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ANAIS DO III ENCONTRO CIENTÍFICO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança e(m) Política Maio/2013 http://portalanda.org.br/index.php/anais 1 RELAÇÕES ENTRE CORPO E PODER A PARTIR DE UMA VISÃO CRÍTICA DO BALÉ CLÁSSICO FLÁVIA SCHEYE SPIRÓPULOS (USP) RESUMO Pretendemos investigar relações entre corpo e poder a partir de uma visão crítica do balé clássico que se estruturou como modelo da formação em dança em nosso país. A bailarina Zélia Monteiro propõe outras relações, deslocando o foco do treinamento dos passos que atuam como modelo na técnica clássica para o processo que ocorre no corpo durante o movimento. Katz & Greiner (2001, 2003, 2004, 2005, 2007, 2009, 2010), Vieira (2006, 2008), Teixeira (2012), Foucault (1979, 1987) e Agamben (1993, 1995) são os autores que dialogam com a pesquisa, explicitando que os ambientes estético, pedagógico, social e político se imbricam por meio de toda e qualquer ação, fazendo-se necessário deter o olhar sobre essa rede complexa quando tratamos de dança. PALAVRAS-CHAVE: Dança, Balé Clássico, Zélia Monteiro, Corpo, Poder. RELATIONS BETWEEN BODY AND POWER FROM A CRITICAL VIEW OF CLASSICAL BALLET ABSTRACT We intend to investigate the relationship between body and power from a critical view of classical ballet that was structured as a model of dance training in our country. The ballerina Zelia Monteiro proposes other relationships, shifting the focus of the training steps that act as a model in the classic technique for the process that occurs in the body during movement. Katz & Greiner (2001, 2003, 2004, 2005, 2007, 2009, 2010), Vieira (2006, 2008), Teixeira (2012), Foucault (1979, 1987) and Agamben (1993, 1995) are the authors that dialogue with research, explaining that the environments aesthetic, educational, social and political intertwine through any and all actions, making it necessary to hold the look on that network when dealing with dance. KEYWORDS: Dance, Classical Ballet, Zélia Monteiro, Body, Power.

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ANAIS DO III ENCONTRO CIENTÍFICO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança e(m) Política – Maio/2013

http://portalanda.org.br/index.php/anais 1

RELAÇÕES ENTRE CORPO E PODER A PARTIR DE UMA VISÃO CRÍTICA DO BALÉ CLÁSSICO

FLÁVIA SCHEYE SPIRÓPULOS (USP)

RESUMO Pretendemos investigar relações entre corpo e poder a partir de uma visão crítica do balé clássico que se estruturou como modelo da formação em dança em nosso país. A bailarina Zélia Monteiro propõe outras relações, deslocando o foco do treinamento dos passos que atuam como modelo na técnica clássica para o processo que ocorre no corpo durante o movimento. Katz & Greiner (2001, 2003, 2004, 2005, 2007, 2009, 2010), Vieira (2006, 2008), Teixeira (2012), Foucault (1979, 1987) e Agamben (1993, 1995) são os autores que dialogam com a pesquisa, explicitando que os ambientes estético, pedagógico, social e político se imbricam por meio de toda e qualquer ação, fazendo-se necessário deter o olhar sobre essa rede complexa quando tratamos de dança. PALAVRAS-CHAVE: Dança, Balé Clássico, Zélia Monteiro, Corpo, Poder.

RELATIONS BETWEEN BODY AND POWER FROM A CRITICAL VIEW OF CLASSICAL BALLET

ABSTRACT We intend to investigate the relationship between body and power from a critical view of classical ballet that was structured as a model of dance training in our country. The ballerina Zelia Monteiro proposes other relationships, shifting the focus of the training steps that act as a model in the classic technique for the process that occurs in the body during movement. Katz & Greiner (2001, 2003, 2004, 2005, 2007, 2009, 2010), Vieira (2006, 2008), Teixeira (2012), Foucault (1979, 1987) and Agamben (1993, 1995) are the authors that dialogue with research, explaining that the environments aesthetic, educational, social and political intertwine through any and all actions, making it necessary to hold the look on that network when dealing with dance. KEYWORDS: Dance, Classical Ballet, Zélia Monteiro, Body, Power.

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Introdução

Em sua emergência como uma dança institucionalizada, o Balé Clássico

se consolidou de forma diretamente relacionada ao discurso de poder de seu

entorno que, em seu contexto de origem, dizia respeito ao governo do rei Luís

XIV.

