pororoca, pipoca, paca

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POROROCA, PIPOCA, PACA E OUTRAS PALAVRAS DO TUPI M a r c o s B a g n o e O r l e n e L ú c i a S . C a r v a l h o

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Page 1: Pororoca, PiPoca, Paca

Pororoca,PiPoca,

Paca e outras Palavras do tuPi

Marcos bagno e orlene Lúcia S. Carvalho

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Direitos reservados àParábola EditorialRua Dr. Mário Vicente, 394 - Ipiranga04270-000 São Paulo, SPpabx: [11] 5061-9262 | 2589-9263 | fax: [11] 5061-8075home page: www.parabolaeditorial.com.bre-mail: [email protected]

Todos os direitos reservados. nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão por escrito da Parábola Editorial Ltda.

isBn: 978-85-7934-090-1

© do texto: Marcos Bagno & Orlene Lúcia de Sabóia Carvalho, 2014.© da edição brasileira: Parábola Editorial, São Paulo, maio de 2014.

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTESINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

B134p

Bagno, Marcos, 1961-Pororoca, pipoca, paca e outras palavras do tupi / Marcos Bagno, Orlene

Lúcia de Sabóia Carvalho ; ilustrações Luiz F. Amorim. - 1. ed. - São Paulo : Parábola Editorial, 2014.

160 p. ; 23 cm (Poranduba ; 1)

Inclui apêndiceInclui índiceISBn 978-85-7934-090-1

1. Língua tupi-guarani - Estudo e ensino. I. Carvalho, Orlene Lúcia de Sabóia. II. Amorim, Luiz F. III. Título. IV. Série.

14-11238 CDD: 498.3829 CDU: 811.87

Capa e projeto gráfiCo: Telma Custódio

revisão: Karina Mota

ilustrador: Luiz F. Amorim

imagens de Capa: Banco de imagens - 123RF

foto dos autores: Dora Galesso

editora afiliada

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SuMário

abacaxi, 15açaí, 15-acanga, 16acará, 17-açu, -guaçu, -uçu, 18aipim, 19Anhangá, 19anu, anum, 20ara-, 20araçá, 21Araci, 22arapuca, 22arara, 23arataca, 23ariranha, 24

babaçu, 25baiacu, 25biboca, 25boi-, -boia, 26Boitatá, 28buriti, muriti, 29

caa-, ca-, 31caiçara, 32caipira, 33cajá, 33caju, 34capixaba, 35capoeira, 36

caramuru, 36carapanã, 36carioca, 37catapora, 37-catu, 37cauim , 38Ceci, 39cipó, 39Coaraci, Guaraci, Quaraci, 39cobaia, 40coivara , 42coroca, 42cuia, 43cunhã, 44cupim, 44curumim, 45Curupira, 46cururu, 46cutia, 47cutucar, 48

embira, 49-etê, 50

graúna, 51guabiru, gabiru, 51guará1, 52guará2, 53guariba, 53guri, 53

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Iara, 55-iba, - iva, -uba, -uva, 56igapó, 56igarapé, 56ipê, 57Iracema, 58ita-, 58

jaburu, 61jabuti, 62jacarandá, 62jacaré, 63Jaci, 64jaguar, 64jandaia, 66Jandira, 66jararaca, 66jenipapo, 67jerimum, 68jiboia, 68jirau, 69-juba, 69juçara, 70jurema, 70jururu, 71

macaxeira, 73Maíra, 73maitaca, 73mandacaru, 74mandioca, 75maracá, 77maracanã, 78maracujá, 79maruim, 80

mingau, 80mirim, 81Moacir, 81mocó, 82Moema, 82moquém, 83morubixaba, 83muçum, 84muiraquitã, 84muquirana, 85muriçoca, 85mutuca, 85mutum , 86

nhandu, 87nhe-nhe-nhem, 87

-obi, 89oca, 90

paca, 91paçoca, 91pacova, pacová, pacoba, 92pajé, 92panapaná, 93panema, 94pará, paraná, 95peba, 97peitica, 98pequi, 99pereba, 99perereca, 100Peri, 100peteca , 100piaba, 101

