por um novo conceito de ensino da...

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RUBENS CESAR STIER PORTELLA POR UM NOVO CONCEITO DE ENSINO DA ARTE Monografia apresentada para obten~o de titulo de especialista em Melodologia do Ensino da Arte, CEPPE - Centro de Pas Gradua~o, Pesquisa e Extensiio, da Universidade Tuiuti do Parana. Orientadora: Denise Araujo. UTP CURITIBA 2000

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RUBENS CESAR STIER PORTELLA

POR UM NOVO CONCEITO DE ENSINO DA ARTE

Monografia apresentada para obten~ode titulo de especialista emMelodologia do Ensino da Arte, CEPPE- Centro de Pas Gradua~o, Pesquisae Extensiio, da Universidade Tuiuti doParana.Orientadora: Denise Araujo.

UTP

CURITIBA

2000

SUMARIO

INTRODUI;AO ..

2 0 ENSINO DA ARTE .......................•••

. 1

. 2

3 0 BELO, A ARTE E A ESTETICA .4

4 ESTETICA, ARTE E REALIDADE.. ..7

CLASSICO, P6S-MODERNO E NEOBARROCO. . 9

6 ESTETICA, TECNICA E TECNOLOGIA... . 11

7 PRODUTOS ESTETICOS CONTEMPORANEOS: fotografia, musica,

arquitetura, moda, design e cinema.. . 13

8 CONCLUSAO.... . 24

9 REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ...................•... ...... 25

1 INTRODUi;Ao

Desde sua forma mais primitiva a atitude humana de apreensao da realidadetem par finalidade estreitar os layos que unem 0 homem ao universo que 0 cerca,

acompanhando continuamente a mudant;a de ambos. No desenvolvimento deste

processo, revelaram-se ao homem diferentes dimensoes de sua atuay80 e

existemcia,dentre elas, sua rela~o com a belez8, a arte e a estatica.o objetivo deste trabalho e de discutir esta relayiio dentro de um enfoque

particular, que e 0 da questiio do ensino da arte, procurando atraves de um

panorama do desenvolvimento do ensino da arte no Brasil e das variayoes dos

conceitos de arte e estatica, uma ligayao natural entre a arte, 0 homem e seu

contexto.

Para tanto, S8 faz necessaria urn exame de abordagem da pr6pria realidadeem toda sua flexibilidade, considerando dois p610sprincipais de configurayiio. 0

primeiro deles e 0 da realidade classica, 0 do conhecimento absoluto e da realidade

como verdade. 0 segundo, e 0 de uma realidade nac classica, do conhecimento

relativo e da realidade como circunstancia.Por uma necessidade intrinseca de organizayao e sistematizayao do

conhecimento, consolidado na estrutura academica, 0 ensina da arte desenvolveu-se dentro de um formato ciassico de realidade. Reflexos de uma contingencia

oposta, tanto 0 homem, quanto a arte vem exigindo, cada vez mais, a necessidade

de espansao desta realidade lirnitada - numa realidade nao classica.Procura-se en.tao, por urna forma de se conciliar estas duas realidades, por

novo conceito de metodologia do en sino da arte.

2 0 ENSINO DA ARTE

o Ensino da Arte em suas diferentes metodologias, vem sistematicamente

privilegiando 0 produto ou 0 processo criativD, desconsiderando a importancia de S9

incentivar 0 estudante de arte na formaC;8o de um criteria estetico individual e uma

maneira critica de apreensao dos valores artisticos e esteticos dissolvidos na

realidade.

Voltadas a seus proprios metodos e a defesa de sua ideologia, as escolas ou

tendemcias do ensina da arte no Brasil deixaram esta lacuna na formaC;8o de seus

alunos.Nas escolas mais normativas ou tradicionalistas, nota-s8 apenas a

preocupac;ao com 0 produto artistico, atraves do fornecimento sistematico de

subsidios como tecnica, material, tema e modelo. Essas escolas, descendentes

diretas do academicismo dominante no seculo XVII, visam principalmente 0

aprimoramento tecnico do alune e seu resultado, muitas vezes satisfatorio, e produtoda repeticao mecilnica dos modelos, com pouco ou nenhum trabalho de

contextualizac;ao hist6rica e embasamento te6rico.

Num revisionismo formal esteril e arcaico, este tipo de escola deixa de lade a

experiencia individual do alune e 0 desenvolvimento de seu conhecimento e de sua

habilidade intelectual e critica. Alem disso, este tipo de escola contribui para a

cristaliza<;ilo dos paradigmas da arte classica como a (mica forma verdadeira de

arte.

Este procedimento contribui para a formayao de um publico preconceituoso,

cuja propria deformidade do gosto, 0 impede de se relacionar com as formas da arte

contemporanea e ate mesmo com seus reflexos em seu cotidiano.

Outro modele de ensino, experimentado a partir da Escola Nova, privilegia a

liberdade criativa do aluno, sem a interferencia do professor, para que 0 produto de

sua pratica nao seja impuro, contaminado por urn fazer que Ihe fosse alheio.

Essa forma de arte catartica e liberadora e seus metodos de auto-

aprendizagem continuou a ignorar a consciencia intelectual e estetica do aluno e,

apesar de ser um processo mais livre que 0 ensino academico, incorreu tarnbern

numa instrumentalizayao processual, substituindo a obrigatoriedade do modelo a do

nao-modelo.

