pepetela - romance e utopia na história de angola

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  • 7/30/2019 Pepetela - romance e utopia na histria de Angola

    1/18

    P ep e t e la : rom a n ce e

    u t op ia n a h is t r ia

    d e An gola

    R it a C h a v e s *

    * Univers ida de d e S o Pau lo .

  • 7/30/2019 Pepetela - romance e utopia na histria de Angola

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    Em ent rev is ta conced ida a Miche l Lab an , em 1988, e pu bl icad a n o liv ro An-

    gola - encont r o com escr i tor es, ao fa lar sob re Muana Pue as d ife ren t es fa ses d e

    sua ob r a , P e pe te l a obse r va :

    P a r e c e -m e q u e a s p r e o cu p a e s d e fu n d o , e m Mu a n a P u s o a s me s m a s d e t o d o o

    r e s t o q u e fo i e s c r it o d e p o is . H u m t e m a q u e c o m u m , q u e o t e m a d a fo r ma o d a n a o

    a n g o la n a . I s s o fa z o d e n o m in a d o r c o m u m .1

    Ante s de b usc a r m os a p i s t a da d a pe lo a u to r, in t e r e s sa n te , pa r a nos a p r ox i-

    m arm os de tod o o res t o qu e fo i e sc r ito d epois, exam ina r a su a b ib l iogra fia , t a re -

    fa q u e p e r m i t e t a m b m s it u a r a s u a d im e n s o n o s is t e m a q u e i n t e g ra . R e u n i n d o

    j t reze t t u lo s , d os q u a is a p en a s t r s p u b lic a d os n o B ra s il, P ep e t e la d ivid e com

    Jos Lu a nd ino Vie ir a o e s t a tu to d e e sc r it o r m a is c onhe c ido e p r e mia do d e Ango-

    la . Pa ra c ita r apen as d ois , ap ont am os o P rm io da Assoc iao Pa ul is ta d e Cr t i -

    c os de Ar t e ( e m 1993) e o P r m io C a m e s ( e m 1997) . O le va n ta m e n t o de suap r odu o de m ons t r a a ind a qu e a r e pe r c us s o de s e u t r a ba lho j va i a l m da s fr on -

    t e i r a s d a l n g u a p o r t u g u e s a . P a r a m u i t o a l m , e u d i r i a m e s m o , u m a v e z q u e

    Mayombe, fo i pub licad o inc lus ive no J ap o , num a ed io lind a , onde s se p ode

    r e c onhe c e r o s n m e r os da s p g ina s e um m a p inha d e Ango la na c on t r a c a pa , s e -

    g u n d o b e m h u m o r a d a d e c la r a o d o p r p r io r o m a n c is t a .

    1 C f. Encont ro com escri tores - An gola. Po r to , Funda o En genhe i ro An ton io de Alme ida ,1991 .

  • 7/30/2019 Pepetela - romance e utopia na histria de Angola

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    via a t l n t ica n . 2 ju l. 1999

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    A le itu r a d o c on jun to da ob r a , inc lu indo - se o s t t u lo s p ub lic a dos a ps a e n -

    t r e v is t a , vem , com e fe ito , c on fir ma r a c on s t r u o da na c iona l ida de c om o um t e m a

    c ons t a n t e q ue , sob v r io s ngu los e pe r spe c t iva s , c ons t i t u i um e le m e n t o m a t r iz

    em seu rep er tr io . Se sa m os do p a r t icu la r e a lcan am os o ge ra l, ou se ja , o conjun-to d a l it e r a t u r a d e Ango la , r e c onhe c e mos q ue a fo r ma o da ide n t ida d e na c iona l

    na r e a lida d e um a d a s l inh a s d e fo r a da c onse c u o d e s se s is t e m a l it e r r io . Com

    dca da s de d ife rena , os e sc rito res a ngolanos p assa m pe la exper inc ia qu e vive -

    r a m os nos sos r om n t ic os e r e vive ra m , de m a ne i r a d i fe r e nc ia da , os nos sos m ode r -

    n is ta s : faze r um a l ite ra tu ra qu e in t e rv iesse no p rocesso de d e fin io do p a s . Se a

    que s t o pa r e c e -nos a n t iga , h q ue r e c o r da r que o p a s novo : pa s sa r a m - se a pe -

    na s 22 a nos d e sde a sua ind e pe nd nc ia e o p r ob le ma da f un o da ob r a lit e r r ia e

    do p ap e l soc ia l do esc r ito r se r ecoloca , sen o com out ras cores , pe lo m enos , com

    novos m a t iz e s . p r e c iso e xa m in - lo s , a ind a q ue n o se d i sponha da pe r spe c t iva

    h i st r i ca qu e o t e m po h d e a b r ir e qu e o in s t r um e n t a l a na lt i c o t e nha s ido fo r ja -

    do p a r a o e s tu do d e ou t r o u n ive r so cu l tu r a l .

    Se o tem a cent ra l n o s ingu la r iza Pep e te la no in te r ior do s is t em a lite r r io

    a ngo la no , h ou t r o e l em e n t o c a pa z de m a r c a r a su a d ife r e n a : ele ho j e o n ic o

    nom e qua se que e xc lus iva me n te i de n t ific a do c om o r oma nc e c om o fo r ma de e x -

    p r e s s o . Assoc ia do a o m und o d a e sc r it a , e sse g ne r o l it e r r io e xe r c e u d e sde s e m -

    p r e um a im pr e s s iona n te a t r a o sob r e o s e sc r it o r e s a ngo la nos e m que p e se sua

    inse r o num un ive rso cu l tura l m arcad o pe la t r ad io ora l . A despe i to d esse fa s -c n io , a obra de seu s com pa nh e iros , com o Jos Lu an dino Vie ira , Arna ldo San tos ,

    C os t a Andr a d e , Ma n ue l R u i, He nr ique Abr a nc he s , e n t r e ou t r o s , d iv ide - se e n t r e

    c on tos e r oma n c e s , r oma nc e s e poe m a s , poe m a s e con t os . Em bor a t e n ha p ub lic a -

    do a lguns c on t os na s a n t o log ia s da fa m osa C a sa dos Es t ud a n t e s do I mp r io , a in -

    da n o t e m po d e e s tud a n t e e m L i sboa , e , po r du a s vez e s , s e t e nh a e nve r eda d o pe lo

    tea t ro , como au tor d e na r ra t ivas longas q ue e le se insc reve no pro je to l ite r r io

    a ngo la no . At o m om e n t o s o d e z a s j e d it a da s , s e a inc lu mos As aventu ra s de

    Ngunga( obra e sc r i ta em c ircun s t n c ias e spec ia is com d es t ina o espec ia l ) . De

    Muana Pua A g lor iosa fam l i a , p a s s a n d o p o r Mayombe, Yaka., O co e os

    caluandas, Lueji , A gerao da ut opia, O desejo de kianda , e a Parbola do

    cgado velho, o a u t o r t e m se m a n t ido fie l a o g ne r o que c e d o e sc o lhe u p a r a d a r

    curso ao s eu p ro je t o lit e r r io .

    Aprove ita nd o do gne ro , o senso d e h is tor icida de , a lg ica da cau sa l ida de

    h i st r i ca , P e pe te l a o r ga n iz a a su a v is o d o qu e t e m s ido a qu e la soc ie da d e . E , c om-

    b ina nd o e le m e n t os in t e r nos a o qu a d r o l it e r r io a ngo la no c om a s m a r c a s p r ove n i-

    en tes de out ros processos , e le va i e sco lhendo as r e fe rnc ias que melhor podem

    se r vir a su a p r opos t a . Ass im , do la do de d e n t r o , pos s ve r ver a su a ob r a c om ot r ibu t r ia da p r odu o d e C a s t r o S o r ome n ho , e sc r it o r qu e c ons t it u i um c u r io so

  • 7/30/2019 Pepetela - romance e utopia na histria de Angola

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    ou t ros en sa ios R it a Ch a ves , P ep e t e la : rom a n ce e u t op ia ...

