realidade e possibilidade da indissociabilidade teoria e ... · teoria e prática no âmbito da...

21
REALIDADE E POSSIBILIDADE DA INDISSOCIABILIDADE TEORIA E PRÁTICA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DO CEDF/UEPA Lana Lima Pereira Discente Concluinte do CEDF/UEPA [email protected] Anibal Correia Brito Neto Professor Orientador do CEDF/UEPA [email protected] Resumo O objetivo geral do estudo se materializou em discutir as possibilidades para a efetivação da indissociabilidade teoria e prática na materialização do currículo do CEDF/UEPA. Para tanto, adotou parâmetros do materialismo histórico dialético para análise das fontes bibliográficas, documentais e orais, onde foi possível identificar que: a história da formação em educação física é marcada pela divisão das dimensões teoria e prática; os dispositivos orientadores da formação do CEDF/UEPA apontam possibilidades que são frágeis quanto a superação da dicotomia teoria-prática, pois não apresentam conteúdo de essência ligado a proposta de superação do modo de produção em vigor; a materialização do currículo do CEDF/UEPA expressa na fala dos acadêmicos concluintes demonstram problemas de concepção e político-administrativa de implementação de ações que viabilizem a indissociabilidade teoria e prática. Neste sentido, concluímos que uma formação que vise a emancipação da classe trabalhadora deve dispor de mecanismos que ultrapassem a barreira da aparente indissociabilidade teoria e prática proclamado pelos ordenamentos legais, interligando obstinadamente ações imediatas com o projeto histórico de longo alcance que supere a lógica do capital. Palavras-Chave: Educação Física. Formação de Professores. Indissociabilidade teoria e prática. Práxis revolucionária. INTRODUÇÃO Há aproximadamente uma década no Brasil foram estabelecidas novas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para orientar o processo de Formação de Professores de Educação Física. Trata-se, no geral, da Res. CNE/CP 01/2002 (BRASIL, 2002a) e Res. CNE/CP 02/2002 (BRASIL, 2002b), referente à educação básica e, no específico, a Res. CNE/CES 07/2004 (BRASIL, 2004a) e a alteração instituída pela Res. CNE/CES 07/2007 (BRASIL, 2007), alusiva a Educação Física. Estes dispositivos trouxeram à tona a irremediável necessidade da

Upload: hoangdung

Post on 17-Nov-2018

228 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

REALIDADE E POSSIBILIDADE DA INDISSOCIABILIDADE TEORIA E PRÁTICA NA

FORMAÇÃO DE PROFESSORES DO CEDF/UEPA

Lana Lima Pereira

Discente Concluinte do CEDF/UEPA

[email protected]

Anibal Correia Brito Neto

Professor Orientador do CEDF/UEPA

[email protected]

Resumo O objetivo geral do estudo se materializou em discutir as possibilidades para a efetivação da indissociabilidade teoria e prática na materialização do currículo do CEDF/UEPA. Para tanto, adotou parâmetros do materialismo histórico dialético para análise das fontes bibliográficas, documentais e orais, onde foi possível identificar que: a história da formação em educação física é marcada pela divisão das dimensões teoria e prática; os dispositivos orientadores da formação do CEDF/UEPA apontam possibilidades que são frágeis quanto a superação da dicotomia teoria-prática, pois não apresentam conteúdo de essência ligado a proposta de superação do modo de produção em vigor; a materialização do currículo do CEDF/UEPA expressa na fala dos acadêmicos concluintes demonstram problemas de concepção e político-administrativa de implementação de ações que viabilizem a indissociabilidade teoria e prática. Neste sentido, concluímos que uma formação que vise a emancipação da classe trabalhadora deve dispor de mecanismos que ultrapassem a barreira da aparente indissociabilidade teoria e prática proclamado pelos ordenamentos legais, interligando obstinadamente ações imediatas com o projeto histórico de longo alcance que supere a lógica do capital. Palavras-Chave: Educação Física. Formação de Professores. Indissociabilidade teoria e prática. Práxis revolucionária.

INTRODUÇÃO

Há aproximadamente uma década no Brasil foram estabelecidas novas Diretrizes

Curriculares Nacionais (DCN) para orientar o processo de Formação de Professores de

Educação Física. Trata-se, no geral, da Res. CNE/CP 01/2002 (BRASIL, 2002a) e Res.

CNE/CP 02/2002 (BRASIL, 2002b), referente à educação básica e, no específico, a

Res. CNE/CES 07/2004 (BRASIL, 2004a) e a alteração instituída pela Res. CNE/CES

07/2007 (BRASIL, 2007), alusiva a Educação Física.

Estes dispositivos trouxeram à tona a irremediável necessidade da

indissociabilidade teoria e prática na Formação de Professores, em especial, no campo

da Educação Física, que deverá ser garantida “por meio da prática como componente

curricular, estágio profissional curricular supervisionado e atividades complementares”

(BRASIL, 2004a).

No entanto, no âmbito do Curso de Educação Física da Universidade do Estado

do Pará (CEDF/UEPA), a persistente denúncia formulada cotidianamente pelos

acadêmicos e egressos do curso, de que a formação está “excessivamente teórica” nos

mobilizou a investigar de maneira sistematizada o que os graduandos concluintes

inferem sobre o trato com esta dimensão na formação, com a finalidade de

compreender as contradições e apontar possibilidades superadoras.

Com base nos estudos que consideram a categoria trabalho como determinante

para explicação dos processos formativos (TAFFAREL, 1993; LACKS, 2004;

RODRIGUES, 2007; FRIZZO, 2008; ALVES; LACKS, 2011) é possível compreender a

fragmentação do gênero humano no processo histórico de divisão do trabalho se

expressando na cisão entre trabalho manual e trabalho intelectual, o que consolida uma

concepção fragmentada de homem.

Com o advento de novas DCN que anunciam mudanças para a formação dos

professores de Educação Física torna-se fundamental abordar a repercussão destas no

âmbito dialético da produção/reprodução de novos parâmetros para a formação. Desta

forma, questionamos: segundo as DCN, como deve se constituir a indissociabilidade

teoria e prática no âmbito da organização e desenvolvimento dos Projetos Políticos

Pedagógicos (PPP) dos cursos de Educação Física? E no âmbito do CEDF/UEPA: 1)

como tal relação está indicada no PPP? 2) E na dinâmica curricular, como a mesma tem

sido efetivada segundo o relato dos alunos concluintes? 3) Por fim, qual a possibilidade

da orientação de indissociabilidade teoria e prática, como práxis revolucionária está

contida na realidade investigada?

