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Revista Brasileira de Educação 5 Apresentação Neste texto, abordaremos três questões que, nos últimos vinte anos, têm estado no centro da pro- blemática da profissionalização do ensino e da for- mação de professores, em um grande número de países ocidentais: > Quais são os saberes profissionais dos professores, isto é, quais são os saberes (conhe- cimentos, competências, habilidades etc.) que eles utilizam efetivamente em seu trabalho diá- rio para desempenhar suas tarefas e atingir seus objetivos? > Em que e como esses saberes profissio- nais se distinguem dos conhecimentos univer- sitários elaborados pelos pesquisadores da área de ciências da educação, bem como dos conhe- cimentos incorporados nos cursos de forma- ção universitária dos futuros professores? > Que relações deveriam existir entre os saberes profissionais e os conhecimentos uni- versitários, e entre os professores do ensino básico e os professores universitários (pesqui- sadores ou formadores), no que diz respeito à profissionalização do ensino e à formação de professores? A fim de proporcionar elementos que permi- tam responder a essas três perguntas, vamos, em um primeiro momento, fazer uma breve descrição da conjuntura social na qual se vem desenvolven- do, hoje, o movimento de profissionalização do ensino. Em um segundo momento, proporemos uma definição daquilo que entendemos por “epis- temologia da prática profissional”, especificando, de forma sucinta, algumas conseqüências dessa de- finição para a pesquisa sobre o ensino. Em um ter- ceiro momento, procuraremos ver de que modo essa definição permite destacar algumas das mais importantes características da prática dos profes- sores. Finalmente, como conclusão identificaremos algumas conseqüências dessa análise da prática profissional em relação aos programas de forma- ção para o magistério, aos dispositivos de forma- Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitários Elementos para uma epistemologia da prática profissional dos professores e suas conseqüências em relação à formação para o magistério Maurice Tardif Faculté des Sciences de l’Éducation, Université Laval

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  • Revista Brasileira de Educao 5

    Apresentao

    Neste texto, abordaremos trs questes que,nos ltimos vinte anos, tm estado no centro da pro-blemtica da profissionalizao do ensino e da for-mao de professores, em um grande nmero depases ocidentais:

    > Quais so os saberes profissionais dosprofessores, isto , quais so os saberes (conhe-cimentos, competncias, habilidades etc.) queeles utilizam efetivamente em seu trabalho di-rio para desempenhar suas tarefas e atingirseus objetivos?

    > Em que e como esses saberes profissio-nais se distinguem dos conhecimentos univer-sitrios elaborados pelos pesquisadores da reade cincias da educao, bem como dos conhe-cimentos incorporados nos cursos de forma-o universitria dos futuros professores?

    > Que relaes deveriam existir entre ossaberes profissionais e os conhecimentos uni-

    versitrios, e entre os professores do ensinobsico e os professores universitrios (pesqui-sadores ou formadores), no que diz respeito profissionalizao do ensino e formao deprofessores?

    A fim de proporcionar elementos que permi-tam responder a essas trs perguntas, vamos, emum primeiro momento, fazer uma breve descrioda conjuntura social na qual se vem desenvolven-do, hoje, o movimento de profissionalizao doensino. Em um segundo momento, proporemosuma definio daquilo que entendemos por epis-temologia da prtica profissional, especificando,de forma sucinta, algumas conseqncias dessa de-finio para a pesquisa sobre o ensino. Em um ter-ceiro momento, procuraremos ver de que modoessa definio permite destacar algumas das maisimportantes caractersticas da prtica dos profes-sores. Finalmente, como concluso identificaremosalgumas conseqncias dessa anlise da prticaprofissional em relao aos programas de forma-o para o magistrio, aos dispositivos de forma-

    Saberes profissionais dos professorese conhecimentos universitriosElementos para uma epistemologia da prticaprofissional dos professores e suas conseqnciasem relao formao para o magistrio

    Maurice TardifFacult des Sciences de lducation, Universit Laval

    JefersonUnderline

  • 6 Jan/Fev/Mar/Abr 2000 N 13

    Maurice Tardif

    o e s prticas profissionais dos formadores deprofessores.

    A profissionalizao do ensino:uma conjuntura paradoxal

    Para comear, demoremo-nos um pouco naatual conjuntura social, pois se trata de um contextobastante paradoxal, considerando que se pede aosprofessores para se tornarem profissionais no mo-mento em que o profissionalismo, a formao pro-fissional e as profisses mais bem assentadas atra-vessam um perodo de crise profunda.

    O movimento de profissionalizaobusca renovar os fundamentos

    epistemolgicos do ofcio de professor

    Na Amrica do Norte e na maioria dos outrospases de cultura anglo-saxnica (Austrlia, Ingla-terra etc.), bem como, de forma mais recente, naEuropa francfona (Blgica, Frana, Sua), toda area educacional est mergulhada em uma vastacorrente de profissionalizao dos agentes da educa-o em geral e dos professores em particular (Gins-burg e Linday, 1995; Judge et al., 1994; Paquay etal., 1996; Tardif, Lessard e Gauthier, 1998; Tisheret al., 1990). Tambm encontramos essa correnteem vrios pases latino-americanos (Ldke e Mo-reira, 1999; Tato e Velez, 1997). A profissionaliza-o do ensino e da formao para o ensino consti-tui, portanto, um movimento quase internacionale, ao mesmo tempo, um horizonte comum para oqual convergem os dirigentes polticos da rea daeducao, as reformas das instituies educativas eas novas ideologias da formao e do ensino (Tar-dif, Lessard e Gauthier, 1998; Lessard et al., 1999).

    A questo da epistemologia da prtica profis-sional se encontra, evidentemente, no cerne dessemovimento de profissionalizao. De fato, no mun-do do trabalho, o que distingue as profisses dasoutras ocupaes , em grande parte, a natureza dosconhecimentos que esto em jogo. Lembremos aquias principais caractersticas do conhecimento pro-

    fissional tais como se acham expressas, nos ltimosvinte anos, na literatura sobre as profisses (Bour-doncle, 1994; Tardif e Gauthier, 1999):

    > Em sua prtica, os profissionais devem-se apoiar em conhecimentos especializados eformalizados, na maioria das vezes, por inter-mdio das disciplinas cientficas em sentidoamplo, incluindo, evidentemente, as cinciasnaturais e aplicadas, mas tambm as cinciassociais e humanas, assim como as cincias daeducao.

    > Esses conhecimentos especializados de-vem ser adquiridos por meio de uma longa for-mao de alto nvel, a maioria das vezes de na-tureza universitria ou equivalente. Essa for-mao sancionada por um diploma que pos-sibilita o acesso a um ttulo profissional, ttu-lo esse que protege um determinado territrioprofissional contra a invaso dos no-diplo-mados e dos outros profissionais.

    > Embora possam basear-se em discipli-nas cientficas ditas puras, os conhecimen-tos profissionais so essencialmente pragm-ticos, ou seja, so modelados e voltados paraa soluo de situaes problemticas concre-tas, como, por exemplo, construir uma pon-te, ajudar um cliente a resolver seus conflitospsicolgicos, resolver um problema jurdico,facilitar a aprendizagem de um aluno que estcom dificuldades etc.

    > Em princpio, s os profissionais, emoposio aos leigos e aos charlates, possuema competncia e o direito de usar seus conhe-cimentos, conhecimentos esses que so, de umcerto modo, esotricos: eles pertencem legal-mente a um grupo que possui o direito exclu-sivo de us-los por ser, em princpio, o nicoa domin-los e a poder fazer uso deles.

    > Isso significa tambm que s os profis-sionais so capazes de avaliar, em plena cons-cincia, o trabalho de seus pares. O profissio-

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    JefersonTextboxexiste uma crescente na profissionalizao do ensino em todo o mundo

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    JefersonTextboxa epistemologia cerne dessa discusso

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    JefersonTextboxno que o profissional da educao se apoia

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    JefersonTextboxo diploma smbolo de distino entre os educadores

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    JefersonTextboxconhecimentos so voltados para a prtica

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    JefersonTextboxprofessores se tornam autoridade em falar de algo.

  • Revista Brasileira de Educao 7

    Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitrios

    nalismo acarreta, portanto, uma autogestodos conhecimentos pelo grupo dos pares, bemcomo um autocontrole da prtica: a competn-cia ou a incompetncia de um profissional spodem ser avaliadas por seus pares.

