PROMOO DA SADE E SERVIO SOCIAL: elementos para o debate1

Kathleen Elane Leal Vasconcelos

Valdilene Viana Schmaller

RESUMO Este artigo examina o debate sobre a promoo da sade no discurso sanitrio contemporneo, especificamente, na profisso de Servio Social. No estudo, optamos pela abordagem qualitativa, e para coleta de dados a pesquisa bibliogrfica em artigos dos anais do Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais e em peridicos, abrangendo o perodo de 2006 a 2012. A defesa da Reforma Sanitria est presente como tendncia no debate profissional; porm, a corrente mais identificada a Nova Promoo da Sade. imperativo aprofundar a discusso sobre o tema uma estratgia para desvelamento das contradies da Promoo da Sade. Palavras-chave: Promoo da Sade. Servio Social. Debate professional. Abstract This article examines the discussion about the promotion of the health in the contemporary sanitary speech, specifically, in the profession of Social Service. In the study, the qualitative approach was adopted, and to collect data the bibliographical research was used in articles from the annals of the Brazilian Congress of Social Workers and periodicals covering the period 2006-2012. The defense of the Sanitary Reform is present like tendency in the professional debate; however, the most identified current is the New Promotion of the Health. It is imperative to deepen the discussion as a strategy to unveil the contradictions of Health Promotion. Keywords: Health Promotion. Social Work. Professional debate.

1. ALGUMAS PALAVRAS INICIAIS

Nos ltimos anos, debates, pesquisas e programas/projetos em torno da Promoo da

Sade (PS) vm se disseminando no mbito das polticas pblicas de diversos pases, sob a

1 Artigo publicado nos anais do Seminrio Servio Social e Sade, realizado em So Jos dos Campos, em abril de

2014.

batuta da Organizao Mundial de Sade (OMS) e suas regionais. Esse processo configura um

movimento internacional, denominado de Nova2 Promoo da Sade (NPS).

As propostas desse movimento buscam alternativas ao modelo biomdico3 - ainda

hegemnico no cenrio atual - e abrangem questes relacionadas aos Determinantes Sociais

da Sade (DSS), equidade, intersetorialidade, participao social, ao empowerment, s

redes de apoio social, num discurso aparentemente progressista.

No Brasil, disseminou-se a ideia de que os princpios da NPS so concatenados com os

do Movimento de Reforma Sanitria (MRS) dos anos 1980. Constata-se que a legislao

nacional, especialmente desde o incio da dcada de 2000, est repleta de referncias ao termo

e considera a PS como uma estratgia fundamental para o Sistema nico de Sade (SUS).

importante destacar que, no obstante o aspecto de consenso e modismo, o

discurso da NPS (...) heterogneo e possui contradies que correspondem a interesses

diversos (CZERESNIA, 2003, p.9). Nesse sentido, a temtica parece constituir um verdadeiro

caleidoscpio, perpassada por diversas tendncias, expressando tenses polticas e tericas.

No Servio Social, apesar do termo PS ser recorrente nos discursos e textos da rea da

sade e da categoria estar envolvida no planejamento, execuo e avaliao de

projetos/programas de PS ou inserida em espaos ocupacionais nos quais a PS aparece como

uma das diretrizes do trabalho, o debate terico-poltico e conceitual sobre o tema da NPS no

aparece com densidade, sendo esparsos os estudos sobre o mesmo.

Diante da relevncia dessa discusso para a categoria, no trabalho em tela objetivamos

apresentar alguns resultados de uma pesquisa de doutorado que buscou analisar como se

configura o debate sobre PS na produo terica do Servio Social (VASCONCELOS, 2013).

2. AS RAZES DO MOVIMENTO DA NOVA PROMOO DA SADE: BREVES

CONSIDERAES

As propostas em torno da NPS surgem na dcada de 1970, em um cenrio marcado

pela crise do capitalismo e a ascenso de propostas neoliberais; por reivindicaes de

movimentos sociais que, em diversas partes do globo, lutavam por direitos sociais, entre eles o

direito sade; por um processo de mudanas no perfil de morbimortalidade da populao de

diversos pases, principalmente os centrais, que colocam em evidncia o papel das doenas

crnico-degenerativas; por constataes da falta de efetividade de um sistema de sade

2 Mais adiante situaremos o porqu do uso da adjetivao.

3 Caracterizado pela nfase no individualismo; no biologismo; na especializao mdica; na tecnificao do ato

mdico; no curativismo (MENDES, 1996). Tal modelo propunha como foco da formao e dos servios de sade a doena e o indivduo, tendo como figura central o mdico e como unidade organizacional principal o hospital, conforme menciona o autor em tela.

direcionado ao atendimento das situaes agudas de adoecimento. Todo esse processo

culminou em diversas crticas ao modelo biomdico.

