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PIBID, FORMAÇÃO E SABERES DOCENTES Giseli Barreto da Cruz Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ Resumo O painel articula três pesquisas sobre formação de professores adotando como contexto investigativo o PIBID Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência financiado pela CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. A proposta consiste em discutir resultados de pesquisas sobre formação e saberes docentes através das contribuições do PIBID na perspectiva da parceria Universidade-Escola Básica. O primeiro trabalho, ancorado na pesquisa nos/dos/com os cotidianos focaliza os saberesfazeres dos sujeitos praticantes de uma sala de aula de alfabetização estudantes de Pedagogia de uma Universidade Pública Federal. O estudo pretendeu caçar pistas, rastros, indícios de que a travessia de formação docente se dá em múltiplos contextos, em diferentes redes, em diversos espaçostempos. O segundo trabalho apresenta alguns dos resultados de uma pesquisa com foco nos diferenciais da parceria universidade-escola básica para a formação inicial de pedagogos docentes no contexto do PIBID Pedagogia de uma Universidade Pública Federal. Seu foco investigativo são as intervenções e mediações das professoras supervisoras das escolas parceiras no processo de formação de futuros professores. O terceiro trabalho, voltado para os egressos, analisa os saberes docentes mobilizados pelos investigados no seu cotidiano escolar, compreendendo quais estratégias de ensino-aprendizagem se baseiam para ensinar e relacionando-as com suas concepções de ensino. Com essa estrutura, o painel articula a iniciação à docência no tempo da formação inicial e no espaço/tempo da Universidade e da Escola; e a iniciação à docência no tempo da inserção profissional e no espaço/tempo da escola de atuação. Articula ainda a dinâmica de trabalho dos sujeitos protagonistas do projeto: o licenciando, o professor supervisor e o egresso. Os resultados indicam a potência do PIBID na formação e no trabalho de professores. Palavras-chave: PIBID Formação de professores Saberes Docentes XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 3411 ISSN 2177-336X

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PIBID, FORMAÇÃO E SABERES DOCENTES

Giseli Barreto da Cruz

Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ

Resumo

O painel articula três pesquisas sobre formação de professores adotando como contexto

investigativo o PIBID – Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência –

financiado pela CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível

Superior. A proposta consiste em discutir resultados de pesquisas sobre formação e

saberes docentes através das contribuições do PIBID na perspectiva da parceria

Universidade-Escola Básica. O primeiro trabalho, ancorado na pesquisa nos/dos/com os

cotidianos focaliza os saberesfazeres dos sujeitos praticantes de uma sala de aula de

alfabetização – estudantes de Pedagogia de uma Universidade Pública Federal. O estudo

pretendeu caçar pistas, rastros, indícios de que a travessia de formação docente se dá em

múltiplos contextos, em diferentes redes, em diversos espaçostempos. O segundo

trabalho apresenta alguns dos resultados de uma pesquisa com foco nos diferenciais da

parceria universidade-escola básica para a formação inicial de pedagogos docentes no

contexto do PIBID Pedagogia de uma Universidade Pública Federal. Seu foco

investigativo são as intervenções e mediações das professoras supervisoras das escolas

parceiras no processo de formação de futuros professores. O terceiro trabalho, voltado

para os egressos, analisa os saberes docentes mobilizados pelos investigados no seu

cotidiano escolar, compreendendo quais estratégias de ensino-aprendizagem se baseiam

para ensinar e relacionando-as com suas concepções de ensino. Com essa estrutura, o

painel articula a iniciação à docência no tempo da formação inicial e no espaço/tempo

da Universidade e da Escola; e a iniciação à docência no tempo da inserção profissional

e no espaço/tempo da escola de atuação. Articula ainda a dinâmica de trabalho dos

sujeitos protagonistas do projeto: o licenciando, o professor supervisor e o egresso. Os

resultados indicam a potência do PIBID na formação e no trabalho de professores.

Palavras-chave: PIBID – Formação de professores – Saberes Docentes

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3411ISSN 2177-336X

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UNIVERSIDADE X ESCOLA-BÁSICA: NARRATIVAS COMPARTILHADAS

NOS/DOS/COM OS COTIDIANOS ESCOLARES

Viviane Lontra Teixeira

Colégio de Aplicação da UFRJ

Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO

Resumo:

O presente trabalho apresenta investigações de uma pesquisa no Mestrado em Educação

de uma universidade pública federal acerca dos saberesfazeres dos professores em

formação do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid) da

Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) formado por

estudantes da licenciatura em pedagogia, professores da escola básica e da universidade

pública. Norteado por algumas questões: como nos tornamos professores; qual o papel

do estudante da escola básica na formação do futuro profissional docente; qual o lugar

da Universidade e da escola básica na formação do futuro profissional da educação, a

pesquisa pretendeu, através de uma investigação indiciária (GINZBURG, 1989) seguir

as pistas, rastros, indícios de que a travessia de formação docente se dá em múltiplos

contextos, em diferentes redes, em diversos espaçostempos que nos formam,

desformam, nos constituem professores. Traz algumas narrativas e relatos

coletivossingulares, potencializados nas discussões na universidade e nas salas de aula,

propondo uma formação de professores na/da/com a prática, tecendo reflexões que nos

possibilitam (re)pensar a formação docente para além das lógicas dominantes

cientificistas e colonialistas. Longe da ideia de que há um momento em que a formação

se cristaliza, as narrativas e relatos dos encontros de formação sugerem que aprendemos

a ser professores no ineditismo, nas redes que tecemos nos cotidianos das escolas e salas

de aula, na não-linearidade, na surpresa, na incerteza, na circulação entre diferentes

saberes e nãosaberes. Discute o movimento práticateoriaprática, apontado por Alves

(2001) propondo a possibilidade de pensar a formação numa perspectiva de

horizontalização de saberes, onde todos aprendem e ensinam.

Palavras-chave: Formação de professores - Narrativas - Estudos do cotidiano

XVIII ENDIPE

Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3412ISSN 2177-336X

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UNIVERSIDADE X ESCOLA-BÁSICA: NARRATIVAS COMPARTILHADAS

NOS/DOS/COM OS COTIDIANOS ESCOLARES

Viviane Lontra Teixeira

Colégio de Aplicação da UFRJ

Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO

Introdução

O presente trabalho apresenta investigações realizadas durante o Mestrado em

Educação acerca dos saberesfazeres dos sujeitos praticantes (CERTEAU, 2013) de uma

sala de aula de alfabetização e do Pibid (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à

Docência) da Capes (Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior)

formada por alunos do 1º ano do Ensino Fundamental, estudantes da Pedagogia,

professores da escola básica e da universidade pública.

O sujeito praticante de Certeau (2013, p.55) é o homem ordinário, herói comum,

personagem disseminada, caminhante inumerável que bricola, cria, desvia, inventa

maneiras de fazer, dada a impossibilidade do consumo supostamente passivo dos

produtos culturais oferecidos. Dessa forma, a opção por chamar os envolvidos nesse

estudo de praticantes se dá por entender que os processos de formação se desenham na

trajetória e pela ação do sujeito em múltiplos contextos com os quais se tecem

experiências e sentidos para se fazer professor.

O texto desdobra-se em três partes sucintas. Na primeira, traz a perspectiva

teoricoepistemológica que se fundamenta, na segunda discute as experiências de

formação que acontecem a partir das vivências, das lembranças, das escritas, relatos de

encontros que nos ensinam, nos constituem professorxs. Por fim, à guisa de conclusão,

traz alguns resultados das investigações.

Atravessado por algumas questões: como nos tornamos professorxs? Qual o

papel dx estudante da escola básica na formação docente? Qual o lugar da Universidade

e da escola básica na formação dx profissional de educação? O estudo pretendeu,

através de uma investigação indiciária (GINZBURG, 1989), caçar pistas, rastros,

indícios de que a travessia de formação docente se dá em múltiplos contextos, em

diferentes redes, em diversos espaçostemposi que nos formam, desformam, nos

constituem professorxs.

XVIII ENDIPE

Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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A escolha pela grafia com X possibilita pensar a diversidade de gêneros

ressaltada ao longo desse texto. É uma opção epistemológica que faz referência aos

estudos queer que privilegiam estratégias desconstrutivas das normas, das lógicas e dos

arranjos sociais vigentes (LOURO, 2012, p. 367) entendendo que o universo de

construção das identidades é amplo e não cabe nos esquemas binários que estamos

acostumados a classificar gênero e sexo.

São os seguintes fatores e circunstâncias que mais contribuíram para essa

pesquisa: em primeiro lugar, implicou um mergulho nos/dos/com os cotidianos

(ALVES, 2003) de salas de aula do 1º ano do Ensino Fundamental e reuniões semanais

com professorxs em formação no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à

Docência, em segundo lugar, debruçou-se no estudo de narrativas e relatos

coletivossingulares que eram potencializados nas discussões na universidade e nas salas

de aula, desinvisibilizando, na formação docente, “o que acontece” (PAIS, 2003, p. 28,

29) cotidianamente e de forma permanente indo além dos documentos curriculares. Em

terceiro lugar, a pesquisa implicou trocas de experiências numa relação apoiada no

movimento práticateoriaprática (ALVES, 2001, p. 15) em que percebemos homens

comuns (CERTEAU, 1994) criando conhecimentos em situações de formação que

valorizam o dissenso, a copresença e as práticas orientadas para justiça cognitiva

(SANTOS, 2010, p. 40).

Os aspectos acima descritos levaram à compreensão de que a formação pode ser

tecida cotidianamente no entrelugar universidade-escola onde partilhamos fragilidades,

dúvidas e cogitações, aprendendoensinando uns com outros.

Caminhos da pesquisa

Porque são os passos que fazem os caminhos!

Mario Quintana

Nesse caminho de pesquisa procuramos seguir os passos de Alves, Certeau,

Ferraço, Oliveira, Santos e Süssekind, pequenos aliados, que auxiliam pensar a

formação de professorxs na perspectiva dos estudos nos/dos/com os cotidianos

escolares, tendo este caminho de pesquisa uma possibilidade de pensar a formação

docente no cotidiano e com o cotidiano de salas de aula, erguendo o que vivenciamos

nas escolas à condição de espaçostempos privilegiados de produção dos conhecimentos,

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crenças e valores que dão sentido e direção à relação práticateoriaprática (ALVES,

2008).