    > Esses conhecimentos exigem tambmautonomia e discernimento por parte dos pro-fissionais, ou seja, no se trata somente de co-nhecimentos tcnicos padronizados cujos mo-dos operatrios so codificados e conhecidosde antemo, por exemplo, em forma de roti-nas, de procedimentos ou mesmo de receitas.Ao contrrio, os conhecimentos profissionaisexigem sempre uma parcela de improvisaoe de adaptao a situaes novas e nicas queexigem do profissional reflexo e discernimen-to para que possa no s compreender o pro-blema como tambm organizar e esclarecer osobjetivos almejados e os meios a serem usadospara atingi-los. o que Schn (1983) chamade construo do problema, em oposio resoluo instrumental do problema, queseria baseada na aplicao de teorias e tcni-cas prvias. De forma anloga, Jamous e Pe-loille (1985) afirmam que todo processo deproduo se caracteriza por um certo grau deindeterminao (I) no trabalho em relao aum grau de tecnicidade (T); eles afirmam queaquilo que entendemos por profisso se carac-teriza por uma razo I/T elevada, isto , umalto grau de indeterminao na realizao doprocesso de trabalho, o que exige dos profis-sionais uma construo de julgamentos em si-tuaes de ao.

    > Tanto em suas bases tericas quantoem suas conseqncias prticas, os conheci-mentos profissionais so evolutivos e progres-sivos e necessitam, por conseguinte, uma for-mao contnua e continuada. Os profissio-nais devem, assim, autoformar-se e reciclar-se atravs de diferentes meios, aps seus es-tudos universitrios iniciais. Desse ponto devista, a formao profissional ocupa, em prin-

    cpio, uma boa parte da carreira e os conheci-mentos profissionais partilham com os conhe-cimentos cientficos e tcnicos a propriedadede serem revisveis, criticveis e passveis deaperfeioamento.

    > Enfim, os profissionais podem ser con-siderados responsveis pelo que os anglfonoschamam de malpractice, ou seja, pelo mau usode seus conhecimentos, causando, desse modo,danos a seus clientes. A autonomia e a com-petncia profissionais tm, como contrapeso,a imputabilidade dos profissionais e sua res-ponsabilidade para com os clientes. Um pro-fissional pode cometer erros pelos quais podeser considerado tcnica e legalmente respon-svel, o que quer dizer que se pode, em prin-cpio, estabelecer uma relao direta, e at cau-sal, em certos casos, entre a realizao de seusatos e a aplicao de seus conhecimentos, emfuno dos padres de competncia aceitosdentro de sua prpria profisso (Office desProfessions, 1998). Aqui, no se trata somen-te de erros deontolgicos ou de falta de ticaprofissional, mas sim de erros de julgamentoou de manifestaes de incompetncia referen-tes ao uso judicioso dos conhecimentos acei-tos, em funo das particularidades de uma si-tuao concreta. A avaliao desse tipo de errodepende muito mais de um julgamento em-prico ou tcnico do que de um julgamentodeontolgico ou normativo e supe a existn-cia, por mnima que seja, de um repertriode conhecimentos profissionais qual sejapossvel referir-se para julgar a importncia doerro cometido.

    Essas so, portanto, as principais caractersti-cas do conhecimento profissional. Ora, de uns vinteanos para c, o objetivo do movimento de profis-sionalizao do ofcio de professor tem sido, exa-tamente, o de conseguir desenvolver e implantar es-sas caractersticas dentro do ensino e na formaode professores. Desse ponto de vista, em educao,a profissionalizao pode ser definida, em grande

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    JefersonTextboxcompetncia e incompetncia s pode ser avaliada pelos pares

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    JefersonTextboxo conhecimento profissional tambm requer improviso para atuar em campo.

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    JefersonTextboxconhecimentos profissionais so evolutivos e progressivos e por isso requerem formao contnua e continuada.

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    JefersonTextboxquanto maior a autonomia, maior a responsabilidade com os clientes

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    JefersonTextboxsee o conhecimento aprofundado, possvel perceber o erro e analis-lo.

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  • 8 Jan/Fev/Mar/Abr 2000 N 13

    Maurice Tardif

    parte, como uma tentativa de reformular e renovaros fundamentos epistemolgicos do ofcio de pro-fessor e de educador, assim como da formao parao magistrio. Todos os esforos realizados nos l-timos vinte anos para construir um repertrio deconhecimentos (knowledge base) especfico ao en-sino vo nessa direo (Gauthier et al., 1998), bemcomo as numerosas reformas visando a definir e afixar padres de competncia para a formao dosprofessores e para a prtica do magistrio. Se essesesforos e reformas forem bem-sucedidos, o ensi-no deixar, ento, de ser um ofcio para tornar-seuma verdadeira profisso, semelhantemente pro-fisso de mdico ou s profisses de engenheiro ede advogado.

    Essa tentativa tem seus adeptos e seus adver-srios, seus defensores e seus detratores (Tardif eGauthier, 1999). Os inmeros debates a esse respei-to levantam problemas complexos cujo alcance ul-trapassa a inteno deste artigo, que busca discutiras caractersticas dos saberes profissionais dos pro-fessores e suas conseqncias em relao forma-o para o magistrio e pesquisa universitria.

    A crise do profissionalismo

    Entretanto, para compreender melhor os as-pectos atuais dessa questo, parece-me necessriochamar a ateno para um fenmeno importantede que pouco se fala em educao: historicamentefalando, nos ltimos vinte anos, a profissionali-zao da rea educacional se desenvolveu em meioa uma crise geral do profissionalismo e das profis-ses, inclusive das profisses mais bem assentadascomo a medicina, o direito e a engenharia. Essacrise provocou muitos debates, anlises e diagns-ticos que no retomaremos aqui de maneira por-menorizada (Bourdoncle, 1991, 1993; Fullan etal., 1998; Laberree, 1992, 1997; Laberree e Pallas,1996; Schn, 1983). Podemos resumi-la em quatropontos:

    > 1. A crise do profissionalismo , em pri-meiro lugar, a crise da percia profissional, ou

    seja, dos conhecimentos, estratgias e tcnicasprofissionais por meio dos quais certos profis-sionais (mdicos, engenheiros, psiclogos, for-madores, professores etc.) procuram solucio-nar situaes problemticas concretas. A pe-rcia profissional perdeu progressivamente suaaura de cincia aplicada para aproximar-se deum saber muito mais ambguo, de um sabersocialmente situado e localmente construdo.Assimilada durante muito tempo ao exercciode uma racionalidade instrumental diretamen-te baseada no modelo das cincias aplicadas,uma racionalidade capaz de calcular e combi-nar eficazmente meios e fins, a percia profis-sional est sendo cada vez mais percebida hojeem dia de acordo com o modelo de uma racio-nalidade limitada, de uma racionalidade im-provisada, na qual o processo reflexivo, a im-provisao, a indeterminao, a criatividade,a intuio, o senso comum desempenham umgrande papel, apoiando-se, ao mesmo tempo,em rotinas prprias a cada tradio profissio-nal. O conhecimento profissional possui tam-bm dimenses ticas (valores, senso comum,saberes cotidianos, julgamento prtico, interes-ses sociais etc.) inerentes prtica profissional,especialmente quando esta se aplica a seres hu-manos: pacientes, prisioneiros, alunos, usu-rios dos servios sociais etc. Essas mudanasna viso da percia profissional suscitaramcontrovrsias a respeito do valor dos funda-mentos epistemolgicos das prticas profis-sionais. Houve, assim, uma multiplicao dasescolas de pensamento e dos referenciais, pro-vocando uma intensificao nos debates entreprofissionais e um aumento nos questionamen-tos do pblico com relao ao tipo e ao valordos saberes nos quais se apiam os atos pro-fissionais. A ausncia de referncias comunsgerou diviso e confuso entre os profissionaise multiplicou os problemas de comunicaoentre os adeptos de diferentes correntes de pen-samento, o que d agora a impresso de quemuitas profisses no dispem de um repert-

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    JefersonTextboxem educao, a profissionalizao o renovar e reformular os fundamentos epistemolgicos da profisso

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    JefersonTextbox essa conjuntura que tornar a profisso de educador to complexa quanto a do mdico, engenheiro, advogado.

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    JefersonTextboxsegundo o autor, a crise do profissionalismo tem afetado diversas profisses

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    JefersonTextboxPossivelmente isso pode se linkar as discusses da NSC em que criticava-se muito a teoria em detrimento de um conhecimento predominantemente prtico

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  • Revista Brasileira de Educao 9

    Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitrios

    rio de saberes estvel, codificado, consensuale portador de imputabilidade.

    > 2. Essa crise da percia profissional pro-voca um impacto profundo na formao pro-fissional. Na maioria das profisses, esse im-pacto se manifesta por meio de uma grandeinsatisfao e de crticas muitas vezes ferrenhascontra a formao universitria oferecida nasfaculdades e institutos profissionais (Clark eNeave, 1992; Lessard e Tardif, 1998). Em v-rios pases, muitos se perguntam se as univer-sidades, dominadas por culturas disciplinares(que so, alm disso, e acima de tudo, cultu-ras monodisciplinares) e por imperativos deproduo de conhecimentos, ainda so real-mente capazes de proporcionar uma formaoprofissional de qualidade, ou seja, uma forma-o assentada na realidade do mundo do tra-balho profissional. No que diz respeito edu-cao, na Amrica do Norte, um nmero ca-da vez maior de pessoas reclama que a forma-o de professores seja feita fora dos modelosdominantes da cultura universitria e, como napoca das escolas normais, que seja ligada aomeio escolar, como j ocorre com as escolasassociadas no Quebec e com as ProfessionalDevelopment Schools nos Estados Unidos.