Neste contexto, a gestao do movimento de NPS ocorreu no Canad, no decnio

citado, tendo emergido formalmente atravs da divulgao, em 1974, do documento A New

Perspective on the Health of Canadians (conhecido como Informe Lalonde), de autoria Marc

Lalonde, ento assessor do ministro da sade (CARVALHO, 2005). No documento, partindo de

estudos epidemiolgicos, o autor constata que, naquele pas, tinham ocorrido mudanas nas

condies de vida da populao e que as doenas infecciosas no eram mais as principais

causas de morte, mas as doenas crnicas e acidentes, associadas principalmente ao

comportamento e ao ambiente (LALONDE, 1981). Apesar do novo perfil de morbimortalidade,

segundo o autor, o sistema de sade canadense prosseguia mdico-centrado, com foco na

assistncia mdica, hospitalar, exames laboratoriais e medicamentos prescritos. Ao buscar

ultrapassar essa viso tradicional de sade, o autor traa o conceito de campo de sade

(LALONDE, 1996, p.5), que abrangeria a biologia humana, o meio ambiente, o estilo de vida e a

organizao da ateno sade. Lalonde priorizao de medidas preventivas e programas

educativos voltados para as mudanas comportamentais e de estilos de vida (WESTPHAL,

2006).

As ideias do canadense se espraiaram por diversas partes do globo sob a regncia da

OMS, impregnando prticas de promoo de sade com foco na modificao de hbitos, estilos

de vida e comportamentos individuais no saudveis, entre os quais o tabagismo, a obesidade,

questes relacionadas vida sexual e ao abuso de substncias psicoativas.

No obstante sua disseminao, diversas crticas foram direcionadas ao carter

individualizado e normativo de vrias dessas propostas, bem como sua instrumentalidade ao

iderio neoliberal que nascia.

Para fazer face s crticas ao Relatrio Lalonde, emerge a Moderna ou Nova

Promoo da Sade (agora adjetivada em contraposio tanto ao preventivismo4, quanto ao

Relatrio Lalonde). Alguns autores, como Westphal (2007), indicam como marco inicial da NPS

a Conferncia Internacional de Cuidados Primrios em Sade5, realizada em Alma Ata6, em

4 importante mencionar que, entre as dcadas de 1930 e 1940, emerge, nos EUA, o movimento de medicina

preventiva que, partindo da histria natural das doenas e tendo como disciplinas bsicas para a interveno a epidemiologia e a clnica, propunha uma srie de medidas preventivas que ampliariam uma lacuna da prtica mdica: a atitude preventiva e social (PAIM, 2006). Apontava para a possibilidade de redefinio das responsabilidades mdicas atravs de mudanas na educao, mantendo a organizao de servios de sade na perspectiva da medicina liberal (AROUCA, 2003, apud PAIM, 2008, p.549) (VASCONCELOS, SCHMALLER, 2011, p. 4). 5 Como se pode perceber, embora nem sempre esteja em evidncia no debate e na produo cientfica, as

estratgias APS e Promoo da Sade (PS) possuem uma ntima vinculao. 6 importante indicar que as discusses em torno do significado desta Conferncia so complexas e polmicas, indo

1978, pela OMS. No evento, a sade entendida como direito humano fundamental (como

marco pioneiro num documento oficial internacional) e chama-se a ateno para seus

determinantes sociais, sendo feita uma proclamao para a ao de todos os governos,

profissionais de sade e de desenvolvimento e a comunidade mundial no sentido de proteger e

promover a sade de todos os povos (OMS, 1978).

Segundo Carvalho (2005), em linha de continuidade com Alma-Ata, ocorre a atualizao

do Movimento de Promoo da Sade, com a finalidade de superar as fragilidades do projeto

de promoo da sade voltado para os estilos de vida. Assim, organizada a I Conferncia

Internacional sobre Promoo da Sade, realizada em Ottawa, em 1986. A a Promoo da

Sade7 aparece como uma forma nova de reativar a necessidade de aes intersetoriais e as

intervenes no solo poltico visando melhoria das condies de sade no planeta

(RESTREPO, 2001).

A mencionada Conferncia define cinco campos da promoo da sade (BRASIL,

2002): a) polticas pblicas saudveis; b) criao de ambientes favorveis; c) reforo da ao

comunitria; d) desenvolvimento de habilidades pessoais; e) reorientao dos servios de

sade.

importante mencionar que so definidos como princpios da NPS: concepo

holstica de sade; equidade; intersetorialidade; empowerment; participao social; aes

multi-estratgicas; sustentabilidade (OMS, 1998).

As proposies em torno da NPS vm sendo abraadas e amplamente divulgadas pela

OMS8, influenciando a poltica de sade dos mais diversos pases do globo, seja no setor

pblico, seja no privado. relevante situar tambm que as estratgias promocionais, adotadas

nas reformas sanitrias de diferentes locais, esto imbrincadas num complexo e contraditrio

enredo: de um lado, podem ser consideradas parte de um movimento que reconhece a sade

como direito de cidadania e que busca a superao do modelo biomdico; de outro, tende a ser

desde a leitura de sua importncia para a compreenso da sade enquanto direito humano; passando por sua anlise como uma reedio da Medicina Comunitria, com novas bases, sendo funcional aos interesses neoliberais. 7 Em Ottawa, so considerados como condies e recursos fundamentais para a sade: paz, habitao, educao,

