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1 PROCESSO DE INCLUSÃO SOCIAL E SERVIÇO SOCIAL 1 Isadora Araújo Magalhães 2 Lucineide Orsolin 3 RESUMO: Com o objetivo de refletir acerca de práticas inclusivas relacionadas a pessoas com deficiência, destaca-se o Assistente Social, como um profissional que trabalha na perspectiva de viabilizar direitos e ampliar a cidadania. Diante disso se observa a relevância deste fazer profissional para a efetivação da inclusão social, eliminando todas as formas de preconceito e discriminação, bem como trabalhando na defesa intransigente dos direitos humanos. Reflexões sobre inclusão social são relevantes à medida que compreendê-las significa pensá-las de forma plena e não superficial, desmistificando mitos e estereótipos historicamente criados acerca das pessoas com Síndrome de Down. Uma pessoa, com deficiência, por exemplo, pode estar inserida no mercado de trabalho e em uma escola regular de ensino. No entanto, isso não quer dizer que ela está de fato usufruindo de todos os seus direitos, e, que exista neste caso inclusão social. São muitos os desafios neste processo. Contudo, as possibilidades se sobressaem, principalmente se esta questão for pensada pela prática interdisciplinar. Diante disso, é possível afirmar que o profissional Assistente Social conta com conhecimento teórico-metodológico, ético-político e técnico-operativo e, portanto, está apto para lutar e para viabilizar a inclusão social - de forma que esta aconteça efetivamente e não apenas porque existe uma legislação que obriga tal procedimento ou conduta. PALAVRAS-CHAVE: Assistente Social. Inclusão Social. Síndrome de Down. 1 GT 6: Direito, Cidadania e Cultura 2 Formanda do Curso de Serviço Social. URI São Luiz Gonzaga. Email [email protected] 3 Mestre em Desenvolvimento UNIJUÍ Ijuí/RS. Docente e Coordenadora do Curso de Serviço Social. URI São Luiz Gonzaga.Email [email protected]

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PROCESSO DE INCLUSÃO SOCIAL E SERVIÇO SOCIAL1

Isadora Araújo Magalhães2

Lucineide Orsolin3

RESUMO: Com o objetivo de refletir acerca de práticas inclusivas relacionadas a pessoas

com deficiência, destaca-se o Assistente Social, como um profissional que trabalha na

perspectiva de viabilizar direitos e ampliar a cidadania. Diante disso se observa a relevância

deste fazer profissional para a efetivação da inclusão social, eliminando todas as formas de

preconceito e discriminação, bem como trabalhando na defesa intransigente dos direitos

humanos. Reflexões sobre inclusão social são relevantes à medida que compreendê-las

significa pensá-las de forma plena e não superficial, desmistificando mitos e estereótipos

historicamente criados acerca das pessoas com Síndrome de Down. Uma pessoa, com

deficiência, por exemplo, pode estar inserida no mercado de trabalho e em uma escola regular

de ensino. No entanto, isso não quer dizer que ela está de fato usufruindo de todos os seus

direitos, e, que exista neste caso inclusão social. São muitos os desafios neste processo.

Contudo, as possibilidades se sobressaem, principalmente se esta questão for pensada pela

prática interdisciplinar. Diante disso, é possível afirmar que o profissional Assistente Social

conta com conhecimento teórico-metodológico, ético-político e técnico-operativo e, portanto,

está apto para lutar e para viabilizar a inclusão social - de forma que esta aconteça

efetivamente e não apenas porque existe uma legislação que obriga tal procedimento ou

conduta.

PALAVRAS-CHAVE: Assistente Social. Inclusão Social. Síndrome de Down.

1 GT 6: Direito, Cidadania e Cultura 2 Formanda do Curso de Serviço Social. URI São Luiz Gonzaga. Email –

[email protected] 3 Mestre em Desenvolvimento UNIJUÍ – Ijuí/RS. Docente e Coordenadora do Curso de Serviço

Social. URI São Luiz Gonzaga.Email – [email protected]

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INTRODUÇÃO

Analisar a evolução da prática profissional do Serviço Social é importante para

compreender a profissão, bem como, sua operacionalização e relevância que esta apresenta

para o contexto social em que vivemos.