Apresentando grande eficiência adaptativa, o Balé evoluiu e se

transformou ao longo do tempo; também se expandiu como forma de

conhecimento, ganhando projeção e características diversas entre muitos

lugares no mundo.

Então, quando olhamos para a produção desta técnica nos dias de hoje,

é importante ressaltar que existem inúmeras abordagens diferentes sobre seu

ensino e prática.

Este artigo é parte da pesquisa de mestrado, ainda em andamento,

realizada sob a orientação da profa. Dra. Maria Helena Franco de Araújo

Bastos no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas, Escola de

Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, com o apoio da CAPES,

com o objetivo de investigar e discorrer sobre o trabalho da artista Zélia

Monteiro.

Partindo do entendimento que corpo só existe e sobrevive em um

determinado ambiente, sendo sua sobrevivência dependente desta relação

(KATZ & GREINER, 1998), este texto pretende exaltar o fato de que toda forma

de saber delimita, necessariamente, um campo de poder (FOUCAULT, 1979)

e, portanto, quando pensamos em dança, a relação estabelecida entre o corpo

e suas ações no mundo implicam em atitudes e posturas que extrapolam o

âmbito artístico, repercutindo diretamente na esfera política. Particularmente,

quando falamos sobre ensino em dança, devemos considerar que o aluno está

entrando em contato com toda esta complexa rede de conhecimento, e pensar

o que e de que forma lhe será ensinado.

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Zélia Monteiro propõe a prática da técnica clássica por meio de uma

relação sensível com o corpo de cada indivíduo. Suas aulas de balé abordam

todo o vocabulário específico desta técnica, apoiando-os sobre o conhecimento

da estrutura e funcionamento do corpo. As relações com o outro e com o

espaço emergem desse ambiente.

Acredita-se que sua proposta proporciona uma prática em dança

baseada na autonomia do indivíduo em relação ao seu próprio corpo e que

esse tipo de abordagem é bastante interessante para se pensar a formação em

dança em nosso país.

Institucionalização do Balé Clássico e alguns de seus desdobramentos

O balé clássico nasceu nos salões de baile das cortes renascentistas

européias, ganhando força e projeção na França, durante o reinado Luís XIV

de 1643 a 1715, quando passou a ser organizado, sistematizado e apresentado

como espetáculo público.

Luís XIV(1638-1715), o Rei Sol, considerado o maior rei do período

absolutista, foi capaz de construir uma imagem pública cobiçada em torno da

sua atuação na corte de Versailles (BURKE, 1994). Como exímio bailarino que

era, Luís XIV se utilizou da dança como recurso de governo, representando sua

atuação na corte. “O balé de corte é uma forma teatral de organizar, em

símbolos, as relações sociais” (MONTEIRO, 2006: 37), sendo “o próprio rei o

integrante mais importante da trupe” (TEIXEIRA, 2012: 41) e, escolhendo os

dançarinos que o acompanhariam em tal empreitada, a pirâmide hierárquica do

governo era explicitada nesses espetáculos. Saber dançar, portanto, podia

possibilitar maior proximidade com o rei. Caracterizando aquele que estaria, ou

não, em destaque, o balé se tornava um meio para a ascensão social: um

instrumento de poder.

De acordo com o filósofo Michel Foucault (1979), todo campo de saber

delimita também um campo de poder e vice-versa − as duas ações estão

implicadas mutuamente. O autor define que nos séculos XVII e XVIII ocorre na

Europa um fenômeno que dá à luz uma “nova mecânica de poder” que “apoia-

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se mais nos corpos e seus atos do que nas terras e seus produtos”

(FOUCAULT, 1979: 187, 188). Este tipo de poder que se instaurava

diferenciava-se dos outros, pois, uma vez que seu dispositivo se localizava no

corpo, não era mais necessário um esquema de vigia e cobranças; o próprio

sujeito, regido por interesses ou repressões políticas e sociais, passava a

regular suas ações de acordo com as regras vigentes. Pode-se dizer que o

balé, no contexto em que se organiza como uma técnica de dança estruturada,

foi um desses dispositivos de poder ligados diretamente aos interesses do

governo monárquico. Era, portanto, necessário criar um “selo oficial”

(TEIXEIRA, 2012), de conhecimento, que justificasse o fato de que somente

um determinado grupo de pessoas teria acesso ao saber dessa dança, além de

regulamentar os modos pelos quais se dariam tal acesso.

