pressupostos filosóficos e político-constitucionais do sistema núcleo intersindical de...

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PRESSUPOSTOS FILOSÓFICOS E POLÍTICO-CONSTITUCIONAIS DO SISTEMA NÚCLEO INTERSINDICAL DE CONCILIAÇÃO TRABALHISTA Teoria e práca da razão dialógica e do pensamento complexo na organização do trabalho e na administração da jusça: democracia integral e éca de responsabilidade social

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Page 1: Pressupostos Filosóficos E Político-Constitucionais Do Sistema Núcleo Intersindical De Conciliação Trabalhista

PressuPostos FilosóFicos e Político-constitucionais do sistema núcleo

intersindical de conciliação trabalhista

Teoria e prática da razão dialógica e do pensamento complexo na organização do trabalho

e na administração da justiça: democracia integral e ética de responsabilidade social

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Antônio Gomes de VasconcelosMestre e doutor em Direito Constitucional (UFMG).

Especialista em Direito Público (CUMM). Bacharel em Filosofia (PUC-MG). Professor da Universidade Federal de Minas Gerais. Juiz do Trabalho.

Coordenador do Programa Universitário de Apoio às Relações de Trabalho e à Administração da Justiça da Universidade Federal de Minas Gerais (PRUNART-UFMG).

PressuPostos FilosóFicos e Político-constitucionais do sistema núcleo

intersindical de conciliação trabalhistaTeoria e prática da razão dialógica e do

pensamento complexo na organização do trabalho e na administração da justiça: democracia integral e

ética de responsabilidade social

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EDITORA LTDA.

Rua Jaguaribe, 571 CEP 01224-001 São Paulo, SP — Brasil Fone (11) 2167-1101 www.ltr.com.br

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Índices para catálogo sistemático:

Todos os direitos reservados

Produção Gráfica e Editoração Eletrônica: R. P. TIEZZI x Projeto de Capa: FABIO GIGLIO Impressão: GRÁFICA PAYM

Outubro, 2014

Vasconcelos, Antônio Gomes dePressupostos filosóficos e político-constitucionais do Sistema Núcleo

Intersindical de Conciliação Trabalhista : teoria e prática da razão dialógica e do pensamento... / Antônio Gomes de Vasconcelos. — São Paulo : LTr, 2014.

Bibliografia

1. Conciliação industrial — Brasil 2. Dissídios trabalhistas — Brasil 3. Negociações coletivas — Brasil 4. Relações industriais — Brasil 5. Sindicatos — Brasil I. Título.

14-08140 CDU-34:331.88:331.153(81)

ohlabart od otieriD : siacidnisretni soelcúN : atsihlabart oãçailicnoC : lisarB .134:331.88:331.153(81)

ohlabart od otieriD : atsihlabart oãçailicnoC : siacidnisretni soelcúN : lisarB .234:331.88:331.153(81)

Versão impressa - LTr 5060.7 - ISBN 978-85-361-3098-9Versão digital - LTr 8506.8 - ISBN 978-85-361-3187-0

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Dedicatória

À Eliana, ao Octávio Augusto e ao Thiago Eduardo.

O amor e o carinho inesgotáveis que me dedicam foram a sustentação e o dínamo das energias consumidas neste trabalho.

A necessária solidão da introspeção profunda, por vezes dolorosa, somente é possível

se acompanhada da certeza paradoxal de não estar só.

Às abnegações, renúncias e ausências necessárias, sem quaisquer cobranças, compensam o amor e a gratidão.

Aos meus pais Joaquim Gomes dos Santos (in memoriam) e Elza Pereira de Vasconcelos Santos.

Aos meus irmãos Maria Elza (in memoriam), Edson, Elson, Maria Helena, Carlos Lacerda, Dalva Cristiane e Altamir Eustáquio.

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Homenagens

A Altair Olímpio de Oliveira e Ezequias dos Reis (in memoriam) líderes e dirigentes sindicais, pela ousadia de criar o primeiro Ninter

do país e apontar novos horizontes para o sindicalismo brasileiro.

Ao professor Antônio Álvares da Silva.

Ao professor José Alfredo de Oliveira Baracho (in memoriam).

Ao ministro Orlando Teixeira da Costa — TST (in memoriam).

À Dra. Gilma Gonçalves Xavier.

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Agradecimentos

A Gabriela de Campos Sena, mestranda, coordenadora discente e pesquisadora do Programa Universitário de Apoio às Relações de

Trabalho e à Administração da Justiça (PRUNART-UFMG), pela leitura dos originais e pelas valiosas sugestões.

Ao Fagner e à Izadora, pesquisadores do PRUNART e, respectivamente, estagiária secretária executiva e estagiário assessor de coordenação administrativa do PRUNART-UFMG, pela colaboração

na formatação e adequação das demonstrações estatísticas (gráficos, tabelas e quadros).

À Ivone e ao José Humberto, respectivamente, coordenadora e conciliador do NINTER de Patrocínio/MG, pela presteza com que

disponibilizaram os dados estatísticos da instituição.

Ao Luciano, diretor da Vara de Patrocínio/MG, pela abnegada disposição para o fornecimento dos dados estatísticos indispensáveis

à prova de realidade das hipóteses confirmadas neste trabalho.

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sumário

Lista de sigLas ................................................................................................21

apresentação .................................................................................................23

prefácio .........................................................................................................33

introdução .....................................................................................................39

capítuLo 1 princípios fiLosóficos e poLítico-constitucionais do sistema ninter

1.1. Ninter e democracia ...............................................................................63

1.1.1. A transição paradigmática pressuposta na construção de uma teo- ria doadora de sentido ao princípio de democracia imanente ao sistema Ninter ...............................................................................65

1.1.1.1. A questão metodológica da abordagem da crise sob o enfo-que paradigmático ...............................................................67

1.1.2. Democracia integral .............................................................................71

1.1.3. A participação dos sindicatos nos procedimentos cognitivos de for-mação da opinião e da vontade dos agentes do Poder Público ......74

1.1.4. O locus institucionalizado de interseção entre a autonomia pública e a autonomia coletiva ..................................................................78

1.1.5. Abandono da ficção da personificação do Estado ..........................81

1.1.6. Fundamentos da democracia integral na Constituição brasileira ....86

1.2. Os pressupostos epistemológicos......................................................89

1.2.1. O discurso filosófico ......................................................................91

1.2.2. O discurso científico ......................................................................97

Page 12: Pressupostos Filosóficos E Político-Constitucionais Do Sistema Núcleo Intersindical De Conciliação Trabalhista

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1.2.3. O primeiro pressuposto: a razão é dialógica ................................102

1.2.3.1. A “viragem linguística” .......................................................102

1.2.3.2. Karl-Otto Apel: “somos um diálogo” ...................................105

1.2.3.3. O fundamento biológico.....................................................109

1.2.3.4. O fundamento filosófico .....................................................111

1.2.3.5. A ética da responsabilidade, ação pública e Ninter .............112

1.2.4. O segundo pressuposto: o princípio da complexidade .................117

1.2.5. O Ninter e a concepção construtivo-discursiva do direito .............122

1.2.5.1. A relação recursiva e reciprocamente constitutiva de sentido entre o fato (realidade) e a norma jurídica .........................124

1.3. Pressupostos político-constitucionais .....................................................130

1.3.1. O princípio da “governança” .......................................................132

1.3.1.1. A essencialidade da função emancipatória da democracia ..136

1.3.1.2. A busca do fundamento da “governança” na filosofia da linguagem ..........................................................................138

1.3.1.3. O exercício comunicativo do poder e o princípio da autori- dade ..................................................................................140

1.3.1.4. “Governança” local e o princípio da complexidade .............142

1.3.1.5. Ética de inteligibilidade .......................................................144

1.3.2. O princípio da subsidiariedade ativa .............................................146

1.3.2.1. O Estado democrático subsidiário .......................................151

1.3.2.2. Formas concretas de manifestação do princípio da subsidia- riedade ...............................................................................156

1.3.2.2.1. Subsidiariedade e a resolução dos conflitos .........158

1.4. Governança e subsidiariedade ativa ......................................................160

capítuLo 2 pragmática do princípio de democracia no

sistema ninter: conceitos operacionais

2.1. A concreção do princípio de democracia...............................................162

Page 13: Pressupostos Filosóficos E Político-Constitucionais Do Sistema Núcleo Intersindical De Conciliação Trabalhista

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2.2. O exercício dialógico do Poder Público e da autonomia coletiva na cons- trução social da realidade .......................................................................164

2.2.1. A insuficiência da concepção “neocorporativista” ........................166

2.2.2. O sentido do “diálogo social” e da “concertação social” na pers- pectiva da democracia integral ....................................................167

2.2.2.1. O “diálogo social” ..............................................................170

2.2.2.2. A concertação social e a coordenação das ações das institui-ções do trabalho ................................................................174

2.2.3. Os administrados e os jurisdicionados são sujeitos, e não objeto da ação pública ................................................................................175

2.3. A prática da governança e a reconstrução do princípio do tripartismo: o acoplamento estrutural das autonomias pública e coletiva ......................177

2.3.1. Tripartismo e governança ............................................................179

2.3.1.1. Tripartismo de base local ....................................................180

2.3.1.2. Conselho Tripartite do Ninter: locus da governança ............182

2.4. Governança e acesso à justiça “coexistencial” .......................................187

2.4.1. Os prejuízos sociais da contraposição maniqueísta entre os meios judiciais e não judiciais de resolução dos conflitos .......................190

2.4.1.1. Racionalização “fabuladora” da conciliação judicial.............194

2.4.1.2. A mensagem contraditória do “movimento nacional pela conciliação” (endoprocessual) ............................................196

2.4.1.3. Crítica ao “reformismo conservacionista” ............................202

2.4.2. O problema cultural .....................................................................205

2.4.2.1. As técnicas não judiciais de resolução dos conflitos e o prin- cípio da proteção ao trabalhador .......................................207

2.4.2.2. A intercomplementaridade e a coexistencialidade das auto- nomias pública e coletiva ...................................................214

2.4.2.3. As comissões de conciliação prévia são um estágio prepara- tório da criação do Ninter ..................................................215

2.5. Conceitos operacionais do princípio de democracia imanente ao sistema Ninter .....................................................................................................216

2.5.1. A ação pública comunicativa .......................................................218

Page 14: Pressupostos Filosóficos E Político-Constitucionais Do Sistema Núcleo Intersindical De Conciliação Trabalhista

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2.5.1.1. Ação pública comunicativa cognitiva e suasória e ação pú- blica coercitiva ....................................................................225

2.5.2. Ação coletiva comunicativa ..........................................................226

2.5.3. Programas interinstitucionais de especial interesse público ..........228

2.5.4. Regime trabalhista especial temporário ou “permanente” ...........229

2.5.5. A negociação coletiva ..................................................................234

2.5.5.1. Negociações coletivas “concertadas”? ................................237

2.5.5.2. Um breve esforço hermenêutico em prol da autonomia coletiva ..............................................................................240

2.6. Agentes do Poder Público de carreira permanente (ética de responsa- bilidade) ..................................................................................................241

2.6.1. Aspectos metajurídicos da transformação paradigmática na ação pública ........................................................................................242

2.6.2. Os agentes do Poder Público e o problema do diálogo transpara- digmático ....................................................................................245

2.6.3. Agentes públicos de carreira permanente e responsabilidade social 246

2.7. O ativismo judicial moderado e prudente: entre o contencionismo e o ativismo radical .......................................................................................251

2.7.1. O diálogo de que necessita a sociedade ainda não é o diálogo que a Justiça se dispõe a oferecer ......................................................254

2.7.2. Jurisdição e “governança” ...........................................................256

2.7.2.1. Um ativismo judicial moderado e prudente .........................258

2.7.2.2. Jurisdição comunicativa ......................................................261

2.7.2.2.1. Limites da livre convicção: jurisdição inconstitu- cional ..................................................................261

2.7.2.2.2. A jurisdição comunicativa como expressão do prin- cípio de democracia integral na administração da justiça .................................................................263

2.7.3. O Conselho de Administração de Justiça .....................................266

2.8. O sistema Ninter e a reforma trabalhista ..............................................268

2.8.1. As premissas da democratização adotadas na Reforma ...............270

Page 15: Pressupostos Filosóficos E Político-Constitucionais Do Sistema Núcleo Intersindical De Conciliação Trabalhista

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2.8.2. Ninter: com a Reforma e além da Reforma ..................................271

2.8.2.1. Justiça social .......................................................................272

2.8.2.2. Tripartismo e diálogo social ................................................274

2.8.2.3. Concepção sistêmica ..........................................................276

2.8.2.4. A negociação coletiva .........................................................277

2.8.2.5. Resolução dos conflitos ......................................................278

capituLo 3 resuLtados concretos da experiência transformadora do núcLeo

intersindicaL de conciLiação trabaLhista de patrocínio (1994-2013)

3.1. A pesquisa de campo do “Programa Gestão Pública e Cidadania” (FGV/SP) ...............................................................................................285

3.2. Desenvolvimento da negociação coletiva ..............................................290

3.2.1. Alteração performativa da negociação e das normas coletivas: as-pectos qualitativos e quantitativos ...............................................291

3.2.1.1. Atos normativos internos com força de norma coletiva ......296

3.2.2. Regime trabalhista especial ..........................................................298

3.2.3. Procedimento voluntário comprobatório de obrigação trabalhista rural ............................................................................................300

3.2.4. O “Programa de Prevenção de Riscos Ambientais da Cafeicultura de Patrocínio” e o “Projeto Piloto” ...............................................302

3.2.4.1. Programa de prevenção de riscos ambientais da cafeicultura de Patrocínio ......................................................................302

3.2.4.2. O “Projeto Piloto”: programa de fomento do PPRA coletivo ..305

3.3. Impactos da ação do Ninter-Patrocínio no âmbito da prevenção e da resolução dos conflitos (1994-2013) .....................................................320

3.3.1. Levantamento estatístico e análise de dados ...............................321

3.3.1.1. A criação do Ninter (1994): marco temporal inicial .............321

3.3.1.2. A tradução estatística do grau de satisfação do usuário .....324

3.3.1.3. A tradução estatística da legitimação da instituição ............325

Page 16: Pressupostos Filosóficos E Político-Constitucionais Do Sistema Núcleo Intersindical De Conciliação Trabalhista

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3.3.1.4. A “governança” é condição de possibilidade do sucesso das soluções não judiciais .........................................................326

3.3.1.5. A ampliação do acesso à justiça .........................................327

3.3.1.6. A drástica redução dos processos judiciais ..........................329

3.3.1.7. A relevância do caráter institucional do Ninter ....................332

3.3.1.8. A celeridade e a qualidade da jurisdição com critérios de le- gitimação social ..................................................................333

3.3.2. Crítica aos argumentos jurídico e cultural que alimentam a má vontade em relação aos meios não judiciais de resolução de con- flitos ............................................................................................333

3.4. A priorização da efetividade dos direitos sociais no Programa de Certifi- cação do Café do Cerrado, em andamento na região de Patrocínio/MG .339

3.5. Outros resultados incomensuráveis a serem estudados .........................345

3.6. O Sistema Ninter-Cenear (SNC) e o Programa Universitário de Apoio às Relações de Trabalho ..............................................................................346

3.6.1. O anteprojeto de Lei do Sistema Ninter-Cenear ...........................350

3.6.2. O “Programa Universitário de Apoio às Relações do Trabalho — Prunart”: a contribuição da Universidade para a consolidação do Sistema Ninter-Cenear .................................................................351

3.6.3. O Programa Universitário de Apoio às Relações do Trabalho do do Centro Universitário do Triângulo: o Prunart-Unit ...................354

3.6.4. O Programa Universitário de Apoio às Relações de Trabalho e à Administração da Justiça da Universidade Federal de Minas Gerais: Prunart-UFMG .............................................................................356

considerações finais .....................................................................................365

Epistemologia e democracia ..................................................................365

Razão (dialógica) e realidade (complexa) ...............................................374

O sistema Núcleos Intersindicais de Conciliação Trabalhista democratiza a organização do trabalho ...........................................................378

Por um ativismo judicial moderado e prudente ......................................389

referências ...................................................................................................395

gLossário .....................................................................................................409

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anexos

Anexo A — Ato constitutivo do conselho de administração de justiça da Vara do Trabalho de Araguari-MG ..................................................................427

Anexo B — Ato constitutivo do conselho de administração de justiça da 5ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte-MG .................................................430