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    c a so no t e r r e no da na c iona l ida d e . F i lho d e pa is c a bove r d ia nos , S o r ome nh o na s -

    ceu em Moam bique , fo i fun c ion r io do governo co lonia l por t ugu s em Angola ,

    e s t e ve po r u m bom pe r odo e m P or tu ga l, ex ilou - se e m P a r is , e ve io a m or r e r no

    B r a s il, ond e p a r t i cipou da o r ga n iz a o do C e n t r o d e E s tu dos Afr ic a nos d a Un i-ve rs ida d e de S o P a u lo . Em m e io a e s sa p lu r a l ida d e de p a se s , C a s t r o S o r om e nho

    op t ou po r Ango la c omo m a r c a de ide n t ida de e sob r e a r e g i o da Lu nd a , s it u a da

    no n ordes t e do p a s , qu e e le va i concen t ra r o seu o lha r de esc r i to r. Num pa ra le lo

    c om P e pe te l a , a c onve r g nc ia a p on t a a n a tu r e za e nsa s t ic a dos t e x to s ( a t r a vs da

    fam ilia r idad e com as l ies d a Ant ropologia , da E tn ologia , da S oc io logia e d a H is -

    t r i a ) . No c a m po d os e le m e n t os e s t r u t u r a i s do r om a nc e , de s t a c a - se a r e l ev nc ia

    da da a o e spa o na o r ga n iz a o t e x tua l. S ob r e t ud o e m Terr a mort a , A chagae

    Viragem, os s ina is da t e r r ve l c r ise d o s is t em a co lonia l p ro je tam -se na te r ra . Toda

    a a r idez do t em po faz -se re fle t i r no cho p oe iren t o qu e as fix ia a s p e r sona gens e

    a nu nc ia a fa l nc ia d a o r de m in s t a la da . Es sa c onc e p o d o e spa o q ue se e l eva e

    a t ua c om o e le m e n t o de fo r t e s ign ific a do na o r d e m n a r r a t i va s e r t a m b m um t r a -

    o de c is ivo e m ob r a s c om o Yaka, O co e os cal use O desejo de Ki an da, pa ra c ita r

    a p e n a s t r s d o P e p e t e la .

    Na r e la o c om os e le m e n t os e x t e r nos , pod e m os a s s ina l a r a ma r c a da s p r o -

    pos t a s d o Ne o- re a lism o po r t ugu s , da l it e r a t u r a n o r t e - a m e r ic a na ( He m ingwa y,

    S t e inb e c k e S . F it t z ge r a ld ) e do r om a nc e b r a s ile ir o vo lt a d o de m odo d ir e to p a r a

    a s q ue s te s soc i a is . Ne sse c a m po , t a l c omo oc o r r e u c om a m a io r pa r t e dos e sc r i-t o r e s a f ric a nos d e lngua po r t ugue sa a p a r t i r dos a n os 40, a fon t e s e r sob r e t ud o o

    noss o regiona lism o da d cad a de 30. A Jorge Ama do, Jos Lins do Rego e G raci lian o

    R a m os a s soc ia - se na p r e fe r nc ia p o r um a l ingua ge m m a is d i r e t a , um e s t i lo s e c o ,

    ca lcado no d ese jo de reve la r a s agru ras de u m a s i tua o in jus t a e , por i sso , pa ss -

    ve l de m ud a n a . Ne ssa g r a nde fa m lia , a p r ox im a da pe l a d ime ns o pop u la r p r e -

    se n t e e m se us p r o je to s , p r oc u r ou se s it u a r P e p e te l a , s e m pr e liga do a um p r o je to

    a p to a c a t a lis a r que s t e s que p ud e sse m d e fin i r o s e r ( e o e s t a r ) a n go la no .

    F o r t a le c ido c om os e ns ina m e n t os qu e , s e m p r e c onc e ito , r e t ir a d a e xpe r i n -

    c ia d e esc r ito res d e out ras te r ras , ma s ap oiado n a sua prp r ia exper inc ia , Pep e te la

    firm a o seu i t ine r r io e organ iza as l inh as d e um a ob ra ond e se pod e recolhe r fios

    express ivos da p rpr ia h is tr ia de Angola . Ta lvez m ais do q ue em qu a lquer ou t ra

    p r od u o e s t e ja m v is ive lm e n t e a s s ina l a dos na sua a s r e p r e se n ta e s , o s im pa sse s

    e a s c on t r a d i e s da h i s t r ia r e c e n t e d o pa s . A ind is fa r a da p r e oc upa o c om os

    p r ob le ma s e m to r no d a fo r ma o da n a c iona l ida d e pode e xp l ic a r a c on t inu ida de

    de u m p r o je to e m c u jo in t e r io r s e ma n i fe s t a m a s d ive r sa s r up t u r a s qu e o p r p r io

    d e s e n vo lv im e n t o d a H i s t ria i m p e . S e t o m a m o s o t e m a d a u t o p ia c o m o u m a

    cha ve cent ra l, po ss ve l, sem esqu ecer a s p a r t icu la r ida des do tex t o lite r r io , ve rde q ue m odo os a va n os , o s r e c uos e o s d e svios no p r o je to e l a bo r a do nos a n os 50.

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    via a t l n t ica n . 2 ju l. 1999

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    F a z-s e u m a u t o p ia e n a s ce u m a n a o

    Para faze r essa t r avess ia , um bom pon to d e de pa r t ida o roma nce Mayombe,

    cu jo enredo d esve la a s d imen ses v r ia s da que las horas em q ue se e s t ges ta nd o aut opia da liber t ao n acional . Na florest a s i tua da em Cab ind a, os guerr i lheiros fa-

    zem a lu ta e d iscu t em sobre sua rea l izao e seus desdob ram ent os . Ali, am eaados

    por t an t os pe r igos , pe rd em -se em longas conversas a r e spe i to do qu e dever se r o

    pa s a ps a i nde pe nd nc ia . Im pr e s s iona n a m on ta ge m t e x tua l a a t m os fe r a de d i -

    logo m arcan do d iversos nveis da n arra t iva . Sob o cu verde , conversam os guerr i-

    lhe i ros en t re s i, conversam os hom ens com a na tu reza , d ia logam cons igo m esm o ( e

    com o leito r a qu em su t i l ou d i re tam ent e se d ir igem ) os m ui tos na r radores a qu em

    o na r r a d o r t i t u la r a b r e e spa o pa r a q ue e xp r im a m a sua le it u r a da s c o isa s . As

    inf indveis discusses, ao revelarem as dif iculdades e a prenunciarem impasses,

    e xp r im e m t a m b m a ne c e s s ida d e e a von t a de d e m a io r c om pr e e ns o e n t r e o s v r i-

    os m un dos q ue p rec isam se fun di r pa ra enfren ta r o in imigo m aior, qu e am eaa sua s

    v ida s e a t e r ra p o r onde se m ove m e onde e s t o in s t a l a da s m u it a s ou t r a s v ida s .

    C onfir m a nd o a im por t nc i a do e spa o c om o e le m e n t o e s se nc ia l e m se u t e x -

    to , o a u to r fa z da flo r e s t a m u i to m a is do qu e um pa l c o pa r a a s a e s que s e r o

    na r r a d a s . A t r ibu ind o - lhe um pa p e l d ina m iz a dor na qu e le mom e n t o da h i s t r ia de

    Angola , e le inves te na sua pe r soni f icao . Invadida , des t ru da , ma l t ra tada pe lo

    colonizador, a na tu reza no ch egou a se r por e le com preen dida , e agora se conver-t e e la p r p r ia e m a m e a a . S u a e x u b e r n cia , t o c a n t a d a n a s p g in a s d a c h a m a d a

    lite ra tu ra co lonia l, com o evidn c ia da gran dios ida de d o im pr io por tu gus , pa re -

    ce reve la r agora a f ace infe rna l de u m m un do n un ca dom ina do. A frag ilida de d e

    qu em se ju lgou invenc ve l e spe lha - se en t o na incap ac idad e de d ec ifra r os m is t -

    r io s a b r iga dos e m se us c a m inh os n o t r a a dos . Inve r sa me n t e po r m , o s op r im i-

    dos , t r a ns fo r ma dos n e s sa e t a p a e m gue r r ilhe i ro s , t m da flo r e s t a u m a ou t r a v is o .

    S ua ide n t ida de c om o e spa o p e r mi t e - lhe s e s t a be l ec e r c om e le um a r e la o d in -

    m ic a , onde o im pr e v is to n e m se mp r e fon t e de a ngs t ia . A im a ge m do l a b ir in t o

    pod e a q u i s e r e voc a da : de sc onhe c ido , o e spa o p r e c isa s e r c onq u i s t a do , ope r a o

    que e x ige a r gc ia e e m pe n ho d e qu e m a e l a s e a r r is c a , da de c o r r e ndo um r o t e ir o

    de a p r e nd iza ge m, no qua l o s a to s s e d e se n r o la m c omo u m a e sp c ie de r it o m e d i -

    a d o t a m b m pe la pa ix o . N o h , po r t a n t o , s ina i s de subm is s o e n t r e o s a to r e s e

    o e spa o ; s o a m bos fo r a s c omp le m e n t a r e s de u m e spe c ia l m ovim e n t o , p r oc e s -

    sa do sob o s igno da s e d u o . S ob o s igno da s e du o , o qua d r o n o se a r m a c om

    a s fo r ma s da m ono ton ia e a r e la o e n t r e a flo r e s t a e o s hom e ns a t r a ves sa da

    pe la im pr e v is ib i lida d e , num a c omp os i o e m q ue o t e m or s e mi stu r a a um a dose

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    ou t ros en sa ios R it a Ch a ves , P ep e t e la : rom a n ce e u t op ia ...

