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WWW.BRASILENGENHARIA.COM.BR ENGENHARIA/2009 591 RAIO X DA PRODUÇÃO, O transporte de carga é um importante alicerce da economia de um país. É um setor determinante para as exportações, as quais causam importante impacto na produção e geração de empregos em diversos outros setores, além de atrair ganhos cambiais ao país. Neste artigo é feito uma análise do transporte de cargas no Brasil, apresentando seus pontos positivos e negativos, além de apontar possíveis mudanças e investimentos que contribuiriam para a melhoria desse tipo de transporte e consequentemente tornariam o país mais competitivo. O principal ponto de discussão é a construção do sistema de transporte brasileiro tendo como base as rodovias, um dos meios mais caros e maléficos ao meio ambiente. Cerca de 60% de toda produção brasileira é transportada pela malha rodoviária, as ferrovias são responsáveis por apenas 21% e o modo aquaviário por 14%. Os sistemas dutoviário e aéreo não alcançam 5% da produção. São apresentadas estatísticas, pesquisas e comparações com outros países comprovando que o dinheiro investido é gasto de forma inadequada e não prioriza os modais diferentes do rodoviário, tampouco a integração dos modais. DIVULGAÇÃO / VALE investimento e participação dos modais de transportes Terminal Portuário de Tubarão (ES) JOSÉ MANOEL FERREIRA GONÇALVES* GILBERTO MARTINS**

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Raio X da pRodução,

O transporte de carga é um importante alicerce da economia de um país. É um setor determinante para as exportações, as quais causam importante impacto na produção e geração de empregos em diversos outros setores, além de atrair ganhos cambiais ao país.Neste artigo é feito uma análise do transporte de cargas no Brasil, apresentando seus pontos positivos e negativos, além de apontar possíveis mudanças e investimentos que contribuiriam para a melhoria desse tipo de transporte e consequentemente tornariam o país mais competitivo.O principal ponto de discussão é a construção do sistema de transporte brasileiro tendo como base as rodovias, um dos meios mais caros e maléficos ao meio ambiente.Cerca de 60% de toda produção brasileira é transportada pela malha rodoviária, as ferrovias são responsáveis por apenas 21% e o modo aquaviário por 14%. Os sistemas dutoviário e aéreo não alcançam 5% da produção.São apresentadas estatísticas, pesquisas e comparações com outros países comprovando que o dinheiro investido é gasto de forma inadequada e não prioriza os modais diferentes do rodoviário, tampouco a integração dos modais. D

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Terminal Portuário de Tubarão (ES)

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o Brasil, o modal de transporte ro-doviário representa 60% do total de

cargas transportadas no país. Enquanto isso, a hidrovia, que é um modal econômico, pouco poluente e seguro, representa ape-nas 13,86% dos produtos comercializados1. Transportamos por rios apenas 17 milhões de toneladas e pelo mar 110 milhões por ano.

Um dos segmentos mais importantes para a economia de qualquer país é o transporte.

Sem transporte, produtos essenciais as mãos de seus consumidores, indústrias não produziriam, não haveria comércio exterior. Qualquer nação fica literalmente paralisada se houver interrupção do seu sistema de transporte, além disso, transporte não é um bem importável. No caso de um país com dimensões continentais como o Brasil, este risco se torna mais crítico (CNI/ COPPEAD, 2002: p.06).

Todavia, durante toda a história brasileira pôde-se verificar uma enorme disparidade en-tre os investimentos e consequente desenvol-vimento dos diferentes modais de transporte. No gráfico da figura 1 apresento as alocações dos investimentos públicos nos diferentes mo-dais de transportes dentre os anos de 1995 e 2000 (CNI/ COPPEAD, 2002: p. 65).

O sistema rodoviário sempre foi uma prioridade durante a formação das bases do transporte brasileiro, um exemplo é o lema “governar é abrir estradas” utilizado pelo presidente Washington Luiz, na década de 1920, que serviu de base para seu governo.

“Percebe-se que o legado rodoviaris-ta ainda persiste sob a forma de uma forte cultura de utilização deste modal, com uma consequente falta de conhecimento a respei-to das vantagens e desvantagens dos modais alternativos” (CNI/ COPPEAD, 2002: p. 65).

