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32 O ROSACRUZ · OUTONO 2016 n O R I E N T A Ç Ã O Por ADILSON RODRIGUES, FRC* N a história de nossa civilização, houve época em que os homens acreditavam em forças externas e invisíveis, causadoras de doenças e malefícios e também em forças benéficas à humanidade. Naquelas circunstâncias, o ser humano situava-se em posição passiva e sentia-se manipulado como um fantoche. Com a evolução do pensamento humano as causas físicas passaram a ser a explicação para as doenças, inclusive das tristezas, an- gústias e de todo sofrimento emocional. Assim, temos uma primeira fase cuja explicação para as nossas mazelas são forças externas e uma segunda onde as causas são orgânicas.

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32 O ROSACRUZ · OUTONO 2016

n O R I E N T A Ç Ã O

Por ADILSON RODRIGUES, FRC*

Na história de nossa civilização, houve época em que os homens acreditavam em forças externas e invisíveis, causadoras de doenças

e malefícios e também em forças benéfi cas à humanidade. Naquelas circunstâncias, o ser humano situava-se em posição passiva e sentia-se manipulado como um fantoche.

Com a evolução do pensamento humano as causas físicas passaram a ser a explicação para as doenças, inclusive das tristezas, an-gústias e de todo sofrimento emocional.

Assim, temos uma primeira fase cuja explicação para as nossas mazelas são forças externas e uma segunda onde as causas são orgânicas.

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Entretanto, nossa evolução continua e atingimos a terceira fase onde encontramos no interior do homem, no segredo do seu pensamento, as causas dos desequilíbrios e das doenças. Mas ali também estão a alegria, a paz e a harmonia. O pensamento huma-no é a grande fonte energética propulsora de estímulos que criam alegria e tristeza, paz e ansiedade, saúde e doença e é aí que se revela a importância do relacionamento humano, do relacionamento entre pessoas.

O homem pensa. O pensamento é uma energia de vital importância. O homem interage com outro homem e esta interação influencia o pensamento.

Se somos afetados pela relação com outros seres huma-nos porque a inte-ração influencia o pensamento,então o relaciona-mento humano, por si só, pode-rá ser benéfico, ou não, ao nosso equilíbrio emocio-nal e ao nosso desen-volvimento espiritual e por si só merece estudos e considerações especiais.

O Dr. H. Spencer Lewis, em seu livro Envenenamento Mental, de excepcional valor prático, conta-nos a história de “comadres” que, sem conter o germe da maldade, ino-culam veneno em sua vítima: “Como você engordou!” ou “como você está pálida, está doente?”. E a vítima, por ser uma pessoa que não se defende muito bem, inculca, remói seus pensamentos, deteriorando seu organis-mo pela desarmonia. O veneno mental foi inoculado num relacionamento humano ina-dequado. Sem muito valor para quem fala,

mas muito importante para quem ouve e não sabe defender-se dessas agressões mentais.

“O falar é de prata e o silêncio é de ouro”. Se não pudermos falar para trans-mitir, ensinar, elogiar, aliviar as angús-tias de nossos irmãos, então calemos.

Os homens se comunicam de várias ma-neiras: pelo falar, por gestos, pelo olhar, pelas expressões faciais e também telepaticamente.

A palavra é uma arma muito sofisticada que precisa de técnica especial para o seu manejo e, em princípio, dentro do ponto de

vista apresentado, não nos parece ver-dade a frase “falar é fácil, fazer

é que é difícil”. Devemos lembrar do adágio dos

sábios antigos de que não devemos temer o

que entra pela nossa boca, mas sim o que sai dela. Se a palavra expressas-se sempre o nosso verdadeiro senti-mento e se a pa-lavra fosse sempre

dirigida com bons propósitos, então não

deveríamos temê-la. A palavra é fundamen-

tal no relacionamento huma-no, mas pode ser também uma

arma quando mal utilizada. Por isto, devemos estar atentos ao princípio de que toda comunicação verbal traz consigo dois conteúdos: o conteúdo manifesto e o conte-údo latente. Como exemplo, podemos citar a pergunta de um garoto à sua mãe que sai para o trabalho: “Mãe, por que você precisa trabalhar?”. A mãe provavelmente responde: “Bem, filhinho, precisamos de dinheiro...”. Neste caso, o conteúdo manifesto é: mãe, por que você precisa trabalhar? Entretanto, esta pergunta contém outro significado. Se

“ A palavra é fundamental

no relacionamento humano, mas pode ser também uma arma quando mal

utilizada. ”

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n O R I E N T A Ç Ã O

a mãe tivesse questionado a razão da per-gunta poderia ter ouvido: mãe, quero fi car com você, quero mais carinho e atenção.

Se observarmos bem, vamos verifi car que o conteúdo latente muitas vezes é o mais importante, sendo a ele que devemos responder, já que o conteúdo manifesto é apenas um disfarce.

Outro exemplo: Zezinho quebrou o vidro da porta de propósito. Seu pai pode agredi-lo com palavras ou perguntar por que ele fez aquilo e então descobrir o conteúdo latente da comunicação, neste caso não verbal. Esta é uma questão para refl exão. Quem solicita

comida se está fartamente alimen-tado? Quem, abastecido de

amor, solicita guerra?Lembremos que a

comunicação não verbal, um olhar,

um sorriso, um gesto, tem

tanto ou mais signifi cado do que a pa-lavra. Uma criança, a partir dos primeiros momentos de

vida, tem per-cepção verda-

deira se é amada ou rejeitada. Lembramos que a

maioria das agressões é o resultado de descarregar-

mos ou deslocarmos (termo usa-do na Psicologia médica) nossas frustrações e aborrecimentos no “primeiro que passa”, se não estivermos vigilantes.