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piaçaba, piaçava, 101pindaíba, 101pipoca, 102pirá, 103-piranga, 106piranha, 107pirarucu, 108pitanga, 108pitiú, 109pitu, 109pixaim, 109pororoca, 110poti, 111-pueira, 112

-rana, 115

sabiá, 117saci, 118sagui, 119sapê, 119sapecar, 120sarará, 120sariguê, 121saúva, 122seriema, 123siri, 124soroca, 125suaçu, 125

sucuri, 126sururu, 127

taba, 129tamanduá, 130tambaqui, 131tapioca, 131tapir, 132taquara, 133tatu, 134taturana , 134-tiba, -tuba, 135-tinga , 136tipiti, 136tipoia , 137tiririca, 137tocaia, 137traíra, 138tucunaré, 138Tupã, 139

-una, 141urubu, 141urucum, 142

Vupabuçu, 143

xará, 145xerimbabo, 145

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PriMEiraS PaLaVraS

Quando os portugueses desembarcaram por aqui, em 1500, existiam no Brasil centenas de povos indígenas que falavam também centenas de línguas diferentes. Até hoje, aliás, são

mais de 190 as línguas indígenas faladas em nosso país. Uma dessas línguas, no entanto, se tornou muito importante como elemento de comunicação inicial entre os europeus e os índios: o tupi. O tupi era falado principalmente na costa brasileira, a primeira região do Brasil ocupada pelos colonizadores portugueses.

Temos uma primeira descrição dessa língua feita pelo padre José de Anchieta, que publicou em 1595 um livro chamado Artes de gra­mática da língua mais usada na costa do Brasil. Anchieta e os outros padres que vieram impor a religião cristã aos índios se serviram do tupi para escrever peças de teatro e hinos com temática religiosa.

O tupi serviu de base para a criação e difusão de duas “línguas gerais”, uma na região Norte e outra no Sudeste (principalmente São Paulo). Essas línguas eram faladas não só pelos índios, mas também pelos europeus e principalmente pelos filhos nascidos da união de portugueses com índias, o que era muito comum porque os coloniza-dores eram quase exclusivamente homens. Com isso, o português foi durante muito tempo uma língua de poucos, já que a maioria da po-pulação se valia do tupi ou das línguas gerais. Em 1694, por exemplo, o padre Antônio Vieira escreveu numa de suas cartas: “É certo que as famílias dos portugueses e índios de São Paulo estão tão ligadas hoje umas com as outras que as mulheres e os filhos se criam mestiça e do­mesticamente, e a língua que nas ditas famílias se fala é a dos índios, e a portuguesa a vão os meninos aprender à escola”.

A língua geral paulista foi levada para o interior pelos bandeiran-tes, que tinham pouca familiaridade com o português. Por isso te-

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mos tantos nomes de lugares (rios, morros, cidades etc.) de origem tupi em regiões onde a língua não era falada: foram nomes dados pelos bandeirantes em suas incursões Brasil adentro. Aos poucos, no entanto, o português foi ganhando mais espaço, a Coroa portuguesa proibiu que o ensino fosse feito em língua indígena, e a língua geral paulista deixou de ser falada, mas, segundo alguns estudiosos, deixou muitas marcas no chamado “dialeto caipira”, que é o modo caracte-rístico de falar dos habitantes da zona rural do Sudeste e de parte do Centro-Oeste.

A língua geral amazônica até hoje é falada por comunidades no estado do Amazonas, às margens do rio Negro e de seus afluentes. Ela se chama nheengatú, “a fala bonita”, e é uma das quatro línguas oficiais do município de São Gabriel da Cachoeira, juntamente com o português, o tucano e o baniua.

Muitas pessoas costumam fazer referência a uma “língua tupi-gua-rani”, mas esse nome não é correto, já que essa língua não existe. Os estudiosos chamam de tupi-guarani uma família de línguas, ou seja, um grande conjunto de línguas diferentes, mas aparentadas entre si. O tupi da época colonial não é mais falado atualmente, mas existem ainda hoje no Brasil diversas línguas descendentes dele faladas em várias regiões por diferentes grupos indígenas. O guarani, por sua vez, é outra língua, falada por comunidades indígenas brasileiras da região Sul e, principalmente, pelos nossos vizinhos paraguaios: ao lado do espanhol, o guarani é uma das línguas oficiais do Paraguai, utilizado por toda a população do país e ensinado nas escolas. Sendo da mes-ma família, o tupi antigo e o guarani moderno apresentam muitas semelhanças. Por isso, é muito provável que os nomes de lugares da região Sul do Brasil atribuídos ao tupi sejam, na verdade, derivados do guarani. Mesmo assim, vamos citar neste livro alguns desses no-mes de lugares, já que todos nós, brasileiros, somos herdeiros de um patrimônio indígena comum.