Outra parte da burocratização das artes foi a montagem do sistema de academias, o equivalente nas artes do sistema de colégios que estava se desenvolvendo sob governos europeus no século XVII. Colbert não se limitou a fundar academias; regulamentou o comportamento de seus membros. Os da Academie Française, por exemplo, receberam horários fixos de trabalho, juntamente com um relógio de pêndulo, para garantir que seu sentido de tempo seria tão preciso quanto desejava o ministro (BURKE apud TEIXEIRA, 2012: 38).

A ação de Colbert, ministro de Luís XIV, garantia o funcionamento da

academia a partir de leis que relacionavam diretamente o tempo com ações.

Em Vigiar e Punir, Foucault (1987) apresenta o conceito de disciplina

que diz respeito, justamente, ao modo de regulamentar uma ação, feita pelo

corpo humano, relacionando-a com o tempo e espaço, de forma que o modo

como é feita seja garantido por essas regras. De acordo com este conceito, o

relógio de ponto da academia de dança francesa disciplinava o comportamento

dos funcionários, dizendo o que fazer, quando fazer e por quanto tempo.

A primeira academia de dança oficial foi inaugurada na França, em

1661, sob o nome de L'Académie Royale de Danse (“Academia Real de

Dança”) com o objetivo de dar legitimidade à dança produzida nesse contexto.

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Privilegiando o bailarino com formação técnica, a Academia Real de Dança garantiria seu posicionamento artístico perante as outras artes da corte, mas, em contrapartida, o vínculo se associava diretamente aos desígnios do rei. Era para ele que os bailarinos dançavam, eram eles que evidenciavam “Sua Majestade” e assim, a autonomia dos artistas continuava a mercê de autoridades (TEIXEIRA, 2012: 41).

Mesmo havendo a separação entre bailarinos profissionais e não

profissionais, e tendo o balé se transferido dos salões de baile para o palco,

“encontrava-se preservada a sua razão política de perpetuar, como algo

incontestável, a relação de dominância da realeza sobre a sociedade”

(HERCOLES, 2005: 50). Jean-Georges Noverre (1727-1810) propõe uma

mudança neste sentindo, dando ênfase à interpretação dos bailarinos em

coreografias dramáticas, nos seus Balés de Ação. Contudo, suas contribuições

estéticas só foram reconhecidas num momento posterior; em sua época,

Noverre não recebeu o apoio que precisava para propagar suas ideias

revolucionárias, pois, segundo a pesquisadora Rosa Maria Hercoles (2005),

elas vinham com a força que poderia desestabilizar a continuidade política da

realeza.

No século XIX, depois da Revolução Francesa de 1830, a Ópera de

Paris se desvincula do poder da corte passando a refletir o triunfo da

burguesia em suas produções. Durante esse período, a escola acadêmica

francesa se expande por toda Europa e Rússia.

A Revolução Francesa deslocou para as províncias muitos dos dançarinos e dos mestres de balé, a dispersão destes artistas foi extremamente benéfica para a arte do balé. Londres passou a ser um polo para artistas de todas as Escolas, destacando-se a participação de Charles Didelot (1767-1836), aluno de Jean Dauberval e de Jean Georges Noverre, que atuou em Londres na temporada de 1788-9. Suas experiências o levaram a pavimentar o caminho para o surgimento do balé de elevação, um dos traços marcantes do balé romântico, e para a fundação de uma escola distinta de balé clássico na Rússia (HERCOLES apud LAWSON, 2005: 90).

A figura central desse período é Marius Petipa (1818-1910), que, no ano

de 1847, é contratado como primeiro bailarino de São Petersburgo, onde,

depois, seguiria como o mestre de balé e coreógrafo. Petipa atendeu o desejo

da sociedade russa da época por obras mais fáceis, com execução brilhante,

em torno de estrelas femininas: “Petipa adotará o hábito de rechear seus balés

com episódios que nada têm a ver com o assunto, mas que são pitorescos,

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sem perceber que transformava o balé de ação de Noverre numa super-revista

dançada, do tipo grande espetáculo” (BOURCIER, 2001: 217).

A partir de 1887, a escola italiana irrompe na Rússia, disseminando um

modelo de balé mais virtuoso e formal. Sua figura central é Enrico Cecchetti

(1850-1927), professor e bailarino, que, em 1902, se juntou a Serge Diaghlev

(1872-1929), formando seus principais bailarinos.