Desta forma, o objetivo geral do estudo se materializou em discutir as

possibilidades para a efetivação da indissociabilidade teoria e prática na materialização

do currículo do CEDF/UEPA. Os objetivos específicos são: 1) Examinar a concepção de

indissociabilidade teoria e prática presente nos dispositivos oficiais que regem a

formação em Educação Física; 2) Identificar as contradições apresentadas entre o

indicado no PPP do CEDF/UEPA e as experiências formativas relatadas por

acadêmicos sobre os componentes de indissociabilidade teoria e prática e; por fim, 3)

Apontar possibilidades de aproximar os acadêmicos, desde o início do curso, em

experiências significativas da realidade do mundo do trabalho, objetivando, dessa

forma, a constante presença da práxis revolucionária como orientadora dos processos

formativos.

A lógica adotada para exposição desta investigação parte da discussão da opção

pelo materialismo histórico dialético como pressuposto filosófico e método de análise.

Em seguida, discute a formação ontológica do ser social na perspectiva de explicar a

essência do problema da separação entre teoria e prática, posteriormente aponta os

aspectos históricos da fragmentação da formação em Educação Física, para então

analisar os dispositivos oficiais orientadores da formação e os registros orais dos

acadêmicos sobre a relação teoria e prática. Ao final conclui sobre possibilidades da

“práxis revolucionária” orientar os processos formativos.

1 A OPÇÃO PELO MATERIALISMO HISTÓRICO DIALÉTICO E AS DECISÕES METODOLÓGICAS

No desenvolvimento desta investigação adotamos os parâmetros teóricos e

metodológicos do materialismo histórico dialético por entender que este dispõe do

arsenal cientifico mais adequado para a captura dos fenômenos humano-sociais em

suas múltiplas determinações. Por isso, segundo Frigotto (2006), indica além de uma

concepção de mundo, um método de apreensão radical da realidade e uma práxis.

Neste sentido, as questões afetas a relação teoria e prática no CEDF/UEPA,

local de nossa investigação, passam a ser compreendidas dentro do desenvolvimento

sócio-metabólico do capital, o qual determina, em última instância, as relações sociais

estabelecidas, pois, conforme explica Marx e Engels (2007) o ser humano está

intimamente ligado à produção da sua própria vida material e nela está condicionado e

determinado, independente de sua vontade. Logo, na formação de professores de

Educação Física, a essência da dicotomia teoria e prática só pode ser desvendada com

rigorosidade se estiver relacionada com o próprio interesse do capital em fragmentar o

ser humano e o conhecimento.

No entanto, identificamos que tais relações não se manifestam imediatamente

aos sujeitos em sua práxis utilitária cotidiana, por isso, é necessário superar a

pseudoconcreticidade do fenômeno para chegarmos a compreensão da totalidade

deste processo (KOSIK, 2002). Para este fim, utilizamos as categorias e leis da dialética

materialista, estabelecendo as relações conflitantes e contraditórias do fenômeno, para,

enfim, apoderar-se dos pormenores da matéria e analisar as suas múltiplas

determinações (MARX, 2008).

Para a captura das múltiplas determinações, valemo-nos de fontes bibliográficas

sobre a discussão da indissociabilidade teoria e prática, de fontes documentais oficiais

que orientam a formação em educação física (DCN e PPP) e de fontes orais a partir da

aplicação de entrevistas semiestruturadas com 06 (seis) discentes do CEDF/UEPA,

estratificados igualmente nos turnos da manhã, tarde e noite. Os critérios para seleção

dos sujeitos foram: concluintes do último semestre do CEDF/UEPA, melhores

desempenhos no cômputo geral das disciplinas e participação em algum projeto de

ensino, pesquisa e/ou extensão.

Quanto à organização da análise dos dados, procedemos em três momentos:

pré-análise, definição de categorias e interpretação dos dados (FRANCO, 2008). Como

categorias centrais, utilizamos o par dialético realidade/possibilidade, que segundo

Cheptulin (2004) não coincidem, pois “do ponto de vista do materialismo dialético, a

realidade é o que existe realmente e a possibilidade é o que pode produzir-se quando

as condições são propícias.” (CHEPTULIN, 2004, p. 338).

Portanto, evidenciar elementos que possibilitem a passagem da possibilidade

para a realidade deve ser o compromisso de todos que buscam a destruição da

pseudoconcreticidade, tanto para tomar consciência da verdadeira realidade que se

mostra em seu tempo histórico, quanto para intervir de forma a transformar

conscientemente essa realidade.

2 ANÁLISE DA RELAÇÃO TEORIA E PRÁTICA NA FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA

Com base na teoria materialista da história, localizamos que a forma de organizar

a vida em sociedade, orientada pelos ditames do capital, tem determinado de maneira

perversa e contraditória todas as manifestações da vida humana, seja em maior ou

menor proporção e, na formação de professores, influenciando na materialização de

uma perspectiva fragmentada, acrítica, a-histórica e despolitizada.

Como aspecto essencial para a análise, valemo-nos da categoria trabalho,

condição fundamental da vida humana, pois é por meio dele que o ser humano

constituiu-se e desenvolveu-se como ser ontologicamente social, logo, o homem

satisfaz suas necessidades vitais, em um intercâmbio com a natureza e ao modificar

esta matéria natural o homem modifica sua própria natureza (MARX, 1996).

Em meio aos diversos processos de criação emanados da condição de

existência humana, o trabalho se especificou e colocou para o sujeito um problema em

relação às finalidades que condicionam novas escolhas, trata-se do processo de prévia

idealização, que determina dois planos indissociáveis, o subjetivo e o objetivo. Logo, “o

trabalho é uma atividade projetada, teleologicamente direcionada, ou seja: produzida a

partir do fim proposto pelo sujeito” (NETTO, 2006, p.32).

Com o surgimento da propriedade privada e a consolidação da sociedade de

classes, o ser social é reduzido a mero elemento integrante das forças produtivas. O

papel que a divisão social do trabalho teve no processo produtivo possibilitou o avanço

desenfreado, unilateral e, consequentemente alienado da relação produtor-produto e

trabalho manual e intelectual, constituindo um trabalhador que não se reconhece como

criador de suas próprias produções, vivendo a estranheza do que produz sem possuir o

controle de suas produções (MARX; ENGELS, 2007).

