protagonismo educativo em ações interministeriais contemporâneas

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Sumário

Educação & Sustentabilidade

Diálogo entre Teatro e Educação

Teatro e Educação: nos rastros da utopia

Flávio Desgranges 17

A formação do público como uma forma de sustentabilidade na Cultura

Viviane da Soledade 27

O Festival do Teatro Brasileiro e suas ações de formação para alunos

da rede pública de ensino

Sérgio Bacelar 37

Patrocínio cultural, uma possibilidade de desenvolvimento local

Marcelo Santos 45

Sustentabilidade na Cultura

A insustentável “leveza” do teatro.

Cida Falabella 59

Essencialidade e Sustento

Jorge Braz 67

A sustentabilidade a partir da experiência da Cia. Teatral ManiCômicos

Juliano Pereira 73

Cultura e sustentabilidade: desafios, práticas e futuros

José Márcio Barros 83

iii Seminário Subtexto em diálogo | Edição comemorativa – 2013 Teatro em mG: educação & sustentabilidade 90

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ExpEDiEnTE

Subtexto – Revista de Teatro do Galpão Cine Horto - no. 10 – ISSN 1807-5959

coordenação editorial: Luciene Borgesprodução editorial: Marcos Colettajornalista responsável: Luciene Borges (MG 09820 JP)conselho editorial: Chico Pelúcio, Fernando Mencarelli, Leonardo Lessa e

Nina Caetanocolaboradores desta edição: Cida Falabella, Cíntia Inês Boll, Eduardo Moreira,

Flávio Desgranges, Jorge Braz, José Márcio Barros, Juliano Pereira, Marcelo Santos, Rita Gusmão, Sérgio Bacelar, Soraya Belusi e Viviane da Soledade.

Fino Traço Editoraprodução editorial: Maíra Nassifrevisão ortográfica: Cláudia Rajãoprojeto gráfico: Milton Fernandes diagramação: Ana C. Bahia

fotos:Acervo da Gerência de Cultura da Escola SESC 28, 30, 33 | Alexandre Hugo 62, 64 | André Fossati 81 | Arquivo FTB 42, 43 | Arquivo Grupo Galpão 120 | Arquivo ManiCômicos 78 Arquivo Teatro de Tábuas 68, 72 | Arquivo Teatro Invertido 48 | Arquivo Teatro Kabana 51 Elenize Desgeniski 38 | Elvira Nascimento 49 | Felipe Freitas 70 | Guto Muniz 61, 84, 87, 122, 124, 125, 130-133, 135, 140 | Marcos Coletta 134 | Nathanael Andrade 74 | Pedro Vilela 52 Priscila Natany 76 | Tiago Carneiro 19, 25 | Zé Evaristo 71 |

Fino Traço Editora Av. do Contorno, 9317 A | 2o andar | PradoBelo Horizonte. MG. Brasil / Tel. +55 (31) 3212 9444 finotracoeditora.com.br

Centro de Pesquisa e Memória do Teatro / Galpão Cine Horto Rua Pitangui, 3613 – Horto / 31030-065Belo Horizonte – Minas Gerais – Brasil / Tel. +55 31 3481 5580www.galpaocinehorto.com.br/galpaocinehorto_cpmt.php

[email protected]

A Revista Subtexto é uma publicação independente. Todas as opiniões expressas nos artigos são de responsabilidade exclusiva dos autores.

Esta publicação foi realizada com o patrocínio do Ministério da Cultura, Governo de Minas, Usiminas, Petrobras, Cemig e Instituto Unimed BH através das Leis Federal e Estadual de Incentivo à Cultura e do Fundo Estadual de Cultura do Estado.

tiragem 2.000 exemplares impressão Paulinelli dezembro de 2013

Teatro e política:

Protagonismo Educativo em ações interministeriais contemporâneas: O programa Mais Educação e o programa Mais Cultura nas Escolas

entrecruzando imaginações e conhecimentos autorais

Cíntia Inês Boll 97

Constelação

Rita Gusmão 103

Galpão em Foco

Teatro, crise e renovação

Eduardo Moreira 117

Cine Horto em Foco

Na dianteira das discussões e proposições acerca do teatro contemporâneo: 15 anos de atuação do Galpão Cine Horto

Soraya Belusi 129

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EDiTorial

Marcos comemorativos trazem consigo o reconhecimento da trajetória empreendida, evidenciando os percalços, as adaptações e as conquistas ocorridas ao longo do trajeto. E quando o balanço é positivo, também reforçam o desejo e a necessidade de continuidade, fortalecendo ou reinventando determinadas práticas. A continuidade tornou-se uma palavra-chave nesse ano em que o Galpão Cine Horto comemorou seus 15 anos. É certo que o trabalho que fazemos, assim como o de inú-meras instituições similares, é fundamental para garantir o espaço da formação, do fomento, da criação teatral em nossas cidades e estados. Em certa medida, é política pública! Mas é certo também que vivemos na corda bamba dos financiamentos, dinheiro público tratado como pri-vado... Então, como garantir a longevidade do espaço e a continuidade de cada projeto nesse contexto instável ("permanentemente instável"), em que vive (ou sobrevive?), o teatro brasileiro? Como garantir a nossa Sustentabilidade?

A partir dessas questões chegamos a um dos temas do III Seminário Subtexto em Diálogo – Teatro em MG: Educação & Sustentabilidade, do qual resulta essa edição da revista Subtexto. Nesse ano o evento teve edição ampliada (porque comemorativa), com duração de 4 dias, que contou com o apoio da Secretaria de Estado da Cultura e com a presença de palestrantes e debatedores de diversas cidades brasileiras, além de representantes de grupos e instituições teatrais de 8 macro-regiões de Minas. Parte do evento foi aberta ao público (palestras) e parte foi res-trita aos inscritos e convidados (Grupos de Trabalho), de modo que se alcançasse o aprofundamento da discussão e elaboração de propostas concretas.

O tema da Sustentabilidade na Cultura foi inicialmente abordado por especialistas a partir da nossa relação com quatro instâncias: poder público, poder privado, terceiro setor e a articulação entre os próprios agentes da cultura. Em seguida, público e participantes ouviram relatos

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de experiências concretas e diversificadas empreendidas por grupos e espaços em diferentes lugares do país. As informações compartilhadas serviram de base para o debate dos Grupos de Trabalho, focados em temas como Circulação, Formação, Manutenção de Espaços, entre ou-tros. A nossa preocupação, desde a concepção do evento, era não cair no lugar-comum do debate sobre as Leis de Incentivo à Cultura, que já vem trazendo sua contribuição para a revisão das mesmas, mas sim, "buscar caminhos que possibilitassem potencializar as experiências, es-truturas e práticas desenvolvidas pelo setor teatral no Estado, alinha-vando possibilidades de compartilhamento, comunicação, continuidade e permanência".

O resultado desse debate pode ser conferido nos artigos da seção princi-pal e da seção Teatro e Política dessa edição. A diretora e ativista política da cultura Cida Falabella, no artigo "A insustentável 'leveza' do teatro.", traz um instigante balanço dos dois dias de seminário dedicados ao tema, o primeiro ocupado com palestras e relatos, o segundo dedicado aos Grupos de Trabalho. O artigo "Cultura e sustentabilidade: desafios, práticas e futuros", do prof. José Márcio de Barros, da PUC Minas e do Observatório da Diversidade Cultural, mediador do evento, traz reflexões preciosas sobre o tema, a partir das palestras e experiências comparti-lhadas com o público. Nos demais artigos, Jorge Luis Braz, do Teatro de Tábuas de Campinas e Juliano Pereira do Grupo ManiCômicos de São João Del Rey apresentam relatos de suas singulares experiências de gestão e sustentabilidade.

Os outros dois dias do III Seminário Subtexto em Diálogo foram dedi-cados à discussão sobre possibilidades e alternativas de Diálogo entre Teatro e Educação. Para apresentar um panorama de como o tema tem sido abordado nas diferentes instâncias do poder público e da universi-dade, foram convidados representantes do MinC, do MEC, da SEE-MG e da UFMG. As palestras foram contempladas por relatos de experiências bastante diversas, de dentro e fora de Minas Gerais. Da mesma forma que no eixo de sustentabilidade, as palestras e relatos serviram de base para a discussão dos Grupos de Trabalho. Flávio Desgranges, professor da USP e mediador das palestras desse tema, nos oferece um sensível

texto que nos torna testemunhas de uma marcante e poética experiência de vida. Sérgio Bacelar, do Festival do Teatro Brasileiro, relata a experiên-cia de ação educativa do Festival, enquanto Marcelo Santos defende o investimento no crescimento endógeno das comunidades pelas empresas patrocinadoras de cultura, no artigo “Patrocínio cultural, uma possibili-dade de desenvolvimento local”, ilustrado pelos depoimentos do Grupo Teatro Invertido e Grupo Kabana, ambos de Minas Gerais.

Os artigos da seção Teatro e Política dessa edição também decorrem do Seminário. A prof. Cíntia Inês Boll, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que esteve representando o MEC no evento, e a prof. Rita Gusmão, da UFMG apresentam diferentes olhares sobre o edital Mais Cultura nas Escolas, uma iniciativa do MEC em parceria com o MinC, intensamente debatida nos dois dias de discussão sobre o tema Diálogo entre Teatro e Educação.

Completando esta edição da Revista, a seção Galpão em Foco traz a reflexão do ator Eduardo Moreira sobre os momentos de reinvenção e riscos que fizeram parte da trajetória do Grupo.

Na seção Cine Horto em Foco, o artigo da jornalista Soraya Belusi faz um balanço crítico sobre a trajetória do Galpão Cine Horto ao longo desses quinze anos, apontando algumas das principais contribuições do espaço para o cenário do teatro em Belo Horizonte.

Falando em 15 anos, não podemos deixar de lembrar que marcos co-memorativos também implicam em festa, e esta é sempre feita com e para os amigos. Ao longo de todo o ano de 2013, nosso aniversário foi comemorado com edições especiais dos projetos artísticos, que conta-ram com a presença de amigos criadores, pensadores, companheiros de estrada, e também público cativo de nossa programação. Foi assim que os grupos Armazém (RJ), Clowns de Shakespeare (RN), Cia Brasileira de Teatro (PR) e Espanca! (BH), participaram como convidados da edição comemorativa do Festival de Cenas Curtas, apresentando cenas inédi-tas, compostas especialmente para o evento. Foi assim que o projeto Cena-Espetáculo ganhou, nesse ano, um festival próprio, no qual se apresentaram montagens produzidas dentro ou em proximidade com o

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Galpão Cine Horto. O Oficinão também teve sua edição especial, realizada somente com ex-participantes, dirigidos por Chico Pelúcio e Lydia Del Piccha, que desde 2004 não atuavam no projeto, com a colaboração de um antigo parceiro da casa, o dramaturgo Luís Alberto de Abreu. Por fim, o tão espera-do livro comemorativo dos 15 anos do Galpão Cine Horto continua em fase de produção, com lançamento previsto para o segundo semestre de 2014.

Vale dizer ainda que em 2013 o projeto Memória Feita à Mão, voltado para a conservação e difusão do acervo de figurinos do Grupo Galpão, coordenado pelo CPMT, contou com parceria exclusiva da UFMG para sua segunda edi-ção, que contemplou os acervos dos espetáculos "Um Moliére Imaginário" e "Romeu e Julieta". O Ateliê Aberto funciona no Centro Cultural da UFMG e poderá ser visitado até agosto de 2014.

O portal Primeiro Sinal, também desenvolvido pelo CPMT em parceria com a PUC Minas e o Curso de Teatro da UFMG deu continuidade, em 2013, ao projeto "Memória em Movimento: resgate da história do teatro em Belo Horizonte", levantando mais de 40 horas de entrevistas com os principais artistas do teatro mineiro. Esse material dará origem a um documentário, com lançamento previsto para 2015.

Como desdobramento de nosso ano comemorativo, entramos em 2014 com significativas mudanças nos projetos de criação, que tem o objetivo de pro-mover arejamento, renovação e compartilhamento. Desta forma, o Oficinão e o Pé na Rua apresentam novos formatos, que serão nutridos por contri-buições trazidas por outros artistas. Como filho que é do Grupo Galpão, o Galpão Cine Horto traz em sua genética "o vírus" da reinvenção. Criar é também romper com o estabelecido, arriscar, reinventar. Que venha 2014, com cheiro de novidade e o sabor doce-amargo do coletivo!

Boas leituras!

Equipe do Galpão Cine Horto

** A programação completa do III Seminário Subtexto em Diálogo, assim com a lista de grupos participantes, pode ser conferida no final da seção principal. Dados relativos aos nossos projetos realizados em 2013 podem ser conferidos no final da seção Cine Horto em Foco.

EDuCação & SuSTEnTabiliDaDE

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DiáloGo EnTrE TEaTro E EDuCação

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TEaTro E EDuCação: nos rastros da utopia

Flávio Desgranges*

Meu companheiro menino,perante o azul do teu dia,trago sagradas primícias

de um reino que vai se erguerde claridão e alegria.

É um reino que estava perto,de repente ficou longe,

não faz mal, vamos andando,porque lá é nosso lugar.[...]Meu companheiro menino,

neste reino serás homem,um homem como o teu pai.Mas leva contigo a infância,

como uma rosa de flamaardendo no coração:porque é da infância, menino,

que o mundo tem precisão.

Thiago de Mello

Cada vez que me questiono sobre a potência do teatro para transformar as pessoas, e me pergunto se faz ainda algum sentido acalentar esta ideia, e ainda por cima me propor a escrever sobre ela, recordo uma passagem importante para mim mesmo, que suscita o vislumbre de como o encon-tro com a arte teatral, em momento oportuno, desencadeou uma série de ocorrências que modificaram completamente minha trajetória nesta vida. Sempre volto a esta ocasião marcante, em busca de recuperar algo que parece frágil, que ameaça extinguir-se num sopro, e solicita ânimo sempre renovado para manter-se aceso, atuante. Retomo esta história

* Professor do Departamento de Artes Cênicas da USP, coordenador do INERTE – Instável Núcleo de Estudos de Recepção Teatral, e autor dos livros: A Pedagogia do Espectador, Pedagogia do Teatro: provocação e dialogismo e A Inversão da Olhadela: alterações no ato do espectador teatral, pela editora Hucitec.

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Educação & Sustentabilidade | 1918 | Subtexto . Revista de Teatro do Galpão Cine Horto

para tentar manter vivo isto que, como diz Barba, "está em nosso interior, nessa parte de nós que vive exilada, que gostaria de reaparecer e viver em sua própria terra, visível, mas continua lá, escondida".1 Tentarei, aqui, retomar esse encontro significativo com o intuito de fomentar questões e, quem sabe, reacender possíveis lampejos de utopia acerca de nossa atuação cotidiana com o teatro.

Como aponta Benjamin2, é sempre preciso desencantar o passado, dei-xando-o em aberta relação com o presente, capturando aquilo que foi desejado, mas reprimido, despertando os sonhos adormecidos pelo véu da história. Sonhos manifestos no passado e que foram sufocados. Reaver os momentos em que o passado sonhou o futuro, e oxigenar estes sonhos para que venham à tona, invadam e impulsionem o presente. Os sonhos de ontem não cessam de esperar respostas e ressonâncias no momento presente; sonhos frustrados historicamente e que buscam incessantemente serem revitalizados, trazendo o seu potencial transformador.

Não se trata, pois, de um sentimento nostálgico em relação ao passado, mas de um movimento dinamizador do presente que, para se libertar, precisa reaver o seu passado. Os fatos históricos - mesmo individuais, especialmente quando tocam questões de interesse coletivo - são encara-dos, assim, sob o ponto de vista do momento atual e propõe ao narrador (e ao leitor) gestos contemporâneos de compreensão.

A noção de história, para Benjamin, neste sentido, pode se aproximar da ideia de infância. Reaver os fatos significativos da história como quem retoma a própria infância. A infância de um tempo, por sua vez, é feita daquilo que o movimenta para o futuro, dotada do mesmo espírito infantil do homem que crê nos seus sonhos e que perde o impulso de realizá-los na fase adulta, submetido a uma passiva adaptação à realidade. A infância de um homem pode ser relacionada à infância dos homens, e a infância de um tempo pode ser relacionada à infância dos tempos. Acessar o sonho

1 Eugenio Barba. O Espaço Interno. São Paulo, Revista Sala Preta, Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade de São Paulo, nº8, pp 9-10, 2008.

2 Walter Benjamin. Obras Escolhidas: magia e técnica, arte e política. São Paulo, Brasiliense, 1993.

de um tempo torna-se vital para fazê-lo despertar, pois possibilita acessar o sono profundo em que mergulha a consciência coletiva desse tempo. Os conteúdos inauditos advindos da memória tornam-se fundamentais para a revisão do presente, fazendo-o despertar do velho e mesmo sono civilizatório, pois "a reforma da consciência consiste apenas em despertar o mundo... do sonho de si mesmo".3

Se as demandas contínuas do presente assoberbado inibem o acesso do psiquismo ao passado, este pode "recuperar a força de transpor o limiar da consciência sempre que nos colocarmos, de algum modo, na vida do sonho".4 Ou, como dito nas palavras de Henri Bergson em seus estudos acerca das relações entre percepção e memória, "nosso passado permanece quase inteiramente oculto para nós porque é inibido pelas necessidades da ação presente".5

3 Karl Marx, apud Walter Benjamin, 2006, p. 499.

4 Henri Bergson. Matéria e Memória: ensaio sobre a relação do corpo com o espírito. São Paulo, Martins Fontes, 2006, p. 180.

5 Idem, ibidem..

Flávio Desgranges como relator do III Seminário Subtexto em Diálogo. Foto: Tiago Carneiro.

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Educação & Sustentabilidade | 2120 | Subtexto . Revista de Teatro do Galpão Cine Horto

O estreitamento da temporalidade, ante a pressa de um cotidiano que nos oprime e condiciona a uma racionalidade operacional, pode ser pensado também como desestímulo aos atos coletivos e aos eventos que promovam a convivência e a comunicação humana. O que nos oferece ensejo para pensar os processos artísticos como (re) encontro com a temporalidade perdida, tanto na recuperação da experiência atemporal das manifestações do inconsciente, quanto no fomento às relações humanas, possibilitando que o saber extraído de uma vivência adquira o estatuto de experiência no ato de transmissão, ao ser compartilhado com alguém.

Os choques provocados pelo cotidiano tenso da vida moderna - tal como os traumas para Freud - acarretam uma fratura na experiência e na linguagem6, pois fazem convite a uma função psíquica meramente funcional. O que nos rouba o acesso ao tempo dilatado, tempo de vagar da subjetividade, temporalidade própria à produção de conhecimentos; e dificulta que nos disponibilizemos para os encontros, e deixemos de perceber e retribuir o olhar que nos é dirigido por pessoas e objetos durante a vivência cotidiana.

Tanto o passado individual, quanto o passado coletivo, em franca asso-ciação, são formados pelos detritos da história, por aquilo que passou despercebido, que foi recalcado, que não se viu, não se leu, que talvez nem tenha sido escrito. Ou seja, articular a linguagem no presente so-licita apalpar o intangível, observar o invisível, ou "ler o que nunca foi escrito".7 Os restos e detritos vivenciais lançados ao esquecimento são justamente os elementos não percebidos pelo consciente operacional, as cenas "que não demos atenção naquele momento, quando atravessamos

6 Acerca desse tema, podemos lembrar a pesquisa que o educador Philippe Meirieu realizou com crianças desfavorecidas social e economicamente habitantes da periferia da cidade Lião, França, que, em pesquisa em que lhes era pedido para falarem de suas vidas, revelavam enormes dificuldades para falar de si, contar a própria história, articular os fatos de sua existência. A relação que faziam entre os acontecimentos da própria vida não estabelecia uma organização produtora de sentido. Meirieu destaca no texto que, sem aptidão para compreenderem o passado, estas crianças teriam provavelmente muita dificuldade de se situar no presente e se projetar no futuro (Meirieu, 1993, P. 14).

7 Hugo Von Hofmannsthal, apud Walter Benjamin, 2006, p. 461.

pensando em outra coisa".8 Esse material rejeitado na vivência diária, que se constitui como elemento vital para a produção de experiências, pode ser acessado pela percepção, tornando-se visível.

O aprendizado, como assinala Deleuze9, surge da potência de um signo, de um objeto ou situação que se interpõe ao fluxo perceptivo usual, promovendo um encontro tão imprevisto quanto inevitável, que solicita a produção do pensamento, forçando a realização de algo inédito. A aprendizagem se afasta, pois, do mero reconhecimento ou da compreensão objetiva de algo que nos foi transmitido, e se aproxima da invenção, de um processo de produção de sentidos. E que não apenas é individual, já que se produz de maneira sempre pessoal e intransferível, mas que propõe a individuação, o estímulo à invenção de um jeito singular de estabelecer sentidos a partir da relação com os acontecimentos da vida e da arte.

Meus companheiros do Caju

Na ocasião do encontro a que me refiro no início do texto, em 1985, cursava a graduação em Direito na UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), que se apresentava como mais uma tentativa de encontrar um campo de trabalho que me motivasse, pois acabara de abandonar o curso de Engenharia Química, que fazia na mesma universidade. Mas as aulas de Direito pareciam também bastante enfadonhas e resolvi, no horário livre que dispunha durante o dia, me oferecer para trabalhar como voluntário em uma instituição beneficente localizada no bairro do Caju, na cidade do Rio de Janeiro, chamada SOS - Serviço de Obras Sociais, e que atendia a uma média de quinhentas crianças e jovens social e economicamente desfavorecidos.

A coordenadora pedagógica da instituição me propôs que assumisse uma das turmas, com crianças entre 9 e 13 anos, e que naquele momento estava sem professor. O objetivo das aulas era o de "reforço escolar", já

8 G. K. Chesterton, apud Walter Benjamin, 2006, p. 482.

9 Gilles Deleuze. Proust e os Signos. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2006.

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que as crianças estudavam na escola pública em um turno e no outro iam para o SOS. A proposta era "reforçar" aquilo o que tinham aprendido, ou deixado de aprender, na escola. Contudo, o grande serviço prestado era mesmo a guarda e a alimentação daquelas crianças, que, muitas vezes, não faziam outras refeições que não as ali oferecidas. A indisci-plina e o barulho, por um lado, e o autoritarismo, por outro, imperavam na instituição, e qualquer atividade organizada, que solicitasse maior disponibilidade, concentração e atitude colaborativa, era rapidamente boicotada pelos alunos e abandonada pelos professores.

