poemas completos de alberto caeiro - fernando pessoa

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Poemas Completos Poemas Completos de de Alberto Caeiro Alberto Caeiro Heterônimo de Heterônimo de Fernando Pessoa Fernando Pessoa

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Page 1: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Poemas Completos dePoemas Completos deAlberto CaeiroAlberto Caeiro

Heterônimo de Heterônimo de Fernando PessoaFernando Pessoa

Page 2: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Ao lado de Camões, é considerado um dos mais importantes poetas de Portugal.

Maior poeta do movimento modernista português Complexidade de sua obra – coexistem o moderno e

o clássico, o revolucionário e o tradicional, o materialismo e o panteísmo, o múltiplo e o paradoxal, o lógico e o contraditório, o prosaico e o poético.

Hoje eu defendo uma coisa, amanhã outra; eu era pagão dois parágrafos acima, mas ao escrever este já não o sou.

ACM (“desde a obra lírica de Camões, a nossa poesia não voltara a alcançar essa aliança total dos mais elevados poderes de comunicação emotiva com a riqueza e a profundidade de pensamento. É a proximidade do sentir de cada um, a imediata comunicação que nos permite reconhecer nos versos de Camões e de Pessoa a nossa própria experiência cotidiana”

Page 3: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Ato de criar é mais importante que viver. Influências filosóficas dos pré-socráticos aos pessimistas do

séc. XIX Tendência ao estudo do ocultismo, da maçonaria, da cabala, da

alquimia, do zen budismo, entre outros. “Posição religiosa: ... Fiel, por motivos que mais adiante estão

implícitos, à Tradição secreta do Cristianismo, que tem íntimas relações com a Tradição secreta em Israel (a Santa Kabbalah) e com a essência oculta da Maçonaria. Posição iniciática: Iniciado, por comunicação direta de Mestre e discípulo, nos três graus menores da (aparentemente extinta) Ordem Templária de Portugal.”

Filosofia Zen: contemplação tranqüila, tudo o que estiver relacionado com o cotidiano – portanto, implica presente.

Heráclito: “Toda coisa que vemos, devemos vê-la sempre pela primeira vez, porque realmente é a primeira vez que a vemos. E então cada flor amarela é uma nova flor amarela, ainda que seja o que se chama a mesma de ontem. A gente não é já o mesmo nem a flor a mesma. O próprio amarelo não pode já ser o mesmo. É pena a gente não ter exatamente os olhos para saber isso, porque então éramos todos felizes.: (posfácio Álvaro de Campos)

Page 4: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

As Pessoas de Pessoa - HeteronímiaHeterônimo ≠ Pseudônimo

Multiplicidade de visões de mundo (modernidade)

Ortônimo 

Épico Mensagem

Fernando Pessoa – LiteratoLírico

CancioneiroPoemas FrancesesPoemas InglesesTraduçõesTextos em Prosa

HeterônimosFicções deInterlúdioInter-ludus

Odes Ricardo Reis – o médico -Clássico

PoesiasÁlvaro de Campos - o engenheiro – Moderno/Revolucionário

O Guardador de RebanhosO Pastor AmorosoPoemas Inconjuntos

Alberto Caeiro – o homem do campo

Page 5: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Sistema heteronímico/ abarcar o mundo

pólo da + objetividade - sensação

pólo da + subjetividade - pensar

ALBERTO CAEIRO

presente/simplicidade/cultura elementar/campo.

RICARDO REIS

passado/classicizante/cultura humanística/formal

ÁLVARO DE CAMPOS

presente/cidade//conflitos modernos, crises

Page 6: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Os três heterônimos (Alberto Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro de Campos) e “O Menino da sua Mãe"

Desenho a esferográfica de Almada Negreiros 

Page 7: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

O poeta e suas múltiplas faces – máscaras?

Leia os fragmentos de Fernando Pessoa, compare-os com a tela do pintor surrealista Magritte – “Os Amantes” (1928) – e teça possíveis relações entre eles.

Texto 1: “O poeta é um fingidor,Finge tão completamenteQue chega a fingir que é dorA dor que deveras sente.”

Texto 2:“Como um carrossel,Giro em meu torno sem me achar...”

Texto 3:“Multipliquei-me, para me sentir,Para me sentir, precisei sentir tudo,Transbordei, não fiz senão extravasar-me,Despi-me, entreguei-me,E há em cada canto da minha alma um altar a um deus diferente.”

Page 8: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

“Os Amantes”, Magritte

Page 9: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Ideal PoéticoO essencial é saber ver,

Saber ver sem estar a pensar,

Saber ver quando se vê,

E nem pensar quando se vê,

Nem ver quando se pensa.

