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PARECER JURÍDICO Os Contratos de Concessão dos Pólos Rodoviários do Rio Grande do Sul e o ato Governamental de Denúncia - Efeitos Jurídicos, sub-rogação e Caminhos Úteis Ricardo Giuliani Neto Porto Alegre, Maio de 2006

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PARECER JURÍDICO

Os Contratos de Concessão dos Pólos Rodoviários do Rio Grande do Sul e o ato Governamental de Denúncia -

Efeitos Jurídicos, sub-rogação e Caminhos Úteis

Ricardo Giuliani Neto

Porto Alegre, Maio de 2006

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EMENTA: CONVÊNIO DE DELEGAÇÃO. CONVÊNIO-CONCESSÃO. NATUREZA JURÍDICA. CONTRATO ADMINISTRATIVO. ATO ADMINISTRATIVO E SEUS EFEITOS. DENÚNCIA E MOTIVAÇÃO. SUB-ROGAÇÃO, EFEITOS E NATUREZA JURÍDICA. A discussão que se produz na doutrina nacional acerca da natureza jurídica dos convênios e contratos somente adquire sentido se observadas as conseqüências que concretamente produz no ambiente das partes ou convenentes. O ato administrativo, como expressão funcional do administrador público é autoexecutável por nascer com a presunção de validade, modo que, para apartá-lo da vida, necessária a intervenção judicial e nunca ato unilateral de ente federado de qualquer nível. A denúncia, instrumento tipicamente contratual, pode ser exercida se suficientemente motivada em vista de ser espécie do gênero ato administrativo. A sub-rogação, como fato da vida, determina, per se, a substituição em pólo de relação jurídica de direito material, mais quando expressamente contratada e sendo os instrumentos derivados parte integrante do ajuste originário que a prevê. O ato administrativo produz efeitos jurídicos subordinados a boa-fé administrativa e a legalidade, portanto, válidos e eficazes até que ação do poder judiciário os nulifique ou ato do agente público expedidor o revogue. Poder concedente expresso no termo de delegação originário, o Convênio-concessão, donde brota a responsabilidade solidária entre os entes signatários.

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S U M Á R I O

A. O CONVÊNIO DE DELEGAÇÃO 6

A.1. NATUREZA JURÍDICA 8 A.2. DO OBJETO CONVENIADO 15 A.3. O PODER CONCEDENTE E AS CONCESSIONÁRIAS 18

B. A DENÚNCIA 22

B.1. A DENÚNCIA NO DIREITO PRIVADO 23 B.2. A DENÚNCIA NO DIREITO PÚBLICO 24 B.3. A DENÚNCIA NO CONVÊNIO 26 B.3.1. OS TERMOS DO GOVERNADOR 28 B.3.2. EFEITOS 29

C. A SUB-ROGAÇÃO COMO CATEGORIA JURÍDICA 32

C.1. A CONDIÇÃO JURÍDICA DO SUB-ROGADO: A UNIÃO OU A ANTT? 36 C.2. UMA ADVERTÊNCIA NECESSÁRIA 37

D. O CAMINHO JURÍDICO A SER CONSTRUÍDO 38

D.1. O REEQUILÍBRIO ECONÔMICO E FINANCEIRO DOS CONTRATOS 41 D.2. AS PRELIMINARES PARA O CONHECIMENTO DE UM PROCESSO DE REEQUILÍBRIO 43 D.2. O CAMINHO JUDICIAL – RAZÃO OU LAVA-MÃOS? 45

CONCLUSÕES 47

BIBLIOGRAFIA 52

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P A R E C E R*

Ricardo Giuliani Neto**

Consulta-me a Associação Gaúcha das Empresas Concessionárias

de Rodovias – AGCR – a propósito de “denúncia” que teria sido procedida

pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul aos Convênios celebrados com

a União Federal para a administração de rodovias e exploração de trechos de

rodovias federais, tudo fundado nos documentos que faz anexar, para, a seguir,

apresentar a seguinte linha de questionamento:

1) Qual a natureza jurídica dos Convênios de delegação firmados entre o Estado do Rio Grande do Sul e a União Federal?

2) Relativamente a denúncia, quais os efeitos estaria apta a produzir face aos termos em que se concretizou?

3) Especificamente, no que pertine a sub-rogação, que direitos, deveres ou obrigações emergiriam às Concessionárias?

* É absolutamente proibida a reprodução total ou parcial, comunicação pública, modificação, transformação, cópia, upload, transmissão, distribuição, venda ou qualquer outra forma de exploração e manipulação deste parecer e seu conteúdo, sem o consentimento prévio expresso da AGCR e/ou seu autor. ** Advogado; Professor de Teoria Geral do Processo e de Teoria da Constituição na UNISINOS; Especialista em Direito Privado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul em convênio com a Escola Superior do Ministério Público; Mestre em Direito do Estado e Doutorando em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Professor de Teoria Geral do Processo e de Teoria da Constituição na UNISINOS.

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4) Diante da ação concreta do Poder Concedente, que medidas podem ser adotadas pelos Consulentes de modo a preservarem-se os direitos emergentes dos contratos mantidos entre o Estado e as empresas concessionárias de rodovias?

O objeto da consulta, em verdade, reside no interesse legítimo que

os consulentes têm em perquirir as condições jurídicas que “podem/devem” ser

criadas, ou esgrimidas, para efeitos de assegurar-lhes o retorno dos

investimentos procedidos, a realização dos lucros planejados e,

fundamentalmente, a proteção aos direitos contratados junto ao poder público

no que se refere à mantença do equilíbrio econômico e financeiro dos

respectivos contratos, tudo diante da ação do Excelentíssimo Senhor

Governador do Estado do Rio Grande do Sul que, ao que informam, teria

denunciado os convênios de delegação antes referidos.

Despiciendo reportarmo-nos ao processo licitatório que adjudicou

os pólos rodoviários integrantes do Programa Estadual de Concessões de

Rodovias, uma vez que sobre ele nada há para esclarecer ou mesmo dúvidas

para dirimir. Trata-se de contratualização já patrimonializada nas empresas e

que detém potência para gerarem direitos a partir das relações jurídicas

aperfeiçoadas. Anote-se que não falamos aqui de eventuais liberalidades

praticadas de parte a parte na gestão dos contratos públicos, o que, por sua vez,

produzem efeitos jurídicos nos limites destas liberalidades.

Posto isso, passamos diretamente ao parecer antes advertindo que

para a análise dos pontos trazidos será indispensável ter-se em mente o

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ambiente da política condicionante do negócio posto em exame. Pôr o

“direito”, pois, sob termos exclusivamente “jurídicos” seria excluí-lo de

qualquer possibilidade de êxito diante dos fatos apresentados e vividos na vida

real; o negócio jurídico está realizado, aperfeiçoado, no ambiente da política; o

interesse público, pois, vêm dito por boca-não-jurídica. E são com essas bocas

e mentes que deveremos concretamente dialogar.

Já pelo início é o momento de afirmar que os mundos dos direitos

administrativo e constitucional – sede de concretização do negócio comercial

contratado com o Estado do Rio Grande do Sul –, não se confundem com o

mundo do direito privado sob pena de reduzir-se o jurídico ao próprio jurídico,

momento em que, inexoravelmente, o negócio comercial – a razão de

existências das empresas associadas a consulente –, estará posto por terra, visto

que este negócio- bem jurídico das concessionárias – nada mais é do que a

prestação de um serviço público relevante que se viabiliza pela longa manus do

Estado. Quando se fala de direito constitucional ou administrativo, estamos a

dialogar com o interesse público, com o mundo da política, que o escolhe,

define e realiza, e é por isso que se deve fazer firme que os conceitos

emergentes do direito público, face a estas peculiaridades, não se relacionam e

não podem relacionar-se diretamente com os conceitos do direito privado, pena

de confusão jurídica e negocial. Não fosse assim, qual o sentido da distinção

entre um e outro?

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É no ambiente do direito público que obraremos e apresentaremos

nossa opinião na ordem do sumário já apresentado.

Ao parecer.

a. O convênio de delegação

A União Federal, por intermédio do Ministério dos Transportes, e o

Estado do Rio Grande do Sul, firmaram convênio de delegação para a

administração de rodovias e a exploração de trechos de rodovias federais.

Trata-se de instrumento que expressou a vontade política dos entes federados

no sentido de prover serviços de infra-estrutura aos usuários de trechos

rodoviários devidamente descritos no termo de ajuste. Os Convênios de

Delegação somente vieram à baila em vista do estabelecimento de política

pública pelo Estado do Rio Grande do Sul que recebeu da União, por

intermédio do Ministério dos Transportes, aquiescência, adesão e

interveniência.

Assim, em vista dos referidos convênios, nasceu o Programa

Estadual de Concessão de Rodovias, onde caberia, como de fato coube, à

iniciativa privada manter determinados pólos rodoviários, integrados por

trechos de rodovias estaduais e federais. Anote-se que a modelagem que

determinou a licitação para entrega dos bens públicos aos entes privados parte

daquele ajuste de vontades, patrocinados pela União Federal e pelo Estado do

Rio Grande do Sul.