O Serviço Social foi visto por muito tempo como uma prática de assistencialismo, ou

seja, política de ajuda aos pobres, em que se atuava a partir de uma perspectiva caritativa. A

concepção que se tinha do assistente social era de “moças piedosas” que tinham pena dos

pobres e agiam de forma solidária. Acreditava-se que os pobres surgiam da falta de sorte e de

benção divina, assim, os “abençoados”, ou seja, os que tivessem condições financeiras

melhores deveriam ser solidários e fazer caridade para os necessitados:

As origens do Serviço Social estão fincadas na assistência prestada aos

pobres, por mulheres piedosas, alguns séculos atrás. De lá para cá, apesar de muita

coisa ter mudado, o Serviço Social continuou sendo uma profissão essencialmente

feminina, só que as ricas damas de caridade cederam lugar às filhas da classe média

ou dos trabalhadores urbanos (ESTEVÃO, 2006, p. 7).

A partir do Movimento de Reconceituação, na década de 1960, o qual surgiu com a

necessidade de adequar as práticas profissionais a realidade do país e para fazer uma ruptura

com o conservadorismo, construindo novos métodos e técnicas a partir das necessidades da

realidade social, a profissão ganha um novo sentido a sua prática, sendo operacionalizada não

mais como forma de assistencialismo. O Serviço Social, então, não é mais executado por

“boas moças” ou “mulheres piedosas”, mas por profissionais preparados com conhecimento

teórico-metodológico, ético-político e técnico-operativo que trabalham na perspectiva de

viabilizar direitos e ampliar a cidadania, comprometidos com a qualidade dos serviços

públicos prestados à população.

Embora se perceba uma evolução na forma de operacionalização do Serviço Social, é

possível perceber que ainda existem profissionais que trabalham a partir de uma perspectiva

assistencialista, que não têm uma visão crítica e propositiva acerca da realidade, o que

desvaloriza o fazer profissional e contribui para uma concepção equivocada e superficial da

profissão:

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Em primeiro lugar, para garantir uma sintonia do Serviço Social com os

tempos atuais, é necessário romper com uma visão endógena, focalista uma visão

“de dentro” do Serviço Social, prisioneira em seus muros internos. Alargar os

horizontes, olhar para mais longe, para o movimento das classes sociais e do Estado

em suas relações com a sociedade; não para perder ou diluir as particularidades

profissionais, mas, ao contrário, para iluminá-las com maior nitidez. Extrapolar o

Serviço Social para melhor apreendê-lo na história da sociedade da qual ele é parte

e expressão. É importante sair da redoma de vidro que aprisiona os assistentes

sociais numa visão de dentro e para dentro do Serviço Social, como precondição

para que se possa captar as novas mediações e requalificar o fazer profissional,

identificando suas particularidades e descobrir alternativas de ação (IAMAMOTO,

2003, p.20).

Abster-se de uma postura conservadora, ou seja, sair da zona de conforto e trabalhara

partir de perspectivas transformadoras da realidade social, é algo desafiador, no entanto, é

necessário quando se almeja uma nova ordem societária, que é também objetivo do Serviço

Social. E isto, implica em ser um profissional propositivo, criativo, reflexivo e não só

executivo, ou um mero profissional que cumpre somente atividades preestabelecidas.

O assistente social é um profissional voltado para atuar diretamente na realidade, a

partir das expressões da questão social, sendo este o objeto de estudo e ação do profissional.

As expressões se caracterizam pelas forças de resistência e pelas desigualdades sociais, as

quais se tornam visíveis pela falta de acesso da população aos direitos sociais. O profissional

pode intervir na realidade social através do planejamento, execução e avaliação de Programas

e Projetos voltados à área social. E para, além disso, ser um profissional assistente social

necessita ter compreensão acerca do Projeto Ético-Político da profissão, dos seus

conhecimentos teórico-metodológicos, ético-político e técnico-operativo, ou seja, ter

comprometimento com o fazer profissional, com os usuários dos serviços e com o Código de

Ética da profissão.

