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Políticas públicas locais para o envelhecimento: o caso de Portugal e da Suécia Cristina Maria Oliveira Barbosa UNIFAI – Unidade de Investigação e Formação sobre Adultos e Idosos do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa [email protected]

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Políticas  públicas  locais  para  o  envelhecimento:  o  caso  de  Portugal  e  da  Suécia  

Cristina Maria Oliveira Barbosa UNIFAI – Unidade de Investigação e Formação sobre Adultos e Idosos do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa [email protected]

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Resumo

O envelhecimento demográfico é um fenómeno atual que marca os discursos e a orientação estratégica e política. Surge como um desafio às sociedades, às instituições em geral, ao próprio modelo de organização coletiva e ao modelo de bem-estar. Apresenta-se ainda como um fenómeno que induz à reflexão acerca do papel das pessoas idosas nas sociedades contemporâneas e para o seu estatuto como pessoa e como grupo heterogéneo.

O objetivo geral deste estudo é compreender os conceitos e visão sobre o envelhecimento presentes nas políticas locais e conhecer os modelos de governança local das políticas públicas no domínio do envelhecimento, de Portugal e da Suécia. Tem como objeto empírico de estudo, as políticas locais no âmbito do envelhecimento nos contextos de Portugal e da Suécia.

O estudo realizado é de natureza qualitativa apoiando no exercício de análise, compreensão e perspetivação de estratégias de atuação e tem como amostra empírica, o estudo de caso, em dois contextos, Portugal e Suécia, especificamente e respetivamente Lisboa e Nacka. Nestes contextos foram entrevistados stakeholders cuja atuação (in)direta poderia ter ação e/ou interesse ao nível das políticas públicas locais para o envelhecimento.

A partir da análise realizada pode-se concluir que os modelos públicos locais procuram renovadas lógicas de ação e que nenhuma política é perfeita na sua estruturação, desde o seu planeamento, implementação e avaliação, no entanto, em diversos aspetos são complementares.

Palavras- chave: Teorias psicossociais / políticas de envelhecimento / governança local.

Abstract

Demographic ageing is a phenomenon that marks current discourses, strategies and policies. It’s a challenge to societies, institutions, collective organizations and Welfare-State. It’s a phenomenon that still leads to reflection on the role of older people in contemporary societies and their status as a person and a heterogeneous group.

The general goal of this study is to understand the concept that based ageing local policies, and understand the local governance of ageing public policies, from Portugal and Sweden. This study presents a comparison between ageing local policies and concept about ageing, in Portugal and Sweden.

A qualitative methodology it was followed that supports analysis and understanding of both local ageing policies. The sample are case studies of two contexts, Portugal and Sweden, respectively Lisbon and Nacka, where had been interviewed stakeholders with (in)direct action in local public policies about ageing.

In general it is concluded that local public intervention based their action in different psychosocial theories and there are different concepts and vision about ageing that oriented ageing policies in Portugal and Sweden, however both have a positive concept about ageing and psychosocial related aspects.

Keywords: psychosocial theories of ageing / ageing policies / local governance.

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Introdução

As estatísticas demográficas são concordantes relativamente ao acelerado processo de envelhecimento populacional a que países desenvolvidos e em desenvolvimento estão sujeitos. Portugal segue igualmente esta tendência. O INE (2011), no relatório provisório dos Censos 2011, referindo-se à questão do envelhecimento em Portugal conclui que estamos mais velhos. O fenómeno de duplo envelhecimento da população portuguesa, caracterizado pelo aumento da população idosa e pela redução da população jovem, aumentou nas últimas décadas. Segundo Cravey & Mitra (2011), em todo o mundo, as populações mais velhas estão a aumentar e entre 1950 e 1998, a população mundial acima de 60 anos cresceu 255 milhões. Até o ano 2025, esse número deverá ascender a 1,3 biliões. A maioria, 839 milhões, vai concentrar-se nos países em desenvolvimento e cerca de 500 milhões nos países desenvolvidos.

A perspetiva social face ao envelhecimento é encarada de diferentes formas: uma oportunidade, uma conquista civilizacional e até mesmo como um indicador de desenvolvimento (Harper, 2010). Walker (2002, p.758) afirma que o aumento da longevidade é um indicador de progresso social e económico: um grande triunfo da civilização e, especificamente, da ciência e da política pública sobre as mais prevalentes causas de morte prematura. No entanto, alguns autores e documentos oficiais demonstram uma contínua preocupação face a este aumento exponencial e aos impactos que imprimem nos territórios sociais, referindo-se ao envelhecimento como um problema.

De facto, esta evolução demográfica pode ter um impacto a longo prazo a nível da política social e económica, e por isso, o poder político deve assumi-la como uma questão importante na definição das prioridades e do planeamento estratégico (Audit Commission, 2009). As organizações internacionais e os governos nacionais foram percecionando que a mudança na demografia também exige Estados com uma abordagem mais pró-ativa e inovadora para apoiar o planeamento e desenvolvimento de políticas que favoreçam o redesenho dos modelos organizacionais, que equilibrem os desiquilíbrios sociais e políticas inerentes a uma sociedade envelhecida (Bell, 2005; Blanco, s.d.).

Neste quadro, o poder local e os atores locais e regionais apresentam-se como atores-chave na capitalização de oportunidades para o envelhecimento ativo e para a promoção da solidariedade entre gerações. Para a Age Platform Europe (2011), estes atores são os únicos capazes de compreender e responder à especificidade que os desafios demográficos do envelhecimento representam para as comunidades. Estas considerações estão em linha com Barca (2009) e as políticas de place-based development, claramente enraizadas na matriz que é o território e as suas especificidades, os seus recursos institucionais, materiais e imateriais.

O envelhecimento da população marca o contexto atual nos variados domínios da sociedade contemporânea, impondo repensar conceitos, práticas e visões pessoais e sociais. Pese embora a disparidade de orientações políticas e modos de atuação, as estratégias de nova governança caracterizam-se por modelos de atuação inovadores e desafiantes entre os diversos níveis de atuação, especificamente no que respeita ao nível de atuação local.

Estas questões encerram em si a problemática base deste artigo, cujo objetivo geral é compreender os conceitos e visão sobre o envelhecimento presentes nas políticas locais e conhecer os modelos de governança local das políticas públicas no domínio do envelhecimento, de Portugal e da Suécia. Os objetivos específicos respeitam a percecionar nos discursos dos entrevistados, quais as visões acerca do envelhecimento e da pessoa idosa, compreender se o conceito e visão sobre o

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envelhecimento condiciona as políticas públicas, conhecer as estratégias de governança local no domínio do envelhecimento e perspetivar o papel do local ao nível dos processos de governança multinível.