Essas pesquisas têm o compromisso político e epistemológico de buscar um

modo de convivência pesquisador-universo pesquisado em que haja respeito mútuo,

desenvolvendo relações horizontais com professorxs das escolas pesquisadas,

“institucionalizando, nessa relação, a ideia da validade dos diversos saberes e do

necessário diálogo entre eles, para além da hierarquia atuante nos modos dominantes de

fazer pesquisa.” (OLIVEIRA, 2005, p.100-101)

Inserida no contexto dessas pesquisas e trabalhando como professora da escola

básica, com professorxs em formação e crianças na alfabetização, a pesquisadora

buscou ouvir as camadas de vozes (AOKI apud SÜSSEKIND, 2012, p.6) que se

entrecruzavam, se entrelaçavam nas salas de aula, nos encontros de formação e nas

reuniões pedagógicas utilizando relatos e narrativas orais e escritas dos professorxs em

formação em diferentes espaçostempos, propondo uma formação de professoxs

na/da/com a prática.

Reis (2014) ajuda a pensar que toda formação é autoformação, não existindo

momento fixo que nos torna “preparados” para a docência, porque ela se tece nas

interações, no arquipélago de subjetividades (SANTOS, 1996) que somos e que nos

vemos envolvidos desde que nascemos, por isso, optamos pelo termo professorxs em

formação que utilizamos ora para designar os licenciandxs da graduação, ora para

designar os profissionais da educação que já possuem diploma, porque, com Pérez

(2004, p.80 e 81) compreendemos que:

cada um de nós é uma rede de subjetividades, tecida nas múltiplas e

diferentes relações que estabelecemos nos múltiplos contextos

cotidianos em que vivemos. Formamo-nos e somos formados nestas e

por estas redes e nas relações múltiplas e complexas que existem entre

elas.

Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência como entrelugar de formação

De acordo com os documentos oficiais, o Programa Institucional de Bolsa de

Iniciação à Docência – Pibidii, voltado para professorxs em formação das diversas

licenciaturas, foi criado para:

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melhorar o ensino nas escolas públicas em que o Índice de

Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) esteja abaixo da média

nacional, de 4,4. [...] O IDEB também é importante por ser condutor

de política pública em prol da qualidade da educação. É a ferramenta

para acompanhamento das metas de qualidade do PDE para a

educação básica. O Plano de Desenvolvimento da Educação

estabelece, como meta, que em 2022 o IDEB do Brasil seja 6,0 –

média que corresponde a um sistema educacional de qualidade

comparável a dos países desenvolvidos.iii

Apesar da proposta se apresentar com o entendimento subjacente de

conhecimento como um objeto impessoal e descontextualizado que busca a

padronização com resultados verificáveis por meio de testes, percebemos que o

diferencial dessa política está em como cada projeto vai encarar o diálogo escola básica

x universidade. Da mesma forma que a Universidade, através dxs licenciandxs, precisa

entrar na escola para “melhorar o ensino”, é no cotidiano das escolas que xs

licenciandxs aprendem o exercício da docência, numa proposta que possibilita a

horizontalização de saberes.

De acordo com o Presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de

Nível Superior – Capes, Jorge Almeida Guimarães:

o Pibid não é simplesmente um programa de bolsas. É uma proposta

de incentivo e valorização do magistério e de aprimoramento do

processo de formação de docentes para a educação básica. Os alunos

de licenciatura exercem atividades pedagógicas em escolas públicas

de educação básica, contribuindo para a integração entre teoria e

prática, para a aproximação entre universidades e escolas e para a

melhoria de qualidade da educação brasileira. Para assegurar os

resultados educacionais, os bolsistas são orientados por

coordenadores de área – docentes das licenciaturas – e por

supervisores – docentes das escolas públicas onde exercem suas

atividades.iv (grifo meu)

A ideia de que resultados educacionais podem ser assegurados traz a concepção

de “controle” do processo de ensino-aprendizagem e soa como se a universidade tivesse

posse do “saber” necessário à escola básica. Endossando o que vem sendo discutido a

respeito da (im)possibilidade das políticas serem aplicadas tal como foram pensadas

(SÜSSEKIND; LONTRA; PELLEGRINI, 2015), o que vivenciávamos no programa era

uma formação com infinitas possibilidades de troca entre diversos

aprendentesensinantes, superando a dicotomização e a hierarquia entre os diferentes

saberesfazeres por meio da discussão em torno dos processos de aprendizagemensino

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(OLIVEIRA, 2013) e da valorização do saber da práticateoriaprática (ALVES, 2008)

compartilhado na escola (diariamente) e na universidade (semanalmente).

Recorremos a Oliveira (2012, p.8 e 9) para ressaltar a compreensão de prática e

teoria como “instâncias complementares e indissociáveis do fazerpensar dos sujeitos

das escolas e que se interpenetram permanentemente, não devendo ser percebidas como

elementos dissociáveis de uma realidade ou reflexão qualquer”, por isso,

práticateoriaprática.

A pesquisadora, professora supervisora do PIBID, compartilhava diariamente a

sala de aula do 1º ano do Ensino Fundamental de uma escola básica pública com sete

licenciandxs de uma universidade federal. Semanalmente todos os praticantepensantes

(OLIVEIRA, 2012) do projeto, em suas multiplicidades, se encontravam na

universidade para trocar experiências, negociar sentidos, partilhar informações e

saberes, (re)pensando, (re)formando e ressignificando ações, práticas e olhares sobre o

cotidiano escolar. Muitos relatos foram produzidos nesses encontros e a pesquisa traz a

discussão dessas trocas que foram tecendo um bordado composto de diversos fios: o fio

da criança, da prática, da dúvida, das leituras, das (des)orientações, das

(des)construções, os fios... vividoscompartilhados antes/durante a pesquisa que, no

exercício de (re)pensar, de captar sentidos e de pesquisar a nossa prática, nos oferece

indícios (GINZBURG, 1989) do quanto fomos nos desvelando para aprender com.

Deslocando a visão de professorxs “transmissorxs” de conhecimentos já elaborados para

a de “professorxs-autorxs” das próprias práticas, abrimo-nos para a possibilidade de

criar, de inventar, de construir novas formas de aprenderensinar.

Longe da ideia de que há um momento em que a formação se cristaliza, as

narrativas e relatos, potencializados a partir dos encontros com as crianças, sugerem que

aprendemos a ser professor no cotidiano das salas de aula, no ineditismo, no

acontecimento (GERALDI, 2010), na surpresa, na incerteza, nas situações reais onde é

preciso usar mais do que aprendemos na formação docente, na circulação entre

diferentes saberes e nãosaberes, no entendimento de que em todo conhecimento há uma

ignorância e de que em toda ignorância há um conhecimento (SANTOS, 2011), na

(des)formação, possibilitada através da (re)invenção, (re)descoberta de práticas, de nós

mesmos e dos “outros”, não como um “outro eu”, e sim o outro enquanto tal, o outro

que está, inclusive, no eu (GALLO, 2010, p.239). Uma formação em que ora somos

aprendentesensinantes, ora somos ensinantesaprendentes, onde é preciso usar “fatores

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que não podem ser mensurados – um cheiro, um olhar, uma intuição” (GINZBURG,

1989), bricolagens, astúcias, táticas, diferentes modos de fazer (CERTEAU, 2013).

Sobre a autoria desse estudo, Ferraço (2003, p.168) ajuda a compreender a

importância de dialogar não só com autores reconhecidos academicamente, como

também com os sujeitos cotidianos que “vivem, convivem, inventam, usam, praticam,

habitam, ocupam nesses cotidianos [...]. Trata-se de entender que também aqueles que

vivem, de fato, esses cotidianos são os legítimos autores/autoras dos discursos “com”

os cotidianos”.

Dessa forma, as narrativas além de darem visibilidade aos autores do cotidiano

da escola básica e da universidade, também os afirmam como protagonistas desse

estudo, fazendo “valer as dimensões de autoria, autonomia, legitimidade, beleza e

pluralidade de estéticas dos discursos dos sujeitos cotidianos” (Ibid, grifo do autor). Os

afirmam como heróis comuns (CERTEAU, 2013) e anônimos, no anonimato.

Relatos de (des)formação: construindo novas formas de aprenderensinar

Nas salas de aula, com as crianças do 1º ano do EF, fazíamos junto, aprendíamos

na relação que acontece no/do/com o cotidiano da turma. Na mesma perspectiva, nos

encontros sem as crianças, planejávamos, conversávamos, trocávamos impressões

percebendo que estamos “sempre contínua e permanentemente em estado de mudança”

(PÉREZ, 2002). Bricoladas no cotidiano de aulas e reuniões, as narrativas e relatos

selecionados abaixo apresentam algumas trocas, aprendizagens, conhecimentos

partilhados diariamente na escola e, semanalmente, nas reuniões.

Estou gostando muito de observar uma turma de alfabetização, tudo

que tenho percebido tem sido muito novo para mim. O ambiente é

bom. Alguns alunos são mais agitados, mas isso não impede a

professora de realizar seu trabalho. Hoje foi um dia marcante porque

foi minha primeira experiência, acredito que é o começo de uma longa

caminhada. Me chamou atenção quando estava escrevendo meu

relatório e L., uma aluna de 6 anos, pediu para ler o que eu tanto

escrevia. Não soube o que fazer. Fechei o caderno e vi que precisava

interagir. (Narrativa de A., 2015)v

Hoje me aproximei um pouco mais das crianças. Vi que elas são

muito carinhosas e receptivas. Precisei ficar com a turma 10 minutos

após o recreio porque a professora precisou resolver um problema e

fiquei muito nervosa, não tinha planejado nada, não tinha nada em

mente, não tinha ainda o domínio da turma. Deu pânico! Nem sei

como, mas aconteceu de todo mundo ficar junto e a gente começou a

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conversar sobre o recreio, sobre a greve dos funcionários da limpeza e

nem percebi quando a professora chegou. Ela não interferiu. Eu parei

de falar, disse que a professora tinha chegado, mas ela disse que

estava ótimo, que devia continuar, que as crianças estavam

envolvidas, aí a gente aproveitou e produziu um texto de apoio aos

funcionários. Quero mais dias assim! (Narrativa de B., 2015)

Hoje foi um dia diferente, as crianças estavam fazendo um relato

escrito sobre o passeio ao Parque Lage. Percebi que algumas estavam

escrevendo errado, mas venho percebendo que a professora não

corrige os erros de todas as crianças. Às vezes ela conversa com um

ou com outro. Eu não sabia como devia agir, para mim elas só deviam

escrever quando soubessem para não ficarem errando tanto. A

professora percebeu minha angústia, conversou comigo e disse que o

mais importante era o que a criança estava escrevendo e não como ela

escrevia e então percebi que tenho que parar de olhar de cima.