    22 1

    de c um pl ic ida d e . A m a ta o de us qu e in sp i r a me d o ma s t a m b m o fe r e c e p r o t e -

    o , sen t im ent o d bio a d is t ingu ir os co lonizados d os co lonizadores :

    O p a s s e io a o S o l a r d e n t e a i n d a o e n fu r e c e u m a is . N o e s t a v a h a b i t u a d o a o S o l , s e m-

    p r e e s c o n d id o n a s o m b r a p r o t e t o r a d o Ma y om b e . 2

    ( . . . ) po i s dev iam i r de r a s tos sobre a s pedras . Por vezes t inham de en t ra r na gua

    pou co p ro fun da . A gua es t ava fr ia e a roup a m olhad a co lava -se em a r rep ios ao co rpo . O

    Mayom be j r ecupera ra o a rco - ir is ve rde . Sem M edo recebeu -o como um pr ime i ro s ina l de

    boas -v indas .3

    A s ingu la r ida d e da s it u a o e xp r ime - se t a m b m na fo r a dos d i logos c om

    que se c om pe o r om a nc e . De scr it o p e lo na r r a d o r t i t u l a r com o o e spa o d o s il n -

    c io , o Mayom be t ran sfigura - se n a ve rdad e no re ino da pa lavra . O d i logo se fazsem pre : pe lo d i to , pe lo n o d i to , r ea lizam -se as conversas . Conversam os pe r so -

    na ge ns e a m a t a , c onve rsa m os pe r sona ge ns e n t r e s i, c onver sa m pe r sona ge ns e

    na r rad or. At ravs de exp resses in t e r roga t ivas que p a recem convocar o le ito r

    d i scus s o , in t r oduz - se um poss ve l de s t ina t r io q ue in i cia lm e n t e n o e s t a r ia in t e -

    g r a do t r a m a . Em m e io de ns ida de d a m a t a , o s gue r rilhe ir o s a b r e m c a m inhos e

    de a lgum m odo se a b r e m pa r a u m a p r odu t iva t r oc a de e xpe r i nc ia s . A t e ns o

    pa ten t e , m an t ida p e lo pe r igo ex te rn o e pe la inevita b i lida de d e conflito s in t e rnos ,

    n o e n t a n t o p o d e - s e p e rc e b e r t a m b m a im p o r t n c ia d a p a la v ra c o m o p r o ce s s o d e

    o r ga n iz a o da s c onsc i nc ia s e m e io u sa do d e fo r ma e xa us t iva p a r a a s se gu r a r a

    com un icab ilida de en t re h om ens , h is t r ia s e pro je tos . Ass im , fazend o da n a r ra t iva

    , a le g o r iz a d a p e l a flo r e s t a , o e s p a o d o d i l o go , n a r r a d o r e p e r s o n a g e n s e m

    Mayombe, c ons t r oe m - se a pa r t i r de um p r oc e s so vivo que r e ne ide n t ida de s e

    d i fe rena s , co inc idnc ias e d iss idn c ias , hom ologias e ru p t uras . Se con s ide ra m os

    qu e um a da s e s t ra tg ias do co lonia lism o e ra im ped ir a c ircu lao da s id ias , b lo-

    que a nd o a s t r oc a s c u l tu r a i s e n t r e o s v r io s g r upos , pe r c e be m os a im por t nc ia

    des se c lim a d e ex te r ior izao d e va lores e d i fe renas com o j u m a t o sub vers ivo .

    A c on t r a c e na r v iva me n te c om o e spa o e s t o foc o na r r a t ivo. Assumido p o rvr ios na r ra dores , cu jas fa la s so organizad as p or um a esp c ie de na r rad or t i tu la r,

    o f io na r ra t ivo d iv id ido e comungado pe los e lementos que v ivem as aes do

    e n r e do . A d ivis o , t oda v ia , na que le con t e x to ond e tu do c onv ida c om un h o n o

    de ve ser e n t e nd ida c om o fr a gme n ta o p r op r ia m e n t e , m a s c omo um s ina l de que

    a a u to r ida d e , de q ue a pa l a vr a m a n i fe s t a o , , e m c e r t a m e d ida , pa r t ilha d a .

    Ar t ic u la - se a e s sa s m a r c a s da d e m oc r a t iz a o da voz o me nc iona d o pe so dos d i -

    logos ne s se t e x to , c onc e b ido in ic ia lm e n t e , s e gund o a fir m ou o a u t o r num a e n t r e -

    2 C f. May ombe. Lisboa : Edi es 70, 1982, p.933 Idem , p . 245

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    vis t a qu e lhe f izem os em 87, pa ra se r u m ro te i ro c inem at ogr fico . E n esse c lim a d e

    d i logo , s e pe r c e be a fo r ma o da u t op ia c omo u m p r inc p io e spe r a n a , pa r a c it a r

    a e xp r e s s o c om que E r ns t B loc h in t i t u la o s e u l iv ro .

    Or ga n iza dos c on t r a um in imigo c om um e m a is p ode r oso , o s gue r r ilhe ir o sde ve m ve nc e r t a m b m os fa n t a sm a s de ixa dos c om o he r a n a p e lo s is t e m a c o lon i-

    a l : o r ac ismo, o t r iba lism o, o reg iona lism o com o con flito . O tu ga, como e ram

    c ha m a d os o s po r tu gue se s , j n o t e m se que r e s t a t u t o de pe r sona ge m e s se nc ia l.

    C omo u m a e sp c ie de figu r a o s uma som br a qu e c o rt a o c a m inho d os gue r r i-

    lhe ir o s . Em bor a a s it u a o d a gu e r r a c o lon ia l s e ja e v ide n te no t e x t o , o r oma n c e ,

    e sc r it o m e sm o nos in t e r va lo s do c om ba t e po r um e sc r it o r fis ic a m e n t e e mp e nha -

    do na lu t a , a va n a no t e m po e r e fe r e - se a p r ob le m a s qu e v ir o d e po is . P r e vis t a , a

    v it r ia a s sum ida c om o um da d o de r e a lida d e e e s sa ce r t e z a c onve r t e - a num a

    fo r ma de ine xo r a b ilida d e qu e e r gue impa sse s e r e g is t r a a n e c e s s ida d e de so lu -

    es . A s itu ao a gud a d a c r i se no esb a t e a con sc inc ia de q ue a v itr ia s ign i fica -

    r ha rm onia ; a r e la t iv izao do a lcance d os resu l tad os ind c io da p rofun didad e

    de v is o d e qu e m n o he s it a e m inve s t ir na a o . As v r ia s fa la s d os na r r a do r e s ,

    c omp ond o um v ivo mosa i co de p r opos t a s e s e ns ib ilida d e s , s ina l iz a m pa r a a p r e -

    ca r iedad e da in t egrao qu e a l i se v ive . Cont ra os r iscos da desa gregao com o

    n o r m a , s e a b r e u m a r e d e u t p i ca p e r m e a d a t a m b m p e la s n u a n c e s d e u m d i sc u r -

    so e d i fic a n t e . Tome m os c om o e xe mp lo a lguns p a r g r a fos da fa la d e Mu a n t i nvua ,

    o e x -m a r inhe i r o que c om o gue r r ilhe ir o a s sum e o nom e de imp e r a do r na t r a d i ocul tu ra l de Angola :

    Me u p a i er a u m t r a b a l h a d o r b a i lu n d o d a Dia m a n g , m in h a m e e r a u m k im b u n d o d o

    S o n g o .

    O m e u p a i mo r r e u t u b e r c u lo s o c om o t r a b a l h o d a s m in a s , u m a n o d e p o i s d e e u n a s c e r.

    Na s c i n a L u n d a n o c e n t r o d o d ia m a n t e . O m e u p a i c a vo u c o m a p ic a r e t a a t e r r a vir g e m,

    c a r r e g ou v a g e s d e t e r r a , q u e i a s e r s e p a r a d a p a r a d e la s e l ib e r t a r e m o s d i a ma n t e s . Mo r re u

    n u m h o s p i t a l d a c o m p a n h i a , t u b e r c u lo s o . O m e u p a i p e g o u c o m a s m o s r u d e s m ilh a r e s d e

    e s c u d o s d e d ia m a n t e s . A n s n o d e i x ou u m s , s e q u e r o s a l r io d e u m m e s . O d ia m a n t een t rou- lhe no p e ito , chup ou- lhe a fo ra , chu pou , a t que e le mor reu

    O b r ilh o d o d ia m a n t e s o a s l g r im a s d o s t r a b a lh a d o r e s d a C o mp a n h ia . A d u r e z a d o

    d i a ma n t e i lu s o : n o ma i s q u e g o t a s d e s u o r e s m a g a d a s p e la s t o n e l a d a s d e t e r r a q u e o

    c o b r e m .

