sua capacidade.

ORGANIZAÇÃO E COMUNICAÇÃO

Na medida em que uma informação bem trata­da vira comunicação, uma comunicação bem traba­lhada vira conhecimento. E este só é conhecimento quando residente, ou seja, captado, embalado e agre­ga valor. Comunicação como instrumento privilegiado de ação.

A comunicação configura-se como incor­poração, discursos dos vários outros que cada um é, resultado de vários universos. (BACCEGA, 1998 p.1 04).

Toda ou qualquer comunicação jamais é total­mente enfática. A significação que se dá a alguns ges­tos, a algumas palavras, deve sempre ser inserida nos quadros psíquicos de onde surgiram.

Acredita-se que a comunicação representa um processo construtivo, não simplesmente um trilho con­dutor de mensagens ou de idéias. Qualquer forma de diálogo exige um esforço específico na direção da cons­trução. De nada adianta apenas sentar junto para con­versar, se cada um dos lados permanece numa posição de defesa muito particular, entendendo que deve sem­pre partir do outro a postura da compreensão. Assim a linguagem, sozinha, não garante a comunicação, por­que deixa de lado sua implicação social.

Acredita-se, acima de tudo, que comunicação pressupõe a vontade de construir, não sozinho, mas em conjunto sempre. Não há crença fora do diálogo. Os encontros são ilimitados. É, segundo RODRIGUES (1997), uma relação fundamentalmente intersubjetiva; enraíza-se na experiência particular e singular dos interlocutores, fazendo apelo tanto à experiência indi­vidual como à experiência coletiva que entendem por em comum.

Trata-se de uma ação global de cunho sócio­educativo ou socializadora, voltada para mudanças na maneira de ser, de sentir, de ver e agir das pessoas, que buscam a adesão dos sujeitos. O conhecimento é a pró­pria capacidade de integração, de combinação das in­formações. O conhecimento organiza, operando sobre as informações.

Desde os primórdios a linguagem permeia a prática e a interação entre o homem e outros homens e ele mesmo; tanto a linguagem, assim como a consciência advêm da carência, da necessidade de interações do homem com outros homens. (MARX, 1985)

As atividades estão se interpenetrando, o que exige do ser humano uma alta rotatividade sobre o que deve e precisa saber/fazer/saber. Aprendizagem sendo entendida como um processo contínuo, proativo. Construir, destruir e reconstruir sempre sua realidade a partir de experiências ao mesmo tempo antigas e novas: a transformação de uma cultura. Tra­ta-se de um pensar em movimento, conforme diz MORIN (1997). Pensar que se apresenta como sendo um processo dinâmico de construção. Significando ir além do pensamento monolítico, fechado, estático, absoluto, ou seja, significando relação, mobilização, flexibilidade, criação. Diz que se faz necessário à percepção desta nova convivência do antigo e do novo, ou seja, é preciso ver o cenário com o seu para­doxo, combinatório.

Tem-se, ao mesmo tempo, um crescente do co­letivo convivendo com a apologia do individualismo, onde as relações são ornamentadas pela concorrência, por um mercado regulador do social, da ordem da cons­ciência (glorificação do capitalismo).

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Segundo RODRIGUES (1997), ( ... )é neste con­texto que a problemática comunicacional emerge no pensamento científico como quadro epistêmico desti­nado a dar conta das estratégicas discursivas, fluidas e plurais, que se jogam hoje no espaço público (pág. 13).

Tem-se segundo FOUCAULT (apud CAIAFA, 2000) a presença de uma "nova era da curiosidade", em que se exploram as imensas potencialidades das novas técnicas na direção da transformação, do aguçamento dos sentidos, do conhecimento. Procura-se afastar de um tipo de discurso que diz que tudo está mal, que vivemos um total vazio sem futuro. Ao contrário, acredito que há uma pletora. Não estamos sofrendo de um vazio, mas de meios inadequados para pensar sobre tudo o que está acontecendo (CAIAFA, 2000, pág. 61 ).