Sensasionismo: FP (1915) ...nada existe, não existe a realidade, mas apenas sensações. As idéias são sensações, mas de coisas não colocadas no espaço e, por vezes, nem mesmo no tempo. A lógica, o lugar das idéias, é outra espécie de espaço.”

Tema A poesia descreve o real e o exterior ao homem

sensação

EstiloSensacionismo

Paganismo absoluto

Page 10: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Modernismo: Crise da manifestação artística – gestação de

vanguardas revolucionárias; As artes em crise voltam-se para si mesmas Reação ao passado artístico – ruptura e

reconstrução; Destruir “as gavetas do cérebro e das organizações

sociais, desmoralizar por toda a parte” Sensibilidade moderna forjada pela destruição

(Primeira Guerra) – espetáculo de selvageria – compulsão de criar troca de lugar com a compulsão de destruir (ou melhor, misturam-se as linguagens)

Canto ao presente, ao tempo das máquinas, da velocidade.

O cotidiano e a linguagem – proximidade do poeta. Prosaísmo, liberdade formal e estilística.

Page 11: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Concepção poética - modernismo

Não me importo com as rimas. Raras vezesHá duas árvores iguais, uma ao lado da outra.Penso e escrevo como as flores têm corMas com menos perfeição no meu modo de exprimir-mePorque me falta a simplicidade divinaDe ser todo só o meu exterior

Olho e comovo-me,Comovo-me como a água corre quando o chão é reclinado,E a minha poesia é natural como o levantar-se vento...

Page 12: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

A obra de Alberto CaeiroO Guardador de Rebanhos (1911 – 1912)

49 poemas sem título, com numeração em algarismos romanos;

O Pastor Amoroso6 pequenos poemas lírico-amorosos,

datados de 6/7/1914; 6/7/1914; 1-/7/1930; 10/7/1930; 10/7/1930 e 23/7/1930

Poemas inconjuntos (1913 – 1915)49 poemas

Page 13: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

O Guardador de Rebanhos[211]

Pensar em Deus é desobedecer a DeusPorque Deus quis que o não conhecêssemos,Por isso se nos não mostrou...

Sejamos simples e calmos,Como os regatos e as árvores,E Deus amar-nos-á fazendo de nósBelos como as árvores e os regatos,E dar-nos-á verdor na sua primavera,E um rio aonde ir ter quando acabemos!...

Panteísmo, paganismo, cristianismo – contradições e conjunções recusa a transcendência, a explicação metafísica ou teológica a natureza e nós devemos existir apenas, sem indagações

Page 14: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

[242]

Também às vezes, à flor dos ribeiros,Formam-se bolhas na águaQue nascem e se desmanchamE não têm sentido nenhumSalvo serem bolhas de águaQue nascem e se desmancham.

recusa a procurar o sentido para as coisas as coisas não têm sentido, têm apenas existência diferença entre ser/pensar/existir

Page 15: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

[252]

Vi que não há Natureza,Que Natureza não existe,Que há montes, vales, planícies,Que há árvores, flores, ervas,Que há rios e pedras,Mas que não há um todo a que isso pertença,Que um conjunto real e verdadeiroÉ uma doença das nossas idéias,A Natureza é partes sem um todo.Isto é talvez o tal mistério de que falam.

natureza dissociada de um todo as coisas não têm sentido como partes desse todo as coisas têm apenas existência.

Page 16: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

[245]

Passa uma borboleta por diante de mimE pela primeira vez no Universo eu reparoQue as borboletas não têm cor nem movimento,Assim como as flores não tem perfume nem cor.A cor é que tem cor nas asas da borboleta,No movimento da borboleta o movimento é que se move,O perfume é que tem perfume no perfume da flor.A borboleta é apenas borboletaE a flor é apenas flor.

A supremacia do visual A concretude das coisas existe nas próprias coisas.

Page 17: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

[210]

Há metafísica bastante em não pensar em nada.

O que penso eu do mundo?Sei lá o que penso do mundo!Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que idéia tenho eu das coisas?Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?Que tenho eu meditado sobre Deus e a almaE sobre a criação do Mundo?

Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhosE não pensar. É correr as cortinasDa minha janela (mas ela não tem cortinas).

O mistério das coisas? Sei lá o que é mistério!O único mistério é haver quem pense no mistério.