Podemos conseguir um bom controle da agressividade conhecendo os conteúdos latentes e manifestos da comunicação. A

agressão verbal recebida é quase sempre fl e-cha envenenada dirigida a outra pessoa, com frequência pai, mãe ou do ambiente familiar. Como exemplo podemos citar o marido que chega em casa furioso com o chefe e briga com a esposa; esta frustra-se e descarrega nos fi lhos e talvez até no cachorro da família.

Até aqui vimos três pontos importantes que devemos considerar:

1. A importância do pensamento;

2. A importância do relacionamento humano;

3. A importância dos conteúdos manifestos elatentes da comunicação com outras pessoas.

Se pensarmos em ambientes onde deva estar presente a fraternidade, e considerando as diferenças e difi culdades humanas, todos temos que cuidar, todos somos terapeutas. E todos somos pacientes também, porque não somos perfeitos. Nosso ambiente nos trata e nos dá oportunidade de tratarmos dos outros.

Se compreendemos o que foi dito aci-ma, poderemos ser mais tolerantes. E se quisermos ser mais tolerantes ainda, então nos comuniquemos mais, sem defesas e armaduras, pois nos fi lmes de super-heróis só torcemos para o mocinho porque desco-nhecemos a história dos bandidos. É fácil amá-los ou pelo menos sermos mais tole-rantes se conhecermos sua história: seus pais, suas privações, seu ambiente, suas difi culdades, seu grau de evolução. Tole-rância é uma virtude experimentada com a maturidade e adquirida com a experiência.

É oportuno lembrar que para uma criança de 1 a 5 anos, que enxerga um adulto, princi-palmente seus pais, como criatura onipoten-te, tudo o que lhe for transmitido será regis-trado em seu subconsciente como Verdade. Se isto é fato, que responsabilidade a nossa!

Em A República, de Platão, obra escrita há

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2.500 anos, já encontramos estas conjecturas. Diz ele para termos cuidado com as histórias, com as fábulas que contamos às crianças. Para fazer valer seus conselhos, certos pais costumam usar o regime de terror: “Não sai de casa senão o homem te pega”. Que condi-cionamento terrível: “O homem te pega” con-diciona o medo dos homens e futuramente difi culdades no relacionamento humano.

E o que é válido para uma criança de 1 a 5 anos é válido para muitos adultos, que não crianças indefesas, apesar do tamanho e idade. Quantas frases colocadas descuidada-mente levam nossos irmãos ao sofrimento; quantos títulos negativos e apelidos maldosos acarretam confl itos íntimos.

Assim, fazemos duas advertências:

1. Crítica: excelente arma para destruir;

2. Agressividade: excelente arma para formarcírculo de guerra e sofrimento.

Entretanto, apesar do peso de tudo o que é dito, em Psiquiatria dizemos que aprende-mos pelo processo de identifi cação. Apren-demos mais pelo que as pessoas fazem do que pelo que elas falam. Vivemos à cata de exemplos, buscamos com curiosidade pesso-as que se dizem evoluídas, ansiamos para ver o Grande Mestre e o Imperator, buscamospontos de referência. Mas, lembramos que também somos pontos de referência para outras pessoas? Então, se formos exemplo dignifi cante, teremos um mundo muito me-lhor, feliz e saudável.

O ser humano é gregário por natureza; a lei universal é que os seres humanos se unam, que exista cooperação mútua. Dentro de cada pessoa existem impulsos que visam a obtenção de satisfação e segurança e há tam-bém, além de muitos outros impulsos, um que a leva a ter contato com outras pessoas. Assim, desde os primeiros momentos de

vida, o ser humano busca o contato com outros da mesma forma em que busca satisfação e segurança internas. Ora, dentro deste enfo-que é fácil imaginar que buscamos con-tatos interpes-soais amistosos, afetivos, que nos ajudem em nossos impulsos para obter sa-tisfação e segurança. Porém, o que acontece frequentemente?Os contatos humanos são tão inadequados que desequilibram os pratos da balança e a luta para obter segurança e satisfação deixa de ser só com o meio ambiente natural para ser também uma luta interpessoal. Raios, terremotos, vulcões, seres micro e macros-cópicos por um lado, e ódio, agressões, in-diferença e irresponsabilidade por outro.

Assim, só podemos concluir com o Amor que Jesus, o Cristo pregava em sua infi nita sabedoria e deu o exemplo. Hoje, a ciência vem catalogar o amor como arma fundamen-tal no relacionamento sem angústias, afetivo, amistoso, cooperativo, tolerante, compreen-sivo. Dizer “eu amo” difere signifi cativamente de experimentar o amor.

Amar é muito fácil, basta não temer. Cui-de, esteja atento, mas não tema amar. Elogie, tolere, compreenda, pois só assim o mundo será melhor e mais saudável. 4

* Frater Adilson Rodrigues atuou como médico psiquiatra e homeopata; durante muitos anos foi palestrante ofi cial da AMORC e na década de 90 e anos 2000, foi diretor de Planejamento e Patrimônio da AMORC-GLP.