Diaghlev foi um empresário e importador da dança. Conseguiu reunir

nos seus Balés Russos (1909-1929), criado em 1908, grandes nomes não só

da dança (Fokine, Nijinsky, Massine, Nijinska, Balanchine, entre outros) mas

também da música (Stravinsky, Satie, entre outros) e artes plásticas (Picasso,

Matisse, entre outros). A companhia se configura com caráter itinerante, o que

exige a produção de balés mais curtos, com cenários mais simples,

significando uma grande transformação no âmbito estético do balé. Entre seus

coreógrafos estava Fokine, interessado em uma estética que discutisse a

expressividade ligada ao corpo que dançava, e não nos adereços e libretos

necessários para contar as histórias dos balés narrativos. Segundo Hercoles,

coube a esse coreógrafo a ruptura com a estética vigente até então:

Creio que tenha chegado à conclusão que a dança, assim como a poesia, não é o meio mais adequado para se contar histórias, embora não explicite esta ideia em seu discurso. O Sr. passou a se interessar em narrar acontecimentos em um único ato, inaugurando um novo formato, onde seu desejo de comunicar as emoções e os sentimentos, provocados pelo ato de dançar, podia se realizar. (...) Coube ao Sr. a reforma não só das estruturas coreográficas, mas também, de todo o pensamento romântico em dança. Seu rompimento com o excessivo formalismo acadêmico possibilitou o surgimento do balé moderno. Historicamente, lhe coube esta transição. Em outras palavras, estava rompido o contrato do corpo como legenda de algo que se passa além dos limites de sua carne (HERCOLES, 2005: 82, 84).

A partir deste breve histórico, pretende-se chamar a atenção para a

evolução dos âmbitos político, estético e pedagógico, que acontece sempre de

forma concomitante, pois são imbricados um no outro. A autonomia que os

sistemas desenvolvem para permanecer no tempo reúne fenômenos relativos

às diferentes instâncias que se cruzam, propagando sua existência relativa ao

ambiente com que troca suas informações.

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O Modelo Importado na Formação em Dança no Brasil e o Discurso de

Poder que Ele Carrega

Em sua tese de doutorado, Ana Teixeira (2012) investiga as instâncias

de dança públicas brasileiras e afirma que “mantém-se uma relação estreita,

nos dias de hoje, com o pensamento produzido no Brasil colônia quando se

refere à importação de modelos artísticos no contexto da dança oficial”

(TEIXEIRA, 2012: 30). A autora defende que nossas raízes coloniais, mais o

quadro político do local onde essas companhias e academias são geridas,

atravessam os corpos que dançam e atuam nesses lugares, comprometendo o

entendimento de dança que ali se produz. Teixeira nos mostra que essa

tradição vem permeando toda a institucionalização da dança brasileira, desde a

chegada da coroa portuguesa no Rio de Janeiro, encontrando reverberações

até os dias de hoje.

Quando a corte portuguesa desembarca no Brasil, em meados de 1800,

a cidade de Rio de Janeiro passa por uma revolução cultural. Além dos hábitos

e costumes europeus que passam a ser incorporados, incluindo um

determinado padrão artístico, os portugueses investiram também em

construções de teatros e academias, todas de acordo com o modelo europeu.

A construção de um cenário adequado a tal padrão exigia, num primeiro

momento, a atuação dos próprios profissionais de dança com naturalidade

européia. Muitos imigrantes fixaram residência no Brasil a fim de educar o povo

brasileiro no seu gosto pelas artes.

Um século depois, em 1927, ainda de acordo com esta ideia, é criada a

primeira escola oficial brasileira de formação em dança. A russa Maria Olenewa

(1896-1965) deu início à Escola de Bailados do Theatro Municipal do Rio de

Janeiro. Em 1982, a escola adotou o nome de sua mentora e passou a se

chamar Escola Estadual de Dança Maria Olenewa.

Olenewa iniciou seus estudos em Moscou e, em 1916, foi para Paris

onde começou a dançar com a companhia de Ana Pavlova. Em 1918 conhece

o Brasil em tourneé com essa companhia e, mais tarde, retorna, em 1921, com

Léonide Massine, mudando-se para cá, definitivamente, em 1926. Um ano

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depois fundaria a escola no Rio de Janeiro, na qual permanece como diretora

até 1942, quando é afastada do cargo e muda-se para São Paulo, assumindo a

direção da Escola Municipal de Bailado, que havia sido fundada em 1940,

também com a direção artística de um bailarino russo, Vaslav Veltchek (1897-

1967). Em 2011, sob a direção de Susana Yamauchi, essa escola pública

adota o nome de Escola de Dança de São Paulo e inclui em seu programa um

segundo eixo de formação, com mais ênfase em técnicas de dança moderna e

contemporânea.

