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PARASSUBORDINAÇÃO: ORIGENS, ELEMENTOS, ESPÉCIES E TUTELA Renata Orsi Bulgueroni 1. INTRODUÇÃO. 2. A CRISE DA SUBORDINAÇÃO JURÍDICA E O SURGIMENTO DA PARASSUBORDINAÇÃO. 3. O ESMIUÇAR DO INSTITUTO: IDENTIFICAÇÃO DE EUS ELEMENTOS E ESPÉCIES. 4. A TUTELA JURÍDICA DOS TRABALHADORES PARASSUBORDINADOS. 5. A REFORMA BIAGI E A MORALIZAÇÃODA UTILIZAÇÃO DAS CO.CO.CO.. 6. A PERMANÊNCIA DA VELHA PARASSUNORDINAÇÃOEM FACE DO LAVORO A PROGETTO. 7. CONCLUSÕES. 1. INTRODUÇÃO A análise do ordenamento jurídico de Estados outros que não o Brasil mostra-se sobremaneira árdua – especialmente quando dela emergem conceitos totalmente desconhecidos do direito pátrio. A noção de parassubordinação, elaborada pelo direito italiano, é exemplo vivo de tal dificuldade: em um modelo como o brasileiro, cujo direito laboral é tradicionalmente marcado pela dicotomia “subordinação- autonomia”, parece inconcebível se pensar em uma classe de trabalhadores que presta serviços de maneira autônoma, mas se insere no âmbito de organização empresarial do tomador, sujeitando-se ao poder diretivo deste no curso da execução do contrato. Contudo, a realidade demonstra que tais trabalhadores vêm ganhando cada vez mais espaço no mercado laboral. E,

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PARASSUBORDINAÇÃO: ORIGENS, ELEMENTOS, ESPÉCIES E TUTELA

Renata Orsi Bulgueroni

1. INTRODUÇÃO. 2. A CRISE DA SUBORDINAÇÃO JURÍDICA E O SURGIMENTO DA

PARASSUBORDINAÇÃO. 3. O ESMIUÇAR DO INSTITUTO: IDENTIFICAÇÃO DE EUS

ELEMENTOS E ESPÉCIES. 4. A TUTELA JURÍDICA DOS TRABALHADORES

PARASSUBORDINADOS. 5. A REFORMA BIAGI E A “MORALIZAÇÃO” DA UTILIZAÇÃO DAS

CO.CO.CO.. 6. A PERMANÊNCIA DA “VELHA PARASSUNORDINAÇÃO” EM FACE DO LAVORO

A PROGETTO. 7. CONCLUSÕES.

1. INTRODUÇÃO

A análise do ordenamento jurídico de Estados outros que não o Brasil mostra-se

sobremaneira árdua – especialmente quando dela emergem conceitos totalmente

desconhecidos do direito pátrio. A noção de parassubordinação, elaborada pelo direito

italiano, é exemplo vivo de tal dificuldade: em um modelo como o brasileiro, cujo direito

laboral é tradicionalmente marcado pela dicotomia “subordinação-autonomia”, parece

inconcebível se pensar em uma classe de trabalhadores que presta serviços de maneira

autônoma, mas se insere no âmbito de organização empresarial do tomador, sujeitando-se ao

poder diretivo deste no curso da execução do contrato.

Contudo, a realidade demonstra que tais trabalhadores vêm ganhando cada vez

mais espaço no mercado laboral. E, enquanto o legislador brasileiro empreende tentativas

inócuas de enquadrar esses prestadores nas categorias clássicas do direito do trabalho, na

Itália reconheceu-se efetivamente a existência desse tipo de relação laboral em que se

imiscuem elementos da subordinação e da autonomia – a qual restou conhecida como

parasubordinazione. E mais: o legislador italiano, ciente do crescimento de tal classe no

mercado de trabalho, procura, cada vez mais, aperfeiçoar o instituto, adequando-o às

constantes modificações verificadas no setor produtivo.

É da construção da noção de parassubordinação, destarte, que se tratará no

presente estudo. Para tanto, inicialmente será imprescindível a aferição das origens do

instituto, e da caracterização desses trabalhadores que, conquanto autônomos, prestam

serviços sob a direção alheia. Concluída tal premissa, passar-se-á à análise dos elementos

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essenciais do trabalho parassubordinado, bem como das principais espécies de trabalhadores

que nele podem ser incluídas.

Posteriormente, efetuar-se-á estudo acerca da tutela conferida na Itália ao trabalho

parassubordinado. Assim, primeiramente, mister se fará a apreciação do tratamento legal do

instituto para que, em seguida, se proceda à análise dos entendimentos doutrinários e

jurisprudenciais a respeito do tema. Neste ponto, procurar-se-á, na medida do possível, indicar

os principais direitos de cunho trabalhista que são aplicados, pelos tribunais italianos, a tais

prestadores de serviços.

Por fim, será esmiuçada a atuação do legislador italiano que visa a manter o

instituto da parassubordinação em constante evolução, de maneira a adequá-lo às alterações

verificadas no mercado de trabalho. Sua mais recente atuação nesse sentido refere-se à

instituição, no ordenamento, da fattispecie do contrato de trabalho a projeto – a qual será

explicitada com vagar no último capítulo deste estudo.

Com o presente trabalho, pretende-se contribuir com as pesquisas do jurista

brasileiro que se embrenha na análise das relações de parassubordinação. O pressuposto

essencial para o alcance de tal objetivo, entretanto, consiste no abandono momentâneo das

concepções arraigadas do direito do trabalho pátrio, para a análise de uma realidade que, em

muitos aspectos, se distancia completamente do modelo brasileiro. É sob tal ponto de vista,

assim, que se estudará o instituto da parassubordinação.

2. A CRISE DA SUBORDINAÇÃO JURÍDICA E O SURGIMENTO DA PARASSUBORDINAÇÃO

2.1. Os trabalhadores autônomos-dependentes

Como se sabe, a noção de subordinação jurídica sempre representou um dos

pilares do direito do trabalho; com efeito, nos períodos em que o mercado de trabalho

mostrou-se profundamente influenciado pelas formas de produção taylorista e fordista, fez-se

necessária a instituição de um sistema normativo cujo principal escopo seria a obtenção da

igualdade substancial entre a classe social do proletariado, alheia à distribuição do capital, e

os empregadores, então vistos como detentores do poder econômico. Daí a estruturação do

direito do trabalho da maneira como este é conhecido atualmente: um sistema de fortes

características interventivas e protetoras, que objetiva conferir, ao trabalhador que presta

serviços sob o comando de outrem, superioridade jurídica em relação ao natural poderio

econômico do empregador.

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Contudo, diante das modificações que marcaram o processo produtivo a partir da

denominada “Terceira Revolução Industrial”, consolidou-se o entendimento de que o critério

da subordinação jurídica mostrava-se em desacordo com a nova configuração das relações

laborais. Nesse sentido, estudiosos do direito do trabalho de todo o mundo reconheceram que

a rígida legislação então vigente era inapta a tutelar as novas formas de trabalho que surgiam

no contexto da automatização, descentralização produtiva e internacionalização da economia.