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O acordo entre os entes federados vem inequívoco, pois, uma vez

produzido teve a finalidade declarada de viabilizar aquela política pública que

optou pela concessão de trechos rodoviários para efeitos de manutenção a custa

de pedagiamento, sendo gerida pelo “delegatário” mediante aprovação – e

interveniência expressa – do “delegante”, termos da cláusula segunda do

documento de ajuste nominado de convênio de delegação. Neste convênio

pactuaram-se obrigações recíprocas! Mais, determinou-se que os instrumentos

derivados do convênio a ele fossem integrados, termos da cláusula terceira,

caput.

Ademais, uma vez aprovada pelo “delegante” – A União, por

intermédio do MT, interveio – sabido era que tais complexos rodoviários

seriam postos a execução por empresas privadas que receberiam, como de fato

receberam, em concessão – mediante legal e constitucional licitação pública –

os bens públicos para gestão e disponibilização dos serviços aos usuários:

assim os termos da Cláusula terceira, parágrafo primeiro; Cláusula quarta -

item 1, incisos II, IV e VIII - item 2, inciso V – item 3, inciso II; Cláusula

oitava; Cláusula décima segunda, parágrafo terceiro. Ainda, é de verificar-se

nos instrumentos contratuais firmados – principal e aditivos – entre o Poder

Concedente e as Concessionárias, repiso, a firma do Senhor Ministro dos

Transportes.

Portanto, impõe-se dar definição jurídica ao instrumento fundador

das relações contratuais mantidas entre os consulentes e o Estado.

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a.1. Natureza jurídica

Trava-se polêmica na doutrina nacional acerca das aproximações

ou afastamentos que há entre as figuras jurídicas do convênio e do contrato

administrativo. Em nosso sentir, trata-se de polêmica – tirando-se a utilidade

pedagógica da distinção – que até os dias de hoje foi incapaz de gerar um

instrumento purificador nos efeitos jurídicos que o ajuste, num ou noutro

modelo, produz. Todavia, para o exame das questões postas será relevante uma

digressão sobre a matéria na medida em que, ao nosso sentir, existem efeitos

contratuais que nascem do convênio firmado entre União e Estado. Estes

efeitos jurídicos se irradiam para os contratos de concessão e, portanto, para a

esfera patrimonial das empresas.

Define a doutrina, com variações aqui e acolá, que o convênio

administrativo é acordo celebrado entre entidades públicas de qualquer

espécie ou mesmo entre estas e entidades ou instituições privadas objetivando

a consecução de interesses e objetivos comuns. A contraposição do contrato

administrativo ao convênio tem a nítida função de distinguir funções que um e

outro observam no campo da operação jurídica pública. Em linhas gerais os

critérios que têm sido apontados para distingui-los entre si são os seguintes:

convênio “é acordo, mas não é contrato”; é “ajuste administrativo”; são

“acordos de cooperação” (todos partícipes agem em atividades pré-ordenadas

para o fim que se deseja realizar); ou são atos administrativos que caracterizam

colaboração entre os signatários; outros dizem que convênios seriam atos

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administrativos complexos, portanto, pactos da espécie acordo; atos

multilaterais de parceria; e “acordo de vontades com características

próprias”.

No mundo do direito civil, tudo o que acima foi dito se enquadraria

perfeitamente na definição do contrato em geral, sendo que a doutrina civilista

prefere atribuir como característica essencial para a existência do contrato

privado simplesmente à presença de um determinado ajuste firmado entre

partes, que define um preço para a consecução de um objeto lícito.

A premissa que tem orientado a doutrina no estabelecimento das

distinções seria que enquanto o contrato é comutativo – fundado em interesses

contrapostos – o convênio seria cooperativo – baseado na harmonização de

finalidades comuns. A meu sentir, as coisas não são tão puras e simples assim.

Sendo o convênio tudo aquilo que se disse, é de se observar que os

contratos administrativos têm peculiaridades que importam trazer à colação.

Vejamos que quanto aos interesses, haveria divergência e contraposição entre

as partes contratantes (comutatividade), enquanto que no convênio

administrativo seriam convergentes e comuns entre os partícipes

(cooperatividade); Temos partes no contrato, onde uma pretende o serviço, a

obra, enfim, o objeto do ajuste enquanto que a outra deseja a contraprestação

adequada, a remuneração; diz parte significativa e autorizada da doutrina

nacional que o convênio realiza-se com partícipes que não se vinculam uns aos

outros como ocorre no contrato na medida em que suas pretensões não seriam

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opostas, mas convergentes mesmo que existam obrigações específicas e

particularidades de “partícipe a partícipe”.

Nos contratos administrativos há uma composição de vontades e

não o somatório de esforços, como nos convênios. O interesse comum é a

tônica convenial enquanto que nos contratos cada parte deseja uma finalidade

diversa, mas não divergente. A conjugação de esforços que faz marca no

convênio é a que determina a inexistência de um preço ou de uma

remuneração, em verdade opera-se a cooperação pelo repasse de verbas, uso

de equipamentos, de recursos humanos e materiais, de bens móveis e imóveis,

know-how, como exemplos possíveis de compartilhamento de interesses.

Estas características determinam os efeitos jurídicos específicos

que merecerão nossa atenção tendo em conta o caso concreto. Veja-se que no

contrato, a remuneração integrará o patrimônio da parte que a recebeu, sendo

irrelevante para o pagador do preço a utilização que a ele será dada; já no

convênio, recebido determinado valor, este restará vinculado à utilização

prevista no ajuste; portanto, se um particular recebe verbas do poder público,

em vista do convênio, a verba manterá sua natureza pública, devendo ser

destinada para os fins previstos no acordo. É este o motivo que autoriza aos

órgãos públicos de fiscalização o exercício de suas competências legais,

inclusive sobre entidades privadas, obrigando-se estas a prestação de contas,

inclusive ao repassador.

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Pelo prisma de quem vê o convênio por sua característica

eminentemente cooperativa, pura, onde não brotariam quaisquer efeitos

contratuais, deveriam considerar nulas cláusulas de permanência obrigatória

ou mesmo as obstativas de denúncia do convênio a qualquer momento, ou

mesmo a eventual previsão de sanções pela retirada de um dos partícipes,

promovendo-se a respectiva prestação de contas. Isso não é assim; basta ver o

que dispõe a Lei 8666/93 que prevê expressamente a possibilidade de denúncia

dos ajustes conveniais, nos termos do art. 116, § 6º. Ou seja, há um sinalágma,

obrigações recíprocas vinculam as partes ou os partícipes e, portanto,

responsabiliza os pactuantes em vista das opções que fizerem durante a

execução do ajuste: recebe ele o nome que receber, convênio ou contrato.

É possível, pois, no instrumento do convênio, incluir cláusulas

nitidamente contratuais, prevendo-se, inclusive, penalidades para a hipótese de

ferimento de cláusulas tidas como conveniais. Se é verdade que as entidades

não-estatais podem ser beneficiadas pelo fato de receberem recursos do Poder

Público, nada impede (a lei não impede) que havendo desobediência aos

princípios e regras que legitimaram tais subvenções arquem com sanções que

devem (para defesa do interesse público) ser previstas no instrumento de ajuste,

no convênio.

Ora, não tem pertinência ou lógica argüir-se que eventuais sanções

venham para transmudar a natureza jurídica de convênio para contrato, de

instrumento cooperativo para comutativo, porquanto, da mesma forma, não se

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poderá negar que convênios, sem transfigurarem sua natureza comportam

cláusulas nitidamente contratuais como as de remuneração (tipicamente

comutativa), escritas sob a forma de repasses de verbas. É da lei que se retira

esta conclusão, novamente dos termos do art. 116, caput da Lei nº 8.666/93,

uma vez que todas as previsões contidas na lei devem se afeiçoar com a

natureza dos convênios acarretando subsunção imediata, como é o caso do

apenamento por conduta faltosa do conveniado, quando firmado o convênio

entre a Administração e particulares.

Sustentar, então que o convênio não goza de autonomia, que,

portanto, não se trata de pacto distinto de contrato não será nada absurdo, ao

contrário, por serem (ou poder ser) categorias da mesma natureza, pertencentes

à categoria contratual estar-se-á gerando segurança jurídica e estabilidade

institucional na gestão dos negócios públicos e privados. Vejamos, pois, como

isso é possível e o quanto esta definição importa para a conformação da

opinião que haveremos de emitir ao final. As obrigações assumidas em sede de

convênio, por atribuírem-se-lhe características próprias não podem ser capazes

de prejudicar direitos de terceiros, como é o caso das concessionárias dos pólos

rodoviários no Rio Grande do Sul. Vejamos:

a) quanto à reciprocidade de obrigações indicada como fator

distintivo, pode se verificar que os convênios envolvem encargos

recíprocos: por exemplo, convênio firmado entre um Estado e um

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Município para construção de uma escola, em que ao primeiro cabe

a obra e ao segundo o oferecimento do terreno;

b) quanto aos interesses, a presença do Poder Público num dos pólos

levaria a concluir que o interesse público será o fim perseguido

tanto por convênios quanto por contratos; Nada, todavia, autoriza

afirmar que a presença de particulares num dos pólos do ajuste

induziria à sentença de que não se está a perseguir e proteger o

interesse público, uma vez que esse fato, por si, deslegitimaria

tanto o convênio quanto o contrato;

c) quanto aos resultados comuns, eles estão presentes no mundo dos

contratos, aos moldes do que afere nos contratos celebrados entre

entidades estatais;

d) quanto à competência comum do mesmo modo não faz distinguir

um ajuste do outro, uma vez que, nos convênios firmados entre

entes estatais e particulares inexiste a chamada competência comum

entre os partícipes;

e) quanto à remuneração, finalmente, é de verificar-se o próprio caso

posto em exame, a concessão de rodovias para particulares, onde

quem remunera o concessionário não é o contratante mas sim o

usuário dos serviços disponibilizados.