É curioso notar que, desde sua primeira visita ao Brasil, pouco tempo se

passou para que Olenewa se transferisse para o país. É possível imaginar que

havia um cenário convidativo para bailarinas(os) que, com conhecimento

especifico em balé clássico, construído no exterior, estivessem interessados

em abrir mão de sua carreira e terra natal para virem se instalar nas grandes

cidades do país a fim de atuar como formadores desta técnica. Apesar disso, o

ambiente que encontravam aqui não era apoiado pelo governo e os artistas

precisavam dispor de seus próprios recursos para manter suas investidas.

Olenewa, por exemplo, teve que se desfazer de suas tapeçarias e joias para

manter a escola (ACERVO KLAUSS VIANNA).

Hoje, 86 anos depois de sua fundação, a escola ainda é um dos polos

mais significativos no ensino da técnica clássica, porém, quando se acessa o

site oficial da escola, pouco se sabe sobre como o Balé Clássico é ensinado

atualmente em seu programa:

A Escola oferece curso profissionalizante com aulas de Ballet clássico, pas de deux, repertório clássico, danças características, dança espanhola, ballet moderno, composição e improvisação, história da arte, história da dança, terminologia da dança clássica, educação musical, comportamento e atitude profissional. E, ao longo de sua existência, vem sendo responsável pela formação dos mais importantes nomes brasileiros que atuam no ballet, seja como bailarinos, coreógrafos, maitres no Brasil e no exterior (THEATRO MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO).

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Zélia Monteiro: Uma Proposta para o Ensino do Balé

Zélia Monteiro atua como artista, criadora e professora de dança,

principalmente em São Paulo. Teve formação em balé clássico, com Maria

Melô (1910-1993), italiana que se radicou no Brasil na década de 1970, e dava

aulas de balé baseadas na escola de seu professor, o italiano Enrico Cecchetti

(1850-1928). Zélia foi sua aluna e assistente, de 1977 a 1985. Depois trabalhou

durante 9 anos, de 1984 a 1992, ao lado de Klauss Vianna (1928-1992),

compartilhando seu interesse pela improvisação. Entre os anos de 1993 a 1997

atuou na França ao lado de Marie Madelaine Beziérs (Coordenação Motora),

Ivonne Berge (Improvisação para Crianças), Peter Goss e Mathilde Monnier

(Dança Contemporânea), entre outros.

Os cruzamentos dessas técnicas de dança no corpo da artista criaram

um entendimento que diz respeito ao processo do movimento no corpo e que

reverberam nas instruções que ela dispara nas aulas de balé que ministra,

assim como nos procedimentos que organizam suas criações.

O trabalho de Zélia compreende um corpo que se apresenta da forma

como se organiza. Quando realiza passos e sequências pré-existentes (como

na técnica clássica), ou quando improvisa (a pesquisa cênica da bailarina se

utiliza da improvisação como linguagem), nós vemos aquele corpo pensando

enquanto dança, isto é, atento às ignições de movimento que acontecem

naquele determinado momento.

Tal entendimento é coerente com a descrição que Helena Katz e

Christine Greiner propõem na Teoria Corpomídia (2001, 2003, 2004, 2005,

2007, 2009, 2010), que compreende o corpo como resultado de uma

determinada coleção de informações que se apresentam em materialidade um

determinado tempo/espaço. Essa coleção é resultado de trocas que o corpo

estabelece em relação com seu ambiente imediato. Corpo e ambiente são,

então, instâncias codependentes, que existem e se transformam sempre em

relação. A ação de um desses sistemas necessariamente implica no outro.

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Portanto, quando consideramos o Balé Clássico como um sistema em

relação com seu entorno, o modo como é executado, ou seja, como se realiza

esta determinada ação no mundo, implica em responsabilidades por suas

reverberações. Nesse sentido, quais ideias estamos propagando quando

ensinamos essa técnica de dança do modo como fazemos?