Anexo C — Estatuto Básico do Núcleo Intersindical de Conciliação Trabalhista ...432

Anexo D — Convenção Coletiva de Trabalho Constitutiva do Núcleo Intersin- dical de Conciliação Trabalhista de [...] ...................................................455

Anexo E — Ciclo de iniciação científica do Programa Universitário de Apoio às Relações de Trabalho e à Administração da Justiça — Prunart-UFMG .......458

Anexo F — Conclusões do I Encontro de Patrocínio para Modernização das Relações de Trabalho ..............................................................................459

Lista de figuras

Figura 1 — A “galeria dos quadros”, de M. Escher ........................................84

Figura 2 — Lavoura de café, região de Patrocínio/MG ..................................309

Figura 3 — Colheita mecanizada em lavoura de café, região de Patrocínio/MG ......310

Figura 4 — Condições atuais de segurança no trabalho em propriedade cafei-cultora, região de Patrocínio/MG ............................................................311

Figura 5 — Condições atuais de alojamento de trabalhadores em propriedade cafeicultora, região de Patrocínio/MG ....................................................... 312

Figura 6 — Condições atuais de alojamento de trabalhadores em propriedade cafeicultora, região de Patrocínio/MG .....................................................313

Figura 7 — Cultivo de hortaliças para complementação alimentar dos traba- lhadores próximo ao alojamento em propriedade cafeicultora, região de Patrocínio/MG ........................................................................................314

Figura 8 — Amostra de unidade de alojamento em propriedade cafeicultora, região de Patrocínio/MG .........................................................................315

Figura 9 — Amostra de dormitório de alojamento rural em propriedade cafei-cultora, região de Patrocínio/MG ............................................................316

Figura 10 — Amostra de instalação sanitária de alojamento rural em proprie- dade cafeicultora, região de Patrocínio/MG ............................................317

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Figura 11 — Capela em alojamento rural de propriedade cafeicultora, região de Patrocínio/MG ...................................................................................318

Figura 12 — Capela em alojamento rural de propriedade cafeicultora, região de Patrocínio/MG ...................................................................................319

Lista de tabeLas

Tabela 1 — Evolução quantitativa das normas coletivas rurais a partir da cria- ção do Ninter-Patrocínio/MG ..................................................................291

Tabela 2 — Ação fiscal do Grupo IV — Delegacia Regional do Trabalho de Mi-nas Gerais ...............................................................................................308

Tabela 3 — Média mensal de processos na Vara de Patrocínio em 1994 e 2013 .......................................................................................................333

Lista de Quadros

Quadro 1 — Amostragem intencional da evolução qualitativa das CCTs cele- bradas entre o STRP e SRP no período de 1994-2013 .............................292

Quadro 2 (ANEXO E) — Ciclo de iniciação científica do Programa Universitá- rio de Apoio às Relações de Trabalho — Prunart-UFMG ...........................458

Lista de gráficos

Gráfico 1 — Conciliações nas Varas (1980-2005) ..........................................197

Gráfico 1-A — Conciliações nas Varas. Total no país: 2013 ..........................198

Gráfico 2 — Estatística geral anual do número de demandas rurais ajuizadas na Vara do Trabalho de Patrocínio no período de 1991 a 2013 ..............322

Gráfico 3 — Movimento geral da Vara do Trabalho de Patrocínio (1994-2013) com discriminação de demandas rurais ...................................................323

Gráfico 4 — Movimento anual da Vara do Trabalho de Patrocínio (1994-2013) com discriminação de demandas rurais ...................................................323

Gráfico 5 — Estatística geral do Ninter-Patrocínio (1994 a 2013) ..................325

Gráfico 6 — Estatística anual do Ninter-Patrocínio (1994 a 2013) .................327

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Gráfico 7 — Estatística comparativa do movimento geral e específico (deman- das rurais) da Vara do Trabalho de Patrocínio e do Ninter-Patrocínio (1994-2013) ......................................................................................................328

Gráfico 8 — Estatística comparativa do movimento anual geral e específico (demandas rurais) da Vara do Trabalho de Patrocínio e do Ninter-Patrocí- nio 1994-2013) .......................................................................................329

Gráfico 9 — Movimento médio anual de pendências rurais da Vara do Traba- lho e do Ninter-Patrocínio (1995-2013) ...................................................330

Gráfico 10 — Movimento geral da Vara do Trabalho (demandas rurais) e do Ninter 1994-2013 ...................................................................................331

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lista de siglas

ACARPA — Associação dos Cafeicultores da Região de Patrocínio

ACC — AçãoColetivaComunicativa

ADESA — AgênciadeDesenvolvimentoEconômicoeSocialdeAraguari

AI — Auto de Infração

AINS — Auto de Inspeção

ANI — AtonormativointernodoConselhoTripartitedoNúcleoIntersin- dicaldeConciliaçãoTrabalhista

APC — AçãoPúblicaComunicativa

APCP — AgentesPúblicosdeCarreiraPermanente

CAJ — ConselhodeAdministraçãodeJustiça

CCP — ComissãodeConciliaçãoPrévia

CCT — ConvençãoColetivadeTrabalho

CLT — ConsolidaçãodasLeisdoTrabalho

IES — InstituiçãodeEnsinoSuperior

JC — JurisdiçãoComunicativa

JCJ — Junta de Conciliação e Julgamento

NCCP — NegociaçãoColetivaConcertadaePermanente

Ninter — NúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhista

PRINESP — ProgramasInterinstitucionaisdeEspecialInteressePúblico,Social eColetivo

Prunart — UFMGProgramaUniversitáriodeApoioàsRelaçõesdeTrabalho da UFMG

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RO — RecursoOrdinário

RTE — RegimeTrabalhistaEspecial

SIC-Ninter — Seção Intersindical deConciliaçãodoNúcleo Intersindical de ConciliaçãoTrabalhista

SRP — Sindicato Rural de Patrocino/MG

STRP — SindicatodosTrabalhadoresRuraisdePatrocínio/MG

TMAP — TriânguloMineiroeAltoParanaíba

Page 23: Pressupostos Filosóficos E Político-Constitucionais Do Sistema Núcleo Intersindical De Conciliação Trabalhista

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aPresentação

Avidaprofissional,osideaiseaatividadeacadêmicaentrecruzaram-senoprojetodevidadoautor,eestetrabalhoéofrutodainteraçãodestasmúltiplasdimensões.

Apresenteobraépartedeumprojetomaisamploquesecomplementa,indispensavelmente,comoutrapublicaçãoquelheécontemporânea,deautoriadestemesmoautor,intituladaO Sistema Núcleo Intersindical de Conciliação Tra-balhista — Do fato social ao instituto jurídico: uma transição neoparadigmática do modelo de organização do trabalho e da administração da justiça.

Ambasencerram,depoisdeduasdécadas,aparticipaçãodoautornoproces-sodecriação(1994)econsolidaçãodainstituiçãosocialeoinstitutojurídicoqueasintitula.Responsávelpelaconcepçãoeelaboraçãodasteorias e fundamentos jurídicosquelhedãosustentação,oautorfoioproponentedaemendalegislativa,acolhidapeloparlamento,queacresceuaoprojetodaLein.9.958/2000oart.625-H,paradistinguirdasComissõesdeConciliaçãoPréviaoinstitutoqueserátratadonestaobra.Alémdisso,porforçadoreferidodispositivo,oSistema(1) Ninter foi recepcionadopelaordemjurídicabrasileira,comascaracterísticasebalizamentosestabelecidosnomanualbásicoelaboradopeloautoraconvitedoMinistériodoTrabalhoeEmprego, responsávelpor suaedição (MTE.Núcleo intersindical de conciliação trabalhista — manualbásico. Brasília:MTE,SRT,2000).

Asduasobrassecompletam.Porisso,esta“apresentação”ésoleiradeambas.

Naobracitadaacima,procede-seàcríticadomodeloderacionalidade—ométododaciênciamodernaeafilosofiadaconsciência,quepresideaciênciaeapráticajurídicas,aorganizaçãodotrabalho,oscódigosdecondutaeomodus operandi dasinstituiçõesdotrabalhoedaadministraçãodajustiça.Busca-seainda

(1) A caracterização do instituto como sistema somente se coaduna com a ideia de sistema aberto capaz de promover a confluência do conjunto dos subsistemas (públicos ou coletivos) que atuam no mundo do trabalho por meio das técnicas do diálogo e da concertação social.

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analisarasconsequênciassociolaboraisdaatuaçãodasinstituiçõesdotrabalhoà luzdasperspectivasfilosóficaepolítico-constitucionais inspiradasnaquelesparadigmas.Nestemister, focalizam-se contextosde realidade locais, em sua singularidadeeespecificidadeirrepetíveis,alémdesituações-problemaidentifi-cadasnestescenáriosparaalimentaraconstruçãodateoriaapartirdeumarazãofilosófica, jurídicaesociologicamentesituada.Taiscontextosservemaoquesedesigna por evocação epistêmica da realidadeparaincluí-lacomoelementoconsti-tutivodoconhecimento,buscandoevitarosriscosdaalienaçãoracional-cientificista,daéticadeintençõesconducentesàcisãoentreleierealidadeeaumprofundodéficitdeefetividadedosdireitosedaatuaçãodasinstituiçõesencarregadasdesuaaplicação,bemcomododesprezopelasconsequênciassociaisdaspráticasjurídico-institucionais.Aobracumpre,afinal,seuobjetivoaoexplicitaroscontextosoriginárioseodesenvolvimentodaexperiênciamatricial,prototípica,doSistemaNinter,ainteraçãodialógicaentreoPoderJudiciáriotrabalhistacomasociedade,napráticadeumativismomoderadoeprudente,bemcomodefiniroscontornosdesuaidentidadeinstitucionaleconfiguraroselementosdogmático-jurídicosquelhedãosustentação.

Nesta,constrói-seateoriapolítico-constitucionalquefundamentanarazãodialógicaenoprincípiodacomplexidade ospressupostosepistemológicosdoprincípiodedemocraciaintegralimanenteaoSistemaNinter,doqualdecorremosprincípiosdegovernançaedesubsidiariedadeativaaplicáveisàorganizaçãodotrabalhoeàadministraçãodajustiça,bemcomoosconceitosoperacionaisquedãosuporteàssuaspráticas institucionais—tripartismodebaselocal,diálogosocial,concertaçãosocial,acessoàjustiça“coexistencial”,açãopúblicacomuni-cativacognitivaesuasória, jurisdiçãocomunicativa,açãocoletivacomunicativa,negociaçãocoletivaconcertada.Nocampodaadministraçãodajustiça,daexpe-riênciavividapeloautor,noexercíciodamagistratura,exsurge,naperspectivadoEstadoDemocráticodeDireitoedoprojetodesociedadeinscritonaConstituiçãode1988.Compreende-sequeaparticipaçãodoPoderJudiciárionodiálogosocialcomobjetivodediagnosticarascausasdosconflitossociaisedosgargalosdaad-ministraçãodajustiça,bemcomonabuscadesoluçõesparaaquestãojudiciáriaedamelhoriadaprestaçãojurisdicional,émedidacondizentecomosfundamentosconstitucionaisdoEstadobrasileiro.Nessesentidoéqueodiálogoeainteraçãoentreosórgãosdejustiçaeossindicatosprotagonistas do Sistema Ninter é ca-pítulorelevantedestetrabalho.Olevantamentoeadescriçãodosresultadosdaexperiência transformadoradoNúcleo IntersindicaldeConciliaçãoTrabalhistadePatrocínio(MG)émaisqueaconclusãodoestudodecasoquepermeia,nasduasobras,aconstruçãodateoriadoSistema,poisimpõe-se,comomedidadecoerênciacomaspremissasepistemológicasadotadas,interaçãoreciprocamenteconstitutivaentreteoriaerealidade,conhecimentoeação.O“estudodecaso”dessaexperiência,alémdeoutrosquetraduzemsituações-problema,prestigiaa

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práticasemdeixardeapontarproblemasgeraisesistêmicosdaquestãotrabalhistanacional,alémdeilustraraspectosdacrisedomodeloderacionalidadequelheésubjacente.Poroutrolado,oestudodosresultadosatestaalegitimaçãodateoriaemfacedosresultadospositivosalcançadoscomaatuaçãodainstituiçãoeasuacoerênciacomoprojetoconstitucionaldasociedadebrasileira.

Ateoriavemdepoisdaexperiência,numatrajetóriarecursivaereciproca-menteconstitutivacomarealidade.Domesmomodoseestabeleceointercâmbioentre conhecimentoeação, acessíveis eerigidosdialogicamente.A interaçãocomarealidadedecorredaspremissasepistemológicasaceitasesetransformaemelementoconstitutivodoconhecimentoedaação,nãoseconfundindo,porisso,comumaciênciamilitanteaserviçodeumaideologia,emboramantenhaocompromissocomoprojetoconstitucionaldasociedadebrasileira,umavezquenãoháciêncianeutra.

Arelaçãointercomplementardasduasobrasrepousa,ainda,noplanodospressupostos,jáqueambasprofessamaexistênciadeumacorrelaçãoindissociávelentreepistemologiaedemocracia;estacompreendidacomorealizaçãodoprincípiodaigualdadeedaliberdade,demodoaassegurar,alémdaefetividadedosdireitossociaisfundamentais,odireitofundamentalàparticipação,inclusivenosprocessosdeconstruçãodoconhecimentoqueservedebaseàaçãopúblicaeàaçãocoletiva.

Asrelaçõessociais,econômicaselaboraistornam-secadavezmaiscomple-xasedinâmicas,emdecorrênciadosavançostecnológicosemtodosossetoresdaatividadehumanaepordependeremdefatorescadavezmaisinternacionalizados(“globalizados”).Naintrincadateiadeproblemasgeradosportantastransforma-ções,surgeoproblemadaracionalidadedaorganizaçãosocial,quepõeemxequeospressupostosdoconhecimentoedaação.

Considera-sequeaquestãodoconhecimentoinstala-senaorigemdacrisederacionalidadequeatingeatodosossetoresdaatividadehumanaequeopro-blemadagarantiadaefetividadedosdireitossociaisquedesafiaasinstituiçõesdotrabalhoestárelacionadocomaquestãoepistemológica(2).

Acrisederacionalidadedaciênciaedafilosofiamodernatemreflexospro-fundosnateoriaenapráticajurídicaqueestãonabasedaaçãopúblicanasuatríplicedimensão:regulação,administraçãoejurisdição.

Porisso,acisãoentreodireitoearealidadenãopodeserresolvidasemumretrocessoàquestãoepistemológica.Comefeito,aracionalidadeclássicaqueorien-taateoria,apráticajurídicaeaaçãodasinstituiçõesdoPoderPúblicoparecenãomaisatenderaonovoparadigmadoEstadoDemocráticodeDireitoeaoprojeto

(2) Essa constatação levou Edgar Morin a reconhecer que o problema da sociedade contemporânea é o problema do conhecimento.

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desociedadeinscritonaConstituiçãoFederal,oqueconstituiumdoselementosdadenominadacrisedodireitoedasinstituições.

Admite-secomoalternativaparaoenfrentamentodessacrisederacionalidadeademocratizaçãoradicaldosistemaderelaçõesdotrabalhoedaadministraçãodajustiça,doexercíciodoPoderPúblicoemtodasasesferasdesuainterfacediretacomasrealidadeslocais/setoriais,bemcomodapráticajurídicaedosprocedimentoscognoscitivosadotadospelosagentespúblicosresponsáveisportaisatividades.

Aideiadedemocratizaçãoresultantedaconjugaçãoentreaepistemologiaeademocracia implicouodesenvolvimentodas teoriasda “governança”edasubsidiariedadeativa,harmônicasaos fundamentos constitucionaisdoEstadobrasileiro.Arelaçãoentrepressupostosepistemológicosadotadoseapragmáticapassaasermediadapelastécnicasdo“diálogosocial”eda“concertaçãosocial”,própriasà“governança”.