alimentao, renda, ecossistema estvel, recursos sustentveis, justia social e equidade (BRASIL, 2002). A PS conceituada como (...) o processo de capacitao da comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e sade, incluindo uma maior participao no controle deste processo. Para atingir um estado de completo bem-estar fsico, mental e social os indivduos e grupos devem saber identificar aspiraes, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente. A sade deve ser vista como um recurso para a vida, e no como objetivo de viver. Nesse sentido, a sade um conceito positivo, que enfatiza os recursos sociais e pessoais, bem como as capacidades fsicas. Assim, a promoo da sade no responsabilidade exclusiva do setor sade, e vai para alm de um estilo de vida saudvel, na direo de um bem-estar global (Id Ibidem, p.20). 8 Vale situar que, a partir da Conferncia de Ottawa, foram realizadas pela OMS e suas regionais diversas iniciativas

multinacionais, que cumprem importante papel na difuso da filosofia da NPS, no desenvolvimento e amadurecimento do conceito de NPS, bem como no esclarecimento dos princpios que a norteiam. So elas as conferncias internacionais ocorridas em Adelaide (1988); Sundsvall (1991); Bogot (1992); Port of Spain (1993); Jacarta (1997); Mxico (2000); Bangkok (2005); Nairbi (2009).

\funcional ao discurso de reduo do papel do Estado no que se refere aos direitos sociais,

atravs da responsabilizao do indivduos por suas condies de vida e sade.

3. PROMOO DA SADE E MOVIMENTO DE REFORMA SANITRIA NO BRASIL:

(DES)CAMINHOS

No Brasil, disseminou-se a ideia de que os princpios da NPS so concatenados com os

ideias do Sistema nico de Sade (SUS) e do Movimento de Reforma Sanitria (MRS) 9 dos

anos 1980. No obstante, como Pasche e Hennington (2006) advertem, embora seja comum

que a histria, a trajetria e os fundamentos do SUS e da NPS sejam tidos como comuns, por

trilhas muitas vezes sinuosas, de aproximaes ou diferenciaes entre seus marcos terico-

conceituais, ou seja, de confluncias e dissonncias, que se vem estabelecendo as relaes

entre o MRS e a NPS no pas (CASTRO; MALO, 2006).

Nesse sentido, constatamos que a Sade Coletiva/MRS e a NPS so contemporneos e

possuem alguns questionamentos semelhantes em relao ao modelo hegemnico de ateno

sade. Segundo Campos, Barros e Castro (2004), o ponto de comunicao mais evidente

entre ambos o conceito ampliado de sade e sua produo social. Pasche e Hennington

(2006) apontam como outro elo o princpio da intersetorialidade. Alm desses, consideramos

que o debate sobre o princpio da integralidade (reivindicao do MRS incorporado legalmente

ao SUS) parece dialogar com alguns elementos presentes no movimento da NPS.

Apesar de serem coetneos e dos pontos de interseco entre os dois movimentos,

havia, na dcada de 1980, uma postura de reserva poltica incorporao do debate

internacional. Na anlise de Pasche e Hennington (2006), isso se devia ao fato de que o MRS

tem como uma de suas categorias mais caras a perspectiva da totalidade (herana marxista),

donde tambm sua preocupao com a reforma do sistema de sade como um todo, em

contraposio tradio dos organismos internacionais de adoo da APS e da NPS (...) sem,

muitas vezes, se propor mudanas na dinmica da organizao dos modos de produo de

sade (PASCHE; HENNINGTON, 2006, p.20). Outro importante elemento a ser destacado

que a Sade Coletiva tem como concepo basilar a determinao social da sade10, atravs

9 De acordo com Bravo (2006), o citado Movimento tinha como principais propostas: a concepo de sade como

direito social e dever do Estado; a defesa da universalizao do acesso; a reestruturao do setor atravs da criao do Sistema nico de Sade (SUS); a descentralizao do processo decisrio para as esferas estadual e municipal; o financiamento efetivo e a democratizao do poder local. Como sabemos, a Carta Magna de 1988 incorpora algumas das proposies do MRS e prope a criao do SUS, concebido enquanto um dos trips da seguridade social, ao lado das polticas de previdncia e assistncia social. A sade concebida como dever do Estado e direito de cidadania. O SUS regulamentado atravs da lei 8.080/1990, complementada pela lei 8.142/1990. 10

importante situar que a determinao social da sade tem suas bases na perspectiva marxista; j os DSS, de

acordo com Tambellini, Schutz (2009) e CEBES ([s/d]), tem como o modelo da epidemiologia tradicional, no qual

da qual busca apreender as determinaes contraditrias e simultneas decorrentes de

necessidades do capital e do trabalho (TEIXEIRA, 1989, p. 18) e suas relaes com as

condies de vida e de sade das populaes. Tal compreenso vai de encontro vertente da

NPS que normatiza estilos de vida, culpabiliza indivduos e prioriza o enfoque nos

comportamentos individuais (ligados ao tabagismo, atividade fsica, alimentao, etc.). No

debate do MRS, existia uma nfase na indissociabilidade entre a integralidade e os demais

princpios do SUS, assim como uma discusso especfica sobre o setor sanitrio, posio

distinta da NPS. Alm disso, o MRS defendia a sade como direito de cidadania e dever do

Estado, concepo distanciada da proposio da NPS como mera orientao de governo11.