Em sua tese de doutorado, Teixeira nos traz o decreto municipal de São

Paulo n. 17.620, de 29 de outubro de 1981, e o estatuto do servidor público do

município de São Paulo, Lei n. 8.989, de 29 de outubro de 1979, vigentes até

hoje, que nos mostram os deveres dos bailarinos do Balé da Cidade de São

Paulo, e conclui: “Como se vê, a capacidade e a aptidão de um bailarino

funcionário público do município de São Paulo baseiam-se em cinco vocábulos:

assiduidade, disciplina, responsabilidade, capacidade de iniciativa e

produtividade” (TEIXEIRA, 2012: 71). Os vocábulos descritos por Teixeira

deveriam garantir que os bailarinos dessa companhia realizem sua função, que

é dançar.

A disciplina, ou método disciplinar, foi durante muito tempo vinculada ao

ensino do balé clássico. Como apresentado acima, Foucault (1987) define este

dispositivo e o vincula a um determinado contexto, no qual coabitava um

determinado modo de lidar com a dança. Desconsiderar essas informações

pode provocar entendimentos equivocados que atribuem à técnica clássica a

qualidade de ser, por si, disciplinar.

Alheia a esta ideia − que repercute na exigência de muitos professores

acerca da reprodução de formas ideias que cada passo ou posição de pés e

braços devem obedecer no balé −, Zélia afirma que o foco está justamente em

perceber o estado de atenção e de disponibilidade do corpo enquanto a dança

acontece. Seu interesse é pelo processo do movimento, suas instruções

consistem mais em como fazer, do que no que fazer e, deste modo, os passos

e as posições emergem como resultado do modo como o corpo se organiza.

O balé pode ser assim apresentado ao aluno como uma maneira de sentir, perceber e conhecer seu corpo e seu funcionamento, para que ele possa trabalhá-lo tecnicamente com base nesse conhecimento. Não precisa ser associado, como em geral o é, a um treinamento

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rígido imposto ao corpo, e, sim, introduzido, respeitando o processo individual e a constituição física de cada um. Visto por este enfoque, o balé é capaz de reorganizar padrões posturais desequilibrados, pois trabalha com alinhamento ósseo muscular, alongamento e fortalecimento de musculaturas fracas, adequando postura e coordenação […]. O trabalho de consciência aplicado aos exercícios de barra e centro traz para o aluno a noção de que o corpo que dança balé é o mesmo que vive e apreende o mundo e pode ser trabalhado dentro e fora da sala de aula (MONTEIRO, 2010: 95,96).

Assim, compreende-se a técnica não como uma ferramenta ou algo de

que se dispõe a priori ou independente da dança, mas como a própria ação

realizada de uma determinada maneira, que, ao se repetir, vai se refinando e

especializando. A técnica seria, dessa maneira, uma competência do corpo.

Conhecimentos de anatomia e cinesiologia fundamentam o trabalho pedagógico, onde a técnica é introduzida como uma maneira de sentir e conhecer o corpo e seu funcionamento. O trabalho, a partir desse conhecimento, promove um trânsito coerente entre técnica e percepção (sensível) da organização de seus movimentos. Os exercícios da barra são explorados de modo que o aluno consiga encontrar o alinhamento ósseo, o uso das alavancas e das musculaturas corretas para a realização dos movimentos e sequencias que serão feitos no centro e nas diagonais. Aos poucos, o aluno adquire a postura e a coordenação exigidas pela técnica do balé (CENTRO DE ESTUDOS E ENSINO DE BALÉ).

Esta abordagem dá importância à diferença de como cada pessoa se

apropria da técnica e transforma o conceito de repetição necessária para o

desenvolvimento da habilidade. Cada vez que se repete um plié, é realizado

um plié diferente, uma vez que o interesse ao realizar este passo está em

como o corpo se organiza a fim de tentar reproduzir este modelo ideal. Fica

claro que cada corpo se move de uma determinada forma apesar de se basear

em um modelo comum.

No trabalho corporal, a aprendizagem, muitas vezes, é compreendida como treinamento para excelência na repetição de movimentos codificados, na reprodução de um vocabulário padronizado. Mesmo nesse caso, pode-se notar a maneira como cada corpo se organiza para cumprir a tarefa de aprender e reproduzir o movimento aprendido. A diferença individual aparece (NEVES, 2008:71).

Para Katz, a questão da repetição também é entendida como um

processo em constante transformação:

Um processo de repetição não se dá sem minúsculas diferenças a cada repetição. E a repetição com essas minúsculas diferenças, a

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certa altura, produz uma diferença que se nota. As várias qualidades de informação que um corpo produz e abriga não são compartimentadas e estanques, mas se comunicam e se relacionam. Assim, um processo de repetição também está modificando todo o resto, que não está sendo especificamente repetido (KATZ, 2005:39).