Atualmente, a tendencia do ensino da arte e de se tornar mais analitico,

desenvolvendo paralelos entre teoria e pratica, valorizando a interdisciplinariedade.

Dentro desta filosofia, cabe-se destacar a cham ada "Metodologia Triangular",

idealizada por Ana-Mae Barbosa, onde a proposta pedagogica propoe a integra<;iio

da Historia da Arte, da leitura de obras de arte e do fazer artistico. Assim, procura-se

estabelecer urn maior equilibrio entre os fatores historicos, teoricos e tecnicos que

envolvem os processos relativos a arte.

Paralelamente, comec;a-se a desenvolver nas escolas de Arte, uma

preocupa9aO especial com dois elementos que ate entao nao haviam recebido 0

merecido destaque : a enfase em uma postura crftica em relayao a arte e a estetica

contemporaneas e 0 desenvolvimento da poetica propria do aluno.

Estas novas contingencias exigem que se procure, alem do desenvolvimento

teorico, historico e tecnico do aluno, uma forma de ajuda-Io a se relacionar com a

realidade.

Assim como 0 ensino da arte e seus contextos, a propria realidade que

envolve artistas, professores, consumidores, alunos e crfticos, se transformou. As

escolas nao sao mais os receptaculos da sabedoria, os professores nao sao mais

detentores do conhecimento e nem as alunos, telas em branco.

A atividade do professor como mediad or entre aluno e conteudo, proposta

pela pedagogia atual, se soma a de ponto de liga<;iio entre a escola e esta realidade,

derrubando as paredes que separam os assuntos academicos da vivencia pessoal

do aluno.

As questoes da arte nao cabem mais no universo limitado das rela90es

professor, aluno e escola, se extendendo ao contexto comum e infinitamente maior

de uma nova realidade - de uma realidade estetica.

4

3 °BELO, A ARTE E A ESTETICA

No decorrer da hist6ria, os conceitos relacionados ao bela e a arte, assim

como suas implica90es na realidade humana, percorreram urn longo caminho ate

que pudessem alcan~r a relativa autonomia que as caracteriza nos dias de hoje.

Foram concebidos diferentes criterios de avaliayao e relacionamento com

estes conceitos, muitos dos quais presentes ate hoje nas atitudes do homem

contemporaneo - seja em suas melhores virtu des ou nos piores preconceitos.

Durante a antiguidade cl<issica, a beleza adquire legitimidade quando

participa do bem e a arte, entendida como manufatura, na adequac;ao do produto

criado ao cumprimento de sua finalidade. Surge 0 criteria moral, que acompanhara 0

pensamento ocidental por toda a Antiguidade e Idade Media.

Com 0 Renascimento a arte se desliga do caniter servil quando se liga a obra

do artista a sua ideia ou imagina9iio. 0 artista, alem de tecnicamente habil, e capaz

de idealizar e materializar uma nova realidade - mold ada de acordo com seus

desejos - celebrando a atividade humana e sua supremacia sobre a Natureza. A

arte torna-se coisa intelectual - cosa mentale, nas palavras de Leonardo - e

concretiza a configurac;aode uma Realidade Ideal.

Essa nova realidade idealizada, representada na arte em sua perfeic;ao

racional e matematica, encontrou no academicismo uma maneira de perpetuar-se

atraves do metodo. Baseado principalmente nas conceP90es de simetria, propor9iio,

harmonia e consonancia, herdadas da antiguidade classica e reafirmadas pela

filosofia medieval, este padrao classico academico se firmou como mais solido

paradigma da arte jamais visto.

Com um forte apelo a fantasia, ja prenunciado pelo Barroco, 0 Romantismo

traz it tona uma nova natureza, forte, selvagem e misteriosa que ao contra rio da

renascentista - docil e controlada - foge ao controle do homem.

o racionalismo que predominava anteriormente se tempera com 0 empirismo

numa nova atitude que aproxima 0 hom em e natureza, 0 sujeito e objeto. A Estetica

surge como uma nova ciencia advinda da contemplayao sensfvel e finalmente, ao

moralizador binario bela J feio a realidade e acrescentada de outras categorias

esteticas como 0 sublime, 0 gracioso, 0 grotesco e 0 tragico.

5

A ficyao autoriza a criaC;8o de urn universo paralelo com infinitas

possibilidades, mais intenso, exotica e interessante que a realidade cotidiana,

abalando as alicerces do academicismo estabelecido.

Nessa mesma apaca, comeyam a ser organizados as primeiros grandes

museus cnde artefatos provenientes de outras culturas e epocas passam a ser

valorizados naD par seu valor material au utilitario, mas pelo seu valor estatica, como

verdadeiras obras de arte.

A esta revolu9iio da consciencia estetica se somaram a for9a da arte

romantica e as conting{mcias da modemidade, rompendo definitivamente com 0

canone do classicismo. 0 desenvolvimento da tecnologia e sobretudo 0

aparecimento da fotografia deflagrou 0 processo de crise da representa9ao na arte,

desafiando as artistas a criar novas realidades de expressao.

As vanguardas da modernidade procurararn, cada uma a seu modo, urn novo

sentido para a arte - e em alguns casos sua propria destruiyao - que se tornava tao

vibrante, veloz e diversificada quanto a sociedade do inicio do seculo XX. Outra

nova caracteristica desta arte emergente era a vontade de mudan~, a voz de

manifesto, ensaiada e nao exprimida pelos romanticos. 0 tom messianico e ut6pico

da arte modernista trouxe a tona uma nova dimensao para as quest6es da arte: a do

compromisso social e da arte como instrumento de protesto e denuncia.