Tal aspecto é fundamental para compreendermos as determinações históricas da

fragmentação teoria e prática na formação em Educação Física, já que o exame deste

processo demonstra de maneira específica as implicações da base material nas

diferentes dimensões da vida em sociedade, logo, a concepção que incutiu

historicamente a separação entre corpo e mente, espírito e matéria deixaram marcas

irreparáveis até o presente momento do processo formativo da área.

Sendo assim, identificamos que a formação em Educação Física no Brasil tem

sua gênese com as preocupações da intelectualidade no período pós-imperial, com o

protagonismo das Forças Armadas na adoção do método francês na sua instrução

(GHIRALDELLI JUNIOR, 1991). Posteriormente na década de 1930, como método

obrigatório nas escolas, sua finalidade apontava o "conjunto dos exercícios cuja prática

racional e metódica é suscetível de fazer o homem atingir o mais alto grau de

aperfeiçoamento físico, compatível com a sua natureza" (OLIVEIRA, 2004, p. 26).

Dessa forma, a formação em Educação Física apresentava um currículo com

disciplinas específicas e técnicas, que reduziam os conhecimentos e a própria formação

à experiências exclusivamente práticas, negando, muitas vezes, o conteúdo teórico e

orientador de uma prática crítica, que servisse para compreender a realidade

(QUELHAS; NOZAKI, 2006). Transferindo à Educação Física um papel determinante e

indispensável ao sistema educacional escolar, aonde a função desempenhada deveria

“desenvolver e fortalecer física e moralmente os indivíduos” (SOARES et al., 2012, p.

52). Essa função dialogava com aquela que era mais geral na educação que apontava

“uma educação intelectual, outra moral e outra física, que correspondiam

respectivamente às dimensões da mente, do espírito e do corpo” (MEDINA, 1990, p.

59).

Com a chegada da década de 1980, a Educação Física passa por um período de

crise de identidade, evidenciada por autores clássicos dessa época (CARMO, 1985;

GHIRALDELLI JUNIOR, 1991; MEDINA, 1990; OLIVEIRA, 2004), mostrando que o

papel desempenhado pela Educação Física em nada estava contribuindo para a

educação do ser integral, crítico e reflexivo. Por isso, entendemos que a formação em

Educação Física não deve se utilizar de atividade exclusivamente prática para formar

um ser humano integral, pois “por mais que a manifestação visualizável da Educação

Física esteja no corpo, a sua práxis não pode ser analisada apenas pela evidência

corporal”, como também, oferece oportunidades para formar um indivíduo consciente,

critico e sensível à realidade que o envolve (OLIVEIRA, 2004, p. 43).

Esse processo histórico de fragmentação teoria e prática na formação em

Educação Física nos possibilita compreender e analisar as influências que permanecem

até os dias atuais nos currículos de formação. A fragmentação da formação na área em

licenciatura e bacharelado, na atualidade, é a demonstração precisa da divisão do

conhecimento, em que o saber é cindido, desqualificando, assim, os futuros

profissionais logo na matriz de sua formação inicial.

Concordamos com Taffarel (2009) quando indica que é impossível sustentar a

divisão da formação em Educação Física sem que se evidencie a desqualificação do

licenciado ou do bacharel. Os próprios argumentos demonstram esta assertiva: escolar

X não escolar, professor X pesquisador, educador X profissional, conhecimento das

ciências da saúde X conhecimento das ciências da educação.

Por isso, entendemos que o dinamismo e a contradição da realidade apresentam

possibilidades de outra formação, a qual seja capaz de desenvolver, no ser humano,

suas inúmeras potencialidades, além de propiciar o avanço da consciência de classe e

sedimentar o terreno para um novo projeto histórico para a humanidade.

3 MECANISMOS DE INDISSOCIABILIDADE TEORIA E PRÁTICA: das DCN ao processo de implementação da política curricular no CEDF/UEPA

A partir do pressuposto de que a ação humana não está descolada de uma teoria

que a fundamente, toda forma de atividade humana é uma práxis. Neste sentido,

trataremos dos vários entendimentos sobre teoria e prática contidos no discurso dos

sujeitos entrevistados, nos documentos regulatórios da formação e naquela que

consideramos uma concepção superadora para compreender e transformar a realidade,

a filosofia da práxis.

A concepção que orienta a proposta das Diretrizes Curriculares Nacionais e o

Projeto Político Pedagógico está contida no Parecer CNE/CP nº 28/2001 quando infere

que: “[...] a prática no momento pelo qual se busca fazer algo, produzir alguma coisa e

que a teoria procura conceituar, significar e com isto administrar o campo e o sentido

desta atuação.” (BRASIL, 2001). Nesta constatação, é possível observar que os

conceitos são definidos separadamente, quando afirma que uma não é reflexo da outra

e coloca a teoria como um suporte à prática, fragmentando a realidade e afirmando que

em um momento ela é teoria e outro é prática, por isso, diz que teoria é conceituar,

significar e administrar uma ação e que a unidade dessas duas se realiza no saber-

fazer da prática pedagógica.

Tal concepção é expressa no quadro 01 pela grande maioria dos sujeitos quando

afirmam que teoria são as atividades que acontecem em sala de aula (sujeitos A1, A2,

A3, A4, A5 e A6) e prática é o movimentar-se e as vivências corporais e ou esportivas

(A1, A2, A5 e A6). Enquanto que, a indissociabilidade teoria-prática é entendida como a

aplicabilidade imediata do conhecimento teórico na prática (sujeitos A1, A2, A3, A4, A5 e

A6), como bem exprime o Acadêmico 01: “você vai tentar resgatar o que você

conseguir, o máximo de conhecimento que você absorveu durante toda a tua

graduação para poder utilizar lá na tua intervenção.”