Emtermosconcretos,ademocratizaçãointegralquedásentidoaosistemaNinterimplica:a)prioritariamente,apersecuçãodaefetividadedalegislaçãotra-balhistacomocondiçãodelegitimaçãodosistemaderelaçõesdetrabalhoedesuasinstituições;b)aparticipaçãodossindicatosnoexercíciodoPoderPúblico,emsuasdiversasinstâncias,especialmenteemrelaçãoaoconhecimentodoscon-textosderealidadeemqueincideaaçãopública(princípiodacomplexidade),enosprocedimentoscognitivosrelativosàescolhadanorma,doseusentidoedomodomaisadequadodesuaaplicaçãonosreferidoscontextosderealidades(prin-cípiodarazãodialógica);c)aparticipaçãodossindicatosnagestãolocal/setorialdaorganizaçãodotrabalhoedaadministraçãodajustiça;d)aimplementaçãodeinstrumentosautônomosdeprevençãoederesoluçãodosconflitos,numarelaçãodecoexistencialidade,intercomplementaridadeecoerênciacomosmeiosoficiais;ee)aampliaçãodoexercíciodaautonomiacoletivaedasfunçõesdanegociaçãocoletiva,especialmentenoquedizrespeitoàgestão intercategorialdosistemalocal/setorialderelaçõesdotrabalho.

Seosprincípiosdarazãodialógicaedacomplexidadeconduzemaodiálogoeàconcertaçãosocialnoplanodaação,implicamtambémainclusãodarealida-denosprocessosdeproduçãodoconhecimento,aqual,porsuavez,aindaqueinacessível emestadopuro, somentepode ser compreendidaemsuamáximapossibilidadedeapreensãomedianteaconstruçãodediagnósticosmultifacetários,erigidosdialogicamente,comaparticipaçãodetodososenvolvidos.Trata-sedabuscadeumavisãosistêmicadoscontextosderealidadedecorrente da interação dialógicaqueenvolvaoconjuntodasinstituiçõesdotrabalhoepossaguiarsuasaçõesinternaseexternas.

Issosignifica,anteasnecessáriasescolhasepistemológicasqueresidemnabasedetodotrabalhocientífico,queointercâmbioentreateoriaeapráticanãose

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prendeaumaconcepçãoracionalistadoconhecimento(filosofiadaconsciência).Considera-sequearealidadeseconstituinalinguagem,reconhecendo-seaomes-motempoqueacomplexidadedorealrelativizaapossibilidadedoconhecimentoabsolutodoobjetoconhecido.Domesmomodo,oconhecimentonãoémaisumatodeconsciênciaindividual,masintersubjetivo,porquea“razão”eaconsciên-ciatambémseconstituemnaintersubjetividade.Osujeito(razão)earealidade (objeto)sedesvelamnalinguagemesão,epistemologicamente,interdependentes.Daíainsuficiênciadoscritériospopperiano(falseabilidade)ekuhniano(consensodacomunidadecientífica)devalidaçãodoconhecimento.

Opressupostoepistemológicoaquidescritoimplicaoafastamentodométodoreducionistaefragmentadorquefundaoconhecimentonaseparação/disjunçãodoobjetopormeiodecortesepistemológicosimpostospelaespecializaçãoprópriaàracionalidadedaciênciamoderna.Transcendeocientificismometódiconamedidaemqueesteprocedeaoenquadramentoarbitráriodoobjetodoconhecimentonummodeloderacionalidadeaoqualseatribuiacondiçãode“absoluto”segundopreferênciaseescolhas, individuaise/ouminoritárias (antidemocráticas),entrealternativasmultiversáteis.Aomesmo tempo reconhecea impossibilidadedeacessoaorealpuroecomplexoemsuaplenitude,porqueesteserevelasempremultiformeeemcontextoscujaapreensãoésemprerelativaaomododever,àsvivênciaseàspremissasdoobservador.

O“conhecimentocomplexo”realiza-seapartirdeumaconcepçãosistêmicadoseuobjeto(sistema aberto)quepassaaserperseguidonamaioramplitudepossível,aindaquecontingentee transitória.Nãotemfronteirasdelimitadasapriori, porqueoobjeto,nãosegmentado,precisasercontextualizadoeexploradoemtodasassuasdimensõesrelevantesparaasoluçãodosproblemasreaisouparaoalcancedosobjetivospreviamentedefinidos.Semembargo,nocampojurídico,tantonaformulaçãoquantonaaplicaçãododireito,taisobjetivosjáestãodefinidosnaConstituiçãoquereassumesuafunçãodirigente.Semprecontingenteecon-textualizado,esseconhecimentoseaproximadeoutroscomiguaislimitaçõesesereconstróidialogicamente,levandoemcontaaperspectivado“outro”,permitindoumaconcepçãosistêmicadoobjetodaqualnãose tornaestacionário,porqueelasomenteécompatívelcomaideiadesistemaaberto,capazdeacompanharodinamismodavida.

Emcoerência comestaepistemologiaprocura-secompreenderobjetodoconhecimentoemsuamáximainteireza.Nolugardelimitar,ampliahorizontes;nolugardecentralizaropensamentoemaxiomasextraídosdarazãoindividual--solipsistaeencadearproposições lógicasdirecionadasaumaconclusão,buscaapresentaroproblemapropostoemsuaconexãocomarealidadeconcreta.

Poroutro lado,a transiçãoparadigmática impõeumesforço incomumdereconstruçãodopensamentoà luzdaepistemologiaemergente,oque torna

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movediçotodoo“terreno”emqueseassentaaatividadeintelectual.Todososconceitosdevemserpostos, enão simplesmentepressupostos.Alémdisso,oprincípiodacomplexidadeimplicaoesforçoparaapercepçãodotodo,emsuapermanentearticulaçãocomaspartes,evice-versa.Emsuma,acontextualizaçãodoobjetotorna-seimprescindível.

Adianta-sequeaaplicaçãodesseparadigmaafetanãosóométodo,massobretudooresultadodapesquisa,umavezqueademocratizaçãosomentesecompreendepelaaceitaçãododiálogosocialcomotécnicadelegitimaçãodaaçãopúblicaedaaçãocoletiva,emdecorrênciadessaestreitaconexãoentredemocra-ciaeepistemologia.Considera-sequeoprincípiodedemocraciaintegral,paraserconcretizado,precisaoperarnoprópriomomentodaproduçãodoconhecimentoemquesebaseiaoexercíciodoPoderPúblico.Emespecialoconhecimentoquealimentaapráticajurídica,aaçãopúblicaeaaçãocoletiva,cujafontelegitimadorapassaaserodiálogosocial.

Admite-sequesomenteopensamentocomplexopermitecompreenderqueoconjuntodasaçõesisoladasedescoordenadasdasinstituiçõesdotrabalhopodegerarresíduosdeinjustiçaantagônicosaosseuspropósitoseaosprincípiosconsti-tucionaisdejustiça,comosedenotado“estudodecaso”realizadoemO sistema Núcleo Intersindical de Conciliação Trabalhista — Do fato social ao instituto jurídi-co: uma transição neoparadigmática do modelo de organização do trabalho e da administração da justiça (Capítulo3).Poressarazão,osistemaNinterapresenta-setambémcomopontodeinteraçãoedecoordenaçãodasaçõespromovidaspelasinstituiçõesdotrabalho(públicasecoletivas)nasquaissepassamaconsideraroscontextosespecíficosdasrealidadeslocais/setoriaisaquesedirigem.

Portodosessesmotivos,emconsideraçãoaosparadigmasanunciados,algunsaspectosteorético-praxiológicosdaabordagemescapamàsexigênciasmetódicasdospressupostosderacionalidadedaciênciaclássicaedafilosofiadaconsciência,porquesãoportadoresdeumdéficitdelegitimidadeemrelaçãoaumaéticadein-teligibilidadedoreal,consideradoemsuacomplexidadeesingularidadeirrepetíveis.

Anteoriscodaredução,correu-seoriscodaextensão,consideradomenor;umavezqueaindapersistiráoriscodaresistênciaaodiálogotransparadigmático,conscienteounão.PorissoThomasKuhnalertaparaaimpossibilidadedodiálogoquandoaapreensãodeummesmoobjeto(fatodarealidadeouteoria)édirigidaporparadigmasdistintossemquesedisponhaaumdiálogoesemqueseopereuma“tradução”dospadrõesutilizados.Aúnicaalternativaviávelentreinterlocutoresquenãosecompreendemmutuamenteéoreconhecimentodequepertencemadiferentescomunidadesdelinguagem(paradigmas)paratornarem-se“traduto-res”,transpondoparaapróprialinguagemateoriadooutroesuasconsequências.

AsobrasqueaquiseapresentamsãofrutodoesforçodefundamentaçãoeelucidaçãodoSistemaNinter—comonova instituiçãodotrabalho introduzida

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naordem jurídicabrasileira.E,domesmomodo,demonstrar suaaptidãoparapromoverademocratizaçãoeamelhoriadasrelaçõesindividuaisecoletivasdotrabalhoedaadministraçãodajustiça,tendoporquadrodereferênciaosresultadoseaimportânciasocialadquiridapelainstituiçãomatricialdoSistema.Resultam,porém,deproduçãoindividualsolipsistadoautore,porisso,sãoresultadodeumaabstraçãodecorrentedeumaobservaçãodesegundograu(Maturana),materia-lizadaemtesededoutoradodefendidanaUniversidadeFederaldeMinasGerais.Recobra-se,contudo,acoerênciacomosprincípiosdialógicoedacomplexidadenomomentoemqueseinserenodebatepúblicoaomesmotempoemquepassaasermóbiledaação,comonocasodoProgramaUniversitáriodeApoioàsRelaçõesdeTrabalhodaUniversidadeFederaldeMinasGerais,que,medianteatividadesdeextensãouniversitáriadecorrentesdacelebraçãode termosdecooperaçãoacadêmica,emprestaapoioaossindicatosprofissionaiseeconômicosdecididospelacriaçãodoSistemaNinternorespectivosetordeatividade.

Aofimeaocabo,procede-seaumaanáliseprofundadoscontextosdecria-ção,dosfundamentos,daspráticasedosresultadosdaexperiênciaprototípicaeorigináriadesseinstitutojurídicorecentementeintroduzidonaorganizaçãodotrabalhoenaordemjurídica,origináriodotensionamentoentreabuscadaefetivi-dadedosdireitossociaiseainadequaçãodenormasinstrumentais(instrumentais,enãoaquelasconstitutivasdosdireitossociais)aoscontextosderealidade,emsuasingularidadeecomplexidadeirrepetíveis.

Poressa razão, asobrasque se trazema lumecompreendemumabaseempíricanosentido:a)deumaamplaexposiçãocrítico-descritivadoselementosderealidade,extraídosdosinúmerosdadoslevantados,atémesmodoestudodecaso,naabordagemdacrisederacionalidadedosistemaderelaçõesdetrabalho;eb)doestudodoscontextosdesurgimento,dosaspectoshistóricosesociológicos,além de outros fatores determinantes da criaçãodoNúcleoIntersindicaldeCon-ciliaçãoTrabalhista(Patrocínio/MG),bemcomodosresultadosmaissignificativosdaatuaçãodessaexperiênciaprototípica.Taisresultadospontuam-senoscamposdamelhoriadascondiçõesdetrabalho,danegociaçãocoletiva,dagestãodaad-ministraçãodasrelaçõesdetrabalhoedaadministraçãodajustiça(incluindo-seos meios judiciais e não judiciais de resolução dos conflitos, tomando-secomoreferência o interregno de 1994 a 2012.

Admitindoaexistênciadeumainterseçãoinelutávelentreademocraciaeaepistemologia,propugna-se,deresto,porumacompreensãoneoparadigmáticadaprimeira, sustentadana teoriadodiscursoena teoriada complexidade.Aquestãodospressupostosepistemológicosdasaçõespúblicaecoletivaprecedeeaomesmotemporevela-setãoimportanteparaademocratizaçãodosistemaderelaçõesdetrabalhoquantoadoaparelhamentodasinstituições,etraz,comoconsequência,aindiscutívelnecessidadedochamamentodossindicatosauma

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participaçãomaisativanagestãodasrelaçõesdetrabalhoedaadministraçãodajustiça,noenfrentamentodacrisedodéficitdelegitimidadedasinstituiçõesedeefetividadedosdireitossociais.

Nessaperspectiva, a açãopública compreende toda conduta tendenteà interpretaçãoeàaplicaçãododireitopelasinstituiçõesdoPoderPúblico,agestãodaorganizaçãodotrabalhoeaadministraçãodajustiça,concebidassobopara-digma da democracia integral.

Aaçãocoletivaorienta-seporumacompreensãomaisampladoprincípiodaautonomia,demodoapotencializaraconcreçãodoprincípiodadignidadehu-manaeodacidadania,materializadosnabuscadaautodeterminaçãoindividualecoletivadospartícipesdarelaçãodetrabalhoedaefetividadedosdireitossociais.

Dessarte,avaloraçãodasobrasaquiapresentadastorna-se,então,dependen-tedoquadrodereferênciametodológicocomqueoleitoroptarporvisualizá-las.Paradoxalmente, dependerádeumadecisão individual-solipsista, fundadanafilosofiadaconsciência.Aindaassim,espera-sequeemcasodeopçãodistintadaquesustentaoseuarcabouçopossamcontribuiçãoparaampliarareflexãosobreaorganizaçãodasrelaçõesdetrabalhoeaadministraçãodajustiça.

Omundocontemporâneocaminhaparasetornaromundodainstantaneidadeedaquiloqueéabsolutamentenecessáriopararesolverosproblemashumanosnasuaimediatidade,obscurecendoareflexãoacercadospressupostosdaaçãoedoconhecimento,cujodomínioparecedeverpermanecernasmãosdepoucaspessoasque,nadefesadosprópriosinteresses,jamaisoscolocamespontanea-menteemquestão.

Ostrabalhosapresentadosassumemoriscodeousarretroagiraocampodospressupostosepistemológicosdoconhecimento,anunciarseuspressupostose,apartirdeles,edificarateoriademocráticaimanenteaoSistemaNinter.

Meuagradecimentoprofundoatodosaquelescomquempudeconviverecompartilharesteprojetodevidaeque,aolongodasúltimasduasdécadas,nasmaisdiversaslocalidadesdopaís,deixaramaquisuavaliosacontribuição.Ressalto,especialmente:dirigentessindicaisdesetoresprofissionaiseempresariais,esuasassessoriasjurídicas;colegasmagistrados,procuradoresdotrabalhoeagentesdeinspeçãodotrabalho;trabalhadoreseempresáriosávidosportransformarsuasinquietaçõeseproposiçõesemprojetosdereconstruçãodasrelaçõesdetrabalhoembasesharmônicas,humanitáriasesolidárias,diantedosquaistiveaoportuni-dadedeexpor,debatereenriquecerpartedasideiasorganizadasedesenvolvidasnestetrabalho.

O incomensurável apoio institucional recebido nos primeiros anos deconsolidaçãodaexperiênciadoNúcleo IntersindicaldeConciliaçãoTrabalhista

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dePatrocínio (1994-2000)—considerandoo interessepúblicomotivadordosobjetivosedaatuaçãodoscidadãosedasinstituiçõesenvolvidasnasuacriação,comprometidasemapoiá-lanaquele tempo,bemcomodoconhecimentoaquiproduzido—conduz-mearegistrarasseguintesinstituições:TribunalSuperiordoTrabalho,TribunalRegionaldoTrabalhoda3ªRegião,AssociaçãodosMagistradosdoTrabalhoda3ªRegião,AssociaçãoNacionaldosMagistradosTrabalhistaseMinistériodoTrabalhoeEmpregoeMunicípiodePatrocínio/MG;semdeixardemencionarosprópriosprotagonistasdosistema:SindicatodosTrabalhadoresRuraisdePatrocínio/MG,SindicatoRuraldePatrocínio/MGeAssociaçãodosCafeicultoresdaRegiãodePatrocínio/MG.Emhomenagemeconsideraçãoatodosaquelesqueporforçadomisterinstitucionalemprestaram,nestacondição,seuapoio,faço-o(in memoriam)emnomedosaudosoministroOrlandoTeixeiradaCosta,entãoministrodoTST,edoíntegroedignodirigentesindicalEzequiasdosReis(in me-moriam),entãopresidentedoSindicatodosTrabalhadoresRuraisdePatrocínio.Todasestasreminiscênciasforamomóvelespiritualdoesforçointelectualdequeseprestacontasnostrabalhoscientíficosqueorasetrazapúblico.