Passada a metade do seculo, a uma boa distancia da efervecencia

modernista, notou-se um certo desconforto em relayao as promessas de mudan~

da arte moderna. 0 rigor formal, as mudan9as de conceito e atitude se esvaziaram e

perderam a for98 da certeza.

A arte da chamada P6s-Modernidade nao tern mais 0 compromisso de ataque

ou defesa e aparentemente, volta-se a si mesma numa postura que revela ora uma

atitude reflexiva e revisionista, ora de celebra9iio da liberdade alcan9ada, recriando-

58 a si m8sma em infindav8is wneos" e wp6s".

Essa nova realidade mundial encontra-s8, nos termos de Baudrillard, num

estado de transparencia, onde a arte e a estetica se potencializaram a tal ponto, que

de tao saturadas se tornam in6euas.

De todo este processo, a exercicio das diferentes atitudes do homem em

rela980 a arte contemporanea, como produtor, eonsumidor ou eritleo -

6

desdobramentos das tunyoes ocupadas historicamente par filosotos, artesaos,

artistas e estetas - exige urn foco cada vez mais preciso sabre uma existencia cada

vez mais ampla, etemera, imaterial e tragmentada.

Ao mesma tempo em que a vida estetizada deste novo homem exige seu

envolvimento em todas as esferas do processo de conhecer, consumir, analisar,

criticar e produzir esteticamente, a arta e 0 processo estetico S8 atomizam par todos

as campos da realidade que 0 cerca.

Sendo assim, ha que S8 considerar duas implicacoes diretas deste processo:

a necessidade de S8 desenvolver uma apreensao desta dimensao estatica da

realidade e uma forma de S8 utilizar desta informac;ao como referencial no ensina au

no exercicio da arte.

7

4 ESTETICA, ARTE E REALIDADE

Detectada a amplitude desta estetizacao da realidade e a impossibilidade de

se definir urn ambito verdadeiro que delimite a existencia de urn universe artfstico na

contemporaneidade, e precise encontrar urna forma de trabalhar as conceitos de

estetica arte e realidade dentro desta mesma unidade em que S8 encontram no

cotidiano.

Para Sanchez Vazquez • Estetica e a ci€mcia de urn modo especifico de

apropria<;iio da realidade, vinculado a outros modos de apropria9iio humana do

mundo e com as condic;oes hist6ricas, sociais e culturais em que ocorre.'" Ao

considerar a atitude estatica como urna maneira de ver 0 mundo e suas

contingencias, ao inves de segmentar os limites entre obra de arte, produto estatica

e cotidiano, propoe-se urna maneira de S8 enxergar para alam da superficie,

contemplando estes conceitos naD apenas como fatores isolados, mas como a

propria assodac;ao em rede que os configura.

Esta propria realidade, amplia-da e potencializada pelas novas tecnologias

expande-se em infinitas possibilidades, onde as rnais diversas areas do

conhecimento se combinam e interagem, criando novas realidades hibridas, cada

vez mais complexas e inter-referendadas.

Cada vez mais presente no cotidiano do homem urbano, este material se

constitui numa das mais ricas fontes de informac;ao,nao s6 nos assuntos relativos aesta nova estetica contemporiinea ou pos modema, mas tambem no que diz

respeito a uma nova maneira de existir e encarar 0 mundo.

Estas informa¢es sao muito importantes sobretudo no aprendizado informal

do individuo, e servem como complemento e referenda para 0 estudo formal em

todos os nrveis. Segundo Manuel Moran, MOS meios de comunicac;ao, principalmente

os audio-video-graficos, desenvolvem formas sofisticadas de comunicac;ao

sensorial, multidimensional, de superposi<;iio de linguagens e mensagens que

facilitam a arendizagem e condicionam outras formas e espayos de comunicac;ao."2

1 VAZQUEZ. Adolfo Sanchez. Convite " Estetica. p.47.

1MORAN. J. Manuel. A Escola do Amanha: dcsafio do prcscnte. p 30.

8

A estetlz8c;ao da realidade e urn fen6meno evidente. Nos aspectos mais

essenciais do cotidiano do homem contemporaneo he urna preocupa980 com 0 valor

estatica, a aparencia, e S8 naD com a arte propriamente dlta, pelo menDS com 0 born

desenho e com 0 prazer da forma.

Mais que simples prazer sensivel, esta relayao com a arte toma-se tambem

urn prazer intelectual nurn cruzamento de informayoes e referemcias.

Essa permeabilidade entre a arte e as demais areas da atividade do homem

deve-se em grande parte ao carater revisionista e fragmentado da Pas Modernidade,

que possibilitou urna serie de cruzamentos entre meies, epocas, conceitos e valores,

trazendo a tona novas parametros entre quest6es tao fundamentals como as

rela¢es entre realidade e simulacra, original e c6pia I bern e mal.

A realidade estetizada se revela e se celebra nas atividades fundamentais do

homem e em suas necessidades. A mesma sociedade que fez do sistema do

consumo urn modo de vida, 0 transforma numa forma de arte mutante.

