promotor de justiÇa - apostila eletrônica - apostilas ... · assegurar a solução de conflitos...

21
a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL 1

Upload: dangnhan

Post on 04-Dec-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

1

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

2

SUMÁRIO

I. Constituição................................................................................................................................ 003

II. Poder Constituinte..................................................................................................................... 008

III. Princípios Fundamentais.......................................................................................................... 011

IV. Os Direitos e Garantias Fundamentais..................................................................................... 013

V. Da Organização do Estado......................................................................................................... 048

VI. Da Administração Pública......................................................................................................... 055

VII. Organização dos poderes do Estado....................................................................................... 065

VIII. Das funções Essenciais à Justiça............................................................................................. 090

IX. Do Controle de Constitucionalidade......................................................................................... 094

X. Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas.............................................................. 106

XI. Do Sistema Tributário Nacional................................................................................................ 107

XII. Das Finanças Públicas.............................................................................................................. 118

XIII. A ordem Econômica e Financeira........................................................................................... 130

XIV. Do Sistema Financeiro Nacional............................................................................................. 140

XV. A Ordem Social........................................................................................................................ 142

XVI. Disposições Constitucionais Transitórias............................................................................... 152

XVII. Emendas Constitucionais...................................................................................................... 159

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

3

CONSTITUIÇÃO

1. CONCEITO E OBJETO DE CONSTITUIÇÃO A palavra constituição, em qualquer acepção que seja tomada, exprime o modo de ser de

alguma coisa, ou seja, determina a organização interna de seres e entidades. Nesse sentido, pode-se afirmar que em todo o agrupamento humano, por mais rudimentar que seja, a estrutura básica do corpo social e político é disciplinada por determinadas normas, escritas ou costumeiras (consuetudinárias), as quais podem ser chamadas de constituição.

A Constituição do Estado, considerada como a sua lei fundamental, a qual estabelece a

organização dos seus elementos essenciais; pode ser definida como um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regula a forma do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o exercício do poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites de sua ação, os direitos fundamentais do homem e as respectivas garantias. Em síntese, a constituição é o conjunto de normas que organiza os elementos constitutivos do Estado. Assim é que constituição significa o “corpo”, a “estrutura”, de um ser que se convencionou denominar Estado. Essa é a concepção jurídica da Constituição.

Atualmente, com exceção dos países que se baseiam em constituições consuetudinárias, a

constituição deve ser entendida como documento formal (escrito) e solene (auto proclamado de constituição), que codifica as normas mais relevantes que regulam a organização fundamental do Estado, tendo em vista os valores supremos da sociedade.

2. ELEMENTOS DA CONSTITUIÇÃO Conforme classificação elaborada por José Afonso da Silva, as normas constitucionais podem

ser diferenciadas ou separadas em diversas categorias levando-se em conta a sua estrutura normativa e conteúdo, sendo que essas "categorias" são denominadas de "elementos". São eles:

a) elementos orgânicos, que contêm normas que regulam a estrutura do Estado e do Poder,

que se concentram, predominantemente, nos Títulos II (Da organização do Estado), IV (Da organização dos Poderes e Sistemas de Governo), Capítulos II e III, do Título V (Das Forças Armadas e da Segurança Pública) e VI (Da Tributação e do Orçamento);

b) elementos limitativos, que se manifestam nas normas que consagram o elenco dos

direitos e garantias fundamentais (do Título II da Constituição- Dos Direitos e Garantias Fundamentais), excetuando-se os Direitos Sociais, que entram na categoria seguinte;

c) elementos sócio-ideológicos, consubstanciados nas normas que revelam o caráter de

compromisso das Constituições modernas entre o Estado individualista e o Estado Social, intervencionista, como as do Capítulo II do Título II (Direitos Sociais) e as dos Títulos VII (Da Ordem Econômica e Financeira) e VIII (Da Ordem Social);

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

4

d) elementos de estabilização constitucional, consagrados nas normas destinadas a

assegurar a solução de conflitos constitucionais, a defesa da Constituição, do Estado e das instituições democráticas, como os encontrados nos arts. 34 a 36, CF, os arts. 59, I e 60 (processo de emendas à Constituição), art. 102, I. "a" (controle de constitucionalidade);

e) elementos formais de aplicabilidade, que são os que se acham consubstanciados nas

normas que estabelecem regras de aplicação das normas constitucionais, assim, o preâmbulo, o dispositivo que contém as cláusulas de promulgação, as disposições constitucionais transitórias e o § 1°, art. 5°, que determina que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicabilidade imediata.

