projetos de inclusão social: casos de...

18
Projetos de Inclusão Social: casos de sucesso Ana Paula Johann Bertha de Borja Reis do Valle Cláudia Gutierrez Santana Cláudio Cesar Pimentel Teixeira Daniela Haetinger Dinéia Urbanek Elair Hasselman de Bastos Eloiza da Silva Gomes de Oliveira Fátima e Silva de Freitas Fernando B. Monte-Serrat Gisele Gonçalves Melles de Oliveira Ida Beatriz Costa Velho Mazzillo Ivelir Neiverth Laiz Beerends Maria de Fátima Minetto Caldeira Mário Sérgio Vasconcelos Marli Kaczmarek Max Günther Haetinger Orley Boçon Patrícia Braun Paulo Henrique Pienta Ruth Eugênia Cidade Vânia Maria da Silva Andrade IESDE Brasil S.A. Curitiba 2013 Edição revisada

Upload: trinhkhuong

Post on 11-Nov-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Projetos de Inclusão Social: casos de sucesso

Ana Paula JohannBertha de Borja Reis do Valle

Cláudia Gutierrez SantanaCláudio Cesar Pimentel Teixeira

Daniela HaetingerDinéia Urbanek

Elair Hasselman de BastosEloiza da Silva Gomes de Oliveira

Fátima e Silva de FreitasFernando B. Monte-Serrat

Gisele Gonçalves Melles de OliveiraIda Beatriz Costa Velho Mazzillo

Ivelir NeiverthLaiz Beerends

Maria de Fátima Minetto CaldeiraMário Sérgio Vasconcelos

Marli KaczmarekMax Günther Haetinger

Orley BoçonPatrícia Braun

Paulo Henrique PientaRuth Eugênia Cidade

Vânia Maria da Silva Andrade

IESDE Brasil S.A.Curitiba

2013

Edição revisada

Autores:Ana Paula Johann Ivelir Neiverth

Bertha de Borja Reis do Valle Laiz Beerends

Cláudia Gutierrez Santana Maria de Fátima Minetto Caldeira

Cláudio Cesar Pimentel Teixeira Mário Sérgio Vasconcelos

Daniela Haetinger Marli Kaczmarek

Dinéia Urbanek Max Günther Haetinger

Elair Hasselman de Bastos Orley Boçon

Eloiza da Silva Gomes de Oliveira Patrícia Braun

Fátima e Silva de Freitas Paulo Henrique Pienta

Fernando B. Monte-Serrat Ruth Eugênia Cidade

Gisele Gonçalves Melles de Oliveira Vânia Maria da Silva Andrade

Ida Beatriz Costa Velho Mazzillo

© 2007 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais.

Capa: IESDE Brasil S.A.Imagem da capa: Shutterstock

IESDE Brasil S.A.Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br

Todos os direitos reservados.

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTESINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ ________________________________________________________________________________P958 Projetos de inclusão social : casos de sucesso / Ana Paula Johann ... [et al.]. - 1. ed. rev . - Curitiba, PR : IESDE Brasil, 2013. 222 p. : 28 cm Inclui bibliografia ISBN 978-85-387-3578-6 I. Integração social. 2. Inclusão escolar. 3. Educação - Aspectos sociais. I. Título. 12-8111. CDD: 302 CDU: 316.45 01.11.12 08.11.12 040463 ________________________________________________________________________________

SumárioA inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida ................7

Introdução ....................................................................................................................................................7Paralisia cerebral: causas e manifestações mais frequentes ........................................................................7A inclusão social de um portador de paralisia cerebral: uma história de vida ...........................................13Palavras finais ............................................................................................................................................16

Educação de crianças hospitalizadas .....................................................................................19O Hospital Pequeno Príncipe .....................................................................................................................19Um programa de Educação e Cultura ........................................................................................................19

Idoso e inclusão ......................................................................................................................27De volta para a escola ................................................................................................................................29Considerações acerca do envelhecimento com campo de conhecimento ..................................................32

Inclusão digital: o desafio da inclusão social por meio da inclusão digital ...........................41Falando de inclusão ...................................................................................................................................41Inclusão digital no Brasil ...........................................................................................................................43Fases da inclusão .......................................................................................................................................44Pensamento final ........................................................................................................................................45Estudo de caso ...........................................................................................................................................51Considerações finais ..................................................................................................................................56Alguns links para sala de aula ....................................................................................................................57

A inclusão de pessoas com Síndrome de Down na Educação: um caso de sucesso ..............61Comentários ...............................................................................................................................................64Conhecendo um pouco a Síndrome de Down ............................................................................................65Ambulatório da Síndrome de Down do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná ...........69