Portanto, no trabalho de Zélia Monteiro, a consciência do corpo em

movimento perpassa e modifica o entendimento do treinamento de balé,

permitindo uma discussão acerca de seus modos de ensino, considerando uma

abordagem preocupada com a organização do corpo em ação. A prática que a

artista propõe aproxima a dança clássica do estado de atenção necessário às

práticas corporais investigativas, fazendo com que o treinamento repetitivo com

fim em si mesmo perca o sentido (pois é feito sem sentir).

Como ensinar a dança? Bom, eu mudei muito minha maneira de ensinar dança depois que conheci o Klauss, trabalhei com ele. Hoje em dia, no trabalho que faço, procuro trazer um pouco o aluno para o corpo dele, ou trazer o corpo do aluno para ele mesmo. Aproximar um pouco o corpo da pessoa. Considero, assim, uma didática aberta, porque... não é que eu ensine alguma coisa, mas é um trabalho de sensibilizar, de procurar, ir sugerindo. Você vai, através de algumas diretrizes, sugerindo, para que ele comece a perceber o corpo, como esse corpo se move, como ele sente o corpo. Essa ruptura que falei de antes e depois do Klauss foi um pouco relacionada com o modelo no ensino da dança. Você não partir de um modelo, de um lugar onde você tem que chegar, mas partir da sua sensação, do seu corpo, seu peso, suas articulações, do que é tensão, do que é relaxamento, do que é o espaço interno, espaço articular, e de como esse corpo vai se relacionar com o espaço, com as outras pessoas, tudo isso vai sendo trabalhado, quer dizer, o próprio aluno é que vai descobrindo, uns mais rápidos outros mais lentos, vai de cada um. Um pouco com as instruções que você vai sugerindo para eles, cada um vai fazendo o seu caminho, dentro disso. Eu ensino balé, também, e improvisação. E nos dois eu trabalho mais ou menos do mesmo jeito. No caso do Balé Clássico, depois desse trabalho de sensibilização, da pessoa ir se apropriando mais do corpo, ela vai para a barra, e aí é que vou introduzir o código do balé, para aquele corpo que ela já tem, que ela já está descobrindo, ou não. Ou que ela já está mais em posse dele. Esse corpo é que vai aprender o que é um plié, que não é tão diferente de sentar numa cadeira, fazer um demi-plié, ou um grand-plié. E é um pouco a partir da mesma musculatura, dos mesmos apoios que você usa para andar, correr, sentar, para abrir a porta, fechar a porta, para dirigir, na verdade você vai dando a ponte de que essas mesmas musculaturas, essas mesmas articulações é que são usadas para fazer balé. É o mesmo corpo. Na verdade, faço um pouquinho essa ponte nas aulas de balé (PORTAL DE PERIÓDICOS ELETRÔNICOS DA UFBA).

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Considerações Finais

O Balé Clássico é uma técnica de dança que sobrevive desde o século

XVII. Durante este longo período, mudanças significativas já ocorreram e ainda

acontecem de acordo com o profissional que transmite essa forma de

conhecimento e o ambiente no qual está inserido. Portanto, ao ensinar essa

técnica nos dias de hoje, é importante que o professor tenha clareza de qual

traço desta dança seu trabalho enfoca e, desta forma, qual a rede de

conhecimento que acompanha sua ênfase.

Para Zélia Monteiro, as formas específicas do balé são entendidas como

um resultado das conexões psicomotoras, do encadeamento muscular, do

reconhecimento do peso e apoios com os quais o corpo lida naquele momento.

Em seu trabalho, a técnica clássica é um meio de troca, de comunicação, um

ambiente de atenção e escuta ao corpo que dança que permite que o indivíduo

aprenda mais sobre si mesmo, desenvolvendo e refinando recursos acerca de

como se colocar no mundo.

Em A comunidade que vem, Giorgio Agamben (1993) trata do ser

qualquer. Diferente da tradução comum, que carrega o sentido de indiferente,

Agamben traz à luz a relação com o desejo também presente nessa

designação do ser qual quer (aquele que quer). Neste sentido, a singularidade

do indivíduo não se dissolve diante dos traços comuns do conjunto ao qual faz

parte (qualquer um), mas permite o reconhecimento com os outros por meio do

engajamento por algo (o qual quer) que pode ser comum. “A singularidade

liberta-se assim do falso dilema que obriga o conhecimento a escolher entre o

carácter inefável do indivíduo e a inteligibilidade do universal” (AGAMBEN,

1993:11).