3. CLASSIFICAÇÕES DAS CONSTITUIÇÕES As constituições são qualificáveis ou classificáveis quanto à forma, quanto ao modo de

elaboração, quanto à origem, quanto à estabilidade, quanto à extensão, quanto ao conteúdo, e, por fim, quanto à dogmática.

a) quanto à forma: ● constituições escritas – as normas fundamentais do Estado estão codificadas e organizadas em um único texto; ● constituições não-escritas – são aquelas cujas normas não constam de um documento único e solene, mas resultam de leis esparsas, da jurisprudência e dos costumes, tal qual a constituição inglesa.

b) quanto ao modo de elaboração: ● constituições dogmáticas – são elaboradas por um órgão (poder) constituinte que sintetiza as idéias fundamentais da teoria política e do Direito dominantes no momento; ● constituições históricas ou costumeiras – são resultantes da lenta evolução histórica, do evoluir das tradições, que se cristalizam como normas fundamentais de organização de determinado Estado. Geralmente é possível associar a idéia de constituição não-escrita com constituição histórica ou costumeira, assim como é possível traçar um paralelo entre constituição escrita e dogmática. c) quanto à origem: ● constituições democráticas, populares ou promulgadas – são oriundas de um poder constituinte composto de representantes legitimamente eleitos pelo povo para o fim de elaborá-las e estabelecer; ● constituições outorgadas – são as elaboradas e estabelecidas sem a participação do povo, sendo impostas pelo governante. As Constituições brasileiras de 1824, 1937, 1967 e 1969 foram outorgadas.

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

5

d) quanto à estabilidade: ● constituições rígidas – são aquelas que somente são alteráveis por processos com exigências solenes e formais especiais, diferentes e mais rigorosas que as exigências para formação de leis ordinárias ou complementares. A Constituição brasileira de 1988 é rígida, pois para uma emenda constitucional ser aprovada é preciso a aprovação de 3/5 dos membros das casas legislativas, enquanto uma lei ordinária é aprovada por maioria simples. O procedimento especial de alteração da constituição através de emenda constitucional está disposto no art. 60, § 2º da CRFB/88. Além disso, a CRFB/88, no seu art. 60, §4º, estabelece tópicos intangíveis, os quais não podem ser alterados nem por emenda constitucional. CRFB, art. 60, § 2º - a proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros. CRFB, art. 60, § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes; IV – os direitos e garantias individuais. ● constituições flexíveis – não exigem um procedimento especial de modificação. As normas constitucionais alteram-se com o mesmo processo de criação de leis ordinárias. e) quanto à extensão: ● constituições sintéticas – são aquelas que dispõem sobre os aspectos fundamentais da organização do Estado e acerca dos direitos fundamentais de forma sucinta, em poucos artigos. Exemplo de constituição sintética é a dos Estados Unidos da América, uma vez que possui atualmente apenas 33 (trinta e três) artigos; ● constituições analíticas – dispõe a respeito de diversos aspectos da organização do Estado, abrangendo temas que não fazem parte das normas constitucionais em sentido material. Ou seja, as constituições analíticas regulam vários aspectos da organização política e social, muitos dos quais não precisariam estar, necessariamente, no texto constitucional. f) quanto ao conteúdo: ● constituições materiais – são aquelas que somente se referem à matéria essencialmente constitucional (aquela a respeito da organização do Estado e dos seus órgãos); ● constituições formais – definem e regulam; geralmente de forma escrita, mediante documento solenemente estabelecido pelo poder constituinte; diversas situações da organização política e social, abarcando matérias que não são essencialmente constitucionais.

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

6

g) quanto à dogmática: ● constituições ortodoxas ou simples - são resultado de uma só ideologia; ● constituições ecléticas ou complexas - resultam de um compromisso entre diversas forças políticas existentes em um determinado momento histórico. ● Classificação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. A CRFB promulgada em 1988 é uma constituição escrita, legal, dogmática, democrática (popular ou promulgada), rígida, analítica, formal, reduzida e eclética.

4. NORMAS CONSTITUCIONAIS, EFICÁCIA E APLICABILIDADE 4.1. APLICABILIDADE E INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

Alexandre de Moraes, referenciando a doutrina de Canotilho e Jorge Miranda, destaca uma

série de princípios e regras interpretativas das normas constitucionais, nomeadamente: ● Unidade da Constituição: a interpretação deve ser realizada de maneira a evitar contradições entre suas normas; ● Efeito integrador: deve ser dada primazia aos critérios favorecedores da integração política e social, bem como ao reforço da unidade política; ● Máxima efetividade (eficiência): a interpretação deve sempre buscar a maior eficácia possível da norma constitucional – principalmente em se tratando de Direitos Fundamentais; ● Justeza ou conformidade funcional: os órgãos encarregados da interpretação não poderão chegar a uma posição que subverta, altere ou perturbe o esquema organizatório-funcional constitucionalmente estabelecido pelo legislador constituinte originário; ● Concordância prática ou harmonização: exige-se coordenação e combinação dos bens jurídicos em conflito de forma a se evitar o sacrifício total de uns em relação aos outros; ● Força Normativa da Constituição: entre as interpretações possíveis, deve ser adotada aquela que garanta maior eficácia, aplicabilidade e permanência das normas constitucionais. ● Colisão (ou contradição) entre princípios: deve ser superada por meio da redução proporcional do âmbito de alcance de cada um deles ou, em alguns casos, mediante a preferência ou prioridade de certos princípios; ● Função útil da norma constitucional: é vedada a interpretação que lhe suprima ou diminua a finalidade; ● Preceitos constitucionais: deverão ser interpretados tanto explicitamente quanto implicitamente, com o fim de se alcançar compreensão mais adequada acerca do conteúdo da norma.

