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Radiação eletromagnética (II) Gastão B. Lima Neto Vera Jatenco-Pereira IAG/USP AGA 210 – 1° semestre/2016 www.astro.iag.usp.br/~aga210/ Modelo atômico Átomo de Bohr Formação de linhas espectrais Linhas espectrais e composição química Alargamento de linhas Intensidade da radiação: brilho e luminosidade Magnitudes e fluxo Distância e paralaxe Bandas fotométricas, índice de cor Céu azul, pôr do Sol vermelho

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Radiação eletromagnética (II)

Gastão B. Lima Neto Vera Jatenco-Pereira

IAG/USP

AGA 210 – 1° semestre/2016

www.astro.iag.usp.br/~aga210/

Modelo atômico Átomo de Bohr Formação de linhas espectrais Linhas espectrais e composição química Alargamento de linhas Intensidade da radiação: brilho e luminosidade Magnitudes e fluxo Distância e paralaxe Bandas fotométricas, índice de cor Céu azul, pôr do Sol vermelho

Leis de Kirchhoff

•  Nos anos 1860, Gustav Kirchhoff formula as leis que resumem os 3 tipos de espectro possíveis:

Espectro contínuo

•  Luz branca que passa por um prisma se decompõe nas cores do arco-íris, formando um espectro contínuo.

•  No caso de uma lâmpada incandescente, este espectro contínuo é de um corpo negro: tem uma forma bem precisa que só depende da temperatura.

•  Observando as propriedades do espectros, conhecemos a natureza da fonte.

prisma fenda

esta lâmpada emite como um copo negro

espectro contínuo

luz branca tela

Modelo atômico •  A noção de átomo surgiu na Grécia no séc. V a.C. proposta por

Leucipo e Demócrito. –  átomo = partícula indivisível, em grego.

•  Em 1789, Antoine Lavoisier lista 33 elementos químicos

em seu “Tratado Elementar de Química”.

•  Em 1808, John Dalton sugere que os átomos de um mesmo elemento são idênticos.

•  O modelo atômico de Joseph Thomson de 1904

consiste em uma esfera de carga positiva salpicada de partículas menores negativas (“Plum pudding model” ou modelo de pudim de ameixas).

+

John Dalton 1766–1844

Modelo atômico •  Em 1911, Ernest Rutherford faz o primeiro

modelo atômico moderno, composto por um núcleo compacto e com carga positiva, e por partículas de carga negativa que orbitam o núcleo.

Ernest Rutherford 1871 – 1937

Se o átomo de hidrogênio fosse do tamanho de um campo de futebol, o núcleo teria 2 mm de diâmetro. Para comparação, se a órbita de Netuno fosse do tamanho de um campo de futebol, o Sol teria 3,6 cm.

Os elétrons não tinham órbitas definidas ao redor do núcleo. Grave problema: elétrons em órbita estão sempre acelerados, logo deveriam emitir energia (radiação), espiralar e cair no núcleo (em menos de 10–12 segundos).

Modelo atômico •  Em 1914, Niel Bohr modifica o modelo de Rutherford e introduz o

conceito de órbitas bem definidas (orbitais) para os elétrons.

•  Bohr utiliza uma mistura entre a (então) nova mecânica quântica e mecânica clássica.

Niels Henrick Bohr (1885-1962)

Modelo atômico •  Em uma órbita dada (orbital) o elétron pode girar indefinidamente

ao redor do núcleo sem perder energia.

•  Se há ganho ou perda de energia, o elétron salta para a órbita correspondente. É o “salto quântico”.

•  A energia absorvida ou emitida é definida pela diferença de energia entre os níveis nantes e ndepois.

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Modelo atômico •  Modelo de Bohr:

–  apenas alguns orbitais são permitidos. –  o elétron não emite radiação enquanto está no mesmo orbital.

•  Orbitais definidos pelo número quântico n.

n só pode assumir valore inteiros: 1, 2, 3, 4...

•  A força que mantém o elétron em órbita é a atração eletromagnética.

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�������

Absorção e emissão de fótons

•  A energia total de um elétron na órbita n é dada pela combinação da energia cinética com a energia potencial.

•  O sistema é considerado ligado enquanto a energia do nível for En < 0.

•  À medida que n → ∞, E → 0

•  Quando E > 0, o elétron não fica ligado ao núcleo.