Marilda Iamamoto aborda sobre os desafios do profissional, assistente social, na

contemporaneidade:

Um dos maiores desafios que o Assistente Social vive no presente é

desenvolver sua capacidade de decifrar a realidade e construir propostas de trabalho

criativas e capazes de preservar e efetivar direitos, a partir de demandas emergentes

no cotidiano. Enfim, ser um profissional propositivo e não só executivo. (2003,

p.20).

Desta forma, o assistente social da contemporaneidade deve desenvolver propostas

criativas de trabalho para poder intervir nas demandas emergentes. E o processo de inclusão

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social se caracteriza como um desses desafios, tendo em vista que vivemos em uma

sociedade com preconceitos e limitadas compreensões acerca do processo de inclusão. As

práticas discriminatórias da sociedade podem, até mesmo dificultar a intervenção do

profissional no processo de viabilização de direito, contudo, não deve impedi-lo de exercer de

forma ética a sua atribuição e compromisso social, visto que a defesa intransigente dos

direitos humanos é um dos princípios fundamentais de um assistente social.

Provocar reflexão acerca da inclusão social, dos direitos das pessoas com deficiência,

bem como, ter empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, se constitui como

deveres enquanto assistentes sociais, comprometidos com a ampliação e consolidação da

cidadania, visando uma sociedade mais justa e igualitária. A partir disso, faz-se relevante

analisar as possibilidades do assistente social neste processo.

INCLUSÃO SOCIAL: POSSIBILIDADES E DESAFIOS AO SERVIÇO SOCIAL

Refletir sobre a necessidade da inclusão social se faz relevante no sentido de

compreender que a mesma deve existir de forma plena e não superficial. Uma criança com

Síndrome de Down, por exemplo, pode estar inserida em uma escola regular de ensino, no

entanto, isso não quer dizer que ela está de fato usufruindo de todos os seus direitos, e, que

exista neste caso inclusão social. São muitos os desafios neste processo para o Assistente

Social. Contudo, as possibilidades se sobressaem.

É difícil pensarmos que pessoas são excluídas do meio social em razão das

características que possuem, como cor da pele, cor dos olhos, altura e peso. Já nascemos com

essas características e elas é que nos definem como ser humano, sendo que, cada um de nós

se distingue um do outro. Isso deveria ser visto como algo positivo, no entanto, existe na

sociedade um “padrão ideal” a se seguir, e isso causa as discriminações, exclusões e

preconceitos.

Os excluídos socialmente são também, por exemplo, os que não possuem condições

financeiras dentro dos padrões impostos pela sociedade, ou seja, as pessoas pobres, além dos

idosos, dos negros, indígenas, homossexuais, pessoas com deficiência, etc.

A palavra exclusão remete o pensamento instantaneamente para a ideia de

desigualdade. Não há como pensar em grupos privados de direitos considerados

básicos sem que se tenha em mente um comparativo, com um outro cujo acesso a

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esses direitos seja pleno. A desigualdade de renda, de oportunidade ao trabalho, de

acesso à saúde, à justiça, à escola, à cultura, ao lazer, à segurança, à escolha e à

cidadania política constitui cada uma delas, faces de uma única questão abrangente

que, quando estudada em conjunto e focada sobre os que estão despojados desses

direitos costuma chamar-se de exclusão social (AMORIM, BLANES,

POCHMANN, 2006, p. 98).

A desigualdade social é compreendida pelo desigual acesso aos bens e serviços

produzidos pela sociedade, bem como aos direitos, e, além disso, ela também é percebida nas

relações sociais, quando alguém é excluído ou não se percebe como pertencente a um

determinado espaço e/ou grupos sociais. Logo compreende-se, neste processo, que não há

inclusão de forma integral, mas sim, o que se observa com mais frequência é a exclusão

social, em suas variadas formas de expressão.