A inclusão de pessoas com necessidades especiais no mercado de trabalho .........................73Introdução ..................................................................................................................................................73Legalmente nos respaldando (será?!) ........................................................................................................74Formação, ética, cidadania e inclusão social .............................................................................................76Visões para o futuro ...................................................................................................................................78Finalizando ................................................................................................................................................81

Os meninos de Quatro Pinheiros: construindo o futuro .........................................................83Nascimento do projeto ...............................................................................................................................83Proposta .....................................................................................................................................................85Atividades com as crianças e os adolescentes ...........................................................................................87Relatos .......................................................................................................................................................91

Programa Educacional de Apoio à Inclusão no Mundo do Trabalho .....................................97Contextualização ........................................................................................................................................97Função social do Programa Educacional de Apoio à Inclusão no Trabalho ............................................100Educação e trabalho: uma discussão necessária ......................................................................................101Sobre alguns fundamentos legais e político-filosóficos ...........................................................................105Família: circulação de afetos ...................................................................................................................107Avaliação .................................................................................................................................................108E, concluindo, para incorporar um novo reapreender ..............................................................................109Casos de sucesso sendo construídos ........................................................................................................110Casos de sucesso sendo construídos: Divonei e Luciana ........................................................................114

Pequeno Cotolengo: casas-lares para pessoas em situação de abandono ............................119Histórico do Pequeno Cotolengo do Paraná (Dom Orione) ....................................................................119Projeto Casas-Lares .................................................................................................................................124Setor de Terapia Ocupacional ..................................................................................................................128

Inclusão social dos catadores de materiais recicláveis: criança no lixo, nunca mais! .........131Introdução ................................................................................................................................................131Fórum Estadual Lixo & Cidadania do Paraná .........................................................................................131Instituto Lixo e Cidadania .......................................................................................................................136Problemática ............................................................................................................................................137Justificativa ..............................................................................................................................................138Objetivos ..................................................................................................................................................139Metodologia .............................................................................................................................................140Indicadores de monitoramento ................................................................................................................142Metas ........................................................................................................................................................143Abrangência e população-alvo ................................................................................................................143

A Arte e a Educação Inclusiva: uma possibilidade real .......................................................145Introdução ................................................................................................................................................145A inclusão ................................................................................................................................................145A prática docente e a Arte como facilitadora da inclusão ........................................................................147Importância da Arte na Educação ............................................................................................................151O conhecimento da Arte ..........................................................................................................................152A vivência nas oficinas de Arte ................................................................................................................153A metodologia das oficinas de Arte .........................................................................................................154Caso de Sucesso: pintores com a boca e os pés .......................................................................................157Relação de pintores brasileiros ................................................................................................................158Relatos .....................................................................................................................................................162Considerações finais ................................................................................................................................167

A atividade motora adaptada ................................................................................................169A Educação Física Adaptada ...................................................................................................................169Considerações finais ................................................................................................................................183

Inclusão no escotismo ..........................................................................................................187Portadores de necessidades especiais ......................................................................................................187

Um paralelo entre o Método Educacional Escoteiro e a visão pedagógica de Vygotsky ........................190Caso de sucesso .......................................................................................................................................194

Brincar, diversidade e inclusão ............................................................................................199A exclusão na escola ................................................................................................................................200Oficinas que dão certo .............................................................................................................................207

A Cinoterapia na inclusão social ..........................................................................................215Inclusão utilizando o cachorro como facilitador .....................................................................................215Autismo ....................................................................................................................................................217Casos de sucesso ......................................................................................................................................218O caso de Leonardo .................................................................................................................................219Conclusão ................................................................................................................................................220

A inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida

Bertha de Borja Reis do ValleEloiza da Silva Gomes de Oliveira

Ida Beatriz Costa Velho Mazzillo

Introdução

N esta aula, vamos conversar um pouco sobre paralisia cerebral, suas manifestações mais fre-quentes e formas de prevenção. Nosso objetivo principal, porém, é apresentar a história de in-clusão de uma portadora de paralisia cerebral que tem conseguido superar suas limitações.

Paralisia cerebral: causas e manifestações mais frequentes

Conceito de paralisia cerebralA expressão paralisia cerebral nos remete a um conjunto de distúrbios do movimento, da pos-

tura, do equilíbrio, da coordenação e/ou dos movimentos involuntários, permanente, mas não invari-ável, que surge antes ou depois do nascimento, nos primeiros anos de vida.