    Na s c i n o m e io d e d i a ma n t e s s e m o s v e r. Ta lv ez p o r q u e n a s c i n o m e io d e d ia m a n t e s ,

    a i n d a j ov e m s e n t i a t r a e s p e l a s go t a s d o m a r im e n s o , a q u e l a s g ot a s - d ia m a n t e q u e c h o c a m

    cont ra o casco d os nav ios e sa l t am pa ra o a r , aos m ilha res , com o b r ilho l e itoso d as l g r im as

    e s c o n d i d a s .

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    ou t ros en sa ios R it a Ch a ves , P ep e t e la : rom a n ce e u t op ia ...

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    O m a r fo i p o r m im p e r c o r r id o d u r a n t e a n o s , d e n o r t e p a r a s u l , a t a Na m b i a , o n d e o

    d e s e r t o v e m m is t u r a r - s e c o m a a r e ia d a p r a i a , a t a o G a b o e a o Gh a n a , e a o S e n e g a l, o n d e

    o ve rde das p ra ia s va i ama re lecend o , a t de novo se confun d i r com e las na Mau r it n ia , jun -

    ta nd o a fr ica do N or te fr ica Aus t ra l, no a m are lo das sua s p ra ia s . Mar inh e iro do At ln t i -

    co , e m esm o do n d ico eu fu i . Chegue i a t a Arb ia , e de n ovo , encon t re i a s p ra ia s am are las

    de Mo m edes e Ben gue la , ond e c resc i. P ra ia s de Ben gue la , p ra ia s da M au r it n ia , p ra ia s da

    Ar b ia , n o s o a s a m a r e la s p r a i a s d e t o d o o Mu n d o ?

    .......................................................................................................

    On d e e u n a s c i, h a via h o me n s d e t o d a s a s l n g u a s v iv en d o n a s c a s a s c o mu n s e m is e r -

    ve is da Com pa nh ia . Ond e eu c resc i, no Ba ir ro Benf ica , em Ben gue la , hav ia hom ens d e tod as

    a s ln g u a s , so fr e n d o a s m e s ma s a m a r g u r a s . O p r im e ir o b a n d o a q u e p e r t e n c i t i n h a m e s mo

    me n i n o s b r a n c o s , e t i n h a mi d o s n a s c i d o s d e p a i u mb u n d o , t c h o k u e , k i mb u n d o , f i o t e ,

    k u a n h a m a .

    ..........................................................................................................................

    Qu e r e m h o j e q u e e u s e ja t r ib a l is t a ?

    De q u e t r ib o ? p e r g u n t o e u . d e q u e t r i b o , s e e u s o u d e t o d a s a s t r ib o s , n o s d e An g o -

    la , como d e fr ica ? No fa lo eu o swah ili, n o ap ren d i eu o hau ssa com um n ige r ian o ? Qu a l

    a m inh a l ngua , eu , que n o d iz ia um a frase sem em pregar p a lav ras d e lngua s d i fe ren t es ?

    E a g o r a , q u e u t i liz o p a r a f a la r c o m o s c a m a r a d a s , p a r a d e le s s e r c o mp r e e n d i d o ? O p o r t u g u -

    s . A q u e t r ib o p e r t e n c e a l n g u a p o r t u g u e s a ?

    E u s o u o q u e p o s t o d e l a d o p o r q u e n o s e g u i u o s a n g u e d a m e k i mb u n d o o u o

    s a n g u e d o p a i u mb u n d o . T a mb m S e m Me d o , t a mb m T e o r i a , t a mb m o C o mi s s r i o , e

    t a n t o s o u t r o s m a is .

    A im e n s id o d o m a r q u e n a d a p o d e m o d i fic a r e n s in o u - me a p a c i n c ia . O m a r u n e ,

    e s t r e it a , o m a r l ig a . N s t a m b m t e m o s o n o s s o m a r i n t e r io r, q u e n o n e m o Ku a n z a , n e m

    o Lo je , nem o Kun ene . O nosso m ar , fe ito d e go tas -d iam an te , suores e lg r imas esm agad os ,

    o n o s s o ma r o b r ilh o d a a r m a b e m o le a d a q u e fa s c a n o m e io d a v e r d u r a d o Ma y o mb e ,

    la n a n d o fu lg u r e s d e d i a ma n t e a o s o l d a L u n d a .

    E u , M u a t i n v u a , d e n o m e d e r e i, e u q u e e s c o lh i a m i n h a r o t a n o m e io d o s c a m in h o s

    d o M u n d o , e u , la d r o , m a r in h e i r o , c o n t r a b a n d is t a , g u e r r ilh e i r o, se m p r e m a r g e m d e

    t u d o ( m a s n o a p r a ia u m a m a r g em ? ) , e u n o p r e c is o d e m e a p o ia r n u m a t r ib o p a r a

    s e n t i r a m i n h a f o r a . a m in h a fo r a ve m d a t e r r a q u e c h u p o u a f o r a d e o u t r o s h o m e n s , a

    m in h a f o r a v e m d o e s fo r o d e p u x a r o c a b o e d a r m a n i ve la e d e d a r m u r r o s n a m e s a

    d u m a t a b e r n a s it u a d a a l gu r e s n o M u n d o , m a r g e m d a r o t a d o s t r a n s a t l n t i c os q u e p a s -

    s a m , in d i fe r e n t e s , s e m n a d a c o m p r e e n d e r e m d o q u e o b r i lh o - d i a m a n t e d a a r e ia d u m a

    p r a i a . 4

    4 Idem , p . 138-140

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    No discurso do pe r sonagem , tem pora r iam ent e a lado cond io de na r rad or,

    p r o j et a m - se a s ve r da d e s que s e ide n t ific a r ia m c om a e m e r g nc ia de s se m om e n t o

    novo na h i st r i a de Ango la d e qu e a gu e r r ilha c ons t i t u i um a e sp c ie de r it o de

    passagem. Al i , onde a grande ta re fa po l t ica cons is te em formula r uma pr t icaqu e , un ificand o as vozes , venha con fe r ir un ida de a e ss e pu nh ad o de p ovos , r aas ,

    t r a d i e s , c ir c u la um hom e m q ue j c omp r e e nde u o qu e o p r o je to de i nde pe n d n -

    c ia n o con seguira a inda ens ina r a t odos . A voz , a ssoc iada sa bed or ia , anun c iadora

    do m und o que se de ve a b r ir, , n o p o r a c a so da voz do m a r inh e ir o , a c um ula do r

    da s exper inc ias qu e as v iagen s t rou xeram . A re fe rnc ia logo cond uz s ob se rva -

    es de Wal te r Benjam in a r e sp e ito d as m a t r izes do na r ra dor t r ad ic iona l. Recor -

    d a m o s , e n t o , d a r u p t u r a e n t r e a t r a d i o o r a l e o r o m a n c e c om o u m g n e ro d o

    m und o bu r gu s , r e la o t o b e m d isc u t ida pe lo pe n sa do r a l em o . I nc o r po r a do

    por u m p r o je to l it e r r io que s e fa z no r itm o im pu ls iona d o da s t r a n s fo r ma e s de

    ba se , qua nd o e s t o a ba la dos o s p i la r e s que sus t e n t a m a o r de m a ind a e m v igo r

    m a s j e m d e c o m p o s i o , o r o m a n c e n o c o n t e x t o a n g o la n o t e m e le p r p r i o

    r e la t i viz a do um de se us p on t os e s t r u t u r a i s .

    S e n o h p o s s i b ilid a d e d e r e c u p e r a r a in t e ir e z a d o n a r r a d o r d a t r a d i o

    o r a l, a n a r r a t iva de P e p e te l a n o a b r e m o d e r e fe r ir -s e a o d e se jo de i n t e r c a m bia r

    e x p e r i n c i a s . I r r o m p e n d o c o n t r a a o r d e m b u r g u e s a , a l i d i r e t a m e n t e c o la d a

    e m p r e s a c o lo n i a l, a m b i c io n a d a , a n a r r a t iv a , m e s m o s e c o n s c i e n t e d o s lim it e s

    d a m u d a n a a s e r e fe t i va d a , sin a l iz a a v o n t a d e d e s u p e r a r a i n c o m u n i ca b i lid a d e .A in d a q u e e x t e m p o r n e a , a a p o s t a n a u t o p ia s e v a i r e it e r a n d o a o lo n g o d a s

    m u i t a s p g in a s d o Mayombe. N o d e s d o b r a m e n t o d o p r o je t o u t p i co d e q u e a

    fa la d o M u a t i n v u a e m b le m t i ca , u m c e r t o a p e g o e x p o s i o d i d t i ca p o d e

    e x p l ic a r a t o n a l id a d e c r u a d a s m e t fo r a s via d e r e g r a c o n s t r u d a n u m a r e la o

    d i r e t a e n t r e a im a g e m e a s i t u a o q u e e la q u e r e x p r im ir. A r e it e r a o d e a l-

    g u n s e le m e n t o s c o m o o b r ilh o d o d i a m a n t e e m c o n t r a s t e c o m a o p a c id a d e d a s

    v ida s dom ina da s pe l a e xp lo ra o e p e la c a r nc i a r e fo r a a c onv ic o de s se p on t o

    d e v is t a o n d e s e r e c or t a m a s lin h a s d a e x e m p l a rid a d e r e p u t a d a c o m o im p r e s -

    c in d v e l a o e s fo r o d o m o m e n t o . S e p a r e c e r a s o o v o d a im a g in a o n a c o m -

    p o s i o d a l in g u a g e m , o s lim it e s d e v e m s e r v is t o s e m c o n s o n n c i a c o m a in s e r -

    o d o t e x t o n a h i s t r ia q u e a lit e r a t u r a a j u d a a f a z er e a c o n t a r.