    > 3. A crise do profissionalismo apontatambm para a crise do poder profissional epara a confiana que o pblico e os clientes de-positam nele. preciso entender, aqui, o ter-mo poder tanto no sentido poltico quantono sentido de capacidade ou competncia. Porum lado, no sentido poltico, o poder profis-sional parece, com demasiada freqncia, es-tar servindo muito mais aos interesses dos pro-fissionais do que aos interesses de seus clien-tes e do pblico em geral. Por outro lado, sepensarmos em termos de capacidade, o poderprofissional perde tanto quanto ganha e, quan-do ganha, seus xitos so muitas vezes amb-guos e portadores de efeitos imprevistos e svezes perversos.

    > 4. Enfim, a crise do profissionalismo ,em ltima instncia, a crise da tica profissio-nal, isto , dos valores que deveriam guiar osprofissionais. Nos ltimos trinta anos, obser-va-se que a maioria dos setores sociais ondeatuam profissionais tem sido permeada porconflitos de valores para os quais torna-se cadavez mais difcil achar ou inventar princpiosreguladores e consensuais. Esses conflitos devalores parecem ainda mais graves nas profis-ses cujos objetos de trabalho so seres hu-manos, como o caso do magistrio. Valorescomo a sade, a justia e a igualdade perde-ram a sua transparncia, seu poder de evidn-cia e sua fora de integrao. Para os profissio-nais, essa situao se expressa por meio de umacomplexificao crescente do discernimento eda atividade profissionais: se os valores quedevem guiar o agir profissional no so maisevidentes, ento a prtica profissional supeuma reflexo sobre os fins almejados em opo-sio ao pensamento tecnoprofissional situa-do apenas no mbito dos meios. A reflexosobre a tica profissional cessa de existir comoum discurso que exterior prtica e que do-mina a ao: ela reside doravante no prpriocerne do discernimento profissional a ser exer-cido na prtica cotidiana e co-constitui essaprtica.

    A crise a respeito do valor dos saberes profis-sionais, das formaes profissionais, da tica pro-fissional e da confiana do pblico nas profissese nos profissionais constitui o pano de fundo domovimento de profissionalizao do ensino e daformao para o magistrio. Ora, essa crise colocaatualmente os atores das reformas do ensino e daprofisso docente em uma situao duplamentecoercitiva: por um lado, h presses considerveispara profissionalizar o ensino, a formao e o of-cio de educador; por outro, as profisses perderamum pouco de seu valor e de seu prestgio e j noest mais to claro que a profissionalizao do en-sino seja uma opo to promissora quanto seus

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    JefersonTextboxa viso provoca uma dicotomia que pe em cheque o conhecimento das universidades como algo distante da prtica

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    JefersonTextboxcrise e falta de credibilidade no profissional

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    JefersonTextboxso estas crises que fomentam a profissionalizazo do magistrio.

  • 10 Jan/Fev/Mar/Abr 2000 N 13

    Maurice Tardif

    partidrios querem que se acredite (Tardif, Lessarde Gauthier, 1998; Tardif e Gauthier, 1999).

    Parafraseando uma frase clebre de Kant, ti-rada da Crtica da razo pura, em educao, essaconjuntura paradoxal deveria pelo menos tirar-nosdo sono dogmtico da razo profissional, man-tendo-nos acordados e sobretudo alertas diante dosriscos e perigos que ela comporta para a educaoe para a formao. , portanto, nesse contexto du-plamente coercitivo que a questo de uma episte-mologia da prtica profissional acha sua verdadei-ra pertinncia. De fato, se admitirmos que o movi-mento de profissionalizao , em grande parte,uma tentativa de renovar os fundamentos episte-molgicos do ofcio de professor, ento devemosexaminar seriamente a natureza desses fundamen-tos e extrair da elementos que nos permitam en-trar num processo reflexivo e crtico a respeito denossas prprias prticas como formadores e comopesquisadores.

    A epistemologia da prticaprofissional: tentativa de definio

    Sem entrar em uma discusso profunda a res-peito da noo de epistemologia, especifiquemosaqui alguns elementos conceituais que esto por trsda concepo defendida nesse texto. Depois da dis-soluo kantiana das teorias filosficas metafsicasdo conhecimento, no sculo XIX, e da ascenso dopositivismo, a epistemologia passa progressivamen-te de teoria do conhecimento a teoria da cincia, emais especificamente das cincias empricas da na-tureza. Por meio do pensamento empirista anglo-saxo e alemo (Crculo de Viena), a epistemologiatorna-se uma reflexo normativa que busca estabe-lecer critrios de demarcao entre a cincia e ano-cincia. Pensadores como Karl Popper e sobre-tudo Thomas Kuhn vo pouco a pouco se distan-ciar dessa viso positivista para tentar propor con-cepes capazes de dar conta da atividade cientfi-ca real (contexto da descoberta, mudanas sociaisque afetam as transformaes de paradigmas cient-ficos etc.). Esse movimento tambm pode ser asso-

    ciado, do lado anglo-americano, ao desenvolvimen-to da sociologia das cincias e a diversos estudossobre o conhecimento comum, o senso comum etc.,oriundos da etnometodologia, do interacionismosimblico e da sociologia cognitiva, bem como dolinguistic turn da filosofia de expresso inglesa. Dolado francfono e europeu continental, a epistemo-logia, dominada durante muito tempo pelo neokan-tismo e pelo positivismo, vai tambm se libertar doestudo estrito da lgica cientfica para incorporar,em suas preocupaes, a histria das cincias (Gan-guilhem), a psicologia (Bachelard, Piaget), a socio-logia e a antropologia das cincias (Latour) etc., semfalar de pensadores mais radicais como Derrida,Lyotard ou Foucault, que vo questionar profun-damente a autonomia das cincias e da racionali-dade cientfica, esforando-se para colocar em evi-dncia a conivncia delas com diferentes formas depoder. Desde a dcada de 1960, pode-se dizer queassistimos a um certo esfacelamento do campo tra-dicional da epistemologia (as cincias psicomate-mticas) e sua abertura a diferentes objetos epist-micos, especialmente o estudo dos saberes cotidi-anos, do senso comum, dos jogos de linguagem edos sistemas de ao por meio dos quais a realidadesocial e individual constituda. O conhecimentodos profissionais (mdicos, psiclogos, trabalhado-res sociais, professores etc.) faz parte desses objetosepistemolgicos, e nesse mbito que nos situamos.

    A definio que lhes propomos no uma de-finio de palavras ou de coisas, mas uma defini-o de pesquisa, isto , uma proposta com o fim deconstruir e delimitar um objeto de pesquisa, umcompromisso em favor de certas posturas tericase metodolgicas, assim como um vetor para a des-coberta de realidades que sem ela no veramos. Eisaqui essa definio: chamamos de epistemologia daprtica profissional o estudo do conjunto dos sa-beres utilizados realmente pelos profissionais em seuespao de trabalho cotidiano para desempenhar to-das as suas tarefas.

    Damos aqui noo de saber um sentidoamplo, que engloba os conhecimentos, as compe-tncias, as habilidades (ou aptides) e as atitudes,

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    JefersonTextboxmas a questo paradoxal porque se tem a luta pela profissionaliza e ao mesmo tempo a desvalorizao imperando.

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    JefersonTextboxa definio de Tardif para saberes docentes

  • Revista Brasileira de Educao 11

    Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitrios

    isto , aquilo que muitas vezes foi chamado de sa-ber, saber-fazer e saber-ser. Sublinhemos, comomostraremos adiante, que esse sentido amplo refleteo que os prprios profissionais dizem a respeito deseus prprios saberes profissionais (Tardif, Lahayee Lessard, 1991; Tardif e Lessard, 1999).

    A finalidade de uma epistemologia da prticaprofissional revelar esses saberes, compreendercomo so integrados concretamente nas tarefas dosprofissionais e como estes os incorporam, produ-zem, utilizam, aplicam e transformam em funodos limites e dos recursos inerentes s suas ativida-des de trabalho. Ela tambm visa a compreender anatureza desses saberes, assim como o papel quedesempenham tanto no processo de trabalho docen-te quanto em relao identidade profissional dosprofessores.

    Na ltima parte do texto, indicaremos em quesentido essa definio suscetvel de modificar nos-sas concepes em relao formao profissionalno magistrio. No momento, queremos chamar bre-vemente a ateno para certas conseqncias te-ricas e metodolgicas da decorrentes e que estorelacionadas com a pesquisa universitria. Em ou-tras palavras, em que sentido essa definio da epis-temologia da prtica profissional pode modificarnossas concepes atuais sobre a pesquisa univer-sitria a respeito do ensino? Seis conseqncias pa-recem ser particularmente importantes.