En =

m v2

2−

Z e2

r= −13,6 Z2

n2eV

mecânica quântica

mecânica clássica

�����

�����

����� ���� �����

�������� ���

�����

����������

�������

Formação de linhas espectrais •  A diferença de dois níveis de energia, ΔE = E2 – E1, é:

ΔE = +13,6 Z2 1

n12 −

1n2

2

⎣ ⎢

⎦ ⎥ �eV = +2,18 ×10-11Z2 1

n12 −

1n2

2

⎣ ⎢

⎦ ⎥ �erg

•  Para o Hidrogênio (Z = 1), a transição do nível n=4 para n=1 produz a emissão de um fóton de:

–  energia 12,75 eV. –  frequência 3,083×106 GHz –  comprimento de onda 972,4 Å –  Qual é a “cor” deste fóton?

� ultravioleta

Series de linhas do hidrogênio •  1885, Johann Balmer dá a fórmula empírica para uma série de linhas do Hidrogênio. •  1906, Theodore Lyman descobre a linha Lyα no ultravioleta. •  1908, Friedrich Paschen descobre a série no infravermelho. •  1914, Niel Bohr explica todas estas séries com seu modelo atômico

Hα Hβ Hγ En-E1

Linhas espectrais •  Cada elemento produz seu próprio conjunto de linhas espectrais. •  O modelo de Bohr é bom para o Hidrogênio e elementos com a

mesma configuração eletrônica.

•  Para outros elementos é necessário um modelo quântico mais completo. –  1925, equação de

Schrödinger. –  Não há órbitas, os elétrons

ocupam uma “nuvem de probabilidades”.

Diversos estados do átomo de hidrogênio

Composição química dos astros

•  Auguste Comte, filósofo positivista francês.

•  Em 1835, declara que “Nós não poderemos jamais estudar a composição química das estrelas”, pois não podemos alcançar os astros.

•  Para Comte a astronomia deveria se concentrar na geometria e na mecânica: “todo casamento com a física ou a química seria monstruoso”.

Isidore Auguste Comte (1798-1857)

Linhas espectrais

•  O espectro de um elemento é como sua impressão digital.

Linhas espectrais

•  O espectro de uma estrela é usado para determinar sua composição química.

•  O hélio (He) foi descoberto primeiro no Sol por suas linhas espectrais em 1868 e encontrado na Terra apenas em 1895.

Alargamento doppler térmico

•  Movimento aleatório das partículas do gás: –  algumas se aproximam, outras se afastam do observador. –  quanto maior a amplitude do movimento, mais largas as linhas. –  amplitude do movimento � temperatura. –  ocorre em emissão e absorção.

•  Alargamento: Δλ / λrepouso ∝ Tgás ∝ velocidade típica das partículas do gás.

muito frio

quente

Exemplo de espectros no visível br

ilho

rela

tivo

comprimento de onda [Å] 3500 4500 5500 6500 7500 8500

Balmer

Qual é a estrela mais quente? Note as linhas da série de Balmer (linhas do hidrogênio).

Lei do inverso do quadrado da distância •  A luz emitida de uma fonte, como uma lâmpada incandescente ou uma estrela,

propaga-se igualmente para todas as direções.

•  A medida que a luz se afasta da fonte, ela se espalha ao longo de uma superfície cada vez maior, que cresce com o quadrado da distância:

� Área = 4 π r2 (r é a distância da fonte).

•  O fluxo luminoso (energia por unidade de área e por unidade de tempo) diminui com o quadrado da distância à fonte.

Intensidade da radiação

•  Luminosidade = energia emitida por unidade de tempo. –  grandeza intrínseca do astro; –  não depende da distância.

•  Brilho = fluxo de energia (energia por unidade de tempo e por unidade de superfície). –  grandeza aparente (observada) do astro; –  depende da distância.

fluxo =

luminosidade4π distância 2

Intensidade da radiação •  Por exemplo:

–  luminosidade do Sol: 3,86×1026 watt = 1 × L�. •  Aproximadamente 10 trilhões de vezes o consumo de energia mundial).

–  brilho aparente do Sol na Terra: 1373 watt/metro2. –  luminosidade de Sirius (αCMa): 1,0×1028 watt (i.e., 26,1×L�). –  brilho aparente de Sirius na Terra: 0,12 watt/km2

–  lâmpada de 100 W –  brilho aparente a 2 metros de distância: 2 watt/metro2. –  brilho aparente da lâmpada na Lua: 5,5 x 10–11 watt/km2.

–  luminosidade da galáxia de Andrômeda: 1037 watt. –  brilho aparente de Andrômeda: 0,0014 watt/km2.

Magnitude aparente •  No séc. II a.C., Hiparco classifica as estrelas em magnitudes.

–  As estrelas mais brilhantes são de 1a magnitude. –  As estrelas mais fracas (visível a olho nu) são de 6a magnitude. –  A escala de Hiparco segue a sensibilidade da visão humana, logo

é logarítmica:

–  É uma escala de brilho aparente. –  É uma escala invertida: maior brilho tem a menor magnitude.