O assistente social, como referenciado anteriormente, é um profissional que trabalha

na perspectiva de viabilizar direitos e ampliar a cidadania. Diante disso, se observa a

relevância deste fazer profissional para a efetivação da inclusão social, eliminando com todas

as formas de preconceito, discriminação, trabalhando na defesa intransigente dos direitos

humanos.

Neste viés, é de compromisso dos assistentes sociais, da sociedade civil e também do

Estado, trabalhar na perspectiva de se efetivar a inclusão social, através de programas e

projetos de ordem social, além de colocar em vigor os já existentes, visando, desta forma,

uma sociedade mais justa e igualitária. Este processo implica em grandes desafios, uma vez

que a naturalização da exclusão e desigualdade social é algo marcante no contexto social em

que vivemos, pois são conceitos historicamente constituídos. No entanto, provocar reflexão

acerca deste processo é de fundamental importância para a efetivação da inclusão social, e

também para a desmistificação de estereótipos e preconceitos acerca da pessoa com

deficiência.

Faz-se relevante salientar, mais uma vez, que o Assistente Social dispõe de um

Código de Ética Profissional, do qual, alguns de seus princípios fundamentais norteiam esta

abordagem:

Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do

autoritarismo;

Ampliação e consolidação da cidadania, considerada tarefa primordial de

toda sociedade, com vistas à garantia dos direitos civis, sociais e políticos das

classes trabalhadoras;

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Empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, incentivando

o respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente discriminados e à

discussão das diferenças;

Compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população e com

o aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência profissional;

Exercício do Serviço Social sem ser discriminado, nem discriminar, por

questões de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade, opção

sexual, idade e condição física (CFESS. RES. 273/93).

A partir disso, compreende-se que trabalhar na perspectiva de respeitar as

diversidades e ter posicionamento em favor da equidade e justiça social, constituem-se como

alguns dos princípios básicos do Assistente Social. Tendo em vista que é compromisso deste

profissional prezar pelo exercício de seu Código de Ética.

O Assistente Social, como já mencionamos, é um profissional que possui

conhecimentos teórico-metodológico, ético-político e técnico-operativo, estando habilitado

para trabalhar a partir de uma perspectiva viabilizadora de direitos sociais e para a expansão

da inclusão social, visto que a sua formação lhe proporciona conhecimentos e possibilidades,

as quais são maiores que os desafios encontrados neste processo.

Neste viés, a inclusão social deve ser compreendida como um direito das pessoas em

ter acesso às suas necessidades básicas, viver e usufruir dos espaços sociais, os quais não

devem ser pensados e planejados apenas para as pessoas que não têm deficiência. A inclusão

deve acontecer de forma plena, podendo os sujeitos com deficiência usufruir dos bens e

serviços produzidos e ofertados pela sociedade sem discriminação, bem como aos direitos

sociais, sendo alguns deles o direito à educação de qualidade, ao convívio social e ao acesso

efetivo ao mercado de trabalho.

Portanto, a inclusão social deve acontecer de forma integral, plena e de caráter

verdadeiro, não somente porque existe uma legislação que exige esta conduta da sociedade,

mas sim por desejo de uma sociedade realmente inclusiva.

O SERVIÇO SOCIAL NAS ESCOLAS: UMA VISÃO INTERDISCIPLINAR

Torna-se significativo analisar as possibilidades do Serviço Social no âmbito escolar,

e, por certo, suas contribuições neste contexto. Trabalhar de forma interdisciplinar parece ser

um desafio para os profissionais das diferentes áreas do conhecimento e para a nossa

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sociedade. Contudo, há necessidade de refletir acerca desta prática que é fundamental para o

fazer profissional do Assistente Social.

O Assistente Social é um profissional que busca compreender e refletir sobre as

relações sociais, bem como, sobre o que as mesmas refletem no cotidiano dos usuários de

seus serviços. As experiências de cada indivíduo constituem a sua história de vida, que, por

certo, são determinantes para a compreensão de ser humano e sociedade, e, desta forma,

poder observar e compreender a sua situação, além de seus princípios e valores. Desta forma,

se analisa que o trabalho do Assistente Social não deve partir do pressuposto de que a sua

concepção de vida seja melhor e/ou superior a de alguém, a ponto de servir como exemplo,

mas que o profissional deve também compreender o outro.