Tendo tal arcabouo, a NPS, durante os anos 1980 e at meados da dcada de 1990,

parece no ter assumido um lugar muito relevante nas elaboraes terico-conceituais da

Sade Coletiva. Alis, a concepo de PS que est subjacente produo dos defensores do

MRS dos anos 1980 inclusive ultrapassa o discurso promocional, possuindo uma radicalidade

poltica12 ausente no discurso da NPS, ao colocar em questo a prpria ordem social.

A partir da dcada de 1990 contexto em que a influncia do marxismo na Sade

Coletiva arrefece , passa a acontecer uma crescente incorporao das proposies da NPS no

Brasil. Campos (2005) avalia que diversos pesquisadores e dirigentes, deixando de lado a

amplitude das questes colocadas pela Sade Coletiva (SC), at mesmo da necessidade de

superar suas lacunas, aderiram, com armas e bagagens, novidade vinda do norte

(CAMPOS, 2005, p.15), numa incorporao acrtica de um similar estrangeiro. Para ele, a

Promoo transformou-se em uma espcie de discurso politicamente correto, o desafio estaria

em aplicar suas diretrizes sem necessariamente analis-las para eventuais retoques ou

correes (CAMPOS, 2005, p.14).

Neste contexto, possvel observar em diversas iniciativas do Ministrio da Sade13 a

influncia da NPS, como se pode verificar na prpria escolha da APS (e da Estratgia Sade da

estes aparecem unicamente na qualidade de fatores causais de morbidade e mortalidade, sendo um conceito puramente emprico. No existiria a nenhum tipo de teoria da sociedade de carter crtico ou ao menos explicativo, conforme alerta o Cebes ([s/d]). Neste sentido, de acordo com o CEBES ([s/d]), o problemtico da concepo do DSS acreditar que a atuao nos fatores de risco pode minimizar a determinao social, sem que se transformem efetivamente as condies sociais. 11

Outro motivo para a resistncia inicial NPS era a compreenso de que ela configurava um conjunto de propostas elaborado em pases centrais, com realidade socioeconmica bastante distinta do quadro nacional e problemas sanitrios tambm diferentes. Fora justamente contra essas importaes tericas descontextualizadas que a Medicina Social Latino Americana se colocara, ao defender a necessidade de anlises sobre a realidade de periferia do capitalismo vivenciada pela nossa regio. 12

O MRS destaca as condies de vida como questo central da sade, sinalizando claramente para o enfrentamento das desigualdades sociais, para a modificao da organizao social da produo (COSTA, 2013). 13

Sobre as configuraes da poltica sanitria no Brasil, vemos que, apesar de todas as reivindicaes e propostas do MRS, bem como dos avanos legais, as alteraes no modelo de ateno sade so ainda embrionrias. Isso vem ocorrendo principalmente em virtude do contexto socioeconmico vivenciado no pas: os direitos sociais

Famlia) como estratgia para mudana do modelo de ateno, j em meados dos anos 1990;

na influncia do iderio internacional em vrios programas do Ministrio da Sade (como o de

Controle do Tabagismo, o de Controle do HIV/AIDS, o de Controle da Hipertenso e Diabetes, o

Programa Sade na Escola, o Programa Academia da Sade, o Plano de aes estratgicas

para o enfrentamento de Doenas Crnicas No Transmissveis (DCNT) no Brasil). Cumpre

indicar que, a partir de 2006, a NPS ganha destaque na poltica nacional, em virtude de sua

incluso dentre as diretrizes e prioridades do Pacto pela Vida, em Defesa do SUS e de Gesto

(CASTRO; MALO, 2006); da instituio da Comisso Nacional dos Determinantes Sociais da

Sade (CNDSS); e da publicao da Poltica Nacional de Promoo da Sade (PNPS). Alm

disso, a ideia da PS enquanto um elemento que deve ser efetivado no trabalho das equipes de

sade est presente especialmente na legislao sobre a APS (VASCONCELOS;

SCHMALLER, 2013).

Ainda que ultrapasse o escopo desse trabalho analisar a PNPS e a forma como a PS

aparece na legislao sanitria, importante fazer trs observaes. A primeira chamar a

ateno para a existncia de uma tenso no prprio texto da PNPS: apesar dos amplos

objetivos e da meno NPS, as aes propostas so voltadas prioritariamente para mudanas

nos estilos de vida individuais (CRUZ, 2010). A segunda diz respeito concepo de PS na

atual poltica de sade: uma concepo restrita de PS que, em lugar de viabilizar

(...) polticas pblicas estruturais e universais que promovam condies de vida que incidam diretamente sobre os determinantes sociais, termina possibilitando que, tendencialmente, as polticas de sade enfatizem as prticas e comportamentos saudveis, centralizando-se na responsabilizao do indivduo sobre o processo sade-doena (SOARES, 2010, p.106).