O Caju é um bairro localizado no subúrbio do Rio de Janeiro, circundado por quatro pontos que marcam o seu aspecto geográfico e social: a Avenida Brasil, via intensa, ruidosa e com altos índices de poluentes; a Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana), que possui no bairro um terreno amplo e com odor desagradável, onde lança e seleciona dejetos; o cemitério do Caju; e a praia, pertencente à Baía de Guanabara, se transformou em porto, e, desfigurada e poluída, perdeu a beleza natural e as antigas condições de banho (era curioso e triste, observar que muitas daquelas crianças, que moravam à beira-mar, diziam nunca ter ido à praia; o que era compreensível, pois praia não existia mais naquele recanto). Neste bairro, a partir da segunda metade do século XX, construíram-se inúmeras favelas, habitadas em grande parte por imigrantes das regiões norte e nordeste do país. As condições precárias em que se encontravam aquelas crianças - desrespeitadas com frequência pelo Estado, que não oferecia condições mínimas de moradia, transporte, saúde, segurança, educação, cultura, e, por vezes, pelos próprios familiares, já que os relatos de casos de violência doméstica eram costumeiros - talvez explicassem a desconfiança com que recebiam qualquer proposta de afeto e coope-ração. Afinal, por que esperar que estabelecessem relações de respeito e confiança com qualquer pessoa ou instituição, se o desrespeito era a tônica das relações cotidianas?

Foi nessas condições pouco convidativas, e de tanto tentar e fracassar nas aulas de "reforço escolar" - tarefa que nenhum dos professores conseguia realizar efetivamente; mesmo porque a zoeira que vazava de uma sala para as outras impedia qualquer tentativa eficaz -, que me lembrei das

aulas de artes cênicas que tinha tido a oportunidade de experimentar quando criança na escola. Passei, então, a frequentar as bibliotecas da UERJ em busca de livros sobre o ensino do teatro. As minhas idas para a universidade ganhavam agora novo ânimo. Ao lado da minha sala, no SOS, havia um grande espaço em que ficavam depositadas umas velhas máquinas de escrever, remanescentes de um curso de datilografia já desativado. Solicitei aquela sala à coordenação, e, depois da sala limpa, passei a ir para lá com meus alunos. Ao invés de reforço escolar, teríamos aula de teatro! Ciente da dificuldade generalizada em realizar de fato o tal reforço escolar, a coordenação não fez qualquer oposição à minha iniciativa.

A mudança de espaço, a inovação, foi, a princípio, muito bem recebida pelos alunos do meu grupo, que invadiram a nova sala aos gritos, felizes por aquela conquista. Ressalte-se que esta sala era muito maior que a outra. A nossa alegria era evidente, agora precisávamos partir para o próximo passo, organizar o grupo para as propostas e jogos teatrais. Aí as coisas deixaram de funcionar como eu imaginara, como acontecera nas minhas aulas de artes cênicas na escola, ou mesmo como estava es-crito nos livros. Ou seja, a prática improvisacional proposta pelos autores partia do princípio de que havia um grupo disponível, capaz de criar um silêncio concentrado e prazeroso, de falar e de ouvir, e não de gritar; de estabelecer uma relação, se não afetuosa, minimamente respeitosa ao menos, e não de correr de maneira desvairada pela sala, sem condições de ouvir qualquer proposta, mesmo que fosse uma simples sugestão para sentarmos e fazermos uma roda. Este intento colaborativo estava muito longe da disposição do meu grupo. No primeiro dia da nova etapa, depois de várias tentativas de organizar as crianças, deixei-os sozinhos na sala, fui para o banheiro e chorei copiosamente. O teatro solicitava uma dis-ponibilidade e entrega que eles jamais seriam capazes. Nem eles, nem eu.

Mas o dia seguinte chegou e eu continuei tentando, e aos poucos (bem aos poucos mesmo) eles demonstravam compreender o quão divertido poderiam ser aqueles jogos; e entender que, por vezes, respeitar as regras do jogo poderia ser muito mais prazeroso que uma zoeira permanente e despropositada. O que não quer dizer que as crianças perderam a sua

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vitalidade e que a bagunça não se fazia presente, e, vez ou outra, era mesmo muito bem-vinda na nossa sala.

No final daquele ano, apresentamos um pequeno espetáculo para os demais alunos da instituição. Foram vinte minutos de êxtase para mim, momentos únicos em que pude ver meus alunos em cena, e aquelas tantas crianças, pela primeira vez, em silêncio total e absoluto, assistindo a seus companheiros. O vigor estético da arte teatral se configurava de modo surpreendente para mim naquela tarde no Caju, tanto na potencialida-de do processo em sala de aula, como o que realizei com meu grupo, quanto na mostra de espetáculo para os alunos, que fizemos no final do ano. Carrego viva ainda comigo aquela experiência fundamental, que me deu norte na vida pessoal e profissional, e sou muito grato ao tanto que aprendi com aquelas crianças; que logo depois se tornaram jovens e adultos, pois continuei trabalhando lá com eles por cinco anos.

Em meu último ano no SOS, no processo de criação em que me despedi do grupo, partimos divertidamente dos sambas que os alunos estavam habituados a cantar, e, livremente inspirados na estética do teatro grego, montamos um coro de pagodeiros. As canções costuravam a trama, es-truturadas a partir de lances como: um bandido entra na casa do pobre e toma um susto - "o ladrão foi lá em casa, quase morreu do coração" -, e, apiedado ante a miséria com que se deparou, desce o morro clamando aos policias para que o prendam - "pega eu, pega eu que eu sou ladrão".

O meu reencontro com alguns daqueles meninos, anos depois, se deu de modo não menos inusitado. Estava no cemitério do Caju para o enterro de um tio querido, e, como o velório se alongava por um tempo maior que o esperado, decidi me afastar daquela situação angustiante e pas-sear um pouco pela região. Foi nessa caminhada prosaica que encontrei acidentalmente dois ex-integrantes do grupo. Alegres com o encontro fortuito, os meninos, que já se mostravam jovens adultos, me deram conta do que faziam os demais: um trabalhava agora em uma oficina de automóveis da região; outro virara pescador, saindo nos pequenos barcos ainda existentes na comunidade local; uma atuava como secretária de

uma pequena empresa; um outro se virava como traficante de drogas; e assim por diante.

Contudo, para além da alegria de revê-los, me chamava a atenção o fato de carregarem algo que nos marcava, que nos identificava, um algo que certamente também estaria perceptível em mim, como se o espaço conquistado pela experiência em comum, tal como um quintal invisível a olho nu, concebido e acalentado por nós mesmos, ainda estivesse ali, presente, pronto para ser revisitado a qualquer momento. O modo de constituição desse lugar estético a partir de experiências artísticas, tal como se dera com aqueles meninos, espaço poético, local de encontros e descobertas, que solicita cuidado e revisão permanentes, tem, desde então, me despertado o interesse. E uma questão permanece para mim tão insondável quanto inquietante: o que terá ficado na alma daqueles meninos, após anos de experiência com o teatro? Apesar da busca in-cessante, sinto apenas tangenciá-la, tocando-a, quem sabe, vez ou outra.

Mesa do III Seminário Subtexto em Diálogo. Da esq. para dir.: Lúcia Pimentel, Américo Córdula, Flávio Desgranges, Cíntia Inês Boll e Alícia Loureiro. Foto: Tiago Carneiro.

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Bibliografia

BARBA, Eugenio. O Espaço Interno. São Paulo, Revista Sala Preta, Pro-grama de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade de São Paulo, nº8, pp 9-10, 2008.

BENJAMIN, Walter. Obras Escolhidas: magia e técnica, arte e política. São Paulo, Brasiliense, 1993.

________. Passagens. Belo Horizonte, Editora UFMG, São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2006.

BERGSON, Henri. Matéria e Memória: ensaio sobre a relação do corpo com o espírito. São Paulo, Martins Fontes, 2006.

DELEUZE, Gilles. Proust e os Signos. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2006.

MEIRIEU, Philippe. Le théâtre et la construction de la personalité de l'enfant: de l'événement à l'histoire. In: CRÉAC'H, M. Les enjeux actuels du théâtre et ses rapports avec le public. Lyon, CRDP, 1993.

a Formação Do públiCo Como uma Forma DE

SuSTEnTabiliDaDE na CulTura

Viviane da Soledade*

O III Seminário Subtexto em diálogo promovido pelo Galpão Cine Horto tinha como um de seus eixos temáticos a Sustentabilidade na Cultura. O convite para participar de uma abordagem sobre o assunto, apresentando o trabalho realizado na área de Cultura da Escola SESC de Ensino Médio (RJ), me fez pensar o que seria essa sustentabilidade no campo cultural. Sustentabilidade é um conceito muito utilizado para a reflexão sobre o controle de recursos esgotáveis no Meio Ambiente. Influenciada por esse conceito tão impregnado de uma preocupação com a escassez, imbuí-me da urgência e da necessidade de novas possibilidades para a criação e a manutenção da produção artística, de tal maneira que a criatividade e a possibilidade de subversão artística não sejam minadas por uma indústria cultural. Talvez a noção de sustentabilidade seja mais coerente ao pensar-mos em produção artística, ao invés de produção cultural, pois a Cultura possui o seu fluxo independente de uma necessidade de viabilização. É característica da Cultura a condição de mudança e de consolidação. Já a Arte precisa de recursos sustentáveis para a realização do seu ciclo de criação, produção, difusão e recepção. Pensar em sustentabilidade na Arte é pensar em ações que a torne sustentável, por isso visível.

Para refletir sobre o tema apresento o Clube de Espectadores, um projeto de sistematização de público e acessibilidade à Arte e Cultura realiza-do pelo Espaço Cultural Escola SESC desde 2008, localizado na Escola SESC de Ensino Médio em Jacarepaguá, Rio de Janeiro.A Escola SESC de

* Atriz formada pela Casa das Artes de Laranjeiras (CAL), Bacharel em Teoria do Teatro pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), pós-graduada em Arte e Cultura pela Universidade Candido Mendes (UCAM) e mestranda em Bens Culturais e Projetos Sociais pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Assessora Técnica em Artes Cênicas da Gerência de Cultura da Escola SESC de Ensino Médio e coordenadora do Projeto Social (RJ). Também integra a comissão julgadora do Prêmio Questão de Crítica.

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Ensino Médio é uma escola residência onde moram 483 alunos de todo o Brasil, além de professores e seus familiares. O Espaço Cultural Escola SESC é um lugar que promove atividades de fruição, ações formativas e socioculturais para os alunos de todo Brasil e moradores da Zona Oeste do Rio de Janeiro de maneira totalmente gratuita.

O projeto Clube de Espectadores foi uma estratégia para criar a siste-matização de público por meio de ações que visassem a formação do espectador/cidadão. A necessidade de desenvolver esse projeto partiu da compreensão de que a função de uma programação é se adequar ao seu público e às suas expectativas, ao mesmo tempo em que busca proporcionar novas experiências artísticas e culturais. O objetivo inicial era formar público apostando na possibilidade de se tornarem especta-dores espontâneos desse espaço de cultura e de muitos outros da cidade.

A criação do hábito de frequentar um espaço cultural é o início para o processo de formação de espectador e incentivo à produção artístico-

-cultural. Qualquer ação cultural para ser sustentável precisa considerar o seu público, tendo em vista que toda a produção artístico-cultural tem como finalidade atingir aquele que irá fruir a programação. Se não tiver público não há forma de sustentabilidade. Ainda que o público não seja pagante, qualquer investimento público ou privado para a realização de

uma programação gratuita só se viabilizará com a presença do público. O sócio do Clube de Espectadores parece estar procurando um tratamento diferenciado enquanto espectador por meio de valores simbólicos, já que a programação é gratuita. Os princípios do projeto são: desenvolvimento cultural da sociedade, democratização dos bens culturais, a ocupação e utilização das potencialidades dos equipamentos culturais disponíveis, pertencimento comunitário e a comunicação por meio da revista Clube de Espectadores. Além das ações que oportunizem a ampliação do gosto do espectador e da noção de qualidade para além do que é oferecido pela indústria cultural.

Uma das ações específicas que tem como perspectiva a formação de público e reforça a consciência de cidadania cultural dos espectadores, desenvolvidas como um princípio do Clube de Espectadores é o Manual de Fruição para espectadores iniciantes e alunos de rede de ensino pú-blico. Esse artigo pretende abordar rapidamente a questão da formação do espectador enquanto processo de sustentabilidade cultural que se concretiza com a realização de ações de sistematização de público criadas pelo Espaço Cultural Escola SESC. O Clube de Espectadores e suas ações consistem na criação de uma política cultural que tornou todo o trabalho de Cultura da Escola SESC de Ensino Médio, sustentável.

A iniciativa de criar o Clube de Espectadores para constituir um público assíduo à programação do espaço não atingiu o seu objetivo somente com o cadastramento dos seus sócios. Torná-los espectadores estava para além da iniciativa de gerar uma carteirinha e divulgar a programação, pois isso não garantiria a ida dos sócios ao espaço cultural. Era preciso criar uma política cultural que implicasse em ações de formação do hábito de frequentar espaços de cultura, para posteriormente, incentivá-los en-quanto espectadores. Foi então que o trabalho começou a ser delineado com o público de escolas públicas. Como o Espaço Cultural Escola SESC está localizado em uma escola de ensino médio, escolas do entorno com demanda de programação artística se aproximaram, mas com poucas (ou quase nenhuma) possibilidades de viabilizar o transporte de seus alunos para frequentar a programação em período escolar. Os alunos não tinham poder aquisitivo para arcar com os custos de transporte, muito

Conversa com o público após a fruição. Foto:

Acervo da Gerência de

Cultura da Escola SESC

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menos de ingresso. Como a programação do Espaço Cultural Escola SESC sempre foi gratuita, faltava apenas viabilizar o transporte. A demanda que surgia fez com que a equipe de cultura da Escola SESC desenvolvesse, desde 2010, uma programação específica para escolas públicas, Escola vai ao teatro1, que disponibilizava o transporte dos alunos e professores e oferecia programações com horários adequados ao período escolar. A programação do projeto Escola vai ao teatro é composta de linguagens artísticas diversas com a intenção prioritária de ser formativa. Nesse contexto surgia a proposição de parceria entre cultura e educação.

Para que o projeto Escola vai ao teatro atingisse êxito era necessário tra-balhar junto com os professores das redes públicas. O objetivo inicial era formar público, no caso os alunos das escolas, apostando na possibilidade de se tornarem espectadores espontâneos desse espaço de cultura. No

1 Realização de apresentações artísticas e visitas a exposições para alunos da rede pública, com o princípio de estimular e viabi lizar a ida de estudantes ao teatro, objetivan do dar acesso a alunos de instituições formais e informais a uma programação diversificada e de qualidade. Período de realização: março a novembro.

entanto, a realidade que se apresentava era de um grande despreparo dos professores enquanto formadores de atividades de fruição, pois muitos tinham pouca experiência enquanto espectadores, bem como os alunos. Tornava-se difícil a relação entre espectadores-alunos, espectadores-pro-fessores, artistas e mediadores do Espaço Cultural Escola SESC por uma rejeição à programação que se desconhecia, por uma incompatibilidade à expectativa de comportamento que se tinha e uma falta de entendi-mento dos professores de que a atividade de fruição também poderia ser formativa. Muitas das linguagens apresentadas para eles estavam sendo inaugurais e a questão do gosto em relação ao que se apresentava estava sempre em jogo acompanhado de grande estranhamento.

Nesse contexto é criado pela equipe de cultura da Escola SESC o material didático Manual de Fruição, um guia prático de como ser um espectador melhor. A princípio o material didático era composto apenas de orienta-ções comportamentais para o momento da apresentação artística que se apresentava no formato de folheto com observações do tipo: desligar o celular, não conversar, não se movimentar demasiadamente, não beber e comer na sala de espetáculo, não fotografar sem autorização prévia e ir ao banheiro antes ou depois da apresentação. A necessidade do Manual de Fruição surgiu na medida em que o público das escolas públicas apre-sentava um grande desconhecimento dos códigos sociais constituídos para espaços de cultura institucionalizados. A ideia era ensinar as regras básicas de sociabilidade entre espectadores, artistas e mediadores de espaço de cultura. Com o desenvolvimento do projeto Escola vai ao teatro percebeu-se que também era preciso preparar os alunos para o que iriam assistir, dando-lhes informações do que seria apresentado para que os alunos pudessem criar alguma relação prévia com a programação.

Então foi incorporado ao Manual de Fruição informações sobre o que seria assistido e enviado ao professor previamente para ser repassado aos alunos em sala de aula. Nesse segundo momento foram incorporadas sugestões aos professores de como deveriam ser trabalhadas previamente as informações sobre o espetáculo de maneira a estimular o aluno a as-sistir a apresentação artística. Essa parte é um instrumento para auxiliar

Panorâmica do Teatro do Espaço

Cultural Escola Sesc. Foto: Acervo da

Gerência de Cultura da Escola SESC

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o professor com propostas de jogos e abordagens de conteúdos sobre a obra artística para serem trabalhadas junto aos alunos em sala de aula.

Devido ao fato de muitos alunos estarem lidando com a fruição de lin-guagens artísticas pela primeira vez surgiu a necessidade de incluir no manual, informações sobre as apresentações artísticas que pudessem evitar um estranhamento, em demasia causando uma profunda falta de empatia entre o produto artístico e o espectador. Dessa maneira, o manual contribui para a formação de público a partir do entendimento de onde o espectador se encontra, de como proceder, qual a programa-ção que irá assistir,uma introdução à temática do espetáculo e o que ele pode fazer com o que lhe foi oferecido. O apoio dos professores, antes e durante o espetáculo, na orientação dos alunos é imprescindível para o bom andamento desse processo formativo.

Busca-se com isso que o ato de fruir arte possa contribuir de maneira significativa para a construção da cidadania, oportunizando o convívio entre os espectadores/frequentadores do Espaço Cultural Escola SESC, gerando o pertencimento, exercitando a fala sobre a fruição e a discussão sobre o gosto, elaborando ações de educação do espectador iniciante que dizem respeito à criação de novos hábitos comportamentais, ampliação de referenciais e do gosto. Essas ações são iniciativas que ajudam a reverter a constatação de que na Cultura, assim como na área da sustentabilidade ambiental "(...) muito pouco tem sido feito no sentido de se analisar as práticas de consumo como uma forma de criação de redes de intercâmbio de informação e de aprendizagem do exercício da cidadania." (PORTILHO, 2005. p. 10). Nesse caso a dimensão de consumo na Cultura está menos atrelada à noção de compra e muito mais de fruição como um direito de todo e qualquer cidadão.

Para o desenvolvimento do projeto Clube de Espectadores e da criação do Manual de Fruição a noção de sustentabilidade cultural se faz pertinente na medida em que era necessário estimular a formação de um público (ou públicos) para viabilizar as políticas culturais desenvolvidas pelo setor de cultura da Escola SESC. A sustentabilidade também pressupõe trabalhar com recursos escassos como uma necessidade de promover,com pouco

capital, o maior número de atividades culturais sem excluir o critério de qualidade. Para isso, é necessário incentivar o desenvolvimento dos grupos artísticos locais e a ampliação do conceito de Cultura do público oferecendo-lhes uma programação fora de um eixo comercial. Mas pensar em sustentabilidade na área cultural é, sobretudo, pensar em sustenta-bilidade social que, dada a abrangência desta atividade, deve atender à comunidade receptora, ao patrimônio histórico-cultural e à sua interação com os cidadãos, de forma a aumentar a auto-estima e o padrão de vida das comunidades locais, respeitando as suas tradições culturais e o seu direito de criação do novo.

Sustentabilidade na Cultura pode ser entendida como medidas que criam a oportunidade de criação, manutenção, difusão e recepção na área cultural de maneira que os recursos investidos sejam distribuídos sem centralização e fomentem a produção artístico-cultural. Para isso é preciso pensar para além de medidas que inibam a escassez de produção e difusão cultural, mas que transformem os recursos aplicados em ações mais abundantes e sistemáticas que alcancem o maior número de cidadãos-espectadores.

Conversa entre artistas, público e mediadores do Espaço Cultural Escola Sesc. Foto: Acervo da Gerência de Cultura da Escola Sesc.

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Para isso é importante considerar a cadeia produtiva para o desenvolvi-mento de uma política cultural.

É preciso criar medidas que façam com que os recursos investidos na área cultural sejam melhores distribuídos e aproveitados pelos artistas, produtores culturais e fruidores. Ao mesmo tempo em que é necessário o apontamento de novas medidas dos que promovem a distribuição da cultura e dos que se beneficiam dessa distribuição para tornar a vida cotidiana cultural sustentável. Para que essa investida se realize, é ne-cessário refletir seriamente sobre a recepção artística. Sem público não há possibilidade de realização de um trabalho artístico. Por essa razão torna-se urgente uma relação mais próxima dos artistas para com os espectadores, dos produtores culturais e do poder público para então ratificar a importância do incentivo à cidadania e à "consciência cultu-ral" e a criação de valores coletivos. Além disso, é preciso oportunizar o diálogo do governo com a sociedade para a elaboração de medidas com perspectivas de orientação da fruição e do hábito de consumo da cultura, mais especificamente da Arte.

Essa seria uma perspectiva que tem, sobretudo, como foco de mudança, a forma de relação entre espectadores, artistas e produtores de Arte e Cultura. Para pensar mais especificamente na fruição da arte é funda-mental considerar os hábitos e a acessibilidade. Há uma necessidade de que a difusão do hábito de fruir arte seja estabelecida para classes mais amplas. Quando isso acontece, a pressão comportamental aumenta, a adesão em alguma medida também e a valoração dos gestos se estabe-lece. Portanto, é preciso estar disposto a negociar padrões de consumo para melhorar a qualidade de vida da grande maioria da população em situação desfavorável de acesso às produções culturais e artísticas, para diminuir situações de contínua discriminação e exclusão social.

Promover o consumo sustentável cultural no Brasil significa, antes de qualquer coisa, garantir que as populações de baixa renda tenham acesso à fruição de produtos e serviços culturais contemplando assim as neces-sidades básicas como o direito de frequentar os espaços de cultura para fruir teatro, cinema, música, artes plásticas... Não se gosta do que não

se conhece. Quanto àqueles que já possuem condições econômicas para garantir o atendimento de suas necessidades básicas precisam ampliar as suas possibilidades de escolhas entrando em contato com uma maior diversidade cultural; optando por produtos culturais que incentivem à produção de grupos artísticos que não sejam midiáticos e, deste modo, consequentemente, incentivando o surgimento de novos artistas fora de um eixo comercial. Para a sustentabilidade de uma produção não comer-cial é necessário despertar as noções de coletividade e o sentimento de comunidade nos consumidores/espectadores/cidadãos. Não se almeja com isso a universalidade do gosto, mas a ampliação do mesmo e o desenvolvimento de um hábito de fruir algo que não está legitimado pela indústria cultural.

Bibliografia

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CAMPBELL, Colin. Eu compro, logo sei que existo: as bases metafísicas do consumo moderno. In. BARBOSA L. e CAMPBELL, C. (org.). Cultura, Consumo e Identidade. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2007.

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MONTESQUIEU, Charles de Secondat. O gosto/Montesquieu. Trad. Teixeira Coelho. São Paulo: Iluminuras, 2005.

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PORTILHO, Fátima. Consumo sustentável: limites e possibilidades de ambientalização e politização das práticas de consumo. Cadernos EBAPE.BR, 2006.