(Narrativa de C., 2015)

Refletindo sobre os encontros com as crianças, xs professorxs em formação

revelam momentos de aprendizagem que precisam dos sentidos, das intuições, dos

improvisos, do olhar cuidadoso. Desinvibilizam situações que revelam que no/com o

cotidiano das salas de aula se dá a relação com o outro, consigo mesmo, com o saber,

com o nãosaber por isso ele se constitui como espaçotempo de descobertas, de

aprendizagem, de formação significativa do ser professor.

Em sua narrativa, A. descreve o quanto aprendeu com a curiosidade da

pequenina aluna de 6 anos: “vi que precisava interagir” sugere que refletiu a respeito de

sua postura em sala de aula.

O pânico inicial de B. parece ter sido dissipado ao se abrir para aprenderensinar

com as crianças. O “não tinha planejado nada” me faz refletir na crença de que um

professor deve ter sempre tudo planejado e de que o “domínio” dos procedimentos,

objetivos e conteúdos de ensino poderia garantir o controle do que acontece nas salas de

aula. Por outro lado, seu relato vai desvelando o quanto a abertura para o acontecimento

possibilitou novas possibilidades de ensinaraprender e aprenderensinar. A narrativa de

C. parece trazer marcas de um modelo de linearidade e hierarquização do ensinar e

aprender: “para mim elas só deviam escrever quando soubessem para não ficarem

errando tanto” e, como a retirada de uma venda que só faz olhar por cima, ao longo de

sua narrativa, C. percebe que pode olhar de frente para, também, aprender. Podemos

perceber que as narrativas revelam a importância das trocas, da parceria do/com o

professor que está em sala de aula há mais tempo, mas que também aprendeensina.

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Com Süssekind (2014, p.12) é possível compreender os relatos como vestígios

de momentos de aprendizagem que acontecem no/com o cotidiano e “se constituem

como arte de fazerpensarfazer”. Cada narrativa pode trazer um conjunto de referências

que nos permitem estabelecer diálogos teóricos, políticos e educacionais porque são

artes de formação, de pensarfazer de forma única e reflexiva porque “quando alguém

nos faz um relato, ambos passamos por uma experiência única de conhecimento,

pensamos e transformamos a nós mesmos e o mundo” (SÜSSEKIND, 2012, p.17).

Utilizá-las como uma prática curricular emancipatória é um caminho para a luta pela

justiça cognitiva, para apagar as linhas abissais (SANTOS, 2010) traçadas nas salas de

aula, tanto no sentido literal como no metafórico.

Considerações finais

A escrita não é um veículo para se chegar a uma essência, a uma

verdade. A escrita é a viagem interminável. A escrita é a descoberta de

outras dimensões, o desvendar de mistérios que estão para além das

aparências. (COUTO, 2009, p. 104)

O estudo pretendeu trazer escritas que parte e se tecemvi

nos/dos/com os

cotidianos das aulas. Seus usos nos possibilitam refletir acerca dos saberesfazeres dxs

professorxs em formação, tecendo práticas que são (com)partilhadas, (re)pensadas,

(re)inventadas. No exercício de narrar-se, de inscrever-se no escrito, deixamos

registradas as vivências, as experiências coletivassingulares. Na dimensão de ator e

autor de nossas próprias narrativas, aprendemos sobre nós e sobre o outro. Como a mão

do oleiro na argila do vaso (BENJAMIN, 1994, p.205), imprimimos a nossa marca nos

inscrevendo no escrito.

Escrevendo livremente, lendo/relendo narrativas e relatos, nos tornamos co-

autores/co-enunciadores dos textos uns dos outros, numa relação que não vê hierarquia,

mas se constitui horizontalmente com aprendentesensinantes e ensinantesaprendentes,

todos entendidxs/respeitadxs como protagonizantes da pesquisa, cada um como uma

“rede de sujeitos gerada pelo enredamento das diferentes formas de inserção social.”

(OLIVEIRA, 2008, p.13)

Mergulhando com todos os sentidos (ALVES, 2008) nos/dos/com os cotidianos

escolares o estudo possibilita pensar o Pibid como espaçotempo de multiplicidade de

práticas, de táticas, ensinando-nos a aceitar, como dignas de interesse, de análise e

registro, as práticas comuns (CERTEAU, 2013), tidas como insignificantes, e que são

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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potencializadas através dos relatos e das narrativas que contribuem para a superação da

cegueira epistemológica (OLIVEIRA e SGARBI, 2007, p.19) desinvisibilizando

práticas emancipatórias presentes quando entramos nas escolas.

A respeito da cegueira epistemológica, aprendemos, com Oliveira e Sgarbi

(2007), que é culturalmente desenvolvida pelos sujeitos sociais em virtude dos

processos de socialização e dos saberes que nesses processos se tecem:

Esta cegueira pode ser superada – desaprendida – a partir de processos

cotidianos de desestabilização do já-sabido, que dariam origem tanto a

novas possibilidades quanto a impossibilidades, derivadas de novas e

diferentes cegueiras ou, ainda, de um impedimento à repetição. Ou

seja, a partir do questionamento e da desnaturalização dos valores e

saberes socialmente tecidos. (p.19)

Entendendo que faz-se necessário (re)pensar o conhecimento para além das

lógicas dominantes cientificistas e colonialistas, propomos a possibilidade de pensar

alunos e professores numa perspectiva de horizontalização de saberes, onde todos

aprendem e ensinam. Ao produzirem suas narrativas, professorxs em formação trazem

(suas) formas de enxergar o mundo e, ao compartilhar as impressões, tecem novas

possibilidades de currículo, possibilidades de emancipação, indo na contramão da

concepção hegemônica de educação, de formação e de currículo.

Os encontros semanais do PIBID promovem estratégias e abrem um campo de

possibilidades táticas de formação onde percebemos que, de certo modo, as hierarquias

e papéis preestabelecidos na relação escola-universidade se dissolvem, num entrelugar

pautado por práticas horizontais, ecológicas (SANTOS, 2010), e aprendem/ensinam

numa perspectiva de copresença de saberes (ibidem). As narrativas, produzidas como

forma de valorização das subjetividades e conhecimentos tecidos em rede, constituem-

se como instrumento para (re)pensar o currículo para além das normas formuladas pelas

autoridades educacionais, em tentativas cotidianas de reinventar a escola.

Reinventar a escola e horizontalizar as relações tem sido o caminho que

encontramos para enxergar que, além das cegueiras, há outras possibilidades.

Referências bibliográficas

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ATUAÇÃO DE PROFESSORES DA ESCOLA BÁSICA NA FORMAÇÃO DE

PEDAGOGOS DOCENTES: APRENDIZAGEM SOBRE A DOCÊNCIA NO

CONTEXTO DO PIBID

Talita da Silva Campelo

Secretaria Municipal de Educação de Duque de Caxias/RJ

Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ

Resumo

O presente trabalho apresenta alguns dos resultados de uma pesquisa com foco nos

diferenciais da parceria universidade - escola básica para a formação inicial de

pedagogos docentes no contexto do PIBID Pedagogia de uma universidade federal do

Rio de Janeiro. Cuida de analisar as ações desenvolvidas nesse projeto, adotando como

foco investigativo as intervenções e mediações das professoras supervisoras das escolas

parceiras. Para conduzir o estudo foi formulada a seguinte questão: quais as

contribuições do papel desenvolvido pelas professoras supervisoras do PIBID

Pedagogia investigado para a formação inicial do pedagogo docente na perspectiva da

parceria universidade - escola básica? Para tanto, foram propostos os seguintes

objetivos: analisar o trabalho desenvolvido pelas professoras supervisoras com os

licenciandos participantes do programa e compreender como se constituem as

intervenções das professoras supervisoras investigadas no processo de formação

docente desses licenciandos. Metodologicamente, foi desenvolvido um estudo de caso a

partir das contribuições de André (2005 e 2013) e Yin (2010). Optamos por além de

observações, realizar entrevistas e análise documental tanto de documentos oficiais

quanto daqueles produzidos pelos sujeitos no contexto do programa. Vários autores

contribuíram para o embasamento teórico do estudo no que se refere a compreensão da

escola como lugar proeminente de construção de conhecimento sobre a docência, bem

como o lugar desses saberes oriundos da experiência em sala de aula na formação inicial

docente e, finalmente, o papel do professor da escola básica como co-formador de

licenciandos. Entretanto, situam-se como referências principais Cochran-Smith e Lytle

(1999) e Zeichner (2010). Quanto a aprendizagem da docência nos licenciandos,

identificamos que a ação das professoras supervisores contribui com a familiaridade

com as especificidades do ofício; o favorecimento da relação teoria e prática; e o

desenvolvimento de uma postura investigativa.