Morar, comer, vestir, conhecer, trabalhar, S8 divertir, descansar, enfim existir

esteticamente - eis 0 homern. Todos as ramos da atividade humana, em maior OU

menor escala, participam deste processo.

o que S8 propoe e que se utilize deste mesmo referencial artistico e estetico

impregnado na vida do estudante de arte como parte do seu processo de

aprendizagem e conhecimento, trabalhando a partir de suas proprias areas de

interesse e experiencias de sua vivemcia pessoa!.

E preciso aeabar com a postura passiva do aluno em relayao a propria

realidade que 0 cerca, transformando-a em uma fonte de informa9iio que nao so

complemente 0 trabalho executado na vida academica, mas tambem 0 seu propriodesenvolvimento como ser humane vinculado a esta realidade, sendo necessaria

tambem que 0 ensino da arte contemple esta mudan9a.

9

CUi.SSICO, P6S-MODERNO E NEOBARROCO

Com toda a racionalidade que caracteriza a especie humana, 0 modo que 0

homern apreende a realidade, privilegia 0 esquema classica, ande 0 bern €I superiorao mal, a razaD €Isuperior a sensibilidade e a forma e superior a materia.

Culturalmente condicionado nesta maneira do conhecer, a partir das grandes

mudanyas ocorridas na sociedade a partir do seculo XIX, 0 homem moderno nao

pode continuar aver 0 mundo par urn filtro cartesiano.A ordem, prometida entao pelo modernismo, nao S8 concretizQu e no lugar da

certeza de uma verdade instaurou-se uma era de transformayoes, incertezas e decrise. Este e 0 panorama descrito por Jean-Fran<;oisLyotard em A Condi98o P6s-

Modema.

Dissidentes do experimentalismo modernista e de seu compromisso com 0racionalismo e 0 funcionalismo, 0 movimento pos-moderno S8 utilizou dadeconstruc,:ao,da reelaborac,:ao.da releitura e da citac,:aona construc,:aode uma nova

forma de S8 pensar e de S8 tazer arte.Tomado como manifesto, moda, estilo ou simplesmente como corrente

puramente antagonica aD movimento moderno, 0 pos-modernismo vern sendotomado por simpatizantes e detratores de uma forma diferente da concepc,:ao

original, que e a de ser apenas urn criterio analitico.

Evitando confusees de terminologia e esta ideia de contraposi9aO as

vanguardas, Omar Calabrese propoe 0 termo neobarroco para designar umaqualidade cultural especifica da contemporaneidade - entendendo 0 barroco como

categoria do espirito oposta ao classico e 0 prefixo neo significando uda mesma

forma que' e nao como repetic,:ao.regresso ou reciclagem. Como ressalta Maflesoli.

"trata-se menos do barroco como conjunto artistico bem delimitado, que do barroco

como tipo de sensibilidade".

Calabrese identifica urn 90sto neo-barroco na cultura contemporanea, pelabusca de formas em que se assiste a perda da integridade. da globalidade e da

sistematicidade ordenada em troca da instabilidade, da polidimensionalidade e da

mutabilidade e em oposic,:aoa maneira classica de organizac,:aoda realidade. propee

10

o neobarroco como urn ar do tempo Maparentemente tao confuse, fragmentado e

indecifravel ( ... ).'"

Severo Sarduy salienta que ao contrario do barraee europeu que

pressupunha urna harmonia implicita na subversao do circulo pel a elipse e na

organiza9&o proporcional de urna assimetria harmonica, o neo-barroco

contemporaneo recusa a existencia de urn Logos absoluto, M( ... ) reflexo estrutural de

um desejo que nao pode alcanyar seu objeto,( ... ) pretende um fim que

constantemente Ihe escapa (... ).'"

Esse jogo estetico, do objeto de desejo vislumbrado e jamais alcanyado e

refiexo da maneira contempor€mea de apreensao da realidade, onde a atenyao naD

busca a tranquilidade do conhecimento de uma verdade eterna e absoluta, mas a

fugacidade do prazer.

A arte e a realidade da contemporaneidade, em sua rede de relayoes,

metatoras e referencias nao se deixa apreender pela 16gica determinista do

pensamento classico e neste sentido, como diz Maffesoli, "coloca em jogo a forya do

imaginal (imagens, imaginarios, imaginayao e aparencia) ( ... ) em ayao na

complica<;ao do barroco"6

A verdade estetica, que se mantinha estatica e consolidada nos modelos da

arte c1assica, se amplia numa uma forma orgimica e se alastra pela realidade

cotidiana, numa forma que, ainda que fragmentada, passui urna coenancia interna.

Para explicar esta uharmonia conflituar7 e esta MI6gica contraditorian8 desta vi sao

neobarroca, Maffesoli a compara com a cidade, ~pelo menos a cidade barroca, que

nao se entrega em primeira mao, a cidade toda em labirinto, a cidade em curvas e

em lugares escondidos, em suma, a cidade equivoca~9.

J MAFFESOLI. Michel. No fundo das apllreneius. P. 188."'CALABRESE, Omar. A Idade Neobarroca. p.lO.S SARDUY, Severo. Escrltosobrc urn corpo. p.79.6 MAFFESOLI. MicheLNo fundo das aparendas. p.llS.7 MAFFESOLl, Michel. No fundo dns Apnrenclns. p 226.~ Idem.

II

6 ESTETlCA, TECNICA E TECNOLOGIA

Uma das maiores questoes sobre arte na atualidade discute a legitimidade

dos meios pelos quais S8 apresenta 0 produto estatica au artfstico, cada vez maisintimamente ligado a tecnologia.