Quadro 01: Concepção teoria, prática e indissociabilidade teoria e prática segundo os discentes do CEDF/UEPA Fonte: Entrevistas da pesquisa

Categorias Explicativas Recorrências Nº Concepção de Teoria

Atividades em sala de aula A1, A2, A3, A4, A5 e A6 06

Dimensão reflexiva da área “pedagógica” A3 e A5 02

Concepção de Prática

Vivência corporal e/ou esportiva A1, A2, A5, e A6 03

Dimensão técnico-profissional da área “biológica” A3 e A5 02

Discussão em sala de aula sobre a intervenção profissional A2 01

Concepção de indissociabilidade Teoria e Prática

Aplicabilidade imediata do conhecimento teórico na prática A1, A2, A3, A4, A5 e A6 03

Intercâmbio Ação-Reflexão-Ação A2 01

Dois acadêmicos afirmaram a compreensão de que a dimensão reflexiva da área

pedagógica é teoria (sujeitos A3 e A5), e a dimensão técnica profissional da área

biológica é prática (A3 e A5), isso remete afirmar uma incompreensão imposta pela

formação do CEDF/UEPA que permite confundir conhecimentos de diferentes ciências

com papéis divididos e definidos, desconsiderando que em todas as formas de

conhecimentos envolve a unidade teoria e prática.

O entendimento de que as discussões em sala de aula também compreendem

uma prática, é levantada por um entrevistado (sujeito A2) avançando mais quando

comparado às DCNs e por todos os acadêmicos entrevistados anteriormente. Este

acadêmico vai mais além na compreensão quando aponta que é necessário o

intercâmbio ação-reflexão-ação, possibilitando uma postura mais critica sobre a

realidade. Essa compreensão é reafirmada por Lacks (2004, p.203) quando afirma que:

“[...] da unidade teoria-prática que se materializa com o processo ação-reflexão-ação.”

Todos os sujeitos quando concebem que o conhecimento deve ser aplicado do

teórico para o prático, estão orientados pelo projeto hegemônico de sociedade e de

formação, que é caracterizado por uma organização curricular que separa disciplinas de

conteúdos específicos e de conteúdos pedagógicos, pulverizando os conhecimentos e

fortalecendo o processo de alienação na medida em que o sujeito fica impossibilitado

de compreender a totalidade da realidade.

A essa formação, valoriza-se a práxis utilitária (SANCHEZ VAZQUEZ, 2011),

onde a “as competências voltadas apenas para solução de questões práticas revelam-

se como a expressão dos nexos entre trabalho pedagógico e uma dada concepção de

formação que tem na dicotomia teoria e prática seu principal elemento.” (LACKS, 2004,

p.248). Esse entendimento está contido nas DCNs para a formação em Educação

Física, onde a proposta de indissociabilidade teoria e prática, segundo Brito Neto et al.

(2011, p. 73) “vincula-se diretamente com o pragmatismo da pedagogia das

competências que assegura a formação do trabalhador de novo tipo”;

Logo, os elementos integrantes da indissociabilidade teoria e prática nestes

dispositivos são elencados de forma fragmentada, ou seja, é pensado separadamente a

prática como componente curricular, o estágio supervisionado e as atividades

complementares, desconsiderando, portanto, o conhecimento da práxis pedagógica

como orientadora do processo e como categoria filosófica.

Entre os indicadores de indissociabilidade teoria e prática, a “prática como

componente curricular” é entendida, segundo o Parecer CNE/CP nº 28/2001 como uma

prática que produz algo no âmbito do ensino, devendo ser flexível de modo a articular-

se com o Estágio Supervisionado e construir conjuntamente a identidade do professor,

já a Resolução CNE/CES nº 7/2004 orienta que ela deverá ser contemplada no projeto

pedagógico, sendo vivenciada em diferentes contextos de aplicação acadêmico-

profissional, desde o início do curso.

Para o atual PPP do CEDF/UEPA, a prática como componente curricular deve se

organizar no currículo prioritariamente nas disciplinas de Pesquisa e Prática

Pedagógica e Fundamentos e Métodos, mas também deixa em aberto a possibilidade

de se enquadrar em outras disciplinas ou componentes curriculares (UEPA, 2007).

Quando questionamos os acadêmicos sobre esta dimensão do currículo

conforme explícita o quadro 02, todos (A1, A2, A3, A4, A5, e A6) foram unânimes em

conceber que os componentes curriculares ligados a tal dimensão devem propiciar

“vivências práticas das discussões teóricas”, principalmente, da relação com a prática

pedagógica que os futuros professores irão atuar, pois cabe a mesma “[...] vivenciar na

pratica e observar o que era a realidade da atuação do professor [...]” (Sujeito A4).

Tal inferência está de acordo com a proposta descrita no PPP do curso, já que os

conhecimentos adquiridos nesta modalidade estão compreendidos dentro da área da

pesquisa e produção do conhecimento, mas que guardam estreita relação com a

realidade da pratica pedagógica e dos estágios (UEPA, 2007).

Quadro 02: concepção, limites e possibilidades da prática como componente curricular segundo discentes do CEDF/UEPA Fonte: Entrevistas da pesquisa

Categorias Explicativas Recorrências Nº Concepção de prática como componente curricular Vivências práticas das discussões teóricas A1, A2, A3, A4, A5,

A6 06

Limites para implementação da prática como componente curricular Docentes sem compromisso e sem organização do trabalho pedagógico

A1, A2, A3, A4 e A5 05

Prioridade de vivências corporais ao invés de ensinar a ser professor

A1, A2 e A6 03

Prioridade na dimensão reflexiva descolada da realidade A1, A5 e A6 03

Sobreposição de conteúdo dos componentes curriculares A1 e A6 02

Possibilidade para implementação da prática como componente curricular Experiências práticas de ensino com consistente fundamentação teórica

A1, A2 e A6 03

Aproximação permanente com a realidade da intervenção profissional

A2, A4 e A5 03

Necessidade de alteração do quadro docente A1, A2, A3 e A4 04

Taffarel (2010), em experiência realizada em outra universidade com disciplina

semelhante, defende como ponto de partida, a prática real e concreta da problemática

da crise estrutural do capital para então definir táticas e estratégia para uma formação

que busque como pilar o trabalho socialmente útil. Neste bojo, está compreendido a

disputa de preparar um novo trabalhador para atender os interesses da burguesia ou

formar o novo homem, com base em uma proposta progressista de formação.

Desta forma, é necessário que se compreenda e fortaleça a compreensão de

trabalho pedagógico apontado por Frizzo (2008), quando afirma que em uma visão

marxiana, esse trabalho deve estar norteado por uma teoria, elaborada a partir da

prática, mas que se volte em formas de estratégias de ação. Segundo Taffarel (2010)

para que se tenha essa unidade entre teoria e prática é necessário articular um projeto

histórico que oriente a práxis política em defesa do socialismo.