    > 1. Conforme a palavra de ordem da fe-nomenologia, em termos de postura de pesqui-sa, essa definio prope uma volta reali-dade, isto , um processo centrado no estu-do dos saberes dos atores em seu contexto realde trabalho, em situaes concretas de ao.A hiptese subjacente a essa postura de pes-quisa que os saberes profissionais so sabe-res da ao ou ainda, usando uma expressoque preferimos, saberes do trabalho, saberesno trabalho: working knowledge, como tobem expressa Kennedy (1983). Essa hiptese forte, na medida em que no diz somente queos saberes profissionais se referem ao trabalho,

    como uma teoria se refere a um objeto ou auma prtica, mas vai mais longe, dizendo queos saberes profissionais so saberes trabalha-dos, saberes laborados, incorporados no pro-cesso de trabalho docente, que s tm sentidoem relao s situaes de trabalho e que nessas situaes que so construdos, modela-dos e utilizados de maneira significativa pelostrabalhadores. O trabalho no primeiro umobjeto que se olha, mas uma atividade que sefaz, e realizando-a que os saberes so mobi-lizados e construdos. Esse enfoque consideraque o profissional, sua prtica e seus saberesno so entidades separadas, mas co-perten-cem a uma situao de trabalho na qual co-evoluem e se transformam. Querer estudar ossaberes profissionais sem associ-los a umasituao de ensino, a prticas de ensino e a umprofessor seria, ento, um absurdo. a mes-ma coisa que querer estudar uma situao realde trabalho, uma situao real de ensino, semlevar em considerao a atividade do profes-sor e os saberes por ele mobilizados. Finalmen-te, querer estudar os professores sem estudaro trabalho e os saberes deles seria um absurdomaior ainda. Ora, uma boa parte da literaturada rea da educao, nos ltimos cinqentaanos, est assentada nesses trs absurdos...

    > 2. Uma conseqncia direta dessa de-finio que no se devem confundir os sabe-res profissionais com os conhecimentos trans-mitidos no mbito da formao universitria.Na Amrica do Norte, a situao clara a esserespeito: trinta anos de pesquisa mostram queh uma relao de distncia entre os saberesprofissionais e os conhecimentos universitrios(Fenstermacher, 1994; Tardif e Lessard, 1999;Wideen et al., 1998; Schn, 1983; Zeichner eHoeft, 1996). Essa distncia pode assumir di-versas formas, podendo ir da ruptura rejei-o da formao terica pelos profissionais, ouento assumir formas mais atenuadas comoadaptaes, transformaes, seleo de certos

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    JefersonTextboxcomo atua essa epistemologia das atividades prticas docentes

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    JefersonTextboxuma implicao estudar os saberes docentes em sua efetivao prtica

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    JefersonTextboxa ideia pensar que o trabalho , fundamentalmente, sua efetivao

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    JefersonTextbox incoerente estudar os saberes do professor sem considerar a sua prtica

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  • 12 Jan/Fev/Mar/Abr 2000 N 13

    Maurice Tardif

    conhecimentos universitrios a fim de incor-por-los prtica. Desse ponto de vista, a pr-tica profissional nunca um espao de aplica-o dos conhecimentos universitrios. Ela , namelhor das hipteses, um processo de filtraoque os dilui e os transforma em funo dasexigncias do trabalho; ela , na pior das hip-teses, um muro contra o qual se vm jogar emorrer conhecimentos universitrios conside-rados inteis, sem relao com a realidade dotrabalho docente dirio nem com os contex-tos concretos de exerccio da funo docente.

    > 3. Do ponto de vista metodolgico, essadefinio exige o que poderamos chamar deum distanciamento etnogrfico em relao aosconhecimentos universitrios. Dizendo de ma-neira polmica, se os pesquisadores universi-trios querem estudar os saberes profissionaisda rea do ensino, devem sair de seus labora-trios, sair de seus gabinetes na universidade,largar seus computadores, largar seus livros eos livros escritos por seus colegas que definema natureza do ensino, os grandes valores edu-cativos ou as leis da aprendizagem, e ir dire-tamente aos lugares onde os profissionais doensino trabalham, para ver como eles pensame falam, como trabalham na sala de aula, comotransformam programas escolares para torn-los efetivos, como interagem com os pais dosalunos, com seus colegas etc.

    > 4. Parafraseando Garfinkel (1984), essadefinio tambm prope que se pare de con-siderar os profissionais, isto , os professores,como idiotas cognitivos cuja atividade de-terminada pelas estruturas sociais, pela culturadominante, pelo inconsciente, mesmo sendoele prtico, e outras realidades do gnero. Osprofissionais do ensino so, evidentemente,determinados em parte por todas essas realida-des, mas so tambm, ao mesmo tempo, ato-res que possuem saberes e um saber-fazer (Gid-dens, 1987) e que do provas, em seus atoscotidianos, de uma competncia significativa

    diante das condies e das conseqncias deseu trabalho, o que lhes possibilita tirar par-tido dele, a maior parte do tempo, para atin-gir seus objetivos. O conceito de professor co-mo ator e profissional dotado de competnciastem servido de base, alis, s reformas efetua-das na formao para o magistrio, na Am-rica do Norte, desde meados dos anos 1980.Ele provocou, por exemplo, um aumento sig-nificativo da contribuio da formao prti-ca nos currculos, a origem de novas prticasde formao reflexiva e o reconhecimento dovalor dos saberes profissionais dos professo-res. preciso, portanto, que a pesquisa univer-sitria se apie nos saberes dos professores afim de compor um repertrio de conhecimen-tos para a formao de professores.

    > 5. Essa definio tambm no-nor-mativa. A nosso ver, um dos maiores proble-mas da pesquisa em cincias da educao ode abordar o estudo do ensino de um pontode vista normativo, o que significa dizer queos pesquisadores se interessam muito mais peloque os professores deveriam ser, fazer e saberdo que pelo que eles so, fazem e sabem real-mente. Essa viso normativa est alicerada emuma viso sociopoltica do ensino: historica-mente, os professores foram ou um corpo daIgreja ou um corpo do Estado a servio de cau-sas e finalidades maiores do que eles. De umcerto modo, as cincias da educao assumi-ram essa viso sociopoltica, dando-lhe, po-rm, uma aura cientfica, tecnocrtica, refor-mista, inovadora e ao mesmo tempo huma-nista. A legitimidade da contribuio das cin-cias da educao para a compreenso do en-sino no poder ser garantida enquanto os pes-quisadores construrem discursos longe dosatores e dos fenmenos de campo que eles afir-mam representar ou compreender.

    > 6. Por fim, a epistemologia da prticaprofissional sustenta que preciso estudar oconjunto dos saberes mobilizados e utilizados

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    JefersonTextboxisso faz referncia ao processo de didatizao porque o acadmico no traduz o saber docente.

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    JefersonTextboxpara conhecer os saberes dos professore,s preciso estudar situaes prticas

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    JefersonTextboxno podemos tomar os professores como idiotas cognitivos

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    JefersonTextboxELE CRITICA AS PESQUISAS QUE S FALAM O QUE OS PROFESSORES DEVERIAM SER E NO TRATAM DO QUE ELES SO.

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  • Revista Brasileira de Educao 13

    Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitrios

    pelos professores em todas as suas tarefas. Po-demos chamar essa perspectiva de ecolgi-ca, em referncia aos trabalhos de WilliamDoyle (1986). Todavia, em relao de Doy-le, trata-se de uma perspectiva ecolgica in-tegral, pois ele limitava a ecologia da salade aula. A perspectiva ecolgica integral sesitua mais na linha das propostas de Wideenet al. (1998), no tocante formao para omagistrio, e de outros pesquisadores norte-americanos, no tocante ao estudo do ensino(Erickson, 1986). Ela deseja ampliar e ultra-passar as duas portas de entrada tradicionaisda anlise do ensino, que so a didtica e a pe-dagogia ou a psicopedagogia, as quais foram,durante muito tempo, as duas tetas da forma-o de professores na universidade. Noutraspalavras, o conhecimento da matria ensina-da e o conhecimento pedaggico (que se re-fere a um s tempo ao conhecimento dos alu-nos, organizao das atividades de ensino eaprendizagem e gesto da classe) so certa-mente conhecimentos importantes, mas estolonge de abranger todos os saberes dos profes-sores no trabalho. A didtica e a psicopeda-gogia so construes de pesquisadores uni-versitrios e no de professores ou de alunosdos cursos de formao de professores (La-rose, Spallanzani, Lenoir, Grenon e Hasni, noprelo). O estudo do ensino em uma perspec-tiva ecolgica deveria fazer emergir as cons-trues dos saberes docentes que refletem ascategorias conceituais e prticas dos prpriosprofessores, constitudas no e por meio do seutrabalho no cotidiano.