A terceira considerao diz respeito ao fato de que, embora as proposies em torno da

PS estejam presentes na legislao sanitria, estudos revelam que, de maneira geral, sobre o

trabalho das equipes de sade ainda voltado para a produo de procedimentos, com foco na

doena e nos indivduos e no para o enfrentamento da determinao social da sade ou da

busca da promoo da sade, inclusive na ESF.

inscritos na Constituio Federal de 1988 esto sendo postos em questo em nome de ajustes fiscais (dbitos pblicos) e monetrios (combate inflao) (DRUCK; FILGUEIRA, 2007). As polticas sociais, focalizadas, objetivam, de maneira parcial e restrita, enfrentar os estragos resultantes do neoliberalismo, definindo-se ento por ser a contraface dos supervits fiscais primrios (Id ibidem). O outro lado da moeda das polticas focalizadas corresponde ao agudizamento do processo de mercantilizao das mesmas, em uma lgica na qual os direitos sociais deixam de ser referncia-mestre (PEREIRA, 2009), para dar lugar ao acesso atravs do mercado. nesse solo tenso e contraditrio que o SUS vai sendo tecido, defrontando-se com um conjunto de obstculos, conforme Paim (2008, p.245): a no implementao do preceito constitucional da Seguridade Social; o subfinanciamento; precarizao das relaes, remuneraes e condies de trabalho; insignificncia de mudanas estruturantes nos modelos de ateno sade e de gesto do sistema; marketing de valores de mercado "em detrimento das solues que ataquem os determinantes estruturais das necessidades de sade". Acrescentaramos o aprofundamento das parcerias pblico-privado, atravs de diversas estratgias, como as Organizaes Sociais (O.S.), as Fundaes Estatais de Direito Privado, a criao da Empresa Brasileira de Servios Hospitalares (EBSERH), entre outras.

A partir do quadro exposto, constata-se a existncia de distintas concepes de

promoo da sade, relacionadas s vertentes poltico-ideolgicas as quais seus proponentes

tem se filiado, expressando s concepes do processo sade-doena que orientam suas

prticas (WESTPHAL, 2006). importante destacar que tais concepes vo nortear a forma

de organizao do processo de trabalho em sade e como as prticas vo sendo tecidas.

Nesse sentido, interessante atentar para uma indicao de Chapela e Garca (2010)

sobre a configurao de duas grandes vertentes de PS: a primeira diria respeito s vertentes de

PS subalternizantes, que englobam a promoo da sade do mercado; a PS oficial e outras

perspectivas que adensam uma abordagem culpabilizante do indivduo; a segunda abarca as

concepes nas quais a PS tratada na direo da emancipao (VASCONCELOS;

SCHMALLER, 2012).

La perspectiva dominante de promocin de la salud est centrada en la modificacin de riesgos y estilos de vida a partir de lo cual ignora los determinantes sociales de la salud, desvincula la poltica sanitaria de la econmica y se suma acrticamente a la tendencia a la mercantilizacin y privatizacin de los servicios de salud. Funge como un legitimador de las desigualdades sociales al tiempo que culpabiliza e individualiza la salud, ignorando los procesos colectivos. Frente a ello, es posible ubicar una perspectiva emergente de promocin de la salud que denuncia la desigualdad social y retoma los determinantes sociales de la salud dando centralidad a la nocin de derechos sociales; vincula la poltica sanitaria e la econmica; cuestiona la mercantilizacin de la promocin de la salud; propicia procesos colectivos que implican la decisin de los sujetos al tiempo que promueve procesos de exigibilidad/emancipacin (GARCIA, 2010, p.89).

Em nossa avaliao, no interior da segunda perspectiva que se pode situar, no Brasil,

um debate sobre a PS que se conecta ao iderio do MRS dos anos 1980: a promoo da sade

pode ser pensada como estratgia em nvel da poltica de sade em geral (e seus esforos no

sentido da intersetorialidade com as polticas econmicas e com as demais polticas sociais) no

enfrentamento da determinao da sade; bem como na gesto local da poltica e dos servios

de sade e em como isso se traduz na micropoltica do trabalho cotidiano dos profissionais

sanitrios.

No novidade que nos deparemos com trabalhos na perspectiva da PS heterogneos:

h tanto produes tericas, legislaes e experincias com marcas subalternizantes, quanto

com perspectivas progressistas (VASCONCELOS; SCHMALLER, 2012).

Da se percebe a imprescindibilidade de se apreender, face heterogeneidade e

polifonia do discurso promocional, de qual PS se est tratando. sobre esta preocupao que

este artigo se debruar a seguir, ao analisar as tendncias do debate sobre o tema no interior

do Servio Social.

4. PROMOO DA SADE E SERVIO SOCIAL: UMA ANLISE DA PRODUO TERICA

Com a criao do SUS e as propostas de alterao do modelo de ateno sade e

seus pressupostos - que passam pelo conceito ampliado de sade, a universalidade, a

descentralizao, a participao social, a integralidade -, o Servio Social adquire um novo

estatuto na rea (MIOTO; NOGUEIRA, 2009; KRUGER, 2010), que supera a ideia de que seria

uma profisso paramdica.

Neste contexto, o debate profissional dos/as assistentes sociais sobre a sade vem

adquirindo maior densidade e amplitude14: notvel a expanso da produo de dissertaes,

teses, relatrios de pesquisas; a apresentao de trabalhos nos congressos da rea (MATOS,

2000); bem como a publicao de livros e artigos abrangendo temticas relacionadas sade e

servio social.

Em relao PS/NPS, o cenrio coetneo tem colocado diversas demandas ao Servio

Social, sejam aquelas referentes PNPS e s demais requisies da poltica sanitria atual

(inclusive na sade suplementar); sejam as estratgias no mbito da formao no SUS,

desencadeadas pelo Ministrio da Sade (MS), nas quais a profisso vem se inserindo.

