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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Patrícia Müzel de Paiva As Crianças entre as Drogas, a Polícia e a Segurança Mestrado em Ciências Sociais São Paulo 2018

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Patrícia Müzel de Paiva

As Crianças entre as Drogas, a Polícia e a Segurança

Mestrado em Ciências Sociais

São Paulo

2018

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Patrícia Müzel de Paiva

As Crianças entre as Drogas, a Polícia e a Segurança

Mestrado em Ciências Sociais

Dissertação apresentada à Banca

Examinadora da Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, como exigência

parcial para obtenção do título de Mestre

em Ciências Sociais sob orientação do

Prof. Dr. Edson Passetti.

São Paulo

2018

______________________________________

______________________________________

______________________________________

Resumo

A pesquisa As crianças: entre as drogas, a polícia e a segurança pretende

mapear, a partir de uma perspectiva genealógica, as ações histórico-políticas que

convergem na criação de um programa de prevenção às drogas, o PROERD (Programa

Educacional de Resistência às Drogas e à Violência), adaptação do programa norte-

americano D.A.R.E. (Drug Abuse Resistance Education). Interessa problematizar suas

articulações, não apenas dentro das disciplinas, como também dos controles. Analisa a

constituição de um sujeito-criança resiliente e participativo, voltado à segurança de si e

do espaço a sua volta em nome da construção de uma sociedade melhor – saudável, feliz

e segura.

Palavras-chave: drogas, segurança, polícia, criança

Abstract

The research Children: between drugs, the police and the security intent to map,

from a genealogical perspective, the historical-political actions that converge into

creating a drug prevention program, PROERD (Educational Program of Resistance to

Drugs and Violence), adaptation of the american program D.A.R.E. (Drug Abuse

Resistance Education). Problematize their articulations, not only within the disciplines,

as well as the controls. Analyzing the formation of a resilient and participatory subject-

child, leading to personal and living security improvements in the name of building a

better society - healthy, happy and secure.

Keywords: drugs, security, police, children

Agradeço à Fundação São Paulo, mantenedora da Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, pela concessão da bolsa dissídio para a realização desta pesquisa.

Agradecimentos

Aos meus pais, Mônica e Mário, pelo apoio e incentivo.

Ao Ricardo Mota, companheiro de vida acadêmica, pelas inúmeras conversas que

permeiam esta pesquisa.

À Salete Oliveira, pelas intensas e provocantes aulas e conversas.

Aos professores doutores Acácio Augusto e Maria Cristina Gonçalves Vicentin, pelo

diálogo e sugestões feitos na qualificação.

Ao Edson Passetti, pela paciência e generosidade desde a iniciação científica. Pelo tanto

que aprendi e pelo rigor que propiciaram essa pesquisa.

SUMÁRIO

Introdução ......................................................................................................................... 9

Capítulo 1. Proibição e Prevenção .................................................................................. 15

Proibicionsimo estadunidense e internacional ............................................................ 17

Proibicionismo no Brasil ............................................................................................ 41

Capítulo 2. Saber Polícia ................................................................................................ 58

Sobre a Polícia ............................................................................................................ 61

Modelo Profissional .................................................................................................... 72

Polícia Comunitária .................................................................................................... 78

Capítulo 3. Sobre o PROERD ........................................................................................ 88

Do D.A.R.E. ao PROERD .......................................................................................... 89

O Policial PROERD .................................................................................................. 100

Material ..................................................................................................................... 108

“Protegendo Nossas Crianças: ajudando a mantê-las seguras, livres das drogas e da

violência” .............................................................................................................. 108

Caindo na... REAL ................................................................................................ 125

Livro dos Pais ........................................................................................................ 137

Avalição do PROERD .............................................................................................. 147

Prevenção nas Escolas .............................................................................................. 152

Considerações Finais .................................................................................................... 164

Referências Bibliográficas ............................................................................................ 171

9

Introdução

Com a pesquisa “As crianças entre as drogas, a polícia e a segurança” busco

mapear, a partir de uma perspectiva genealógica, as ações histórico-políticas que

convergem na criação de um programa de prevenção às drogas, o PROERD (Programa

Educacional de Resistência às Drogas e à Violência), adaptação do programa

estadunidense D.A.R.E. (Drug Abuse Resistance Education). Interessa problematizar

suas articulações, não apenas dentro das disciplinas, como também dos controles,

analisando a constituição de um sujeito-criança resiliente e participativo, voltado a

segurança de si e do espaço a sua volta em nome da construção de uma sociedade

melhor – saudável, feliz e segura.

O PROERD se define como um programa de prevenção primária, que parte do

funcionamento de uma Polícia Comunitária, educando crianças e jovens a tomar

decisões de maneira “correta” e “segura” com o objetivo de valorizar a vida,

“contribuindo para o fortalecimento da cultura de paz e a construção de uma sociedade

mais saudável e feliz” (Livro PROERD, 2013: 3).

Essa nova polícia que atua para além da repressão, se apoia em valores como a

cultura de paz em uma sociedade cujas comunidades buscam ser saudáveis e felizes. A

programática da cultura de paz tem início no pós Segunda Guerra Mundial, mas é em

um documento de 2000, adotado pela UNESCO, que a cultura de paz assume, nos

termos atuais, seu [afamado] protagonismo. O Manifesto 2000 – por uma Cultura de

Paz e Não-Violência, pretende atribuir a todos a responsabilidade de promover paz e a

não-violência para o “futuro da humanidade”1.

1 Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/bibpaz/textos/m2000.htm. Acesso em: 15/09/2018.

10

Essa ação policial “comunitária” PROERD se dá na escola, espaço disciplinar

por excelência, [n]o qual desempenha o “papel de formadora de moral para a obediência

escorada em parâmetros humanistas, técnicos e disciplinares necessários para orquestrar

cidadãos e trabalhadores” (Passetti; Augusto, 2008: 73). A escola, a fábrica, o banco, as

instituições militares e policiais se estabelecem segundo suas direções e o

funcionamento das vigilâncias e punições pela hierarquia. Além disso, com a expansão

da educação democrática há uma institucionalização de uma nova forma de educar na

sociedade de controle, a qual envolve professores, alunos funcionários e a comunidade

(Idem: 73-74).

Dentro do programa PROERD, a educação preventiva pela da cultura de paz e

não-violência não se estabelece apenas na relação entre estudantes e polícia, mas existe

uma tentativa de aproximação entre agentes que consiste em uma ação conjunta entre

Instrutor Proerd – policial que passou por um curso de formação para atuar diretamente

com as crianças e jovens (Rateke, 2006: 42) – professores, especialistas, estudantes,

pais e comunidade.

Em qualquer sociedade o corpo se encontra preso no interior de poderes que lhe

impõem limitações, proibições ou obrigações, porém na sociedade disciplinar muitas

coisas são novas. Entre elas, a escala do controle. Não se trata, somente, de cuidar do

corpo em massa como se fosse uma unidade indissociável, mas trabalha-lo

detalhadamente, exercendo uma coerção sem folga. Implica uma coerção ininterrupta,

constante, que esquadrinha ao máximo o tempo, o espaço, os movimentos (Foucault,

2012: 132-133).

Esse método permite um controle minucioso das operações do corpo e impõe

uma relação de docilidade-utilidade, através das disciplinas. As disciplinas surgem em

um momento histórico, no qual surge também, uma arte do corpo humano, que visa à

11

formação de uma relação na qual o mesmo mecanismo é capaz de produzir obediência,

e quanto mais obediência mais utilidade e docilidade.

No século XVIII, com a ascensão da burguesia na sociedade europeia, surge a

necessidade de investimento na educação de crianças como forma de preparar o

indivíduo a vida adulta. A instituição reguladora voltada à normalização do

comportamento infantil – a escola – nasce com o propósito de atender a essa imposição

burguesa.

A escola é um lugar para educar crianças e jovens levando adiante o projeto

iluminista ao combinar humanismo com tecnicismo, exercícios físicos e formação

intelectual específica, conformando crianças e jovens com base em uma moral. Desde

pequenos aprendem a respeitar o professor, a assimilar as mínimas regras, o respeito aos

superiores. Dessa forma, a escola se constituiu na mais generalizada instituição de

captura, uma vez que sua ação é mais decisiva para a constituição da sociedade

disciplinar do que a prisão, o exército, o hospital, a fábrica (Veiga-Neto; Saraiva, 2011:

6).

Na sociedade disciplinar, a logica do confinamento é a técnica de exercício de

poder que prevalece, com o objetivo de extrair produtividade econômica e docilidade

política. Esse exercício de poder se expressa através da imagem do medo, algo a ser

evitado, e da qual cada um deve se precaver.

A criança é um problema para a sociedade que, então, a torna alvo de vários

investimentos de governo das condutas, vivendo sob vigilância, tutela, proteção e

assistência. Vê-se na criança e no jovem um perigo em potencial às estabilidades e

tranquilidades utópicas (Augusto, 2013: 39).

12

As lições do PROERD se apoiam na imagem do medo validada pelas

instituições do saber e do poder médicos ao citar as consequências do uso de drogas à

saúde e ao bom funcionamento do corpo, e mostrar rótulos de advertência do Ministério

da Saúde.

Segundo Foucault, o direito à Saúde consolidou-se em 1942, durante a Segunda

Guerra Mundial, com a elaboração do Plano Beveridge na Ingleterra, no qual “a

sociedade assume a tarefa explícita de garantir a seus membros não só a vida, mas a

vida em boa saúde” (Foucault, 2010: 168). Portanto, nos anos de 1940, ocorreu a

formulação de um novo direito, uma nova moral, uma nova economia, uma nova

política do corpo são, saudável e é este corpo do indivíduo são que se torna um dos

principais objetos de intervenção do Estado, um dos objetos de que o Estado também

deve se encarregar.

Os investimentos em uma educação atual para a resiliência de crianças e jovens

valoriza a formação, produção e restauração da melhoria de si e da melhoria dos outros

e objetiva dinamizar o vínculo entre tolerância e segurança. Segundo Oliveira,

semelhança dissolvida e ao mesmo tempo renovada nas medições e projeções

de cálculos probabilísticos governáveis, voltados ao governo de todos por

cada um (portanto, democrático); medianos e individualizados (derivados de

incontáveis nivelamentos pastorais); de suportar um impacto e refazer o

estado original, não como aquele que era, mas modulado por estados

conformados ao que pretende ser em condições de tolerância e, desta

maneira, pela capacidade de sustentar um determinado estado governável e

governado, pela vida tomada sob controle e gestão resiliente (Oliveira, 2011:

98).

Para a autora, a educação voltada para a formação de crianças e jovens

resilientes respalda novas práticas políticas de cuidados e proteção. E, assim,

possivelmente a resiliência seja hoje a expressão política muito próxima de um

“ecletismo acolhedor”, pelo qual o castigo permanece invariante (Idem: 94). Além de

13

sinalizar que pretende ser afirmado como “a ética do futuro” melhor, estável e

sustentável, configurando a continuidade da prevenção geral (Oliveira, 2012: 110).

Segundo Rodrigues, um dos subterfúgios para o controle social, atualmente, é a

proibição das drogas. A ilegalidade de muitas substâncias psicoativas é bastante recente,

uma vez que, há cerca de um século, não existiam proibições à produção, venda e

consumo de tais substâncias. Atualmente, o proibicionismo é o padrão mundial no

tratamento legal das substâncias psicoativas lícitas ou ilícitas. Dessa forma, a proibição

das drogas se apresenta como incremento das estratégias de controle social, sendo

sobreposta pelas noções de “classe perigosa”, “viciados” e “traficantes” identificando as

grandes ameaças à moral, à saúde pública e à segurança pública procedente das classes

populares.

Através da perspectiva genealógica penso ser possível situar os mecanismos

disciplinares e de fluxos de controle que atravessam o programa de prevenção

PROERD, fundado em três pilares: escola, família e polícia. E que supõe a educação

resiliente de crianças e jovens, voltada a melhorias de si e dos outros em busca de mais

segurança para almejar um futuro melhor.

A dissertação está dividida em três capítulos. O primeiro trata da evolução do

proibicionismo das drogas ao longo do século XX, como resultante de diversas práticas

sociais de uma cultura punitivista e moralista e das táticas de biopolítica de governo

populacional, focando principalmente nos Estados Unidos da América — EUA, o

principal protagonista desse movimento proibicionista no planeta, e no Brasil, assim

com a matriz do PROERD. O segundo capítulo situa a polícia, do seu surgimento de

uma forma geral e da mudança de atuação neste momento de transição no qual nos

encontramos de passagem do modelo profissional para as modulações da polícia

comunitária. E o terceiro capítulo, trata especificamente do PROERD em si, sua

14

história, materiais utilizados com as crianças e investimento em resiliência, tolerância e

segurança.

15

Capítulo 1. Proibição e Prevenção

As drogas sempre estiveram presentes e fizeram parte das sociedades. Hoje estão

associadas a pessoas “perigosas” e criminosas incluindo crianças e jovens, mas seus

usos remontam a rituais de diversos povos da antiguidade, como Egito e Grécia. Essas

substâncias estiveram sempre presentes nos contextos religiosos, místicos, terapêuticos,

festivos, entre outros, mas ao longo dos anos, de práticas sagradas e festivas, o uso

passou a ser considerado uma epidemia social, surgindo, então, a “questão das drogas”

(Escohotado, 1998).

Em toda sociedade o corpo se encontra no interior de poderes que lhe impõem

limitações, proibições ou obrigações, e na sociedade disciplinar muitas coisas são novas

no que diz respeito às tecnologias de poder. Entre elas, a escala do controle. Não se

trata, somente, de cuidar do corpo em massa como se fosse uma unidade indissociável,

mas trabalha-lo detalhadamente, exercendo uma coerção sem folga. Implica uma

coerção ininterrupta, constante, que esquadrinha ao máximo o tempo, o espaço, os

movimentos (Foucault, 2012). Trata-se de uma “economia do corpo”, de suas forças, da

utilidade e da docilidade delas, de sua repartição e de sua submissão, mesmo sem

recorrer a castigos violentos ou sangrentos. As disciplinas “permitem o controle

minucioso das operações do corpo, que realizam a sujeição constante de suas forças e

lhes impõem uma relação de docilidade-utilidade” (Ibidem: p. 133).

O controle e proibição de substâncias não são procedimentos recentes. Contudo,

considerar um conjunto específico de substâncias e seu uso como um “problema” é uma

questão mais recente com um desdobramento moral que delimita drogas de uso ilícito e

drogas de uso livre, tolerado ou controlado (Vargas, 2008). Há uma uniformidade nas

políticas de drogas nos países ocidentais, desde o século XX, que estabelece uma

16

distinção entre drogas e fármacos e reprime todas as formas de uso não médico de todas

as substâncias psicoativas, com exceção do álcool e do tabaco (Musto, s.d.).

O consumo de substâncias psicoativas data de milhares de anos atrás, com o uso

recreativo, terapêutico e sacramental e se converteu, ao longo do século XX, em um

empreendimento científico de destaque. A guerra contra algumas dessas substâncias

constitui uma tecnologia política com funções sociais complexas que culminam na

criação do problema chamado “drogas” (Escohotado, 1998: 13), resultado de diversos

fatores inicialmente autônomos que vão convergindo: o descobrimento de novos

psicoativos, pressão de movimentos proibicionistas, atribuição do consumo de

substâncias psicoativas a minorias sociais e imigrantes. Esses fatores podem ser

observados desde o final de século XIX, contudo, no século XX, seu fortalecimento e

convergência se aceleram com a ascensão dos Estados Unidos ao estatuto de potência

mundial e “convocando uma cruzada” interna e externa (Ibidem: p. 451).

No início do século XXI há uma grande quantidade de drogas psicoativas

proibidas pelos governos de diversos países, que pretendem estabelecer um acentuado

controle. Como o processo de produção, distribuição e consumo ocorrem em áreas

geográficas distintas, o “problema droga” passou a ser reconhecido como um tema

estratégico na agenda internacional. (Ventura, 554; 2013). Tais medidas se iniciaram no

século XX e, de um modo geral, o resultado mais visível são as leis sobre drogas que

seguem um mesmo direcionamento, o proibicionismo. Segundo Ventura, “o foco de

ação da comunidade internacional sobre as drogas era restrito às questões de segurança

internacional, uma vez que o tráfico de drogas influenciava (e influencia) o princípio de

‘soberania’ plena dos países em seu território” (Ibidem); consequentemente os países

reagiram com legislações focadas em proibicionismo, redução de oferta das drogas e

repressão do uso e do tráfico. Essas medidas legais repressivas, antes de serem uma

17

doutrina para tratar o “problema das drogas” é uma prática moral e política que defende,

como dever do Estado, a proibição de determinadas substâncias, desde a produção até o

consumo.

A proibição das drogas se apresenta como incremento das estratégias de controle

social, sendo a sobreposição construída entre “classe perigosa”, “viciados” e

“traficantes” grandes ameaças à moral, à saúde pública e à segurança pública. Esse

capítulo pretende apresentar como as demandas antidrogas são uma pressão moralista

que vem desde o final do século XIX e início do XX nas Américas, Europa e Ásia,

culminando em medidas repressivas e preventivas, dentre as quais o PROERD que se

apresenta como uma dessas medidas preventivas que atua nas escola através da polícia

comunitária.

Proibicionsimo estadunidense e internacional

Até o final do século XIX não havia legislações concernentes ao consumo de

drogas ou regulamentações quanto à produção, mas já havia movimentos sociais, como

os Movimentos de Temperança nos Estados Unidos e Inglaterra ao longo dos séculos

XVII e XVIII, que focavam na abstenção do consumo de álcool, associado à

imoralidade e à fraqueza de caráter, pouco autocontrole e irresponsabilidade social

(Blocker, Fahey, Tyrrell; 2003). Na virada para o XX a situação muda nos EUA, a

legalidade ao acesso a psicoativos passa a ser tema de crescente discussão. Não só os

EUA, mas diversos países adotaram políticas repressivas em torno de determinadas

substâncias, criminalizando a produção, o tráfico e o uso com propósitos não

medicinais.

18

No século XIX, tanto nos EUA quanto na Inglaterra, a influência do

protestantismo contribuiu decisivamente para o surgimento de grupos ou sociedades

abstêmias. A moderação encontra-se no próprio patrono da Reforma Protestante,

Martim Lutero o “idealista da moderação quanto ao uso de bebidas alcoólicas”

(Fernandes; 2015: 23). Em 1831, Joseph Livesey e outros sete trabalhadores se

comprometeram a não consumir mais álcool, influenciados pela doutrina religiosa

protestante, motivados pela situação dos trabalhadores ébrios e pela violência causada

pelo álcool na Inglaterra.

De acordo com Fernandes, essa ação de Livesey desencadeou manifestações

pelo país, que primavam pela garantia da saúde e dos costumes. Tal relação entre vício e

crime, moralmente, se sedimenta na sociedade estadunidense, tornando como dever do

governo regrar as condutas e criminalizar os vícios (Passetti, 2013; 50). Assim, o

proibicionsimo estadunidense foi fundamentado na relação entre coerção e saúde

pública, ligando o “problema da droga” a uma relação indissociável entre segurança e

saúde.

As ideias abstêmias de Livesey não se limitavam aos adultos, foram fundadas

organizações destinadas a crianças chamadas de “Band of Hope”, com cerca de 3

milhões de membros ao longo dos anos de 1890 a 1914 (McAllister, 2012: 2). As

reuniões ocorriam com a frequência semanal e tinham como metodologia palestras e

atividades diversas. Entre os materiais utilizados nas reuniões, Livesey foi responsável

pelo “The Mouse Trap”, com o dizer: “Cuidado com a BEBIDA - Tentação, Ruína,

Doença, Pobreza” (Ibidem, 1; T.A.).

19

Figura 1 “The Mouse Trap” (“Be Beware of DRINK—Temptation, Ruin, Ailment, Poverty”). Retirado

do Artigo “Picturing the Demon Drink: How Children were Shown Temperance Principles in the Band of

Hope” de Annemarie McAllister.

As “Band of Hopes” eram organizações voltadas para a educação musical, moral

e salutar, enfatizando dois aspectos centrais: os perigos do uso do álcool e a educação

religiosa, ensinando as crianças a se abster de bebidas alcoólicas desde muito jovens

para que se tornassem adultos abstêmios (moralmente sadios) (Blocker; Fahey; Tyrrell,

2003: 86). Do mesmo modo como procurava prevenir o consumo de álcool entre as

crianças, utilizavam-se das crianças para introduzir as ideias abstêmias em suas famílias

(McAllister, 2012: 2).

Essas organizações recorriam, principalmente, a recursos visuais para suas

atividades pedagógicas:

a tecnologia da lanterna mágica coincidiu com os anos mais expansionistas

no movimento de temperança. [...] No entanto, a experiência mais comum

das crianças de engajar-se com material de temperança visual teria sido

através do uso do quadro-negro. Este dispositivo simples provou o seu valor,

permitindo a ilustração preparada ou improvisada de qualquer tema e

facilitando que as crianças o utilizassem para contribuir com o ensino, o que,

na verdade, foi defendido. [...] Os relatórios anuais mostram enormes

aumentos no número de conjuntos de slides que foram encomendados e

emprestados. Histórias da Bíblia, desenhos animados, piadas e slides eram

todos anexos dos programas Band of Hope, mas, especificamente, os

conjuntos de slides relacionados à temperança eram geralmente de quatro

20

tipos. Havia imagens de figuras populares ou heroicas que defendiam a

temperança; figuras esportivas, como os jogadores de cricket Sir John Berry,

"Jack" Hobbs (1882-1963) ou Sir Donald George "Don" Bradman (1908-

2001) com o soldado e estadista Lord Kitchener (1850-1915) e Mickey

Mouse (Idem: 5; tradução da autora T.A.).

O argumento moral foi a principal estratégia usada pela “Band of Hope”,

especialmente em grupos ligados às escolas dominicais. Segundo McAllister (2012) seu

lema era um texto do Provérbio 22: 6: "Educa a criança no caminho em que deve andar;

e até quando envelhecer não se desviará dele". Além disso, a moral cristã cruzou com

construções sociais de respeitabilidade e comportamentos aceitáveis, que eram

apresentados em slides como o “Beber leva a negligência do dever, degradação moral e

crime”.

Figura 2 “Drinking Leads to Neglect of Duty, Moral Degradation, and Crime,” ca. 1880–1920? Black-

and-white lantern slide. Retirado no Artigo “Picturing the Demon Drink: How Children were Shown

Temperance Principles in the Band of Hope” de Annemarie McAllister.

As primeiras pesquisas que apontavam para o consumo intenso de álcool como

perigo à saúde era apresentado no material didático, com as estatísticas de óbito,

doenças e lesões acompanhadas por diagramas gráficos de órgãos “anormais”. Em

1888, iniciou-se o Programa de Ensino de Temperança Científica das Escolas onde

milhares de lições sobre álcool e saúde foram entregues em escolas por voluntários. As

21

crianças escreviam ensaios sobre temperança, eram avaliadas e finalmente certificadas

pelo programa. Depois de 1926, o Programa terminou, mas a “Band of Hope” continuou

envolvida com Educação em "Higiene" e "Saúde" e, eventualmente, no fornecimento de

material para educação pessoal, social e de saúde (Ibidem: 11).

No século XIX, o conceito de limpeza, de higiene como limpeza, ocupa um

lugar central nessas morais sobre a saúde do corpo, enfatizada em publicações que

colocam a limpeza como requisito para ter boa saúde, tanto ao indivíduo quanto àqueles

que o rodeiam. E a saúde é necessária para trabalhar para sustentar os filhos e como

forma de assegurar o trabalho social e a produção (Foucault, 2010). Segundo Foucault,

a saúde, a doença e o corpo se convertem em um instrumento de socialização dos

indivíduos.

Portanto, essa socialização se desenvolve progressivamente em um conjunto de

regras amplamente impostas, e o Estado “é o princípio de organização do consentimento

como adesão à ordem social, a princípios fundamentais da ordem social, e que ele é o

fundamento, não necessariamente de um consenso, mas da própria existência das trocas

que levam a um dissenso” (Bourdieu, 2014: p.31). Essa ordem pública, esse conjunto de

regras, tem como um dos seus princípios o Estado, mas não somente representado pela

polícia e o exército, em outras palavras, pelo monopólio da violência física. A ordem

pública se estabelece pelo consentimento.

Nos EUA, dois pastores presbiterianos, Justin Edwards e Lyman Beecher,

fundaram, em 1826, a Ameriacan Temperance Society. Afirmavam que o objetivo

destas sociedades abstemias se pautava na promoção de uma vida saudável, sem a

presença do álcool. Esses ideias elencadas de Edwards e Beecher foram amplamente

aceitas, resultando na formação de 2.200 sociedades nos EUA, com cerca de 170 mil

22

membros; a adesão cresceria ainda mais ao longo dos dez anos seguintes, somando 8

mil sociedades e mais de 1.5 milhão de membros (Fernandes, 2015: 26).

Grupos associados a igrejas protestantes começaram a se organizar ao final da

Guerra Civil americana (1861-65) para pressionar o governo a proibir a produção,

venda e consumo de substâncias psicoativas, principalmente o álcool. Segundo

Rodrigues (2003), um grupo de destaque é o Anti-saloon League, fundado em 1893. Os

saloons eram estabelecimentos que concentravam jogos de azar, prostituição e consumo

de álcool, três dos maiores vícios na concepção protestante; além deles havia o

Prohibition Party, a Sociedade para a Supressão do Vício e a Woman's Christian

Temperance Union.

As sociedades abstêmias, num primeiro momento, atuavam de forma mais

amena, propagando suas ideias para a sociedade através de folhetos e jornais, como o

Journal of the American Temperance Union, The National Temperance Advocate, The

Youth’s Temperance Banner, e The Water Lily, voltados para adultos, jovens e crianças

(Fernandes, 2015: 28). O Journal of the American Temperance trazia como símbolo

“The Star of Temperance” com os dizeres: “Intemperança, o uso de bebidas intoxicantes

é a causa da pobreza, doença, insanidade, crime e miséria” e “Temperança, abster-se de

bebidas intoxicantes leva a saúde, riqueza e felicidade” (Journal of Amercian

Temperance Union, 1837: 24; T.A.).

Há um momento em que estas “sociedades” passam de uma prática de

“conversão” para outra, a de imposição, acompanhada de um posicionamento mais

radical defendendo a proibição legal das bebidas alcoólicas (Fernandes, 2015: 29). Não

demoraria muito para que as reivindicações dessas sociedades abstêmias se

consolidassem em procedimentos legais proibitivos que incluíam o consumo, a

produção e a venda de bebidas alcoólicas.

23

Os saberes médico-farmacológico fundamentaram essas políticas de repressão.

Segundo Canguilhem, o termo “normal” passou para a língua popular, se naturalizando,

por meio de vocabulário específico da instituição pedagógica e da instituição sanitária

(Canguilhem, 2009: 108). A medicina como prática está intimamente ligada à reforma

hospitalar, que exprime uma exigência de racionalização, ao qual se chamou de

normalização.

Ainda segundo o autor,

a definição de normas higiênicas supõe o interesse que se dá — do ponto de

vista político — à saúde das populações considerada estatisticamente, à

salubridade das condições de vida, à extensão uniforme dos tratamentos

preventivos e curativos elaborados pela medicina.

Até o século XIX, na produção de substâncias de uso terapêutico, eram

utilizadas plantas inteiras, frescas ou secas, mas essas produções já sofriam

perseguições desde o século XVII, quando ocorreram várias tentativas de eliminação de

uma variedade de preparos considerados suspeitos ou inúteis (Vargas, 2008: 49).

Segundo Foucault (2010), foi justamente por volta do final do século XIX que a

medicina começa a funcionar fora do seu domínio tradicional, definido pela demanda do

doente, impondo-se ao indivíduo, doente ou não, como ato de autoridade. A saúde se

converteu em um objeto de intervenção médica; tudo que garante a saúde do indivíduo,

seja a salubridade da água, as condições de moradia, o regime urbanístico ou o consumo

de substâncias psicoativas, passam a ser um campo de intervenção médica, que não está

mais vinculada exclusivamente às doenças, e a medicina está dotada de um poder

autoritário com funções normalizadoras. Com o crescimento dos conhecimentos

farmacêuticos e biomédicos, a tônica das políticas relacionadas a psicoativos é marcada

pela distinção entre drogas e fármacos, reprimindo todas as formas de uso não médico.

24

Enquanto, no século XVII, a medicina era um instrumento de manutenção e

reprodução da força de trabalho para o funcionamento da sociedade moderna, onde o

Estado era encarregado de garantir a saúde física dos cidadãos, assegurando a força

física nacional, sua capacidade de trabalho e de produção, bem como de defesa e

ataques militares, a partir do século XX, o direito do homem em manter seu corpo em

boa saúde se converte em objeto da própria ação do Estado e a medicina encontra a

economia por outra via, pois pode produzir riqueza, na medida [em] que a saúde

constitui objeto de consumo produzido por uns (laboratório farmacêutico, médico, etc.)

e consumido por outros (os doentes potenciais e atuais): “a saúde adquiriu importância

econômica e se introduziu no mercado” (Foucault, 2010: 188).

Em 1906, nos EUA, é aprovada a Lei Federal sobre Alimentos e Drogas (Food

and Drugs Act) que regulamentou a produção e venda de substâncias psicoativas.

Assim, o controle de substâncias psicoativas dava indícios de relevância na agenda do

governo estadunidense não somente em leis regulamentadoras internas, mas também

internacionalmente com o presidente Theodore Roosevelt pressionando grandes

potências a limitar a o comércio global de ópio.

A China, no século XVIII, deu inicio a restrição do consumo de ópio. Em 1729,

o imperador Yongzheng, da dinastia Manchu, proibiu fumar ópio, mas não o cultivo da

papoula na China e o uso oral de ópio pelos agricultores. A proibição incitou corrupções

na burocracia e uma forte resistência do povo, fazendo com que, em 1793, o imperador

Chian-ch’ing proibisse o cultivo e a importação, alegando que o consumo de ópio se

restringia às pessoas de reputação duvidosa, entretanto ele se disseminou entre os

membros de família com boa reputação, estudantes e trabalhadores (Escohotado, 2003).

Após essa repressão, o contrabando de ópio na China aumentou.

25

Para o governo, o problema do ópio na China era uma percepção

de que o consumo de ópio atingia níveis preocupantes nas últimas décadas do

século XIX e início do século XX, com todos os malefícios decorrentes tanto

para a saúde quanto para a ordem públicas, foi capital para a constituição do

processo internacional de criminalização das ‘drogas’ (Sanches, 2010: 60).

Foi esse o pretexto que o governo de Theodore Roosvelt utilizou para encabeçar a

Convenção Internacional do Ópio, em 1912.

As Guerras do Ópio (1839-42 e 1856-60) entre a Grã-Bretanha e o governo

imperial chinês foram motivadas pela questão da proibição do ópio; os ingleses

forneciam a substância ao mercado chinês enquanto o governo imperial tentava limitar o

acesso de seus súditos ao psicoativo. Em ambas as guerras a China saiu derrotada, e

Inglaterra, França e Portugal impuseram, através da força, a legalização do ópio no

Império Chinês.

Por volta de 40 anos mais tarde, a questão do controle do ópio ressurge, dessa

vez com os EUA, que incentivaram a realização da Conferência de Xangai, em 1909.

Nessa, os EUA, a China e as potências como Inglaterra, França, Alemanha, Holanda e

Portugal se encontraram para discutir limites e controle à produção e ao comércio de

ópio e derivados, aceitando-se a proposta estadunidense de restringir o negócio de ópio

com o objetivo de promover o uso médico dos opiáceos.

De acordo com Rodrigues (2003), as decisões não se configuraram em ações

efetivas, mas dessa conferência iniciou-se a prática de encontros diplomáticos para o

controle de substâncias psicoativas. Apenas três anos depois (1912), mais uma vez os

Estados Unidos incentivaram uma nova conferência que ocorreu em Haia, Holanda, na

qual foi produzido um documento mais explícito na exigência de limitar a produção e

comércio de ópio e seus derivados e cocaína.

26

Apesar de mais enfática, essa conferência também foi pouco eficaz e efetiva,

mas consolidou a postura proibicionista dos EUA, incluindo as regulamentações de

substâncias, reforçando o uso médico e reprovando o uso lúdico. O primeiro capítulo do

Tratado de Haia estipula que os países deveriam elaborar leis eficientes ou regulações

para controlar a produção e distribuição de ópio, tomando medidas para prevenir

exportação a países que proibiram ou restringiram a entrada de ópio, limitando a

exportação a cinco quilos no máximo; o capítulo seguinte reforça a repressão da

produção e distribuição especificando que os países deveriam tomar medidas graduais

para suprimir a produção e proibir a importação e exportação o quanto antes:

Os poderes contratantes que ainda não estão prontos para proibir

imediatamente, a exportação de ópio,

(a.) Limitará o número de cidades, portos ou outras localidades

através do qual o ópio preparado pode ser exportado;

(b.) Proibirá a exportação de ópio preparado para países os quais

proíbem ou podem proibir a posteriori, a importação;

(c.) Deve, entretanto, proibir a exportação de ópio preparado para

países que desejam restringir a sua entrada, a menos que o exportador cumpra

os regulamentos de importação do país;

(d.) Deve tomar medidas para assegurar que cada pacote seja

exportado, contendo ópio, tenha uma marca que indique a natureza de seu

conteúdo;

(e.) Não permitirá a exportação de ópio, exceto por pessoas

especialmente autorizadas (Hague, 1912; T.A.).

O terceiro capítulo do tratado especifica o que deve ser entendido por ópio

medicinal, cocaína e heroína para que sejam promulgados leis ou regulamentos

destinando essas substâncias a fins exclusivamente médicos, controlando-se produção,

importação, venda, distribuição e exportação. Além disso, os Artigos de 15 a 19 são

específicos em relação a China: os países que mantém tratados com a China podem,

juntamente com o governo chinês, tomar as medidas necessárias para prevenir a entrada

de ópio, morfina, cocaína e heroína em território chinês e os estrangeiros que residem na

China devem cumprir as leis e regulamentações do governo.

27

A ação internacional estadunidense também auxiliou na elaboração e aprovação

de novas leis internas concernentes à regularização de substâncias psicoativas mais

rígidas do que as existentes até então. Uma vez que os EUA se colocaram na linha de

frente no controle sobre tais substâncias internacionalmente, ele também deveria

adequar suas leis internas. Em 1914 foi aprovada a Lei Harrison (Harrison Narcotic Tax

Act) que era "mais complexa e severa que acordos internacionais já assinados e que

investia na proibição explícita de qualquer uso de psicoativos considerados sem

finalidade médica" (Rodrigues, 2003: 29-30).

A Lei Harrison estabelece que “toda pessoa que produz, importa, fabrica,

compõe, lida, dispensa, distribui, dá ópio ou folhas de coca ou qualquer composto,

derivado, ou preparação deve se registrar com o coletor de receita interna do distrito”

(United States of America, 1914; T.A.), pagando impostos anualmente sobre seu

negócio. Dessa forma, um aspecto importante da lei é a delimitação da figura do

traficante e do viciado. O primeiro produz e comercializa substâncias psicoativas

irregularmente (não-registrado), portanto deve ser perseguido e preso. O segundo é

aquele que consome sem permissão médica, considerado doente e que deve ser tratado.

Com o proibicionismo, cria-se o mercado ilegal de substâncias psicoativas, o início da

economia do narcotráfico e os programas de saúde pública concernentes às drogas

consideradas ilegais.

A reprovação moral dos usos de substâncias psicoativas nos EUA, segundo

Rodrigues, acompanha a associação entre certas substâncias e determinados grupos. De

acordo com Escohotado (1994), a vigorosa reação puritana nos EUA vê com

desconfiança as massas de novos imigrantes e as grandes urbes, associando-se certas

drogas à chegada de determinados grupos sociais;

28

as primeiras vozes de alarme sobre o ópio coincidem com a corrupção

infantil atribuída aos chineses, o anátema da cocaína com o ultraje sexual dos

negros, condenação da marijuana com o surgimento de mexicanos, e o

objetivo de abolir o álcool com as imoralidades judaica e irlandesa (1994: 86;

T.A.).

Em todos os casos, a lógica era a mesma, minorias imigrantes com hábitos que

ameaçavam valores morais estadunidenses — lê-se cidadãos protestantes e de origem

anglo-saxônica — e que eram consideradas classes perigosas também por sua pobreza,

sujeira e imoralidades.