Além disso, o transporte de cargas é um dos setores que mais emitem gases de efeito estufa no nosso país, especialmente o modal rodoviário. O combustível dos transportes rodoviários expelem gases como o óxido de nitrogênio e o monóxido de carbono, capazes de provocar efeito estufa e chuva ácida, além de prejudicarem o sistema respiratório2.

Mas é possível reorganizar todo o sis-tema de transporte nacional para redu-zir perdas e ineficiências. De acordo com

N José Vicente Caixeta Filho um dos maiores problemas é a falta da multimodalidade – “aquele em que são utilizados, para o des-locamento físico da mercadoria, pelo menos dois modos de transporte (exemplos: navio e trem)” – (Garcia Júnior3, 2002: p.12). O país precisa investir mais na transferência de carga para que, combinados, os meios possam ser mais econômicos e menos po-luentes (Stuani, 2002a: p. G4).

RAIOS X dO TRANSPORTEdE CARGAS NO BRASIL

O transporte de cargas, no Brasil, sofre enormes deficiências de regulação, o eleva-do custo de capital, a falta de política públi-ca de investimento, que combinados, leva-ram o país a uma dependência exagerada do modal rodoviário.

Embora apresente características po-sitivas, como flexibilidade, disponibilidade, e velocidade, o modal rodoviário possui um conjunto de limitações que crescem de importância em um país como o Brasil, ca-racterizado por sua dimensão continental e grande participação de bens primários na formação do produto interno bruto.

De acordo com Ioris4 a precariedade das estradas e o alto preço do combustível fazem com que os gastos com transporte represen-tem 30% dos negócios das empresas de soja do Mato Grosso (apud Ferreira, 2003: p. G6).

Essa dependência rodoviária não tem pa-ralelo entre nações de grande extensão ter-ritorial. Nos Estados Unidos, mais de 70% do transporte de cargas não utiliza rodovias. Na China, 8% da produção é escoada por cami-nhões. No Canadá, 25% (COPPEAD, 2002).

Uma alternativa as rodovias, o sistema hidroviário parece ser o modal de transpor-te que apresenta mais vantagens diante dos outros modais. A Agência Nacional de Trans-portes Aquáticos (Antaq) apresentou na Câ-mara dos Deputados, no dia 18 de setembro de 2007, alguns desses benefícios. “Com as hi-drovias, a emissão de poluentes é 90% menor. Além disso, as hidrovias contribuem para que a competitividade dos produtos brasileiros au-mente, gerando mais empregos e melhorando a distribuição de renda no país5”, ressaltou Fer-nando Fialho, diretor-geral da Antaq.

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O transporte hidroviário tem grande po-tencial de desenvolvimento no Brasil, com seus 27 400 quilômetros de rios navegáveis, mas ficará subutilizado caso não receba investimentos de 12,8 bilhões de reais em dragagem, balizamento e sinalização nos próximos 15 anos, segundo recomenda o Plano Nacional de Logística de Transportes (PNLT) do governo federal6.

Para ter uma ideia da possível eficácia do modal hidroviário, basta vermos a dimensão de comboios feitos em nossos rios e o que é feito, por exemplo, no Rio Mississippi, dos Estados Unidos (figura 2).

O transporte alicerçado em estradas em detrimento das ferrovias e hidrovias faz com que o custo final do produto se torne maior do que em países como a Argentina, onde o produtor rural gasta em média 16,00 dólares para colocar uma tonelada de soja no porto. Nos Estados Unidos esse gasto é de 15,50 dó-lares. No Brasil são 23,50 dólares para realizar a mesma operação (Embrapa soja, 2004).

É baixa a oferta do nosso sistema ferro-viário. Ao comparar o Brasil com países de extensão territorial semelhante verifica-se uma enorme disparidade entre suas malhas ferroviárias.

Enquanto nos Estados Unidos a partici-pação das ferrovias é de 43% da produção transportada e na Rússia chega a 81%, no Brasil a participação ferroviária é próxima dos 20% ficando atrás, inclusive, de países menores. A França, por exemplo, tem o ta-manho, aproximado, do Estado de São Paulo e uma disponibilidade ferroviária superior a do Brasil.