Segundo Brandão (1992, p. 9): “Paralisia cerebral é uma desordem da postura e do movimento, persistente, mas não mutável, devido a uma disfunção do cérebro antes de estar completado seu cres-cimento e desenvolvimento.”

Crianças cerebralmente paralisadas não conseguem controlar alguns ou todos os movimentos. Algumas têm dificuldades em falar, andar ou usar as mãos. Umas serão capazes de sentar sem suporte ou ajuda, enquanto outras necessitarão de ajuda para a maioria das tarefas da vida diária.

Trata-se de um estado de saúde, de uma deficiência física adquirida, de um Distúrbio de Efici-ência Física que, durante muito tempo, foi designado “invalidez”.

Não existe um limite rígido de idade para que uma lesão pós-natal possa ocasionar o quadro motor de paralisia cerebral. Ela é significativa quando ocorre sobre o Sistema Nervoso Central ainda imaturo. Como se admite que, por volta dos dois anos, a maioria das funções já esteja estabelecida, as lesões ocorridas após esse período têm menor probabilidade de provocar tais efeitos.

7

A denominação paralisia cerebral não é totalmente satisfatória, pois a maio-ria dos pacientes não apresenta paralisia. Muitas vezes, os autores falam em “pa-ralisias cerebrais” pela diversidade de manifestações que compreende. Alguns autores preferem utilizar a denominação Dismotria Cerebral Ontogenética.

Crianças com paralisia cerebral podem apresentar alterações que variam desde uma leve falta de coordenação dos movimentos, ou uma maneira diferente para andar, até a inabilidade para segurar um objeto, falar ou deglutir, nos casos mais graves.

Logo após a concepção, começa o desenvolvimento do cérebro, e isso con-tinua após o nascimento. Se o tecido de uma região cerebral for danificado antes, durante ou após o parto, as áreas a ela relacionadas terão a função prejudicada e, dependendo da importância do dano, certas alterações serão permanentes (carac-terizando uma lesão não progressiva).

Tipos de paralisia cerebralComo já dissemos, existem vários tipos de paralisia cerebral, de acordo com

a alteração de movimento que predomina. Formas mistas também são observa-das. Os tipos mais conhecidos são:

espástica – é a forma mais comum. Ocorre quando a lesão está localiza-da na área responsável pelo início dos movimentos voluntários, no trato piramidal, o tônus muscular é aumentado, isto é, os músculos são tensos e os reflexos são exacerbados;

discinética – ocorre quando a lesão está localizada nas áreas que modi-ficam ou regulam o movimento, no trato extrapiramidal; a criança apre-senta movimentos involuntários (que estão fora de seu controle) e os movimentos voluntá rios apresentam-se prejudicados;

atáxica – está relacionada com lesões cerebelares. Como a função prin-cipal do cerebelo (observem a imagem seguinte) é controlar o equilíbrio e coordenar os movimentos, as crianças com lesão cerebelar apresentam ataxia – marcha pouco firme, por causa da deficiência de equilíbrio – e falta de coordenação motora, com incapacidade para realizar movimen-tos alternados rápidos e dificuldade para atingir um alvo. Há hipotonia muscular no momento do nascimento e retardo das habilidades motoras e verbais.

A inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida

8

A inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida

Causas da paralisia cerebralSegundo Telford e Sawrey (1974), em obra muito questionada atualmente,

mas considerada um clássico no estudo das necessidades especiais, as causas da paralisia cerebral dividem-se em três grandes blocos: pré-natais, natais ou perina-tais e pós-natais.

No período pré-natal, os principais fatores determinantes da paralisia cere-bral são as infecções e parasitoses (lues, rubéola, toxoplasmose, citomegalovírus); intoxicações (por drogas, álcool, tabaco); radiações (diagnóstica – raios X – ou te-rapêutica – radiação); traumatismo (impacto direto no abdômen ou queda da ges-tante sentada); fatores maternos (doenças, anemia grave, desnutrição, idade avan-çada da mãe) e fatores metabólicos, como diabetes e subnutrição da gestante.

No momento do parto, há outros fatores (perinatais) que correspondem ge-ralmente a quaisquer situações que aumentem o sofrimento da cabeça fetal duran-te a passagem pelo canal de parto, ou alterem a dinâmica do mecanismo do parto, seja este natural ou não.

O risco de alterações do sistema nervoso durante o trabalho de parto é im-portante. As lesões podem-se produzir mesmo num parto aparentemente normal, e isso é especialmente verdadeiro para os bebês prematuros; porém, as lesões cos-tumam ser tanto mais frequentes quanto mais prolongado for o parto, caso tenha ocorrido uma apresentação pouco comum ou tenha sido necessário recorrer ao fórceps, ou, ainda, quando a criança não chora espontaneamente.