Antes da grande depressão econômica nos EUA, o consumo de maconha não era

considerado um problema de saúde ou de ordem pública, tanto que a proposta de incluí-

-la no projeto de lei do deputado Harrison foi veementemente atacada, alegando-se não

haver provas científicas suficientes para determinar que a maconha fosse uma

substância formadora de hábito e não se apontava para um problema de grande

significância nos EUA (Musto, 1972). Porém, em tempos de recessão ocorre uma

mudança de concepção. O consumo de maconha estava difundido principalmente entre

mexicanos, que migraram para os EUA no início do século XX para trabalhar em

lavouras de algodão e campos de beterraba, e esse costume foi tolerado durante o tempo

em que os empregos eram abundantes, contudo, com o alarmante desemprego os

mexicanos se tornaram uma presença inconveniente (Sanches, 2010). No final da

década de 1920, vários crimes foram relacionados ao uso da maconha e aos mexicanos,

iniciando-se estudos sobre o mal da maconha. E em poucos anos foram publicados

artigos alegando que muitos crimes tipificados estavam relacionados à maconha (Musto,

1972).

Assim como todas as instituições estatais, os EUA "formulavam políticas de

segurança que visavam, de um lado, o controle do seu território nacional e, de outro, da

população que habitava esse território" (Rodrigues, 2003: 32). Sob a justificativa de

29

"combate ao tráfico", os grupos sociais relacionados a determinadas substâncias

psicoativas eram perseguidos pelo policiamento do Estado. E esse combate ganhou

grande impulso com a aprovação da Lei Seca, em 1919.

Rodrigues relaciona o proibicionismo com o controle da população, apontada

por Foucault, e a necessidade de coordená-la, de integrá-la ao desenvolvimento do

aparelho de produção e controlá-la por mecanismos de poder: "era necessário, desse

modo, a constituição de saberes que forjassem corpos saudáveis para o trabalho e

mansos para o trato" (Rodrigues, 2008: 96); era preciso gerenciar as minúcias da vida

individual e coletiva para tornar os indivíduos produtivos, dóceis, úteis e sãos. Essa

nova forma de exercício do poder Foucault chamou de biopolítica.

Na teoria clássica da soberania, o direito de vida e de morte está diretamente

ligado à vontade do soberano. Este pode fazer morrer ou deixar viver, ou seja, o súdito

não é de pleno direito nem morto nem vivo, do ponto de vista da vida e da morte, ele é

neutro, sua vida ou sua morte só se tornam direitos pelo efeito da vontade do soberano.

Esse direito de vida e de morte se exerce de forma desequilibrada e sempre do lado da

morte, pois o poder do soberano sobre a vida só se exerce porque o soberano pode

matar.

A transformação do direito político, no século XVIII, modifica esse direito de

soberania, sem necessariamente apaga-lo, que será um poder exatamente inverso de

fazer viver e deixar morrer. Ao longo dos séculos XVII e XVIII, surgiram técnicas de

poder centradas no corpo individual:

eram todos aqueles procedimentos pelos quais se assegurava a distribuição

espacial dos corpos individuais (sua separação, seu alinhamento, sua

colocação em serie e em vigilância) e a organização, em tomo desses corpos

individuais, de todo urn campo de visibilidade (Foucault, 1999: 288).

30

Essas técnicas visavam aumentar-lhes a força útil através do exercício, do

treinamento, etc. Eram técnicas de racionalização e economia, um poder que deveria se

exercer de maneira menos onerosa possível, através de um sistema de vigilância, de

hierarquias, de inspeções, de relatórios. Tais técnicas Foucault chamou de técnicas

disciplinares.

A partir da segunda metade do século XVIII, Foucault observou o aparecimento

de outra tecnologia de poder que não excluía a técnica disciplinar, mas a integrava.

Diferente das disciplinas, que se aplica ao corpo, essa nova técnica se aplica à vida dos

humanos, ao homem-espécie. A disciplina rege a multiplicidade dos homens resumindo

essa multiplicidade em corpos individuais que devem ser vigiados, treinados, utilizados,

eventualmente punidos. Essa nova tecnologia, que Foucault chamou de biopolítica, não

resume os homens em corpos, mas os transformam em uma massa global, afetadas por

processos de conjuntos que são próprios da vida, como o nascimento, a morte, a

produção, a doença, etc. A biopolítica lida com a população, como problema biológico e

como problema de poder.

No final do século XVIII é introduzida uma medicina que vai ter a função

da higiene publica, com organismos de coordenação dos tratamentos

médicos, de centralização da informação, de normalização do saber, e que

adquire também o aspecto de campanha de aprendizado da higiene e de

medicalização da população. Portanto, problemas da reprodução, da

natalidade, problema da morbidade também (Foucault, 1999: 291).

Os mecanismos disciplinares do corpo e os mecanismos reguladores da

população são articulados um com o outro. Exemplo disso é a cidade-operária que

articula mecanismos disciplinares de controle sobre o corpo por sua quadrícula, pelo

recorte da cidade, pela localização das famílias que se encontram cada uma em uma

casa, e dos indivíduos, cada um em um cômodo. Mas há também uma série de

31

mecanismos que são regulamentadores e incidem sobre a população, garantindo sua

longevidade, procriação, etc.

Um dos elementos mais importantes, no século XIX, é o conjunto de saberes

constituído pela medicina e a higiene, dado o vínculo que estabelece entre as influências

científicas sobre os processos biológicos e orgânicos, ou seja, sobre a população e sobre

o corpo. Portanto, a medicina é um saber-poder que incide simultaneamente sobre o

corpo e sobre a população, tendo efeitos disciplinares e regulamentadores.

Segundo Julio Groppa Aquino, o homem está constantemente em busca de

amenizar suas angústias, enfermidades, debilidades, deficiências, aflições e tormentos.

“Daí a invocação incessante aos deuses” (Aquino, 1998: 86). O mito, a filosofia, a arte,

ciência seriam “remédios” à incompletude do ser. Os gregos atribuíram a palavra – ao

discurso filosófico – um poder de phármakon enquanto portador da verdade aclaradora;

a palavra também é de grande poder na literatura, no século XIX, onde “tinha o papel

fundamental de ensinar as pessoas a viver” (Ibidem). Mas se no passado, aprendia-se a

“cura” com porta-vozes de uma tradição, seja ela ancorada no logos, no divino, na arte,

hoje elegemos a ciência, particularmente os médicos, como guardiões privilegiados da

verdade do nosso tempo.

A biopolítica deve ser entendida como a maneira pela qual se racionaliza os

problemas atribuídos à prática governamental concernente a população, como a saúde, a

higiene, a natalidade, etc., que foram ganhando espaço nos séculos XVIII e XIX

(Foucault, 2008a). Portanto, a biopolítica é uma técnica das relações de governo dirigida

ao homem-espécie, governando-se a população com técnicas de segurança,

combinando-se com as leis e as normas disciplinares para exercer a soberania sobre o

território (Idem, 2008b). O controle e regulamentação das drogas consolida a autoridade

32

médica no século XIX e início do XX, período em que estabelece no Ocidente o uso

legal ou ilegal de psicoativos.

A Lei Seca proibia totalmente a produção, circulação, estocagem, importação,

exportação e venda de bebidas alcoólicas em território estadunidense. De um lado,

temos uma conquista do movimento proibicionista no país, e do outro, o surgimento de

mafiosos e contrabandistas, como Al Capone, dedicados ao mercado ilícito criado pela

Lei Seca. No entanto, o consumo não diminuiu e, até ser revogada em 1933, ela foi

relacionada ao crescimento do crime nos EUA (Sanches, 2010).

Após a Conferência de Haia, em 1912, ocorreram dois encontros em Genebra

nos anos de 1925 e 1931, nos quais os EUA defenderam novamente seu posicionamento

proibicionaista, procurando fortalecer as regulamentações da cocaína e dos opiáceos.

Segundo Rodrigues, os estadunidenses pressionaram para que o Tratado de 1931

incluísse uma cláusula obrigando os países signatários a "criar departamentos próprios

de repressão ao tráfico de psicoativos nos modelos daqueles instaurados pelos EUA nos

anos 1920" (Rodrigues, 2003: 34). Observa-se, agora, uma imperativa aceitação do

modelo de repressão estadunidense para lidar com a produção e comércio ilegal de

substâncias psicoativas.

Nos anos 1930, os Estados Unidos criaram duas agências regulamentadoras: a

Food and Drugs Administration (FDA) e o Federal Bureau of Narcotics (FBN). O

primeiro até hoje é responsável pela aprovação de novas drogas ou alimentos a serem

comercializados no país, e o segundo concentrava as iniciativas de repressão ao tráfico

de psicoativos, cuja chefia inaugural foi de Harry Jacob Anslinger, representante

estadunidense na Conferência de Genebra de 1925 e defensor das propostas anti-álcool.

Anslinger ficou a frente do FBN até 1962, quando se aposentou. Em 1968, a FBN se

fundiu ao Bureau of Drug Abuse Control, uma agência de controle de comidas e drogas,

33

para formar o Bureau of Narcotics and Dangerous Drugs (BNDD), sucedida pela atual

Drug Enforcement Administration (DEA).

Em 1933, a Lei Seca foi revogada, mas isso não impediu o avanço de novas

regulamentações para psicoativos já proibidos, como a cocaína e outros que ainda não

recebiam restrições diretas, como a maconha. Essa recebeu a primeira restrição rígida

em 1937, quando o governo de Franklin Roosevelt criou a Lei Tributária sobre a

Maconha (Marijuana Tax Act), proibindo a produção e comercialização da maconha e

derivados em território estadunidense. De acordo com Rodrigues (2004), a legalidade

recebeu ajuda da propaganda oficial, pretendendo convencer os cidadãos dos supostos

malefícios da maconha, como lascividade, indolência e agressividade.

O filme mais conhecido da propaganda oficial anti-maconha é o Reefer

Madness, de 1936, que começa dizendo:

O filme que você está prestes a assistir pode te chocar.

Não seria possível, de outra forma, enfatizar suficientemente a

pavorosa ameaça da nova droga que está destruindo a juventude da América

num número alarmantemente crescente. A maconha é essa droga — um

narcótico violento — um flagelo indescritível — O Verdadeiro Inimigo

Público Número Um!

Seu primeiro efeito é súbito, violento, risadas incontroláveis; então

surgem alucinações perigosas—– o espaço se expande — o tempo

desacelera, quase parando... ideias fixas vêm em seguida, evocando

monstruosas extravagâncias – seguida por distúrbios emocionais, a total

inabilidade de raciocinar, a total perda do pode de resistir à emoções...

conduzindo, finalmente, a atos de extrema violência... terminando, em muitos

casos, em insanidade incurável.

Ao retratar seus efeitos destruidores de almas, não atentamos

cometer equívocos. As cenas e incidentes, embora ficcionais para o propósito

da história, são baseados em pesquisas sobre as consequências do vício em

maconha. Se a sua verdadeira realidade fará você pensar, fará você notar que

algo deve ser feito para acabar com essa ameaça horrível, então o filme não

terá falhado em seu propósito...

34

Porque a terrível maconha pode ter como próximo alvo o seu filho

ou a sua filha ... ou seus filhos... ou SEUS FILHOS! (Reefer Madness, 1938;

T.A.).

Fonte: IMDb

Sensacionalista desde o pôster, o filme começa com o diretor do colegial Josef

Forte dando palestras para os pais sobre os males da erva, dizendo que é mais mortal do

que ópio, morfina e heroína juntos. Para ilustrar esse fato, ele conta a trágica história

“verdadeira” de alguns “jovens” de sua própria escola, Mary e Bill, que pagaram um

alto preço por se envolverem com negociantes de “drogas do mal”.

Tudo começa quando Bill e Mary, e o irmão de Mary, Jimmy, são convidados

para uma festa na casa de alguns personagens que encorajam os garotos a participarem

de fofocas. Aparentemente, os vendedores de drogas nunca pedem dinheiro pelo

35

produto, porque sua ambição subversiva é derrubar a sociedade transformando todos em

maconheiros.

Fumar a erva assassina tem o efeito imediato de fazer você dançar

incontrolavelmente ao jazz, rir de uma forma insana e se entregar a um comportamento

promíscuo — tudo logo depois de uma tragada. Um pianista em um café local é,

obviamente, um viciado em tempo integral e ele fica rindo como um louco o tempo

todo.

De qualquer forma, Jimmy e Craig são imediatamente fisgados, com terríveis

resultados para ambos. Rir e rir incontrolavelmente enquanto se sentir extremamente

excitado pode não ser um problema para tocar piano, mas não é uma boa combinação ao

volante de um carro, e Jimmy acaba num canteiro depois de atropelar um pedestre. Bill,

por outro lado, simplesmente fica maluco e acaba sendo julgado por assassinato.

Já Mary, ao visitar o apartamento de um revendedor em busca de seu namorado,

prova maconha pela primeira vez e é prontamente violada e morta. Tudo termina com o

Forte dando uma avaliação grave do estado mental vacilante de Craig: "No meio de uma

discussão extremamente séria sobre Romeu e Julieta, ele de repente deu uma gargalhada

histérica".

Enquanto as relações entre EUA e os Estados europeus se alinhavam, nos anos

1950, no que concerne o posicionamento em relação ao proibicionismo de psicoativos,

as relações com Estados considerados produtores se intensificavam, como com a

Turquia e o Irã. De acordo com Rodrigues, os EUA e países europeus "exigiam maior

rigidez no controle de opiáceos, maconha e cocaína e pouca regulação para psicoativos

sintéticos produzidos em suas indústrias farmacêuticas" (Rodrigues, 2003: 37). Em

contraposição, os países produtores de ópio bruto e folha de coca, defendiam, em caso

de proibição total de psicoativos, a inclusão de sintéticos nas leis internacionais.

36

Durante a Segunda Guerra Mundial houve um declínio de consumo de ópio,

cocaína e maconha nos Estados Unidos devido a escassez de suprimentos, pois as

remessas de países produtores de ópio foram cortadas ou prejudicadas por ações

militares. Contudo, a falta de suprimentos fez com que o preço dos psicoativos

aumentasse drasticamente, e atraído para as chamadas organizações criminosas. Isso

contribuiu para o enrijecimento do controle de psicoativos com a aprovação da Lei

Boggs Act em 1951 e a Lei de Controle de Narcóticos (Narcotics Control Act) em 1956;

instituindo "previsão de cinco anos de prisão para traficantes primários e penas de morte

para traficantes maiores de idade que vendessem drogas ilícitas a menores de dezoito

anos" (Rodrigues, 2003: 38). Ambas as leis estabeleciam, também, maiores penalidades

para todos os usuários de drogas.

Em 1961, na Convenção Única sobre Entorpecentes na Sede da ONU em New

York, ficou estabelecido o aumento do controle sobre o comércio legal de drogas

psicoativas (para uso médico) e intensificação do combate ao tráfico e produção de

ilícitos. No início do texto é mencionada a preocupação, dos países envolvidos (entre os

61 que assinaram, se encontram: Argentina Austrália, Bélgica, Brasil, Canada, Chile,

Dinamarca, Alemanha, Índia, Itália, Japão, México, Portugal, Grã-Bretanha), com a

saúde física e moral da humanidade, por isso a importância de medidas adequadas para

garantir a disponibilidade de entorpecentes para tais fins (ONU, 1961).

Esse é o modelo de orientação repressivo-terapeutista que se manterá em todas

as convenções internacionais (Escohotado, 1998), o qual estabelece que,

com ressalva das limitações de natureza constitucional, cada uma das Partes

se obriga a adotar as medidas necessárias a fim de que o cultivo, a produção,

fabricação, extração, preparação, posse, ofertas em geral, ofertas de venda,

distribuição, compra, venda, entrega a qualquer título, corretagem, despacho,

despacho em trânsito, transporte, importação e exportação de entorpecentes,

feitos em desacordo com a presente Convenção ou de quaisquer outros atos

que, em sua opinião, contrários à mesma, sejam considerados como

delituosos, se cometidos intencionalmente, e que as infrações graves sejam

37

castigadas de forma adequada, especialmente com pena prisão ou outras de

privação da liberdade (ONU, 1961, artigo 36).

A essência da convenção é fornecer uma ampla proposta de colaboração, tanto

para medidas repressivas quanto para medidas de tratamento, reabilitação e educação:

As Partes darão especial atenção à concessão de facilidades para o tratamento

médico, o cuidado e a reabilitação dos toxicômanos.

Se a toxicomania constituir um problema grave para uma das Partes,

e se seus recursos econômicos e permitirem, é conveniente que essa Parte

conceda facilidades adequadas para o tratamento eficaz dos toxicômanos

(ONU, 1961, artigo 38).

A década de 1960 foi marcada pela contracultura que contestava os padrões

morais estabelecidos. Nesse contexto, o uso de substâncias psicoativas ilícitas

(principalmente alucinógenos) se apresentava como ato de revolta contra a autoridade

estatal e a sociedade conservadora, além de atitude de autoconhecimento, autogoverno e

exploração das potências do corpo e da mente (Rodrigues, 2003).

Para o fortalecimento do combate às substâncias psicoativas – entre elas as mais

utilizadas eram a mescalina, a maconha e o LSD - foi criado, em 1966, o Escritório para

o Controle do Abuso de Drogas (Bureau of Drug Abuse Control) que dois anos mais

tarde se fundiu com o FBN, criando o Bureau of Narcotics and Dangerous Drugs

(BNDD). Segundo Rodrigues, a agência

representou um aumento na centralização das iniciativas de aplicação das leis

antidrogas nos EUA e a permanência da prática de se construir o alvo do

proibicionismo por meio da aglutinação um tanto arbitrária das substâncias

psicoativas ilegais em classificações genéricas e pouco precisas (Rodrigues,

2003: 41).

No âmbito internacional, os alucinógenos ganham relevância na criação de um

adendo à Convenção Única de 1961 e assinado em 1972, que inclui psicoativos não

regulamentados no tratado anterior e separados em quatro listas: 1) alucinógenos; 2)

anfetaminas; 3) e 4) diferentes classes de barbitúricos. Somente os alucinógenos eram

totalmente proibidos por não haver qualquer propriedade medicinal, de acordo com os

38

técnicos da ONU. Os alucinógenos foram completamente banidos sob a justificativa da

inutilidade médica, e compreendiam as drogas usadas pelos movimentos

contraculturais.

As normas internacionais acompanham o ritmo das reformas internas

estadunidenses. Em 1972, o presidente Richard Nixon afirma ser os psicoativos ilícitos

inimigos nº 1 da América, declarando guerra às drogas. Guerra essa que intensificou as

medidas repressivas com aumento de ações policiais de busca, apreensão de drogas

ilegais, combate a grupos clandestinos e redes de tráfico. Dessa forma se estabelece a

separação entre países produtores e consumidores, exteriorizando o tráfico de drogas e

categorizando os EUA como vítima.

Entre as décadas de 1960 e 1970, os EUA realizou operação antidrogas com o

objetivo de interceptar a entrada de maconha e heroína em território estadunidense.

Segundo Rodrigues, cinco fatores ajudaram o fortalecimento do tráfico de substâncias

psicoativas no continente americano: 1) consumo - nos anos de 1960 houve aumento do

consumo de maconha e psicodélicos, principalmente nas grandes metrópoles, abastecido

por importados e produções locais; 2) sedução econômica - o narcotráfico era um

mercado em expansão de grande lucro e para muitos latino-americanos era a única

forma de melhorar o padrão de vida; 3) vantagens latino-americanas - condições

geográficas e climáticas propícias para produção de Cannabis e arbustos de coca, por

exemplo, e a existências de práticas sociais já desenvolvidas, como "a cultura milenar

das folhas de coca nos Andes e os tradicionais circuitos de ilegalidade que constituíram

know-how para as organizações narcotraficantes que se formaram" (Rodrigues, 2003:

51); 4) proibicionismo - desenvolvimento de um negócio ilegal e extremamente

lucrativo de repressão inviável; e 5) tecnologia bancária - o dinheiro ilegal do

39

narcotráfico torna-se legal com depósitos e transações financeiras podendo ser

reaplicado em negócios clandestinos e não-clandestinos.

De acordo com Torcato, entre as décadas de 1960 e 1980, foram realizadas

várias conferências e eventos internacionais para “elaborar critérios para definição da

periculosidade das substâncias oferecidas no mercado lícito e as substâncias que

deveriam ser banidas da face da terra (em geral plantas ou fitoquímicos ligados a

tradições milenares de uso)” (2016; 315), entre eles o Single Convention on Narcotics

Drugs (1961), Convention on Psychotropics Substances (1971), United Nation

Convention Against Illicit Traffic in Narcotic Drugs and Psychotropic Subsatance.

Segundo Rodrigues (2004), esse período de transição pode ser pontuado

especificamente em 1985, quando Lewis Tambs, embaixador dos EUA na Colômbia,

afirma haver associação direta entre guerrilhas marxistas e organizações

narcotraficantes no país. Em 1986, Ronald Reagan reforça essas afirmações com o

documento National Security Decision Directive (NSDD 221):

a ameaça de segurança nacional representada pelo comércio de drogas é

particularmente grave fora das fronteiras dos EUA. A principal preocupação

são os países com uma indústria de narcóticos florescente, onde uma

combinação de organizações internacionais criminosas de tráfico, insurgentes

rurais, e os terroristas urbanos pode minar a estabilidade do governo local;

esforços corruptos para reduzir a produção de culturas de droga,

processamento e distribuição; e distorcer a percepção pública da questão de

narcóticos, de tal forma que se torna parte de um debate anti-U.S. ou anti-

ocidental.

Enquanto estes problemas são endêmicos para a maioria das nações assoladas

por narcóticos, seus efeitos são particularmente insidiosos para os Estados

democráticos do Hemisfério Ocidental. Além disso, a expansão da atividade

narcótica cria um problema regional, bem como um de países específicos.

[...]

Vários estados soberanos - Cuba, Nicarágua, e a Bulgária, por exemplo - têm

apoiado ou tolerada tráfico internacional de drogas por motivos financeiros

ou políticos (United States of America, 1986: 1-2; T.A.).

oficializando o posicionamento estadunidense de que "comunismo e narcotráfico agiam

em conjunto para minar a democracia e a saúde das populações" (Rodrigues, 2003: 74).

40

Além disso, o documento incita a criação de programas educacionais e de prevenção em

países de produção, trânsito e consumo de substâncias psicoativas:

o Secretário de Estado, em colaboração com o Diretor, USIA2 e o

Administrador da AID3, deve auxiliar no desenvolvimento de programas de

prevenção e educação de abuso de drogas em países de produção, trânsito e

consumo de drogas. Os aspectos da diplomacia pública desses esforços

devem ser revisados conforme o caso pelo Comitê Internacional de

Informação e pelo Comitê Político Internacional (United States of America,

1986: 4; T.A.)

O programa educacional mais conhecido que se originou nos Estados Unidos é o

Drug Abuse Resistance Education (D.A.R.E.) criada em 1983. O programa é uma

parceria entre o Departamento de Polícia de Los Angeles e o distrito escolar daquela

cidade com o intuito de conter consumo de substâncias psicoativas que vinha crescendo

na década de 1970 e início dos anos de 1980 e a violência que se vinculava ao consumo

dessas substâncias. O currículo era aplicado, num primeiro momento, somente às

crianças da quarta séria (Nogueira, 2010: 65).

Segundo Nogueira, inicialmente o programa era desenvolvido em 17 lições ao

longo de um semestre com o objetivo de desenvolver nos alunos noções de cidadania,

prevenir o abuso de drogas entre eles e auxiliá-los com técnicas de resistência a

violência, através da promoção de valores que julgam essenciais a uma “vida de

qualidade”.

O interesse pelo programa cresceu rapidamente e já em 1986 a Polícia de Los

Angeles e o Conselho de Assistência Jurídica se uniram para documentar o programa

D.A.R.E. em um projeto que resultou num programa modelo a ser aplicado

nacionalmente. Em 1987, 398 departamentos de polícia de 33 estados dos EUA

mandaram policiais para o treinamento em Los Angeles.

2 United States Information Agency.

3 Agency for International Development.

41

Nesse mesmo ano foi criado o D.A.R.E. America, uma organização nacional

sem fins lucrativos que

apoiava as iniciativas de prevenção do Programa naquele país, através: da

ação de conscientização nacional a respeito do Programa e sua eficácia; da

coordenação nacional de uma campanha para arrecadar fundos e fim de

confeccionar o material didático, filmes e outros materiais de ensino (os

quais, na sua maioria, protegidos por marcas registradas); da promoção de

treinamento dos policiais, nos centros de treinamentos regionais; e do

monitoramento do Programa para a manutenção dos padrões de fidelidade

nas reproduções (Nogueira, 2010: 66).

Segundo o site do programa D.A.R.E., o currículo atende crianças desde a

Educação Infantil até o Ensino Médio, pois especialistas concordam que a criança

precisa começar cedo a desenvolver “boas habilidades de tomada de decisão” e entender

as consequências de seus atos. Por isso o currículo do programa foi criado em parceria

com instituições como a Universidade Estadual da Pensilvânia, a Universidade do

Estado do Arizona, a Universidade de Akron, especialistas no campo do abuso de

drogas e da ciência da prevenção. O capítulo três dará mais detalhes sobre o assunto.

Proibicionismo no Brasil

A primeira lei, no Brasil, que demonstra a preocupação do Estado com as

substâncias psicoativas foi elaborada em 1851 no Regulamento Imperial, onde foram

estabelecidas regulamentações em relação à saúde dos portos, inspeção da vacinação,

exercício da medicina, policia sanitária, venda de medicamentos e quaisquer substâncias

medicinais; conforme dispõe:

Art. 67. Os medicamentos compostos, de qualquer denominação que

sejão, ou quaesquer outros activos, não poderão ser vendidos senão por pessoa

legalmente autorisada. Os droguistas não poderão vender drogas ou

medicamentos por peso medicinal, nem poderão vender os medicamentos

compostos chamados officinaes.

42

Art. 68. As substancias venenosas constantes da 1ª tabella a que se

refere o Art. 794 não poderão ser vendidas se não a Boticarios e droguistas

matriculados. As empregadas em artes e para fabricas só serão vendidas aos

fabricantes, quando estes apresentarem certidão de matricula (Brasil, 1851).

Porém, não há nenhuma referência explícita à proibição da fabricação ou

consumo dessas substâncias. De Acordo com Torcato, os médicos no Brasil já vinham

problematizando o uso de drogas, construindo-se uma patologização do consumo,

defendendo o uso dos fármacos pelas ciências médicas e a necessidade de um maior

controle sobre o comércio (Torcato, 2013: 121).

Em 1890, o Código Penal considerava crime contra a saúde pública ministrar ou

vender substâncias venenosas sem autorização ou fora dos devidos regulamentos

sanitários, “não há Proibição, mas torna-se ilegal a fabricação, a indicação, a aquisição e

o uso desses ‘venenos’ sem a expressa chancela estatal” (Rodrigues, 2004: 127).

Com o Código Sanitário, de 1892, proíbe-se a venda de cocaína, mas sem

previsão de punição ao infrator, o que não significa que não há repressão aos usuários e

aos estabelecimentos que vendiam cocaína fora do uso médico legítimo. Em 1911, em

São Paulo, foi elaborado o Código Sanitário substituindo o Código de 1894 que

regulava o exercício da medicina e da farmácia. O novo Código criou a Polícia

Sanitária, responsável por vigiar farmácias, panificadoras, restaurantes e bares

irregulares; reafirmava o Código Penal Federal, de 1890, que estabelecia a venda ilegal

de substâncias psicoativas como atentado a saúde pública (Idem: 132).

Nesse início de século, o país passava por uma transição, em um crescente

investimento dos centros urbanos onde a ordem e a limpeza tomariam o lugar da

4 “Art. 79. A Junta Central formará huma tabella explicativa das substancias venenosas, que só podem ser

expostas á venda por Boticarios e droguistas, assim como outra das mesmas substancias que podem ser

empregadas nas artes e fabricas. Estas tabellas serão revistas todos os annos e organisadas de novo,

quando for necessario fazer-lhe alguma alteração. Tanto as tabellas primitivas, como as organisadas

posteriormente, serão remettidas ás Commissões e aos Provedores para as distribuir pelos Boticarios e

droguistas, e faze-las publicar pela imprensa.”

43

doença, da insalubridade e do caos. As práticas sanitárias eram uma forma de combater

obstáculos que doenças e epidemias colocavam ao progresso material. Parte dessa

prática sanitária dependia do “poder curativo” do profissional de medicina, responsável

por restaurar o corpo ao que se considera como normal, como saudável. O corpo

saudável, no entanto, não depende meramente de norma biofisológicas, “a situação

social do indivíduo, a sua própria noção do que seria integridade corporal alterariam a

percepção de certos aspectos mórbidos. A necessidade médica seria antes de tudo uma

necessidade cultivada culturalmente” (Carneiro, 1993: 37).

Segundo Torcato (2013), em São Paulo, foi promulgado em 1917 um novo

regulamento sanitário que, em comparação ao Rio de Janeiro, previa maior punição e

menos tolerância aos hábitos indesejados, entre os quais os “hábitos elegantes” de usar

drogas. Um maior policiamento sanitário levou à taxação de multas e fechamento de

estabelecimentos que descumpriam a proibição de venda de entorpecentes fora do uso

médico.

Assim como nos EUA e outros países que aderiram ao movimento proibicionista

estadunidense, no Brasil também há um processo gradativo de institucionalização do

saber médico através da promulgação dos regulamentos sanitários e que torna o Estado

detentor legítimo desse saber, sendo o único autorizado a regulamentar a venda de

substâncias psicoativas e a elaborar de políticas de saúde públicas. Essa articulação

política se consolida com a implementação da Lei nº. 4.294 de 14 de julho de 1921 que

estabelece penalidades para os contraventores na venda de cocaina, opio,

morphina e seus derivados; crêa um estabelecimento especial para internação

dos intoxicados pelo alcool ou substancias venenosas; estabelece as fórmas

de processo e julgamento e manda abrir os creditos necessários (Brasil,

1921).

Progressivamente, adotou-se um modelo de prevenção alinhado à visão de

ilegalidade das drogas, repressão e abstinência; inserido em um processo mais amplo de

44

modernização e no ideal civilizatório brasileiro fundado no discurso médico-legal (Trad,

2009: 98). Portanto, segundo Rodrigues (2004), as leis e deliberações sobre psicoativos

— ou “venenos” — cumprem a função normativa de dotar o Estado de legitimidades e

instrumentos necessários para a aplicação do controle sobre o desejo e o consumo de

substâncias psicoativas.

O processo de criminalização de psicoativos começou no século XX de forma

muito semelhante aos Estados Unidos. Havia pouca regulamentação de substâncias

psicoativas na legislação no início do século XX, o consumo de drogas como morfina e

cocaína — provindas da Europa — se restringia a estabelecimentos como bordéis

luxuosos e fumèries. Ainda que o consumo se concentrasse na elite econômica do país,

grupos conservadores se expressavam através de campanhas e periódicos contra a

degeneração dos costumes, associando o vício a luxúria e o uso lúdico ao desvio moral.

O aumento do consumo de tais psicoativos fora desse círculo especiale a aversão a

maconha, considerada droga de negros, "auxiliou na produção de uma ambiente

favorável ao controle desses psicoativos" (Rodrigues, 2004: 77). No final da década de

1910, o consumo das substâncias psicoativas aumentou e se disseminou em outros

estratos sociais, o que fez com que os editoriais e campanhas dos grupos conservadores

mudassem de tom, exigindo leis que fortalecessem a repressão estatal.

Parte da prática médica consiste em receitar o remédio. Entre os tóxicos

produzidos que continham entorpecentes estavam a morfina, cocaína, ópio e éter,

destinados a fins terapêuticos, e portanto, a venda era efetuada exclusivamente pelas

farmácias sob prescrição médica (Carneiro, 1993: 38). Com a proibição da venda de

substâncias psicoativas, o acesso a elas se dá pelo receituário médico, portanto, o tráfico

fica ao encargo dos profissionais da área da saúde que desviam medicamentos ou

falsificam receitas (Rodrigues, 2004). Então, não há fabricação clandestina de drogas,

45

mas os “venenos” tem sua origem nos laboratórios farmacêuticos. As leis sanitárias

foram as responsáveis por diminuir a autonomia médica para receitar tais substâncias

livremente, na medida em que essas leis determinavam os “usos recomendados”, ou

seja, aqueles considerados com aplicação curativa comprovada.

Segundo Rodrigues (2004), a Conferência de Haia (1912), à qual o Brasil

compareceu, deu prerrogativas jurídicas às autoridades nacionais para a iniciativa

proibicionista no país. Editada, em 1921, a primeira lei de controle de psicoativos, pelo

Decreto nº 14.969 condenava qualquer uso não-médico de substâncias como ópio e seus

derivados e da cocaína e seus congêneres:

Art. 1º As substancias venenosas ou entorpecentes (anesthesicas ou

analgesicas), como o opio e seus derivados, a cocaina e seus congeneres, não

poderão ser despachadas pelas alfandegas, nem terão sahida quando vierem

como amostras pelo correio, sem licença prévia do Departamento Nacional

de Saúde Publica por intermedio da Inspectoria de Fiscalização do Exercicio

da Medicina, Pharmacia, Arte Dentaria e Obstetricia (Brasil, 1921),

e estabelecia penas mais rígidas para os vendedores ilegais:

Art. 5º Os droguistas só poderão vender as substancias referidas no

art. 1º aos pharmaceuticos e mediante pedido escripto e authenticado por

estes.

[...]

§ 2º Os infractores deste artigo serão punidos com a multa de 500$ a

2:000$ e o dobro nas reincidencias, além da pena criminal que fôr devida

(Ibidem),

e fortalecia a polícia sanitária:

Art. 3º Na Inspetoria de Fiscalização do Exercício da Medicina,

Pharmacia, Arte Dentaria e Obstetrícia haverá um livro especial em que serão

registradas as licenças e inscritas as informações necessárias sobre cada

partida cuja importação for autorizada.

§ 1º Esse livro será rubricado pelo inspetor dessa Inspetoria, que

nele deverá lavrar também os termos de abertura e encerramento.

§ 2º Entre as informações acima referidas deverão figurar sempre o

nome do consignatário, a substancia despachada, sua quantidade,

procedência, data da autorização e do despacho, etc.

Art. 4º As substancias referidas no art. 1º, só poderão ser importadas

por pharmaceuticos e droguistas licenciados, ou pessoa devidamente

autorizada pelo Departamento Nacional de Saúde Publica (Ibidem).

Nesse texto é possível destacar a diferenciação entre usuário e traficante; o

primeiro como uma vítima a ser reabilitada e o segundo como um criminoso a ser

46

punido (Brasil, 1921). Dessa forma, seguindo o modelo de Haia, alinhar-se às

determinações acordadas nos encontros internacionais significa estar sintonizado com a

postura proibicionista defendida pelos Estados Unidos e o Brasil seguirá frequentando

as reuniões internacionais, que pautam o ritmo de suas reformas legais.

Essa perspectiva reduz o usuário a doente e, com isso, vemos, novamente, a

intervenção da institucionalização médica que “aciona a engrenagem médico-legal, na

medida em que a avaliação da pessoa presa consumindo drogas depende diretamente de

um perito médico indicado pelo Poder Jurídico” (Rodrigues, 20: 136). Grande parte dos

usuários – “doentes” – ainda são de classes altas; consequentemente, os traficantes

criminosos são os de classes baixas (cafetões, prostitutas, estrangeiros, profissionais da

saúde que falsificam e desviam psicoativos). Dessa forma, o comércio ilegal agrupa

uma parte da população que é marginalizada e condenada moralmente pelas parcelas

mais conservadoras da sociedade, materializando em leis, os costumes antes não

vinculados ao Estado.

Na continuidade do estabelecimento de uma organização de políticas de drogas

no Brasil, o Decreto nº 20.930 de 1932 não trazia novidade no campo normativo, mas

apresentava alguns adendos com o propósito de encontrar maior efetividade à política

antidrogas que já ocorria. Esses adendos, de forma geral, são apenas o aumento da

punição do sistema, como por exemplo, a pena para tráfico de maconha que no decreto

de 1921 era de até quatro anos, agora poderia chegar a até dez anos. Enfim, segundo

com Toscano, a lei de 1932 pode ser considerada o marco de uma nova configuração

política, na qual o “poder executivo federal tomou para si a tarefa de coordenar uma

política nacional, com órgãos capazes de sistematizar informações sobre a circulação

das substâncias entorpecentes no país” (Torcato; 2016: 290).