A tabela 2 e a figura 3 comparam a dis-ponibilidade das linhas férreas brasileira e de outros países. Neles, ficam ainda mais evidentes as necessidades do aumento da nossa malha ferroviária.

Segundo especialistas do setor são ne-cessários investimentos de 11,3 bilhões de reais entre 2005 e 2008 (7,1 bilhões de reais do setor privado e 4,2 bilhões de reais da União), para aumentar em 57% a oferta do transporte ferroviário de carga, um ganho de seis pontos percentuais na matriz de transporte e uma redução de custos para o país na ordem de 11 bilhões de reais.

Devido à necessidade de transportar grandes volumes de cargas de baixo valor específico a grandes distâncias e ao mesmo tempo enfrentar uma acirrada competição no mercado internacional, o setor agrícola é o setor mais penalizado pelos altos custos de transporte e portuário. Para se ter uma idéia da situação existente em 1995, basta dizer que o custo para se embarcar uma tonelada de soja em New Orleans era de apenas 3 dólares a tonelada, enquanto que o custo de embarque do mesmo produto no porto de Paranaguá chegava a mais de 14 dólares. O custo para se transportar esse produto entre as regiões produtoras dos Estados Unidos e o mesmo porto (média de 2 000 quilômetros), via hidro-vias, era de apenas 16 dólares por tonelada. No Brasil chegava a mais 80 dólares por tonelada.

Para enfrentar o problema o governo fe-deral decidiu estimular o desenvolvimento dos corredores multimodais de transportes, basea-do no aproveitamento

de algumas hidrovias e na privatização das ferrovias e portos.

Considerando as perspectivas de expansão da fronteira agrícola, os fluxos de comerciali-zação da produção conhecidos e os principais mercados, foram criados oito corredores7 no-meados pelo GEIPOT (1999 e 2001)8: o Corre-dor Noroeste, o Centro-Norte, o Nordeste, o Centro-Leste e o Sudoeste (figura 4).

O Corredor Noroeste envolve uma área agricultável estimada em mais de 16 milhões de hectares, localizada no norte do estado de Mato Grosso e leste de Rondônia. De acordo com Lício e Corbucci (1996), os principais mo-dais de transportes são o fluvial e o rodoviário. O primeiro trajeto, entre o entroncamento da BR 364 e 235 e Porto Velho, é feito através da BR 364. O segundo, entre essa capital e o por-to de Itacoatiara (AM), é feito pela Hidrovia do Madeira, na distância de 1 115 quilôme-tros. Entre esse porto e o Oceano Atlântico, o trajeto é feito pelo Rio Amazonas.

A área de influência do primeiro corredor está localizada principalmente na região pré-amazônica e envolve a Chapada dos Parecis, situada nos estados de Mato Grosso e Rondô-nia, a área de cerrados adjacentes em 150 qui-lômetros à Rodovia Federal 364 que liga Cuia-bá (MT) a Rio Branco (AC), e áreas limítrofes ao

Tabela 1 - Composição percentual da carga transportada(1996-2000)

Modo detransporte 1996 1997 1998 1999 2000

Aéreo 0,33 0,26 0,31 0,31 0,33

Hidroviário 11,47 11,56 12,69 13,19 13,86

Dutoviário 3,78 4,55 4,44 4,61 4,46

Ferroviário 20,74 20,72 19,99 19,60 20,86

Rodoviário 63,68 62,91 62,57 62,29 60,49

Total 100 100 100 100 100

Fonte: Anuário Estatístico em Transportes da GEIPOT.

Figura 1 - Alocações dos investimentos públicos nos diferentes modais de transportes

Figura 2 - Comparativo do modal hidroviário no Brasil e nos Estados Unidos

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Rio Madeira. Alternativa de escoamento seria a BR 363 entre Cuiabá (MT) e Santarém (PA), no Rio Amazonas. Segundo Stuani (2002b) a ligação entre Cuiabá (MT) e Santarém (PA), por meio da BR-163, é um corredor reivindica-do com insistência pelas grandes companhias de soja junto ao governo federal.