Todo esse processo, além de representar uma vi­são de futuro, deve representar a corporificação de uma dinâmica organizacional, ou seja, de um comportamen­to, algo que deve ser construído ao longo da história da organização, algo com raízes.

METODOLOGIA

O trabalho foi desenvolvido em uma empresa em fase de automação- uma lavanderia industrial, da cida­de de Londrina- PR. A empresa, vinculada ao ramo têx­til e de confecção, de médio porte, possuía um arsenal de maquinário de 48 unidades entre prensas, secadoras, lavadoras, centrífugas, ferros de passar e caldeiras.

Sujeitos

87%

96 %

Sexo

59%

Gênero

Turnos

Escolaridade

0% 0% 0%

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Tempo de serviço 83%

1 ou 1 . 4, 4 . 8, 8 - 13. menos

Anos de empresa

Figura 1 - Perfil da amostra pesquisada

A amostra total analisada foi de 62 sujeitos. Deste total, o gênero masculino, 87% dos sujeitos estudados, se caracterizou como uma constante e de grande pre-

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domínio no estudo, o que acaba por refletir a realidade da empresa. E uma inferioridade numérica do gênero feminino, 13% dos sujeitos.

Quanto à formação escolar dos sujeitos, a amos­tra representa também a realidade da empresa. Na amostra os sujeitos encontravam-se na faixa entre o ensino fundamental até o ensino médio (1 00% da amos­tra): 27% dos sujeitos concluíram seus estudos no ensi­no fundamental, 35% se encontram na faixa dos que não terminaram o ensino fundamental. Um quarto dos colaboradores caminha na faixa dos que ainda não con­cluíram o ensino médio (20%) e o restante concluiu o ensino fundamental (16%).

No que diz respeito aos turnos de trabalho, 55% dos colaboradores se encontram no turno das 7 às 15 horas (o 1 º turno da área de produção) e o restante dos colaboradores divididos entre os outros dois turnos (2º turno (16%)- 15 às 23 horas e 3º turno (1 6%)- 23 às 7 horas) da área de produção, e o turno próprio do setor administrativo (13%).

Quanto ao tempo de serviço o perfil dos colabo­radores se enquadra na faixa de 1 a 4 anos de tempo na empresa, visto ser quase a metade dos colaborado­res (45%). Há pouquíssimos funcionários antigos- aci­ma dos 13 anos na empresa (9%). Os colaboradores que estão na empresa há menos de 1 ano se enqua­dram como um pouco mais de um quarto (27%). Res­tando os colaboradores que estão na empresa no período de 4 a 8 anos (19%).

Resultados

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Políticas de RH

61% 59%

41%

82%

O Inadequado / Insatisfeito 1 lnsufK:iente

ISI Adequado I Satisfeito SufK:iente

70%

63%

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46%

37%

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Subcategorias

Figura 2 - Políticas de Recursos Humanos

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Como se pode observar no gráfico da figura 2, das 7 subcategorias estudadas, apenas a relacionada à organização e funcionamento do departamento pessoal fo i considerada como adequada (com 59% de aceitação, contra 41% de reprovação) . No quesito adequação de salário, 86% dos colaboradores mostraram-se insatisfeitos e 14% satisfeitos. Quanto à subcategoria oportunidades de promoção, 61% dos colaboradores consideraram insatisfatórias tais oportunidades, e 39% as consideraram satisfatórias. Em relação à remuneração satisfatória, os colaboradores, em sua grande maioria (82%), disseram-se insatisfeitos com sua remuneração, enquanto que 18% disseram-se satisfeitos com ela; 70% dos colaboradores pensam ser insuficientes os benefícios disponibilizados pela empresa, enquanto que 30% pensam ser suficientes tais benefícios . Quanto à satisfação com tais benefícios, 63% dos colaboradores consideram insatisfatórios, e 37% consideram satisfatórios. A respeito do treinamento ofertado pela empresa, 54% dos colaboradores consideraram insuficiente, e 46% consideraram suficiente a oferta de treinamento.

Sob a ótica destas categorias e destes percentis fica notório um aspecto negativo nesta categoria ana­lisada.

