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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X PROTAGONISMO POLÍTICO DAS MULHERES QUILOMBOLAS E VIOLÊNCIA DE GÊNERO Anderlany Aragão dos Santos 1 Resumo: A história dos movimentos sociais rurais brasileiros remonta ao período colonial, no qual a maioria das lutas era empreendida pelos/as negros/as escravos/as na construção de quilombos, visando a fuga à exploração e maus tratos de seus senhores. Atualmente, a organização das comunidades tradicionais remanescentes de quilombos dá-se mediante necessidade de defesa do território frente a pressões pela inserção na lógica das sociedades urbano-industriais, marcadas por impactos socioambientais permeados por injustiça ambiental. Deste modo, os impactos são intensificados sobre grupos sociais pertencentes a classes sociais e raciais desfavorecidas dentro do sistema patriarcal-capitalista-racista. Diante de uma pesquisa acerca da territorialidade em comunidades tradicionais quilombolas obteve-se, na comunidade do Cumbe (CE), que os principais espaços impactados eram ocupados por atividades de subsistência exercidas principalmente pelas mulheres. Tal fenômeno desencadeou protagonismo feminino nas ações de defesa do território tradicional cumbense. Entretanto, mediante designação da vida pública ao homem e o espaço doméstico às mulheres, a atuação política feminina representaria um rompimento a tais padrões, implicando no uso de violência contra as mulheres para restituição de tal ordem, permeadas por relações hierárquicas de gênero historicamente construídas. Palavras-chave: mulheres quilombolas, protagonismo político feminino, violência de gênero, movimentos sociais. Introdução Os povos tradicionais estão em crescente pressão pela inserção na sociedade urbano- industrial e, consequentemente, sendo invadidas por projetos desenvolvimentistas que não se adaptam ao seu modo de vida (DIEGUES, 2000) e à lógica territorial construída em regime de propriedade comum (LITTLE, 2002). Tais pressões desencadeiam conflitos socioambientais marcados pela injustiça ambiental, no qual os impactos são intensificados sobre grupos sociais pertencentes a classes sociais e raciais desfavorecidas dentro do sistema patriarcal-capitalista-racista (ACSERALD, 2009; SAFFIOTI, 2001). A partir da constatação de desigualdades nas destinações dos custos ambientais intensificados a grupos étnicos tradicionais, delineiam-se discussões acerca do racismo ambiental. Tal conceito é discutido por Pacheco (2008), a qual atribui o racismo ambiental às injustiças socioambientais que recaem de forma implacável sobre etnias e populações mais vulneráveis. Diante das supracitadas pressões, riscos e impactos desencadeados pelos grandes empreendimentos, os povos tradicionais passaram a se mobilizar e empreender lutas voltadas à 1 Mestranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Brasil.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

PROTAGONISMO POLÍTICO DAS MULHERES QUILOMBOLAS E VIOLÊNCIA DE

GÊNERO

Anderlany Aragão dos Santos1

Resumo: A história dos movimentos sociais rurais brasileiros remonta ao período colonial, no qual

a maioria das lutas era empreendida pelos/as negros/as escravos/as na construção de quilombos,

visando a fuga à exploração e maus tratos de seus senhores. Atualmente, a organização das

comunidades tradicionais remanescentes de quilombos dá-se mediante necessidade de defesa do

território frente a pressões pela inserção na lógica das sociedades urbano-industriais, marcadas por

impactos socioambientais permeados por injustiça ambiental. Deste modo, os impactos são

intensificados sobre grupos sociais pertencentes a classes sociais e raciais desfavorecidas dentro do

sistema patriarcal-capitalista-racista. Diante de uma pesquisa acerca da territorialidade em

comunidades tradicionais quilombolas obteve-se, na comunidade do Cumbe (CE), que os principais

espaços impactados eram ocupados por atividades de subsistência exercidas principalmente pelas

mulheres. Tal fenômeno desencadeou protagonismo feminino nas ações de defesa do território

tradicional cumbense. Entretanto, mediante designação da vida pública ao homem e o espaço

doméstico às mulheres, a atuação política feminina representaria um rompimento a tais padrões,

implicando no uso de violência contra as mulheres para restituição de tal ordem, permeadas por

relações hierárquicas de gênero historicamente construídas.