A importância do tupi na formação do português brasileiro é enor-me. Centenas e centenas de palavras do tupi fazem parte hoje da nossa língua diária, muitas vezes sem que a maioria das pessoas se

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dê conta. Por isso, escolhemos aquelas que nos pareceram mais in-teressantes, principalmente as que trazem aspectos curiosos ou que fizeram surgir expressões bem brasileiras, como “estar na pindaí-ba”, “chorar as pitangas” ou “abraço de tamanduá”. Incluímos tam-bém neste livro alguns nomes de pessoa muito comuns, quase sem-pre criados por escritores, inspirados em palavras do tupi: Iracema, Moacir, Jandira etc.

Para facilitar a localização das palavras de origem tupi menciona-das, criamos, no final do livro, um índice geral com todas elas, incluin-do, os nomes de lugar e os nomes de pessoa.

Nós aprendemos muito enquanto preparávamos este livro e nos encantamos com as nossas descobertas. Esperamos que você tam-bém se interesse em conhecer cada vez mais a rica herança que rece-bemos dos nossos antepassados indígenas.

Marcos BagnoOrlene Lúcia S. Carvalho

Brasília, primavera de 2014

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SobrE a TranSCriÇÃo daS PaLaVraS do TuPi

Para transcrever as palavras de origem tupi, fizemos algumas op-ções gráficas que se guiaram pelos objetivos didáticos deste li-vro. Assim, merecem atenção as seguintes grafias:

ï – representa uma vogal inexistente em português, intermediária entre [u] e [i]. Por isso, as palavras que continham ï foram apor-tuguesadas ora com U, ora com I: Ipanema (no Rio de Janeiro) e Upanema (no Rio Grande do Norte), de ïpanema, ‘água ou rio ruim, imprestável’ (para a pesca ou a navegação, por exemplo).

i ̯– representa o som da letra I em palavras como ioga ou Iara. Em tupi não existia o som que representamos com a letra J, mas mui-tas palavras que continham i ̯foram aportuguesadas com J: ia̯u̯otí (‘jabuti’), marakuiá̯ (‘maracujá’).

u̯ – representa o som da letra U em palavras como guarda ou Mauá. Em tupi não existia o som [b] nem o som [v], mas muitas palavras que continham u̯ foram aportuguesadas com B ou V: péu̯a, ‘chato, plano’, presente em Itapeva (‘pedra achatada’) e Boipeba (‘cobra achatada’), por exemplo.

s – representa sempre o som [s], como em só, mesmo entre duas vo-gais (e nunca o som [z], que não existia em tupi). Assim, arasá deve ser lido como “araçá”.

x – representa sempre o som da letra X em xixi.(˜) – o til sobre as vogais indica som nasal, como em fã. Todas as vogais

podem receber o til, e não somente o A e o O, como na ortografia do português.

(´) – usamos o acento agudo para indicar a sílaba tônica das palavras oxítonas ou sempre que achamos necessário, para facilitar a leitu-ra. As palavras não acentuadas são paroxítonas.

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abaCaXi Tupi ïu̯á ‘fruta’ + katí ‘que tem cheiro forte’ (katí é uma forma provável)

Os viajantes que estiveram no Brasil, nos primeiros séculos, usavam a palavra ananás. Até o século XIX, nos textos escritos só aparece ananás, que também é uma palavra de origem tupi: naná. Por isso, a palavra abacaxi só é usada em português, enquanto em outras línguas a fruta é conhecida como ananá (espanhol, mas também piña), ananas (alemão, francês, italiano, russo), ananasz (húngaro) etc. Também o nome científico do abacaxi (Ananas comosus) deixa claro o uso mais recente da palavra.