RANCIÈRE, Jacques. O espectador emancipado. Trad.: Ivone C. Benedetti. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2012.

o FESTiVal Do TEaTro braSilEiro E SuaS açõES DE

Formação para alunoS Da rEDE públiCa DE EnSino

Sérgio bacelar*

O Festival do Teatro Brasileiro (FTB) é um projeto de circulação interesta-dual que propõe a aproximação cultural entre os estados brasileiros. Ao longo de suas 15 edições e desde 1999 foram realizadas a Cena Baiana no DF, PE, CE e MA; a Cena Mineira no DF, RJ, SP, PR e RS; a Cena Pernambucana no DF, SE e BA; a Cena Cearense em MG e ES; a Cena Gaúcha no DF e GO; a Cena Paranaense no RS e em SP; a Cena Distrito Federal no MS; e uma edição especial de Teatro de Rua no DF.

Além de apresentar um recorte da produção das artes cênicas do estado que é o objeto da edição, o FTB, desenvolve outras ações. São realizadas oficinas de qualificação profissional, encontros informais entre os grupos dos estados envolvidos, encontros entre os departamentos de artes das universidades, oficinas de introdução às artes cênicas, construção de instrumentos e introdução de ritmos musicais para jovens em situação de risco social, bate-papos após as apresentações, bem como ações de formação de plateia para alunos da rede pública de ensino.

As ações de formação de plateia foram incorporadas pelo FTB para propor soluções à algumas questões como: ampliação de público; proposição de contrapartidas socioculturais; adequação às diretrizes culturais do Governo Federal; e aumento das possibilidades de captação.

* Sérgio Bacelar é Idealizador e captador de projetos culturais, especializado na elaboração de projetos nas linguagens de teatro, música e dança. Atualmente, o gestor coordena o Festival do Teatro Brasileiro, o Festival de Teatro de Rua (DF) e a ocupação da Sala Plínio Marcos da Funarte, em Brasília.

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A primeira experiência com os alunos aconteceu na sétima edição, em 2008, quando da Cena Baiana em Pernambuco. A Fundação do Patri-mônio Histórico e Artístico de Pernambuco (FUNDARPE) era parceira do FTB. A instituição tinha um núcleo destinado às relações com as escolas estaduais e ficou responsável pela escolha das escolas e o transporte dos alunos. Foram contratados atores para acompanhar os alunos no percur-so da escola até teatro. Quando da chegada dos alunos nos teatros os atores formavam uma roda e conversavam sobre o espetáculo que seria assistido, os profissionais envolvidos nas criações e sobre comportamento nas salas de espetáculos. Imaginou-se que se poderia iniciar a conversa já no ônibus, entretanto isso não foi possível em virtude da dispersão. Como forma de preparação os atores receberam os DVDs com as imagens corridas dos espetáculos e os releases. Foram realizados encontros entre

os atores-educadores e os diretores e atores dos espetáculos para que se identificasse o que poderia ser destacado quando das rodas com os alunos. Tal iniciativa foi elogiada pelos atores-educadores quando das avaliações finais.

A frequência dos alunos foi muito boa. As rodas de conversa se mostraram frágeis já que eram realizadas em locais improvisados com interferência de ruídos. Levavam em média 15 minutos e os alunos ficavam em pé. Os alunos eram em sua maioria frequentadores do Ensino de Jovens Adul-tos (EJA). Espetáculos como “Cabaré da rrrrraça” do Bando de Teatro Olodum e R$ 1,99 conseguiram despertar um grande interesse. Em um R$ 1,99 o ator Ricardo Castro, logo no início, troca de figurino em cena com uma luz indireta. Naquele momento os alunos reagiram com gritos e assobios que pareciam infindáveis. Foi necessário o ator interromper a apresentação e propor cumplicidade para que o espetáculo fosse reto-mado. Foram momentos de muita apreensão da equipe de produção. O espetáculo transcorreu bem apesar de uma pequena parte do público continuar com os assobios. Ao final a plateia aplaudiu calorosamente e por um tempo pouco visto.

No ano seguinte foi a vez da Cena Pernambucana ser apresentada em Sergipe e Bahia. Foi chamada para coordenar as ações de formação uma arte-educadora que tinha uma larga experiência com grupos de alunos em visitas guiadas em exposições de artes visuais. Decidiu-se que ela coordenaria a ação nos dois estados. Na Bahia tentou-se uma parceria com as Secretarias de Educação do Estado e do Município de Salvador. Ambas as instituições não aderiram argumentando que não seria possível transportar os alunos. A solução encontrada foi um contato direto com as escolas próximas aos teatros. Em Sergipe a parceria com o Estado foi muito bem recebida pela Secretaria de Educação.

Foram preparadas duas metodologias distintas. Uma destinada a um contato direto com os alunos soteropolitanos e a segunda para os pro-fessores das escolas estaduais de Sergipe. A primeira seguiu o formato de visitas guiadas e abordava temas da primeira experiência realizada em Recife – cenografia, iluminação, figurino, direção, dramaturgia, etiquetas

Plateia no Festival de Teatro Brasileiro em 2011. Curitiba/

PR. Foto: Elenize Desgeniski.

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para a frequência a teatros. E a segunda era mais teórica objetivando capacitar os professores para transmitirem aos seus alunos assuntos in-trodutórios sobre a cultura pernambucana, história do teatro e os temas sobre as diferentes criações artísticas que compõem um espetáculo e comportamento.

Em Salvador, a frequência foi muito baixa. Era um período de chuvas in-tensas e muitos alunos deixaram de ir às aulas. Em Aracaju foi programado um sábado em dois períodos para o contato com os professores de artes. Esses encontros faziam parte da agenda dos professores do Estado que se reuniam mensalmente para reciclagem. Participaram da capacitação cerca de 40 professores. A Secretaria conseguiu mobilizar cerca de 7000 alunos, entretanto observou-se, já nas primeiras apresentações, que um número pequeno dos professores capacitados foi com suas turmas. Uma solução encontrada para os alunos do EJA foi realizar a mesma prática das rodas de conversas de Recife. Para as apresentações realizadas no período vespertino, exclusivas para os alunos, optou-se por se ter uma conversa com as crianças e jovens antes dos espetáculos, agora dentro do teatro.

Em 2008 o FTB contou pela primeira vez com o patrocínio da Petrobras. A parceria com a instituição tem sido um importante estímulo para o aperfeiçoamento e continuidade das ações de formação para alunos da rede pública de ensino. Nas edições seguintes continuaram as experi-mentações. A seguir, a metodologia considerada ideal pelo FTB.

No primeiro movimento, identifica-se um coordenador pedagógico no estado que deve se destacar por ter um bom trânsito junto as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação e núcleos de graduação. O profissio-nal recebe os relatórios e os guias dos professores das ações anteriores.

Os curadores apontam espetáculos que têm boas possibilidades didáticas. A definição dos que serão trabalhados na ação de formação passa a ser uma escolha do coordenador pedagógico e da direção do FTB. Entende-

-se que ninguém melhor do que uma pessoa do estado para escolher o espetáculo que pode gerar um resultado mais efetivo.

O próximo passo é montar a equipe de arte-educadores que tenha vivência como atores ou com alunos de graduação em licenciatura em teatro e um produtor. Uma boa experiência é a parceria com as universidades e uma seleção resultado de inscrições e entrevistas. Trabalhar com pessoas que se dispõem a ter um envolvimento pessoal e apaixonado é um excelente indicativo de bons resultados.

A definição da preparação dos arte-educadores é uma escolha da co-ordenação pedagógica que tem como referência as experiências dos anos anteriores. O produtor fica responsável pelos agendamentos dos encontros, deslocamento dos arte-educadores, preparação do material de apoio didático e acompanhamento dos deslocamentos dos alunos.

A equipe de arte-educação faz a adequação do Guia do Professor, mate-rial de auxílio à preparação dos alunos com proposições pré-espetáculo, durante e pós apresentação. Desenvolve-se também um material didático complementar para os alunos.

A direção do FTB, em conjunto com a coordenação pedagógica, identi-fica, a melhor estratégia para a proposição da parceria - se direto com as escolas ou com as Secretarias. Deve-se priorizar o contato com os núcleos relacionados à arte -educação.

O primeiro contato deve ser com os professores das turmas que par-ticiparão da ação. Em um encontro de 2 horas dos professores com a coordenação pedagógica e os arte-educadores é apresentado o Guia do Professor e são demonstradas algumas das práticas sugeridas.

O próximo passo é o encontro dos arte-educadores com os alunos por um tempo de 2 horas/aula. Neste momento, aplica-se a metodologia sugerida pela coordenação e treinada com os arte-educadores. Após os primeiros encontros ajusta-se a metodologia proposta.

O segundo movimento e o mais esperado é a apreciação do espetáculo. A ida até o teatro para a vivência é muito rica, pois acrescenta elementos outros. Informações sobre a história do local e uma visita a suas depen-dências são opções de ações complementares. A participação tanto dos professores quanto dos arte-educadores deve ser proativa. A equipe deve

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estar preparada para organizar a saída dos ônibus, o acesso à plateia e a saída do teatro. Sugere-se que dois arte-educadores estejam no palco para dar os avisos gerais e relembrar o que foi conversado em sala de aula. Aproveita-se a oportunidade para falar sobre a rotina dos sinais sonoros ou luminosos. Outra possibilidade já experimentada e bem sucedida é levar espetáculos de rua para dentro da escola. Sempre que possível uma conversa após o espetáculo entre os alunos e atores gera uma desmisti-ficação da figura do ator e potencializa a ação de arte educação.

O terceiro movimento é o retorno dos arte-educadores às escolas. Essa é a ação que melhor deve ser preparada em virtude das dificuldades a serem transpostas. Até aquele momento a ação já tomou muito do tempo dos professores e dos alunos. A interferência na grade curricular passa a ser questionada. Os alunos do ensino noturno (EJA) não tem uma frequência regular. Entretanto, quando o envolvimento dos professores, coordena-dores e diretores da escola é pleno a ação final viabiliza a conclusão dos objetivos. Neste último movimento, planejado e preparado previamente pela coordenação pedagógica e arte-educadores, se conversa sobre toda a vivência e principalmente sobre o espetáculo. Aplica-se também um questionário que possibilitará a leitura do conjunto das percepções dos alunos e se poderá avaliar a eficácia da ação, bem como os ajustes necessários para a próxima edição.

Até hoje não se conseguiu desenvolver a metodologia na sua totalidade. A realidade do sistema educacional é muito sofrida. Encontra-se um grande número de profissionais sobrecarregados e desestimulados. As greves dos professores são frequentes. Alunos também desestimulados e com problemas de comportamento são muitos. Sensibilizar jovens, jovens adultos e professores que têm nenhuma ou pouca vivência das artes cênicas pode se tornar uma batalha.

Por outro lado os depoimentos dos envolvidos e resultados avaliados são um estímulo para se dar continuidade à ação. É comum pelas cidades por onde passa o FTB ser essa a primeira experiência de aplicação de uma ação de formação para as artes cênicas considerando a metodologia, quantitativo de horas de trabalho, número de alunos atendidos e formação de equipe de arte-educação. Também é comum ouvir dos profissionais envolvidos que a ação foi transformadora para suas carreiras.

Ação de Formação. CEMEIT, Taguatinga/

DF. Foto: Arquivo FTB.

Ação de Formação. CEMEIT, Taguatinga/DF. Foto: Arquivo FTB.

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Tem-se a compreensão que a ação proposta é pontual. Entretanto o modelo apresentado se junta a outras iniciativas privadas e públicas para tentar fazer ecoar a urgência de um engajamento amplo e sistematizado para que se potencialize o diálogo entre o teatro e a educação, entre a arte e a educação.

Participar do III Seminário Subtexto em Diálogo – Teatro em MG: Edu-cação e Sustentabilidade foi compreender que, apesar do assunto ser uma preocupação de poucos, iniciativas preciosas e necessárias estão acontecendo. A parceria do Ministério da Educação e o Ministério da Cultura no Programa Mais Cultura Nas Escolas, que deve atingir 5000 escolas em 2014, aponta para uma mudança desejada nos processos de educação.

paTroCínio CulTural, uma poSSibiliDaDE DE

DESEnVolVimEnTo loCal

marcelo Santos*

O desenvolvimento constitui fator de grande relevância para as políticas públicas contemporâneas, no Brasil. Seja sob a perspectiva ambiental ou da inclusão social, as políticas públicas estão sempre orientadas para o desenvolvimento nacional. Essa perspectiva está repercutida, tam-bém, no discurso de empresários e de representantes de instituições da sociedade civil. A pauta do desenvolvimento é recorrentemente apre-sentada como condição sine qua non de políticas públicas e, por esse motivo, deve ser evidenciada como resultado de ações, legislações e planos de governo.

Por meio da Constituição Federal de 1988 o Estado promoveu avanços em direção à democracia e preconizou um modelo de descentralização político-administrativa que estimulou à participação da sociedade ci-vil. Também indicou como competência da União o desenvolvimento econômico e social (Brasil, 1988). Concomitantemente, a Organização das Nações Unidas (ONU), por meio da Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural da United Nations Educational, Scientific and Cul-tural Organization (Unesco, 2002) e do PNUD (Pnud, 2011), defendeu o princípio do desenvolvimento das comunidades como eixo estratégico de planejamento. Na Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, há referência explícita ao modelo de desenvolvimento “não somente em termos de crescimento econômico” (Unesco, 2002) e do fortaleci-

* Gestor cultural, Mestre em Gestão Social pelo Centro Universitário UNA. [email protected]

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mento “[...] da função primordial das políticas públicas em parceria com o setor privado e a sociedade civil” (UNESCO, 2002).

A revisão do papel do crescimento econômico em sua relação com o desenvolvimento é importante porque muito embora haja evidência fa-vorável do desempenho econômico brasileiro, não se pode comemorar proporcional redução dos índices que apontam desigualdades sociais re-levantes caracterizadas pela concentração de recursos em determinados eixos de desenvolvimento. Segundo Celso Furtado:

O subdesenvolvimento tem suas raízes numa conexão precisa, surgida em certas condições históricas, entre o processo interno de exploração e o processo externo de dependência. Quanto mais intenso o influxo de novos padrões de consumo, mais con-centrada terá que ser a renda. Portanto, se aumenta a depen-dência externa, também terá que aumentar a taxa interna de exploração. Mais ainda: a elevação da taxa de crescimento ten-de a acarretar agravação tanto da dependência externa como da exploração interna. Assim, taxas mais altas de crescimento, longe de reduzir o subdesenvolvimento, tendem a agravá-lo, no sentido de que tendem a aumentar as desigualdades sociais.

(Furtado, 1974, p. 94).

As políticas públicas devem ser inovadoras ao propor formas de in-tervenção que não reproduzam as desigualdades de oportunidade de acesso a melhores condições de vida. Nesse sentido, o desenvolvimento local deve incorporar o desafio de contraposição aos modelos conven-cionais de crescimento e desenvolvimento. Deve ser orientado na pro-dução de valores e condições propícias à construção de novas possibili-dades socioeconômicas para as populações. Sob essa perspectiva, deve ser entendido como objetivo qualitativo e quantitativo das políticas pú-blicas. Nesse contexto é pertinente a questão de como isso será possí-vel, sobretudo, a permanecer o intuito de considerar o desenvolvimento como resultante da ação direta das comunidades envolvidas, ou, dito de outra forma: desenvolvimento local endógeno, evitando os riscos de hierarquização e de manutenção da hegemonia.

A participação efetiva das comunidades impacta positivamente o am-biente político ao reequilibrar os interesses de classes, reforça princí-pios e valores democráticos, expande o exercício dos direitos civis e a abrangência das políticas sociais colaborando mais fortemente para o desenvolvimento humano. Se a participação nas políticas públicas tem potencial para induzir a maior qualidade da democracia, há motivos para se acreditar que deva ser estimulada também por meio de possi-bilidades pragmáticas incorporadas às políticas públicas. O processo de desenvolvimento local endógeno seria, portanto, aquele que objetiva um modelo de desenvolvimento caracterizado pela quebra de paradig-mas e modelos exclusivamente econômicos, que pressupõe a agregação de valores identitários das comunidades, que está estruturado a partir de determinado grupo ou em região específica, planejado a partir de elaboração e/ou assimilação pela própria comunidade.

É importante frisar, contudo, que a forma e o conteúdo da gestão social decorrem da materialidade histórica em que vivem os participantes, no sentido local e naquele mais amplo das relações sociais da sociedade capitalista. Assim, a gestão é social porque, além de ser compartilha-da, repousa no reconhecimento e legitimação dos interesses sociais dos participantes, requisitos não isentos de conflitos e contradições.

O incentivo à cultura no Brasil, sobretudo por meio das legislações que possibilitam a participação das empresas, deve ser analisado sob a pers-pectiva das políticas públicas e, por esse motivo, deveria, também, obje-tivar o desenvolvimento local endógeno como estratégia emancipatória.

A explicitação de um objetivo que unificasse as agendas da produção cultural, das comunidades, dos governos e das empresas, por meio das legislações culturais de incentivo, corroboraria a lógica sistêmica impres-cindível a resultados palpáveis de desenvolvimento.

Foi nesse contexto que, no ano de 2008, a área de responsabilidade social do segmento florestal de uma grande siderúrgica solicitou de sua fundação que estudasse uma forma de contribuir para o desenvolvi-mento das pequenas cidades onde atua, por meio de ações beneficiadas por leis de incentivo à cultura.

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A estratégia adotada foi a de estimular processos culturais formativos, durante um período médio de quatro a seis anos, com foco nos resulta-dos de mobilização sociocultural; valorização da identidade e da diver-sidade cultural local; formação e consequente formalização de grupos artísticos; capacitação em planejamento, gestão e em conteúdos artís-tico-culturais e; estimulação da economia local. Para tanto, a empresa deveria se comprometer a investir os recursos incentivados necessários; abandonar modelos de decisão que lhe conferissem o status de pro-tagonista; estimular a participação das comunidades nos processos de formação e, ainda, avaliar, por meio de diálogos com a comunidade, os resultados e aprendizados do processo. Esses princípios que orientaram a elaboração, pela ArcelorMittal BioFlorestas, do programa “Desenvol-vimento comunitário, educação e cultura”, que passou a ser realizado nas cidades mineiras de Abaeté, Martinho Campos, Quartel Geral, Bom Despacho e Dores do Indaiá (no vale do rio São Francisco) e Dionísio, Marliéria, São José do Goiabal e São Pedro dos Ferros (no vale do rio Doce), com a mediação da Fundação ArcelorMittal Brasil.

Para realizar as atividades atinentes ao programa, a ArcelorMittal Bio-Florestas prospectou e contratou, por meio da Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais, de 2008 a 2013, diversos projetos culturais

que previam em seus planos de trabalho atividades que colaboravam, diretamente, para os objetivos planejados.

O segmento de artes cênicas foi selecionado como eixo estruturante do programa devido à oferta abundante de projetos disponíveis para apoio por meio da Lei Estadual de Incentivo e, também, por sua característica polissêmica. Essa polissemia foi estratégica, porque viabilizou o diálo-go com inúmeras expressões artísticas locais: literatura, artes visuais, música etc. A criação dos grupos culturais é um dos resultados do pro-grama: Grupo Babilônia em Marliéria; Coração de Ferro em São Pedro dos Ferros; Nossa Cia. em Dionísio; Cia. Doce em São José do Goiabal; Sapere Arte em Dores do Indaiá; CenAção e Sorriso Feliz em Martinho Campos; QG da Alegria e QG Mirim em Quartel Geral; Engenhos do Teatro em Bom Despacho; e um grupo de estudos em Abaeté.

As etapas, descritas a seguir, estão sendo implantadas em períodos que variaram de acordo com a apreensão das comunidades. Em média cada etapa tem duração de seis a doze meses. Os grupos profissionais cujos

Oficina ministrada pelo ator Camilo Lélis

na cidade de Marliéria. Foto: Arquivo Teatro

Invertido.

Grupo Teatro Invertido (BH) e atores da cidade de Marliéria (Grupo Babilônia). Projeto de formalização de grupos artísticos da ArcelorMittal BioFlorestas. Foto: Elvira Nascimento.

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projetos são disponíveis para apoio por meio da LEIC se revezaram entre as cidades e de acordo com a etapa de formação. O programa previu os seguintes objetivos divididos em etapas complementares.

Sensibilização - Objetivo de apresentar, para a comunidade, conteúdos artísticos que sejam de seu interesse e que gerem aproximação por afi-nidade. Nessa etapa as oficinas, geralmente de pequena duração, têm o objetivo de atrair e despertar a atenção para os temas e para a lin-guagem artística. Foi adotado, como critério imprescindível, a comuni-cação prévia com o poder público (prefeitos e secretários de educação e de cultura) quando foram apresentados os objetivos do programa, as estratégias, os resultados esperados e, eventualmente, demandas es-pecíficas normalmente associadas à cessão de locais para oficinas e/ou apresentações. Nessas ocasiões, sempre surgiram informações acerca de artistas locais, jovens talentos, lideranças comunitárias, manifesta-ções relevantes para a comunidade etc. A partir dessas informações, muitas vezes houve direcionamento do programa para determinadas regiões, bairros ou distritos ou foram privilegiadas parcerias com escolas ou lideranças de forma a potencializar os ativos culturais locais.

Mobilização - Objetivo de identificar e mobilizar pessoas que querem desenvolver habilidades no segmento das artes cênicas e instruí-las nos conteúdos básicos por meio de oficinas de média ou longa duração con-forme a identificação da demanda. Os conteúdos são debatidos com os grupos profissionais formadores (contratados por meio da Lei) e explo-ram a cultura local.

Formação -Objetivo de intensificação dos conteúdos artísticos por meio de oferta regular e de longa duração. Nessa etapa são propostas pes-quisas, diagnósticos, diálogos com instituições e/ou grupos culturais, debates, seminários e parcerias locais que tenham potencial de contri-buir para a sustentabilidade do trabalho. As oficinas, dessa etapa, têm carga horária superior a cem horas/aula. Os participantes são instados a concluir o processo formativo por meio da eleição de uma causa cultural que os motive, normalmente a produção de um trabalho de conclusão que será apresentado à comunidade.

Produção de repertório local - Objetivo de consolidação dos coletivos formados na etapa de Formação. É esperada, além de repertórios artís-ticos mais consistentes, a realização de apresentações dos grupos locais em distritos e a participação dos integrantes em eventos artísticos como

festivais, encontros e seminários.

Avaliação / continuidade - Objetivo de avaliação coletiva do processo formativo e de assunção das responsabilidades de planejamento e ges-tão pelo grupo local. Nessa etapa são esperados os resultados de ela-boração de projetos próprios das comunidades, prospecção de recursos por meio de parcerias locais e participação em editais de microprojetos

Oficina de Bonecos feitos com Cabaça ministrada pelo Grupo Teatro Kabana em Engenho Ribeiro. Foto: Arquivo Teatro Kabana.