Palavras-chave: mulheres quilombolas, protagonismo político feminino, violência de gênero,

movimentos sociais.

Introdução

Os povos tradicionais estão em crescente pressão pela inserção na sociedade urbano-

industrial e, consequentemente, sendo invadidas por projetos desenvolvimentistas que não se

adaptam ao seu modo de vida (DIEGUES, 2000) e à lógica territorial construída em regime de

propriedade comum (LITTLE, 2002). Tais pressões desencadeiam conflitos socioambientais

marcados pela injustiça ambiental, no qual os impactos são intensificados sobre grupos sociais

pertencentes a classes sociais e raciais desfavorecidas dentro do sistema patriarcal-capitalista-racista

(ACSERALD, 2009; SAFFIOTI, 2001).

A partir da constatação de desigualdades nas destinações dos custos ambientais

intensificados a grupos étnicos tradicionais, delineiam-se discussões acerca do racismo ambiental.

Tal conceito é discutido por Pacheco (2008), a qual atribui o racismo ambiental às injustiças

socioambientais que recaem de forma implacável sobre etnias e populações mais vulneráveis.

Diante das supracitadas pressões, riscos e impactos desencadeados pelos grandes

empreendimentos, os povos tradicionais passaram a se mobilizar e empreender lutas voltadas à

1 Mestranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Brasil.

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defesa territorial. Constatou-se tal fenômeno na Comunidade Quilombola do Cumbe, situada no

Nordeste brasileiro.

A partir de uma investigação que terá como produto final uma dissertação acerca da

territorialidade da comunidade tradicional do Cumbe, percebeu-se que as mulheres pescadoras

quilombolas protagonizavam as estratégias de defesa territorial frente aos conflitos desencadeados

pelos grandes empreendimentos instalados na espacialidade. Deste modo, buscou-se investigar

elementos relacionados a tal protagonismo, marcado pelo rompimento de padrões patriarcais de

gênero, os quais desencadearam episódios marcados pelo aumento da violência doméstica e

intrafamiliar.

Para tal discussão, foram sumariamente contextualizados os conceitos referentes aos

movimentos sociais, especificamente rurais, seguidos por uma síntese da construção da ideologia

patriarcal e de violência de gênero baseados principalmente nos trabalhos de Saffioti (2001). Por

fim, são contextualizados aspectos referentes à espacialidade estudada, descrevendo os processos lá

desencadeados e os padrões de gênero construídos, tendo em vista a heterogeneidade dos padrões

culturais mediante tempo e espaço, utilizando para tal fim trabalhos de Nascimento (2014) e Xavier

(2013).

Movimentos sociais e opressão histórica

O patriarcado é um sistema de dominação regido pela ideologia machista e racista,

alcançando, portanto os campos políticos, ideológicos e culturais. Porém, mais que isso, é um

sistema de exploração, remetendo diretamente ao terreno econômico (SAFFIOTI, 2001).

O trinômio machismo-capitalismo-racismo é permeado por relações hierárquicas construídas

historicamente, sendo o primeiro pautado nas condições de acesso à renda pelos indivíduos, no qual

há superioridade daqueles que possuem maior poder aquisitivo sobre os que não possuem recursos.

O machismo indica superioridade masculina sobre a mulher e o racismo é pautado sobre as

diferenças raciais, sendo denotada superioridade de indivíduos brancos sobre as demais raças.

Apesar do conceito de raças atribuído a diferenças fenotípicas, principalmente ligadas à cor

da pele, entende-se que este não é uma realidade biológica. Enfatiza-se no presente estudo a

construção da raça como um fenômeno exclusivamente sociológico, utilizado como instrumento de

dominação e de exclusão (MUNANGA, 2000).

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Homens, ricos, heterossexuais e brancos são, portanto, a classe dominante de tal sistema de

exploração e privilegiados mediante manutenção dos sistemas sociais e institucionais vigentes

(SAFFIOTI, 2001). Deste modo, os oprimidos pelo sistema patriarcal-capitalista-racista organizam-

se em lutas de cunho político, social e econômico, construindo os movimentos sociais (OLIVEIRA,

2007), conceituados por Gohn (1995, p. 44) como

(...) ações coletivas de caráter sociopolítico, construídas por atores sociais

pertencentes a diferentes classes e camadas sociais. Eles politizam suas demandas e

criam um campo político de força social na sociedade civil. Suas ações estruturam-

se a partir de repertórios criados sobre temas e problemas em situações de conflitos,

litígios e disputas. As ações desenvolvem um processo social e político-cultural que

cria uma identidade coletiva ao movimento, a partir de interesses em comum. Esta

identidade decorre da força do princípio da solidariedade e é construída a partir da

base referencial de valores culturais e políticos compartilhados pelo grupo.