94%

Relações Pessoais

Relacionamento

94%

Colaboraçao/Ciima

Subcategorias

~ Insatisfeito/Fechado

(!l Satofeito/Aberto

PartiOpação'Oedsão

Figura 3 - Relacionamentos

No gráfico da figura 3, três subcategorias foram estudadas. A subcategoria relações pessoais dentro do contexto da empresa mostrou que 94% dos entrevista­dos consideraram satisfatórias as relações interpessoais e apenas 6% mostraram-se insatisfeitos. Com a mesma estatística (94% I 6%), a subcategoria Colaboração e clima de trabalho apresentou-se. E na subcategoria participação nas decisões: 69% colaboradores consi­deraram haver abertura para tal, e 31% discordaram, afirmando não haver abertura.

De maneira geral, no que diz respeito aos rela­cionamentos existentes no ambiente de trabalho, a em­presa demonstra um aspecto positivo.

94% 90%

10%

~ 6%

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Trabalho em SI

100% 100% 94%

89%

54%

46%

~ 6%

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Subcategorias

IS!Insatisfeito/Facititador/ lmposs~eVOiSCO«!o

D Satisfe ito/Di f~uHanle/ Sempre/Concordo

87'1.

90%

73%

59% 56'11

44% 41%

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Figura 4 - Trabalho em si

No gráfico da figura 4 a categoria estudada foi trabalho em si, onde faziam parte 12 subcategorias. A primeira: trabalho do supervisor, 90% dizem-se satis­feito com o trabalho do seu supervisor, e 10% insatis­feitos. Quanto ao trabalho que realizam, 94% consideram-se satisfeitos, apenas 6% insatisfeitos. Em relação ao trabalho dos subordinados, todos os supervisores (1 00%) consideraram satisfatório o traba­lho dos seus subordinados. Em relação a sua vida den­tro da empresa: 100% dos colaboradores consideraram-na satisfatória. Em relação ao trabalho na empresa 94% dizem-se satisfeitos e 6% insatisfei­tos; 89% dos colaboradores consideram os processos de trabalho impostos pela empresa um aspecto facilitador para o desempenho de sua tarefa, e 11% consideram um aspecto dificultante; 54% dos colabo­radores concordaram com a afirmação de que podem usar seus conhecimentos prévios para melhorar o pro­cesso de trabalho, sendo que 46% discordam de tal afirmação; 59% dos colaboradores afirmaram serem reconhecidos pelo bom desempenho de seu trabalho; 41% discordaram. Quanto à divisão das tarefas, 73% dos colaboradores consideraram que ela é feita igual­mente, enquanto que 27% discordam.

Revista de Psicologia, Fortaleza, V.20(2), p. 71·81, jul./dez. 2002 H

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Comunicação

66%

Subcategorias

Figura 5 - Comunicação

~ Nunca Consuna

[J Sempre Consuna

Como observado no gráfico acima, 66% dos co­laboradores afirmaram que a empresa não os consulta quando deseja implantar novas regras e normas; 34% afirmaram que a empresa os consulta. A maioria, ou seja, 58% dos colaboradores também afirmaram que a empresa não dá abertura aos funcionários quanto a novas idéias e opiniões dos mesmos para a melhoria da empresa. Esses resultados evidenciam que, de modo geral, a comunicação não ocorre de maneira a facilitar o dia-a-dia da empresa.

92%

Comunicação entre funcionários

Fluxo de Trabalho I

Subcategorias

Figura 6 - Fluxo de Trabalho I

O gráfico acima mostra que 92% dos colabora­dores afirmaram que a comunicação entre os funcio­nários durante a execução das tarefas acontece de forma rápida. Somente 8% discordam dessa afirmati-

1&!1 Revista de Psicologia, Fortaleza, V.20(2), p. 71-81, jul./dez. 2002

va. No que diz respeito aos prazos para execução das tarefas, 62% dos colaboradores afirmaram serem es­tes suficientes, enquanto 38% discordaram e afirma­ram serem muito curtos.