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

7

Uma questão que merece destaque se refere ao Preâmbulo da Constituição. Muito se

discute acerca de sua natureza e eficácia. Alexandre de Moraes e Pedro Lenza sustentam não se tratar de norma jurídica, porém o Preâmbulo constitucional possui importante função orientadora da interpretação e integração do texto constitucional. A ausência de caráter normativo exatamente é um dos fatores que fundamentam a desnecessidade de que a invocação da proteção de Deus não seja norma de reprodução obrigatória nas Constituições estaduais.1

Ainda em relação à hermenêutica constitucional, importante destacar dois mecanismos

fundamentais à constitucionalização dos textos normativos infraconstitucionais: a Interpretação conforme a Constituição e a Declaração de Inconstitucionalidade (nulidade) Parcial sem Redução de Texto.2

A interpretação conforme a Constituição pode ser com ou sem redução de texto. Uma de

suas finalidades será exatamente preservar (ou tentar salvar) a constitucionalidade da norma infraconstitucional na sua concepção textual originária. Haverá interpretação conforme a Constituição com redução de texto quando, em virtude da redação do texto confrontado, for declarada a inconstitucionalidade de determinada.

Na interpretação conforme a Constituição sem redução de texto a constitucionalidade da

norma está condicionada à determinada interpretação. Ou seja, como leciona a Professora Vânia Hack de Almeida, não se trata de alterar o texto, mas sim de vincular a sua constitucionalidade à determinada interpretação.3 Na interpretação conforme a Constituição não se declara inconstitucionalidade de uma norma infraconstitucional quando for possível uma interpretação que resguarde a harmonia e coesão sistemática da ordem constitucional. Não se faz, portanto, interpretação por fatias, devendo ser sempre considerado o sistema constitucional como um todo.

APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

Normas Constitucionais de eficácia plena:

dispõem de aplicabilidade direta, imediata e integral.

Normas Constitucionais de eficácia contida: não são dotadas de

aplicabilidade integral (há possibilidade de redução do alcance

do preceito por via da legislação ordinária)

Normas Constitucionais de eficácia limitada: não são providas de

aplicabilidade direta e imediata (subdividem-se em declaratórias de

princípio institutivo ou organizatório e declaratórias de princípio programático)

Por sua vez, a declaração de nulidade parcial sem redução de texto, a certa maneira, segue o

caminho inverso: excluem-se, por inconstitucionalidade, determinadas hipóteses de aplicação do dispositivo infraconstitucional confrontado sem que se produza alteração em seu texto.

1 "Preâmbulo da Constituição: não constitui norma central. Invocação da proteção de Deus: não se trata de norma de reprodução obrigatória na Constituição estadual, não tendo força normativa". (ADI 2.076, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 08/08/03) 2 Assim dispõe o parágrafo único do artigo 28 da Lei n.º 9.868/1999: “A declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal.” (grifado). 3 ALMEIDA, Vânia Hack. Controle de constitucionalidade. 2.ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2005, p. 103.

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

8

PODER CONSTITUINTE

1. CARACTERÍSTICAS O poder constituinte é o poder de criar, de estabelecer uma nova Constituição. Ele se divide

em Originário e Derivado. Trata-se da expressão da vontade política suprema de um povo direcionada à elaboração ou

alteração do texto constitucional. É, portanto, o poder de criar a Constituição ou reformá-la. Nos regimes democráticos, este poder, cujo titular é sempre o povo, é exercido por

representantes eleitos, os quais formam uma Assembléia Nacional Constituinte. Isso está consagrado no Preâmbulo da Constituição Federal de 1988.