A multiplicidade dos agentes envolvidos nas lutas desencadeou o termo popular para referir-

se aos movimentos urbanos e o conceito de movimentos de campo para as lutas rurais. A existência

dos movimentos sociais rurais contradiz, portanto, a imagem construída historicamente de

trabalhadores rurais como passivos, submissos e incapazes de formular e lutar pelos próprios

interesses (MEDEIROS, 1989).

A história dos movimentos sociais rurais brasileiros remonta ao período colonial, no qual a

maioria das lutas era empreendida pelos negros escravizados. A organização de tais atores em prol

da fuga à exploração e maus tratos deu-se através da implantação de quilombos em terras virgens

(MEDEIROS, 1989). Apesar desse período não ser integralmente abordado pela história oficial e

tampouco ter sido dada importância à atuação das mulheres escravas frente a esses movimentos,

sabe-se que estas foram essenciais neste processo. Tem-se conhecimento, ainda que limitado, sobre

as lideranças de Dandara dos Palmares, Aqualtune e Teresa de Benguela (SCHUMAHER, 2000).

Dandara atuava contra o sistema escravocrata do período colonial brasileiro no século XVII

e liderava as falanges femininas do exército do Quilombo dos Palmares, este que teve como uma

das primeiras lideranças a Princesa Aqualtune devido aos seus conhecimentos sobre política,

organização e estratégias de guerra. Teresa de Benguela também estava à frente da coordenação do

quilombo, mais precisamente sobre o sistema de defesa e as atividades de subsistência do Quilombo

de Quariterê/MT ( SCHUMAHER, 2000).

Atualmente as terras originadas destes processos são reconhecidas legalmente como

“remanescentes das comunidades dos quilombos”. Mediante autoreconhecimento, foram instituídas

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legalmente mais de duas mil comunidades no território brasileiro por meio de atribuições instituídas

no Decreto 4.887/03 (BRASIL, 2003). Tal Decreto estabelece que “remanescentes das comunidades

de quilombos” são populações negras que compartilham um território e uma identidade marcada

pela ancestralidade negra e relacionada à luta contra a opressão histórica (SCHMITT; TURATTI;

CARVALHO, 2002).

Por apresentar uma dinâmica territorial que se distancia da hegemônica (DIEGUES, 2000),

enquadram-se no contexto dos territórios tradicionais, caracterizados pelo “regime de propriedade

comum, o sentimento de pertencimento a um lugar, a procura de autonomia cultural e práticas

adaptativas sustentáveis” (LITTLE, 2002, p.23).

Tendo em vista que a relação desses povos com a terra transcende a noção de posse,

estendendo-se para relações identidatárias (XAVIER, 2013), a defesa do território torna-se

extremamente expressivo nessas comunidades e as mulheres quilombolas permanecem com um

papel de destaque nos movimentos sociais (LEITE; SOUZA, 2010) que se contrapõem às pressões

exercidas pela inserção destas comunidades na lógica da sociedade urbano industrial (DIEGUES,

2000).

Entretanto, apesar das mulheres quilombolas continuarem “se destacando como lideranças e

produzindo lado a lado com seus pares masculinos” (OLIVEIRA, 2007), os estudos dos

movimentos sociais, em geral, tenderam historicamente a ignorar a composição interna destes,

assexualizando os atores sociais que os constroem (OLIVEIRA, 2007). Portanto, a visibilidade da

participação política das mulheres quilombolas é restrita devido aos padrões da sociedade patriarcal

que foram mescladas a tais culturas. (BARRETO, ARAÚJO e PEREIRA, 2009).

Destarte, torna-se necessário abordar a construção histórica dos padrões patriarcais a fim de

entender a contraditória relação entre o protagonismo político e a invisibilidade das mulheres em

tais lutas.