Entre os limites para implementação desta dimensão no currículo do

CEDF/UEPA na oferta das disciplinas, destaca-se a forte crítica direcionada a “falta de

compromisso e de organização do trabalho pedagógico” por parte de docentes que

ministram disciplinas responsáveis pela prática como componente curricular (sujeitos

A1, A2, A3, A4 e A5). Os discentes sugerem como possibilidade para a efetivação desta

relação à substituição imediata dos docentes (sujeitos A1, A2, A3 e A4), o que leva o

debate para um patamar político-administrativo.

Para a superação desse problema, Taffarel (2010) sugere a necessidade que se

realize um plano de estudo para os professores, monitores e estudantes, devendo todos

situarem-se no contexto da luta de classes e reconhecerem as mudanças na formação,

com vistas à formar professores mais críticos, elevando a consciência deles, para isso,

é necessário considerar a auto-organização tanto individual quanto coletiva.

Logo, cabe às instâncias administrativas e órgãos colegiados adotarem o

processo avaliativo como bússola para o encaminhamento e redimensionamento das

ações, com vistas a verificarem o grau de aproximação da atuação docente e a política

de formação global, quiçá com a periodicidade de atividades que priorizem o diálogo e

a análise da realidade, seja possível encaminhar coletivamente as demandas e superar

as fragilidades.

Tal limite nos leva a concluir que não somente os alunos precisam de uma

formação, mas os próprios docentes precisam ser educados em novas bases que se

concretize uma prática pedagógica renovadora e progressista, já que ficou evidente nas

falas dos estudantes que a grande maioria dos professores que ministram essas

disciplinas não tem a preocupação em atualizar seus conhecimentos e, dessa forma,

além de reproduzirem uma prática diretamente ligada a um projeto de formação

alienante, eles são conservadores no que se refere à complexidade do trabalho

pedagógico.

Sobre o Estágio supervisionado exigido na formação em Educação Física, o

mesmo é componente obrigatório na organização curricular e deve se fazer presente a

partir da segunda metade do curso, este “representa um momento da formação em que

o graduando deverá vivenciar e consolidar as competências exigidas para o exercício

acadêmico-profissional em diferentes campos de intervenção” (BRASIL, 2004a).

Caracterizando-se por um momento na formação, exercido diretamente in loco, que

segundo o Parecer CNE/CP 28/2001, é também um momento para se verificar e provar

(em si e no outro) a realização das competências exigidas na prática profissional dos

formandos.

No entanto, para o PPP do CEDF/UEPA, além de compartilhar os mesmos

mecanismos e características dos ordenamentos legais, afirma também: “o estágio é

concebido como investigação e possibilidade de compreensão e intervenção da prática.

[...] investigando as problemáticas da organização geral da escola e da Educação

Física [...]” (UEPA, 2007, p. 68-69). Pimenta e Lima (2009) corroboram com esta

concepção, defendendo que o Estágio deve se realizar em forma de pesquisa,

possibilitando a investigação por meio da análise e problematização de situações nos

contextos onde os estágios se realizam. Já para Rodrigues (2007), o Estágio na

formação não deve estar desatrelado de um trabalho pedagógico baseado em um

projeto de sociedade, de ser humano, de mundo e de educação, no qual o ser humano

possa intervir nessa realidade de forma consciente, crítica e transformadora.

No currículo do CEDF/UEPA, o Estágio está dividido entre a área escolar e não

escolar. Essas modalidades distinguem-se devido à formação de Licenciatura Plena em

Educação Física possibilitar a atuação nos diversos ambientes de trabalho do professor

dessa área, tendo, portanto, o dever de ampliar e garantir formação para essas áreas

(UEPA, 2007).

O quadro 03 desvela as concepções, limites e possibilidades do Estágio

Supervisionado no âmbito do CEDF/UEPA.

Quadro 03: concepção, limites e possibilidades do estágio supervisionado segundo discentes do CEDF/UEPA Fonte: Entrevistas da pesquisa.

Categorias Explicativas Recorrências Nº Concepção do Estágio Supervisionado

Associação dos conhecimentos teóricos anteriores na prática A1, A3, A5, A6 04

Vivência pedagógica acompanhada pelo professor A2 01

Vivência de elementos deficientes em outras disciplinas A4 01

Limites para implementação do Estágio Supervisionado

Supervisão pífia e/ou meramente formal nos Estágios III e IV A1, A2, A3, A5 e A6 05

Estágio III e IV pulverizado em visitas e observações isoladas A1, A2, A3, A5 e A6 05

Momentos de reflexão sobre a prática pedagógica insuficiente A2, A5, e A6 03

Compreensão distorcida do professor da escola sobre o Estágio A1, A5 e A6 03

Falta de transposição da teoria anterior na prática pedagógica A1, A5 e A6 03

Possibilidades para implementação do estágio Supervisionado

Orientação efetiva do supervisor de estágio A1, A2, A3 03

Estágio Supervisionado desde o início do curso A1 01

Formalização de vínculos efetivos entre Universidade/Escola A1 01

Estágio supervisionado em hospital A3 01

Ampliação do quadro de professores supervisores A4 01

Quanto à concepção dos acadêmicos acerca do estágio supervisionado

percebemos o predomínio de uma concepção retrógrada que concebe o momento do

estágio como um “descarrego teórico”, oportunidade em que todo o conhecimento

aprendido durante dois anos de formação “teórica” seja despendida na prática.

Porém, ao invés de permitir a aproximação com a intervenção na realidade, os

alunos criticam que o Estágio III e IV não tem possibilitado a continuidade dos alunos no

local de trabalho, já que resumiu-se em visitas e observações pontuais (sujeitos A1, A2,

A3, A5 e A6), subtraindo a supervisão do professor e a possibilidade de enfrentar os

desafios impostos ao ensino e criar uma identidade profissional a partir da

problematização do trabalho pedagógico, bem como sugere o Parecer CNE/CP nº

28/2001 “onde o estagiário assuma efetivamente o papel do professor”.