2. ESPÉCIES São espécies de Poder Constituinte: a) Originário b) Derivado Reformador c) Derivado Revisor d) Mutações Constitucionais e) Derivado Recorrente

2.1. PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO a) Conceito: consiste no poder de elaborar uma constituição, inaugurando uma nova ordem

jurídico-constitucional. O poder constituinte originário traz consigo uma ideia de ruptura em face da ordem jurídica anterior.

b) Recepção e não-recepção: essa ruptura, entretanto, não ignora os atos legislativos de um

ordenamento anterior, porquanto vai recepcionar os atos normativos antecedentes, desde que compatíveis com a nova Constituição. Ao contrário, tudo o que se mostrar incompatível com as novas normas constitucionais será considerado não recepcionado e, em consequência, revogado. Em nosso sistema não se admite a inconstitucionalidade superveniente, ou seja a norma anterior é considerada revogada e não inconstitucional.

c) Desconstitucionalização: também não é aceita em nossa ordem constitucional a

desconstitucionalização, assim entendida a situação em que permanece em vigor uma ordem constitucional mesmo em face da promulgação de uma nova Constituição. Todavia, a permanência do texto anterior implicaria na redução de sua hierarquia, passando do plano constitucional para o infraconstitucional.

d) Titularidade do poder constituinte originário: a titularidade do poder constituinte é do

povo, que o exerce, em regra, da forma representativa, através de representantes eleitos, que vão

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

9

reunir-se em uma Assembleia Geral Constituinte. Também há formas de manifestação direta desse poder constituinte, como o plebiscito e o referendo.

e) Características: o poder constituinte originário possui as seguintes características: inicial,

autônomo, ilimitado e incondicionado. Inicial – instaura uma nova ordem jurídica. Autônomo – quem exerce o poder constituinte vai dispor sobre o novo ordenamento jurídico, estabelecendo a nova estrutura estatal e normas de regência. Incondicionado – não lhe são impostas formas de manifestação. Ilimitado – ou, melhor dizendo, juridicamente ilimitado, porquanto não há direito ou norma anterior lhe impondo limites ou restrições, embora limitado por valores sociais, econômicos e culturais.

Em face dessas características, uma nova constituição não contém normas inconstitucionais.

Se não há norma anterior lhe servindo de fundamento, um poder constituinte originário não produz normas viciadas ou inconstitucionais. Desde já alerte-se que as emendas constitucionais podem ser inconstitucionais, como adiante será demonstrado.

O poder constituinte originário também será permanente, porquanto permanece apto a

manifestar-se quando assim entender seu titular, qual seja, o povo. 2.2. PODER CONSTITUINTE DERIVADO REFORMADOR a) Conceito: também denominado de poder constituído, instituído ou de segundo grau,

porquanto instituído ou previsto pelo constituinte originário, que estabelece limites e condições para reforma da constituição, bem como aponta quem poderá revisar o texto constitucional. Em nossa atual Constituição, em face de sua rigidez, o processo legislativo de reforma constitucional se dá através das emendas constitucionais, disciplinadas no art. 60.

b) Limitações: o poder de reforma constitucional, limitado por natureza, mostra várias

ordens de limitações: formais ou processuais, circunstanciais, temporais e materiais. Em nossa atual Constituição, as limitações apresentam-se da seguinte forma: ● Processuais ou formais - dizem respeito ao processo legislativo de reforma da

Constituição. (Ex. exigência de dois turnos de votação, maioria qualificada de 3/5 para aprovação, iniciativas legislativas especiais, proibição de ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa em que rejeitada ou tida por prejudicada.)

● Limitações circunstanciais - entendem-se aquelas que impedem a reforma da Constituição

na vigência de estado de sítio, estado de defesa ou intervenção federal. ● Limitações temporais - ocorrem quando se impede a reforma constitucional durante um

período de tempo. A atual Constituição não contém essa espécie de limite, porquanto pode ser alterada a qualquer momento.

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

10

● Limitações materiais - determinadas matérias ou núcleos temáticos da Constituição – as

cláusulas pétreas – que não admitem qualquer possibilidade de alteração. Impede-se que sejam objeto de reforma as decisões políticas fundamentais do legislador constituinte originário, assim consideradas aquelas que dão identidade à Constituição. Exatamente por isso, veda-se qualquer emenda, porquanto alterar essas matérias constitucionais será retirar sua própria identidade. Com essa imutabilidade preserva-se a identidade e a continuidade de um sistema constitucional. O art. 60, § 4º, da Constituição Federal de 1988 elenca como cláusulas pétreas a forma federativa de estado, o voto direto secreto, universal e periódico, a separação dos poderes e os direitos e garantias individuais.

2.3. PODER CONSTITUINTE DERIVADO REVISOR a) Conceito: denomina-se de revisão constitucional o poder constituinte, também derivado

do constituinte originário, que se manifesta de forma extraordinária e transitória. Difere da reforma constitucional que é via permanente de alteração da constituição. Ex. art. 3º do ADCT.

2.4. MUTAÇÕES INFORMAIS DA CONSTITUIÇÃO a) Conceito: constituem-se mutações informais da Constituição as alterações da norma

constitucional, que ocorrem sem que o texto sofra modificações. Ou seja, a constituição não é reformada mediante um processo legislativo formal (emenda), mas seu significado e alcance sofrem mudanças, em regra através dos usos e costumes, evolução cultural ou jurisprudencial.