No obstante, quando nos voltamos para a anlise do debate profissional sobre a

temtica, no estudo bibliogrfico empreendido (VASCONCELOS, 2013)15, constatamos diversas

fragilidades, que aqui agrupamos em quatro tendncias: 1) o uso indiscriminado dos termos PS,

preveno e Educao em Sade, bem como a disseminao de propostas voltadas

predominantemente para estas duas ltimas; 2) uma perspectiva acrtica em torno da NPS; 3)

uma recusa do debate sobre a NPS; 4) a PS associada ao iderio do MRS.

Quanto primeira tendncia, em diversos dos artigos analisados, os termos PS,

preveno e Educao em Sade (ES) so usados como sinnimos, geralmente considerados

como aes. No entanto, cada uma das propostas possui vinculao a determinado

arcabouo terico-poltico, que, aparentemente, vem sendo pouco apreendida no debate

14

Especialmente a partir dos anos 2000, percebe-se um maior envolvimento da categoria com as discusses da Sade Coletiva (KRUGER, 2010), especialmente a partir do reconhecimento da confluncia entre as proposies do MRS e o PEP (BRAVO, 2006): a sintonia entre tais projetos posta em destaque. Tm sido realizados eventos temticos em nveis local, estadual e nacional, inclusive o Seminrio Nacional Servio e Sade (2008), organizado pelo CFESS. Outro importante marco para o Servio Social na sade foi a elaborao dos Parmetros para a atuao de assistentes sociais na poltica de sade (CFESS, 2009, p.9), que (...) tem como finalidade referenciar a interveno dos profissionais de Servio Social na rea da sade . Vale situar tambm que, na dcada de 2000, acontece, de forma mais expressiva, a insero da profisso nos programas de induo do MS para formao de profissionais com perfil para atuar no SUS, a exemplo das Residncias Profissionais, do Pr-Sade, do PET-Sade e do Ver-SUS (KRUGER, 2010). 15

A pesquisa consistiu em um estudo descritivo e analtico, com abordagem qualitativa. Na coleta dos dados, utilizou-se a pesquisa bibliogrfica junto a publicaes posteriores PNPS: os anais dos CBAS de 2007 e 2010; e os 15 peridicos Qualis A e B da rea do Servio Social, indexados na Web, com coleta realizada junto a artigos publicados entre janeiro de 2006 e abril de 2012 (considerando as atualizaes disponveis at este ltimo perodo). Foram analisados 112 (cento e doze) artigos relacionados ao tema sade. Para anlise dos dados, adotou-se a anlise de contedo.

profissional. Ainda que ultrapasse o escopo de nosso trabalho aprofundar essa reflexo,

fundamental traar breves indicaes sobre esta questo.

Cumpre considerar que as propostas em torno da preveno da sade, como mostra

Buss (2002), esto mais associadas a questes da clnica e da medicina preventiva: como

evitar, curar, mitigar. Seus focos so a doena e as estratgias para enfrent-la atravs dos

impactos nos fatores mais ntimos que a desencadeiam e seu lcus de responsabilidade e

unidade de anlise o indivduo e seus aspectos biolgicos (WESTPHAL, 2006). importante

lembrar que o livro O dilema preventivista, de Arouca (2003), escrito em 1973 (considerado

um dos marcos fundantes da Sade Coletiva brasileira), j naquela poca denunciava as

fragilidades de propostas que se focavam na mudana de comportamento dos profissionais,

bem como em sua formao acadmica, por no considerarem efetivamente a determinao

social da sade.

Destarte, a preveno, ainda que configure uma das facetas imprescindveis para a

integralidade em sade, no toma como fundamento o conceito ampliado em sade, mas busca

evitar ou mitigar o adoecimento, referencial do qual tanto o MRS quanto a NPS requisitam a

ultrapassagem.

Sobre a Educao em Sade, esta tambm possui um largo histrico de anlises, e

constitui um campo de disputas (MOROSINI; FONSECA; PEREIRA, 2009), no qual vrias

concepes sobre a sociedade, a sade e a educao se defrontam, indo desde perspectivas

higienistas, que se focam na culpabilizao dos indivduos e na modificao de seus hbitos e

costumes, num enfoque biologicista da relao sade-doena, no qual a atividade educativa

percebida como transmisso de informaes e habilidades (SILVEIRA, SILVA, 2006); at as

vertentes da educao popular em sade, que, segundo as autoras citadas, assumem o carter

poltico das aes educativas, buscando a anlise da realidade social, apreendendo os

determinantes do processo sade-doena e instrumentalizando a ao organizada da

populao para a luta em torno da soluo dos problemas existentes16.

Cumpre situar que a PS/NPS aparece como uma crtica ao preventivismo, mas tambm

ES17, partindo de um enfoque mais amplo, por colocar em foco os DSS, estando conectada

aos aportes advindos de Ottawa; ou pode ser situada como uma importante estratgia do MRS.