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PreFácio

Em1994,foicriadooprimeiroNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhista—Ninter—noBrasil,nacidadedePatrocínio/MG.Ainstituiçãoresultoudeam-ploesforçodossindicatosprofissionaleempresarialedaVaradoTrabalholocalnabuscaparaaquestão trabalhista local resultantes de um conjunto de fatores socioeconômicose jurídico-culturais, cujacomplexidadenãoseenquadravanomodeloderacionalidadecomqueasinstituiçõesdotrabalho(públicasecoletivas)visualizavamoproblemaetornavaminoperantesseuscódigosdecondutaemodus operandi naaplicaçãodalegislaçãotrabalhista,naadministraçãodajustiçaenaconduçãodosconflitoscoletivos.Aocontrário,adisparidadeeodesencontrodaatuaçãodasdiversasinstituiçõesdotrabalhonummesmocontextoderealidadecontribuíamparaagravamentodasituaçãolocalcomdesvantagemparatodososatoresenvolvidos,emespecialostrabalhadoresegrandeparceladepequenosempresáriosdosetor.Emsuma,asinstituiçõesdotrabalho,públicasecoletivas,nãotinhamamenorcondiçãodeasseguraraefetividadedaordemjurídicaemníveissociologicamenteaceitáveis,dadaaagudadesproporçãoentresuacapacidadedeatuaçãoeademandaporserviçospúblicoságeiseaptosarespondersistêmicaeeficazmenteosproblemas locaisdeadministraçãoda justiça,de inspeçãodotrabalhoedecumprimentodosdireitostrabalhistas:impotênciadainspeçãotra-balhista,dadaarizíveldisparidadeentreonúmerodeauditoresfiscaiseaimensagamadeempresassujeitasàfiscalizaçãosituadanumaamplabaseterritorial;oprogressivoaumentodataxadecongestionamentodeaçõesajuizadasnaVaradoTrabalholocale,porisso,umaintoleráveldemoradaprestaçãojurisdicional,alémdasensívelinadequaçãodaatuaçãoestatalàrealidade local.

ÀfrentedaVaradoTrabalhodePatrocínio/MG,oautorprotagonizouains-tauraçãododiálogosocialdoqualtomarampartetodososatorespúblicosesociaisenvolvidosnaorganizaçãodasrelaçõesdetrabalholocais.

Napassagemdodiagnósticoparaação, foimarcantea criaçãodoNinter,instituiçãoconcebidapeloautoreconstituídacomasuadecisivaparticipação.

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Desdeentão,dedicou-seàconstruçãodoarcabouçoteóricoejurídico-dogmáticodonovoinstitutonoscursosdemestradoedoutoradorealizadosnaUniversidadeFederaldeMinasGerais.Tarefaquenelapersiste,agora,nacondiçãodeprofessornoscursosdegraduaçãoepós-graduaçãodaFaculdadedeDireitodaUFMG,ondeécoordenadordoProgramaUniversitáriodeApoioàsRelaçõesdeTrabalhoeàAdministraçãodaJustiça(Prunart-UFMG).

Nestatrajetória,oautorvemtrazeralumeadíade:

“O Sistema Núcleo Intersindical de Conciliação Trabalhista — Do fato social ao instituto jurídico: uma transição neoparadigmática do modelo de organização do trabalho e da administração da justiça.”

e

“Pressupostos Filosóficos e Político-Constitucionais do Sistema Núcleo Intersindical de Conciliação Trabalhista — Teoria e práxis da razão dia-lógica e do pensamento complexo na ação coletiva e na ação pública: democracia integral e ética de responsabilidade social.”

AmbascorrespondemaosVolumesVIeVIIda“SérieNinter”,quereúneoconjuntodaspublicaçõesdoautorsobreoSistemaNúcleoIntersindicaldeConci-liaçãoTrabalhista—Ninter.

Desdequandoo instituto jurídicoNúcleo IntersindicaldeConciliaçãoTra-balhistafoirecepcionadonaordemjurídicaporintermédiodaLein.9.958/2000(art.625-H,CLT)epassouaintegraroconjuntodasinstituiçõesquecompõemaorganizaçãodotrabalhobrasileira,oNinter/Patrocínio(MG)tornou-seaexperiênciamatricialeabaseempíricadaconstruçãodateoriaquelheconferiuidentidadejurídica.

Asobras não têmnatureza didática, sendooportunomencionar que aidentidadejurídico-dogmáticaeacategorizaçãoconceitualeoperacionaldessasinstituiçõesjáforamobjetodasobrasanterioresdoautor.Elassedestinamaumpúblicomultifacetário,contudoenfatizamafundamentaçãoteóricadoinstitutonumplanomaiselevadodeabstração,decaráterinterdisciplinare,porvezes,trans-disciplinar,dadasastransformaçõesparadigmáticaspropugnadaseaexigênciadeumanovaracionalidadecomocondiçãonecessáriaàcompreensãodoseusentido.Nestemister,fazem-senecessáriosavançosnocampodafundamentaçãofilosófico--político-constitucional,apartirdeumacríticaàspremissasepistemológicasdaciênciaedafilosofiamodernas,visandoàsustentaçãodaspremissas,dosprincí-piosedaspráticasinstitucionaisqueascaracterizam,especialmenteodiálogoeaconcertaçãosocial,agovernançapúblicaeaparticipaçãodasociedadenagestãopúblicaenaadministraçãodajustiça.Taisconstructosenvolvemquestõesteóricasdealtaindagaçãoqueseapresentamcomo“panodefundo”detodaainvestigação.

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Contudo, aindaporexigênciadoviésfilosófico-metodológicoemque sebaseiam,asobrasaquiapresentadassededicamtambémaexplicitarasuabaseempírica,traduzidanoamploestudodecasodaexperiênciamatricialdoinstituto,oNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhistadePatrocínio/MG,paraextrairdeletodasasconsequênciasteóricasquedelaemergem.Assim,apesardaabordagemdeaspectosafetosaespecialistas,adimensãoempíricaéamplamentedesenvolvida,conferindo-se-lhemesmomaiorrelevância,dadaaaceitaçãodoprincípiodares-ponsabilidadesocialcomoprincípioéticonorteadordas“escolhas”epistemológicasadotadas.Nessesentido,oleitorencontraráumaimensadescriçãocríticademons-trativadacrisesistêmicadasinstituiçõesdotrabalho,entendidacomoestadoemqueasinstituiçõesjánãocumpremmaissuafunçãoconstitucionalesocial,sejasobaformadeestudodecaso,sejanoregistrodosdiagnósticosedocenárioemqueseverificouacriaçãodoNinter.Mas,importanteainda,nestaperspectivadeprofundaepermanenteconexãodateoriacomarealidade,encontra-seolevanta-mentoeadescriçãodosresultadosedastransformaçõespelareferidainstituição.

Poroutrolado,frenteaocontundenteequívocodaquasetotalidadedapro-duçãocientíficasobreamatéria,queequiparaconceitualeoperacionalmenteoinstitutoemquestãocomodasComissõesdeConciliaçãoPrévia,otrabalhonãosedispensadedescortinaraspectosrelevantesnoplanodadogmáticajurídica.

Nestaparte,asobrassedestinamatodososqueseinteressampelasquestõestrabalhistasedeadministraçãoda justiçasociolaboral,dentreestesosagentesdopoderpúblico,osdirigentessindicais,advogados,estudiososepesquisadores.

Ao longodeduasdécadas, a atuaçãodaexperiênciamatricial doNinternaquelaregiãoensejouumaprofundamudançanoquadroorigináriodaquestãotrabalhistalocal,nocampodanegociaçãocoletiva,daadministraçãodajustiça,dascondiçõesdetrabalho,dasegurançaesaúdedotrabalhadoredodesenvolvimentosocioeconômicolocal.

Nestes temposemquesebuscadesesperadamenteumareforma judicialcapazdedevolveraoPoderJudiciárioacredibilidadeealegitimidadeperdidas,osresultadosdaatuaçãodoNinternocampodaadministraçãodajustiçamerecemsertomados em sério. Eles demonstramqueaparticipaçãodasociedadenaadminis-traçãodajustiça,umdosaspectosfundamentaisparaumareformaconsistenteeparadigmática,nãorecebeutratamentocorrespondenteàsuaimportânciaeàsuapotencialidadeparacontribuirnoenfrentamentoda“crisedaJustiça”.Comprovamatesedoautordequesemaparticipaçãoefetivadasociedadenaadministraçãodajustiça,incluídoofomentoaosmeiosautônomoseconsensuaisderesoluçãodosconflitosmediantearupturadefinitivadaculturadomonopóliodaprestaçãojurisdicional,omovimentonãolograrásedesvencilhardo“circulovicioso”emque,historicamente,incorreramasreformasjudiciaisfocadasemestratégiasendógenas

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eautorreferenciais.Maisaindaquandoseabandonaaobsessãoquantitativaesevislumbraumajustiçaqualitativaevoltadaparaarealização da justiçaemsentidosubstantivo,denso,degarantir,emtemporazoável,aefetividadedaordemjurídica,comdéficitssociologicamenteaceitáveis.

Dessarte,aaberturadoPoderJudiciárioàparticipaçãodasociedadenaadmi-nistraçãodajustiçaécaminhosemoqualareformacorreoriscodefracassarnosseusobjetivoseemsuasmetas,tantoquantoocorreuem“reformas”anteriores.Istoporqueoreaparelhamentodaestruturachegasempreatrasado,demodoquea relação input/outputnosserviçosjudiciáriosnãotemsidofavorávelàreduçãodastaxasdecongestionamentoeàreduçãodademoranasoluçãodosprocessosdemodosignificativoeimpactante.OnúmerodeprocessosqueentramnaJustiçacontinuasendosuperioraonúmerodeprocessosquesaem.

Olevantamentoderesultadosprocedidonocapítuloqueencerraapresenteobra,apresentaresultadosgrandiloquentesnoperíodode1994a2013tomadocomomarcotemporaldestainvestigação.

OsresultadosapuradossãoaprovaderealidadeelegitimamosistemaNin-terpelasconsequênciassociaisdesuaatuação.Noâmbitodaadministraçãodajustiça,oslevantamentosestatísticosrealizadosrevelamqueonúmerodeaçõesajuizadasprovenientesdosegmentorepresentadopelossindicatosenvolvidosteveumareduçãode85%.Ainstituiçãoatendeu,nestasduasdécadas,144.034,dosquais142.253foramdefinitivamenteresolvidose1.781(1,24%)foramobjetodeaçãonaVaradoTrabalholocal.Projeçõesestatísticasrevelamque,seoNinternãoexistisse,seriamnecessáriasoutrascincoVarasinstaladasnacomarcaemquestão,paraquesepudessemanteramesmaprestezacomque,hoje,aVaradoTrabalhoatendeàsociedadelocal.

Assim,aavaliaçãodestesresultadosrevelaqueaparticipaçãodasociedadenaadministraçãoda justiçaéestratégia indispensávelàconformaçãodoPlanoEstratégicodoPoderJudiciárioNacional,noqualnãorecebeu,ainda,ênfasecom-patívelcomasuaimportânciaparaareversãodacitadacrise.

Apresentepublicaçãoacontecenoanoemqueestanovainstituiçãodotra-balhocompletaduasdécadasdeexistênciaedeatuaçãonabaseterritorialdossindicatosresponsáveisporsuacriação.

Portudoissojustifica-seoesforçointelectualdespendidonestaempreitada.

O autor

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“[...] Os discursos de fundamentação e de aplicação [do direito] precisam abrir-se também para o uso pragmático, e,

especialmente, para o uso ético-político da razão prática.” HABERMAS

“Como toda revolução, uma revolução paradigmática ataca enormes evidências, lesa enormes interesses, suscita

enormes resistências [...] Todas as teorias, ideias ou opiniões incompatíveis com o paradigma aparecem, evidentemente como

contrárias à lógica, imbecis, delirantes, absurdas.” MORIN

“Nossa individualidade como seres humanos é social, e ao ser humanamente social é linguisticamente linguística, isto é, está

imersa em nosso ser na linguagem.” MATURANA

“Uma ordem jurídica é legítima na medida em que assegura a autonomia privada e a autonomia cidadã de seus membros,

pois ambas são co-originárias; ao mesmo tempo, porém, ela deve sua legitimidade a formas de comunicação nas quais essa

autonomia pode manifestar-se e comprovar-se...”

“A guinada em direção ao modo de ver intersubjetivista nos leva ao seguinte resultado, surpreendente no que respeita à

‘subjetividade’: a consciência que parece estar centrada no Eu não é imediata ou simplesmente interior. Ao contrário, a

autoconsciência forma-se através da relação simbolicamente mediada que se tem com um parceiro de interação, num

caminho que vai de fora para dentro.” HABERMAS

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introdução

“Lo que es verdaderamente fundamental, por el mero hecho de serlo, nunca pude ser puesto, sino que debe ser siempre pressupuesto.”

Zagrebelsky(3)

Aestrutura,aorganizaçãoeasinstituiçõesdoEstadoModernoforamcon-cebidasapartirdomodelode racionalidadedaciênciaedafilosofiamoderna(ocidental),ambasorientadaspeloparadigmadarazãológica/instrumental,quedásustentaçãoàsdiversasformasdeexplicaçãodarealidadeedoconhecimen-tohumanos,asquaisse localizamnosextremosdoempirismoedo idealismo,ouentreambos,comprevalênciadeumoudeoutro,semprecalcadosnacisãocartesianaentreosujeitoeoobjetodoconhecimento.Todoopensamentooci-dentaldosúltimoscincoséculosselocalizanestesdiversosquadrosdereferênciaque tomama razãohumanacomo fonteexclusivade todoo conhecimento.Apolítica,os sistemasdegovernos,osdiversosmodelosdedemocracia,deau-toritarismoedetotalitarismo,agestãopública,adivisãosocialdoexercíciodopoderporcompetências,aaçãoestatal,asdicotomiasEstadoversussociedade,públicoversus privado,PoderPúblicoversus cidadãoeautoridadepúblicaversus destinatários/afetados(administrados/jurisdicionados)radicam-senoaxiomadarazãoinstrumentalcomofontedetodoconhecimentoedetodaverdade.Porisso,tais elementos são in printingsprofundamenteenraizadosnaculturapública.Afilosofiadodireito,asteoriasjurídicas,osjuristasteóricoseosjuristasdeofício,asinstituiçõespúblicasencarregadasdainterpretaçãoedaaplicaçãododireitoedoexercíciodaautoridadeorientam-seporesteparadigmaqueseconvencionoudenominar“filosofiadaconsciência”,oqualtemcomofontedoconhecimentoedeverdadeosujeitoindividual-solipsista.

(3) ZAGREBELSKY, Gustavo. El derecho dúctil. Trad. Marina Gascón. 6. ed. Madrid: Trotta, 2005. p. 9.

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Aorganizaçãoearegulamentaçãodasrelaçõesdotrabalho,asinstituiçõesqueacompõem(sindicatoseinstituiçõespúblicas),acultura,oscódigosdecon-dutaeomododeoperardeseusagentes,concebidossobaorientaçãodoEstadoautoritário-intervencionistaecorporativodaprimeirametadedoséculopassado,sofremasconsequênciasdacrise(paradigmática)deracionalidade,tantodaciênciacomodafilosofia,provenientedasprofundasecélerestransformaçõesemtodososcamposdaaçãohumanaedacomplexidadecadavezmaiorqueenvolveaatividadehumana.Sãomodosdemanifestaçãodessacrisenaorganizaçãodotrabalho:oexacerbadograudededesrespeitoaosdireitossociais,ainadequaçãodoscódigosde conduta e do modus operandi das instituiçõesdotrabalhoaosdesafiosdastransformaçõessocioeconômicasdasociedadecontemporâneaesuaconsequenteineficiênciaparaconformarcondutasdostrabalhadoreseempregadorescomasexigênciasda legislaçãotrabalhista,a inadequaçãoe insuficiênciada legislaçãotrabalhistadiantedecontextosderealidadecomplexos,singulareseirrepetíveis,alémdacrônicaincapacidadedemonstradapelosistemaderesoluçãodeconflitostrabalhistasemrespondersatisfatoriamenteaosaspectosquantitativoequalitati-vodademandasocial.Aoladodosfatores“exógenos”aoprópriosistema,ecomigualimportância,acrisedomodeloderacionalidade(paradigmática)éumdoselementosdeterminantesdacrisedaorganizaçãodotrabalhoedaadministraçãodajustiça.