2.5. PODER CONSTITUINTE DERIVADO DECORRENTE a) Conceito: denomina-se poder constituinte decorrente à parcela de poder constituinte

atribuída aos Estados-membros, permitindo-lhes dotar-se de uma constituição própria. Os Estados-membros e o Distrito Federal auto-organizam-se através de constituições locais, no Distrito Federal denominada de Lei Orgânica. É também derivado, porquanto estabelecido pelo legislador constituinte originário.

b) Limitações: a limitação está nos princípios da Constituição Federal. São os princípios

constitucionais sensíveis, estabelecidos e extensíveis. c) Sensíveis: encontram-se previstos no art. 34, VII, da Constituição Federal, e sua

inobservância permite a intervenção da União. d) Estabelecidos: designam-se as normas de observância obrigatória encontradas em todo o

texto constitucional, que estabelecem preceitos de observância compulsória pelos Estados-membros.

e) Extensíveis: constituem-se em normas que regulam determinadas matérias concernentes

à União e que devem ser também (de forma extensiva) observadas pelos Estados.

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

11

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

Os princípios fundamentais do Estado brasileiro estão previstos no Título I da nossa Constituição Federal. São também identificados como princípios estruturantes do nosso sistema constitucional, porquanto “têm relevante função na indicação dos valores que devem predominar no processo hermenêutico, isto é, o de descoberta do sentido da norma constitucional. Os princípios fundamentais estão muito além de indicadores da atuação do Estado, pois consubstanciam os valores de suprema importância na organização da sociedade brasileira”4.

Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

O nome do Estado – República Federativa do Brasil – indica a forma de governo – república – e a forma de estado – federação.

1. REPÚBLICA

República é forma de governo que se opõe à monarquia, caracterizando-se principalmente pela necessária alternância no poder e pela responsabilidade dos agentes públicos, que respondem por seus atos. Por isso são considerados seus elementos essenciais a temporariedade dos mandatos políticos e a responsabilidade dos governantes.

2. FEDERAÇÃO O federalismo é a forma de estado adotada, significando uma união de entes que gozam de

autonomia. São partes indissociáveis. Nossa federação é formada pela União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, de forma indissolúvel.

4 Slaibi Filho, Nagig. Direito Constitucional. 2004. Rio de Janeiro, Forense, p. 141.

Federação

Forma de Estado

República

Forma de Governo

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

12

3. ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO O art. 1º também estabelece um Estado Democrático de Direito, ou seja, sua submissão às

normas jurídicas, normas democráticas, elaboradas com a participação popular direta ou por meio de representantes.

Estado de direito significa que todos se encontram submetidos às regras jurídicas, inclusive o

próprio Estado. De outro lado, a Constituição adota uma democracia semidireta ou participativa, porquanto

assegura exercício de soberania popular de maneira indireta ou representativa e de maneira direta. 4. FUNDAMENTOS Soberania é o poder político que atribui ao Estado sua personalidade de direito

internacional. Cidadania é a possibilidade de participação dos indivíduos nas decisões políticas. Em nosso

sistema constitucional, cidadão é o eleitor, ou seja, quem está no gozo de seus direitos políticos. Dignidade da pessoa humana, que, no conceito de Ingo Sarlet, significa a qualidade intrínseca

e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. 5

Valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, garantindo-se aos seres humanos sua

subsistência e o desenvolvimento do país. Pluralismo político, afirmando a participação popular nos rumos políticos, garantindo a

organização e participação de partidos políticos. 5. ORGANIZAÇÃO DOS PODERES O artigo 2ª consagra o princípio da separação de poderes, na doutrina clássica da tripartição

dos poderes.

Art. 2º. São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

5 Sarlet, Ingo. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais, 3.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, p. 59-60.

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

13

6. OBJETIVOS FUNDAMENTAIS

A Constituição Federal declara os fins do Estado, vinculando a atuação dos poderes públicos, objetivando promover a justiça social.

Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

7. PRINCÍPIOS QUE REGEM AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS

Cuida aqui a Constituição de consagrar os princípios que determinam a atuação e os compromissos do Estado brasileiro na ordem internacional.

Art. 4º. A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: I - independência nacional; II - prevalência dos direitos humanos; III - autodeterminação dos povos; IV - não-intervenção; V - igualdade entre os Estados; VI - defesa da paz; VII - solução pacífica dos conflitos; VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X - concessão de asilo político. Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

14

DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

Considerações Iniciais A expressão Direitos Fundamentais indica que se tratam de situações jurídicas sem as quais a

pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive. A todos por igual devem ser reconhecidos, concreta e materialmente.

São direitos constitucionais na medida em que se inserem no texto de uma constituição.

Nascem e fundamentam-se no princípio da dignidade da pessoa humana. O Título II da Constituição Federal trata dos direitos e garantias fundamentais, subdividindo-

os em cinco capítulos: dos direitos e deveres individuais e coletivos (art. 5º); dos direitos sociais (arts. 6º-11); da nacionalidade (arts. 12 e 13); dos direitos políticos (arts. 14-16); e, dos partidos políticos (art. 17).