16

pertinente esclarecer que nesta direo que a ES vem sendo tratada no Servio Social: na perspectiva do PEP, se refere no apenas s atividades educativas, mas ao trabalho de politizao, de formao poltica, de busca da construo da conscincia sanitria, enfim, de uma contra-hegemonia. considerada, nos Parmetros, como um dos objetivos centrais para a atuao de assistentes sociais na sade. 17

De acordo com Kickbusch (1996, p.17), a NPS emergiu a partir do momento em educadores sanitrios perceberam que (...) a educao para a sade unicamente poderia desenvolver todas suas capacidades apoiando-se em medidas estruturais (legais, ambientais, normativas, etc.). Neste contexto, a NPS tida como estratgia mais ampla que a ES.

Alm do uso indiscriminado dos termos acima sinalizados, encontramos, em alguns dos

textos analisados, certa defesa da preveno ou da educao em sade, colocando tais

estratgias como basilares para modificao do modelo de ateno. Nessa perspectiva, caiu-se

na defesa de movimentos que j foram criticados desde o surgimento da SC, aparentemente

desconhecendo tais crticas e tambm as discusses levantadas pela NPS.

A segunda perspectiva do debate profissional do Servio Social se refere a uma

reproduo acrtica do discurso da NPS e/ou das concepes do Ministrio da Sade sobre a

NPS, que a menciona como se fora componente fundamental do prprio SUS. importante

registrar que a polissemia do discurso promocional dificulta sua leitura crtica, especialmente

por sua aparncia de concatenao ao iderio do SUS, posio largamente divulgada pelo MS

(VASCONCELOS, 2013). Tal perspectiva tem se disseminado no mbito da produo da Sade

Coletiva, que tem sinalizado, muitas vezes, um discurso acrtico sobre a NPS, posio que

tambm tem sido, com certa frequncia, incorporada pelos profissionais de Servio Social.

A terceira tendncia do debate profissional se coloca exatamente no polo oposto da

anterior: adota uma recusa to frontal NPS (pelas crticas culpabilizao do indivduo nela

possivelmente presente), que tende a silenciar sobre ela ou a apenas mencion-la como uma

ao18, do que resulta um no aprofundamento analtico sobre o tema.

A ltima tendncia que encontramos se refere compreenso da PS a partir do aporte

do MRS, partindo da ideia de que a concepo ampliada de sade advinda do citado

movimento, bem como a proposta de novo modelo de ateno dela resultante, que ultrapassa

os tradicionais esquemas de preveno e cura, do espao para (...) um campo abrangente de

prticas de distintas disciplinas voltadas promoo da sade, esta acrescida de

adensamentos conceituais que do conta de responder ao modelo de ateno sade

proposto pelo SUS (MIOTO; NOGUEIRA, 2009, p.224 grifos nossos). Vale salientar, porm,

que tambm nesta perspectiva o debate sobre a PS/NPS no est amadurecido.

A discusso acima apresentada revela, portanto, que o tratamento dado PS/NPS no

debate profissional do Servio Social ainda bastante embrionrio e a temtica no vem se

configurando com relevncia na agenda terico-poltica da nossa rea, o que evidencia uma

considervel lacuna na produo acadmica19.

18

Inclusive no principal documento de referncia para o trabalho do(a) assistente social no SUS, que so os Parmetros (CFESS, 2010), a PS aparece mencionada algumas poucas vezes e geralmente como uma ao. 19

pertinente destacar, porm, que essa incipincia no se restringe nossa profisso: como um debate relativamente recente, bastante complexo e em torno do qual vem se fazendo uma associao ao MRS, as diversas profisses de sade no tm, tambm, uma tradio de produes sobre o tema.

Apesar disso, consideramos que, sob o iderio do MRS dos anos 1980, a PS poderia

contribuir para a configurao trabalho do (a) assistente social no SUS, colocando-se como um

campo prioritrio para o exerccio profissional. Vejamos.

importante lembrar que, se o lugar que a racionalidade hegemnica tem atribudo ao

Servio Social nos servios de sade a assistncia direta aos usurios, com contedo

majoritariamente assistencial/emergencial (SOARES, 2010), as requisies do projeto do MRS

e do Projeto tico-Poltico do Servio Social e as necessidades subjacentes s demandas dos

usurios indicam uma direo muito mais ampla, na perspectiva da determinao social da

sade. Nesse sentido, o trabalho do (a) assistente social na sade (...) passa pela

compreenso dos determinantes sociais, econmicos e culturais que interferem no processo

sade-doena e na busca de estratgias poltico-institucionais para o enfrentamento dessas

questes (CFESS, 2010, p.28). As repercusses de tal afirmao remetem s questes

colocadas pela PS/NPS, como o conceito ampliado de sade, a intersetorialidade, a

participao social, etc. Consideramos que o debate sobre a PS, realizado numa perspectiva

crtica, traz tona questes relevantes para a tessitura do trabalho em sade, inclusive de

assistentes sociais.

Concomitantemente, o debate crtico sobre a PS pode contribuir para fortalecer a

identidade profissional na rea, ao contribuir para aprofundar as discusses sobre os

pressupostos fundamentais para o Servio Social na rea. Sobre este tema, pertinente trazer

as indicaes de Carvalho e Ceccim ([s.d.]) de que as Cincias da Sade20 configuram a

Grande rea da Sade, formada, de um lado, por um conjunto de profisses que tem seus

ncleos21 de competncias nas prticas da assistncia; de outro lado, estaria aquele conjunto

de profisses cujos ncleos integrariam prticas de promoo da sade22, entre as quais

estaria, evidentemente, o Servio Social.