Como esta fruta é difícil de descascar, principalmente por causa da casca espinhosa e dura, passamos a chamar de abacaxi uma situação difícil, um problema complicado. Daí vem a expressão “descascar um abacaxi”, isto é, “resolver um problema difícil”.

aÇaÍ Tupi ïu̯asaí

O açaí é um fruto pequeno de cor roxa, que tem bastante suco e é rico em vitaminas. O açaizeiro, uma palmeira que pode chegar a 25 metros de altura, é encontrado na região Norte, geralmente nas margens de rios. Para colher o açaí, é preciso subir no açaizeiro

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com ajuda de uma peconha, um trançado de folhas, saco ou corda, usado para apoiar os pés. Usamos o açaí para fazer sucos, doces, sorvetes e o famoso “açaí na tigela”. Do açaí também se extrai o palmito. As sementes são usadas no artesanato e as folhas, no te-lhado de casas.

Na comitiva da grã-duquesa austríaca Leopoldina, que iria se casar com o príncipe herdeiro D. Pedro, futuro D. Pedro I, vieram viajantes para estudar e coletar plantas, animais e minerais. Entre eles, esta-va o naturalista alemão Carl Friedrich Philipp von Martius, que deu o nome científico do açaí: Euterpe oleracea.

-aCanGa Tupi akanga ‘cabeça’

O cocar usado pelos índios era chamado acangatara ou canitar. E para designar o desânimo o tupi usava akangu̯ḯra, ‘cabeça baixa’, uma noção parecida com a da nossa palavra cabisbaixo, “de cabeça baixa”.

A onça-pintada, o maior felino das Américas, também é chamada de canguçu, palavra derivada de akangusú, ‘cabeça grande’. Essa mesma palavra é um dos muitos sinônimos que existem no portu-guês brasileiro para se referir ao “caipira”.

Tapanhoacanga é o nome de uma rocha muito rica em ferro, encon-trada no sertão de Minas Gerais. É formada de tapuïúna (‘homem negro’) e akanga (‘cabeça’), “cabeça de negro”: as pedras são mui-to escuras e redondas, lembrando a cabeça de uma pessoa negra. Como no Brasil originalmente não existiam negros, os falantes de tupi tiveram de criar uma palavra para designar os africanos trazi-dos para cá como escravos. Tomaram a palavra tapúïia̯ (‘tapuia’, isto é, índio não tupi) e acrescentaram una (‘preto’). De fato, a palavra tapanhuna ou tapanhaúna foi empregada durante muito tempo pelos brasileiros para designar os escravos negros.

Jacarecanga é um bairro da cidade de Fortaleza, Ceará. No início do século, era o bairro da elite, mas, depois da construção da estação

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de tratamento de esgotos na praia do Jacarecanga, nos anos 1970, esse bairro passou por uma grande desvalorização. O nome vem do tupi ia̯karé ‘jacaré’ + akanga ‘cabeça’ = “cabeça de jacaré”.

aCará Tupi akará

Acará, ou cará, é uma palavra usada para designar alguns peixes de água doce, encontrados em rios e lagoas brasileiras, principal-mente na bacia amazônica, onde a água é mais quente. Por serem bonitos, costumam ser criados em aquários. Os mais conhecidos e que melhor se adaptam a aquários com outros peixes são os acarás--bandeira. Tem também os acarás-disco, acarás-severos e acarás--festivos, entre vários outros.

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ISBN: 978-85-7934-090-1

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O que quer dizer estar na pindaí­ba? Por que chamamos de muquirana alguém que é pão-duro? Qual a origem dos nomes

Moacir, Jandira, Ubiratã, Iracema, Iara, Maí ra, Moema e Jurema?

Você sabe de onde vem sapecar? Por que só nós, brasileiros, temos

um nome especial para pipoca? Todas essas palavras e muitas outras têm origem

no tupi, língua indígena que deixou uma rica herança no português brasileiro. Nomes de

bichos, de plantas, de gente e de lugar. Nomes de coisas, de comidas, de bebidas e de seres fantásticos. Pororoca,

pipoca, paca explica de onde eles vieram e mostra a importância desse legado na nossa vida de todos os dias.