Prestações Positivas, Negativas e de Tutela Transindividual Costuma-se apontar a existência de três gerações ou dimensões de direitos fundamentais, as

quais surgiram em momentos históricos distintos. Os direitos de primeira geração correspondem aos limites impostos à atuação do Estado. Representam uma prestação negativa, um não fazer do Estado, em respeitos aos direitos individuais dos cidadãos. Os direitos de segunda geração dizem respeito aos direitos sociais (direitos de conteúdo econômico e social que visam a melhorar as condições de vida e trabalho da população). Implicam uma prestação positiva do Estado. Por fim, a terceira geração corresponde a mais recente forma de tutela de direitos fundamentais, qual seja, a proteção dos direitos difusos e coletivos, dos direitos que ultrapassam a esfera individual para abarcar uma pluralidade de pessoas (direitos de solidariedade). Alguns autores como Norberto Bobbio defendem a existência de direitos de quarta geração, consistindo naquela categoria de relações decorrentes do avanço da ciência, em especial as questões relativas à bioética.

Direitos fundamentais de

1ª geração Direitos fundamentais de 2ª

geração Direitos fundamentais de 3ª geração

Limites à atuação do Estado. Correspondem a um não-

fazer estatal. São as liberdades públicas e

aparecem no art. 5º da CF.

Direitos de conteúdo econômico e social que impõem ao Estado não

mais uma abstenção, mas uma prestação positiva.

Representam direitos que dizem respeito não mais às pessoas

individualmente consideradas. São os direitos transindividuais, difusos e

coletivos. Todas as constituições brasileiras enunciaram direitos fundamentais, mas a Constituição de

1988 é a mais completa nesse sentido, inovando nos seguintes aspectos:

a) trouxe os direitos fundamentais para o início da Constituição, tratando-os antes mesmo da própria organização do Estado, realçando sua importância na nova ordem democrática;

b) tutelou direitos transindividuais (direitos da terceira geração);

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

15

c) impôs deveres ao lado de direitos.

1. DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS. DIREITO INTERNACIONAL DE

DIREITOS HUMANOS E DIREITO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO Considerações iniciais O art. 5º da Constituição apresenta um rol extenso, mas não taxativo, de direitos e garantias

individuais e coletivos. Trata-se da enunciação dos direitos de primeira geração, exigindo uma prestação negativa por parte do Estado.

Os direitos dessa natureza surgem a partir das revoluções burguesas do século XVIII,

inspiradas nos ideais iluministas, segundo os quais a pessoa humana possuiu certos direitos inerentes a essa condição e que não podem ser desconsiderados pelos entes estatais.

Os direitos individuais e coletivos do art. 5º são irrenunciáveis (não se pode abrir mão dos

direitos individuais), inalienáveis (são direitos intransferíveis, inegociáveis) e imprescritíveis (não deixam de ser exigíveis pela falta de uso). No entanto, os direitos fundamentais não são absolutos na medida em que possível a ocorrência de conflito de interesses resultante da colisão entre dois direitos fundamentais. O desfecho nesses casos depende de aplicação dos métodos de interpretação constitucional ao caso concreto.

Não se pode anular ou ignorar um dos direitos fundamentais, mas tão somente mitigar sua carga de eficácia. Através do “princípio” da proporcionalidade ou da razoabilidade é possível se encontrar uma solução ao caso concreto que envolver colisão entre dois direitos fundamentais.

Via de regra, os direitos individuais têm eficácia plena e aplicabilidade imediata, isto é, não

dependem de norma regulamentadora para poderem ser exercidos. É o que se desprende do § 1º do art. 5º da Constituição:

Art. 5º, § 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicabilidade imediata. O § 2º desse mesmo artigo esclarece que os direitos e garantias enunciados no texto

constitucional são meramente exemplificativos, havendo o reconhecimento de direitos individuais e coletivos fundamentais implícitos e também os decorrentes de tratados internacionais.

Assim dispõe o § 2º do art. 5º em análise: Art. 5º, § 2º - Os direitos e garantias expressos nessa Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. Com a Emenda Constitucional n.º 45/2004 foram incluídos outros dois parágrafos ao artigo

5º: § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

16

Em que pese fosse aceito em doutrina, de forma majoritária, a posição no sentido de que os

Tratados e Convenções Internacionais de Direitos Humanos têm equivalência às normas constitucionais, agora o constituinte derivado introduziu regramento próprio no texto constitucional, no citado parágrafo 3º, para que tais atos internacionais adquiram o status de Emenda Constitucional.

De outro lado, o entendimento atual do Supremo Tribunal Federal, quanto aos Tratados

Internacionais de Direitos Humanos introduzidos no ordenamento jurídico interno antes da Emenda Constitucional nº 45, é de que estes seriam dotados de supralegalidade (superiores às leis ordinárias e inferiores às normas constitucionais).