Atuação política das mulheres e invisibilidade

A atribuição de atividades no espaço público aos homens livres e a ordem do espaço

doméstico às mulheres foram definidos na sociedade grega (OLIVEIRA, 2007). A atuação

masculina concentrada na esfera pública instituiu a imagem do homem como sujeito eminente para

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a cidade, enquanto a mulher consiste em um sujeito escondido, sem individualidade própria,

resguardado no lar (PERROT, 1998).

A atuação das mulheres no espaço público historicamente enfrentou dificuldades devidas,

sobretudo, à negação à educação e à participação política (GROSSI, GARCIA e MAGRINI, 2015).

Entretanto, sua inserção nestes espaços vem ocorrendo mediante quebra de padrões, nos quais as

mulheres vêm reivindicando seus direitos de cidadania e abrindo espaços de lutas (LOURO, 1997).

A atuação pública das mulheres frente às lutas sociais pode ocorrer de duas maneiras, como

aponta Oliveira (2007, p. 106):

A primeira, a participação por dentro de movimentos de forma heterogênea, isto é,

homens e mulheres se aliavam e se organizavam para defender, reivindicar e

promover novas formas de organização do trabalho e das relações sociais do campo.

A segunda, quando organizaram grupos específicos de mulheres para tratarem de

questões inerentes ao público feminino nos movimentos.

Geralmente a incorporação das mulheres nos movimentos sociais ocorre mediante maior

intensidade nos confrontos, entretanto a fase de negociações e decisões políticas é designada aos

homens (PETRAS, 2003, p.93). Portanto, a influência da cultura grega nos padrões culturais

ocidentais ainda é perceptível na contemporaneidade e regem os padrões culturais e societários da

sociedade hegemônica (SAFFIOTI, 2001).

Dando destaque aos homens no espaço público, a história gerou uma valorização do homem

sobre a mulher (OLIVEIRA, 2007), sendo construídas relações hierárquicas entre os sexos

(SCOTT, 1995). Dentro desse contexto, o empoderamento feminino, adquirido pela organização

das mulheres em lutas sociais, se contrapõe ao modelo instituído no qual a mulher é formada para

ser submissa e controlada pelo homem.

Percebe-se, portanto, que os padrões estabelecidos pela ideologia patriarcal podem não ser

suficientes para que as mulheres sigam os papéis que lhes foram designados, o que pode resultar em

ações violentas do agente dominador para reestabelecimento dos padrões sociais “corretos”

instituídos (SAFFIOTI, 2001), desencadeando violência de gênero, nossa próxima discussão.

Violência de gênero

A violência de gênero abrange mulheres, crianças e adolescentes de ambos os sexos vítimas

de danos ou intimidações morais (SAFFIOTI, 2001). Sendo estes vitimados geralmente por pessoas

ligadas por parentesco e no ambiente doméstico, tal conceito confunde-se com os conceitos de

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violência intrafamiliar e violência doméstica. Considera-se violência intrafamiliar ações danosas

cometidas dentro de uma comunidade de indivíduos que se consideram aparentados (BRASIL,

2006). No âmbito da violência doméstica, esta é compreendida como agressões que ocorrem em um

espaço de convívio permanente de pessoas.

Apesar das três vertentes não especificarem os vetores de agressão, geralmente são

utilizadas para categorizar episódios de violência de homens contra as mulheres, devido ao

supracitado modelo ideológico que molda a sociedade, que atribui às mulheres a submissão frente

ao patriarca. Destaca-se, portanto, que a perspectiva adotada não enfatiza um olhar vitimizador em

relação à mulher, mas que a expressiva concentração deste tipo de violência ocorre historicamente

sobre os corpos femininos e que as relações assimétricas de poder permeiam a vida rotineira das

pessoas (BANDEIRA, 2014).

Portanto, a constatação de violência de gênero incide no controle sobre os corpos e mentes

femininas (BANDEIRA, 2014). Tal controle pode ser manifestado através de ações que causem

morte, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral e patrimonial (BRASIL, 2006). A Lei

Maria da Penha (Lei 11.340/06), criada para prevenir e coibir a violência doméstica e familiar

contra a mulher institui cinco tipos de agressões (BRASIL, 2006), sendo estas a violência física,

psicológica, sexual, patrimonial e moral.