    R e c onhe c e nd o um m ovim e n to e sp e c ia l na flo r e s t a , o na r r a do r e sc a pa s t e n -

    dn c ias fo lc lor izan t es e conver te -a em a lgo mais que u m cenr io ext ico . Pa ra seu

    in t e r io r t r a nsp la n t a da a c om ple xida d e d a v ida u r ba na , o qu e s ign ific a qu e e x is -

    t e m a li a spe c t os que imp e de m que se ve ja ne l a c e rt a s m a r c a s pa r a s a t i s fa z e r a

    se de d e e xo t ism o de q ue m p r oc u r a n a l it e r a t u r a a fr ic a na o c o lo r ido t p i co dos

    fo lhe t o s de t u r ism o e que c a r a c t e r iz a va m g r os so modo a s p g ina s da lit e r a t u r acolonia l. O d es t aq ue con fe r ido flo res t a , a nfase com qu e se desc reve a su a exu-

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    b e r n c i a , a a t m o s fe r a m e io m g ic a d e s e u i n t e r io r n o c o n c o r r e m p a r a s u a

    idea l izao . Pol i t izado , o Mayombe lugar de conf l i to e cont rad io , podendo,

    po r t a n t o , s e r vis to c om o um a r e p r e se n t a o de Lua n da , a c a p it a l do p a s , ond e a

    lu t a i a ga nha n do f or a e ond e , e m nove mb r o de 75, s e p r oc la m a a ind e pe nd nc iado p a s .

    F a z-s e u m a n a o e p e r d e - se u m s on h o

    O s a n o s q u e s e p a r a m n o t e m p o a e s cr it a d o Mayombed o m o m e n t o e m q u e

    Pepe te la e sc reve A gerao da ut opiaforam viv idos de form a in t ensa pe lo esc r i-

    t o r e p e lo pa s que s e fo r mou a ps a de c la r a o da ind e pe nd nc ia e m onz e de

    nove mb r o de s e t e n t a e c inc o . Qua se 20 a nos d e po i s, a h i s t r ia d e Ango la , pa r t i c u -

    la r iz a da po r u m c o t id i a no d e im pr e s s iona n te s d ific u lda d e s , sob a b r u t a l a tm os fe -

    r a d e um a gue r r a qu e va i c onhe c e nd o a sp e c tos , a pa r nc ia s , ra z e s e r e pe r c us se s

    d i fe r e n t e s , c omp r ova n o jogo d o c o t id ia no a d im e ns o in susp e it a dos lim it e s da

    v it r ia c onqu is t a d a . Mui to m a is do qu e ousou p r e ve r o C oma nd a n t e S e m Me do , o

    he r i do Ma yom be , o s fa n t a sm a s pe r p e tu a r a m e c om a in t e r ven o de ou t r o s e le -

    m e n tos s a c ud ir a m a fr g il su s t e n t a o da u top ia que m e d ia r a o e m pe n ho , fund in -

    do t ica e e s t t ica no p ro je to l ite r r io an golan o .

    Esc r it o n o c ome o d os a nos 90 na c ida d e de B e r l im , ond e se in s t a lou o a u to r

    pa r a goza r d e um a b o lsa o fe r e c ida po r i n s t i t u i o a l em , o novo r oma n c e p r oc u r afa z e r um ba l a n o da u t op ia que , be m ou m a l, ha v ia m ob i liz a do a ge r a o que a s s i -

    na a i nde pe n d nc ia . S e r e s se g r upo , mob iliz a do d e a lgum m odo , pa r a a a ve n t u r a

    d o Mayombeo ob je to c e n t r a l de s sa n a r r a t i va c u j a t n ic a da da pe lo de sga s t e ,

    pe l a somb r a , pe l a a ma r ga d ilu i o de u m p r o je to a d u r a s p e na s ima g ina d o .S e a

    t a r e fa d e a va lia o , o m ovim e n t o fund a m e n t a l o da m e m r ia qu e r e sga t a fa to s

    que possa m p r op ic ia r a c omp r e e ns o d os c a m inh os e sc o lh idos . R e v is it a d os , a l-

    gun s loca is e pocas v iab ilizam um olha r novo, desp ido a gora do sonh o e j t ing i -

    do pe l a s c o re s do de se nc a n to . De a c o r do c om a p r opos t a de r e ve r e a va lia r, o e s p a -

    o secun da r iza - se e o pon to fu lc ra l o tempo, e le m e n t o e s t r u t u r a l que a s sum e a

    p r ima z ia na c ond u o do p r oc e s so na r r a t ivo. O d e s t a q ue da do a o t e r mo ge r a -

    o c om q ue se nom e ia o r om a nc e se r c on fir ma do p e lo de se nvo lv im e n t o da na r -

    ra t iva .

    Cronologicam ent e longo o t em po d o enred o : a s aes se in ic iam em 1961 e

    o l t imo cap t u lo se fecha com um suges t ivo a p a r t ir de 1991. Du ran te e ss as t r s

    d c a d a s , in i ciou - se a l u t a a r m a da pe l a ind e pe nd nc ia , na sc e u o p a s , ensa iou -se o

    pro je to soc ia lis ta , t r a nscor reu a guer ra d e agresso m ovida p e lo reg im e rac is ta da

    fr ica d o S ul , in t ens i ficou-se a guer ra c iv il en t re o MP LA e a UNITA, ass ina ram -sea lg u n s t r a t a d o s d e p a z j a m a is c o n c r e t iz a d o s n a n t e g r a , o p t o u - s e p e lo

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    ne o libe r a l ism o , o mu lt i pa r t i da r ism o suc e d e u o r e g im e d e p a r t i do n ico . As t r a ns -

    fo r ma e s fo r a m se m som br a d e d v ida e x t r a o r d in r ia s e d e t u do i s so , e m a lgu -

    ma ins tnc ia , pa r t ic ipou essa ge rao . Coube- lhe ges ta r o pro je to nac iona l i s ta ,

    in s t it u ir um m ode lo de e s t a do , inve s t ir na c ons t r u o ou na fr a ud e de um a soc ie -d a d e o r ie n t a d a p e lo s v a lo r e s s o c ia lis t a s , v iv er a p a s s a g e m p a r a o s p a d r e s

    neol ibe ra is , en t e r ra r , a l te ra r ou a rqu iva r a u t opia qu e ca t a l isa ra a r e s is t nc ia ao

    c o lon ia lism o . De sse s p r ob le ma s se oc upa o r om a nc e , p r oc u r a ndo d e sve nda r o s

    e n igm a s que in s id io sa m e n t e t r a ns fo r ma r a m a p r o je o u tp ic a do Ma yomb e na s

    som br a s qu e obsc u r e c e m o pa s libe r t a do .

    Abr indo o t e x to que c o loc a e s sa ge r a o c omo p r o t a gon i s t a da s g r a nde s

    m u d a n a s , o n a r r a d o r r e m o n t a a u m e x a m e o r a l d e s e u t e m p o d e e st u d a n t e r e -

    cm-chegado me t rpole . Ao in ic ia r uma f rase com a pa lavra por tan to - um

    t rao do fa la r angolano - , o a luno ac ida m ent e repreen dido p e lo professor qu e ,

    e m sua a r r og nc ia , hum ilha - o a s soc ia nd o a p e c u lia r ida d e de s e u u so d a l ngua

    igno r nc ia d e qu e m ve m d a s c o ln ia s . De sse mod o , a s ingu la r ida d e qu e pod e r ia

    se r en t end ida com o um t ra o de iden t idad e conver te - se em def ic inc ia, p rova ,

    por t an to , de infe r ior ida de :

    Por t an to , s os c ic los e ram e te rn os .

    ( Na p r o va o r a l d e Ap t i d o F a c u ld a d e d e L e t r a s , em L is b o a , o e x a mi n a d o r fe z u m a

    p e r g u n t a a o fu t u r o e s c rit o r. E s t e r e s p o n d e u h e s i t a n t e m e n t e , in ic ia n d o c o m u m p o r t a n t o .