    Algumas caractersticasdos saberes profissionaissegundo essa definio

    Limitamo-nos at aqui a uma discusso con-ceitual e polmica a respeito da epistemologia daprtica profissional. Queremos, agora, mostrar co-mo ela se aplica anlise do saber dos professores

    e que tipos de resultados de pesquisa susceptvelde produzir. Nas pginas seguintes, vamos nos re-ferir a trabalhos recentes sobre o ensino nos Esta-dos Unidos, quilo que os americanos chamam desnteses de pesquisa, que so resenhas sistemticase crticas de pesquisas empricas, bem como s nos-sas prprias pesquisas sobre o trabalho docente.No queremos fazer aqui uma apresentao siste-mtica desses resultados, mas organiz-los por meiode constataes que possibilitem a caracterizaodos saberes profissionais dos professores.

    Os saberes profissionaisdos professores so temporais

    Um dos primeiros resultados que sobressaemdessa perspectiva epistemolgica e ecolgica queos saberes profissionais dos professores so tempo-rais, ou seja, so adquiridos atravs do tempo. Elesso temporais pelo menos em trs sentidos (Tardif,Raymond, Lessard e Mukamurera, no prelo).

    Em primeiro lugar, uma boa parte do que osprofessores sabem sobre o ensino, sobre os papisdo professor e sobre como ensinar provm de suaprpria histria de vida, e sobretudo de sua hist-ria de vida escolar (Butt e Raymond, 1989; Cartere Doyle, 1996; Jordel, 1987, Raymond, no prelo a,no prelo b; Richardson, 1996). Os professores sotrabalhadores que foram mergulhados em seu espa-o de trabalho durante aproximadamente 16 anos(em torno de 15 mil horas), antes mesmo de come-arem a trabalhar (Lortie, 1975). Essa imerso semanifesta atravs de toda uma bagagem de conhe-cimentos anteriores, de crenas, de representaese de certezas sobre a prtica docente. Esses fenme-nos permanecem fortes e estveis ao longo do tem-po. Na Amrica do Norte, percebe-se que a maio-ria dos dispositivos de formao inicial dos pro-fessores no conseguem mud-los nem abal-los(Wideen et al., 1998). Os alunos passam pelos cur-sos de formao de professores sem modificar suascrenas anteriores sobre o ensino. E, quando come-am a trabalhar como professores, so principal-mente essas crenas que eles reativam para solu-

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    JefersonTextboxos sabberes dos professores no se reduzem ao conhecimento da matria e ao pedaggico.

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    JefersonTextboxpor isso deve-se pensar categorias a partir do trabalho no cotidiano

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    JefersonTextboxsaberes dos profissionais so temporais

    JefersonTextboxExperiencia de vida

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    JefersonTextboxProfessores podem construir crenas que no so alteradas durante sua experiencia de formao

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  • 14 Jan/Fev/Mar/Abr 2000 N 13

    Maurice Tardif

    cionar seus problemas profissionais. Por exemplo,Raymond, Butt e Yamagishi (1993) observaramque, quando ocorriam problemas de disciplina emsala de aula, a tendncia dos professores era reati-var modelos de soluo de conflitos que vinham desua histria familiar e escolar.

    Os saberes profissionais tambm so tempo-rais no sentido de que os primeiros anos de prti-ca profissional so decisivos na aquisio do senti-mento de competncia e no estabelecimento das ro-tinas de trabalho, ou seja, na estruturao da pr-tica profissional. Ainda hoje, a maioria dos profes-sores aprendem a trabalhar na prtica, s apalpa-delas, por tentativa e erro. a fase dita de explo-rao (Huberman, 1989; Huberman et al., 1989),caracterizada pela aprendizagem intensa do ofcio.Essa aprendizagem, freqentemente difcil e ligadaquilo que denominamos sobrevivncia profissio-nal, quando o professor deve dar provas de sua ca-pacidade, ocasiona a chamada edificao de umsaber experiencial, que se transforma muito cedo emcertezas profissionais, em truques do ofcio, em roti-nas, em modelos de gesto da classe e de transmis-so da matria (Feinman Nemser, 1983; Hubermanet al., 1989; Ryan et al., 1980; Zeichner e Gore,1990; Zeichner e Hoeft, 1996).

    Finalmente, os saberes profissionais so tem-porais em um terceiro sentido pois so utilizados ese desenvolvem no mbito de uma carreira, isto ,de um processo de vida profissional de longa du-rao do qual fazem parte dimenses identitrias edimenses de socializao profissional, bem comofases e mudanas. Na Amrica do Norte, muitospesquisadores se interessaram pelas relaes entresaberes profissionais e carreira, principalmente noque se refere aos professores. Por exemplo, essesestudos colocam em evidncia o carter narrativodo saber, com suas metforas e imagens centraiscomo a relao com as crianas, a questo da au-toridade, o sentimento de caring (a ideologia doservio) etc. (Elbaz, 1991, 1993). Por outro lado,a carreira tambm um processo de socializao,isto , um processo de identificao e de incorpo-rao dos indivduos s prticas e rotinas insti-

    tucionalizadas dos grupos de trabalho. Ora, essesgrupos a equipe de professores da escola, a dire-o do estabelecimento etc. exigem que os indi-vduos se adaptem a eles e no o contrrio. Em ter-mos profissionais e de carreira, saber como viver emuma escola to importante quanto saber ensinarna sala de aula (Zeichner e Gore, 1990; Zeichner eHoeft, 1996).

    Os saberes profissionais dos professoresso plurais e heterogneos

    Um segundo resultado de trabalhos realizadosde acordo com essa perspectiva epistemolgica eecolgica que os saberes profissionais dos profes-sores so variados e heterogneos, em trs sentidos.

    Em primeiro lugar, eles provm de diversasfontes. Em seu trabalho, um professor se serve desua cultura pessoal, que provm de sua histria devida e de sua cultura escolar anterior; ele tambmse apia em certos conhecimentos disciplinares ad-quiridos na universidade, assim como em certos co-nhecimentos didticos e pedaggicos oriundos desua formao profissional; ele se apia tambm na-quilo que podemos chamar de conhecimentos cur-riculares veiculados pelos programas, guias e ma-nuais escolares; ele se baseia em seu prprio saberligado experincia de trabalho, na experincia decertos professores e em tradies peculiares ao of-cio de professor.

    Os saberes profissionais tambm so variadose heterogneos porque no formam um repertriode conhecimentos unificado, por exemplo, em tor-no de uma disciplina, de uma tecnologia ou de umaconcepo do ensino; eles so, antes, eclticos e sin-crticos. Um professor raramente tem uma teoriaou uma concepo unitria de sua prtica; ao con-trrio, os professores utilizam muitas teorias, con-cepes e tcnicas, conforme a necessidade, mesmoque paream contraditrias para os pesquisadoresuniversitrios. Sua relao com os saberes no debusca de coerncia, mas de utilizao integrada notrabalho, em funo de vrios objetivos que pro-curam atingir simultaneamente.

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    JefersonTextboxos primeiros anos de experincia so os mais significativos para a adaptao e adequao a rotina de trabalho.

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    JefersonTextbox nesse estgio que se criam certezas e se totalizam as experincias de trabalho prtico em sala.

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    JefersonTextboxexiste o desenvolvimento e mudanas na carreira

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    JefersonTextboxexiste tambm o processo de socializao, no qual os professores vo se adaptando equipe de professores, a escola, direo. As relaes estabelecidas no espao escolar so fundamentais.

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    JefersonTextboxos saberes dos professores provem de diversas fontes diferentes.

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    JefersonTextboxos conhecimentos so eclticos e sincrticos

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    JefersonTextboxa coiisa toda no segue uma nica linha, mas multiplo.

  • Revista Brasileira de Educao 15

    Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitrios

    Finalmente, os saberes profissionais so va-riados e heterogneos porque os professores, naao, no trabalho, procuram atingir diferentes ti-pos de objetivos cuja realizao no exige os mes-mos tipos de conhecimento, de competncia ou deaptido. Dizendo de outra maneira, a prtica pro-fissional dos professores heterognea ou heter-noma no tocante aos objetivos internos da ao eaos saberes mobilizados. Por exemplo, quando ob-servamos professores trabalhando em sala de aula,na presena dos alunos, percebemos que eles pro-curam atingir, muitas vezes de forma simultnea,diferentes tipos de objetivos: procuram controlaro grupo, motiv-lo, lev-lo a se concentrar em umatarefa, ao mesmo tempo em que do uma atenoparticular a certos alunos da turma, procuram orga-nizar atividades de aprendizagem, acompanhar aevoluo da atividade, dar explicaes, fazer comque os alunos compreendam e aprendam etc. Ora,esse conjunto de tarefas evolui durante o tempo daaula de acordo com uma trama dinmica de intera-es humanas entre professores e alunos. Essa tra-ma bem conhecida hoje graas a inmeros traba-lhos sobre o ensino em sala de aula (Doyle, 1986;Tardif e Lessard, 1999). Esses trabalhos mostramque o trabalho na sala de aula, na presena dosalunos, exige uma variedade de habilidades ou decompetncias. A gesto de classe exige a capacida-de de implantar um sistema de regras sociais nor-mativas e de fazer com que sejam respeitadas, gra-as a um trabalho complexo de interaes com osalunos que prossegue durante todo o ano letivo.Para respeitar os programas escolares, os professo-res precisam interpret-los, adapt-los e transfor-m-los em funo das condies concretas da tur-ma e da evoluo das aprendizagens dos alunos.Quer se trate de uma aula ou do programa a serministrado durante o ano inteiro, percebe-se que oprofessor precisa mobilizar um vasto cabedal desaberes e de habilidades, porque sua ao orien-tada por diferentes objetivos: objetivos emocionaisligados motivao dos alunos, objetivos sociaisligados disciplina e gesto da turma, objetivoscognitivos ligados aprendizagem da matria en-

    sinada, objetivos coletivos ligados ao projeto edu-cacional da escola etc.