Palavras-chave: Pedagogos docentes - PIBID - Parceria universidade-escola básica.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3424ISSN 2177-336X

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ATUAÇÃO DE PROFESSORES DA ESCOLA BÁSICA NA FORMAÇÃO DE

PEDAGOGOS DOCENTES: APRENDIZAGEM SOBRE A DOCÊNCIA NO

CONTEXTO DO PIBID

Talita da Silva Campelo

Secretaria Municipal de Educação de Duque de Caxias/RJ

Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ

Introdução

Este trabalho apresenta os resultados de um estudo de caso que analisa os

diferenciais da parceria universidade - escola básica para a formação inicial de

pedagogos docentes no contexto do PIBID (Programa Institucional de Bolsas para

Iniciação à Docência). Nosso interesse são as relações de ensino/aprendizagem sobre a

docência que se estabelecem, no contexto do programa, entre professores experientes na

escola básica e professores em formação inicial. Nesse sentido, está centrada nas ações

do programa que se desenvolvem a partir das mediações e intervenções das professoras

supervisoras.

Integrante do Plano Nacional de Formação de Professores (2009), o PIBID é um

programa brasileiro de iniciação à docência que visa a participação de licenciandos em

atividades de ensino-aprendizagem desenvolvidas na escola pública. O programa é

desenvolvido por meio da concessão de bolsas de iniciação à docência para estudantes,

bolsas de coordenação para professores coordenadores (Instituições de Ensino Superior)

e bolsas de supervisão para professores supervisores (Escola Básica). Seu lançamento

ocorreu em dezembro de 2007, mediante Edital MEC/CAPES/FNDE 01/2007vii

.

Os licenciandos são envolvidos, ao longo de sua participação no programa, no

processo de planejamento e desenvolvimento de atividades de aula, materiais didáticos e

projetos interdisciplinares em ciclos contínuos (não há limitações de tempo para

permanência dos licenciandos no programa). Tudo isto é feito coletivamente com

professores supervisores (da escola básica) e professores coordenadores (da

universidade). Estas características distintas do programa certamente imprimem

mudanças na formação dos licenciandos que dele participam.

Concentrando-nos no PIBID Pedagogia de uma universidade federal do Rio de

Janeiro nos interessa analisar as ações desenvolvidas nesse projeto, adotando como foco

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3425ISSN 2177-336X

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investigativo as intervenções e mediações das professoras supervisoras das escolas

parceiras: quais as contribuições do papel desenvolvido pelas professoras supervisoras

do PIBID Pedagogia para a formação inicial do pedagogo docente na perspectiva da

parceria universidade - escola básica?

Aspectos teóricos e metodológicos

Metodologicamente, desenvolvemos um estudo de caso único (holístico), com

base nos pressupostos de André (2005 e 2013) e Yin (2010). O caso se forja na

especificidade do PIBID Pedagogia da instituição investigada, cuja prática requer que os

bolsistas façam etnografia da prática escolar, se inserindo na turma semanalmente como

coparticipe dela, indo além da proposta de desenvolver atividade de ensino em tempo

específico, o que requer um convívio prolongado de aprendizagem sobre a docência sob

a intervenção da professora supervisora.

André (2005) sinaliza que o estudo de caso ressurge na pesquisa educacional

com um sentido mais abrangente: o de focalizar um fenômeno particular, levando em

conta seu contexto e suas múltiplas dimensões. Valoriza-se o aspecto unitário, mas

ressalta-se a necessidade da análise situada e em profundidade. Assim, o mundo do

sujeito, os significados que atribui às suas experiências cotidianas, sua linguagem, suas

produções culturais e suas formas de interações sociais constituem os núcleos centrais

de preocupação dos pesquisadores. Se a visão de realidade é construída pelos sujeitos,

nas interações sociais vivenciadas em seu cotidiano, torna-se fundamental uma

aproximação do pesquisador a essas situações (ANDRÉ, 2005).

Preocupados com isto optamos por uma imersão em campo de um ano. Neste

período construimos evidências no contato direto com os sujeitos envolvidos no projeto:

1 professora coordenadora (universidade), 5 professoras supervisoras (escolas parceiras)

e 14 licenciandos bolsistas. Foram feitas observações, entrevistas e análise documental.

O material coletado reúne atas de reuniões, escritas dos bolsistas (caderno de

campo, diário de campo, portifólio, comunicação oral, relato de experiência e escrita

etnográfica), propostas de atividades de ensino, análise reflexiva das práticas, filmagem

de aulas, apresentações de trabalhos em eventos da área e relatórios. A observação se

deu em duas fases: a primeira fase, desenvolvida nos encontros semanais do PIBID

Pedagogia na universidade. A segunda fase ocorreu na sala de aula do professor

supervisor de uma das escolas parceiras, onde aconteciam encontros semanais entre ele

e licenciandos do PIBID.

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3426ISSN 2177-336X

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Para análise e interpretação dos dados nos utilizamos de uma estratégica

analítica geral (YIN, 2010) voltada para o exame, a categorização, a tabulação, o teste

ou nas evidências recombinadas de outra forma, para tirar conclusões baseadas

empiricamente. Para isso foram usados um dos quatro eixos propostos por Yin (2010): o

exame dos dados a partir das proposições teóricas. Foram usadas também técnicas

específicas da análise dos estudos de caso propostas pelo autor, como a combinação de

padrão, a construção da explanação e a síntese cruzada dos dados.

Para fundamentar nosso estudo, nos apoiamos em dois autores: Zeichner (2010)

e Cochran-Smith & Lytle (1999). Nossas proposições teóricas decorrem do estudo sobre

dois eixos: relação teoria-prática e parceria universidade - escola básica. Direcionamo-

nos ao desenvolvimento de terceiros espaços como facilitadores da articulação entre as

dimensões teóricas e práticas do conhecimento sobre a docência (ZEICHNER, 2010), e

de igual modo, às concepções de formação de professores que preveem a troca de

saberes entre docentes experientes e em formação inicial (COCHRAN-SMITH e

LYTLE, 1999).

Com base nesse conjunto de ideias e proposições e com foco nas intervenções e

mediações dos professores supervisores das escolas parceiras sobre os licenciandos do

PIBID, estabelecemos como objetivos de nossa pesquisa: analisar o trabalho

desenvolvido pelas professoras supervisoras com os licenciandos participantes do

programa e compreender como se desenvolvem as intervenções das professoras

supervisoras investigadas no processo de formação docente desses licenciandos.

Neste trabalho trazemos os dados no que se refere às implicações da participação

de professores da escola básica como co-formadores de pedagogos docentes no contexto

do PIBID Pedagogia investigado. Os resultados que aqui trazemos se referem a

totalidade da análise dos dados colhidos ao longo de toda a imersão em campo, no

entanto, neste recorte trazemos o foco para os depoimentos dos licenciandos. Conforme

o termo de consentimento assinado pelos sujeitos da pesquisa, a identidade de todos os

envolvidos será preservada. Para fins de organização foram utilizados codinomes para

os licenciandos bolsistas – PIB seguido de número.

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Aprendizagem da docência na relação entre professoras supervisoras e

pibidianosviii

Ao analisar o trabalho desenvolvido pelos professoras supervisoras com os

licenciandos participantes do PIBID Pedagogia investigado, percebemos como

professoras da escola básica e licenciandos podem compartilhar e desenvolver saberes.

Os dados nos mostram que pela via da desprivatização da prática (COCHRAN-SMITH,

2012), os pibidianos constroem conhecimentos sobre a docência quando podem indagar

- participar, interferir - suas supervisoras sobre os processos (intelectuais, reflexivos,

organizacionais) que acompanham seu trabalho.

Constatamos que muito além de permitir que sua prática seja investigada, o que

vemos, por exemplo, no estágio curricular, no PIBID investigado as professores da

escola-básica expõem constantemente a escrutínio, julgamento e análise o que ensinam,

porque ensinam e como ensinam. Percebemos que quando licenciandos podem dialogar

sobre o trabalho docente e experimenta-lo com o apoio de professores experientes, a

aprendizagem sobre o oficio de ensinar é potencializada.

Quando o professor da escola básica compartilha seus saberes sobre a docência

em movimentos de auxiliar o desenvolvimento/planejamento de ações de licenciandos

na sala de aula, instigando a reflexão (a partir do que faz e do que os licenciandos

fazem), passa a contribuir significativamente na formação docente dos licenciandos.

Este movimento, intensificado pela ausência de limites de tempo, imprime

diferenciais importantes para a formação de professores. As implicações para os

licenciandos que se expressam na possibilidade de pensar/experimentar a docência com

professores que já a exercem na escola básica, se revelaram em três aspectos:

familiaridade com as especificidades do ofício; favorecimento da relação teoria e

prática; e desenvolvimento de uma postura investigativa.

Os dados nos mostram que os pibidianos se familiarizaram com aspectos da

docência que muitas vezes se ocultam nos fazeres dos professores por conviverem tão

de perto (e por tanto tempo) com as professoras supervisoras, não apenas as observando,

mas as questionando e desenvolvendo ações sob sua orientação. O trabalho

desenvolvido no PIBID Pedagogia investigado proporciona a antecipação de

experiências que apenas seriam vividas no exercício do trabalho, como acompanhar

uma turma, planejar e desenvolver atividades, fazer avaliações de aprendizagem. A

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3428ISSN 2177-336X

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despeito de outros modelos formativos, a grande diferença está em fazer isso em um

ciclo contínuo não pré-determinado temporalmente.

Ao relatar sobre a oportunidade de desenvolver atividades com os alunos, Pib 1

afirmou que “nessas horas eu me sinto professora [risos] eu estou me formando

professora”(comunicação oral Pib 1). A oportunidade de entrada precoce na escola e de

vivenciar nela experiências de trabalho já seria de muita relevância para a formação

docente desses licenciandos, pois tal como afirma Zeichner (2010) “muito do que os

professores precisam aprender deve ser aprendido na e a partir da prática, ao invés de na

preparação para a prática”. No contexto do PIBID, o estudo deste caso nos mostra o

quanto vivenciar este processo na companhia de professores que já atuam na escola

básica potencializa seus efeitos.