3%

Fluxo de Trabalho li

75%

Volume de Trabalho Subcategorias

[J Extrema/e Reduzido

!Si] Razoável

11 Excessivo

Figura 7 - Fluxo de Trabalho 11

No gráfico acima foi investigado o volume de trabalho, no qual se verificou que 75% dos entrevista­dos afirmaram que este é suficiente, ou seja, razoável; 22% dos colaboradores afirmaram ser excessivo e so­mente 3% disseram ser muito reduzido.

97%

A empresa sempre oferece equipamento

Acidente de Trabalho

Subcategorias

~ Nunca olereceflalha humana

[J Sempre oferecellalha equipamento

acidentes por falta equipamentos

Figura 8- Acidentes de Trabalho

O gráfico 8 mostra que 97% dos colaboradores afirmaram que a empresa sempre oferece equipamen­tos de segurança. Somente 3% afirmaram que nem sem-

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RevistadePsicologia~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~B_r_u_n_o_s_r_~_m_a_n_d_i_n_o_H_M_o_r_e_n_o

pre há disponibilidade destes equipamentos; 93% dos entrevistados também afirmaram que os acidentes de trabalho ocorridos na empresa são decorrentes de fa­lhas humanas; 7% afirmaram ocorrerem por falta de equipamento de segurança.

Ambientes Físicos

Iluminado I Arejado

Subcategorias

Figura 9 -Ambiente Físico

~ Discordo lotaVa

[] Concordo lotaVa

De acordo com o gráfico acima, 85% dos entre­vistados concordaram que o ambiente físico de traba­lho é bem iluminado e arejado. Outros 15% da amostra entrevistada discordaram.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Todo o trabalho desenvolvido na realização deste estudo pautou-se pelas recentes práticas da psicologia organizacional dentro de uma empresa. A nova era do conhecimento e da informação aponta para uma sociedade onde o mundo do trabalho sofre alterações significativas, com o uso intensivo de novas tecnologias. O emprego dessas facilidades e a sua utilização coerente dependem da evolução moral da humanidade, ou seja, chega-se a um estágio evolutivo da tecnologia que não é compatível com o estágio evolutivo da sociedade humana.

No mundo que tende continuamente para a globalização é fundamental o reconhecimento das pes­soas como o principal diferencial competitivo das em­presas e das nações, e isso depende de uma nova visão do ser humano, por conseguinte, das sociedades, das empresas, dos clientes e consumidores, levando a uma construção ética de um novo desenho de trabalho.

Se a ameaça é, atualmente, uma constante em todos os negócios, as oportunidades surgem como nunca antes visto, permitindo aos inovadores e criativos a sua própria imaginação como limite, pois nunca estiveram tão em voga os empreendedores. Para pegar e manter­se no veloz trem da história, de todos exigem-se novas atitudes/estratégias frente à vida, agora mais do que nunca, aprender a aprender, aprender a empreender, tornaram-se sinônimo de sobrevivência.

A capacidade de adaptação, a aprendizagem, a criatividade e a flexibilidade tornam-se valores im­prescindíveis a todos que desejam trabalhar. O traba­lho torna-se, cada vez mais, urna atividade intelectual. A empresa é o lugar de se atrair e manter talentos estra­tegicamente, seja a distância ou presencialmente.

Um desafio imenso à frente da psicologia de um modo geral e da psicologia organizacional em particu­lar é responder à questão: como as identidades das pessoas vêm sendo afetadas se a flexibilidade do traba­lho requer identidades menos atadas, por exemplo, às empresas ou às ocupações? Que identidades se desen­volvem e como elas moldam as percepções e as chances que se tem no mercado? Outro grande desafio interno à psicologia organizacional é tentar redefinir seus pressupostos de trabalho a partir das noções trazidas e levantadas pelo pensamento dito pós-moderno, princi­palmente aqueles que se referem aos questionamentos da noção de verdade, de epistemologia e de mente. Além disso, é fundamental entender como as alterações no mundo do trabalho podem ser conectadas com mudan­ças mais gerais, tais como mudanças na forma de subjetivação, mudanças na família, na cultura e tam­bém na política.