Problemas de ordem político-administrativas voltaram a ser os agravantes para a

não implementação satisfatória deste componente curricular, ausência de uma atuação

satisfatória por parte do professor universitário, que implica em uma pífia supervisão

(sujeitos A1, A2, A3, A4, A5 e A6), ou falta de reflexão pedagógica (sujeitos A2, A5 e A6)

foram recorrente na fala dos sujeitos, a exemplo da reflexão do sujeito A5 “[...]a gente

acabava fazendo algumas coisas sem supervisão que poderia ser feito bem melhor se

o professor tivesse por perto”.

Esses limites, portanto, entram em contradição com aquilo que está descrito no

PPP do curso e normas da universidade quando delimita no Art. 16º da Resolução

CONSUN 2169/2010: “o Estágio Obrigatório e o Não-obrigatório serão supervisionados

e acompanhados por docentes supervisores de estágio lotado pela Chefia de

Departamento e Coordenação de Curso e por supervisores da parte concedente”

(UEPA, 2010). A importância dessa supervisão determina um auxilio necessário para a

formação do sujeito e a falta dela irá implicar em deficiências relacionadas a decisões

futuras dos rumos profissionais. (PIMENTA; LIMA, 2009).

Dessa forma, várias sugestões foram colocadas pelos entrevistados que se

complementam entre si, desde a exigência por uma supervisão efetiva nos estágios

(sujeitos A1, A2 e A3) somada à necessidade de vínculos efetivos entre

Universidade/Escola (sujeito A1), até a necessidade de Estágio Supervisionado desde o

primeiro momento do curso (sujeito A1) foram citados.

Entendendo o Estágio como espaço que envolve todos os conhecimentos

relacionados na formação, ele está diretamente ligado a todas as disciplinas do

currículo, devendo ser o eixo articulador desde o início da formação, como afirma

Rodrigues (2007), quando diz que ele deve ser desenvolvido desde o 1º semestre do

curso, dialogando com os conhecimentos de todas as áreas que envolvem a Educação

Física, abordando um conhecimento amplo sobre a realidade.

Por fim, concordamos e reafirmamos a proposta de que o Estágio deva ser

princípio articulador da formação como um todo, devendo ser “o fio condutor na

formação de professores” como defende Rodrigues (2007), o que dialoga com o fato da

prática ser a articuladora e orientadora do conhecimento, conforme proposta trazida por

Lacks (2004), que converge com o pensamento de Marx (2008) quando afirmava ser a

prática o critério de verdade, o ponto de partida e a linha norteadora para afirmar se

estamos retrocedendo ou avançando em uma dada realidade quando nela estamos

intervindo e construindo a história.

Quanto às atividades complementares, os acadêmicos concluintes convergem no

sentido de indicar o “enriquecimento da formação universitária” possibilitado por este

componente curricular. No entanto, localizamos uma situação problemática em relação

à compreensão de alguns participantes (sujeitos A3, A4 e A5), o fato de relacionar tais

atividades com a superação de fragilidades e lacunas vividas no currículo do

CEDF/UEPA, ou seja, atividades que deveriam servir essencialmente para

complementar a formação estão sendo interpretadas para “ajudar nas deficiências de

certas disciplinas [...] visa suprir as deficiências das disciplinas que são ofertadas no

Curso [...]” (sujeito A4).

Tal inferência apontada pela metade da amostra dos entrevistados está em plena

contradição com aquilo que está exarado nos marcos regulatórios, pois de acordo com

o Parecer CNE/CP nº 28/2001, as atividades complementares devem servir para se

articular e enriquecer os processos formativos do professor como um todo, com base na

diversificação dos espaços educacionais e ampliação do universo cultural, somado ao

trabalho interdisciplinar produzido coletivamente (BRASIL, 2001).

Desta forma, tal dimensão formativa é entendida numa perspectiva de aprofundar

algum conhecimento, não no sentido de suprir deficiências ou carências, já que nesta

última concepção a mesma perderia o sentido de “complementar” para ser de fato

“basilar”. Outra concepção que pode ser evidenciada é aquela que atribui a este

componente curricular ação meramente burocrática (sujeito A1), limitando este aspecto

formativo ao simples cômputo de carga horária, conforme demonstra o Quadro 04.

Quadro 04: concepção, limites e possibilidades das atividades complementares segundo alunos do CEDF/UEPA Fonte: Entrevistados da pesquisa

Categorias Explicativas Recorrências Nº Concepção de atividades complementares Oportunidade de novas experiências dentro da área A2, A3, A6 03

Atividades para suprir lacunas deixadas pelo Curso A3, A4, A5 03

Atividades obrigatórias com comprovação de carga horária A1 01

Limites para implementação das atividades complementares

Falta de subsídio/orientação institucional A1, A2, A3, A4 e A6 05

Critérios complexos e restrito a quantidade A2 e A6 02

Alunos acomodados em buscar atividades externas A3 01

Custo elevado das atividades complementares A6 01

Facilidade de conseguir certificados ilicitamente A6 01

Possibilidades para implementação das atividades complementares Oferta de mais atividades complementares pelo CEDF/UEPA A1 e A6 02

Disponibilizar aos alunos lista de todos os cursos e projetos na área

A1 01

Priorizar qualidade em detrimento da quantidade A6 01

No entanto, a concepção apontada pela maioria dos acadêmicos quando

articulada com os limites e possibilidades desta dimensão curricular demonstra não

somente as deficiências deste componente em si, mas uma relação mais abrangente

da própria insuficiência institucional, que segundo infere os acadêmicos, não tem

subsidiado e dado as devidas condições para a implementação de uma prática pública,

sistematizada e transformadora, deixando os acadêmicos a mercê da alienação da

lógica do mercado, que conforme indica o sujeito 06, vem aproveitando as inovações do

processo formativo para ampliar suas margens de lucro, transformando formação em

mercadoria, o que propicia o afastamento deste componente de uma proposta formativa

global.

O CEDF/UEPA como instituição pública precisa assumir o seu compromisso

social com a totalidade da proposta de formação, sistematizando e divulgando

amplamente suas ações, com o objetivo de garantir o acesso dos acadêmicos a

práticas culturais e científicas significativas, de modo gratuito e planejado.

No entanto, todas essas ações para se efetivarem de modo articulado e

transformador, precisam estar subsidiadas por uma concepção revolucionária de

indissociabilidade teoria e prática, a qual soma medidas imediatas com e projeto

histórico de longo alcance, o qual passaremos a visualizar na próxima seção.