47

Em 1936, foi criada a Comissão Permanente de Fiscalização de Entorpecentes

instituída pelo Decreto nº 790 (inspirado na Comissão Permanente da Liga das Nações)

que, seria responsável pelo saber estatístico sobre a circulação, produção e comércio

legal de substâncias psicoativas controladas.

Dois anos mais tarde, é imposto pelo Executivo, no Estado Novo (1938), o

Decreto nº 891 que sintetiza determinações de decretos anteriores e reforça a estratégia

repressiva do Estado às substâncias controladas, concretizando o controle estatal sobre o

comércio e o uso de substâncias psicoativas:

Artigo 3º: Para extrair, produzir, fabricar, transformar, preparar,

possuir, importar, exportar, reexportar, expedir, transportar, expor, oferecer,

vender, comprar, trocar, ceder ou ter para um desses fins, sob qualquer feras,

alguma das substâncias discriminadas no, artigo primeiro, é indispensável

licença da autoridade sanitária, com o visto da autoridade policial

competente, em conformidade com os dispositivos desta lei.

Artigo 4º: A Secção de Fiscalização do Exercício Profissional do

Departamento Nacional de Saude é a única repartição autorizada a conceder

certificados e autorizações de importação, exportação e reexportação de

substâncias entorpecentes a drogarias, laboratórios, farmácias e

estabelecimentos fabrís, quites dos impostos respectivos, que depositarem na

Caixa Econômica Federal, a importância que lhes for arbitrada como caução

de 40:000$000 a 30:000$000 para responder por eventuais multas e custas

processuais, bem como por outras cominações (BRASIL, 1938).

O decreto pretende “dotar o país de uma legislação capaz de regular

eficientemente a fiscalização de entorpecentes” e fazer com que o Brasil “esteja de

acordo com as mais recentes convenções sobre a matéria” (Brasil, 1938), com o

objetivo de adequar o ordenamento interno às Convenções internacionais.

Além de substâncias controladas, o Decreto também se detém nas ilegais,

proibindo a cultura das plantas precursoras e toda a circulação de matéria-prima e

produtos finalizados sem a autorização do Departamento Nacional de Saúde. Mais do

que nos decretos anteriores, o saber-médico serviu de suporte para a adoção de medidas

restritivas ao uso de psicoativos. O artigo 33 restringe o uso à esfera medicinal:

Artigo 33º: Facilitar, instigar por atos ou por palavras, a aquisição,

uso, emprego ou aplicação de qualquer substância entorpecente, ou, sem as

48

formalidades prescritas nesta lei, vender, ministrar, dar, deter, guardar,

transportar, enviar, trocar, sonegar, consumir substâncias compreendidas no

art. 1º ou plantar, cultivar, colher as plantas mencionadas no art. 2º, ou de

qualquer modo proporcionar a aquisição, uso ou aplicação dessas substâncias

- penas: um a cinco anos de prisão celular e multa de 1:000$000 a 5:000$000

(BRASIL, 1938).

E no artigo 63, a polícia aparece como o último responsável por colaborar no

esforço conjunto de repressão:

Artigo 63 As autoridades sanitárias e policiais prestarão auxilio

recíproco nas diligências que se tornarem necessárias ao bom cumprimento

dos dispositivos desta lei, atendendo prontamente às solicitações que nesse

sentido forem feitas (BRASIL, 1938).

Quanto ao usuário, o decreto dedica um capítulo às medidas de internação e

interdição civil. O viciado é considerado doente, devendo ficar subjugado à autoridade

sanitária local, passível de internação obrigatória ou facultativa e a ser monitorado pelas

autoridades sanitárias. O tratamento em domicílio não é permitido (artigo n. 28). O

usuário obterá a certificação de reabilitado por meio de internação em clínica médico-

psiquiátrico, ao traficante a reabilitação social somente pelo aprisionamento. No

entanto, é nesse decreto de 1938, que o usuário também será incriminado, não pelo ato

de intoxicar-se, mas pela posse de substâncias proibidas.

Em 1967, com o Decreto nº 159, equipara-se os medicamentos legais às

substâncias ilegais quando usados para fins não médicos. Segundo Toscano, a política

de drogas e a política de medicamentos estão intrinsicamente ligadas, não sendo

coincidência que no mesmo ano em que aprovada a Lei de Tóxicos é promulgada a Lei

nº 6.360 que define a obrigatoriedade de tarjas, garantindo o monopólio médico.

Em 1976, a Lei nº 6.368 (Lei de Tóxicos) reafirma a instituição da figura do

traficante como criminoso a ser punido e a do usuário como indivíduo que necessita de

tratamento. Essa Lei investe em medidas repressivas e preventivas:

Art. 2º Ficam proibidos em todo o território brasileiro o plantio, a

cultura, a colheita e a exploração, por particulares, de todas as plantas das

49

quais possa ser extraída substância entorpecente ou que determine

dependência física ou psíquica.

§ 1º As plantas dessa natureza, nativas ou cultivadas, existentes no

território nacional, serão destruídas pelas autoridades policiais, ressalvados os

casos previstos no parágrafo seguinte.

§ 2º A cultura dessas plantas com fins terapêuticos ou científicos só

será permitida mediante prévia autorização das autoridades competentes.

§ 3º Para extrair, produzir, fabricar, transformar, preparar, possuir,

importar, exportar, remeter, transportar, expor, oferecer, vender, comprar,

trocar, ceder ou adquirir para qualquer fim substância entorpecente ou que

determine dependência física ou psíquica, ou matéria-prima destinada à sua

preparação, é indispensável licença da autoridade sanitária competente,

observadas as demais exigências legais.

[...]

Art. 3º Fica instituído o Sistema Nacional Antidrogas, constituído pelo

conjunto de órgãos que exercem, nos âmbitos federal, estadual, distrital e

municipal, atividades relacionadas com:

II - a repressão ao uso indevido, a prevenção e a repressão do tráfico

ilícito e da produção não autorizada de substâncias entorpecentes e drogas

que causem dependência física ou psíquica (Brasil, 1976).

As medidas preventivas se encontram no primeiro capítulo da Lei de Tóxicos

reforçando o caráter técnico e científico, portanto imparciais, das ações:

Art. 4º Os dirigentes de estabelecimentos de ensino ou hospitalares, ou

de entidade sociais, culturais, recreativas, esportivas ou beneficentes,

adotarão, de comum acordo e sob a orientação técnica de autoridades

especializadas todas as medidas necessárias à prevenção do tráfico ilícito e

do uso indevido de substância entorpecente ou que determine dependência

física ou psíquica, nos recintos ou imediações de suas atividades.

Art. 5º Nos programas dos cursos de formação de professores serão

incluídos ensinamentos referentes a substâncias entorpecentes ou que

determinem dependência física ou psíquica, a fim de que possam ser

transmitidos com observância dos seus princípios científicos.

Parágrafo único. Dos programas das disciplinas da área de ciências

naturais, integrantes dos currículos dos cursos de 1º grau, constarão

obrigatoriamente pontos que tenham por objetivo o esclarecimento sobre a

natureza e efeitos das substâncias entorpecentes ou que determinem

dependência física ou psíquica (BRASIL, 1976).

Essa Lei foi regulamentada pelo Decreto nº 78.992/76 que criou o Sistema

Nacional de Prevenção, Fiscalização e Repressão de Entorpecentes segundo o qual o

Ministério da Educação e Cultura (MEC) juntamente com o Ministério da Saúde

coorderariam a execução dos programas previstos artigo 5º e seu parágrafo único até

que fosse implantado o Sistema de Prevenção, o qual ocorreu em 1980. O Decreto

85.110/80 foi revogado pelo 2.636/98, que mudou o nome do antigo Sistema Nacional

de Prevenção, Fiscalização e Repressão de Entorpecentes para Sistema Nacional

50

Antidrogas (SISNAD). Contudo não foram fixadas atribuições a serem desenvolvidas

pelo MEC nem pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), embora se mantivera a

inclusão de ensinamentos referente à matéria entorpecentes, abrangendo os currículos

dos cursos de formação de professores e de todos os graus de ensino. Em 2000, esse

decreto foi revogado pelo Decreto 3.696/00 que, como os anteriores, mantem a

promoção da inclusão de ensinamentos referentes a drogas em todos os níveis de

formação de professores e em todos os graus de ensino. Apesar de insistir na inclusão

de ensinamentos referentes a substâncias entorpecentes ou que causem dependência

física e/ou psíquica, nos cursos de formação de professores e nos currículos do ensino

fundamental, não há nenhum registro de sua concretização.

O Brasil caminhava sujeito as decisões internacionais e marcadas pela guerra às

drogas estadunidense, declarada por Nixon em 1971. Em 1986, o Brasil sediou a

Conferência Especializada Interamericana sobre Tráfico de Entorpecentes, no qual foi

elaborada a Comissão Interamericana para o Controle do Abuso de Drogas que,

segundo Torcato (2016), se tornaria referência de mecanismo multilateral nessa área.

Tais tendências do governo brasileiro se mantiveram na década de 1980 e 1990,

consonante às diretrizes reforçadas pela convenção de Viena sobre Drogas, em 1988, e

pelas ações estadunidenses nas décadas de 1980 e 1990, com destaque à criação do

projeto SIVAM (Sistema de Vigilância da Amazônia) e da Secretaria Nacional

Antidrogas (SENAD).

O SIVAM começou a ser desenvolvido em 1990, com o intuito de criar uma

rede de sensoriamento, através de satélites e radares em terra, para monitorar a extração

ilegal de madeiras e minerais, o trânsito de produtos contrabandeados e o tráfico de

drogas. O projeto começou a operar em 2002, sob responsabilidade do Ministério da

Defesa.

51

O SENAD foi criado pelo Decreto nº 2.632, de 1998, com o objetivo de

repreender e prevenir o tráfico ilícito, o uso indevido e a produção não autorizada de

substâncias entorpecentes e drogas que causam dependência física e psíquica através de

formulação de políticas antidrogas, programas e procedimentos; além de ser responsável

por ações de recuperação de dependentes:

Art 2º São objetivos do Sistema Nacional Antidrogas:

I - formular a política nacional antidrogas;

II - compatibilizar planos nacionais com planos regionais, estaduais

e municipais, bem como fiscalizar a respectiva execução;

III - estabelecer prioridades entre as suas atividades, por meio de

critérios técnicos, econômicos e administrativos;

IV - promover a modernização das estruturas das áreas afins;

V - rever procedimentos de administração nas áreas de prevenção,

repressão e recuperação;

VI - estabelecer fluxos contínuos e permanentes de informações

entre seus órgãos, bem como entre o seu órgão central e organismos

internacionais;

VII - estimular pesquisas, visando ao aperfeiçoamento das atividades

de sua competência;

VIII - promover a inclusão de ensinamentos nos cursos de formação

de professores, em todos os níveis, referentes a substâncias entorpecentes e

drogas que causem dependência física ou psíquica;

IX - promover, junto aos órgãos competentes, a inclusão de itens

específicos nos currículos de todos os graus de ensino, com a finalidade de

esclarecer os alunos quanto à natureza e aos efeitos das substâncias

entorpecentes e drogas que causem dependência física ou psíquica (Brasil,

1998).

Essa secretaria era vinculada à Casa Militar da Presidência da República, e hoje

é parte integrante da Secretaria Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD),

vinculada ao Ministério da Justiça. O SISNAD foi regulametado pela Lei nº 11.343 de

2006, tendo como finalidade a articulação, integração, organização e coordenação das

atividades relacionadas “a prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de

usuários e dependentes de drogas” e “a repressão da produção não autorizada e do

tráfico ilícito de drogas” (Brasil, 2006).

Portanto, no SISNAD são articuladas e distribuídas entre os diferentes órgãos

governamentais as ações voltadas para a área de drogas e, principalmente, é

estabelecido como a sociedade pode participar da elaboração das políticas. O Ministério

da Justiça é o órgão governamental central do SISNAD, sendo que as ações de redução

52

da oferta tem a polícia federal como órgão executivo e as ações de redução da demanda

tem a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD) como órgão que as

executa.

No SISNAD, a formulação de políticas sobre drogas ocorre através do Conselho

Nacional sobre Drogas (CONAD). Com a participação de diferentes representantes da

sociedade, este conselho é responsável por formular consensos e propor estratégias para

a redução da demanda e para a redução da oferta de substâncias psicoativas. Na esfera

estadual, existem os Conselhos Estaduais sobre Drogas e os municípios são estimulados

a implementarem o Conselho Municipal sobre Drogas. A imagem a baixo mostra a

estrutura do SISNAD.

Fonte: Duarte & Branco (2006)

O início do século XXI é marcado pelos crescentes movimentos sociais que

lutam pela descriminalização do uso de drogas, em especial a maconha. Esses

movimentos têm como maior ponto de encontro e exposição a Marcha da Maconha,

evento que acontece todos os anos e que nasceu em São Paulo e no Rio de Janeiro no

53

início dos anos 2000, ganhando força até alcançar projeção nacional. Além disso, hoje

os partidos identificados com a esquerda (PSOL, PCB e PSTU) se abriram pra discutir a

descriminalização e há o apoio de conglomerados de imprensa e personalidades

políticas, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Em 2006 foi promulgada a Lei nº 11.343 que apresenta algumas mudanças

conceituais em relação ao que vinha se fazendo, uma vez que os órgãos e as políticas

deixaram de serem “antidrogas” e se tornaram “sobre drogas”. Outra mudança foi “a

substituição das penas de privação de liberdade por outras nos casos referentes ao

consumo” (Torcato, 2016: 339).

Apesar das mudanças conceituais, apontada por Torcato, de forma geral, a

abordagem que se dá ao consumo de psicoativos é a mesma, a prescrição de medidas

para prevenção do uso indevido – lê-se, não médico –, repressão da produção e da

venda não autorizadas e define crime.

Portanto, a mudança de conceito não muda a perspectiva em relação às

substâncias psicoativas, mas apresenta uma maior preocupação coma nova abordagem

de prevenção e reinserção social do usuário e dependentes químicos. O Art. 19

estabelece os princípios e diretrizes de prevenção, sendo alguns deles:

I - o reconhecimento do uso indevido de drogas como fator de

interferência na qualidade de vida do indivíduo e na sua relação com a

comunidade à qual pertence;

II - a adoção de conceitos objetivos e de fundamentação científica

como forma de orientar as ações dos serviços públicos comunitários e

privados e de evitar preconceitos e estigmatização das pessoas e dos serviços

que as atendam;

[...]

V - a adoção de estratégias preventivas diferenciadas e adequadas às

especificidades socioculturais das diversas populações, bem como das

diferentes drogas utilizadas;

[...]

X - o estabelecimento de políticas de formação continuada na área

da prevenção do uso indevido de drogas para profissionais de educação nos 3

(três) níveis de ensino;

XI - a implantação de projetos pedagógicos de prevenção do uso

indevido de drogas, nas instituições de ensino público e privado, alinhados às

54

Diretrizes Curriculares Nacionais e aos conhecimentos relacionados a drogas

(Brasil, 2006).

Torcato (2016) sugere que estamos vivendo um momento de crise do modelo

proibicionista de políticas de drogas. Contudo, isso não significa que caminhamos para

a construção de uma cultura emancipatória do consumo de psicoativos, uma vez que,

políticas de prevenção e reinserção social do usuário ainda se pautam na proibição do

consumo de psicoativos fora do âmbito médico.

Surge, no Brasil, na década de 1960, as primeiras comunidades terapêuticas.

Essa modalidade de tratamento é proveniente da Grã-Bretanha, na década de 1940, onde

foi desenvolvida para o tratamento psiquiátrico crônico de militares que retornaram da

guerra com problemas psicológicos e que eram tratados em alas especiais de hospitais

comuns (Fosse; Guareschi, 2015: 98).

As comunidades terapêuticas para o tratamento de usuários de substâncias

psicoativas seguem o modelo de tratamento dos Alcoólicos Anônimos (AA), surgido

nos Estados Unidos na década de 1930, pelo corretor da bolsa de valores de Nova York,

Bill Wilson e o médico cirurgião Dr. Robert Holbrook Smith (Ibidem). O programa é

baseado na abstinência, na troca de experiências dos adictos e no programa de Doze

Passos: “1) Admitimos que éramos impotentes perante o álcool - que tínhamos perdido

o domínio sobre nossas vidas; 2) Viemos a acreditar que um Poder Superior a nós

mesmos poderia devolver-nos à sanidade; 3) Decidimos entregar nossa vontade e nossa

vida aos cuidados de Deus, na forma em que O concebíamos; 4) Fizemos minucioso e

destemido inventário moral de nós mesmos; 5) Admitimos perante Deus, perante nós

mesmos e perante outro ser humano, a natureza exata de nossas falhas; 6) Prontificamo-

nos inteiramente a deixar que Deus removesse todos esses defeitos de caráter; 7)

Humildemente rogamos a Ele que nos livrasse de nossas imperfeições; 8) Fizemos uma

relação de todas as pessoas a quem tínhamos prejudicado e nos dispusemos a reparar os

55

danos a elas causados; 9) Fizemos reparações diretas dos danos causados a tais pessoas,

sempre que possível, salvo quando fazê-las significasse prejudicá-las ou a outrem; 10)

Continuamos fazendo o inventário pessoal e quando estávamos errados, nós o

admitíamos prontamente; 11) Procuramos, através da prece e da meditação, melhorar

nosso contato consciente com Deus, na forma em que O concebíamos, rogando apenas o

conhecimento de Sua vontade em relação a nós, e forças para realizar essa vontade; e

12) Tendo experimentado um despertar espiritual, graças a estes Passos, procuramos

transmitir esta mensagem aos alcoólicos e praticar estes princípios em todas as nossas

atividades”5.

Essa vinculação entre tratamento e religião também é encontrada no Brasil, onde

as comunidades terapêuticas estão associadas às igrejas católicas e evangélicas:

“Em 1968, na cidade de Goiânia, surge no Brasil a primeira Comunidade

Terapêutica denominada Desafio Jovem, oriunda de um movimento religioso

evangélico. Em 1978, na cidade de Campinas, foi fundada a Comunidade

Terapêutica Senhor Jesus, oriunda de um movimento religioso coordenado

pelo Padre Haroldo Rham, missionário americano” (Fosse; Guareschi, 2015:

99).

Em 1990, foi fundada a Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas

(FEBRACT) pelo Padre Haroldo Joseph Rahm, pioneiro em Comunidades Terapêuticas

no Brasil, e pelo Prof. Saulo Montserrat6, com o objetivo de fortalecer, organizar,

capacitar e assessorar as Comunidades Terapêuticas em todo o território Nacional e

atuar em parceria com o poder público na elaboração e execução de políticas públicas.

Segundo o Glossário Álcool e Drogas da Secretaria Nacional de Política de

Drogas, a comunidade terapêutica é:

5 Disponível no site da Junta de Serviços Gerais de A.A. do Brasil:

http://www.alcoolicosanonimos.org.br/index.php/os-doze-passos. Acesso em: 02/07/2018.

6 Site da Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas: http://febract.org.br/portal/historia-da-

febract/. Acesso em: 02/07/2018.

56

“Um ambiente estruturado no qual indivíduos com transtornos por uso de

substância psicoativa residem para alcançar a reabilitação. Tais comunidades

são em geral especificamente destinadas a pessoas dependentes de drogas;

elas operam sob normas estritas, são dirigidas principalmente por pessoas que

se recuperaram de uma dependência, e são em geral isoladas

geograficamente” (Brasília, 2010: 42).

Segundo Fosse e Guareschi (2015), uma vez internado, o adicto deve

comprometer-se com o programa de tratamento da instituição que pode durar de seis a

doze meses, a critério da própria comunidade terapêutica, e onde terão atividades diárias

que podem ser laboral, terapêutica ou religiosa.

O modelo de tratamento residencial está fundamentado na premissa de que não

há possibilidade de reabilitação do dependente químico sem alterar o meio (o ambiente)

onde vive e retirá-lo da situação em que acontece o consumo de substâncias psicoativas.

Dessa forma, espera-se mudar o comportamento do indivíduo e reinseri-lo na sociedade

por meio da moral e da promoção de valores como responsabilidade, solidariedade,

honestidade, etc.

Temos, então, um ambiente disciplinar cujo modelo pode ser relacionado com o

manicômio, “embasado na compreensão de que a exclusão dos loucos estava justificada

pela necessidade de um local 'protegido', com regramentos de horário na rotina dos

asilados, foi por séculos justificado pelas ciências como possibilidade única para os

portadores de transtornos mentais” (Fosse; Guareschi, 2015: 100). Não apenas pelo seu

modelo se aproxima do manicômio, mas também no âmbito da proteção do corpo

social, atuando por meio do domínio geral da higiene pública, autoridade do saber

científico (Foucault, 2010).

De acordo com Fosse e Guareschi, o uso de drogas pode ser entendido como

ausência de razão, pois aquele sob o efeito de substâncias psicoativas perde o controle

de si e age movido por seus instintos, sendo potencialmente um risco para si e para os

57

outros. Nesse contexto, o usuário de drogas ou o adicto podem ser tomados como objeto

de intervenção psiquiátrica, devendo ser normalizado.

As comunidades terapêuticas trazem, além da disciplina, o elemento da moral

religiosa. Assim “A justiça, a psiquiatria e a moral cristã compõem uma rede de

instituições que tem como objetivo comum e único a abstinência” (Fosse; Guareschi,

2015: 103), uma vez que o consumo de substâncias psicoativas está vinculado, desde o

começo do proibicionismo, à moral religiosa que associa prazer ao “mal”.

Em abril de 2018, o governo federal lançou um edital no valor de R$87,3

milhões para a contratação de comunidades terapêuticas. São 7 mil vagas que deverão

atender 20 mil pessoas por ano. Esse programa é uma iniciativa que envolve o

Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional de Política sobre Drogas (Senad);

o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS); o Ministério da Saúde; e o Ministério

do Trabalho (Brasília, 2018).

O capítulo está sem conclusões.

A política de “guerra às drogas” expressa a crimanalização de condutas

massivamente praticadas em todo o mundo e que remontam a hábitos e costumes

culturais anteriores a própria história.

58

Capítulo 2. Saber Polícia

Na sociedade de soberania o exercício do poder sobre o corpo se encontra

fundado no patria potestas do direito romano, no qual o direito de vida e morte era

concedido ao pater familia romano sobre os seus filhos e escravos; assim, era permitido

ao pai de família romano retirar-lhes a vida, já que a tinha concedido. Entre soberanos e

súditos, o direito de vida e morte não se exerce em termos absolutos e de modo

incondicional, mas apenas nos casos em que se encontre exposto em sua própria

existência; portanto, o direito de soberania era um poder de vida e morte condicionado à

defesa e à sobrevivência do soberano. Com isso, o exercício do direito de vida e morte

pelo poder soberano ficaria restrito aos casos de guerra em defesa do soberano e de sua

própria autoridade – o soberano exerceria “indiretamente” este direito através das

declarações de guerra, ordenando que os súditos guerreiem e morram em seu nome –, e

nos casos de desobediência da lei – nesse caso o soberano poderia exercer de forma

direta o seu poder sobre a vida do súdito através de suplícios e pena de morte.

Dessa forma, a soberania poderia ser resumida como: fazer morrer, deixar viver.

Isto demonstra de forma clara que, desde a Antiguidade, a soberania sempre foi

exercida como uma ação – fazer morrer – e não por sua expressão omissiva – deixar

viver.

A soberania, como um poder de fazer morrer, exteriorizava-se através da lei. A

lei é exatamente a forma do imperativo que nasce da promulgação pelas instâncias

oficiais do poder soberano. A lei nada mais é que o discurso jurídico entendido como

regra que materializa a expressão do poder soberano. É a lei, portanto, como

materialidade da expressão da soberania que garante e assegura o uso legítimo da força.

59

Esta relação entre soberania e lei, fez com que se tornasse indissolúvel a associação

entre lei, punição e morte até os dias de hoje.

Porém, o Ocidente conheceu, a partir da modernidade, uma grande alteração

nestes mecanismos de poder. Transformava-se agora em um poder “destinado a

produzir forças, a fazê-las crescer e a ordená-las mais do que a barrá-las, dobrá-las ou

destruí-las” (Foucault, 2012b: 148).

A mudança no tratamento da pena de morte pode ser tomada como exemplo da

substituição da soberania clássica pela biopolítica. “A partir do momento em que o

poder assumiu a função de gerir a vida, já não é o surgimento de sentimentos

humanitários, mas a razão de ser do poder e a lógica de seu exercício que tornaram cada

vez mais difícil a aplicação da pena de morte” (Foucault, 2012b: 150). Então, o direito

de causar a morte e deixar viver foi substituído por um poder de causar a vida e

devolver a morte:

se fizéssemos uma história do controle social do corpo, poderíamos mostrar

que, até o século XVIII inclusive, o corpo dos indivíduos é essencialmente a

superfície de inscrições de suplício e de penas; o corpo era feito para ser

supliciado e castigado. Já nas instâncias de controle que surgem a partir do

século XIX, o corpo adquire uma significação totalmente diferente; ele não é

mais o que deve ser supliciado e castigado, mas o que deve ser formado,

reformado, corrigido, o que deve adquirir aptidões, receber um certo número

de qualidades, qualificar-se como corpo capaz de trabalhar (Foucault, 2002:

109).

Este novo poder preocupado com a vida já não se conciliava mais com a

soberania como poder de fazer morrer e deixar viver. Isto fez com que este novo poder

se manifestasse através de técnicas que gerissem a vida, aumentassem sua força, melhor

distribuíssem os corpos. A estas duas técnicas de poder, Foucault denominou de

disciplinas e de controles reguladores. “A velha potência da morte em que se

simbolizava o poder soberano é agora, cuidadosamente, recoberta pela administração

dos corpos e pela gestão calculista da vida” (Foucault, 2012b: 152).

60

Assim, estas novas técnicas se exteriorizaram através de um outro imperativo,

que não precisava ser formalmente posto pelo Estado; e este mecanismo é a norma. Esta

sociedade que passa a se utilizar da norma como expediente de gerência da vida,

Foucault deu o nome de “sociedade de normalização” que se contrapunha a “sociedade

punitiva”.

Ao longo dos séculos XVII e XVIII, as relações de poder passam por muitas

transformações. O velho direito de “causar a morte ou deixar viver” foi sendo

substituído por um poder de “causar a vida”, pois agora é sobre avida que o poder

estabelece seus pontos de fixação. Esse poder desenvolveu-se em duas formas

principais: 1) corpo como máquina, o qual exerce um poder de adestramento, de

ampliação de suas aptidões, de extorsão de suas forças, de sua utilidade e docilidade, de

sua integração em sistemas de controle eficazes e econômicos; e 2) corpo-espécie,

pensado como suporte dos processos biológicos como proliferação, nascimento e

mortalidade; surge, então, no terreno das práticas políticas e observações econômicas,

os problemas de natalidade, longevidade, saúde pública, habitação e migração. Foucault

situa que, ao longo desses dois séculos, multiplicou-se por todo o corpo social

verdadeiras instituições de disciplina, tais como as oficinas, as fábricas, as escolas e as

prisões.

Ao contrário do que ocorre no poder da soberania, o poder disciplinar não está

vinculado à existência física do soberano, mas nos corpos dos sujeitos e seus atos.

Enquanto o poder soberano se apropriava e expiava os bens e riquezas dos súditos,

governava o território, o poder disciplinar não se detém como uma coisa, não se

transfere como uma propriedade, mas governa os corpos.

61

Além da multiplicação das instituições de disciplina, Foucault salientou que os

séculos XVII e XVIII também assistiram a uma efusão de dispositivos disciplinares ao

longo de toda a extensão da estrutura da sociedade.

A vigilância, a disciplina e o exame: todos os dispositivos disciplinares

funcionam, portanto, como um laboratório de poder, proporcionando um aumento de

saber em todas as suas frentes. O poder disciplinar, portanto, passa, a partir da segunda

metade do século XVIII, a ser complementado pela biopolítica. Ambas as espécies de

poder passam a coexistir no mesmo tempo e no mesmo espaço.

O corpo se torna objeto de investimento como coisa de energia e força suscetível

de ser apreendida e retida; ao mesmo tempo em que é alvo de poder. Um dos momentos

de cruzamento, desse duplo investimento, é o modelo quase ideal do acampamento

militar:

é a cidade apressada e artificial, que se constrói e remodela quase à vontade;

é o ápice de um poder que deve ter ainda mais intensidade, mas também mais

discrição, por se exercer sobre homens de armas. No acampamento perfeito,

todo o poder seria exercido somente pelo jogo de uma vigilância exata; e

cada olhar seria uma peça no funcionamento global do poder. [...] Define-se

exatamente a geometria das aldeias, o número e a distribuição das tendas, a

orientação de suas entradas, a disposição das filas e das colunas; desenha-se a

rede dos olhos que se controlam uns aos outros (Foucault, 2012d: 165).

Dá-se, assim, o “confisco” de determinados corpos e sua preparação para a

função específica, na sociedade disciplinar, como polícia militar.

Sobre a Polícia

A gestão do Estado centrada na polícia estabelece um corpo sadio disposto ao

trabalho de controle da delinquência e da criminalidade que, segundo José Eduardo

Azevedo (2003), articula um conjunto de intervenções em diversos campos, como

62

cultural – moral, costumes –, de saúde coletiva, segurança pública, assistência aos

pobres e regulação do comércio e do trabalho.

O termo polícia deriva da raiz politeia, vinculado a organização societária da

Grécia antiga, a polis, ou cidade-Estado. Nessa época, a cidade era a principal unidade

política, e a arte de governar era entendida como prática pedagógica da família na

constituição dos futuros cidadãos:

nesse aspecto, a polícia, como instrumento de manutenção da segurança da

cidade, não era vinculada a uma incipiente organização estatal, mas aos

interesses de setores privados, ainda que submetida a um controle

governamental em sua funcionalidade. Essas polícias helênicas eram

descentralizadas e pouco coordenadas entre si, vinculadas aos interesses de

grupos econômicos, faziam reconhecer-se como: polícia dos mercados,

polícia dos e polícias dos cereais (Azevedo, 2003: 32).

Em Roma, foi dado ao termo politeia dois sentidos: e de res publica – coisa

pública – e o de civitas – negócios da cidade. Assim como na Grécia, as funções de

defesa, segurança pública e prisões exercidas por essa polícia ainda são reservados às

famílias, as quais encaminham e citam diante do magistrado público a sentença a ser

cumprida pela vítima. Posteriormente, com a transição do período republicano para o

Império, os juristas romanos dão um significado específico à noção de polícia que não

mais resulta da violência social, mas da afirmação do poder soberano sobre os súditos.

Otávio Augusto enfraquece o senado e cria a polícia como força pública e instituição

garantidora de seu poder pessoal (Azevedo, 2003: 34).

Simultaneamente, são criadas outras instituições com poderes policiais

comandadas pelo prefeito da cidade: os vigiles, que patrulham as ruas à noite e

combatem incêndios, e os staionarii, que possuem postos fixos em “departamentos” de

polícia de bairro.

Durante o feudalismo, em decorrência da descentralização política, o homem das

sociedades medievais era sujeitado a controles diversos que o mantinham sob vigilância

63

por meio das corporações, associações e, sobretudo, da Igreja. Também por

consequência da descentralização política, o poder de polícia é considerado um direito

dos proprietários de terras e das Casas Medievais, entidades públicas que dividiam, com

o soberano, o direito de governar baseado nas de vassalagem. Os cavaleiros das Casas

Medievais mantinham a ordem e levavam os criminosos perante a corte dos lordes,

sendo assim, unidades derivadas do reino (Bayley, 2003: 39-40).

Segundo Azevedo, por conta de conflitos, escassez de recursos e a peste durante

séculos as cidades eram bastante desorganizadas; e a crescente dispersão e conflitos

locais fez com que senhores feudais e a burguesia comercial constituíssem “uma

organização centralizada de recursos financeiros, forças bélicas, decisões políticas e

codificações de leis para o esquadrinhamento de corpos perigosos” (Azevedo, 2003:

36). A partir disso vai se configurando os rudimentos da polícia como dispositivo para a

vigilância e controle da plebe.

Portanto, o nascimento da polícia resulta da reforma da justiça e da consolidação

do poder soberano, uma vez que o poder de justiça – o direito de julgar – que confere a

função de polícia, de impor o castigo público e a punição estatal.

Na Inglaterra, os oficiais de polícia públicos, diretamente responsáveis junto ao

poder soberano, eram os xerifes – “termo derivado de shire-reeve (prefeito de distrito),

que era nomeado oficial real pelos reis normandos no século doze e recebia poder para

cobrar impostos de criminosos e dos Tything e Hundreds7 que não capturavam os

criminosos” (Bayley, 2003: 41). Até o século XVIII, os únicos agentes de manutenção

da lei eram os xerifes e os juízes comerciais londrinos.

7 Divisões geográficas organizadas como uma espécie de aliança de clãs, os Tythings (dez famílias) e os

Hundreds (dez Tythings), sob a responsabilidade de lordes.

64

Ao longo do século XVIII, os militares eram convocados a realizarem

policiamentos nas principais cidades e regiões industrializadas devido aos conflitos e

insurreições urbanas. Contudo, a pouca preparação, treinamento e equipamento, a

contribuição das milícias do exército contribuíram para a exacerbação dos problemas de

ordem pública. Consequentemente, a demandada inicialmente pela intervenção militar

para conter a violência interna foi diminuindo, dando espaço as organizações múltiplas

de polícia: privadas, públicas e mistas, voluntárias ou remuneradas circunscritas a

pequenos territórios e sem legitimidade para o exercício de suas operações. (Azevedo,

2003: 41-42).

Em A sociedade punitiva, Foucault aponta uma crescente criação de grupos

espontâneos para garantir a ordem. A razão para a proliferação dessas sociedades de

ordem moral é o desenvolvimento econômico, em um período de deslocamento

populacional. Com esse desenvolvimento há uma subversão das antigas organizações

territoriais – burgos, justiça de paz, paróquias –, enquanto nas grandes cidades, os

grupos de indivíduos não organizados somam-se aos núcleos urbanos que não são

capazes de enquadrá-los ou assimilá-los em suas próprias organizações (Foucault, 2015:

97).

Nesse novo cenário exigia-se uma nova ordem, uma maneira de conseguir

controlar as populações e impedir os saques e furtos cotidianos – impedir a transferência

de propriedade. Contudo o regime inglês não oferecia essa garantia devido à

descentralização do poder central que tinha “a microterritorialidade dos organismos

judiciários e dos instrumentos de penalidade, que não podiam deslocar-se e acompanhar

os movimentos da riqueza” (Foucault, 2015: 98).

Foucault apresenta quatro grupos que assumiam explicitamente como objetivo a

vigilância, o controle e punição, na Inglaterra desde o fim do século XVII. São eles: 1)

65

as comunidades religiosas dissidentes, como os quakers e os metodistas: tinham como

função “garantir no interior do grupo algumas tarefas de repressão e sanção moral” –

inspetores de moral examinavam casos de desordem como adultério, fuga ao trabalho,

embriagues –, e garantir um controle externo do grupo, se tratando de elemento que

pudessem circular as fronteiras dos grupos como desempregados, miseráveis, inválidos,

loucos; 2) sociedades vinculadas indiretamente as comunidades religiosas: tinham como

objetivo “impor respeito ao domingo, ou seja, impedir que as pessoas se distraíssem,

fossem à taverna, lá se reunissem e gastassem; impedir o jogo e a bebedeira, fontes de

despesas e obstáculos ao trabalho; eliminar prostituição e tudo o que pudesse ameaçar a

família; reprimir os desvios de linguagem”, se diferenciam das comunidades religiosas

por não terem como objetivo uma disciplina endógena; 3) grupos de autodefesa com

caráter paramilitar: morador dos bairros de Londres se organizaram em patrulhas para

garantirem a vigilância e a ordem moral, entres eles se encontravam os notáveis e a alta

burguesia, posteriormente se utilizarão de pessoas mais pobres para cumprir tais tarefas;

e 4) grupos com caráter econômico: espécie de polícia particular responsável por vigiar

a fortuna da burguesia “nas novas formas em que ela se encontra exposta em pleno

período de desenvolvimento econômico (lojas, docas, estradas)” (2015: 100-101).