•  A escala de magnitude usada hoje é descendente direta da escala de Hiparco.

“magnitude”

luminosidade

1 10 100 1000

1

2

3

4

Magnitude aparente •  Em 1856, foi proposta uma escala de magnitude quantitativa por

Norman Pogson (1829–1891): –  Define-se que uma diferença de 5 magnitudes corresponde a um

fator 100× em fluxo. –  Isto é: (magnitude + 5) �� fluxo / 100

1 2 3 4 5 6

Flux

o m

edid

o

Magnitude

Bril

ho

Mag

nitu

de

100

40

16

6 2,5

1

•  m1 = 0 e m2 = 1 � m1 – m2 = –1 � –1 = –2,5 log(f1/f2)

� log(f1/f2) = 0,4 � f1 = f2 × 2,512.

Magnitude aparente

•  m1 = 6 e m2 = 1 � m1 – m2 = 5 � 5 = –2,5 log(f1/f2)

� log(f1/f2) = –2 � f1 = f2/100.

•  Matematicamente expressamos a relação entre magnitude e fluxo como:

magnitude = –2,5 log(fluxo) + constante

•  Comparando dois astros:

mag1 – mag2 = – 2,5 log (fluxo1/fluxo2)

•  Exemplos de magnitude:

–  Sol = –26,75 Lua cheia = –12 Vênus = –4,4 –  Vega (α Lira) = 0 Sirius = –1,6 Plutão = +15

–  lâmpada de 100 W a 1 metro de distância = –21 –  limite do olho nu = +6 –  limite de um telescópio de 1 metro = +18; –  limite do telescópio Hubble (2,5 m no espaço) e do Keck (10m) = +30.

Estas magnitudes são aparentes, correspondem ao brilho (fluxo) que observamos.

30 –3020 10 0 –10 –20

1 104 108 101210–410–810–12

fluxo (brilho) relativoHubble

e Keck

(Havaí)

tele

scópio

de

1m

Siriu

sVênus

Lua ch

eia, lâ

mpada d

e 100W

a 50m

binócu

lo

Cen

tauri

e V

ega

Sol

+ brilhante+ fraco

olho h

umano

quasar

+ b

rilhan

te

lâm

pada de 1

00W a

1m

lâm

pada de 1

00W n

a Lua

Sol n

a gal

áxia

de

Andrôm

eda

Terra

chei

a vi

sta

da Lu

a

lâm

pada de 1

00W a

1 km

Plutã

o

magnitude

•  Medindo-se ϖ, mede-se a distância. –  quanto mais distante, menor o ângulo ϖ.

distância

tan(ϖ ) =Rd

=1 UA

d.

Além disto, tan(ϖ ) ≈ ϖ (em rad).

d

Paralaxe: alteração da posição aparente de um objeto devido à posição do observador.

Distância e paralaxe

(ângulos pequenos)

Distância e paralaxe

•  distância(em parsec) = 1/ϖ'' (ângulo medido em segundos de arco)

•  Se ϖ = 1′′ então distância = 1 parsec.

•  1 parsec = 3,26 anos-luz = 30,86 mil bilhões de km •  1 parsec = 206 mil vezes a distância Terra–Sol

•  parsec = paralaxe second (paralaxe de um segundo)

d

Distância e paralaxe

•  Para astros fora do sistema solar ϖ é tão pequeno que só foi medido a partir de 1838 por Friedrich Bessel.

•  Exemplos: –  Próxima Centauro: ϖ = 0,772'' � D = 1,3 pc (ou 4,24 a.l.); –  Sirius : ϖ = 0,38'' � D = 2,63 pc (ou 8,58 a.l.); ‒  α Crux : ϖ = 0,01'' � D = 100 pc; ‒  β Crux : ϖ = 0,0029'' � D = 345 pc;

Projeto da ESA, lançamento foi em dezembro/2013: Medida de paralaxe até 10 kpc c/ 10% de precisão: http://sci.esa.int/gaia/

Magnitude e distância

•  Tomando 2 astro de mesma luminosidade mas em distâncias diferentes temos:

mag1 – mag2 = 5 log(dist1/dist2)

•  Magnitude absoluta, M : é a magnitude de um astro localizado a uma distância de 10 parsecs.

m – M = 5 log(D1/10 pc)

•  Exemplos: –  Para o Sol: m = –26,7 , M = +4,82; –  Para Sirius: m = –1,6 , M = +1,48 (i.e., 21,6 × L�); –  Para Rigel (β Ori): m = +0,12 , M = –6,7 (i.e. 40.000 × L�); –  Para ε Eridani : m = +3,73 , M = +6,19 (i.e. L�/3,53).

fluxo =

luminosidade4π distância 2

(m – M) = Módulo de distância

Exercício

�  Duas estrelas A e B têm luminosidades 6,4 e 0,4 L� respectivamente. Ambas são observadas com o mesmo brilho (magnitude) aparente. � Qual é a estrela mais distante?

