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MINORIAS ÉTNICAS NA AMAZÔNIA: ÍNDIOS E NEGROS NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE DE RESISTÊNCIA Marília Ferreira Emmi * 1 INTRODUÇÃO Refletir sobre a situação de exclusão social de índios e negros na Amazônia nos dias atuais é não somente reconhecer que as raízes desse processo encontram-se na formação do Estado brasileiro, como também reconhecer a existência de um processo de resistência dessas minorias que vem ganhando força no sentido de questionar o lugar de subalternidade que lhes foi reservado nos diferentes pactos de poder. Desde o pacto colonial, na situação de escravos, passando pelo período imperial, quando após a abolição conviveu-se com a ambigüidade de ao mesmo tempo “esconder” /“integrar” as minorias à nação brasileira, os diversos segmentos que compunham a sociedade eram diluídos na noção de povo. A perspectiva integracionista, influenciada pelas teorias de assimilação e aculturação tiveram continuidade no período republicano. As minorias seriam “absorvidas”, não lhes sendo reconhecida a condição de unidades culturais distintas (SEYFERTH, 2005). O princípio do nacionalismo apoiado na perspectiva do “caldeamento” (de raças e culturas) e do “branqueamento” (como negação da contribuição africana), vai conformar o mito da democracia racial, ideologia que durante muito tempo serviu de base para a negação da existência de discriminação racial no Brasil. Porém, diferentes formas de preconceito que motivaram a exclusão social permaneceram na sociedade brasileira. Só muito recentemente com a Constituição de 1988 é que se viu assegurado, em termos legais, o direito à diferença com o reconhecimento da diversidade cultural e étnica. Entretanto, ainda que esse direito tenha sido reconhecido por lei, os índios e os negros (sobretudo os quilombolas), populações portadoras de sabedoria e valores estranhos ao atual modelo de sociedade, ainda lutam para conseguir uma visibilidade social enquanto minorias culturalmente diferenciadas. Percebe-se a ausência de políticas públicas que ultrapassem o mero assistencialismo e que contemplem de modo eficaz, por exemplo, seus direitos à terra, educação, saúde . Esse não reconhecimento dos direitos e a resultante situação de exclusão vem tendo como resposta dessas minorias um processo de construção de identidades que se expressa – ainda que em gradações e em ritmos diferentes - nas reações isoladas ou coletivas(situações de enfrentamento) e atualmente na organização de associações , na participação de fóruns, conferências e congressos onde formulam suas propostas visando garantir os seus direitos , seu espaço social , bem como o reconhecimento de sua distintividade cultural. Há uma luta constante objetivando por fim à invisibilidade social, econômica, cultural e política a que essas minorias Socióloga, professora e pesquisadora do NAEA/UFPA.Colaboraram no levantamento de dados os estudantes de Ciências Sociais Ana Paula Campos Barra e Felipe Escher 1

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MINORIAS ÉTNICAS NA AMAZÔNIA: ÍNDIOS E NEGROS NO PROCESSO DE

CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE DE RESISTÊNCIA

Marília Ferreira Emmi∗

1 INTRODUÇÃO

Refletir sobre a situação de exclusão social de índios e negros na Amazônia nos dias atuais é não somente reconhecer que as raízes desse processo encontram-se na formação do Estado brasileiro, como também reconhecer a existência de um processo de resistência dessas minorias que vem ganhando força no sentido de questionar o lugar de subalternidade que lhes foi reservado nos diferentes pactos de poder.

Desde o pacto colonial, na situação de escravos, passando pelo período imperial, quando após a abolição conviveu-se com a ambigüidade de ao mesmo tempo “esconder” /“integrar” as minorias à nação brasileira, os diversos segmentos que compunham a sociedade eram diluídos na noção de povo. A perspectiva integracionista, influenciada pelas teorias de assimilação e aculturação tiveram continuidade no período republicano. As minorias seriam “absorvidas”, não lhes sendo reconhecida a condição de unidades culturais distintas (SEYFERTH, 2005).

O princípio do nacionalismo apoiado na perspectiva do “caldeamento” (de raças e culturas) e do “branqueamento” (como negação da contribuição africana), vai conformar o mito da democracia racial, ideologia que durante muito tempo serviu de base para a negação da existência de discriminação racial no Brasil. Porém, diferentes formas de preconceito que motivaram a exclusão social permaneceram na sociedade brasileira.

Só muito recentemente com a Constituição de 1988 é que se viu assegurado, em termos legais, o direito à diferença com o reconhecimento da diversidade cultural e étnica. Entretanto, ainda que esse direito tenha sido reconhecido por lei, os índios e os negros (sobretudo os quilombolas), populações portadoras de sabedoria e valores estranhos ao atual modelo de sociedade, ainda lutam para conseguir uma visibilidade social enquanto minorias culturalmente diferenciadas. Percebe-se a ausência de políticas públicas que ultrapassem o mero assistencialismo e que contemplem de modo eficaz, por exemplo, seus direitos à terra, educação, saúde .

Esse não reconhecimento dos direitos e a resultante situação de exclusão vem tendo como resposta dessas minorias um processo de construção de identidades que se expressa – ainda que em gradações e em ritmos diferentes - nas reações isoladas ou coletivas(situações de enfrentamento) e atualmente na organização de associações , na participação de fóruns, conferências e congressos onde formulam suas propostas visando garantir os seus direitos , seu espaço social , bem como o reconhecimento de sua distintividade cultural. Há uma luta constante objetivando por fim à invisibilidade social, econômica, cultural e política a que essas minorias Socióloga, professora e pesquisadora do NAEA/UFPA.Colaboraram no levantamento de dados os estudantes de Ciências Sociais Ana Paula Campos Barra e Felipe Escher

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foram submetidas ao longo da história, contribuindo desse modo para um processo de construção de identidade étnica.

Segundo Castells, todo processo de construção de identidades sempre ocorre em um contexto marcado por relações de poder desiguais. Esse autor identifica

...uma identidade legitimadora; introduzida pelas instituições dominantes da sociedade no intuito de expandir e racionalizar sua dominação em relação aos atores sociais; uma identidade de resistência: criada por atores que se encontram em posições/ condições desvalorizadas e/ ou estigmatizadas pela lógica da dominação,construindo, assim, trincheiras de resistência e sobrevivência com base em princípios diferentes dos que permeiam as instituições da sociedade, ou mesmo opostos a estes últimos e uma identidade de projeto : quando os atores sociais, utilizando-se de qualquer tipo de material cultural ao seu alcance, constroem uma nova identidade capaz de redefinir sua posição na sociedade e, ao fazê-lo, de buscar a transformação de toda a estrutura social .(CASTELLS,2002: 24)

Tomando como referência essa classificação de Castells, considera-se que atualmente as populações indígenas e as negras (ainda que em tempos e situações diferenciadas) vem construindo uma identidade de resistência que se expressa no questionamento da situação de exclusão e de inferioridade (espaço social, político , econômico e cultural subalterno) que lhes foi reservado pelo modelo político e econômico vigente, identidade legitimadora . Essa busca de redefinição de sua relação com os demais segmentos étnicos presentes na sociedade brasileira visa lançar as bases, para um longo e difícil processo de construção de uma identidade de projeto.

A situação atual de dois grupos de minorias étnicas na Amazônia, os negros e os índios constitui o eixo principal da reflexão desenvolvida neste texto. Como toda minoria étnica, esses grupos apresentam atributos que os distinguem da maioria da população com experiências históricas singulares, a adesão a certas tradições e peculiar atribuição de significados (identificação simbólica da finalidade da ação), os quais são referidos na literatura especializada como traços culturais (POUTIGNAT, 1998). Por outro lado, eles se encontram numa posição social de dominados, vivenciando em seu cotidiano situações de discriminação e sobretudo compartilhando uma história de resistência à dominação imposta pelo modelo de desenvolvimento adotado pelo Estado brasileiro.

2 OS ÍNDIOS NA AMAZÔNIA : DE MAIORIA A MINORIA , UM PROCESSO DE INTEGRAÇÃO À MARGEM DO SISTEMA.

Nos primórdios da ocupação da Amazônia pelos europeus, estimativas baseadas em documentos e pesquisas arqueológicas atestam que a população indígena na região amazônica era de aproximadamente três a cinco milhões de pessoas. Entre 1750 e 1850, afirma antropólogo Moreira Neto que essa população registrou um decréscimo acentuado, tendo passado de maioria a minoria na Amazônia. (NETO, 1988).

O principal fator responsável por essa situação pode ser creditado às conseqüências do projeto colonial implantado, no qual tinham lugar as guerras, a escravidão, as ideologias religiosas e a proliferação de doenças até então desconhecidas para os índios.

Na segunda metade do século XIX, a repressão à Cabanagem teve grande contribuição à redução dessa população. Como estratégia de sobrevivência muitos povos refugiaram-se nas terras firmes

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dos altos dos rios, mas tiveram que conviver com a invasão de seus territórios durante o ciclo da borracha.

Mais recentemente, com a expansão capitalista para a Amazônia, e a implantação de grandes projetos econômicos assistiu-se novo capítulo no massacre aos povos indígenas respondidos por reações e resistências de diferentes formas. A abertura de estradas como a Belém – Brasília, a Trasamazônica e a Perimetral Norte atingiram duramente, entre outros os povos, Waimiri-Atroari, Yanomami, Arara, Parakanã, Cinta Larga e Nambikwara. Esse massacre foi tão acentuado que chegou-se a estimar que esses povos seriam exterminados no fim da década de 1980. Mas a tendência passou a ser revertida a partir dos anos 70, conforme apontou o antropólogo Egon Heck:

Desde então, a luta dos povos indígenas foi conquistando espaços territoriais que permitiram o crescimento demográfico, e os próprios índios começaram a apresentar levantamentos demográficos, desmentindo os dados oficiais que subestimavam a população. Povos que mantinham sua identidade oculta sentiram-se encorajados a assumi-la publicamente e as estatísticas começaram a registrar uma numerosa população indígena nos centros urbanos( HECK,2005).

2.1 Quantos são os índios na Amazônia?

Como não existe um censo indígena no Brasil, as estimativas globais, por serem feitas de acordo com os critérios das instituições que os produzem, apresentam dados diferentes.

O censo demográfico do IBGE baseia-se na autodeclaração e classifica os índios em urbanos e rurais. Segundo esse instituto, a população indígena no Brasil em 2000 era de 734.131 pessoas e na Amazônia (Região Norte) 213.444 pessoas.

Por outro lado, para a FUNAI (Fundação Nacional do Índio) que só considera como índios os que habitam as reservas (portanto não contabiliza os que moram nas cidades) a população indígena no Brasil estimada para 2005, seria de aproximadamente 410 mil e na Amazônia 163.191 mil pessoas.

Para o CIMI (Conselho Indigenista Missionário), instituição ligada à Igreja católica, que desde à década de 70 assiste os povos indígenas em questões referentes à terra, educação e saúde entre outras, o critério principal é a auto-identificação dos indígenas o que incluiria os índios aldeados, os das cidades, os resistentes e os isolados. O referido instituto estima a população indígena na Amazônia em aproximadamente 208 mil pessoas.