A definição de traços que separam o contrato administrativo do

convênio administrativo tem mais função pedagógica do que prática. Todavia,

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o esforço que a doutrina faz para distingui-lo termina por gerar graves

prejuízos no manejo destes relevantes instrumentos. Em verdade, terminam por

perderem de vista os objetivos para os quais tais instrumentos têm existência.

A par das dificuldades demonstradas na doutrina em separar o que

a vida não separou, optamos, e da leitura dos instrumentos postos em comento,

pode-se afirmar que o “convênio de delegação” celebrado entre o Estado do

Rio Grande do Sul e a União Federal é verdadeira espécie de convênio-

concessão, portanto, figura com natureza preponderantemente contratual capaz

de gerar obrigações recíprocas e exigíveis, de parte a parte, pelos integrantes da

teia complexa de relações jurídicas que restou fundada pelo nominado

“convênio de delegação”. Não fosse pela carga obrigacional recíproca que

contém, seria pela produção necessária de instrumentos (também

nominalmente) contratuais que este ajuste de condutas determinou existirem,

pena de incumprir-se o objeto avençado: falo dos contratos de concessão dos

pólos rodoviários que brotaram da vontade explícita dos Entes públicos

convenentes em transferir atividades típicas de Estado aos particulares. A não

entrega dos pólos rodoviários às concessionárias determinaria a morte do

chamado convênio de delegação por absoluta inanição em seu objeto fundador.

Não é o caso.

Definida esta questão, sobre a natureza jurídica do “convênio de

delegação” – convênio-concessão –posto em causa, poderemos avançar para

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examinar a denúncia promovida por uma das partes e que atinge diretamente a

interesse de “parte legítima” naquela relação jurídico-contratual.

a.2. Do objeto conveniado

O Convênio de delegação firmado pelos Entes estatais se anuncia

do seguinte modo:

“ O presente instrumento tem por objeto a delegação, da União para o Estado do Rio Grande do Sul, da administração de rodovias e exploração de trechos de rodovias federais, nos termos da Lei n. 9.277, de 10 de maio de 1996, e da Portaria n. 368, de 11 de setembro de 1996, do Ministro dos Transportes, identificados na Cláusula Segunda.” (omissis)

Logo a seguir, explicitamente, as partes firmatárias instituem os

pólos respectivos, que para efeitos de transcrição valer-nos-emos do convênio

n. 09/96, que assim versa:

“As rodovias federais delegadas à administração, compreendidas dentro do território do DELEGATÁRIO e os trechos de rodovias federais para fins de exploração correspondem ao pólo de

concessão METROLOLITANO/RS, consoante programa aprovado pelo DELEGANTE e são abaixo nominados:” (grifos nossos) (omissis)

Portanto, dois Entes Estatais se reúnem para efeitos de

estabelecerem política pública comum e, para tanto, avençam que, uma vez

determinada a malha rodoviária que haveria de ser servida pelo programa,

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haver-se-ia de CONCEDÊ-LA, e assim o fizeram mediante procedimento

licitatório levado a efeito pelo Estado do Rio Grande do Sul.

A este propósito, por exemplo, é de ver-se que o EDITAL DE

PRÉ-QUALIFICAÇÃO n. 75/96 do Departamento Autônomo de Estradas de

Rodagem do Rio Grande do Sul diz textualmente no seu item 18.2. que:

“Esta licitação rege-se (g.n) pelas disposições aplicáveis dos seguintes instrumentos legais, além das normas estabelecidas neste EDITAL e consolidadas em AUDIÊNCIA PÚBLICA, realizada em 15 de julho de 1996, na cidade de Porto Alegre. (omissis) III – Lei Federal 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, que dispõe sobre a concessão e prestação de serviços públicos; IV – Lei Federal n. 9.277, de 10 de maio de 1996, que autoriza a União a delegar a administração e exploração de rodovias federais; (omissis) IX – Convênio n. 012/96.de 29 de dezembro de 1996, de delegação para a Administração de Rodovias e Exploração de Trechos de Rodovias Federais.” (g.n.)

Ademais, para efeitos de concretização do programa de concessões,

convencionaram, o Estado do Rio Grande do Sul e a União, termos da Cláusula

Terceira, que:

“O DELEGATÁRIO exercerá a administração e a exploração da rodovia e dos trechos rodoviários delegados mediante concessão, de acordo com programa aprovado pelo DELEGANTE, que passa a fazer parte integrante deste convênio, independentemente de transcrição.”(grifos nossos)

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Ou seja, o Programa Estadual de Concessão de Rodovias, aprovado

por Lei Estadual, pólo a pólo, é parte integrante do chamado convênio de

delegação por força de disposição da avença celebrada entre os entes

federados. Afirme-se, tal é o vínculo estrito e direto entre a União e os pólos

que o § 3º. da cláusula Terceira define o rateio do produto dos recursos

provenientes da verba de fiscalização entre os intervenientes dos convenentes

DAER e DNER (atualmente pela ANTT nos termos do art. 24, inciso VI da Lei

10.233/2001).

Portanto, em vista do clausulamento específico constante no

convênio, pode-se afirmar sua natureza predominantemente contratual em vista

das obrigações que constituiu de parte a parte e, sobremaneira, em vista pelos

instrumentos que determinou fazerem parte de si.

Trata-se, pois, de convênio-concessão, repita-se, com eficácia

nitidamente contratual, onde o objeto ajustado afirma-se, no fundamental, ao

seguinte:

1. Delegar os trechos de rodovias federais que descreve; 2. Assegurar que o Programa Estadual de Concessão de Rodovias esteja integrado ao próprio convênio – como derivação contratual, termos da cláusula terceira – mediante aquiescência direta do delegante a este programa estadual bem como fazer com que as derivações do programa, os contratos de concessão, dele, convênio, sejam parte integrante; 3. Assegurar a partição da verba de fiscalização entre os intervenientes dos entes federados, DAER E DNER; 4. fixar os termos em que a União atuará na condição de interveniente, expressão do item 4 da cláusula terceira do convênio de delegação. 5. Transferir as competências relativas ao Exercício do Poder de Polícia administrativa do delegante ao delegatário; 6. Afirmar que o delegante poderá destinar recursos financeiros destinados à construção, conservação, melhoramento e operação das rodovias ou trechos de rodovias federais, termos da cláusula nona; 7. Afirmar os termos em que eventual denúncia poderá se realizar; e,

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8. Definir os termos em que poderá ocorrer a sub-rogação nos contratos derivados do convênio de delegação, parágrafo 3º. da cláusula décima-segunda.

Ora, a definição do objeto do acordo é relevante para que dele,

ajuste, extraiamos os efeitos jurídicos capazes de vincular materialmente as

partes e mesmo às concessionárias que contrataram com o Estado para efeitos

de exploração do serviço público em vista do instrumento fundador.

Mais do que isso, é relevante, a partir do objeto do convênio-

concessão, perceber-se que a União Federal é parte nos contratos de concessão

firmados a partir do Programa Estadual de Concessão de Rodovias do Estado

do Rio Grande do Sul, forte na Cláusula Terceira do Instrumento de ajuste.

É assim que, do exame do objeto convenial, poderemos sacar a

adequada natureza jurídica; portanto, os efeitos irradiadores do instrumento

pactual residem nas obrigações que foram assumidas e nos deveres que foram

impostos de parte a parte. É assim que as concessionárias vincularam-se

indiretamente a União desde o início do Programa Estadual de Concessão de

Rodovias, na medida em que, do objeto ajustado, percebe-se que os contratos

de concessão aderiram, por cláusula expressa, ao convênio inaugural.

a.3. O Poder Concedente e as concessionárias

É por isso que se pode afirmar com tranqüilidade que O Estado do

Rio Grande do Sul, ao exercer a administração do programa por delegação

convenial, tem consigo a União Federal como partícipe indireto desta

administração.

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O Edital de pré-qualificação, o edital de convocação para a

participação da iniciativa privada no certame licitatório deu vazão ao disposto

no parágrafo Primeiro da Cláusula Terceira do Convênio, visto que assim o

DELEGATÁRIO assumia sua obrigação de natureza contratual, verbis:

“Para os fins previstos neste convênio, o DELEGATÁRIO promoverá a correspondente licitação para a outorga de concessão (omissis)”

Já no Parágrafo Segundo da mesma Cláusula, de modo

parcimonioso, o ente federado DELEGANTE assegura-se que a legislação

aplicável ao certame poderá ser a estadual “desde que não contrarie a

legislação federal”. Numa primeira vista pode parecer um excesso do

DELEGANTE em preservar a Lei Federal. Ocorre que em matéria de licitações

há competência comum para que os Estados legislem sobre esta matéria,

termos do art. 24, § 2º c/c art. 22, XXVII e art. 241, todos da Constituição

Federal.