Essas lesões podem ser de natureza traumática (por hemorragia das menin-ges, por hemorragia cerebral ou por engasgamento temporal).

Reconhece-se como principal responsável a anoxia (falta de oxigênio no cére bro) anterior ao nascimento, quando o trabalho de parto prolonga-se, ou pos-terior ao nascimento, quando a respiração da criança não se estabelece normal-mente.

Incluem-se entre essas situações os diferentes tipos de distorcias maternas ou fetais, as apresentações anormais, sobretudo o parto pélvico, anestesias condu-zidas de forma incorreta e o uso de fórceps, entre outras.

Existem, ainda, causas determinantes após o parto, que cometem a lactente e a criança pequena (até a primeira infância) que possuem o Sistema Nervoso Central em processo de amadurecimento.

Temos causas:

traumáticas – traumatismo de crânio acidental ou relacionado à síndro-me da criança espancada;

hipóxica ou isquêmica – asfixia mecânica, afogamento, estado relacio-nado à epilepsia, acidente cerebrovascular espontâneo ou pós-operatório (acidentes anestésicos);

infecciosas – meningoencefalites bacterianas e virais;

9

tóxicas – intoxicações medicamentosas, ou por produtos agrotóxicos e industriais;

imunoalérgicas – encefalopatias desmielinizantes pós- infec ciosas e pós-vacinais;

metabólicos – distúrbios hidroeletrolítico e metabólico, devidos à desi-dratação e desnutrição.

Problemas associados à paralisia cerebralSão comuns as ocorrências de epilepsia, deficiência mental, deficiência vi-

sual, dificuldades de aprendizagem, de fala e de alimentação, além de dificuldades auditivas, disartria, escoliose, contraturas musculares, problemas odontológicos e salivação fora de controle.

Prevenção da paralisia cerebralCom os avanços atuais da ciência, é bastante possível falar-se em prevenção

da paralisia cerebral.

O acompanhamento pré-natal regular e a boa assistência ao recém-nascido, na sala de parto, diminuem a possibilidade de certas crianças desenvolverem le-são cerebral permanente. Muitas das formas graves de paralisia cerebral estão re-lacionadas a causas que podem ser prevenidas como hipóxia perinatal, infecções congênitas e hiperbilirrubinemia neonatal.

Alinha-se a isso o esforço para que o período gestacional seja o mais saudá-vel possível, por meio da manutenção de uma boa nutrição e da eliminação do uso de álcool, fumo, drogas e medicamentos que possam causar dano ao feto.

A rubéola congênita pode ser prevenida se a mulher for vacinada antes de engravidar. Quanto à toxoplasmose materna, medidas de higiene são importantes, como não ingerir carnes mal cozidas ou verduras que possam estar contaminadas com fezes de gatos.

As gestantes com sorologia positiva devem ser adequadamente tratadas, diminuindo, assim, os riscos de infecção fetal. Quanto à incompatibilidade de Rh, ela pode ser facilmente prevenida (vacina anti-Rh+) e identificada. Quando a bilirrubina não conjugada no recém-nascido atinge níveis críticos, a criança deve ser submetida à transfusão de parte do volume sanguíneo.

Falando das causas pós-natais, uma das mais frequentes é o traumatismo crânio-encefálico, que pode ser prevenido com o uso de cadeiras de segurança especiais para crianças pequenas, ajustadas nos bancos dos automóveis. Algumas das infecções cerebrais podem ser prevenidas com vacinas (contra sarampo, me-ningite meningogócica e Haemophilus influenzae, por exemplo).

A inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida

10

A inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida

O tratamento da paralisia cerebralExiste um amplo quadro de tratamentos para a paralisia cerebral que inclui,

entre outros: estimulação do desenvolvimento neurológico, atividades físicas, treinamento para atividades da vida diária, utilização de meios alternativos de locomoção e comunicação, uso de órteses e realização de cirurgias ortopédicas, tratamentos odontológicos e da espasticidade.

Geralmente, para o alcance de um bom resultado, é envolvida uma equipe interdisciplinar extensa: assistentes sociais; terapeutas ocupacionais (TO); neuro-pediatras; fonoaudiólogos; fisioterapeutas; pedagogos; psiquiatras infantis; psicó-logos; educadores (Professores de classes regulares e especializados em Educação Especial e Informática aplicada à Educação); psicomotricistas; terapeutas corpo-rais; fisiatras; ortopedistas.