Page 18: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Pensar = doença Viver é diferente de pensar Antiintelectualismo Nada de especulação filosófica, mística ou

metafísica. incisivo e agressivo discurso - anticristão Busca da objetividade absoluta em si mesmo Aproximação panteísta Aproximação do objeto estético: as sensações.

Page 19: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

[223]

Quem me dera que eu fosse o pó da estradaE que os pés dos pobres me estivessem pisando...

Quem me dera que eu fosse os rios que corremE que as lavadeiras estivessem à minha beira...

Quem me dera que eu fosse os choupos à margem do rioE tivesse só o céu por cima e a água por baixo...

Quem me dera que eu fosse o burro do moleiroE que ele me batesse e me estimasse...

Antes isso que ser o que atravesse a vidaOlhando para trás de si e tendo pena...

Page 20: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Outras Obras

Page 21: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

O pastor amorosoQuando eu não te tinhaAmava a Natureza como um monge calmo a Cristo...Agora amo a NaturezaComo um monge calmo à Virgem Maria,Religiosamente, a meu modo, como dantes,Mas de outra maneira mais comovida e próxima...Vejo melhor os rios quando vou contigoPelos campos até à beira dos rios;Sentado a teu lado reparando nas nuvensReparo nelas melhor –Tu não me tiraste a Natureza...Tu mudaste a Natureza...Trouxeste-me a Natureza para o pé de mim,Por tu existires vejo-a melhor, mas a mesma,Por tu me amares, amo-a do mesmo modo, mas mais,Por tu me escolheres para te ter e te amar,Os meus olhos fitaram-na mais demoradamenteSobre todas as cousas.Não me arrependo do que fui outroraPorque ainda o sou. [258]

.

Page 22: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Poemas inconjuntos

Não basta abrir a janelaPara ver os campos e o rio.Nem é bastante não ser cegoPara ver as árvores e as flores.É preciso também não ter filosofia nenhuma;Com filosofia não há árvores: há idéias apenas.Há só cada um de nós, como uma cave.Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,Que nunca é o que se vê quando se abre a janela. [261]

Page 23: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

O espelho reflete certo; não erra porque não pensa.

Pensar é essencialmente errar.Errar é essencialmente estar cego e surdo. [285]

* * *

O universo não é uma idéia minha.

A minha idéia do Universo é que é uma idéia minha.

A noite não anoitece pelos meus olhos,

A minha idéia da noite é que anoitece por meus olhos.

Fora de eu pensar e de haver quaisquer pensamentos

A noite anoitece concretamenteE o fulgor das estrelas existe se tivesse peso. [283]

Page 24: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Quando tornar a vir a Primavera

Talvez já não me encontre no mundo.

Gostava agora de poder julgar que a Primavera é gente

Para poder supor que ela choraria,

Vendo que perdera o seu único amigo.

Mas a Primavera nem sequer é uma cousa:É uma maneira de dizer. [273]

* * *

É talvez o último dia da minha vida.

Saudei o sol, levantando a mão direita,

Mas não o saudei, dizendo-lhe adeus,

Fiz sinal de gostar de o ver antes: mais nada.

Page 25: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Aquela senhora tem um pianoQue é agradável mas não é o correr dos riosNem o murmúrio que as árvores fazem...

Para que é preciso ter piano?O melhor é ter ouvidosE amar a Natureza.

Condensação poética Combinação de sons – artificial e natural. Defesa singela da natureza Versos em liberdade

(Fuvest) a) Qual a opinião do poeta em relação ao piano?

b) Que simboliza o piano no poema?

c) Verifique se há no poema alguma característica que permita situá-lo em determinada estética literária.

d) Algum elemento que evidencie ser o autor português ou brasileiro. Justifique.

Caeiro por exercícios

Page 26: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

“Olá, guardador de rebanhos,Aí à beira da estrada,Que te diz o vento que passa?”

“Que é vento, e que passa,E que já passou antes,E que passará depois.E a ti o que te diz?”

“Muita cousa mais do que isso.Fala-me de muitas outras cousas.De memórias e de saudadesE de cousas que nunca foram.”

“Nunca ouviste passar o vento.O vento só fala do vento.O que lhe ouviste foi mentira,E a mentira está em ti.”

Page 27: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

(Unicamp)

Falso diálogo entre Pessoa e Caeiro[Pessoa] - a chuva me deixa triste...

[Caeiro] - a mim me deixa molhado.(José Paulo Paes)

O poema “Falso diálogo entre Pessoa e Caeiro” de José Paulo Paes, remete-nos ao poema X de O Guardador de Rebanhos, de Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando Pessoa). Leia atentamente os dois poemas e identifique no poema de Alberto Caeiro as falas que, segundo o poema de José Paulo Paes, poderiam ser atribuídas a Pessoa e a Caeiro, respectivamente. Justifique sua resposta.