    Finalmente, se os saberes profissionais dos pro-fessores tm uma certa unidade, no se trata de umaunidade terica ou conceitual, mas pragmtica: co-mo as diferentes ferramentas de um arteso, elesfazem parte da mesma caixa de ferramentas, por-que o arteso pode precisar deles no exerccio desuas atividades. A natureza da relao entre o ar-teso e todas as suas ferramentas , portanto, prag-mtica: essas ferramentas constituem recursos con-cretos integrados ao processo de trabalho, porquepodem servir para fazer alguma coisa especfica re-lacionada com as tarefas que competem ao arteso.Ocorre o mesmo com os saberes profissionais dosprofessores: eles esto a servio da ao (Durand,1996) e na ao que assumem seu significado esua utilidade.

    Os saberes profissionais sopersonalizados e situados

    Um terceiro conjunto de resultados de pesqui-sas indica que os saberes profissionais so persona-lizados e situados. Por isso, o estudo dos saberesprofissionais no pode ser reduzido ao estudo dacognio ou do pensamento dos professores (tea-chers thinking). Os professores dispem, evidente-mente, de um sistema cognitivo, mas eles no sosomente sistemas cognitivos, coisa que muitas ve-zes esquecida! Um professor tem uma histria devida, um ator social, tem emoes, um corpo, po-deres, uma personalidade, uma cultura, ou mesmoculturas, e seus pensamentos e aes carregam asmarcas dos contextos nos quais se inserem.

    O que a pesquisa sobre os saberes profissio-nais mostra que eles so fortemente personali-zados, ou seja, que se trata raramente de saberesformalizados, de saberes objetivados, mas sim desaberes apropriados, incorporados, subjetivados,saberes que difcil dissociar das pessoas, de suaexperincia e situao de trabalho. Essa caracters-tica um resultado do trabalho docente (Carter,1990).

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    JefersonTextboxbuscam atingir objetivos diferentes que utilizam conhecimentos diferentes

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    JefersonTextboxconhecer e readequar os programas

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    JefersonTextboxa totalizao dos saberes pragmtica

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    JefersonTextboxo professor no s a parte pedaggica que ele faz mas tambm um sujeito historicamente constituido.

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  • 16 Jan/Fev/Mar/Abr 2000 N 13

    Maurice Tardif

    De fato, nas atividades e profisses de intera-o humana como o magistrio, o trabalhador estpresente pessoalmente no local de trabalho e suapessoa constitui um elemento fundamental na rea-lizao do processo de trabalho em interao comoutras pessoas, isto , com os alunos, os estudan-tes. Em outras palavras, nas profisses de interaohumana, a personalidade do trabalhador absor-vida no processo de trabalho e constitui, at certoponto, a principal mediao da interao (Tardif eLessard, 1999). Esse fenmeno permite, justamen-te, compreender por que os professores, ao sereminterrogados sobre suas prprias competncias pro-fissionais, falam, muitas vezes, primeiro de sua per-sonalidade, suas habilidades pessoais, seus talentosnaturais, como fatores importantes de xito em seutrabalho.

    Alm disso, nas atividades e profisses de in-terao humana, os trabalhadores dificilmente po-dem se apoiar em conhecimentos objetivos que pro-duzam concretamente tecnologias operatrias e efi-cazes nas situaes de trabalho. At agora, as cin-cias sociais e humanas e as cincias da educao noconseguiram construir, como as cincias naturais eaplicadas, tecnologias eficazes e operatrias de con-trole das situaes humanas e dos seres humanos.As pessoas e o que ocorre com os professores que trabalham com seres humanos devem habi-tualmente contar consigo mesmas, com seus recur-sos e com suas capacidades pessoais, com sua pr-pria experincia e com a de sua categoria para con-trolar seu ambiente de trabalho.

    Mas os saberes profissionais dos professoresno so somente personalizados, eles tambm sosituados, isto , como dizamos anteriormente, cons-trudos e utilizados em funo de uma situao detrabalho particular, e em relao a essa situaoparticular que eles ganham sentido. Em outras pa-lavras, diferentemente dos conhecimentos univer-sitrios, os saberes profissionais no so construdose utilizados em funo de seu potencial de transfe-rncia e de generalizao; eles esto encravados,embutidos, encerrados em uma situao de traba-lho qual devem atender. Usando as palavras de

    Giddens (1987), poderamos falar aqui de con-textualidade dos saberes profissionais. Ora, noensino, esse fenmeno de suma importncia, poisas situaes de trabalho colocam na presena unsdos outros seres humanos que devem negociar ecompreender juntos o significado de seu trabalhocoletivo. Essa compreenso comum supe que ossignificados atribudos pelos professores e pelos alu-nos s situaes de ensino sejam elaborados e par-tilhados dentro dessas prprias situaes; noutraspalavras, eles esto ancorados, situados nas situa-es que ajudam a definir. So esses fenmenos deancoragem que levam hoje, depois de Lave (1988;1991, 1993), muitos pesquisadores a se interessa-rem pela cognio situada, pela aprendizagem con-textualizada, onde os saberes so construdos pe-los atores em funo dos contextos de trabalho.

    O objeto do trabalho do docenteso seres humanos e, por conseguinte,os saberes dos professores carregam

    as marcas do ser humano

    O quarto e ltimo resultado de pesquisa parao qual vale a pena chamar a ateno o seguinte:o objeto do trabalho docente so seres humanos e,conseqentemente, os saberes dos professores tra-zem consigo as marcas de seu objeto de trabalho.Essa proposio acarreta conseqncias importan-tes e raramente discutidas quanto prtica profis-sional dos professores. Mencionaremos somenteduas delas.

    Em primeiro lugar, os seres humanos tm aparticularidade de existirem como indivduos. Mes-mo que pertenam a grupos, a coletividades, elesexistem primeiro por si mesmos como indivduos.Esse fenmeno da individualidade est no cerne dotrabalho dos professores, pois, embora eles traba-lhem com grupos de alunos, devem atingir os indi-vduos que os compem, pois so os indivduos queaprendem. Do ponto de vista epistemolgico, essasituao muito interessante. ela que orienta aexistncia, no professor, de uma disposio paraconhecer e para compreender os alunos em suas

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    JefersonTextboxo saber docente construido em relao com a turma trabalhaada.

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    JefersonTextboxtrabalha-se no coletivo mas busca-se atingir o individuo

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  • Revista Brasileira de Educao 17

    Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitrios

    particularidades individuais e situacionais, bem co-mo em sua evoluo a mdio prazo no contexto dasala de aula. Ao invs de se centrar nos fenmenosque possibilitam o acmulo de conhecimentos de or-dem geral, como ocorre com a construo de sabe-res codificados sobre os alunos (por exemplo, empsicologia infantil, nas teorias da aprendizagem), adisposio do professor para conhecer seus alunoscomo indivduos deve estar impregnada de sensibi-lidade e de discernimento a fim de evitar as gene-ralizaes excessivas e de afogar a percepo queele tem dos indivduos em um agregado indistintoe pouco frtil para a adaptao de suas aes. Essadisposio para conhecer os alunos como indivduosparece, alis, muito pouco desenvolvida nos alunos-professores, que so acusados de no conheceremsuficientemente os alunos (Kagan, 1992), de nosaberem usar de discernimento para com eles (Mo-rine-Dershimer, 1988) e de projetarem neles os in-teresses e motivaes caractersticos de suas pr-prias histrias escolares (Raymond, no prelo b). Aaquisio da sensibilidade relativa s diferenas en-tre os alunos constitui uma das principais caracters-ticas do trabalho docente. Essa sensibilidade exigedo professor um investimento contnuo e a longus-simo prazo, assim como a disposio de estar cons-tantemente revisando o repertrio de saberes adqui-ridos por meio da experincia.