O acompanhamento das ações do PIBID Pedagogia deste caso nos mostrou o

quanto “viver a docência” junto com professores que já atuam na escola contribui para a

aprendizagem docente dos pibidianos. Nesse sentido experimentar a docência, sem as

responsabilidades de um professor, sob a supervisão de quem já a exerce possibilitou

que os licenciandos bolsistas investigados se familiarizassem com as especificidades do

ofício docente. Pensar o trabalho docente com as professoras supervisoras, a partir da

observação dos seus fazeres em sala e do planejamento e desenvolvimento de atividades

com a contribuição dos seus saberes, aproxima os pibidianos da escola e do que de fato

os professores fazem lá.

Para os pibidianos, trabalhar na escola com professores da escola básica - seus

supervisores - permite “avaliar a minha atuação como futura docente, perceber os

desafios diários, a importância do planejar uma atividade e até mesmo a sensibilidade

para atuar de acordo com a reação da turma e sempre com a ajuda do professor

supervisor” (auto avaliação Pib 5). Sobre isso, Pib 6 diz que com Sup 5 teve “apoio para

o seu desenvolvimento, sobre como se comportar como docente”, além de aprender

como desenvolver atividades e de que maneira avaliar os alunos

em seu processo de desenvolvimento da escrita,(...) a percepção

de dificuldades com as quais os docentes se deparam ao

realizarem suas tarefas, quando o aluno apresenta alguma

dificuldade ao realizar as atividades (auto avaliação Pib 6).

Para professores em formação inicial, este modelo de aprendizagem da docência,

tal como propõem Cochran-Smith e Lytle (2002), substitui noções antigas de

treinamento de professores como um processo que acontece de uma vez, antes do início

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3429ISSN 2177-336X

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da carreira docente, onde graduandos seriam “equipados” com conteúdos, métodos de

cada área específica, e informações sobre fundamentos educacionais, e então partiriam

para "praticar" o ensino. A seguir, um exemplo de como os pibidianos vivenciaram a

experiência de exercer a docência ainda estando em formação, em uma perspectiva

diferente:

“A experiência que o PIBID têm me proporcionado,de poder

acompanhar o processo de ensino/aprendizagem dos alunos, de

poder participar deste desenvolvimento desde o começo, é uma

grande oportunidade. É ótimo poder ver qual a realidade que as

crianças vivem na escola e como é ser professora.”

(autoavaliaçãoPib 7).

Vivenciar situações de ensino/aprendizagem sob a supervisão de professores da

escola básica permitiu aos licenciandos oportunidades para “ampliar, tornar explícito e

articular o conhecimento tácito entranhado na experiência” (COCHRAN-SMITH e

LYTLE, 2002). Nesse processo a aprendizagem da docência é mais construtivista do

que orientado por uma concepção transmissivista. Para Cochran-Smith e Lytle (2002)

conceber assim o processo de ensino/aprendizagem da docência carrega a ideia de que

ensinantes e aprendentes trazem conhecimentos e experiências prévias específicas, e

que a aprendizagem ativa requer oportunidades de unir conhecimentos prévios com

novas compreensões.

Quanto a estas novas compreensões, os dados revelam também que os

pibidianos perceberam como o trabalho docente é marcado por conexões teórico-

práticas ao serem instigados por suas supervisoras a fazê-las e ao verem nas práticas

delas como elas tomam forma.

Os pibidianos deste caso relatam com muita satisfação o quanto participar do

PIBID Pedagogia tem sido contributivo para ajudá-los na relação teoria-prática. Tanto

em conversas informais, quanto em portfólios, relatos de experiência e autoavaliações,

ideias relacionadas à relação teoria-prática estavam, em maior ou menor proporção,

sempre presentes. Pib 3 relata que “ao decidir participar do projeto, tinha em mente que

seria a oportunidade de aprender coisas que eu acreditava não ter a chance de aprender

na sala de aula da faculdade”. Sobre essa intenção, viu-se realizada porque “após a

minha entrada, vi que realmente seria um aprendizado diferente, pois o PIBID, para

mim, uniu a teoria e a prática com um grande enfoque na nossa formação como futuros

docentes” (autoavaliação Pib 3).

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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Sobre isso, Pib 1 também relata como não apenas observar, mas também poder

dialogar com um professor da escola básica sobre o que ele faz em sala de aula é

contributivo para a aprendizagem da docência. Pib 1 nos conta como foi perceber o

papel da leitura funcional na alfabetização:

“(...) e foi aí, que nesse dia, eu percebi que o livro, a história, é

como uma chave pra aula. Sup 3 trabalha todos os outros temas

e eles emergem da história, daquela leitura (...) e eu achei isso

muito diferente porque eu nunca tinha vivenciado isso, nem na

minha formação escolar.” (comunicação oral Pib 1).

Pib 1 faz questão de ressaltar o papel de sua professora supervisora nesse

processo. Para ela,“isso foi uma coisa que eu aprendi com Sup3, vendo ela, gravando

ela, conversando com ela (...), algumas coisas eu percebi, alguns elementos diferentes”

(comunicação oral Pib 1). A seguir outros relatos que seguem nesta direção:

“A gente se inspira muito no que Sup3 faz, na prática dela,

muitas coisas que eu vi, por exemplo, como é que você vai

ensinar uma criança a ler, vai alfabetizar uma criança, eu não

estava preparada pra fazer isso (...) e ela mostrou isso (...) e é

uma coisa muito diferente do que aprendi no estágio e pra mim

está ajudando muito a construir com eles essas „coisas de

escola‟.” (comunicação oral Pib 3).

Quando se trata de estimular conexões teórico-práticas como estratégia de

intervenção adotada pelas professoras supervisoras, os dados mostram o quanto seu uso

era recorrente. Ficou nítido como as professoras supervisoras observadas neste caso

tinham especial interesse em ajudar os pibidianos a superar a desconexão entre teoria e

prática, entre conhecimentos acadêmicos e conhecimentos profissionais. No entanto, ver

muitas vezes nos bolsistas expressões aflitas quando não conseguiam explicar qual a

relação entre o que aprendiam na universidade e o que aprendiam na escola não nos

surpreendeu.

Para Zeichner, esta questão está diretamente ligada ao fato de que a “desconexão

entre o que é ensinado aos estudantes nos cursos acadêmicos e suas oportunidades de

aprendizagem para levar a tais práticas em suas respectivas escolas não raramente é

muito grande, inclusive nas escolas parceiras” (2010, p.484). Os depoimentos dos

pibidianos ilustram como presenciar práticas de professores experientes e poder pensar

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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sobre elas - problematizá-las e investigá-las - com esses mesmos professores é

importante para favorecer a relação teoria e prática.

Quanto a isto os dados mostram que a experiência no PIBID é potencializada

com a atuação de professores híbridos (ZEICHNER, 2010): quando as professores

supervisoras se tornam formadoras atuando em um espaço que não é primariamente seu

- a formação docente - e em uma função que não é primariamente sua: formar

professores - se fazem melhor aproximações entre universidade e escola pela via do

trabalho docente, da experiência de quem vive o ensino na escola. Com isso, para as

supervisoras a participação no programa representa a oportunidade de retorno ao espaço

da universidade, em outro papel, na condição de formadoras, o que favorece um novo

olhar sobre a própria prática e sobre a escola. É nessa interface que se mostram as

maiores diferenças que o PIBID traz para a formação de professores.

Ao intervirem junto aos pibidianos compartilhando experiências – e as

colocando sob escrutínio, instigando a reflexão – tomando o ensino e o que acontece

antes, durante e depois dele como problematizável, e estimulando a observação–

permeando-a de análise crítica, as supervisoras contribuem para que os bolsistas

desenvolvam uma postura investigativa. Para além da reflexão como característica

inerente do trabalho doente – enquanto marcado por intelectualidade e racionalidade –

estas intervenções das supervisoras imprimem nos licenciandos o entendimento da

aprendizagem da docência como um processo contínuo que se faz na coletividade

através da busca por respostas a questões que funcionam como lentes para ver e dar

significado à prática construída.

Entrar em contato com o projeto PIBID aumentou o meu desejo

por uma profissionalização mais especializada, qualificada,

diferente e ousada. Ao discutir ideias, próximas ou diferentes

das minhas, meus horizontes se alargam quanto às variadas

possibilidades do ato de ensinar, que para mim é mais que

transmitir conteúdos, é também agregar valores psicológicos,

sociais e morais, despertar interesses e principalmente estimular

o prazer pelo ato de aprender (relato de experiência Pib 13).

Segundo Cochran-Smith e Lytle (1999) a investigação como postura como

construto para entender o aprendizado de professores baseia-se em uma concepção mais

rica de conhecimento que as permitidas pela tradicional distinção conhecimento

formal/conhecimento prático, uma concepção mais rica de prática que a sugerida no

aforismo que a prática é prática, uma concepção mais rica de aprendizado ao longo da

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3432ISSN 2177-336X

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história de vida profissional que o conhecimento de especialização e uma concepção

mais rica de culturas e propósitos educacionais que as difundidas por muitas reformas

escolares. Nesse sentido, a postura investigativa não segue a distinção entre

conhecimento formal e conhecimento prático; enfatiza, isto sim, a importância do

conhecimento localix

que também pode ser útil em contextos mais amplos.

Nesse sentido, tão importante quanto investigarx a docência é investigar a

docência coletivamente, entendendo que se aprende mais e melhor sobre o trabalho

docente quando os professores - investigadores/investigados - expõem o que fazem

dentro das salas de aula. No que se refere ao PIBID estudado, sobre esse movimento de

problematizar e investigar o trabalho docente em grupos que congregam professores

experientes e em formação inicial, Pib 14 diz que permite o desenvolvimento de ambos

os atores “pois tanto os pibidianos levantam dúvidas e sugestões, quanto os professores

supervisores passam a refletir sobre sua prática docente, trazendo novas formas de

ensinar” (relato de experiência Pib 14). Aqui destaca-se o papel do professor supervisor

como sendo aquele que corporifica o elo entre universidade e escola-básica, como sendo

aquele que aproxima os pibidianos com o trabalho docente pela via da escuta e do

diálogo.

Esta centralidade na figura do professor supervisor nos mostrou algumas

questões que precisam ser ponderadas. Não conseguimos constatar com clareza até que

ponto a familiaridade com as especificidades do oficio docente dos licenciandos eram

influenciadas pela visão da supervisora sobre a sua escola e sua sala de aula.