A esse respeito, bem salienta Luisa Galantino:

“(...) l’appiattimento della struttura gerarchica dell’impresa:

gli sviluppi tecnologici ed informatici non si limitano a rendere

possibile un incremento di prestazioni lavorative elastiche nel

tempo e nello spazio, ma impongono la flessibilità come

requisito funzionale della stessa organizzazione di lavoro, la

quale diventa sempre meno gerarchizzata”. 1

A partir da segunda metade do século XX, então, surgem discussões acerca da

necessária revisão do conceito de subordinação como elemento caracterizador do contrato de

trabalho. Fala-se na “crise da subordinação jurídica” a qual, segundo Arion Sayão Romita,

não representa uma crise propriamente dita, mas “a necessidade de adaptação da legislação

do trabalho às novas realidades trazidas pelas inovações tecnológicas e pela globalização da

economia”. 2

No entender de Luiz de Pinho Pedreira Silva, o critério da subordinação começa a

ser questionado quando se percebe que ele abarca trabalhadores de condições sociais muito

diferentes – o que leva o direito laboral a tutelar pessoas que, conquanto subordinadas, não

necessitam de proteção e a ignorar outras que, embora autônomas, encontram-se em posição

de debilidade em relação ao tomador de seus serviços.3

É por tal razão, destarte, que inúmeros doutrinadores ressaltam a impossibilidade

de se pensar a subordinação jurídica como um conceito único, atrelado às funções

originariamente desempenhadas pelo direito laboral em relação à tutela do empregado

clássico; ao contrário, é mister que se reconheça a existência de várias “subordinações”, aptas

1 GALANTINO, Luisa. Diritto del lavoro. 14 ed.. Torino: G. Giappichelli, 2006, p. 17.2 ROMITA, Arion Sayão. A crise do critério da subordinação jurídica – necessidade de proteção a trabalhadores autônomos e parassubordinados. Revista de Direito do Trabalho, São Paulo, ano 31, n. 117, jan./mar. 2005, p. 42.3 SILVA, Luiz de Pinho Pedreira. Um novo critério de aplicação do direito do trabalho: a parassubordinação. Revista de Direito do Trabalho, São Paulo, ano 27, n. 103, jul/set. 2001, pp. 174-175.

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a propiciar uma maior coerência das tutelas jurídicas com as exigências do mercado de

trabalho. 4

Os Estados europeus foram pioneiros na rediscussão do critério da subordinação; é

entre eles, dessa maneira, que primeiramente se reconhece a existência de trabalhadores que

se situam em uma zona cinzenta entre a subordinação e a autonomia, i.e., prestadores que, a

despeito de ostentarem características típicas do trabalho autônomo, vêem seu modus

operandi limitado por uma relação de dependência com o tomador de seus serviços. A partir

do reconhecimento de tal classe de trabalhadores, difunde-se por toda a Europa a noção de

“trabalho autônomo de segunda geração”, representada por prestadores de serviços que

passam a ser conhecidos pela doutrina como “trabalhadores autônomos-dependentes”. 5 6

Referida forma de prestação de serviços ostenta características que ora a

aproximam do trabalho autônomo clássico, ora do trabalho subordinado. Nesse sentido,

podem ser apontados como elementos essenciais do trabalho autônomo de segunda geração:

a) a pessoalidade da prestação; b) a longa duração das relações contratuais; c) a destinação da

prestação em favor de um único tomador (e a importância, para o trabalhador, dos

rendimentos recebidos desse comitente, ainda que mantenha relações com outros) e d) a

inexistência de vínculo direto entre o prestador e o mercado, o qual resta destinado

exclusivamente ao tomador.

Está-se diante, ademais, de trabalhadores que dispõem de um bem diferenciado em

relação aos empregados clássicos, qual seja, a especialização profissional. Infere-se, pois, que

tais prestadores não vendem sua força de trabalho, e sim seu know-how, seu conhecimento

especializado em dada matéria que se mostra necessária para o crescimento da empresa.

Colacione-se o magistério de Otávio Pinto e SILVA acerca do tema:

“Trata-se de trabalhadores que não dispõem de instrumentos

de produção tradicionais mas que possuem uma ‘nova

riqueza’: um patrimônio de conhecimento, de know-how, de

4 Nesse sentido, cf., por todos, ZOPPOLI, Lorenzo. La subordinazione tra persistenti diseguaglianze e tendenze neo-autoritarie. Disponível em http://www.unicz.it/LAVORO/ZOPPOLI_04042003.pdf. Acesso em 10 maio 2008.5 A aparente contradição que a expressão representa para o direito laboral brasileiro é enfrentada com naturalidade pelos doutrinadores europeus, o que corrobora a afirmação de que estes foram pioneiros a reconhecer a tenuidade da linha divisória entre a subordinação e a autonomia.6 Denominações específicas a tais trabalhadores consagram-se nos diferentes países da Europa, como “pessoas semelhantes ao trabalhador subordinado” (arbeitnemeränliche Person), na Alemanha; contrats de dépendance à sujétion imparfaite, na França; dependent self-employed workers, no Reino Unido; “contratos de livre trabalho” (Freie Ddienstverträge) ou “contratos para o trabalho” (Werkvertrag), na Áustria; trabajo autonomo dependiente, na Espanha e – objeto do presente estudo – lavoro parasubordinato, na Itália.

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especialização profissional, que os torna capazes de fornecer

um resultado, um serviço, um programa, sem a necessidade da

rigorosa direção que tipifica o trabalho subordinado. Esses

trabalhadores necessitam coordenar-se de modo estável e

continuado com as empresas para desenvolver suas atividades

pessoais”. 7

Observa-se, portanto, que, concomitantemente ao surgimento de espécies atípicas

de trabalho subordinado – como, e.g., o trabalho a tempo parcial, a aprendizagem e,

especificamente na Itália, o lavoro ripartito, o lavoro a chiamata e o contratto di inserimento

–, assiste-se à difusão de novas formas de trabalho autônomo, as quais colocam em xeque a

tradicional distinção entre subordinação e autonomia e, conseqüentemente, acarretam um

redimensionamento do próprio direito laboral.

2.2. As origens da parassubordinação

É nesse contexto de releitura da dicotomia “autonomia-subordinação”, destarte,

que é construída, na Itália, a noção de parassubordinação – em clara manifestação da

fattispecie do trabalho autônomo de segunda geração.

O instituto contempla dois grandes objetivos que, à primeira vista, aparentam ser

distintos; porém, em uma segunda leitura, mostram-se totalmente conexos. Assim, de um

lado, visa-se a atender às demandas das empresas pela flexibilização das formas de trabalho,

mediante a instituição de relações contratuais laborais que lhes permitam adequarem-se às

modificações ocorridas no mercado. De outra parte, busca-se conferir a adequada tutela

jurídica a essa classe de trabalhadores formada por pessoas que, conquanto autônomas,

apresentam típicas características do trabalho subordinado.