Podemos dizer que o modo como Zélia Monteiro apresenta o balé

clássico aos seus alunos permite que a técnica seja trabalhada na mesma

relação de vontade tratada por Agamben. Apesar de essa dança dispor de

modelos pré-estabelecidos para todos, os passos e posições já estão definidos

há muitos anos; o que a artista leva em consideração é o modo como cada um

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irá se relacionar com eles. Neste sentido, ela redefine quem pode ter acesso a

esse saber: um ser qualquer.

Portanto, nesta proposta existe uma mudança de paradigma. Uma vez

que Zélia revê o foco de interesse na relação com o balé, imediatamente

transforma o entendimento do corpo que dança e o ambiente com o qual está

implicado.

Para o corpo que se comunica enquanto é, o discurso que surge daí não

é mais impregnado pelo poder de outro, mas sim o do engajamento; daquele

que alimenta o desejo e o prazer de dançar.

Referências

AGAMBEN, Giorgio. A Comunidade que vem. Tradução de Antônio Guerreiro. Lisboa: Editorial Presença, 1993.

________________. Notas sobre a política. Tradução de Mauricio Rocha. Paris: Editions Payot et Rivages, 1995, p. 121-130.

BOURCIER, Paul. História da dança no ocidente. Tradução de Marina Appenzeller. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

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FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Tradução de Roberto Machado. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979.

__________________. Vigiar e punir: nascimento das prisões. Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis: Editora Vozes, 1987.

GREINER, Christine. O Corpo: pistas para estudos indisciplinares. São Paulo: Annablume, 2008.

HERCOLES, Rosa Maria. Formas de comunicação do corpo − novas cartas sobre a dança. Tese de Doutorado em Comunicação e Semiótica. Programa de Pós Graduação em Comunicação e Semiótica, Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2005.

KATZ, Helena. Um, dois, três. A dança é o pensamento do corpo. Belo Horizonte: FID. Editorial, 2005.

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KATZ, Helena; GREINER, Christine. A natureza cultural do corpo. In PEREIRA, Roberto; SOTER, Silvia (org.). Lições de Dança 3. São Paulo: Editora Univercidade, 1998, p. 77-102.

MONTEIRO, Marianna. Noverre: cartas sobre a dança. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo: FAPESP, 2006.

MONTEIRO, Zélia. A influência do trabalho de Madame Béziers no ensino do balé. In WOSNIAK, Cristiane; MARINHO, Nirvana (org.). O avesso do avesso do corpo − educação somática como práxis. Joinville: Nova Letra, 2011, p. 93-96.

NEVES, Neide. Klauss Vianna: estudos para uma dramaturgia corporal. São Paulo: Cortez, 2008.

SENNETT, Richard. O artífice. Tradução de Clóvis Marques. Rio de Janeiro: Record, 2012.

TEIXEIRA, Ana Cristina E. A midiatização das companhias oficiais de dança no Brasil: ecos de comunicação entre público e privado. Tese de Doutorado em Comunicação e Semiótica. Programa de Pós Graduação em Comunicação e Semiótica, Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2012.

VIANNA, Klauss. A dança. São Paulo: Summus, 2008.

VIEIRA, Jorge de Albuquerque. Ontologia sistêmica e somplexidade: formas de conhecimento − arte e ciência uma visão a partir da complexidade. Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora, 2008.

_________________________. Teoria do conhecimento e arte: formas de conhecimento − arte e ciência uma visão a partir da complexidade. Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora, 2006.

ACERVO KLAUSS VIANNA. Disponível em <http://www.klaussvianna.art.br/>. Acesso em: jul. 2013.

PORTAL DE PERIÓDICOS ELETRÔNICOS DA UFBA. Disponível em <http://www.portalseer.ufba.br/>. Acesso em: jul. 2013.

THEATRO MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO. Disponível em <http://www.theatromunicipal.rj.gov.br/>. Acesso em: jul. 2013.

Flávia Scheye Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas (ECA/USP), sob a orientação da Prof. Dra. Helena Franco de Araújo Bastos. Graduada em Comunicação das Artes do Corpo (PUC/SP) desde 2008. Integrante da Companhia Perdida (direção de Juliana Moraes) desde 2010. Trabalha em parceria com Zélia Monteiro discutindo a prática e o ensino do balé clássico. Professora da Escola de Dança de São Paulo desde 2012.

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