(...) a ao profissional do assistente social se inscreve no campo da promoo da sade, notadamente no eixo da intersetorialidade, tomando como evidncia dessa

afirmao as atividades e aes que vem desempenhando no sistema nacional de sade (MIOTO; NOGUEIRA, 2006, p.21 grifos nossos).

20

"Inicialmente cabe ressaltar que no h consenso no meio acadmico-cientfico a respeito da composio das Cincias da Sade. Almeida Filho (2000) enftico ao escrever que vrias cincias contemporneas se apresentam como da sade, mas so cincias da doena na medida em que as disciplinas que se pretendem constituintes do campo da sade no constroem modelos de sade que considerem a complexidade dos processos relativos ao sofrimento, dor, ao cuidado e vida, ou seja, o paradigma que rege as reas da sade est distante daquele que padece" (CARVALHO, CECCIM, [s.d.], p.20). 21

As afirmaes dos autores nos remetem aos conceitos de ncleo e campo, conforme formulado por Campos (2000, apud VASCONCELOS et al, 2010): ncleo diria respeito identidade de uma rea de saber e de prtica profissional; e campo seria um espao de limites imprecisos onde cada disciplina ou profisso buscaria em outras apoio para cumprir suas tarefas tericas e prticas. 22

A impreciso de limites entre os dois grupos ou destes com outros grupos profissionais se relaciona com a amplitude que se queira imprimir ao conceito de prticas de sade ou de necessidades de sade (CARVALHO, CECCIM, [s.d.], p.20).

Em nosso entendimento, a relao da PS23 com o Servio Social se coloca em duas

esferas. A primeira seria como arcabouo terico e poltico associado ao iderio do MRS dos

anos 1980 que pode contribuir para orientar o trabalho de assistentes sociais nos variados

espaos ocupacionais do SUS, inclusive para iluminar a discusso sobre a identidade do

assistente social como profissional de sade e para imprimir ao mesmo uma direo que

busque ir alm do adoecimento, considere a determinao social da sade, objetive a

construo de estratgias intersetoriais que contribuam para o enfrentamento das

desigualdades sociais e possam efetivamente gerar, produzir, sade.

A segunda seria como campo de prticas que, ultrapassando as fronteiras de um

trabalho assistencial e burocrtico, voltado para a demanda espontnea, alm de incorporar a

perspectiva da educao popular em sade, considere a importncia do trabalho no territrio,

avance no sentido da considerao da determinao social da sade, da participao e do

controle social, na perspectiva dos direitos sociais, contribuindo para a construo da

conscincia sanitria, de uma contra-hegemonia.

5. CONSIDERAES FINAIS

Diante do exposto, constatamos que, embora seja um termo frequentemente utilizado

quando se discute a poltica de sade e que contenha importantes proposies no sentido da

mudana do modelo de ateno sade, a PS/NPS possui uma srie de contradies, que

precisam ser apreendidas.

Quanto ao debate sobre o tema no Servio Social, averiguamos que, apesar das

referncias PS ou NPS constantes na legislao sanitria e na literatura da rea, bem como

a remisso a noes/conceitos to variados, em linhas gerais, esse tema no tem sido

analisada/problematizada na produo cientfica de nossa rea.

Em nossa avaliao, por um lado, h uma premente necessidade de superao de certo

movimento de negao (consciente ou no) da discusso sobre a PS/NPS, atravs da

incorporao ao tema de uma referncia terica crtica, conhecendo melhor seus princpios e

diretrizes, esmiuando seu significado, apreendendo suas contradies, denunciando as

23

No podemos esquecer, contudo, que necessrio qualificar de que promoo se est falando. Isso porque, a depender das opes terico-metodolgicas, tico-polticas e tcnico-operativas dos(as) profissionais, o trabalho pode se voltar ainda que de forma no consciente para uma abordagem individualizante, focada nos estilos de vida, que desconsidera as condies de vida e de trabalho da populao, ainda que em nome da Reforma Sanitria. Isso pode ocorrer atravs da realizao de atividades individuais, grupais ou comunitrias que adotem estratgias de educao em sade, de preveno ou promoo da sade, mas que no consideram efetivamente a determinao social da sade.

distores de alguns discursos, enfim, transformando to polmico debate em objeto de estudo

e reflexo de estudiosos (as) e profissionais da rea.

Por outro lado, diante da relevncia da temtica para a poltica sanitria nacional, bem

como para as demandas colocadas ao Servio Social, este um debate que precisa ser

travado pela categoria, principalmente pelas contribuies que as proposies relacionadas

PS podem trazer para a profisso.

Concebemos que o adensamento da discusso sobre a PS/NPS e sua relao com o

Servio Social, distante de se contrapor aos Parmetros (CFESS, 2010), pode contribuir para

aprofundar o processo de ressignificao do trabalho do (a) assistente social na sade. Isso

porque consideramos que, apesar de toda a polissemia do debate promocional, se este for

associado ao iderio da RS dos anos 1980, pode fazer avanar as alteraes o trabalho em

sade, processo para o qual o (a) assistente social pode trazer importantes contribuies.

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