Muito se questiona em doutrina acerca do momento em que teria ocorrido a

positivação do instituto da parassubordinação pelo legislador italiano. Nesse sentido, importa

salientar que data de 1959 a primeira menção ao trabalho parassubordinado na legislação

italiana – a qual foi operada pela Lei nº 741, de 14 de julho desse ano, que dispôs que ao

governo competiria estabelecer normas jurídicas com força de lei aptas a garantir a tutela

mínima “das relações de colaboração que se concretizem em prestações de obra continuativa

e coordenada”. 8

7 SILVA, Otávio Pinto e. Subordinação, Autonomia e Parassubordinação nas Relações de Trabalho. São Paulo: LTr, 2004, p. 115.8 Veja-se a redação de referida lei:

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Com referido diploma legal, pois, insere-se no ordenamento italiano o embrião da

expressão “colaboração continuativa e coordenada” (co.co.co.) – a qual, posteriormente, com

o desenvolvimento do conceito da parassubordinação, sempre acompanhará o instituto como

sua espécie mais característica.

Todavia, a despeito da previsão constante da Lei nº 741/1959, a doutrina é pacífica

ao afirmar que o instituto da parassubordinação somente é realmente consagrado pelo

ordenamento jurídico da Itália em 1973, com a reforma do Codice di Procedura Civile

operada pela Lei nº 533, de 11/08/1973. Com referida alteração, o art. 409 desse diploma

passa a dispor que:

“Art. 409 (Controversie individuali di lavoro)

Si osservano le disposizioni del presente capo nelle

controversie relative a:

(...)

3) rapporti di agenzia, di rappresentanza commerciale ed altri

rapporti di collaborazione che si concretino in una prestazione

di opera continuativa e coordinata, prevalentemente personale,

anche se non a carattere subordinato;

(...)”.

Verifica-se que, mediante a modificação do Codice di Procedura Civile, o

legislador consagrou efetivamente o instituto das co.co.co. no ordenamento italiano e,

iniciando um longo percurso de extensão de direitos a essa relação de trabalho, conferiu-lhe a

tutela processual constante do capítulo I do Título IV do C.P.C., referente ao procedimento a

ser adotado na solução das controvérsias individuais de trabalho.

A partir da positivação do instituto, destarte, iniciam-se as discussões em doutrina

acerca de suas características, seus elementos e suas espécies, bem como da tutela jurídica a

lhe ser assegurada9. É o que se passa a analisar no próximo capítulo.

“Art. 1. Il Governo è delegato ad emanare norme giuridiche, aventi forza di legge, al fine di assicurare minimi inderogabili di trattamento economico e normativo nei confronti di tutti gli appartenenti ad una medesima categoria. (...)Art. 2. Le norme di cui all'art. 1 dovranno essere emanate per tutte le categorie per le quali risultino stipulati accordi economici e contratti collettivi riguardanti una o più categorie per la disciplina dei rapporti di lavoro, dei rapporti di associazione agraria, di affitto a coltivatore diretto e dei rapporti di collaborazione che si concretino in prestazione d'opera continuativa e coordinata”. (g.n.)9 Representa marco desses estudos doutrinários a publicação, em 1979, da clássica obra Il lavoro parasubordinato, de Francesco Santoro-Passarelli, considerada pela doutrina como o primeiro estudo efetuado acerca da parassubordinação. Cumpre ressaltar, aliás, que, embora o trabalho parassubordinado tenha sido alvo de diversas modificações nos últimos anos – consoante se demonstrará a seguir – grande parte das lições propostas por Santoro-Passarelli ainda se mostra de grande valia para o estudo do instituto.

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3. O ESMIUÇAR DO INSTITUTO: IDENTIFICAÇÃO DE SEUS ELEMENTOS E ESPÉCIES

3.1. Elementos: a parassubordinação como um tertium genus das relações de trabalho

Com a alteração do art. 409 do Codice di Procedura Civile e a conseqüente

positivação do instituto da parassubordinação no ordenamento italiano, coube à doutrina a

tarefa de identificação das características dessa nova modalidade de relação de trabalho.

Referido intento mostrou-se sobremaneira árduo, vez que o que se buscava, em realidade, era

elencar os pontos de aproximação e distanciamento do trabalho parassubordinado em relação

aos conceitos tradicionais de autonomia e subordinação.

Nesse sentido, consoante leciona Otavio Pinto e Silva, os juristas italianos tinham

como objetivo precípuo esclarecer que a parassubordinação vai além do conceito clássico de

trabalho autônomo e que, de outra parte, não se confunde com o trabalho subordinado, apesar

de apresentar várias semelhanças em relação a este10.

No estudo da estrutura das co.co.co., a doutrina deparava-se ora com elementos

que muito as aproximavam da autonomia, ora com características que lhes conferiam um

nítido caráter de relação de trabalho subordinado. Por conta de tal oscilação entre os pólos da

dicotomia clássica que sempre norteou o direito do trabalho, firmou-se na Itália o

entendimento de que a parassubordinação constituiria uma zona cinzenta entre a autonomia e

a subordinação, um verdadeiro tertium genus que teria rompido com a tradicional concepção

polarizada do direito laboral.

Todavia, insta observar que referido posicionamento não resistiu aos estudos mais

aprofundados a respeito do instituto que viriam a ser realizados pela doutrina nos anos

seguintes à reforma do C.P.C.. Com efeito, hoje é praticamente unânime entre os juristas

italianos a concepção de que, a despeito dos evidentes elementos que aproximam a

parassubordinação ao trabalho subordinado, esta se trata, em realidade, de espécie do grande

gênero “trabalho autônomo”. Tal entendimento, como se verá, é de suma importância para a

identificação dos direitos a serem aplicados a essas relações de trabalho.

Veja-se o quanto assevera Luisa Galantino acerca do tema:

“La formulazione legislativa è certamente ridondante, poiché

sul piano giuridico l’unica distinzione di genus è quella fra

lavoro subordinato e lavoro autonomo, in quest’ultimo

10 SILVA, Otávio Pinto e. Subordinação, Autonomia.... Op. cit., p. 104.

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comprendendosi anche le species della collaborazione

coordinata e continuativa o di altre ‘forme’ di attività

lavorativa, quali il contrato d’opera o il contratto di agenzia”11

Consagrado, pois, o posicionamento de que a parassubordinação representa

verdadeira espécie de trabalho autônomo, passa-se à análise de seus elementos constitutivos.

A esse respeito, mostra-se de grande valia o estudo efetuado por Otavio Pinto e

Silva, o qual, compilando o entendimento de diversos autores italianos e interpretando a

disciplina legal acerca do tema, aponta como elementos essenciais do trabalho

parassubordinado a continuidade da relação, a natureza preponderantemente pessoal da

prestação e, especialmente, a existência de uma colaboração ou ligação funcional entre a

atividade do prestador de serviços e aquela de seu tomador12.

A continuidade indica o caráter não-esporádico da atividade realizada, i.e., “a

prestação de serviços deve se destinar a atender uma necessidade do tomador que tenha um

determinado prolongamento no tempo, tendo em vista os interesses de ambas as partes” 13.