É possível perceber, a partir das reflexões feitas e da apreensão acerca da importância

do fazer profissional do Assistente Social, que a sua inserção no âmbito escolar se faz

relevante na perspectiva de efetivação da inclusão social.

O campo educacional, para o Serviço Social, não vem a ser apenas mais um espaço de

atuação do Assistente Social, mas uma intervenção que visa articular seus conhecimentos

com todo o contexto escolar, de forma a prezar pela interdisciplinaridade. Esta inserção

possivelmente contribuirá para práticas inclusivas, de formação da cidadania e emancipação

dos sujeitos sociais.

Não se trata, ao menos do nosso ponto de vista, de identificar um nicho de

mercado inexplorado ou potencialmente viável. Trata-se, antes de tudo, de um

campo de intervenção do Estado e de uma dimensão da vida social, que hoje se

coloca como estratégica na sociedade contemporânea, seja para a afirmação de um

projeto societário vinculado aos interesses do capital, seja para a ampliação e

integração das lutas sociais no que diz respeito à conquista de direitos e

enfrentamento das desigualdades (ALMEIDA, 2000, p. 25).

Neste interim, é notório que a inserção de Assistentes Sociais nas escolas se faz

importante na medida em que este profissional trabalha numa perspectiva de viabilizar

direitos, bem como a partir de ações que visem o enfrentamento às desigualdades sociais e

efetivação da inclusão social. Não busca-se, “apenas”, mais um campo de trabalho onde o

Serviço Social possa intervir. A proposta e o desejo de lutar por práticas educacionais que

concebem o aluno como sujeito de relações sociais, as quais por vezes, interferem no seu

aprendizado e desenvolvimento, são bem maiores do que isso, ou seja, o Assistente Social

tem muito o que contribuir para a melhoria e o aperfeiçoamento do processo educativo.

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O Projeto de Lei 3688/2000, visa a inserção de assistentes sociais e psicólogos no

quadro de profissionais das escolas públicas de educação básica. Este PL já foi aprovado na

Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara (CSSF), na Comissão de Educação e

Cultura (CEC), e na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC); foi retirado de

pauta, de ofício, a pedido do Relator, um mês depois o parecer foi proferido e aprovado. No

momento está pronto para Pauta no Plenário (PLEN).

Mediante aprovação deste, se prevê a legalidade da atuação do Assistente Social nas

escolas, e, desta forma, a sua ampliação na possibilidade de enfrentamento às expressões da

questão social. Assim, considera-se que a partir do contexto escolar se pode analisar estas

manifestações de exclusão social, incluindo questões que vão desde a violência,

discriminações e práticas de bullying, até a evasão escolar, possivelmente oriundas destas

atitudes.

Algumas das questões a serem identificadas pelo Assistente Social na área da

educação são: analisar o baixo rendimento escolar, a evasão escolar, o “desinteresse” pelo

aprendizado, a insubordinação a qualquer limite ou regra escolar, a vulnerabilidade às drogas,

as atitudes e comportamentos agressivos e violentos, suspeita de abuso sexual, violência

familiar, além de propor estratégias de fortalecimentos de vínculos familiares e sociais

(CFESS, 2011, apud ARAÚJO E BARCELOS, 2016).

Acredita-se que a contribuição do Assistente Social neste espaço pode ser ainda maior

e mais complexa. Trabalhar a partir de uma prática emancipatória, que visa politizar os

sujeitos, também é uma das possibilidades do profissional neste contexto:

Pensar a educação no âmbito da crise do capitalismo contemporâneo é

analisá-la sob duas perspectivas: a subordinação das práticas educativas aos

interesses do capital, ou, o entendimento da educação enquanto apropriação de um

conjunto de conhecimentos, atitudes, habilidades e valores capazes de forjar a

liberdade e o reconhecimento do homem enquanto ser teológico, criador e (re)

criador da sua própria história (AMARO, 1997, p.7-8).