Consoante mencionado no HC 88240, “A esses diplomas internacionais de direitos humanos é

reservado o lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de ratificação.” (STF)

§ 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

Já o parágrafo 4º consolida o disposto no art. 7º das ADCT. Assim, nos termos do art. 5º do

Estatuto de Roma (que cria o Tribunal Penal Internacional), o Tribunal terá competência para julgar: a) os crimes de genocídio; b) os crimes contra a humanidade; c) os crimes de guerra; e, d) os crimes de agressão. Espécies de Direitos Individuais e Coletivos

Os direitos individuais e coletivos básicos são cinco: direito à vida, à liberdade, à igualdade, à

segurança e à propriedade. Em que pese o texto constitucional fale em “brasileiros e estrangeiros residentes no País” (e por brasileiros compreenda-se os brasileiros natos e naturalizados), a doutrina e o STF tem estendido tais direitos ao estrangeiro não-residente no País, aos apátridas e às pessoas jurídicas. Importante: na prova, atentar com muito cuidado para a redação da questão para se ter em mente se a pergunta versa sobre o que está consagrado no texto da Constituição ou se busca o

CF

Tratados Internacionais de Direitos Humanos antes da EC 45

Leis Ordinárias

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

17

entendimento atual da doutrina e do STF. Cabe também destacar a diferenciação entre direitos e garantias. Assim, direitos seriam bens

e vantagens prescritos na norma constitucional, enquanto que as garantias seriam os instrumentos através dos quais se assegura o exercício dos aludidos direitos (preventivamente) ou prontamente os repara, caso violados. Dito de outro modo, direitos teriam natureza meramente declaratória, enquanto as garantias possuem um caráter assecuratório, de instrumentalidade da tutela constitucional.

Art. 5º, caput – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Os 78 incisos do art. 5º, que serão a seguir analisados, estabelecem em linhas gerais, já que

não são taxativos, a proteção dos cinco direitos individuais fundamentais: vida, liberdade, igualdade, segurança e propriedade. Vejamos:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; Expressão do direito fundamental à igualdade, esse dispositivo torna inaceitável a utilização

do critério sexo sempre que o mesmo seja eleito com o propósito de desnivelar materialmente o homem da mulher. Aceita-se a diferenciação, porém, quando a finalidade pretendida for atenuar os desníveis, em consonância com a clássica lição segundo a qual igualdade significa tratar igualmente aos iguais e desigualmente aos desiguais, na exata medida de suas desigualdades.

II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; Trata-se do princípio da legalidade, o qual diz respeito à segurança do indivíduo em matéria

jurídica. Tal princípio visa a combater o poder arbitrário do Estado, constituindo, assim, necessária manifestação do Estado de Direito. Dessa forma, somente por meio das espécies normativas elencadas no art. 59 da CRFB/88, elaboradas conforme o devido processo legislativo, serão hábeis a criar obrigações ao indivíduo. O indivíduo é, portanto, livre para fazer ou deixar de fazer qualquer coisa que não esteja prevista em lei.

III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; O referido dispositivo tutela o direito fundamental à vida e à integridade física, repelindo as

práticas incompatíveis com a vida e com a dignidade humana. A tortura constitui crime, e sua tipificação legal encontra-se na Lei n. 9.455/97. O artigo 1º da referida lei define o crime de tortura, nos seguintes termos:

Art. 1º Constitui crime de tortura: I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa; II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. Pena - reclusão, de dois a oito anos. § 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

18

medida legal. § 2º Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos. § 3º Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão de quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos. Trata-se de um dispositivo por meio do qual o legislador infraconstitucional reforça o

combate à tortura, principalmente aquela oriunda das práticas do poder repressivo estatal, seja na colheita de provas, seja no tratamento carcerário.

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; O pensamento, em si, é absolutamente livre. A liberdade de expressão, por sua vez, constitui

fundamento essencial de uma sociedade democrática. A manifestação do pensamento, embora livre, não pode ser feita de forma abusiva ou

descontrolada. Os excessos porventura ocorridos no exercício indevido do direito à liberdade de expressão são passíveis de apreciação pelo Judiciário.

A Constituição Federal assegura, de um lado, a livre manifestação do pensamento, e, por

outro, determina a responsabilização por aquilo que é manifestado. Assim, veda-se o anonimato, ou seja, as pessoas são obrigadas a assumir a responsabilidade do que exteriorizam, não podendo esconderem-se sob a forma do anonimato.

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; Essa norma pretende a reparabilidade da ordem jurídica lesada, seja através de reparação

econômica, seja através de outros meios, por exemplo, o direito de resposta. Representa o exercício do direito de defesa por quem foi ofendido com a manifestação do

pensamento de outrem. A pessoa atingida tem o direito de apresentar a sua resposta ou retificação, oferecendo a sua versão dos fatos, em dimensões iguais à do escrito ou transmissão que deu causa a esse direito.