Corroborando tal definição, afirma Angelo Sodano que, “la continuatività della

collaborazione risulta individuata dalla stabilità, dalla non occasionalità e dalla continuità

della prestazione o dalla ripetizione nel tempo di essa”. 14 15

Por seu turno, a característica da pessoalidade preponderante impede o prestador

de serviços de se fazer substituir em suas atividades, seja na etapa organizativa do negócio,

seja na fase de produção propriamente dita. Ressalte-se que se exige apenas a

preponderância da pessoalidade; assim, nada impede que o prestador valha-se do auxílio de

outras pessoas, cujo trabalho “deve ser apenas complementar, o que significa que a principal

carga de atividades deve ser desenvolvida pelo prestador pessoalmente contratado” 16.

Por fim, a coordenação – tida pela doutrina italiana como a característica

distintiva da parassubordinação em relação às demais formas de trabalho – é marcada pela

intensa inserção da atividade do prestador na organização da empresa. Trata-se, pois, da

11 GALANTINO, Luisa. Diritto del lavoro.... Op. cit., p. 49. No mesmo sentido, cf. SODANO, Ângelo. Rapporti di parasubordinazione e giusta retribuzione. Lavoro e Previdenza Oggi, Milano, ano 17, n. 6, giugno 1990, p. 1170.12 SILVA, Otávio Pinto e. Subordinação, Autonomia.... Op. cit., p. 105.13 SILVA, Otávio Pinto e. Subordinação, Autonomia.... Op. cit., p. 104.14 SODANO, Ângelo. Rapporti di parasubordinazione.... Op. cit., p. 1171.15 Importa salientar que, com a criação do instituto do trabalho a projeto, reforça-se a idéia de continuidade inerente às relações de parassubordinação, já que o decreto-legislativo nº 276/2003 é explícito ao excluir de seu âmbito de aplicação os contratos cuja duração não ultrapasse trinta dias no curso de um ano com o mesmo comitente (art. 61, n. 2).16 SILVA, Otávio Pinto e. Subordinação, Autonomia.... Op. cit., p. 105.

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ligação funcional entre o trabalho prestado e a atividade desenvolvida diretamente pelo

destinatário da prestação.

Observe-se que, no âmbito da parassubordinação, não se fala propriamente em

“colaboração na empresa”, como ocorre no trabalho subordinado clássico (de acordo com o

disposto no art. 2094 do Codice Civile); ao contrário, consagra-se a concepção de

“colaboração para a empresa”, i.e., situação em que os resultados do trabalho do colaborador

devem se unir àqueles do tomador para que a atividade empresarial possa atingir suas

finalidades. A esse respeito, leciona Luisa Galantino que, na parassubordinação, a

colaboração entre prestador e tomador de serviços deve ser funcional, no sentido de que uma

concorre para a realização da outra; já na subordinação, a colaboração é unicamente de cunho

estrutural17.

Neste ponto, insere-se um último elemento essencial do trabalho

parassubordinado: a necessidade de, entre tomador e prestador de serviços, pactuar-se um

projeto a ser seguido pelo último, já que “o trabalhador não promete a sua atividade pessoal

para o desenvolvimento de qualquer objetivo pretendido pelo tomador, mas sim coloca os

seus serviços à disposição somente daquele específico tipo de atividade, que é necessária

para atingir os fins previstos no programa contratualmente elaborado” 18.

Após a identificação dos elementos caracterizadores do trabalho

parassubordinado, a doutrina italiana viu-se diante de um novo desafio: a averiguação de

quem seriam esses trabalhadores que colaboram, de forma autônoma, na atividade empresarial

mediante uma prestação de obra continuativa e coordenada, prevalentemente pessoal. Em

outras palavras: quem – diante da averiguação dos elementos acima indicados – poderia ser

considerado um verdadeiro prestador de serviços parassubordinado?

Instaurou-se na Itália, assim, a discussão acerca das espécies de trabalhadores

sujeitos às co.co.co..

3.2. Espécies de trabalhadores parassubordinados: a atuação conjunta da doutrina, da jurisprudência e do legislador

17 GALANTINO, Luisa. Diritto del lavoro.... Op. cit., p. 15. Contudo, ressalta a autora na mesma obra que “(...) presenta spesso serie difficoltà um’indagine di fato a rilevare se il coordinamento della prestazione del lavoratore com quella di altri abbia o meno caratere strutturale olthe che funzionale. E tal rilievo ancora uma volta pone in luce l’esigenza di omogeneizzare la disciplina del lavoro subordinato com quella del lavoro cosiddetto parasubordinato”.18 SILVA, Otávio Pinto e. Subordinação, Autonomia.... Op. cit., p. 105..

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Na identificação das espécies de trabalhadores parassubordinados, imprescindível

se mostrou a atuação conjunta da doutrina e da jurisprudência italiana; todavia, foi o

legislador que desempenhou o papel fundamental em tal tarefa.

Inicialmente, é mister relembrar a alteração operada pela Lei nº 533/1973 ao

Codice di Procedura Civile, para estabelecer a obrigatoriedade de aplicação da disciplina

processual trabalhista às “relações de agência, de representação comercial e outras relações

de colaboração que se concretizem em uma prestação de obra continuativa e coordenada”,

nos termos do art. 409, n. 3 desse diploma. Da redação de tal dispositivo, infere-se, de plano,

que o legislador, no momento da instituição da parassubordinação no ordenamento italiano,

procurou indicar duas espécies de relação de trabalho que, em seu entender, nela se

inseririam: as relações de agência e de representação comercial.

Dessa maneira, é pacífico o entendimento, hoje, de que aos agentes e

representantes comerciais aplica-se a tutela jurídica conferida originalmente ao trabalho

parassubordinado – a qual, saliente-se, será explicitada com mais vagar a seguir.

Grande celeuma, contudo, instaurou-se em relação à expressão “outras relações de

colaboração que se concretizem em uma prestação de obra continuativa e coordenada”,

mencionada por referido artigo. Com efeito, tratando-se de expressão demasiadamente ampla

e abstrata, esta demandou esforços contíguos da doutrina, da jurisprudência e do legislador na

especificação de seu âmbito de abrangência.

Inicialmente, contribuíram para a identificação dos demais trabalhadores

parassubordinados normas de caráter tributário promulgadas na Itália posteriormente à Lei nº

533/73 – como, e.g., a Lei nº 342, de 21 de novembro de 200019. Referido diploma contempla,

em seu art. 34, n. 1, letra c-bis, rol exemplificativo de outras atividades que constituem

relações de colaboração coordenada e continuativa, tais como os ofícios de síndicos e

administradores de sociedades e associações, de colaboradores em jornais, revistas,

enciclopédias e similares e de participantes em colégios e comissões.

Entretanto, tais normas de natureza tributária não propiciaram uma delimitação

precisa do âmbito de abrangência da expressão contida no art. 409, n. 3 do C.P.C. – e, como

bem salienta Alessandra Gaspari, nem era esperado que o fizessem, já que as leis fiscais são

19 Citem-se, ainda, os decretos presidenciais nº 597/73 e nº 917/86, que contêm disposições análogas ao previsto pela Lei nº 342/00 no que concerne ao regime tributário das co.co.co.. Todos esses diplomas estabelecem sistema diferenciado de tributação às relações de parassubordinação, de maneira geral menos oneroso do que aquele instituído ao clássico trabalho subordinado.