Diante disso, a capacidade de observação, inerente ao Assistente Social, possibilita ter

uma visão ampla do contexto social do educando, permitindo conhecê-lo e compreendê-lo

melhor enquanto sujeito de relações sociais, ou seja, que possui uma família, que está

inserido em um contexto social e não somente um indivíduo que está na condição de aluno, o

qual se pressupõe de que tem o dever de aprender. A escola deve ser reconhecida como uma

totalidade, e que, portanto, vai além de seus “portões”, se constituindo em um espaço para a

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ampliação da cidadania e fortalecimento de vínculos familiares e comunitários a partir das

oportunidades de participação dos mesmos.

Amaro (1997) aponta que o cenário escolar é um espaço social rico e fecundo. E é

nele que as contradições sociais se mostram vivas e pulsantes, espelhando a realidade tal

como ela é.

É neste espaço, a partir de um trabalho interdisciplinar, que o Assistente Social visa

reconhecer as expressões da questão social, visto que a escola é um ponto de encontro para a

construção do diálogo e para propor estratégias de enfrentamento a estas expressões. Neste

sentido, o profissional pode assumir o papel de articulador de propostas e ações que visem a

constante reflexão acerca dos processos acima mencionados.

Percebe-se a relevância da profissão de Serviço Social na consolidação dos processos

de aprendizagem em um sentido amplo, a partir da aproximação da família à realidade

educacional, percebendo esta como parte do contexto escolar, contribuindo para o

reconhecimento da escola como um espaço social também seu e que, portanto, é de sua

responsabilidade colaborar para práticas eficientes da Gestão Escolar. Por outro lado, também

é relevante que a escola conheça ou reconheça a realidade familiar e social em que o aluno

está inserido, podendo identificar, inclusive, quais os reais motivos de uma possível

dificuldade de aprendizagem, ou seja, o que a realidade familiar vivenciada por este aluno

pode influenciar diretamente em seu desenvolvimento.

Schneider e Hernandorena (2012) apontam para as definições de Gestão Escolar,

sendo fundamental que esta articule espaços administrativos, pedagógicos, políticos e

financeiros que possam dinamizar as ações educativas, entendendo a escola como um espaço

de socialização da cultura e do saber historicamente produzido.

[...] compreende-se que a Gestão Escolar composta destes espaços configura-

se em um processo que deva ser operacionalizado no viés da participação entre

escola e comunidade, ou seja, um processo que propicie aos alunos, professores,

funcionários e comunidade em geral, serem sujeitos atuantes e integrados na

dinamização do cotidiano escolar (2012, p.21).

Diante do exposto é possível compreender que a interdisciplinaridade é fundamental

no âmbito escolar e que práticas de socialização entre o corpo escolar, comunidade e as

famílias contribui para a educação, ampliação da cidadania e para um processo educacional

de qualidade em que ambos propõem e participam do mesmo:

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A interdisciplinaridade aparece neste contexto como uma das

possibilidades de instrumentalizar os profissionais a interagir em equipe de forma

mais coerente e eficiente, conjugando esforços, ampliando o raio de análise e de

ação, face a uma realidade sempre pronta a nos desafiar e a tornar nossa intervenção

absoleta (AMARO, 1997, p.35).

Este processo pode ser entendido como uma superação do pensamento fragmentado e

disciplinar. Uma prática interdisciplinar pode ser descrita como interações participativas, de

complementação de todas as formas de conhecimento.

Segundo Frigotto (2008) a interdisciplinaridade é vista como uma necessidade e como

um problema. A necessidade é entendida por meio da concepção de que o sujeito precisa

estabelecer relações sociais, pois o homem é um ser de relações, não é isolado, não é uma

“ilha”. E também, porque devemos alargar nossos horizontes enquanto profissionais,

superando a visão fenomênica dos fatos. A mesma também é concebida como um problema,

pois, os limites do próprio ser humano, como saber ouvir, refletir, analisar e reconhecer a

importância do outro para o convívio social, fazem com que tenhamos dificuldade em

estabelecer relações. Todavia esta dificuldade é potenciada pela forma específica que os

homens produzem a vida de forma condida, alienada no interior da sociedade de classe. Desta

forma, o modo de produção capitalista neoliberal faz com que tenhamos uma visão

egocêntrica do mundo, tendo em vista que o nosso conhecimento está atrelado a este modo de

produção vigente.