Ora, em verdade a Legislação de regência sobre a matéria é Lei

Federal onde o DELEGANTE concedente se pode afirmar legitimamente. A

legislação estadual e os atos administrativos posteriores estão subordinados à

capacidade legal do DELEGANTE. Portanto, é lícito e adequado afirmar, por

enquanto, que a União Federal, por interveniência, primeiro do DNER, e

atualmente da ANTT, integra o pólo ativo da relação contratual de concessão.

São os termos do convênio que determinam que os instrumentos,

todos, firmados a partir dele, nele integrar-se-ão, o que, produz, por evidente,

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solidarização quanto ao cumprimento das obrigações nascidas a partir daquela

avença produzida entre entes estatais.

A este propósito não custa referir o que o Judiciário Federal vem

decidindo sobre este tema:

“Existência de responsabilidade solidária entre os convenentes, de modo que qualquer deles pode ser responsabilizado integralmente pela totalidade da obrigação de indenizar. Art. 896, 904 e 1.515 do CC. Hipótese que enseja a formação de litisconsórcio facultativo.” (REsp. 461.823-PR)

O Acórdão revela-se interessante, pois, seu núcleo decisório afirma

que, mesmo diante da existência de cláusula expressa elidindo a

responsabilidade da União, não haverá eficácia, face à responsabilidade

solidária que existente entre os convenentes. Assim refere:

“A Cláusula Quarta, item 1, inciso C do convênio 004/96 não tem o condão de excluir a responsabilidade solidária dos demais convenentes.” (idem)

Ora, querer infirmar que o Poder Concedente nas concessões

rodoviárias do Rio Grande do Sul é exclusivamente o Estado seria desconhecer

os instrumentos que fizeram nascer o Programa Estadual de Concessão de

Rodovias e mesmo o processo licitatório que vinculou particulares à prestação

de serviço público delegados pela União Federal nos termos do convênio de

delegação, verdadeiro convênio-concessão, que ajustou com o Estado.

Na mesma esteira há de perceber-se que a União Federal, tanto

quanto o Estado do Rio Grande do Sul, não podem se eximir de obrigação que

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contratualizaram em vista de suas vicissitudes, opções políticas ou inapetência

para decidir, ou mesmo qualquer causa que não esteja diretamente vinculada a

execução contratual. No ponto, onde necessitamos definir o Poder Concedente

desta relação jurídico-material deveremos recorrer novamente ao Judiciário

Federal quanto assim se expressa:

“A União é parte legítima para figurar no pólo passivo da presente relação processual. A União nos termos da lei 9.277/96, art. 1º, delegou a administração de rodovias e exploração de trechos de rodovias, ou obras rodoviárias federais. Ora, na delegação transfere-se a execução de serviço público, mas não sua titularidade. Assim persiste o interesse da União na solução desta demanda.”(Apelação em ação civil pública 2002.04.01.022691-3/PR) (grifo nosso)

A titularidade que não se transfere é a dominial, ou seja, aquela que

atribui ao “dono”, determinadas capacidades e responsabilidades sobre a coisa

que o ato jurídico eventualmente se lhe transfira a posse, por qualquer título

que seja, não tem a possibilidade de retirar aqueles atributos originários.

A titularidade dominial é relevante para efeitos de compreender os

pólos da relação jurídico-material, no caso, de índole administrativa. O

programa está integrado por rodovias estaduais e federais, portanto há carga

jurídica que expõe ambos os entes federados, o que não somente se lhe impõe

obrigações relativas ao cumprimento do contratado como lhe impõe deveres de

natureza processual.

Então, pode-se retirar da teia contratual a seguinte definição: A

União é concedente pela via da delegação que fez para efeitos de administração

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e exploração; o Estado é concedente uma vez que delegatório daqueles

misteres. Se aquela é concedente, o é pela via originária nascida do domínio.

Se este o é, é pela derivação da relação Convenial/contratual que lhe impões

encargos de administração sobre o bem público federal. A união é

concessionária mediata; o Estado, concessionário imediato. Ambos entes

federativos, portanto, concedentes.

É por isso que os concessionários podem pedir, imediatamente ao

Estado e, meditamente, a União.

b. A denúncia

O Convênio de delegação foi denunciado por ato do Governador do

Estado do Rio Grande do Sul. O mais alto mandatário Estadual dirigiu-se ao

Ministério dos Transportes e a Agência Nacional dos Transportes Terrestres. A

este o fez diretamente, àquele por intermédio de cópia do instrumento

extintivo. Por que assim o fez, é matéria a ser estudada, uma vez que a

Administração Pública, por seus servidores, principalmente quando se trata do

Governador do Estado, deve ter uma idéia mínima, pelo menos, dos efeitos

jurídicos que os contratos que administra produzem, e deveriam saber,

portanto, identificar correta e adequadamente os órgãos estatais que fazem

parte da relação administrativa sobre a qual se debruçam para desincumbirem-

se de encargos públicos. Disse isso, o porquê da relevância em compreender a

opção política feita pelo Ente federado convenente. No mínimo, quando o

Governador decidiu sobre o convênio, foi inconveniente, face aos termos em

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que declarou suas razões. O desfecho desta inapetência para o cometimento do

ato administrativo é o perigo a que o interesse público foi exposto.

O instrumento utilizado pelo Governador foi o previsto no

convênio de delegação: a Denúncia.

b.1. A denúncia no direito privado

Denunciar é dar a conhecer a parte ex adversa da intenção de

extinguir a relação contratual. A denúncia, no mundo privado, pode se realizar

de forma cheia ou vazia. Esta, sem que o contratante tenha o dever de motivá-

la, aquela com o elencamento dos motivos que a justificam. Trata-se, pois, de

forma de extinção do vínculo contratual. Os efeitos da denúncia no mundo dos

contratos privados estão na lei civil e nos próprios termos contratuais. Do

mesmo modo, a forma com que o ato adquirirá existência está posta na

liberalidade das partes contratantes; poderá ser expressa ou tácita, a depender

da vontade livre das partes.

É relevante para o presente parecer fixar que se trata de forma

extintiva de uma relação jurídica obrigacional e que, portanto, litígios sobre o

exercício desta condição potestativa (arbítrio, juízo de subordinação), poderão

orbitar em torno de indenização capaz de repor a esfera patrimonial daquele

que se entender prejudicado pela prática do contratante adverso, equilibrando,

assim, a relação jurídica de direito material. A eventual indenização, para o

mundo do direito privado, é suficiente para equilibrar as esferas patrimoniais

que contratam.

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No mundo do direito público é diferente. O que está em questão

não é o equilíbrio patrimonial das partes, mas sim o interesse da sociedade

incrustrado nesta ou naquela instrumentalidade formal (contrato administrativo,

convênio, consórcio, etc.).

Portanto, não se há de trazer, neste ponto, variável de direito

privado para compreender a denúncia no direito público. Como veremos,

mesmo o exercício da denúncia em determinados contratos públicos não o

extinguem mas limitam-se a modificar a relação jurídica num dos seus pólos e

nunca, jamais, a denúncia terá o condão e impedir a prestação do serviço

público a que a avença administrativa se propôs. É o que veremos

b.2. A denúncia no direito público

O administrador público exerce uma função, estando obrigado pela

lei a atender ao interesse público. O faz trilhando caminhos pré-determinados,

condicionando o processo de avaliação subjetiva aos interesses máximos da

sociedade insculpidos e anunciados na ordem jurídica. Assim, a doutrina busca

compreender a ação do administrador público e os meios pelos quais esta ação

se concretiza na vida real. Portanto, quando o administrador determina a

pavimentação de uma estrada ou a construção de um prédio estará cometendo

atos administrativos de natureza material; quando loca um imóvel cometerá

um ato administrativo jurídico de direito privado; ou, quando nomeia um

funcionário, aplica uma multa de trânsito, estará no cometimento de um ato

administrativo de direito público.

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Portanto, os atos administrativos são aqueles praticados pelo

administrador público no exercício da função administrativa onde, para

concretizá-los, o administrador examina as condições e circunstâncias de fato

e do ordenamento jurídico vigente para efeitos de sua edição. Diante da

pluralidade de possibilidades que o ordenamento jurídico oferece ao

administrador, este deverá proceder uma escolha de acordo com o direito e

com o interesse público. É este o sentido de o Direito Administrativo erguer-se

por sobre tantos e sólidos princípios doutrinários: legalidade, moralidade,

publicidade, boa-fé, motivo e motivação, eficiência, proporcionalidade,

legitimidade e responsabilidade objetiva da administração pública, são

exigências postas no Ordenamento Jurídico, seja na Constituição seja na lei.

Então, quando necessitamos abordar o tema denúncia em contrato

público, na primeira hora, há de atentar-se que se trata de uma espécie de ato

administrativo. Trata-se, pois, de uma escolha procedida pelo administrador no

exercício da função pública e, assim, deverá, para aperfeiçoar (concretizá-lo de

acordo com o ordenamento) o ato administrativo recorrer a toda carga

principiológica capaz de legitimá-lo e fazer viver (cumprir a função para a qual

foi chamado).