10

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destinadas a regular os fluxos monetários e indicar seu respectivo campo de aplicação, e não a

construir ou esclarecer definições20.

Delegou-se, destarte, à doutrina e à jurisprudência a tarefa de individuação das

relações de trabalho pautadas na parassubordinação.

Em doutrina, merecem relevo os estudos de Angelo Sodano, o qual apresenta, em

suas obras, inúmeros exemplos de prestações que poderiam ser facilmente enquadradas no

conceito previsto pelo art. 409, n. 3 do Codice di Procedura Civile. A esse respeito, poder-se-

ia falar em relações de consultoria entre uma empresa e um profissional liberal, relações entre

uma sociedade de capitais e seu administrador, entre outras21.

A jurisprudência, por seu turno, procura identificar as co.co.co. mediante a

comparação entre os elementos verificados em concreto em dada relação laboral e as

características essenciais do trabalho parassubordinado. Todavia, a atuação dos órgãos

judiciários na especificação dos trabalhadores parassubordinados ainda é bastante criticada

pelos juristas italianos, vez que, segundo eles, esta se mostra estritamente ligada à tradicional

dicotomia entre subordinação e autonomia – razão pela qual são poucos os casos em que se

reconhece a existência de uma autêntica relação de colaboração.

Ainda assim, há determinados trabalhadores que são frequentemente considerados

pelos tribunais como parassubordinados, tais como os profissionais liberais e os sócios que

prestam serviços às respectivas sociedades comerciais.

Tal atuação doutrinária e jurisprudencial se mostra sobremaneira relevante, haja

vista que, identificados os trabalhadores que atuam em coordenação direta com o tomador de

seus serviços, nos termos do art. 409, n. 3 do C.P.C., é preciso especificar quais normas de

direito processual e material são a eles aplicáveis – questão que sempre foi e ainda é motivo

de acirradas discussões na Itália.

4. A TUTELA JURÍDICA DOS TRABALHADORES PARASSUBORDINADOS

Identificados os elementos característicos e as espécies de trabalhadores

parassubordinados, surgiu a questão fulcral que até os dias atuais norteia as discussões

relacionadas à parassubordinação na Itália: qual a tutela jurídica aplicável a tais prestadores de

serviço? Tratando-se de trabalhadores autônomos, aplicar-se-iam as regras previstas pelos

arts. 2.222 e seguintes do Codice Civile? Ou, ao contrário, o elemento “dependência” atrairia

20 GASPARI, Alessandra. La qualificazione di un rapporto di lavoro controverso: le risposte passate e recenti, dalla dialettica autonomia/subordinazione alla sua metamorfosi in corso. Lavoro e Previdenza Oggi, Milano, ano 30, n. 3, mar. 2003, p. 47.21 SODANO, Angelo. Rapporti di parasubordinazione.... Op. cit., p. 1171.

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tais prestadores ao espectro do trabalho subordinado, incidindo sobre eles o direito material

trabalhista contemplado pelos arts. 2.094 e seguintes do C.C.?

Para a adequada compreensão da questão, é mister, inicialmente, tecer breves

considerações acerca dos métodos de proteção dos trabalhadores denominados “autônomos

dependentes” no âmbito da União Européia.

Nesse sentido, observa-se que a atenção hoje conferida pelos Estados europeus ao

trabalho autônomo dependente evidencia-se especialmente por duas vertentes distintas:

primeiramente, vislumbram-se esforços de tais ordenamentos na prevenção de formas ilegais

de trabalho autônomo dependente, que freqüentemente mascaram verdadeiras relações de

trabalho subordinado; de outra parte, consagra-se nesses países a necessidade de se

estabelecer uma mínima proteção legal a tais trabalhadores, com a extensão, a estes,

sobretudo de tutelas de direito do trabalho e da seguridade social.

A primeira vertente de proteção verificada entre os países europeus representa, em

verdade, uma tendência mundial, haja vista os esforços que os Estados vêm empreendendo

para erradicar formas irreais de trabalho autônomo. Todavia, vê-se que a maior parte dos

Estados procura reprimir a subutilização do trabalho autônomo mediante a atuação direta do

Poder Judiciário, a quem é atribuída a prerrogativa de “desmascarar” as relações de falsos

autônomos, convertendo-as em contratos de trabalho subordinado; é, e.g., o que se verifica no

Brasil. Na Europa, por outro lado, já existem disposições legais que estabelecem presunções

de inautenticidade de contratos de autônomos, na hipótese de se mostrarem ausentes os

requisitos essenciais dessa forma de trabalho – como ocorre, e.g., com o instituto do contratto

a progetto, na Itália, consoante a seguir se demonstrará.

De outra parte, a segunda vertente de proteção, qual seja, a extensão de tutelas aos

trabalhadores autônomos dependentes ainda se encontra adstrita aos limites do continente

europeu. A esse respeito, Adalberto Perulli22, em esclarecedor estudo a respeito do tema,

salienta que a extensão de tutelas aos trabalhadores autônomos dependentes pode ser realizada

segundo duas lógicas distintas: de assimilação ou de extensão seletiva.

Inicialmente, pode-se utilizar a técnica da assimilação, a qual propicia o

alargamento da área coberta pela disciplina do trabalho subordinado. Aplicam-se, destarte,

aos prestadores autônomos dependentes todas as regras típicas do trabalho subordinado

clássico, revelando-se uma forte tendência atrativa das normas tradicionais de direito laboral.

É o que se verifica, segundo o autor, em países como França e Inglaterra.

22 PERULLI, Adalberto. La regolazione del lavoro parasubordinato. In PERULLI, Adalberto (a cura di). Le riforme del lavoro. (s.l.) Halley Editrice, pp. 137-159.

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Mais popular, no entanto, é a lógica da extensão seletiva, tendência que busca

estender a aplicação, aos trabalhadores autônomos, de apenas algumas tutelas dispensadas ao

trabalho subordinado clássico – especialmente direitos de natureza fiscal e previdenciária. É o

que se pode observar em países como Alemanha, Espanha e na própria Itália.

O legislador italiano, portanto, pautando-se nessa lógica de extensão seletiva das

tutelas, foi paulatinamente ampliando a gama de direitos característicos do trabalho

subordinado aplicáveis aos prestadores parassubordinados, mediante a promulgação de

diversas leis. De acordo com o entendimento de Luisa Galantino

“(...) il diritto del lavoro esercita da tempo uma sorta de vis

espansiva nei confronti di quelle categorie di lavoratori che,

pur non definibili sotto il profilo giuridico come subordinati, si

trovano in uma situazione socio-economica sostanzialmente

assimilabile a quella di questi ultimi”.23

Inicialmente, consoante já se asseverou, operou-se a extensão, ao trabalho

parassubordinado, das normas processuais sobre controvérsias individuais trabalhistas,

constantes do título IV, capítulo I, do Codice di Procedura Civile, conforme disposto no

caput e n. 3 do art. 409 de referido diploma. Tal alteração mostra-se de todo acertada, vez que

se reconheceu que as cortes laborais, por conta de sua especialização, detêm maiores

conhecimentos para apreciar quaisquer demandas que envolvam prestações de trabalho.