Page 28: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

ENEM 2004Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no Universo...Por isso minha aldeia é tão grande como outra terra qualquerPorque eu sou do tamanho do que vejoE não do tamanho da minha altura... (Alberto Caeiro)

A tira “Hagar” e o poema de Alberto Caeiro (um dos heterônimos de Fernando Pessoa) expressam, com linguagens diferentes, uma mesma idéia: a de que a compreensão que temos do mundo é condicionada, essencialmentea) pelo alcance de cada cultura.b) pela capacidade visual do observador.c) pelo senso de humor de cada um.d) pela idade do observador.e) pela altura do ponto de observação.

Page 29: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Nas nossas ruas, ao anoitecer,Há tal soturnidade, há tal melancolia,Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresiaDespertam-me um desejo absurdo de sofrer. (...)

E, enorme, nesta massa irregularDe prédios sepulcrais, com dimensões de montes,A Dor humana busca os amplos horizontes,E tem marés de fel como um sinistro mar!”

O sentimento dum ocidental – Cesário Verde

Como amanhece! Que meigasAs horas antes do almoço!Fartam-se as vacas nas veigasE um pasto orvalhado e moçoProduz as novas manteigas.

Provincianas – Cesário Verde

Page 30: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

[208]

Ao entardecer, debruçado pela janela,E sabendo de soslaio que há campos em frente,Leio até me arderem os olhosO livro de Cesário Verde.

Que pena que tenho dele! Ele era um camponêsQue andava preso em liberdade pela cidade.Mas o modo como olhava para as casas,E o modo como reparava nas ruas,E a maneira como dava pelas coisas,É o de quem olha para árvores,E de quem desce os olhos pela estrada por onde vai andandoE anda a reparar nas flores que há pelos campos...

Por isso ele tinha aquela grande tristezaQue ele nunca disse bem que tinha,Mas andava na cidade como quem anda no campoE triste como esmagar flores em livrosE pôr plantas em jarros...

Page 31: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

(Unicamp)

a) Como Cesário Verde apresenta a cidade em “O Sentimento dum Ocidental”?

b) Como Caeiro interpreta a visão que Cesário Verde tem da cidade?

c) O que, nos textos transcritos, justifica as considerações de Caeiro?

Page 32: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,Mas o Tejo não é mais belo que o rio que o corre pela minha

aldeia.Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia.

O Tejo tem grandes naviosE navega nele ainda,Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,A memória das naus.

O Tejo desce de EspanhaE o Tejo entra no mar em Portugal.Toda a gente sabe isso.Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeiaE para onde ele vaiE donde ele vem.E por isso, porque pertence a menos gente,É mais livre e maior o rio da minha aldeia.

Page 33: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Pelo Tejo vai-se para o Mundo.Para além do Tejo há a AméricaE a fortuna daqueles que a encontram.Ninguém nunca pensou no que há para além Do rio da minha aldeia.

O rio da minha aldeia não faz pensar em nadaQuem está ao pé dele está só ao pé dele.

Pretensão de objetividade absoluta Comparação entre o ser (o rio de aldeia) e o poder ser (o

Tejo) O poder ser – histórico, geográfico – carrega vultos e

fantasmas O ser – real – concretude da natureza. Pelo jogo antitético o poeta chega ao ser.

Page 34: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

(A traição das Imagens, 1928-1929)

Fuvest - adaptado

Page 35: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Texto 1:

 “Voltemos à casinha. Não serias capaz de lá entrar hoje, curioso leitor; envelheceu, enegreceu, apodreceu, e o proprietário deitou-a abaixo para substituí-la por outra, três vezes maior, mas juro-te que muito menor que a primeira. O mundo era estreito para Alexandre; um desvão de telhado é o infinito para as andorinhas.”

(Machado de Assis, Memórias Póstumas de Brás Cubas)

Indique o tema comum aos fragmentos de Memórias Póstumas de Brás Cubas, Alberto Caeiro e o quadro de Magritte.

Page 36: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

(FUVEST)

Leia o seguinte poema de Alberto Caeiro:

Ponham na minha sepulturaAqui jaz, sem cruz,Alberto CaeiroQue foi buscar os deuses...Se os deuses vivem ou não isso é convosco.A mim deixei que me recebessem.

a) Identifique, no poema, a modalidade religiosa que o poeta rejeita e aquela com que tem maior afinidade. Explique sucintamente.b) Relacione a referência a “deuses” (plural), no poema, com o seguinte verso, extraído de outro poema de Alberto Caeiro: “A natureza é partes sem um todo”.