Essas sociedades não tinham como função detectar e punir o crime, mas atacar

falhas morais, propensões psicológicas, hábitos, modos de ser, comportamentos como a

preguiça, o jogo, a devassidão. Tratava-se, portanto, da produção não só de uma sanção

penal, mas de algo mais positivo e contínuo, o governo das condutas.

Além desse movimento de práticas de vigilância espontâneas organizadas por

grupos que tentam moralizar o sistema penal, procurando criar uma continuidade entre

controle e repressão moral e sanção penal, Foucault também aponta “um movimento por

meio do qual a exigência de moralização se desloca em direção ao Estado” (Foucault,

66

2015; 100), cujos exigentes são as classes mais elevadas, e as classes mais baixas são

alvo de aplicação dessa moralização do sistema penal.

Patrick Colquhoun fundou a primeira polícia regular na Inglaterra, a Polícia do

Rio Tâmisa, que era encarregada de proteger os bens dos mercadores do porto de

Londres no Tâmisa. Não só por isso Colquhoun é referenciado por Foucault, mas

também por considera-lo um dos precursores da moralização da penalidade por ter

escrito o Tratado sobre a polícia da metrópole.

Para Colquhon, um sistema penal deve ser fundamentado na moralidade:

embora o princípio governante do nosso Governo seja incontestavelmente, a

liberdade, muito se teme que o rigor que as leis infrinjam

indiscriminadamente sobre ofensas leves e mais atrozes, possam ser mal

conciliado com as verdadeiras distinções da Moralidade e noções estritas de

Justiça, que constituem a excelência peculiar dos Estados que devem ser

caracterizados como livres.

[...]

Nada contribui em maior grau para depravar as mentes das pessoas, do que a

pouca consideração que as Leis pagam à Moralidade; infligindo castigos mais

severos aos infratores que cometeram, o que pode ser chamado, crimes

políticos e crimes contra a propriedade, do que aqueles que violam a religião

e a virtude (Coquhoun, 1795: 34; T.A.).

Dessa forma, se a lei precisa se preocupar com a moralidade, a qual é essencial à

salvaguarda do Estado e ao exercício de sua soberania, é necessária a instituição de um

agente público que vigie a moralidade dos indivíduos. As leis, então, seriam aquilo que

dá a esses organismos de vigilância a legitimidade para intervir e agir no nível da

moralidade (Foucault, 2015: 102).

Por trás das proibições legais se desenvolve um conjunto de coerções cotidianas

que incidem sobre os comportamentos, os usos e os costumes. Efeito disso não é a

punição de algo como infração, mas a ação positiva sobre os indivíduos, transformando-

os por meio da moral de modo a obter uma certa correção dos indivíduos.

A polícia metropolitana de Londres foi criada em 1829 e é considerada um

marco no longo processo que resultou na profissionalização policial. As

67

implementações realizadas por Sir Robert Peel, em uma década notadamente pacífica,

são tomadas como referência de especialização da polícia (Azevedo, 2003: 41).

Segundo Azevedo, no século XVIII a Inglaterra foi o país onde a organização

policial mais se desenvolveu, implicando na constituição de 43 forças municipais com

relativa autonomia. Em 1856, unificou-se o sistema policial por toda a Inglaterra e o

País de Gales que se mantem como estrutura organizacional até hoje, se submetendo ao

controle de comitês compostos de juízes e representantes eleitos dos conselhos das

cidades e condados (Azevedo, 2003: 40). A noção de força policial moderna se

constituiu dessa polícia inglesa que adotou como medida básica a disciplina, que adequa

os policiais ao modelo de trabalhador sóbrio e ordeiro.

Vê-se então, na Inglaterra, o estabelecimento de um processo de controle que se

torna necessário pelo deslocamento dos indivíduos e pelo novo sistema de localização

de riquezas. Segundo Foucault, os detentores desse controle, em um primeiro momento,

são os grupos religiosos constituídos de pequenos burgueses; posteriormente, os

titulares passam a ser pessoas ligadas ao poder, como comerciantes e aristocratas. Há

também uma mudança no alvo desse controle, não sendo mais os indivíduos marginais

ou irregulares, mas a classe trabalhadora. Assim, estabelece-se o controle exercido por

uma classe social sobre a outra (Foucault, 2015: 113).

Na França, pode-se considerar a primeira polícia o superintendente de Paris, um

cargo criado no século XIII, que era auxiliado por uma equipe de comissários

investigadores e “sargentos”. Além disso, o superintendente era responsável por uma

pequena divisão de tropas militares montadas e pela patrulha noturna, o qual

participação de todos os cidadãos do sexo masculino era obrigatória.

Foi a França o primeiro país a introduzir na sua linguagem jurídica a palavra

polícia, para designar as atividades e os fins do Estado no que se refere à organização

68

policial. De acordo com Azevedo, “a polícia francesa já nasce com um poder de

vigilância, [...] A polícia é posta em cena como dispositivo militar de disciplina e

controle dos franceses, adquirindo em seu próprio corpo os recursos táticos para o

controle social” (Azevedo, 2003: 44).

O treinamento do policial atrelado a disciplina militar e formação como soldado

é generalizado como padrão de policiamento em todos os países europeus até a primeira

metade do século XIX, e ainda permanece nos dias de hoje como princípio organizador

de algumas polícias, como os Carabinieri na Itália, a Guarda Civil na Espanha, a

Gendarmeriena França e a Landerspolizei na Alemanha (Azevedo, 2003: 46).

Ao longo do século XIX, segundo Bayley (2006), surgiram as autoridades

especializadas para gerir a polícia exterior e os assuntos de guerra; a justiça

desvinculou-se do resto do Poder Público; consequentemente, as funções públicas do

poder policial foram reduzidas, deixando de participar das atividades administrativas. A

polícia moderna passa a atuar nas esferas do poder de vigiar, constranger, obrigar,

proibir, restringir, confinar e subtrair vidas.

Entre 1350 a 1364, foi criada a maréchaussée, uma força policial que atua fora

das cidades, nas províncias, cujas principais funções eram proteger as retaguardas dos

exércitos em deslocamento, ao mesmo tempo, que caçava os desertores e mercenários

que pilhavam os territórios onde atravessavam; reprimia as violências coletivas e

controlava as populações migrantes. Posteriormente, também realiza a segurança nas

estradas contra crimes e roubos, e torna-se sedentária a partir do século XVI (Azevedo,

2003: 46).

Diferentemente da Inglaterra, na França, a depressão econômico e as crises

sociais do século XVII não a conduziram a uma revolução burguesa. Com a amplitude

dos movimentos populares o poder se utilizou de dois instrumentos de repressão:

69

exército e justiça. Contudo, o poder régio percebeu que a justiça se furtava a seus

pedidos de repressão, pois

aqueles mesmos que deveriam aplicar a justiça tinham vários interesses em

comum com os proprietários fundiários, de modo que, diante do crescimento

da fiscalização régia e da depressão econômica, o grupo encarregado de fazer

justiça estava tão recalcitrante diante do poder régio quanto a maioria da

população (Foucault, 2015: 114);

e o exército era um instrumento muito pesado e custoso.

Então, os instrumentos de repressão foram substituídos por uma técnica de

retirada de parte da população, a reclusão. Os instrumentos responsáveis pelo

funcionamento da fiscalização e do controle eram: de um lado os intendentes de justiça,

de polícia e de finanças; de outro, um aparato policial (Foucault, 2015: 115).

No século XIV, a rede de vigilância e controle se disseminou em toda sociedade

através de um instrumento disciplinar o qual se apresentava em forma de denúncia, as

lettres de cachet, através delas demandava-se o confinamento de pessoas caracterizadas

como “indesejadas” (Azevedo, 2003: 47). As lettres de cachet eram cartas em branco

assinadas pelo rei e postas à disposição dos súditos (Varella, 2006: 17). Portanto, seria

uma forma de poder ascendente contra indivíduos que causassem desordem que invoca

o poder descendente do soberano.

Contudo, as lettres de cachet não eram concedidas a qualquer um que as

solicitasse, eram necessárias inquisições destinadas a julgar o fundamento da demanda,

determinando se tal desordem – abuso, bebedeira, violência libertinagem – merecia um

internamento, e em quais condições e por quanto tempo. Essa era a tarefa da polícia, que

recolhia testemunhos, realizava espionagens, etc. (Foucault, 2003: 210).

Esse instrumento disciplinar, limitado a França, foi um episódio bastante breve,

que assegurou a distribuição do arbítrio real no cotidiano através de uma relação de

demanda e resposta (Varella, 2006: 17). Nesse momento, o abuso do absolutismo não

70

era do rei, mas dos indivíduos que se utilizavam das lettres de cachet para seu proveito

e contra os outros:

“Abuso do absolutismo? Talvez; não, todavia, no sentido de que o monarca

abusaria pura e simplesmente de seu próprio poder, mas no sentido de que

cada um pode usar para si, para seus próprios fins e contra os outros, a

enormidade do poder absoluto: uma espécie de pôr à disposição mecanismos

da soberania, uma possibilidade dada, a quem fosse bastante hábil para captá-

los, desviando em seu beneficio os efeitos. Daí um certo número de

consequências: a soberania política vem inserir-se no nível mais elementar do

corpo social; de súdito a súdito – e, às vezes, trata-se dos mais humildes –,

entre os membros de uma mesma família, nas relações de vizinhança, de

interesses, de profissão, de rivalidade, de ódio e de amor, se podem fazer

valer, além das armas tradicionais da autoridade e da obediência, os recursos

de um poder político que tem a forma do absolutismo; cada um, se ele sabe

jogar o jogo, pode tornar-se para o outro um monarca terrível e sem lei: homo

homini rex; toda uma cadeia política vem entrecruzar-se com a trama do

cotidiano” (Foucault, 2003: 210-211).

Uma das razões para a emissão de uma lettre de cachet insere-se de uma forma

mais intensa na constituição de uma economia moral vinculando o soberano e a família,

as lettres de cachet de famille. Elas estabelecem a troca contratual das obrigações e

deveres entre as instâncias pública e familiar. O apoio do Estado à família reforçando a

autoridade paterna sobre os membros familiares será preservada parcialmente no

Código Civil Napoleônico (Azevedo, 2003: 50).

No século XVI, a capacidade administrativa do Estado francês aumentou com a

criação do cargo de intendente, oficial pago pelo rei para manter a ordem, administrar a

justiça e coletar impostos nas trinta e duas províncias da França. Em 1667, foi criado em

Paris o cargo de tenente-geral da polícia, representante especializado em lei e ordem

(Bayley, 2006: 43). A polícia de Paris e reorganizada, distribuída entre os bairros,

atribuída funções de conduta de processos verbais, realização de investigações e

efetuação de prisões; e estende-se sua capacidade de vigilância com a criação de uma

rede de informantes, recrutados entre as “classes perigosas” (Azevedo, 2003: 51).

Essa polícia parisiense ainda difere da contemporânea por diversas áreas

correlacionadas a outras esferas da governamentalização do Estado. A polícia do Ancien

71

Régime abrangia um conjunto de regulamentos e instituições que compreendiam

funções tradicionais do Estado, como poder decisório sobre a paz ou a guerra e

regulação dos litígios e punição dos delitos por ordem jurídica, além de funções como a

manutenção da ordem social, a organização do enriquecimento e a gestão da saúde

(Foucault, 2012a: 301-302).

O Traité de Delamare era uma carta das funções policiais na época clássica. De

acordo com Foucault, Delamare classifica as atividades da polícia em onde rubricas que

se repartem segundo três grandes direções:

respeito da organização econômica (circulação das mercadorias,

procedimentos de fabricação, obrigações dos profissionais entre eles e com

relação a sua clientela); respeito das medidas de ordem (vigilância dos

indivíduos perigosos, caça aos vagabundos e eventualmente dos mendigos,

perseguição dos criminosos); respeito as regras gerais de higiene (cuidar da

qualidade dos gêneros postos à venda, do abastecimento de água, da limpeza

das ruas) (Foucault, 2012a: 302).

Portanto, a importância que a medicina ganha no século XVIII advém do

cruzamento de uma economia da assistência com a emergência de uma polícia geral da

saúde, que tem como objetivo a preservação, manutenção e conservação da “força de

trabalho”. Esboça-se a projeto de uma tecnologia da população (Foucault, 2012a: 302).

Nesse momento, deriva-se desta “tecnologia de polícia” uma nova matriz do poder

pastoral, no qual a noção de salvação cristã dá espaço às práticas não-discursivas de

saúde, bem-estar e segurança, e, também, quando se afirma a biopolítica que intervêm

no corpo-espécie.

Na Inglaterra, a intervenção do saber-médico voltado às classes populares

adquire a dimensão de ação policial, impondo a vacinação obrigatória, inspecionando

usinas de gás, interditando minas de carvão, proibindo o trabalho de menores de doze

anos, etc. Na França, essa intervenção está orientada para a higienização das cidades e o

combate das epidemias. O saber-médico vai se disseminar em diversos departamentos e

72

funções da administração pública, culminando na criação do Ministério da Higiene, da

Assistência e da Previdência Social (Azevedo, 2003: 53-54).

Modelo Profissional

Para compreender melhor as propostas e ideias que definem um novo

desdobramento da polícia na incessante busca por segurança, vou me ater, por um

momento, a explicação do modelo tradicional atual e dominante dos departamentos de

policia.

De acordo com esse “modelo profissional”, o policial é um aplicador imparcial

da lei, relacionando-se com os cidadãos de forma neutra e distante, cumprindo os

deveres oficiais e seguindo os procedimentos de rotina (Poncioni, 2005: 590).

Compreende-se a policia como uma organização que se estrutura para reagir a

denúncias por meio da referência à legalidade.

Nos Estados Unidos, no início do século, movimentos sociais e políticos exigiam

uma reforma nacional da polícia, afirmando que as instituições policiais da época não se

adequavam as necessidades de uma nova sociedade urbana e industrial. Segundo

Samuel Walker, essas reformas definiram o policiamento como uma profissão

comprometida com o serviço público sem influências políticas, cujos principais

objetivos eram

eliminar a influência política do policiamento; apontar indivíduos com

experiência em liderar grandes organizações como chefes de polícia;

introduzir princípios de gerenciamento moderno nos departamentos de

polícia; desenvolver unidades especializadas para abordar crimes específicos;

e criar padrões hierárquicos para oficiais através de requisitos de

qualificações para candidatos e treinamento (Walker, 2016: 629, T.A.).

Segundo Eduardo Cerqueira Batitucci, os elementos associados à construção

histórica do ideal profissional das organizações policiais americanas, e até mesmo, das

73

polícias ocidentais do século XX são: 1) o desenvolvimento de uma autoconsciência

profissional, especialmente com o surgimento de uma literatura profissional e a

consolidação da prática de recrutamento interno para as posições de liderança na

organização; 2) a militarização das organizações policiais, graças a ênfase na disciplina

com o objetivo de aumentar o controle sobre os policiais e suas atividade, centralizando

as operações para se obter conformidade e regularidade e o desenvolvimento de uma

carreira profissional; 3) emergência das associações profissionais que se consolidaram

como fóruns de discussão e disseminação do conhecimento profissional, e, de outro

lado, à crescente sindicalização dos policiais, responsável pela consolidação de uma

arena de interesses profissionais comuns; 4) os princípios da moderna administração de

empresas foram adaptados às organizações policiais, na crença de que a eficiência e a

capacidade de mostrar resultados, típicas do mundo corporativo, ofereciam um modelo

apropriado para a polícia; 5) necessidade de melhorar a qualificação do policial de linha,

com a introdução progressiva de programas vigorosos de formação e de treinamento

formal, procedimentos de avaliação do desempenho individual e sistemas racionais de

promoção meritocráticos; e 6) uso intensivo da tecnologia, especialmente aquela voltada

para o aumento da mobilidade (introdução do automóvel) e das comunicações

(utilização do telefone e, posteriormente, do rádio), tecnologias que possibilitaram

solidificar a centralização burocrática do comando e do controle organizacionais da

polícia.

Portanto, firma-se uma imagem do policial como um indivíduo tecnicamente

habilitado, altamente treinado e eficiente, exercendo a atividade de agente da lei e da

ordem na guerra contra o crime. Constitui-se uma organização profissional para se

encarregar da função de regulação e vigilância, com o monopólio estatal da força como

seu recurso primordial (O’Malley, 2006: 115).

74

De forma geral, os departamentos de polícia dos Estados Unidos possuem como

estratégia dominante o conceito de “policiamento profissional” ou “modelo

profissional” que se constitui em três divisões: força de patrulheiros (60% ou 70% do

pessoal do departamento), detetives, equipes especiais (dedicadas a atividades como

investigações sobre narcóticos, crimes cometidos por menores, trânsito, e armamentos e

táticas especiais) e uma divisão administrativa. Obviamente, a organização é

formalmente hierárquica, quase militar:

cada policial tem uma patente e é obrigado a obedecer ordens daqueles que

estão em patentes superiores à dele. Como parte do regulamento, são

codificados procedimentos e normas cuidadosos que regem as condutas dos

policiais. Uma das tarefas mais importantes dos policiais superiores é

verificar que a conduta dos policiais mais novos esteja de acordo com o

regulamento. As políticas, como seria previsível, vêm de cima para baixo e

espera-se obediência. A pessoa que está no comando é responsável pela

atuação da unidade (Moore, 2003: 124).

Segundo Moore, as práticas mais importantes são o patrulhamento, a resposta

rápida para pedidos de serviço e a investigação retrospectiva de crimes. E acredita-se

que a responsabilidade mais importante da polícia é controlar o crime, sendo que seu

principal instrumento para alcançar esse objetivo é a realização de prisões, pois “para

controlar os criminosos e manter baixas as taxas de crime, a polícia acredita no poder da

detenção e da incapacitação legal” (Ibidem: 125).

Devido a aumentos de violência e crimes em grandes cidades, Poncioni afirma

que o discurso do “controle do crime” é progressivamente substituído pelo da “guerra

ao crime”, de forma a fortalecer no imaginário do público e da própria polícia a ideia de

perigo iminente e de necessidade de mobilização máxima de esforços. Dessa forma, a

adoção de um estilo militar de organização não se dá por acaso, retrata uma tentativa de

arranjo organizacional que mobilize os indivíduos para reagir, ao seja, um modelo

prontidão militar que seria capaz de conter o crime.

75

Portanto, essas práticas consideradas mais importantes e que são os principais

meios de atuação da polícia no combate ao crime e a violência, se resumem a um

profissionalismo baseado em habilidades técnicas e valores associados a “colocar

malfeitores na cadeia”.

Contudo, o “modelo profissional” não tem sido suficiente em obter resultados no

controle do crime. De acordo com Moore,

a polícia argumenta que tem feito bem a sua parte mas que tem sido deixada

de lado pelo resto do sistema de justiça criminal, que é incapaz - ou não

deseja - de processar, condenar e prender aqueles que a polícia

convincentemente acusou de terem cometido crimes. No policiamento, ou

mesmo em outros lugares, algumas pessoas afirmam, também, que mudanças

prejudiciais na sociedade- aumento da pobreza e do desemprego, racismo

continuado, crescimento no tamanho dos grupos etários com tendência ao

crime, o colapso da famílias, a decadência dos valores morais - tendem a

aumentar os níveis do crime, e que a polícia sistema de justiça criminal têm

tido uma boa atuação conseguindo manter o crime nos níveis atuais (Moore,

2003: 128).

Com todos esses apontamentos, a atuação policial no “modelo profissional” se

tornou insuficiente, sendo questionado se é possível confiar no patrulhamento para deter

o crime; ou nos detetives, trabalhando apenas com as evidências da cena do crime,

possam resolver os crimes; ou que detenções produzam intimidação generalizada ou

especifica, ou sequer reabilitação; ou na resposta rápida aos chamados por serviços. As

medidas do “modelo profissional” são todas reativas, segundo Moore, isso seria

importante para assegurar que a polícia opere na superfície da vida social e não interfira

nela profundamente.

De acordo com Moore, há dois argumentos que apontam as fraquezas da

abordagem reativa. O primeiro diz respeito à incapacidade de lidar com crimes que não

produzam vítimas ou testemunhas, como prostituição, jogo e venda de drogas. O

segundo está relacionado à percepção das pessoas em relação a polícia. As duas

principais variáveis do desempenho do papel social da polícia são o perigo e a

autoridade, de acordo com Jerome H. Skolnick (1966: 42-70). O elemento do perigo

76

está relacionado com o policial desenvolver a característica de “suspeição” frente ao

outro, isolndo-o socialmente tanto do segmento da sociedade que ele considera

simbolicamente perigoso como, e também do cidadão convencional com quem ele

deveria se identificar. O elemento da autoridade reforça o isolamento do elemento

“perigo”, pois requerido a fazer valer leis que representam uma moral puritana, tais

como as que sancionam o uso de álcool ou a prostituição, e leis que regulam o curso da

atividade pública das pessoas, tais como infrações de trânsito. Nessas situações, ele

interfere no comportamento das pessoas, cuja resposta típica é questionar o

reconhecimento da autoridade do policial em fazê-lo, reforçando sua obrigação como

policial de responder ao perigo potencial que tal questionamento representa.

A estratégia reativa enfraqueceria a sensação de presença policial na

comunidade e torna os cidadãos inseguros, uma vez que o distanciamento entre polícia e

cidadão a tornaria pouco digna de confiança (Moore, 2003: 129-130). Além desses

argumentos, Walker (2016) afirma que o “modelo profissional” tornou a polícia

centralizada e burocrática afastando-a da comunidade a qual serve. Dessas críticas e

apontamentos surgem ideias para desenvolver parcerias entre a polícia e grupos de

bairro, com o objetivo de dar voz ao cidadão.

Egon Bittner, em seu artigo “The Police on Skid-Row: a study of peace

keeping”, apresenta uma perspectiva da polícia como mantenedora da paz. Observou

que há cinco tipos diferentes de circunstâncias que “produzem” atividade policial, mas

que não invocam a lei, sem ser consideradas ações ilegais, apenas não há diretivas

legais: 1) supervisão de determinados serviços licenciados e regulamentação do tráfico;

2) não realizar prisões por pequenas ofensas; 3) demanda pública por intervenção

policial quando não há aspectos criminais ou legais envolvidos; 4) controle de

77

multidões em situações de desordem; e 5) deveres diferenciados quando lidam com

menores de idade ou deficientes mentais.

Tais circunstâncias não excluem a possibilidade de invocar o processo criminal,

no entanto, muitos casos ocorridos nessas condições não terminam em prisão. Nesse

sentido, o autor caracteriza a ação policial como “agentes da paz”. Em tais condições,

Bittner questiona “como o próprio policial sabe se ele tem algum negócio com uma

pessoa que ele não prende e, em caso afirmativo, o que esse negócio poderia ser” (1967:

704).

Dessa forma, a ação policial como restrita aos ditames da lei era simplesmente a

fachada de uma intervenção que era, na verdade, baseada em todo um outro conjunto de

considerações, mesmo que a lei fosse invocada para legitimá-la. Na verdade, a lei era

uma referência, um recurso simbólico a ser utilizado para a solução de problemas

práticos e cotidianos, que Bittner chamou de manutenção da paz.

A partir das observações de Bittner, vemos que apesar da profissionalização da

ação policial há um movimento contrário com ausência de disciplina nas atividades dos

patrulheiros em áreas que o autor considerou degradadas, e onde a lei não é a base para

a atuação policial. Segundo Batitucci,

departamentos de polícia em que os principais problemas são de manutenção

da ordem e não de implementação da lei, por exemplo, apresentam um estilo

“vigilante” (watchman) de policiamento. Nesse caso, a polícia não apenas

enfatizava a ordem em detrimento do fazer valer a lei, mas também leva em

consideração as características de grupos sociais específicos no julgamento

da seriedade de uma infração (em geral quando não é cometido um crime

mais grave), deixando que acordos informais prevaleçam sobre a aplicação

estrita da lei (Batitucci, 2011: 83).

Apesar do desenvolvimento do “modelo profissional”, observa-se diversas

limitações que se traduzem em ações fora dos parâmetros desse modelo, os quais são

interpretados com um policiamento de manutenção da paz ou de um estilo “vigilante”

de policiamento.

78

Polícia Comunitária

A segurança do Estado moderno atua em dois sentidos. Para fora, dirige-se às

guerras com outros Estados e, para dentro, estabelece a paz frente a ameaça da guerra

civil. A polícia diz respeito a esse segundo sentido (Augusto, 2013: 33). Porém, não

deve ser entendida somente como força repressiva, pois também tem a função de zelar

pela saúde e moral dos cidadãos, apontando sua utilidade dentro do que Foucault

chamou de biopolítica.

Nesse sentido, emerge um novo desdobramento da busca por segurança que vai

além da repressão policial, expandindo a função da polícia e a renomeando, como por

exemplo, Polícia Comunitária e Polícia Pacificadora. Essa outra polícia se apoia em

valores de paz de uma sociedade comunitária que busca ser saudável e feliz.

Busca-se o desenvolvimento de novas soluções organizacionais para suprir, o

que considera-se, limitações do modelo profissional de policiamento, pensando uma

descentralização do comando nas organizações policiais e a inclusão da comunidade

como contribuinte na segurança pública para além da denúncia.

As procedências da polícia comunitária situam-se em meados do século XX,

propondo um novo modelo pautado na ideia de que a polícia e os cidadãos deveriam

trabalhar em conjunto na prevenção e resolução de atos infracionais, uma alternativa ao

modelo profissional estadunidense (Cabeleira, 2016: 86). Esse “modelo profissional”

“enfatiza o respeito aos regulamentos previamente estabelecidos como fonte da ação, a

hierarquia como metodologia de tomada de decisão e a distância do policial em relação

à comunidade policiada para evitar cooptações políticas da polícia” (Ribeiro, 2014:

528).

79

Segundo Maurício Futryk Bohn, o policiamento comunitário mais antigo que se

conhece é o japonês. Depois, surge em Nova York, entre 1914 e 1919, uma proposta de

policiamento comunitário. A proposta do comissário de polícia Arthur Woods, era

incutir no policiamento uma percepção da importância social e do valor público do

trabalho policial. Para alcançar seus objetivos, desenvolveu estratégias, dentre elas

“designou sargentos para visitar as escolas para explicar o trabalho da polícia relatando

que sua função não era apenas prender ladrões, mas também de melhorar o bairro,

tornando-o mais seguro onde se pudesse viver mais feliz”, “criou a ‘rua de lazer’: nestas

ruas a polícia colocava barreiras parando o trânsito local, para que as crianças pudessem

sair de suas casas e brincar com segurança”, realizava a “impressão de circulares com os

regulamentos que controlavam os vendedores ambulantes , em parceria com jornais, em

diferentes línguas devido a imigração em massa” (Bohn, n.d.).

Porém, com a mudança de governo, a grande depressão americana de 1929 e a

Segunda Guerra Mundial, essas iniciativas não duraram muito. Voltou-se a pensar uma

nova aproximação com a população e questionar o modelo profissional, a partir da

década de 1960, devido aos inúmeros conflitos raciais e hostilidades entre a polícia e as

comunidades dos guetos.

Na década de 1960, nos Estados Unidos, a polícia estava lidando com duas

crises: 1) o movimento dos direitos civis e rebeliões urbanas que eram uma expressão

da frustração dos afro-americanos com discriminação sistemática e a falta de progresso

em direção a igualdade racial; e 2) a devida revolução processual do Supremo Tribunal

Federal e o estabelecimento de padrões constitucionais para os principais procedimentos

policiais de combate ao crime (Walker, 2016: 631).

Essas crises provocaram uma ampla reconsideração do papel da polícia, da

conduta policial e, em particular, da ação policial em comunidades afro-americanas. De

80

acordo com Walker, a “reconsideração do policiamento incluiu desafios fundamentais

às normas existentes de profissionalização policial, [...] provocou uma série de

propostas de reformas relacionadas à governança da polícia” (Ibidem: 631, T.A.).

Contudo, a proposta que envolvia participação da população, através da “supervisão

cidadã”, não foi implementada.

Novamente em Nova York, foi desenvolvido um modelo comunitário, do

programa de segurança pública, chamado Tolerância Zero. Segundo Cabeleira (2016),

em 1994, o prefeito da cidade, Rudolph Giuliani (1994-2001), com o apoio do

comissário de polícia, Willian Bratton, inaugurou uma estratégia de segurança pública

que se baseava na prevenção para conceder “sensação de segurança” e “qualidade de

vida” para a população de Nova York.

Para colocar em ação essa estratégia foi utilizado o CompStat (Computerized

Statistics), um sistema com tecnologia intensiva de comunicação, rastreamento de

informações e elaboração de estatísticas. Com o CompStat, era possível identificar

padrões e tendências dos chamados atos criminosos, catalogando todos os indivíduos

que a polícia considera uma ameaça a ordem pública.

Como consequência disso,

o que passou a acontecer nas ruas de Nova York foi uma perseguição

repressiva e ininterrupta aos indivíduos classificados como marginais, pobres,

mendigos, pichadores ou prostitutas que perambulam nos espaços públicos.

Mais uma vez, a tentativa de extermínio dos indesejáveis é explícita. Se antes

ele operava-se por meio da proibição, segregação e/ou higienização, agora se

atualiza e se aperfeiçoa, sem ignorar as estratégias anteriores, com as

tecnologias computo-informacionais que possibilitam identificar e mapear

ações classificadas como suspeitas (Cabeleira, 2016: 94).

De acordo com Ludmila Ribeiro (2014), o policiamento comunitário tem sido

apontado como grande solução para os problemas comumente verificados na prestação

de serviço policial desde a década de 1990. Seu surgimento é atribuído

81

aos experimentos conduzidos pelas polícias norte-americanas ao longo de 40

anos (1950-1990) a fim de aumentar a efetividade da ação policial tanto em

termos de prevenção do crime quanto no que diz respeito à redução do

sentimento de insegurança e ao aumento da confiança nas organizações

policiais. Esses experimentos são iniciados com o objetivo de responder às

críticas que a população fazia às organizações policiais norte-americanas, as

quais, na época, estavam completamente dominadas pelo ‘modelo

profissional’ (Ribeiro, 2014: 528).

Dessa forma, a polícia reorganiza sua distribuição nos bairros estadunidenses e

convoca a população a participar ativamente da prática de deleção feita diretamente aos

policiais do bairro (Cabeleira, 2016: 86). O objetivo do modelo de policiamento

comunitário é aproximar a população civil da polícia facilitando o trabalho policial

através da prática da delação.

A proposta de uma polícia comunitária decorre de críticas constantes à ênfase

excessiva que o modelo profissional dava aos crimes graves, fazendo com que os

pequenos crimes – furtos, por exemplo – e as desordens – presença de bêbados,

prostitutas, moradores de ruas, jogos ilegais nas calçadas – não fossem atendidas pelas

organizações policiais (Ribeiro, 2014: 529).

No artigo “Policiamento Comunitário e Policiamento para a Solução de

Problemas”, Mark Harrison Moore também aponta o crescente apoio à proposta de um

polícia comunitária em oposição ao “modelo profissional” da aplicação da lei,

ampliando a percepção de polícia para além da luta contra o crime e, assim, incluindo

outros objetivos como prevenção de crimes e melhoria nas respostas às mais variadas

emergências e problemas trazidos pelos cidadãos. Portanto, para Moore, essas ideias

concernentes a polícia comunitária buscam “trocar burocracias de comando-e-controle,

extremamente centralizadas, por organizações profissionais descentralizadas” (Moore,

2003: 116).

Apesar do crescente apoio às propostas de polícia comunitária, Moore (2003)

considera que nenhum departamento de polícia dos Estados Unidos pode ser

82

caracterizado como policiamento comunitário, mas novas abordagens operacionais

foram adotadas. Por exemplo, o patrulhamento a pé, o estabelecimento de minipostos de

polícia em bairros e o uso de outros órgãos do governo para ajudar a eliminar as

condições que contribuem para elevar as ocorrências criminais.

O policiamento para a solução de problemas seria uma atividade de pensamento

e análise necessários para entender o problema que está por trás dos incidentes para os

quais a polícia é acionada. Contudo, isso não significa procurar as origens do problema,

essa é uma abordagem superficial e situacional. Segundo Moore, a estratégia do

policiamento para a solução de problemas é

imaginar e criar uma resposta efetiva e aplicável para resolver os problemas

que não estão aparentes. Essa pode incluir, e quase sempre inclui, prender

desordeiros ou enviar policiais para patrulhar certos lugares em determinadas

horas. Mas o ponto importante, é que a resposta não está, necessariarnente,

limitada a essas formas tradicionais de respostas pela policia. O desafio está

em usar outros mecanismos além das prisões, que produzam soluções e que

procurem, dentro e fora do departamento, por capacidade operacional

utilizável (Moore, 2003: 138).

Já o policiamento comunitário se fundamenta no trabalho conjunto entre a

polícia e a comunidade na redução do crime e na promoção da segurança, pois os

próprios cidadãos seriam a primeira linha de defesa na luta contra o crime. Por isso, o

policiamento comunitário não só se justifica pelo potencial de reduzir o crime e a

violência, mas também pela possibilidade de atender às necessidades e desejos da

comunidade. Assim, a satisfação da comunidade se torna base da legitimidade da ação

policial, junto com o combate ao crime e a conformidade com a lei.

Moore dá um exemplo do funcionamento da polícia comunitária, uma situação

que aconteceu em Nova York, em 1987, onde um representante de uma associação de

inquilinos chamou um policial comunitário, com informações específicas sobre

traficantes de drogas e seus pontos no conjunto popular em que morava. Segundo o

morador, o prédio estava inundado de traficantes e compradores, que ocupavam

83

apartamentos e faziam negócios nos corredores. O policial marcou uma reunião com a

associação de inquilinos para que as condições do prédio fossem descritas claramente.

A reunião mostrou o desejo da comunidade: que a polícia limpasse o prédio, usando

patrulhamento mais frequente e expulsando ou prendendo os traficantes. Sem poder

despender de policiamento constante em um único conjunto habitacional, o policial

sugere que se tornem participantes ativos da solução. Os moradores precisavam agir,

não só como relatores do problema, mas também assumir alguma responsabilidade na

eliminação dele. O policial sugeriu a formação de uma patrulha de inquilinos para

suplementar a atividade policial e prometeu seu apoio à patrulha. Os inquilinos

concordaram e formaram sua própria unidade de patrulha. Em duas semanas, a

associação de inquilinos tinha se transformado; estabeleceram uma patrulha vinte quatro

horas do prédio, monitorando e anotando a presença de todos que entravam. O policial

conduzia patrulhas no prédio, cinco ou seis vezes por dia e regularmente informava as

unidades especiais de narcóticos do Departamento de Polícia sobre a situação. Além

disto, encontrou-se com representantes do Departamento de Preservação das Habitações

Populares, com os Conselheiros Municipais, com o Escritório de Serviços de Família;

estes diferentes recursos colaboraram dando informações aos inquilinos, trabalhando na

renovação dos apartamentos e na assistência pela escolha de futuros inquilinos, para

garantir que, quando os traficantes atuais fossem expulsos, o problema não iria começar

novamente, com outras pessoas.

Ambos os policiamentos possuem condutas que se sobrepõem. Muitas vezes, a

busca pela solução de problemas passa por uma consulta à comunidade para saberem

quais os problemas existentes, do ponto de vista da comunidade, que podem não ser os

mesmo nomeados pela polícia, e o policiamento comunitário, para atender as demandas

da comunidade, deve pensar novas abordagens operacionais. Apesar das sobreposições

84

cada uma tem sua forma de tratar os assuntos pertinentes a polícia. A solução de

problemas, de acordo com Moore, enfatiza a reflexão e a análise acima da cooperação

comunitária, e o policiamento comunitário fixa sua atenção no desenvolvimento da

cooperação com a comunidade.

O policiamento comunitário propõe seis estratégias principais (Batitucci, 2011:

87): 1) ênfase na comunidade que, junto com a lei, passará a representar a base para a

construção da legitimidade política da polícia; 2) redefinição e ampliação da função da

polícia; 3) descentralização do poder de decisão; 4) incentivo na construção de sólidas

relações com a comunidade; 5) gerenciamento privilegiando as demandas da

comunidade; e 6) reconceitualização das medidas de avaliação operacional que devem

passar a considerar variáveis como a redução do medo e satisfação da população com os

serviços policiais.