Os profissionais que atendem a criança têm um papel importante na me-diação do estresse familiar. Os pais necessitam de profissionais experientes, que parem para ouvir as suas dúvidas e preocupações, passem as informações com sensibilidade e respeito e tenham consciência de suas limitações.

A melhora da criança com paralisia cerebral normalmente é lenta e deman-da um constante equilíbrio entre aquilo que se quer e o que é possível. Assim, cabe à equipe que trata da criança uma atitude de apoio aos familiares com o objetivo de fortalecê-los para que possam realizar os cuidados adequados e en-frentar as dificuldades que acompanham o processo de ajustamento à deficiência. Esse processo torna-se mais fácil quando pais e profissionais de saúde buscam os mesmos objetivos.

A educação de indivíduos com paralisia cerebralDe acordo com Telford e Sawrey (1974, p. 439),A tarefa de medir a inteligência de crianças com paralisia cerebral está eivada de dificul-dades. [...] a maior parte destes (investigadores) achou necessário alterar as tarefas dos testes padronizados de inteligência, de um modo ou de outro, para apurar o estado de deficiência do sujeito em questão.

Embora haja essa dificuldade de mensuração, é bastante claro que nem sem-pre paralisia cerebral e deficiência mental andam juntas. Dessa maneira, a edu-cação das pessoas que têm paralisia cerebral deve acontecer, de preferência, em escolas regulares. A deficiência mental não está obrigatoriamente presente nos quadros de paralisia cerebral, o que permite a essas crianças frequentarem a esco-la regular, em classe compatível com sua faixa etária.

Os melhores meios de avaliação das capacidades cognitivas de crianças com paralisias cerebrais são os processos pedagógicos desenvolvidos em atividades grupais com outras crianças (com e sem deficiências), tanto na escola como fora dela. Nessas ocasiões, poderão ser revelados potenciais de aprendizagem muitas vezes sequer imaginados.

11

Algumas crianças, apesar de mostrarem capacidade para aprender, neces-sitam de ensino especial devido aos distúrbios sensoriais. Algumas instituições possuem modalidades de atendimento especializado para crianças com deficiên-cia visual ou auditiva.

São muitas as perplexidades do educador diante do aluno com paralisia ce-rebral. Basil (1995, p. 270) diz que ele

[...] deve considerar que tem diante de si, sobretudo, um aluno que deve ajudar, como a todos os demais, a aproveitar, ao máximo, suas potencialidades de desenvolvimento, para viver uma vida o mais independente, intensa e feliz possível. As necessidades especiais destes alunos devem ser vistas mais como um desafio do que como um obstáculo.

Qualquer que seja a manifestação da paralisia cerebral, no entanto, as adap-tações curriculares sempre se fazem necessárias.

A inclusão de alunos com necessidades especiais na classe regular implica o desenvolvimento de ações adaptativas, visando à flexibilização do currículo, para que ele possa ser desenvolvido de maneira efetiva em sala de aula, e atender às necessidades individuais de todos os alunos. De acordo com o MEC/SEESP/SEF (1998)1, essas adaptações curriculares realizam-se em três níveis:

adaptações no nível do projeto pedagógico (currículo escolar) que de-vem focalizar, principalmente, a organização escolar e os serviços de apoio, propiciando condições estruturais que possam ocorrer no nível de sala de aula e no nível individual;

adaptações relativas ao currículo da classe, que se referem, principal-mente, à programação das atividades elaboradas para sala de aula;

adaptações individualizadas do currículo, que focalizam a atuação do professor na avaliação e no atendimento a cada aluno.

A Educação Inclusiva, entendida sob a dimensão curricular, significa que o aluno com necessidades especiais deve fazer parte da classe regular, aprendendo as mesmas coisas que os outros – mesmo que de modos diferentes –, cabendo ao professor fazer as necessárias adaptações. Essa proposta difere das práticas tra-dicionais da Educação “Especial” que, ao enfatizar o déficit do aluno, acarretam a construção de um currículo empobrecido, desvinculado da realidade afetivo- -social do aluno e da sua idade cronológica, com planejamento difuso e um siste-ma de avaliação precário e indefinido.

A implementação da Educação Inclusiva não é tarefa fácil, pois o professor terá que garantir o aprendizado de alunos com necessidades educacionais diversas dos demais, no contexto de suas atividades rotineiras e do planejamento para a turma como um todo.

Sobressai, portanto, a ideia de uma educação inclusiva plena, que não entre na escola às escondidas, em função da resistência encontrada por parte dos educadores. Ela será facilmente compreendida no conceito de currículo, nas experiências relatadas e no grande desafio encontrado nas instituições edu-cativas: a avaliação.