Os índios, em sua maioria, vivem em aldeias compartilhando num dado território, de uma organização social e cultural da etnia à qual pertencem, eles podem ainda participar da organização social de sua etnia vivendo em pequenos povoados pertencentes a vários municípios da Amazônia. Por outro lado, existe uma população indígena que não vive mais nas aldeias ou lá nunca viveu.Essa mora na cidade onde a organização social difere daquela da aldeia. Seu território na cidade pode corresponder ao bairro ou ainda, a apenas a um pequeno espaço, onde têm como vizinhos seus familiares e outros indivíduos não indígenas. Esses índios vivem e trabalham na cidade desenvolvendo atividades diversas, porém mantém sua identidade e pontos de ligação com seus locais de origem, neste caso, as aldeias (PATRÍCIO, 2006).

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Existem ainda na Amazônia, povos indígenas que são comumente chamados “isolados”, “sem contato”, ou “livres”. Estes, por terem vivenciado experiências traumáticas com as frentes de expansão, adotaram como estratégia de sobrevivência o afastamento da sociedade. Segundo informações do CIMI existem aproximadamente 60 povos indígenas nessa situação, dos quais cerca de 17 estão seriamente ameaçados de extinção. Eles se encontram principalmente em Rondônia e no sul do Amazonas. No Pará, tem -se conhecimento da existência de cerca de 8 povos isolados ( Uruahá Prainha, Marapiri/Urucuriana, da Desordem, do Anfrísio, do Ipitinga, do Bacajá, do Cachorro e Capoto).

Além dos mencionados, ainda existem povos indígenas chamados de “resistentes”, “ressurgidos” ou “emergentes”. São grupos que em anos recentes passaram a reivindicar oficialmente a condição de indígenas no Brasil. Durante muito tempo, uns negaram a identidade por medo da discriminação, outros se isolaram ou se integraram a outros povos para continuar existindo. A maioria deles encontra-se no Nordeste. Na Amazônia, são conhecidos os casos do povo Náua , no Acre e dos Tupinambá, Maitapu, Apium e um grupo Munduruku na região do Alto Rio Tapajós no estado do Pará.(ISA, 2006).

Segundo dados de IBGE, no conjunto da população brasileira, a Região Norte concentra 78,31% dos índios que vivem no meio rural e 21,6 % dos que vivem nas cidades. A tabela abaixo apresenta a distribuição da população indígena (urbana e rural) nos estados da Região Norte.

TABELA 1 - População residente autodeclarada indígena na Região Norte

Fonte: IBGE, 2000.

Esses dados do IBGE relativos ao Censo de 2000, ainda que não incluam todos os povos indígenas, revelam que é significativa a presença dessas populações no meio urbano, sobretudo nos estados de Rondônia, Tocantins e Pará. Essa presença deverá ser considerada pelo poder público destinando-lhes um atendimento diferenciado sobretudo quanto à saúde , educação e geração de emprego e renda.

2.2 A presença dos indígenas no meio urbano paraense

Estados População RuralNo. absoluto %

População UrbanaNo. absoluto % TOTAL

Amazonas 94.608 84,44 18.783 16,56 113.391Roraima 22.331 79,39 5.797 20,61 28.128Pará 25.962 68,90 11.718 31,10 37680Acre 6.911 86,29 1.098 13,71 8.009 Rondônia 6.460 60,47 4.223 39,53 10.683 Tocantins 7.153 67,60 3.428 32,40 10.581 Amapá 3.714 74,70 1.258 25,30 4.972 TOTAL 167.139 78,31 46.305 21,69 213.444

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O Censo de 2000 registra que no Estado do Pará, o maior contingente da população autodeclarada indígena no meio urbano residia em Jacareacanga, Oriximiná , Ananindeua , Ourilândia do Norte , Aveiro , Santarém e Altamira.

Na região Metropolitana de Belém (Belém, Ananindeua, Marituba, Benevudes e Santa Bárbara) autodeclararam-se indígenas 5.357 pessoas. A tabela abaixo apresenta a distribuição por municípios na RMB.

TABELA 2 - População indígena residente na Região metropolitana de Belém

Município Total %Belém 3583 66,88Ananindeua 1525 28,47Marituba 194 3,62Benevides 49 0,92Santa Bárbara

6 0,11

RMB 5357 100,00Fonte: IBGE, Censo 2000.

Um levantamento realizado no primeiro semestre de 2006 em Belém, pelo Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (Almeida, 2006) identificou os seguintes bairros como áreas de moradia de indígenas: Agulha, Tapanã, Benguí Cabanagem, Una, Marambaia, Sacramenta, Telégrafo, Marco, Canudos, Terra Firme, Guamá e Cremação. Os índios pertenciam às etnias: Apalay, Tembé, Karipuna, Galibi-Maruorno, Munduruku e Juruna .

Segundo esse estudo, a maioria dos índios é filiada à Associação dos Indígenas da Região Metropolitana de Belém. Essa associação que surgiu em 2001 com a denominação de Associação dos Indígenas de Belém – AIB, tem como principal objetivo a luta pelo reconhecimento da identidade indígena na cidade.É uma luta permanente , uma vez que até mesmo para garantir atendimento em repartições públicas, é exigida a mediação de entidades de representação de suas aldeias de origem. A Funai não os reconhece como índios e portanto não têm direito às políticas públicas destinadas aos índios aldeados.

2.3 Quantos são os povos indígenas na Amazônia?

Aqui também se observam, pelos mesmos motivos anteriormente mencionados, discrepâncias entre os dados da FUNAI e os do CIMI. A Funai reconhece a existência de 161 grupos indígenas na Região Norte com uma população estimada de 163.191 índios, conforme a tabela abaixo:

TABELA 3 - Grupos indígenas na Amazônia (Região Norte)

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Estados Número de grupos PopulaçãoAcre 14 9.868Amapá 6 4.950Amazonas 65 83.966Pará 34 20.185Rondônia 25 6.314Roraima 9 30.715Tocantins 8 7.193TOTAL 161 163.191

Fonte: FUNAI

Segundo esses dados, o Pará conta com cerca de 34 (21,12%) dos grupos e 20.185 (12,37%) da população , que se encontram na jurisdição das cinco administrações regionais da FUNAI localizadas em: Altamira, Belém, Itaituba , Marabá e Redenção. Os 34 grupos indígenas reconhecidos pela Funai no Pará são: Amanayé, Anambé, Apiaká, Arara, Araweté, Assurini, Atikum, Guajá, Guarani, Himarimã, Hixkaryána, Juruna, Karafawyána, Karajá, Katwena, Kaxuyana, Kayabi, Kayapó, Kreen-Akarôre, Kuruáya, Mawayãna, Munduruku, Parakanã, Suruí, Tembé, Timbira, Tiriyó, Turiwara, Wai-Wai, Waiãpi, Wayana-Apalai, Xeréu e Xipaya. Essas 34 etnias englobam índios que vieram de outras regiões como os Guarani, que residem próximo à Jacundá e os Atikum que estão localizados na região de Marabá.

Por outro lado, para o CIMI, na Amazônia vivem aproximadamente 180 povos, espalhados em vários municípios paraenses, dos quais 26 vem sendo acompanhados pelo CIMI-Norte II, em questões referentes à terra, educação, saúde e formação a serviço da autonomia dos povos indígenas A tabela abaixo apresenta esses 26 povos indígenas com a localização e respectiva população:

TABELA 4 - Povos indígenas no Pará

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Povo Terra indígena Município PopulaçãoAmanayé Amanayé, Barreirinha, Saraua Goianésia do Pará, Paragominas,

Ipixuna do Pará204

Anambé Anambé Moju 132Arara Arara, Cachoeira Seca do Iriri Altamira, Medicilândia, Uruará e

Rurópolis194

Arapium Arapium,Cobra Grande,Mirixim,Rio Maró, São João

Santarém, Margens do rio Tapajós 300

Araweté Araweté Altamira e Senador José Porfírio 239Asurini Trocará e Koatinemo Tucuruí e Senador José Porfírio 393

Cara Preta Baixo Tapajós I, Cara Preta, Muratuba do Pará

Aveiro, Tapajós, Margens do Tapajós, Santarém

s/inf

Gavião Mãe-Maria Bom Jesus do Tocantins 340Juruna Pakiçamba Senador José Porfírio 21Karafawyana s/inf s/inf s/infKatuena s/inf s/inf s/infKaxuyana Nhamundá-Mapuera Óbidos s/infKayapó (*) Kayapó São Félix do Xingu e Senador

José Porfírio5174

Kuruaya Kuruaya Altamira 107Mawaiãna s/inf s/inf s/infMaytapu Baixo Tapajós I Aveiro Tapajós s/infMunduruku Praia do Índio, Mangue,

Munduruku e Sai CinzaItaituba 1967

Parakanã Apitereua, Parakanã Altamira, São Félix do Xingu, Itupiranga, Novo Repartimento

672

Panará Panará Altamira 200Suruí Sororó São João do Araguaia 202Tembé Tembé e Turé Mariquita Tomé-Açu ,Paragominas, Santa

Luzia do Pará e Nova Esperança do Piriá

485

Tiriyó Parque Tumucumaque Alenquer, Oriximiná e Óbidos 380Tupaiu Amina, Aningualzinho, Tupaiu Margens do Rio Tapajós s/infWai Wai Nhamundá/Mapuera Óbidos s/infWayana- Apalaí

Rio Paru de Leste e Parque Tumucumaque

Monte Alegre, Almerim e Alenquer, Oriximiná e Óbidos

415

Xipaia-Curaia Curuá Altamira 147Zo’é Zo’é Óbidos e Alenquer 178Fonte: Cimi Norte II- 2006 (*) Sub-grupos: Gorotire, Kuben-Kran-Kêi, Kokraimoro, Mekranoti, kubenkokre, Kararaô, Xikrin

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2.4 As terras indígenas: a luta pela demarcação

O eixo principal das lutas indígenas tem sido a busca pelo reconhecimento e demarcação de suas terras, das terras de seus ancestrais. A regularização dos territórios indígenas por meio da demarcação significa muito mais do que a manutenção de sua cultura e modo de se relacionar com a natureza, o que está em jogo é a sua própria sobrevivência, o que os têm motivado a assumir ao longo da história várias formas e estratégias de luta visando a demarcação.

A Constituição Federal de 1988 reconheceu como sendo posse permanente dos povos indígenas, as terras tradicionalmente por eles ocupadas. Essas terras são bens da União e são inalienáveis e indisponíveis e os direitos sobre elas imprescritíveis. Entretanto para que uma comunidade indígena possa ter direitos sobre uma determinada área, segundo o que prescreve o parágrafo 1º. do artigo 231 da Constituição Federal, o poder público deverá identificá-la e delimitá-la, realizar a demarcação física de seus limites, de registrá-la em cartório e protegê-la.

A FUNAI reconhece a existência de 611 terras indígenas no Brasil apresentando a seguinte situação:

TABELA 5 - Terras Indígenas no Brasil

Situação Total %Em estudo 123 20,13Delimitada 33 5,40Declarada 30 4,91Homologada 27 4,42Regularizada 398 65,14Total 611 100

Fonte: Funai – maio / 2006.

Segundo esses dados 65,14% das terras indígenas já concluíram seu processo demarcatório com o devido registro nos Cartórios de Registro de Imóveis dos Municípios onde estão situados e no Departamento de Patrimônio da União, estando portanto regularizadas. Encontram-se em processo de regularização (em diferentes fases) 14,73 % e 123 delas, 20,13% ainda não iniciaram o processo de demarcação.