Destaca-se aqui discussões acerca das violências psicológicas e morais por serem uma

argamassa para outros tipos de violência de gênero (SEGATO, 2003). A violência psicológica e

moral é caracterizada por meio de ações que podem ocorrer sem ofensa verbal explicita, nas quais

desencadeiem danos emocionais e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o

pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e

decisões (BRASIL, 2006; SEGATO, 2003). Isto é, a constatação de episódios que ocasionem

prejuízos à saúde psicológica e à autodeterminação desencadearia formas de controle mais intensas

sobre a mulher, facilitando a instituição do “poder de macho”.

Sendo o “poder de macho” a expressão máxima de dominação masculina, o direito

designado ao homem de agredir sua mulher, autorizados e/ou tolerados socialmente (SAFFIOTI,

2001) atuaria em prol do reestabelecimento da hierarquia entre os sexos, dado que a desconstrução

de padrões patriarcais pelas mulheres resultaria na ascensão feminina, formadas historicamente para

aceitar a submissão.

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Percebe-se tal fenômeno na Comunidade Tradicional quilombola do Cumbe (CE), onde as

mulheres, semelhantemente às negras escravas que empreendiam lutas no período colonial,

protagonizam as lutas frente aos movimentos sociais que se contrapõem ao modelo

desenvolvimentista trazido pelos grandes empreendimentos instalados no território tradicional e,

devido à intensa atuação no espaço público, são vítimas de violência no núcleo familiar

(NASCIMENTO, 2014).

Sendo a diversidade de manifestações culturais influenciada pelo tempo e espaço

(BARRETO, ARAÚJO e PEREIRA, 2009), os valores patriarcais instituídos na cultura hegemônica

manifestam-se de modos desiguais na sociedade. Deste modo, faz-se necessário entender o lugar ao

qual os/as sujeitos/as sentem-se pertencidos/as a fim de entender os processos culturais que lá

ocorrem.

Mulheres pescadoras quilombolas do Cumbe

A comunidade do Cumbe está localizada no município de Aracati/CE, no Nordeste

brasileiro. Após autoreconhecimento da ancestralidade negra/quilombola, a comunidade formada

por 165 famílias foi certificada pela Fundação Cultural Palmares em 2014 como comunidade

remanescente de quilombos (NASCIMENTO, 2014).

Os primeiros registros da presença de escravos na região são datados no século XVI, quando

o território cumbense começa a ser ocupado por criação de gado para produção de charque e cultivo

de cana-de-açúcar para fabricação de cachaça nos nove engenhos instalados no Cumbe,

pertencentes a grandes comerciantes do centro de Aracati (DAMASCENO, 1961).

A cachaça produzida em tais engenhos era famosa por ser uma das melhores da região e

movimentava a economia local. A mão de obra empregada nos engenhos não é relatada nos livros

de história do município ao qual se situa o Cumbe. No entanto, relatos da Comissão Científica,

organizada pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) para levantamento botânico,

geológico, zoológico, geográfico e etnográfico, relata: “Dois bois puxam o engenho e um mulatinho

metia canas, e há muito tempo tocava os bois” (FREIRE ALEMÃO, 1859).

Portanto, apesar de carência de relatos acerca de mão de obra escrava na região, é possível

afirmar que a região apresentava estrutura social das sociedades açucareiras, assim como a maior

parte do Nordeste brasileiro dos séculos XVI a XVIII. Sabe-se que tais sociedades são marcadas

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pelo patriarcalismo, sendo os senhores de engenho detentores de autoridade absoluta sobre a

família, escravos e qualquer um que habitasse seus domínios (LINHARES, 1990).

Sendo uma sociedade essencialmente patriarcal, as mulheres tinham poucos poderes e

nenhuma participação política. O papel social das mulheres, sobretudo as esposas dos senhores de

engenho, era recluso ao lar e à família. Apesar de registros de trabalho de escravas realizando os

mesmos serviços dos homens escravos em diversos setores, estas eram geralmente responsáveis

pelos trabalhos ligados à manutenção da casa-grande e cuidados com os filhos dos senhores.

Portanto, é claramente reproduzida a lógica patriarcal da sociedade grega, em que o homem é

destinado à polis (vida pública) e a mulher à oikia (espaço doméstico) (OLIVEIRA, 2007).