Dito isso, é possível afirmar que a denúncia contratual procedida

em sede de contrato público, tomando-se a terminologia privatista, jamais

poderá ser vazia. Haverá, sempre, de ser cheia, pela singela razão de que cabe

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ao povo saber os motivos pelos quais o agente público adota esta ou aquela

possibilidade que a lei lhe defere.

Ademais, para efeitos de exercício do controle judicial sobre os

atos administrativos e mesmo para efeitos de autotutela administrativa, é

indispensável que os motivos e as razões que conduziram à escolha estejam

devidamente registrados e anunciados.

Afirmar o contrário é negar 250 anos de construção do Estado

Liberal Moderno.

b.3. A denúncia no Convênio

O convênio de delegação traz em sua cláusula décima segunda a

seguinte hipótese normativa no que refere a possibilidade para o exercício da

denúncia:

“As partes poderão denunciar o presente convênio, mediante notificação, com trinta dias de antecedência. § 1º - Constituem motivos para a denúncia deste convênio a superveniência de ato, fato ou lei que o torne inviável, a conveniência administrativa devidamente justificada, ou a inadimplência de quaisquer de suas cláusulas e condições, responsabilizando-se a parte que der causa à denúncia pelas respectivas indenizações. § 2º - A denúncia deste Convênio, por qualquer das partes, não prejudicará o contrato de concessão dele decorrente. § 3º - Na verificação da hipótese prevista no item anterior, operar-se-á a sub-rogação do DELEGATÁRIO pelo DELEGANTE nos direitos e obrigações do contrato de concessão.”

Da redação da Cláusula infere-se conclusões diretas, a saber:

1) Há forma expressamente avençada para denunciar: a notificação;

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2) Há prazo mínimo para que uma parte exerça seu direito: 30 dias de antecedência ao termo que se desejar fixar;

3) Os motivos para que a denúncia seja legítima são os seguintes:

a) Ocorrência de ato ou fato superveniente ou lei que o torne inviável. Ou seja, não basta o ato, fato ou lei, é necessário que a sua superveniência o torne inviável;

b) Conveniência administrativa devidamente justificada.

c) Inadimplência contratual por qualquer das partes

Já as conseqüências para o exercício da faculdade

convenial/contratual, são, também, evidentes:

1) A parte que der causa à denúncia responsabiliza-se por eventuais indenizações;

2) Os contratos de concessão decorrentes (esta a expressão do convênio) da avença não serão prejudicados;

3) O DELEGANTE, e somente ELE, sub-rogar-se-á nos direitos e obrigações do contrato de concessão.

Antes de prosseguir é relevante fazer duas anotações: primeiro, o

convênio reconhece e toma para si os contratos de concessão (termos do § 2º

da Cláusula Décima Segunda combinado com o caput da Cláusula Terceira e

Cláusula DécimaTerceira); segundo, somente a União poderá sub-rogar-se nos

direitos dos contratos de concessão ( o que a primeira vista pode parecer

óbvio).

Avançando. No que refere a denúncia a ser exercida em contrato ou

convênio público não existe, como já dito, a possibilidade de fazê-la sem a

adequada justificação, não fosse pelo móvel que conduz a decisão

administrativa, ato administrativo, seria por disposição do próprio ajuste que

expõe os motivos aceitáveis para efeitos de resolução contratual ou convenial.

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Assim, a denúncia no caso concreto somente poderá legitimar-se se

estiver vinculada aos termos do convênio que a admite. Por isso é lícito afirmar

que se trata de ato administrativo vinculado na medida em que o administrador

estará preso aos motivos que alegar para o exercício da prerrogativa (teoria dos

motivos determinantes), pena de nulificação do ato.

Portanto, resta saber se os motivos são suficientes para legitimar o

ato extintivo da obrigação contratual bem como os efeitos que a decisão

administrativa produzirá sobre as partes, sobre os partícipes, desta relação que,

como já observamos à saciedade é prenhe de obrigações, deveres, sanções, e

interesses que se compõe no âmbito dos negócios públicos.

b.3.1. Os termos do Governador

O administrador público no uso de sua competência legal dirigiu-

se a Agência Nacional dos Transportes Terrestres exercendo a prerrogativa

ajustada para denunciar o convênio de delegação firmado com a União

Federal. Assim procedeu oferecendo ciência ao Senhor Ministro dos

Transportes na medida em que este é partícipe da relação jurídica firmada na

condição de interveniente, tendo, inclusive, força de disposição convenial,

assinado os contratos de concessão dos pólos rodoviários do Rio Grande do

Sul.

Em síntese o Governador do Estado em 12 de janeiro de 2006, por

ato administrativo próprio, ofício 007/06-GG, invoca as competências legais

atribuídas à ANTT, termos da Lei Federal 10.233 de 5 de junho de 2001. O

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Governador é expresso quando se refere às competências gerais e específicas

daquela Agência e mais, afirma a impossibilidade do Estado em adimplir

Cláusula Contratual relativa ao equilíbrio econômico-financeiro. Invoca, então,

“importantes tarefas institucionais” que a ANTT estaria incumbida por força de

lei.

Ao final, o Senhor Governador notifica a União, nos termos da

Cláusula décima segunda e seus parágrafos primeiro e segundo – denúncia –

“demandando ingresso da ANTT nas questões invocadas” e, de forma

destacada, afirma a incidência do parágrafo terceiro da mesma Lei. Ou seja, diz

que o DELEGANTE haverá de tomar o lugar do DELEGATÁRIO nos

contratos de concessão mantidos em vista do convênio de delegação originário.

Em suma, o Senhor Governador procede o ato administrativo

observando os requisitos substanciais capazes de lhe entregar legitimidade.

Indica a situação de fato que o leva a exercer o permissivo ajustado (legal).

Ademais, motiva o ato de forma suficiente quando refere-se a

impossibilidade de solver a questão relativa ao equilíbrio econômico e

financeiro dos contratos e na relevância da continuidade da prestação dos

serviços públicos.

b.3.2. Efeitos

A motivação oferecida ao ato administrativo deverá consubstanciar

a conjugação de dois elementos fundamentais, a saber:

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a) circunstâncias fáticas positivadas;

b) os requisitos legais típicos.

As circunstâncias de fato estão oferecidas pelo senhor Governador

do Estado quando afirma o seguinte:

1) “atualmente, o Estado enfrenta problemas no que toca à definição do chamado

equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão. Prova disso é a

edição de várias leis estaduais, sempre postergando a definição deste equilíbrio.”

2) “Em vista de todo o exposto, e com fundamento na legislação invocada (...)

bem como do contexto que envolve a matéria no cenário gaúcho, conforme

exposto supra (...)”

Com as referências acima o Senhor Governador faz a mostra do

fato superveniente autorizador para o exercício da prerrogativa convenial.

Diz o Convênio, Cláusula Décima Segunda, parágrafo primeiro,

que “constituem motivos para denúncia deste convênio a superveniência de

ato, fato ou lei (...)”, como o que o Estado motiva suficientemente o ato

administrativo legitimamente que notifica a União.

Já os requisitos legais estão compreendidos no permissivo

convenial/contratual bem como na competência que o mais alto mandatário do

Rio Grande do Sul detém para exercer a opção político-administrativa.

E neste ponto, é de verificar-se a exaustiva capitulação legal que o

Estado convenente reproduz para legitimar a denúncia e para, por consectário

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convenial, noticiar a sub-rogação, nos termos do Parágrafo Terceiro da

Cláusula de denúncia.

Ressalte-se que a motivação para adquirir legitimidade deverá ser

suficiente, portanto deverá ser capaz de expressar a opção administrativa,

bastante para os fins do ato, hábil, pois, para conduzi-lo à sua finalidade.

É de se afirmar que uma motivação singela não é sinônimo de não-

motivação.

Não custa, pois, recuperar três características básicas do ato

administrativo: é manifestação de vontade do poder estatal que possui objeto

lícito por presunção e, pode gerar efeitos jurídicos imediatos (executoriedade

imediata, independentemente do pronunciamento do poder judiciário).

Estas características estão presentes no ato de denúncia do Senhor

Governador do Estado do Rio Grande do Sul na medida em que o agente

público competente expressou o desejo da administração convenente;

denunciou em vista dos termos que o convênio e a lei permitiam e, desde o

momento da fluência do prazo notificatório, independentemente de

manifestação judicial, podem as partes envolvidas ou afetadas manejarem

direitos que entendem espargir do ato resilitivo.

O contrário, afirmar que o ato administrativo do Estado não

preenche os pressupostos legais não retira, per se, sua capacidade auto-

executória. Se assim desejarem fazer, a via adequada é a do controle judicial

sobre os atos da administração, até porque, no caso presente, não pode um ente

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federado sobrepor-se a outro. É nesta obra que o ofício do Senhor Ministro dos

Transportes não tem o condão de obstar a eficácia do ato resilitivo. Em

primeiro lugar, como já dito, não pode um ente federado preponderar sobre o

outro e, em segundo, não tem o Ministro competência para agir na matéria, vez

que a interveniência, efeitos da Lei 10.233, é da Agência Reguladora.