As correntes de pensamento mais classicas defendem 0 ponto de vista que a

tecnologia, usada it exaustao para S8 subverter a forma da arte tradicional atravesde exercfcios vazios de tecnicismo - da releitura e do pastiche - e em grande parteresponsavel pela perda da habilidade tecnica dos artistas contempor;;neos.

Hit urn grande receio que estas tecnologias - au ainda que 0 espetaculoproduzido per elas, nos termos em que colocou 8audrillard10 - tarnem 0 hom em

prisioneiro numa construc;ao estetizada em que 0 computador, como pr6tese

prolongadora da mao - ou do proprio cerebro - roube 0 dominio da arte das maos

do homem.

A propria realidade, tranformada numa opera baudrillardiana do caos se

impoe diante do homem, fazendo com que a expectativa do retorno da placidez

classica S8 perea em uma angustia cada vez mais crescenta.Uma vez constatada essa SitU8C;80 de fragmentac;8.o eu ate mesma de

desmaterializa9ao da realidade nos moldes consagrados, e inutil pensar numa

inversao do estado das eoisas.

A saida mais clara parece ser a adapta9ao a esla nova situa9iio numa atitude

em que, ao inves de negar, tome partido desta nova realidade, usufruindo das

facilidades que as novas tecnologias oferecem na manutenc;ao do referendalartistico hist6rico e tambem na possibiHdadeda criac;aode novas form as de arte.

Ao estudar 0 bin6mio Tecnica e Estetica, Francastel desenvolve um raciociniono qual afirma a inexistencia de oposi9aOnatural entre estes dois fatores. Longe de

se excluirem, um complementa 0 outro: "Sem a arte, a tecnica seria apenas umaatividade va; sem a tecnica a arte nao passaria de um inutil jogo de sombras

fugitivas~11. Parte do principio que, apesar das artes terem origem na operagao do

9 Ibidem.

10 BAUDRILLARD, Jean. A transparencia do mal. p. 59-66.II FRANCASTEL, Pierre. A reaIidade Figuratlva, p. 62.

l2

homem sobre a materia, esta operac;ao S8 faz na livre associayao de valores

plasticos e utilitarios.

De maneira anilloga, Luigi Pareyson, diz que a arte ",; um tal fazer que,

enquanto faz, inventa 0 par tazer e a modo de fazer"12,

Outro fator de grande importancia na configurayao da arte contemporanea e a

nova reaJidade comunicacional produzida pela internet, on de as conceitos de original

e copia, autoria e co-autoria, se f1exibilizam atraves de urna arte que rompe com a

estrutura rigida da arte tradicional.

Massimo Canevacci va nesta nova estatica, f1uida e IIquida urna nova

dimensao de liberdade de autoria, ande a interferencia do usuario - transformado

em co-autor - amplia a individualidade do autor, transformando-Q em varies eus.Segundo Canevaci, "a obra de arte contemporanea, no fluxo da comunicayao, e uma

obra de arte performativa, comunicacional. Arte comunicacional e uma arte que nao

vai colocar-se num momenta definitivo, de congelamento. Ela e mais f1uida e desafia

cada tentativa de fixar urn momenta unico~13.

Juntas, estas circunst€mcias indicam que a combinac;ao rnais prov8vel entre

estetica, tecnica e tecnologia nao e a de exclusao aniquilar;ao au de

empobrecimento, mas de cambinac;ao, enriquecimento e perpetuac;ao.

11 PAREYSON, Luigi. Os problemas da Estetiea. p.26.I) CANEVACCI, Massimo.Webpidgill, cria~o em trlnsito. Jornnl do Museu de Arte do Rio Grande do Sui

Ado Mnlngoli. Pon.oAlegre, nO 59,ju1. 2000.

13

7 PRODUTOS ESTETICOS CONTEMPORANEOS

As mesmas caracteristicas de onipreseng8, transparencia e confusao

esteticas que comp6em 0 diagnostico apocaliptico de Baudrillard, nos trazem nao a

morte, mas 0 comec;o de urna nova realidade. Urna nova realidade, organizada em

rede, cnde a verdade nao mais S8 refugia na solidez dos conceitos, mas em suas

frestas.

Os produtos da estetica contemporanea f1utuam nessa mesma tendencia,

misturando-se entre si, confundindo as limites entre a vida e arte, forma e conceito.

E exatamente por esta fiuidez, pela surpresa, por sua velocidade de muta9ao e pelo

constante desafio que oferece, que 0 objeto estetica contemporaneo S8 torn a tao

importante no estabelecimento de urna ligar.;:ao entre 0 homem, a arte e seu proprio

contexto.

Para ilustrar esta influencia mutua entre a arte e 0 cotidiano do estudante de

arte, estao elencados a seguir seis elementos dentre os produtos estetlcos

contemporaneos que, conceltual e folmalmente, constituem um referencial vasto e

importante sobre a atualidade, formando um ponto de liga.;,ao, au ainda, uma rede

de conexoes entre a vida, a ensino e a arte.

14

FOTOGRAFIA

Ha mais de urn seculo, 0 surgimento da fotografia deflagrou urn dosprocessos mais importantes na his6ria universal da arte - a crise da representayao.

A arte, impossibilitada de superar a capacidade mimetica da fotografia se obriga a

procurar par novas maneiras de representar 0 mundo.A fotografia contemporanea se coloca nos dias de hoje sobre um impasse

semelhante ao da arte na aurora da modernidade. A sociedade e a cultura da pos

modernidade em seu anseio pelo extrema, pelo superiormente interessante e pelonovo exige da fotografia a transcendencia de seu objetivo original, da imagem comorecorte do real.