    A segunda conseqncia decorrente do obje-to humano do trabalho docente reside no fato de osaber profissional comportar sempre um compo-nente tico e emocional. Um componente tico eemocional, primeiro porque, como explica Denzin(1984, apud Hargreaves, 1998), o ensino umaprtica profissional que produz mudanas emo-cionais inesperadas na trama experiencial da pes-soa docente. As prticas profissionais que envolvememoes suscitam questionamentos e surpresa napessoa, levando-a, muitas vezes de maneira invo-luntria, a questionar suas intenes, seus valorese suas maneiras de fazer. Esses questionamentossobre a maneira de ensinar, de entrar em relaocom os outros, sobre os efeitos de suas aes e so-bre os valores nos quais elas se apiam exigem do

    professor uma grande disponibilidade afetiva e umacapacidade de discernir suas reaes interiores por-tadoras de certezas sobre os fundamentos de suaao. O trabalho dirio com os alunos provoca noprofessor o desenvolvimento de um conhecimentode si, de um conhecimento de suas prprias emo-es e valores, da natureza, dos objetos, do alcan-ce e das conseqncias dessas emoes e valores nasua maneira de ensinar (Fenstermacher, 1999).

    Em seguida, porque os estudantes, os alunos,so seres humanos cujo assentimento e cooperaodevem ser obtidos para que aprendam e para queo clima da sala de aula seja impregnado de tolern-cia e de respeito pelo outros. Embora seja possvelmanter os alunos fisicamente presos em uma salade aula, no se pode for-los a aprender. Para queaprendam, eles mesmos devem, de uma maneira oude outra, aceitar entrar em um processo de apren-dizagem. Ora, essa situao pe os professores dian-te de um problema que a literatura chama de mo-tivao dos alunos: para que os alunos se envolvamem uma tarefa, eles devem estar motivados. Moti-var os alunos uma atividade emocional e socialque exige mediaes complexas da interao hu-mana: a seduo, a persuaso, a autoridade, a ret-rica, as recompensas, as punies etc. Essas me-diaes da interao levantam vrios tipos de pro-blemas ticos, principalmente problemas de abuso,mas tambm problemas de negligncia ou de in-diferena em relao a certos alunos. Por exemplo,vrias pesquisas evidenciaram o fato de que certosprofessores tinham espontaneamente menos tendn-cia a se dirigir em classe a certas categorias de alu-nos (Baudoux e Noircent, 1998; Zeichner e Hoeft,1996). Alis, a repartio da ateno do professorentre os alunos na sala de aula um dos mais impor-tantes dilemas ticos constitutivos do ensino (Lam-pert, 1985).

    Podemos resumir agora nossas palavras da se-guinte maneira: uma perspectiva epistemolgica eecolgica do estudo do ensino e da formao parao ensino permite conceber uma postura de pesqui-sa que leva ao estudo dos saberes docentes tais comoso mobilizados e construdos em situaes de tra-

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  • 18 Jan/Fev/Mar/Abr 2000 N 13

    Maurice Tardif

    balho. Os trabalhos realizados de acordo com essaperspectiva mostram que os saberes docentes sotemporais, plurais e heterogneos, personalizadose situados, e que carregam consigo as marcas do seuobjeto, que o ser humano. Ora, os conhecimentostericos construdos pela pesquisa em cincias daeducao, em particular os da pedagogia e da di-dtica que so ministradas nos cursos de formaopara o ensino, no concedem ou concedem muitopouca legitimidade aos saberes dos professores, sa-beres criados e mobilizados por meio de seu traba-lho. Na formao inicial, os saberes codificados dascincias da educao e os saberes profissionais sovizinhos mas no se interpenetram nem se inter-pelam mutuamente. Se admitirmos a legitimidadedessa tese, no podemos deixar de considerar cer-tas questes importantes para a pesquisa e para aformao universitria. So essas questes que va-mos examinar agora guisa de concluso.

    Concluso: formao dos professorese saberes profissionais

    Na Amrica do Norte, os problemas da for-mao para o magistrio em contexto universitrioso conhecidos, discutidos e examinados de maneirarecorrente. H pouco tempo, no contexto das re-centes reformas da formao inicial, os professoresuniversitrios, tanto americanos quanto canaden-ses, fizeram grandes balanos e prognsticos som-brios, motivados, em grande parte, pelo conserva-dorismo e pela estagnao das faculdades e dos de-partamentos de educao (Fullan, Galluzzo, Mor-ris e Watson, 1998; Lessard, Lenoir, Martin, Tardife Voyer, 1999; Tom, 1997). As dificuldades iden-tificadas abrangem todo o espectro das armadilhasque podem ser encontradas nos ambientes institu-cionais. Entretanto, ns nos limitaremos discussode problemas de natureza epistemolgica, proble-mas que se tornaram ainda mais patentes median-te os resultados de estudos sobre as caractersticasdos saberes profissionais dos professores. Aps adiscusso desses problemas, proporemos opes detrabalho e tarefas a serem realizadas pelos profes-

    sores universitrios a fim de reconstituir o campoepistemolgico da formao para o magistrio.

    Problemas epistemolgicos domodelo universitrio de formao

    Os cursos de formao para o magistrio soglobalmente idealizados segundo um modelo apli-cacionista do conhecimento: os alunos passam umcerto nmero de anos a assistir a aulas baseadas emdisciplinas e constitudas de conhecimentos pro-posicionais. Em seguida, ou durante essas aulas, elesvo estagiar para aplicarem esses conhecimentos.Enfim, quando a formao termina, eles comeama trabalhar sozinhos, aprendendo seu ofcio na pr-tica e constatando, na maioria das vezes, que essesconhecimentos proposicionais no se aplicam bemna ao cotidiana (Wideen et al., 1998).

    Esse modelo aplicacionista no somente ideo-lgico e epistemolgico, tambm um modelo ins-titucionalizado atravs de todo o sistema de prti-cas e de carreiras universitrias. Por exemplo, apesquisa, a formao e a prtica constituem, nes-se modelo, trs plos separados: os pesquisadoresproduzem conhecimentos que so em seguida trans-mitidos no momento da formao e finalmenteaplicados na prtica: produo dos conhecimen-tos, formao relativa a esses conhecimentos e mo-bilizao dos conhecimentos na ao tornam-se, apartir desse momento, problemticas e questescompletamente separadas, que competem a dife-rentes grupos de agentes: os pesquisadores, os for-madores e os professores. Por sua vez, cada umdesses grupos de agentes submetido a exignciase a trajetrias profissionais conforme os tipos decarreira em jogo. De modo geral, os pesquisadorestm interesse em abandonar a esfera da formaopara o magistrio e em evitar investir tempo nosespaos de prtica: eles devem antes de tudo escre-ver e falar diante de seus pares, conseguir subven-es e formar outros pesquisadores por meio deuma formao de alto nvel, doutoral ou ps-dou-toral, cujos candidatos no se destinam ao ensinoprimrio e secundrio.

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    Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitrios

    Esse modelo aplicacionista comporta um cer-to nmero de problemas fundamentais bastanteconhecidos e documentados hoje lembremossomente dois dentre os mais importantes. Primei-ro problema: ele idealizado segundo uma lgicadisciplinar e no segundo uma lgica profissionalcentrada no estudo das tarefas e realidades do tra-balho dos professores. Ora, a lgica disciplinarcomporta duas limitaes maiores para a forma-o profissional:

    > por um lado, por ser monodisciplinar,ela altamente fragmentada e especializada:as disciplinas (psicologia, filosofia, didticaetc.) no tm relao entre elas, pois consti-tuem unidades autnomas fechadas em si mes-mas e de curta durao e, portanto, tm pou-co impacto sobre os alunos;

    > por outro lado, a lgica disciplinar regida por questes de conhecimento e no porquestes de ao. Em uma disciplina, aprender conhecer. Mas, em uma prtica, aprender fazer e conhecer fazendo. No modelo aplica-cionista, o conhecer e o fazer so dissociadose tratados separadamente em unidades de for-mao distintas e separadas. Alm disso, o fa-zer est subordinado temporal e logicamenteao conhecer, pois ensina-se ao alunos dos cur-sos de formao de professores que, para fa-zer bem feito, eles devem conhecer bem e emseguida aplicar seu conhecimento ao fazer.

    Do ponto de vista epistemolgico, esse mo-delo dominante do conhecimento baseia-se na re-lao sujeito/objeto. Ele parte do princpio de queum sujeito dotado de um equipamento mental por exemplo, estruturas cognitivas, representaes,mecanismos de processamento da informao etc. se posiciona, de um certo modo, diante do ob-jeto do qual ele extrai e filtra certas informaes apartir das quais ele emite proposies mais ou me-nos vlidas sobre o objeto. Essas proposies po-dem ser asseres empricas sobre o objeto ou ain-da proposies de ao concebidas a partir do sa-

    ber emprico disponvel. Em ambos os casos, o lo-cutor (por exemplo, um bilogo) e o ator (por exem-plo, um engenheiro) referem-se a um saber propo-sicional: no primeiro caso, o locutor sustenta quesuas proposies a respeito do objeto so vlidas(por exemplo, A causa B); no segundo caso, o atorsustenta que essas proposies so eficazes na ao(por exemplo, se A ento B). Esse modelo o dacincia emprica da natureza, segundo a concepopositivista-instrumental (Habermas, 1987). Ele seassemelha quilo que Durand (1999) chama de mo-delo da encomenda, as situaes de ao so abor-dadas de acordo com o postulado da existncia, noator, de estruturas cognitivas prvias ao e a par-tir das quais o ator age, dirigindo de um certo mo-do a ao em funo de suas estruturas cognitivas.