Reservou-seaotrabalhodeinvestigaçãorealizadonolivroO sistema Núcleo Intersindical de Conciliação Trabalhista — Do fato social ao instituto jurídico: uma transição neoparadigmática do modelo de organização do trabalho e da admi-nistração da justiça, o estudohistórico-contextualizador-problematizadordasquestõeslocaisedosfatoresdesurgimentodaexperiênciaprototípicadosistemaNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhista.Oestudovem,acompanhadode“estudosdecaso”aosquaisseatribuiu,aumsótempo,funçõesepistemológicaemetodológica.Procedeu-se,naquelaoportunidade,àrevisitação,àampliaçãoeaoaprofundamento jurídico-dogmáticosdo institutoNúcleo Intersindical de ConciliaçãoTrabalhistacomvistasàreafirmaçãodesuaautonomiaconceitualejurídicafrenteàsComissõesdeConciliaçãoPrévia,comocondiçãosine qua non dequaisqueroutrasteorizaçõesacercadotema.

Napresenteobrasedesenvolvemaspremissasepistemológicas,osentidodoprincípiodedemocraciaimanenteaosistema,osconceitosoperacionais e as práticasinstitucionaisdeledecorrentes,para,aofinal,contemplarosresultadosdaexperiênciamatricialcomofimdeilustrarsuaspotencialidades.Osresultadosapresentados,porém,nãodecorremdamera implantaçãodosistema,nemdaexperiênciaemsi;dependemdasopçõespolítico-epistemológicascomasquaisasinstituiçõesencarregadasdaaplicaçãodaordemjurídicaedaorganizaçãodotrabalho, assimcomoasentidades incumbidasda representação coletivados

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trabalhadoreseempresáriossedispõemaoperar.Emoutraspalavras,dependemdaaceitaçãododiálogoedaconcertaçãocomoinstrumentodecoordenaçãodainteraçãodasinstituiçõesenvolvidas.

AideiadedemocraciaqueorientaoSistemaNúcleosIntersindicaisdeConci-liaçãoTrabalhistaeoconjuntodesuasatividadesinstitucionaisexigeaconstruçãodeumabase teórica coerente comos fundamentos constitucionaisdoEstadobrasileiroeumarupturacomatendênciadeatribuiràConstituiçãoumafunçãomeramente“fabuladora”ou“simbólica”,conferindoumsentidoforte(normativo)aosprincípiosdadignidadehumanaedacidadania.

Essadensificaçãodosentidodademocraciaenvolve,enfaticamente,abuscadaefetividadedosdireitossociaislegitimadapelaparticipaçãodosdestinatários(afetados)daaçãopúblicanagestãodaorganizaçãodotrabalho(administração)edaadministraçãoda justiça (istoé,dosistemade resoluçãodosconflitosdotrabalhointegradopelosmeiosjudiciaisenãojudiciaisdisponíveis).

Porisso,areconstruçãoaquiempenhadatemcomoparâmetrooparadigmadoEstadoDemocráticodeDireito, compreendidoapartirdenovaspremissasepistemológicas,buscandodemonstraraaptidãodemocratizadoradosistemaaquiestudado.Estaéprincipalmotivaçãodestainvestigaçãoqueprocuradetectaroenraizamentodeimprintringsculturaiseideológicosqueorientamaaçãopúbli-caeaaaçãosindical,nãomaiscompatíveiscomomodelodeEstadoerigidonaConstituiçãode1988,osquaisseguemneutralizandomaioresavançosemdireçãoàdemocratizaçãodaorganizaçãodotrabalhoedaadministraçãodajustiça,taiscomoaausênciaouaprecariedadedanegociaçãocoletiva,oisolamentoeodesen-contronaatuaçãodasinstituiçõesdotrabalho,aausênciado“diálogosocial”eda“concertaçãosocial”,aausênciademecanismoseficazesdeprevençãodeconflitos,ainsuficiênciadosmeiosoficiaisderesoluçãodeconflitoseasuainaptidãoparagarantiraefetividadedosdireitossociais.

Astransformações locaispromovidaspelaatuaçãoda instituiçãomatricial—Núcleo IntersindicaldeConciliaçãoTrabalhistadePatrocínio/MG—,origemdoinstitutojurídicoquelheécorrespondente,procedemdeumamudançadosparadigmaspolítico-filosófico-constitucionaiscomquesecompreendemosfun-damentosdoEstadoDemocráticodeDireitoinstituídopelasociedadebrasileiranaConstituiçãode1988.

Seessamudançaocorreunocampodaexperiênciaeproduziuconsequênciassociaisdignasdeumareflexãocientíficamaisconsistente,aracionalidadeestru-turadacombasenafilosofiadaconsciênciaenométodocientíficomodernoéinsuficienteparapromoverumaefetivatransformaçãoculturalnapráticajurídicaenomododeatuaçãodasinstituiçõesdotrabalho(públicasederepresentaçãocoletiva),poismostra-seincapazdefomentarademocratizaçãosubstantiva,enão

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meramenteformaldasociedadeedosistemaderelaçõesdetrabalho.EssemodeloderacionalidadeapresentaobstáculosepistemológicosconsideráveisàelaboraçãodaideiadeumademocraciaintegralcompatívelcomosfundamentosdaRepúblicabrasileira.Eleserviuàtradiçãoautoritáriae,nocampodateoriademocrática,nãofoialémdaorganizaçãodoEstado,dasinstituiçõesedademocraciaformal-repre-sentacionista.Trata-se,portanto,deumaquestãoparadigmáticaaserenfrentada.

Oparadigmanãotemumsentidopreciso.DepoisdeKuhn,muitosficaramtentadosadesistirdeatribuir-lheumsentido.EdgarMorin,queoresgatounasuadensidadeenoseusentidoprofundo,demonstrouagrandeimportânciadesseconceitoparaafilosofiadaciência.Essacristalizaçãodesubstratos ideológicoscarregaascategoriasmestrasdainteligibilidade,determinaasoperaçõeslógicasmatriciaisedesempenhaumpapelsubterrâneo.Éoprincípiodeseleção/rejeiçãodas ideias a serem integradas no discurso e na teoria ou descartadas/recusadas. Parecedepender,masnãodepende,dalógica,porquefuncionacomocritériodeseleçãodasoperaçõeslógicas,quesetornam,sobseuimpério,preponderantes,pertinentes,evidentes.Eletambémdeterminaautilizaçãocognitivadadisjunção ou da conjunção.Comisso,alémdedesignarascategoriasfundamentaisdainte-ligibilidade,controlaoseuemprego.Porserinvisível,éum“tanto”invulnerável,etudoqueestáforadeleparece“exótico”,estranho,eassumecaráterescandaloso,absurdo,profanador,incoerente.Oparadigma,pormeiodasteoriaseideologias,determinaumamentalidade,umavisãodemundo.Assim,a compreensãodomundoquetemcomopremissaaoposiçãocapitalismo/socialismonãocorrespon-deàquelaquevêomundoapartirdaoposiçãodemocracia/totalitarismo.Assim,todasasvisõesdemundotêmumconteúdoquasealucinatório.

Duascrençasadvindasdaexperiênciaimpulsionamestainvestigação:acren-çanodiálogocomofundamentodetodoconhecimento,detoda“verdade”edetodaação(paradigmadarazãodialógica,quesetomacomosubstitutodarazãoinstrumental);eacrençanaeloquênciaperformativadosresultadosalcançadosporaçõesconcertadas,cooperativasesolidáriasentreosatoressociaislocaiscriadoresdainstituiçãoedoinstitutojurídicodosNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTra-balhista,apartirdasuadisposiçãocomosujeitosdetentoresderesponsabilidadespúblicasecoletivas,paraumaconstruçãosocialdarealidade(BERGER;LUCKMAN).

Masatríadeparadigmáticaqueintegraaconstruçãodasteoriasnasquaissesustentaestateseemergedaprópriaciênciaedafilosofiacontemporâneas,configurando-senas seguintesasserções: a) a razãoédialógica, a consciêncianascedaintersubjetividadeeseformanodiálogo;b)arealidadeéumatotalidadecomplexa,inacessívelemsuaplenitude,razãopelaqualasimplificação,areduçãoeafragmentaçãosãomutiladorasdoobjetodoconhecimentoeproduzemconse-quênciasinaceitáveis;ec)a“verdade”ésemprecontextualizadaeintersubjetiva,logotodapretensãodeverdadebaseadaemproposiçõesimperativas(empíricas

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ouracionais)oriundasdarazãoindividual-solipsistaéautoritáriaeimplica“petiçãodeobediência”.

A razãodialógica transcendeaos limitesda razão solitáriadafilosofiadaconsciência;oparadigmadacomplexidadetranscendeoparadigmareducionista,fragmentáriaemutiladoradocientificismomoderno,que,comomododeverascoisas,“cega”,porconsiderar“inexistente”tudoqueescapaaoseuângulodevisão.Aideiadecomplexidadenãoserefere,simplesmente,aummétododeconheci-mento,masaummododeconhecerquetemcompromissocomatotalidadeecomosingular,aomesmotempo.

Aaceitaçãodospressupostosdarazãodialógicaedoprincípiodacomplexi-dadeinverteaequaçãoqueimpõeasubmissãodosujeitoaoobjeto,colocando-o“entreparênteses”,parasecogitardeumaobjetividade(realidade)“entreparên-teses”,condicionadapelosujeito.Arealidadepassaaservistacomoumcomplexus eoobjetodoconhecimentoéa fenomenologia,enãoa realidadeontológica,inacessívelaoconhecimento,“emsimesma”.Toma-seadireçãodeumpensamen-tosistêmico,aberto,holísticoehologramáticonaconcepçãodaorganizaçãodotrabalho.Contudootratamentosistêmicocondizcomaideiadesistemaabertoerefutao“sistemismo”.

Essarelaçãoreciprocamenteconstitutivaentreosujeitoearealidadeétam-bémdeterminantedeumaconexãoindissociávelentreoconhecimentoeaação.Atríadeconhecimento-realidade-açãoestá,inexoravelmente,presenteemtodaso-ciedade.Eoproblemadacoordenaçãodasaçõeshumanase“institucionais”emergecomopontocentral,porquantocadaindivíduoecada“instituição”(conduzidaporindivíduos)serevelamnasingularidadecomque,noseuuniversoexistencial,sedáessatrípliceconexão.Odiálogoeainteraçãocolocam-senocentroecomocondiçãodepossibilidadedequalqueraçãocoletivaregradapeloprincípiodedemocracianoestágiomaisrecentedaevoluçãodaconsciênciapolítico-filosófico-constitucional.Porisso,falaremdemocraciaimpõelogoapergunta:“Qualdemocracia?”.

Osparadigmasdarazãodialógicaedacomplexidadeimprimem,contudo,aosprocessosdiscursivosedecisóriosumaéticada inteligibilidade,porquantoaperspectivadetodososinteressadospassaaserlevadaemcontamedianteaadoçãodeprincípioseregrasdeprocedimentosqueassegurema“universalização”do discurso.

AsteoriasdePiagetedeEdgarMorinsecomplementamnosentidodeumavisãoconstrutivistadoconhecimentohumanoapartirdosparadigmasdarazãodialógicaedacomplexidade.Ambasindicamquearazãoéevolutivaeaindavaievoluir.Revelam,por isso,queomodeloestáticode racionalidade tradicionalnãoécapazdeapreenderacomplexidadedoreal,dodiálogoedasolidariedadeuniversal indispensávelà sobrevivênciadahumanidade. Informam,porúltimo,

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queessemodelo tambémnãoé capaz deorientar a açãopor umaéticade responsabilidadeedesolidariedadequesevolveparaasconsequências,enãoparaasintençõesdoagirhumano.

A recusadadicotomia sujeito-objetoeaassimilaçãodoacoplamentoes-truturalentreosujeitoearealidadenaqualseinsere,demodoqueambosseconstituamreciprocamentenumarelaçãoincindível,decorredaconjugaçãoedaexistênciadeumarelaçãodeintercomplementaridadeentreosprincípiosdarazãodialógicaeoprincípiodacomplexidade.Dessasimbioseresulta,então,queteoriaepráticaseconstituemreciprocamentenalinguagem.

Comtaisparadigmas,afilosofialevaalinguagemàssuasúltimasconsequên-ciasnosentidodeconferir-lheumafunçãoconstitutivadoseredarealidade.Arealidadeé,portanto,multiversátil, complexae inesgotável.Elaemergeda lin-guagemeérelativaaossujeitosenvolvidosnodiálogo.Etodaaçãohumanadeveentãosercoordenadapelodiálogo.

DesdeWittgensteinaKarl-OttoApel/JürgenHabermasodiálogotornou-seafontedetodoconhecimentotantonaciênciaquantonafilosofia.

Considera-sequeaaçãopública,naqualseinseremoscódigosdecondutae o modus operandidasinstituições/autoridadesdotrabalho,sindicatosedemaisagentesdaorganizaçãodotrabalho,comoqualqueraçãohumana,comportaumadimensãocognitiva,oreconhecimentodanaturezadialógicadarazão,aqual,paraserdemocrática,impõe,necessariamente,aparticipaçãodosafetados/destinatáriosdaaçãopúblicanosprocessosdedecisãodaautoridadepública.

AaçãodoPoderPúblico,atentaaosprincípiosdadignidadehumanaedacidadania,deverásersemprecomunicativaedialógica.Eaaçãocoercitivadeveserantecedidapelaaberturadeoportunidadesdecompreensãointersubjetivadosmotivosedosfinsdaaçãopública.Aquiabre-secaminhoparaodesenvolvimento,noplanoepistemológico,deumateoriadaaçãopúblicacomunicativaqueestánabasedaspráticasdemocráticasinstitucionalizadasnoNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhista.

Osprincípiosdadignidadehumanaedacidadania,compreendidossegundoosprincípiosdarazãodialógicaedacomplexidade(real),implicamoreconhecimentodosdestinatáriosdaaçãopúblicanumadimensãomaisavançadaqueaquelabasea-danoassistencialismoenoprotecionismodohipossuficiente.Estesegundopontodevistasustenta-senosparadigmasepistêmicosda“razãoclássica”e,porisso,nãolevaemcontaavisãoeosprojetosdevidadosdestinatáriosdaaçãopública,nemassuasconsequênciassociais,asquaissomentepodemserconsideradassoboenfoquedosafetados,medianteprocedimentosdialógicoseparticipativosemqueestes possam manifestar sua compreensão da realidade e ofertar feedbacks por intermédiodosquaisavalidade,ounão,destasconsequênciaspossaseravaliada.

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Asteoriasdodiscurso,quesebifurcamemteoriadaéticadaresponsabilidadesolidáriadeKarl-OttoApeleteoriadaaçãocomunicativadeHabermas,sãoopontodepartidadaconstruçãodesentidodoprincípiodedemocraciaimanenteaosiste-maNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista.Alegitimaçãodaaçãopúblicacomunicativaconfigura-senabuscadialógicadaverdadeenacorrespondênciadeseusfinsaoprojetodasociedadebrasileirainscritonaConstituiçãoFederal,assimcomonaantecipaçãoeavaliaçãodassuasconsequênciassociaissobaperspectivadoscidadãosdestinatários/afetados.Porisso,oprincípioqueconfereaosistemaNúcleosIntersindicaisaptidãoparacontribuirparaademocratizaçãodasrelaçõesdetrabalhoampara-senateoriadaaçãocomunicativa,nosentidodaefetivapartici-paçãodosdestinatáriosdaaçãopúblicanoexercíciodopoder(público)conferidoàsinstituiçõesdotrabalho.Somenteessadiretrizpermiteaconduçãodaaçãopúblicasobadireçãodeumaéticaderesponsabilidadeesolidariedadequepriorizaasconsequênciasdaaçãohumanaemsubstituiçãoaumaéticademerasintenções.

A relação Estado versus sociedade passa a ser compreendida nos termos de umateoriadegovernançaquefaçajusaosnovosparadigmas,paraaqualo“essen-cialhojenãoéacoerênciadaaçãopública,mas,comcerteza,asuapertinência,eestasemedepelaqualidadedosdiálogostravadosentreasinstituiçõespúblicasecomasociedade[...]”(CALAME,Pierre;TALMANT,André.A questão do estado no coração do futuro, 2001. p. 40).

A fundamentaçãodaaçãoestatalna razãocomunicativaéumaexigênciaprovenientedaaceitaçãodofatodequeoindivíduoeasociedadeseconstituemreciprocamentee,porisso,dasuperaçãodatãodebatidadicotomiaindivíduoesociedade.Aautoconsciência,portanto,éumfenômenogeradocomunicativamen-te,comoque,tambémporestavia,seprocedeàsuperaçãodaoposiçãoclássicaentre ideia e realidade.