Ademais, o art. 6º da Lei nº 533/73 determinou ser também aplicável aos

parassubordinados a regra do art. 2113 do Codice Civile, a qual dita não serem válidas as

renúncias e transações que tenham por objeto direitos decorrentes das relações de trabalho.

Veja-se o quanto dispõe referido artigo:

“Art. 6º L' articolo 2113 del codice civile é sostituito dal

seguente:

Le rinunzie e le transazioni, che hanno per oggetto diritti del

prestatore di lavoro derivanti da disposizioni inderogabili della

legge e dei contratti o accordi collettivi concernenti i rapporti

di cui all' articolo 409 del codice di procedura civile, non sono

valide”.

23 GALANTINO, Luisa. Diritto del lavoro.... Op. cit., p. 4.

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Posteriormente, o legislador houve por bem instituir uma tutela tributária

diferenciada para as relações de parassubordinação, criando, por meio da lei nº 342/00 e dos

decretos presidenciais nº 597/73 e nº 917/86, um regime de contribuição menos oneroso a tais

contratos. Porém, é mister ressaltar, neste ponto, que subsistem contrariedades entre a

legislação trabalhista – que considera a parassubordinação como trabalho autônomo – e a

fiscal, que contempla a remuneração derivante de tais atividades como assimilada àquela dos

trabalhadores subordinados24.

Especialmente relevante, por outro lado, mostrou-se a extensão da tutela

previdenciária às relações de co.co.co.. Nesse sentido, inicialmente mencione-se a Lei nº

335/1995, a qual estabeleceu que os colaboradores devem ser inscritos em uma gestão

previdenciária apartada junto ao INPS, que deverá ser financiada à razão de dois terços pelo

tomador de serviços e um terço pelo trabalhador. Em seguida, as Leis nº 449/1997 e nº

144/1999 introduziram, respectivamente, normas relativas à tutela da maternidade –

especialmente no que tange ao auxílio-maternidade – e à cobertura contra acidentes de

trabalho. Também foi assegurada a cobertura previdenciária contra doenças em caso de

internação hospitalar (Lei nº 488/1999, modificada em 12/01/2001) e contra moléstias

profissionais (decreto-legislativo nº 38/2000).

Mesmo com a ampliação das tutelas aplicáveis aos trabalhadores

parassubordinados, operada pelo legislador italiano, discussões remanesceram em doutrina e

em jurisprudência acerca da suficiência de tal extensão. A maior crítica à atuação legislativa,

a esse respeito, referia-se ao fato de que as normas consideradas aplicáveis ao trabalhador

parassubordinado não apresentavam natureza trabalhista propriamente dita, mas, ao contrário,

poderiam ser qualificadas exclusivamente como regras de cunho processual, tributário e

previdenciário.

Destarte, mesmo após a promulgação das leis que objetivaram melhor tutelar o

trabalhador parassubordinado, permaneceram os esforços dos juristas italianos para conferir

uma ampliação da tutela material laboral a tais prestadores de serviços.

Destaca-se, aqui, o importante papel desempenhado pela jurisprudência. Com

efeito, firmou-se na Corte de Cassação italiana entendimento que pugnava pela extensão de

diversas regras de direito material do trabalho às relações de parassubordinação. Assim,

encontram-se inúmeros julgados reconhecendo às co.co.co., e.g., a disciplina da

24 Cf., a esse respeito, GASPARI, Alessandra. Lavoro a progetto.... Op. cit., p. 45 e LEONE, Gabriella. Le collaborazioni coordinate e continuative a progetto. Rivista Giuridica del Lavoro e della Previdenza Sociale, Roma, ano 55, n. 1, jan./mar. 2004, pp. 88-89.

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responsabilidade do tomador de serviços pela segurança do trabalho25, o direito de greve26,

entre outros27.

Observa-se, entretanto, que inexistia homogeneidade na aplicação, pelos tribunais

italianos, de direitos trabalhistas às relações de parassubordinação. Tal situação acabou por

comprometer a segurança de referido instituto, visto que eram freqüentes as decisões

conflitantes dos órgãos judiciários a respeito do tema, com o reconhecimento de tutelas

divergentes para situações análogas.

Nesse contexto de incongruências com relação à tutela dos trabalhadores

parassubordinados, foi aprovado pelo Senado italiano, em fevereiro de 1999, o Projeto de lei

Smuraglia (nº 5651). Referido projeto foi fortemente aclamado pela doutrina, haja vista que

propunha a aplicação, às relações de colaboração continuativa e coordenada, de um patamar

mínimo de direitos trabalhistas, que poderia ser complementado por meio da negociação

coletiva.

Primeiramente, o projeto intentou precisar o conceito de parassubordinação,

elencando expressamente em seu texto as principais características que norteiam tais relações

de trabalho. Estabeleceu, destarte, que o trabalho parassubordinado era caracterizado por uma

colaboração de caráter não ocasional, coordenada com a atividade do tomador, desenvolvida

de modo pessoal, sem vínculo de subordinação, sem o uso de meios organizados e em troca

de remuneração28.

Em seguida, contemplou direitos outros que deveriam ser assegurados aos

parassubordinados, incluindo normas sobre liberdade de opinião, proibição de fixação de

horário de trabalho rígido, duração mínima do contrato, tempo e forma do pagamento, direitos

de informação e formação, preceitos sobre higiene e segurança do trabalho, tutela

previdenciária.

Por fim, assegurou aos colaboradores ampla liberdade sindical, nos termos do art.

14 do Statuto dei Lavoratori, permitindo-lhes a organização de sindicatos representativos de

seus interesses e a filiação a entidades intercategoriais. Dessa forma, buscou-se propiciar a

25 Cf. Cass., Sez. lav., 16/07/2001, nº 9614, apud GASPARI, Alessandra. Lavoro a progetto.... Op. cit., p. 48.26 Cf. Cass., Sez. lav., 29/06/1978, nº 3278, apud SODANO, Angelo. Rapporti di parasubordinazione.... Op. cit., p. 1173.27 Em doutrina, veja-se a posição de Angelo Sodano, para quem o art. 409, nº 3 do CPC realizou uma equiparação do trabalho coordenado com o subordinado não apenas no campo processual, mas também no substancial (Rapporti di parasubordinazione.... Op. cit., pp. 1172-1173).28 Cf., a esse respeito, as lições de SILVA, Otávio Pinto e. Subordinação, Autonomia.... Op. cit., p. 132.

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ampliação do rol de direitos a eles aplicados, mediante a celebração, pelos próprios atores

sociais interessados, de acordos e convenções coletivas29.

Contudo, referido projeto jamais foi convertido em lei. De fato, enquanto este

tramitava na Câmara italiana, operou-se a denominada “reforma Biagi do mercado de

trabalho”30, a qual pretendia tornar mais flexíveis as relações laborais, por meio da inserção de

novas tipologias contratuais, e, dessa maneira, diminuir as elevadas taxas de desemprego

verificadas na Itália então.

No bojo de tal reforma, foi criada a fattispecie do contrato de trabalho a projeto,

previsto pelos arts. 61 a 69 do decreto-legislativo nº 276, de 10 de setembro de 2003. Referida

alteração representou importante inovação para os estudos da parassubordinação, conforme se

passa a expor.