Por outro lado, O CIMI, baseado em outros critérios entre os quais o auto-reconhecimento pelos indígenas de suas terras e utilizando outra metodologia de classificação, aponta a existência de 850 terras indígenas no Brasil, com a situação apresentada no quadro abaixo:

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TABELA 6 - Terras indígenas no Brasil(atualização em 11/08/2006)

Fonte: CIMI/2006

Esses dados mostram que no Brasil.apenas 38,24% das terras indígenas tiveram, o procedimento administrativo de demarcação concluído.

Das 400 terras indígenas reconhecidas pelo CIMI na Amazônia..44,75.% concluíram o processo demarcatório com o registro no Departamento do Patrimônio da União e nos Cartórios de Registro de Imóveis dos Municípios onde estão localizados.Observa-se que 21,5% do total das terras ou 86 delas, ainda não tiveram seus limites declarados através de Portaria do Ministro da Justiça.

Quanto às terras sem providências, isto é, aquelas que são contabilizadas pelos povos indígenas, mas que não são reconhecidas pela Funai, perfazem na Amazônia 15,25% do total.

Em todos os fóruns, em todas as manifestações públicas os povos indígenas questionam a lentidão e os entraves do processo de regularização de suas terras, o que tem constituído de maneira permanente um ponto de pauta de suas reivindicações.

Quanto ao Estado do Pará, o Programa Raízes da Secretaria Executiva de Justiça do Governo do Estado do Pará sistematizou dados referentes às 64 terras indígenas. Esses dados são apresentados na tabela abaixo:

TABELA 7 - Terras Indígenas no Pará

Situação Brasil AmazôniaNo. % No. %

Registradas 325 38,24 179 44,75Homologadas 57 6.71 39 9,75Declaradas 33 3,88 15 3,75Identificadas 47 5,53 16 4,00A identificar 128 15,06 86 21,5Sem providencias 226 26,58 61 15,25Reservadas/Dominiais 34 4,00 4 1,00 Total 850 100 400 100

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Terra Indígena Grupo Indígena

Pop. Município Área Situação/Etapa

Alto Rio Guamá Tembé, Timbira, Urubu Kaapor

922 Nova Esperança do Piriá, Paragominas, Santa Luzia do Pará

279.897 Regularizada

Amanayé Amanayé 66 Goianésia do Pará

0 Confirmada

Amina Tupaiu Itamarati 0 ConfirmadaAnambé Anambé 120 Moju 7.882 RegularizadaAndirá-Marau Satere-Mawe 5.825 Aveiro, Itaituba 788.528 Regularizada

Aningalzinho Tupaiu Santarém 0 ConfirmadaApyterewa Parakanã 219 Altamira,

São Félix do Xingu

773.000 Delimitada

Arara Arara 135 Altamira, Brasil Novo, Medicilândia, Uruará

274.010 Regularizada

Araweté Igarapé Ipixuna

Araweté 247 Altamira, São Félix do Xingu, Senador José Porfírio

940.900 Regularizada

Badjonkore Kayapó 82 Cumaru do Norte, São Félix do Xingu

221.981 Homologada

Baixo Tapajós Munduruku, Tupinambá, Cara Preta

Santarém 0 Confirmada

Baixo Tapajós II Munduruku, Maytapu, Cara Preta

0 Aveiro 0 Confirmada

Barreirinha Amanayé 73 Paragominas 2.400 DeclaradaBaú Menkrangnotí 65 Altamira 1.850.000 DeclaradaBorari de Alter do Chão

Borari 0 Santarém 0 Confirmada

Bragança Munduruku 0 Belterra 13.515 ConfirmadaBrinco das Moças Cumaruara 0 Santarém 0 ConfirmadaCachoeira Seca Arara 56 Altamira,

Placas,760.000 Declarada

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UruaráCayabi Apiaká/Koyabi,

Kayabi, Munduruku

297 Jacareacanga 117.246 Regularizada

Cobra Grande Arapiun 0 Santarém 0 ConfirmadaJuruna do Km 17 Juruna 34 Vitória do

Xingu0 Confirmada

Karajá Santanado Araguaia

Karajá 74 Santa Maria das Barreiras

1.485 Regularizada

Kararaô Kararaô 28 Altamira 330.837 RegularizadaKayapó Kayapó 2.515 Bannach,

Cumaru do Norte, Ourilândia do Norte, São Félix do Xingu

3.284.004 Regularizada

Km 43 Munduruku 0 Itaituba 0 ConfirmadaKoatinemo Asuriní 89 Altamira,

Senador José Porfírio

387.834 Regularizada

Kuruáya Kuruáya 107 Altamira 166.700 DeclaradaLas Casas Kayapó 0 Floresta do

Araguaia, Pau d´Arco, Redenção

21.100 Delimitada

Mãe Maria Gavião 340 Bom Jesus do Tocantins

62.488 Regularizada

Maia Arara 0 Senador José Porfírio

0 Confirmada

Maranduba Karajá 31 Santa Maria das Barreiras

389 Declarada

Marituba Mundurukú 0 Santarém e Belterra

0 Confirmada

Menkragnotí Menkrangnotí 626 Altamira,

São Félix do Xingu

4.914.254 Regularizada

Mirixipi Arapiun Santarém 0 ConfirmadaMunduruku Munduruku 4.106 Jacareacanga 2.381.795 HomologadaMuratuba do Pará Tupinambá,

Cara Preta0 Santarém 0 Confirmada

Nhamundá/Mapuera Hixkaryana, Waiwái

1.116 Faro, Oriximiná 1.049.520 Regularizada

Nova Jacundá Guarani Mbyá 0 Rondon do Pará 417 Homologada

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Nova Vista Arapiun Santarém 0 ConfirmadaPacajá Asuriní 0 Portel 7.673 ConfirmadaPanará Panará 337 Altamira, 498.017 Regularizada

Paquiçamba Juruna 32 Vitória do Xingu 4.348 RegularizadaParakanã Parakanã 422 Itupiranga, Novo

Repartimento351.697 Regularizada

Parque do Tumucumaque

Apalaí, Wayana

1.017 Alenquer, Almeirim, Laranjal do Jari, Óbidos, Oriximiná

3.071.067 Regularizada

Pimental Munduruku 0 Itaituba, Trairão 0 ConfirmadaPraia do Índio Munduruku 69 Itaituba 31 HomologadaPraia do Mangue Munduruku 97 Itaituba 31 HomologadaRio Maró Arapiun 0 Santarém 0 ConfirmadaRio Paru D'Este Apalaí,

Wayana134 Alenquer,

Almeirim, Monte Alegre

1.195.785 Regularizada

Sai-Cinza Munduruku 873 Jacareacanga 125.552 RegularizadaSão João Arapiun 0 Santarém 0 ConfirmadaSão Luiz do Tapajós Munduruku 0 Itaituba 0 ConfirmadaSarauá Amanayé 0 Ipixuna do Pará 18.635 DelimitadaSororo Aikewar 190 Marabá,

São Domingos do Araguaia, São Geraldo do Araguaia

26.257 Regularizada

Takuara Munduruku 0 Belterra 25.323 ConfirmadaTembé Tembé 41 Tomé-Açu 1.075 RegularizadaTrincheira Bacaja Apiterewa,

Araweté, Asuriní, Xikrin

308 Altamira, Anapu, São Félix do Xingu, Senador José Porfírio

1.650.939 Regularizada

Trocará Asuriní 239 Baião, Tucuruí 21.722 RegularizadaTrombetas Mapuera Karafawyana,

Waiwái700 Faro, Oriximiná

3.970.420 Confirmada

Ture/Mariquita Tembé 20 Tomé-Açu 146 RegularizadajurídicaTure/Mariquita II

Tembé 0 Tomé-Açu 587 Homologada

Xikrin do Rio Catete Xikrin 575 Água Azul do Norte, Parauapebas

439.151 Regularizada

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Xipaya Kuruáya, Xipaya

47 Altamira 199.640 Delimitada

Zo'e Zo'é 178 Alenquer, Óbidos

664.465 Declarada

Fonte: Programa Raízes/ 2006.

Segundo esses dados, as 64 terras indígenas arroladas perfazem uma área de 30.902. 743 hectares, com uma população de 22.452 índios. Quanto à situação jurídica, 25 terras (39%) tiveram seu processo de demarcação concluído, enquanto que 39 terras (61%) encontram-se em diferentes etapas do processo de regularização.

2.5 Os índios e as políticas públicas: a saúde indígena

As políticas de saúde indígena, antes competência da FUNAI, desde 1999, passaram a ser coordenadas pela Funasa (Fundação Nacional de Saúde). Os atendimentos diretos nas aldeias são executados pelos municípios e por entidades credenciadas. Esse atendimento se dá por meio de 34 Distritos Sanitários Indígenas – os DSEIs, que funcionam como um subsistema de atenção à saúde indígena, onde cada rede do serviço de saúde está articulada com o Sistema Único de Saúde- SUS. Na Amazônia estão situados 21 DSEIs.

Segundo a Funasa, o funcionamento dos DSEIs é baseado nos seguintes princípios:

1) Considerar os próprios conceitos de saúde e doença da população e os aspectos intersetoriais de seus determinantes; 2)ser construído coletivamente a partir de um processo de planejamento participativo; 3) possuir instâncias de controle social formalizados em todos os níveis de gestão.

Os serviços de saúde são prestados na própria aldeia/comunidade e contam com a atuação dos Agentes Indígenas de Saúde (AIS), que estão sempre vinculados ao Posto de Saúde. Estes são responsáveis pela manutenção dos casos mais simplificados, como acompanhamento de gestantes, primeiros socorros, vacinação e supervisão de tratamentos.

Os casos que necessitem de atendimentos especializados são encaminhados para os pólos-base que contam com médicos, enfermeiros, dentistas e auxiliares de enfermagem. Os pacientes que não puderem ser atendidos nos pólos-base - por demandarem disposições de alta complexidade - são encaminhados para os serviços especializados na sede dos municípios mais próximos, em hospitais regionais.

Há também para suporte da saúde, as Casas do Índio que funcionam como facilitadoras do acesso da população aos serviços terceirizados do SUS. Essas casas têm função de agendar serviços, dar suporte aos tratamentos e viabilizar o transporte. Elas não têm função assistencial de saúde, portanto não possuem vínculo com o SUS. Segundo a FUNASA, as principais atribuições das Casa do Índio são:1) receber pacientes e seus acompanhantes encaminhados pelos DSEIs;

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2)alojar e alimentar pacientes e seus acompanhantes , durante o período de tratamento; 3)estabelecer os mecanismos de referência e contra-referência com a rede SUS;4) prestar assistência de enfermagem aos pacientes pós-hospitalização e em fase de recuperação; 5) acompanhar os pacientes para consultas, exames subsidiários e internações hospitalares;6) fazer contra-referência com os Distritos Sanitários e articular o retorno dos pacientes e acompanhantes aos seus domicílios, por ocasião da alta.