Ousodalinguagemorientadaparaoentendimentopossibilitaacoordenaçãodeaçõeseainteraçãoentreosparticipantesdeumprocessodiscursivo.Osatoressãoconvencidos,enãocoagidos,acercadoqueéverdadeiroecorreto.Comefeito,os“complexosdeinteraçãonãoseestabilizamapenasatravésdainfluênciarecí-procadeatoresorientadospelosucesso[...]asociedadetemqueserintegrada,emúltimainstância,atravésdoagircomunicativo”.Noquedizrespeitoàvalidadejurídica,aaceitaçãodaordemjurídicadistingue-sedosargumentossobreosquaiselafundaasuapretensãodelegitimidade.“Essaduplacodificaçãoremeteàcir-cunstânciadequeapositividadeeapretensãoàlegitimidadedodireitotambémfazemjusàcomunicaçãonãocircunscritaqueexpõe,emprincípio,todasasnormasevaloresaoexamecrítico.”(4)

(4) HABERMAS, Jürgen. Pensamento pós-metafísico. 2. ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2002. passim.

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Diantedetaisconclusões,omododeoperarodireitotambémpassaaservisto segundoosnovosparâmetrosepistêmicos,oque resultanumaprofundaalteraçãonaatividadecognitivaqueprecedeadecisãopúblicaemtodasasesfe-rasdeatuaçãodopoderestatal,demodoaromperoautoritarismocognitivoqueimperanaconcepçãoformalísticadademocracia.

Ainterpretaçãoeaaplicaçãododireitosesujeitamàsescolhasepistemológi-casdosdecisores-operadoresdodireito,impondo-se,portanto,aaberturadetaisprocessosaprocedimentoscomunicativoseparticipativosembuscadavalidadedosdiscursos(KlausGunther)deaplicação.

Trata-sedeaceitarumacompreensãododireitocomoumsistemasimulta-neamentefechadoeaberto:

[...] normativamente fechado, porém cognitivamente aberto.Nãoexistemnormasjurídicasforadele,areproduçãodeseuselementos,vincula-se,ademais,aosdadosnormativosinternos,aacontecimentosexternoscujaaveriguaçãorequerumaatividade cognitiva [...]. (grifo posterior)(5)

Arazãodialógicaintroduz-setambémnocampodaseleçãoeinterpretaçãodosfatos,abrangendoaindaainterpretaçãoeaaplicaçãodanorma,paraconstituirdiscursivamenteoscontextosderealidadederelevânciasocial,coletivaepública,epermitiraescolhadanormaedomodomaisadequadodesuaaplicação,tendoemvistaasconsequênciassociaisalmejadas.

Aconstruçãodoconhecimento(darealidade)emquesefundamentaaaçãopúblicapassaentãopelocrivododiálogosocial;aaçãopúblicaengendradacombasenesseconhecimentosubmete-seàconcertaçãosocial,quersejaparaasomaeacomunhãodeesforços,quersejaparaasualegitimaçãosobopontodevistadoprincípioéticodaresponsabilidadesocial.Nessesentido,sãoindissociáveisoconhecimentoeaação.

Odiálogosocial,contudo,paraquepossaserinseridocomocritériode“ver-dade”doconhecimentoaptoàcoordenaçãodaaçãopública,fundamenta-senosprincípiosenasnormasconstitucionaise,quantoaoprocedimento,nainstitucio-nalizaçãodeespaçoseregrasdeinteraçãocomunicativa.Desonera-se,portanto,dafundamentaçãoconteudísticadodireito,poisrestringe-seaosprocessoscognitivosdebuscadas“verdadesconsensuais”capazesdeinterferirnosprocedimentosdeescolhadaautoridadepública,entrealternativasquedizemrespeitoàeleiçãodapróprianormaaplicáveledosfatostidoscomorelevantes,quantoàsuainterpre-

(5) ARNAUD, André-Jean; LOPES JR., Dalmir. Niklas Luhmann: do sistema social à sociologia jurídica. Trad. Dalmir Lopes Jr., Daniele Andreia da Silva Manão e Flávio Elias Riche. Rio de Janeiro: Lumens Juris, 2004. p. 335.

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tação,alémdaseleçãodoscritériosparaatribuiçãodesentidoedevaloraçãodeambos.Resguarda-seàautoridadepúblicaaemissãodejuízosdelegalidadesubja-centementepresumidanosrespectivosatosdefala;taisjuízoscontudosujeitam-seatransformaçõesnocursododiálogo.Detodaforma,acelebraçãodeconsensosinterinstitucionaisdosquaisparticipemasautoridadespúblicasinduzàpresunçãodelegalidadedetaispactos.Contudo,ojuízodefinitivoreserva-seàsinstituiçõespúblicasnoestritoexercíciodesuasfunçõesinstitucionais,nestecaso,infensasaodiálogosocial,emboradelepossamextrairelementosservíveisàfundamentaçãodoatopúblico.

Essassão,portanto,ascondiçõesdevalidadedaaçãopúblicaque,apesardecomunicativa,temcomofundamentoúltimo(transcendental)nãosomenteasnormasqueregemoprocedimentonodiálogosocial,masosdireitosfundamentaisdotrabalhadorinscritosnaConstituiçãoFederal,insuscetíveisdederrogaçãopelaviacomunicativa.

AteoriademocráticadosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTra-balhistapermaneceaquéme,aomesmotempo,vaialémdateoriadodiscurso.Aquémporquea teoriadademocracia integral, fundadanauniversalizaçãodarazãodialógica,nãopermitea“criaçãododireito”porseus“operadores”(aqui,cabetraçarumparalelocomasteoriasdousoalternativododireitorecentementeemvogaemnossopaís)emnomedeumaverdadeconsensualmenteatingidanoâmbitodaaplicaçãododireito.Alémporqueosparadigmasemergentesimpõemumnecessárioavançoparaconsiderarosprocedimentoscognitivosquefundamentamaaplicaçãododireito.Seestes,comoquestionaKlausGunther,compreendidosapartirdosparadigmasdarazãodialógicaedacomplexidade,requeremaadequaçãododireitoaoscontextosderealidade,aentregadestadecisãoàrazãoindividual--solipsistadaautoridadepúblicadeslegitimaoanteriorprocedimentodiscursivocriativododireito,reinstalandoaarbitrariedadeeoautoritarismonomomentomais importante da atuação do direito.

Porseuturno,aautodeterminaçãocoletivainspiradanoprincípiodasubsi-diariedadeativatambémsesubmeteaoprincípiododiálogoparacaracterizaroqueaquisedesignacomoaçãocoletivacomunicativa,pelosmesmosfundamentos.

Aaçãopúblicacomunicativaeaaçãocoletivacomunicativaconvergemparaoprincípiode“governança”,eassimsãosuperadas as dicotomias Estado versus sociedadeepúblicoversusprivado,própriasaoparadigmadaracionalidadedaciênciaedafilosofiamodernas.

Busca-se,portanto,umprincípiodedemocraciaquenapráticadasinstituiçõesdotrabalhodêefetividadeaosprincípiosdadignidadehumanaedacidadaniaquefundamentamaRepúblicabrasileira,quesituamaConstituiçãode1988nacampo

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abrangidopelasteoriasconstitucionalistasmaisrecentes,porvezes,intituladasde“neoconstitucionalismo”.

OprincípiodedemocraciaemquesesustentaosistemaNúcleosIntersin-dicaisdeConciliaçãoTrabalhistapressupõeaideiadeumademocraciaintegral,fundadanafilosofiadalinguagem(razãodialógica).Oconhecimento(verdade)eaação(ética)queorientamoexercíciodoPoderPúblicoedaautonomiacoletivalegitimam-seemprocedimentosdiscursivosnosquaiséasseguradaaparticipaçãoativadosatoressociais(agentesdoPoderPúblicoedestinatáriosdaaçãopúblicalegitimamenterepresentadosouassistidos).Arealidadeéresultadodaarticulaçãodemúltiplasvariáveiscujafragmentaçãocomprometeasuaapreensãoemsuasin-gularidadeecomplexidadeirreplicáveis(paradigmadacomplexidade).Inacessível,arealidadeintegralecomplexaé,aomesmotempo,permanentementeperseguidapelaparticipaçãocooperativa,construtiva,detodososinteressadosnosprocessosconstitutivosqueaconstituemcomoobjetodeconhecimento.

Aaçãopúblicacomunicativaconsubstanciaumdosconceitosoperacionaisqueassumeposiçãodecentralidadeaoladodacaracterizaçãodoquesedesignapor “agentesdoPoderPúblicode carreirapermanente” socialmente compro-metidoscomumaéticaderesponsabilidadeesolidariedade.Essacaracterizaçãodecorredaconcreçãodoprincípiodedemocracia,quesópodesercompreendidonosentidoemancipatóriodepromoveracidadaniaeadignidadedapessoadotrabalhador,dimensãoqueinclui,necessariamente,aquestãodaefetividadedosdireitos sociais, semaqualo sentidoeaatuaçãodas instituiçõesdo trabalhocarecemdelegitimidadesocial.Aaçãopúblicapassaaexigireaorientar-seporumaéticaconsequencialista,capazdeindagarpelosresultadoseconsequênciassociaisquedeladerivam.

Aprimeiraimplicaçãodessaposiçãoepistêmico-paradigmáticaéoabandonodoidealismoedoobjetivismoracionalistas—oprimeiro,pornãoacharsaídaparaasdiversasconcepçõesteóricasdisputantesdahegemonianaexplicaçãodomundoenadireçãodaaçãohumana;osegundo,pornãocompreenderacomplexidadedarealidadeesuadinâmica.Trata-sedeummodeloderacionalidadequetemnosujeitoindividualsolipsistaafontedetodoconhecimentoecrêteracessoprivile-giadoàverdadeeaocorreto.

Anteacomplexidadeeacéleremetamorfosedasrelaçõessocioeconômicascontemporâneas,essedistanciamentonãopôdenempoderásercontidosomentepelalouvávelobstinaçãoepersistênciadasinstituiçõesencarregadasdaaplicaçãodaleitrabalhista.Acomplexidadedarealidadeedasrelaçõeshodiernasnãopodeserapreendidaapartirdeummodeloreducionista,simplificadorelegalistadométodocientíficotranspostoparaodireito.

Essasconsideraçõespermitemidentificarumcontundenteparadoxoentreadecisãoconstituintedopovobrasileirodeelegercomoparadigmadeorganização

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danossasociedadeoEstadoDemocráticodeDireito(Constituiçãode1988)eacrônicapersistênciadaspráticasinstitucionaisinspiradaspelomodeloepistêmiconoqualseconcebeuosistemaderelaçõesdotrabalhodoestadoautoritário.

Aalteraçãodeparadigmasépordemaismelindrosaeextraordinariamentecomplexa,dandomargema todaespéciede contestação,porduasprincipais razões.

Primeira,aoalteraropontodepartida,abasedeumsistemaracional,elapas-saaexigirnovasexplicaçõesparaosfenômenoscompreendidosàluzdoparadigmaalteradoeparaaspráticasinovadorasconsequentesdonovoparadigma.Impõe-se,portanto,areconstruçãodeconceitoselaboradosconformeospressupostosdoparadigmaanterioreaconstruçãodenovosconceitosquepossamrepresentarosfenômenosemergentes.Significalaborar,desdeocomeço,reconstruindosemdestruir.Especificamenteemrelaçãoaoobjetodestainvestigação,estaemprei-tadaconsisteemedificartodaumateoriajus-filosófico-constitucionaldosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista,semheresiaaosprincípiosere-grasconstitucionais,aosfundamentos,aosprincípioseàsregrasdeproteçãodosdireitossociaise,aomesmotempo,alterarprofundamenteamaneiradevê-losecompreendê-los,porqueessaéumadasconsequênciasdamudançadeparadigmas.

Asegundarazãodizrespeitoaoimpactodaalteraçãoparadigmática.Elapro-duzresistênciaobstinada,porqueabalaosreferenciaisprimeirosdosujeitoquereage.Essareaçãosedádeacordocomascircunstâncias,podendomanifestar-sedemodosofisticadoougrotesco,emníveiselevadosdeintelectualidadeedeabs-tração,oumedianteobjeçõesqueseconsideramfundadasno“óbvio”outrivial,ou,mesmo,apartirde“escolhas”cognitivasbaseadasempreferênciassubjetivas/individuaisacopladasemargumentosaparentementeperfilhadosacorrentesdepensamentos,teoriaseideologias,asquaisexistemparaquasetodosos“gostos”.

As“perturbações”oriundasdessatransformaçãoparadigmática(oabaloa“enormesevidências”,o incômodoa “grandesdecisivos”) tornam incomunsasexigências relativasa investigaçõesdeste jaez.Por isso, compreende-se comocondiçãodepossibilidadedodesenvolvimentodestainvestigaçãoaexplicitação,en passant,dodaracionalidadeprópriaàciênciaeàfilosofiamoderna(filosofiada consciência) e de sua correlação com a conformação da estrutura do Estado brasileiroqueserviudebaseparaoordenamentodetodoosistemaqueorganizaasrelaçõesdetrabalho.

Alémdisso,aprópriaconcepçãodademocratizaçãonagestãodaorganiza-çãodotrabalhoeadministraçãoda justiçacarecedeserreconstruídasobeste novoenfoqueepistemológico.Adigressãoéindispensável,porqueaexplicitaçãodoparadigmaantecedeàexposiçãodesuasconsequênciasjus-filosóficaseprag-máticas.

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Osproblemasdequeseocupaamentehumanapodem,porvezes,circunscre-ver-seaocampodaficçãoedoimaginário,desprendidosdarealidadefenomênica;outrasvezes,podememergirdeumaconexão,reciprocamenteconstrutiva,entreaconsciênciaearealidade;ou,ainda,podemsercompreendidoscomoprovenientesdeumarealidadeexterioràconsciência(razão),quearepresenta(representacio-nismo).

Aindaque se considerea indissociabilidadeexistenteentre consciênciaerealidade,mesmoquandosepretendeacategorizaçãodeumaoudeoutraemcategoriasdistintas,derazãooudefato,aproduçãodetodoconhecimentodeverásercompreendidacomooriundadoentrelaçamentoentreambas(sujeitoeobjeto).Issosemqualquerpossibilidadedepriorizaçãodeumaoudeoutra,anãoseremsacrifíciodequalquerumadelas.Ahipertrofiadasubjetividadeobscureceaobjeti-vidadee,reflexivamente,aprópriasubjetividade,poisambassãointerdependentes.Ahipertrofiadaobjetividadeobscureceasubjetividade,novamenteemsacrifíciodeambas.Essarelaçãoindissociáveldeinterdependênciaentresubjetividadeeobjetividade,asquaisseconstituemrecíprocaeperenemente,é,decertomodo,ignoradapeloracionalismoepeloempirismomodernos,nosquaisoraprevaleceasubjetividade,oraaobjetividade,respectivamente.

Seoparadigmadaciênciaclássicanãopermitetomarconsciênciadapróprianoçãodeparadigma,oparadigmadasimplificaçãonãopodetranscender-seasimesmo.Logo,aimposiçãodaescolhaentrealternativaspossíveisétambémumdilemaqueantecedeoconhecimentoeapráticajurídica,definindoafunçãoatri-buídaaestesnasociedade,bemcomoadesuasinstituições,dosjuristasteóricosedosjuristasdeofício.Emsuma,há,portanto,nabasedesseempreendimentoteórico,a constatação inelutáveldaexistênciadeuma relação incindívelentredemocraciaeepistemologia,eumaescolhaindissimulávelaserfeita.

Noplanofilosófico,afirma-seaexistênciadeumacorrelaçãoindissociávelentreasconcepçõessobrecomoohomemconhecearealidadeeasuaaçãonomundo,fenômenocujaexplicaçãoaolongodatrajetóriadopensamentohumanooscilaentreoobjetivismoeosubjetivismo(solipsista).

Vivemosnumaculturacentradanaquiloqueacercadecomooconhecimentoseproduz,e“oproblemacrucialqueahumanidadeenfrentahojeéarealidade”(6). Enquantoaaçãodo indivíduopermaneceemsuaesferadeatuaçãoprivada,aarbitrariedadedasescolhas individuaisentremúltiplasalternativasnãoprestacontasàcomunidade.Contudo,seoindivíduoagenoexercíciodoPoderPúblico,suasescolhasindividuaisentremúltiplaspossibilidadesoualternativassomentesão legitimáveis se coerentes comosprincípioseosobjetivos constitucionais.

(6) MATURANA, Humberto. Ontologia da realidade. Belo Horizonte: UFMG, 2002. p. 243.