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Educação & Sustentabilidade | 5352 | Subtexto . Revista de Teatro do Galpão Cine Horto

e, sobretudo, a formalização dos coletivos em formato jurídico (associa-ção, ONG, microempresa etc.).

Desenvolvimento dos Grupos Profissionais Formadores - Objetivo de contribuir, por meio do patrocínio regular, para que o planejamento dos grupos profissionais possa ser feito em longo prazo, além de viabilizar pesquisas e novas montagens, condição essencial à manutenção dos grupos mas, também, à produção e difusão de conhecimento para os grupos recém-formados nas cidades de atuação da empresa. Outro as-pecto importante foi o aprendizado dos profissionais formadores a par-tir do contato com as realidades locais.

Influência em políticas culturais - Objetivo de estimular os grupos for-mados e formalizados a influenciar as políticas culturais locais por meio da inclusão de propostas junto ao Plano Municipal de Cultura; pleito de orçamento específico da cultura nos planos plurianuais de gestão muni-cipal e adesão ao Sistema Nacional de Cultura. Esta etapa ainda não foi atingida pelo projeto.

O GRUPO TEATRO INVERTIDO FALA SOBRE SUA PARTICIPAÇÃO NO PROJETO

Teatro InCurso: Trilha para a transformação

O projeto Teatro InCurso, idealizado pelo Grupo Teatro Invertido em parceria com a Fundação ArcelorMittal Brasil e com patrocínio da Ar-celorMittal BioFlorestas através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura, iniciou suas atividades no ano de 2011 levando a duas cidades da região do Vale do Rio Doce, Marliéria e São Pedro dos Ferros, uma vivência criativa através dos elementos que constituem a linguagem cênica, ten-do como meta a formação de grupos teatrais nessas localidades. Par-tindo da experiência coletiva do Grupo Teatro Invertido, que em 2014 completa uma década de atuação, o projeto tem como objetivo central trabalhar a conscientização e a preparação do corpo como instrumento criativo para uma vivência em longo prazo.

A sistematização de procedimentos colaborativos para a criação teatral, bem como princípios de gestão, produção e organização internas, de-senvolvidos intuitivamente ao longo de nossa trajetória, estabeleceu-se como o grande desafio metodológico para a estruturação do projeto. Toda a prática pedagógica tem se baseado na dinâmica própria de cada comunidade, tendo como principal repertório criativo a cultura local e o fortalecimento do vínculo dos grupos com suas cidades. Nesse pro-cesso didático continuado, os resultados têm sido alcançados no tempo da artesania. Ao concluirmos seu terceiro ano já reconhecemos uma apropriação autônoma dos alunos-atores, moradores de municípios dis-tantes da capital mineira, portanto, com pouco acesso a programações culturais.

Mais do que grupos teatrais atuantes temos testemunhado o surgimento de artistas-cidadãos conscientes de seus direitos e deveres, valendo-se do teatro, arte coletiva, para expressarem-se sobre seu lugar no mundo. É com muita satisfação que acompanhamos de perto o reconhecimento de que o desenvolvimento local deve se dar não só sob o aspecto eco-nômico. Na medida em que os grupos formados pelo projeto tornam-se

Mostra “Histórias de Cá”. Encerramento da oficina realizada pelo Grupo Teatro Kabana na cidade

de Engenho Ribeiro. Foto: Pedro Vilela

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mais ativos em suas comunidades, estabelecendo parcerias que garan-tam sua sustentabilidade, inclusive com os poderes públicos municipais, vislumbra-se um caminho real de transformação que coloque a Cultura como pauta prioritária nas políticas públicas de municípios do interior de Minas Gerais.

Grupo Teatro Invertido, dezembro de 2013.

O GRUPO TEATRO KABANA FALA SOBRE SUA PARTICIPAÇÃO NO PROJETO

Relato das oficinas no Centro-Oeste de Minas Gerais

Em maio de 2013 o Grupo Kabana deu início a duas Oficinas de Forma-ção Teatral, ambas dirigidas a jovens moradores de duas pequenas co-munidades do centro oeste de MG: Engenho do Ribeiro/Bom Despacho e Buriti Grande/Martinho Campos.

Em ambas, o intenso processo de trabalho (120 horas cada), foi um importante despertar para as artes, para a formação humana e um estí-mulo ao trabalho em grupo. Em pouco tempo, o som de tambores, can-tos, jogos dramáticos, a confecção de bonecos, o circo e ensaios abertos, muitas vezes realizados na rua ou nas escolas, deram novo ritmo e se integraram à vida dessas comunidades.

Realizamos Mostras de encerramento com apresentação de dois traba-lhos bastante distintos, HISTORIAS DE CÁ (Engenho do Ribeiro) é uma coletânea de textos do Sr. Geraldo Rodrigues da Costa, escritor, mora-dor do Engenho. Em cena, bonecos feitos com cabaça contam casos de personagens que fazem parte da memória e da história do Engenho do Ribeiro.

BURITI BRODOWSKI (Buriti Grande) é uma homenagem ao artista Cândido Portinari que viveu na pequena cidade de Brodowski e dali levou as lembranças, as imagens e as cores que pintou. Com música e

texto inspirados em suas telas e poemas, BURITI BRODOWSKI faz uma ligação entre os dois povoados.

Os dois processos estão tendo continuidade.

Grupo Teatro Kabana, dezembro de 2013.

Bibliografia

DEMO, Pedro. Dimensão Cultural da Política Social. Recife: Editora Massangana, 1982.

Drástica, Cia. Relatório de Atividades. Marliéria, 2009.ESTADO DE MINAS (Jornal) – Caderno Prazer em Ajudar – Página 24.

Título: Teatro que transforma realidades – ArcelorMittal investe em projeto de artes cênicas como forma de promover a cultura, a edu-cação e o desenvolvimento local tendo o grupo Terceira Margem como condutor do processo. Texto: Cristiana Andrade. Belo Hori-zonte, 25/06/2013

FISCHER, Tânia. Gestão do Desenvolvimento e Poderes Locais: marcos teóricos e avaliação. Salvador: Casa da Qualidade, 2002.

FURTADO, Celso. O mito do desenvolvimento econômico. São Paulo: Círculo do Livro, 1974.

INVERTIDO, Teatro. Teatro InCurso, Projeto Pedagógico para a região do vale do rio Doce, 2011

INVERTIDO, Teatro. Relatório Final das Oficinas. São Pedro dos Ferros, 2011

KABANA, Grupo Teatro. Relatório de atividades formativas. São José do Goiabal, 2009

MINAS GERAIS. Lei Estadual de Incentivo à Cultura nº 17.615/2008.PNUD. PROGRAMA DAS NAçõES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMEN-

TO. O PNUD e seus objetivos – mandato, objetivos e resultados. Disponí vel em <http://www.pnud.org.br/pnud>. Acesso em 8 mai. 2012.

SACHS, Ignacy. Desenvolvimento includente, sustentável, sustentado. Rio de Janeiro: Garamond, 2008.

Page 29: Protagonismo Educativo em ações interministeriais contemporâneas

56 | Subtexto . Revista de Teatro do Galpão Cine Horto

SANTOS, Boaventura de Sousa. Renovar a teoria crítica e reiventar a emacipação social. São Paulo: Boitempo, 2007.

SEN, Amartya K. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Compa-nhia das Letras, 1999.

TENÓRIO, F. G. (Re)Visitando o conceito de gestão social. In: Silva J. et al. (Orgs.). Gestão social: práticas em debate, teorias em construção. Fortaleza: Imprensa Universitária, 2008.

UNESCO. Declaração da Diversidade Cultural. 2002. Disponível em: <http://www.unesco.org/new/en/unesco/>. Acesso em 1o fev. 2011.

SuSTEnTabiliDaDE na CulTura

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a inSuSTEnTáVEl “lEVEza” Do TEaTro.

Cida Falabella*

Prólogo

(um dramaturgo lê o texto sentado numa cadeira próxima ao público)

Dramaturgo: Escrevo sob o impacto de uma plateia vazia. Não totalmente, mas o suficiente para provocar dor no estômago. Divulgação razoável nos jornais, site, redes sociais, panfletos e cartazes, que ficaram prontos meio em cima da hora. Só faltou o carro de som dessa vez. “Pode ser que isso tenha afetado”. O horário de verão começara na virada da noite anterior. “Pode ser que isso tenha afetado”. Era dia de jogo, os dois times rivais jogavam, alguns atores até ouviam pelo celular, mas que dia não tem jogo, não é mesmo? “Pode ser que isso tenha afetado”. Era um domingo. Não, não estava chovendo, tinha até lua no céu. Pode ser que isso tenha afetado”. Perto dali se instalara o famoso “Circo”, onde sua filha estava trabalhando, quase um trabalho escravo, é verdade, com ingressos a módicos 200 e 100 reais, liquidação que se estendia ao mais famoso ainda “tapis rouge”, realmente para ver tudo aquilo estava super barato. “Pode ser que isso tenha afetado”. No resto da cidade rolava uma ocupação, protestando contra um novo desvario do prefeito, que detestava a arte, os artistas e talvez até mesmo as pessoas. “Pode ser que isso tenha afetado”.

Tudo, absolutamente tudo, nos afeta.

* Cida Falabella é atriz, professora e diretora. Coordenadora da ZAP 18 – Zona de Arte da Periferia. Mestre em Artes pela Escola de Belas Artes/UFMG.

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A montagem dera bastante trabalho desde cedo, as pessoas nem imagi-nam o trabalho que o teatro dá, não é mesmo? Montagem de luz, cenário, som, café, lanche, passar pano no chão, mais café, lanche, organizar o bar, sim, tinha um bar no final pra ver se atraía mais gente, porque, afinal, a cidade era a capital dos botecos. Em cada esquina.

Pessoas que conseguiram não ser afetadas por tudo isso foram. Ao todo, juntando com a equipe, o namorado da bilheteira e os técnicos, eram oito. Pedi que as pessoas se sentassem mais perto, porque era um monólogo e não podiam deixar o ator mais sozinho do que já estava.

E então o espetáculo começou. Aconteceu aquela comunhão que não possui fórmula. As pessoas se emocionaram, participaram, riram. Ali nas bordas da cidade onde a borda transborda. Poucos viram, ficaram sabendo. Afetados por tantos outros motivos, que não servem de des-culpa para aquelas pessoas, que apesar de tudo, continuam fazendo uma arte que interessa a poucos, mas que deve continuar a existir. Como um balão de oxigênio dentro de uma UTI.

A palavra sustentabilidade foi dissecada durante dois dias entre profissionais, estudantes, grupos e pesquisadores de teatro no III Seminário “Subtexto em diálogo - Teatro em Minas Gerais: Educação e Sustentabilidade”, subsidiando o material da presente edição. Passando por abordagens que iluminaram diversos “pontos de mutação” com re-latos de experiências ricas e criativas, o eixo Sustentabilidade na Cultura, pretendeu apontar caminhos para potencializar as experiências, estruturas e práticas desenvolvidas pelo setor teatral no Estado, alinhavando possi-bilidades concretas de compartilhamento, comunicação, continuidade e permanência; com a firme mediação e reflexão crítica do Prof. Dr. José Márcio Barros, da PUC Minas.

Um primeiro painel trouxe a visão de diversos “lugares”: das ações transversais no âmbito da arte e cultura, apresentadas por César Piva da instigante Fábrica do Futuro, em Cataguases, e o êxito na construção de parcerias público-privadas; a economia criativa vista de forma críti-ca, passando pelo mercado e suas relações com a cultura, apresentadas

por Marcos Barreto do Instituto Pensarte; as iniciativas do terceiro setor sobre ações de fomento teatral como a experiência pioneira da Escola do SESC e seu Clube de Espectadores no Rio de Janeiro, apresentadas por Viviane Soledade e por fim o relato de Chico Pelúcio, como artista e agente cultural, abordando a dualidade do conceito e as tentativas que ciclicamente ocorrem, quando grupos se juntam, como na Redemoinho e no Movimento Brasileiro de Teatro de Grupos, para tentar “não sucumbir às dificuldades” e questionar o espaço que tem “através de suas próprias pernas para o fortalecimento coletivo de sua existência”.

No segundo momento cinco estudos de caso ampliaram e aprofundaram o terreno da questão sustentabilidade e seus possíveis sentidos, tratando mais especificamente do fazer teatral, indicando diferentes caminhos tri-lhados: o da formação, da circulação, do espaço cultural, da manutenção de grupo e por fim a especificidade da gestão e planejamento para a área.

Mesa do primeiro painel de palestras sobre Sustentabilidade: (esq p/ dir) Viviane da Soledade, César Piva, José Márcio Barros, Marcos Barreto e Chico Pelúcio. Foto: Guto Muniz.

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O panorama de possibilidades traçado e a energia de experiências tão fantásticas como o caminhão-palco do Teatro de Tábuas (Campinas/SP) e sua multiplicação; a longevidade do Teatro Vila Velha da Bahia, abri-gando diversos grupos e estéticas, marco na cena cultural de Salvador e do país, e a persistência criativa de grupos como Kabana, de Sabará e Manicômicos de São João del Rey sobrevivendo ao alimentar a utopia de se manter como grupo e formar jovens na arte, mostraram que a rein-venção constante das formas de fazer é uma característica fundamental para sobreviver na atividade, desafiando regras e cartilhas de economia.

No segundo dia, com o acúmulo do compartilhamento das experiên-cias proporcionadas, os grupos de trabalho previstos: Circulação e Organização de Eventos, Intercâmbio e Compartilhamento, Políticas Públicas, Financiamento e Fomento, Equipamentos, Infraestrutura e Manutenção de Espaços foram fundidos em um só e trataram de suas realidades. A questão subjacente às falas desde os primeiros painéis emer-

giu com força: quando colocada ao lado da palavra teatro, o mundo do sustento e o da antiga arte (artesanal) começam a se estranhar. Muitas vezes ela embute, dentro dos compêndios dos planos de cultura em ela-boração pelo país afora, o perigoso conceito de auto-sustentabilidade. E a auto-sustentabilidade do (e no) teatro é quase uma utopia. Ou de certo teatro, ligado à pesquisa, aos coletivos, aos trabalhos em longo prazo. Essa forma de fazer teatro já nasce deficitária. Os espaços dos grupos são pequenos, existe o desejo de ter uma relação mais próxima com o espectador, o valor do ingresso e o seu poder de impactar a atividade foram esvaziados pelas leis de incentivo, os processos de montagem exigem tempo e pesquisa. A população mineira, que com a estabilidade econômica vê aumentado o seu poder aquisitivo, não tem o hábito de ir regularmente ao teatro. O binômio teatro-educação ainda é um esforço isolado de professores, coordenadores, grupos culturais e alguns governos mais sensíveis à causa.

Em 1920 o cômico alemão Karl Valentim, uma das principais influências de Bertolt Brecht na elaboração do conceito de distanciamento se per-guntava: “Porque os teatros estão vazios?” e defendia uma ideia singular:

Se cada um de nós se visse obrigado a ir ao teatro, as coisas mudariam

completamente. Por que não instituir o teatro obrigatório? Por que ins-

tituímos a escola obrigatória? Porque nenhum estudante iria à escola se

não fosse obrigado. [...]

Instituindo Estado por Estado o teatro obrigatório, nós transformaríamos

completamente a vida econômica. Porque não é absolutamente a mesma

coisa se perguntar: “Será que eu vou ao “teatro hoje?”, ou dizer: “Eu

tenho que ir ao teatro.” O teatro obrigatório levaria o cidadão a renunciar

voluntariamente à todas as outras distrações estúpidas como, por exemplo

o jogo de peteca, de cartas, as discussões políticas de botequim, encontros

amorosos e todos esses jogos sociais que tomam e devoram nosso tempo.

É somente por lei que podemos obrigar nosso público a ir ao teatro. Nós

tentamos anos a fio convencê-los com boas maneiras, e eis o resultado.

Golpes publicitários para atrair a multidão, como: “Ar refrigerado perfeito”,

ou então: “É permitido fumar durante o intervalo”, ou ainda: “Estudantes,

professores, aposentados e militares, do general ao raso pagam meia.”

Com todos esses truques não conseguimos encher salas, vejam vocês. E

Mesa do segundo painel de

palestras sobre Sustentabilidade:

(esq. p/ dir.) Romulo Avelar, Jorge Braz,

José Márcio Barros, Angela Andrade, Mauro Xavier e

Juliano Pereira. Foto: Alexandre Hugo

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tudo que iríamos gastar para fazer publicidade será economizado, pois o

teatro será obrigatório.

Peter Brook, em 1950, trilhando o mesmo caminho paradoxal, o de re-negar a própria atividade, nos faz dialeticamente pensar na “inutilidade” de nosso ofício:

A crise é evidente. Hoje em dia, é possível realizar de maneira satisfatória uma grande variedade de peças; no entanto, quem for honesto consigo mesmo há de saber muito bem, no fundo, que o que está fazendo é totalmente inútil. O que nos move é um simples impulso pessoal. Há cinquenta anos atrás, acreditava-

-se na arte pela arte e na arte para o artista, isto é, que o artista existia tanto para si mesmo quanto para os outros. Hoje damo-nos conta de que, individualmente, somos facilmente substituídos. [...] A terrível verdade é que, se todos os teatros deste país fossem fechados de repente, haveria apenas uma sensação coletiva e cortês de falta de alguma comodidade civilizada, assim como

nos fariam falta o ônibus ou a água da torneira. A emoção, a indignação emanariam do contribuinte. Ter-se-ia talvez um as-sunto de conversa a menos. Mas será que haveria um verdadeiro protesto, a sensação de que algo “está fazendo falta”? Uma

“fome”? (grifo meu)

Se parece que o teatro interessa a tão pouca gente de que sustentabi-lidade podemos falar? Na discussão dos grupos, seja da capital ou do interior, presença forte no encontro, constata-se a sustentabilidade como uma necessidade e esforço em manter vivo algo que a maior parte da sociedade ignora, pensando a arte e o teatro como bem público. No século XXI, o teatro só é sustentável, tanto econômica quando artisticamente, se seus fazedores combatem, literalmente, em três frentes que dialogam:

- colaborando entre si, criando redes de trocas e criação compartilhada, nas quais a moeda é o trabalho e os ativos de cada coletivo;

• organizando-se para elaborar, cobrar e fiscalizar a implantação de políticas públicas eficazes para tratar a arte e dentre elas especifica-mente o teatro, por suas características intrínsecas, como direito do cidadão, tal como saúde e educação.

• estabelecendo laços sólidos com a Educação, em âmbito municipal, estadual e federal, para a realização de projetos permanentes de for-mação de plateias, e sensibilização estética através do teatro, oficinas de teatro-educação para alunos e professores.

E continuar acreditando em um teatro utópico e possivelmente insus-tentável, fazendo coro às palavras do escritor brasileiro Luís Rufatto na Feira do Livro em Frankfurt, quando atribui à arte, um papel capital para transformar pessoas e, transformando-as, transformar a sociedade desigual em que vivemos.

Eu acredito, talvez até ingenuamente, no papel transformador da literatura. Filho de uma lavadeira analfabeta e um pipoquei-ro semianalfabeto, eu mesmo pipoqueiro, caixeiro de botequim, balconista de armarinho, operário têxtil, torneiro-mecânico, ge-rente de lanchonete, tive meu destino modificado pelo contato,

Participantes doSeminário discutem

a sustentabilidade no teatro. Foto:

Alexandre Hugo

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embora fortuito, com os livros. E se a leitura de um livro pode alterar o rumo da vida de uma pessoa, e sendo a sociedade feita de pessoas, então a literatura pode mudar a sociedade. Em nossos tempos, de exacerbado apego ao narcisismo e extremado culto ao individualismo, aquele que nos é estranho, e que por isso de-veria nos despertar o fascínio pelo reconhecimento mútuo, mais que nunca tem sido visto como o que nos ameaça. Voltamos as costas ao outro --seja ele o imigrante, o pobre, o negro, o indíge-na, a mulher, o homossexual-- como tentativa de nos preservar, esquecendo que assim implodimos a nossa própria condição de existir. Sucumbimos à solidão e ao egoísmo e nos negamos a nós mesmos. Para me contrapor a isso escrevo: quero afetar o leitor, modificá-lo, para transformar o mundo. Trata-se de uma utopia, eu sei, mas me alimento de utopias. Porque penso que o destino último de todo ser humano deveria ser unicamente esse, o de alcançar a felicidade na Terra. Aqui e agora.

Nesse contexto a existência de um teatro que se contrapõe ao mercado, que questiona o modo como esse mercado se organiza, que revela o processo de construção dos espetáculos e se preocupa com sua recepção, ainda que tenha dificuldades na sua sustentabilidade, torna-se fundamen-tal, resistindo contra tantas intempéries.

Bibliografia

BROOK, Peter. Em busca de uma fome. Cadernos de teatro, [s.l.], n. 96, p. 1-8. jan. 1983

Discurso de Luiz Ruffato na Feira do Livro de Frankfurt 2013. Acesso em: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,leia-a-integra-do-discurso-de-luiz-ruffato-na-abertura-da-feira-do-livro-de-frank-furt,1083463,0.htm

VALENTIM, Karl. Porque os teatros estão vazios. Revista Ensaio Aberto/MTG, nº 01. 2013.

ESSEnCialiDaDE E SuSTEnTo

Jorge braz*

Algumas informações importantes e peculiares precisam ser postas antes de se analisar a experiência de sustento de um coletivo. A primeira é que, quase sempre, não é possível replicar o modus operandi, pois as soluções encontradas, comumente, estão concentradas ou na natureza criativa, ou na virtuose individual ou na complexa fotografia sociocultural do coletivo; alicerçada na política pontual oportunizada nos momentos históricos des-tes grupos. A segunda, e fundamental, é que toda experiência negativa destes coletivos é mais relevante que as positivas na análise e aprendizado para outras abordagens. Pois é no entendimento daquilo que é obstáculo comum que deve se basear a construção de qualquer outra experiência. A Terceira e tão importante quanto as outras é a compreensão objetiva (emocional e prática) de cada coletivo do que é “ sustento “ para seus membros e a contabilização do que costumo chamar de ativos intangíveis nos momentos de se analisar o balanço das atividades.

Posto estes preceitos, vamos navegar pela nossa interpretação do con-ceito de sustentabilidade. Minha compreensão de sustento está ligada, diretamente, ao equilíbrio rígido entre: Ética, Estética, Dialética e Práticas. Nunca nos seduziu separar quaisquer destas importantes metas na cons-trução de um produto criativo. A diferença básica dos meios de sustento da arte para outros segmentos da sociedade é que nosso maior valor é o uso da propriedade imaterial que cerca nossas atividades. A confusão e dificuldade dos coletivos entenderem seu papel na sociedade, suas verdadeiras ambições e publicar interna e externamente seus valores, desejos e objetivos dificulta ainda mais o equilíbrio necessário ao sustento das práticas.