Elas pedem a pavimentação do trecho que, quando asfaltado, escoará soja pelos portos fluviais de Itaituba e Santarém e movimentará três milhões de toneladas, com economia de 60 milhões de dólares em gastos com frete.

O Corredor Norte promoverá a melhoria da infraestrutura já existente e a multimodali-dade de transporte dos estados do Amazonas, de Roraima, do Amapá e do Acre. Essa é uma área de difícil acesso devido as florestas e a distância dos principais polos de consumo do país. Uma das principais metas do projeto é a BR 174 (já concluída) que liga a Zona Franca de Manaus a Venezuela. Outros pontos importan-tes deste corredor são a BR 156 (entre Macapá (AP) e Guiana Francesa) e a BR 364 (entre Rio Branco (AC) com a fronteira do Peru).

O Corredor Oeste tem como objetivo a redução dos custos do transporte de cargas e melhorar o escoamento da produção pro-veniente dos Estados do Amazonas, do Pará, de Rondônia e Mato Grosso. As principais vias desse corredor são: BR 163, BR 230, BR 364, BR 319 e BR 230.

No Corredor Centro-Norte, os princi-pais trechos são: 1 230 km navegáveis do Rio Araguaia, 580 km do Rio das Mortes em Mato Grosso, 420 quilômetros do Rio Tocantins, 1 500 quilômetros da BR 010 (Belém-Brasília), 230 quilômetros da Ferro-via Norte-Sul e 600 quilômetros da Ferrovia Carajás entre Açailândia (MA) e o Porto da

Ponta da Madeira em São Luís (MA). É impor-tante enfatizar que parte desse corredor, no trecho entre Estreito (MA) e São Luís (MA), pode ser utilizado para o escoamento da pro-dução de grãos das regiões produtoras do Sul do Maranhão e Piauí. A área de abrangência do Corredor Centro-Norte envolve, portan-to, uma imensa área da região dos cerrados, estimada em mais de 20 milhões de hectares nos estados do Tocantins (47,1%), de Goiás (20,2%), de Mato Grosso (14,6%), do Pará (7,1%), do Maranhão (5,9%), da Bahia (3,1%) e do Piauí (2,0%).

O Corredor Centro-Leste é destinado a es-coar a produção da região noroeste do Estado de Minas Gerais e do centro de Goiás (uma área de aproximadamente 1,5 milhão de hectares). Envolve basicamente a utilização da Estrada de Ferro Vitória-Minas entre o Porto de Tuba-rão e Belo Horizonte e de um ramal ferroviário entre Belo Horizonte e Pirapora (MG) e entre essa cidade e Unaí (MG), a ser construído.

O Corredor Nordeste abrange todas as regiões localizadas no norte de Minas Ge-rais, Bahia e Pernambuco e é constituído da extensão navegável do Rio São Francis-co entre Pirapora (MG) e Petrolina (PE), da malha rodoviária a partir de Petrolina até as principais capitais e portos nordestinos. Permite uma ligação ferroviária entre Petro-lina e os portos de Pernambuco e Paraíba.

O Corredor Sudeste envolve basicamen-te a utilização da Hidrovia Tietê-Paraná, permitindo o escoamento da produção de Mato Grosso do Sul e de São Paulo até os principais portos de exportação localizados na foz do Rio da Prata. Esse corredor tem forte interface com o sistema de transporte da região sudeste. Por meio da construção

Figura 3 - Mapa das linhas férreas brasileira e norte-americanas

Brasil

3,4

EUA

29,8

da eclusa de Jupiá, é possível o aumento de 700 quilômetros na hidrovia, permitindo a ligação de São Paulo com Foz do Iguaçu (PR) e com os portos exportadores do Rio da Prata e com o Centro-Oeste.

Possibilita, ainda, a ampliação das ex-portações de grãos produzidos na região de Santa Cruz de La Sierra (Bolívia). As obras de consolidação da hidrovia permitem a in-terligação dos tramos norte e sul do Rio Pa-raná que, juntamente com os rios da Prata e Paraguai, facilitam a utilização de barcaças em 7 700 quilômetros de hidrovias, fazendo a ligação estratégica entre Cáceres (MT) e a foz do Rio da Prata.