Portanto, essas novas estratégias polícias supõe novas ações que devem

influenciar a conduta da polícia, pois trata-se de um modelo que trabalha pelo discurso

da satisfação e harmonia da população. Algumas dessas ações são:

autorizar policiais, individualmente, a juntar dados sobre situações que estão

por trás dos incidentes, de modo que as causas ocultas possam ser

compreendidas; ao lidar com problemas, ser cuidadoso com os projetos de

operações policiais; estabelecer medidas para determinar se alguém foi bem

sucedido; ao projetar soluções efetivas, e ao executar as soluções, reconhecer

o importante papel da comunidade na nomeação de problemas que pedem

solução; ver que o objetivo da luta contra o crime pode ser melhor perseguido

pelo estabelecimento de relações mais confiáveis com as comunidades que

são policiadas; e ter consciência de que a polícia tem oportunidades mais

amplas - do que o reconhecido no conceito de policiamento profissional - de

prevenir e controlar o crime, promover a segurança e aliviar parte do perigo,

da dor e da frustração de se viver nas cidades hoje (Moore, 2003: 143).

Assim, o policiamento para solução de problemas e o comunitária procuram

conter a criminalidade sem diminuir a atenção que o modelo profissional concede a essa

questão, ampliando as formas de controle:

85

os defensores do policiamento para solução de problemas e do policiamento

comunitário argumentam, entretanto, que não é o controle do crime que deve

perder sua ênfase. Eles concordam que o controle do crime, com eficiência,

deva permanecer o principal critério para avaliar as estratégias da polícia.

Mas, dizem eles, há maneiras melhores de controlar o crime do que as

técnicas habituais de policiamento profissional. Em particular, estão

interessados em técnicas que se centralizem menos na reação aos crimes e

mais na prevenção, e que se apoiem menos na própria polícia e mais nas

capacidades comunitárias e em outros órgãos públicos.

Também argumentam que muitas atividades, embora não pareçam

diretamente atividades de controle do crime, podem, mesmo assim, ajudar a

construir relações com as comunidades, que vão aumentar a eficácia do

controle do crime no futuro e que são, de qualquer forma, valiosas na redução

do medo e na melhora da qualidade de vida dos bairros. Por exemplo, lidar

com situações de perturbações leves, pode não só paralisar os medos na

comunidade e melhorar seu moral, como também aumentar as probabilidades

de que os cidadãos cheguem a ajudar a polícia a resolver os crime (Moore,

2003: 160).

Portanto, os estudos e discursos sobre a polícia comunitária não se traduzem

efetivamente em uma nova polícia que abandonaria o modelo profissional, mas seria

uma nova estratégia para reforçar o polícia já existente com a ajuda da comunidade. No

site da Secretaria de Segurança Pública do Governo do Estado de São Paulo a polícia

comunitária é definida como filosofia e estratégia institucional.

Criada em 1997, inspirada nos modelos canadense e japonês, o policiamento é

tratado como filosofia, pois “permeia todos os níveis da PM e é absorvida por todos os

policiais militares, que aprendem e aplicam conceitos primários de solidariedade e

respeito às individualidades no cotidiano do trabalho com a população”. E também é

uma estratégia no sentido de direcionar “esforços, medidas e programas institucionais

no sentido de criar continuamente condições de aproximação com a população”.

Antes da criação da polícia comunitária no Estado de São Paulo em 1997, já

existiam os Conselhos Comunitários de Segurança (Consegs) homologados em 1985,

pelo então governador do Estado Franco Montoro, com o Decreto nº 23.455 que

considera que “a participação da população, em cooperação com a Polícia, poderá

contribuir positivamente para a consecução desse objetivo, manter a ordem e a

Segurança Pública; e considerando, por fim, a necessidade de se instituirem

86

instrumentos adequados à participação da coletividade”. O Consegs tem como objetivo

a aproximação da população e das autoridades policiais de bairros e municípios,

funcionando como ferramenta de participação popular na segurança pública.

Atualmente existem 487 Consegs no Estado de São Paulo, estabelecidos em 522

dos 645 municípios do Estado. Participam das reuniões do Conselho representantes o

comandante da PM e o delegado titular da Polícia Civil na área, representantes dos

poderes públicos, das entidades associativas, dos clubes de serviço, da imprensa, de

instituições religiosas e de ensino, de organizações da indústria, do comércio, de

prestação de serviços, além de líderes comunitários que residem, trabalham ou estudam

na região.

Em 2008, a Polícia Militar do Estado de São Paulo criou a Diretoria de Polícia

Comunitária e de Direitos Humanos, sendo o órgão de Direção Setorial responsável pela

implementação das políticas do Comando Geral referentes à Polícia Comunitária e aos

Direitos Humanos (Art. 4, VII, do Decreto Estadual n 60.175/14). Suas atribuições são:

1) coordenar as atividades da Comissão Estadual de Polícia Comunitária – CEPC; 2)

planejar e executar atividades educacionais e científicas para qualificação técnica do

público interno e externo (cursos, palestras, e etc), referente ao tema “Polícia

Comunitária”; 3) elaborar propostas de normas referentes à política do policiamento

comunitário buscando seu aperfeiçoamento; 4) interpretar e difundir resultados de

pesquisas de interesse da Polícia Comunitária; 5) realizar estudos de modelos de

policiamento ostensivo que contemplem a defesa da cidadania, o integral respeito aos

direitos humanos e aos anseios da população; 6) acompanhar o desenvolvimento das

Bases Comunitárias de Segurança (BCS), Bases Comunitárias de Segurança Distrital

(BCSD), Bases Comunitárias Móveis (BCM), Postos Policiais-Militares e Bases

Operacionais do policiamento Rodoviário e Ambiental; 7) acompanhar e padronizar as

87

atividades de policiamento comunitário, por meio de bancos de dados alimentados por

relatórios elaborados por policiais militares especialistas decorrentes de visitas técnicas;

8) prestar assessoria na celebração de acordos referentes à Polícia Comunitária

(convênios, protocolos de intenção e etc) e acompanhar o seu desenvolvimento; 9)

elaborar estudos propondo a celebração de convênios, nas áreas de cooperação técnico-

científica com órgãos públicos e privados sediados no Brasil ou em outros países; e 10)

Formular política de relacionamento da Polícia Militar do Estado de São Paulo com os

municípios, objetivando o estabelecimento de parcerias em benefício da segurança da

comunidade local.

Sendo uma de suas atribuições atividades educacionais, a Diretoria de Polícia

Comunitária e de Direitos Humanos é a responsável pelo Programa Educacional de

Resistência às Drogas e a Violência, mais conhecido como PROERD, cujo objetivo é

“prevenir o uso e abuso de drogas, através da orientação e conscientização dos efeitos

provocados pela dependência de substâncias químicas, sejam elas lícitas ou ilícitas”. As

atividades educacionais do PROERD são direcionadas a alunos das escolas públicas e

particulares, desde a Educação Infantil e 5º ano e 7º ano do Ensino Fundamental.

Este é um, entre muitos, investimentos da sociedade para ajustar e direcionar as

crianças e jovens, pois vê-se a necessidade de educa-los “para que seu ideal seja

introjetado, com mais ou menos força, mais ou menos retórica, mais ou menos

argumentos complementares e contraditórios, como o verdadeiro, o justo” (Augusto,

2013: 38), e assim conter o potencial de revolta que se encontra em situação dita

vulnerável.

88

Capítulo 3. Sobre o PROERD

Desde a instauração do proibicionaismo a repressão, como vimos, não é a única

tática desse movimento crescente e os programas de prevenção com crianças foi um dos

focos constantes. Hoje, um dos programas de prevenção mais conhecido no Brasil, é o

PROERD (Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência), aplicado

pela Polícia Militar.

Ao longo desse capítulo será mostrada a emergência do PROERD e alguns dos

materiais utilizados, como: dois livros do aluno utilizados no Ensino Fundamental; o

livro dos pais; os cartazes do curso da Educação Infantil, que não é de acesso ao público

utilizados apenas pelo Policial PROERD; e o currículo de formação do Policial

PROERD.

O Policial tem um material próprio para ministrar as aulas tanto para os pais

quanto para as crianças e jovens, contendo instruções passo-a-passo para conduzir as

aulas e com as esperadas respostas das atividades contidas nos livros dos alunos e dos

pais. A esse material não me foi permitido acesso.

Ao longo dos anos, o programa realizou atualizações e mudanças nos materiais.

Entretanto, tais mudanças não serão apontadas, pois a obstrução aos livros anteriores a

esses foi insistente, alegando-se não serem mais utilizados pela própria polícia e esta

não os ter arquivados.

89

Do D.A.R.E. ao PROERD

A Lei de Tóxicos, de 1976, já indicava medidas preventivas em escolas. Nos

Estados Unidos, o NSDD 221, de 1986, incentivava o desenvolvimento de programas

educacionais e de prevenção à produção e consumo de substâncias psicoativas:

o Secretário de Estado, em colaboração com o Diretor, USIA e o

Administrador da AID, devem ajudar na desenvolvimento de programas de

prevenção e educação sobre abuso de drogas nas nações produtoras, de

trânsito e consumidoras de drogas (United States of America, 1986: 4; T.A).

Em 1983, o programa Drug Abuse Resistance Education (D.A.R.E.) surge em

Los Angeles, por meio de uma parceria entre o Distrito Escolar e o Departamento de

Polícia de Los Angeles com o intuito de conter o consumo de substâncias psicoativas

que crescia entre a década de 1970 e o início dos anos de 1980, e a alegada violência

vinculada ao consumo dessas substâncias. O currículo era aplicado, num primeiro

momento, somente às crianças de 10 a 12 anos8.

Segundo Deise Rateke (2006), o programa se expandiu a partir de 1988, nos

Estados Unidos, pretendendo atender todas as crianças do Ensino Infantil e Ensino

Fundamental, com cartilhas em espanhol e braile, objetivando inclusão de uma maior

diversidade de crianças e jovens possível. As aulas eram ministradas por Policiais

fardados que se apresentavam desarmados, pois, apesar de ser um dos principais objetos

de trabalho dos policiais, a arma é tida como obstáculo para a aproximação com

crianças e jovens por remeter às práticas violentas muitas vezes associadas à polícia.

Os policiais recebiam capacitação antes de entrar no programa por meio de um

curso de oitenta horas de treinamento específico nas áreas do desenvolvimento infantil e

da adolescência; aprendiam técnicas de ensino e habilidades de comunicação. Outro

curso de quarenta horas de treinamento era ministrado aos Instrutores do DARE,

8 Disponível em: http://www.dare.org/mission-vision/. Acesso em: 15/09/2015.

90

visando preparar os policiais para instruírem os alunos da escola secundária. De acordo

com Rateke (2006), a capacitação era realizada sob a supervisão de profissionais das

áreas de Educação, Psicologia e Farmacologia.

O programa foi implantado em todos os estados dos EUA como também em

outros 44 países, como Canadá, Austrália, Nova Zelândia, México, Porto Rico e Brasil9.

Hoje o programa atua em todos os estados brasileiros. No estado de São Paulo o número

de escolas adeptas ao programa cresceu:

Fonte: Secretaria de Estado dos Negócios da Segurança Pública / Polícia Militar do Estado de São Paulo /

Diretoria de Polícia Comunitária e Direitos Humanos / Divisão de Prevenção ao Uso de Drogas

Abaixo o número de alunos formados pelo programa:

9 Disponível em: http://www.dare.org/d-a-r-e-international/. Acesso em: 15/09/2015.

Particular Estadual Municial

1999 410 548 997 1.955

2000 531 709 1.291 2.531

2001 644 858 1.563 3.065

2002 756 1.007 1.835 3.598

2003 923 1.230 2.241 4.394

2004 1.001 1.334 2.430 4.765

2005 948 1.264 2.302 4.514

2006 1.070 1.425 2.596 5.091

2007 1.067 1.423 2.590 5.080

2008 1.301 1.937 2.557 5.795

2009 1.045 1.122 3.541 5.708

2010 1.154 1.601 2.823 5.578

2011 941 1.326 2.585 4.852

2012 1.075 1.898 2.949 5.922

2013 963 1.282 2.895 5.140

2014 928 1.470 2.987 5.385

Total de Escolas Atendidas Pelo PROERD

EscolasAno Total

91

Fonte: Secretaria de Estado dos Negócios da Segurança Pública / Polícia Militar do Estado de São Paulo /

Diretoria de Polícia Comunitária e Direitos Humanos / Divisão de Prevenção ao Uso de Drogas

Antes do PROERD, a polícia militar do Rio de Janeiro já realizava palestras em

instituições de ensino com o propósito de informar os jovens a respeito de drogas e

violência. Por intermédio do Consulado Americano, a polícia militar obteve um

primeiro contato com o projeto D.A.R.E. em uma palestra ministrada por agentes do

Departamento de Polícia de Los Angeles. Em 1992, uma equipe do Departamento de

Los Angeles veio ao Rio de Janeiro para treinar os policiais militares, oficializando o

programa no país (Rateke, 2006; 42). No mesmo ano, uma delegação de oficiais da

Polícia Militar da Cidade de São Paulo viajou aos EUA para estudos e lá conheceram o

D.A.R.E. Quando retornaram, o então Coronel da Polícia Militar de São Paulo Luiz

Carlos Santos pediu que uma equipe do Rio de Janeiro e um Mentor do D.A.R.E.

formassem a primeira turma de policiais instrutores PROERD de São Paulo (Polícia

Militar do Estado de São Paulo, 2013: 32).

O PROERD é uma ação da polícia comunitária criada em 1985, em São Paulo,

nos Conselhos Comunitários de Segurança. Em uma revista de circulação interna da

Ano Total de Alunos Nº Municípios Nº Instrutores

1999 211.131 188 321

2000 262.150 215 317

2001 312.286 398 472

2002 376.416 407 458

2003 462.061 331 565

2004 464.324 467 662

2005 461.405 478 680

2006 523.715 525 702

2007 552.021 496 672

2008 627.337 465 739

2009 665.709 523 562

2010 600.604 470 516

2011 545.924 467 541

2012 579.487 456 732

2013 548.990 444 733

2014 604.630 373 633

Total de Alunos Atendidos

92

polícia (Idem), um artigo sobre a história do programa aponta a criação da policia

comunitária como uma necessidade direcionada aos compromissos de defesa da vida e

da integridade física das pessoas, defesa da cidadania e respeito aos cidadãos, com o

objetivo de aplicar as regras e legislação internacionais relativas aos Direitos Humanos.

Em 1993, foi constituído o primeiro Centro de Treinamento do Brasil. O

programa D.A.R.E. no Brasil adotou o nome Programa Educacional de Resistência às

Drogas e à Violência (PROERD), aplicado às crianças da quarta série do Ensino

Fundamental de escolas públicas e privadas, e mantendo desde então, sem alterações, os

aspectos pedagógicos (Rateke, 2006; 42).

De acordo com Rateke, os policiais PROERD se dispõem em três níveis de

atuação: Instrutor, Mentor e Master. O policial Instrutor passa por um curso de oitenta

horas para atuar diretamente com as crianças e jovens. O trabalho do policial neste

projeto é voluntário, e para obter o certificado de Instrutor, ele passa inicialmente por

uma seleção baseada nos seguintes critérios: ter no mínimo dois anos de serviço de

policiamento ostensivo; estar, no mínimo, no bom comportamento10

; ter concluído o

Ensino Médio; não ser fumante. Não beber não é requisito, mas o oficial é orientado a

não usar bebidas alcóolicas.

Após dois anos ativos como Instrutor, o policial pode ser convidado a ocupar a

vaga de Mentor. O curso para a formação de Mentores possui uma carga de quarenta

horas ministradas por policiais Masters. Os policiais Mentores são formadores de

educadores, os policiais Instrutores, mas também lhes é solicitado continuar com a

formação de crianças e jovens. O policial Master também passa por um curso de

10

A polícia tem uma avaliação interna contínua, na qual o comportamento do policial será classificado

em excelente, ótimo, bom, regular ou ruim. Todos iniciam em “bom”, podem subir ou descer na escala

(Curso Especial Formação de Docência do PROERD – Programa Educacional de Resistência às Drogas e

à Violência, 2011-2014).

93

quarenta horas: é o policial que atuará nas atividades administrativas e na formação de

policiais Instrutores e Mentores11

.

Segundo a Revista PROERD: Edição Comemorativa de 20 Anos (2013), após

uma reunião do Conselho-Geral da Comunidade, em 1997, decidi-se implantar o

PROERD em todo Estado de São Paulo. No ano seguinte, a Polícia Militar do Estado de

São Paulo consolidou o programa com a criação do Centro de Treinamento Proerd São

Paulo e o Sistema de Prevenção às Drogas e à Violência (Sispred), com o objetivo de

reforçar o caráter não repressivo da polícia comunitária que age, prioritariamente, pela

aplicação de medidas preventivas.

Os Policiais PROERD, instrutores do programa, são capacitados por um corpo

docente composto por outros policiais do programa que receberam qualificação

específica para tornarem-se multiplicadores (são os Facilitadores e Mentores do Proerd),

além de profissionais pedagogos especialistas em educação. Esse corpo docente forma a

chamada Equipe de Treinamento PROERD, sendo que algumas instituições policiais

participantes do programa podem solicitar ao D.A.R.E. America ou ao D.A.R.E.

International o seu reconhecimento como Centro de Treinamento D.A.R.E./PROERD12

.

O Sistema de Prevenção às Drogas e à Violência (SISPRED) foi criado, em 1998, com

o propósito de formar uma polícia de cunho estratégico que priorizasse a prevenção às

drogas, deixando de agir exclusivamente com ações repressivas13

.

11

Só houve um único Curso Master do PROERD São Paulo, promovido pelo D.A.R.E. Brasil em 2000,

com a participação de policiais militares do Rio de Janeiro, Distrito Federal e São Paulo.

12

Disponível em: https://www.policiamilitar.mg.gov.br/portal-

pm/proerd/conteudo.action?conteudo=1554&tipoConteudo=itemMenu. Acesso em: 26/02/2016.

13

Disponível em: http://leaoproerdiano.blogspot.com.br/2012/03/o-proerd-no-brasil.html. Acesso em:

26/02/2016.

94

Uma vez estabelecido o Centro de Treinamento, pôs-se em prática o plano de

expansão, com cursos para policiais militares de todos os Estados. Hoje, há sete Centros

de Treinamento no Brasil, em: São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Minas Gerais,

Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e no Distrito Federal, e o programa é aplicado

em todos os Estados.

Em 2000, ocorreu, em São Paulo, o Primeiro Encontro Nacional de

Coordenadores do PROERD promovido pelo D.A.R.E. Brasil, com o objetivo de

estabelecer novas metas para o programa; como estender o trabalho de prevenção aos

adolescentes; implantar um curso para os pais; e adotar o novo currículo criada pelo

D.A.R.E. estadunidense. Além de expandir o programa para os Estados solicitantes,

nesse ano, o PROERD já estava implantado em 20 Estados, sendo que muitos deles

clamavam por maior apoio institucional.

Em 2001, o novo currículo direcionado aos jovens da, então, sexta série do

Ensino Fundamental chega ao Brasil. O curso para os policiais foi coordenado pelo

D.A.R.E. Internacional. Em 2003, ano de comemoração dos dez anos de PROERD no

Brasil, o Departamento e Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, da Faculdade

de Medicina de São Paulo, realizou uma pesquisa com o objetivo de determinar a

eficácia do programa. Na Revista PROERD, os resultados de tal pesquisa são indicados

como positivos, encarando a avaliação como parte necessária do desenvolvimento do

programa e a ser integrada de forma contínua. Segundo os resultados da pesquisa, o

PROERD não só orienta a criança sobre as drogas e suas consequências, como também

fortalece sua autoestima e forma seu caráter. Essa pesquisa foi realizada com duas

amostras: a amostra primária, com 555 alunos de escolas públicas e 561 alunos de

escolas particulares que realizaram o PROERD, e a amostra controle, com 277 alunos

de escolas públicas e 245 de escolas particulares que não realizaram o programa.

95

Também afirma que o programa é percebido como um grande aliado dos pais,

ajudando a criança ao fornecer argumentos para se defender diante das ameaças do

meio, isso a deixa mais atenta, esperta, e permite que ajude as demais que não foram

iniciadas no programa; facilita a entrada do tema drogas nas discussões familiares.

Seguem algumas considerações estabelecidas pela pesquisa: eficiente ação de relações

públicas com a comunidade, além de alavancar a autoestima do policial; e programa

bem avaliado, que deve continuar se desenvolvendo e se atualizando.

O PROERD foi eleito, em 2005, como Parceiro Estratégico da Secretaria

Nacional Antidrogas (SENAD), integrando o Conselho Estadual de Políticas sobre

Drogas (Coned), através de Deliberação nº 161:

Deliberação extraída da Ata 161ª Reunião Plenária, confirmada na 162ª

Reunião Plenária Em 10.10.1997, foi publicada deliberação extraída da Ata

da 88ª Reunião Plenária, no sentido de que o PROERD (Programa

Educacional de Resistência às Drogas) deveria ter suas atividades suspensas

até que fossem realizados estudos e avaliações a respeito do Programa. As

avaliações foram feitas e, atualmente, o PROERD conta com o

reconhecimento do Poder Publico e da sociedade. Todas as iniciativas do

CONEN/SP têm o apoio e ativa participação do PROERD, sendo certo que

todas as colaborações no sentido de prevenir o uso e abuso de drogas lícitas

devem ser incentivadas. Assim, cancelasse deliberação anterior, aprovando o

Programa desenvolvido pela Polícia Militar do Estado de São Paulo (Diário

Oficial Poder Executivo – Seção I14

).

O ConedSP foi instituído em 1986 pelo Decreto nº 25.367, ressaltando a

necessidade do Estado de São Paulo se integrar ao Sistema Nacional de Prevenção,

Fiscalização e Repressão de Entorpecentes, objetivando uma ação conjunta com órgãos

federais, estaduais e municipais, em consonância com o Conselho Nacional sobre

Drogas (Conad). Os objetivos do conselho são:

I - propor a política estadual de entorpecentes, compatibilizando-a

com o Sistema Nacional de Prevenção, Fiscalização e Repressão de

Entorpecentes, bem como acompanhar a respectiva execução;

14

Disponível em:

https://www.imprensaoficial.com.br/DO/BuscaDO2001Documento_11_4.aspx?link=/2005/executivo%25

20secao%2520i/abril/14/pag_0003_EQBGUJ27F5R95eC0QA74LSNA6NF.pdf&pagina=3&data=14/04/

2005&caderno=Executivo%20I&paginaordenacao=10003. Acesso em: 12/06/2016.

96

II - estimular pesquisas visando ao aperfeiçoamento dos

conhecimentos técnico-científicos referentes ao uso e tráfico de entorpecentes

e substâncias que determinem dependência física ou psíquica;

III - coordenar, desenvolver e estimular programas de prevenção à

disseminação do tráfico e uso indevido de substâncias entorpecentes ou que

determinem dependência física ou psíquica;

IV - propor ao Governador do Estado a celebração de convênios

para os fins previstos nos incisos anteriores;

V - encaminhar ao Conselho Federal de Entorpecentes propostas

fundamentadas de alteração do sistema legal de Prevenção, Fiscalização e

Repressão ao uso e tráfico de substâncias entorpecentes (Estado de São

Paulo, 1986)15

.

O Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo (IMESC) é

responsável pelo apoio técnico-científico ao ConedSP, com pesquisas específicas

requeridas pelo conselho, coleta e análise de dados informativos e estatísticos. São os

organismos estaduais que atuam nas áreas de prevenção, tratamento e repressão ao

tráfico e uso de entorpecentes fornecem os dados ao IMESC.

Com o fim da Diretoria de Assuntos Municipais e Comunitários (DAMCo), em

2006, a coordenação do PROERD foi transferida para a Diretoria de Ensino e Cultura

(DEC), fruto de uma reestruturação organizacional da Polícia Militar do Estado de São

Paulo.

O D.A.R.E. estadunidense realizou mudanças nos currículos de 5º e 7º anos do

Ensino Fundamental em 2005. O curso passou a ter dez lições e o curso de pais cinco

lições, além de inserir o tema violência e cultura de paz. A tradução e adaptação desses

currículos foram realizadas, em 2007, pelo Centro de Treinamento do Proerd São Paulo.

Em 2008, foi criada a Diretoria de Polícia Comunitária e de Direitos Humanos

(DPCDH) pelo Decreto nº 53.733 que estabelece a estrutura básica da Polícia Militar do

Estado de São Paulo em Órgãos de Direção, Órgãos de Apoio e Órgãos de Execução. A

DPCDH faz parte dos Órgãos de Direção e é responsável pela implementação das

15

Disponível em: http://www.imesc.sp.gov.br/imesc/Decreto_25367.htm. Acesso em: 12/06/2016.

97

políticas referentes à polícia comunitária e aos direitos humanos16

, portanto,

coordenando também o PROERD (São Paulo, 2008). No mesmo ano foi sancionada a

Lei Estadual nº 12.901 que instituiu o dia 19 de maio como o Dia Estadual do Proerd.

O governo do Estado de São Paulo criou, em 2011, a Coordenação Estadual de

Políticas sobre Drogas (Coed), ligada a Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania

pelo Decreto nº57.049, na qual integrantes do PROERD representam a Polícia Militar

do Estado de São Paulo. O currículo de 7º ano do Ensino Fundamental foi novamente

atualizado, em 2013, com o título “Caindo na REAL...”. Dois anos mais tarde, o

currículo do 5º ano também foi atualizado, levando o mesmo título.

Como apontado anteriormente, a repressão era a primeira medida do movimento

contra as drogas, mas em pouco tempo surgiram, em documentos estatais. incitações às

ações preventivas, sem que os aspectos repressivos fossem suprimidos. A medida

preventiva estudada é o PROERD que, não por acaso, tem suas origens nos EUA, em

Los Angeles, área de grande migração de mexicanos que eram vistos como inveterados

consumidores de maconha (Rodrigues,2004).

O PROERD não atua somente com as crianças e jovens de diferentes faixas

etárias nos três módulos educacionais (Educação Infantil, Ensino Fundamental 5º e 7º

anos), mas também possui um curso voltado para os pais com seu próprio material

didático que tem como objetivo informá-los sobre drogas e orientá-los a estabelecer

uma vida saudável, segura e de bem-estar para seus filhos.

Dentro do programa PROERD, a educação preventiva através da cultura de paz

e não-violência não se estabelece apenas na relação entre estudantes e polícia, mas

16

Disponível em: http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/decreto/2008/decreto-53733-

27.11.2008.html. Acesso em: 12/06/2016.

98

existe uma tentativa de aproximação entre agentes que consiste em uma ação conjunta

entre o Policial PROERD, professores, especialistas, estudantes, pais e comunidade.

A cultura de paz é um conceito-chave no programa. No documento, da

UNESCO, “Paz, como se faz?: semeando cultura de paz nas escolas”, a cultura de paz é

[simplesmente considerada] um advento da modernidade,

como a expansão do conhecimento e das tecnologias, o impulso da

industrialização, do capitalismo e da globalização, enfim, delineou-se um

conjunto de mudanças que levou a sociedade ocidental a caminhos

complexos e a ter uma preocupação não somente no plano individual, mas

prioritariamente no plano coletivo (UNESCO, 2002: 9).

Nesse plano coletivo, o governo democrático desenvolve políticas públicas que

procuram fortalecer a família, possibilitar o desenvolvimento autônomo dos indivíduos

e das comunidades e o acesso a direitos básicos (Ibidem). Assim, cada indivíduo é

convocado a participar e a se tornar responsável pela construção da cultura de paz.

A proposta de uma educação para a cultura de paz diz respeito a dotar crianças,

jovens e adultos de uma compreensão dos princípios e respeito pela liberdade, justiça,

democracia, direitos humanos, tolerância, igualdade e solidariedade; além disso, preza-

se pela não-violência.

A cultura de paz e não-violência são princípios base que levaram 50 países a

constituir a Organização das Nações Unidas (ONU) após duas Guerras Mundiais17

. No

mesmo ano, 1945, também é assinado a Constituição da Organização das Nações

Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) cujo objetivo é

contribuir para a paz e para a segurança, promovendo colaboração entre as

nações através da educação, da ciência e da cultura, para fortalecer o respeito

universal pela justiça, pelo Estado de direito, e pelos direitos humanos e

liberdades fundamentais, que são afirmados para os povos do mundo pela

Carta das Nações Unidas, sem distinção de raça, sexo, idioma ou religião

(UNESCO, 2002: 2).

17

Disponível em: http://www.un.org/en/charter-united-nations/index.html. Acesso em: 10/06/2018.

99

A Constituição da UNESCO ressalta que a paz baseada em arranjos políticos e

econômicos dos governos não é suficiente e nem alcançaria apoio unânime, duradouro e

sincero. Portanto, para que a “paz não falhe” é preciso que seja fundamentada na

solidariedade intelectual e moral da humanidade.

Um conceito importante nessa trajetória da busca pela paz é o de tolerância. Em

1995, foi promulgada a Declaração de Princípios sobre a Tolerância que retoma a Carta

das Nações Unidas ao afirmar a necessidade de preservar as gerações vindouras do

flagelo da guerra, reafirmando a importância dos direitos humanos e a convivência

pacífica entre vizinhos; e a Constituição da UNESCO que regula como a paz deve se

fundamentar.

A importância atribuída à tolerância é evidente: “a tolerância é a harmonia na

diferença”18

, impondo-se como uma “virtude” para a substituição de uma cultura de

guerra em uma cultura de paz. Segundo Salete Oliveira, o escopo temático da educação

para a tolerância

mostra-se como o elemento norteador discursivo no campo das mais variadas

vertentes de defesa dos direitos e da tolerância, associadas ao que,

oficialmente, foi eleito como tema transversal: o pluralismo – capaz de

congregar a neutralidade do relativismo cultural à harmonização dos

interesses conflitantes do multiculturalismo (Oliveira, 2005: 284).

Esses termos e conceitos que constitui o ideal fundador e norteador dessa

organização e que se apresenta em tom constitutivo e edificante nas declarações,

convenções e recomendações enunciando seu poder institucional, são usados como

palavras-chave no exercício da pedagogia, dirigidos a crianças e jovens. Sua autoridade

no âmbito dos pactos políticos internacionais torna-se fala ordinária, uma reiteração

discursiva. O que importa é a assimilação e a práticas das condutas e de introjeção de

valores que devem ser exaustivamente repetidos às crianças e jovens.

18

Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/paz/dec95.htm. Acesso em: 10/06/2018.

100

O Policial PROERD

A grade do Currículo Especial de Formação de Docência do PROERD, do

quadriênio 2011-2014, inclui as seguintes matérias a baixo resumidas:

1) Psicologia da Aprendizagem

Assuntos: Demonstrar a importância do meio social no desenvolvimento do

sujeito enfocando os conceitos de: desenvolvimento real, potencial e zona de

desenvolvimento proximal. Mostrar que o desenvolvimento humano é muito rico e

diversificado. Cada pessoa tem suas características próprias, que as distinguem das

outras pessoas, e seu próprio ritmo de desenvolvimento.

2) Didática: Habilidades Gerenciais

Assuntos: Demonstrar os componentes elementares do processo de ensino-

aprendizagem; discutir os componentes de um gerenciamento de classe : o professor

estabelece relações positivas (estabelecimento de objetivos, respeitando as necessidades

humanas básicas, mantendo interações saudáveis, conhecendo os estudantes,

esclarecendo as expectativas acadêmicas, ensinando para o sucesso e desenvolvendo a

responsabilidade e o envolvimento dos estudantes para o sucesso da aula). Demonstrar

as estratégias de aprendizagem ativa: escuta ativa, perguntas, trabalho em equipe,

gerenciamento de classe e reflexão. Demonstrar como o diálogo pode facilitar ou não o

processo de ensino-aprendizagem, dando ênfase ao respeito pelo posicionamento dos

educandos. Abordar questões como: expressão oral, voz (tonalidade, timbre – qualidade

do som, intensidade e ênfase) e fala (ritmo, articulação, correção da linguagem e

facilidade de expressão) e a expressão corporal (aparência, fisiologia, postura,

movimentação, gesticulação e contato visual). Como demonstrar aprovação ou

101

desaprovação; estimular a originalidade e o entusiasmo. Demonstrar as técnicas de

motivação, os aspectos da motivação (geral e específico), dicas para motivar uma sala

(demonstrar domínio sobre a matéria; aliar teoria/prática; exemplificar a utilidade na

vida prática; buscar atenção dos desatentos; dar ênfase aos pontos principais; elogiar e

repreender quando necessário, sem formar estereótipos permanentes; e respeitar os

instruendos.

3) Prevenção ao uso abusivo de drogas

Assuntos: Demonstrar os modelos de programas de prevenção: informação ou

conhecimento científico, afetividade ou educação afetiva, estilo de vida saudável,

resistência social, aumento do controle social, oferecimento de alternativas, princípio

moral, amedrontamento e abordagem eclética. Demonstrar o papel dos órgãos de apoio

aos programas preventivos (cooperação absoluta com os grupos comunitários e o

trabalho de equipes nos casos de dependências para indicar o tratamento). Demonstrar

os elementos-chave para o sucesso de um programa de prevenção (estabelecimento de

parcerias com instituições de educacionais das comunidades; identificação das pessoas e

seus papéis no processo; e iniciar com um programa piloto e crescer). Os níveis da

prevenção: primária, secundária e terciária e ainda os conceitos de prevenção seletiva,

universal e indicada. Conceitos básicos: dependência, dependência física e psíquica,

codependência e comorbidades. Relação usuário x droga x família. A dependência

química como síndrome com sintomas e progresso previsível que é incurável, porém

tratável. A dependência no contexto familiar, onde os seus membros são afetados e

apresentam seus próprios sintomas. Como caracterizar a dependência química (D.Q.). A

dinâmica familiar como reflexo da D.Q.: a família funciona como um sistema (papéis,

relacionamentos, distribuição de força); a doença familiar tem um processo (negação,

eliminação, desorganização, reorganização, escape, realização e recuperação); a

102

sobrevivência da família depende dos papéis (chefe, herói da família, bode expiatório,

criança ou adulto perdido, mascote); os resultados da capacitação operam a negação,

perda do respeito e convivência. Os estágios do uso e do uso de drogas (uso ocasional,

uso regular, uso frequente) e os sinais de dependência, como: substância usada para

escapar de si mesmo e para se sentir normal, baixa autoestima, perda do controle sobre

o uso etc. O desenvolvimento do adolescente: a principal mudança do adolescente e as

influências (autoestima, ansiedade, estresse, pressão do grupo). Quando há necessidade

de intervenção para tratamento. Índice de recuperação. Apresentação de programas de

recuperação. Abordagem: o que fazer quando um filho está usando drogas? Abordagem

preventiva visando o não uso de drogas por jovens.

4) Toxilogia

Assuntos: Histórico (origem). Conceitos básicos (drogas; substâncias psicoativas

e psicotrópicas; drogas lícitas e ilícitas; dependência; dependência física e psíquica;

tolerância; síndrome da abstinência; e sinergia). Classificação das drogas

(perturbadoras, depressoras e estimulantes) e seus efeitos (maconha/skank,

cocaína/crack, LSD, êxtase, anfetaminas, ansiolíticos (barbitúricos e tranquilizantes),

álcool, tabagismo, entre outras.

5) Políticas Públicas

Assuntos: O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069 de 13 de julho

de 1990): disposições preliminares: conceitos básicos e princípios gerais; direitos

fundamentais; prevenção a violação dos direitos; entidades de atendimento do menor;

ato infracional; medidas contra os pais e responsáveis; o Conselho Tutelar –

organização, atribuições, competências, escolha e impedimentos dos conselheiros;

justiça da infância e da juventude; o papel do Ministério Público. Os símbolos

nacionais, noções de civismo relacionados aos princípios de exercício da cidadania.

103

Nesse bloco do currículo o documento se refere às crianças e aos jovens pelo

termo “menor”, que o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente – citado pelo

documento – não utiliza por considerar inapropriado, estigmatizador e pejorativo. Esse

termo reproduz e endossa de forma subjetiva as discriminações arraigadas e uma

postura de exclusão social que remete ao extinto Código de Menores[; apesar da retórica

inclusiva, o uso do termo “menor” permanece para além da sua possível designação

relacionada à impunidade penal.

Segundo o antigo Código de Menores, vivem em situação irregular os menores

de dezoito que cometeram uma infração. De acordo com Edson Passetti, é possível

notar que o Código não se dirige a menores em geral, mas era destinado a crianças e

jovens de baixa rende, geralmente relacionados às chamadas famílias desorganizadas.