�  Se elas têm a mesma magnitude aparente, então a estrela intrinsecamente mais luminosa tem que estar mais distante.

�  m1 – m2 = –2,5 log[(fluxo1/fluxo2)] , (fluxo = L / 4πD2);

�  m1 – m2 = –2,5 log[(L1/L2)×(D2/D1)2];

�  m1 – m2 = 0 � (L1/L2)×(D2/D1)2 = 1;

�  (D1/D2)2 = (6,4/0,4) = 16 � D1 = 4 × D2

Magnitude bolométrica

•  Não podemos observar todo o espectro de uma fonte astronômica.

•  Observações são feitas em filtros ou bandas, i.e., intervalos de comprimento de onda (ou frequência, ou energia).

•  A magnitude medida usando todo o espectro é chamada bolométrica. –  Isto é calculado, assumindo uma forma para o espectro e

extrapolando a observação em uma ou mais bandas.

Bandas fotométricas

•  U, B e V representam as

magnitudes aparentes (mU, mB ,

mV) nas bandas do ultravioleta,

azul e visível.

•  Os sistemas fotométricos

também se estendem para

outras faixas espectrais como o

vermelho (R, I) e o

infravermelho (J, H, K, L, M..)

•  Definido em função das magnitudes aparentes medidas em diferentes bandas espectrais (filtros).

•  Ex: Sistema fotométrico Johnson: •  bandas U (λ=350nm), B(λ= 450nm) e V(λ= 550nm)

Índice de Cor

•  U, B e V representam as

magnitudes aparentes (mU, mB ,

mV) nas bandas do ultravioleta,

azul e visível.

•  Os sistemas fotométricos

também se estendem para

outras faixas espectrais como o

vermelho (R, I) e o

infravermelho (J, H, K, L, M..)

•  Definido em função das magnitudes aparentes medidas em diferentes bandas espectrais (filtros).

•  Ex: Sistema fotométrico Johnson: •  bandas U (λ=350nm), B(λ= 450nm) e V(λ= 550nm)

•  Índice de cor é a diferença entre as magnitudes (brilhos) de duas bandas.

Índice de Cor

•  Existem outros sistemas

(filtros):

•  u', g', r', i', z'

•  Índice de cor é a diferença entre as magnitudes (brilhos) de duas bandas.

•  Por exemplo: •  B–V, V–R, H–K, g’–r’, etc... •  Por convenção, fazemos:

(banda mais azul – banda mais vermelha)

comprimento de onda

fluxo

rela

tivo

Índice de Cor •  Índice de cor está relacionado com a temperatura de um corpo negro.

� ��

� ���� ������ �

����

���

���

���

��

�����

��

1000K

3000K

10000K

30000K

������ ��������

��������!������������� ����

�����������������

����������������

����������������

������������ � ����� � ��� �� �� ��

������

Índice de Cor •  Diferença entre as magnitudes (brilhos) de duas bandas:

(B–V) = magB–magV = –2,5 log (FB / FV)

•  Em estrelas (e corpos negros) o índice de cor está relacionado com a temperatura.

tem

pera

tura

[K]

U–B

+frio e +vermelho

+quente e +azul

Porque o céu é azul?

•  A luz do Sol é espalhada pelas moléculas na atmosfera. –  As partículas (moléculas) que espalham a luz são muito menores do

que o comprimento de onda da radiação.

•  O quanto a luz é espalhada depende do comprimento de onda (ou frequência): AZUL é mais espalhada do que VERMELHO

•  Este fenômeno é conhecido como espalhamento de Rayleigh, devido ao físico John William Strutt, Lord Rayleigh (1842 - 1919)

Porque o céu é azul?

•  A luz do Sol é espalhada pelas moléculas na atmosfera.

•  O quanto a luz é espalhada depende do comprimento de onda (ou frequência): AZUL é mais espalhada do que VERMELHO

O céu é azul

Porque o pôr do Sol é vermelho?

•  A luz do Sol é espalhada pelas moléculas na atmosfera.

•  O quanto a luz é espalhada depende do comprimento de onda (ou frequência): AZUL é mais espalhada do que VERMELHO

O pôr do Sol é vermelho

Porque a Lua é vermelha durante um eclipse lunar?

•  A luz do Sol é espalhada pelas moléculas na atmosfera.

•  O quanto a luz é espalhada depende do comprimento de onda (ou frequência): AZUL é mais espalhada do que VERMELHO