4 O MARXISMO E A FILOSOFIA DA PRÁXIS COMO PROGRAMA DE TRANSIÇÃO PARA A INDISSOCIABILIDADE TEORIA E PRÁTICA É necessário entender que o professor de Educação Física é um trabalhador

proletário, liberal, flexível, explorado, e na condição de oprimido, deve criar consciência

de sua condição e de classe revolucionária. Essa consciência é fundamental à

constituição do proletariado como classe para que se possa ascender à práxis

revolucionária, mas para que essa classe possa se emancipar plenamente das amarras

desse sistema opressor é necessária também, organização política. Por isso, o

marxismo e a filosofia da práxis nos colaboram com três instrumentos teórico-práticos

indispensáveis para romper com toda a estrutura social: a consciência de classe, a

organização política e a práxis.

A práxis é uma atividade que deve ser necessariamente sobre uma ação real,

objetiva a uma dada realidade (natural ou humana), ou pode ser uma atividade do

pensamento (subjetiva), mas que prefigurem idealmente uma realidade futura, nos dois

casos sempre visando à transformação do mundo. (SANCHÉZ VAZQUÉZ, 2011).

É a partir das contradições problematizadas a partir da realidade concreta da

educação que dispomos de condições para uma efetiva indissociabilidade teoria e

prática, somada a luta de classes que materializa a possibilidade de superação do

sistema do capital por meio da revolução proletária. Para que a educação cumpra esse

papel, é necessário que esteja pautada inicialmente no trabalho revolucionário, na

práxis revolucionária e, segundo Alves e Lacks (2011), em uma pedagogia de transição

que aponte para a realização de uma pedagogia socialista.

A referida pedagogia de transição é uma analogia ao programa de transição

defendido por Leon Trotsky (apud ALVES; LACKS, 2011), onde se defende e propõe

uma formação de transição baseada nos princípios revolucionários, na transição da

sociedade capitalista para a socialista. Para a área da formação de professores, toma

como base a formação humana e omnilateral, articulando conjuntamente a luta de

classes com a superação da formação unilateral, possibilitando, assim, a

universalização do trabalho e a inversão da lógica do trabalho degradante e da

desqualificada formação de professores a que são geridas para a manutenção da

sociedade capitalista (ALVES; LACKS, 2011).

Alcançar a emancipação de toda a classe trabalhadora é a finalidade a partir da

ruptura com o sistema atual de produção, no entanto, nos limitamos aqui a lançar

perspectivas e instrumentos que possibilitem alcançar esse objetivo. É através do

projeto educacional, inserido em um programa de transição, somado à organização

política de toda a classe e mediado pela práxis revolucionária que a sociedade deve

caminhar para trilhar uma nova estrutura social, logo, uma nova educação e formação

de professores.

Neste sentido, apesar de percebemos que esta experiência pôde contribuir em

certa medida com o avanço da consciência do indivíduo sobre os problemas sociais,

para Frizzo (2008), a dimensão da concreticidade e da materialidade da práxis humana

só poderá ser apreendida em sua totalidade, se a intervenção for orientada pela

compreensão do trabalho pedagógico, relacionado à conjuntura de uma sociedade de

classes, que imputa os mais diversos desafios aos processos de ensino.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O debate travado em torno do objeto de investigação possibilitou o desvelamento

de contradições entre as dimensões analisadas neste estudo, a título de confirmação: a

produção especializada sobre a relação teoria e prática, as normatizações expressas

nos documentos oficiais e o relato de acadêmicos concluintes sobre o processo de

materialização dos componentes curriculares ligados a indissociabilidade teoria e

prática.

No que se refere às concepções sobre teoria e prática, todos os sujeitos da

pesquisa confirmaram a concepção hegemônica dos ordenamentos legais, a qual

entende a formação de forma fragmentada em dois momentos: um teórico e outro

prático, sendo este último ligado ao ambiente de atuação do professor ou as aulas das

disciplinas que requerem atividades corporais, enquanto o teórico compreendido como

atividade nas salas de aula, nos momentos de leitura e produção textual. Em

contraposição, sinalizamos a concepção de práxis revolucionária enquanto atividade

teórico-prática que produz transformação de essência na realidade.

No que tange às atividades complementares, a mesma foi identificada pelos

acadêmicos como oportunidade de novas experiências ou atividades para suprir

lacunas, com relação à prática como componente curricular, a mesma foi visualizada

prioritariamente nos componentes Pesquisa e Prática Pedagógica e Fundamentos e

Métodos, como disciplinas que deveriam possibilitar vivências práticas das discussões

teóricas. Em relação aos Estágios relacionaram à aproximação dos alunos com a

realidade a partir da associação dos conhecimentos anteriores neste momento.

Como possibilidade, os próprios alunos apontaram a necessidade de maior

integração entre os componentes curriculares, possibilitando um avanço para a

indissociabilidade entre teoria e prática na formação quando esta relação apresenta

sentido e significado na articulação de uma práxis reflexiva.

A concepção central das Diretrizes Curriculares para a formação não é a mesma

para o Projeto Político Pedagógico do CEDF/UEPA, o qual defende uma formação

voltada ao professor crítico e reflexivo e se diferencia, considerando a cultura corporal

como objeto de estudo da mesma, ou seja, baseando o PPP do CEDF/UEPA na

perspectiva da pedagogia crítico-superadora pensada por Soares et al (2012).

No entanto, quando analisamos a realidade descrita pelos acadêmicos,

observamos um distanciamento com a realidade que se apresenta na formação. A

concepção de práxis como orientadora e articuladora do conhecimento não é

possibilitada aos alunos, o que inviabiliza uma práxis revolucionária no currículo e que

tenha o trabalho como princípio da formação, este elemento pode estabelecer nexos

perdidos com a história do desenvolvimento do ser social.

No entanto, ele pode tanto ser responsável pela alienação quanto pela

emancipação, por isso, a busca pela emancipação da classe requer uma transformação

profunda da realidade. Entender, portanto, que uma formação para a emancipação da

classe trabalhadora é a defesa deste princípio, e para isso, é necessário criar

mecanismos alternativos e que supere aqueles colocados de forma hegemônica, no

nosso caso, pensar a indissociabilidade entre teoria e prática diferentemente do que é

colocado nas legislações e de forma dominante, pois almejamos o avançar das

consciências da classe trabalhadora por completo, considerando que os professores de

Educação Física, devem se organizar politicamente em um instrumento revolucionário

para lutar e livrá-la de todas as algemas que às acorrentam e poder em fim gozar

plenamente da liberdade.