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Apardisso,osdiversosmodospossíveisde compreenderaefetivaçãodessesprincípioseobjetivosdevolvemnovamenteaoatorpúblicoamplamargemdediscricionariedade,cujoexercícionãopodemaisserexercidocombasenarazãoindividualsolipsista,aqualdevolveàautoridadeapossibilidadedeescolhasse-gundopreferênciasindividuais,semcomprometimentocomosfundamentosdademocraciacompreendidasegundooparadigmadoEstadoDemocráticodeDireito,especialmenteadignidadehumanaeacidadania.

AsracionalidadeseasracionalizaçõesproduzidaspelarazãoocidentaldesdeoséculoXVIIconstruíramumavisãototalizantedomundoapartirdedadosparciaisedeumprincípioúnico,razãopelaqualempobreceramarealidadeaopretenderfecharoUniversonumacoerêncialógicaouartificial.Procedeu-seaumahomo-geneizaçãoredutoradasdiferenças,queforamrenegadasparaumplanoinferior.

OsistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista,comoinstituiçãosocialconstituídaemconformidadecomaordemjurídicavigente,introduziunaorganizaçãodotrabalhoenaadministraçãodajustiçaumaprofundaconversãoparadigmáticaaoaceitarospressupostosdarazãodialógicaedacomplexidade.Apartirdasestruturastradicionais,propugnaporumnovomodeloderelaciona-mentoparaoEstado(asinstituiçõeseosagentesdoPoderPúblico),deexercíciodoPoderPúblicoedeaplicaçãododireito.Poroutrolado,sobrelevaaatuaçãoeaautonomiadosdestinatáriosdaaçãopública(autonomiasindical)nosentidodaproteçãoàdignidadehumana,dacidadaniaedavalorizaçãosocialdotrabalhoenquantovaloresconstitutivosdaRepúblicabrasileira.Nestestermos,destaca-seoprincípiodasubsidiariedadeativa,peloqualtudoaquiloquepuderserrealizadoeresolvidonaalçadadaautonomiaedanegociaçãocoletivanãosereservaaomonopóliodasinstituiçõesdotrabalho,queassumemfunçãosupletiva.OexercíciodoPoderPúblico,porforçadosparadigmasadotados,implicaaideiadegovernan-çacujotraçodecisivoéorespectivoexercíciocompartilhadoentreautoridades/decisoreseosdestinatáriosdaaçãopública,comênfasenastécnicasdo“diálogosocial”eda“concertaçãosocial”.

Osentidogeraldademocratizaçãopassaaincluiraparticipaçãodosdestinatá-rios(afetados)daaçãodoPoderPúblico(instituições/autoridadesdotrabalho):nagestãodaorganizaçãodotrabalho;naadministraçãodajustiça;nosprocedimentoscognitivosconcernentesàrealidade(princípiodacomplexidade),àescolhadanor-ma,doseusentidoedomodomaisadequadodesuaaplicaçãoaoscontextosderealidadesconcretamenteconsiderados(princípiodarazãodialógica);enofomentoaoplenoexercíciodaautonomiacoletivaedanegociaçãocoletiva,especialmentenoquedizrespeitoàautogestãodaorganizaçãodotrabalho,aaçõesautônomasdeprevençãoeàdisponibilizaçãodemeiosnãojudiciais,autocompositivoseau-tônomos,deresoluçãodosconflitosindividuaisecoletivosdotrabalho.

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Dissoresultaqueàdimensãoprocedimentalqueseatribuiaoprincípiodademocraciaéacrescidaumadimensãosubstancial,traduzidanabuscadaefetivi-dadeedaintegridadedosdireitossociais.Essasinstituiçõesrepresentamoespaçoinstitucionaldotadodeumaconformaçãoorganizacionalejurídicaoriginal,naqualseconcretizamessesconceitos.

Nessesentidoéquesecompreendeainstitucionalizaçãode“segundograu”,ouem“segundonível”(porsetratardeinstitucionalizaçãodeaçõesjáinstituciona-lizadasemprimeironívelemcadaumadasinstituiçõesdotrabalho)dagestãodaorganizaçãodotrabalho,dasaçõescomunicativas,públicaecoletiva,pelosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista,quepassaaserolocusdodiálogointerinstitucional,indispensávelaumapráticademocráticainspiradanosprincípiosevaloresaquipropostosepressupostos.

Uma institucionalizaçãodessetipo respondeaumaconcepção sistêmica(aberta)darealidade,totalizadorae,aomesmotempo,inclusivadosingularedoespecíficoprovenientedosparadigmasaceitos.Emconsequência,elacomportauma teorizaçãoquedesafiaumaabordagemversátile interdisciplinar.Refoge,portanto,dareduçãodoobjetodepesquisaaumtemaespecíficosobreoqualseproduzemconhecimentosverticalizados,segundoosparâmetrosmetodológicosclássicosditadospelomodeloderacionalidadedaciênciamoderna.Esseenfoqueexigeumaampliaçãoeuma investigaçãohorizontalizadaepluridimensionaldoobjetodepesquisa.

Umdosmóbilesdestainvestigaçãofoiacomprovaçãoeocompartilhamentodatesedequeareformadocenárionormativo-institucionaldaorganizaçãodotrabalhocentradaexclusivamentenaaçãoenainiciativadoEstadorequercustosastronômicoseocontornodeinjunçõesdepolíticassetoriaisestratégicasqueinvia-bilizamseudelineamentoconformeosreclamosdoEstadoDemocráticodeDireito.OfracassodoFórumNacionaldoTrabalhoéumexemploeloquentedestaassertiva.Emoutrostermos,paralelamenteàreformadocenárionormativo-institucionaldaorganizaçãodo trabalho,umaoutra reformaque implique transformaçõesnoscódigosenomodus operandi dasinstituiçõesdotrabalhopodeserfeita.So-bretudo,nosentidodeamenizarodéficitdeefetividadedosdireitossociaisedaadministraçãodajustiça.

Estaoutrareformapossívelpoderáserfeitaporumconjuntodecidadãosdetentoresde responsabilidadespúblicas (autoridadesdo trabalho)e coletivas(dirigentessindicais),mesmoqueminoritário,mascomdisposiçãoparademocra-tizarsubstantivamentesuaspráticaseexercercomautonomiasuasatribuições.Aproposta sedirige,especialmente,aosagentesdoPoderPúblicodecarreirapermanentedosquaisasociedadebrasileiramuitopoderáesperar.

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ComaexposiçãoeaelucidaçãodosfundamentosdainstituiçãoedoinstitutodosNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista,assimcomodoconjuntodeconceitos concebidos como instrumentodedemocratizaçãodaorganizaçãodotrabalhoedaadministraçãodajustiça,pretendeu-seapresentarumaalternativaconcretadeaçãonessesentido.

Aexplicitaçãoda crise sistêmicadaorganizaçãodo trabalho realizadanaobraO sistema Núcleo Intersindical de Conciliação Trabalhista — Do fato social ao instituto jurídico: uma transição neoparadigmática do modelo de organização do trabalho e da administração da justiça,abriucaminhoparaaabordagemprocedidanestainvestigaçãoequefocalizaacorrelaçãoentreaepistemologiaeademocracia(elementosendógenosdacrisedaorganizaçãodotrabalho),umavezquefoiobjetodeinvestigaçãoomodocomoamencionadacriseseapresentaemcontextosderealidadecomplexosesingularesdarealidadeemquesedeuacriaçãodoprimei-roNúcleoIntersindicaldopaís.Nessesentidoéqueseincorporouaopresentetrabalhodeinvestigaçãoumaabordagem(dopontodevistateórico)acercadacrisederacionalidadedaorganizaçãodotrabalhoedaadministraçãodajustiça,seguidadeabordagemempíricaemqueseprocuroudemonstraraspectosdesuamanifestaçãolocal,istoé,oscontextosdesurgimentodoNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhistadePatrocínio.

Aconstataçãodofatodequeademocracianãopodemaissesustentarsobreumconjuntodeconhecimentosjárealizadoseimutáveis,masqueseconstróipormeiodeumprocesso cognitivo intersubjetivamente compartilhado, impôsum“retrocessoinvestigativo”àquestãoepistemológica,que,aestaalturadaevoluçãodaconsciênciahumana,éindissociáveldaquestãopolítica.Elapôsemquestãooprópriomodeloderacionalidade,tantodaciênciacomodafilosofiaclássica,queabsolutizouacapacidadedarazãohumana—aprimeiraporfetichizaras“verdadescientíficas”easegunda,oprincípiodofundamentoúltimooudarazãosuficiente.

Atransformaçãoparadigmáticanocampodaepistemologiaexigiu,contudo,fundamentarainsuficiênciadoparadigmaquesepretendesuperar.Poressarazão,ospressupostosepistemológicosdaciênciaedafilosofiamodernasforamopontodepartidadaabordagemqueaquiseconcluieque,deresto,implicaoquestio-namentodosfundamentosepistemológicosdademocraciaedopróprioEstado.

AsustentaçãodateoriademocráticaemquesebaseiaosistemaNinterexi-giutambémumafundamentaçãofilosóficaecientíficadosparadigmasdarazãodialógicaedacomplexidadequeoorientam.AinterseçãodasteoriasdiscursivasdeKarl-OttoApele JürgenHabermas coma teoriada complexidadedeEdgarMorinconfirmamopensamentodePiagetnosentidodeumavisãoconstrutivistadoconhecimentohumano,apartirdessesnovosparadigmas.Elas indicamquearazãoéevolutivaeaindavaievoluir.Revelamqueomodeloderacionalidade

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tradicionalnãodácontadacomplexidadedoreal,dodiálogoedasolidariedadeuniversal indispensávelàsobrevivênciadahumanidade.Deresto,essemodelotambémnãoécapazdeorientaraaçãopúblicaporumaéticaderesponsabilidadeedesolidariedadequesevolveparaasconsequências,enãoparaasintençõesdoagirhumano.

Aquestãoepistemológicaconstituiumadimensãoessencialàconstruçãoteó-ricadeumprincípiodedemocraciacomprometido,porumlado,comaefetividadedosdireitosfundamentaise,poroutro,comasuperaçãodasincongruênciasdosistemaderelaçõesdetrabalho.Uma“razãosituada”,contextualizada,conformadapelalinguagem,pelodiálogoepeloprincípiodacomplexidadelegitimaoatodeautoridadeperpetradopelasinstituiçõespúblicas,queé,aumsótempo,umatodeconhecimentoeumatodevontade,osquaisseinterferemreciprocamente.Teoriaearealidadeseconstituemreciprocamente,sendo,portanto,indissociáveis.

Umaquestãoqueemergeimediatamentedessatransformaçãoparadigmá-ticadizrespeitoàperguntasobreaaptidãodosistemaNinterparademocratizarosistemaderelaçõesdetrabalho,cujarespostanãosetornapossívelcomousoderecortesmetodológicossimplistas,queignoramquestõesadjacentesaoutrasáreasdeconhecimentoouasincongruênciassurgidasnalinhalimítrofeemqueseoperouo“recorte”.

Nocampodagestão localdaorganizaçãodotrabalhoedaadministraçãodajustiça,essaquestãoprecisaserencaradasoboenfoquedeumaconcepçãosistêmicadaatuaçãodoconjuntodeinstituiçõespúblicaseentidadesderepre-sentaçãoprofissionaleempresarial,porsetorouramodeatividadecoletivamenteorganizado.IssoporqueosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhistaconvergeemtornodoconjuntodestasinstituiçõesparapotencializarsuasaçõesnumambiente institucionalpropício ao somatóriodos respectivosesforçosefunções,tantoquantoacapacidadedeaçãoexternadecadaumadelasassimopermita.Issosomenteépossívelse,deumlado,ospressupostosepistemológicosadotadospermitemtalconcepçãoe,deoutro,existemprocedimentosinstitucio-nalizadoseumaorganizaçãocapazdeviabilizarodiálogosocialeaconcertaçãosocialnecessáriosaoalcancedesseescopo.

Estaabordagemserevelaindispensávelporqueajustificaçãodatransforma-çãoparadigmática,assimcomoaafirmaçãoecontextualizaçãoteórico-pragmáticadosnovosparadigmasdarazãodialógicaedacomplexidadenateoriadosistemaNinter, constituio substrato teóricopressupostonaelaboraçãodos conceitosoperacionaisqueorientamaspráticas (concreçãodoprincípiodedemocracia)concernentesaoconjuntodasfunçõesinstitucionaisdosistemaeelucidamamul-tiversatilidadeoperacionaldosconceitosquecompõemoprincípiodedemocraciaquelhedásentido.

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Impõe-se a imediata abdicaçãoda teoria formal dedemocracia, que se assenta no princípio da representação e se restringe aos processos de decisão política, substituindo-aporuma teoria substancial, capazdeconferirumnovosentidoaoexercíciodopoderpúbliconasesferasadministrativaoujurisdicional.Essaopçãoobrigouaumaanálisedacrisedodireitoesuacorrelaçãocomacrisedosparadigmasdaciênciaedafilosofiaclássicas.Talpontodevistadeslocaoproblemadademocraciatambémparaomomentodaaplicaçãododireito,emrazãodaconexãoestabelecidaentreasquestõesepistemológicaedemocrática,envolvendoosatoscognitivosquefundamentamadecisãopública.

Porfim,comoaperspectivacentraldaéticaderesponsabilidadequeorientaosentidodoprincípiodemocráticoaserconstruídoéadaefetividadedalegis-laçãotrabalhista,ainvestigaçãoprocedeuaumlevantamento,poramostragem, dedadosempíricos edeelementospraxiológicos expressivosdos resultadosapresentadospeloNúcleo IntersindicaldeConciliaçãoTrabalhistadePatrocínionointerregnoquevaide1994a2012.Aapresentaçãodosefeitosdesuaatuaçãovisademonstraraaptidãodetalinstituiçãoparainterviretransformarasrelaçõesdetrabalhoafetasàsuaáreadeatuação.Alémdisso,legitimarsuaatuaçãopelosresultados alcançados.

AcompreensãoneoparadigmáticadosfundamentosconstitucionaisdaRe-pública,daatuaçãodasinstituiçõesdotrabalhoedapráticajurídica,noentanto,comportao riscodas interdiçõesprovenientesdeuma leitura sedimentadanasimplificaçãoenareduçãoprópriasdométodocientificistaque,noDireito,cor-respondeàtradiçãopositivistanaqualseinscrevenossaculturajurídica,deformamitigadaounão.

Porisso,ébempossível,numprimeiromomento,quenãosealcancea“cla-dogênese”(reorganizaçãodasestruturasdopensamento)necessáriaàapreensãodosentidoparadigmáticodaestrutura,daorganizaçãoedomododeoperardosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista,bemcomodoconjuntodasatividadesqueocaracterizam.Cuida-se,noentanto,dacondiçãodepossibi-lidadedaaveriguação,corroboraçãoou falseamentodahipóteseafirmativadesuaaptidãoparapromoverademocratizaçãodaorganizaçãodo trabalhoedaadministraçãodajustiçanorespectivoâmbitodeatuação.

Cumpre,ainda, instar,comWittgenstein,paraa função imprescindíveldoanúnciodestesparadigmasedomodocomoelesinfluenciamodirecionamentodestainvestigação.Comisso,explicita-seo“jogodelinguagem”aelasubjacente,sejanadescriçãoenaproblematizaçãodoscasosestudados,sejanacompreen-sãodoscontextosderealidadequeinvoca,bemcomonaconstruçãodosentidoqueaquiseemprestaaoprincípiodedemocraciaenabuscadasoluçãoparaoproblemaproposto.

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Domesmomodo,ateoriademocráticaqueorientaaspráticasinerentesaosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhistaimplicaapossibilidadedeexplicitaçãoporpartedequalquerautoridadepúblicanoexercíciodesuasfunçõesinstitucionais—emprocedimentosdiscursivoseinstitucionalizadosdestinadosaessefim—doquadrodereferênciacomoqualrealizasuasescolhasdiscricionáriasnoexercíciodoPoderPúblico.Adensificaçãodoprincípiodedemocraciaintegral,aquiesposado,induz,portanto,anecessidadede“fundamentarofundamento”emquesebaseiaaatuaçãodoPoderPúblico,nainterpretaçãoenaaplicaçãodalei.Aissocorrespondeaindicaçãodoprincípioconstitucionalemquesesustentaaexplicaçãodesuarelaçãocomosargumentosquesustentamadecisãoouaaçãopública.