Diante disso, o efeito primário decorrente da expedição do ato de

denúncia é o fato resilitivo. Ou seja, o § 3º o Convênio de Delegação incidirá

como invocado pelo Estado, produzindo os efeitos jurídicos da sub-rogação.

Ou seja, o Delegante, a União Federal, por intermédio da ANTT, assume o

pólo ativo dos contratos de concessão mantidos com as empresas

concessionárias dos pólos rodoviários integrantes do programa estadual de

concessão de rodovias.

c. A Sub-rogação como categoria jurídica

Em termos amplíssimos, sub-rogar significa substituir, pôr uma

pessoa no lugar de outra (pessoal) ou uma coisa no lugar de outra (real). Nossa

tradição (quanto ao modelo – eficácia – da sub-rogação) aproxima-se do direito

francês e do italiano, onde é meio indireto de pagamento. Já no direito

português a sub-rogação é meio de transmissão das obrigações. A sub-rogação,

pois, importa, em fato extintivo satisfatório ou não satisfatórios, podendo,

nessa via, produzir adimplemento com extinção da relação obrigacional ou não.

Deve-se, pois, distinguir as hipóteses de satisfação do credor: a) satisfação sem

liberação (no caso da substituição do credor); b) satisfação sem adimplemento

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(quando ocorre de fato natural, ou de terceiro ou do próprio devedor); c) da

eliminação do escopo ou do interesse do credor (quando não pode ser mais

realizado ou não existe). Esta a doutrina de Pontes de Miranda. No direito civil

brasileiro o adimplemento por terceiro é o habitual, sendo que a sub-rogação

relativamente ao próprio devedor ocorre quando há distinção patrimonial.

Havendo patrimônios distintos, a pessoa, que é o devedor, pode adimplir ao seu

credor com recursos de outro patrimônio, e tudo se passa como se fosse

terceiro. No Novo Código Civil, é no Título III , Capítulo III (arts. 346 a 351)

que está desenhando o cerne da estrutura legal que compõe o modelo, o qual é

completado por força dos modelos negociais, advindos da força do poder

negocial, já que admitida a chamada sub-rogação convencional (art. 347).

Encontraremos normas legais acerca da sub-rogação nos arts. 259, parágrafo

único, 304, caput e parágrafo único, 305, 831, etc. É importante afirmar que na

sub-rogação negocial (art. 347) se dá a substituição de um credor pelo outro,

permanecendo todos os direitos do credor originário (sub-rogante) em favor do

novo credor (sub-rogado).

Todavia, como já alhures afirmava, não se há de confundir

institutos de direito público com os de direito privado, em que pese, haver

momentos em que, para compreender aquele, indispensável o conhecimento

deste.

Diz a lei de licitações em seu art. 72 que “o contratado, na

execução do contrato, sem prejuízo das responsabilidades contratuais e legais,

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poderá subcontratar partes da obra, serviço ou fornecimento até o limite

admitido, em cada caso, pela administração.” E isso é assim porque não se

admite a natureza personalíssima no contrato administrativo. A atividade

administrativa do Estado se rege pelo princípio da impessoalidade, o que

significa afirmar que as características pessoais do contratado não se

configuram como fator relevante para a contratação. A licitação, pois, é

procedimento desvestido preferências subjetivas, onde critérios objetivos

norteiam o exame que será procedido sobre os particulares que acorrerem ao

Estado.

A impossibilidade de que o eventual contratado venha a transferir

ou ceder para terceiros a execução das obrigações que se incumbiu é regra

administrativa decorrente de expressa disposição de lei. A lei autoriza, porém,

que a Administração, caso a caso, pondere a conveniência de permitir a sub-

contratação, ou seja, de permitir a substituição de uma parte para outra sem

que, com isso, ocorra efeito liberatório; e tudo isso observados os limites pré-

determinados.

Neste passo, a escolha da administração deve pautar-se pelos

princípios que materialmente orientem a atividade privada como modo de

cumprir o princípio da eficiência e da economicidade. Se determinada

atividade na iniciativa privada opera com sub-contratação para a execução de

certas obrigações, o edital licitatório deverá permitir que tais procedimentos se

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repitam na execução do contrato administrativo. Tudo, devidamente motivado

e, por óbvio, subordinado ao interesse público.

O que importa repetir é que o ato de sub-rogação – subcontratação

– não retira a responsabilidade do subcontratante frente a administração uma

vez que o ato não é liberatório.

No regime de Concessões o instituto opera do mesmo modo.

Entretanto, pode-se afirmá-la como subconcessão.

Importa, todavia, os termos do § 2.º do art. 26 da Lei de

Concessões onde se prevê a sub-rogação do subconcessionário em todos os

direitos e obrigações do concessionário, nos limites da subconcessão.

É de ver-se que no convênio de delegação firmado entre dois entes

federados, a finalidade ali consignada reside em implantar a concessão de

serviços públicos por intermédio da conjugação de esforços daqueles entes com

o estabelecimento de obrigações recíprocas entre os convenentes. É nesta

medida que a União concede ao Estado rodovias sob sua titularidade dominial

e, permite que o Estado subconceda a exploração de domínio seu por

particulares. Tratamos, e a expressão é de Marçal Justen Filho, de verdadeiro

convênio-concessão, donde se pode extrair efeitos jurídicos próprios.

Então, a sub-rogação, em termos administrativos é ato que

reconhece a existência de um fato jurídico relevante que determina a

substituição, sem liberação, de uma parte/partícipe por outra na relação jurídica

de direito material, no contrato ou no convênio.

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Sendo assim, a condição para a sub-rogação é a existência do fato

jurídico denúncia. O convênio em comento determina que a sub-rogação é

hipótese derivada daquele fato, onde os motivos, suficientes, determinam,

expressamente, que o DELEGANTE assumirá o pólo ativo dos contratos de

concessão firmados com as empresas particulares.

Portanto, sub-rogar-se é assumir encargos e como tal a

administração somente os pode assumir por intermédio de ato administrativo

formal devidamente motivado. Afora isso, estar-se-á trilhando o caminho da

nulidade e, portanto, do sancionamento próprio que é a exclusão do ato ilegal

do mundo da vida.

No caso presente, houve o fato sub-rogação legitimado pelo ato

originário denúncia. Resta vir o ato administrativo procedente da União que

reconheça este fato jurídico.

c.1. A condição jurídica do sub-rogado: a União ou a

ANTT?

Não há dúvidas quanto ao sub-rogado. Este é a ANTT. Assim pode

ser sacado da lei federal especial em seus artigos Art. 13,I; art. 14,I, a; art. 24,

V e VI; art. 26,VI e 50, todos da lei 10.233/2001.

Ademais é de afirmar-se que a União, por seu interveniência,

originariamente o DNER e atualmente a ANTT, sempre esteve no pólo ativo

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das relações contratuais por força do que dispôs a Cláusula Terceira do

Convênio de delegação que assim versou, repetindo:

“ O DELEGATÁRIO exercerá a administração e a exploração da rodovia e dos trechos rodoviários delegados mediante concessão, de acordo com o programa aprovado pelo DELEGANTE, que passa a fazer parte integrante deste Convênio, INDEPENDENTEMENTE de transcrição”. (grifos nossos)

Ora, sempre a relação jurídica nascida do convênio foi solidária

entre União e Estado e, isso, em todas as derivações e instrumentos jurídicos

que nasceram em vista do convênio fundador.

c.2. Uma advertência necessária

É de se notar que a União Federal ao conceder rodovias e trechos

de rodovias sob sua titularidade dominial para exploração e administração do

Estado o fez mediante autorização legislativa, nos termos da lei 9.277, de 10 de

maio de 1996. E assim procede em vista do que dispõe a Constituição da

República. A onerosidade incidente sobre bem público demanda autorização

legislativa para admiti-la.

No caso da sub-rogação, onde o DELEGANTE, a União, assumirá

a administração e exploração de rodovias e trechos de rodovias estaduais, o

mesmo procedimento autorizativo é requerido. Vista a Legislação Estadual

vigente, perceber-se-á a ausência das autorizações, seja implícita ou

explicitamente.

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A este propósito consultar a Lei 11.090/98 bem como o Decreto

41.640/02 que a regulamenta. Ademais, importa ter-se em conta o disposto na

lei 10.086/94 especialmente no que respeita a parte final do seu art. 2º onde

torna indelegável o exercício do poder de polícia.

d. O caminho Jurídico a ser construído

Será oportuno, já por aqui, transcrever decisão do Tribunal

Regional Federal da 4ª. Região e do Superior Tribunal de Justiça, a propósito

da legitimidade de Entes federados para figurarem em qualquer pólo de

relações jurídicas processuais decorrentes de convênios de delegação da União

para os Estados.