A despeito de alguns problemas (causa-dos principalmente por organizações ambien-talistas) que provocaram (e continuam pro-vocando) grandes atrasos na implantação de algumas hidrovias como a Araguaia-Tocantins e Tietê-Paraná. Após a implantação dos cor-redores multimodais de transportes e da pri-vatização das ferrovias e dos portos efetuadas a partir de 1995, os custos de transportes de grãos foram reduzidos em 40% na média e o custo portuário, em 50% (Coelho).

O Corredor Mercosul tem como objetivo reduzir os custos do transporte de cargas entre o Brasil e os países do Mercosul, vi-sando incrementar as transações comerciais na região. Os Estados de Paraná, Santa Ca-tarina e Rio Grande do Sul tiveram grandes melhorias em sua malha ferroviária, rodovi-ária e em seus portos. O Corredor Mercosul

Tabela 2 - Países com maiormalha ferroviária (km)

Ranking Paises Malha ferroviária

1À Estados Unidos 228.464

2Àº Rússia 87.157

3˼ China 70.058

4Àº ÍIndia 63.140

5Àº Canadá 48.909

6˼ Alemanha 46.039

7Àº Austrália 43.802

8˼ Argentina 34.091

9Àº França 32.175

10˼ Brasil 29.798

Fonte: Anuário de Infraestrutura da Revista EXAME 2005/2006.

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engloba as rodovias federais BR 101, BR 116, BR 376 e BR 392.

Nos próximos 15 anos, o Brasil vai prio-rizar a construção de ferrovias e hidrovias. Projeto nesse sentido foi apresentado pelo Ministério dos Transportes e pelo Centro de Excelência em Engenharia de Transportes (Cetran) em maio de 2006 durante o Fórum Nacional de Secretários de Transportes, em Belo Horizonte. O Plano Nacional de Logística de Transportes (PNLT) prevê um investimen-to de 173,41 bilhões de reais para promover o equilíbrio entre os diferentes modais de transporte no Brasil. Caso seja realmente im-plementado, seria possível iniciar uma sensí-vel mudança em um ciclo histórico, que se tornou responsável por uma das maiores dis-torções na área do transporte de cargas.

A intenção do governo federal é mudar o modal rodoviário dos atuais 58% para 33% fazendo com que seja integrado ao sistema multimodal através do carregamento e dis-tribuição de ponta. O plano também prevê a mudança do modal ferroviário dos atuais 25% para 32% e do aquaviário de 13% para 29%.

Dados da Associação Brasileira de Logísti-ca revelam que o uso da multimodalidade po-deria reduzir em até 20% os custos do trans-porte, hoje concentrado nas rodovias. Para o Centro de Estudos em Logística COPPEAD/UFRJ essa redução poderia chegar a 50%.

Porém, do plano à realidade, o país terá um longo desafio pela frente. Além de inves-tir em diferentes modais, é preciso investir em armazéns e tecnologias. Hoje, o Brasil tem capacidade de estocagem estimada em 93,815 milhões de toneladas de grãos, apre-sentando um déficit, segundo o Ministério da Agricultura e Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), de 35 milhões de toneladas. Sem poder estocar, o produtor é obrigado a vendê-lo logo após a colheita, período em que o preço do frete é mais alto.

Segundo a Escola Politécnica da Univer-sidade de São Paulo (2001), o peso dessa ineficiência logística, em termos de PIB é de pelo menos 16%, o mesmo de 15 anos atrás nos Estados Unidos. Hoje o percentual de ineficiência norte-americano é de 10%.

A incapacidade administrativa do setor empresarial de transporte, aliado à falta de

continuidade por parte das políticas gover-namentais de planejar e controlar o trans-porte nacional de cargas aumenta ainda mais o risco de colapso.

Não acompanhamos o crescimento da demanda por qualidade. É elevada a idade média da nossa frota rodoviária (17,5 anos). Os acidentes de trânsito no país são o se-gundo maior problema na área da saúde pública. Perde apenas para a desnutrição. Segundo o Ministério dos Transportes, o nú-mero de mortos é de 10 a 70 vezes maior que nos países desenvolvidos.