As novas tecnologias, principalmente as softwares desenvolvidos a partir do

inicio da decada de 1990 permitiram um controle total de cada uma das minimas

particulas que compoem a imagem. Esse advento tecnol6gico ocasionou duasimportantes consequencias no relacionamento entre realidade e fotografia.

A primeira delas diz respeito a uma reafirma980 do compromisso da fotografia

com a realidade. A liberta9ao dos processos quimicos e manuais utilizados no

reloque de imperfei95es do processo de registro de imagem, possibiltou aos

fotografos uma maior fidelidade de reprodu9ao, resultando numa maior proximidade

entre imagem e objeto. A funyao inicial da fotografia como instumento de registro eentao cumprida com a maxima eficiencia.

A segunda implica980 deste desenvolvimento tecnologico e justamente

aquela que rompe 0 vinculo existente entre imagem e 0 real, trazendo a ton a umanova realidade, cada vez mais pr6xima da arte - sobretudo a uma concepC;aoromantica da arte, como fic9ao e fantasia.

Este novo tipo de fotografia se desenvolveu principalmente, nas areas da

comunica980, da publicidade, do entretenimento e da moda, dimens5es do cotidiano

mais ligadas aos anseios, angustias e desejos do homem em rela980 a propria

imagem e a sua concep980 do mundo.A nova fotografia, ao inves de revelar seu conteudo, faz 0 caminho inverso

propondo um desafio tanto a nivel formal quanto em significado.

15

A configura9iio pictorica prop6e um desafio ao olhar - nao se distingue

facilmente 0 real do virtual. Os elementos visuais - cor, luz, sombra, textura, volume -apontam para urna dramaticidade alam do real, indican do urna maneira de olhar

proxima a do barreco, aspirando a vertigem a velocidade e ao prazer.Sua narrativa e metaf6rica e parab6lica, contendo refen§ncias a Qutras areas

do conhecimento como a arte, a cultura, a hist6ria e a ciemcia. A informavao contida

nesta fotografia, ao contra rio da documental, naD tern nenhuma pretensao de vinculocom a verdade e e exatamente nesta fresta entre 0 real e 0 imaginario e que esta

sua importancia como referencial estatica de pesquisa.Recentemente, a editora inglesa Phaidon Press publicou "The Impossible

Image", registrando 0 trabalho de novos fotografos, sob 0 enfoque dos limites entre

fantasia e realidade na fotografia contemporanea e a relaryao entre 0 processo

fotografico e a manipula9iio digital de imagem. Dentre eles, Nick Knight um dois

mais respeitados fotografos da atualidade, a respeito destas quest6es afirma: "nunca

vi rneu trabalho como qualquer outra caisa que nao fosse uma serie de imagens

manipuladas.(... ) Se voce quer realidade, de uma olhada pela janela".

Foto de Nick Knight para Alexander McQueen.

16

MUSICA

Em sua relayeo com a musica, a produyao contemporanea procura urna

ambivalencia: a manuten~o e restaurayao do material acumulado no passado

historico e tambem a pesquisa de novas possibilidades musicais, em sintonia com a

nova realidade do homem.

No primeiro caso, a tecnologia vern colaborando de maneira inestimavel,atraves da recupera<;iio de arquivos danificados e pelo estabelecimento de

condic;oes tecnicas e acusticas cada vez mars pr6ximas ao ideal.

Dentro das novas pesquisas, a musica - notadamente a cham ada musicaeletr6nica - e um dos produtos que mais refietem 0 carater de movimento,

instabilidade e tensao presentes na estetica contemporanea.

Sua organiz8c;ao em sobreposic;ao, com movimentos em espiral, interrupc;oes

e reversoes, assim como 0 ritmo em sincope reafirmam a visao do mundo em urna

organizac;ao naD linear do tempo e do espac;o. Outra de suas caracterfsticas e 0 usa

de samples, colagens digitais de outras obras que puntuam na estrutura musical

como citac;oes au referencias - de uma forma analoga a dos links no hipertexto

Esta estrutura compositiva, assim como na arquitetura dos dias de hoje,

deriva dos proprios processos geradores e sua forma, independente deles, seria

inimaginavel.

Atualmente pode-se notar a crescente necessidade de acoplamento da

musica a uma forma visual. 0 aparecimento e consagrac;ao do video-clip em

meados da dacada de 80 deu inicio a um formato musical que se apoia

paradoxalmente em um texto visual.

Transformada nesta unidade hibrida, a nova musica conseguiu transcender a

imaterialidade de sua estrutura e se personificou material e visivelmente. Cada estilo

musical constr6i e simboliza uma estatica particular, correspondendo a um esquema

visual e de comportamento proprios com grande infiuEmcia,sobretudo na polula<;iio

maisjovem.

Num mercado avido pelo novo e com uma tecnologia capaz de suprir esta

demand a com uma velocidade vertiginosa, 0 universe da musica a um dos

ambientes de maior cruzamento de informa9oes, estilos e tendencias. Pela

17

amplitude de seu alcance - como no formato MP3 transmitido pela Internet -

consegue atingir simultaneamente todo 0 planeta, absorvendo e influenciando todas

as ambientes culturais.