“A União é parte legítima para figurar no pólo passivo da presente relação processual. A União nos termos da lei 9.277/96, art. 1º, delegou a administração de rodovias e exploração de trechos de rodovias, ou obras rodoviárias federais. Ora, na delegação transfere-se a execução de serviço público, mas não sua titularidade. Assim persiste o interesse da União na solução desta demanda.”(TRF Apelação em ação civil pública 2002.04.01.022691-3/PR) (grifo nosso) “Existência de responsabilidade solidária entre os convenentes, de modo que qualquer deles pode ser responsabilizado integralmente pela totalidade da obrigação de indenizar. (STJ 461.823-PR)

Portanto, qualquer caminho que se deva trilhar há de levar em

consideração esta questão que decorre da relação jurídica de direito material

estabelecida entre os convenentes. A disposição expressa de que todos os

instrumentos decorrentes do convênio dele venham a fazer parte,

“independentemente de transcrição” – Cláusula Terceira –, determinada que

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não há possibilidade de criar-se confusão quanto ao titular da Concessão que,

originariamente é a União Federal que a exerce por intermédio do Estado do

Rio Grande do Sul sendo este devidamente autorizado a celebrar contratos de

concessão com particulares.

O nó que impõe reflexão jurídica está na aparente anomia nascida

da contraposição de atos administrativos entre o Estado DELEGATÓRIO e a

União DELEGANTE. Enquanto aquele denuncia, esta, por intermédio do

Senhor Ministro dos Transportes, opõe contrariedade afirmando não estar o

instrumento resilitivo dotado das respectivas condições legais,

fundamentalmente, referindo-se a inexistência de motivação.

Ora, em primeiro lugar, a luz da Lei 10.233/2001, pode-se afirmar

que o Ministro dos Transportes não é competente para opor qualquer

contradição ao ato decorrente do convênio uma vez que a Lei atribui esta

competência à ANTT. Segundo, a inexistência, ao que se sabe, de qualquer ato

da ANTT negando as condições jurídicas do ato de denúncia faz eficaz o

instrumento eleito pelo Estado do Rio Grande do Sul, portanto, fazendo operar

a sub-rogação dos contratos de concessão nos termos do parágrafo terceiro da

Cláusula Décima Segunda do Convênio de Delegação.

Todavia, como se trata de ato administrativo, ato de aceitação do

fato jurídico expressa por um dos convenentes é necessário que a Agência o

produza, permitindo assim a assunção principal no domínio contratual.

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Então, a questão que surge é a seguinte: qual o meio adequado

para fazer com que a omissão do Poder Concedente seja suprida?

Uns dirão que o Poder Judiciário é a via correta. Outros, não.

Todavia, qual a medida é capaz de devolver segurança jurídica às relações

contratuais entabuladas entre particulares e o Estado e como torná-las

eficientes do ponto de vista de quem explora legitimamente atividade

econômica, portanto, com o desejo não menos legitimo de realizar seus

resultados?

Estamos convencidos que a via Judicial é a menos indicada, pelo

menos enquanto estratégia principal. Na verdade o que se necessita é definir

com clareza o bem da vida que as concessionárias perseguem. Com certeza não

estão a cata de um Poder Concedente. Este está aí: é o Estado em suas formas

de expressão. É a União ou a Unidade federada. No momento, é a União, na

medida em que inexiste qualquer ação que desconstitua o ato legitimo

praticado pelo Convenente denunciante. Portanto o ato administrativo de

denúncia está hígido e forte, sendo, pois, capaz de produzir, como está

produzindo, seus jurídicos efeitos.

Então, o que querem as concessionárias é o cumprimento dos

contratos de concessão e das leis vigentes de modo a produzir-se o

adequado reequilíbrio econômico e financeiro dos respectivos contratos.

Trata-se de obrigação contratual incumprida e declaradamente incumprida,

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como se pode extrair do documento de denúncia quando a inadimplência do

Estado deu azo à motivação ao ato administrativo.

d.1. O reequilíbrio econômico e financeiro dos contratos

Se o bem da vida que se persegue é o reequilíbrio econômico e

financeiro do contrato haveremos de explicitamente persegui-lo. Não se trata

de saber quem é ou quem não é o Poder Concedente. Não fosse pela inépcia de

eventual notícia para reequilibrar os contratos, seria pelo fato de que os

convenentes são responsáveis solidários, é a dicção jurisprudencial, pelas

relações jurídicas de direito material nascidas do convênio/contrato de

delegação.

Ora, se o motivo da denúncia é a impossibilidade de adimplir a

cláusula contratual econômica, e esse motivo foi suficiente para invocar-se o

parágrafo terceiro da cláusula décima segunda, onde o DELEGANTE, por

disposição clausular expressa, deve assumir o lugar do DELEGATÁRIO, como

proceder de outra forma que não seja a busca junto ao DELEGANTE, por

intermédio da ANTT, do cumprimento da cláusula contratual que assegura o

direito de manterem-se os contratos econômica e financeiramente equilibrados?

Se a alternativa fosse a judicial, que termos poderiam ser deduzidos

para que existisse um provimento jurisdional útil? Primeiro, poder-se-ia

invocar a incerteza quanto a quem os concessionários dever-se-iam dirigir para,

por exemplo, recolher a verba de fiscalização ou mesmo sobre a quem pedir

que o reequilíbrio se realizasse? Segundo, poder-se-ia requerer que o Juiz

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determinasse a União que fizesse o que deveria fazer, ou seja, que cumprisse

sua obrigação de fazer, declarando-se como Poder Concedente, portanto

suprindo o judiciário, em sede antecipatória, o reconhecimento de fato jurídico

aperfeiçoado, que demanda ato expresso da administração pública no sentido

de assumir os encargos decorrentes da sub-rogação.

Vejamos que em momento algum o bem da vida é perquirido ou

demandado, uma vez que não se trata de buscar o reequilíbrio econômico e

financeiro dos contratos. Ao contrário, abre-se espaço de cognição judicial para

que, em preliminaríssima, se defina qual o ente federado seria legítimo para

decidir sobre o bem da vida perseguido pelas concessionárias. Quer-se dizer:

alguns anos após o tráfego da demanda, poderemos sim, porque foi o caminho

eleito por quem pediu, a partir do trânsito em julgado da dicção judicial, buscar

aquilo que de fato, desde o início querer-se-ia ter buscado.

Portanto, tanto a via da consignatória, art. 895 do CPC, quanto na

da obrigação de fazer, art. 461, “a”; 632 e ss, todos do CPC (atenção para o art.

641) estaremos trazendo aquilo que seria a derivação de uma postulação

legitima para a condição de principalidade, ou seja, o que se quer, o que se

necessita, é o reequilíbrio dos contratos e, para tanto, a competência está

afirmada nos instrumentos administrativos que concretizaram os contratos,

inclusive, levando-os a integrarem o chamado convênio de delegação.

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Se do pleito administrativo houver lide, esta sim, com o objeto já

determinado – busca do reequilíbrio contratual – poder-se-á, por derivação do

pleito econômico, buscar-se algum remédio de índole jurisdicional.

Nesta esteira, poder-se-ia aguardar uma resposta taxativa do

parecerista quanto ao nomem iuris da demanda a ser eventualmente proposta.

Ora, pela linha que estamos assumindo, a eventual ação somente poderá ser

definida a partir do ato administrativo concreto que, eventualmente, atinja

direito das concessionárias. É neste caudal, que a principalidade da demanda

haverá de estar centrada na busca do reequilíbrio econômico e financeiro dos

contratos, uma vez que este é o bem da vida pretendido.

d.2. As preliminares para o conhecimento de um processo

de reequilíbrio

Se o bem da vida que estamos a perseguir é o reequilíbrio

econômico e financeiro dos contratos de concessão, e o é porque assim já o

deduzimos frente ao Estado do Rio Grande do Sul e o fizemos, também, junto

ao interveniente estadual, o DAER, e mesmo o conduzimos para a Agência

Estadual de Regulação, e se este pleito, obrigação contratual incumprida, foi o

motivo pelo qual o Governador do Estado Denunciou o Convênio de

delegação, como, então, não dar seqüência ao que está posto?

Produzida a denúncia, e ocorrendo como ocorreu a sub-rogação dos

contratos de concessão, devem as concessionárias argüirem diretamente a

ANTT para o cumprimento das cláusulas contratuais que regulam a matéria.

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Sem dúvidas, haverá uma preliminar para o exame do mérito posto

em causa junto ao órgão regulador: Será a ANTT competente para examinar a

matéria? Aqui o momento, e somente aqui, para, em caso de negativa, argüir-

se, num primeiro momento na sede do juízo coletivo da Agência sobre os

efeitos da denúncia do Estado do Rio Grande do Sul e sobre o seu efeito sub-

rogatório. Mais, somente este ato (se negativo) poderá ensejar uma demanda

judicial para efeitos de afirmar a condição de delegante que a União Federal

detém, e o detém desde o inicio.

Portanto, será na esfera administrativa que poderemos subordinar

as questões secudárias – quem é o poder concedente – a questão primária –

necessário reequilíbrio contratual.

Como veremos adiante, a via judicial direta, além de padecer de

problemas relativos ao cumprimento de condições da ação (inexistência de

lide), cria um ambiente político que autoriza – e até mesmo impõe – a

autoridade pública aguardar uma decisão definitiva acerca do tema posto em

sede jurisdicional.