* Jorge Braz é fundador do Teatro de Tábuas (Campinas.SP). Formado em Letras e Artes Cênicas pela Universidade Federal de Pernambuco. Tem seu trabalho voltado para a criação de coletivos artísticos que promovam ações e atitudes de democratização do acesso a bens culturais de qualidade. Gestor Cultural, dramaturgo e diretor de vários projetos ligados a itinerância e ocupação do espaço público.

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A questão inicial, sempre é a mais difícil de se responder. Por que esta-mos juntos? Qual a essência criativa deste coletivo? Quais as regras que regulam nossa ética artística diante da realidade social e financeira do ambiente em que vivemos? Saber por que se está junto é fundamental para a longevidade de um coletivo, pois é no tempo que são apuradas as boas experiências criativas, é na lida com os desgastes impostos pelo tempo que conquistamos a maturidade e a potência para transformar criatividade em produto criativo.

Compreender a essência que une o coletivo é a única forma de coletivizar as potências individuais e direcioná-las há um lugar central e invisível, que alimenta as diferenças em prol de um bem artístico em construção. Também nos alimenta e energiza para compreender a importância das diferenças dentro de um processo coletivo. Um bom coletivo é aquele que consegue superar crises baseadas nas diferenças e cria mecanismos de valorizar a permanência delas, individualmente, como força motriz e enriquecedora e que não tenta uniformizar seus indivíduos.

Por fim estabelecer, claramente, objetivos práticos e regras de como se entrega o bem criativo deste coletivo ao mundo. Protegendo a todos das dúvidas permanentes dos coletivos artísticos e do meio artístico sobre o

debate interminável: O que é Arte e o que é produto? Como se houvesse uma instância para decidir ou julgar!

Quando fundei nossa experiência, depois de longo período desgostoso com outras formas de associação coletiva, me alimentei de vários desejos e firmei alguns como essenciais. Feito isso publiquei, incisivamente, aos que chegaram meus desejos principais, o que acabou se transformando na ética e desafio da nossa história.

Foram estas nossas escolhas:

1. Trabalhar com não atores e desenvolver formação baseada na expe-riência do coletivo.

2. Inverter o fluxo da produção de bens culturais que sempre foi da capital para o interior.

3. Circular e fazer fruir estes bens a cidadãos e localidades aonde eles, tradicionalmente, nunca chegam!

4. Construir bens culturais em formatos que possam ser compreendidos pela realidade das pessoas atingidas, pelos poderes públicos e apoiadores. Gerando sustento e experiências que pudessem se tornar modelos de políticas públicas.

Depois de 15 anos cravados com intensidade em nossos corpos e mentes temos um balanço de conquistas que nos agradam. Nossa maior conquis-ta, de longe, foi a formação ética, estética e humana dos que passaram por aqui. Escolhemos como lema, registrado em nossas comunicações diárias e internas o seguinte dizer: “Todas as dificuldades sempre. Paciente e generosamente, pois sabemos onde queremos chegar!”.

Como frase obrigatória em cada movimento de comunicação interna. Sempre nos lembrávamos de nossas escolhas. Escolhendo os caminhos mais espinhosos, desenvolvemos uma braveza e rusticidade que se tor-naram uma carapaça impenetrável que nos protegeu do mundo para o mal e para o bem. A difícil escolha de fazer arte enquanto se constrói o repertório do artista e sua formação humana foi uma desafiadora dinâmi-ca e fez com que, rotineiramente, sofrêssemos com idas e chegadas. Mas

A carreta do Teatro de Tábuas em

circulação pelo país. Foto: Arquivo Teatro

de Tábuas.

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foi também esta escolha que nos permitiu romper com os mecanismos tradicionais de sustento. Quando deixamos de nos importar com o que as regras de Mercado impunham e com o que a realidade nos oferecia, criamos um perigoso e delicioso jogo de criar utopias.

Foi assim, questionando o poder público pela ausência de políticas per-manentes e ao mesmo tempo o chamando à parceria, provocando o setor privado com propostas inovadoras e com alto grau de responsabilidade corporativa, com um projeto de formação de público e inversão da lógica capital-interior que, lentamente, fomos somando pequenas e penosas conquistas ao nosso currículo. Fizemos da utopia e do impossível uma realidade concreta! O fato é que isso implica na tomada de decisões complexas e onerosas a um coletivo artístico. Tivemos que aprender a administrar, a planejar, a construir, a gerir. Precisamos nos forçar a desenvolver novas inteligências, novas tecnologias e mais responsabili-dades civis, criminais e financeiras. Mesmo que no primeiro momento nossas escolhas tenham sido meramente artísticas e sociais, tivemos que acrescentar outras tantas escolhas no caminho e para idealizar e realizar, sangrar as dores da generosidade.

Claro que estas escolhas nos custaram uma lentidão maior nas buscas internas e individuais, claro que “tudo ao mesmo tempo agora” não é possível. Costumo dizer aos remanescentes da odisseia utópica deste lugar que somos construtores de cenários… Precisamos construir nossa casa para abrigar com segurança nossos sonhos criativos. Descobri logo cedo, baseado na biografia de vários mestres que tive, que artistas que esperam da realidade a viabilização de sua obra criativa, acabam mar-tirizados e amargos nas margens da Estrada! Também olhamos para o lado e percebemos um movimento histórico de coletivos que eclodiram na década de 1980-1990 com os mesmos paradigmas, mesmo que com escolhas diferentes. Enxergamos coisas maravilhosas em curso, que hoje se tornaram ícones de um questionamento sobre o modelo de financia-mento de coletivos artísticos. Não citarei nomes para não causar injustiças com tantos outros.

Pois bem, construímos parcerias públicas e privadas, tecnologias inova-doras e conseguimos materializar projetos que provem nossas expec-tativas artísticas e sociais, que agradam nossos apoiadores financeiros, que apoiam positivamente políticas de formação de público. Somados a isso construímos uma rede gigantesca de parceiros irmãos que lutam por suas causas e essências e que trilham sua própria história e desafios de sobrevivência. É bom lembrar que também criamos desafetos! Como em todos os setores da vida. Colocar com propriedade e virilidade ideias

A carreta do Teatro de Tábuas se transforma em

estrutura inflável para receber o público.

Foto: Felipe Freitas.Auto de Natal realizado pelo Teatro de Tábuas em 2008. Foto: Zé Evaristo.

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no mundo é também oferecer a face à incredulidade, à imaturidade e , por que não dizer, às maldades e invejas alheias!

Hoje somos uma companhia que apesar de não estar assentada nos grandes centros, não circular por eles, não possuir nomes estelares que possuam força midiática, existe fortemente comprometida com as causas da sua fundação. Possuímos três grandes projetos de criação e circulação que tem agenda antecipada em um ano, portanto, segurança e desafios permanentes para os envolvidos. Possuímos um extenso rol de boas prá-ticas relacionadas a modelos de política pública, mesmo reconhecendo a dificuldade de convencer os gestores a aplicá-las. Possuímos um sem número de patrocinadores privados que confiam e nos apoiam nestas experiências. Possuímos um invejável potencial de manter unidas pesso-as que pensam mais no coletivo e na essência do que em seus projetos pessoais e individuais. Possuímos o reconhecimento público sem nenhum apoio midiático. Possuímos um desejo jovem e, ainda, fortalecido de renovar nossas metas e ambições e continuar experimentando.

Ter todas estas posses em um país com hábito cultural inconsistente, em um Mercado Cultural com regras duras, sem uma política pública alvis-sareira, segura e construtiva, é nossa grande contribuição na vida. Sem romantismo exacerbado nem a sensação pessimista de que tudo está por fim, sentimos que a casa permanece em construção.

a SuSTEnTabiliDaDE a parTir Da ExpEriênCia Da Cia. TEaTral maniCômiCoS

Juliano pereira*

No trajeto do convite ao encontro, o pensar amplo da sustentabilidade nos 15 anos da Cia. Teatral ManiCômicos. No encontro com artistas e pensadores, a reflexão se estende, se aprofunda. Na volta, tento organizar a síntese: nesse momento da história do grupo, pensar na sustentabilidade provoca a reflexão sobre quem somos e o que queremos. Sustentar o quê? Não é uma crise, mas uma urgência em respirar, refletir, conversar.

Nas linhas abaixo, vou contar um pouco da trajetória desses 15 anos de ManiCômicos, e olhar um pouco para alguns aspectos do grupo que deram sustentação a essa trajetória, sendo eles: o desafio artístico, a arte do encontro, a dinâmica da organização do grupo, a personalidade jurídica, a capacidade de gerar e gerir recursos e, por fim, o convívio.

A história do ManiCômicos em 3 movimentos

Em 1998, cinco jovens artistas se uniram a um diretor de teatro para fundar a ManiCômicos. Na bagagem dos jovens artistas, uma vontade corajosa de se arriscarem pelos campos do teatro; na bagagem do diretor, uma formação em Artes Cênicas pela USP, uma pesquisa em estudos do movimento iniciada com Klaus e Rainer Vianna e continuada com alguns discípulos de Rudolf Laban, e uma experiência de criação coletiva e de jogo teatral em cinco intensos anos de Troupe de Atmosfera Nômade,

* Juliano Pereira é ator e diretor. Fundador da Associação Cultural ManiCômicos – Arte por Toda Parte (SJ Del Rei/MG). Formado em Artes Cênicas pela Universidade de São Paulo.

Público infantil assiste a

espetáculo dentro do teatro-carreta.

Foto: Arquivo Teatro de Tábuas.

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significativo grupo paulistano dos anos 90 capitaneado por Cristiane Paoli-Quito. No encontro dessas bagagens foi se desenrolando a pes-quisa do jovem grupo, que cria um espetáculo, “A Farsa do Cangaço”, uma adaptação livre da “Farsa do Advogado Patelin”. A decisão era: ao invés de ir para o centro da cidade de São Paulo e provavelmente seguir a lógica do nenhum dinheiro e quase nenhum público, fomos para a periferia da zona sul da cidade, aonde também não teríamos nenhum dinheiro, mas teríamos muito público. E fomos para as praças, escolas, parques, ruas, centros comunitários, favelas. Apesar da simplicidade do texto e da montagem, que queríamos que coubesse em qualquer lugar, queríamos um encontro social, político, lúdico e estético.

2005 (início do processo de mudança para São João del-Rei)

Em 2005, havíamos encerrado três anos de parceria com a Secretaria Municipal de Educação da Região Sul da cidade de São Paulo, parceria esta que proporcionou que levássemos espetáculos teatrais do grupo para mais de 300 mil estudantes da rede pública. Na mesma parceria, o grupo manteve, só em 2004, oficinas teatrais, com aulas todas as semanas ao longo do ano, em 28 bairros da região.

Continuávamos nossa pesquisa teatral, nossa criação, produzindo es-petáculos variados. Misturamos Brecht (Sr Puntila e seu criado Matti) a Commedia dell’Arte, com máscaras em couro criadas e confeccionadas por nós; Dostoievsky com o teatro popular; Durrenmat a um estudo sobre a loucura. Mas foi inspirado pelo físico austríaco, Fritjof Capra, com um roteiro baseado na “Peste” de Albert Camus que criamos o espetáculo

“Perfeição” que levava o caos de uma cidade sitiada para as ruas. Este espetáculo abriu espaços para o grupo no Brasil e fora.

No entanto, em 2005, a vontade de alguns integrantes do grupo (3 dos 4 fundadores ainda presentes na época) de busca por uma qualidade de vida melhor, fez com que o grupo começasse um movimento de mu-dança para São João del-Rei. Na partida, os remanescentes fundaram outro grupo, e o ManiCômicos, com nova sede, começou o processo de

“mineirizar-se”, tanto nos processos, como nos conteúdos.

2013 (novas e próximas perspectivas)

Atualmente, em São João del-Rei, o grupo mantém o Espaço Cultural ManiCômicos (Ponto de Cultura) que recebe eventos de música, cinema, dança e teatro. O Projeto Arte por Toda Parte está presente em 13 cidades da região, oferecendo aulas de artes (teatro, música, dança, circo, artes plásticas, literatura) a mais de 2.000 crianças e jovens. Em parceria com SATED – MG, o grupo oferece um curso técnico em teatro, que já está na sexta turma. No último 25 de outubro, estreou em Barroso o espetáculo

Cia ManiCômicos encena a peça ‘O

Grande Dia’. Foto: Nathanael Andrade.

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de circo teatro “A Flor de Manacá”. O Grupo Experimental ManiCômicos tem se apresentado nas cidades da região com o também novo espe-táculo “Terno” que traz três textos de Arthur Azevedo embalados por músicas românticas da melhor qualidade. Os espetáculos “A Fada, a flor e a princesa”, infantil, e “Domdeandar”, para a rua, continuam circulan-do. O ManiCômicos hoje, agrega mais de quarenta participantes, entre educadores, artistas e produtores e prepara para o final de novembro e início de dezembro de 2013 um Encontro de Grupos de Teatro.

A sustentabilidade. Como e o que tem mantido a Cia. Teatral ManiCômicos

A criação

Um dos principais sustentáculos do grupo, o que nos uniu a princípio e reúne esse corpo artístico, que hoje é formado não só por atores, mas também por músicos e artistas plásticos, é a criação. O desenvolvimento de ideias e formas para a cena.

A criação em processo colaborativo entre diretor-dramaturgo e atores. A pesquisa constante do estar em cena, do jogo, do improviso, de uma técnica corporal baseada nos estudos de Rudolf Laban. E a pesquisa não se encerra. Novos elementos são incorporados, ora no treinamento semanal, ora na pesquisa de um espetáculo específico, tal como agora, quando estamos recebendo periodicamente a visita de uma especialista em Feldenkrais, técnica que acreditamos poder ser incorporada ao nosso treinamento básico.

E os conteúdos – a cada novo espetáculo, um novo mergulho.

Como criamos? Pensamos num tema. Pesquisamos o máximo de coisas relacionadas ao tema e depois experimentamos essas ideias na sala de ensaio em um processo orgânico. Todos os elementos são explorados ao mesmo tempo e a partir de criações de cenas, improvisos e jogos, vai se costurando a trama, a história, os diálogos.

Paralelo a pesquisa, a Companhia sempre manteve cursos para jovens e adultos interessados em teatro. Uma maneira de partilhar a experiência criativa do grupo e de conhecer novos atores.

O encontro

Desde o início em 1998, a Cia. ManiCômicos resolveu ir ao encontro de uma nova plateia. Levou o teatro para onde ele pouco ou nunca acon-tecia. Despertou o interesse e reafirmou-o com o retorno às mesmas praças. Percebendo a avidez desta plateia, ofereceu em vários bairros por onde passava oficinas teatrais, dando a oportunidade a crianças e

Juliano Pereira ministra oficina para educadores em São João Del Rey. Foto: Priscila Natany.

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jovens, principalmente àqueles oriundos de regiões economicamente menos favorecidas, de criarem, inventarem, se expressarem por meio do teatro. Este encontro com o público, principalmente em sala de aula, foi determinante na caminhada. Despertou-nos para a realidade, nos deu uma visão mais abrangente de nosso país e suas mazelas sociais, econômicas e políticas, e isso dialogou e dialoga com a nossa criação.

Hoje, esses caminhos da arte e da arte-educação dentro do ManiCômicos têm se encontrado cada vez mais, se informando e se transformando em uma coisa só, num caminho só, no caminho do ManiCômicos, onde as duas ideias, do artista e do educador, se completam.

Organização

Somos pessoas de teatro, artistas. Então, como administrar um grupo? Quem faz o quê?

O movimento constante de achar um jeito de se organizar – qual a di-nâmica? Como dividir as funções? Qual modelo seguir ou descobrir o nosso próprio modelo (que hoje é tema de estudo do curso de economia da UFSJ)?

O sonho: que alguém venha resolver para a gente. Mas esse alguém nunca chega.

E vamos construindo a nossa maneira, na maneira possível, de nos or-ganizarmos. Nessas idas e vindas, o ManiCômicos vem sempre se reor-ganizando. Um troca de função com o outro; agimos ora vertical, ora horizontal; chamamos especialistas ou assumimos a responsabilidade de tudo. E temos que escrever projetos, fazer reunião de captação, preencher planilha de prestação de contas...

Personalidade

Outro desafio para a nossa sustentabilidade é a definição de nossa per-sonalidade jurídica. Encontrar a maneira para interagirmos com o Estado. Já fomos grupo informal, mas com propostas de contratações, viramos produtora. O trabalho voltado ao social nos convenceu a virar uma ONG, entidade sem fins lucrativos, e desde esse ano, com título de OSCIP. Mas uma ONG não contempla a participação efetiva dos sócios, e estamos pensando em cooperativa. No entanto, estamos convencidos que falta personalidade jurídica para nós. Um debate deveria se organizar para que grupos de teatro pudessem ter uma personalidade jurídica que desse conta exata de suas responsabilidades trabalhistas.

Recursos

Temos que viver do nosso trabalho!!! Isso é, pagar as nossas contas com o dinheiro que ganhamos no trabalho do ManiCômicos. Esse princípio tem nos orientado desde que decidimos viver só de ManiCômicos. Isso tem tempo e significou algumas graves crises financeiras pessoais.

Cia ManiCômicos ministra oficina

de teatro em comunidade. Foto: Arquivo do grupo.

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Atualmente, as atividades do ManiCômicos são possíveis graças a progra-mas de doação de recursos, tais como Amigo do ManiCômicos (qualquer quantia) e Adote uma turma (empresas e entidades que por R$ 300,00/mês mantêm uma turma); parcerias com prefeituras e entidades na construção de projetos comuns de acessibilidade à arte; e editais.

O desafio da sustentabilidade financeira é grande quando Estado e en-tidades promotoras da cultura mantêm políticas de balcão, esperando os nossos projetos, ao invés de correrem o Brasil, percebendo o que já

é feito e ajudando a esses heroicos grupos a manterem seus projetos. Lutamos no ManiCômicos não só pela descentralização dos recursos, mas também para que se enxergue esse país continente na sua grandiosidade e pluralidade. As circulações e trocas são importantes, nós gostamos bastante. Como desvelar esse país? Convidamos a vir a São João para conhecer nosso trabalho.

Cia. ManiCômicos no espetáculo ‘Borgobandoballo’. Foto: André Fossati

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O convívio

Por fim, o último pilar de sustentabilidade é o do convívio, do cuidado das relações humanas. Construção constante e desafiadora, talvez o mais complicado dos pilares.

Conclusão

Os desafios do ManiCômicos hoje, que a ida e a vinda do encontro ajudaram a perceber, são: a necessidade de se reconhecer nas poten-cialidades (quem somos) e nas vontades (o que queremos). Olhar para o futuro, após tantas chegadas e partidas importantes, perceber que se antes éramos um grupo de amigos, outrora quase uma família, hoje somos pessoas em torno de um ideal que o tempo ajudou a lapidar e clarificar. E precisamos juntos desse novo coletivo, pensar os próximos passos dessa caminhada.

CulTura E SuSTEnTabiliDaDE:Desafios, práticas e futuros

José márcio barros*

Este texto é um ensaio livre, fruto da escuta atenta que realizei das refle-xões e experiências sobre o tema cultura e sustentabilidade, apresenta-das por Cesar Piva, da Fábrica do Futuro de Cataguases (MG); Marcos Barreto do Instituto Pensarte (SP); Viviane da Soledade do SESC (Rio); Chico Pelúcio e Rômulo Avelar do Grupo Galpão de BH (MG); Juliano Pereira do Associação Cultural ManiCômicos de São João Del Rey (MG); Ângela Andrade do Teatro Vila Velha de Salvador (Ba); Jorge Luís Braz do Teatro de Tábuas de Campinas (SP); Mauro Xavier do Grupo Kabana de Belo Horizonte (MG).

Sua organização em três tópicos constitui apenas uma forma de orga-nização linear de um texto que foi inspirado em um processo circular e dinâmico de reflexão.

1. O cuidado conceitual: a necessidade de ampliação e aprofundamento sobre sustentabilidade e cultura

Falar da relação entre a cultura e sustentabilidade hoje, é abordar mais do que uma possibilidade: uma necessidade para muitos e já uma realidade para alguns. Entretanto, apesar dos termos serem conjugados em nossos discursos com muita facilidade e otimismo, articulá-los na prática, parece não ser nada simples e imediato. Requer clareza conceitual, estratégia e práticas coerentes.

* José Márcio Barros é Professor e Pesquisador da UEMG e PUC Minas. Coordenador do Observatório da Diversidade Cultural. [email protected]

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Falar de sustentabilidade remete necessariamente a alguns valores, prin-cípios e compromissos, independentemente do setor da realidade a que está associado.

De forma genérica, é possível dizer que sustentável é aquilo que promove as condições de continuidade. Na maioria das vezes, o termo está asso-ciado às questões ambientais e às questões orçamentárias. Sustentável ora é tomado como aquilo que permite que a vida tenha prosseguimento. Ora é visto como aquilo que não dá prejuízo financeiro. Tais concepções são, contudo, insuficientes e, muitas vezes, redutoras. Mesmo assim, em ambas encontramos uma mesma perspectiva: sustentabilidade como um modelo de articulação renovável entre meios e fins, um “ciclo-de-vida” que tende ao equilíbrio.

Sustentabilidade requer, portanto, a integração entre princípios humanistas e pensamento holístico, ou seja, compromissos com o desenvolvimento da condição humana e a capacidade de pensar e agir de forma articulada entre as partes e o todo.

No campo da cultura, sustentabilidade nos remete necessariamente ao enfrentamento de desafios de renovação de valores e reinvenção de práticas. Atualmente, essas são questões demasiadamente reduzidas e esgarçadas pelo modelo dominante de financiamento e fomento às atividades artísticas e culturais, centradas, de modo excessivo, nas leis de incentivo fiscal e na dependência de ações governamentais.

Arriscaria dizer, que sustentável no campo da cultura, é aquilo que re-sulta de uma cultura da sustentabilidade. É a forma como adotamos, no campo da cultura, os princípios básicos desse conceito, e a maneira como, assim fazendo, contribuímos para a manutenção da condição humana. Há aqui uma dupla implicação: o modo como a cultura se organiza de forma sustentável e a maneira como contribui para a sustentabilidade.

Pensando desta forma, pode-se dizer que a articulação entre cultura e sustentabilidade abarca, como propaga o documento Agenda 21 da cultura1, um conjunto de 4 compromissos.

•  com os direitos humanos;•  com a proteção e promoção da diversidade cultural;•  com a democracia;•  e com a paz social.

Resulta desses compromissos, um modelo de organização sistêmica que trabalha com a complementaridade entre as dimensões econômicas, so-ciais e ambientais de forma a promover inclusão social, desenvolvimento econômico e proteção dos recursos naturais.

Assim, a sustentabilidade no campo cultural demanda a capacidade de articulação e convergência de forma a garantir o duplo sentido aqui proposto, uma ação cultural sustentável e a contribuição da cultura para um mundo sustentável.