Envelhecimento: uma visão pessoal e coletiva

A complexidade dos problemas sociais contemporâneos coloca desafios crescentes à ação pública na promoção da coesão social. O processo de globalização não é alheio a essa complexidade e concorre para a necessidade de conceção e implementação de novas formas de ação, referindo Gonçalves (2011), que a questão social, como um fenómeno das sociedades modernas, fundamenta a reforma do paradigma do reposicionamento do Estado e da intervenção social. A sociedade assiste a uma nova política social que tem por base as mudanças sociais que se operam atualmente, com a alteração dos padrões de vida e de estar em sociedade. Uma dessas é o envelhecimento humano, que impõe uma atual mudança de paradigma, forçando as políticas e os policy makers a compreender que este é um processo contínuo e que o mesmo não se limita ou deve ser considerado negativo ou incapacitante.

A mudança de paradigma está presente na capacidade de se atribuir aos próprios seniores a oportunidade de participar, decidir e serem potenciados, conforme as suas capacidades, fomentando-se assim uma democracia e governança participativa e com empowerment, capaz de formular políticas que tenham em conta as mudanças demográficas e sociais vivenciadas (Naue & Kroll, 2010).

Para Walker (2002) o envelhecimento da população é um processo social, e no enquadramento deste estudo, a realidade do envelhecimento enquanto fenómeno psicossocial é aquela que é analisada. As teorias psicossociais do envelhecimento suscitaram grande curiosidade na comunidade científica, não estabelecendo contudo uma relação geral entre as teorias desenvolvidas e os diversos estudos no âmbito da gerontologia social, podendo-se afirmar que a teoria não se repercutiu de modo direto nas políticas.

Teoria da desvinculação e ação pública

Esta teoria surge de Cummings e Henry, no início da década de setenta e demonstra que o envelhecimento é acompanhado por uma desvinculação recíproca entre o indivíduo e a sociedade (Berger & Poirier, 1995). De acordo com Martinez e Valle (1996) a pessoa idosa ao longo dos anos vai vendo diminuir as suas forças e se retirando da vida ativa, finalizando com o seu próprio afastamento da interação social. Os mesmos autores reafirmam que esta desvinculação é mútua entre indivíduo e sociedade: por um lado, o indivíduo marginaliza-se após a reforma e, por outro, a sociedade vai-lhe limitando e negando as possibilidades de participação que outrora já lhe foram entregues. Contudo, continuam os autores, Martinez e Valle (1996), a teoria da desvinculação reforçou as políticas sociais de incentivo à reforma, criando uma imagem negativa do envelhecimento, no que se prende com a ideia de descompromisso deste com a sociedade em geral e ainda a sua falta de capacidade. Efetivamente esta visão perdurou durante algum tempo, tendo desenvolvido em alguns contextos um fosso entre gerações e inter solidariedades, tendo no entanto outros estudos entretanto demonstrado que as pessoas idosas têm preferência por situações que proporcionam atividade e participação.

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Teoria da atividade e ação pública

Havighurst e Albrecht formularam em 1953 a hipótese de que uma pessoa idosa deverá manter-se ativa, manter a sua auto-estima e preservar a sua saúde, se quiser obter mais satisfação na vida (Berger & Poirier, 1995). Para esta hipótese, a pessoa idosa sente-se mais feliz, quanto mais atividade tenha, sendo que a ausência ou carência de atividade pressupõe apatia, pessimismo e depressão (Martinez & Valle, 1996). Havighurst e Albrecht assumem que a velhice bem-sucedida pressupõe a descoberta de novos papéis ou uma nova organização dos já desempenhados e, neste sentido, as sociedades industriais deveriam valorizar a idade e facilitar esse processo (Berger & Poirier, 1995) e ainda preparar as suas diretivas para aproveitar o capital que as pessoas idosas têm.

Apesar disto, atualmente começa já a reconhecer-se efetivamente a idade como positiva, a transmitir-se uma imagem positiva da pessoa idosa, repercutindo-se na capacidade da sociedade ir aceitando e criando oportunidade às pessoas idosas para desempenharem novos papéis sociais e ainda se criarem condições para o desenvolvimento de programas baseados na potenciação de um estilo de vida em atividade (Martinez & Valle, 1996).

Teoria da continuidade e ação pública

Esta teoria demonstra que o envelhecimento é uma parte integrante do ciclo de vida e não um período final, separado das restantes fases, e assim a velhice não é mais do que o prolongamento das etapas anteriores que foram vividas (Berger & Poirier, 1995). Cada indivíduo vive e experiencia um ciclo vital que se manifesta por etapas e onde o mesmo desenvolve uma determinada conduta, onde passado, presente e futuro estão interligados e embora exista uma certa descontinuidade ao nível das situações sociais, hábitos e estilos de vida, estes determinantes vão exigindo adaptação contínua (Berger & Poirier, 1995; Martinez & Valle, 1996).

Neste contexto não se admitem soluções únicas face ao envelhecimento que é experimentado de forma individual, e por isso, na opinião de Martinez e Valle (1996) não há uma política única segundo a qual todos os governos se poderiam regular, mas sim a necessidade de serem criadas políticas sociais plurais e que respondam à diversidade.

No trabalho de Hudson e Gonyea (2012), os autores citam Schneider e Ingram (1993) ao apresentarem uma tipologia quadrupla que produz categorizações das populações alvo, como dependents (dependentes), advantaged (priviligiados), contenders (rivais/competidores) e deviants (marginalizados). Esta tipologia respeita a estudos e caracterizações referentes à realidade da América do Norte e refere-se à ambivalência social, na qual identifica duas dimensões como centrais na construção de orientações políticas para grupos populacionais: a forma como esses grupos-alvo são vistos pelos políticos e outros interessados e quão poderoso é o grupo-alvo em questão.

Este trabalho sugere que os Boomers constituem uma população conceptualmente distinta daquela que foi a geração dos seus pais ou avós e que as categorizações das populações-alvo podem alterar-se ao longo dos tempos.

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Dependents (dependentes)

No início do século XX, as pessoas idosas dos países desenvolvidos eram vistas como um grupo populacional dependente, pobre, socialmente sem função e pouco representativo (Henrard 1996, p. 669). Do ponto de vista do estatuto económico dividia-se em duas classes: os auto-dependentes 34% (aqueles que se asseguravam a si próprios) e os dependentes 66% (aqueles que necessitavam de outras formas de apoio). A pobreza era encarada como fruto da revolução industrial da época e associada à baixa representatividade demográfica, provocando que ficassem sem política autónoma. Nos anos 20 e 30, de modo a proporcionar um impulso à política, foram aprovadas as pensões de velhice

Advantaged (privilegiados)

O papel exercido pelas pessoas idosas na recuperação económica e social do pós II Guerra Mundial foi determinante para os avanços económicos e para a construção do bem-estar. Os níveis de pobreza caíram, assim como a dependência face ao sistema, tendo estes aspetos sido conjugados com o aumento da esperança média de vida e a melhoria de cuidados médicos, levando à democratização do envelhecimento e ao aumento dos gastos públicos. A sua construção positiva, mais do que o seu poder, promoveram a expansão e início de políticas para as pessoas idosas, levando à transição de dependents para advantaged. Numa primeira fase, a força e organização política das pessoas idosas era fraca (anos 60), no entanto, no início dos anos 90, esta situação inverteu-se, sendo constituídas diversas organizações políticas de pessoas idosas, dando-se um impulso à vantagem política deste grupo.

Contenders (rivais/competidores) e Deviants (marginalizados)

O rápido crescimento demográfico impulsionou novas realidades políticas e sociais, com sérios desafios associados. A passagem de advantaged para contender, envolve uma perda de legitimidade política, ou seja, se as pessoas idosas são vistas como menos merecedoras ou se têm igualmente direito aos benefícios anteriores. Este cenário tem criados diversas tensões nos últimos anos com uma divisão clara entre a opinião pública que continua a expressar um forte apoio às pessoas idosas e às suas necessidades, e a opinião de experts, que consideram em termos fiscais, esta situação insustentável, referindo que sem os gastos de proteção social e de saúde, os orçamentos nacionais estariam em melhor condição. As circunstâncias económicas e políticas restringem as agendas e, num quadro de visão negativa das pessoas idosas, podem resultar numa fratura da opinião do poder político podendo ocorrer dois caminhos: as pessoas idosas mais ricas continuarão a intervir e defender os seus interesses como contenders (rivais/competidores), enquanto as mais pobres podem ser deviants (marginalizados) e ser relegadas novamente à categoria de dependents.

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O envelhecimento e a governança

O envelhecimento e as incapacidades são dois campos sociais e políticos, que na opinião de Naue e Kroll (2010) devem ser repensados e sobre os quais policy makers e outros atores políticos não têm convenientemente planeado a longo prazo, perante os verdadeiros desafios que os dados demográficos apresentam. No entanto, os autores acreditam que o envelhecimento funcionará como uma janela de oportunidades, a nível económico, pela potencialidade que representa. O verdadeiro problema está precisamente na formulação de novas políticas e na implementação de novas práticas, que respondam ao desafio demográfico e à capacidade das políticas e práticas a este nível serem economicamente sustentáveis (Naue & Kroll, 2010).

No discurso do Comissário Europeu para o Emprego, Assuntos Sociais e Inclusão, Andor (2012) refere que quando se trata de lidar com os desafios do envelhecimento, precisamos de esforços concentrados nos domínios políticos e entre os diferentes níveis de governo e tipos de stakeholders.

Para Walker (2008) uma estratégia efetiva no âmbito do envelhecimento ativo tem de ser baseada na lógica da parceria entre cidadãos e sociedade e, neste âmbito de trabalho em parceria, o papel do Estado é o de capacitador, facilitador, mobilizador e motivador dos cidadãos. Esta lógica de trabalho requer assim estratégias interrelacionadas a nível individual e social, pois conforme afirmam Cerda e Socías (1995), as intervenções com pessoas idosas exigem que sejam mobilizados todos os recursos da comunidade e que seja promovida a colaboração entre os profissionais de saúde, social, educação e outros, evitando-se assim uma burocratização do trabalho e o desenvolvimento de grupos fechados e que marginalizem as pessoas idosas, como grupo etário.

Nas notas finais da Conference on Good Governance for Active and Healthy Ageing, Testori (2012) refere que uma das questões cruciais para a Europa relaciona-se com as questões do envelhecimento ativo e saudável, assim como a consciência da sociedade civil de que as pessoas idosas devem efetivamente desempenhar um papel ativo nas suas comunidades, devendo ser potenciada uma vivência tão mais elevada, quanto possível.

Naue e Kroll (2010) referem que é efetivamente necessário refazer os objetivos inerentes a estas políticas, pelos atores políticos das diversas áreas de intervenção, pois o envelhecimento e também a incapacidade são domínios que têm efeitos em toda a sociedade e, por isso mesmo, neste processo de delineação de instrumentos políticos devem estar envolvidos não só atores políticos governamentais, como também os diversos grupos de atores, desde sociedade civil, comissões de seniores, ONG’s, entre outras.

Esta envolvência de diversos stakeholders e a alteração da lógica focal dos objetivos inerentes a estas políticas traz a evidência de que se vivencia uma mudança da noção de política, posicionando-se a governança neste contexto como um novo campo da análise política, como sendo uma nova forma de atuação política (Naue & Kroll, 2010).

Para Testori (2012) a União Europeia tem promovido junto dos seus Estados membros, através de diferentes iniciativas o envelhecimento ativo e saudável. Contudo, serão necessários a mobilização e o envolvimento de diferentes tipos de stakeholders e diferentes níveis de governança, de modo a que se compreenda e defina como deverão cooperar, para um efetivo delineamento e implementação de estratégias promotoras de um envelhecimento ativo e saudável. Este envolvimento, conclui Testori (2012), deverá exercer-se com o comprometimento de todos os parceiros, quer públicos, quer privados, fomentando-se a confiança e a colaboração entre si, tendo neste contexto as autoridades

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nacionais, regionais e locais, um papel crítico, para mediar todo este processo, numa perspetiva de articulação multi-nível.

No seio da alteração de paradigma da governança, do reposicionamento do Estado Social e das competências atribuídas, a questão do envelhecimento e a necessidade de desenhar novos enquadramentos internacionais, impele que os vários níveis de stakeholders se coordenem de modo a atuar perante uma sociedade envelhecida globalmente.

Políticas públicas locais no âmbito do envelhecimento

É notória a importância do envelhecimento junto do poder político, conforme refere Lynch (2010, cit. in Hudson, 2010). No entanto, tem de ocorrer uma mudança da construção política face ao envelhecimento e ao potencial que esta faixa populacional pode desempenhar, tornando-se fundamental equilibrar a atenção crítica sobre o impacto socioeconómico do envelhecimento e a avaliação de potenciais intervenções das políticas públicas.

As políticas públicas de atenção às pessoas idosas, progressivamente têm-se descentralizado e territorializado, numa perspetiva de proximidade, permitindo ao meio satisfazer e ir ao encontro das necessidades das pessoas idosas. De forma complementar, Hadjab, Roussel e Voullet (2007) defendem que a resposta que pode ser realizada pelos atores locais, face ao envelhecimento, encara-se como essencial para o desenvolvimento dos territórios, especificamente os rurais, estando esta resposta ainda numa fase embrionária, face aos desafios emergentes.

Poder-se-á assim afirmar que o fenómeno demográfico abre as portas ao local para o desenvolvimento de perspetivas que alavanquem o seu potencial, tendo os atores locais e regionais um papel de vanguarda na capitalização de oportunidades para o envelhecimento e para a promoção da solidariedade entre gerações. Para a AGE Platform Europe (2011), estes atores são os únicos capazes de compreender e responder à especificidade que os desafios demográficos do envelhecimento representam para as comunidades.

Estas considerações exigem por seu turno uma coordenação próxima entre os diferentes atores e a consciência de basear as suas ações em bases coerentes. Leclerc (2005) defende que poder envelhecer num território ou residir junto dos seus é efetivamente uma legitimidade que não deverá ser quebrada com a segregação que as políticas podem promover. Na aproximação a políticas integradoras e holísticas, torna-se essencial a presença de stakeholders, capazes de promover o processo de envelhecimento e de fomentar a intergeracionalidade, sendo claro que as políticas e orientações delineadas nos Estados membros da EU, devem ter repercussões ao nível regional e local (Andor, 2012).

Desde os âmbitos estatais aos municipais, a descentralização das instituições públicas propicia uma renovada forma de pôr em ação programas que vão ao encontro das necessidades das pessoas idosas, em específico (Martinez & Valle, 1996).

Percebe-se que a temática local e políticas públicas e envelhecimento é de inequívoca pertinência, quer para o domínio político, quer para o domínio social. Contudo, são escassas as metodologias formais e concertadas que, de forma estruturada e estratégica, permitem operacionalizar uma leitura

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correta e multidimensional das políticas locais no âmbito do envelhecimento. O processo de análise de políticas públicas, tal como refere Tavares (2006) é um processo que obedece a um conjunto de etapas mais ou menos sequencial e que, invariavelmente, culmina na avaliação da política. Para Munger (2000), a análise de políticas é efetivamente um processo, que implica avaliar e decidir entre alternativas, tendo por base a sua utilidade e satisfação e envolvendo diversas entidades em todo este processo.

Metodologia

Neste estudo, optou-se por uma metodologia de natureza qualitativa, uma vez que, o exercício de análise, compreensão e perspetivação de estratégias de atuação, na opinião de Flick (2005) é um trabalho de recolha de dados, o qual é reflexo do pensamento, opinião e considerações dos participantes e, por isso, deverá ser de natureza qualitativa.

Esta investigação teve como dimensão empírica o estudo de caso, em dois contextos: Lisboa e Nacka.

Foram identificados stakeholders cuja atuação (in)direta poderia ter ação e/ou interesse ao nível das políticas públicas locais no âmbito do envelhecimento. Iniciou-se este processo de identificação dos stakeholders, considerando-se as orientações do Plano de Ação de Madrid, no qual se responsabiliza o envolvimento dos vários níveis governativos, ressaltando-se a ação das organizações não-governamentais, a sociedade civil, o setor privado e se estimula a cooperação internacional, nas guidelines produzidas para as políticas de envelhecimento. Os stakeholders considerados neste estudo e os critérios apresentados às organizações participantes para a sua definição foram:

- Político local – político dos municípios alvo do estudo, com funções na área do envelhecimento;

- Profissional com atuação local na área do envelhecimento – técnico dos municípios analisados, com trabalho e intervenção no âmbito da população sénior;

- Organismo nacional de planeamento estratégico – entidade de nível nacional, com funções de coordenação e/ou gestão de políticas nacionais no domínio do envelhecimento;

- Especialista (teórico-académico) – Indivíduo com funções de docência e/ou investigador na área das políticas públicas e o envelhecimento;

- Empresa – entidade do setor empresarial, com interesse no target pessoas idosas;

- Entidade de economia social – entidade do terceiro setor ou setor público, com respostas e serviços específicos para a população sénior.

A escolha do estudo de caso Lisboa teve como fundamento apresentar-se como uma das áreas territoriais mais envelhecidas de Portugal e este município ter em curso o desenho e implementação de uma política local no âmbito do envelhecimento – Plano Gerontológico Municipal. A opção pelo contexto sueco-Nacka surge pela oportunidade de: i) compreender os modelos de atuação de um distinto Welfare-State, que poderá permitir retirar algumas pistas de orientação, para um novo paradigma de governança e ação do poder estatal; ii) conhecer atuações locais ao nível do envelhecimento já enraizadas no contexto e conforme dados demográficos, a Suécia, apresentar-se

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atualmente como um dos países mais envelhecidos do mundo. Para além disto, no âmbito do Active Ageing Index (2013), a Suécia é identificada como o país europeu com melhor ranking deste índice em termos gerais. Ao nível do emprego e capacidade das pessoas para um envelhecimento ativo surge em 1.º lugar, na participação social em 4.º lugar e na vida independente em 2.º lugar. Portugal neste ranking tem a pontuação global número 13, no emprego 4.º, na participação 20.º, na vida independente 24.º e na capacidade para envelhecimento ativo 18.º. Nacka foi o município selecionado na Suécia, pois à semelhança de Lisboa, é um Município urbano, pertencente à área metropolitana de Estocolmo e ainda em 2007, no Peer Review: Freedom of choice and dignity for the elderly (encontro de especialistas, organizado pela União Europeia - 2007), foi apresentado como uma boa prática da Suécia, no âmbito da intervenção local ao nível do envelhecimento.

Tendo por base estas considerações, em modo esquemático, em ambos os contextos, os stakeholders selecionados para participação encontram-se descritos no Quadro 1.

Quadro 1. Stakeholders selecionados em ambos os contextos para participação no estudo

Stakeholders

Domínio Entidade Portugal Designação Entidade Suécia Designação

Político local Câmara Municipal de Lisboa Político_CML Câmara Municipal de Nacka - Suécia Político_Nacka

Profissional com atuação local na área do envelhecimento

Câmara Municipal de Lisboa Técnico_CML Câmara Municipal de Nacka - Suécia

Técnico_Nacka_K Técnico_Nacka_H

Organismo nacional de planeamento estratégico

Gabinete de Estratégia e Planeamento do Ministério da Solidariedade, do Emprego e

Segurança Social

Organismo Estratégico

Nacional_PT

National Board of Health and Welfare

Organismo Estratégico Nacional_SW

Especialista (teórico-académico)

CESNOVA - Centro de Estudos de Sociologia / Universidade

Nova de Lisboa

Especialista teórico-

académico_PT

Aging Research Center - Stockholm

University

Especialista teórico-académico_SW

Empresa Associação RH 50 +, Lisboa Empresa_PT Danvikshem – Nacka, Suécia Empresa_SW

Entidade de economia social Inválidos do Comércio, Lisboa IPSS_PT Suécia IPSS_SW

Na procura de adequação do método ao problema optou-se pela recolha de dados através da

realização de entrevistas presenciais e semi-estruturadas. A elaboração dos guiões, que serviram de base orientadora às entrevistas, teve como metodologia um processo iniciado com a identificação das áreas temáticas chave. Foi ainda elaborado e devidamente traduzido o consentimento informado, a ser assinado pelo investigador e stakeholders entrevistados, no momento prévio ao início da entrevista respetiva.

As entrevistas em Portugal foram realizadas no período de 20 de Março a 26 de Abril de 2013 e na Suécia foram realizadas entre 16 a 24 de Abril de 2013, tendo sido as entrevistas agendadas antecipadamente com cada stakeholder. Cada entrevista, teve em média a duração de 53 minutos na Suécia e de 45 minutos em Portugal, tendo sido realizadas individualmente com cada stakeholder. Após as entrevistas serem transcritas, foram enviadas individualmente a cada stakeholder, de modo a que estes pudessem expressar a sua discordância e/ou concordância com a transcrição realizada. Embora tenham sido poucos os entrevistados a pronunciar-se (n=4; 3 Portugal; 1 Suécia), os que o fizeram concordaram com o conteúdo transcrito.

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Resultados

Conceito e visão sobre o envelhecimento

No enquadramento deste estudo, surge o interesse em destacar o domínio “Conceito e visão sobre o envelhecimento” pela importância de se compreenderem os conceitos base dos contextos acerca do envelhecimento e percecionar nas “entrelinhas” dos discursos qual o conceito e visão sobre o envelhecimento e se estes condicionam a forma de encarar as políticas públicas.

Como referido anteriormente, as teorias que mais basearam as políticas públicas no âmbito do envelhecimento, foram: a teoria da desvinculação, a teoria da atividade e a teoria da continuidade. Neste enquadramento procurou analisar-se as orientações teóricas adotadas ou seguidas nos discursos dos entrevistados em ambos os contextos. De um modo global, segundo a Figura 1, nos dois contextos, os discursos repartem-se entre a teoria da atividade (25 referências identificadas) e a teoria da continuidade (24 referências identificadas). A teoria da desvinculação tem referência diminuta, em grande parte devido a esta teoria estar efetivamente fora de uso e em processo de descrédito.

Figura 1 - N.º de referências por teoria de envelhecimento

Procedendo a uma análise mais específica da referência destas teorias, por país, através da Figura 2 poder-se-á concluir que, em Portugal, pode-se identificar mais referências que se coadunam com conceitos e visões relacionadas com a teoria da atividade, seguindo-se com menos 4 referências, a teoria da continuidade. Na Suécia, a orientação dos discursos seguiu mais as tendências da teoria da continuidade e somente depois, com menos 3 referências, surge a teoria da atividade. Estes resultados poderão apoiar a reflexão de que, nas tomadas de decisão política, estes conceitos e visões estarão mais predominantemente presentes, respetivamente em cada contexto.

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Figura 2 - N.º de referências às teorias do envelhecimento, por contexto

Numa análise específica por stakeholder de cada país poder-se-á verificar que o organismo estratégico nacional é o stakeholder com mais referências em Portugal. De entre as teorias em análise, em Portugal, no Organismo Estratégico, conseguiu-se identificar o mesmo número de referências (n=5) para as teorias de atividade e continuidade. Deste resultado poder-se-á verificar, contudo, que o maior desequilíbrio é identificado no discurso da empresa portuguesa. No caso do Político, este refere aspetos que se coadunam com as três teorias.

O contexto sueco é mais pobre no que se refere a referências, sendo a sua maior referência encontrada no discurso do Especialista. Deste modo, entre os organismos estratégicos, as empresas e os políticos, encontram-se grandes discrepâncias de discursos identificados e codificados, para cada uma destas teorias (Figura 3).

Figura 3 - Nº de referências por stakeholder, por contexto

Esta questão poderá ser complementada com uma análise à visão sobre o envelhecimento, especificamente no que se refere ao conceito relativo a este target populacional. Deste modo, a análise que se realizou teve como base estrutural as tipologias de targets populacionais, apresentadas no trabalho de Hudson e Gonyea (2012), dos autores Schneider e Ingram (1993).

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A análise à Figura 4 permite verificar que Portugal apresenta de forma mais presente visões do envelhecimento como target Advantaged (n=19), o mesmo acontecendo na Suécia (n=10). Apesar disto, o gráfico apresentado permite inferir que a Suécia apresenta visões que se coadunam muito proximamente como as pessoas idosas serem Contenders, enquanto Portugal reparte esta visão entre Contenders e Dependents. Note-se que as 10 referências acerca de Deviants em Portugal, algumas estão relacionadas com a reflexão dos entrevistados sobre como ainda há poucos anos atrás as pessoas idosas e o envelhecimento era encarado em Portugal, ou seja, para alguns entrevistados a passagem de uma visão de Dependents para Advantage ou Contenders é recente em Portugal.

Figura 4 - Nº de referências por tipo de target populacional, por país

De modo a ilustrar as considerações que os stakeholders apresentaram face à visão sobre o envelhecimento, apresenta-se o Quadro 2.

Quadro 2 - Tipologias de visão face ao envelhecimento, baseado em Schneider e Ingram (1993) cit. in Hudson e Gonyea (2012)

Construções Positiva Negativa

Fort

e

ADVANTAGED PT_ é fundamental essa sabedoria e trazer os seniores e trazer… e operacionalizar o envelhecimento ativo (Político_CML) SW_should we see elderly persons as a specific group in the general population… and be this kind of special law that regulates care of elderly, health care for example (Especialista teórico académico_SW)

CONTENDERS PT_ ainda se olha para as pessoas com mais de 50 anos, como se fossem pessoas que estivessem a mais na sociedade, porque elas estão a tirar os lugares [de trabalho](Político_CML) SW_ but the same ambition we increase our preparations to met the coming challenges with ageing populations (Especialista teórico académico_SW)

Frac

o

DEPENDENTS PT_Do ponto de vista do que fizemos na segurança social (…) ainda está muito numa perspetiva curativa e remediativa, e sinceramente acho que não demos o salto nisso… (Organismo estratégico nacional_ PT) SW_I mean it’s twenty, almost 20% of population and a lot of them … all are not disabled but the larger extent of this are disable in one way or another, a lot of people are cognitive impair… (Organismo estratégico nacional_ SW)

DEVIANTS PT_neste momento está a tentar criar até a nível político uma guerra entre gerações, dizendo que estas gerações estão a consumir tudo e que estamos a consumir os recursos que as próximas gerações não vão ter… (IPSS_PT) SW_the system that we have in Sweden today it means that the main bulk or care of the elderly and health care is publicly financed with tax money (Especialista teórico académico_SW)

Pode

r

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No Quadro 3 apresenta-se, para cada contexto, a visão acerca do envelhecimento e as opções e bases conceptuais das suas políticas públicas.

De um modo geral, a visão dos entrevistados face ao envelhecimento são no sentido de o entender como um processo integrante do ciclo de vida e de recusar concepções irrealistas e homogéneas, face a este target populacional.

A discussão em torno do termo mais correto para referência ao envelhecimento surge como uma reflexão que vários stakeholders de Portugal apresentam (embora esta questão não fosse contemplada no guião das entrevistas). No que se refere às políticas públicas, as intervenções vão no sentido de retirar a palavra “envelhecimento” e ainda de tornar estas políticas mais holísticas e compreensivas e não específicas. Pese embora estas considerações, a contínua dúvida quanto à designação das políticas públicas ao nível do envelhecimento torna-se evidente, mas nenhum stakeholder avança com uma única designação, mas sim com propostas de designações e bases conceptuais às mesmas.

Quadro 3 - Quadro resumo da análise ao domínio “Conceito e visão sobre o envelhecimento”

Conceito e visão sobre o envelhecimento Visão sobre o envelhecimento Políticas públicas e Envelhecimento

Port

ugal

/Lis

boa

- Envelhecimento como processo e ativo; - Visão holística e heterogénea do envelhecimento; - Valorização do papel das pessoas idosas na sociedade; - Pessoas idosas como fonte de capital social e riqueza para o país; - Discordância com designações para “envelhecimento” e “políticas públicas no âmbito do envelhecimento”; - Importância das relações inter-geracionais, para equilíbrio social; - Importância da aprendizagem ao longo da vida;

- Predominância de políticas centrais assistencialistas e políticas locais de participação; - Nível local com maior ação e dinamismo no envelhecimento; - Importância de se avançar com uma política nacional e/ou guidelines nacionais; - Opção por políticas de envelhecimento ativo;

Suéc

ia/N

acka

- Adoção de leis que orientam as políticas: dignidade, empowerment e liberdade de escolha; - Conceção de envelhecimento como um target competidor e gerador de capital, bem-sucedido, com longevidade, saúde e morte rápida; - Preocupação no desenvolvimento de respostas e cuidados; - Envelhecimento populacional é sucesso civilizacional, mas com prós e contras; - Possibilidade de agefobia; - Dificuldade em gerir a multiculturalidade e migrações;

- Políticas que definem as atuações das entidades e serviços; - Políticas com visão de ciclo de vida contínuo e não tanto ativo; - Adoção de políticas (de envelhecimento) preventivas, no contexto; - Ação do local, que segue guidelines, mas tem autonomia local para decidir; - Incredibilidade e afastamento às orientações da EU; - Falta de formações especializadas no envelhecimento; - Ação local de avaliação da qualidade dos serviços;

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Governança multi-nível: o Local

O nível “Local” destaca-se neste estudo pela importância de analisar a forma como este nível de governança atua no âmbito do envelhecimento. Sendo este estudo de caráter prospetivo, com base na análise de dois estudos de caso, importa compreender a lógica de ação do local, enquanto elo de ligação entre níveis governativos e de articulação horizontal entre os diversos atores.

Inicia-se a análise com a seleção da palavra “Local” e elabora-se uma árvore de palavras. Pela sua análise verifica-se que “local” está interrelacionado com o nível de governança, poder e política local e com programas e serviços de nível local, sendo assim evidente a amplitude do seu uso.

Em complemento, procedeu-se à análise das 200 palavras mais usadas (com aplicação de critério de serem palavras com um número de letras superior a 5), e após se excluírem palavras relativas a conjunções ou outras sem interesse (n=68) verifica-se que 50% dessas palavras (n=34) são as que se apresentam na Figura 5.

Figura 5 – Árvore de palavras “local”

Verifica-se, conforme a Figura 6, a preponderância de discursos, em ambos os contextos, relacionados com a questão da estratégia local e da sua ligação com o desenvolvimento e o envelhecimento. Como se poderá observar, a palavra mais frequentemente usada (%=0.87) é “plano”, seguido de “social” (%=0.75) e do conjunto formado pelas palavras “people/person(s)” (%=0.63). O discurso centrou-se em torno das questões do envelhecimento, e como se pode observar, palavras similares como “idosos”; “elderly”; “ageing” e “envelhecimento”, tiveram, em conjunto uma % total de referência de 1.53%. Palavras como “plano”; “services”; “municipallity”; “programa(s)”; “local”; “áreas”; “provider(s)”; “ações”; “guidelines”; “municipal”; “município”; “pelouro” e “department”, são mais utilizadas e que se relacionam diretamente com a ação das autarquias locais. Assume particular interesse esta análise para a presença das palavras específicas de cada contexto estudado, como

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exemplo: “programa(s)” para o caso das ações locais em Portugal e “services” ou “provider(s)” para o caso sueco. Deste modo, verifica-se que ao nível da ação local no envelhecimento, cada contexto utiliza conceitos díspares para referência ao tipo de intervenção que operacionaliza. Questionar-se em Portugal "quais os “serviços” que o Município presta", não é compreendido e é desajustado; o mesmo acontece quando se questiona na Suécia quais são os “programas” ou “medidas municipais?”. Esta questão assume maior importância, pois quando se realizam análises às políticas públicas é necessário atentar na especificidade do caso em estudo, tal sendo reforçado quando se trata de países distintos.

Figura 6 - Referência de palavras no domínio “Estratégia Local” em %

Para além disto, importa ainda analisar em cada contexto os posicionamentos dos entrevistados acerca da articulação da governança local com a estratégia nacional e em relação à definição da estratégia local (Quadro 4).

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Quadro 4.1 - Articulação da governança local com a estratégia nacional e em relação à definição da estratégia local

Estratégia local Ações/mecanismos de ação

Port

ugal

- A nível local é o departamento de desenvolvimento social… (Político_CML) - fizeram parte da elaboração do plano, um representante da Santa Casa da Misericórdia, um representante da Segurança Social, um representante também da Associação Alzheimer Portugal e da Câmara (Técnico_CML) - Lisboa (…) tem imensa dificuldade em fazer a ligação, constatando-se neste momento que é a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, o principal elo de ligação dos idosos com as instituições. (IPSS_PT) - o município de Lisboa tem vindo já a ter diversas políticas, algumas delas dispersas no ponto de vista sobre os idosos(Político_CML) - o grupo de trabalho da área de envelhecimento tem algumas definições com um modelo simplex para idosos, organização das respostas locais que simplificam os processos de aproximação dos serviços aos idosos (Político_CML) - o plano diretor (…) ao dizer que tem que atrair população(…) assume que a cidade de Lisboa está a envelhecer (…) agora são precisos olhares especializados e setorizados (Político_CML) - o plano gerontológico municipal (…) tem que se articular fortemente com (…) o âmbito da rede social e que é alargado (Político_CML) - este plano gerontológico vai ter que evoluir (…) ter ações que umas vêm da rede, outras virão de juntas de freguesia e outras virão efetivamente só do município (Político_CML)

- Têm um Núcleo técnico de Envelhecimento; - Plano Gerontológico Municipal, concebido em parceria tripartida; - Identificação clara das estratégias globais do Plano Gerontológico: habitat; solidão/isolamento; participação; segurança; inserção social/desenvolvimento de competências sociais; informação; serviços; violência/maus tratos; gestão do plano; - Câmara abre candidaturas, maioritariamente para projetos das juntas de freguesia; as juntas de freguesia candidatam-se, há a avaliação dos projetos pelo Núcleo de Envelhecimento, e são financiados os projetos, que especificamente solicitem menores financiamentos, sendo valorizadas as estratégias de sustentabilidade dos mesmos; - Ausência de intervenção direta junto das pessoas idosas; - Ausência de fórum/conselho sénior; - Ausência de momentos de escuta ativa às pessoas idosas – ação essencialmente monitorizadora e financiadora; - Elaboração sistemática de diagnósticos sociais; - IPSS e setor privado de serviços não são parceiros privilegiados, - Identificação da necessidade de intervenção ao nível das acessibilidades no espaço privado das pessoas idosas; - Projetos dinamizados com recurso a voluntariado; - Programas dinamizados são essencialmente do foro lúdico, cultural e informativo; - CML sem interferência na qualidade dos serviços prestados nas respostas sociais;

Suéc

ia

- [A nível local] mainly those are social services department, but of course we have a lot of collaboration with like hospital access to different things. (Político_Nacka) - if you’re talking about the openness and the diversity when it comes to customers choice for example, the citizens, can choose how services they want to (…) themselves…(Empresa_SW) - I don’t think is not a lot strategies from the municipality, but they have… (IPSS_SW) - We decided since 1992, when it comes to home help services and special housing for elderly, that we want diversity and producers (Político_Nacka) - Our aim is to protect finances and quality standards and also the results (…) we have a freedom of choice since 1992. And it’s being success, because we empower the citizens to choose what provider they want… (Político_Nacka) - we have a vision in Nacka in openness and diversity. (Político_Nacka) - The (…) strategy is a healthy ageing and prevention and promotions as well. (Técnico_Nacka_K) - we do focus a lot on how do we keep our elderly people independent, safe and secure. (Técnico_Nacka_K) - Several strategies, (…) one of the strategies is the consumers choice, the choice of choosing what, who is giving you the services that you need, and this means that, you have the possibility to…you have a strength to vote, tell you what you want and power over the services given (Técnico_Nacka_H)

- Têm uma Social Services Elderly Unit; - Não há um instrumento de planeamento específico – dificuldade em elencar as áreas de intervenção; - Avaliação das necessidades/serviços é operacionalizada pelos serviços sociais municipais; - Comité Social and Older Board e realização de reuniões com este Comité; - Social Services Quality Work - procedem à Certificação Safe and Secure Promotion das entidades públicas e privadas; - São públicos os resultados das avaliações; - Ausência de diagnósticos sociais: orientações são decididas segundo n.º de pessoas idosas; - Lançamento anual de um catálogo informativo “Services for elderly people in Nacka”, onde constam informações úteis (o que são as respostas sociais, quanto custa,…); - Centralização de informações sobre os serviços no departamento municipal – tipologia de equipamentos: centros de dia; residências (curta e longa duração); lares; apoio a cuidadores, security alarme; cuidados em casa; serviço de alimentação ao domicílio; respite care para cuidadores; - Projeto tecnológico em casa - Innocare; - Projeto de prevenção de quedas – Balance School; - Projeto Senior Lunches in Nacka; - Transporte para viagens até Estocolmo; - A questão dos maus tratos é tratado no âmbito da área “Família”/”Pessoas Adultas”; - Custo de entrada nas piscinas, reduzido para pessoas idosas; - Câmara paga diretamente aos prestadores de serviços; - Ausência de estímulo à participação social – dificuldade em implementar voluntariado; - Identificação da necessidade de intervenção ao nível das acessibilidades no espaço privado das pessoas idosas;

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De modo a resumir os resultados obtidos pela análise de ambos os domínios, seguidamente apresenta-se o Quadro 5:

Quadro 5. Quadro resumo da análise de resultados: cruzamento stakeholders e domínios em análise

Político Técnico

Organismo Estratégico

Nacional

Especialista teórico

académico Empresa IPSS

Para

d. E

nve.

PT_Teoria da Continuidade/ Advantaged SW_S/R/Advantaged

PT_Teoria da atividade/ Advantaged SW_Teoria da continuidade/Advantaged

PT_Teoria da atividade e continuidade/ Advantaged SW_S/R/Contenders

PT_Teoria da continuidade/Advantaged SW_Teoria da atividade/Contenders

PT_Teoria da atividade/Deviants SW_Teoria da desvinculação/S/R

PT_Teoria da atividade/Deviants SW_Teoria da continuidade/Advantaged

Loca

l

PT_Estratégia: Plano gerontológico (PG) fez a congregação estratégica do que já era dinamizado/PG deve articular com outros instrumentos e organismos/depart: pelouro desenvolvimento social SW_ Estratégia: Pretendem diversidade, abertura, inovação e qualidade/depart: serviços sociais

PT_Estratégia local: PG/ Juntas apresentam candidaturas e município financia/Programas dinamizados pela CML/PG elaborado em consórcio com 3 entidades SW_Estratégia local: healthy ageing, prevention, promotions; keep our elderly people independent, safe and secure; Freedom of choice/Município responsável por qualidade dos serviços/ Não há plano estratégico, mas estratégias

PT_Autarquias olham para idosos como atores/ação local deve ser generalizada e de desenvolvimento social SW_stakeholders consideram que só lançam legislação, mas são irrealistas e não compreendem a complexidade das situações

PT_Autarquias são o nível mais relevante/desconhecimento do conteúdo do PG SW_Importância das intervenções serem a nível local/conhecimento das insatisfações dos idosos de Nacka

PT_Nenhuma noção ou conhecimento da estratégia do município de Lisboa SW_Conhecimento e participação no projeto Safe and Secure / importância da partilha de resultados dos parceiros

PT_Desconhecimento do conteúdo do PG/ não participação na definição do PG/ausente articulação com Município SW_Importante o trabalho de acompanhamento de Nacka/necessidade de mais diálogo e cooperação com Município

Discussão

O desenho das políticas públicas locais encerra em si distintas concepções pessoais e sociais acerca do envelhecimento como processo e, tal como afirma Osswald (2013), o envelhecimento é caracterizado pela heterogeneidade e pela necessidade de se reconhecer o falso estereótipo da pessoa idosa como diminuída, carente, empobrecida, doente e improdutiva, social e economicamente. Os resultados deste estudo seguem esta visão aberta do envelhecimento, como processo normal ao ciclo de vida, sendo vivenciado heterogeneamente pelos indivíduos. Contudo, ao nível do construto para referência a pessoas com mais de 65 anos, os resultados obtidos são concordantes com a

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bibliografia, apresentando-se este de forma dispersa e não concordante. Para Hudson (2010) o envelhecimento deverá evoluir no sentido de construir políticas positivas da idade, sendo importante, como conclui o presente estudo, encontrar outras designações para a ação junto das pessoas com mais de 65 anos. Ainda como refere Hudson (2010) são necessárias políticas positivas da idade e não políticas de/para o envelhecimento. Esta constatação é corroborada pela opinião de alguns stakeholders sendo fulcral a aposta numa atuação articulada das várias políticas e medidas existentes, na construção de uma política transversal de envelhecimento da sociedade.

Da análise dos resultados, poder-se-á concluir que os modelos públicos locais de intervenção procuram renovadas lógicas de ação e a análise de ambos os modelos estudados permite inferir que nenhum dos modelos de política local é perfeito na sua estruturação, desde o seu planeamento, implementação e avaliação. Ao nível da governança local, Portugal e Suécia trilham caminhos e formatos de intervenção, evidentemente distintos.

Portugal não apresenta uma estratégia nacional para o envelhecimento, o que concomitantemente se agudiza ao nível da governança local, na inexistente orientação acerca dos modelos e áreas prioritárias de ação. Neste contexto, em Portugal, verifica-se uma total autonomia dos municípios em desenvolverem modelos de intervenção, no entanto, essa autonomia torna-se frágil, pois se Lisboa desenvolve um Plano Gerontológico Municipal, esta metodologia não é comum a todos os municípios portugueses.

Na Suécia, a ação local é baseada em diretivas nacionais, que embora promovam a autonomia e liberdade de ação aos poderes locais, desenvolvem orientações que obrigam os municípios a responderem e implementarem. Do ponto de vista da ação local, os municípios são, em geral, as entidades que garantem a qualidade dos serviços prestados e a satisfação de cidadãos, setor privado e público. Nacka não apresenta formalmente um instrumento de planeamento político, mas identifica-se nos discursos analisados, que os stakeholders seguem a mesma ideologia de ação local, neste caso, a importância de todos garantirem o freedom of choice, dignity e health ageing.

Na realidade sueca o local apresenta uma visão orientada para a prestação de serviços de qualidade promotores de ageing in place e autonomia. Por um lado, denota-se uma ausência do local na Suécia, promotor e dinamizador de serviços/atividades que promovam a inclusão social, a coesão social e a vivência de cidadanias ativas, intergeracionais e saudáveis. O local, em Portugal, não tem uma relação privilegiada com os prestadores de cuidados e a necessária garantia de prestação de serviços com qualidade é uma competência que não passa pela gestão autárquica.

Na realidade portuguesa, o Programa Rede Social representa uma mais-valia ao nível da aproximação dos agentes dos territórios; na Suécia essa aproximação, do ponto de vista da concertação de esforços e parcerias, é ainda desconsiderada, mas percecionada como relevante. Por outro lado, os municípios suecos têm atribuídas competências e autonomia decisória, segundo orientações e acompanhamento central e regional. Portugal apresenta um modelo local que reclama a ausência de orientações top-down, sendo o envelhecimento visto e intervencionado sob o ponto de vista da provisão de programas e projetos de cariz lúdico, social e de aprendizagem, sem no entanto existirem orientações centrais nesta matéria. Esta situação propicia a existência de realidades locais, com distintas velocidades e mecanismos estratégicos ao nível do envelhecimento.

Pese embora esta tenha sido a realidade apresentada neste trabalho, importa compreender que a contextualização Lisboa não permite tirar ilações conclusivas face a todo o território português, o mesmo se passando com Nacka e Suécia. A realidade fora dos centros urbanos, e especificamente

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destes que comportam a cidade e não somente o município, traz desafios específicos. Para além disto, o facto dos municípios suecos terem presente o fator competitivo entre si, promove desenvolvimento, mas sobretudo, competição, que quando não devidamente acautelada, poderá potenciar desvantagens no desenvolvimento dos territórios mais pobres.

Conclusão

O envelhecimento demográfico é um fenómeno atual que marca os discursos e a orientação estratégica e política. Surge como um desafio às sociedades e às instituições em geral, ao próprio modelo de organização coletiva atual, e ao modelo de bem-estar até aqui desenvolvido. Apresenta-se ainda como um fenómeno que promove a reflexão acerca do papel das pessoas idosas nas sociedades contemporâneas e para o seu estatuto como pessoa e como grupo heterogéneo.

O conceito e visão sobre o processo de envelhecimento encontra-se em discussão. O envelhecimento cruza setores de atuação desde a saúde, educação, infraestruturas, ação social, transportes, economia e finanças, cultura e património, entre outros, sendo importante que as governanças locais sigam modelos de intervenção transversais à sociedade e à especificidade dos territórios. Para além disso, as estruturas formais de apoio e serviços específicos para situações de dependência e/ou necessidades pessoais, deverão encontrar pontos comuns para o diálogo e concertação, adotando lógicas de governança que se primam pela neutralidade e reforço à coordenação e networking.

No que respeita ao nível de governança local e a sua correlação com o envelhecimento, o presente estudo permitiu concluir que são acrescidos os desafios a ultrapassar no sentido de preparar as comunidades para o seu próprio envelhecimento. Os resultados permitem expressar a importância da definição clara das funções atribuídas ao local, assim como a necessária definição e atribuição de mecanismos de autonomia decisória e financeira. A capacidade do local em desenvolver modelos de governança, especificamente ao nível do envelhecimento, induz ainda a capacidade dos territórios e stakeholders trabalharem em lógicas de parceria e cooperação. A dependência financeira do local face ao nível central, as limitações orçamentais e os exigentes procedimentos administrativos impostos pelo Estado central ao local, retrai a ação e poderes.

Em termos de ação futura, os modelos de governança local parecem orientar-se segundo princípios de cooperação, articulação, escuta e envolvimento de stakeholders. Estes princípios deverão constituir-se como bases de cooperação entre os vários níveis e entre as diversas áreas de intervenção do poder político, com um envolvimento ativo das pessoas, pela construção de plataformas de governança baseadas em ações e princípios que emancipem a coordenação vertical e horizontal das políticas e que estas sejam capazes de promover um envelhecimento mais positivo e comprometido, indivual e socialmente.

Em suma, a governança local caracteriza-se pela capacidade do poder local diferenciar a sua ação no sentido de promover aproximações entre stakeholders e fomentar uma ação local próxima, idónea e aberta. Neste sentido, o local deverá reger a sua ação pelo acompanhamento próximo dos seus atores locais e de abertura dos serviços públicos aos seus parceiros. A difusão de práticas e ações deverá ser uma das ferramentas de ação e de desenvolvimento.

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