1A Secretaria de Educa-ção Especial (SEESP)

tem, entre outros, organizado materiais sobre Adaptações Curriculares, disponíveis em: <www.mec.gov.br/seesp/Ftp/pcn.pdf>; <www.mec.gov.br/ seesp/Ftp/cartilha05.pdf >; <www.mec.gov.br/sees/p/Ftp/cartilha05.pdf>.

A inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida

12

A inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida

À educação de indivíduos com paralisia cerebral aplica-se perfeitamente o princípio enunciado na Declaração de Salamanca. Ela constitui um avanço signi-ficativo, na medida em que não propõe uma escola que, na prática, não existe, mas indica que todos os governos devem atribuir “[...] a mais alta prioridade política e financeira ao aprimoramento de seus sistemas educacionais no sentido de se tor-narem aptos a incluírem todas as crianças, independentemente de suas diferenças ou dificuldades individuais” (1994, p. 2).

Encerramos essas “palavras iniciais” sobre a paralisia cerebral com uma citação extraída da dissertação de mestrado de Mazzillo, defendida em 2003. Ao estudar as representações dos professores, relativas aos alunos portadores de pa-ralisia cerebral, a autora conclui:

[...] as representações que tivemos em mãos, acentuadas pela falta de informação e en-dossadas por um discurso carregado de enganos, incertezas, ignorância, conhecimentos incompletos, falta de respaldo teórico certamente interferem na vida escolar, tanto dos alunos considerados “normais”, como e principalmente do aluno portador de Paralisia Cerebral. (2003, p. 83)

A inclusão social de um portador de paralisia cerebral: uma história de vida

O relato da inclusão social de Bia, pedagoga formada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), com pós-graduação em Educação Especial, realizada na Universidade Federal Fluminense (UFF) e mestra em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) é a história que passamos a relatar para que possamos refletir o quanto a escola pode influenciar e colaborar para que portadores de necessidades educativas especiais tenham uma realidade de vida dentro de padrões de normalidade.

Nossa entrevistada tem atualmente 32 anos, e é portadora de paralisia ce-rebral causada por anoxia cerebral, distúrbio da oxigenação fetal, devido à obs-trução do cordão umbilical no momento do parto. Ao nascer, o cordão umbilical enrolou em seu pescoço, causando-lhe falta de oxigenação no cérebro, o que afe-tou as regiões cerebrais responsáveis pela coordenação motora, pelo equilíbrio e pela fala.

Intenso tratamento de reabilitação iniciado aos 12 meses de idade fez com que adquirisse habilidades de fala, locomoção e outras que, apesar de fugirem aos padrões de normalidade, lhe permitem levar uma rotina de vida normal, lo-comovendo-se sozinha, a pé, de ônibus e de metrô na cidade do Rio de Janeiro, exercendo sua profissão de professora e realizando os cursos de nível superior que deseja.

Foi alfabetizada em casa, pela mãe, que é professora também, e teve, com-plementando essa experiência inicial de aprendizagem escolar, duas professoras particulares, colegas de sua mãe, que lhe ajudaram a adquirir os conhecimentos dos primeiros anos escolares.

13

Sua vida como estudante do Ensino Fundamental deu-se nos anos 1980. Experimentou um pouco do ensino em classes especiais, dentro do Instituto Bra-sileiro de Reeducação Motora (IBRM), que se localiza no bairro do Andaraí, no Rio de Janeiro. O IBRM é uma associação beneficente, criada em 1955. É consi-derado um centro de excelência para pessoas portadoras de deficiências. Lá estão disponíveis serviços de Medicina de Reabilitação, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Psicologia, Serviço Social, atividades desportivas adaptadas, oficina de arte, psi-copedagogia e outros. A vida escolar e social de Bia está muito ligada a essa instituição.

A vontade de Bia de ir para uma escola de ensino regular era tão grande que um dia chegou para a sua professora, Rute Pereira, do IBRM, que também era uma das diretoras dessa instituição, e falou que queria ir para a escola regular como todas as crianças. Ela gostaria que fosse a escola pública municipal, ao lado do IBRM, pois já havia um colega , o Anderson, até hoje seu grande amigo, que tinha ido estudar lá. Anderson também tinha sequelas de paralisia cerebral.