"O menor em situação irregular é aquele que vive na situação de marginalidade social"

(Passetti, 1985: 31). Ainda, segundo o autor, uma infração realizada por um menor com

pais empregados, com acesso aos bens de consumo variados, que frequentava

regularmente a escola, etc., era considerada um ato de rebeldia inerente ao jovem. Caso

contrário, esse infrator seria um menor, um marginal, pois o que o Código de Menor

caracterizava como irregular não se aplicava na mesma medida para todos. Para esses

debilitados psicológica, biológica e socialmente que foram constituídas as instituições

de recolhimento e reeducação e integração. Mesmo com o ECA e sua nova

nomenclatura a condição de “menor” permanece habitando o “mundo” assistencial e

penal, justificando, com outros argumentos tolerantes e afeitos à cultura de paz, a

mesma discriminação, com esforços suplementares para justificarem a inclusão.

6) Desenvolvimento Profissional do Programa

Assuntos: Demonstrar as habilidades e qualidades necessárias para tornar-se um

instrutor do Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (PROERD).

104

Demonstrar que o policial militar/instrutor do PROERD: não concorda com colocações

preconceituosas a respeito de sexo, raça, cor e religião; é um modelo exemplar em

situações formais e informais; é aberto a receber e se atualizar perante críticas; é flexível

e criativo perante situações inesperadas; respeita o público com quem fala; é capaz de

demonstrar e estar apto a: preparar as lições, incorporar os elementos necessários da

lição; utilizar as técnicas de controle de classe; habilidade de falar e escrever para

crianças; é pontual; ter boa apresentação pessoal; e demonstrar quais são as

responsabilidades policial militar instrutor, sob a ótica das normas legais vigentes.

Discutir técnicas úteis para reforçar o relacionamento policial-escola: reunião na escola

e na comunidade para reformar os propósitos do Programa de Prevenção; reuniões com

diretores; reunião com professores; apresentação para os pais; atividades diárias

(atividades com os alunos; relacionamento com a administração; contato na sala de aula

com os professores; intervalo com os alunos; integridade de ações acima de tudo);

conduta informal; gerenciamento de estresse (preparação das lições; atenção para a

saúde pessoal; lidando com visitantes em sala – pais, imprensa, líderes escolares;

respondendo questões sobre o Programa de várias partes interessadas; cumprir

compromissos assumidos). Explicar os propósitos de realização da reunião com os

diretores e professores dos estabelecimentos de ensino que consiste: criar suporte para o

Programa de Prevenção entre professores; explicar o propósito e currículo do Programa;

enfatizar a importância da formatura. Discutir os elementos necessários para uma boa

apresentação: transmitir aos diretores informações a respeito das lições do Programa de

Prevenção; elaborar o plano de sessão, dispondo dos meios de auxiliares de ensino e

instrução disponíveis. Explicar que o abuso de drogas requer ações integradas entre

família, escola e comunidade – o Programa de Prevenção às Drogas e à Violência está

inserido neste contexto; o currículo foi elaborado através de pesquisas, testado e

105

aprovado em mais de 45 (quarenta e cinco) países; o currículo é ensinado por policiais

uniformizados, pois representam as instituições formais, não podendo ser considerados

como elementos estranhos às crianças; os policiais são exaustivamente treinados para o

Programa, porém não são professores credenciados, assim sendo necessitam da

permanência integral do professor em sala de aula inclusive para dar continuidade aos

ensinamentos; o currículo inclui outros materiais e atividades em que o professor deve

atuar e auxiliar; a caixa de perguntas é uma forma dos estudantes conseguirem

informações de forma anônima o que os estimula a perguntar; as lições do Programa de

Prevenção incluem tópicos como pressão dos companheiros, auto-estima, sistema de

apoio, maneiras de dizer não, tomada de decisões, etc.; a formatura é a última lição onde

os estudantes assumem o compromisso público de resistir às drogas e à violência – a

direção da escola deve providenciar o preenchimento de certificados, o roteiro da

formatura e outros auxílios necessários; o policial deverá permanecer com as crianças

tanto em sala de aula tanto no intervalo para se tornar acessível e disponível a questões e

perguntas; os policiais deverão solicitar que sejam cientificados da realização das

reuniões com pais para também participarem. Demonstrar quais são as

responsabilidades do policial militar instrutor, sob a ótica das normas legais vigentes.

Definir o Cronograma de Trabalho Semestral; Demonstrar os objetivos do Cronograma

e a sua importância. Explicar os passos que o policial militar, instrutor do Programa de

Prevenção, deve seguir para elaborá-lo em um estabelecimento de ensino: agendar uma

reunião com o diretor da escola, solicitar cópias do calendário da escola, grade de aula

do professor, horário de aulas e de intervalos de cada escola, as atividades onde não

haverá aula, tais como: gincanas, olimpíadas, etc., poderão contar com a presença do

instrutor para a divulgação do Programa; agendar com antecedência a formatura de

encerramento, informando o diretor da escola de suas necessidades; os afastamentos

106

legais, tais como: luto, núpcias, etc., a organização das aulas, os limites diários, sob o

contexto da norma vigente. Demonstrar quais são as responsabilidades do policial

militar instrutor e do Oficial de Ligação do Programa de Prevenção, quanto ao

Cronograma de Trabalho Semestral, sob a ótica das normas vigentes. Os alunos deverão

realizar o agendamento prático de um semestre letivo para uma escola, através da

distribuição de um modelo de programação de aulas. Explicar os objetivos da realização

da reunião com pais: apresentar o Programa de Prevenção à comunidade; permitir que

os pais conheçam o policial; informar os pais do impacto do problema das drogas,

mostrando estatísticas. Explicar o papel do policial na escola: não é repressão; treino

para ensinar o currículo do Programa de Prevenção às Drogas e à Violência. Explicar as

habilidades que os pais devem ter quanto à prevenção às drogas e à violência:

comunicação eficaz com os filhos; estar informado sobre drogas; tomar uma posição

firme contra o abuso de drogas; formar o comportamento que os pais desejam;

proporcionar alternativas dentro da família; saber usar os recursos comunitários; e

espelhamento (exemplo). Demonstrar quais são as responsabilidades do policial militar

instrutor, sob a ótica das normas legais vigentes. Conhecer a origem do Programa,

através do modelo americano “D.A.R.E. – Drug Abuse Resistance Education” e sua

interação nos diversos segmentos sociais na sua elaboração. Demonstrar quais são as

técnicas de Marketing Institucional e os programas de prevenção complementares,

desenvolvidos pelo DARE. Demonstrar e encorajar a adoção do Programa conforme o

modelo original, protegendo a marca registrada, utilizada pelas Instituições que aplicam

esta metodologia preventiva no mundo. O papel do DARE America como de apoio aos

países que aplicam a metodologia educacional preventiva do Programa e seus objetivos

(conscientização nos países em que é aplicado sobre a interação polícia, escola e

família; encorajar a adoção do Programa em outras comunidades; fornecer material

107

didático para as localidades que necessitem; apoiar treinamentos em comunidades que

solicitem a implantação do Programa; monitorar os padrões e a integridade do Programa

através de auditorias e pesquisas; coordenar o levantamento de fundos nos EUA).

Conhecer a origem do Programa de Prevenção às Drogas e à Violência no Brasil, sua

evolução e disseminação pelos Estados da Federação. O papel do Programa como

metodologia educacional preventiva ao uso abusivo de drogas e à violência esua

interação com a família, escola e polícia para a busca de soluções eficientes paea esse

problema.

7) Modelos de Lições do PROERD

Assuntos: Proporcionar conhecimentos que capacitem o aluno a conhecer as

lições sobre prevenção às drogas e à violência de acordo com as técnicas e normas

estabelecidas pelo Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência

(PROERD) destinado aos 5º e 7º anos do Ensino Fundamental.

8) Práticas de Ensino

Assuntos: Proporcionar conhecimentos que capacitem o aluno a a) atuar com

confiança na plataforma, b) apresentar-se perante uma classe sem receios, inibições ou

vícios e c) ministrar aulas sobre resistência às drogas e à violência de acordo com as

técnicas e normas estabelecidas pelo Programa Educacional de Resistência às Drogas e

à Violência (PROERD).

As técnicas e normas citadas acima não são especificadas no currículo de

formação do Policial PROERD, mas devem estar contidos no manual do instrutor que

não é de acesso público.

9) Doutrina de Emprego Policial – PROERD como Atividade de Segurança

Escolar

108

Assuntos: Capacitar o aluno a compreender que o Programa Educacional de

Resistência às Drogas e à Violência (PROERD) é uma atividade de policiamento

vinculado à segurança escolar, assim como a ronda escolar e, portanto, devem estar

integrados para que atuem como um prolongamento de segurança nas escolas, com

postura preventiva e pró-atividade e não somente repressiva imediata.

Material

“Protegendo Nossas Crianças: ajudando a mantê-las seguras, livres

das drogas e da violência”

O material “Protegendo Nossas Crianças: ajudando a mantê-las seguras, livres

das drogas e da violência”19

preparado para a educação infantil até o 3º ano do Ensino

Fundamental é composto por vinte cartazes apresentados às crianças, focando em

atividades lúdicas para o desenvolvimento de noções de cidadania, segurança pessoal e

práticas saudáveis. A parte da frente do cartaz é uma ilustração e a parte de trás contem

instruções para o policial de como apresentar o conteúdo. Tais informativos estão

organizados em seis partes: conceito, objetivos, vocabulário, motivação, ensino da lição

e reforço, indicando o que dizer ou que exemplos dar, como fazer uma atividade ou um

jogo.

Os vinte cartazes abordam temas comuns que as crianças podem encontrar em

casa, na escola ou lugares públicos. Cada cartaz apresenta uma situação diferente e as

“práticas adequadas” para lidar com tais situações de forma segura: reconhecer, evitar,

resistir e relatar.

Os temas de cada cartaz são:

19

Este material foi cedido pela Polícia Militar do Estado de São Paulo.

109

1) Porque é mais seguro seguir instruções?

Conceito: Os símbolos e sinais de trânsito devem ser obedecidos.

Objetivos: Os alunos deverão demonstrar consciência sobre a importância dos

sinais e símbolos de trânsito mediante: explicação sobre o que significam,

especificamente, sinais e símbolos, e porque são importantes; demonstração das

atitudes seguras a tomar em resposta aos símbolos e sinais.

Vocabulário: Sinais, símbolos.

Motivação: Jogue com seus alunos um jogo de “Luz Vermelha, Luz verde”.

Você fica em uma das extremidades da área de jogo e os alunos se colocam em

fila, ao longo da outra extremidade, de modo que estejam à sua frente. Quando

você disser “luz verde”, eles avançam na sua direção, deslocando-se o mais

rapidamente possível até que você diga “luz vermelha”. Nesse, ponto, eles

devem parar e permanecer estáticos até que você diga "luz verde” novamente.

Os alunos que não seguirem as regras deverão retornar ao ponto de partida.

Vence o aluno que alcançar você primeiro. Dê prosseguimento, dizendo aos

alunos que, ao seguirem as instruções, eles obtêm um desempenho excelente no

jogo. Hoje, eles aprenderão de que maneira o fato de seguir instruções os auxilia

a realizar algo ainda mais importante – manterem-se seguros.

Ensino da Lição:

Mostre o cartaz 1 aos alunos. Aponte cada sinal ou símbolo e pergunte

qual é o seu significado. O que você deve fazer ao vê-lo? Revise também

o significado das diferentes cores nos semáforos: vermelho significa

pare; verde significa siga; amarelo significa reduza a marcha, tenha

cuidado.

110

Explique o significado do sinal internacional do “Proibido”; assinale o

que estiver sob a barra diagonal não é permitido. Na ilustração, o sinal

significa “Proibido bicicletas”. Os alunos devem compartilhar seu

conhecimento de outros sinais dessa espécie (por exemplo, sinais de

“Proibido fumar” são muito comuns).

Traga à memória dos alunos outras duas regras de segurança no trânsito,

a fim de lembra-los de que, geralmente, não são representadas por

nenhum símbolo ou sinal. (1) Quando estiver passeando em um

automóvel, utilize sempre o cinto de segurança. (2) Quando andar de

bicicleta, utilize sempre um capacete para ciclismo.

Reforço: Instrua os alunos a desenharem seus próprios sinais, os quais

representam ser uma regra importante em suas vidas. Enfatize que os sinais se destinam

a indicar as regras que ajudam a manter as pessoas seguras.

2) Por que é importante saber o que está acontecendo à sua volta?

111

3) Por que você não deve aceitar presentes nem caronas de estranhos ou de

pessoas que você não conheça bem?

4) Para quem você deve telefonar em caso de emergência?

5) Por que você deve ficar perto de seus amigos em locais públicos?

6) O que você deve fazer se não for buscado na hora combinada?

7) O que você deve fazer se encontrar uma arma?

Conceito: Armas de fogo e quaisquer outras armas são perigosas e não devem

ser manipuladas pelas crianças.

Objetivos: Os alunos terão condições de demonstrar atitudes seguras que devem

ser tomadas se encontrarem uma arma de fogo ou qualquer arma, como: nunca

manipular armas, balas ou outras partes de uma arma; nunca manipular outras

armas, como facas; encontrar um adulto de confiança e lhe contar a respeito da

arma que você encontrou; obedecer às regras de segurança em relação a toda e

qualquer arma mantida em casa, pelos adultos.

Vocabulário: Bala, manipulação, arma.

Motivação: Relate aos alunos alguns fatos que ajudam a mostrar como as armas

são perigosas. Por exemplo: no ano de 2005, quarenta crianças e adolescentes

sofreram acidentes por disparos de armas de fogo no Brasil. (Fonte: Ministério

da Saúde – Datasus).

Ensino da lição:

Mostre o cartaz 7 aos alunos. Peça-lhes que descrevam o que está

acontecendo na cena. O que os meninos encontraram? (uma arma).

Como eles podem estar se sentindo? (assustados, curiosos).

112

Peça aos alunos que contem a você o que deveria acontecer em seguida,

se os garotos quisessem ficar em segurança. (Deveriam se retirar e ir

buscar um adulto de confiança para lhe contar sobre a arma). O que não

deveria acontecer? (Os garotos não deveriam tocar na arma).

Conte aos alunos que, algumas vezes, as pessoas acreditam que uma

arma de verdade é um brinquedo. Pessoas foram feridas e mortas, porque

alguém pensou, por engano, que estava manipulando uma arma de

brinquedo. Os alunos devem sempre pensar que qualquer arma é de

verdade e que está carregada (tem balas dentro). Nenhuma arma deve ser

recolhida, apontada para alguém ou manipulada de alguma forma.

Fale sobre situações onde há armas em casa. Explique que as regras de

segurança devem ser cuidadosamente seguidas. Por exemplo, as armas

devem ser mantidas descarregadas em um local trancado e fora do

alcance de crianças. As balas devem ser guardadas em um lugar

diferente, que também esteja trancado.

Volte novamente à ilustração. Peça aos alunos para imaginarem que um

dos garotos quer pegar a arma. Pergunte-lhes sobre o que o outro menino

poderia fazer para evitar que o amigo faça isso.

Reforço: Faça jogos de interpretação com os alunos, onde eles encontram uma

arma nas situações seguintes: em casa; na rua; na escola; na praça; quando um amigo

lhe mostra uma arma. Desenvolva os jogos de interpretação, certificando-se de que os

alunos utilizem práticas de segurança adequadas em cada cena.

113

8) Como você pode saber o que é seguro tocar, experimentar, cheirar ou

comer?

Conceito: Apenas alimentos são seguros de tocar, experimentar, cheirar ou

comer. Medicamentos e produtos não-alimentícios, que são úteis no ambiente

doméstico, podem fazer muito mal se forem utilizados inadequadamente.

Objetivos: Os alunos terão condições de explicar a diferença entre produtos

alimentícios e não-alimentícios e seguirão práticas seguras com relação a produtos não-

alimentícios, tais como: sEmpre perguntar a respeito de um produto que não se tem

certeza se é ou não seguro de se tocar, experimentar, comer ou cheirar antes de

manipulá-lo; nunca tocar em produtos domésticos não-alimentícios sem antes obter

autorização de um adulto; ajudar a armazenar produtos domésticos perigosos fora do

alcance de crianças; nunca tomar medicamentos sem a supervisão de um adulto.

Vocabulário: Produto doméstico, medicamento, não-alimentício, tóxico.

114

Motivação: Solicite aos alunos para dizerem quais são suas comidas preferidas.

Faça uma lista no quadro. Em seguida, peça aos alunos para ajudarem você a decidir se

cada alimento é saudável de comer frequentemente ou adequado para ingestão somente

às vezes. Explique que, embora comer alguns alimentos seja menos saudável do que

comer outros, eles são feitos para serem comidos. Outros produtos encontrados no

ambiente doméstico, entretanto, nunca devem ser comidos ou cheirados. Eles são

produtos domésticos não-comestíveis. Hoje, os alunos aprenderão sobre esses artigos.

Ensino da lição:

Mostre o cartaz 8 aos alunos. Explique que o pai e a filha acabaram de ir

às compras e estão prestes a guardar as coisas que compraram. Peça aos

alunos que ajudem você a identificar cada produto desenhado no cartaz.

Pergunte-lhes se é um artigo alimentício ou não.

Para cada produto não-alimentício, pergunte aos alunos para que ele é

utilizado. Fale como o produto pode ser útil, quando utilizado

corretamente. Enfatize que esses produtos podem ocasionar dano, se

utilizados incorretamente. Substâncias químicas tóxicas podem causar

doenças ou morte, se forem ingeridas ou inaladas. Alguns venenos

podem causar queimaduras, se forem tocados. Destaque a advertência

existente em muitos produtos, como: “Deve ser mantido fora do alcance

de crianças”.

Agora, pergunte aos alunos em que lugar o pai e a filha devem colocar

cada produto: Na geladeira? Em um lugar em que as crianças não podem

alcançar?

115

Reforço: Sugira aos alunos as situações a seguir. Pergunte-lhes o que eles

deveriam fazer em cada caso:

Você vê uma barata correndo no chão da cozinha. Você odeia baratas.

Sua mãe está trabalhando no computador e pediu que você não a

incomode. Você sabe onde está o spray contra baratas. (Você não deve

utilizar o spray sem a supervisão de um adulto. Você pode interromper

sua mãe ou contar a ela o que viu, quando ela terminar o trabalho).

Você comeu um pedaço de pizza de alho e óleo no almoço e sabe que

está com mau hálito. Você já viu seu pai borrifando alguma coisa na

boca antes e gostaria de experimentar aquilo também. Você vai procurar

no banheiro sprays que cheiram bem. (Você jamais deve colocar um

produto não-alimentício na boca ou inalá-lo sem antes perguntar a um

adulto. Você nunca deve procurar nada nos armarinhos do banheiro sem

autorização).

Você encontra sua irmã de 2 anos de idade andando pela casa, com um

recipiente de produto de limpeza. Você não tem como saber se ela o

abriu ou não. (Conte a um adulto imediatamente, certifique-se de que o

produto de limpeza seja colocado em um lugar, no qual sua irmã não

possa alcança-lo).

9) Por que você não deve entrar na casa de uma pessoa que você não

conheça bem?

10) Se estiver sozinho em casa e alguém telefonar ou bater à porta, o que

você deve fazer?

116

11) O que você deve fazer caso se perca de seus pais durante um passeio ao

shopping center ou a uma grande loja?

12) Por que é importante fazer com que as pessoas responsáveis por você

saibam onde você está?

13) O que você deve fazer se alguém tentar tocá-lo de um jeito que você não

gosta?

14) Quando as drogas podem ajudar e quando podem fazer mal?

Conceito: Os medicamentos e produtos domésticos comuns contêm drogas e

podem ajudar ou fazer mal.

Objetivos: Os alunos devem saber que medicamentos e produtos domésticos

podem ser úteis, quando utilizados corretamente, e podem fazer mal, se forem utilizados

de forma incorreta. Eles devem seguir regras de segurança sobre medicamentos e

práticas domésticas, tais como: nunca tocar, experimentar ou cheirar nenhum

medicamento ou produto doméstico sem autorização de seus pais ou outro adulto

responsável; nunca tomar medicamentos por conta própria. Somente um médico ou

outro profissional de saúde, ou um dos pais, responsável ou outro adulto de confiança

deve tomar essa decisão; nunca tomar o medicamento de outra pessoa; manter-se

sempre longe de armarinhos ou outros locais onde medicamentos e produtos domésticos

são armazenados.

Vocabulário: Drogas, medicamento, dor, vitaminas.

Motivação: Defina, para os alunos a palavra droga como “toda substância que

não seja alimento e que possa modificar a maneira como o corpo funciona”. Pergunte

aos alunos se são capazes de nomear algumas drogas. (Os alunos podem responder com

palavras genéricas como aspirina, com nomes de marcas ou com os nomes das drogas

117

“da rua”, sobre as quais tenham ouvido falar no noticiário. Não deixe que os alunos

personalizem a discussão com histórias de uso de drogas). Explique que os alunos

poderão se surpreender com o que irão aprender hoje: que muitos produtos domésticos

comuns também contêm substâncias perigosas na composição. Isso significa que é

necessário seguir as normas de segurança sobre o uso e o armazenamento de produtos

domésticos.

Ensino da lição:

Inicie a aula, enfocando os medicamentos. Defina primeiramente

medicamento para os alunos, como: “drogas que, quando utilizadas

corretamente, possuem a capacidade de ajudar as pessoas que estão

doentes a melhorarem ou aliviar a dor”. Em seguida, converse sobre as

normas de segurança que devem ser seguidas quanto a medicamentos.

Elabore uma lista com essas regras em uma cartolina ou no quadro:

nunca decida, por conta própria, que você precisa tomar um

medicamento. (Quando você não se sentir bem, diga a um de seus pais,

responsável ou outro adulto de confiança. Ele ou ela pode decidir se você

precisa de remédio ou não); nunca tome medicamento por conta própria.

(Somente quem é responsável por você deve lhe administrar

medicamento); mantenha-se sempre longe de armarinhos ou outros

lugares nos quais estão guardados os remédios.

Agora, mostre o cartaz 14 aos alunos. Peça a eles que digam quais

ilustrações mostram medicamentos. Ajude-os a identificar as ilustrações

de recipientes com vitaminas e medicamentos. Enfatize que esses são

medicamentos e que as regras de segurança devem ser seguidas. Logo,

aponte para cada ilustração, ajudando os alunos a identificarem qual

118

produto doméstico é mostrado. Pergunte-lhes para que finalidade cada

produto é utilizado. Enfatize que o produto pode ser útil no ambiente

doméstico, se for utilizado corretamente. No entanto, se o produto for

experimentado, inalado ou usado de forma incorreta, pode fazer mal.

Continue mostrando o cartaz 14, enquanto discute com os alunos, agora,

onde cada produto ilustrado deve ser mantido para evitar que crianças

pequenas possam alcança-los. Destaque também que produtos como

esses devem ser mantidos longe do calor.

Reforço: Compile outras ilustrações, tais como as encontradas em anúncios

publicitários de revistas e jornais, de medicamentos e produtos domésticos comuns.

Distribua os alunos em pequenos grupos para que identifiquem cada produto, digam

qual é o uso e façam uma ilustração do local onde ele deveria ser armazenado.

15) De que maneira o tabaco, o álcool e outras drogas perigosas podem fazer

mal?

119

Conceito: O tabaco e o álcool são drogas nocivas, cujo consumo e venda para

crianças e adolescentes são ilegais. A maconha é uma drogas prejudicial e ilegal. Os

medicamentos podem ser prejudiciais, se forem utilizados incorretamente.

Objetivos: Os alunos devem conhecer fatos relevantes acerca dos efeitos nocivos

do álcool, do tabaco e de outras drogas perigosas, e devem aplicar essas informações

para tomarem atitudes seguras tais como: recusar todas as ofertas para experimentar

tabaco, álcool, maconha ou outras drogas ilegais; utilizar medicamentos apenas quano

um dos pais, um tutor ou outro adulto responsável estiver supervisionando, e nunca

tomar o medicamento de outra pessoa.

Vocabulário: Álcool, cerveja, fumo de mascar, cigarros, charutos, cocaína,

efeitos, ilegais, bebidas, maconha, cachimbo, tabaco, vinho.

Motivação: Converse com os alunos sobre todas as coisas que estão sempre

acontecendo no corpo, sobre as quais não estamos conscientes: nós respiramos, nosso

coração pulsa, o sangue corre nas veias, a comida é digerida e transmitida ao longo do

corpo para fornecer energia. Enfatize como é importante cada atividade do corpo, e

como todas elas estão relacionadas. É por isso que devemos ter cuidado com aquilo que

colocamos dentro do corpo, para que todo seu funcionamento ocorra normalmente.

Hoje, os alunos irão aprender sobre algumas drogas que danificam partes do corpo e seu

funcionamento. As crianças nunca devem fazer uso dessas drogas.

Ensino da lição:

Mostre o cartaz 15 aos alunos. Aponte a ilustração dos produtos de

tabaco e identifique cada produto: cigarro, charuto, fumo de mascar e

cachimbo. Enfatize que a compra desses produtos por crianças é ilegal.

Explique que todos eles contêm uma droga perigosa que acelera o

120

funcionamento do corpo. Isso prejudica várias parte[s] do organismo,

incluindo o coração e os vasos sanguíneos. Cigarros, charutos e

cachimbos, os quais são fumados, também provocam danos aos pulmões

e a outros órgãos, e podem levar a doenças fatais, como o câncer e os

distúrbios cardíacos. O fumo de mascar pode danificar as gengivas e os

dentes e causar câncer de boca.

Em seguida, aponte a ilustração de bebidas alcoólicas. Identifique cada

produto: cerveja, vinho, aguardente. Enfatize que o consumo desses

produtos por crianças e adolescentes é ilegal. Explique que todos os

produtos contêm a droga álcool, que reduz a velocidade de

funcionamento do corpo. O álcool tem efeitos nocivos sobre quase todos

os órgãos do corpo. Ele altera a maneira como as pessoas agem, pensam

e se movimentam.

Agora, aponte a terceira ilustração no cartaz 15. Identifique a maconha e

a cocaína na ilustração como drogas perigosas, cujo consumo por

qualquer pessoa é ilegal. Identifique os comprimidos e as cápsulas que

são mostrados. Explique que essas drogas são medicamentos, porém,

tornam-se prejudiciais quando usadas inadequadamente.

Debata com os alunos, de modo breve, o fato de que essas drogas causam

dependência. Quando a pessoa começa a fazer uso delas, torna-se difícil

abandoná-las.

Reforço: Peça aos alunos que façam ilustração com caricaturas, mostrando

uma pessoa que consumiu tabaco (o funcionamento do corpo é acelerado) e

121

uma pessoa que consumiu álcool (a velocidade de funcionamento do corpo é

diminuída).

16) Como você pode dizer “não”?

Conceito: Dizer “não” em uma situação insegura é parte importante de um plano

de segurança pessoal.

Objetivos: Os alunos devem dizer “não” quando forem pressionados, por

companheiros ou adultos, a fazer algo que não seja seguro ou pareça não ser correto.

Eles devem seguir quatro passos quando disserem não: Saber quando uma situação é

insegura ou nociva; Dizer “não”; afastar-se da pessoa que está pressionando você;

contar a um dos pais, responsável ou outro adulto de confiança o que aconteceu.

Vocabulário: Companheiros, pressão.

Motivação: Faça uma representação para os alunos. Diga-lhes que um de seus

amigos está tentando convencê-lo a fazer algo que você não quer fazer. Apresente os

quatro passos que você utiliza para dizer “não”. Primeiro, aponte para a sua cabeça,

122

indicando que está pensando. Diga: “Eu sei que isso é algo que não quero fazer”. Em

seguida, diga não à pessoa. Demonstre como suas palavras tranquilas e sua postura

segura mostram que você está muito seguro de si. Em terceiro lugar, afaste-se. Explique

que você está indo embora (vá). Finalmente, represente um diálogo com um de seus

pais, um responsável ou outro adulto de confiança, contando sobre o que aconteceu

(narre). Diga aos alunos que hoje irão aprender sobre esse método de dizer “não” e terão

a oportunidade de praticar, eles mesmos, os passos.

Ensino da lição:

Converse com os alunos sobre ocasiões em que eles precisam dizer “não”

a amigos ou a adultos. Ajude-os a descrever situações que podem ser

inseguras ou nocivas, ou que pareçam não ser corretas. (Para ajudar os

alunos a ter ideias, você pode mostrar os cartazes 3, 7, 9 e 13). A seguir,

mostre o cartaz 16 e aponte para o primeiro quadro, no qual a menina

mais velha está oferecendo cigarro a mais jovem. Pergunte aos alunos se

essa é uma situação na qual a menina mais jovem precisa dizer “não”

(certamente; cigarros são prejudiciais e ilegais para crianças e

adolescentes). Explique que esse é o primeiro passo para dizer “não”:

saber que a situação não é segura ou é perigosa. Escreva “SABER” no

quadro.

Agora chame a atenção dos alunos para o segundo quadro, no qual a

garota está dizendo “não”. Pergunte aos alunos o que está acontecendo.

Explique que a menina está seguindo o segundo passo para dizer “não”.

Escreva “DIZER NÃO” no quadro, abaixo de “SABER”. Converse sobre

como a garota está dizendo “não” (sua expressão facial, postura, gestos).

123

Aponte para o terceiro quadro no cartaz 16, no qual a menina mais nova

está indo embora. Pergunte aos alunos o que está acontecendo na cena.

Mostre que esse é o terceiro passo para dizer “não”. Escreva “IR

EMBORA” no quadro, abaixo de “DIZER NÃO”. Explique que a

menina está se afastando da situação. Dessa maneira, ela está resolvendo

o problema. Ao ir embora, ela está garantindo que não receberá nenhuma

pressão adicional da garota mais velha.

Finalmente, aponte para o quarto quadro e explique que a menina está

seguindo o último passo para dizer “não”. Ela está contando a um dos

pais, responsável ou outro adulto de confiança o que aconteceu. Escreva

“CONTAR” abaixo de “IR EMBORA”. Enfatize o quanto a garota está

se sentindo melhor.

Reforço: Faça com que, em grupos de três, os alunos encenem situações nas

quais dizem “não”. (Um aluno é aquele que está pressionando, o outro é o pressionado,

e o terceiro é um adulto de confiança). Permita que cada grupo escolha a situação que

deseja apresentar. Comente a cerca do desempenho de cada grupo, seguindo os quatro

passos para dizer “não”.

124

17) O que você sente?

18) O que você deve fazer quando sentir raiva?

19) O que fazer para evitar brigas?

20) O que as gangues fazem para prejudicar você e seu bairro?

Como é possível observar, esse material é de uso exclusivo do Policial

PROERD. Nele é apresentado um roteiro bastante detalhado de como conduzir as aulas

apresentando de forma direta o passo-a passo das condutas que se espera das crianças,

colocando o que devem dizer e o que fazer em diferentes situações.

Diferentemente dos materiais que serão apresentados a seguir, os cartazes

intitulados “Protegendo Nossas Crianças: ajudando a mantê-las seguras, livres das

drogas e da violência” tem uma abordagem que parece ser anterior a metodologia do

material “Caindo na... REAL”. Aqui o termo segurança é repetido diversas vezes:

125

tomada de decisão segura; plano de segurança pessoal; regras de segurança; ações

seguras; escolhas seguras.

Além disso, há mais conteúdo sobre drogas em si do que no material “Caindo

na... REAL”, sendo bastante incisivo e até caricato ao dizer que essas substâncias fazem

mal. Inclusive, como foi mostrado, uma das atividades é fazer uma ilustração caricata de

pessoas sobre o efeito de drogas.

Caindo na... REAL

Os currículos PROERD para crianças e jovens do Ensino Fundamental são

formados por dois livros: uma para alunos do 5º ano e outra para os alunos 7º ano.

Ambas trabalham com o desenvolvimento de estratégias e habilidades para “tomar

decisões seguras e responsáveis”, ao longo de dez lições. O próprio nome do material é

uma referência às estratégias do currículo:

R: Recusar (Não, eu não quero fazer algo);

E: Explicar (Dizendo por que eu não quero fazer algo);

A: Abster-se (Manter-me distante de uma situação na qual não quero me

envolver); e

L:Livrar-se (Sair de uma situação da qual não quero fazer parte).

O livro do 5º ano começa com uma “Mensagem do Policial” para os pais

informando que o Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência é um

esforço cooperativo entre a Polícia Militar, a Escola e a Família, destinado a evitar que

crianças e adolescentes iniciem o uso abusivo de drogas. E que o currículo foi

126

fundamentado na Teoria de Aprendizagem Socioemocional (Social and Emotional

Learning – SEL).

O SEL se refere ao processo de integração do pensar, sentir e se comportar para

se tornar ciente de si e dos outros, tomar decisões responsáveis e orientar seu próprio

comportamento e o dos outros. Em parte, essa teoria deriva de pesquisas sobre

inteligência emocional, ou seja, a habilidade mental associada ao processamento e

resposta à emoções, como por exemplo, reconhecer emoções em expressões faciais, usar

emoções para aprendizagem e regular emoções para conduzir a um determinado

comportamento (Brackett; Rivers, 2012: 4).

Segundo Mark A. Brackett e Susan E. Rivers, a implementação da aprendizagem

socioemocional no currículo escolar foca, principalmente, em bullying, abuso de

substâncias psicoativas, práticas sexuais insalubres, delinquência, violência,

desenvolvimento de caráter, preparação para o mercado de trabalho, serviço

comunitário.

A organização Collaborative for Academic, Social and Emotional Learning

(CASEL) define SEL como sendo

“processos através dos quais as crianças e os adultos adquirem e aplicam de

forma eficaz os conhecimentos, atitudes, e competências necessárias para

compreender e gerir emoções, estabelecer e atingir objetivos positivos, sentir

e mostrar empatia pelos outros, estabelecer e manter relações positivas, e

tomar decisões responsáveis”20

,

e identificou cinco competências associadas ao SEL:

Autoconhecimento: a capacidade de reconhecer as próprias emoções, próprios

pensamentos e valores e como influenciam seu comportamento; ser capaz de reconhecer

20

Disponível em: https://casel.org/what-is-sel/. Acesso em: 14/04/2018.

127

seus pontos fortes e limitações; desenvolver bom senso, otimismo e crescimento

pessoal.

Autocontrole: habilidade de regular as emoções, pensamentos e comportamento

em diversas situações (gerenciar estresse, controlar impulsos e criar condições para se

auto motivar); capacidade de definir e trabalhar em direção a objetivos pessoais e

profissionais.

Consciência social: capacidade de ser empático, se colocar no lugar do outro,

incluindo aqueles com cultura, origem e valores diversos; capacidade de compreender

as normas sociais e éticas, e reconhecer os recursos e apoio da família, da escola e da

comunidade.

Gerenciamento de relacionamento: capacidade de estabelecer e manter

relacionamentos saudáveis com outros indivíduos e grupos; capacidade de se comunicar

com clareza, ouvir bem, cooperar com os outros, resistir a pressão social inadequada,

negociar conflitos construtivamente, buscar e oferecer ajuda.

Tomada de decisão responsável: capacidade de fazer escolhas construtivas

sobre o comportamento pessoal e interações sociais baseadas em padrões éticos,

preocupações de segurança e normas sociais; avaliação realista da consequência de suas

ações, e consideração do bem-estar de si e dos outros.

128

O SEL propõe uma abordagem para o desenvolvimento de competências sociais

e emocionais em função de uma aprendizagem efetiva, comportamento positivo, uma

assiduidade regular e o bem-estar emocional de crianças e jovens (Coelho; Marchante;

Sousa; Romão, 2016: 62-63).

O PROERD se apoia nesses princípios acreditando ser a melhor forma de

ensinar crianças e jovens a tomarem “decisões seguras” e “responsáveis” em relação às

drogas, funcionando como uma iniciativa na educação deles para tornarem-se cidadãos

responsáveis para conduzirem suas vidas de forma mais produtiva e sem drogas

(PMMG, 2013: 1).