1 IV Fórum de Autoridades Locais de Porto Alegre para a Inclusão Social, no marco do Fórum Universal das Culturas – Barcelona 2004, disponível em http://pnc.culturadigital.br/wp-content/uploads/2012/10/2-agenda-21-da-cultura.pdf

Mesa do II Seminário Subtexto em Diálogo

com: Viviane da Soledade, José Márcio Barros

(centro) e Chico Pelúcio.Foto: Guto Muniz.

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•  Algumas perspectivas e ações estratégicas oferecem maior susten-tabilidade, na medida em que: se articulam com o campo da educação, seus sujeitos e instituições e priorizam o trabalho com a juventude;

•  desenvolvem o compromisso com a inovação – a busca de soluções que se apropria de novas possibilidades tecnológicas e científicas;

•  compreendem a economia da cultura em seus diferentes setores e arranjos produtivos;

•  emergem de setores progressistas da sociedade civil, mas se rela-cionam com políticas públicas de cultura;

•  trabalham com a perspectiva da interconectividade, priorizando as ações que produzem efeitos de expansão rizomática;

•  investem em ações locais, mas promovendo integração consorciada entre instituições, com temporalidades e espacialidades diferentes e complementares – consórcios intermunicipais, por exemplo;

•  oportunizam ações de formação contínua e prática, de forma a garantir alteração de valores e experimentação de soluções.

2. Os sentidos do que se busca fazer: cultura, arte e política

Os relatos sobre os caminhos de sustentabilidade nas ações culturais evidenciaram outra questão central e geradora de desdobramentos: a relação complexa entre o conceitual, o estratégico, o artístico e o político.

Nas trajetórias de trabalho relatadas, fica evidente que a estética se configura como uma questão política, uma escolha ideológica e subje-tiva nos modos de se fazer, de se buscar a fruição, nas maneiras de se agenciar o possível e o transcendente. O trabalho artístico e cultural dos diversos grupos revela uma ação estética tomada aos moldes de Deleuze e Guattari, como potências que transbordam regimes de normalidades. O que mais se ouviu no encontro, foi a busca da superação do previsível, da ultrapassagem dos regimes tradicionais de representação, de forma a

fazer da ação artístico-cultural, o compromisso com possibilidades cria-doras e transformadoras. Aqui, sustentabilidade inclui todos os atores da cena e da cadeia produtiva das artes. Para além de artistas, produtores e patrocinadores, o público é central, não como alvo, mas como parceiro, elo de expansão e concretização de possibilidades. Falar de formação de públicos e viabilização de práticas culturais revelou-se como uma das faces da perspectiva da sustentabilidade, entendida também como diminuição dos riscos de existência. E isso, no campo da produção cultural remete ao enfrentamento de questões como: De que forma diminuir a dependência de editais de financiamento? Como romper o ciclo perverso de calendários fiscais determinando processos criativos?

Dada a complexidade, uma questão parece ser óbvia: sustentabilidade é construção de redes de sustentabilidade. Ninguém se afirma sustentá-vel no isolamento e individualidade. Mas, ainda há espaço para recriar práticas coletivas que agem no sentido de diminuir a vulnerabilidade? A sustentabilidade como rede sugere uma capacidade de articulação entre os diferentes e convergentes que possuem discernimento político e cuidados conceituais e metodológicos.

O gestor cultural Cesar Piva fala sobre sua experiência à frente do projeto ‘Fábrica do Futuro – Incubadora Cultural e Residência Criativa’ no III Seminário Subtexto em Diálogo. Foto: Guto Muniz.

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Debater a sustentabilidade exige o reconhecimento de que o modelo dominante de financiamento da cultura no Brasil formatou nossa sub-jetividade e nossos modelos de ação, tornados tímidos, oportunistas e limitados. E isso afeta o estético, entendido como mais que o artístico, o simbólico tecido junto ao político. Sustentabilidade não é uma questão de sustentação, mas de permanência.

Se é possível reconhecer uma evolução nas práticas artísticas, culturais e nos relacionamentos com as forças e instituições de fomento e financia-mento à cultura, que respondem às transformações políticas, econômicas e culturais da sociedade, tais mudanças, que se mostram radicais em alguns setores, ainda permanecem exceções no todo. Aqui encontramos limitações e desafios.

Isso nos leva a pensar que o problema não é o que alguns grupos, ou algumas empresas e instituições realizam, mas aquilo que ninguém faz, especialmente a ausência de políticas públicas permanentes e efetivas. Para se transformar a realidade é necessário radicalidade e coragem. O financiamento colaborativo só se apresenta como uma alternativa po-tente se for a expressão do protagonismo do “faça você mesmo”, com os valores da economia solidária e a busca de autonomia. Do contrário, corre o risco de ser uma ação social... Sustentabilidade deve ser medida e qualificada pelo que desencadeia e não apenas pelo que oportuniza.

3. Do que fica....

Um grande e emocionante consenso. Para muitos o que garante a sus-tentabilidade é o estar junto, é o compartilhamento de ideias e práticas que configura um modo de estar e fazer parte de um lugar.

Na apresentação de todos, outro traço comum. A fala foi sempre no plural. As dúvidas, as certezas, os sonhos, foram sempre conjugadas na primeira pessoa do plural. Na dimensão do “nós”, que tanto marca o fazer do teatro, arte por excelência coletiva, quanto uma pragmática da diversidade cultural. Conjugada no plural, a sustentabilidade no campo

da cultura também comprova a impossibilidade de se pensar caminhos únicos e exclusivos. As práticas relatadas evidenciaram sempre o imperativo de agir coletivamente, a partir de valores e ações que, além de constituir a cada um como sujeito, inauguram a potência do coletivo. Trajetórias pessoais foram sempre apresentadas como dimensões de percursos co-letivos. Vida e trabalho se moldando e configurando modelos híbridos de sobrevivência. Trajetórias que misturam o que nós escolhemos e o que nos é ofertado pelo destino. Uma parte é procura objetiva, outra é encontro. Daí a atualidade do bordão: dominar o objetivo e o tangível para continuar existindo o subjetivo e o intangível.

Duas pontuações finais: em todas as experiências identifica-se não apenas o idealismo de grupos, mas a capacidade de fazer e inventar. Sustentabilidade como projeto político que, sem competência estética, fica apenas no oportunismo ou case de gestão.

O que se discutiu aqui transcende, e muito, a busca do equilíbrio. Incide sobre nossas escolhas.

Bibliografia

BARROS, José Márcio. A crise e a cultura. Políticas Culturais em Revista, v. 2, p. 136-146, 2009, disponível em http://www.portalseer.ufba.br/index.php/pculturais

DELEUZE, Gilles. GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia, São Paulo: Ed.34, 1997.

______ . O que é a Filosofia?, Rio de Janeiro: Ed.34, 1992.MORIN, Edgar. Da necessidade de um pensamento complexo. Seminário

Para navegar no século XXI – Tecnologias do Imaginário e Cibercultura, disponível em http://www.uesb.br/labtece/artigos/da%20necessida-de%20de%20um%20pensamento%20complexo.pdf

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SEminário

iii SEminário SubTExTo Em DiáloGoEDição ComEmoraTiVa – 2013

TEaTro Em mG: EDuCação & SuSTEnTabiliDaDE

05 a 08 de setembro de 2013Galpão Cine Horto. Belo Horizonte. Minas Gerais

Blog do Seminário: subtextoemdialogo.wordpress.com

PALESTRANTESAmérico Córdula (MINC)Angela Andrade (Teatro Vila Velha/BA)Angela Dalben (Magistra/MG)César Piva (Fábrica do Futuro – Incubadora Cultural e Residência Criativa/MG)Chico Pelúcio (Galpão Cine Horto e Grupo Galpão/MG)Cíntia Inês Boll (MEC/MINC)Jorge Luís Braz (Teatro de Tábuas/SP)Juliano Pereira (Grupo Manicômicos/MG)Lúcia Pimentel (UFMG)Marcelo Santos (Gestão Cultural/MG)Marcos Barreto (Instituto Pensarte/SP)Mauro Xavier (Grupo Teatro Kabana/MG)Reginaldo Santos (Galpão Cine Horto/MG)Rômulo Avelar (Gestão Cultural/MG)Samira Ávila (Valores de Minas/MG)Sérgio Bacelar (Festival do Teatro Brasileiro/DF)Viviane da Soledade (Escola SESC/RJ)

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MEDIADORES

Flávio Desgranges (USP)

José Márcio Barros (Observatório da Diversidade Cultural/PUC Minas/MG)

RELATORES:

Cida Falabella (ZAP 18/BH)

Fernando Mencarelli (UFMG/BH)

GRUPOS E INSTITUIÇÕES CONVIDADOS PRESENTES:Casa do Beco (BH/MG)CEFAR – Palácio das Artes (BH/MG)Cia Candongas (BH/MG)Cia Clara (BH/MG)Cia de Artes Asas do Invento (Governador Valadares/MG)Cia dos Aflitos (BH/MG)Cia Luna Lunera (BH/MG)Cia Pierrot Lunar (BH/MG)Cia Suspensa (BH/MG) Cia Uno (Uberaba/MG)Fundação ArcelorMittal (BH/MG)Fundação Municipal de Cultura (BH/MG)Grupo Divulgação (Juiz de Fora/MG)Grupo In-Cena Teatro (Teófilo Otoni/MG)Grupo Manicômicos (São João Del Rei/MG)Grupo Maria Cutia (BH/MG)Grupo Mayombe (BH/MG)Grupo Mundo (Alfenas/MG)Grupo Oficcina Multimedia (BH/MG)Grupo Olho de Gato (Montes Claros/MG)Grupo Primeira Campainha (BH/MG)Grupo Teatro Kabana (Sabará/MG)Grupo Teatro Invertido (BH/MG)

Grupontapé (Uberlândia/MG)Instituto Unimed (BH/MG)Os Teatráveis (Divinópolis/MG)SATED MG (BH/MG)Usiminas (BH/MG)ZAP 18 (BH/MG)

Além dos convidados presentes, o Seminário recebeu outros 29 participantes inscritos.

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TEaTro & políTiCa

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proTaGoniSmo EDuCaTiVo Em açõES inTErminiSTEriaiS

ConTEmporânEaS: o programa Mais Educação e o programa

Mais Cultura nas Escolas entrecruzando imaginações e conhecimentos autorais

Cíntia inês boll*

O Programa Mais Educação (PME) foi criado pela Portaria Interministerial N° 17/2007 e regulamentado pelo Decreto N° 7.083, de 27 de Janeiro de 2010. Os princípios orientadores desse programa objetivam desde então a auxiliar na formulação de uma política nacional de educação bá-sica que considere os pressupostos teóricos de uma educação em tempo integral, no entendimento de que é preciso promover intensos diálogos entre conteúdos escolares e territórios educativos e compartilhar saberes entre professores, alunos e atores das próprias comunidades. Segundo estes pressupostos, acredita-se que ao mesmo tempo em se dissemina experiências educativas na escola e nos grupos sociais se desenvolvem atividades contemplando políticas e programas de saúde, cultura, esporte, direitos humanos, educação ambiental, divulgação cientifica e enfrenta-mento da violência contra crianças e adolescentes.

Esta iniciativa político-pedagógica, a partir de 2011, passou a ser co-ordenada pela Secretaria de Educação Básica (SEB/MEC), em parceria com a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI/MEC), Secretarias Estaduais e Municipais de Educação e suas escolas. Sua operacionalização, através do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), é feita em parceria com o Fundo Nacional de

* Servidora Federal na Secretaria de Educação Básica-SEB/MEC desde maio de 2013. Professora no Departamento de Estudos Especializados-DEE na Faculdade de Educação-FACED da Universidade Federal do Rio Grande do Sul- UFRGS. Pedagoga, Mestre e Doutora em Educação pela também Faculdade de Educação-FACED, Universidade Federal do Rio Grande do Sul-UFRGS, na linha de Pesquisa de Educação, Arte, Linguagem e Tecnologia. Professora no Ensino Fundamental desde 1986 pela Escola Estadual Dom Diogo de Souza, Porto Alegre-RS, e no Ensino Superior desde 2000, atualmente tem como foco estudos em Formação de Professores, Educação Integral e Enunciações Estéticas na Cultura Digital.

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Desenvolvimento da Educação (FNDE) e busca incentivar o gerenciamento financeiro do recurso pela própria escola (veja mais em [email protected]).

Aproximações entre as políticas do Programa Escola Aberta (PEA) criado pela RESOLUçÃO/CD/FNDE/N° 052, DE 25 DE OUTUBRO DE 2004, e o PME estabeleciam objetivos específicos de promoção e ampliação da integração entre escola e comunidade, apresentando oportunidades de acesso a espaços de promoção da cidadania [...]. Em um esforço conjunto, governo federal e secretarias de educação estaduais e muni-cipais disponibilizaram, à época, técnicos com experiência para apoiar a relação escola-comunidade e/ou a proposta de intersetorialidade com ações objetivas nas áreas da cultura, saúde, meio ambiente, esporte, desenvolvimento local e outras.

Várias escolas no país que abraçaram o PEA e hoje concentram esforços no PME buscando integrar currículo e Projeto Político Pedagógico (PPP) têm apresentado melhoria na frequência escolar, na aprendizagem, no aumento no índice do IDEB (Índice de Desenvolvimento de Educação Básica) e na interlocução efetiva com outros atores da própria comunidade territorial. Estudantes do ensino médio, universitários, graduandos e graduados não só participam das atividades como contribuem no gerenciamento dos recursos com pais, comunidade e conselho escolar. Teatros, cinemas, parques, circos, museus, shows têm possibilitado perceber cada vez mais o grande desafio que é o de desenvolver habilidades que colaborem para o sucesso na vida e na escola de cada sujeito, de cada cidadão. Pois que todo o sucesso na vida e na escola requer o necessário protagonismo do saber entrecruzado à ousadia e à imaginação que é pensar o novo, o desconhecido, o que não se sabe.

Pensar o novo é crer que o conhecimento em essência será sempre au-toral, criação. E o protagonismo exigido nesta ação do pensar o novo está diretamente relacionado com o território educativo que cada sujeito compartilha com outros atores. Aprender, portanto, será tanto compartilhar conhecimento como especialmente construí-lo no contexto cultural. E os

programas Mais Educação e Mais Cultura nas Escolas1, em uma iniciativa interministerial entre Ministério da Educação (MEC) e Ministério da Cultura (MinC), reconhecem não só a autonomia cultural dos territórios, com seus saberes e dinâmicas de comunicação e expressão, mas especialmente esse protagonismo educativo que nele se movimenta.

Saberes, valores e práticas de comunicação e expressão cultural anunciam singularidades de pensamentos que se desorganizam-reorganizam-adap-tam para integrar a outros cada vez mais complexos. O protagonismo do saber que se movimenta ao conhecimento do novo que se apresenta será sempre entrelaçado, ininterrupto e singular tanto na relação que o sujeito estabelece com ele mesmo quanto na relação com os outros atores. Portanto, o processo da construção dos conhecimentos científicos e culturais, éticos e estéticos neste contexto educativo do qual falamos

1 O Programa Mais Cultura surgiu em 2007 tendo por objetivo a integração e valorização dos mais diversos segmentos artísticos e culturais deste país. Atualmente se estrutura para incluir nos espaços escolares o conhecimento de artistas, grupos e mestres de cultura popular e tradicional e toda uma profícua rede de arte-educadores. Veja mais em http://www.cultura.gov.br/maisculturanasescolas .

Cíntia Inês Boll palestra no III Seminário Subtexto em Diálogo. Foto: Tiago Carneiro.

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exigirá sempre intensos diálogos entre conteúdos escolares e territórios educativos.

Os programas Mais Educação e Mais Cultura nas Escolas corroboram para que práticas docentes interculturais, flexíveis e inclusivas dialoguem com saberes e atores em espaços cada vez mais ampliados e compartilhados. Neste sentido e atendendo às Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs)2, normas que orientam o planejamento curricular das escolas e dos sistemas de ensino, o ensino precisa ser proposto de forma a garantir a dinâmica intensa da vida cultural e artística de cada território educativo.

Pensar o novo, a ousadia e a descontinuidade podem colaborar na criação de outros sentidos e sensações atravessados pelo território educativo, pelo entorno cultural ao que o sujeito está imerso. Iniciativas que intercambiem sistema escolar e campo cultural, que agreguem museus, teatros, bibliotecas e espaços comunitários aos conteúdos escolares podem se apresentar aos espaços escolares na escrita autoral e inventiva. Neste sentido, contextos culturais ampliam e colaboram para a alegria, o prazer e o deslumbramento requerido pelo protagonismo de um sujeito em busca do conhecimento. A escola precisa estar pronta para apreciar e não só analisar criticamente esse protagonismo da ação educativa: outros olhares se apresentam na composição autoral de um conhecimento.

A apreciação escolar pode potencializar os olhares de cada sujeito para com seu contexto cultural e sua estética. Um sujeito educativo que, ao se assumir como protagonista do conhecimento que se apresenta, assume as rédeas da criação autoral, equilibrando-se entre o aprender e o desejo do aprender atravessados pelos conceitos e princípios da comunhão e do diálogo numa típica tentativa de coexistência pedagógica. Assim, o bem-estar, a alegria e o prazer se espalham movimentando a busca pelo conhecimento desejado entre conteúdos escolares e territórios educativos.

O Programa Mais Educação e o Programa Mais Cultura nas Escolas obje-tivam o encontro de processos educativos intensos, abrangentes e colabo-

2. Disponível em http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=293&Itemid=358. Acessado em outubro de 2013.

rativos entre escolas da rede pública e iniciativas culturais. Apresentam-se como um convite estratégico à construção de espaços para diálogos entre educação, arte e cultura a fim de reconhecer e contribuir para a formação de territórios educativos onde saberes formais, saberes comunitários e práticas artísticas e culturais se integrem aos planos de atividades das escolas públicas. À construção de espaços educativos onde a liberdade à invenção, à criação e ao pensar o novo possam ser apreciados em seu caráter autoral pela busca do conhecimento.

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ConSTElação

rita Gusmão*

O objetivo deste texto é registrar uma reflexão sobre a ação proposta em conjunto pelos Ministérios da Cultura e da Educação, denominada Mais Cultura nas Escolas, e suas prováveis influências na sustentabilidade do campo de trabalho da Arte no país. As ideias das quais se parte aqui são: primeira, que existe, sim, a necessidade de que os órgãos governamentais desenvolvam ações integradas; segunda, de que a educação é, ao mesmo tempo, uma manifestação cultural e o alimento precípuo do processo de desenvolvimento da cultura de um país; e terceira, que ambas são campos de trabalho que necessitam formação e planejamento para a garantia de sua sustentabilidade.

Para iniciar a cartografia da influência do Mais Cultura nas Escolas, far-se-á um breve panorama das funções de cada um dos Ministérios envolvidos, de modo a reconhecer o papel que cada um desempenha nesta ação. O Ministério da Cultura é um órgão da administração pública federal direta, e tem como áreas de competência a política nacional de cultura e a proteção do patrimônio histórico e cultural. Por meio da sua Secretaria de Políticas Culturais, instituiu a Diretoria de Educação e Comunicação para a Cultura, e adotou como um dos objetivos desta promover a integração entre o PNC- Plano Nacional de Cultura e o PNE- Plano Nacional de Educação. Segundo informações do sítio eletrônico do Minc, esta integração está baseada na formulação e implementação de uma política de interface entre educação e cultura, e suas ações se propõem a desenvolver a formação para a cidadania, o ensino de arte nas escolas de educação básica, o compromisso das universidades com a promoção da cultura e da diversidade e o ensino profissionalizante no que tange à economia da cultura (Acordo de Cooperação Técnica Interministerial n. 001/2011).

* Professora Assistente da Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Belas Artes, Curso de Graduação em Teatro, onde participa das modalidades Bacharelado e Licenciatura. Tem experiência nas áreas de Teatro, Performance, Videoarte e videoinstalação. Desenvolve trabalhos como atriz, diretora e produtora de espetáculos e eventos artístico- culturais.

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Para constituir o Plano Nacional de Cultura, desde o Decreto Lei que o instituiu em 2006, o MinC estabeleceu sua concepção de cultura articulada em três dimensões: simbólica, cidadã e econômica. A dimensão simbólica considera que todos os seres humanos têm a capacidade de criar símbolos que se expressam em práticas culturais diversas como idiomas, costumes, culinária, modos de vestir, crenças, criações tecnológicas e arquitetônicas, e também nas linguagens artísticas: teatro, música, artes visuais, dança, literatura, circo, etc.

A dimensão cidadã entende a cultura como um direito básico do cidadão, e para garanti-lo cabe ao MinC promover a participação de cada brasileiro na vida cultural do país. Esta meta seria alcançada, segundo o PNC, ao se criar e dar acesso a livros, espetáculos de dança, teatro e circo, exposições de artes visuais, filmes nacionais, apresentações musicais, expressões da cultura popular, acervo de museus, entre outros. O acesso aos bens culturais, como descrito no Plano, não explicita ações para o desenvolvimento da percepção artística ou da sensibilidade, somente a garantia da oferta de eventos nos quais estes bens sejam disponibilizados. Talvez, por esperar que a presença da disciplina Artes nas escolas de educação básica cumpra este papel.

E, por fim, a dimensão econômica que busca o crescimento do vetor econômico das atividades culturais, vendo-as como lugar de inovação e expressão da criatividade brasileira e fazendo parte do novo cenário de desenvolvimento econômico, socialmente justo e sustentável.

O Ministério da Educação, por sua vez, tem como função promover a educação de qualidade, em todos os níveis nos quais esta se divide. O Plano Nacional de Educação, instituído em 1998, aponta como objetivos: 1) elevação do nível de escolaridade da população; 2) a melhoria da qualidade de ensino em todos os níveis; 3) a redução das desigualdades sociais e regionais no tocante ao acesso e à permanência com sucesso na educação pública; e 4) a democratização do ensino público nos estabelecimentos oficiais, obedecendo aos princípios da participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto

pedagógico da escola e a participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.

A partir desta diretrizes, foi que os Ministérios tomaram a iniciativa do Programa Mais Cultura nas Escolas, buscando incentivar o encontro das experiências artístico-culturais em curso nas comunidades com o projeto pedagógico das escolas de educação básica públicas. Estas escolas devem estar ativas e vinculadas a outros dois programas, sejam O Mais Educação e o Ensino Médio Inovador.

O Programa Ensino Médio Inovador- ProEMI, foi instituído em 2009 com o objetivo de integrar as ações do Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE, como estratégia para induzir a reestruturação dos currículos do Ensino Médio. O objetivo do ProEMI é apoiar e fortalecer o desenvolvimento de propostas curriculares inovadoras nas escolas de ensino médio, ampliando o tempo dos estudantes na escola e buscando garantir a formação integral com a inserção de atividades que tornem o currículo mais dinâmico, atendendo também as expectativas dos estudantes do Ensino Médio e às demandas da sociedade contemporânea. Para tanto, foram eleitos como macrocampos de planejamento e atuação os seguintes: acompanhamento pedagógico; iniciação científica e pesquisa; cultura corporal; cultura e artes; comunicação e uso de mídias; cultura digital; participação estudantil e leitura e letramento. A adesão ao Programa Ensino Médio Inovador é realizada pelas Secretarias de Educação Estaduais e Distrital, e as escolas de Ensino Médio recebem apoio técnico e financeiro, através do Programa Dinheiro Direto na Escola – PDDE, para a elaboração e o desenvolvimento de seus projetos de reestruturação curricular.