No ano seguinte, foi para a 4.ª série dessa escola pública. Devido à dificul-dade de escrita, realizava provas orais, que eram aplicadas pelos professores. A escola recebia alguma orientação dos profissionais do IBRM, de como aproveitar a potencialidade dela. No final do ano letivo, concluída a 4.ª série, os professores recomendaram a seus pais que a colocassem em uma escola particular, que tivesse poucos alunos por turma, na qual os professores pudessem lhe dar mais atenção.

Foi estudar em um colégio pequeno da rede particular, onde passou toda a sua adolescência, época que foi de grande crescimento e de descobertas. Nessa época, havia no colégio uma outra menina com paralisia cerebral, a Renata, que já estava na 6.ª série, mas que logo depois saiu, porque sua família mudou-se para outro estado. Junto com Bia, entrou para o mesmo colégio, na mesma turma, uma outra aluna – a Luciana – também portadora de necessidades educativas especiais. As duas eram suas companheiras do IBRM, instituição que ainda frequentavam na época, realizando atividades para fins de reabilitação.

Ela sempre tentava auxiliar a amiga, pois esta usava cadeira de rodas e, assim como ela, também tinha dificuldades motoras para escrever. Bia acreditava que ambas poderiam ir adiante. Infelizmente, a amiga Luciana não completou o Ensino Fundamental.

Quando eu fui para o ginásio, tive vários professores e cada professor dava aula de um jei-to. Eu sempre tive muita dificuldade para escrever. Só conseguia fazer prova de questões de múltipla escolha que os professores faziam para mim. Mas eu era muito questionadora e me perguntava: por que eu faço prova de múltipla escolha? Eu ainda tenho dificuldade de escrever, mas hoje eu digito todos os meus trabalhos, eu quero guardar tudo no meu computador. Antigamente, como o computador não existia, eu comecei a pensar que de-veria estar só numa escola especial. Mas meus professores e meus amigos diziam: – Você sabe escrever... Foi muito importante!

As dificuldades, por vezes, apareciam. Apesar de haver alunos com outras limitações sempre havia um funcionário da escola que não entendia a sua pre-sença, principalmente porque depois da saída da Luciana e dos questionamentos que ela mesma se fazia, desejando ser como todos os outros alunos, passou a ser avaliada pelos mesmos processos de avaliação por que passavam todos os seus

A inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida

14

A inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida

colegas de turma, realizando questões discursivas. Devido à sua dificuldade de escrita, precisava que alguém a ajudasse nas provas semestrais, registrando por escrito o desenvolvimento das questões. Algumas vezes levou pessoas de fora da escola para ajudá-la, pessoas amigas com quem podia contar. Entre elas, Bia res-salta pelo menos duas: a professora Gloria Schapper, que já lhe havia atendido no IBRM e, mais tarde, foi sua professora na UERJ, e Gilson Teixeira, que, segundo seu relato, foi a alegria de sua juventude, seu ex-namorado, e que sempre lhe dava muito apoio nas suas aspirações acadêmicas.

O diretor desse colégio particular está bem presente na memória de Bia. Segundo ela, ele era uma pessoa muito aberta e sensível às questões relacionadas aos alunos com dificuldades. Nessa escola, além de portadores de paralisia cere-bral, havia um aluno autista. Lá, a inclusão já estava começando, como relata a própria Bia, referindo-se a esse professor: “Ele tinha uma cabeça muito além da época em que vivia. Tinha uma visão muito ampla de educação. Era um verda-deiro mestre!”

Foi nesse colégio, em um ambiente muito amistoso, onde amigos lhe em-prestavam cadernos e ela tirava cópias em xerox das anotações que os colegas faziam, que terminou o Ensino Médio. Vale destacar que, durante esse processo todo, contou também com o apoio da família que sempre fez com que se sentisse uma pessoa capaz, acolhendo-a nos momentos de dificuldades e fornecendo-lhe todos os recursos necessários para a superação dos obstáculos que, muitas vezes, faziam com que duvidasse de suas reais possibilidades.

Eu cursei o Ensino Médio no Colégio Amaral Fontoura, mas só saí do IBRM quando tinha 18 anos. Foi lá que me iniciei na Informática. Foi uma coisa informal, tem uma história. O IBRM tinha um projeto que visava socializar portadores de deficiência, que tinham PC. Ele fez vários convênios e conseguiu profissionais de informática para ministrarem cursos para os portadores de PC. Eu tinha vontade de aprender a usar o computador e aprendi. Mais tarde, passei para um estágio de monitoria, para ajudar os outros deficientes.