Antes de dar início às lições estabelece-se os Combinados PROERD para ser

seguido ao longo de todos os encontros (Idem: 4): levante a mão para que só uma

pessoa fale de cada vez; seja positivo, responsável e respeitoso, um comentário

129

inadequado pode magoar sentimentos e encerrar nosso debate; observe e atenda ao sinal

de silêncio; use a expressão “alguém que eu conheço” em vez do nome da pessoa

quando contar uma história; e responda somente às perguntas às quais se sinta à vontade

para responder.

A primeira lição, chamada “Praticando o Modelo de Tomada de Decisão”

apresenta uma situação em que coloca a criança na posição de escolher entre duas

opções: ir ao jogo da sua equipe ou ir a festa de aniversário de um amigo. Para isso, o

modelo de tomada de decisão tem quatro etapas: 1) defina: descreva o problema, desafio

ou oportunidade; 2) analise: quais são suas escolhas? Quais seriam as consequências de

cada escolha?; 3) atua: faça uma escolha, use os fatos e as informações que você

observou no “analise”; e 4) avalie: revise sua decisão, você fez uma boa escolha?

A lição 2 trata de bebida alcoólica e cigarro, apresentado fatos e efeitos de seu

consumo. Essas são as duas únicas substâncias tratadas no livro. Os fatos sobre o uso da

bebida alcoólica são: a bebida alcoólica é ilegal para menores de 18 anos; há 17.300

mortes relacionadas ao consumo da bebida alcoólica, a cada ano, no Brasil; a maioria

dos jovens não consome bebida alcoólica; a mistura de bebida alcoólica com remédio é

perigosa; crianças e adolescentes ainda estão em crescimento, portanto, a bebida

alcoólica é mais prejudicial a eles do que aos adultos. Os efeitos da bebida alcoólica,

apresentados, são: a bebida alcoólica deixa o cérebro e o corpo mais lentos, os efeitos

podem incluir perda da coordenação, perda dos critérios de julgamento, falha de

memória, perda de autocontrole, reflexos mais lentos; a bebida alcoólica enfraquece o

músculo do coração, pois reduz a quantidade de sangue bombeada por ele; o excesso de

bebida alcoólica pode levar ao coma e à morte; a bebida alcoólica vai diretamente à

corrente sanguínea e pode causar dano a todos os órgãos do seu corpo.

130

Um dos dados apresentados nessa lição aponta que “a maioria dos jovens não

consome bebida alcoólica”. O I Levantamento Domiciliar Sobre o Uso de Drogas

Psicoativas no Brasil, de 2001, aponta que 48,3% dos jovens de 12 a 17 anos já fizeram

uso de álcool; e 5,2%, nessa mesma faixa etária, são dependentes de álcool (Brasil,

2007: 9). Em 2005, foi realizado o II Levantamento Domiciliar Sobre o Uso de Drogas

Psicoativas no Brasil, onde números indicam que 54,3% já consumiram álcool e 7% são

dependentes (INPAD, 2012: 41-42).

Os fatos sobre o cigarro são: no Brasil é ilegal vender cigarros para menores de

18 anos; há mais de 4.700 substâncias tóxicas na fumaça do cigarro; cigarros contêm

nicotina, uma substância nociva e poderosa que causa dependência; o cigarro é uma das

principais causas de morte evitável no país; mais de 200.000 brasileiros morrem de

causas relacionadas ao cigarro a cada ano; quase 6.000 mortes por ano são atribuídas ao

fumante passivo. E os efeitos são: a nicotina contida nos cigarros e no fumo de mascar

reduz a quantidade de sangue que flui para o cérebro, isso interfere na forma como o

cérebro funciona; fumar causa doença cardíaca; fumantes contraem mais resfriados e

problemas respiratórios; fumar causa câncer de pulmão; o fumo de mascar pode causar

câncer de boca, perda dos dentes e outros problemas de saúde; fumar causa

amarelamento dos dentes, mau hálito, ressecamento da pele e rugas.

Os exercícios dessa lição são três situações envolvendo o consumo de álcool ou

cigarro por terceiros e em cada situação o aluno deve definir o problema. A lição

seguinte, “Fazendo Escolhas Seguras e Responsáveis”, apresenta quatro situação, sendo

que apenas uma envolve o consumo de álcool ou cigarro, e o aluno deve definir e

analisar o problema de cada situação.

A lição quatro apresenta cinco estratégias de resistência. São elas: 1) evitando a

situação: “se você conhece os lugares onde as pessoas geralmente usam drogas,fique

131

longe desses lugares”; 2) a união faz a força: “ande sempre com amigos que não usam

drogas”; 3) afastando-se: “-eu achei um cigarro na bolsa da minha mãe, quer fumar?

Diga não e afaste-se”; 4) dizer não, dando uma razão ou uma desculpa: “-quer uma

cerveja? -Não, obrigado, meus pais ficariam desapontados comigo”; 5) mudando de

assunto: “-eu tenho alguns cigarros, você aceita? -Não, vamos jogar basquete em vez

disso” [(neste caso é curioso não haver sequer uma atualização para a sua aplicação no

Brasil, pois seria mais coerente o convite ser para jogar futebol)] . Na sequência são

apresentadas mais quatro situações, sendo que uma envolve o consumo de álcool e uma

conteúdo violento de vídeo game, para definir e analisar, e sugerir uma atuação.

A lição cinco trata de sinais que o corpo manifesta quando em situação de

tensão, sem especificar quais são esses sinais; e propõe que seja realizada alguma

atividade “positiva” nessas situações, como: fazer um desenho, escrever um poema ou

uma música. Provavelmente, o Policial PROED deve ter informações complementares

para apresentar aos alunos. A atividade dessa lição é em grupo, os alunos devem

escolher uma das quatro situação apresentadas no livro e, agora, aplicar as quatro etapas

do modelo de tomada de decisão: defina, analise, atue e avalie.

A lição seis apresenta três estilos de comunicação: insegura – falar com voz

fraca, tem medo de falar, tem má postura, parece nervoso; confiante – fala clara e

respeitosamente, postura firme com os ombros para trás, mantém contato com os olhos,

parece calmo; exigente – fala alto e com voz irritada tem postura rígida e se inclina para

frente, intimida se aproximando do seu rosto, olhar severo (franzindo as sobrancelhas) e

aponta para a pessoa. Novamente são apresentadas três situações para que o aluno

utilize apenas comunicação confiante em cada uma delas. E a lição seguinte, de número

7, é apenas atividades com situações à serem aplicadas o modelo de tomada de decisão e

132

a realização de uma redação em que o aluno deve escrever sobre sua experiência com o

PROERD.

A lição oito é sobre relatar o bullying de maneira “segura e responsável” através

das perguntas: quem? o quê? quando? onde? e por quê?. A lição subsequente é uma

atividade que complementa a lição oito, com atividades que apresentam situações de

bullying para os alunos relatarem. Por último, a lição dez fala em procurar ajuda quando

precisar e propõe uma atividade em que os alunos montem uma rede de ajuda,

colocando nomes de amigos e familiares.

Ao final do livro do aluno há um espaço designado a um diário, onde cada aluno

faz um resumo do que aprendeu em cada lição, e é apresentada a Canção do PROERD,

de composição do 3º Sgt. Cláudio Coutinho dos Santos da Polícia Militar do Estado do

Rio de Janeiro:

Existe um programa

Que vai lhe ajudar

Existe um amigo

Que vai lhe ensinar

Que o problema “DROGAS”

Merece atenção

E para manter-se a salvo

É preciso dizer NÃO

Cultivando o amor próprio

Controlando a tensão

Pensando nas consequências

Resistindo à pressão

Como amor a própria vida

E às DROGAS dizer NÃO

Quem lhe ensina é o amigo

133

Mas é sua a decisão

PROERD é o programa

PROERD é a solução

Lutando contra as drogas

Ensinando a dizer NÃO

O livro para alunos do 7º ano do ensino fundamental também é dividido em dez

lições fundamentadas no SEL (Aprendizagem Socioemocional), trabalhando com

situações que os alunos devem abordar com o Modelo de Tomada de Decisão

PROERD, o mesmo encontrado no livro do aluno do 5º ano do ensino fundamental.

Porém, nenhuma lição foca em apresentar fatos e efeitos sobre substância específica,

como no livro anterior, e há mais ênfase nas “Estratégias para Recusar” (recusar,

explicar, abster-se e livrar-se).

A primeira lição traz uma introdução ao REAL: “Estratégias para Recusar” e

apresenta cinco cenários para os alunos responder em cada um deles: 1) o que você fará

nesta situação?; 2) por quê?; 3) o que você acha que acontecerá como resultado de sua

escolha? Quais as possíveis consequências?; 4) como suas escolhas afetam as outras

pessoas?; e 5) a escolha que você fez foi uma simples escolha ou uma sábia escolha?

A lição dois é um jogo de adivinhação com onze perguntas, quatro delas com

três alternativas cada e sete perguntas de verdadeiro ou falso. As perguntas são:

1) Qual o percentual de alunos do Ensino Fundamental e Médio fazem uso

frequente de cigarros?

Alternativas: 3,8%; 12%; 22%.

2) Qual o percentual de alunos do Ensino Fundamental relataram ingerir bebidas

alcoólicas frequentemente?

134

Alternativas: 11,7%; 33%; 45%.

3) Quais as três drogas ilícitas mais comumente consumidas por estudantes do

Ensino Fundamental e Médio das redes públicas do Brasil, nos últimos 30 dias (uso

mês)?

Alternativas: a) álcool, tabaco e solventes; b) cocaína, inalantes e álcool; c)

maconha, álcool e metanfetamina.

4) Ingerir álcool leva à perda de controle, prejudica o nível de consciência e

diminui o campo visual.

5) Fazer uso de medicamento que foram prescritos para outras pessoas, não tão

prejudicial quanto às drogas que são adquiridas nas ruas, afinal, foram prescritos por um

médico.

6) Qual o percentual de alunos do Ensino Fundamental e Médio que não usam

maconha?

Alternativas: 50%; 75%; 96,8%.

7) Alguém que ingere bebida alcoólica ou usa drogas constantemente pode estar

passando por algum problema.

8) Cerveja e vinho são menos nocivos que outras bebidas alcoólicas.

9) É ilegal vender ou fornecer, mesmo que gratuitamente, bebida alcoólica à

menores de 18 anos de idade.

10) O uso de cigarros em ambientes fechados não traz malefícios à saúde das

pessoas que se encontram próximas a fumantes.

11) O consumo prolongado da maconha não traz prejuízos à saúde.

135

Na lição três é apresentado o Modelo de Tomada de Decisão, demonstrando com

perguntas como se utilizar de cada etapa do modelo: defina: descreve a situação (quais

são os meus riscos?, quais as pressões sobre mim?, devo evitar me arriscar?); analise:

trabalhe suas escolhas (quais as minhas opções?, o que posso fazer?, qual será a melhor

estratégia REAL nessa situação?, como posso fazer?); atue: escolha a estratégia REAL

e aplique (qual a melhor estratégia na minha situação?, o que eu posso dizer ou fazer

nesta situação?); e avalie: reveja o que aconteceu e se sua estratégia funcionou (como

os outros reagiram?, escapei de uma situação arriscada?, se não, qual estratégia REAL

devo usar em uma próxima ocasião?, tomaria a mesmo decisão novamente?).

A lição quatro foca em uma atividade em que os alunos devem recusar de

acordo com as situações apresentadas e avaliar quais formas de recusa funcionaram

melhor, quais não funcionaram, se as recusas foram passivas ou agressivas, etc. A lição

cinco foca em explicar através de uma atividade onde os alunos devem fazer afirmações

e justifica-las. A lição seis é sobre abster-se, a atividade apresenta cinco cenários e, em

grupo, os alunos devem propor três maneiras de absterem-se dessas situações, e então,

decidir a melhor escolha a fazer usando o Modelo de Tomada de Decisão PROERD.

A lição oito trabalha com senso comum. O livro trata de três “sensos comuns21

”:

senso comum entre colegas, meu senso comum e senso comum dos outros. Não há

explicação dessas expressões, toda a lição é uma atividade com afirmações – divididas

entre os “sensos comuns” – que os alunos devem assinalar se concordam ou discordam.

São quinze afirmações:

SENSO COMUM ENTRE COLEGAS

1) 40% dos alunos do Ensino Fundamental e Médio já fumaram maconha.

21

Talvez haja um problema de tradução da expressão common sense que em português seria bom senso.

136

2) Pelo menos 50% dos alunos do Ensino Fundamental e Médio ingerem bebidas

alcoólicas.

3) O número de jovens alunos que fumam cigarro caiu nos últimos anos

conforme pesquisas nacionais.

4) O percentual de jovens estudantes que consumem bebidas alcoólicas

frequentemente vem subindo nos últimos anos.

5) Quase todos os jovens do Ensino Médio acham que está tudo bem em relação

ao consumo de drogas.

MEU SENSO COMUM

6) Minha aparência e como me sinto são importantes para mim.

7) Não tenho medo de trabalhar duro para atingir minhas metas.

8) Eu gosto de estar no controle de mim mesmo e de minhas ações.

9) Eu penso nas consequências das minhas ações.

10) Eu gosto de como sou a maior parte do tempo.

SENSO COMUM DOS OUTROS

11) Se um amigo me desse um cigarro e eu não quisesse, eu diria “Sim” porque

eu não feriria os sentimentos dele.

12) É importante que as pessoas de quem eu gosto sintam orgulho de mim.

13) Se eu me arriscasse muito, meus pais se preocupariam comigo.

14) É importante para as pessoas com quem me importo que eu tenha um bom

futuro.

15) Nada do que eu fizer mudará a opinião das pessoas em relação a mim.

137

A lição seguinte trás atividades complementares a lição oito, onde são

apresentados cenários a serem encenados pelos alunos e cada um deve identificar os

sentimentos envolvidos em cada situação e justificar a validade desses sentimentos. E a

última lição, assim como no livro do aluno de 5º ano, é a montagem de uma rede de

ajuda que nesse livro é chamado de Eco-Mapa.

Livro dos Pais

O curso destinado aos pais, intitulado “Capacitando os Pais para Ajudarem os

Filhos a Fazerem Escolhas Positivas”, contêm cinco lições. Antes de dar início às

lições, há uma apresentação com uma descrição bastante breve da história do programa

e sua proposta como sendo uma ação conjunta – entre polícia, pais, escola, especialistas,

estudantes e comunidade – para prevenir e reduzir o uso indevido de drogas e a

violência para a “valorização da vida, que busca contribuir para o fortalecimento da

cultura de paz e a construção de uma sociedade mais saudável, feliz e principalmente

mais segura” (PMSP, 2006: 5).

Também segundo a Apresentação, o currículo para esse programa foi

desenvolvido pela Associação para Supervisão e Desenvolvimento Curricular

(Association for Supervision and Curriculum Development – ASCD) e pela Famílias

em Ação Nacional (National Families in Action – NFIA).

Segundo o site da ASCD22

, essa é uma associação de educação sem fins

lucrativos, criada em 1943, com a missão de criar soluções para questões que afetam a

aprendizagem, métodos de ensino e liderança. A principal abordagem desenvolvida pela

ASCD é chamada Whole Child (Criança Inteira), cujo objetivo é fazer a transição de um

enfoque em realizações acadêmicas para uma que promova o desenvolvimento a longo

22

Disponível em: http://www.ascd.org/about-ascd.aspx. Acesso em: 14/04/2018.

138

prazo e o “sucesso” de todas as crianças, pois a nova demanda do século 21 requer uma

educação que prepare o estudante para a universidade, a carreira e a cidadania23

.

A ASCD acredita que a educação e aprendizagem foram logística e

filosoficamente separadas da saúde e aprendizagem, apesar de “sabermos que saúde e

educação afetam indivíduos e sociedades, assim como a economia”, sendo a escola o

melhor ambiente para a colaboração “saúde-educação”. O esquema a seguir apresenta o

modelo The Whole Child, na sequencia apresento uma breve explicação de capa tópico

do esquema, de acordo com o site da ASCD24

:

23

Disponível em: http://www.ascd.org/whole-child.aspx. Acesso em: 14/04/2018.

24

Esquema retirado do site da Association for Supervision and Curriculum Development (ASCD) e

traduzido pela autora.

139

A criança integral: tem como objetivo garantir que todas as crianças sejam

saudáveis, seguras, engajadas, apoiadoras e desafiadas. Essa abordagem define o padrão

para melhorias escolares abrangentes e sustentáveis e prevê o “sucesso” do aluno a

longo prazo.

Liderança transformacional: construção de líderes visionários, engajadores,

colaboradores, etc., para a criação de uma cultura escolar positiva.

Engajamento global: os estudantes de hoje precisam de disposição,

conhecimento e habilidades para participarem como cidadãos em uma sociedade global.

Além de estarem ativamente engajados em seu aprendizado, os alunos precisam

entender sua conexão com suas comunidades e o mundo em geral.

Pobreza e equidade: cada aluno precisa de um ambiente de aprendizado seguro,

desafiador e de apoio - especialmente alunos com necessidades especiais, diferenças

culturais ou linguísticas, ou vivem na pobreza. Entender o impacto total das

desigualdades é o primeiro passo para criar ambientes saudáveis, escolas de apoio e

instrução direcionada que ajuda todos os seus alunos a se engajarem em oportunidades

significativas para expandir seu aprendizado e aumentar sua realização.

Redefinindo sucesso: expansão da noção de sucesso para além da métrica regida

pelos resultados dos testes, enfatizando habilidades para a vida e atendendo ao

desenvolvimento socioemocional do aluno.

Ensinando e aprendendo: uso de métodos de aprendizagem inovadores para uma

aprendizagem significativa e engajamento do aluno.

O termo resiliência provém da física que designa a elasticidade de um material

diante de impacto, deformação e restauração, retornando a sua forma original. Segundo

Oliveira, houve diversos debates em torno do termo ao longo do século XX,

140

principalmente depois da Segunda Guerra Mundial, até sua consolidação na primeira

década do século XXI (Oliveira, 2012: 106). Uma de suas procedências significativas

está atrelada ao duplo invulnerabilidade e vulnerabilidade, além de “intitular

investimentos que valorizam a resiliência como conceito-chave para a gestão de pessoas

voltada aos gerenciamentos de crise, superação de stress na ambiente de trabalho,

contudo não restritos a ele” (Idem, 107). Como consequência, produz-se “plasticidade

amorfas, repletas de formas e formas moldáveis e moduláveis, que se dilatam, encolhem

e se recolhem, distendem-se, absorvem, distendem-se, acomodam, dissimulam e se

conformam como bolhas elásticas” (Ibidem), resumindo a vida a um empreendimento

de segurança, protegidas e protocoladas por diversos direitos, em busca do “(sobre)viver

em harmonia”.

A resiliência não aceita fissuras, portanto os investimentos se dão desde a

infância para que se introduza, profundamente, a moral e os valores da sociedade de

cultura de paz que se impõe como “ética” do futuro, onde a resiliência articula-se com o

conceito de vulnerabilidade na promoção de adequações e apaziguamentos, “como

complementaridade que inclui e apazigua o confronto de forças no redimensionamento

de conflitos negociados e punições revificadas” (Oliveira, 2011: 90). Neste cenário

configura-se a prevenção geral, que é considerado prioridade na construção de

resiliência.

De acordo com Oliveira, há um descolamento biopolítico da relação medo-

contágio-risco para a combinação resiliência, vulnerabilidade e proteção (2012: 111).

Contudo, não há abdicação do medo e do castigo que continuam à incidir sobre crianças

e jovens.

Após a Segunda Guerra Mundial houve um redimencionamento dos direitos

humanos que se consolidaram com a Declaração Universal de 1948, reconsagrando a

141

propriedade como direito e promovendo os direitos de minorias com ênfase em

refugiados, mulheres e crianças. Uma década depois, as crianças recebem uma atenção

especial com a Declaração dos Direitos da Criança de 1959, constituída em dez

princípios que reformam o conceito de prevenção geral “para a condição da própria

existência e permanência do direito, do Estado e da Política” (Idem: 112). Entre os

direitos citados no documento, temos o Princípio 6º:

A criança precisa de amor e compreensão para o pleno e harmonioso

desenvolvimento da sua personalidade. Na medida do possível, deverá

crescer com os cuidados e sob a responsabilidade dos seus pais e, em

qualquer caso, num ambiente de afecto e segurança moral e material; salvo

em circunstâncias excepcionais, a criança de tenra idade não deve ser

separada da sua mãe. A sociedade e as autoridades públicas têm o dever de

cuidar especialmente das crianças sem família e das que careçam de meios de

subsistência. Para a manutenção dos filhos de famílias numerosas é

conveniente a atribuição de subsídios estatais ou outra assistência (ONU,

1959).

Segundo Oliveira (2012), a resiliência não se constituía como objeto de estudo

em si, os estudos partiam do que se considera como “situação de risco”, como pobreza,

baixa escolaridade dos pais, stress perinatal ou baixo peso no nascimento, deficiência

física. A partir disso, desenvolvem-se as adversidades que serão acopladas à resiliência.

Neste momento, resiliência é usada como sinônimo de invulnerável, mas, mais tarde, o

co[n]ceito seria revisado para vulnerável que é capaz de forjar e se revestir de

mecanismos de proteção.

A definição foi adotada pela Dra. Edith Grotberg, coordenadora do Projeto

Internacional de Resiliência,

A resiliência é uma capacidade humana básica, nascente em todas as

crianças. Os pais e outros prestadores de cuidados promovem resiliência em

crianças através de suas palavras, ações e o ambiente que elas fornecem.

Adultos que promovem a resiliência tornam disponível o apoio familiar e

institucional às crianças. Eles incentivam as crianças tornar-se cada vez mais

autônoma, independente, responsável, empática e altruísta e se aproximar

pessoas e situações com esperança, fé e confiança. Eles ensinam como se

comunicar com os outros, resolver problemas e lidar com pensamentos,

sentimentos e comportamentos negativos. As próprias crianças tornam-se

cada vez mais ativos na promoção de sua própria resiliência (Grotberg, 1995:

7. T.A.).

142

As pesquisas sobre resiliência, segundo Oliveira (2012), partem do conceito de

“desenvolvimento humano” e de “indivíduo em desenvolvimento”, elegendo a criança

como seu principal alvo de investimento pelo revestimento de direitos em suas

conexões com a tolerância, cultura de paz e voluntariado, por meio de programas de paz

e programas de pacificação. O PROERD se encaixa como um desses programas, o qual

o foco é na educação para a resiliência.

A NFIA é uma organização sem fins lucrativos fundada em Atlanta, Georgia, em

1977. Segundo o site, essa organização obteve as primeiras leis estaduais dos Estados

Unidos da América proibindo a venda de “parafernálias de drogas” e liderou um esforço

nacional para ajudar pais a replicar as leis da Georgia em outros estados para impedir a

comercialização de drogas e seu uso por crianças, além de organizar grupos de pais para

“proteger a saúde das crianças”.

Durante as décadas de 1980 e 1990, a NFIA

publicou o Drug Abuse Update, uma publicação trimestral que destacou

pesquisas científicas sobre álcool, tabaco e outras drogas, seu impacto no

cérebro e no corpo, e o trabalho feito por todos os segmentos da sociedade

para reduzir o uso de drogas, abuso, vício e outros comportamentos de alto

risco25

.

Alguns dos programas desenvolvidos pela NFIA estão o Club HERO aplicado a

alunos da 6ª série de escolas na cidade de Atlanta, para combater a “epidemia de crack”;

e o Addiction Studies Program for Journalists, cujo objetivo é fornecer uma

compreensão básica da ciência que subjaz ao abuso e dependência de drogas para ajudar

jornalistas a escrever mais histórias cientificamente precisas sobre drogas, e ajudar os

legisladores e administradores do poder executivo a implementar políticas de drogas

mais eficazes em seus estados.

25

Disponível em: https://www.nationalfamilies.org/about.html. Acesso em: 14/04/2018.

.

143

Em 2003, a organização criou o Parent Corps um network de pais para prevenir

o uso de tabaco, álcool e drogas ilegais por crianças e jovens. Modelado com os

mesmos princípios do Peace Corps26

, ele recruta, treina, certifica e paga salários aos

“Líderes Pais” durante dois anos de serviço. Os “Líderes Pais” fornecem educação, à

outros pais, sobre drogas e prevenção e uma rede de pares que os país “em sua missão

de manter seus filhos saudáveis e livres de drogas”27

. A última atualização no site do

Parent Corps sobre eventos é de 2006, quando havia um total de oito mil pais membros

e seis mil jovens membros.

Dando início às lições do Livro dos Pais, a primeira é formada por duas

atividades. Assim como os livros dos alunos, não há gabarito. Uma atividade de

“Verdadeiro ou Falso” com catorze afirmativas, sendo elas:

1) Qualquer pessoa que esteja criando uma criança é considerada pai ou mãe.

2) Drogas é qualquer substância que possa alterar o cérebro e causar

dependência.

3) A violência está geralmente associada somente às gangues.

4) Evitar o uso de drogas ou a violência antes que comecem chama-se

prevenção.

5) O tratamento é usado para ajudar as pessoas que não conseguem parar de usar

drogas por si sós.

6) Evitar o uso de drogas ou a violência antes que inicie chama-se intervenção.

26

Agência Federal independente criada, em 1961, pelo então presidente dos EUA John F. Kennedy.

27

Disponível em: http://parentcorps.org/what.php. Acesso em: 14/04/2018.

144

7) Fatores de risco são condições que colocam a criança em risco de uso de

drogas e de comportamento violento.

8) Fatores de proteção protegem a criança do uso de drogas e de comportamento

violento apesar da possível existência de fatores de risco.

9) O menor número de usuários de drogas nos Estados Unidos está entre os

americanos brancos.

10) Setenta por cento dos usuários de drogas têm emprego fixo.

11) A pesquisa mostra que não há nada que os pais possam fazer para evitar a

pressão de grupo.

12) Pais que incentivam os filhos a saírem-se bem na escola colocam pressão

demais nos filhos.

13) Pais que trabalham fora têm filhos que correm risco de usar drogas e de ter

comportamento violento e não há nada que possam fazer quanto a isto.

14) O acesso a armas e drogas torna os adolescentes mais sujeitos a se

envolverem em atividades violentas.

A segunda atividade apresenta catorze afirmações cujos pais vão analisar se

consideram condição de risco, assinalando com a letra “R”, ou se considera um fator de

prevenção, assinalando com a letra “P”. As afirmações são:

1) Os pais desenvolvem fortes vínculos com os filhos.

2) Pouco ou nenhum monitoramento das amizades do(s) filho(s).

3) Permissividade dos pais: jovens que têm permissão para beber e/ou usar

outras drogas em casa.

4) Jovens soltos, sem supervisão, após o horário escolar.

145

5) Relacionamento fraco entre o jovem e o pai ou a mãe que não usa drogas.

6) Estilo de paternidade amável e sem críticas ao invés de excessivamente

autoritário ou excessivamente permissivo.

7) A família têm expectativas claras de comportamento e das consequências

quando as regras não são seguidas.

8) A família valoriza e incentiva a educação escolar.

9) Uso de drogas na família.

10) O pai ou a mãe envolve o jovem em seu uso de drogas.

11) Bom relacionamento entre o jovem e o pai ou a mãe que usa drogas.

12) Pais e filhos passam um bom tempo interagindo como uma família unida.

13) Lar acolhedor e protetor, que oferece uma sensação de segurança.

14) Ausência de regras claras de comportamento e das consequências quando as

regras não forem seguidas.

Diferente dos livros destinados aos estudantes, o Livro dos Pais se utiliza de

duas lições (2 e 3) para apresentar as diferentes substâncias psicoativas, como álcool,

drogas de clubes (ecstasy, GHB, Rohypnol, Cetamina, Anfetamina, LSD), tabaco,

maconha, inalantes, heroína e cocaína. Apresenta, para cada uma dessas substâncias,

fatos, efeitos imediatos e possíveis efeitos a longo preso no organismo.

E assim, justifica com “riscos e perigos”, relacionados ou consumo, o

proibicionismo, citando o Estatuto da Criança e o Adolescente, Art. 243 da Lei Federal

nº 8.069/90:

Vender, fornecer ainda que gratuitamente, ministrar ou entregar, de qualquer

forma, a criança ou adolescente, sem justa causa, produtos cujos

componentes, possam causar dependência física ou osíquica, ainda que por

utilização indevida:

146

Pena – detenção de seis meses a dois anos, e multa, se o fato não constitui

crime mais grave.

Mas antes de falar propriamente sobre as substâncias, o livro apresenta uma lista

com sinais e sintomas do uso de drogas para os pais observarem nos filhos, como: “uma

mudança repentina no círculo de amigos de seu filho”; “comportamento evasivo e/ou

mentira”; “capacidade de manipulação: ao invés de assumir responsabilidade pelas suas

ações e comportamentos, o jovem inventa desculpas para fracassos pessoais, a culpa

sempre é de outra pessoa”; “uma perceptível falta de disciplina”; extremos monetários:

posse de quantia excessiva de dinheiro e constantes queixas de falta de dinheiro”;

“atitude hostil ou argumentativa”.

Também apresenta indicadores físicos e ambientais do consumo de substâncias,

entre eles: “aparência física relaxada”; “fadiga crônica, falta de energia e vitalidade”;

“perda de memória recente”; “problema com os olhos: olhos vermelhos, pupilas

dilatadas, pálpebras caídas, movimentos oculares imprecisos”; “problemas com a

coordenação: surtos de tontura, tropeços, mãos trêmulas”; “pôsteres, pinturas ou

desenhos relacionados às drogas ou ao álcool”; “revistas que façam apologia às drogas”;

“incenso ou desodorizantes que mascaram o cheiro de drogas”; “uso de óculos escuros

em horários inadequados”, etc.

A lição quatro intitulada “Como Ajudar seus Filhos a Lidarem com as Pressões”

consiste em como supervisionar o seu filho, sempre estão ciente de “onde seus filhos

estão”, “com quem seus filhos estão” e “o que seus filhos estão fazendo”. E apresenta

“fatos” sobre a supervisão, como por exemplo: “Crianças e jovens que passam a maior

parte do seu tempo sem supervisão são muito mais suscetíveis ao uso de drogas lícitas e

ilícitas”, “O risco é menor quando os filhos passam a maior parte do tempo com os pais

ou com adultos responsáveis”, “Os pais precisam se certificar de que aquilo que os

147

filhos fazem longe de casa estaja de acordo com as regras e os valores familiares”, entre

outros.

A quinta e última lição foca em violência, “Protegendo seus Filhos da

Violência”, e está dividido em três partes. A primeira lista onze estratégias para proteger

os filhos da violência, entre elas: “Certifiquem-se de que seus filhos estejam

supervisionados”; “Envolva seu(sua) filho(a) em atividades extra-curriculares

positivas”; “Estejam alertas para sinais de perigos”, essa fazendo referência aos já

listados sinais de lições anteriores.

A segunda parte da lição cinco é uma lista de “técnicas de resistência”, com dez

tópicos, entre os quais: “Ensinem seus filhos a falar de maneira clara e confiante”

(também uma técnica apresentada aos alunos de 5º e 7º anos do Ensino Fundamental,

pelos Policiais PROERD); “Discutam a firmeza e expliquem a diferença entre o

comportamento agressivo e o firme (uma reação agressiva irá provocar brigas, enquanto

que uma reação firme é calma e confiante)”; “Ensinem ao(à) seu(sua) filho(a) que pode

correr e buscar ajuda se sentir-se ameaçado”. E a terceira parte da lição uma atividade

de dramatização de resolução de conflitos. Por último temos a Canção PROERD, assim

como no livro do aluno do 5º ano do Ensino Fundamental.

Avalição do PROERD

Apesar do Programa Educacional de Resistência às Drogas e a Violência

(PROERD) ter uma atuação há mais de vinte anos no Brasil, observa-se que, assim

como outros programas e políticas de prevenção, não há real impacto social e as

avaliações não verificam mudanças qualitativas na população (Pereira; Tavares, 2017).

148

Pouco se fala em avaliação do programa tanto “sobre seus resultados em relação

às atitudes de resistência à pressão dos colegas para o uso de drogas, referentes aos

alunos que receberam a sua instrução, ou mesmo a eficiência do programa quanto ao

emprego correto dos métodos e aplicação adequada do currículo perante a população

alvo” (Idem: 37).

Contudo, na Revista de comemoração dos vinte anos de PROERD é apresentada

uma pesquisa que comprovaria a eficácia do programa, realizada em 2003 pelo Grupo

Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas (Grea), do Departamento e Instituto de

Psiquiatria do Hospital das Clínicas, da Faculdade de Medicina da Universidade de São

Paulo, sob a coordenação da Dr. Sueli de Queiroz.

Foram realizadas 1638 entrevistas, divididas em duas amostras: 1) amostra

primária, com 555 alunos de escolas públicas e 561 alunos de escolas particulares, todos

participantes do PROERD; e 2) amostra de controle, com 277 alunos de escolas

públicas e 245 de escolas particulares que não participaram do programa.

Algumas das perguntas que apontam para o “sucesso” do programa são:

Outras perguntas incluem:

Excelente Bom Ruim Excelente Bom Ruim

82% 17% 4% 85% 14% 4%

88% 12% 2% 83% 9% 1%O que os pais acharam de o(a) instrutor(a)

do PROERD ser um(a) policial?

O que achou do PROERD?

Público Particular

89% 14% 2% 85% 10% 1%O que achou de o instrutor do PROERD ser

um policial?

Que nota de 0 a 10 você dá ao PROERD?

6 1%

7 2%

8 4%

9 12%

10 79%

149

Segundo a revista, o programa é visto pelos pais como um aliado, pois permite

que o tema das drogas entre nas discussões familiares, reforça o conhecimento dos pais

Sim Não

Pública 15% 39%

Particular 8% 23%

Pública 17% 31%

Particular 2% 17% 81%

Amostra Primaria

Amostra Controle

Não tive amigos que usassem

Você já perdeu algum amigo por causa de drogas?

58%

46%

52%

Pública Particular Pública Particular

Curiosidade 50% 39% 45% 36%

Faz esquecer os problemas 17% 22% 49% 54%

Porque os amigos pressionam 15% 25% 19% 20%

Cosegue ser aceito na turma 5% 8% 5% 10%

É bom/Dizem que é bom 4% 3% 8% 7%

Para não perder os amigos 5% 9% 5% 6%

Se sente livre 5% 4% 0% 6%

Chamar a atenção dos pais 3% 2% 4% 0%

Amostra Controle

Qual é a principal causa que leva o jovem a

experimentar drogas?

Amostra Primaria

Pública Particular Pública Particular

Favela 71% 71% 71% 79%

Na rua 13% 18% 12% 16%

Bar 9% 10% 10% 10%

Escola 8% 6% 9% 5%

Onde você acho que a droga é mais vendida?

Amostra Primaria Amostra Controle

Pública Particular Pública Particular

Sim 1% 2% 2% 2%

Não 98% 98% 97% 98%

Amostra Primaria Amostra Controle

Você continua usando drogas?

Pública Particular Pública Particular

Muito 41% 56% 30% 42%

Pouco 43% 39% 45% 53%

Nada 15% 5% 25% 4%

Quanto você sabe sobre o assunto?

Amostra Primaria Amostra Controle

150

e dos filhos e fornece elementos para que se sintam fortalecidos em sua argumentação

com os filhos. Os professores também enxergam o programa como um aliado capaz de

provocar mudanças positivas no comportamento das crianças (PMSP, 2013: 78-79).

Abaixo duas opiniões de mães de alunos:

“Ele diz aos irmãos que não pode aceitar balas de estranhos porque pode ser

drogas e depois não consegue ir à escola, só vai ficar no canto, não consegue

praticar esportes.”

“A gente já tá discutindo mais porque até então a gente tinha medo, eu acho

que a preocupação era tanta do filho não trilhar esse caminho que a gente

procurava manter aquilo em segredo. Agora a gente já está podendo falar

abertamente. Porque eles aprendem uma parte e nós como pais aprendemos

bastante” (PMSP, 2013:78).

Alguns exemplos de opinião de coordenadores de escolas particulares:

“Eu acho que vindo uma pessoa de fora as crianças se interessam ainda mais.

Não é que a gente não possa dar a informação, mas o policial vivencia isso,

ele tem muito da vivência dele para passar para os alunos, porque os alunos

fazem perguntas ao policial que a gente não poderia responder... Eles

perguntam: como é uma gangue? Como reagir quando pegar alguém

drogado?”