O Programa Mais Educação foi regulamentado em 2010 e constituiu-se como estratégia para induzir a ampliação da jornada escolar e a organização curricular na perspectiva da Educação Integral. As escolas das redes públicas de ensino estaduais, municipais e do Distrito Federal fazem sua adesão ao Programa e, de acordo com o projeto educativo em curso, optam por desenvolver atividades nos macrocampos de acompanhamento pedagógico, educação ambiental, esporte e lazer,

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direitos humanos em educação, cultura e artes, cultura digital, promoção da saúde, comunicação e uso de mídias, investigação no campo das ciências da natureza e educação econômica.

Para o programa Mais Cultura nas Escolas estabeleceu-se que sua função é inserir iniciativas artístico-culturais de artistas, mestres das culturas tradicionais e populares, pontos de cultura, museus, bibliotecas, etc., no projeto pedagógico das escolas, ou de um ou mais professores, por meio de Planos de Atividade Cultural. Estes planos devem ser desenvolvidos ao longo de, no mínimo, 6 meses, dentro ou fora do espaço escolar. O objetivo central do programa é incentivar o cruzamento destes saberes, para sublinhar a contribuição que as artes e a cultura podem dar para tornar os processos de aprendizado mais efetivos, mais criativos, e mais proveitosos, segundo as proposições disponíveis nos sítios eletrônicos de ambos os Ministérios. Esta proposta define a escola como espaço de circulação da cultura brasileira, de acesso aos bens culturais e de construção do respeito à diversidade e à pluralidade desta.

Se pensarmos na estrutura de um Projeto Político Pedagógico de uma escola de educação básica, podemos perceber a importância da ação do Mais Cultura nas Escolas:

•  É projeto porque reúne propostas de ação concreta a executar durante determinado período de tempo.

•  É político por considerar a escola como um espaço de formação de cidadãos conscientes, responsáveis e críticos, que atuarão individual e coletivamente na sociedade, modificando os rumos que ela vai seguir.

•  É pedagógico porque define e organiza as atividades e os projetos educativos necessários ao processo de ensino e aprendizagem.

Itens que devem ser descritos:

• Missão• Clientela• Dados sobre a aprendizagem• Relação com as famílias• Recursos

• Diretrizes pedagógicas• Plano de ação

(fonte http://gestaoescolar.abril.com.br)

Se a escola toma como sua a função de ser um centro irradiador dos bens e valores culturais do país em sua comunidade, e vice-versa, estimula uma relação mais viva e consistente com a contemporaneidade e as possibilidades de atingir estudantes, profissionais e famílias, criando um vínculo afetivo com o processo educativo. Isto porque o processo de formação oferecido pela escola atual precisa considerar a necessidade da multiplicidade de saberes que o mundo contemporâneo solicita, a inquietude própria dos jovens e das crianças super-estimulados deste mundo e a velocidade das mudanças que se dão nele cotidianamente.

O programa Mais Cultura nas Escolas pode ser um incentivo ao compartilhamento da jornada escolar pelos vários atores sociais que são responsáveis por sua qualidade: o professor que é o condutor dos processos de ensino e aprendizado; os gestores que formam o elo com as esferas decisórias dos governos; os produtores dos bens e símbolos que compõem este universo do conhecimento. É muito interessante que o desenho do Plano de Atividades Culturais seja aberto, não defina previamente abordagens, metodologias ou usos para os recursos. Seu eixo de vinculação se organiza a partir do diálogo com um ou mais eixos temáticos propostos pelo programa: Residências de Artistas para Pesquisa e Experimentação nas Escolas; Criação, Circulação e Difusão da Produção Artística; Promoção Cultural e Pedagógica em Espaços Culturais; Educação Patrimonial – Patrimônio Material, Imaterial, Memória, Identidade e Vínculo Social; Cultura Digital e Comunicação; Cultura Afro-brasileira; Culturas Indígenas; Tradição Oral e Educação Museal. A questão que se coloca para que estes objetivos tão interessantes sejam alcançados reside justamente no papel do Ministério da Educação nesta articulação.

As escolas brasileiras não mantém em seu corpo docente um quadro adequado de professores de Arte. Segundo o pesquisador Mozart Neves Ramos (Conselheiro do Movimento Todos pela Educação), somente 27%

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dos professores que oferecem aulas de artes nas escolas de educação básica atendem aos critérios exigidos por lei para tal1. À parte o fato de que todo e qualquer professor tem a ganhar ao interagir sua metodologia de ensino com os processos culturais em curso na sua comunidade, para que sejam desenvolvidas ações consistentes de aprendizado em cada campo de conhecimento, sua formação específica é fundamental.

No programa Mais Cultura nas Escolas, cada escola pode planejar e vivenciar processos de aprendizado criativo conforme suas escolhas, poderá adequá-los às necessidades e interesses de seus professores e estudantes, à realidade local e aos saberes disponíveis nas iniciativas artísticas e culturais dos territórios em que está inserida. Mas a atividade artístico-cultural necessita de continuidade para que seja efetiva na sua influência sobre a educação da sensibilidade e sobre a sustentabilidade dos seus profissionais. É bastante improvável que um professor ou um gestor que não tenha formação nas áreas de artes esteja pronto e em plenas condições de desenvolver um planejamento coerente e consistente para a continuidade desta agenda na escola. Não por uma questão de falta de vontade, mas porque este é um campo de conhecimento com especificidades, ritmo e nuances próprias, que somente um estudioso pode atender adequadamente.

O acesso aos bens culturais é, sem dúvida, uma necessidade do desenvolvimento humano e da produção crítica de conhecimento. Mas é o acesso contínuo e acompanhado do aprendizado da apreciação que garante este desenvolvimento e problematiza a produção, não permitindo que apenas a cultura de massa faça parte do cotidiano dos cidadãos em geral. Continuidade, multiplicidade, integração e autonomia são atitudes fundamentais para que a agenda artístico-cultural das escolas realize o objetivo de formação que se espera dela.

Uma conquista importante para as atividades da escola como centro irradiador de cultura e artes no programa Mais Cultura nas Escolas, é

1 http://www.todospelaeducacao.org.br/comunicacao-e-midia/educacao-na-midia/22908/professores-40-nao-sao-formados-na-area-em-que-ensinam.

que suas atividades não precisam acontecer necessariamente nos cinco dias da semana e em horário complementar ao das aulas. Podem cruzar-se com as aulas regulares, podem acontecer nas atividades extraclasse e podem compor um calendário de interação com a cidade, com as famílias e com as atividades dos artistas envolvidos. Essa conquista possibilita que as ações do Plano de Atividades Culturais se estendam para novas perspectivas de ensino e aprendizado, possam funcionar como experimentações metodológicas inovadoras e multifacetadas. Esta prática de autonomia e integração com os vários campos de conhecimento que compõem a escola é crucial para o sucesso desta agenda. E neste particular também se mostra a necessidade de o Ministério da Educação investir na alocação de professores efetivos de Artes em todas as escolas.

Do ponto de vista da sustentabilidade dos profissionais de Artes, o programa Mais Cultura nas Escolas contribui com esta esfera ao determinar que artistas, grupos e mestres de cultura popular e tradicional, arte educadores, cinemas, pontos de cultura, museus, bibliotecas, entre outras iniciativas ou instituições, somente poderão participar a partir de representantes devidamente documentados. Podem se caracterizar como pessoas físicas ou jurídicas, mas deverão poder realizar um contrato de serviços e de avaliação dos projetos. Não serão contemplados projetos que não evidenciem as atividades desenvolvidas anteriormente pela iniciativa cultural por meio de comprovação documental e registro, ou ainda, sem detalhamento que relacione a experiência prévia da iniciativa cultural parceira ao Plano de Atividade Cultural proposto e/ou com os eixos temáticos nele escolhidos.

Também é importante ressaltar que o edital deixa bem claro que estes contratos deverão responder a circunstâncias profissionais claras: O PDDE/FNDE define que os recursos serão repassados às escolas em parcela única. Há uma rubrica nomeada “contratação de serviços culturais necessários às atividades artísticas e pedagógicas”, que garantirá que a forma de pagamento seja protegida nos termos da lei e promova a valorização do profissional, bem como a lisura da prestação de contas. As iniciativas culturais parceiras deverão fornecer às escolas recibos que

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atestem o recebimento dos valores definidos no Plano de Atividade Cultural. Estes processos contribuem de maneira muito importante para a profissionalização e a saída da marginalidade dos envolvidos. Também é importante ressaltar que a documentação do processo respeita a informalidade, no sentido de pessoas físicas poderem prestar os serviços, e a mobilidade, no sentido de que vários artistas diferentes podem participar, prestando serviços diversos e em tempo descontínuo dentro dos projetos, e estas são importantes características do campo.

Mesmo considerando a necessidade de incentivo à autonomia das escolas em relação à definição de seus Planos e de sua coordenação, e que o coordenador do programa possa ser ou não ligado ao quadro de servidores da escola, somente sendo resguardada sua escolha em comum acordo entre a escola e iniciativa cultural parceira, este formato pode prejudicar seriamente a continuidade do Plano e da realização da educação da sensibilidade. Poderão assumir esta função a própria iniciativa cultural, um gestor da escola envolvido com os projetos de Educação Integral em curso na mesma, um membro da comunidade escolar envolvido com o projeto ou o professor da escola que se identifique e seja parceiro do desenvolvimento do projeto. Não sendo um docente da área de Artes, este coordenador pode não conhecer, reconhecer ou mesmo conceber os processos que se desenvolvem na relação com as atividades artístico-culturais. Estes processos não sempre dóceis e calorosos, porque muitas vezes provocam o deslocamento de zonas de conforto em seus envolvidos. Se o coordenador não tiver conhecimento e atitude reflexiva para enfrentá-los, o Plano pode vir a derrocar, ou manter apenas a cultura de massa em evidência. Com um docente especialista existe uma tendência maior de que isto não aconteça.

A própria escolha das atividades propostas no Plano de Atividades pode espelhar a experiência e a direção pedagógica destas, o que é enfatizado pelo edital do programa. Infelizmente, a ausência dos profissionais especializados pode provocar que estas não sejam pensadas com o devido aprofundamento. Caberá aos avaliadores, sejam dos Planos iniciais sejam dos resultados alcançados, a identificação da dimensão que esta ausência terá. Do ponto de vista desta reflexão, fica evidente desde

já que por mais inexperiente que um docente de Artes seja, sua visão do contexto de formação será sempre mais completa. E suas relações com os profissionais das iniciativas parceiras serão mais críticas e intensas.

Os números relativos às inscrições no programa evidenciam tanto a quantidade de iniciativas culturais dispostas a interagir com as escolas quanto a necessidade das escolas de desenvolver sua agenda artístico-cultural. Conforme dados da Secretaria de Políticas Culturais do Ministério da Cultura, 26,9 mil escolas fizeram inscrição e, destas, 14,3 mil unidades preencheram os requisitos e estão aptas a participar da seleção. Do total de escolas habilitadas, 13,6 mil são da Educação em Tempo Integral, 675 do Ensino Médio Inovador, e 251 unidades têm Educação Integral e Ensino Médio Inovador. A Secretaria de Políticas Culturais informa que 67% das unidades que concorrem aos recursos têm estudantes do programa Bolsa Família. Entre as regiões, os projetos estão assim distribuídos: 55% na região Nordeste, 16% no Sudeste, 14% no Norte, 10% no Sul e 5% no Centro-Oeste 2.

Cabe aqui uma reflexão sobre a diferença entre o desenvolvimento de um programa pontual e o desenvolvimento de uma política pública. O programa Mais Culturas nas Escolas é, sem dúvida, uma iniciativa importante. O papel do Ministério da Cultura está mais bem realizado no seu âmbito, que o papel do Ministério da Educação. O investimento financeiro, por meio da liberação dos recursos do FNDE e do PDDE, é parte de uma parceria que pensa a utilização integrada dos recursos para o pleno desenvolvimento da educação, o que é uma ação importante e coerente. Mas não é suficiente para realizar o papel de garantir processos educativos de qualidade e completos. Uma política de geração de emprego em renda para as iniciativas artístico-culturais e sua distribuição nas regiões geopolíticas do país, amplia as possibilidades de manutenção de profissionais em suas comunidades de origem, auxiliando a estabilizar cada um dos mercados regionais. E isto cabe de fato ao MinC realizar.

2 ASCOM-Mec - http://aquiacontece.com.br/noticia/2013/10/06.

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A política pública de garantia de emprego para os docentes especialistas egressos das licenciaturas da área de Artes cabe ao MEC. E esta política precisa ser um reflexo da percepção de que a escola e a sociedade se ressentem da falta de educação para a sensibilidade, e por isto investem em todas as iniciativas que possam levar a isto. A aprovação e a regulamentação de leis que estabeleçam um percurso efetivo de ocupação pelos docentes de Artes de seus lugares na escola, por meio da instituição de vagas e dos concursos seria um passo fundamental para a realização desta política. E contribuiria para a continuidade consistente dos Planos de Atividades Culturais das escolas de educação básica.

A guisa de informação, seguem alguns dados sobre a contratação de professores de arte em MG. Na esfera estadual foi possível localizar um concurso em 2011, que disponibilizou 21.337 vagas, sendo a maioria delas para o cargo de Professor de Educação Básica (PEB)3. A previsão foi que 13.993 postos seriam ocupados por professores das áreas de Artes, Biologia, Educação Física, Filosofia, Física, Geografia, História, Língua Estrangeira Moderna – Espanhol, Língua Estrangeira Moderna – Inglês, Língua Portuguesa, Matemática, Química e Sociologia. A remuneração mínima prevista para esse cargo permanece de R$ 1.320,00 para uma jornada de trabalho de 24 horas semanais. As nomeações têm acontecido por todo o ano de 2013, nos seguintes termos:

Março 2013Física: 739Inglês: 542Espanhol: 97Português: 1179

Junho 2013Educação Física: 134Filosofia: 161Geografia:175

3 (http://concursosnobrasil.com.br/concursos/mg)

História: 220Matemática: 79Química: 30Sociologia: 94Ensino Fundamental: 729

Outubro 2013Educação Física: 610Química: 19Sociologia: 06Ensino Fundamental: 240

Como se pode perceber, ainda não foram nomeados professores de Artes.

Na esfera municipal, foi aprovado um concurso em agosto de 2013, para o qual foi nomeada uma comissão que deverá organizá-lo. Serão disponibilizados cargos de auxiliar de biblioteca, auxiliar de secretaria, professor de educação infantil e professor de inglês; não há previsão de vagas para professores de artes. O último concurso que abriu vagas para Artes foi em 2011, no qual 177 profissionais foram aprovados e nomeados no mês de junho; no concurso de 2010, não houve vagas para Artes. Infelizmente, um levantamento informal feito por esta autora, demonstrou que cerca de 20% dos nomeados abandonou as salas de aula, por não concordar ou não suportar as condições de trabalho.

Sem um investimento real nos processos educativos da sensibilidade, da apreciação e do conhecimento sobre a expressão artística, o MEC não estará contribuindo para o desenvolvimento de uma educação de qualidade no Brasil.

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Galpão Em FoCo

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TEaTro, CriSE E rEnoVação

Eduardo moreira*

Ao discorrer sobre o Galpão, nos inúmeros encontros, debates e oficinas que conseguimos realizar por onde circulamos, uma das características mais sublinhadas do grupo é a de sermos um coletivo de atores, sem um diretor fixo. Isso traz como consequência uma natureza cambiante, heterogênea e bastante suscetível `as transformações e `a variedade.

Em ciclos que muitas vezes se alternam entre movimentos centrípetos (de fora para dentro) e centrífugos ( de dentro para fora), o grupo vive uma dialética permanente entre recolher-se e expandir-se, buscando sempre uma fidelidade ao princípio de que a arte se constrói com desafios e travessias perigosas. Tais travessias, que podem também ser traduzidas, como tentativas de saltos de renovação, têm sempre naturezas diversas. Em linhas gerais, podem aprofundar a pesquisa sobre características consolidadas e conhecidas do trabalho do Galpão e, por outro lado, podem traduzir mudanças de rumo, rupturas e tentativas de encontro como novas linhas de pesquisa.

A fim de ilustrar melhor essa característica, considero ser interessante fazer um breve histórico de alguns momentos-chave em que o espírito de ruptura e de renovação se impôs na história do Galpão.

Penso que tal espírito foi moldado desde a fundação do grupo e a for-mação de seus atores, no encontro com os diretores alemães do “Teatro Livre de Munique”. Isso porque, levar o teatro para a rua, no Brasil, em 1982, significava uma ruptura com o “status quo” de uma sociedade cuja expressão artística estava coibida e confinada por dezoito anos de falta de liberdade e perseguições políticas. Se a opção pela rua marcou o grupo como um coletivo disposto a romper com os limites dos espaços convencionais, o segundo movimento interno de renovação se deu com a montagem do espetáculo de palco - “De olhos fechados”. O Galpão

* Eduardo Moreira é ator, diretor e dramaturgo. Integrante e cofundador do Grupo Galpão.

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não só afirmava seu caráter de diversificação, levando o teatro para onde fosse possível fazê-lo, mas também consolidava sua marca como um coletivo movido pelo espírito camaleônico da transformação.

Logo em seguida, outra renovação se deu com a ampliação do Galpão na montagem da peça “Ó prô cê vê na ponta do pé”. Com o convite à entrada de novos integrantes, o grupo agregava `as suas técnicas de teatro de rua impostas pelos alemães, novos elementos de circo,mímica, pantomima e teatro de bonecos.

Uma renovação traumática se deu com o fracasso produzido pelo resultado do espetáculo “Arlequim servidor de tantos amores”. Foi um momento em que o coletivo por pouco não sucumbiu ao fiasco de público e a um resultado artístico que não nos satisfazia. A sobrevivência ao fracasso foi fundamental para que o grupo refletisse e se renovasse, deixando de lado definitivamente as ilusões de um tipo de criação coletiva em que todos faziam tudo e ninguém se responsabilizava por nada. A dura realidade de um espetáculo que não se concatenava cenicamente nos levou a repensar sobre a necessidade de funções e de responsabilidades claras dentro de uma criação artística.

Este fracasso nos levou ao encontro com o diretor Ulisses Cruz que nos trouxe, como modo de criação, o sistema de “workshops”: ideias cêni-cas desenvolvidas num curto espaço de tempo, usando-se o máximo de recursos cênicos e que se viabiliza a partir de uma clara separação de funções, especialmente entre aquele que concebe, tem a visão de fora e a consciência do todo, o diretor, e aquele que executa, é o centro ativo da criação, mas que tem uma visão parcial do todo, o ator.

Outro momento de intensa renovação na história do grupo, entendida tanto como aprofundamento de tendências ,quanto de mudança mais radical de rumo, se deu no encontro com o diretor Eid Ribeiro, com quem fizemos os espetáculos “Corra enquanto é tempo” (texto do próprio Eid) e “Álbum de família” (de Nelson Rodrigues). Era o início do deslocamento do foco para uma dramaturgia brasileira e um teatro menos calcado na expressão corporal e que se voltasse também para a questão da palavra.

No mesmo período, os encontros com grupos de teatro da Europa e da América Latina, ligados à vertente do Teatro Antropológico de Eugenio Barba, expandiam os horizontes de expressão do grupo, com a introdu-ção da música executada ao vivo pelos próprios atores. O advento da música representou uma revolução no nosso encontro com o público da rua, estabelecendo uma relação muito mais íntima e epitelial com os espectadores.

Já Gabriel Villela fez uma espécie de síntese barroca de todos os caminhos trilhados e traçados pelo grupo para criar, com mãos mágicas, a epifania teatral de “Romeu e Julieta”. A partir daí, o Galpão se consolida como um grupo de atores que trabalha com diferentes diretores, buscando nesses variados encontros uma permanente fonte de renovação. Não foi um projeto pré-concebido, mas uma consequência natural.

Ainda que os encontros com diretores e artistas externos sempre provo-quem transformações renovadoras, o Galpão continuamente reflete sobre sua trajetória não apenas com os espetáculos dirigidos pelos próprios integrantes, mas também com o permanente exercício dos “workshops” conduzidos pelos atores. Entre rupturas e retornos à própria essência, seguimos na tentativa de encontrar um ponto de equilíbrio, em que se digladiam elementos como pesquisa e comunicação com o público, busca de linguagem e sobrevivência financeira, interesses individuais e espírito coletivo.

Depois da síntese de “Romeu e Julieta” e o mergulho no circo-teatro e no melodrama proposto por Gabriel Villela em “A rua da amargura”, os atores do Galpão seguiram buscando renovação com ações mais ou menos abruptas.

“Um Molière Imaginário” (direção de Eduardo Moreira) foi uma espécie de balanço e retomada das rédeas artísticas pelo próprio grupo. Em se-guida, veio uma ruptura mais brusca, no encontro com Cacá Carvalho, em “Partido”. Com a criação de uma dramaturgia que estabelecia uma ponte entre o romance de Italo Calvino e o drama, feita a partir das ações físicas criadas pelos atores, o espetáculo estabelecia um corte no curso da linguagem do grupo.

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Coerente com a filosofia de pensar seus projetos artísticos a partir “daquilo que nos falta” ou “daquilo de que somos carentes”, o Galpão vive numa espécie de pêndulo artístico que oscila entre momentos de quebra e de expansão de suas linguagens e momentos de aprofundamento das mesmas.

Em “Um trem chamado desejo” (direção de Chico Pelúcio) o grupo enca-minha a construção cênica a partir dos exercícios de criação colaborativa dos atores e, de certa forma, retorna à sua origem, com uma direção interna e o mergulho no universo do musical brasileiro.

Novas rupturas de renovação viriam com o minucioso trabalho sobre a palavra em “O inspetor geral” e a imersão no universo épico de Brecht em “Um homem é um homem”, ambos sob a direção de Paulo José.

Já “Pequenos milagres” (direção de Paulo de Moraes) trouxe uma guinada em direção a um teatro realista que se opusesse à exuberância imposta pelo teatro de rua. Era o caminho intermediário para chegarmos, poste-riormente à obra de Tchekhov, nos encontros com Eduardo Coutinho e Enrique Dias (“Moscou”), Yara de Novaes (“Tio Vânia (aos que vierem depois de nós)”) e Jurij Alschitz (“Eclipse”).

No meio desse percurso acontece mais uma direção interna, em que o grupo aprofunda sua linguagem popular, debruçando-se sobre a bufonaria medieval em “Till, a saga de um herói torto” (direção de Julio Maciel). É curioso notar que o autor desse texto, o dramaturgo Luis Alberto de Abreu, é o mesmo de “Um trem chamado desejo”, as duas últimas dire-ções internas de espetáculos do Galpão.