A organização do trabalho que fragmenta as ta­refas e os trabalhadores, as características da subjetivi­dade moderna, individualista, atravessando a rede de relações nas empresas, a subjetividade produzida no Brasil desde os anos de 1960/70, anos autoritários e desqualificadores dos movimentos sociais (COIMBRA, 1992), exigem mais que mudanças conjunturais para seu enfrentamento. LA BOÉTIE (1982) diz que a insta­lação da tirania no lugar da liberdade exclui a lem­brança da liberdade e, por conseguinte, o desejo de reconquistá-la. Toda sociedade dividida entre tirano e súditos está, portanto, fadada a durar. Na empresa em que se diz que seus membros devem decidir, espera-se voluntariamente pela tutela dos tiranos, dos que sabem ou deveriam saber para dizer-nos o que fazer.

Os trabalhadores da empresa queixavam-se da falta do cumprimento de promessas feitas pela direção e pediam pelo cumprimento das mesmas e de novas e melhores soluções administrativas para suas insatisfa­ções. E queixavam-se também da falta de solidarieda­de entre turnos, de trabalho coeso, compartilhado.

Há um entrave pessoal na relação dos colabora­dores com o trabalho- os resultados tendem a ser ne­gativos, podendo se estender a diversos âmbitos. A esses

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perigos não estão expostos só os funcionários, mas os patrões e até a organização como um todo. Para o su­jeito, isoladamente, pode resultar desde psicopatologias como depressão, a doenças psicossomáticas como pro­blemas cardiovasculares ou gastrointestinais.

Os colaboradores, bem como as chefias e a direção tornam-se agentes sempre abertos, dispos­tos a prover o local - o topos - para um contínuo intercâmbio de discursos (já que as tecnologias de informação são constituídas mediante trocas simbó­licas que operam sob um substrato eletrônico- e não mais corporal) .

A anterior representação de um sujeito moral ou organizacional substitui-se agora pela representação de um sujeito virtual que se torna um operador. SOTTO (1998) ainda ressalta que uma identidade on-line é mais susceptível de ser manipulada do que uma que não o é. Ao contrário da antiga identidade, presa a um corpo e dele dependente, com a identidade terminal qual­quer corpo pode operar redes de informação. O corpo, o suporte físico, tornar-se-ia algo dispensável, redun­dante ou mesmo prescindível diante dos fluxos da base eletrônica. É dessa nova dinâmica que surgiu dentro da empresa (onde as pessoas vêm-se inseridas) a con­vivência com novos ambientes, layouts, modelos para as coletividades, modelos baseados na arquitetura das redes de comunicação virtual.

Uma coisa parece certa: as mudanças trazidas pelas tecnologias da informação, e por todos os desdo­bramentos que foram- são e ainda serão- a elas con­tingentes, têm trazido grandes modificações na forma do pensamento das pessoas dentro da empresa. Mais do que isso: a base eletrônica que subjaz às novas mo­dalidades de construções subjetivas, naturalmente in­cluindo a identidade, põe em xeque a antiga filosofia transcendental do sujeito. Aqui reside o mérito do tex­to de SOTTO (1998), onde essas transformações não se isolam em pequenas ilhas específicas, como no caso das interações humanas, ou mesmo no caso dos cha­mados estudos de organizações. O que podemos pen­sar é que o ato de organizar, de representar o mundo e hierarquizá-lo em sistemas de valores e de trocas simbólicas, vem cada vez mais colocando ênfase nas rápidas transformações e numa subjetividade quase rasa, isto é, feita de arranjos pontuais, circunscritos e transitórios. Nada mais é certo, nada mais permanece no tempo como algo imutável. O desenvolvimento da empresa é um exemplo berrante desta mutabilidade. Durante seus 13 anos de existência, a empresa obteve um aumento de espaço físico, bem como nas maneiras de atuar e oferecer seus serviços totalmente modifica­dos e adaptados para a realidade da época.