Acredita-se que mais do que perceber a interdisciplinaridade como um problema,

devemos pensá-la como um desafio, mas um desafio possível de superação:

O lugar do Serviço Social na educação é um específico, como específicos

são todos os campos do saber, mas específico não quer dizer isolado, único,

exclusivo. Nisso constitui-se o desafio da humanidade na contemporaneidade. É

esse desafio que chamamos de INTERDISCIPLINARIDADE (SCHNEIDER;

HERNANDORENA, 2012, p. 42).

Diante do contexto abordado, é possível afirmar que a inserção do Assistente Social

nestes espaços contribuirá para a ampliação e fortalecimento da rede de proteção social,

visando reconhecer as demandas de saúde, de sociabilidade, assistência, habitação, renda,

dentre outras que se fazem presentes no contexto escolar.

Para Martinelli e Rodrigues (2001), o Serviço Social é uma profissão interdisciplinar

por excelência, pois articula diferentes conhecimentos de modo próprio, em um movimento

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crítico entre prática-teoria e teoria-prática. Assim, a interação com outras áreas é primordial

para o fazer profissional.

Uma visão estreita sobre a interdisciplinaridade faz observar que há distorções a

respeito de sua concepção, pois pensar uma prática interdisciplinar não é tomar para si as

atribuições específicas de cada profissão, ao contrário disso, é a interação e contribuição de

um conhecimento para outro conhecimento:

A perspectiva interdisciplinar não fere com a especificidade das profissões e

tampouco seus campos de especialidade. Muito pelo contrário, requer a

originalidade e a diversidade dos conhecimentos que produzem e sistematizam

acerca de determinado objeto, de determinada prática, permitindo a pluralidade de

contribuições para compreensões mais consistentes deste mesmo objeto, desta

mesma prática (MARTINELLI e RODRIGUES, 2001, p. 156-157).

Trabalhar a partir de uma prática interdisciplinar é algo desafiador, na medida em que

sentimos dificuldade em nos relacionarmos e convivermos com a diversidade, com a

complexidade do ser humano, com saber ouvir e refletir a respeito do que o outro tem a dizer.

No entanto, somos seres de relações sociais, e necessitamos alargar os horizontes e superar

esta visão fenomênica, como contribui Frigotto (2008).

Compreender a interdisciplinaridade como algo necessário e também como “postura

profissional”, não parece simples. Sentimos dificuldade em conviver com as diferenças, com

o múltiplo e, certamente, uma postura interdisciplinar esbarrará na necessidade de se rever a

condição ética na própria profissão, buscando um amadurecimento profissional que se reverta

em um novo saber ético e social (MARTINELLI E RODRIGUES, 2001).

A prática interdisciplinar é mais necessária do que desafiadora. Trabalhar em

conjunto, socializando, refletindo e a partir disso pensar ações e/ou estratégias de

enfrentamento, é o exercício de uma nova sociedade, que tenta banir a ideia de autoritarismo

e superioridade de ideias. Marques e Ramalho (apud SÁ, 2010), contribuem com esta

reflexão:

[...] a co-participação causa impacto. É um desafio trabalhar com o novo. É

preciso aprender a trabalhar sem coordenação, mas sim em conjunto, com

planejamento democrático, onde as pessoas trabalhem livres, elaborando um

modelo de responsabilidade, não condicionadas a um chefe, mas ao compromisso

real. É difícil, se principalmente considerarmos o período de autoritarismo em que

vivemos desde 1964. Mas se desejamos bani-lo, precisamos exercitar (mesmo se

houver erros), não reproduzir o autoritarismo por simples desconhecimento de uma

outra prática ou por medo do novo (MARQUES E RAMALHO, 2010, p.70).