E para fechar esta breve retrospectiva histórica, chegamos ao último espetáculo, “Os gigantes da montanha” (direção de Gabriel Villela) em que o Galpão encara o desafio de levar a poesia de Pirandello para o público da rua. É um processo em que a renovação se dá, por exemplo, no encontro com as técnicas de espacialização da voz trazidas por Francesca della Monica, que se somam e ampliam ao trabalho consolidado há mais de vinte anos dentro do Galpão pelas mãos de Babaya e Ernani Maletta.

Na verdade, a renovação deve ser entendida como antídoto contra a inércia e contra o estabelecimento de relações viciadas pelo previsível e o burocrático. É um ideal a ser perseguido e que, muitas vezes, nos escapa. É uma busca permanente por procedimentos e dispositivos que injetem frescor e vida. Vinculada ao risco e ao salto no escuro, isto é, no ir ao encontro do desconhecido e ao que não dominamos, ela é fruto da nossa inquietação artística, elemento fundamental do espírito criativo.

Como elemento que nos conduz por caminhos onde nos sentimos perdidos, a renovação também está intimamente ligada à possibilidade de morte e de renascimento de um coletivo de teatro. Algo semelhante à dialética do ator diante da construção de um novo espetáculo e um novo papel. Para se criar algo é preciso se dispor a, diante de uma folha em branco, esvaziar-se, retornar ao zero. De certa forma, morrer.

O diretor Paulo José em processo de criação

com o Grupo Galpão. Foto: Arquivo Grupo

Galpão.

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Todo o processo de renovação expõe o coletivo à tensão provocada pelo encontro com o desconhecido e aquilo que pode fugir ao nosso controle. É o que gera a crise. A crise se instala pelo desejo e a incapacidade apa-rente de se chegar a outro lugar, que não sabemos bem onde está e nem o percurso que devemos traçar para alcançá-lo. Por isso, toda tomada de decisão coletiva sobre aquilo que se vai montar é um momento de crise. Num grupo de atores, como é o caso do Galpão, as decisões dão muitas voltas e são mais difíceis de serem pactuadas. Isso, certamente, torna mais aguda a potência de crise.

Esses momentos criam uma espécie de suspensão, em que o coletivo perde a base e se desinstitucionaliza. O institucional é uma moldura cujos limites a crise deforma e amplia. Nessa dialética entre a crise e o institucional, entre a moldura externa e a inquietação interna, entre o estabelecimento de um conhecimento e sua transformação, o coletivo caminha no fio da navalha.

A renovação ainda precisa desatar o complexo nó dos interesses artísticos pessoais e a construção de um interesse coletivo. É um tipo de problema que tende a se radicalizar com a consolidação do grupo e o avanço cro-nológico de seus atores. Quando se ultrapassa a casa dos cinquenta, a urgência de fazer coisas e de cumprir desejos aumenta. Isso torna cada vez mais difícil encontrar um denominador comum coletivo que satisfaça as diferentes partes.

E, apesar de todas as dificuldades e perigos, é preciso que o coletivo e as individualidades não se furtem a enfrentá-las. É preciso segurar o boi pelo chifre sem fingir que ele não existe. Saber avançar e também recuar, quando preciso for. Ter a consciência de que as coisas não se resolvem num passe de mágica. E que, na verdade, elas não se resolvem nunca. Por isso, é preciso ter tempo, dar tempo ao tempo, não exigir soluções instantâneas e ter muita paciência e perseverança.

Depois de trinta e um anos de trabalho ininterrupto, com muitas dúvidas, conquistas, alguns fracassos, uma boa dose de sucessos e de crises, me pergunto para onde pode apontar a bússola de possibilidade de renova-ção do Galpão. É claro que podemos pensar em renovação no horizonte de um próximo espetáculo e podemos fazê-lo com o horizonte para os próximos dez ou vinte anos. Numa perspectiva de médio e longo prazo, qualquer que seja o diagnóstico artístico, creio que o nosso coletivo não pode se furtar ao desafio de novos atores. De preferência atores jovens, que possam dar continuidade ao nosso projeto artístico.

O desafio será o de conciliar a transmissão de uma trajetória de conhe-cimento e de experimentação em busca de linguagens com a renovação e a transformação dessa mesma trajetória. Essa necessidade traz o risco de se criar definições e conceitos que emolduram e institucionalizam e nos afastam do espectro da crise, tendendo a nos encaminhar para uma atitude confortavelmente estruturada. É preciso estabelecer uma peda-gogia que transmita nossos conhecimentos e experiência e, ao mesmo tempo, nos transforme e nos revigore.

E, para concluir, é bom que se diga que essa tentativa de artigo também está completamente contaminada pelo espírito da crise. As palavras

O diretor Gabriel Villela maquia o ator

Eduardo Moreira para o espetáculo “Os Gigantes da

Montanha”. Foto: Guto Muniz.

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parecem flutuar, suspensas pela falta de exatidão e sem conseguir en-contrar um pouso. Como o arriscado ideal da renovação, que nos tira de um lugar aparentemente seguro e nos lança na incerteza de algo que não sabemos bem o que pode vir a ser. O Grupo Galpão ao lado de alguns de seus parceiros na estreia de “Os Gigantes da

Montanha” (da esquerda para direita): Ernani Maletta, Francesca della Monica, Babaya, Paulo José e Gabriel Villela. Foto: Guto Muniz.

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CinE HorTo Em FoCo

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na DianTEira DaS DiSCuSSõES E propoSiçõES aCErCa Do TEaTro ConTEmporânEo

15 anos de atuação do Galpão Cine Horto

Soraya belusi*

Em 1982, a passagem de uma dupla de diretores alemães por Belo Horizonte marcaria para sempre a vida de cinco atores. Mas não atingi-ria diretamente apenas a eles. Este encontro inaugural, digamos assim, serviria também de referência para um projeto posterior, muito maior, pautado no trabalho coletivo, na pesquisa e na experimentação cênica. Foi sobre esses pilares que se iniciou a trajetória do Grupo Galpão e que, há 15 anos, norteou também as colunas fundamentais do Cine Horto, o que considero ser uma extensão pedagógica da prática da trupe.

Mas o Galpão nunca teve como proposta replicar um modelo “que deu certo”. Sabe que seu percurso é único na cena teatral brasileira, mas também tem consciência do impacto das mais diversificadas colaborações artísticas que integrou ao seu trabalho ao longo de três décadas. O Cine Horto traz implícito em suas origens esse mesmo espírito, a crença no poder transformador do encontro, ideia que serve ao mesmo tempo de princípio para o próprio fazer teatral à medida que é diante (e com) o outro que esta arte se realiza.

São 15 anos de Galpão Cine Horto e incontáveis experiências bem--sucedidas, outras nem tanto, o que também faz parte do aprendizado. Os números, por mais impressionantes e significativos que possam ser (mais de 150 mil espectadores e mais de 100 edições de projetos varia-dos), dão conta apenas de uma visão quantitativa sobre a atuação do

* Soraya Belusi é mestranda em artes pela Universidade Federal de Minas Gerais, jornalista e crítica teatral. É editora do blog Horizonte da Cena e, desde 2002, atua como jornalista cultural em diversos veículos de informação do país.

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Cine Horto e sua relação com a cidade. E não é neste lugar que residem as principais competências desse polo multiplicador.

Em sua página na internet, o Cine Horto divulga aquelas que seriam suas “missões”. Gostaria de fazer um panorama desse período através daquilo que o próprio espaço se propôs a cumprir. A primeira delas e na qual irei me concentrar, segundo o site, é “desenvolver, de forma continuada, ações de fomento, formação, pesquisa, criação, compartilhamento de conhecimento e difusão teatral”. Ao longo desses 15 anos, o Cine Horto atuou de maneira ininterrupta. Poucos foram os projetos que, por falta ou de incentivo financeiro ou demanda, tenham sido abandonados ao longo do caminho.

E a quantidade e relevância dos diferentes criadores e pesquisadores que cruzaram sua história com a do Cine Horto garantiram um fluxo permanente de troca de conhecimento, através de residências (como o Cena 3x4), de oficinas, como as de dramaturgia e direção, conversas, palestras e bate-papos, como no Sabadão, mostras de repertório como as que acontecem no Galpão Convida, de fomento à criação – tanto voltado para o trabalho do ator, como no Oficinão, quanto focando a linguagem, caso do Festival de Cenas Curtas – e o acesso mais demo-crático ao teatro, como o Pé na Rua.

Teria ainda que considerar, ao falar da atuação exercida pelo centro cul-tural, que incluir a área sociopedagógica, de pesquisa e memória (CPMT), e, ainda em fase de implantação, a central de serviços, em que a equipe do Cine Horto pretende prestar uma assessoria em gestão para outros grupos e espaços culturais.

Mas, se nos ativermos apenas aos projetos na área do fomento à criação – uma fatia considerável da atuação do Cine Horto, mas não o total –, é possível constatar um dado interessante. Pretendo centrar meu olhar sobre esse viés a partir do entendimento de que esta seja talvez a sua mais visível faceta de atuação. Durante todos esses anos, o Cine Horto

Primeira edição do projeto Oficinão.

Espetáculo “Noite de Reis”. 1998. Foto:

Guto Muniz

Segunda edição do projeto Pé na Rua. Espetáculo “No Baile”. 2006. Foto: Guto Muniz.

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sempre esteve na dianteira das discussões e proposições acerca do teatro contemporâneo em Belo Horizonte. Atentos com as questões que vinham (e continuam) tendo dimensão relevante na cena teatral, seus gestores introduziram artistas e público a um ambiente propício para se investigar outras formas de pensar, de fazer e de fruir teatro.

Tomemos o Cena 3X4 como exemplo, na minha opinião, um dos projetos que mais reverberou na forma como vemos o fazer teatral hoje em Belo Horizonte – junto, é claro, com ações realizadas por outros eventos e espaços, entre os mais significativos o FIT-BH e o ECUM). Termos, jargões e práticas que até então não faziam parte da “agenda” teatral mineira, hoje habitam cotidianamente o linguajar de jovens criadores mineiros. Este projeto reunia o dramaturgo Luis Alberto de Abreu e o diretor Antonio Araújo como supervisores do “processo colaborativo” que foi experi-mentado por algumas companhias locais, entre elas, a Cia. Luna Lunera, Teatro Invertido e Maldita Cia. de Teatro. É justamente sua atuação junto a grupos, e não a indivíduos, que determinou sua verticalidade.

Essa experiência na forma de fazer, na organização do processo criativo em grupo, marcaria para sempre os trabalhos desses coletivos. O mesmo pode-se dizer da oficina de dramaturgia, ministrada pelo mesmo Luis Alberto de Abreu, que também foi uma das responsáveis por reforçar ainda mais na cidade a ideia da construção de uma dramaturgia própria, em processo, contemporânea, também criada com a participação do ator-criador, noção que faz parte do cotidiano artístico da grande maioria dos jovens grupos belo-horizontinos.

Aliás, muitos desses jovens grupos nasceram ou se consolidaram como desdobramento de experiências vividas no próprio Cine Horto. Além das já citadas Luna Lunera e Maldita, outro projeto seria determinante nesse sentido: o Festival de Cenas Curtas, no qual foi apresentado pela primeira vez a cena “Por Elise”, do Grupo Espanca!, posteriormente transformada em espetáculo e que se tornou um dos maiores sucessos da última década. Esse “milagre do teatro” continua a ser perseguido por dezenas de outros jovens que, a cada ano, inscrevem seus projetos de esquetes de 15 minutos a fim de investigar a linguagem teatral em suas nuances. Milagres não acontecem todo dia, diriam os mais realistas. E tendo a concordar. Mas a multiplicação, esta sim, é possível de ser feita, haja vista a quantidade de coletivos que hoje estão sólidos e com relevância no mercado: só para citar mais alguns, que, de uma forma ou de outra se relacionam com esse evento, Primeira Campainha, Cinco Cabeças, Quatroloscinco – Teatro do Comum, Preqaria Cia. de Teatro, dentre outras.

Espetáculo gerado no projeto Cena

3x4, “Casa de Misericórdias”,

Maldita Cia. de Investigação Teatral.

2003. Foto: Guto Muniz.

Público em uma das noites do Festival de Cenas Curtas 2013. Foto: Guto Muniz.

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Outro fato curioso, mas que me parece ser também reflexo da convivência propiciada por essas experiências, é a troca e o diálogo constante entre esses grupos, com muitos deles compartilhando seus profissionais, que trafegam de uma criação para a outra, criando um trânsito potencialmente rico de informações.

O volume de produção realizada nesse período não “cabe” mais no Cine Horto. Em algum tempo, talvez não tão longo assim, ele terá uma nova casa e, assim se espera, poderá ampliar ainda mais suas ações. Um desafio que se coloca é conseguir que essa produção – cada vez mais volumosa, mas nem por isso mais instigante em suas propostas – mantenha-se com a capacidade de extrapolar suas paredes e de ganhar autonomia artística e, não menos importante, financeira.

Nos últimos anos, de maneira mais direta, o Cine Horto passou também a promover a fomentar a cena local fora de nossas fronteiras. Se antes cabia ao espaço trazer o teatro que estava sendo feito e pensado no Brasil para Belo Horizonte, agora, atua também na outra via, gerando visibilidade às nossas produções em eventos de alcance nacional, como o Festival de Curitiba, e tem como desafio expandir essa influência, agregando não apenas os “filhos” de seus projetos.

Essa vertente para assumir uma dimensão de interferência na cena artís-tica em âmbito nacional pôde ser percebida também em algumas ações que envolveram a edição comemorativa do Festival de Cenas Curtas. Ao convidar quatro coletivos de importante atuação no país (Espanca!, Cia. Brasileira, Clowns de Shakespeare e Cia. Armazém) a criarem trabalhos inéditos para o evento, o Cine Horto se posiciona como detonador de novos processos criativos também fora de Belo Horizonte, onde já cum-pria esta função. Além disso, a aproximação com o pensamento crítico produzido ao redor do país tem sido marcante nas ações do espaço, não apenas promovendo a formação de novos profissionais através do Núcleo de Pesquisa em Jornalismo Cultural, que mantém desde 2009, assim como agregando a seus projetos a participação frequente de jor-nalistas especializados e teóricos do teatro no exercício de reflexão sobre a produção apresentada.

Público no Sabadão com Gero Camilo,

em 2012. Foto: Marcos Coletta.

Fachada do Galpão Cine Horto em 2013 e Mostra do Núcleo de Cenografia e Figurino. Foto: Guto Muniz.

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Olhar retrospectivamente para os desdobramentos das ações promovidas pelo espaço permite-nos constatar que estes formam um painel que pode ser enxergado como uma síntese das principais “tendências” do que está sendo feito e pensado na linguagem teatral na contemporaneidade. E isto não é pouco e, à priori, nem estava nos “objetivos conscientes” quando o espaço foi criado. Mas, assim como os encontros que vem promovendo ao longo desses tempos, o Cine Horto parece também viver um momento de transformação; e não digo isso apenas pela simbologia dos 15 anos. Até porque reinventar-se sempre foi uma das formas de sobrevivência e de afirmação do teatro.

um balanço DaS açõES rEalizaDaS pElo Galpão CinE HorTo Em 2013

Oficinão – 16ª edição: espetáculo “Ensaio de Mentira ou O último ensaio para dizer a verdade”, com dramaturgia de Assis Benevenuto e Vinícius Souza. Direção de Chico Pelúcio e Lydia Del Picchia. Público de mais de 500 pessoas.

Pé na Rua – 9ª edição: espetáculo “Fábulas Errantes”, inspirado nos contos dos Irmãos Grimm, com direção de Mariana Muniz. Cerca de 1550 espec-tadores em Belo Horizonte.

Dia do Teatro: Do Raiar ao Pôr-do-Sol: Apresentações gratuitas em três cidades mineiras: Belo Horizonte, Ipatinga e Igarapé, dos espetáculos

“Como a gente gosta” (Grupo Maria Cutia), O “Santo e a Porca” (Cine Horto Pé na Rua - 8ª edição), “Acontecimento em Vila Feliz” (Cia, Pierrot Lunar) e “Manga Mangueira, Meu Pé de Brincadeira” (Conexão Galpão), além da Mostra dos Rascunhos de Cena. Cerca de 1.000 espectadores.

Festival de Cenas Curtas - 14ª edição: 183 inscrições, 20 cenas. Além de 4 cenas de grupos convidados: Grupo Espanca! (MG), Clowns de Shakespeare (RN), Armazém Cia. de Teatro (RJ) e Cia. Brasileira de Teatro (PR). Público de 1.639 pessoas.

Festival Cena Espetáculo: 15 espetáculos apresentados. Público de 1.355 pessoas.

Sabadão: 3 edições – com Soraya Belusi (MG), Luciana Buarque (RJ) e Cia. La Minima (SP). Público de 115 pessoas.

Cursos Livres de Teatro : mais de 300 alunos, divididos em 19 cursos. Público de 1.100 pessoas nas Mostras dos Cursos (1º e 2º Semestre).

Núcleos de Pesquisa: 3 Núcleos de Pesquisa: Cenografia, Figurino e Jornalismo Cultura. Mais de 70 participantes e 270 espectadores nas mostras do 1º e 2º semestre.

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Oficinas de Verão: “A Fotografia nas Artes Cênicas”, com Guto Muniz; “Preparação do Ator”, com Lydia Del Picchia e “Treinamento Físico e Vocal para Atores”, com Elisa Toledo. Público de 44 alunos.

Cine Horto na Estrada: mais de 600 espectadores em cidades do interior de Minas Gerais.

Espetáculos na rua: público aproximado de 1500 pessoas.

Projeto Conexão: 77 Instituições participantes; público de 7.564 espectadores.

Ações Formativas: 7 oficinas realizadas para um total de 143 professores.

Projeto Grupo Galpão: Memória Feita à Mão: Mais de 200 visitas ao Ateliê Aberto; mais de 4.000 visitas à exposição física no Galpão Cine Horto; 2.109 visitas às exposições virtuais no Portal Primeiro Sinal; mais de 2.000 acessos ao Blog do Projeto.

Portal Primeiro Sinal de Teatro: 13.034 visitas no site em 2013. 64 novos conteúdos publicados (artigos, vídeos, exposições, entrevistas, periódicos).

E mais 13 espetáculos de fora ocuparam o Teatro Wanda Fernandes, somando mais de 3.900 espectadores.

InspIrar é transformar vIdas.—Ver à frente, ter coragem, realizar. Foi sua inquietação como artista que fez Marcus Faustini acreditar no poder transformador das pessoas. Ao criar a Agência de Redes para Juventude, ele inspirou os jovens das comunidades a serem protagonistas da própria vida e nunca desistirem dos seus sonhos. Essa é a nossa gente.É ela que nos inspira a construir o futuro.

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EQuipE Galpão CinE HorTo

Direção geral: Chico PelúcioConselho gestor: Beto Franco, Chico Pelúcio, Leonardo Lessa, Lydia Del Picchia e Romulo AvelarCoordenação geral: Leonardo Lessa

Assistente de coordenação: Aretha GallegoCoordenação de planejamento e projetos: Fernanda Werneck e Alexandra Abreu

Assistentes administrativos: Vanessa Fonseca e Jonathan SobralAssistente de planejamento: Ana Macedo

Coordenação de produção: Gustavo RuasProdução executiva: Graziella MedradoCoordenação Técnica: Rodrigo MarçalTécnicos: Carlos Antônio Santos (Cacá), Orlan Torres (Sabará) e Wellington

Santos (Baiano)Coordenação do Centro de Pesquisa e Memória do Teatro (CPMT): Luciene Borges

Assistente de coordenação do CPMT: Marcos ColettaBibliotecário: Tiago Carneiro Estagiária do CPMT: Bárbara RibeiroAssistente de implantação do CEDOC: Kalyana PachecoPesquisador do projeto Memória em Movimento: Vinícius SouzaBolsistas Extensão PUC Minas para o Portal Primeiro Sinal: Lucas Dolabella,

Lucas Magalhães, Bárbara Malafaia, Tamires Braga, Danielle BragaBolsista Extensão UFMG para o Portal Primeiro Sinal: Alexandre HugoCoordenação do Ateliê Aberto Memória Feita à Mão: Ana Luisa SantosAssistente do Ateliê Aberto Memória Feita à Mão: Lira RibasCoordenação de Conservação e Restauro: Luciana BonadioAssistente de Conservação e Restauro: Gerusa Radicchi

Bolsitas Extensão UFMG para o Ateliê Aberto: Camila Trindade, Carlos Caetano, Marília Dupin, Sarah Almeida Coordenação pedagógica: Lydia Del Picchia

Coordenação pedagógica dos cursos e oficinas: Fábio Furtado Coordenação pedagógica dos núcleos de pesquisa: Camila MorenaCoordenação pedagógica dos projetos especiais: Fábio FurtadoSecretária de cursos: Mirlene de Souza SilvaEquipe pedagógica: Camila Morena, Fábio Furtado, Gláucia Vandeveld,

Juliana Martins, Kelly Crifer, Leandro Acácio e Rita Maia Coordenação do projeto sociocultural Conexão Galpão: Reginaldo Santos Atores-monitores: Dayane Lacerda, Érica Hoffmann e Fabiano Lana

Gerência administrativa e financeira: Maria José dos SantosAuxiliar administrativo: Leandro Dias

EQuipE Grupo Galpão

Atores

Antonio Edson

Arildo de Barros

Beto Franco

Chico Pelúcio

Eduardo Moreira

Fernanda Vianna

Inês Peixoto

Júlio Maciel

Lydia Del Picchia

Paulo André

Rodolfo Vaz

Simone Ordones

Teuda Bara

Gerência executiva: Fernando LaraCoordenadora de produção: Gilma Oliveira Produtora executiva: Beatriz Radicchi Assistente de produção: Evandro Villela Consultor em planejamento: Romulo AvelarCoordenação de planejamento: Ana Amélia ArantesAssistente de planejamento: Natalha AbreuAssessora de comunicação: Beatriz FrançaAssistente de comunicação: Ana Carolina DinizCoordenação administrativa e financeira: Wanilda D’ArtagnanAssistente administrativa: Andréia OliveiraAssistente financeira: Renata FerreiraIluminação: Rodrigo MarçalCenotécnico: Helvécio IzabelSonorização: Vinícius AlvesAuxiliar Técnico: William TelesRecepção: Edvânia SantosServiços gerais: Lê Guedes

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Gerência operacional: William GomesRecepcionista: Dayane NonatoPorteiro: Eberton PereiraServiços gerais: Juarez Pereira e Maria Márcia Bento

Assessoria de comunicação: Caio OttaAssistente de comunicação: Thiago MouraCriação gráfica: Filipe Costa (Espaço Lampejo)Fotografia: Guto Muniz (Casa da Foto)Cobertura audiovisual: Caturra Digital