No Estado do Pará existem 8 Casas do Índio subordinadas aos Distritos Sanitários Especiais ou aos Pólos -Base: Casa do Índio de Icoaraci /DSEI- GUATOC, Casa do Índio de Altamira/ DSEI- Altamira ; Casa do Índio do Tapajós/ DSEI- Tapajós; Casa do Índio Kaiapó/ DSEI- Kaiapó; Casa do Índio de Marabá/Pólo Marabá; Casa do Índio de Paragominas/Pólo Paragomonas; Casa do Índio de Oriximiná/Pólo Oriximiná; Casa do Índio de Santarém/Pólo Santarém.

Em 2004, em decorrência de greves de funcionários da Funasa e por pressão dos índios insatisfeitos com o gerenciamento de verbas destinadas ao atendimento da saúde indígena, houve uma redefinição de papéis e metas para esse setor: Ficaram sob responsabilidade da Funasa a gestão dos serviços de saúde nos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs), a gerência das Casas de Saúde do Índio, a aquisição de medicamentos, combustíveis, transporte, equipamentos e realização de obras de saneamento enquanto que a contratação e capacitação das equipes multidisciplinares de saúde, a distribuição dos medicamentos e a compra dos insumos usados nas aldeias permaneceram sob a responsabilidade das entidades e municípios conveniados (CARVALHO,2005) .

Para os índios, o maior problema do subsistema de saúde está na forma como a política é gerida. Para eles, a burocracia, o autoritarismo, o desrespeito e o desconhecimento da questão indígena pelos organismos responsáveis impedem o desenvolvimento da proposta de DSEIs.

A política de terceirização de serviços com ONGs e prefeituras causa atraso na aplicação de verbas, resultando na interrupção dos serviços de atendimento à saúde por falta de recursos.

Nesse sentido os índios reivindicam: participação efetiva dos indígenas nas tomadas de decisões, já que os conselhos têm atuado de forma meramente figurativa; a melhor formação dos Agentes Indígenas de Saúde, pois estes devem assegurar a atenção diferenciada à saúde indígena; o reconhecimento e o atendimento pela Funai e Funasa dos índios urbanos, que são duplamente discriminados, uma vez que não têm acesso a esse atendimento. (CARVALHO, 2005).

2.6 Os índios e as políticas públicas: a educação escolar indígena

Desde que se tornou um direito das populações indígenas e, até há bem pouco tempo, a educação escolar indígena era voltada para a integração dos índios à sociedade nacional, baseando-se nos conceitos de catequização e civilização. Esses princípios estão expressos no Estatuto do Índio, Lei 6001/73: “a educação do índio será orientada para a integração e comunhão nacional”.

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Com o advento da Constituição Federal de 1988, foi reconhecido aos povos indígenas o direito de terem respeitadas suas diferenças socioculturais, suas organizações e costumes. Com isso, todas as leis referentes à educação escolar indígena, devem estar de acordo com os artigos 210 e 231 desse instrumento legal, que asseguram às comunidades indígenas o direito ao uso da língua materna e dos processos de aprendizagem adequados à sua cultura, ou seja, uma educação diferenciada (SILVA, 2003).

Esse texto constitucional também garantiu aos povos indígenas o direito ao uso de suas línguas de origem, e processos próprios de aprendizagem, dispositivos que dão sustentação à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a qual assegura aos povos indígenas educação escolar bilíngüe e intercultural.

Antes responsabilidade da FUNAI, através do Decreto no. 26/91, passou a constituir atribuição do Ministério da Educação a coordenação das ações da educação indígena, cuja execução tornou-se responsabilidade das Secretarias Estaduais e Munnicipais de Educação. O Conselho Nacional de Educação através da Resolução 03/99 criou as categorias escola indígena e professor indígena além de definir suas competências. (SANTOS, 2003).

No Estado do Pará a educação escolar indígena desenvolve-se no âmbito das unidades escolares vinculadas às redes Municipais e Estadual de Ensino do Sistema Educacional Público do Pará. O sistema possui 90 escolas indígenas, localizadas nas aldeias pertencentes a sete Pólos de Atendimento Pedagógico Indígena. Em 2005 foram matriculados nessas escolas 9.370 alunos. O corpo docente é formado por 326 professores, sendo 169 índios e 157 não-índios. Quanto à escolaridade, 72 são de nível superior, 170 médio e 84 fundamental.

Segundo dados da Coordenadoria de Educação Inclusiva –CEINC, da Secretaria Executiva de Educação do Pará, essas escolas indígenas estão localizadas em 23 municípios, atendendo 37 diferentes povos indígenas, como se pode visualizar na tabela abaixo:

TABELA 8 - Escolas Indígenas do Pará

Pólo Municípios Povos Escola Aluno

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s sAltamira Altamira Arara, Aeweté,

Assurini, Juruna, Kuruaya, Kararao,Parakanã,Xipaia e Xicrin do Bacajá

13 852

Belém Capitão PoçoParagominasTomé-Açu

Tembé 20 854

Jacareacanga

Jacareacanga Munduruku 20 3536

Marabá Bom Jesus J do TocantinsIpixuna do ParáItupirangaJacundáMojuParagominasParauapebasSão João do AraguaiaTacuruí

Anambé, Assurini, Amanayé, Guarani, Karajé, Kuycat^jê, Parakatêjê, Parakanã, Suruí, Atikum e Xikrin do Catete.

13 1372

Oriximiná Oriximiná Wai-Wai, Tiryó, Hixkaryano, Katwena,Kaxyian, Mawayna, Xereu, Wayana, Tuanayana e Cikyana

1 523

Redenção BannachCumarú do NorteOurilândia do NortePau D’arcoSão Félix do Xingu

Kayapó 12 1411

Santarém AveiroBelterraSantarém

Cara Preta, Maitipu, Tupaiú e Tupinambá

11 822

Total 23 37 90 9370Fonte:CEINC/SEDUC (adaptado pelo autor)

A Secretaria de Educação através da Escola Itinerante de Formação de Professores Índios no Pará, vem desenvolvendo um curso de formação e capacitação de professores (índios e não- índios) envolvidos com a educação escolar indígena. Esse curso , em nível médio é ministrado nos pólos e aldeias. Atualmente há 169 professores índios matriculados no referido curso.

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2.7 A violência contra os povos indígenas

Ao longo da história, as populações indígenas vêm sendo submetidas a situações de violência cujas causas encontram-se principalmente no desrespeito aos direitos constitucionais dos territórios indígenas.Esse desrespeito se manifesta através dos erros no estabelecimento dos limites territoriais em detrimento das pretensões indígenas, nos conflitos com setores econômicos da sociedade brasileira e na ineficiência de políticas de assistência aliada a agressões e várias formas de preconceito.

Um documento elaborado em 2005 pelo CIMI apresenta dados sobre vários tipos de violência a que os índios são submetidos: conflitos relativos a direitos territoriais, invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais, danos diversos e agressões ao patrimônio. Uma síntese dessa situação de violência em anos recentes encontra-se no quadro abaixo:

TABELA 9 - Invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio.Estados Município Terra indígena Povo Tipo de dano AnoRondônia Candeias Karitiana Queima do

habitat natural2003

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Rondônia Mirante da Serra, Jaru, Monte Negro

Uru Eu Wau Wau

Uru Eu Wau Wau Caça ilegal e retirada de madeira

2003

Pará Santarém Açaizal Munduruku Assoreamento e contaminação de igarapé; desmatamento de mata ciliar

2004

Roraima Normandia Raposa Serra do Sol

Wapixana, Mukuxi, Ingarikó,Taurepang

Destruição e incêndio das casas e plantações

2004

Acre Nukini, Arara do Alto Juruá

Nukini, Apolima-Arara, Arara e Kaxinawa

Caça ilegal 2005

Acre Marechal Thaumaturgo,Rodrigues Alves, Mâncio Lima, Cruzeiro do Sul e Tarauacá

Arara do Alto Juruá, Jaminawa do Igarapé Preto

Apolima-Arara, Arara, Jaminawa, Nukini e Nawa

Invasão possessória

2005

Acre Campinas, Jaminawa/Arara do Rio Bagé e Kaxinawa Ashaninka do Breu

Katukina, Pano, Arara do Acre, Jaminawa e Kaxinawa

Caça ilegal para retirada de peles de animais

2005

Amazonas Boca do Acre Igarapé de Lurdes

Jamamadi Invasão possessória

2005

Amazonas Maraã e Santa Isabel do Rio Negro

Maraã/Urubaxi Kanamari, Morcego e Makú

Pesca ilegal 2005

Pará Ipixuna do Pará Saraua Amanayé Pesca ilegal 2005Pará Óbidos Z’oé Z’óé i índios

isoladosRetirada de madeira

2005

Roraima Boa Vista São Marcos Makuxi e Wapixana

Invasão possessória

2005

Tocantins Itacajá e Gioatins Kraholândia Krahô Caça ilegal 2004Tocantins Tacantinópolis e

MaurilândiaApinayé Apinayé Pesca

predatória2005

Fonte: CIMI, 2005

Observa-se que essas situações conflitivas, que nesse período ocorreram em 20 territórios envolvendo 23 povos indígenas, são recorrentes tanto em relação às terras quanto aos povos atingidos.por outro lado esses dados não expressam a violência cotidiana a que esse povos são submetidos.

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2.8 Formas de resistência dos povos indígenas: do conflito aberto à organização em associações

Ao longo da história, a resistência dos povos indígenas manifestou-se de diferentes formas que variaram desde as fugas, o conflito aberto, os enfrentamentos, os bloqueamentos de rodovias, às ocupação de prédios públicos , entre outras. As condições objetivas de que dispunham para enfrentar as situações adversas que se sucederam, como a escravidão, passando pela disseminação de doenças, o descaso do poder público até o crescente avanço de grupos econômicos sobre suas terras que determinaram a opção por uma ou outra forma.

Começando com reações de resistência mais pontuais é a partir dos anos 70, que essa resistência vai se tornar cada vez mais coletiva. É o momento em que acontecem os primeiros encontros de povos indígenas para discussão de problemas comuns relacionados a seus territórios.

Mas, é no início dos anos 80 que começam a surgir as primeiras associações.Esse movimento vai ganhado expressão e no fim do ano 2000, já existiam na Região Norte 247 organizações indígenas, com a seguinte distribuição: Acre 32, Amapá 6, Amazonas 114, Pará 22, Roraima 20, Rondônia 39 e Tocantins 14 (ISA, 2006). O quadro abaixo apresenta as organizações, o povo indígena e o município sede no Estado do Pará.