A Constituição assegurou, também, a indenização por danos materiais, morais e à imagem,

consagrando ao ofendido a total reparabilidade em virtude dos prejuízos sofridos.

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; A liberdade de consciência é de foro íntimo, interessando apenas ao indivíduo, e não está

sujeita a qualquer forma de controle pelo Estado. Essa forma de liberdade compreende a liberdade de crença, que nada mais é que a liberdade de foro íntimo em questões de natureza religiosa. Assegura-se, assim, a liberdade de professar ou não alguma religião, de acreditar ou não em alguma divindade.

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

19

A Constituição assegura, na forma da lei, a exteriorização da liberdade de crença, qual seja, a

liberdade de culto.

VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva; Essa previsão constitucional encerra um direito subjetivo daquele que se encontra internado

em estabelecimento coletivo, cabendo ao Estado a materialização das condições para a prestação dessa assistência religiosa.

Tendo em vista a total liberdade religiosa assegurada pela Constituição, ninguém que se

encontre nessa situação poderá ser obrigado a utilizar-se da assistência religiosa.

VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; A objeção ou escusa de consciência consiste no direito de não prestar serviço militar

obrigatório ou qualquer outra obrigação legal a todos imposta por motivo de crença religiosa, filosófica ou política. Atualmente, na hipótese de objeção de consciência, faculta-se a prestação de serviço social alternativo.

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; A fim de assegurar a ampla liberdade de manifestação do pensamento, a Constituição

Federal vetou a possibilidade de censura prévia (verificação da compatibilidade entre um pensamento que se pretende exprimir e as normas legais vigentes) ou licença (exigência de autorização de agente ou órgão para que um pensamento possa ser exteriorizado).

A liberdade de expressão, em todos os seus aspectos, deve ser exercida com a necessária

responsabilidade que se exige em um Estado Democrático de Direito, de modo que o desvirtuamento da mesma para o cometimento de fatos ilícitos possibilita aos prejudicados a indenização por danos materiais e morais, além do efetivo direito de resposta.

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; A inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem das pessoas forma a proteção

constitucional à vida privada, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas.

XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; Via de regra, ninguém pode entrar na casa sem o consentimento do morador, devendo-se

entender como casa o lugar onde uma pessoa vive ou trabalha, não aberto ao público, reservado a sua intimidade e a sua vida privada.

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

20

A própria Constituição estabelece as exceções à inviolabilidade do domicílio. Nesse sentido, é possível entrar na casa sem o consentimento do morador nas seguintes hipóteses: durante o dia, em caso de flagrante delito ou desastre, para prestar socorro e, ainda, por determinação judicial; durante a noite, somente em situações de flagrante delito ou desastre para prestar socorro. A entrada no domicílio sem o consentimento do morador por determinação judicial somente poderá se dar durante o dia.

Casos em que se permite entrar na casa sem o consentimento do morador

Durante o dia Durante a noite flagrante delito flagrante delito

desastre desastre para prestar socorro para prestar socorro

por determinação judicial -----

XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal; O indivíduo precisa ter segurança de que todas as suas comunicações pessoais, tanto as

feitas por cartas como as realizadas por telegramas ou telefonemas, não serão interceptadas por outras pessoas. Essa inviolabilidade tutela, ao mesmo tempo, a liberdade de manifestação do pensamento e o direito à intimidade das pessoas.

O inciso em análise permite que as comunicações telefônicas sejam interceptadas para fins

de investigação criminal ou instrução processual penal. A Lei n. 9.296/96 regulamentou a possibilidade de interceptação telefônica na apuração de determinados tipos de crimes e em certas ocasiões. Veda, por exemplo, a interceptação quando a prova puder ser obtida por outro meio ou quando o fato investigado for punido, no máximo, com pena de detenção.

XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; A liberdade de ação profissional consiste na faculdade de escolha de trabalho que se

pretende exercer. É o direito de cada indivíduo exercer qualquer atividade profissional, de acordo com as suas preferências e habilidades.

Consagrou-se o direito ao livre exercício de profissão como norma de eficácia contida, pois a

Constituição previu a possibilidade de edição de lei que estabeleça as qualificações necessárias para o seu exercício. Ressalte-se que a legislação somente poderá estabelecer condicionamento capacitários que apresentem nexo lógico com as funções a serem exercidas, jamais qualquer requisito discriminatório ou abusivo.

XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional; É o direito constitucional de informar, de se informar e o de ser informado. O direito de

receber informações é um direito de liberdade e caracteriza-se essencialmente por estar dirigido a todos os cidadãos, com a finalidade de fornecimento de subsídios para formação de convicções relativas a assuntos públicos.

a DELEGAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DO RS

PROMOTOR DE JUSTIÇA - MPGO DIREITO CONSTITUCIONAL

21