Apesar do volume de recursos orçamen-tários previstos para os investimentos do Mi-nistério dos Transportes ter aumentado em 2005, a velocidade de execução, no entanto, não atingiu níveis satisfatórios. Até o final de outubro de 2005 o montante efetivamente aplicado correspondeu a apenas 30% do to-tal dos recursos liberados pelo ministério.Outros fatos preocupantes:1) A demora dos órgãos públicos para definir questões importantes para o aprimoramen-to do sistema de transporte como aconte-ceu com a licitação de trechos de rodovias federais aprovada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em 25 de julho de 2007 e realizado em outubro do mesmo ano, mas que foi originalmente enviado ao Ministério dos Transportes em maio de 2005.2) O Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte - CONIT, criado pela

lei 10233/2001, com o objetivo de propor políticas nacionais de integração dos modos de transportes, nunca se reuniu até 2006. Situação que atrapalha os esforços de plane-jamento e de integração entre os modais de transporte e a intermodalidade. Um exemplo da importância da confluência entre os dife-rentes modais, de acordo com Coelho (2003), foi a redução dos custos de transportes de grãos em cerca de 40% quando o governo brasileiro implantou os corredores multimo-dais de transportes e a privatização de ferro-vias e portos ocorridos a partir de 1995.

No ano de 2005 a Confederação Nacio-nal das Indústrias (CNI) junto com as Con-federações Empresariais elaborou a Agenda Mínima para a Governabilidade, identificando algumas ações prioritárias na área de infraes-trutura. O foco é o setor de transportes, des-tacando problemas, soluções e uma proposta para um programa de obras emergenciais.

Embora o próprio documento reco-nheça a complexidade dos problemas e a consequente dificuldade de solucioná-los, são destacados alguns pontos de ação que visam à melhoria da qualidade e da compe-titividade do transporte brasileiro:- Agilizar a modelagem e a publicação dos editais de licitação das PPPs.- Aumentar a capacidade de gestão na exe-cução orçamentária na área de transportes.- Publicar os editais da segunda etapa do Programa de Concessões Rodoviárias.- Implantar, com base na Lei nº 10233/2001, o Conselho Nacional de Integração de Po-líticas de Transporte, com a introdução de representações dos usuários.- Unificar o sistema de informações e esta-belecer claramente a responsabilidade pela elaboração e divulgação das estatísticas do setor de transportes utilizando os meios da tecnologia de informação.- Flexibilizar a reserva de carga e reduzir as limitações hoje existentes ao afretamento de embarcações por parte das empresas brasi-leiras de navegação (CNI, 2005: p. 05 e 06).

É importante ressaltar que a melhora das redes de transporte nacionais não é somente necessária para a estruturação e desenvolvi-mento da economia interna. Segundo Geiling (1996), com a atual globalização da economia

Figura 4 - Corredores de escoamento da produção

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591e a abertura das fronteiras do Mercosul, o Bra-

sil precisa de uma infraestrutura de transpor-tes mais completa para tornar-se competitivo nas relações comerciais internacionais.

CONCLUSÃO É interessante frisar que a utilização dos

modais de transportes visa antes à integração e não à competição modal e implica em estu-dos de alternativas para a otimização dos sis-temas de transportes, reduzindo duplicidades de esforços feitos isoladamente e oferecendo soluções integradas que orientam as pressões para expansão da oferta de transportes.

Evidentemente, isso é positivo sob o pon-to de vista ambiental, pois traz a racionaliza-ção do uso da infraestrutura de transportes e permite o incremento dos transportes fer-roviário e hidroviário de cargas, reduzindo o aumento de emissões veiculares rodoviárias.

É importante que o Brasil alcance os padrões internacionais através de maior espaço para os modais de transporte dife-rentes do rodoviário. Se adotarmos o padrão norte-americano de priorização da rede fer-roviária pode-se vislumbrar queda de até 1 bilhão de dólares por ano.

Devemos destacar que a grande parte das ferrovias brasileiras foi construída e instalada há muitos anos e sua operação e manutenção adotavam procedimentos estabelecidos em uma época em que as variáveis ambientais não eram consideradas como são atualmente. Há, portanto, necessidade de se contemplar hoje a questão ambiental ferroviária.