TABELA 10 - Organizações indígenas no ParáNome Povo Indígena Município sedeAGITARGMA-Associação do Grupo indígena Tembé do Alto Rio Guamá

Tembé Belém

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AIP-Associação Indígena Pahyhy’p Munduruku da região do Médio Tapajós

Itaituba

AIP-Associação Indígena Pusuru_ Munduruku JacareacangaAIPAC-Associação do Povo Anambé do Cariri

Anambé

AIPAS- Associação Indígena do Povo Aikewara do Sororó

Suruí São Domingos do Araguaia

AIPASA- Associação Indígena do Povo Amanaye do Sarawa

Amanaye Paragominas

AIPAT- Associação do Povo Indígena Assurini do Trocará

Assurini

AIPATAK- Associação Indígena Parkategê Amijip Tár Kuxuwa

Gavião Parkategê Bom Jesus do Tocantins

AITTA- Associação Indígena dos Tembé de Tomé Açu

Tembé Tomé-Açu

ANUN- Associação Indígena Anun Maywhy TembéAPIM- Associação dos Povos Indígenas do Mapuera-Ketakronomacho

Wai Wai Oriximiná

APITO-Associação dos Povos Indígenas do Tocantins

Marabá

Associação Bep-Nói de Defesa do Xicrin do Catete

Xicrin do Catete (Kayapó) Marabá

Associação do Povo Indígena Kaapor do Rio Gurupi

Kaapor Paragominas

Associação do Povo Indígena Tembé Tembé ParagominasAssociação Karakekre XikrinAssociação Kamoko-re KayapóCIEPA- Conselho Indígena Estadual do Pará SantarémCIMAT- Conselho Indígena Munduruku do Alto Tapajós

Munduruku Jacareacanga

CIMPA- Conselho Indígena Munduruku do Pará

Munduruku

CITA- Conselho Indígena dos Rios Tapajós e ArapiunsFederação dos Povos Indígenas Kayapó do Estado do Pará

Kayapó

Fonte: Instituto Socioambiental/ ISA

Segundo o antropólogo Bruce Albert, comparando as organizações indígenas que surgiram nos anos 80 na Amazônia, com as que foram criadas a partir dos anos 90, observa-se que as motivações que deram origem e as formas e os objetivos indicam componentes de diferentes fases de um processo de construção de identidade. Enquanto as primeiras eram associações informais, voltadas, essencialmente, para reivindicações territoriais e assistenciais, as que surgiram partir da década de 1990, são associações legalizadas e com estatuto próprio. Se antes as reivindicações eram somente territoriais e legalistas, posteriormente vão se dar em um plano mais amplo ,

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buscando situar-se num mercado sobretudo de projetos , no campo internacional , passando assim segundo o antropólogo,de uma etnicidade estritamente política passam a uma etnicidade de resultados (Albert).

Atualmente esses povos articulam-se na Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia –COICA e na Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira-COIAB, no Grupo de Trabalho Amazônico-GTA e no Fórum Social Pan- Amazônico que constituem redes de resistência e conhecimento visando garantir a sobrevivência dos povos indígenas na Amazônia.

2.8 As reivindicações dos povos indígenas da Amazônia como afirmação de identidade étnica.

Em dezembro de 2005, realizou-se em Belém a Conferência Regional dos Povos Indígenas do Pará, Maranhão e Amapá.

Participaram da conferência representantes dos seguintes povos indígenas: Amanayê, Anambé, Apalaí, Apiaká, Arapiuns, Arara, Araweté, Assurini, Atikum, Borari, Cara Preta, Curuaya, Galiby-Calinã, Galiby-Marworno, gavião, Guajá, Guajajara, Guarany, Juruna, Kaapor, Kanela, Karipuna, Kayapó, Kaxuiana, Kiricauwá, Maytapu, Munduruku, Palikur, Parakanã, Suruí, Tapajó, Tembé, Timbira, Tirió, Tunayana, Tupaiu, Tupinambá, Waiana, Waiãpi, Xeréu, Xikrin, Xipaya eWai-Wai.

O documento final do encontro apresenta as principais reivindicações dos povos indígenas distribuídas nos seguintes temas: Autonomia, Autodeterminação, Tutela e Estatuto do Índio; Política Indigenista; Questão Fundiária; 4 Gestão Territorial; Saúde Indígena; Educação Escolar Indígena.

A importância das reivindicações contidas no documento está relacionada, não somente com representatividade dos povos participantes da Conferência, como também por seu conteúdo revelar propostas que vão além da busca de soluções para problemas imediatos, mas que sugerem a afirmação de uma identidade étnica..

Quanto à Autonomia, Autodeterminação, Tutela e Estatuto do Ìndio, manifestam-se:

a) manifestam-se pela manutenção da tutela enquanto um instrumento jurídico que garanta a proteção mais efetiva aos direitos diferenciados dos povos indígenas (nas áreas da saúde, educação, fundiária, sustentabilidade, etc). Porém ressaltam que alguns aspectos dessa tutela precisam ser revistos, principalmente aqueles que dão margem à interpretação que podem trazer conseqüências prejudiciais aos indígenas; b) pela ampla divulgação por parte do governo de toda legislação indigenista e as políticas públicas em todas as instituições que trabalham direta ou indiretamente com os povos indígenas; c) pela garantia do atendimento diferenciado aos povos indígenas nas aldeias e nas áreas urbanas, obedecendo critérios adotados pelas comunidades indígenas; d) pela criação de programas e mecanismos para a formação e qualificação dos povos indígenas, para estes conhecerem e compreenderem seus direitos, visando garanti-los e defendê-los, elaborando e divulgando, junto aos povos indígenas, materiais e cartilhas didáticos de toda a legislação existente sobre questões

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indígenas; e) pela elaboração de uma proposta de “Estatuto dos Povos Indígenas”, com a participação efetiva destes, aproveitando as propostas já existentes no “Estatuto do Índio” em vigor, desde que contemplem a garantia e a defesa dos direitos dos Povos Indígenas, de acordo com o previsto na Constituição Federal de 1988 e na Convenção 169 da OIT.

Quanto à Política Indigenista, reivindicam:

a) A reestruturação e fortalecimento da FUNAI, com poder de polícia, através do fomento aos recursos orçamentários suficientes para atender às demanda indígenas, garantindo o acompanhamento e a implementação dessas políticas indigenistas, bem como, realizar concursos públicos, sendo que, os mesmos serão diferenciados para o ingresso de indígenas no quadro da FUNAI; b) A criação do Ministério dos povos Indígenas, com a participação efetiva dos indígenas nos assuntos relacionados às políticas indígenas e indigenistas e nos projetos a serem implementados; c) A criação de um Conselho Nacional de Política Indígena, ligado à Presidência da República, com participação exclusiva de indígenas e com poder de decidir e defender os interesses indígenas, através de articulação junto ao Congresso nacional, tendo aquele, autonomia financeira, para poder deliberar, consultar e fiscalizar toda a política indigenista do Estado.

Quanto à questão fundiária, as reivindicações são encaminhadas visando :

a) a garantia de estudo, demarcação, homologação, ampliação e fiscalização das terras originalmente ocupadas pelos indígenas; garantir estudos antropológicos para todas as terras indígenas, para devolvê-las aos seus donos originários; b) a criação de mecanismo para agilizar todos os processos de demarcação territorial com aproximação entre estados, municípios e a União e com a participação indígena; c) a criação de um programa de demarcação e ampliação nacional de território indígena, com caráter emergencial para áreas que estão sofrendo com posseiros, madeireiros, garimpeiros e outras atividades que comprometam as áreas a serem demarcadas e ampliadas; e) a garantia de que as terras indígenas permaneçam como patrimônio da União.

Quanto à gestão territorial, os indígenas reivindicam:

a) que o Ministério do Meio Ambiente desburocratize o processo de repasse dos recursos destinados aos projetos para os povos indígenas; b) que os povos indígenas, por meio de suas organizações sociais e suas associações civis, recebam incentivos dos governos municipais, estaduais e federal, para se tornarem auto-sustentáveis; c) que todo e qualquer acesso à biodiversidade e às matérias-primas, conhecimentos tradicionais e patrimônio genético, através da pesquisa e empreendimentos a serem realizados no interior das terras indígenas ou no seu entorno, sejam consultados os povos indígenas em questão, detentores dos saberes tradicionais, para que estes dêem, se lhes convier, o consentimento prévio, livre e informado, sendo garantidos a estes a repartição justa e eqüitativa dos benefícios, conforme os preceitos da Convenção da Diversidade Biológica; d) que seja impedida a construção de barragens, hidrelétricas, rodovias, ferrovias e projetos de grande impacto ambiental nas terras indígenas; e) que sejam incentivados projetos de valorização, revitalização e comercialização do artesanato indígena, com instituições governamentais e não-governamentais.

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Quanto à saúde indígena, reivindicam:

a) o fim da terceirização da saúde indígena, que esta seja de responsabilidade diretamente do Governo Federal e que tenha participação indígena na política de planejamento de um novo sistema; b) que as ações da saúde indígena voltem para a FUNAI, com recursos orçamentários, físicos, financeiros e humanos, e que seja feito concurso público diferenciado para indígenas, visando o fortalecimento do órgão; c) criação do departamento de saúde indígena dentro da FUNAI, garantindo poderes de intervenção, controle, planejamento e execução das ações, com a participação efetiva de representantes indígenas e autonomia administrativa, financeira e orçamentária; d) garantia de melhorias na saúde indígena em relação à infra-estrutura, consultas, atendimento educativo, preventivo e emergencial, garantindo o atendimento diferenciado, visando evitar a saída dos indígenas para localidades distantes, e, até mesmo o abandono de suas terras para migrar para os centros urbanos em busca de atendimento médico; e) implementação de políticas de incentivo ao resgate, revitalização e fortalecimento da medicina tradicional dos povos indígenas, remunerando, dando condições e respeitando os trabalhos dos pajés e das parteiras, que curam através de rezas, plantas nativas e rituais espirituais, uma vez que na cultura indígena, existem doenças do corpo e do espírito; f) que seja dado igual tratamento de saúde a todos os indígenas, revogando a portaria 70/2003 – Funasa, que dá direito de assistência à saúde apenas aos indígenas que moram nas aldeias, e criar uma portaria que proporcionem o acesso à saúde a todos os indígenas, aldeados ou não.

Quanto à educação escolar indígena, reivindicam:

a) a garantia de um sistema próprio para a educação escolar indígena em nível federal com recursos específicos, que tenham autonomia pedagógica e administrativa contemplando as especificidades de cada povo, e que seja reconhecido o direito dos povos indígenas de criarem suas próprias instituições de ensino conforme as normas da Lei de Diretrizes Bases da Educação; b) que as ações da Educação indígena voltem a ser geridas pela Funai e que as escolas indígenas sejam reconhecidas e autorizadas pelos Conselhos de Educação nas três esferas: municipal, federal e estadual; c) garantia da implantação de uma educação escolar indígena do ensino fundamental e superior em seu próprio território com educação diferenciada, bilíngüe e de qualidade, visando o fortalecimento, a preservação, e o resgate da cultura indígena; d) garantia de cursos de formação e capacitação continuada e concursos públicos específicos para professores indígenas e garantia da contratação de profissionais reconhecidos pela comunidade que sejam conhecedores da cultura tradicional aptos para ministrar uma educação diferenciada; e) incentivar a educação diferenciada através da criação de material didático específico para promover a recuperação, a preservação e o fortalecimento da cultura indígena; f) reforma, ampliação, e construção de escolas indígenas com garantia de recursos e estrutura para que alunos, professores e profissionais envolvidos na educação indígena freqüentem regularmente a escola: transporte, material escolar e ajuda de custo; g) garantia de vagas nas universidades públicas, bolsas de manutenção e casa de apoio para os estudantes indígenas. (Conferência Regional dos Povos Indígenas do Pa, Ma e Ap, 2005).

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3 NEGROS NA AMAZÔNIA: A DIFÍCIL TRAJETÓRIA EM BUSCA DE UMA IDENTIDADE

Os fundamentos coloniais e escravistas que pautaram a sociedade brasileira desde suas origens, relegaram historicamente às populações negras um espaço social subalterno mascarado pela ideologia da democracia racial, o mito de uma nação homogênea, na qual não havia espaço para as diferenças culturais.