É deste modo que opino por construir uma alternativa jurídica para

o caso, onde a via judicial é uma derivação possível, mas não necessária.

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d.2. O caminho judicial – razão ou lava-mãos?

A política tem dessas coisas: quando o ambiente proposto não é o

da decisão política, inexoravelmente quem tomou para si o encargo de decidir

o fará, com o paciente aguardo (e resguardo) do agente político.

Supondo-se que sobrevenha decisão judicial, em sede antecipatória,

que determine a União o cumprimento de uma obrigação de fazer, tomando

para si os contratos de concessão de rodovias, qual seria a atitude do

administrador público relativamente aos atos que dão vazão aos contratos,

especialmente os concernentes a alteração de preços e tarifas?

Antes da opinião, não é demais transcrever o que o Judiciário

Federal tem decido a respeito do tema:

“4 -(...) Há verdadeiro perigo inverso na demora, visto que a improcedência da demanda não poderá reparar o prejuízo caso a sentença – já que não poderá identificar todos aqueles que ao abrigo da decisão, trafegaram pelas estradas -, mas o comprovante de pagamento, título executivo, poderá viabilizar o ressarcimento dos valores pagos, se confirmada a final a sentença. 5 – Tratando-se de questão de significativa importância e que tal, deve ser tratada com cautela, não é recomendável que seja em execução desde já, provimento ainda não examinado na via ordinária pelo órgão hierarquicamente superior”(Proc. 1999.04.01.129496-2, 11/04/2001) “DIREITO DE RESSARCIMENTO. Os usuários que tiveram os valores cobrados indevidamente, tem direito ao ressarcimento. Desta forma os Réus são condenados à devolução dos valores cobrados a título de pedágio, cabendo aos prejudicados procederem à liquidação e na execução da sentença, na forma do art. 97 do CDC.” (TRF 4ª - Apelação Cível 2000.04.01.057802-0, 15/12/2000)

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Ora, se o nível de exposição do agente público estará medido pelo

tipo de decisão judicial, que somente ocorrerá no futuro, qual o motivo, qual a

razão para que ele assuma os riscos de operar uma decisão administrativa já

que há a potencialidade de decisão pela via judicante? Ademais, as incertezas

quanto ao procedimento reside no fato de que, em qualquer medida judicial que

se proponha, tanto a União como o Estado integrarão o pólo passivo da relação

processual, uma vez que a relação jurídica de direito material questionada é

exatamente a ajustada entre eles. O arbítrio da parte não é, de acordo com o

princípio dispositivo, suficiente para escolher a relação processual que deseja

estabelecer; fundamental, pois, que na demanda esteja expressa, minimamente,

a relação jurídica de direito material, pena de emendatio.

Então, colocar, de plano, a relação jurídica sub judice é dar ao Juiz

a possibilidade de solver a lide e sendo assim, a atividade administrativa, antes

principal, reduz-se a coadjuvância necessária; politicamente necessária.

Pode-se dizer que o ambiente, politicamente, chamado de pedágios

é um ambiente conturbado. Adquiriu certa autonomia política,

fundamentalmente quando ultrapassamos a fronteira do mampituba, para baixo.

Não se há de negar este fato político. E a política lida com fatos da política

onde o direito é instrumento para sua realização, nunca o contrário.

Todavia, há um bem juridicamente protegido e este deve ser

buscado. Então, reconhecer que há uma conturbação capaz de turvar a vista dos

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agentes públicos é condição para que se construa uma ação JURÍDICA

eficiente: capaz de entregar o bem da vida a quem se lhe interessa.

Buscar, portanto, tutela jurisdicional neste instante equivaleria a um

lava-mãos, ou melhor, a legitimar uma ação política de lava-mãos, pois quem

deve decidir terá o argumento – que hoje não tem – para não-decidir. Por outro

lado, o uso racional dos instrumentos jurídicos–racional porque diretamente

vinculado a perseguição do bem da vida –, por um lado não inviabiliza o uso

dos meios judiciais e por outro, permite que o administrador adote decisões

razoáveis, de acordo com o direito e com o interesse público.

Alhures diziam: a justiça tarda mas não falha. Hoje, diz-se: a

Justiça falha porque tarda! Este tardar é custo, e esse custo é suportado pelo

investidor privado. Verifique-se que mesmo a eventual antecipação da tutela,

simplesmente a antecipa protraindo o juízo definitivo para o final do processo.

Esse protraimento é custo, político e financeiro.

Conclusões

Retomando os questionamentos trazidos pela consulente:

1) Qual a natureza jurídica dos Convênios de delegação

firmados entre o Estado do Rio Grande do Sul e a União Federal?

Em verdade trata-se de convênios-concessão, com natureza

nitidamente contratual, onde há um plexo de obrigações infirmadas de parte a

parte, inclusive com a determinação expressa de que os contratos de concessão

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e demais instrumentos firmados em decorrência do ajuste originário nele

estarão integrados.

O ajuste gerou diretamente efeitos sobre empresas privadas que

acorreram a certame licitatório para desenvolverem atividades públicas stricto

sensu, ou seja, estão atingidas pelos efeitos jurídicos espargidos do convênio

inaugural.

2) Relativamente a denúncia, quais os efeitos estaria apta a

produzir face aos termos em que se concretizou?

A denúncia vem suficientemente motivada, portanto, apta para

produzir os efeitos jurídicos dela decorrentes, ou seja, o fato da sub-rogação

dos contratos de concessão com a susbstitução do DELEGATÁRIO pelo

DELEGANTE, termos do parágrafo terceiro da Cláusula Décima Segunda.

Portanto, motivada de modo bastante, infere-se que o pólo ativo da

relação jurídica material está ocupado pela ANTT, em vista do Convênio-

concessão e da Lei que a criou.

Uma vez editado o ato administrativo goza ele de presunção de

validade e legitimidade somente podendo ser retirado da vida pela revogação

ou pela anulação judicial, não cabendo ao Ente federado União negar-lhe

eficácia.

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3) Especificamente, no que pertine a sub-rogação, que direitos,

deveres ou obrigações emergiriam às Concessionárias?

Em verdade a União sempre esteve presente nas relações jurídicas

estabelecidas entre o Estado do Rio Grande do Sul e as empresas

concessionárias dos pólos rodoviários. Assim o é em vista da disposição

taxativa do convênio que avoca para si todos os instrumentos que dele forem

decorrentes bem como impõe a necessidade de aprová-los previamente por

intermédio de seu órgão interveniente.

Portanto, a sub-rogação, expressamente anunciada pelo Governador

do Estado no termo de Denúncia faz carregar para a União todos os encargos

decorrentes dos contratos de concessão, podendo, e devendo, as

concessionárias relacionarem diretamente com a ANTT (órgão legalmente

incumbido destes misteres pelos termos da Lei Federal 10.233/2001). Assim,

todas as obrigações, principais e acessórias estão, de fato, partilhadas entre

concessionárias e ANTT, o que, todavia, não retira a responsabilidade solidária

do Estado do Rio Grande do Sul por eventuais indenizações que venham a ser

devidas.

4) Diante da ação concreta do Poder Concedente, que medidas

podem ser adotadas pelos Consulentes de modo a preservarem-se os

direitos emergentes dos contratos mantidos entre o Estado e as empresas

concessionárias de rodovias?

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Devem, imediatamente, em vista de obrigações acessórias

constantes do contrato, especialmente no que concerne a verba de fiscalização,

dirigirem-se a ANTT para pleitear o reequilibrio econômico e financeiro dos

contratos de concessão, momento em que todas as questões preliminares ao

mérito (competências, termo da sub-rogação, exploração de rodovias estaduais)

haverão de ser resolvidas pelo órgão colegiado da Agência reguladora.

Se por ventura houver a necessidade de intervenção judicial, esta

deverá ocorrer de modo derivado, quando a prova administrativa estará

consolidada de modo a receber-se decisão judicial instrumentalmente célere e

útil.

Ademais, o tema relativo a verba de fiscalização é relevante na

medida em que qualquer atitude das concessionárias neste sentido poderá gerar

efeitos jurídicos inconvenientes. Falo de recolhê-la ao foro estadual. Se assim

se proceder estar-se-á reconhecendo a titularidade do Estado na relação jurídica

de direito material negando-se pois efeitos jurídicos ao ato administrativo de

denúncia promovido pelo Governador do Estado.

Por fim, é de revelar que a presente questão se desenvolve num

momento absolutamente delicado para os agentes públicos de modo que os

processos devem ser geridos a partir dos limites que a lei impõe a estes

agentes. Quer-se dizer: as concessionárias tem direito em reequilibrar os

contratos de concessão e o Poder Concedente tem o dever de assim proceder.

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Ainda uma última palavra: não há como a relação jurídica de

direito material, os contratos de concessão ficarem, por um momento sequer,

sem titularidade. Esta, atualmente, em vista do fato superveniente denúncia,

deu titulação à União Federal, sem, contudo, elidir a responsabilidade solidária

do Estado do Rio Grande do Sul no cumprimento de suas obrigações. Não se é

de olvidar, jamais, que a União sempre esteve no pólo ativo das relações

contratuais.

Honrado com a consulta, é o que opino.

Ricardo Giuliani Neto

OAB/RS 30517

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