“A princípio eu achei muito diferente, antes de começarem as aulas, fiquei

pensando: eu acho que isso não vai dar certo porque policial tem uma

conduta diferente (trabalha com marginais), não vai dar certo trabalhar com

crianças... Eu acredito que seja um pouco de preconceito da minha parte... Eu

acreditava que os termos que eles usariam em sala de aula, o vocabulário, não

seriam adequados para as crianças. Não pensei que o trabalho fosse como

foi...”

“Eu tive um aluno que disse que conseguiu fazer a mamãe parar de fumar...”

“Eu acho que os alunos começaram a valorizar os pontos positivos das

pessoas... Começaram a valorizar mais e não ficar tirando sarro do amiguinho

que às vezes tem diferenças... Havia um aluno que tinha um problema físico,

e eles começaram a ver o aluno de outro jeito, a querer ajudar, ao invés de

ficar criticando” (PMSP, 2013: 79).

Além disso, professores e orientadores pesquisados também acreditam que o

PROERD ajuda na reconstrução da imagem da Polícia Militar por estarem próximos das

crianças e jovens e realizando seu trabalho de forma empática (Idem: 80).

Segundo a pesquisa citada pela revista, existiriam diferenças significativas entre

crianças que participam do PROERD e as que não participam, sendo alguns aspectos da

eficácia do programa: 1) as crianças citam mais sentimentos positivos do que negativos;

2) as crianças da amostra primária sentem-se mais animadas, confiantes e agitadas do

151

que as da amostra controle; 3) crianças participantes do programa, sejam de escola

pública ou particular, apresentam o mesmo humor; e 4) os sentimentos citados pela

amostra de controle apresentam características negativas, como solidão e preguiça.

Apesar desses números aparentemente positivos a realidade de encarceramentos

conta outra história. Com a Lei de Drogas de 2006, o encarceramento relacionado a

substâncias psicoativas cresceu, e isso se reflete também no encarceramento de jovens.

Segundo o boletim estatístico da Fundação Casa, em 2015, 39,34% dos jovens que se

encontravam nesta instituição foram presos por tráfico de drogas e 0,14% por porte ou

uso de drogas, em ambos os casos a maior incidência era entre jovens de 16 e 17 anos.

Em 2018, o encarceramento por tráfico é de 45,70% e 0,02% por porte ou uso de

drogas, novamente com maior incidência entre jovens de 16 e 17 anos.

Os encarceramentos registrados por uso são insignificantes. Contudo, essa

diferenciação, entre usuário e traficante, que consta na Lei de Drogas é uma definição

imprecisa, além de não ser exigido provas que comprovem que determinada pessoa é

traficante, basta ser flagrado com uma determinada quantidade para ser denominada

como tal. Portanto, as estatísticas de tráfico e uso se confundem porque as infrações

cometidas ainda são governadas pela noção de “menor”.

Segundo Nevison Amorim Pereira e Marcelo Tavares, o DARE é o programa de

prevenção mais utilizado nas escolas estadunidenses e canadenses parecendo ser mais

efetivo que outros por impactar as mudanças comportamentais, reforçando a intensão

dos estudantes de não usar substâncias psicoativas. Chegou-se a essa conclusão com

uma pesquisa em seis escolas canadenses onde os alunos “expressaram claramente a

intenção de não usar drogas como consequência do programa” (Pereira; Tavares, 2017:

40).

152

Contudo, os mesmos autores afirmam que o programa por si só não reduz o

consumo de substâncias psicoativas e as influências externas são mais determinantes

que um programa, sendo assim, seu objetivo seria o de reforçar “mensagens positivas”

que se iniciam em casa e na escola e continuam na comunidade, na mídia, no marketing

social do governo e políticas antidrogas que afirmam a prevenção.

Entretanto, permanece inalterado para o caso de usuários de drogas pobres.

Assim o PROERD funciona como um complemento para definir que a culpa pelo uso

de drogas é do usuário porque ele sabe, racionalmente, que não deve usar e, portanto,

reconhece positivamente todas as penalidades a que ele estará disposto. De modo

semelhante, justifica o programa como parte dos esclarecimento sobre os devidos

valores morais a serem introjetados.

Prevenção nas Escolas

Na década de 1990, o Estado promoveu diversos encontros, seminários e fóruns

sobre a questão das drogas (Corrêa, 2002: 168). Segundo Guilherme Corrêa, a larga

contaminação de AIDS entre usuários de drogas injetáveis ocasiona uma mudança da

estratégia de controle da AIDS para “o emprego de estratégias de prevenção integral

tendo como coluna mestra a prevenção ao uso indevido de drogas” (Ibidem). Para lidar

com essa questão foram publicadas cartilhas, fitas de vídeo e promovido vários cursos.

Essas medidas eram empregadas às populações consideradas de risco, como por

exemplo, profissionais do sexo, jovens socialmente marginalizados, presidiários,

populações de rua e usuários de drogas.

Contudo, essas medidas são de recuperação do dependente, que é considerado

como doente, reinserindo o sujeito pela via da reconstrução familiar, passando a

153

estabelecer laços familiares, onde as instituições formais passam a atuar por meio de

assistência à saúde, educação e serviço social. Observa-se, então, que o isolamento

social, característica dos grupos de risco, impede a intervenção preventiva, para

atuações desse tipo é preciso reestabelecer vínculos sociais, “num crescente que vai da

família à escola, aos grupos de ajuda e à rede formal de assistência” (Idem: 170).

Assim, cria-se uma necessidade de novas formas de atuação que se somam à

repressão policial; o Estado passa a procurar alternativas direcionadas à prevenção do

consumo de substâncias psicoativas (Pereira; Tavares, 2017: 36).

Desde o século XVIII, o Estado é encarregado de garantir a saúde física dos

cidadãos, porém isso significava assegurar a força física nacional, sua capacidade de

trabalho e de produção, bem como de defesa e ataques militares. Com a elaboração do

Plano Beveridge, em 1948,

a saúde se transforma em objeto de preocupação dos Estados, não

basicamente para eles mesmos, senão, para os indivíduos, o direito do

homem a manter seu corpo em boa saúde se converte em objeto da própria

ação do Estado. Por conseguinte, se invertem os termos: o conceito de

indivíduo em boa saúde para o Estado é substituído pelo de Estado para o

indivíduo em boa saúde (Foucault, 2010: 168).

No entanto não se trata apenas de uma inversão do direito, mas do que Foucault

chama de uma moral do corpo. No século XIX, o conceito de limpeza, de higiene como

limpeza, ocupa um lugar central nessas morais sobre a saúde do corpo, que foi

enfatizada com publicações que colocam a limpeza como requisito para ter boa saúde,

tanto ao indivíduo quanto àqueles que o rodeiam. E a saúde é necessária para trabalhar

para sustentar os filhos e como forma de assegurar o trabalho social e a produção.

Segundo Salete de Oliveira, “a higienização da moral pública corresponde a

assepsia da população” (2001: 89), no qual há de se descobrir o anormal para

154

normalizá-lo e transformá-lo no normal. A normalização se torna dispositivo de

prevenção geral.

Este controle disciplinar democrático, intrínseco ao dispositivo panóptico,

entendendo-se que o dispositivo ultrapassa o território da prisão intramuros,

assume no Plano Beveridge um tom de dispositivo democrático universal,

redimensionando o tribunal do mundo em torno de uma das procedências da

sociedade de controle. Trata-se do limiar tênue que vai se despedindo da

sociedade disciplinar e levanta os vestígios do que viria a ser o longo aceno

de um novo espaço, o controle como promoção da seguridade sob a égide

democrática e o prenúncio da edificação do controle da segurança (Idem:

131).

Com o Plano Beveridge, a saúde entra no campo da macroeconomia. As

condições que permitem assegurar a saúde dos indivíduos convertem-se em uma fonte

de despesas, situando-se no orçamento do Estado. E ao garantir a todas as pessoas as

mesmas possibilidades de se tratar, pretendia-se corrigir em parte a desigualdade de

rendimentos. Segundo Foucault, a saúde, a doença e o corpo começam a ter suas bases

de socialização e se convertem em um instrumento de socialização dos indivíduos.

Acrescenta Oliveira que, a saúde, a doença e o corpo são convertidos em instrumento da

socialização dos indivíduos, tornando a saúde objeto de uma verdadeira luta política

(Ibidem: 133).

Portanto, nos anos de 1940, ocorreu a formulação de um novo direito, uma nova

moral, uma nova economia, uma nova política do corpo; em que o corpo do indivíduo

se torna um dos principais objetos de intervenção do Estado, um dos objetos de que o

Estado deve se encarregar. Com isso há o surgimento de uma somatocracia.

Segundo Foucault (2010), surge uma nova dimensão das possibilidades médicas

que ele chamou de questão da bio-história. O médico e o biólogo deixam de trabalhar no

nível do indivíduo e passam a trabalhar no nível da própria vida e de suas ocorrências

fundamentais. O não-saber deixou de ser um perigo e o perigo está no próprio saber.

Essa é uma das características fundamentais da crise da medicina.

155

Uma característica da medicina moderna é o que Foucault chamou de

“medicalização” indefinida. No século XX, a medicina começou a funcionar fora do seu

domínio tradicional, definido pela demanda do doente. A medicina atual vai além,

impondo-se ao indivíduo, doente ou não, como ato de autoridade, por exemplo,

ninguém é contratado sem o veredito do médico, “que examina autoritariamente o

indivíduo”; ou a submissão ao exame de um perito psiquiatra quando uma pessoa

comete um delito a ser julgado por um tribunal.

Porém, a introdução da saúde no sistema de consumo não aumentou o nível de

saúde. Enquanto o nível de vida se define pelo consumo dos indivíduos, o nível de

saúde não melhora com o aumento no consumo médico. As variações do meio, como o

consumo de alimentos, a educação e a renda, são fatores que influenciam mais do que o

consumo médico. Portanto, por não estar em relação direta, é possível identificar um

paradoxo econômico, onde o crescimento de consumo não acompanha qualquer

fenômeno positivo do lado da saúde (Foucault, 2010: 185-188).

A escola é o lugar, por excelência, da disciplina. Serve para ensinar a obedecer e

seguir às regras, e transmite conhecimentos determinados pelo Estado, uma vez que este

detêm o monopólio da educação; atualmente, por meio das diretrizes estabelecidas nos

Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). E num tempo nem tão longínquo, para obter

os resultados esperados, disponha de castigos físicos. O professor era uma autoridade do

conhecimento e autoridade moral, a ser amada e temida (Augusto, 2011: 120).

A escola ocupa um lugar na sociedade que é inquestionável. Praticamente todos

passam por ela durante a infância e adolescência, se tornando uma experiência

inevitável. Segundo Acácio Augusto, a escola deixou de ser o lugar de uma etapa

necessária ao desenvolvimento, “estabelecido pelos pais, sob o controle do Estado, para

uma educação de conhecimento regulada por pedagogos e psicólogos”, e se tornou um

156

lugar de convívio, “onde se estuda, se desfruta de lazer e se decidem coisas da vida

entre os habitantes do local” (Augusto, 2011: 118).

Segundo Foucault (2012), a partir do século XVII, as disciplinas foram se

tornando fórmulas gerais de dominação, organizando o espaço através de uma

repartição dos indivíduos, controlando as atividades através do controle do tempo,

generaliza[ndo] o indivíduo através de uma vigilância hierárquica, organiza[ndo] as

diferenças através da normalização e produz[indo] e reproduz[indo o] saber através do

exame. Muitas vezes a disciplina exige a cerca:

“Colégio: o modelo de convento se impõe pouco a pouco; o internato aparece

como o regime de educação senão o mais frequente, pelo menos o mais

perfeito; torna-se obrigatório em Louis-le-Grand quando, depois da partida

dos jesuítas, fez-se um colégio-modelo” (Foucault, 2012: 137).

Além do “encarceramento”, a organização de um espaço serial determina lugares

individuais que tornou possível o controle de cada um e o trabalho simultâneo de todos,

fazendo o espaço escolar funcionar como uma “máquina de ensinar”, mas também de

vigiar, de hierarquizar e de recompensar.

As disciplinas, organizando as “celas”, os “lugares” e as “fileiras” criam

espaços complexos: ao mesmo tempo arquiteturais, funcionais e hierárquicos.

São espaços que realizam a fixação e permitem a circulação; recortam

segmentos individuais e estabelecem ligações operatórias; marcam lugares e

indicam valores; garantem a obediência dos indivíduos, mas também uma

melhor economia do tempo e dos gestos. São espaços mistos: reais pois que

regem a disposição de edifícios, de salas, de móveis, mas ideais, pois

projetam-se sobre essa organização caracterizações, estimativas, hierarquias

(Foucault, 2012: 142-143).

Esse espaço escolar vai sempre adquirindo novos propósitos, sem deixar de ser

lugar onde se aprende conhecimentos e obediência, mas na tentativa de tornar esse

espaço mais atraente aos jovens e “melhor” para a comunidade, vai ampliando as

funções do espaço escolar, e de autoridades, pois além do professor, também ocupam

este lugar. Mesmo sem deixar de lado os aspectos repressivos, as disciplinas garantem

positividades nas relações de poder, ajustando utilidade e docilidade.

157

Um dos problemas tratados como principal está o consumo de drogas por

crianças e adolescentes, associado à violência. Contudo,

a escola fecha os olhos para o uso cotidiano de medicamentos prescritos,

segundo diagnósticos feitos a partir do desempenho escolar ou com base na

identificação de transtornos que interferem no rendimento do aluno ou na

convivência com os outros colegas (Augusto, 2011: 123).

A preocupação em torno do consumo de drogas ilícitas, entre crianças e jovens,

resulta em diversos programas e ações extracurriculares desenvolvidos e realizados por

ONGs, institutos e fundações que atuam dentro e fora das escolas. A questão das drogas

entra nos Temas Transversais dos PCNs, mais especificamente em Saúde.

A inclusão de temas transversais nos PCNs é resultado de uma demanda atual

que considera as áreas convencionais, como Língua Portuguesa, Matemática, Ciências,

História e Geografia, insuficientes na construção de uma consciência cidadã. Julio

Groppa Aquino, em seu artigo A escola e as novas demandas sociais: as drogas como

tema transversal, aponta duas críticas à hegemonia dos temas clássicos no ensino

tradicional:

em primeiro lugar, eles parecem não espelhar necessidades concretas, uma

vez que não se aproximam, em sua gênese, das demandas da vida cotidiana, e

nem visam aplicabilidade a esta; em segundo lugar, não se pode dizer que

seus gestores espelhavam as necessidades da maioria, já que a elite grega era

segregacionista e hierarquizada, portanto não democrática (pelo menos como

concebemos hoje a noção de democracia atrelada ao princípio da maioria)

(Aquino, 1998: 100).

Segundo os PCNs, o objetivo da educação para a saúde é promover a

conscientização dos alunos para o direito a saúde, capacitando-os para a promoção,

proteção e recuperação da saúde ao seu alcance. E espera-se que sejam capazes de:

compreender saúde como direito de cidadania, valorizando as ações voltadas para

sua promoção, proteção e recuperação;

compreender a saúde nos seus aspectos físico, psíquico e social como uma

dimensão essencial do crescimento e desenvolvimento do ser humano;

158

compreender que a saúde é produzida nas relações com o meio físico, econômico

e sociocultural, identificando fatores de risco à saúde pessoal e coletiva presentes

no meio em que vive;

conhecer e utilizar formas de intervenção sobre os fatores desfavoráveis à saúde

presentes na realidade em que vive, agindo com responsabilidade em relação à

sua saúde e à saúde coletiva;

conhecer os recursos da comunidade voltados para a promoção, proteção e

recuperação da saúde, em especial os serviços de saúde;

responsabilizar-se pessoalmente pela própria saúde, adotando hábitos de

autocuidado, respeitando as possibilidades e limites do próprio corpo (Brasil,

1997: 269).

Vemos, então, uma transformação da escola, onde temas para além das matérias

tradicionais, como ética, saúde, orientação sexual, meio ambiente, etc. entram na

convivência escolar por se tratar de questões sociais que “visam, sobretudo, a

instrumentalização para o exercício ativo da cidadania num contexto social democrático

– o que pode e deve ser tomado como objeto precípuo da intervenção escolar” (Aquino,

1998: 100).

O documento reconhece que as medidas adotadas para tratar a questão das

drogas como a guerra às drogas e a repressão à comercialização e ao consumo, não tem

produzido efeito no sentido da abstinência, só situa a questão como caso de polícia; e

que o “fenômeno moderno das drogas” é produto da “vida em sociedade, das rupturas

nas relações afetivas e sociais e da desproteção de seus membros” (Brasil, 1997: 271).

Além disso, afirma que o uso de substâncias psicoativas não é algo novo na

sociedade e não há evidências de que deixará de acontecer. Portanto, o que se

caracteriza como “questão das drogas” é a falta de controle ao acesso – quem acessa,

como acessa, por que acessa – que, segundo os PCNs, constitui um problema sanitário.

Para desenvolver uma educação para a saúde, os parâmetros apontam para um

trabalho pedagógico em que o foco seja as “condições necessárias” para a saúde, sua

valorização e a realização de procedimentos que a favorecem por meio de um aumento

progressivo da profundidade dos conteúdos informativos e conceituais, e também as

159

relações entre a escola, a família e a comunidade (instituições, grupos organizados) para

contextualizar a educação para a saúde (Brasil, 1997).

Os conteúdos apresentados nos PCNs são divididos em “Autoconhecimento para

o autocuidado” e “Vida coletiva”. No primeiro, considera-se a importância de sujeitos

com “autonomia, liberdade e capacidade para regular as variações que aparecem no

organismo e que se apropriem dos meios para tomar medidas práticas de autocuidado

em geral e, especificamente, diante de situações de risco” (Brasil, 1997: 275). Para isso,

os conteúdos essenciais seriam: a construção da identidade e da autoestima, o cuidado

do corpo, a nutrição, a valorização dos vínculos afetivos e a negociação de

comportamentos para o convívio social. E no segundo, a vida social ganha destaque

pois é nela que se afirma a concepção de hegemônica de saúde, sendo nesse campo “que

se pode avançar no entendimento da saúde como valor, na luta pela vida e pela

qualidade de vida” (Idem: 279). Os conteúdos desse bloco estão referenciados nas

correlações entre organização sociopolítica e padrões de saúde coletiva, como por

exemplo indicadores de qualidade de vida e saúde, correlações entre meio ambiente e

saúde, doenças transmissíveis, riscos por acidentes e uso indevido de drogas, assim

como relações sociais, acordos e limites (Idem).

Essas medidas trata o problema das drogas de

forma estendida e continuada, operando segundo as utopias de paz,

tolerância, segurança e proteção que devem ser construídas e produzidas com

o envolvimento dos pais e da comunidade em torno das escolas, num fluxo

que envolve governo e sociedade civil em escolas estatais e privadas

(Augusto, 2011: 124).

Os objetivos desses programas pedagógicos seriam promover um ambiente

escolar saudável e seguro, por meio da prevenção de conflitos, da valorização do papel

pedagógico da equipe que constitui os programas e da participação dos alunos e na sua

160

integração na escola e na comunidade. O fato de esses programas acontecerem dentro da

escola, afirma a escolar como espaço privilegiado para a construção da cidadania.

A questão das drogas é abordada por meio de quatro pontos fundamentais:

erradicação das culturas, supressão do tráfico internacional, repressão do comércio

clandestino nos territórios nacionais e programas de prevenção. Por isso, esses

programas de prevenção são direcionados as crianças, e não à toa o PROERD é

realizado na escola com autorização e participação dos pais.

A educação na infância é percebida como um projeto em execução cujo

resultado satisfatório depende de vigilância permanente, cuidado, planejamento, táticas

e técnicas. O programa reflete esse ideal de educação e de infância “da aposta na

garantia de um futuro cidadão, honesto, prudente, resolvido, ou seja, que não venha a se

configurar como alguém que posteriormente possa vir a ser perseguido pela polícia”

(Rateke, 2006: 87).

Segundo Deise Rateke,

em geral, os jovens e as crianças são identificados como uma caixa vazia, um

lugar onde o educador e a educadora depositam um número enorme de

ensinamentos e que, somente não serão tudo aquilo que lhes foi transmitido,

se não quiserem ou se não tiverem a força necessária para assimilar e

proteger-se das “forças más”. Nessa associação a estados inferiores do

desenvolvimento, pode também ser apontado o fato de que em momento

algum, lhes é perguntado sobre os seus interesses em participarem ou não, de

um Programa, de uma determinada proposta educacional. Sua opinião a

respeito do que pensam não é salutar e indica que está estabelecida a idéia de

uma carência ou da incapacidade para distinguir ou saber cuidar de si para ter

o controle sobre si mesmo (Idem: 88).

Segundo Nevison Amorim Pereira e Marcelo Tavares (2017), alguns estudiosos

consideram o ambiente escolar apropriado para o desenvolvimento de estratégias

preventivas contra o uso indevido de drogas. Neide A. Zanelatto e Raquel Zanelatto

afirmam que “a família e a escola são ressaltadas como os dois estruturadores básicos da

identidade do jovem, sendo locais ideais para iniciar ações preventivas” (2004, 1).

161

A escola está inserida em um ampla contexto e delimitada pelo que é produzido

e reproduzido na sociedade, tendo também o papel de definir o sujeito, “seja por meio

das relações de poder que circulam no espaço escolar, seja na forma pela qual concebe a

aprendizagem e transmite o saber” (Rateke, 2006: 90), contribuindo efetivamente na

construção de certas subjetividades.

Uma das características do PROERD é a mobilização da comunidade local em

torno do tema. O programa ressalta que não se trata apenas de um projeto da Polícia

Militar, para garantir a eficácia dos seus resultados é preciso garantir que ele seja uma

parceria efetiva entre escola, Polícia Militar e família.

Propõe-se, através da aproximação da polícia com a comunidade, resgatar a

noção de “polícia comunitária” que, segundo o programa, tem papel fundamental na

redução da criminalidade e na melhoria da qualidade de vida da comunidade, sobretudo

nas regiões menos favorecidas dos Municípios.

Como mostrado nos materiais, por meio de atividades de fundo social e

psicológico, o programa trabalha a autoestima das crianças, auxiliando esses estudantes

a reconhecer e resistir às pressões diretas e indiretas que podem influenciar no uso de

drogas lícitas e ilícitas – como álcool, cigarro, maconha, inalantes, dentre outros tipos –

e mesmo a prática de atividades ilegais ou violentas tais como o vandalismo,

envolvimento com tráfico, furtos e roubos.

E o material direcionado aos pais e responsáveis, apresenta temas como:

importância do diálogo com os filhos, fatores de risco associados à juventude, noções

básicas sobre uso de drogas e estágios da dependência, fatores e fontes de pressão para a

utilização de álcool e drogas e para o uso e resolução pacífica de conflitos.

162

Fica claro, portanto, que o PROERD é um programa de caráter social

preventivo. Ele está amparado pela Constituição Federal - uma vez que esta vê na

Polícia a vocação preventiva no combate à criminalidade - aliado à Lei Federal nº

11.343, de agosto de 2006, que regulamenta o SISNAD, Sistema Nacional de Políticas

Públicas sobre Drogas, que sugere, entre outras determinações, a implementação de

políticas de formação continuada para os profissionais de educação nos três níveis de

ensino que abordem da prevenção ao uso indevido de drogas.

Segundo Acácio Augusto, “O tempo das disciplinas nas escolas não passou. Ele

continua, mas hoje, está atravessado por vários fluxos de controles e isto também

modifica a relação com as drogas e a violência” (2011: 127). Anteriormente, os sujeitos

que não se adequavam ao convívio escolar eram expelidos, mas com a democratização

do acesso ao ensino e a flexibilização das práticas disciplinares, se estabelece uma outra

relação da escola com a indisciplina.

Como observado nos Parâmetros Curriculares Nacionais (1997), as práticas

escolares voltam-se para a administração dos conflitos e criando dispositivos de

inclusão para absorver os marginalizados, mas permanecem os castigos e a disposição

dos corpos no espaço. São novas maneiras de intervir, onde “o exercício do castigo não

se faz no momento decisivo de sua aplicação, mas num processo contínuo de avaliação

que visa promover a adesão às condutas e a cumplicidade no exercício e produção das

regras” (Idem: 127).

Isso transparece no Programa Educacional de Resistência às Drogas e a

Violência por meio da formatura que celebra a boa prática da tomada de decisão

positiva. A certificação do programa é para os alunos que cumprirem com os seguintes

requisitos: 1) preencher corretamente livro do estudante; 2) frequentar as aulas; 3)

comportar-se bem durante as aulas, respeitando os combinados PROERD; 4) escrever

163

uma redação sobre sua própria experiência no PROERD, mostrando os novos

conhecimentos para os outros alunos; e 5) manter-se seguro, saudável e responsável.

Com esses alunos será realizada a formatura, onde recebem uma camiseta e um boné

com a logomarca do programa, e o aluno presta o compromisso de resistir às drogas e à

violência diante de familiares e autoridades presentes.

164

Considerações Finais

A ilegalidade de muitas substâncias psicoativas é bastante recente, uma vez que,

há cerca de um século, não existiam grandes repressões à produção, venda e consumo

de tais substâncias, hoje proibidas. Atualmente, o proibicionismo é o padrão mundial na

abordagem do “problema drogas”. Dessa forma, a proibição das drogas se apresenta

como incremento das estratégias de controle social, sendo a sobreposição construída

entre “classe perigosa”, “viciados” e “traficantes” grandes ameaças à moral, à saúde

pública e à segurança pública. [No entanto, se hoje em dia, já há diversas medidas para

a descriminalização da maconha revestidas de cunho médico-farmacológico empresarial

e de medidas que procuram governar o uso por meio de condutas regulamentáveis,

dentre estas não está incluída a população pobre que é ao mesmo tempo alvo de

repressão, educação positiva contra drogas nas escolas, e manancial de recrutamento de

contingente para compor as forças policiais e o tráfico de drogas. Ou, nos termos de

Foucault, a continuidade do exército de reserva de poder.

Com a evolução e disseminação do proibicionismo, alavancado pelos

movimentos puritanos abstêmios, vemos a força e o valor do conceito de drogas hoje,

onde se concebe o consumo em um duplo de opostos: se for medicamento, devidamente

consumido, pode nos salvar; se for entorpecente, parece ser inevitável a degradação,

uma fatalidade.

Uma das principais consequências desse proibicionismo que restringiu o

consumo de substâncias psicoativas ao uso médico é a heteronomia sobre a dor, pois

a maioria das funções exercidas pelos antigos ‘entorpecentes’ teve substituto

na nova farmacopeia lícita: a cocaína como estimulante, diminuidor do

apetite e potencializador da atenção deu lugar às anfetaminas; como

descongestionantes nasal ela deu lugar a benzedrina e como anestésico local

foi substituída pelos fármacos derivados das amino-amidas; o ópio deixou de

ser usado como hipnótico para dar lugar aos barbitúricos e outras substâncias;

como tranquilizante, ele foi substituído pelos ansiolíticos que provocam uma

165

embriaguez passiva de enorme potencial conformista – gerando uma preguiça

indiferente, sem sono ou ampliação da capacidade de reflexão cujos efeitos

são baseados na diminuição do oxigênio enviado ao cérebro (Torcato, 2016:

319).

É possível afirmar que ascensão punitivista em relação a questão das drogas está

intrinsecamente ligada ao domínio do saber-médico, a monopolização do ato terapêutico

e ao acesso à medicamentos pela população[, incluindo a prescrição médica de

calmantes.]

O tráfico escapa e se readéqua as políticas repressivas do proibicionismo,

continuando a produzir psicoativos novos e antigos. Uma razão para manter essa

"guerra às drogas" é a potente tática de controle social e perseguição seletiva que ela

possibilita, tendo em mente que seu objetivo não é "simplesmente, a erradicação de

substâncias específicas e das práticas sociais a ela relacionadas, mas a manutenção de

uma guerra infindável" (Rodrigues, 2008: 102).

Os objetivos finais dessas políticas não estão relacionados com a não utilização

de psicoativos, mas com a forma que os utilizamos. Trata-se da heteronomia em relação

à definição do que será considerado apto para consumo, uma vez que a centralização do

ato terapêutico – ao âmbito médico e subordinado a lógica do capital – cria uma barreira

que impossibilita a criação de uma cultura calcada na autonomia.

E apesar dos movimentos sociais que clamam pela legalização de determinadas

substâncias e a mudança de conceito na legislação, apontada por Torcato, onde as

políticas não são mais “antidrogas”, mas sim “sobre drogas”, trazendo outras

abordagens como prevenção e reinserção social, não é possível afirmar que realmente

passamos por um momento de crise do proibibicionismo. Nenhum desses argumentos

apresentados são novidades, os movimentos sociais já existiam e não foram

inexpressíveis, vide o movimento de contracultura dos anos 1950. E mesmo que não

166

seja possível observar uma mudança conceitual na legislação até então, ações que

buscavam a prevenção já existiam, como as “Band of Hopes”, citadas no capítulo 1, que

eram organizações voltadas para a educação musical, moral e salutar, enfatizando os

perigos do uso do álcool, ensinando as crianças a se abster de bebidas alcoólicas desde

muito jovens para que se tornassem adultos moralmente sadios.

Dentro do contexto do proibicionismo, o papel repressivo da policia é o mais

aparente. Contudo, encontramos no PROERD a polícia como educadora de crianças e

jovens. A polícia entrou na agenda política de muitos governos, tanto em âmbito

internacional quanto nacional. O policiamento tradicional, conhecido como “modelo

profissional”, foi considerado limitado, tornando-se pauta de discussões acadêmicas,

debates sociais e da população, que procuram soluções e reformas nas práticas policiais.

O modelo profissional é visto, atualmente, como colaborador para a relação

negativa entre polícia e população pelo seu caráter militar e suas ações desvinculadas da

percepção da população em relação aos problemas cotidianos. O policiamento

comunitário traz a perspectiva de mudança, na atuação dos policias e no seu papel junto

da comunidade. Reforça a ideia de que o cidadão deve ser coautor nas estratégias de

policiamento, responsável pela segurança de sua comunidade.

Contudo, observa-se não a mudança de perspectiva, que se mantêm obviamente

no controle da criminalidade, mas o acréscimo de uma abordagem mais centrada na

prevenção criminal com foco em ações que atendam a dimensão da interpretação da

população, supondo uma melhor qualidade de vida das pessoas. No site da Diretoria de

Polícia Comunitária e de Direitos Humanos, vemos isso claramente:

é de fundamental importância o entendimento de que os preceitos

doutrinários de Policiamento Comunitário visam o atendimento aos cidadãos

de bem, pois aos infratores da lei e arredios às regras sociais, aplicam-se as

normas e legislação vigente. Ressalta-se que o Policiamento Comunitário não

167

se traduz em forma branda de aplicabilidade legal, mas sim atuação de uma

Polícia voltada à cidadania e essencialmente participativa28

.

A principal ideia que permeia o conceito de polícia comunitária é a aliança entre

polícia e população na prevenção ao crime e na erradicação das pessoas indesejadas a

partir da delação, incentivando a criação de grupos que policiem seus próprios bairros.

Assim, desenvolve-se uma polícia que combina dura repressão e participação

democrática.

A saúde e a segurança – mais a saúde do que a segurança – são apresentadas

como as principais metas do PROERD, indissociáveis da concepção de

desenvolvimento integral da criança, onde a produção de sua própria saúde e segurança

conecta-se ao investimento de uma educação voltada para crianças e jovens resilientes.

Nesse combate do uso e abuso de substâncias psicoativas, um caminho parece

consensual: o da prevenção. Pensando no trágico mundo das drogas com

narcotraficantes violentos, overdoses, acidentes, suicídios, polícia... as ações

preventivas mostram-se indispensáveis, e evoca outra ação indispensável: a

escolarização. Assim, a escola seria o epicentro da educação para uma vida “saudável”

que promova a “vida”:

se levarmos em conta que a instituição escolar configura, atualmente, uma

das práticas sociais que congregam mais intensivamente o impacto das novas

demandas sociais, além de representar um epicentro concreto das vivências

juvenis, torna-se quase impossível supor que as estratégias de prevenção

prescindam da intervenção promovida pela escola (Aquino, 1998: 94).

As crianças e jovens primam pela experimentação de drogas, muitos vezes pelas

experiências designadas ao “mundo adulto”, impregnado pelos usos devidos e indevidos

de substâncias psicoativas. Para reprimir essas experimentações são utilizados métodos

28 Disponinível em: http://www4.policiamilitar.sp.gov.br/unidades/dpcdh/index.php/policia-

comunitaria/. Acesso em: 14/04/2018.

168

moralistas e repressivos que podem – como muitas vezes é o caso – chegar a lugar

nenhum, e não surtir os efeitos esperados. Obtém-se esse resultado “talvez porque

excluam-no, de véspera, de uma vivência mais direta da situação, obstaculizando um

posicionamento mais autônomo perante o fenômeno social das drogas” (Aquino, 1998:

93).

Mas as ações de prevenção, como o próprio PROERD, partem do princípio do

“saber o que não fazer”, que é apresentado como um roteiro de tomada de decisões

consideradas positivas, que não passam de um rodeio podendo ser resumido ao clássico

“DIGA NÃO ÀS DROGAS”. São abordagens que confinam os jovens a uma posição

heterônoma e coercitiva em relação à apropriação de seu próprio corpo e dos prazeres

que ele possa nutrir.

No livro do aluno, a “Mensagem do Policial”, texto introdutório do programa,

coloca a saúde como o principal objetivo, condicionada pelo: autoconhecimento e

autocontrole; tomada de decisão responsável; compreensão dos outros (alteridade);

habilidades de comunicação e relacionamento interpessoal; lidar com desafios e

responsabilidade; que seriam elementos indispensáveis para alcançar o que se propõe:

cultura de paz. Nesse contexto, a definição de saúde está consonante com o seu

redimensionamento pós Segunda Guerra Mundial, quando a saúde passou a ser situada

não como ausência de doença, mas constante presença de bem-estar, ao mesmo tempo

em que vincula bem-estar com o funcionamento integral do indivíduo e da comunidade

ao seu redor.

O trabalho de propor ou de problematizar um possível modo de ver a infância

atrelada à especificidade de um programa educacional da polícia militar contribuiu nas

explicações sobre as marcas que atravessam a sua legitimidade, como um poderoso

fluxo de interferências do Estado na vida privada.

169

Difunde-se o uso de sistemas de aprovação continuada e convocação à

participação dos alunos para a produção de regras escolares, e também se criam

dispositivos capazes de mantê-los próximos para serem constantemente monitorados; e

assim, o problema individual vira solução para todos, tornando o castigo introjetado,

democratizado e compartilhado (Augusto, 2011: 125).

O currículo desse programa, como visto no capítulo 3, é uma tradução das

práticas policialescas estadunidenses, reproduzindo ensinamentos moralistas nas escolas

públicas e particulares, sem ao menos refletir sobre a realidade brasileira. Investimento

de uma educação para a resiliência de crianças e jovens que valoriza a formação,

produção e restauração da melhoria de si e da melhoria dos outros, e objetiva o vínculo

entre tolerância e segurança produzindo nova dimensão à positividade do poder.

Assim, dentro de uma sociedade correta e virtuosa que se vê diante de forças

corruptoras, todos seus bens (propriedades) devem ser defendidos, protegidos e

resguardados, pois a saúde do corpo “significa a sustentação da ordem pública e dos

valores morais, enunciados como padrões verdadeiros e incontornáveis a serem

observados para evitar a degradação dos costumes e das certezas” (Rodrigues, 2004: 1).

O programa idealiza um sujeito que se visa formar através de atributos

pedagógicos, como a Aprendizagem Socioemocional, canções para dizer não às

violências e às drogas, repetição dos exercícios de tomada de decisão. Todo esse

ensinamento doutrinário é incapaz de perceber a vida em seu movimento, centra-se na

idolatria dos bons-costumes (Rateke, 2006: 129) e na convocação das crianças e jovens

a serem delatores como um bom cidadão.

A política como guerra prolongada por outros meios, afirmação de Foucault

invertendo o cânon de Carl von Clausewitz, é mais que uma ilustração dos

desdobramentos do proibicionismo e de suas medidas de repressão e prevenção. Seu

170

discurso repousa no chamado bem público, conectado a moral que se constitui em

normas que se pretendem universais, em um contexto no qual a paz não é entendida

como ausência de guerra, mas como ausência de insegurança. E assim seguem-se as

tentativas de apaziguamento em nome de uma vida saudável, da segurança e de uma

cultura de paz coroadas em qualidade de vida.

171

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