    De on de o sen hor , pe rgun tou o p ro fesso r, ao qu e o e sc r ito r r e sp ond eu d e Ango la . Logo v i

    q u e n o s a b i a fa la r p o r t u g u s , e n t o d e s c o n h e c e q u e a p a la v r a p o r t a n t o s s e u t iliz a c o mo

    c o n c lu s o d u m r a c io c n io ? As s im m e s mo , p a r a p r o e x a m in a n d o v on t a d e . Da a r a iv a d o

    au to r qu e ju rou u m d ia hav ia de e sc reve r um l iv ro in ic iad o por e s sa pa lav ra . P rom essa cum -

    pr ida . E depo i s des te pa rn tes i s , r eve lador de saudve l r ancor de t r in ta anos , e sconde-se

    def in i t iva e p ru den tem ent e o au t o r.) . 5

    Como se pod e nota r , o inc ident e r e tom ado em tom de b lague por aqu e le que ,

    qu and o nad a, conqu istou , ao longo dessas d cada s, pelo menos, o dire ito d e emp re-

    gar na dimen so m ais sagrada d a escr ita a exp resso re je ita da n o plano d a ora lida de

    por u m represent ant e da prep otn cia colonia l. A defic incia ganh a est a t ut o de es-

    t ilo n o p alco glorificad o d a criao lite rria. Na referncia, ind icia-se o am bient e d a

    m etrp ole povoada pelos preconceitos em re lao ao q ue vinh a d a fr ica e , sut ilm en-

    te , remarca-se a t onal ida de irnica que t ingir a n arra t iva . Cum prida a p rom essa de

    tr inta anos a trs , o narrad or ao fechar o p arnt esis , anu ncia que o au tor se vai re t i rar

    da cena : defi ni ti va e pr udentemente- prom essa qu e no ser cum prida . Visceralm ent e

    ligad a ao p rocesso qu e relat a, sua fala . cont agiada pelos fat os qu e o olha r vai seleci-

    5 C f. A gerao da utopi a. Lisboa : Dom Qu ixote , 1993, p . 11.

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    ou t ros en sa ios R it a Ch a ves , P ep e t e la : rom a n ce e u t op ia ...

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    onand o. O pa rgra fo seguin t e , dom inad o p e la sensao d e d is tanc iam ento dad a p e lo

    u s o d o v e r b o n o p r e t r i t o i m p e r f e i t o d o i n d i c a t i v o , n o s e r p r o p r i a m e n t e

    parad igmt ico da to t a lidad e da obra qu e v ir , fr equentem ente , en t remead a d e in t e r-

    r o g a es , e x p r e s s e s d u b i t a t iv a s , s in t o m a t ic a m e n t e c o r t a d a p o r c o n s t r u e sind icat ivas da p erplexida de em relao h ist ria vivida .

    C o b r in d o u m lo n g o p e r o d o d e t e m p o - d o s a n o s q u e a n t e c e d e m a v e n t u r a

    do Ma yom be fa se j pos t e r io r ind e pe nd nc ia - o e n r e do a c om pa n ha a ge s t a -

    o , a t e n t a t i va d e im p la n ta o e a fa l nc ia d o p r o je to u tp ic o que e s t a r ia na ba se

    da h i s t r ia r e c e n te d o pa s e no p r oc e s so de c r ia o d e um a ob r a c u jo e ixo g ir a ,

    c omo fom os p r e v ia m e n t e in fo r ma dos , e m t o r no da fo r ma o da na c iona l ida d e .

    Dos qu a t r o c a p tu lo s , do i s r efe r e m- se p r e pa r a o e c onq u i st a da ind e pe nd nc ia

    e dois abord am a fase p os t e r ior. Em tod os e les , porm , av ivam -se s ina is nega t ivos

    e o l e it o r p ode , de sde a s p r im e ir a s p g ina s , c a p t a r a d im e ns o d a s d ific u lda d e s a

    inv ia b i liz a r a u t op ia . P r e nu nc ia dos n a e t a pa a ind a sonh a dor a d o Ma yomb e , o s

    p r ob le ma s a m pl ia m - se e s e in t e ns ific a m , de ixa nd o pou c a m a r ge m p a r a o o t im is -

    m o.

    As aes preconizadas , os procedimentos en t rev is tos , os mode los de fendi -

    d o s e a s a t it u d e s c on d e n a d a s q u e c o m p u s e r a m o u n i ve r so d o M a y o m b e s e v o

    de se n r o l a ndo no d e c o r re r do t e m po e d a na r r a t i va d iv id ida e m qua t r o l ongos c a -

    ptulos : A casa ( 1961 ), A chana ( !972 ), O polvo ( 1982 ) e O templo (a

    pa r t i r de 1991 ) . A r e c o r r nc i a a m a r c a s e spa c ia i s qu e a ve r ific a m os logor e la t iv iz a da pe lo pe so do t e m po , ma te r ia lm e n t e r e fe r ido n a s e qu nc ia d o t t u lo de

    c a da se gme n to do r oma nc e . A e xp l i c i t a o dos pe r odos r e ve l a t a mb m que o

    t e m po d e du r a o dos e p isd ios s e va i r e duz ind o , o que s ign ific a qu e a s m ud a n-

    a s de q ue t r a t a o t e x to s e fa z e m d e fo r ma c a da ve z ma i s r p ida . Ob se r ve - se a ind a

    qu e o l t im o cap tu lo in ic ia - se com u m a pa r t i r , suger indo a con t inu ida de d e

    u m a s it u a o q u e d e ix a a p r e e n s iv o q u e m d e a lg u m a m a n e ir a e m b a r c ou n a t r a -

    ve ss ia d o Ma yomb e .

    O c o n t a t o c o m o t e x t o c o m p r o va q u e , s o b o c o m p a s s o d a m e m r ia , a d im e n -

    s o t e m por a l a c iona a m qu ina q ue a o r e ve r luga r e s e s it u a e s e nc on t r a na pe r s -

    pe c t iva da d i s t nc i a a s c ha ve s c om que a go r a ju lga n e c e s s r io a b r ir o s c a n t os qu e

    f i c a r a m o b s c u r e c i d o s p e l a u r g n c i a d a m u d a n a . I n v e r s a m e n t e o r d e n a o

    m e r id i a na do e n r e do do Mayombe, o r oma n c e e xp r e s sa e s t r u t u r a lme n t e a s he s i-

    t a e s , a s a n gs t i a s , a s a t o r me n ta d a s v ivnc ia s no in t e r io r de u m p r oc e s so c e rc a -

    do pe lo s pe r igos que n o se e x t ingu ir a m c om o fim do c o lon ia lism o p o r tugu s . Os

    a b a los na c r ono log ia , com a inc o rpo r a o d o r itm o s ve ze s a luc ina d o da m e m -

    r ia , ma t e r ia l izam -se no uso d o d iscurso ind ire to l iv re , na in t rom isso d esorden ad a

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    via a t l n t ica n . 2 ju l. 1999

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    de u m na r r a d o r que s e a p r ox im a , s e a fa s t a , s e m is tu r a a o na r r a d o , c omo u m r e fle -

    xo da s c on t r a d i e s que a t r a ve ssa m os a to r e s de s sa H i s t r ia .

    Em A casa , a na r ra t iva cent ra - se , com o no r a ro na ob ra de Pep e t e la , na

    pe r spe c t iva de um o lha r fe m in ino que p r oc u r a c om pr e e nd e r a s r up t u r a s e m p r o -c e ss o n o g r u p o d e e s t u d a n t e s d a C a s a d o s E s t u d a n t e s d o I m p r io e p e r c eb e r a s

    linh a s d a c r is e de t ona d a c om o in cio da lu t a a r m a da e m Ango la . A a gud iz a o

    dos p roblem as rac ia is em Por t uga l , o ce rco da P olc ia P olt ica , a an im osida de su r -

    g ind o na r e la o e n t r e o s que s e t i nha m c omo c om pa n he i ro s , a s c r e n a s e op e s

    da juve n tu de f or a d a t e r r a , t u do is so va i a r m a nd o um qua d r o s ign i fic a t ivo d e r e fe -

    rnc ias d essa poca de d i fce is d e fin ies . De u m lad o , a s ex ignc ias , os p rogra -

    m a s e a s in t e r d i e s ; do ou t r o Ango la e u m c omp lic a do p r oc e s so de lu t a . Na r ra do

    e m t e r c e ir a pe s soa , a c o lhe nd o da dos q ue c on f ir m a m a on i sc i nc ia d a voz que c on -

    t a , o c a p tu lo, a t odo m om e n t o , povoa do pe l a s in t e r r oga e s de S a r a , um a e s tu -

    da n t e d e m e d icina , na sc ida e m B e ngue la , filha de c om e r c ia n t e s b r a n c os e c onom i-

    cam ent e bem s itu ad os . Sen s ve l e progress i s ta , e la v ive a exper inc ia das t enses

    r a c i a i s que s e l e va n ta m c om a e c lo s o da lu t a a r ma da c om r e pe r c us s o qua se

    im e d ia t a na m e t r po le . No m om e n t o e m qu e o n im o ge ra l s e p r e nde fo r mu la -

    o de p r o j e to s pa r a a c ons t r u o na c iona l , e l a f unc iona um pouc o c omo uma

    e sp c ie de du p lo de s se na r r a d o r c la r a m e n t e e nvo lv ido c om a qu ilo que na r r a .