Percebemos várias vezes nas falas dos pibidianos reproduções quase ipsis litteris de

falas das professoras supervisoras no que se refere ao trabalho docente e as escolas

parceiras.

Está claro que para pibidianos e para professoras supervisoras a relação teoria e

prática foi favorecida nos processo formativos que envolvem o PIBID UFRJ Pedagogia.

Os dados, no entanto, não nos mostram nitidamente a “teoria” da relação teoria e

prática. Quanto a isso, as observações nos mostraram que os pibidianos ainda não têm

aporte nem teórico e nem prático para se posicionarem com/contra as conexões entre os

conhecimentos acadêmicos e profissionais que as supervisoras fazem. Percebemos que

este aporte está sendo construído (ampliado e consolidado) pelas ações do PIBID

Pedagogia investigado principalmente pelo movimento de problematizar o trabalho

docente. Estimular os licenciandos a desnaturalizar o que veem na escola e no trabalho

da professora supervisora é importante neste processo.

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3433ISSN 2177-336X

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Quanto a isto, ainda que percebamos nos pibidianos o desenvolvimento de uma

postura investigativa, de fato ela se mostrou muito ligado aos questionamentos que eles

faziam as professoras supervisoras. Assim as supervisoras se configuram como os

suscitadores das perguntas e das respostas dos pibidianos, que ainda não têm condições

plenas para fazerem conexões mais amplas entre o que acontece na sala de aula onde

estão alocados e a escola como um todo (menos ainda quando se fala de escolas).

Acreditamos que o desenvolvimento de uma postura investigativa apenas começou, não

temos certeza se será consolidado em todos os sujeitos envolvidos, mas cremos que se

assim o for será especialmente bom para o futuro exercício profissional dos pibidianos

quando enfim forem professores (COCHRAN-SMITH 1999, 2001 e 2002).

Conclusões

Tal qual Cochran-Smith e Lytle (1999), acreditamos que aprender a docência é

algo que acontece com o tempo, e isso acontece quando novos professores trabalham na

companhia de professores mais experientes, que também continuam aprendendo a

ensinar. No entanto, defendemos que já na formação inicial deve se possibilitar aos

licenciandos situações em que possam construir conhecimentos sobre a docência, a

partir da troca com professores que já atuem na escola básica.

Os dados nos mostram que a tríade de familiarizar-se com as especificidades do

oficio docente, favorecer a compreensão da indissociabilidade entre teoria e prática

presente no trabalho do professor e o desenvolvimento de uma postura investigativa

(questionadora e problematizadora) é contributiva para a aprendizagem da docência nos

licenciandos observados no PIBID investigado. No entanto, ainda que estas

contribuições sejam notórias, os dados nos mostram também o quanto isto é um

processo em construção cujas consequências começam a se consolidar em um

movimento vivo que avança e retrocede nos sujeitos envolvidos pelas próprias ações

deles, pelos significados que se forjam diante das experiências vividas.

Os aspectos aqui listados estão profundamente ligados ao relacionamento

supervisor & licenciandos bolsistas, no entanto não negamos que compõem parte

significativa de um processo formativo mais amplo. Os conhecimentos construídos

sobre a docência no PIBID não se traduzem necessariamente em ineditismo, mas sim

em arrumações com novas significações de saberes e fazeres que muitas vezes não se

comunicam ao longo da trajetória curricular.

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3434ISSN 2177-336X

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Consideramos também que as ações das supervisoras sobre os pibidianos se

mostram eficazes pela estrutura do programa. Nesse sentido, o diálogo, a coletividade, a

parceria e principalmente tempo e espaço propícios são fundamentais para que este

relacionamento produza de fato bons frutos.

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3435ISSN 2177-336X

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DIFERENCIAIS DO PIBID PEDAGOGIA NA DOCÊNCIA DE DOIS

PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA

Fernanda Lahtermaher Oliveira

Giseli Barreto da Cruz

Universidade Federal do Rio de Janeiro

Resumo

Este trabalho trata dos resultados de uma pesquisa sobre os diferenciais do PIBID,

subprojeto Pedagogia de uma universidade pública federal localizada no Rio de Janeiro,

na atuação de dois professores da Educação Básica. Analisa os saberes docentes

mobilizados pelos investigados no seu cotidiano escolar, compreendendo quais

estratégias de ensino-aprendizagem se baseiam para ensinar e relacionando-as com suas

concepções de ensino. Foi construído segundo a fundamentação teórica de Tardif

(2002), que situa os saberes docentes a partir da origem social dos saberes, entendendo

que são próprios dos professores, fazendo-se necessário levar em consideração o que

dizem a respeito da sua prática e a relação com o campo de atuação; Cochran-Smith &

Lytle (1999), que auxiliam no entendimento do que significa ensinar no contexto da

prática. Metodologicamente, trabalhou-se com os recursos da entrevista semiestruturada

visando compreender as razões pelas quais os professores ensinam da forma que

ensinam e da análise de documentos, como fotos e registros de campo do ano de 2013,

fase em que os professores investigados estavam no PIBID. O estudo revela que a

participação no PIBID proporcionou uma maior segurança em sala de aula; autonomia

para buscar novos conhecimentos; estratégias de ensino-aprendizagem desenvolvidas

em parceria com os alunos nas escolas; pensamento crítico sobre as concepções de

ensino e, deste modo, os depoimentos ratificam uma racionalidade, demonstrando que

esses professores sabem as razões de suas práticas pedagógicas.

Palavras-chave: Formação de Professores; Educação Básica; Pibid.

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3436ISSN 2177-336X

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DIFERENCIAIS DO PIBID PEDAGOGIA NA DOCÊNCIA DE DOIS

PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA

Fernanda Lahtermaher Oliveira

Giseli Barreto da Cruz

Universidade Federal do Rio de Janeiro

Introdução

O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID - é uma

iniciativa importante que, embora tenha um impacto parcial, pois não atende a toda

demanda da formação inicial, tem possibilitado resultados positivos no que tange a

iniciação à docência. Ao oferecer bolsas para os licenciandos atuarem no contexto das

escolas públicas ao mesmo tempo que são orientados por professores supervisores nas

escolas e professores coordenadores na universidade, o programa estimula uma parceria

entre as duas instituições formadoras. Essa parceria corrobora com a ideia de que teoria

e prática são indissociáveis e os saberes produzidos pela universidade, assim como pela

escola, contribuem para uma formação teórico-prática contextualizada com as

realidades locais.

Por conseguinte, o PIBID se configura como uma importante iniciativa de

mudança nas licenciaturas no que se refere a própria visão que os futuros professores

têm da sua profissão, já que encaram a realidade escolar com profundidade, elaborando

materiais didáticos, acompanhando o professor e analisando seu planejamento,

conforme apontam as pesquisas e avaliações na área (GATTI, 2013).

O presente trabalho tem como objetivo expor os resultados de uma investigação

que apresenta os diferenciais da formação através do PIBID, subprojeto Pedagogia, na

atuação de dois professores da Educação Básica. Para isso, são analisados os saberes

docentes que mobilizam com mais recorrência no cotidiano escolar, suas estratégias de

ensino-aprendizagem e concepções de ensino. Afinal, quais são os conhecimentos que os

professores investigados mobilizam cotidianamente nas salas de aula?

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3437ISSN 2177-336X

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Aspectos teóricos e metodológicos

Adota-se como referencial teórico Tardif (2002), que situa os saberes docentes a

partir da origem social dos saberes, entendendo que são próprios dos professores,

fazendo-se necessário levar em consideração o que dizem a respeito da sua prática e a

relação com o campo de atuação; e Cochran-Smith & Lytle (1999), que auxiliam no

entendimento do que significa ensinar no contexto da prática.

Tardif nos ajuda a entender que o saber do professor não se separa das outras

dimensões do ensino, nem como do trabalho que realiza diariamente. Portanto, o saber é

inserido em um sentido mais amplo da profissão docente, que também está situada em

um contexto histórico e social. Segundo Tardif (2002, p.11) “o saber é sempre o saber

de alguém que trabalha alguma coisa no intuito de realizar um objetivo qualquer”. Deste

modo, falar em saber dos professores é legitimar um saber que é próprio deles, que está

relacionado com a sua identidade, trajetória de vida e experiências pessoais e

profissionais.

Para o autor podemos denominar este saber como social, já que é compartilhado

por um grupo de professores que, apesar de possuírem a mesma categoria profissional,

tem trajetórias de formação e atuação diferentes. Além disso, os produtos dos seus

saberes são coletivamente discutidos e definidos, como currículos, planos de ensino, o

que deve ser ensinado, etc. De modo que a legitimação também é social e se distancia

de afirmações unicamente cognitivas ou epistemológicas.

O professor trabalha com práticas sociais já que ensina a sujeitos que estão

inseridos em um contexto político e que, portanto, atuam diretamente nele, sendo

influenciados e influenciando o mundo a sua volta, o que revela que o saber não é algo

estático, está em constante mudança e adaptação. É possível perceber que a própria

importância que é dada a determinados saberes é diferente de outros em determinados

momentos históricos.

Tardif (2002) afirma:

Noutras palavras, a Pedagogia, a Didática, a Aprendizagem e o Ensino

são construções sociais cujos conteúdos, formas e modalidades

dependem intimamente da história de uma sociedade, de sua cultura

legítima e de suas culturas (técnicas, humanistas, científicas,

populares, etc.), de seus poderes e contrapoderes, das hierarquias que

predominam na educação formal e informal, etc. (TARDIF, 2002.

p.14).

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Portanto, o saber dos professores é sempre situado, pois está em constante

relação com sujeitos, sejam os alunos, diretores, pais, de uma instituição de ensino e em

uma relação de trabalho que exige tarefas complexas, tendo em vista que ensinar

depende de uma série de artifícios. Além disso, exige tempo, pois o saber do professor

irá se modificar ao longo da sua carreira, suas experiências e vivências de modo que a

cada mudança (seja de escola, turma, bairro) haja novos aprendizados.

No entendimento que o saber do professor é próprio, mas ao mesmo tempo

social, temporal e situado faz-se necessário pontuar que esse conhecimento advém da

sua prática de ensino. Assim, os saberes são mobilizados a partir da, na e para a

prática, como apontam as autoras Cochran-Smith & Lytle (1999).

Segundo essas autoras, é através da ação docente que de fato é possível perceber

como manifestam seus conhecimentos. É possível inferir que o conhecimento para a

prática é aquele que ocorre no contexto das instituições formais de ensino, ou seja, é o

“conhecimento formal”, como as teorias gerais e pesquisas na área da educação. Nesta

perspectiva, esses conhecimentos servirão como base para os saberes docentes.

O conhecimento na prática é o conhecimento em ação, o que os professores

sabem e refletem no contexto da prática, mas que ocorre no momento em que é

expressado ou articulado os seus saberes docentes. Nesse sentido, o conhecimento é

entendido como situado e incerto, pois acontece por meio das particularidades

cotidianas da sala de aula.

O interesse neste estudo envolve a problemática dos saberes docentes

mobilizados com mais recorrência por professores egressos do PIBID que atualmente

atuam na Educação Básica e o que eles pensam e fazem para ensinar. Para isso, buscou-

se compreender de que forma o PIBID contribuiu para serem os professores que são

hoje. Para atender a essas questões foram realizadas entrevistas semiestruturadas,

análise de documentos, imagens e planos de aula, para uma posterior análise de

conteúdo. Os dados se referem tanto ao período de participação dos sujeitos no PIBID,

quanto ao posterior a este em que começam a carreira docente.

No âmbito do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência, a

Universidade Federal do Rio de Janeiro atendeu a chamada pública de dezembro de

2007, apresentada conjuntamente pelos Ministério da Educação - MEC, Fundação

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES, e Fundo

Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE.

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3439ISSN 2177-336X

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A pedagogia é inserida como subprojeto conforme edital nº 11/2012. Foi através

da ampliação deste edital que o subprojeto deu início as suas atividades, tendo como

foco os anos iniciais do Ensino Fundamental. No edital seguinte, de 2013, foi também

incorporada a área de educação infantil. Deste modo, o PIBID UFRJ Pedagogia passou

a ter duas coordenadoras de área com dois grupos diferenciados de bolsistas, escolas e

professores supervisores. O presente trabalho se detém a investigar somente a área dos

anos iniciais do Ensino Fundamental.

O primeiro projeto contou com a parceria do CAp UFRJ, colégio de aplicação da

Universidade Federal do Rio de Janeiro, e coube aos estudantes acompanhar, subsidiar e

refletir sobre o trabalho desenvolvido nesta escola. Iniciou com uma professora

coordenadora, uma professora supervisora e cinco estudantes. As reuniões semanais do

grupo ocorriam, majoritariamente, na Faculdade de Educação e havia mais um encontro

na escola onde os estudantes realizavam a observação participante.

Tendo em vista que o PIBID Pedagogia contemplado neste estudo iniciou em

2013 e desde então, dois licenciandos do grupo se graduaram e exercem a docência

profissionalmente, a atual pesquisa abarca 100% dos casos elegíveis para análise. Nesse

sentido, a investigação abarca 100% dos egressos até o presente momento,

proporcionando possibilidades exequíveis de análise para o entendimento dos saberes

docentes que estes professores vêm mobilizando com mais recorrência em sala de aula.

Os dados são apresentados trazendo os relatos desses dois professores,

apresentando sua visão sobre a participação enquanto integrantes de um projeto PIBID e

suas argumentações referentes às práticas em sala de aula. Deste modo, nos interessa

saber quais estratégias os professores investigados mobilizam em suas práticas docentes

e a partir de quais concepções de ensino. Entende-se que a partir dessas questões será

possível perceber com mais clareza os saberes que têm movimentado com mais

recorrência de modo que seja possível refletir sobre os diferenciais do PIBID na

formação desses sujeitos.

Três características se destacam na ação pedagógica atual desses dois

professores: uma visão crítica sobre as concepções de ensino; a importância de

escutar os alunos; e autonomia pedagógica. A partir destes elementos, neste trabalho

nos deteremos na análise somente da racionalidade discursiva, como aponta TARDIF

(2002). Os nomes dos professores foram trocados e suas falas apresentam a codificação

da primeira letra do nome fictício mais a indicação do material e a ordem.

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Os diferencias do PIBID na docência de dois professores da escola-básica

O PIBID Pedagogia do qual os sujeitos investigados participaram, se caracteriza

como um projeto que visa à inserção do estudante em um contexto profissional e, neste

caso, no primeiro ano do ensino fundamental, pois o projeto tem como foco a

alfabetização. Essa parceria entre escola e universidade facilita que o estudante conheça

a realidade que irá enfrentar, contextualizando seus saberes docentes, criticando o

contexto escolar e vivenciando dilemas reais do cotidiano docente.

Sendo assim, não é um projeto de pesquisa, porém se inspira nos estudos

etnográficos para realizar suas atividades. Estratégias como os diários de campo,

registros etnográficos, observação participante são utilizadas para favorecer essa

imersão.

Os professores acompanhados neste estudo participaram do PIBID até 2013 e

hoje atuam como docentes em escolas do Rio de Janeiro. João trabalha em uma escola

no centro do Rio com os primeiros anos do Ensino Fundamental, enquanto Thamara

atua em duas escolas públicas de educação infantil. São jovens recém-inseridos no

campo profissional e que ao mesmo tempo em que possuem uma trajetória profissional

muito parecida, passaram por experiências diversificadas ao longo das suas vidas.

Os dois professores sinalizam aspectos parecidos ao longo da sua trajetória no

que se refere a escolha pelo magistério e as dúvidas que antecederam seu interesse ao

ingressar no PIBID, e as razões pelas quais ficaram, mas, principalmente, aproximam-se

quando justificam as suas ações em sala de aula. Thamara e João relatam que hoje se

sentem mais seguros na escola, tentam ao máximo ouvir os alunos, realizando

atividades que vão ao encontro dos seus interesses. Apresentam uma visão crítica sobre

as concepções de ensino e as estratégias que devem escolher em sala de aula.

Ao relatar sua experiência no PIBID, João afirma que

O PIBID era um sonho para mim. (...). Eu poder fazer a faculdade e

ter um auxílio de orientação e financeiro para poder me empenhar na

atividade de prática ensino. Começar numa escola como aprendiz,

observando o dia-a-dia em sala de aula, vendo um profissional

experiente atuando, e depois dialogar com ele, interagir com as

crianças, ter essa aproximação, ainda mais eu que não vinha de um

ambiente com crianças. Então, esse contato para mim era necessário.

Desenvolver isso para conhecer melhor as crianças, saber como

chegar, desenvolver uma linguagem adequada a compreensão. (J. E1).

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João disserta que a contribuição financeira foi de grande ajuda e reforça a

necessidade de aproximação entre escola e universidade, já que coloca o estudante em

uma posição de ter de refletir sobre o desenvolvimento infantil, uma linguagem e

comportamento próprios a essa idade e atividades.

Atualmente, ele é professor em uma escola que trabalho na perspectiva

montessoriana e valoriza muito a autonomia dos alunos. O professor disserta com

segurança sobre a concepção de ensino da escola, sobre a necessidade de escutar os

alunos, a boa relação que estabeleceu com eles e como se sente preparado para ensinar,

mesmo entendendo que precisará sempre contar com a ajuda de outros profissionais e

materiais. Ele atribui boa parcela do que aprendeu no PIBID à sua prática docente atual,

quando diz:

A gente estudou sobre o estudo etnográfico que foi fundamental para

esse sistema Montessoriano que eu faço parte atualmente (...) As

semelhanças do que a Montessori fala sobre a observação da criança,

porque como você vai proporcionar uma aprendizagem para alguém

que você não sabe como é, que tipos de conhecimento possuí, etc.

Então você precisa ter um bom espírito observador, analisar as

informações e saber o que fazer, como tratá-las para desenvolver

práticas mais satisfatórias para aprendizagem daquela pessoa (J. E1).

Já Thamara ao falar sobre sua experiência no PIBID, relata que este

complementou o conhecimento desenvolvido através das disciplinas da universidade e

também aponta que a aproximação entre escola e universidade favoreceu uma melhor

compreensão da realidade escolar, como no trecho:

Desde que nos inserimos como bolsistas no Programa Institucional de

Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID UFRJ Pedagogia), percebemos,

assim como os demais acadêmicos bolsistas, que fazer parte do

Programa solidifica os estudos realizados nas disciplinas do curso de

Pedagogia (T. TR1).

As estratégias e ações cotidianas do contexto do trabalho desses professores

aparecem de modo a revelar seus saberes e compondo um repertório próprio de

conhecimentos profissionais. Percebe-se através de suas falas que os professores são

atores que possuem seus próprios saber-fazer. (GIDDEND, 1987 apud TARDIF, 2002).

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Com relação as suas ações em sala de aula, João se define numa perspectiva

humanista da educação, apostando na empatia para com os seus alunos e acreditando

que estes devem ser os protagonistas do aprendizado. Sobre a sua prática, ele afirma:

Tento identificar a linguagem que seja mais familiar aquela pessoa e

identificar qual o nível de conhecimento que ela está, e o que ela

precisa trabalhar mais, o que ela tem de talentos, conhecimentos,

habilidades que eu possa aproveitar e incentivá-la naquilo, e também

para ela se apropriar de outros conhecimentos, de outros saberes. (J.

E1)

O relato dos professores aponta para a reflexão acerca das concepções de ensino

de ambos. As suas compreensões sobre as práticas pedagógicas são mobilizadas por um

discurso que é permeado de saberes docentes, indicando o que deve ser ensinado. As

vivências de ambos revelam que, enquanto estudantes, passaram por escolas que

marcaram a sua trajetória e certamente influenciaram as suas práticas enquanto

professores.

Entende-se que os saberes dos professores são temporais, como aponta Tardif

(2002), pois são adquiridos ao longo do tempo. Muito do que sabem hoje, sobre o papel

do professor, como ensinar e a melhor concepção de ensino, advém da sua própria

história de vida, especialmente, da sua história de vida escolar.

Portanto, para o professor iniciante planejar uma aula é pensar as

potencialidades de cada aluno, preservando a autonomia de cada um. Na escola, eles

têm a liberdade de pegar materiais nas estantes, observar, analisar, fazer pesquisas e é a

partir dali que o conhecimento será estimulado, já que o aluno poderá fazer suas

próprias inferências sobre os objetos, tirar dúvidas e pesquisar sobre as suas

curiosidades.

Essa estratégia revela o quanto Thamara e João sabem a respeito do seu trabalho.

Como aponta Tardif (2002) a respeito dos saberes docentes serem sobre seres humanos,

e, por consequência, os seus saberes carregarem marcas profundas do ser humano.

Quando professores reconhecem a importância do ato de ensinar àqueles que aprendem

percebem a dupla transitividade que está implícita neste processo.

Thamara ao contar sua rotina, expõe diversos momentos em que senta em roda

com os alunos e pergunta o que eles querem fazer. Também revela que considera

essencial explorar todos os espaços da escola, como o parquinho, para que brinquem

com diferentes objetos. Além disso, sempre dispõe de um horário livre de modo que as

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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crianças tenham autonomia e possam fazer o que desejarem. Thamara atua numa escola

de educação infantil Montessoriana, assim como João ela também atua em uma escola

cuja concepção de educação se baseia nos princípios montessorianos.

Atualmente ela trabalha em duas escolas de educação infantil, um espaço de

desenvolvimento infantil – EDI e um CIEP. Nesta segunda, tais práticas já ocorrem no

momento em que vão às estantes escolher brinquedos livremente, como conta nas duas

passagens:

A atividade é planejada sempre junto com alguma proposta de um

projeto e, como é uma escola Montessoriana, também se reserva um

tempo para que eles peguem as atividades que estão expostas nas

prateleiras e que são da altura deles e assim eles podem fazer. Então as

atividades que são jogos, eles pegam, fazem as atividades, colocam na

prateleira de novo e se agora querem desenhar eles pegam o papel

desenham e então eles ficam em torno de uma hora e meia fazendo

essas atividades de livre escolha (T. E1, grifo nosso)

Eu acho que é essa proposta também de ir para fora de sala e de muita

escuta deles. Eles chegam e falam: “Vamos lá para fora”. E por que a

gente acha que este é um espaço onde eles vão aprender, não é só

entro da sala e ir para fora, pegar uma corda, uma bola, um bambolê,

esquematizar um circuito e deixar eles livres muitas vezes tem mais

significado do que deixar eles sentados.(ibdem, grifo nosso).

Por meio dessas falas, é possível perceber que esses professores parecem saber

as razões das suas práticas de ensino. Thamara justifica sua ida para outros espaços da

escola porque sabe que neles as crianças também vão aprender, às vezes, até mais do

que dentro de sala de aula. Também explica que por mais que os alunos tenham tempo

livre e explorem os brinquedos de forma espontânea, as atividades estão relacionadas a

um projeto de trabalho, e, portanto, têm uma razão para acontecer naquele momento e

daquela forma.

No que se refere ao conhecimento que adquiriram sobre as suas próprias práticas

docentes e consequentemente sobre si, Thamara e João apontam que se sentem seguros

e confiantes para ensinar. As experiências que vivenciaram ao longo da sua vida e da

formação universitária contribuíram significativamente para que hoje tenham autonomia

para buscar novos conhecimentos.

Com relação a isso, eles sinalizam que se sentem mais confiantes em sala de

aula, mais à vontade para buscar novas fontes de informação e que por isso não têm

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3444ISSN 2177-336X

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tanto medo de errar. Sabem por onde devem caminhar e que nem sempre vão encontrar

colegas de profissão que pensam como eles.

Essas características são resultados do trabalho docente, que envolve interações

humanas e que se dá num contexto ativo de trabalho. Revelam como o conhecimento da

prática, proposto por Cochran-Smith &Lytle (1999) é fundamental para a produção do

conhecimento, levando em consideração que o sujeito não se separa daquilo que visa

conhecer. A ideia do conhecimento da prática é que, através da investigação, os

professores ao longo de sua vida profissional problematizam seu próprio conhecimento,

bem como o conhecimento e a prática de outros, assim se colocando em uma relação

diferente com os saberes docentes.

Por conseguinte, revela o papel central que os professores têm na geração de

conhecimento sobre a sua prática. Na medida em que sabem as razões de ensinar,

produzem saberes docentes que servem de repertório para ser compartilhado com seus

pares e revisto ao longo da sua trajetória profissional.

Nesse sentido, vale destacar que um dos fatores que proporcionou uma reflexão

consistente na mobilização dos saberes profissionais desses dois professores foi a sua

passagem pelo PIBID. Essa questão deixa de ser uma suposição e passa a ser uma

afirmação tendo em vista que ambos os recém professores revelam em seus saberes e

fazeres aspectos estimulados em sua participação no referido Programa. Quanto a isso

destacamos o repertório de conhecimento construído por meio das atividades de ensino,

encontros de reflexão e elaboração de materiais com o grupo, preparação e construção

de trabalhos científicos.

Ambos os investigados afirmam que a reflexão atenta e curiosa sobre o fazer

docente desenvolvida no PIBID favoreceu com que conhecessem o caminho para

ensinar, mas reconhecendo a sua incompletude e sabendo onde procurar formas de

complementa-lo. Assim, reconhecem a autonomia pedagógica que conquistaram.

Conclusões

A pesquisa indicou que os professores apresentam um repertório próprio de

conhecimentos profissionais docentes, revelados através das suas falas sobre as suas

ações diárias e as razões pelas quais ensinam da forma que ensinam. Os seus saberes são

oriundos, como aponta Tardif (2002), da experiência profissional, curricular, dos

saberes experienciais e disciplinares, formando um amálgama.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3445ISSN 2177-336X

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Ambos sinalizam aspectos muito parecidos quanto a sua prática docente, no que

se refere as concepções de ensino que possuem, a necessidade de ouvir os alunos e a

importância da autonomia pedagógica. Essas caraterísticas situam os saberes docentes

enquanto temporais, pois são adquiridos ao longo do tempo, plurais, pois apresentam

diversas fontes, heterogêneos, já que não apresentam um repertório único e um processo

humanizado, tendo em vista que se trata de serem humanos.

Deste modo, entende-se que o PIBID foi de fato um diferencial na formação

desses sujeitos, contribuindo com experiências, materiais e situações de ensino que

possibilitaram uma vivência em sala de aula, uma reflexão sobre o processo de ensino-

aprendizagem e também enquanto professores que refletem criticamente sobre seu

trabalho.

Os dados demonstram como o PIBID vem se configurando como um aliado

potente na formação de professores. Essa formação, que necessita seguir sendo

analisada e discutida, sendo repensada, na sua esfera curricular e didática, ganha um

aliado, que ainda que apresente uma série de questões, vem demonstrando ser

fundamental no que ser refere a unir prática e teoria, escola e universidade, escola e

pesquisa, entre outros fatores fundamentais para iniciação à docência.

Referências Bibliográficas

ANDRÉ, M. Etnografia da prática escolar. Campinas, Sp: Papirus, 1995.

________. Pesquisa em educação: Buscando rigor e qualidade. In: Cadernos de

Pesquisa, n° 113, julho/2001.

COCHRAN-SMITH, M., & LYTLE, S. L. Relationships of Knowledge and Practice:

teacher learning in communities. In Review of Research in Education. USA, 24, 1999.

p. 249–305.

_______. A tale of two teachers: Learning to Teach Over Time. In: Time. Kappa Delta

Record, 48(3), 2002.

GATTI, B. A formação continuada de professores: a questão psicossocial. Cadernos de

Pesquisa, n. 119, p. 191-204, jul. 2003.

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3446ISSN 2177-336X

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_______. A formação inicial de professores para a educação básica: as licenciaturas.

Revista USP, São Paulo, n 100, p. 33-46, dez. 2013.

TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Vozes,

2002.

i Aprendemos com os estudiosos do cotidiano a juntas palavras na intenção de inventar novos

significados: “princípio da juntabilidade” que concede sentido e significado diferentes dos usuais, quando

de sua separação (Alves, 2001).

ii Criado em 2007 pelo Ministério da Educação por intermédio da Secretaria de Educação Superior da

Capes e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.

iii Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=233:pibid-

apresentacao&catid=155:pibid&Itemid=467>. Acesso em: 14.Jul.2015.

iv Cf. em “Um estudo avaliativo do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid).”

Disponível em: <http://www.capes.gov.br/images/stories/download/bolsas/24112014-pibid-

arquivoAnexado.pdf>. Acesso em: 14.Jul.2015.

v No sentido de proteger e valorizar as vozes dos professores e estudantes que tecem as redes e as

conversas que produziram as narrativas utilizadas guardamos as autorias de modo a indicá-las, mas sem

personalizá-las.

vi Apesar de trazer referências já (com)partilhadas, optamos pela escrita no tempo presente para marcar a

potência das narrativas que não se encerram, mas têm a possibilidade de desencadear novos/diferentes

olhares.

vii

MEC – Ministério da Educação. CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível

Superior. FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.

viii Os licenciandos bolsistas do PIBID investigado se autodenominam assim e por ser este termo bem

aceito por todos os membros do grupo, optamos por usa-lo para designá-los.

ix Para Cochran-Smith e Lytle (1999, 2002) o “conhecimento local” nasce na prática e a partir dela. É o

conhecimento gerado pelos professores através de sua artesania, assim se relaciona ao saber-em-ação.

x Investigar aqui neste contexto - tanto no que defendemos quanto no que observamos - não se relaciona

necessariamente a pesquisa sistemática, no sentido de cientificidade e rigor acadêmico. Está muito mais

próximo ao esforço coletivo (em pares) de responder a problemas intrínsecos à realidade do trabalho, pelo

trabalho e para o trabalho.

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3447ISSN 2177-336X