5. A REFORMA BIAGI E A “MORALIZAÇÃO” DA UTILIZAÇÃO DAS CO.CO.CO.

Consoante acima explicitado, a dificuldade em se conceituar a parassubordinação e

– mais além – de identificar os precisos limites entre esta e a clássica subordinação acabou

por ocasionar a utilização desenfreada do instituto, para mascarar verdadeiras relações de

trabalho subordinado.

Com efeito, a estrutura rígida do trabalho subordinado tradicional, com sua forte

vertente protetiva, mostrava-se insuficiente aos anseios das empresas que desejavam se

adequar às modificações ocorridas no mercado. Assim, a possibilidade de os tomadores de

serviço utilizarem-se de colaboradores juridicamente autônomos, porém em modalidades

contratuais não muito diversas daquelas típicas do trabalho subordinado, tornou sobremaneira

atraente o recurso às co.co.co..

No entender de Luisa Galantino, tal sucesso mostra-se de todo justificável,

especialmente por conta de quatro fatores que fazem com que o trabalho parassubordinado

seja privilegiado em relação ao subordinado clássico: em primeiro lugar, a redução dos ônus

sociais e contributivos ao tomador de serviços, por força de disciplina legal específica; em

segundo, a inaplicabilidade do princípio da suficiência ou proporcionalidade retributiva,

previsto no art. 61 da Constituição italiana; em terceiro, a tutela assistencial carente no que

29 Ademais, o projeto ainda trata da conversão do contrato de trabalho na hipótese de utilização fraudulenta das co.co.co., regra que se coaduna com a tendência mundial de prevenção de formas ilegais de trabalho autônomo dependente, acima mencionada.30 Consubstanciada pela Lei nº 30/2003 e pelo decreto-legislativo nº 276/2003.

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tange a doenças, acidentes de trabalho e gravidez; por fim, a inexistência de limites quanto às

modalidades de resolução do contrato31.

Embora justificável, contudo, a utilização desmedida das co.co.co. necessitava ser

coibida, já que representava verdadeira forma de supressão de direitos laborais a muitos

trabalhadores que a eles faziam jus. Nesse sentido, intensos eram os esforços dos órgãos

jurisdicionais italianos, os quais, com base em elementos concretos, frequentemente

reconheciam a existência de autênticos contratos de trabalho subordinado em hipóteses

aparentes de parassubordinação.

Entretanto, tais esforços não foram suficientes para erradicar por completo as

formas ilegais de trabalho autônomo: mostrava-se necessário que o legislador instituísse

disciplina normativa mais adequada para a regulamentação dessa espécie de prestação de

serviços, de forma a especificar em que ocasiões uma dada relação de trabalho pode ou não

ser considerada parassubordinada. É nesse contexto, então, que o decreto-legislativo nº

276/2003 institui a fattispecie do lavoro a progetto.

Ao dispor sobre o trabalho a projeto, o legislador instituiu um novo elemento

caracterizador das relações de parassubordinação previstas pelo art. 409, n. 3 do C.P.C.: o

projeto, programa ou fase deste. De acordo com a nova dicção legal, assim, todas as

relações de colaboração continuativa e coordenada deverão, a partir da promulgação do

decreto-legislativo nº 276/2003, apresentar referido elemento em sua configuração; caso

contrário, nos termos do art. 69 do decreto, serão consideradas relações de trabalho

subordinado por tempo indeterminado desde a data de sua constituição.

Pode-se afirmar, pois, que, após a promulgação do decreto, somente são admitidas

pelo ordenamento italiano relações de colaboração intrinsecamente ligadas a um opus

predeterminado na fase de celebração do acordo; não mais se admitem contratos relacionados

à prestação de obras indeterminadas, com conteúdo de fato indefinido32.

Ainda é cedo para se afirmar que referida modificação colheu os frutos almejados,

i.e., logrou êxito em conter a ascensão indiscriminada dos contratos fraudulentos de

parassubordinação. Todavia, a doutrina italiana mostra-se otimista com relação aos novos

rumos que foram impostos às relações de prestação continuativa e coordenada, crendo que o

instituto será, a partir de agora, efetivamente utilizado para a finalidade à qual foi idealizado,

i.e., como autêntica forma de inserção e colaboração do trabalhador na atividade empresarial,

sem prejuízo de sua autodeterminação.

31 GALANTINO, Luisa. Diritto del lavoro.... Op. cit., p. 22.32 Cf. GALANTINO, Luisa, Diritto del lavoro.... Op. cit., p. 24.

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6. A PERMANÊNCIA DA “VELHA PARASSUBORDINAÇÃO” EM FACE DO LAVORO A PROGETTO

Com a instituição da disciplina do contrato a projeto pelo decreto-legislativo nº

276/2003, questionamentos surgiram entre os juristas italianos sobre se essa nova espécie de

relação de trabalho teria substituído a “velha parassubordinação”33, então representada pelos

contratos de co.co.co.34. A cogitação não é de todo desarrazoada, já que, conforme se infere

das definições propagadas pela doutrina, o “lavoro a progetto” se mostra orientado pelos

mesmos requisitos das relações de co.co.co., quais sejam, a coordenação, a continuidade e a

pessoalidade – apenas lhe foi acrescida a exigência de fixação de um projeto ou programa a

ser desenvolvido pelo colaborador.

Importante papel para o solucionamento dessa questão foi desempenhado pela

circular nº 1/2004 do Ministério do Trabalho, a qual expressamente consignou em seu texto

que “l'art. 61 non sostituisce e/o modifica l'art. 409, n. 3, c.p.c. bensì individua (...) le

modalità di svolgimento della prestazione di lavoro del collaboratore”. Corroborando tal

afirmação, referida circular dita, a seguir, que “sul piano generale, peraltro, il lavoro a

progetto non tende (...) ad assorbire tutti i modelli contrattuali riconducibili in senso lato

all'area della c.d. parasubordinazione”.

Referida orientação do Ministério do Trabalho italiano pautou-se no próprio texto

do decreto-legislativo nº 276/03, o qual é expresso ao excluir do âmbito de incidência do

trabalho a projeto determinadas espécies de prestação de serviços. Entre essas categorias

“relegadas” pelo diploma, destacam-se: a) as relações de agência e representação comercial

(art. 61, n. 1); b) as prestações ocasionais, entendidas como aquelas de duração não superior a

trinta dias no curso de um ano com o mesmo comitente, salvo na hipótese de a remuneração

anual ser superior a 5 mil euros (art. 61, n. 2); c) as profissões intelectuais às quais é

necessária a inscrição em órgãos profissionais; d) as atividades desempenhadas em favor de

associações e sociedades esportivas; e) os componentes de órgãos de administração e controle

das sociedades e participantes em colégios e comissões; f) os aposentados (art. 61, n. 3); g) os

contratos envolvendo a administração pública (art. 1º, n. 2)35.