Émuitoprovávelquenoplanodeumaéticadeintençõesvenhaaconstatar--sequeamaioria,outodososenvolvidosnaorganizaçãodotrabalho,persigamosmesmosobjetivos:efetividadeda legislaçãotrabalhista,melhoriaqualitativadasrelaçõeslaborais,desenvolvimentosocialeeconômicosemabstraçãodasuainterdependêncianaequaçãodajustiçasocialetratamentoaosatoresdaprodução(trabalhadoreseempreendedoresdeboa-fé)emconformidadecomoprincípiodadignidadehumana,queéfundamentodoEstadobrasileiro(art.1º,CF/88).

Todavia,noplanodeumaéticaderesponsabilidadeesolidariedade,ater-seaocampodasintençõessignificadar-seporlegitimadosquaisquerresultadospossíveisdaaçãopública,mesmoosmaisdesastrososdopontodevistasocioeconômicoedaefetividadedosdireitossociais.Frequentemente,asmesmasintençõesproduzemresultadoseconsequênciasantagônicos.MasosresultadossomenteselegitimamseconcorremparaaconcreçãodoprojetodesociedadedefinidonaConstituição.

ÉnessecontextoqueseproblematizaademocratizaçãodaorganizaçãodotrabalhoedaadministraçãodajustiçaemnossopaíseseprocuraapresentarainstituiçãodosNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhistacomoalternativaviávelparaoalcancedesseobjetivo.Busca-seumconceitosubstantivodedemo-craciaeumaéticabaseadanaresponsabilidadeenasolidariedadeentretodososenvolvidos:agentesdoPoderPúblico(instituiçõesdotrabalho)edestinatáriosdaaçãopública(sindicatos).

Oprincípiodedemocraciaaquipreconizadodesigna-sepordemocraciainte-gral.Aelesededicaestetrabalho,traduzindo-o,dopontodevistainstitucionaledasestratégicasindispensáveisàsuaconcretização,nosistemaNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhista.

Nestes termos:

Considerandoqueaorganizaçãodo trabalho foi concebida segundooparadigmadoEstadoautoritário-intervencionista,oqualinformaacultura,oscódigosdecondutaeomodus operandi das instituições/autoridadesdotrabalho;

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Considerandoqueosprincípiosconstitucionaisdadignidadehumanaedacidadania—fundamentosdoEstadoDemocráticodeDireitoadotadonaConstituiçãode1988—devempresidirasrelaçõesentreoPoderPúblicoeasociedade;

Considerandoacrisedomodeloderacionalidadequepresidiuacon-cepçãodoEstadoModerno(paradigmaepistemológicodafilosofiadaconsciênciaedaciênciaclássica)eaadoçãodosparadigmasdarazãodialógicaeda complexidadecomopressupostosepistemológicosdaaçãohumanaemgeraledaaçãopública(dimensãocognitiva)apresenteinvestigaçãodesafiaàseguintequestão:

OsistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista,noâmbitodasrespectivascategorias,podecontribuirparaademocratizaçãodaorganizaçãodasrelaçõesdetrabalho?

Amultivocidadedoconceitodedemocracia(ededemocratização),noentan-to,tornaousodaexpressãovagoesemsentido.Totalitarismosforamconsiderados,historicamente,comodemocracia;asimplesexistênciadeleisedeinstituiçõesderepresentaçãoedeaplicaçãododireitocaracterizaademocraciarepresentativa;domesmomodoqueseatribuiuàágoraeàisegoría(7) ateniensesosentidomaisgenuínodedemocracia.Porissoque,umavezcriado,teoricamente,osentidodoprincípiodedemocraciacaracterísticodosistema,explicitaram-seconceitoscujaexplicaçãoderivadasseguintesquestões:

•Qualéosentidodoprincípiodedemocracia imanenteaosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista,considerandoosfun-damentosdoEstadoDemocráticodeDireitoinscritosnaConstituiçãoFederal(princípiosdadignidadehumana,dacidadania,davalorizaçãodotrabalho,dalivre-iniciativaedopluralismo),compreendidosàluzdosparadigmasdarazãodialógicaedacomplexidade?

• Dopontodevistapragmático,comqueconceitosinstrumentaisedequeformaosistemaNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhistainsti-tucionaliza,operacionalizaereúneesforçosdasinstituiçõesdotrabalho(sindicatosepoderpúblicoadministrativooujudicial)parademocratizaragestãodaorganizaçãodotrabalhoedaadministraçãodajustiça;alcançaraefetividadedosdireitossociais;legitimaraaçãopública?

• ComoseestabelecenosistemaNúcleos IntersindicaisdeConcilia-çãoTrabalhistauma relaçãoharmoniosae intercomplementarentre

(7) Direito de falar e de ser ouvido na assembleia dos cidadãos (antiga Atenas).

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asautonomiaspúblicaecoletiva,estaúltimacompreendidaàluzdoprincípiodasubsidiariedadeativa(comosubconceitodoprincípiodedemocracia),semocomprometimentodasprerrogativasinstitucionaisdasinstituiçõesdotrabalhoedossindicatos?

• DequemodoaspráticasquerealizamoprincípiodedemocraciaqueinformaosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhistapro-porcionamumacompreensãosistêmicae,aomesmotempo,dinâmicaeabertadosproblemastrabalhistas(concretaelocalmenteidentificados)?

• Considerandoquetodaaçãohumanae, ipso facto,aaçãopúblicacompreendemumadimensãoética,quaisimplicaçõesmoraisdecorremda compreensãodoprincípiodedemocraciaqueorientao sistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista?

• Que resultados concretosoriundosdaexperiênciaprototípicadoNúcleo IntersindicaldeConciliaçãoTrabalhistadePatrocíniopodemser tomadoscomo reveladoresdaeficáciaedaspotencialidadesdosistemanocumprimentodeseuspropósitosinstitucionaisdepromo-verademocratizaçãodasrelaçõesdetrabalhosegundooprincípiodedemocraciaaquierigido?

• Considerandoosdesafiosinerentesaosprocessosdetransformaçãoparadigmáticaecultural,especialmenteoprocessodedemocratizaçãopropugnadopelosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTraba-lhista,assimcomoadimensãopragmáticanecessáriaàlegitimaçãodetodateoria,queestratégiasdefomentoesuporteàcriaçãoeaodesen-volvimentodessasexperiênciassãosuscetíveisdeseremconcebidaseimplementadascomtaisfinalidades?

Assim,oobjetivogeraldesta investigaçãoédemonstrar, teóricaeempi-ricamente,aaptidãoeaspotencialidadesdosistemaNúcleos IntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhistaparapromoverademocratizaçãodosistemaderelaçõesdotrabalho—gestãocompartilhadadaorganizaçãodotrabalhoedaadministraçãodajustiça(sistemaderesoluçãodeconflitos)—norespectivoâmbitoderepresentaçãocategorial.Emconsequência,pretende-sedemonstrarqueoreferidosistema,deumlado,atendeàspremissaseaosobjetivosdaReformaTrabalhistae,deoutro,mostra-se, teóricaeoperacionalmente, capazdeconferirmaiordensidadeaosprincípiosconstitucionaisdoEstadoDemocráticodeDireito.Elegeram-seobjetivosespecíficosafimdeseexplicitar:a)aconexãoentreosprincípios,regraseconceitosquedãosustentaçãoaosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista—compreendidocomoinstituiçãosocialecomoinstitutojurídicoautônomo—eainstitucionalizaçãodoconjuntodesuasfunçõeseosproblemasqueamotivaram;

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b)osnovosparadigmaseosfundamentospolítico-filosófico-constitucionaisqueinformamosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista;c)aspoten-cialidadesdestasinstituiçõesparaconferirmaiorefetividadeaosdireitossociaisnasrespectivasáreasdeinfluência,demonstradaspelosresultadosdecorrentesdaatuaçãodoNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhistadePatrocínio/MG,bemcomodelegitimar,porseusresultados,ateoriaepráticadaquelainstituição;ed)opapelaserdesempenhadopelosNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhistanoprocessodedemocratizaçãodosistemaderelaçõesdetrabalhonoBrasil;e)osresultadosdaexperiênciamatricialdoNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTraba-lhistadePatrocínio/MG,comaduplafunçãodedemonstrarapossibilidadedeumareformaculturalesuasconsequênciasedeservircomoelementolegitimadordateoriaedesuaspráticasinstitucionaisorientadasporumaéticaconsequencialista.

Umabrevereferênciaàmetodologia:

NapresenteobraeemO sistema Núcleo Intersindical de Conciliação Trabalhista — Do fato social ao instituto jurídico: uma transição neopara-digmática do modelo de organização do trabalho e da administração da justiça, aaceitaçãodosprincípiosdarazãodialógicaedacomplexidadefoideterminantenadefiniçãodométododetrabalho.

Daescolhaepistemológicaqueestánabasedainvestigação,resultanatu-ralmenteoesforçodereconstruçãodarelaçãorecursivaereflexivaentrerazãoerealidade,descritanosmoldesdeumateoriasituadanaexperiênciaconcretaeconstruídacomeapartirdela.Acomplexidadeinduzotratamentodoobjetoinvestigadoemtodaasuaextensãopossível,ouseja,trata-senecessariamentedeumaabordageminterdisciplinare,porvezes,transdisciplinar,naqualseconjugamincursõesnocampodaFilosofia(especialmentenoâmbitodaEpistemologia,daFilosofiadaCiênciaedaFilosofiadaLinguagem),doDireito(FilosofiadoDireito,DireitoConstitucionaledoTrabalho),daSociologiaedaSociologiadoDireito,daHistóriaedaCiênciaPolítica.

AinvestigaçãopartedeumníveldeobservaçãodesegundograunosentidoquelheconfereMaturanaemOntologia da realidade —“observaçãodeobserva-doresqueseobservamreciprocamente”,motivopeloqualosconstrutosteóricosdelaresultantessãoelesprópriosreconstrutivosdoobjeto de estudo. Ao procurar elucidaredar consistência teóricaàspráticas institucionaisdo sistemaNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhista,ateoriailuminanovamenteapráticaeoporvir.Porém,admitidaessarelaçãoindissociávelentreteoriaeprática,estesdoiselementosnãopodemserdestacadosdarelaçãoentreossujeitos(instituições)históricos responsáveispela criaçãoda instituiçãomatricialdo sistemaNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhistadePatrocínio. Impõe-seaindaabordaropapel desses atores (ação), emestreita conexão comosdesenvolvimentos

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teóricose crítico-descritivosdaspráticas inerentesao sistema, considerandoa premissaepistemológicadaconstruçãosocial(dialógica)darealidade,quenãoé,portanto,umdado,masumfenômenoevolutivo,emquesetransformamsimul-taneamentearealidadeeaconsciênciadossujeitosquenelaseinserem.

Importantenotarqueaquestãoepistemológicaantecedeàproblemáticadademocratizaçãodaorganizaçãodetrabalho,porqueelaconstitui,aoladodosprincípios constitucionaisque fundamentamo sistema, fatordeterminantedareconstruçãodoprincípiodedemocraciadequesevaleosistemaNinter.

Emsíntese,aprimeiraobradesteautoraquesereferiucontemplaelementosindispensáveisàcontextualização,nestaobra,daabordagememqueseexplici-tam:a)omodeloderacionalidadefundadonarazãodialógicaenoprincípiodacomplexidadecomoqualsebuscasuperaraslimitaçõesdaciênciaedafilosofiaclássicanoâmbitodaorganizaçãodotrabalhoedaadministraçãodajustiça;b)embrevereferência,atrajetóriadacrisedafilosofiadesdeoabandonodabuscadofundamentoúltimo,oudeum“argumentocoercitivo”(filosofiadaconsciência),aoreconhecimentodanaturezadialógicadarazão(filosofiadalinguagem);c)aspremissasparaaconstruçãodoprincípiodedemocraciasubjacenteàteoriaquesustentaosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhistaearecons-truçãoeelaboraçãodenovos“conceitosoperacionais”(queorientamaprática)paraademocratizaçãodaorganizaçãodotrabalhoedaadministraçãodajustiçanostermosdeumademocraciaintegral;d)teóricaeempiricamente(mediantelevantamentodosresultadosdoNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhistadePatrocíniotomadoscomoamostragem),aaptidãodosistemaNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhistaparapromoverademocratizaçãodaorganizaçãodotrabalhoedaadministraçãodajustiçanosrespectivosâmbitosdeatuação.

Aofimeaocabo,esta investigaçãodevolve seus resultados,outravez, àreconsideraçãodialógicade todosos interessadosnaorganizaçãodo trabalho,sejacomoobservadores,sejacomoseusatores,todos,porém,integrantesdestetrabalhodeconstruçãosocialdarealidade.

NoCapítulo1destacam-seasbasesteóricasindispensáveisàapreensãodoprincípiodedemocraciaqueinspiraosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista;caracteriza-seatransiçãoparadigmática;lançam-seosfundamentosda transiçãoparadigmáticadomodelode racionalidadebaseadonafilosofiadaconsciênciaparaomodeloderacionalidadefincadonarazãodialógicaenoprincípioda complexidade;estabelecem-seospressupostosepistemológicosepolítico-constitucionaisdosquaisemergemosconceitosdegovernançaedesub-sidiariedadeativainerentesaoprincípiodedemocraciacaracterísticodosistema;redefinem-seasfunçõesdaautonomiacoletivaàluzdetaisconceitos.

NoCapítulo2desenvolvem-seosconceitospragmático-operacionaisquedãoconcreçãoeorientamasatividadeseaspráticasinstitucionaisdosistema;procede-

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-seàreconstruçãodosconceitosdejurisdição,de“governança”,detripartismo,de“diálogosocial”ede“concertaçãosocial”,bemcomoàdensificaçãodosentidodosprincípiosdadignidadehumana,dacidadania(subsidiariedadeativa)edapartici-pação;desenvolvem-seosconceitosoperacionaisinovadoresde“tripartismodebase”,de“açãopúblicacomunicativa”(subdividoemaçãopúblicacomunicativacognitivaeaçãopúblicacomunicativasuasória),de“açãocoletivacomunicativa”,de“jurisdiçãocomunicativa”,de“negociaçãocoletivaconcertada”ede“regimetrabalhistaespecial”,comoconceitosinstrumentaisindispensáveisàexplicitaçãodoprincípiodedemocraciaaquierigidoe,consequentemente,àfundamentaçãodoconjuntodasfunçõeseserviçosinstitucionalizados;edesenvolve-seumate-oriaexplicativadarelaçãodesubsidiariedade,deintercomplementaridadeedecoexistencialidadedosmeiosjudiciaisedosmeiosnãojudiciaisderesoluçãodeconflitosinstituídosnosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista.

Osreferidoscapítulos,conjuntamenteconsiderados,lançamosfundamentospolítico-filosóficosdosistemaNúcleosIntersindicaisdeConciliaçãoTrabalhista.

NoCapítulo3,procede-seaolevantamentodosresultadosconcretosalcança-dospeloNúcleoIntersindicaldeConciliaçãoTrabalhistadePatrocínionointerregnocompreendidoentre1994e2012,noscamposdanegociaçãocoletiva,dagover-nança(diálogoeconcertaçãosocial),daadministraçãodajustiçaedaefetividadedosdireitossociais,comoconsequênciadaspremissasepistemológicasadotadaseparaatenderaosreclamosdeéticaderesponsabilidadeesolidariedadecomoúnicafontedelegitimaçãodaciênciaaquiconstruída.Ocapítuloresultatambémdo reconhecimentoda interdependênciaentreo conhecimentoeaação,edaindispensávelconexãoentreteoriae prática.

Seaquiloqueécomplexoéincognoscívelemsuaplenitude,pode-seapenasansiarporumamaiorfamiliaridadecomele.Diantedessalimitação,aceita-searazãodialógicacomoúnicaalternativametódicaviávelparasustentarumprincípiodedemocraciaconsistente,enãopuramenteformal.

Estetrabalhodeinvestigaçãoserveentãocomorespostaaobjeçõesoriundasdeavaliaçõescalcadasnummodeloderacionalidadeinsuficienteparaumarefle-xãoqueprecisaserfeitanecessariamenteforadoslimitesestritosdametódicacientífico-formaltradicional.

Elarequerumadialógicaeumadialéticatransparadigmática.

Apresente investigaçãotem,portanto,afunçãoconstitutivade inaugurarumateoriaabrangente,apartirdaqualsedescortinaumadialógica-dialéticasemvezosdeconclusãoacercadainstituiçãoemquestãoedosparadigmasapartirdosquaiseleseconstitui.