A sociedade açucareira cumbense entrou em declínio junto com a crise do ciclo da cana-de-

açúcar, ocorrida no início do século XX. Os donos dos engenhos voltaram para a capital do

município e a comunidade, formada essencialmente pelos trabalhadores dos engenhos, passou a

desempenhar atividades ligadas à subsistência, como pesca, mariscagem e agricultura familiar. A

interdependência na relação homem/meio, capacidade de prosseguimento a longo prazo e prudência

ecológica empreendidas em tais atividades instituem à comunidade o conceito de sustentabilidade

socioambiental (CAPRA, 2006, apud ROSA, 2007). Somado tais fatores às relações próximas com

a natureza e a cooperação social, permite-se enquadrar o Cumbe como uma comunidade tradicional

(DIEGUES, 2000).

As comunidades tradicionais são marcadas pela intensa territorialidade, isto é, pelo esforço

coletivo do grupo para ocupar e defender o território. Atribui-se tal fato à familiaridade com os seus

respectivos lugares a partir da construção de vínculos sociais, simbólicos e rituais com o ambiente

biofísico (LITTLE, 2002). A familiaridade com o território é ilustrada nas entrevistas com as

mulheres cumbenses, nas quais aponta o Cumbe como uma extensão do próprio lar:

A rua também é uma extensão da casa, né? Se tem alguma coisa me incomodando

dentro de casa, eu vou e conserto. Assim como na minha casa, se tem algo

incomodando dentro da minha comunidade, eu quero ajeitar aquela situação. A

mulher faz o papel de cuidar da casa, dos filhos, mas dos espaços da comunidade

também. (Moradora, 39 anos).

A territorialidade cumbense foi intensificada a partir da instalação de empreendimentos que

destoam da lógica tradicional. Tal processo remonta à década de 1970, quando a Companhia de

Águas e Esgotos do Ceará (CAGECE) chegou à região, atraída pelos mananciais de água doce

presentes nas dunas do Cumbe. Nos anos posteriores os efeitos da instalação e operação da

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CAGECE trouxeram prejuízos ao território tradicional, ilustrados pela sobre-exploração dos lençóis

freáticos, ocasionando avanço das dunas e modificações na fauna e flora locais (PINTO et al.,

2014).

Quanto às áreas de mangue, carnaubais e apicum, estas foram privatizadas nos anos 1990

pelas fazendas de carcinicultura, instaladas a fim de abastecer o mercado externo, com foco nos

Estados Unidos, União Europeia e Ásia (NASCIMENTO, 2014). Desde então, tais áreas são

contaminadas por metabissulfito de sódio, provenientes dos criatórios de camarão em cativeiro, o

que reduz a produção de pescado.

Os impactos sobre os ambientes dunares foram intensificados, ainda, mediante instalação de

empresas de energia eólica, nos anos 2000, com consequente privatização de sítios históricos,

lagoas periódicas e acesso à praia.

Frente às privatizações de espaços importantes para o desenvolvimento de atividades

tradicionais, desmatamento do manguezal, mortandade de caranguejos, dentre outros impactos

marcados por aspectos ligados à injustiça ambiental (NASCIMENTO, 2014), os/as pescadores/as

quilombolas, agricultores/as e artesãos/ãs organizaram-se em protestos contra tais

empreendimentos.

Movidas pelo descontentamento proveniente pelos impactos, sobretudo da carcinicultura

sobre o manguezal, ambiente de trabalho das pescadoras cumbenses, estas assumiram a frente das

lutas e reinvindicações comunitárias (NASCIMENTO, 2014). Entretanto, se o trabalho fora do

âmbito doméstico já se apresentava como uma afronta aos valores patriarcais, quando somado ao

protagonismo na militância política, tais elementos representaram uma ruptura muito intensa aos

padrões de gênero instituídos. As pescadoras da comunidade passaram, então, a ser mais

pressionadas socialmente a priorizar a vida doméstica, o que dificultou as suas participações

políticas:

A mulher tomou uma proporção de sair, de lutar, de estar em vários desses espaços...

Aí já querem desqualificar, ficam falando que é feio mulher que luta. Eu já sofri

perseguição aqui na minha comunidade, recebia muitas críticas (...) porque a mulher

tava (sic) tomando uma proporção de muita liberdade, de muita autonomia (...).