33 A expressão é extraída de SILVA, Luiz de Pinho Pedreira. Da velha parassubordinação ao novo contrato de trabalho a projeto. Disponível <http://www.esmat13.com.br/art_normal.php?id.noticia=935>, acesso em 02/10/2007.34 Cf., por todos, PIZZOFERRATO, Alberto. Il lavoro a progetto tra finalità antielusive ed esegenze di rimodulazione delle tutele. Il Diritto del Lavoro, Roma, ano 77, n. 6, nov./dic. 2003, p. 631.35 Mostra-se sobremaneira interessante, neste ponto, o entendimento de Antonio Viscomi, para quem tais exceções deram-se ora em virtude da qualificação do sujeito, ora por conta da dificuldade objetiva de reconduzir

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Diante de tais exceções legais, destarte, atualmente é pacífico na Itália o

entendimento de que coexistem no ordenamento as figuras do trabalho a projeto e da

colaboração coordenada e continuativa, sendo esta última aplicável às hipóteses

expressamente mencionadas em lei de exclusão da primeira. Dessa forma, pode-se afirmar, de

maneira geral, que o gênero “parassubordinação” é hoje representado por duas espécies

distintas de relações de colaboração: de um lado, as tradicionais co.co.co., disciplinadas pelo

art. 409, n. 3 do Codice di Procedura Civile, e, de outro, os novos contratos de trabalho a

projeto previstos pelo dls. nº 276/2003.

Tratando-se de uma das espécies do trabalho parassubordinado, infere-se que

também o contrato a projeto deve ser interpretado como forma de prestação autônoma de

trabalho, consoante acima já se explicitou36. No que concerne a sua tutela, contudo, este

apresenta peculiaridades em relação às típicas co.co.co., vez que a ele são aplicadas as regras

relativas ao trabalho autônomo clássico (arts. 2.222 e seguintes do Codice Civile), as normas

de direito laboral que foram sendo gradativamente estendidas às co.co.co. (cf. supra, item 3)

e, ainda, determinados direitos que restaram expressamente consagrados pelo decreto nº

276/2003 – os quais serão analisados com mais vagar em outra ocasião desta obra.

Essa diferenciação de tutela entre as duas espécies de parassubordinação leva

Antonio Viscomi a afirmar que, no que concerne à modulação conferida aos colaboradores,

atualmente se pode falar em uma colaboração “forte” e outra “fraca”. Colacione-se a lição de

referido autor:

“Tale precisazione (...) manifesta intera la sua valenza (...)

quanto sulla peculiare artocilazione in due figure della

fattispecie, originariamente unica, di collaborazione

coordinata e continuata di cui all’art. 409, n. 3, cod. proc. civ..

Risulta, infatti, ora affiancata allá collaborazione “forte” –

qualificata dal progetto, segnata da una valenza generale e

caratterizzara dalla imputazione di effetti predefiniti dalla

legge – la diversa figura por cosa dire “debole” della

collaborazione non qualificata dal progetto, avente carattere

a um projeto determinadas atividades contidas em co.co.co.. (VISCOMI, Antonio. Lavoro a progetto e occasionale: osservazioni critiche. In G. GHEZZI (a cura di). Il lavoro tra progresso e mercificazione. Roma: Ediesse, 2004, p. 319).36 Cf. supra, item 2.1..

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residuale e la cui regolamentazione appare ancora rimessa, in

definitiva, allá volontà negoziale delle parti contraenti”. 37

Com efeito, observa-se que, com o decreto-legislativo nº 276/2003, houve uma

extensão dos direitos conferidos a essa espécie de trabalhador parassubordinado cujo contrato

é marcado pela existência de um projeto ou programa. Todavia, a doutrina italiana ainda hoje

se manifesta, freqüentemente, pelo necessário engrandecimento das tutelas aplicáveis aos

prestadores continuativos e coordenados – e não apenas do contrato a projeto, mas também

com relação às co.co.co. –, reconhecendo-se a característica essencial de dependência por

esses ostentada.

Diante de tais considerações, pode-se apresentar um quadro das relações de

trabalho hoje existentes na Itália, com a respectiva tutela a elas dispensada. Inicialmente, tem-

se o trabalho subordinado clássico, com tutela processual trabalhista (art. 409 do C.P.C.) e

tutela material também trabalhista (art. 2094 do C.C.). De outra parte, existe o trabalho

autônomo, subdividido em a) autonomia clássico, com tutela processual civil e tutela material

também civil (art. 2222 do C.C.), b) relações de co.co.co, com tutela processual trabalhista

(art. 409 do C.P.C.) e tutela material civil, com a extensão de algumas normas de cunho social

e c) o lavoro a progetto, com tutela processual trabalhista (art. 409 do C.P.C) e tutela material

civil, com a extensão conferida pelas normas de cunho social e pelos dispositivos do dls. nº

276/2003.

7. CONCLUSÕES

No presente estudo, pôde-se observar a evolução legislativa, doutrinária e

jurisprudencial da noção da parassubordinação no direito trabalhista italiano. É cediço que,

ainda hoje, muitas são as dúvidas e discussões a respeito do instituto – especialmente no que

tange à novel disciplina do contrato a projeto, que vem sendo alvo de constantes (e

divergentes) interpretações por parte de juristas e estudiosos do direito. Todavia, não se pode

ignorar o fato de que o legislador italiano vem se valendo de todas as cautelas possíveis para

erradicar as formas ilegais de trabalho autônomo.

Outra preocupação do ordenamento italiano diz com a necessidade de tutela das

relações de trabalho envolvendo as espécies da parassubordinação. Mediante o

reconhecimento de que tais trabalhadores possuem um regime diferenciado, que se encontra

37 VISCOMI, Antonio. Lavoro a progetto e occasionale..., Op. cit., p. 317.

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no iter entre a autonomia e a subordinação, é crescente a atuação do legislador e da doutrina

no sentido de conferir direitos a esses prestadores, de maneira a aproximá-los da tutela

conferida ao empregado clássico, sem lhes tolher a marcante característica da autonomia.

Pode-se afirmar com segurança que a atuação contígua da doutrina, do legislador e

da jurisprudência na delimitação dos contornos do trabalho parassubordinado ainda tem muito

a evoluir. Com efeito, foi o que se observou com a construção da disciplina do lavoro a

progetto: diante das falhas verificadas nas relações de co.co.co. – apontadas, sobretudo, pela

jurisprudência e pela doutrina trabalhistas –, o legislador intentou estabelecer regime mais

preciso a tal espécie de trabalho. No entanto, como ainda são várias as falhas constatadas no

sistema estabelecido pelo decreto-legislativo nº 276/2003, é cediço que o legislador tende a

aprimorar cada vez mais a disciplina do contrato a projeto, sublinhando com mais firmeza

seus contornos e suas principais características.

Também não se pode ignorar a repercussão da experiência italiana para o direito

do trabalho mundial. Nesse sentido, consoante acima se salientou, já são vários os países –

especialmente europeus – que iniciam uma saga de reconhecimento de formas de trabalho

autônomo de segunda geração, estendendo-lhes direitos típicos do contrato de trabalho

subordinado. A expectativa é, portanto, que tais repercussões ampliem-se cada vez mais,

atingindo ordenamentos como o brasileiro, que ainda hoje se mostra totalmente adstrito à

clássica distinção entre o trabalho autônomo e o subordinado.

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