Page 37: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

(Fuvest-2006)

Noite de S.João para além do muro do meu quintal.Do lado de cá, eu sem noite de S.JoãoPorque há S.João onde o festejam.Para mim há uma sombra de luz de fogueiras na noite,Um ruído de gargalhadas, os baques dos saltos.E um grito casual de quem não sabe que eu existo.

Page 38: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Considerando-se este poema no contexto das tendências dominantes da poesia de Caeiro, pode-se afirmar que, neste texto, o afastamento da festa de São João é vivido pelo eu-lírico como

a) Oportunidade de manifestar seu desapreço pelas festividades que mesclam indevidamente o sagrado e o profano.

b) Ânsia de integração em uma sociedade que o rejeita por causa de sua excentricidade e estranheza.

c) Uma ocasião de criticar a persistência de costumes tradicionais, remanescentes no Portugal do Modernismo

d) Frustração, uma vez que não experimenta as emoções profundas nem as reflexões filosóficas que tanto aprecia.

e) Reconhecimento de que só tem realidade efetiva o que corresponde à experiência dos próprios sentidos. (alternativa E)

Page 39: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Drummond e Caeiro

O canto não é a naturezaNem os homens em sociedade.Para ele, chuva e noite fadiga e esperança nada significam.A poesia (não tires a poesia das coisas)Elide sujeito e objeto

(“A procura da poesia”)

Vomitar esse tédio sobre a cidade.Quarenta anos e nenhum problemaResolvido, sequer colocado. (...)Uma flor nasceu na rua! (...)É feia. Mas é realmente uma flor.Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

(“A flor e a náusea”)

Page 40: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Caeiro revisitado:XLVI

Deste modo ou daquele modo, Conforme calha ou não calha, Podendo às vezes dizer que o que penso,E outras vezes dizendo-o mal e com misturas,Vou escrevendo os meus versos sem querer,Como se escrever não fosse uma cousa feita de gestos,Como se escrever fosse uma cousa que me acontecesse Como dar-me o sol de fora.

Procuro dizer o que sintoSem pensar em que o sinto.Procuro encostar as palavras à idéiaE não precisar dum corredorDo pensamento para as palavras

Nem sempre consigo sentir o que sei que devo sentir.O meu pensamento só muito devagar atravessa o rio a nadoPorque lhe pesa o fato que os homens o fizeram usar.

 

Page 41: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Procuro despir-me do que aprendi,Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,E raspar a tinta com que me pintaram os sentidos,Desencaixotar as minhas emoções verdadeiras,Desembrulhar-me e ser eu, não Alberto Caeiro,Mas um animal humano que a Natureza produziu.

E assim escrevo, querendo sentir a Natureza, nem sequer como um [homem,

Mas como quem sente a Natureza, e mais nada.Escrevo, ora bem, ora mal,Ora acertando com o que quero dizer, ora errando,Caindo aqui, levantando-me acolá,Mas indo sempre no meu caminho como um cego teimoso.

Ainda assim, sou alguém.Sou o Descobrir da Natureza.Sou o Argonauta das sensações verdadeiras.Trago ao Universo um novo UniversoPorque trago ao Universo ele-próprio.

Page 42: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

 

Isto sinto e isto escrevo

Perfeitamente sabedor e sem que não veja

Que são cinco horas do amanhecer

E que o sol, que ainda não mostrou a cabeça

Por cima do muro do horizonte,

Ainda assim já se lhe vêem as pontas dos dedos

Agarrando o cimo do muro

Do horizonte cheio de montes baixo

in “O Guardador de Rebanhos” 

Page 43: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Caeiro e Bandeira - Visão oposta e modificada da natureza 

O Cacto

Aquele cacto lembrava os gestos desesperados da estatuária:

Laocoonte constrangido pelas serpentes,

Ugolino e os filhos esfaimados.

Evocava também o seco Nordeste, carnaubais, caatingas...

Era enorme, mesmo para esta terra de feracidades excepcionais. 

Um dia um tufão furibundo abateu-o pela raiz.

O cacto tombou atravessado na rua,

Quebrou os beirais do casario fronteiro,

Impediu o trânsito de bondes, automóveis, carroças,

Arrebentou os cabos elétricos e durante vinte e quatro horas privou a cidade de iluminação e energia:

 – Era belo, áspero, intratável.

Page 44: Poemas Completos de Alberto Caeiro - Fernando Pessoa

Laocoonte