Esta pluralidade se revela numa qualidade especifica da nova musica que e a

da cita~o e da referemcia, que van alem de urn nivel superficial. resultando em

novas formas musicais. Pode-sa hoje ouvir 0 samba, 0 jazz, a bessa nova ( jell urn

hibrido de samba e cool jazz), 0 techno (musica eletronica) e tambem a technova

(techno com estrutura e referendal de bossa nova), 0 sambalounge (samba

eletronico de compasso desacelerado) e 0 acid jazz Uazz eletronico de colagem).

Cada uma destas form as, ao gerar uma estatica, reverenciar suas influencias

e influenciar noves autores, torna-S9 atitude e ao mesmo tempo em que absorve as

tendencias da arte e da vida contemporanea, e tambem absorvida por elas.

Capas dos albuns Homogenic, de Bjork (superior) e Mezzanine, de Massive Attack.Fatos de Nick Knight

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ARQUITETURA

Em oposit;ao a arquitetura moderna que S8 colocava como soluyao (mica edefinitiva aos problemas existentes entre 0 homem e a espa90 em que ViV8, a

arquitetura dos dias de hOje aponta para a multiplicidade e a individualidade de cada

solu~o arquitet6nica. A fal€mcia de um modele que pudesse ser aplicado

indefinidamente pas tim a arquitetura an6nima da maquina de morar corbusiana. A

casa contemporanea e antes urn lar, refletindo e tambem revelando em seus

elementos a individualidade do habitante.

A racionalismo puro que caracterizQu a arquitetura moderna tai dando lugar auma nova arquitetura que, sem descuidar da funcionalidade, propos urn espar;o

simb61ico e poetico, unindo tecnologia e sensibilidade.

Jean Nouvel e um dos principais seguidores desta tendemcia, como nos

revela um de seus projetos, 0 Instituto do Mundo Arabe em Paris. Para controlar a

incidencia da luz solar no interior do edificio, projetou uma reticula metalica sobre a

pele de vidro de uma de suas tachadas, na qual 0 desenho remete aos motivos

decorativos arabes e a fun~o, aos muxarabis - treli98s de madeira que fechavam

as janelas das casas no oriente, protegendo a privacidade de seu interior. Nesta

reticula estao dispostos centenas de diafragmas metalicos conectados a um sistema

que aumenta ou diminui 0 diametro de seus oriffcios, de acordo com a quantidade

de luz desejada - na COnCeP9aO do autor, assim como se dilatam as pupilas de uma

mulher apaixonada, ante a visao do amado.

Essa aproxima~o com a tecnologia e outra caracteristica da arquitetura

contemporanea. Por um lado ha a liga980 dupla entre a possibilidade material e a

configura~o plastica - novas formas pedem novos materiais I novos materiais

geram novas tormas - de que talou Francastel. Por outro, surge um novo tipo de

espa90, que s6 pode se configurar tecnologicamente.

Um bom exempo deste tipo de arquitetura e 0 Museu Guggenheim de Bilbao.

Projetado por Frank O. Gehry, sua estrutura se compoe de superficies que ondulam

e se contorcem numa sucessao de espa~os onde se contrastam elementos

arquitetonicos tradicionais a outros completamente novos. Sua carapa98 retorcida

de titanio ao mesmo tempo em que repousa e se reflete sobre 0 principal rio da

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cidade, ameaya invadi-Ia com seus estilhac;os angulosos, numa belfssirna metatorada arte que contem.

Fachada do Museu Guggenheim - Bilbao.Folo de Timothy Hursley

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MODA

A moda e tambem urn importante campo de pesquisa sobre a estaticacontemporimea. Seu ritmo vertiginoso constr6i e destre; sucessivamente idea is de

beleza e perfeic;ao, que ja nascem com uma obsolescencia programada, gerando

uma expectativa que procura nao 56 0 novo, mas 0 al8m do novo.A tensao provocada por essa efemeridade faz com que 0 ambiente da mod a

seja um dos mais criativos da atualidade, pesquisando constantemente materia is,

conceitos, referencias e alternativas para S8 manter sempre a frente de seu tempo e

garantir 0 frescor da novidade que Ihe e exigida.

A tecnologia provem constantes melhorias no desenvolvimento das fibras

texteis, criando materiais cada V8Z mais leves, confortaveis e duraveis. Associados aessas industrias, 0$ criadores buscam novas qualidades visuais, de textura eestrutura.

Assim como 0 pensamento contemporaneo, a moda S8 caracteriza par umaconfigurac;iio multipla, agregando elementos da hist6ria, da literatura, do cinema, das

artes e da propria sociedade inventando e reinventando a si mesma para 5e manterno centro do v6rtex que criou.

A imagem que a moda refiete no espelho nao e s6 a da roupa, do cal98do e

do acess6rio - e a de toda a cultura de seu tempo.

Vestido de acetato tingido de Yves Saint Laurent Rive Gauche.Imagem de Dah Len

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DESIGN

Desde a pre-historia a homem investe aos objetos que fabrica urn

componente que transcende a dicotomia forma-funyaO e feflete entre eles uma

relac;ao estatica, atraves daquil0 que Vazquez chamou de "forma excedente" - uma

forma sem justificativa funcional.

Assim como a moda, as objetos que cercam a humanidade, sao como uma

especie de arquivo sobre a hist6ria, a cutura e a tecnologia. A sociedade de

con sumo, orientada pelo mesma ritmo que rege a moda, caloca nurn mercado cada

vez mais voraz uma serie inumeravel de objetos que S8 sucedem uns aos outros

pela proposta do novo, atraves de urna nova configurayao formal ou de urn avanryo

funcional ou tecnol6gico.