REALITY AND POSSIBILITIES INSEPARABILITY THEORY AND PRACTICE IN

TRAINING TEACHERS CEDF / UEPA

Abstract The general objective of the study was materialized in discussing the possibilities for the realization of the inseparability theory and practice in the materialization of the curriculum CEDF / UEPA. Therefore, we adopted parameters of historical materialism to dialectical analysis of bibliographic sources, documentary and oral, which could be identified: a history of training in physical education is marked by the division of the dimensions theory and practice; devices guiding the formation of the CEDF / UEPA suggest possibilities that are fragile as overcoming the dichotomy between theory and practice, as not present content essence on the proposed overcoming the existing mode of production, the materialization of the curriculum CEDF / UEPA expressed in the speech of academic graduates demonstrate problems design and implementation of political and administrative actions that enable the inseparability of theory and practice. Thus, we conclude that training aimed at the emancipation of the working class must have mechanisms that go beyond the barrier of the apparent inseparability theory and practice proclaimed by national law, linking stubbornly immediate actions with far-reaching historical project that surpasses the logic of capital Keywords: Physical Education. Teacher Training. Inseparability of theory and practice. Revolutionary praxis.

REFERÊNCIAS

ALVES, M. S.; LACKS, S. Divisão social do trabalho e alienação na formação de professores de educação física da UFS: o estágio supervisionado/prática de ensino enquanto síntese dialética dos projetos em disputa. In: Encontro Brasileiro de Educação e Marxismo, 5., 2011. Florianópolis. Anais... Florianópolis: UFSC, 2011. BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CP 28/2001, de 02 de outubro de 2001. Brasília, 2001.

______. Conselho Nacional de Educação. Conselho Pleno. Resolução CNE/CP 01/2002, de 18 de fevereiro de 2002. Brasília, 2002a. ______. Conselho Nacional de Educação. Conselho Pleno. Resolução CNE/CP 02, de 19 de fevereiro de 2002. Brasília, 2002b. ______. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Parecer CNE/CES 058/2004, de 18 de fevereiro de 2004. Brasília, 2004b. ______. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES 07/2004, de 31 de março de 2004. Brasília, 2004a. ______. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES 07/2007, de 04 de outubro de 2007. Brasília, 2007. BRITO NETO, A. C. et al. Formação do professor e diretrizes curriculares nacionais para graduação em educação física: críticas aos parâmetros teórico-metodológicos orientadores. In: TÁVORA, M. J. de S.; BENTES, N. de O. Estudos sobre formação de professores: pesquisa sobre formação de professores. Belém: EDUEPA, 2011. CARMO, A. A. do. Educação Física: Competência técnica e consciência política em busca de um movimento simétrico. Uberlândia: UFU, 1985. CHEPTULIN, A. A dialética materialista: categorias e leis da dialética. São Paulo: Alfa-Ômega, 2004. FRANCO, M. L. P. B. Análise de conteúdo. 3. ed. Brasília: Liber Livro, 2008. FRIGOTTO, G. O enfoque da dialética materialista histórica na pesquisa educacional. In: FAZENDA, I. (org.) et al. Metodologia da pesquisa educacional. 10 ed. São Paulo: Cortez, 2006. FRIZZO, G. O trabalho pedagógico como referência para a pesquisa em educação física. Pensar a Prática n.11, v. 2. p. 159-167, maio/ago. 2008. GUIRALDELLI JUNIOR, P. Educação Física progressista: a pedagogia crítico social dos conteúdos e a Educação Física brasileira. São Paulo: Edições Loyola, 1991. KOSIK, K. Dialética do concreto. 7. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002. LACKS, S. Formação de professores: a prática como articuladora do conhecimento. 2004. 286 f. Tese de Doutorado (Doutorado em Educação), Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2004. MARX, K. O Capital: crítica à economia política. São Paulo: Nova Cultural, 1996. v. 1.

_____; ENGELS, F. A Ideologia Alemã. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. _____. Contribuição à crítica da economia política. 2. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2008. MEDINA, J. P. S. Educação Física cuida do corpo e...”mente”: bases para a renovação a transformação da educação física. 9. ed. Campinas: Papirus, 1990. NETTO, J. P. Economia política: uma introdução crítica. São Paulo: Cortez, 2006. OLIVEIRA, V. M. de. O que é Educação Física. 11. ed. São Paulo: Brasiliense, 2004. QUELHAS, A. A.; NOZAKI, H. T. A Formação do Professor de Educação Física e as novas Diretrizes Curriculares frente aos avanços do capital. Motrivivência, Florianópolis, Ano XVIII, n. 26, p. 69-87, jun./2006. PIMENTA, S. G.; LIMA, M. do S. Estágio e docência. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2009. RODRIGUES, R. C. F. O Estágio Supervisionado no curso de Educação Física na UEFS: realidade e possibilidades. 2007. 103 f. Dissertação de Mestrado (Mestrado em Educação), Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2007. SANCHÉZ VÁSQUEZ, A. Filosofia da práxis. 2. ed. São Paulo: Expressão Popular, Brasil, 2011. SOARES, C. L. et al. Metodologia do Ensino de Educação Física. 2 ed. São Paulo: Cortez, 2012. TAFFAREL, C. N. Z. A Formação do Profissional da Educação: o processo de trabalho pedagógico e o trato com o conhecimento no curso de Educação Físico. 1993. 312 f. Tese de Doutorado (Doutorado em Educação). Universidade de campinas, Campinas, 1993. ______. Diretrizes: depoimento centro de memória do esporte UFRGS. Rascunho Digital, Salvador, 2005. Disponível em: <http://www.faced.ufba.br/rascunho_digital/textos/457.htm > Acesso em: 17 mar. 2009. ______. Pesquisa, prática pedagógica e projeto histórico. Marxismo e Educação em Debate, Londrina, v. 2, n. 2, p. 79-89; ago./ 2010. UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ. Projeto Político-Pedagógico do Curso de Educação Física. Belém: Comissão de elaboração do projeto político-pedagógico do Curso de Educação Física da UEPA, 2007. UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ. Conselho Universitário. Resolução 2169, de 20 de dezembro de 2010. Belém, 2010.