(Moradora, 42 anos).

No entanto, as inúmeras pressões sociais enfrentadas por estas mulheres não foram

suficientes para o abandono da militância, tendo em vista que a construção das pautas

conservacionistas construídas na defesa do território designou às mulheres cumbenses a

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autopercepção como seres sociais capazes de provocar mudanças refletidas na comunidade

(PAIXÃO, 2004). As mudanças são ilustradas, principalmente, a partir dos resultados provenientes

das reinvindicações, tais a implantação de medidas mitigatórias na instalação e operação dos

empreendimentos (NASCIMENTO, 2014)

As supracitadas críticas surgidas a partir do protagonismo político das mulheres levaram à

percepção de tais agentes acerca da subordinação feminina, o que desencadeou questões ligadas à

igualdade de gênero nas pautas dos movimentos sociais cumbenses:

A questão é que o homem sempre quer ta (sic) ali na frente. Quando uma mulher

pega a direção, se der uma opinião que eles não gostam aí fica aquele negócio “Ah,

mulher não é pra dar opinião!”(...) Às vezes deixa você desanimada, mas que tem,

tem o preconceito contra a mulher. (...) Então quando eu saio de casa, que eu deixo

meus filhos, minha família, eu vou buscando (...) um pouco de tudo, de esperança,

de respeito, de chegar na comunidade da gente, ter um respeito. Então eu vou em

busca disso, deixando toda a minha família pra trás eu vou em busca de um pouco

disso, de esperança, de honestidade!

[Liderança Comunitária entrevistada por Nascimento (2014, p. 74)].

Sem o resultado esperado de retorno aos padrões de gênero no qual se designava à mulher a

vida doméstica, o desestímulo ao papel das mulheres como protagonistas foi substituído pela

violência contra elas. Isto é, a intensificação das condutas que desencadeiam danos emocionais e

diminuição de autoestima às mulheres pescadoras designa a constatação de violência psicológica e

pode resultar na reprodução do “poder de macho” em prol do reestabelecimento da ordem social

construída sobre padrões de gênero.

Considerações finais

Tendo em vista a vigência de um sistema constituído por ideologias permeadas de valores

essencialmente machistas, racistas e capitalistas, as mulheres negras, quilombolas e pescadoras da

Comunidade do Cumbe enfrentam tripla opressão, sendo impelidas para organizarem-se frente a

tais.

Diante da necessidade de organização, as pautas dos movimentos sociais eram heterogêneas

(tratando-se de questões de gênero), entretanto desencadeou um processo de autopercepção das

mulheres como sujeitos sociais, passando a construir pautas próprias em relação aos padrões

instituídos pelo patriarcado.

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A partir da desconstrução dos padrões patriarcais impostos, a restauração destes é buscada

através de violência principalmente psicológica e moral contra as mulheres que atuavam nas frentes

políticas.

Diante da reprodução de tais episódios na Comunidade do Cumbe, torna-se necessário dar

prosseguimento a este trabalho a fim de levantar os tipos de violência sofrida pelas mulheres do

Cumbe e a percepção destas acerca das relações de gênero e da relação entre gênero e violência.

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Quilombola’s women political protagonism and gender based violence

Abstract: The history of Brazilian rural social movements goes back to the colonial period, in

which most of the conflicts were undertaken by black slaves on the construction of quilombos, to

escape from exploitation and mistreatment from their slave masters. Nowadays, the remnant

traditional quilombo communities organization revolves around the need to protect the territory of

pressures from the insertion in the urban-industrial societies logic’s, marked by socio-environmental

impacts permeated by injustice and environmental racism, in which effects are intensified on social

groups belonging to disadvantaged social and racial classes within the patriarchal-capitalist-racist

system.

In the context of research on territoriality in traditional quilombola communities, it was found in the

community of the Cumbe (CE/BR) that the main areas impacted were occupied by subsistence

activities carried out mainly by women, which raised the female political protagonism in the

defense actions of the territory of Cumbe. However, through the verification of the gender patterns

that designate public life for men and the domestic space for women, the female political activity

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would represent a break with such patterns. Implying the use of violence against women for

restitution of such order, permeated by historically constructed hierarchical relations of gender.

Keywords: female political protagonism, gender based violence, social movements.