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Neste viés é possível perceber a prática interdisciplinar como sendo primordial para o

exercício da profissão de Assistente Social, visto que este trabalha na perspectiva de ampliar

a cidadania, viabilizando os direitos e lutando constantemente para que se alcance uma

sociedade mais justa e igualitária. E isto só é possível se existir uma forma de trabalho que

conte com as diferentes áreas do saber, cada um contribuindo com o seu conhecimento e

ambos conseguindo enfrentar os desafios diários que a realidade social apresenta,

especialmente no âmbito escolar, que como foi abordado, é um espaço possível de

identificação e enfrentamento das mazelas sociais, ou seja, um contexto de real importância

para os processos de trabalho do Assistente Social.

Diante das reflexões, é possível afirmar que a interdisciplinaridade é essencial para a

profissão, devendo ser uma constante na prática profissional do Assistente Social. O

profissional que adota outra forma de exercer a profissão, que não seja a de articulação com

outras áreas do saber acaba por ferir os princípios da profissão e tornando-a fragmentada e

isolada. Assim, compreende-se que a interação com outras áreas é particularmente primordial

para o Serviço Social.

Portanto, a interdisciplinaridade, bem como os processos que norteiam a efetivação da

inclusão social são caracterizadas como desafios contemporâneos para o Serviço Social.

Visto que ambas não devem ser analisadas isoladamente, uma complementa a outra, podendo

dizer que uma prática interdisciplinar é um instrumento técnico necessário para a profissão de

Assistente Social, bem como para que o processo de inclusão social aconteça de forma plena.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Analisar o contexto histórico, bem como, refletir sobre ele, faz-se relevante quando se

busca uma desmistificação de estereótipos que foram criados e estabelecidos ao longo dos

séculos. Este processo permite compreender os preconceitos relacionados às pessoas com

deficiência, em especial, às pessoas com Síndrome de Down.

O processo de inclusão social apresenta desafios, no entanto, como já mencionamos,

as possibilidades se sobressaem. O assistente social encontra neste contexto oportunidades e

formas de trabalhar na perspectiva de viabilizar direitos, e, desta forma, ampliar a cidadania,

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que é o objetivo do fazer profissional, tendo em vista que a inclusão social é direito do

cidadão e não apenas uma conduta a ser adotada pelo fato de existir uma legislação que prevê

obrigatoriedade.

No entanto, como refletimos neste estudo, a sociedade ainda não percebe a inclusão

social desta forma, e, bem como, a pessoa com Síndrome de Down como um sujeito com

potencialidades e capacidade diversas, o qual não pode ser considerado “diferente” no sentido

de inferioridade, simplesmente por ter alguma limitação física e/ou psíquica. E para que isso

seja possível, há necessidade de analisar o contexto histórico para rever e observar alguns

estereótipos construídos historicamente, ver as pessoas com deficiência a partir de suas

possibilidades e não a partir de um aspecto biomédico ou de suas limitações, e, assim, despir-

se de todas as formas de preconceito em relação às mesmas.

Diante disso, é possível perceber que a inclusão social necessita de reflexões amplas

e aprofundadas, tendo em vista que além de nossa atribuição enquanto Assistentes Sociais,

também é responsabilidade da família, do contexto escolar e de toda a sociedade presar pela

inclusão de forma plena e de caráter verdadeiro, e não apenas a partir de uma legislação que

prevê obrigatoriedade de condutas.

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REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Ney Luiz Teixeira de. O Serviço Social na Educação. Revista Inscrita, n.6.

Brasília, 2000.

AMARO, Sarita Terezinha Alves; BARBIANI, Rosangela; COSTA DE OLIVEIRA;

Maristela. Serviço Social na Escola: O encontro da realidade com a educação. Porto

Alegre: Sagra Luzzatto, 1997.

AMORIM, Ricardo. BLANES, Denise. POCHMANN, Marcio. Inclusão Social, uma

Utopia Possível. São Paulo: Editora Cortez, 2006.

ARAÚJO, Malu de. BARCELOS, Sabrina. O Serviço Social nas Escolas: Contribuições

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