O futuro do trabalho aponta para empresas pe­quenas e médias, como o caso da empresa estudada, para profissionais trabalhando como especialistas em um grande número de funções nas organizações. Nossa em­presa, não diferente das demais, busca a mão-de-obra

IIil Revista de Psicologia, Fortaleza, V.20(2), p. 71-81, jul./dez. 2002

de que necessita contratando pessoas que trabalham via contrato a curto prazo para executar tarefas e projetos específicos. Desta forma, a empresa pode manter uma flexibilidade e rotatividade, com a finalidade de se adap­tar às rápidas mudanças que ocorrem no mundo. As mudanças que acontecem neste momento e aquelas que estão sendo previstas para o futuro estão gerando um aumento no nível de tensão profissional.

Um dos caminhos mais utilizados pelas empre­sas para esta panela de pressão é a criação de condi­ções a partir das quais os conflitos sejam trazidos à tona e adequadamente conduzidos. O objetivo da em­presa deveria ser o de levar a organização a ver o con­flito como uma condição inevitável e como problemas que precisam ser trabalhados antes que possam ser to­madas as decisões adequadas (CHIA, 1998).

Claro que trazer tais conflitos à tona não é um trabalho fácil, visto que a empresa tenta com grandes esforços encobri-los, não aceitando de forma tranqüila reconhecer sua parcela neste processo. Foi isso que ocorreu ao serem desenvolvidos a intervenção e os re­sultados da mesma. As pessoas de um modo geral, tan­to a diretoria, como as da linha de produção, sempre agiam de modo esquivante, na maioria das vezes res­ponsabilizando tais conflitos às outras pessoas, outros setores. Fica evidente aqui perceber um conformismo e comodismo acentuado.

Todo o presente estudo manteve sempre o ca­ráter exploratório enfatizando o trabalho humano mo­bilizado na organização como um todo. No caso de uma fábrica automatizada, como a lavanderia estu­dada, não foi diferente, o foco se deu na atuação do trabalhador o qual surge como elemento auxiliar, pre­sente apenas para atuar onde a máquina não pode alcançar. Porém, mesmo uma empresa relativamente automatizada está disposta (arranjada/ organizada) segundo um plano determinado pela sua função (CAR­VALHO & SERAFIM, 1995).

Os colaboradores da pesquisa, como expoentes de indivíduos cujo modo de executar o trabalho foi abruptamente transformado pela tecnologia, viram nes­tas modificações um ameaçador impacto nos seus sa­lários, modo de vida e de enxergar o trabalho. Todavia, não estão todos os colaboradores preparados, tanto em termos de capacidade profissional, como psicologica­mente para o novo. Diante às transformações advindas com os novos tempos, cabe às subjetividades dos cola­boradores se reconfigurarem, o que não acontecem com muitos, visto que tais reconfigurações mostram-se, cer­tamente, atravessadas pela questão do trabalho e do tempo, paradigmáticos nos modos de viver e de subjetivar contemporaneamente.

O processo investigatório e de intervenção trou­xe aos pesquisadores grande satisfação pela obtenção e alcance de todas as metas estabelecidas em todo o processo (Programa Saúva- Equipes Dinâmicas- vide anexo); e também para a direção da empresa, que pôde

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ver concretamente suas necessidades sanadas (redu­ção de indenizações e melhoria na comunicação entre os colaboradores). Porém não se sabe quantificar o ta­manho da redução alcançada, visto que a própria empre­sa não retornou tal informação, o que conseqüentemente impossibilitou a completa execução do Programa Saúva -Equipes Dinâmicas, ou seja, o não retorno dos resul­tados aos colaboradores e a não entrega da bonificação a quem de direito.

Pretendeu-se enfatizar ao final de nosso traba­lho a importância da Psicologia e do psicólogo (como seu representante) dentro de uma organização; pois toda a organização é composta por indivíduos diversos e totalmente únicos. Enfim, para aqueles que anseiam em melhorar suas relações com a situação de trabalho, existem recursos técnicos disponíveis. A Psicologia é um deles que, tanto a nível individual quanto institucional, muito tem a contribuir para que a rela­ção do sujeito com o trabalho promova saúde, gratifi­cação pessoal e, conseqüentemente, produtividade. Só quando se considera o sujeito humano é que se pode dizer "O trabalho dignifica o homem!"

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