    Ora, na ao, o pensamento humano no pa-rece funcionar como sugerem esses modelos. Comoj mostramos anteriormente, um professor mergu-lhado na ao, em sala de aula, no pensa, comoafirma o modelo positivista do pensamento, comoum cientista, um engenheiro ou um lgico. Os co-nhecimentos proposicionais sobre o ensino basea-dos na lgica disciplinar, conhecimentos esses vei-culados durante a formao, constituem, portanto,uma falsa representao dos saberes dos profissio-nais a respeito de sua prtica.

    Segundo problema: esse modelo trata os alu-nos como espritos virgens e no leva em conside-rao suas crenas e representaes anteriores a res-peito do ensino.1 Ele se limita, na maioria das ve-zes, a fornecer-lhes conhecimentos proposicionais,informaes, mas sem executar um trabalho pro-fundo sobre os filtros cognitivos, sociais e afetivosatravs dos quais os futuros professores recebem e

    1 De acordo com o sentido amplo que damos ao termosaber neste texto, atribumos, no mbito da formao ini-cial para o magistrio, um estatuto epistemolgico s cren-as e representaes que os alunos-professores possuem arespeito do ensino. Essas crenas e representaes agem co-mo conhecimentos prvios que calibram as experincias deformao e orientam seus resultados.

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    processam essas informaes. Ora, esses filtros, co-mo indicamos h pouco, permanecem fortes e est-veis ao longo do tempo, pois provm da histria devida dos indivduos e de sua histria escolar. Con-seqentemente, a formao para o magistrio temum impacto pequeno sobre o que pensam, crem esentem os alunos antes de comear. Na verdade, elesterminam sua formao sem terem sido abaladosem suas crenas, e so essas crenas que vo se rea-tualizar no momento de aprenderem a profisso naprtica, crenas essas que sero habitualmente re-foradas pela socializao na funo de professore pelo grupo de trabalho nas escolas, a comearpelos pares, os professores experientes.

    Possibilidades promissorase campo de trabalho para ospesquisadores universitrios

    Vrias possibilidades vm sendo exploradasem diferentes pases h uns vinte anos, no intuitode reconstituir os fundamentos epistemolgicos daprofisso. Essas possibilidades se referem a vastoscampos de trabalho que resultam em tarefas con-cretas para os professores universitrios.

    A primeira tarefa j vem sendo realizada hmais ou menos vinte anos nos Estados Unidos econsiste na elaborao de um repertrio de conhe-cimentos para o ensino, repertrio de conhecimen-tos baseado no estudo dos saberes profissionais dosprofessores tais como estes os utilizam e mobilizamnos diversos contextos do seu trabalho cotidiano.Essa tarefa supe que os pesquisadores universit-rios trabalhem nas escolas e nas salas de aula emcolaborao com os professores, vistos no comosujeitos ou objetos de pesquisa, mas como colabo-radores dos pesquisadores, isto , como co-pesqui-sadores ou, melhor ainda, como co-elaboradores dapesquisa sobre seus prprios saberes profissionais(Boles, Karmii e Troen, 1999; Gauthier et al., 1997;Zeichner e Caro-Bruce, 1999). Esse campo de tra-balho promissor e ao mesmo tempo repleto dearmadilhas, pois exige um questionamento dos fun-damentos das identidades profissionais dos colabo-

    radores (pesquisadores e professores), bem como acapacidade de navegarem vontade em culturasprofissionais e organizacionais at agora mantidas distncia (Raymond e Lenoir, 1998). Para os pro-fessores, por exemplo, nem sempre fcil teorizara sua prtica e formalizar seus saberes, que elesvem como pessoais, tcitos e ntimos. Para os pes-quisadores, a legitimao dos saberes dos professo-res est longe de ter terminado. A tarefa de cons-truo de um repertrio de saberes baseado no es-tudo dos saberes profissionais dos professores su-pe, portanto, um exame crtico das premissas quefundamentam as crenas de uns e de outros em rela-o natureza dos conhecimentos profissionais. Elaleva igualmente a um questionamento crtico a res-peito das concepes e da relao com os saberesnos quais os pesquisadores e professores foram so-cializados em sua formao e carreiras respectivas.

    A segunda tarefa consiste em introduzir dis-positivos de formao, de ao e de pesquisa queno sejam exclusivamente ou principalmente regi-dos pela lgica que orienta a constituio dos sa-beres e as trajetrias de carreira no meio universi-trio. Em outras palavras, esses dispositivos devemser pertinentes para os professores e teis para suaprtica profissional. Eles devem levar em contasuas necessidades e ser coerentes no que se refere sua bagagem, aos seus saberes, aos seus modosde simbolizao e de ao. O que chamamos noQuebec de escolas de pesquisa e escolas asso-ciadas, e nos Estados Unidos de escolas de de-senvolvimento profissional, constituem espaospara a implantao desses dispositivos. Entretan-to, preciso levar mais adiante essas iniciativas efazer com que as faculdades de educao ou decincias da educao faam parte de tais espaos,o que supe, principalmente, que os professoresparticipem, de diversas maneiras, da formao deseus futuros pares (Raymond e Lenoir, 1998). Aampliao dos papis dos professores associadosna formao para o magistrio, em particular suaparticipao nas comisses de elaborao e de ava-liao de programas de formao e nas equipes depesquisa sobre a formao e sobre o ensino, cons-

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    Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitrios

    tituem espaos frteis para os debates sobre o ca-rter plural e heterogneo dos saberes docentes.

    A terceira tarefa , por enquanto, utpica, sebem que ela tenha sido tentada em diversos lu-gares, particularmente na Inglaterra, onde, desde1992, a responsabilidade de dois teros da forma-o inicial foi transferida para o meio escolar. Osbalanos ainda incertos dessa iniciativa do gover-no britnico, que alguns atribuem a motivos pol-ticos, no poderiam nos eximir da responsabilida-de nem do trabalho de dar a nossa contribuio: preciso quebrar a lgica disciplinar universitrianos cursos de formao profissional. No estamosdizendo que preciso fazer as disciplinas da for-mao de professores desaparecerem; dizemos so-mente que preciso fazer com que contribuam deoutra maneira e tirar delas, onde ainda existe, ocontrole total na organizao dos cursos. Essa ta-refa difcil, entre outras coisas porque exige umatransformao dos modelos de carreira na univer-sidade, com todos os prestgios simblicos e ma-teriais que os justificam. Ela supe, por exemplo,que o valor real do trabalho de formao e do tra-balho de pesquisa em colaborao com os profes-sores seja reconhecido nos critrios de promoouniversitria. Alm disso, para impedir a fragmen-tao dos saberes, caracterstica da lgica discipli-nar, essa tarefa implicaria a criao de equipes deformao pluricategoriais (responsveis de discipli-nas, professores, diretores de escola, pedagogos,didatas) estveis e responsveis pelos muitos alu-nos que permanecem juntos durante toda a dura-o de sua formao. A lgica da socializao pro-fissional, com seus ciclos de continuidades e derupturas, suas experincias de iniciao (a primei-ra lio, a primeira turma, o primeiro incio de anoletivo etc.), seus questionamentos identitrios e ti-cos, sua relao complexa com os saberes de diver-sas fontes, suas urgncias na tomada de decises,seus momentos reflexivos mesclados de afetos e deproselitismo deve progressivamente excluir a lgi-ca disciplinar como fundamento da formao.

    Finalmente, a quarta e ltima tarefa nos pa-rece ser a mais urgente: acreditamos que j tem-

    po de os professores universitrios da educao co-mearem tambm a realizar pesquisas e reflexescrticas sobre suas prprias prticas de ensino. Nauniversidade, temos com muita freqncia a ilusode que no temos prticas de ensino, que ns mes-mos no somos profissionais do ensino ou que nos-sas prticas de ensino no constituem objetos leg-timos para a pesquisa. Esse erro faz que evitemosos questionamentos sobre os fundamentos de nos-sas prticas pedaggicas, em particular nossos pos-tulados implcitos sobre a natureza dos saberes re-lativos ao ensino. No problematizada, nossa pr-pria relao com os saberes adquire, com o passardo tempo, a opacidade de um vu que turva nossaviso e restringe nossas capacidades de reao. En-fim, essa iluso faz que exista um abismo enormeentre nossas teorias professadas e nossas teo-rias praticadas: elaboramos teorias do ensino e daaprendizagem que s so boas para os outros, paranossos alunos e para os professores. Ento, se elass so boas para os outros e no para ns mesmos,talvez isso seja a prova de que essas teorias no va-lem nada do ponto de vista da ao profissional, acomear pela nossa.

    MAURICE TARDIF pesquisador e diretor do Cen-tre de Recherche Interuniversitaire sur la Formation et laProfession Enseignante (CRIFPE), Universit Laval, Que-bec, Canad.

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