    No segun do cap tu lo , A chan a, cu jas aes loca lizam -se j n o esp ao d a

    lu t a c on c r e t a , t e nd o os gue r r ilhe i ro s c om o p e r sona ge ns c e n t r a is , a lt e r a - se o t ome o pon to d e v is t a da na r r a t iva . R a d ic a liz a ndo a lguns s ina is c a p t a dos n a s m a ta s

    do Ma yomb e , aq ui pe r fe ita m ent e poss ve l de t ec ta r a s cont rad ies e insu fic in-

    c ia s q ue l e va r ia m a os d e svios do p r o je to e m pa r t e t o a l im e n t a do na C a sa . Na

    du reza das a es , a so l ida r ieda de j no a tn ica e os p rocedimen tos d iv is ion is ta s

    c um pr e m a t e r r vel fun o de a n un c ia r a p r e c a r ie da d e da v it r ia . O de se nc a n to

    pa r e c e che ga r a n t e s do fim da gue r r a de libe r t a o e o d i s cu r so do n a r r a do r n o

    oc u lt a o s e n t im e n t o d e fr u s t r a o a p r e nun c ia r a de sc r e n a . O c lim a f a vo r vel

    ide n t ida d e dos p r im e ir os t e m pos d a lu t a s e d i lu i . A poss ib i lida d e de c omu nh o de

    que a t e r na a p r ox im a o e n t r e o na r r a do r e S a r a p a r e c ia s e r um a im a ge m c onve r -

    t e - s e e m d is c re t o a fa s t a m e n t o , n u m a r e la o q u e s e fa z t a m b m c o m a s p o n t a s

    de um a boa d ose de ir on ia .

    O c lim a d e d i logo p r e dom ina n te e m Mayombede sa p a r e c e e a s c onve r sa s

    so a t ra vessada s pe los s ina is d a incom un icab ilida de . A incom preen so , a r iva li-

    da de , a s in t r igas m an ifes t as ou t o -som ent e suger ida s fazem prever a ir r ea l izao

    dos p r ops ito s q ue t e r ia m le va do l u t a . O p r o je to d e um a n a o l iv re s e va i e s t i -

    lha a n do na c on du o de um p r oc e s so in i cia lm e n t e ba n ha d o pe la ge ne r os ida d e

    de u m sonho c o l et i vo . A u top ia t e m c omo a dve r s r io o s p r p r io s hom e ns qu e in -ves t i a m e m sua c ons t r u o . As d i fe r e n a s de ixa m de se r d iver s ida d e pa r a s e t r a ns -

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    fo r ma r e m e m c a p i t a l de ne goc ia o , e m pa t r im n io pa r a ob te n o de va n ta ge ns

    na soc ie da d e a ind a e m fo r ma o .

    Os an os sa l tam no d esenro la r do enred o e o te rce iro cap tu lo - O p olvo -

    t e m c omo veto r An ba l, o S b io , com o fic ou c onh e c ido nos a nos d e gue r r a e c la n -de s t in ida de . A sa be dor ia a e s t d i re t a m e n t e liga da a os va lo r e s c unh a dos na e s fe -

    ra da luc idez , da re sp onsa bi lida de , da coe rnc ia . O t em po cor reu , a lu t a p e la ind e-

    pen dn c ia p o lt ica se fez , o in im igo com um fo i de r ru ba do, tod avia levan ta ram -se

    os fan ta sm as p rev is t os e ma is aqu e les qu e no se fize ram prever. O le itor d epa ra -

    se c om um a soc ie da d e m a r c a da pe l a c o r rup o , pe l a fa lt a de e sc r p u los, pe l a

    ir re spon sab ilida de soc ia l. A causa reve la - se pe rd ida e o dup lo do na r rad or m is t u-

    r a - se a o c us t ic o o lha r d a qu e le qu e , fa r to d e s e r de r r o t a d o pe l a im pos i o d e um

    c on jun t o d e no r m a s qu e pe n sou ve r a fa s t a do c om o fim do c o lon ia lism o , r e t ir a - se

    pa r a um luga r d is t a n t e e a l i e m pe nh a sua inc r du la r e s is t n c ia .

    C om o f oc o c e n t r a do no o lha r de um home m que se pos t a a o longe , e s se

    c a p tu lo t e m o c lim a b a liz a do po r u m a e sp c ie de a c e r to d e c on ta s que s e fa z

    m e d ia do pe l a e xpos i o de v r io s c on fr on tos . Ne ssa e t a p a , r etom a m - se a lguns

    fios de ixados s o lto s no con tex t o de Lisboa : Sa ra e Anba l levam ra iz a comu -

    n h o j e x p e r im e n t a d a n o s t e m p o s d e e s t u d a n t e s ; re m a n e s c n c ia s d o p r o je t o r e -

    voluc ionr io present ificam -se ex ig ind o qu e a s itu ao se con front e com a p rpr ia

    His tr ia : a l i se co locam fren t e a fr en t e os vencedores e os n ovam ent e venc idos .

    Mais que t odos esses , porque reve la - se emb lem t ico , s itu a - se o encont ro de Anba lc om o po lvo . Da n do c on t inu ida d e a um e p i sd io con t a do p o r e le a S a r a , no p r i-

    m e ir o c a p tu lo , An ba l qu e , o r ie n t a do pe lo s e u de se n c a n t o r e t i r a -se p a r a a p r a i a

    da C a o t inha , me r gu lha n a qu e la s gua s s e m pr e m ob i liz a do p e lo de se jo de r e e n -

    c on t r a r o p o lvo , o e no r m e po lvo que su a m e m r ia c onve r t e r a e m e n t ida d e m ito l -

    g ic a . P a r a a q ue le pe d a o do p a s , a fa s t a do d a c a p it a l e de q ua lque r c e n t r o d e de -

    c is o , fic a t r a ns fe r ido o pa l c o onde se va i da r um g r a nde c omb a te , o c omb a te de

    um hom e m d ispos t o a p r e se r va r -se in t e ir o c om se us p r p r io s m ons t r o s , c om se u s

    m e dos e s e us l im it e s . In t e ir o , m a s iso la do , im po t e n t e pa r a lu t a r c on t r a ou t r a s

    fe ras , Anba l com pe a im agem do esp r ito d as chan as do Les t e , m it icam ent e iden -

    t i fic a do c om o sonh o qu e o c ond uz iu lu t a p e la i nde p e nd n c ia . A a lu s o a e s sa

    fo r a no fim do c a p tu lo e xp r im e a h ip te se d e que a do r m e c ida a u t op ia pode u m

    dia acord ar.

    Se o t e rce iro cap tu lo se fecha com a p oss ib i lida de , a ind a qu e longnqu a d e

    m ud a n a , o qua r to e l t im o fa z c a ir sob r e o s le it o r e s um a som br a d e sa n ima d or a .

    O p a lc o a c ida d e de Lua n da e o s p e r sona ge ns que p o r e la c ir c u la m de m a ne i ra

    s in i s t r a e m na da pe r mi t e m l e mbr a r a c r e n a num pa s novo e j u s to que ha v ia

    m obi lizado a ge ra o . O em pen ho, a ingen uidad e , a convico pol t ica , m esm o ale ve ir r e sponsa b ilida d e , e n fim tod os o s e le m e n t os qu e s e m is tu r a va m pa r a c om-

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    por a a t m os fe r a da C a sa de sa p a r e c e m c e de n do luga r pa r a a p e r ve r s ida d e de um

    a m bie n te dom ina d o pe la m e squ inha r ia . O va z io sob r e pe - se a t u do e s e a d im e n-

    s o r e l i g io sa do ma r x i smo pod ia s e r a pon ta da c omo um pa t r imn io a r c a i c o , a

    m ode r n ida de e r gu ida sob r e o s va lo r e s do n e o libe r a l ism o de sa b a sob r e o pa s ein s t it u i o c a os . A soc ie da d e qu e inve s t iu n um a p r opos t a soc ia lis t a , que n un c a se

    c onsum ou , a s s is t e imp la n t a o de um ou t r o p r o je to do qu a l a so lida r i e da de n o

    c ons t a , s e que r c omo p a la v r a de o rde m .