Quando concluiu o Ensino Básico, ela cursou, durante seis meses, um curso preparatório para prestar exame para o ensino superior. Fez dois vestibulares. Um deles para o curso de Pedagogia da UERJ e outro para a Universidade Cândido Mendes (UCAM), para o curso de Administração. Fez meio período do curso de Administração, mas, na reclassificação da UERJ, foi chamada para matrícula e passou a cursar Pedagogia.

Fiz do jeito que você sabe. Você foi minha professora na graduação. Fiz na graduação as habilitações de Magistério das Matérias Pedagógicas e Educação Especial e, depois, na UFF, eu fiz uma pós em Educação Especial. Muito boa! Muito legal! Tive disciplinas sobre várias formas de deficiências!

Depois que terminou o curso de Pedagogia, Bia fez um estágio de dois meses como voluntária na Fundação Municipal Lar Escola Francisco de Paula (Funlar), órgão da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, vinculado à Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, voltado para pessoas portadoras de defici-ência, ao qual cabe a formulação da política pública de atendimento ao portador de deficiência da cidade e a execução de ações nesse sentido.

A atuação de Bia na Funlar levou-a a participar do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos dos Portadores de Necessidades Especiais, tendo sido inclu-

15

sive sua presidente durante a gestão da secretária municipal de desenvolvimento social, prof.ª Wanda Engel, que fora professora da UERJ, quando ela era aluna e conhecia o seu potencial.

Eu estudava em Niterói, na UFF, e fazia estágio na Funlar. Eu ando sozinha, de ônibus, desde o 2.º grau. Comecei a andar sozinha, sair... Fiquei um período morando lá em Nite-rói, estou mais segura, desinibida. Eu sei as coisas que eu quero, o que eu penso em cada momento. A gente tem que acreditar em si mesmo. Não pode fugir a isso. Tem uma hora em que você vê que é responsável por tudo o que você faz, tudo o que você quer, ninguém vai fazer nada por mim, tudo vai ser mérito meu. Eu acho que as coisas são conquistadas. É preciso você dizer: estou aqui, eu sou capaz. As pessoas acham os PC frágeis, incom-petentes...

Bia completou o mestrado em Educação na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), em maio de 2003, tendo defendido a dissertação intitulada “Barreiras invisíveis presentes na educação inclusiva: um estudo sobre as representações dos professores relativas a alunos portadores de paralisia cere-bral.” Sua orientadora foi a Prof.ª Maria Aparecida Mamede Neves.

Atualmente, Bia prepara-se para concorrer a uma das vagas de doutorado em Educação e é professora da Escola Antonio Francisco Lisboa, escola públi-ca da rede estadual do Rio de Janeiro, destinada a portadores de necessidades educativas especiais. Sua turma é de deficientes mentais, jovens e adultos, com os quais ela desenvolve toda a sua concepção de educação inclusiva, fazendo com esses seres humanos – alguns deles com mais de 40 anos e tendo pela pri-meira vez a oportunidade de convivência fora de sua própria família – possam perceber uma nova realidade, diferente da que viveram até agora, mais afetuosa e menos excludente.

Palavras finaisA educação inclusiva, embora de concepção recente no Brasil, vem crescen-

do a cada ano em todos os estados. Segundo censo do MEC, o quantitativo de alu-nos portadores de necessidades educativas especiais em escolas regulares cresceu 229% desde 1998. Entretanto, ainda há a necessidade de maior sensibilização dos sistemas escolares e de orientação para os professores. Histórias bem-sucedidas de inclusão social, como a que relatamos, deverão tornar-se rotina e não casos pouco numerosos, como ainda ocorre.

BRANDÃO, J. S. Base do Tratamento por Estimulação Precoce na Paralisia Cerebral ou Dismo-tria Cerebral Ontogenética. São Paulo: Memon, 1992.

BRASIL, C. Os alunos com paralisia cerebral: Desenvolvimento e educação. IN: COLL, C. et al. Desenvolvimento Psicológico e Educação: Necessidades educativas especiais e aprendizagem esco-lar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995, p. 252-71.

A inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida

16

A inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998.

MAZZILLO, I. B. C. V. Barreiras Invisíveis Presentes na Educação Inclusiva: Um estudo sobre as representações dos professores relativas a alunos portadores de paralisia cerebral. Dissertação (Mes-trado), Departamento de Educação, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2003.

TELFORD, C. W.; SAWREY, J. M. O Indivíduo Excepcional. Rio de Janeiro: Zahar, 1974.

UNESCO. Declaração de Salamanca e Linha de Ação sobre Necessidades Educativas Especiais. Brasília: Corde, 1994.

17

A inclusão de pessoas com paralisia cerebral: uma história de vida bem-sucedida

18