Só muito recentemente, a partir da Constituição de 1988 é que vai se dar a garantia formal da diversidade étnica e cultural das minorias, entre as quais os negros.

Mas, existe ainda uma longa trajetória a percorrer para que seja fortalecida a identidade desses grupos, para que como cidadãos brasileiros possam compartilhar com outros segmentos da sociedade de todas as garantias constitucionais, sem discriminação.

Quanto às políticas públicas, verifica-se ainda a prevalência de ações pontuais, tendo como foco fatores étnicos, porém no contexto de outras políticas governamentais como educação, saúde e a política agrária.

Segundo o IBGE, que classifica a população brasileira, segundo a cor ou raça em branca, preta, amarela, parda e indígena, em 2000, essa população estava assim distribuída:

TABELA 11 - População residente segundo a cor ou raça Cor ou Raça

BrasilNº %

Região NorteNo. %

ParáNo %

Branca 91.298.043..............53,75

3.616.840................28,01

1,617.015...........26,10

Preta 10.554.336...............6,21

641. 207....................4.97

340.901................5,50

Amarela 761.538.....................0,45

29.247........................0.23

11.574..................0.19

Parda 65.318.092..............38,45

8.259.486.................63,97

4.115.414...........66,42

Indígena 734.131.....................0,43

213.445.....................1.65

37.681..................0,61

Sem declaração

1.206.673..................0,71

150.946.....................1,17

73.380..................1,18

Total 169.872.859...............100

12.911.170..................100

6.195.965..............100

Fonte : IBGE, Censo Demográfico-2000 (adaptado pelo autor)

Como a identificação é baseada na autodeclaração, fica difícil precisar o tamanho da população negra, uma vez que a categoria parda engloba uma gradação de cor de pele, que esconde a identidade étnica dessa população.

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Entretanto se esses dados forem comparados com os do censo de 1991, observa-se que houve uma diminuição na proporção de pessoas que se declararam pardas e um aumento na dos que se declararam pretos, o que pode indicar uma certa mudança nos padrões de autoclassificação e identificação étnica da população negra no Brasil.

TABELA 12 - Proporção da população residente por cor ou raça no BrasilAnos Branca

%Preta

%Amarela

%Parda

%Indígena

%1991 51,56 5,00 0,43 42,45 0,202000 53,74 6,21 0,45 38,45 0,43

Fonte:IBGE-Censo Demográfico1991/2000

Nesse processo de identificação étnica da população negra no Pará, sobretudo no meio urbano, uma contribuição significativa pode ser creditada ao trabalho desenvolvido pelo Centro de Estudos e Defesa do Negro no Pará – CEDENPA - instituição surgida em Belém nos anos 80, em meio às mobilizações contra a discriminação racial. Atualmente e CEDENPA desenvolve várias atividades de valorização da raça negra, entre elas o Programa de Educação Formal, junto ao Núcleo de Inclusão Social e Relações Raciais, criado no âmbito da SEDUC. Na esfera municipal, o CEDENPA trabalha junto ao Núcleo de Educação, História e Cultura Afro-brasileira, criado pela SEMEC. Oferece ainda cursos de formação e capacitação para o mercado de trabalho e de apoio às populações rurais.

3.1 As populações remanescentes de quilombos na Amazônia: uma realidade pouco conhecida

Ao lado da população urbana, existe um significativo contingente de negros no meio rural constituído principalmente por populações remanescentes dos quilombos, os quilombolas. Esses segmentos, somente a partir do fim da década de 70 começaram a emergir no contexto das mobilizações étnicas na América Latina e, sobretudo no Brasil. As mobilizações permitiram o surgimento e afirmação de um novo modo de pensar sobre a pluralidade e diversidade étnica e cultural da sociedade brasileira, princípios que foram expressamente declarados na Constituição Federal de 1988.

As populações remanescentes de quilombos foram objeto de um cadastro elaborado em 2002, pela a Fundação Palmares, órgão pertencente ao Ministério da Cultura. Esse levantamento apontou a existência de cerca de 743 áreas de comunidades quilombolas espalhadas, de norte a sul do Brasil: Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, São Paulo, Sergipe e Tocantins, ocupando uma área cerca de 30 milhões de hectares. Embora esse levantamento seja a referência oficial, hoje dados de novas pesquisas e a incorporação de outros estados nessa listagem, levam a estimar a existência de mais de 2000 mil comunidades quilombolas no Brasil. (ALMEIDA, 2005).

No que tange à Amazônia, até meados da década de 1970, havia poucas referências sobre a existência comunidades remanescentes de quilombos. Durante muito tempo considerou-se válida a afirmação de que a presença de escravos negros nessa região teria sido pouco significativa, por

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esse motivo, qualquer referência a existência dessas comunidades era encarada com surpresa. A partir dos anos 80 e sobretudo da década de 90 em diante, esse tema passa a ser trabalhado pela comunidade acadêmica e concomitantemente a resistência das comunidades quilombolas na Amazônia na defesa de seus territórios começa a ganhar visibilidade.

Um marco na recuperação da história da escravidão negra na Amazônia e sobretudo no Pará é o livro de Vicente Salles , O Negro no Pará sob o regime de escravidão (1971). Nessa obra, o antropólogo mostra não só a importância do negro na composição étnica do Pará e o emprego de sua força de trabalho em várias atividades econômicas, como também a sua luta contra a escravidão: as fugas , os quilombos, os mocambos. Salles destaca cinco regiões onde se concentraram a maioria dos quilombos nos séculos XVIII e XIX : entre os rios Gurupi e Turiaçu; na Bacia do Rio Tocantins; entre os rios Mojuim e Mocajuba; na bacia do Rio Trombetas e na chamada Guiana brasileira ( atual estado do Amapá).

A existência de quilombos no território paraense é um indicador de que a história da escravidão no Pará não foi uma história de submissão, nela também esteve presente a resistência de negros que por meio da fuga e da construção de quilombos e da participação em movimento reivindicatórios populares como a Cabanagem, buscaram de diferentes formas libertar-se das condições de opressão a que eram submetidos.

Atualmente, a luta das populações remanescentes de quilombos objetiva sobretudo a titulação de suas terras. Esses territórios que hoje ocupam foram conseguidos sob diversas formas: por herança, na situação de agregados, na ocupação de terras abandonadas ou via organização de quilombos. Nessas terras predomina uma economia de base agrícola e familiar, com plantações de milho, arroz , feijão mas o principal produto é a mandioca. Em algumas áreas pratica-se a caça, a pesca e o extrativismo da castanha.

As populações quilombolas compõem um segmento diferenciado do campo amazônico, em que se conjugam três elementos: terra, utilizada para subsistência etnia e território marcado por histórias e ocupações singulares. Essa diferenciação contribuiu para que, nas últimas décadas, os grupos começassem a se tornarem visíveis na Amazônia. (TRINDADE, 2004)

3.2 As comunidades remanescentes de quilombos no Pará

O mapeamento das comunidades negras rurais no Pará teve início no final da década de 1980 por iniciativa do Centro de Estudos e Defesa do Negro no Pará (CEDENPA) com apoio da Empresa de Assistência Técnica Rural (EMATER), secretarias de educação e paróquias de vários municípios Na década de 90 passou a contar com apoio da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e sindicatos de Trabalhadores Rurais.A partir de 1998 a continuidade do mapeamento de comunidades negras ficou sob responsabilidade da Universidade Federal do Pará(UFPA) através do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA). A pesquisa em sua primeira fase (1998-2000) localizou 129 comunidades negras rurais. Os estudos de mapeamento tiveram seu prosseguimento a partir de 2000, através de convênio da UFPA com o Programa Raízes do Governo do Estado do Pará. Essa pesquisa mapeou 240 comunidades quilombolas localizadas na Grande Belém, Guajarina, Bragantina, Gurupá, Tocantins, Região das Ilhas e Marajó.

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Dados recentes do Programa Raízes apontam a existência de 292 comunidades quilombolas localizadas em 43 municípios do estado do Pará, como pode ser visualizado na tabela abaixo:

TABELA 13 - Comunidades Remanescentes de quilombos no Pará, por MunicípioMunicípio

sNº. de

Comum.

Municípios Nº. de Comum

.

Municípios

Nº. de Comum.

Municípios

Nº. de Comu

m.Abaetetuba 16 Bragança 1 Irituia 9 Ponta de

Pedras2

Acará 18 Bujaru 3 Itaituba 1 Porto de Moz

5

Alenquer 1 C.do Arari 1 L. do Ajuru

1 Salvaterra 13

Almeirim 1 C.do Piriá 6 Mocajuba 9 Santa Izabel

8

Anajá 1 Cametá 17 Moju 18 Santarém 9Ananindeua

1 Capitão Poço

1 Monte Alegre

1 S.M. do Guamá

5

Augusto Correa

2 Colares 2 Muaná 5 Soure 1

Bagre 3 Conc. do Pará

12 Óbidos 13 S.Luzia do Pará

4

Baião 25 Gurupá 10 Oeiras do Pará

9 Tracuateua 1

Belém 1 Ig. Miri 1 Ourém 1 Vizeu 7Bonito 3 Inhangapi 3 Oriximiná 29 Sem

identificação

12

Fonte: Programa Raízes. Planilha de Controle de Associações Quilombolas /julho 2006

Embora as comunidades quilombolas estejam distribuídas em boa parte dos municípios paraenses, os dados mostram que as regiões do Tocantins (Acará, Baião, Cametá, Mocajuba, Oeiras do Pará e Bagre) e do Trombetas (Oriximiná e Óbidos) são as que apresentam maior concentração de povoados. Essa concentração parece estar relacionada com a localização dos mocambos e quilombos apontadas por Vicente Salles. Por outro lado, em áreas próximas a Belém, Bragantina e ao Salgado desenvolveram-se atividades agrícolas com a presença de escravos africanos e seus descendentes, o que explica a existência de povoados quilombolas nessas regiões. Na tabela constam ainda 12 comunidades sem identificação. Segundo dados do Programa Raízes, essas comunidades foram citadas por várias fontes, mas não se conseguiu identificar o município onde estão localizadas.

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3.3 Terra e identidade: A titulação das terras quilombolas

A resistência dos quilombolas em permanecer em seus territórios encontrou respaldo legal na Constituição Federal de 1988, que reconheceu as terras das comunidades remanescentes de quilombos como de propriedade definitiva desse segmento, devendo em seu favor ser tituladas. A emissão dos títulos na esfera federal ficou a cargo do INCRA e da Fundação Cultural Palmares, e na esfera estadual através dos órgãos responsáveis pela política fundiária.

O Decreto 4887/2003 apresentou um novo caráter fundiário com o reconhecimento do valor cultural e histórico que têm as terras para as comunidades quilombolas. Assim o parágrafo 1º. do artigo 2º. do referido decreto determina que: Para fins deste decreto, a caracterização dos remanescentes das comunidades de quilombos será atestada mediante auto-definição da própria comunidade.