Com relação ao transporte hidroviário interior no Brasil, resultados melhores de-pendem de um conjunto de fatores, como o aumento da disponibilidade de infraestrutu-ra, de serviços portuários, de equipamentos e de instalações para a transferência modal.

Há um longo caminho a ser percorrido para que toda a estrutura do transporte de carga no Brasil pare de depender tão expres-sivamente do modal rodoviário. O Plano Na-cional de Logística de Transportes (PNLT) prevê investimento de 173,41 bilhões de reais, nos próximos 15 anos, para promover o equilíbrio entre os diferentes modais. Pode ser o início de uma estrutura melhor e mais econômica, na busca de um Brasil mais competitivo.

Notas1Dado do anuário estatístico do GEIPOT (Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes).2Dado retirado do site do Instituto Ecológico Aqualung, http://www.institutoaqualung.com.br/info_ar57.html3Armando Álvares Garcia Júnior é membro do Conselho Científico e Acadêmico da universi-dade de Iowa, USA; jurista da Coalition for the International Criminal Court, Bruxelas, Bélgica.4Marco Aurélio Ioris é gerente da unidade Bunge Alimentos em Nova Mutum – Mato Grosso (MT).5Dado retirado do site: http://www.antaq.gov.br/NovositeAntaq/Navegando/Nave-gandoSet07.htm6Dado retirado do site: http://www.portose-navios.com.br/7De acordo com o DNIT (http://www1.dnit.gov.br/imprensa/download/Intermodalida-de.doc) os Corredores Estratégicos de De-

* José Manoel Ferreira Gonçalves é engenheiro civil com mestrado em Engenharia Mecânica, pós-graduação em Geoprocessamento, Termofluidomecânica e Enge-nharia Oceânica; é formado em jornalismo e direito; e é doutorando em Engenharia de ProduçãoE-mail: [email protected]** Gilberto Martins é engenheiro mecânico com mestrado e doutorado nas áreas de aproveitamento do uso da energia de biomassa e refrigeração por absorção, especialista em economia de energia, atual-mente é professor adjunto da Universidade Federal do ABC, no Centro de Engenharia, Modelagem e Ciências Sociais Aplicada

[1] ANUÁRIO dO TRANSPORTE dE CARGA. - Anuário do Transporte de Carga nº 08. São Paulo: OTM Editora, 2003.[2] CAIXETA FILHO, J.V; SILVA, N.d.V.; GA-MEIRO, A.H. - Competitividade no agrobusi-ness: a questão do transporte em um contexto logístico. In: Competitividade no agrobusiness brasileiro. São Paulo: 1998.[3] COELHO, C.N. - A agricultura e a logística de transporte. Disponível em: http://www.mre.gov.br/cdbrasil/itamaraty/web/port/econo-mia/agric/logist/apresent.htm. Acesso em: 14 agosto de 2003.[4] CNI - CONFEdERAÇÃO NACIONAL dA INdÚSTRIA. - Agenda mínima para a infra-estrutura. Brasília: 2005.[5] CNI - CONFEdERAÇÃO NACIONAL dA INdÚSTRIA. - Pesquisa Rodoviária 2007: Re-latório Gerencial. Brasília: 2007.[6] CNI - CONFEdERAÇÃO NACIONAL dA INdÚSTRIA e COPPEAd/UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro. Transporte de Carga no Brasil - As ameaças e oportunidades para o desenvolvimento do país. Rio de Janeiro: 2002.[7] FERREIRA, V. - Estradas ruins oneram cus-to da safra no Mato Grosso. Jornal O Estado de S. Paulo. São Paulo, 2 março 2003 - p. G-6.[8] GARCIA JÚNIOR, A.A. - Transportes inter-nacionais de mercadorias e pessoas no Merco-

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senvolvimentos são “ligações de um polo produtor a um porto de exportação, utili-zando até três modalidades de transportes, rodoviário, ferroviário e hidroviário. Os cor-redores permitem ao Brasil uma redução de despesas com fretes e gastos com combus-tíveis da origem até o porto de destino”.8Informação retirada do site: http://www.conab.gov.br/conabweb/download/nupin/agroelog.pdf. Acesso em: 07 de dezembro de 2007.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS