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    Planos Diretores

    processos e aprendizados

    OrganizadoresRenato Cymbalista

    Paula Freire Santoro

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    O Instituto Plis conta com o apoio solidrio de:Action AidCCFDEEDFPH

    Frres des HommesFundao FordFundao Friedrich Ebert ILDESIDRCNOVIBOXFAM

    A elaborao e publicao do texto So Gabriel da Cachoeira: o planejamento e a gesto ter-ritorial em um municpio indgena da Amaznia teve o apoio do Instituto Socioambiental.

    Publicaes PlisISSN 0104-2335

    Plis 51

    Organizao: Renato Cymbalista e Paula Freire SantoroCoordenao Executiva: Elisabeth Grimberg, Anna Luiza Salles Souto e Silvio Caccia BavaCoordenao editorial: Veronika Paulics e Cecilia BissoliConselho editorial: Agnaldo dos Santos, Claudia Abramo Ariano, Elisabeth Grimberg, PauloRomeiro e Vilma BarbanReviso de textos: Beatriz FreitasMapas: Maria Rita de S Brasil Horigoshi e Instituto Socioambiental (ISA)Projeto grfico original: Luciana PintoCapa: Silvia AmstaldenEditorao: Cecilia Bissoli

    Planos diretores : processos e aprendizados / [organizao] Renato Cymbalista, PaulaFreire Santoro So Paulo : Instituto Plis, 2009.158p. - (Publicaes Plis ; 51)

    1. Plano diretor Brasil. 2. Planejamento urbano Brasil. 3. Poltica urbana Brasil.

    I. Cymbalista, Renato. II. Santoro, Paula Freire. III. Instituto Plis.

    CDU 711.4(81)

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    O incio do sculo XXI foi um perodo de muitas mudanas na maneirade se fazer poltica urbana nos municpios brasileiros, fruto de dcadas de

    luta dos segmentos envolvidos com a agenda da Reforma Urbana. Dentreuma srie de inovaes, uma das mais importantes frentes na luta pelareformulao da poltica urbana no pas foi o amplo movimento de cons-truo de Planos Diretores por mais de 1.500 municpios.

    No se trata de instrumento novo no pas. Nas dcadas de 1960 e 1970,o Brasil assistiu a uma grande onda de construo de planos diretores nasgrandes e mdias cidades, em sua maioria financiados pelo Servio Federalde Habitao e Urbanismo (SERFHAU), que vinculava o repasse de recursos existncia dos planos diretores. Esses planos diretores j foram muitasvezes vistos como tecnocrticos, de costas voltadas para a participao eportadores de propostas irrealizveis, ineficazes, que permaneceram nas

    gavetas dos planejadores. Por outro lado, autores recentes questionam essetratamento como leitura excessivamente simplificada daquele processo, oque indica que tais planos diretores ainda merecem ser mais estudados(FELDMAN, 2005; FERREIRA, 2007).

    Na dcada de 1980, momento de redemocratizao e das intensas mobi-lizaes sociais, o movimento nacional pela reforma urbana traz novamen-te tona a agenda do Plano Diretor, desta vez com um contedo polticomais explcito. Em uma grande campanha prvia Constituio de 1988, omovimento pela reforma urbana conseguiu que fosse avaliada pelo Con-gresso Constituinte a Emenda Popular da Reforma Urbana, encaminhadacom milhares de assinaturas. Aps uma srie de negociaes e concesses

    por parte dos atores da reforma urbana, a emenda popular resultou nocaptulo de poltica urbana da Constituio (arts. 182 e 183), que instituiunovo papel para o Plano Diretor. O Plano adquiriu, com a Constituio, afuno estratgica de definir exigncias para o cumprimento da funosocial da propriedade urbana, constituindo o instrumento bsico para apoltica de desenvolvimento e expanso urbana que deve ser regulamenta-do por lei municipal (antes no era necessariamente transformado em lei).

    A partir desse novo marco, alguns municpios construram planos dire-tores no incio da dcada de 1990, coordenados por um grupo de gestores

    O Plano Diretor na luta pelo

    direito cidade

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    alinhados com a agenda da reforma urbana que procurou utilizar-se dosprincpios da Constituio para reformular o marco da poltica urbana mu-nicipal, entre eles So Paulo, Rio de Janeiro, Natal, Santo Andr, Diademae Belo Horizonte. Tais experincias nem todas implementadas procu-

    raram fortalecer o papel do municpio como esfera responsvel por umapoltica urbana, e propuseram dispositivos inovadores como instrumen-tos de regularizao fundiria para conhecimento da proteo jurdica daposse de assentamentos de baixa renda, a separao entre o direito depropriedade e o direito de construir, propostas de zoneamento inclusivocom as Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS), um macrozoneamentoque refletia uma inteno de interveno nas dinmicas urbanas no lugarde um zoneamento que apenas regulamentava usos e atividades1.

    Por outro lado, mesmo nas experincias efetivamente aprovadas emlei, a aplicao desses planos diretores revelou-se problemtica em vriosaspectos. Alm dos tradicionais desafios polticos e da resistncia daqueles

    ligados ao mercado imobilirio, os planos enfrentaram barreiras tcnicas ejurdicas. Alguns instrumentos como o IPTU Progressivo no Tempo, propostoem alguns Planos Diretores, foram contestados na Justia por atores ligadosaos proprietrios de terras urbanas. A justificativa dessa contestao era aausncia de regulamentao por lei especfica do captulo de Poltica Urbanada Constituio Federal, o que inviabilizaria a aplicao desses instrumentos.

    Ao menos nos aspectos jurdicos e no marco legislativo, houve um claroavano em prol da aplicabilidade desses instrumentos. A regulamentaoespecfica que faltava era uma lei nacional, em construo desde 1990, pormeio do Projeto de Lei no 5.788/90, destinado a efetivar essa regulamenta-o. O PL no 5.788/90, que tramitou por mais de uma dcada no Congresso,

    foi sendo discutido e alterado e resultou posteriormente no Estatuto da Ci-dade (Lei Federal no 10.257/01)2. O Estatuto da Cidade, aprovado em 10 dejulho de 2001, instituiu diretrizes e instrumentos para o cumprimento dafuno social da propriedade. O Estatuto da Cidade e a Constituio, almde institurem um nova ordem jurdico-urbanstica no Brasil, redefiniram afuno do Plano Diretor municipal.

    Na prtica, o Plano Diretor assumia a capacidade de estabelecer algunsdos contedos para a definio dos direitos de propriedade no municpio.No lugar de uma pea tcnica que circula apenas entre especialistas, oPlano Diretor emergia como uma pea poltica, que deve ser democrati-camente construda com a participao dos segmentos sociais que efeti-

    vamente constrem as cidades, incluindo sobretudo os setores populares movimentos de luta por moradia, associaes de bairros, entre outros ,tradicionalmente alijados dos processos de construo da poltica urbana.No caso de no promoverem planos a partir de processos participativos, osgestores pblicos e at o poder Legislativo so passveis de responder porimprobidade administrativa.

    O Estatuto da Cidade estabeleceu o prazo de outubro de 2006 paraque todos os municpios com mais de 20 mil habitantes3 elaboras-sem seus Planos Diretores, e detalhou as suas novas prerrogativas:

    1 Sobre algumas dessas

    experincias, ver DeniseAntonucci, Plano Diretorde So Paulo 1991, 1999;Laila Nazem Mourad, De-mocratizao do acesso terra em Diadema, 2000;Dulce Bentes, Aplicao denovos instrumentos urba-nsticos no municpio deNatal, 1997; Jos Ablio B.Pinheiro e Otilie Pinheiro,Plano Diretor de SantoAndr, 1994.

    2 Para uma anlise do pro-cesso de tramitao do Es-tatuto da Cidade, ver JosRoberto Bassul, Estatutoda Cidade: Quem ganhou?Quem perdeu?, 2005.

    3 O Estatuto da Cidade (LeiFederal n 10.257/01) esta-belece no artigo 41 que oPlano Diretor obrigatriopara as cidades: I - com maisde vinte mil habitantes; II- integrantes de regies me-tropolitanas e aglomeraesurbanas; III - onde o PoderPblico municipal preten-da utilizar os instrumentosprevistos no paragrfo 4do art. 182 da ConstituioFederal; IV - integrantes dereas de especial interesseturstico; V - inseridas narea de influncia de em-preendimentos ou atividadescom significativo impactoambiental de mbito regio-nal ou nacional.

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    4 As entidades presentesno ncleo nacional foram:Associao Brasileira de En-sino de Arquitetura (ABEA);Associao Brasileira deMunicpios (ABM), Confe-derao das Associaes Co-merciais, Industriais e Agro-

    pecurias do Brasil (CACB),Caixa Econmica Federal,Confederao Nacional dosMunicpios (CNM), Comissode Desenvolvimento Urbanoda Cmara dos Deputa-dos, Cmara Brasileira daIndstria da Construo(CBIC), Central de Movi-mentos Populares (CMP),Unio Nacional por MoradiaPopular (UNMP), Conse-lho Federal de Engenharia,Arquitetura e Agronomia(CONFEA), ConfederaoNacional das Associaesde Moradores (CONAM),Federao Nacional dos Ar-quitetos e Urbanistas (FNA),

    Frente Nacional de Prefeitos(FNP), Frente Nacional de

    Vereadores pela ReformaUrbana (FRENAVRU), Federa-o Nacional de Engenheiros(FNE), Frum Nacional pelaReforma Urbana, Institutode Arquitetos do Brasil (IAB),Ministrio da Sade, Movi-mento Nacional de Luta porMoradia (MNLM), Caixa deAssistncia aos profissionaisdo CREA (Mutua), FederaoBrasileira de Associaes deEngenheiros, dois integran-tes da Unio de Vereadoresdo Brasil (UVB), cinco inte-grantes representando osestados de cada regio do

    pas, sete integrantes doMinistrio das Cidades.

    5 Resoluo no 15, de 3 desetembro de 2004, do Conse-lho Nacional das Cidades.

    6 Resoluo no 25, de 18de maro de 2005 (sobre osrequisitos do processo parti-cipativo), e Resoluo no 34,de 1o de julho de 2005 (sobreo contedo mnimo do PlanoDiretor), do Conselho Nacio-

    nal das Cidades.

    este deve seguir as diretrizes do Estatuto da Cidade; deve ser constru-do com participao popular durante a elaborao e implementao;deve garantir acesso dos interessados aos documentos; deve englo-bar o municpio como um todo, e no apenas as reas urbanas; den-

    tre outras. Alm disso, o Estatuto da Cidade regulamentou a formacomo uma srie de instrumentos devem ser inseridos no Plano Diretor.A partir da promulgao do Estatuto da Cidade, diversos municpios

    iniciaram a elaborao de Planos Diretores, com um grande impulsionadordesse movimento que foi o Ministrio das Cidades, institudo em 2003.Dentre as secretarias do novo ministrio foi criada a Secretaria Nacionalde Programas Urbanos, que centralizou as aes relacionadas aos PlanosDiretores e viabilizou o aumento de escala da construo dos Planos Dire-tores nos municpios. Para diferenci-los dos Planos Diretores de desenvol-vimento urbano das dcadas de 1970 e 1980, estes foram rebatizados dePlanos Diretores Participativos pelo Ministrio das Cidades, ressaltando

    outra das principais apostas em torno do instrumento.A ao do Ministrio das Cidades nessa frente foi realizada a partir deuma articulao entre vrios atores, orquestrada pelo Ministrio das Cida-des, na chamada Campanha do Plano Diretor Participativo. A Campanha proposta pelo Ministrio das Cidades e debatida e aprovada como resolu-o pelo Conselho Nacional das Cidades tinha como objetivo disseminaros princpios do Plano Diretor conforme estabelecido no Estatuto da Cidade.Baseou-se na instituio de um ncleo nacional com participao das enti-dades nacionais presentes no Conselho Nacional das Cidades4, e de ncleosem todos os estados do pas. Concebida pelo Ministrio das Cidades, foiposteriormente discutida e aprovada pelo Conselho Nacional das Cidades5.

    Alm da criao dos ncleos nacional e estaduais, a Campanha realizouuma srie de atividades de capacitao em todos os estados, e construiuum conjunto de materiais pedaggicos, enfeixados no chamado Kit doPlano Diretor, e fomentou atividades e realizao de materiais de capaci-tao pelos ncleos estaduais, por meio de convnio formado com a Fun-dao Universitria da Braslia (FUBRA).

    Diversos atores representados no Conselho Nacional das Cidades ocu-param-se da temtica dos Planos Diretores, buscando garantir a confor-midade com o Estatuto da Cidade e com a agenda da democratizao doplanejamento urbano, por meio de duas resolues do Conselho: uma delassobre os requisitos dos processos participativos e outra sobre o contedo

    mnimo do Plano Diretor6.A parte mais problemtica da Campanha foi o financiamento dos

    Planos Diretores. O Ministrio das Cidades no dispunha de recursos parafinanciar todos os cerca de 1.700 municpios que precisavam elaborar seusPlanos Diretores, e a sada foi acionar diversas fontes, como o OramentoGeral da Unio, o CNPq, o programa Habitar Brasil, com recursos doBID, o PNAFM, o Prodetur, o TALMMA e emendas parlamentares. Vrios desses programas no foram originalmente concebidos paraapoiar Planos Diretores e tiveram de ser adaptados. Ainda que todas

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    essas fontes tenham sido acionadas, apenas cerca de 550 municpiosobtiveram recursos federais para seus Planos Diretores, cerca de 30% dosmunicpios foram obrigados a faz-lo pelo Estatuto da Cidade (ROLNIKet. al., 2008). Mesmo para os municpios contemplados, na maior parte

    dos casos os recursos no eram suficientes para a elaborao dos planos,e tiveram de ser complementados com recursos estaduais e municipais.Tendo em vista as limitaes de financiamento, do ponto de vista quan-

    titativo a campanha dos Planos Diretores participativos foi bastante bem-sucedida. Estudo do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agro-nomia (CONFEA), encomendado pelo Ministrio das Cidades, revelou queem 1.553 dos 1.683 municpios que estavam obrigados a elaborar seus Pla-nos Diretores 86% deles j haviam aprovado ou estavam elaborando seusplanos em 2007. O prazo estabelecido pelo Estatuto da Cidade claramentepegou, dado relevante em um pas com tantas leis que no pegam comoo Brasil. Neste caso especfico, o notvel esforo empenhado pelos grupos

    envolvidos com a agenda da reforma urbana nesses anos claramente pro-duziu efeitos no sentido de reverberar e resultar em processos em centenasde municpios, abrindo assim inmeras novas trincheiras para a disputa emtorno da poltica urbana e da regulao da terra nos municpios.

    As sistematizaes e avaliaes dos Planos Diretores apenas se iniciam.Como todos os processos de construo de polticas pblicas de relevncia,no h consenso em torno da eficcia dos Planos Diretores. H posiciona-mentos bastante cticos com relao ao conjunto dos processos7, h estu-dos que procuram apontar os desafios de implementao de instrumentosespecficos8, problematizar os processos participativos9, o contedo habi-tacional dos planos (ROLNIK et al., 2008), anlises com recortes de gnero

    e etnias (CYMBALISTA et al., 2008), questes relacionadas ao andamentodos Planos Diretores no Legislativo municipal (BONDUKI, 2007). Mas estapublicao parte do princpio de que o processo foi de abrangncia e di-versidade que pressupem ainda vrios anos de monitoramento e estudos.

    O primeiro passo para isso o registro dos processos. Um pas com umaestrutura administrativa ainda precria como o Brasil tem pouca tradiona sistematizao de processos, de modo que uma srie de experinciasacaba se perdendo por falta de registro. Esta publicao foi concebida como propsito de preencher essa lacuna, e apresenta seis estudos que recupe-ram processos e buscam extrair lies aprendidas de cada um deles.

    O prprio trabalho de sistematizao das experincias mostra a diversi-

    dade de questes envolvidas nos Planos Diretores, revelando que em cadamunicpio os focos de construo de conhecimento, de tenses e de nego-ciaes foi especfico. Disso resulta que os casos aqui relatados apresentamtambm focos diferenciados, refletindo as especificidades locais.

    Os cinco primeiros artigos resultam de pesquisa realizada sobre um pe-rodo peculiar: o momento aps a aprovao do Estatuto da Cidade em2001, mas antes da grande onda de elaborao de planos diretores em2005 e 2006, a partir da campanha do Ministrio das Cidades. Assim, foramplanos que buscaram explorar as potencialidades do Estatuto da Cidade,

    7 Flvio Villaa, As ilusesdo Plano Diretor, 2005. Dis-ponvel em: www.planosdi-retores.com.br/downloads/ilusaopd.pdf.

    9 Claudia Virgnia Souza,Santo Andr: instrumentos

    utilizados na elaborao doPlano Diretor Participativopara viabilizar a participa-o e a negociao entre osatores; Regina Bienensteine outros, A universidade e oplano diretor participativo:a experincia de elaboraono municpio de Paracambi.Alm disso, exemplos daconduo dos processosparticipativos estavam dis-ponveis em um banco deexperincias no site do Mi-nistrio das Cidades, na reareferente campanha doPlano Diretor Participativo,em julho de 2007.

    8 Rosana Denaldi e Fer-nando Bruno, Parcelamen-to, edificao e utilizaocompulsrios; aplicaodo instrumento para fazercumprir a funo social dapropriedade, 2007. Trabalhoque levanta uma srie dequestes a serem observadasao analisar-se a ZEIS: JooSetti W. Ferreira e Daniela

    Motisuke, A efetividade daImplementao de ZonasEspeciais de Interesse Socialno quadro habitacional bra-sileiro: uma avaliao ini-cial, 2007. Ver Isadora TamiLemos Tsukumo, Produode habitaes em reasespeciais de Interesse Social(AEIS): o caso do municpiode Diadema, 2002. SobreSalvador, ver ngela MariaGordilho Souza e outros, Odesafio da regulamentaode ZEIS Zonas Especiaisde Interesse Social, 2007.

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    10 Ver pgina www.cidades.gov.br/planodiretorparticipa-tivo. No Instituto Plis, essaprimeira verso foi coorde-nada por Renato Cymbalistae Maria Albertina J. Carvalho.A ficha tcnica coma equipeenvolvida nessa pesquisaencotra-se ao final dessaintroduo. No Ministriodas Cidades, Secretaria deProgramas Urbanos, o proje-to foi coordenado pela entoSecretria de Programas Ur-banos, Raquel Rolnik, e pelourbanista Kazuo Nakano.

    ou tiveram que adaptar-se a ele, mas foram em grande parte desenvolvi-dos margem da ao do Ministrio das Cidades.

    O ponto de partida da sistematizao dessas experincias foi o projetoSistematizao de Experincias de Planos Diretores, levado a cabo em

    2005, apoiado pela organizao no governamental britnica OXFAM epelo Ministrio das Cidades, em que foram sistematizadas pela equipe doInstituto Plis cinco experincias de Planos Diretores na regio Sudeste doBrasil, total ou parcialmente realizadas entre 2001 e 2005 escolhidos Essesestudos de caso foram disponibilizados no banco de experincias do Mi-nistrio das Cidades, cujo objetivo era oferecer instrumentos para tcnicose participantes dos processos de construo dos Planos Diretores10. Algunsdos estudos de caso foram posteriormente reeditados para apresentaoem encontros da rea e, finalmente, em seu conjunto para esta publicao.

    A diversidade das experincias orientou a escolha dos casos a serem estu-dados: diferentes situaes urbansticas, diferentes contextos polticos de

    longo prazo e diferentes conjunturas poltico-partidrias orientando a ex-perincia no curto prazo. Para todos os casos, procurou-se obedecer a umaestrutura bsica comum: uma breve anlise do contexto territorial e polti-co do municpio; o relato cronolgico das etapas de elaborao dos planosdiretores em alguns casos foi necessrio recuperar planos diretores an-teriores, que revelam a histria tcnico-poltica da regulaco territorial domunicpio; e a extrao de lies aprendidas de cada processo, elementoestratgico para o contexto, e que consideramos ainda pertinentes. Dessesestudos de caso resultam os cinco primeiros artigos desta publicao.

    O primeiro artigo, sobre o Plano Diretor de Sorocaba, municpio doEstado de So Paulo, aborda a experincia de construo do plano basea-

    do em dois focos principais: a articulao dos diferentes atores sociais noprocesso e o contedo do plano. A participao dos atores no processo, emespecial do Ministrio Pblico, mostra que ainda h uma construo jur-dica a ser feita sobre a utilizao dos instrumentos do Estatuto da Cidade,de fundamental importncia, que precisa ser conhecida pelos operadoresdo direito. Um segundo foco est no contedo do plano resultante desseprocesso, especialmente no que diz respeito definio da funo socialda propriedade e a possibilidade de autoaplicabilidade dos instrumentosurbansticos do Estatuto da Cidade.

    O segundo estudo analisa uma experincia de elaborao de Plano Dire-tor Participativo que se insere no processo inicial de adequao do plane-

    jamento urbano municipal s diretrizes do Estatuto da Cidade. Trata-se daexperincia do municpio de Mariana, no Estado de Minas Gerais, que temcomo peculiaridade a existncia de significativo conjunto de patrimniohistrico tombado desde a dcada de 1930, gerido pelo rgo federal res-ponsvel pela preservao do patrimnio histrico nacional, atual IPHAN.O estudo investiga a forma como as recentes transformaes na moldurainstitucional do planejamento territorial incidiram sobre essa situao ter-ritorial especfica, aumentando as possibilidades de insero do municpiona gesto do seu territrio, assim como do patrimnio histrico local.

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    O terceiro texto, sobre o Plano Diretor de Diadema, municpio do Esta-do de So Paulo, retoma uma histria de gesto territorial que desde o in-cio dos anos 1990 esteve pautada pelo reconhecimento da irregularidadehabitacional em um territrio que sofreu forte processo de reorganizao

    do setor industrial a partir da dcada de 1980 e que teve de reorganizarseus espaos. O texto recupera a trajetria da implementao das reasEspeciais de Interesse Social AEIS.

    O quarto artigo, sobre o Plano Diretor de Franca, tambm municpiodo Estado de So Paulo, mostra o processo de planejamento de um mu-nicpio que tem tradio de planejamento, pautada pelo prefeito e seussecretrios, e conta com assessores de grande qualidade. O artigo traz umaabordagem relevante para os municpios brasileiros, e em especial para asrealidades no-metropolitanas: o parcelamento do solo, tema pouco abor-dado pelo Estatuto da Cidade.

    O quinto estudo trata do Plano Diretor de Niteri, municpio do Estado

    do Rio de Janeiro que vem construindo, desde a dcada de 1990, um arca-bouo para o planejamento urbano, em um processo que foi atravessadopela instituio do Estatuto da Cidade e seus pressupostos.

    O sexto e ltimo texto foi realizado em outro contexto e trata de mo-mento posterior, o binio 2005-2006, em que os municpios operaram aelaborao de seus planos diretores sob a campanha do Ministrio dasCidades. Trata-se do Plano Diretor de So Gabriel da Cachoeira, no Estadodo Amazonas, processo inserido em um contexto singular. Diferente dosdemais planos aqui estudados, o Plano Diretor de So Gabriel da Cachoeiracontou com participao direta do Instituto Plis, que juntamente com oInstituto Socioambiental (ISA) comps equipe de assessoria tcnica Pre-

    feitura Municipal, reunindo ambientalistas, indigenistas, advogados e di-versos tcnicos envolvidos com a questo indgena com urbanistas e ope-radores do direito envolvidos na implementao do Estatuto da Cidade.

    Esse grupo enfrentou o desafio de discutir as questes relativas ao plane-jamento e gesto territoriais no contexto amaznico. No momento de elabo-rao dos Planos Diretores, estimulado pelo prazo e pela exigibilidade previstano Estatuto da Cidade, concretizar essa discusso foi das aes mais relevan-tes, considerando as especificidades territoriais como regio de fronteira,em floresta amaznica , as extenses geogrficas, os conflitos fundirios,as diversidades culturais e os atores sociais envolvidos nas suas diferentesescalas e culturas em escala global, nacional, regional, municipal e tribal.

    A problematizao da realidade territorial de municpios da Amaznia, luz do recente processo de elaborao de Planos Diretores, o objeto deum terceiro projeto, tambm relacionado a esta publicao. Trata-se doprojeto A implementao do Estatuto da Cidade no Amazonas, realizadopelo Instituto Plis em parceria com a Universidade Estadual do Amazonas -UEA e o Ministrio Pblico Federal do Estado do Amazonas, financiado pelaFundao de Amparo Pesquisa do Estado do Amazonas - FAPEAM. O pro-jeto identifica as dificuldades tcnicas, polticas e de ordem territorial paraa implementao do Estatuto da Cidade e dos planos diretores participati-

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    vos nos municpios de realidade amaznica, e busca construir e disseminarconhecimento que ampare os processos nos municpios. Tem sido apoio im-portante para o processo de implementao dos planos diretores no Estadodo Amazonas no binio 2005-2006, e para a incorporao dos princpios

    da reforma urbana dentre gestores, operadores do direito e pesquisadoreslocais. A expectativa que a circulao do conhecimento consolidado nes-ta publicao sirva para o amadurecimento dese debate nesses municpios.

    Os estudos aqui publicados so de alcance limitado, pois decorrem deprojetos de pesquisa com tempo e recursos exguos. Nesse sentido, servemmais como registro de experincias do que propriamente como balanos de-finitivos mesmo porque, como estamos tratando aqui de processos muitorecentes, ainda cedo para medir muitos dos impactos dos novos instrumen-tos. Mesmo assim, possvel extrair desses poucos casos algumas concluses.

    evidente a diversificao dos segmentos sociais que vm se fazendorepresentar nos processos recentes de construo de Planos Diretores. Se

    at a dcada de 1980 o plano era tratado como temtica eminentementetcnica, operado por seus especialistas (arquitetos, urbanistas, engenhei-ros, em interfaces diversificadas com o poder poltico e o mercado imo-bilirio), os novos Planos Diretores refletem a atuao de um conjuntomuito maior de atores: movimentos de luta por moradia, ONGs, MinistrioPblico, setores do Judicirio, e at mesmo ndios.

    Isso no significa que os atores tradicionais do planejamento urbanotenham desaparecido: os casos aqui estudados mostram que proprietriosde terra, empreendedores imobilirios, vereadores, tcnicos e consultoresem planejamento urbano se fizeram presentes nos Planos Diretores recen-tes, em alguns casos buscando reproduzir posies historicamente privi-

    legiadas, abusos e favorecimentos. Dessa forma ainda que estes estudosassumam uma posio de validao do plano diretor como instrumento dedemocratizao do acesso terra e de efetivao do direito cidade nopodemos ser laudatrios em relao aos processos e seus resultados.

    Os atores ligados ao campo popular, preocupados com a democrati-zao do acesso terra e cidade, normalmente entram na disputa emdesvantagem: em geral tm menor conhecimento, menos conexes com osprocessos de deciso no Executivo e no Legislativo, menor capacidade deacionar assessorias especficas e de responder s demandas dos processoscom a rapidez requerida e a tcnica adequada. Por isso, alm de mobi-lizao social, fundamental uma clara determinao do poder pblico

    municipal em fortalecer esses segmentos, e sero poucos os casos de Pla-nos Diretores que efetivamente buscaram reverter desigualdades sem umfirme envolvimento da Prefeitura.

    A ampliao dos segmentos envolvidos nos processos de planejamento mesmo que em situao de inferioridade, porque se reconheceu nessecampo uma disputa pelos recursos territoriais e pelos investimentos eminfraestrutura, equipamentos urbanos e moradia popular talvez seja aprincipal caracterstica da histria recente de construo de Planos Di-retores. Desvelou-se que a dimenso tcnica do planejamento opera em

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    estreita interface com os processos polticos de gesto do territrio, em umprocesso que pode ser chamado de desmistificadorde uma suposta aura deneutralidade dos instrumentos de poltica e planejamento urbano.

    A diversidade de questes que emergiram nesses poucos estudos e as

    surpresas de um trabalho de campo que mostrou aspectos e problemticasinsuspeitados reiteram a relevncia de uma abordagem emprica e inves-tigativa sobre o processo. Em um pas com realidades territoriais e polticasto diversas como o Brasil, e especificamente em um processo to des-centralizado e heterogneo como foi o conjunto de Planos Diretores Par-ticipativos, a realizao de estudos de caso em quantidade instrumentofundamental para embasar posicionamentos e leituras mais generalizadas.Estas certamente sero construdas com o passar dos anos e a consolidaodas experincias.