São definidas ainda as competências do INCRA no processo de titulação e a permanência destas atribuições nos órgãos fundiários estaduais: Compete ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, por meio do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, a reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelos remanescentes das comunidades dos quilombos, sem prejuízo da competência concorrente dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Segundo o decreto, a titulação será reconhecida e registrada mediante a expedição de um título coletivo, uma vez que a terra representa um bem público das comunidades negras. Como a Lei só aceita o registro em nome de pessoa física ou jurídica, o título será concedido em nome de uma Associação representante dos quilombolas da área titulada. Os casos excepcionais de desapropriação e de sobreposição de terras quilombolas em unidades de conservação ambiental, áreas de segurança nacional e reservas indígenas serão tratados sob os dispositivos constitucionais competentes.

A localização das terras de comunidades remanescentes de quilombos no Brasil pode se visualizada na tabela abaixo:

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TABELA 14 - TERRAS QUILOMBOLAS TITULADAS NO BRASIL POR ESTADOS (1995-2006)

Estados Terras tituladas

Comunidades

Famílias

Área(ha) Órgãos

Amapá 2 2 169 11.797,5242 FCPBahia 4 5 743 36.308,2452 FCP;ITERBAGoiás 1 1 600 253.191,720

0 FCP

Maranhão 9 9 707 15.374,4942

INCRA ITERMA

Minas Gerais

1 1 13 199,3001 FCP

Mato Grosso do Sul

2 2 130 2.434,2832

FCP

Mato Grosso

1 6 350 11.722,4513

FCP

Pará 32 81 3854 531.568,862 INCRA; FCP;ITERPA

Pernambuco 2 2 521 17.048,6678 FCPPiauí 1 1 50 626,839 ITERPIR de Janeiro 2 2 74 1.116,0601 Governo do Estado

do Rio de Janeiro; FCP

Sergipe 1 1 130 2.100,5400 FCPSão Paulo 6 6 220 20122,3192 ITESPTOTAL 64 119 7561 903.611,322 ---------

Fonte: CPI-SP, INCRA e Treccani,2006.

Observa-se que as 64 áreas tituladas, perfazendo 903.611,322 hectares, beneficiaram 119 comunidades, com aproximadamente 7560 famílias. Essa áreas estão localizadas em 13 estados brasileiros. O Estado que apresenta o maior número de áreas tituladas é o Pará com 68% dos títulos que perfazem 531.568,862 hectares ou 59% da área total.

Um dado interessante a registrar é que a primeira titulação de uma terra de quilombos no Brasil ocorreu no Pará. Em 1995, em atendimento ao que determina o artigo 68 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal, a comunidade quilombola de Boa Vista, situada no município de Oriximiná, obteve do INCRA o título de propriedade de seu território,com área de 1.125, 0341 hectares, beneficiando 112 famílias. Esse pleito bem sucedido motivou outras comunidades a encaminharem reivindicações ao governo federal no sentido de regularizarem suas terras.

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TABELA 15 - Terras quilombolas do Estado do Pará tituladas pelo Governo Federal(1995-2004)

Território Comunidades Famílias Hectares Município Órgão AnoBoa Vista Boa Vista 112 1.125,0341 Oriximiná INCRA 1995Pacoval Pacoval 115 7.472,8790 Alenquer INCRA 1996Água Fria Água Fria 15 557,1355 Oriximiná INCRA 1996Trombetas Bacabal, Aracuan de

Cima, Aracuan do Meio, Aracuan de Baixo, Serrinha, Terra Preta Ii e Tarauacá

238 23.862,4725 Oriximiná Incra 1997

Itamoari Itamoari 33 5.377,6028 C.do Piriá INCRa 1998Erepecuru Pancada, Araçá, Espírito

Santo, Jauari, Boa Vista do Cuminá, Varre Vento, Jarauacá e Acapú

154 57.584,8505 Oriximiná INCRA 1998

cabeceiras São José, Silêncio, Matar, Cuecê, Apui e Castanhanduba

445 17.189,6939 Óbidos FCP 2000

Bela Aurora

Bela Aurora 32 2.410,2754 Cachoeira do Piriá

INCRA 2004

Paca e Aningal

Paca e Aningal 22 1.284,2398 Viseu INCRA 2004

Fonte:CPISP,INCRA;Treccani, 2006.

No Estado do Pará, de 1995 a 2004 foram expedidos Pelo Governo Federal 11 títulos de terras para comunidades remanescentes de quilombos, sendo 10 através do INCRA e 1 da Fundação Cultural Palmares. Esses títulos perfazendo uma área de cerca de 116. 800 hectares, beneficiaram aproximadamente 1170 famílias.

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TABELA 16 - Terras Quilombolas do Pará tituladas pelo Governo do Estado Através do IITERPA (1997-2005).

Território Comunidades Famílias hectares Município AnoTrombetas Bacabal,Aracuan de Cima,

Aracuan do Meio, Aracuan de Baixo, Serrinha, Terra Preta Ii e Jarauacá

- 57.024,6216 Oriximiná 1997

Abacatal Abacatal 53 317,9366 Ananindeua 1999Erepecuru Pancada, Araçá, Espírito Santo,

Jauari, Boa Vista do Cuminá, Varre Vento, Jarauacá e Acapú

- 160.459,4072 Oriximiná 2000

Gurupá Gurupá Mirin, Jocojó, Flexinha, Carrazedo, Camutá do Ipixuna, Baça do Ipixuna, Alto Ipixuna e Alto Pucuruí

300 83.437,1258 Gurupá 2000

Maria Ribeira

Maria Ribeira 32 2.031,8727 Gurupá 2000

Camiranga Camiranga 39 320,6121 Cachoeira do Piriá

2002

Laranjituba África

Larangituba e África 48 118,0441 Moju 2002

Ilhas de Abaetetuba

Alto e Baixo Itacuruçá, Campopema, Jenipaúba, Acaraquiri, Igarapé São Joaão, Arapapu e Rio Tauaré- Açu

116 11.458,5320 Abaetetuba 2002

Bom Remédio

Bom Remédio 701 588,1670 Abaetetuba 2002

Bailique Bailique Beira, Bailique Centro, Poção e São Bernardo

112 7.297,6910 Oeiras do Pará e Baião

2002

Jurussaca Jurussaca 45 200,9875 Traquateua 2002Santa Rita de Barreiras

Santa Rita de Barreiras 35 371,3032 São Miguel do Guamá

2002

Santa Fé e Santo Antônio

Santa Fé e Santo Antônio 28 830,8776 Baião 2002

Igarapé Preto e Baixinha

Igarapé Preto, baixinha, Pampelônia,Teófilo, Varzinha, Campelo, Cupu, França, Araquembaua, Carará, Costeiro e Igarapezinho

565 17.357,0206 Baião 2002

Guajará Miri Filhos de Zumbi 70 1.024,1954 Acará 2002Icatu Icatu 80 1.636,6122 Mocajuba e

Baião2002

Santa Maria de Mirindeua

Santa Maria de Mirindeua 85 1.763,0618 Moju 2003

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Santo Cristo Santo Cristo do Ipitinga do Mirindeua

52 1.767,0434 Moju 2003

Itacoã Miri Itacoã Miri 96 968,9900 Acará 2003Mãe Domingas

Abui, Paraná do Abui, Tapagem, Sagrado Coração e Mãe Cue

182 61.211,9578 Oriximiná 2003

Nossa Senhora da Conceição

Nossa Senhora da Conceição 54 2.393,0559 Moju 2005

Santa Maria do Traquateua

Santa Maria do Traquateua 27 833,3833 Moju 2005

São Manuel São Manuel 68 1.293,1786 Moju 2005Fonte: Programa Raízes e Treccani 2006.

Entre 1997 e 2005, o ITERPA expediu 23 títulos perfazendo uma área de aproximadamente 414.700 hectares o equivalente a 78% da dimensão total das terras quilombolas tituladas no Pará, beneficiando cerca de 2800 famílias.

Entretanto entraves burocráticos dos órgãos envolvidos na titulação aliados aos interesses de grupos que historicamente tem sido responsáveis pela concentração de terras na Amazônia colaboram para a lentidão do processo. Essa demora na regularização das terras resulta no acirramento dos conflitos vivenciados entre os quilombolas e os ocupantes ilegais de suas terras. Encontram-se atualmente no Pará 29 terras quilombolas em diferentes fases do processo de regularização, localizadas em 13 municípios paraenses. (CPI-SP, 2006)

3.3 As comunidades quilombolas e as políticas públicas

A educação escolar em territórios de remanescentes de quilombos encontra amparo legal no decreto 4887/03 que objetiva garantir às comunidades quilombolas a posse da terra e o acesso a serviços, como saúde, educação e saneamento.

Á luz do referido Decreto, o Ministério da Educação, através da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade traçou as seguintes ações específicas: formação específica de professores para áreas de remanescentes de quilombos; fóruns estaduais para articulação e acompanhamento das formações de professores in loco; ampliação e melhoria da rede escolar; produção e aquisição de material didático para quilombolas. Por outro lado, a Lei no. 10.639/03 tornou obrigatório nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira (Art. 26-A)

A tabela abaixo apresenta a distribuição das escolas quilombolas no Brasil, por dependência administrativa:

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TABELA 17 - Estabelecimentos escolares localizados em áreas remanescentes de Quilombos 2004.

DependênciaAdministrativa

Brasil Norte Pará

Estadual 44 5 3Municipal 313 90 90Privada 7 0 0Total 364 95 93

Fonte:MEC-Censo Escolar 2004

Segundo dados de Censo Escolar/2004, no Brasil existiam 364 escolas localizadas em áreas remanescentes de quilombos. Segundo a dependência administrativa, 313 ou 78% eram municipais, 44 ou 20% eram estaduais e 7 ou 2% de ensino privado. Quanto a Região Norte 95% Estaduais e 5% Municipais. Quanto ao Estado do Pará 97% Municipal e 3% Estadual. Observa-se que na Região Norte estão localizados 26% do total de escolas quilombolas do país e na quase se totalidade 97% no Estado do Pará, os 3% restantes estão situadas no Estado do Amapá. O significativo percentual de escolas municipais mostra que na maioria das escolas quilombolas é ministrado apenas o ensino fundamental, o que tem constituído um dos principais problemas para os alunos que querem prosseguir seus estudos.

TABELA 18 - Número de Matrículas em Estabelecimentos Localizados em Áreas remanescentes de Quilombos em 2004

DependênciaAdministrativa

Brasil Norte Pará

Estadual 9.716 686 383Municipal 38.593 9.042 9.042Privada 1413 0 OTotal 49.722 9.728 9.425

Fonte: MEC-Censo 2004

Observa-se que no país existe um número significativo de alunos matriculados em escolas quilombolas, entretanto os dados mostram que a maior concentração se dá em escolas municipais , portanto de ensino fundamental. Quanto às matrículas em estabelecimentos estaduais (nível médio), os percentuais são pouco expressivos: Brasil (20%), Norte (7%) e Pará (4%), reforçando a observação feita anteriormente.

Quanto às políticas de saúde destinadas às populações quilombolas verifica-se que não existe no âmbito da FUNASA um programa específico para a saúde das populações quilombolas tal com existe para saúde indígena. As políticas existentes são as voltadas para os vários segmentos da população rural.

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No Estado do Pará, segundo a FUNASA, está em fase inicial um projeto de implantação das primeiras unidades de saúde em áreas quilombolas que serão localizadas nos municípios de Altamira e Abaetetuba.3.5 Associações Quilombolas do Pará

Tendo como objetivo principal a defesa de seus territórios, na final da década de 1980, os quilombolas do Pará passaram a se organizar em Associações de Comunidades Remanescentes de Quilombos. Em 1989 surgiu a Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Município de Oriximiná - ARQMO que por ter sido a pioneira, passou a contribuir com outras comunidades dando surgimento a novas associações.

