quem tem medo da internet

3
Quem tem medo da Internet? Sonia Piaya Marinho Munhos. Mestre em Psicologia da Educação e doutoranda em Educação pela UNISO Na história da Chapeuzinho Vermelho o vilão era o lobo. Na dos três porquinhos também. Na história da sociabilidade humana parece que o lobo agora é a Internet. “Hacker invade site da Cetesb e publica fotos de atriz famosa nua”; “EUA estudante é condenado por bullying na Internet”. Essas notícias, pelo impacto que causam, acabam se sobressaindo às notícias boas desqualificando a Internet e dando a ela a fama de vilã. Felizmente, outras notícias foram veiculadas nestes últimos dias: a do vendedor de cocadas que localizou os filhos pelas redes socais; a do o controle social do governo pela população através do acesso à informação por site e e-mail. Percebe-se, então, que todo novo fenômeno deve ser analisado em todas as suas dimensões. A proposta aqui não é a de retomar a falsa questão do otimismo ou pessimismo em relação à Internet. Não cabe maniqueísmos neste tema. A pretensão é focar nas possibilidades que ela traz e chamar a atenção para os perigos da distorção da percepção pública da prática social da Internet, prática essa que não se restringe aos problemas que eventualmente carrega. Manoel Castells, sociólogo espanhol considerado um dos maiores estudiosos do assunto, afirma: “A Internet é uma extensão da vida como ela é em todas as suas dimensões e sob todas as suas modalidades.” 1 Ora, a Internet é um ambiente, assim como nossa casa e nosso trabalho. Como vamos conviver neste ambiente é a grande questão. O “mal” não está na Internet, nem nas redes sociais, tampouco nas novas formas comunicacionais que dela advém. Recordando Mateus 15:10: “O que contamina o 1 CASTELLS, Manuel. A galáxia da Internet: reflexões sobre a Internet, negócios e sociedade. Lisboa:Fundação Calouste Gulbenkian, 2004. (p.100)

Upload: sonia-piaya-marinho-munhos

Post on 24-Jan-2017

188 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Quem tem medo da internet

Quem tem medo da Internet?

Sonia Piaya Marinho Munhos. Mestre em Psicologia da Educação e doutoranda em Educação pela UNISO

Na história da Chapeuzinho Vermelho o vilão era o lobo. Na dos três porquinhos também. Na história da sociabilidade humana parece que o lobo agora é a Internet. “Hacker invade site da Cetesb e publica fotos de atriz famosa nua”; “EUA estudante é condenado por bullying na Internet”. Essas notícias, pelo impacto que causam, acabam se sobressaindo às notícias boas desqualificando a Internet e dando a ela a fama de vilã.

Felizmente, outras notícias foram veiculadas nestes últimos dias: a do vendedor de cocadas que localizou os filhos pelas redes socais; a do o controle social do governo pela população através do acesso à informação por site e e-mail. Percebe-se, então, que todo novo fenômeno deve ser analisado em todas as suas dimensões.

A proposta aqui não é a de retomar a falsa questão do otimismo ou pessimismo em relação à Internet. Não cabe maniqueísmos neste tema. A pretensão é focar nas possibilidades que ela traz e chamar a atenção para os perigos da distorção da percepção pública da prática social da Internet, prática essa que não se restringe aos problemas que eventualmente carrega.

Manoel Castells, sociólogo espanhol considerado um dos maiores estudiosos do assunto, afirma: “A Internet é uma extensão da vida como ela é em todas as suas dimensões e sob todas as suas modalidades.”1 Ora, a Internet é um ambiente, assim como nossa casa e nosso trabalho. Como vamos conviver neste ambiente é a grande questão. O “mal” não está na Internet, nem nas redes sociais, tampouco nas novas formas comunicacionais que dela advém. Recordando Mateus 15:10: “O que contamina o homem não é o que entra na boca, mas o que sai da boca, isso é o que contamina o homem”.

O fato é que já vivemos na cibercultura: uma cultura contemporânea marcada pelas tecnologias digitais. Home banking, cartões inteligentes, celulares, palms, pages, Ipad, tablets, voto eletrônico, Imposto de Renda via rede, redes sociais, enfim, está criada, a partir delas, uma nova demanda social: a inclusão digital e a aprendizagem das práticas sociais mediadas por estas novas tecnologias.

Em relação a inclusão digital, verificamos que o acesso às tecnologias cada vez mais se ampliam: notícias recentes dão conta da elevação dos números de computadores ligados à rede nos lares sorocabanos; lousa digital nas escolas públicas; distribuição de tabletes aos professores de Ensino Médio, pelo MEC; enfim, é possível afirmar que o acesso já vem ocorrendo, embora não com a emergência de que necessitamos.

1 CASTELLS, Manuel. A galáxia da Internet: reflexões sobre a Internet, negócios e sociedade. Lisboa:Fundação Calouste Gulbenkian, 2004. (p.100)

Page 2: Quem tem medo da internet

Com a ampliação do acesso vem agora a preocupação maior: como estamos lidando com estas novas tecnologias? Já não basta o acesso: é preciso apropriar-se de todas as potencialidades que elas nos trazem. Governos, instituições (especialmente as de ensino e pesquisa), mídia precisam organizar-se para atender as demandas do acesso e letramentos digitais Para isso, são necessários estudos sobre como vêm ocorrendo os chamados letramentos digitais, entendendo-os como o estado ou condição de leitura e escrita propiciadas por estas novas tecnologias de comunicação eletrônica- o computador, a rede ( a Web), a Internet.2

Temos a nosso dispor cada dia mais informação e já podemos dizer que a Internet é a ponta deste fenômeno. Falta-nos aprender a lidar com estas informações, para que se tornem, de fato, conhecimento. E mais: que se tornem conhecimento para a edificação do ser humano, ou seja, para a promoção de cidadãos mais conscientes, participativos e éticos.

Os impactos da Internet na comunicação também já são sentidos. Comunicamo-nos hoje de forma híbrida: falamos com nossos colegas e familiares tanto pessoalmente ou por telefone como por e-mail, msn, facebook. Essas formas diversas podem ocorrer simultaneamente e de forma complementar, sem necessariamente concorrerem entre si.

Não podemos mais basear-nos em posições simplistas quando o assunto é Internet. Por causa da flexibilidade e do poder de comunicação que oferece, a interação social on-line desempenha hoje importante papel na organização social como um todo. Não é preciso ter medo dela nem fechar os olhos aos problemas decorrentes de seu mal uso.

Ganha importância a produção de pesquisas e estudos que ajudem a compreendê-la, assim como as novas formas de sociabilidade e de comunicação no mundo contemporâneo. Como prefiro as histórias com final feliz, acredito que a Internet pode contribuir para promover novas relações sociais baseadas no respeito, na dignidade humana, igualdade, liberdade e na convivência pacífica entre os seres humanos.

Maio/2012

2 SOARES, Magda. Novas práticas de leitura e escrita: letramento na cibercultura. Educação e Sociedade. V.23, n.81,p.146, 2002.