Alguns designers, preocupados com uma relayao mais intima entre objeto e

usuario, comeryam a desenvolver produtos dentro de uma filosofia que ao contra rio

da tendemcia de mercado, propoe uma postura critica de con sumo, de acordo com

as necessidades humanas dentro de uma sociedade com novos valores,

respeitando a escala entre 0 homem e 0 espayo em que vive, preservando 0 meio

ambiente.

Essa noyao de intimidade e desmaterializayao do objeto e claramente

identificada em seus projetos, atraves da tendencia uma forma organica quase

protetica, do uso de texturas que convidam ao toque, do numero cada vez mais

reduzido de componentes, do uso de materiais transparentes e translucidos e na

utilizayao de materia-prima reciclavel.

Philippe Starck e um deles. Seus objetos e ambientes revelam a busca de

uma qualidade simb6lica, de humor, poesia, ironia e drama, propondo uma ligayao

afetiva entre usuario e objeto, numa sociedade que chama de "uma solidao

superequipada". Stark preve uma sociedade menos consumista, mais preocupada

com a qualidade de vida que com 0 acumulo desordenado de bens. Recentemente,

publicou um catalogo intitulado "Good goods" - contendo cerca de 200 "nao objetos

para nao consumidores~, onde ilustra essa passagem do design do produto ao

serviyo.

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Atraves de urn estilo paradoxal, num minimalismo sofisticadamente complexoreferenciado aos objetos em sua forma arquetipica e em um jogo entre formas

historicas e de urn futurismo fantastico, seu design e a propria personifica~o do

905tO neo-barraco.Em entrevista a revista Domus de junho de 1997, Starck revela sua sintonia

com a nova sociedade quando diz que Mhoje, na cidade moderna, a forya e menes

importante que urna mente aberta, mais intuitiv8, menes estruturada, mais

semelhante ao modo de trabalhar nascido do mundo da eletronica, asimultaneidade; e aqui vern a tona a inteligemcia e 0 comportamento femininos.Todos as objetos que temes em volta funcionam em modo masculino, obsoleto e

perigoso porque nos levam a relayoes de forya e de agressividade".

Objetos desenhados por Philippe Starck.Fatos de Tom Vack

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CINEMA

Assim como a fotografia, 0 cinema percorre nos dias de hoje urna dire9aooposta aquela que tinha em sua origem, a de retratar com fidelidade urn reeorte da

realidade. Pela propria capacidade de simular toda uma realidade atraves da

poderosa combinac;;ao da imagem em movimento com 0 som, 0 cinema se

transformou na forma de arte que mais aproxima a imaginayao da dimensao

humana do real. Os recursos tecnol6gicos pemitem ao mesma tempo urna situacao

do mais peneito realismo e da mais livre fantasia.

Absorvendo, subvertendo e influenciando as meies de comunicayao, 0 teatro

e a literatura, 0 cinema e tambsm urn organismo mutante que aos poucos vai se

libertando de suas origens e se estabelecendo como urna nova forma aut6noma,

procurando, assim como a propria apreensao da arte, urna coerencia com 0 seu

tempo.

o cineasta ingles Peter Greenaway diz que "ainda nao vimos cinema ... Vlmos

ate agora teatro filmado e principalmente, textos ilustrados. (... ) Estamos diante do

inicio de todo um metacinema novo que pode criar uma nova mfdia e um novo

produto. Esta criac;ao deve oearrer de forma totalmente aut6noma, sem estar

associada a n090es preconcebidas da cultura ocidental do seculo XIX".

Alem de compartilhar com os demais objetos esteticos contemporaneos a

func;ao de catalogo vivo da existencia estatica humana - real e ficcional - 0 cinema

tem a vantagem de faze-Ie na esfera do prazer do entretenimento, criando uma

realidade que ao mesmo tempo contam e transcende a do expectador - a de uma

estatica Wcinematica-.

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CONCLUSAO

A forma em que S8 configura a arte na contemporaneidade naD mais permite

que se atenha as formas tradicionais de pesquisa academica em arte. Pelo

entrecruzamento cada vez maior das diferentes areas do conhecimento humane

com a que S8 define atualmente par arte, a estrutura normativa do ensina S8 torna

par demais rigida, direcionando seu foeo a urna campo cada vez mais restrito.

o material de estudo nao pode mais limitar-se aquele apresentado na sala de

aula, nem as bibliotecas, nem aos livros.

A nova informac;:ao, construida em urna velocidade maior que sua

possibilidade de registro naD consegue penetrar na area da educayao, tornando-se

parte apenas da vida extra academica do estudante, ao lnves de somar-S8 a ela.

Musica, arquitetura, design, cinema, moda e fotografia - elementos presentes

no cotidiano de todas, sao reflexos daquilo que S8 pensa e S8 vive, ao mesma tempo

em que se tornam agentes deflagradores de novas ideias e valores.

A realidade cotidiana do aluno, convertida em texto, e a mais rica fonte de

informa~o e pesquisa sobre a estetica e a arte contemporaneas, e como tal, nao

pode ser ignorada. E na permeabilidade destas duas dimensDes - do cotidiano e da

estrutura academica - partindo de uma percep~o nao mais artistica, mas estetica

da realidade que a arte encontra a realidade do estudante de arte.

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