Atualmente encontram-se registradas no Programa Raízes 53 associações de comunidades quilombolas, apresentadas na tabela abaixo:

TABELA 19 - Associações Quilombolas do Pará1989-2005

Nome da Associação Município Ano de fundação

Associação dos Moradores e agricultores da Comunidade do Espírito Santo

Acará 2002

Associação dos remanescentes de Quilombos Filhos de Zumbi Guajará Miri

Acará 2000

Associação dos Moradores e Agricultores Quilombolas de Guajará Miri

Acará 2002

Associação dos moradores e Agricultores Quilombolas de Carananduba

Acará 2004

Associação Quilombola da Comunidade de santa Maria Itacoã Acará -Associação Quilombola São Sebastião Acará -Associação de Moradores e Agricultores Remanescentes de Quilombos Menino Jesus

Acará -

Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos das Ilhas de Abaetetuba

Abaetetuba 2001

Associação das comunidades Remanescentes de Quilombos do Ramal de Piratuba

Abaetetuba 2004

Associação dos Moradores e Produtores do Abacatal-Aurá Ananindeua -Associação Comunitária de Negros do Quilombo Pacoval de Alenquer

Alenquer 1990

Associação Comunitária de Remanescentes de Quilombos Mocambo de Santa Fé

Baião 2001

Associação dos Remanescentes de Quilombo de Igarapé Preto e Baixinha

Baião 2002

Associação de Remanescentes de Quilombolos de Bailique Centro, Bailique Beira, Poção e São Bernardo

Baião 2002

Associação das Comunidades remanescentes de Quilombos Umarizal Centro

Baião 2002

Coordenação das Associações de Comunidades Remanescentes Belém 2004

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de Quilombos- MALUNGUAssociação Quilombola Rural Bela Aurora Cachoeira

do Piriá2001

Associação da Comunidade Remanescente de Quilombo Nova Esperança de Concórdia do Pará- ARQUINEC

Concórdia do Pará

-

Associação da Comunidade Remanescente de Quilombo de Narcisa

Capitão Poço

2000

Associação Quilombola de Cacau Colares 2003Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo de Gurupá

Gurupá 1999

Associação dos remanescentes de Quilombo da Comunidade de Maria Ribeira

Gurupá -

Associação da comunidade remanescente de Quilombo de Santa Maria do Traquateua

Moju 2003

Associação da Comunidade de Quilombo de Santo Cristo do Ipitinga do Mirindeua

Moju 2003

Associação Quilombola do Baixo Caeté- comunidades de Laranjituba e África

Moju 2001

Associação Quilombola dos Agricultores de São Manoel Moju 2003Associação da Comunidade Remanescente de Quilombola de Conceição do Igarapé Mirindeua

Moju 2002

Associação da Comunidade R. de Quilombo Oxalá do Jacunday Moju 2003Associação da Comunidade Remanescente de Quilombo de Santa Maria do Mirindeua

Moju 2003

Associação da Comunidade Remanescente de Quilombo de Bom Jesus, Centro Ouro, N.Sra das Graças e São Bernardino

Moju -

Associação dos Filhos e Amigos de Samauma Moju 2002Associação das Comunidades dos Remanescentes de Quilombos do Município de Oriximiná- ARQMO

Oriximiná 1989

Associação das Comunidades de Remanescentes de Quilombos Cachoeira Porteira- AOCRET-CPT

Oriximiná -

Associação das Comunidades remanescentes de Quilombos Pancadas,Espírito Santo, Araçá, Jauari, Boa Vista, Varre Vento e Jarauacá

Oriximiná -

Associação das Comunidades Remanescente de Quilombo Bacabal, Aracuam de Cima, Aracuam do meio, Aracuam de Baixo, Serrinha, terra Preta II e Jarauacá

Oriximiná -

Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos Água Fria

Oriximiná -

Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos Boa Vista

Oriximiná -

Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos Abui, Tapagem, Sagrado coração e Mãe-Cué(Mãe Domingas)

Oriximiná -

Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos do município de Óbidos

Óbidos 1997

Associação dos Remanescentes de Quilombo de Bacabal Salvaterra 2002

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Associação remanescentes de Quilombo dos moradores do povoado Deus me ajude

Salvaterra 2002

Associação Remanescentes de quilombos de Santa Luzia Salvaterra 2005Associação dos Moradores da Comunidade de Santa Rita São Miguel

do Guamá1993

Associação dos moradores remanescentes de Quilombos da comunidade Menino Jesus- ARQMEC

São Miguel do Guamá

2005

Comunidade Santa Luzia Santa Izabel do Pará

1995

Associação Comunitária de remanescentes de Quilombo de Boa vista do Ita

Santa Izabel do Pará

2003

Associação dos Pequenos e Mini produtores da Comunidade do Jurussaca

Tracuateua 1996

Associação Quilombola Rural das Comunidades de Paca e Aningal

Viseu 2002

Centro Comunitário de Camiranga Viseu 2002Fonte: Programa Raízes- Planilha de Controle de Associações Quilombolas

Observa-se que grande parte dessas associações 44 % estão situadas em 3 municípios Acará, Moju e Oriximiná áreas de maior mobilização pela titulação dos territórios. Por outro lado, 20 delas, aproximadamente 40 % surgiram nos cinco últimos anos, constituindo uma indicação de que está em curso um processo de construção da identidade quilombola, pois essas associações constituem um espaço para a defesa da terra, ampliação de direitos e da cidadania.

Atualmente as comunidades quilombolas estão filiadas à Coordenação das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombos - MALUNGU. A associação criada oficialmente em 2004, segundo o seu Estatuto, objetiva defender os direitos e interesses das associações e das comunidades remanescentes de quilombos do Estado do Pará. A MALUGU desenvolve suas ações com apoio do Centro de Defesa e Estudos do Negro do Pará (CEDENPA), da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará (Fetagri-Pa), da Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP), da Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional (FASE), da Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN), do Programa Raízes do Governo do Estado do Pará e de agências de cooperação internacionais OXFAM e CAFOD.

3.6 As principais reivindicações das comunidades negras do Pará.

Tomando com referência o processo de construção de identidade étnica, falar em reivindicações é reconhecer que existem situações diferenciadas e que os pleitos estão relacionados não só com o cotidiano dos grupos que os apresentam, como também com graus diferenciados de envolvimento político desses grupos, sendo necessário, pois pontuar o que é comum e o que é específico.

Existem questões que são básicas, que são comuns a todos, como a luta contra o preconceito e qualquer forma de discriminação racial.

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Quanto aos grupos urbanos, registra-se uma luta pela visibilidade social, política, econômica e cultural, busca-se a efetivação de ações afirmativas sobretudo no plano educacional e no plano das relações de trabalho.

Para as populações quilombolas, a questão principal é a luta pela titulação de seus territórios e o acesso a políticas públicas de saúde, educação e geração de renda diferenciadas.

Essas questões estão presentes nos diversos fóruns, nos documentos elaborados pelas associações, nos relatórios de pesquisa realizados em diferentes comunidades e na fala das lideranças entrevistadas.

Quanto à questão da terra, os principais problemas identificados são referentes à lentidão do processo de titulação pelos órgãos estaduais e federais e as situações de conflito envolvendo posseiros e madeireiros e outros invasores de suas terras. Nesse sentido reivindicam maior agilidade na regularização de suas terras e ação do poder público na resolução dos conflitos fundiários.

Quanto à questão educacional, os principais problemas apontados referem-se à insuficiência de escolas ou inexistência delas em muitas comunidades; ao tamanho das escolas que não comporta o número de alunos matriculados; às turmas multisseriais e restritas ao ensino de primeira à quarta série, o que leva os quilombolas que querem continuar seus estudos a se deslocarem para os as sedes dos municípios e enfrentar várias dificuldades, entre elas a discriminação racial.Por isso reivindicam a ampliação do número de escolas e adequação dos prédios; aumento das séries de ensino e que os livros didáticos sejam específicos, isto é, que tenham a história do quilombo e da cultura quilombola

Quanto à saúde, registra-se falta de saneamento básico, falta de assistência médica, odontológica, ausência de água tratada, ausência de transporte para deslocamento em caso de doenças e as precárias condições de moradias o que facilita o aparecimento de doenças. As reivindicações encaminham-se no sentido de implantar nas comunidades postos de saúde com equipamentos, remédios e profissionais competentes; capacitar e preparar os membros da própria comunidade para trabalhos preventivos e de atenção à saúde e saneamento básico nas comunidades.

Quanto ao trabalho e geração de renda, as reivindicações são encaminhadas no sentido de buscar soluções para os principais problemas apontados que são a falta de terra para plantar; de energia; de saneamento básico; programas de incentivo específicos para a produção quilombola; espaços e locais para o comércio dos produtos quilombolas; transporte para escoar a produção; implementos agrícolas; casas de farinha-construção e melhorias; apoio técnico para produção agrícola. Os quilombolas consideram que a legislação ambiental está em conflito com seus costumes e tradições e nesse sentido reivindicam a inclusão e a participação das comunidades na gestação administrativa de Áreas de Preservação Ambiental e partes que estão dentro de suas áreas. (FUNDAÇÃO CULTURAL PALMARES ; FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA, 2004).

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3.7 Índios e negros na Amazônia, diferentes atores de uma história de exclusão

Índios e negros, enquanto minorias, são atores da mesma história de exclusa e discriminação pautada no desrespeito pela sua diversidade cultural e singularidade resultante do modelo de sociedade vigente no Brasil.

Por outro lado, é muito recente o reconhecimento de que índios e negros, que ao lado dos europeus foram os principais elementos formadores de nossa brasilidade, não pertencem ao passado, ao contrário, são segmentos do presente que buscam ter visibilidade social, política e econômica enquanto minorias culturalmente diferenciadas.

No processo de construção de identidade, essas minorias vêm contando com apoio de diferentes atores sociais como igrejas, ONGs, universidades e o Estado.

Apesar de serem considerados como populações tradicionais cada um desses grupos na Amazônia tem suas peculiaridades e diferenciações internas. Como se trata de um processo, não seria apropriado afirmar com segurança a existência de uma forte identidade de resistência, sobretudo tomando como referência as populações quilombolas. Há, sem dúvida, o início de um caminho no qual as questões mais amplas do movimento negro nacional ainda se encontram pouco delineadas. A questão maior para essas populações rurais está relacionada com a titulação de suas terras.

Quanto aos povos indígenas, em decorrência do nível de organização em que se encontram, esse processo de construção de identidade parece estar caminhado com menos lentidão. O resultado é a contabilização de algumas conquistas em relação ao acesso à políticas públicas, ainda que limitadas e permeadas por situações de violência.

No que concerne ao reconhecimento de seus territórios, motivação maior das reivindicações das referidas minorias, existe uma distinção relativa à dominialidade. Enquanto as terras indígenas são definidas como bens da União, destinando-se a posse permanente, as terras das comunidades quilombolas são reconhecidas como propriedade definitiva. Entretanto os dois grupos padecem de igual descaso do poder público aliado à interferência de agentes econômicos contrários à titulação de suas terras, num desrespeito à singularidade cultural dessas minorias.

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