    O f oc o c e n t r a l r e c a i sob r e V to r , o a n t igo gue r r i l he i r o a go r a min i s t r o , e

    Malongo, o ex-jogad or de fu t ebol , to rnad o em pres r io . L igad os am bos Casa,

    t i ve r a m s u a s t r a je t r ia s a p a r t a d a s d u r a n t e a s d c a d a s d e lu t a e d e fu n d a o d o

    novo pa s . Vto r pos t ou - se no c e n t r o d a s d e c ise s , v ivenc iou de pe r to a s m ud a n-

    a s de s se s a n os . Ma longo v iveu fo r a e s r e g r e s sa t e r r a q ua n do , a ba n don a da a

    op o soc ia lis t a , a l ibe r a l ida d e da e c onom ia a b r e - se c om o um a p r ome ssa a q ue m

    sa be inves t i r . S e pa r a dos p o r mu ito t e m po , o s do is r e ne m - se e m t o r no do p r o je -

    to de enr iquecer , ope rao que se r fac i l i tada pe la l igao com El ias , e s t r anho

    person agem , cu jo c in ismo reves t ido p or um discurso re l ig ioso se r p roviden c ia l

    pa ra da r corpo ao d ese jo dos ou t ros d o is . Nesse cap tu lo , consa gra - se a d i lu io

    de qu a lque r s ina l na d i r e o de um a soc ie da d e ma is ju s t a . C omo d om ina n te n os

    pa ses p e r if r icos , com o neol ibe ra lism o ins ta la - se o jogo do sa lve - se quem pu -

    de r . A o rde m a c um ula r e c a da u m h d e u sa r o c a p i t a l de que d ispe . Aos que

    e s t o n o c e n t r o d o p o d e r o u e m s u a s im e d ia e s a p r e s e n t a - s e o r ec u r s o d ep r iva t iz a r e m se u p r p r io nom e os be n s p b l ic os que d e ve r ia m a dm in i s t r a r. S e o

    Es t ad o de or ien ta o soc ia l is t a m ost rava-se ine f ic ien t e , o m ode lo que o va i sub s-

    t itu ir se r basea do , na ap ropr iao ind evida , na cap ita lizao do pres t g io pesso -

    a l ou in s t i t uc iona l , na s t c n i c a s da r a p ina ge m a li c obe r t a s p e lo s e u fe m ism os qu e

    o p r p r io s is t e m a e l a bo r a pa r a s e a u to ju s t ific a r.O q ua d r o a p r e se n t a do n o d e ixa

    m a r ge m p a r a e xpe c t a t iva s ou t r a s . O e n fr a que c im e n to d o pode r p b l ic o , a p on t a -

    do pe l a c a r t ilha ne o libe r a l c omo u m fa to r de p r og re s so , de p a r a - se c om um a soc i-

    edade c iv i l desorganizada , despreparada pa ra regulamenta r , f i sca l iza r , cor r ig i r

    a b usos . I n s id io sa me n t e a de sc r e n a t r a n s fo r ma - se na no ta dom ina n te e e le va - se

    c omo fo r a me d ia d o r a da s r e la e s e n t r e o s hom e ns .

    S ob e s sa s som br a s , a na r r a t i va va i s e a p r ox im a nd o d o fina l . S e gu ind o a e vo -

    lu o c r ono lg ic a d os fa t o s , a o r ga n iz a o d os c a p tu lo s r e g is t r ou a lgun s d os

    im pa sse s e a s t a n t a s l im it a e s d o p r o je to a c a l e n t a d o t e n do p o r ho r iz on te a l ibe r -

    tao do pa s . A mat r ia vas ta e a s d i f icu ldades que impe ta lvez expl iquem

    c e r t a s fr a g ilida d e s do r oma nc e . D ia n t e da m u l t ip l ic ida d e d e e le m e n t os c om que

    s e d e p a r a , o n a r r a d o r p a r e ce t a m b m e le fa d a d o a o p a p e l d e v t im a d e u m m u n d o

    e m tu r b i lh o . Muito d ife r e n t e m e n t e do qu e a c on te c e e m Mayombe, ond e a s c on -t r a d i e s v m e n r ique c e r o p on t o de v is t a da na r r a t iva , e m A gerao da ut opia

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    ou t ros en sa ios R it a Ch a ves , P ep e t e la : rom a n ce e u t op ia ...

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    a s p e r p le x ida d e s de s se u n ive r so e m de c om pos i o in s inu a m - se a t i ng ind o a voz

    que se qu e r ia sobe r a na na n a r r a o dos fa t o s . O t e x to a s s im pa r e c e - nos e m c e r to s

    m om e n t os a qu m da p r opos t a ; c omo se a ir on ia s e n t ida n a s p r im e ir a s p g ina s s e

    e sva s se im po t e n t e no e mb a t e c om os mon s t r o s c on t r a o s qua is s e la n a . D ia n t eda le m br a n a do a r r oga n te p r o fe s so r, o na r r a do r e r gue - se de b oc ha do , a tu a liz a o

    d e s p r e zo a c u m u la d o d u r a n t e a n o s e cu m p r e a p r o m e s s a d e c om e a r u m r o m a n c e

    por po r t a n to . Envo lv ido n a in s id io sa s e qu nc ia dos fa t o s qu e in t e r d it a m a u to -

    p ia , e le a s fix iad o e , em ce r ta s p assa gens o le ito r p ode sen t ir qu e lhe fa l ta f lego .

    C omo n o se de fine p r op r i a me n te c om o um r e c u r so de e xp r e s s o , e s sa a pa r e n t e

    de b ilida d e do na r r a do r c on t r ibu i pa r a q ue s e r e duz a e m a lguns m om e n t os a flu -

    nc ia d a n a r r a t i va .

    Esse p r oc e sso de e sva z ia m e n t o da fo r a na r r a t iva pod e se r pe r c e b ido , po r

    e xe mp lo , no c on fr on to e n t r e a a b e r tu r a e o s p a r g r a fos que a n t e c e de m o fe c ho do

    r oma nc e . No p r im e ir o c a p tu lo , inc lu s ive a s pa s sa ge ns a n t e r io r me n te a qu i t r a ns -

    c r it a s , p r im a m por um a fo r a que na sc e ndo d a c onc is o suge r e a im a ge m de um

    na r rad or convic to d os proced im ent os que escolhe . A energ ia de sc r it iva se a r t icu la

    c om t ona l ida d e s po t i ca s da n do a o t e x t o um r itm o e spe c ia l c a pa z de c omb ina r

    t r e c hos d ig r e s sivos c om c e r to s s ina i s que s in tom a t iz a m o tom a c e le r a do d e a lgu -

    ma s a e s a l i a pa nha da s . As ima ge ns r i c a s ga nha m a inda ma io r de ns ida de no

    jo go d is cu rs ivo em q u e os d i lo gos se m esc la m com a s vo lt a s d o d is cu rso in d ir e t o

    liv re . Os p la nos s e m is tu r a m r e su lt a n do n um in t e r e s sa n te p a ine l pa r a e xp r im ir ar ique z a de un s a nos t oc a d os pe la u t op ia . A viva c ida d e do m om e n t o a c om pa n ha -

    da pe l a lingua ge m e o t e x to e sp e lha d e fo r ma d in m ic a a s r e la e s que c om pe m

    o c o n t e x t o .

    Ta l com o a am binc ia da casa re fe r ida n o t tu lo , o rom an ce prom ete . Mas ,

    a c om pa n ha n do a t r a je t r ia d a soc ie da d e a qu e e s t l iga do , os s e n t idos s e c on fun -

    de m , d i lu indo - se ba s t a n t e a e ne r g ia p r e s se n t ida ne s se c om e o , ind ic a nd o , que m

    sa be , que o be c o se m sa da e m que a soc i eda d e a ngo la na s e v s it i a da n o a b r e

    m ui tas p oss ib ilida des d e expresso . Pa ra fugi r ao ce rco opt a - se pe lo de l r io com o

    ve to r da lingua ge m e a s l t im a s p g ina s s o p ovoa da s po r um a suc e s s o de fr a se s

    de sc os ida s , ond e a s e lip se s a lt e r na m - se c om a s r e pe t i e s , a s in t a xe d i spe nsa a

    pon tua o c onve nc iona l , t udo c on t r a r i a ndo a ob je t i v ida de que um ba l a n o r e -

    qu er. A in t enc iona l ida de d esses proced im ent os n t ida , tod avia o re su l tad o fica

    aqu m dos ob je t ivos . At m esm o a rac iona l idad e da a rgum ent ao do sb io Anba l ,

    m a lgrado suas s r ia s in t enes , se e sba t e sem dar cont a d essa rea lida de m ul t iforme

    e m su a de sa g r e ga o . Num m un do a s s im , ond e o s c inc o se n t idos mos t r a m - se in -

    suf ic ien t es pa ra com preen der o rea l , a lingu agem ta m bm pa rece frg il pa ra re fle -

    t i r vivam ent e os m ovim ent os dos se res e da s co isas . Por isso ta lvez , ao aca ba r ale itu ra , guard e -se um gos to de insa t is fao . Ao le itor f icam , pe lo m enos , du as h i-

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    via a t l n t ica n . 2 ju l. 1999

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    p t e se s : s e num p r ime ir o mom e n t o t e nd e a a t r i bu i r e s se s s ina i s de fr u s t r a o

    im pe r c ia do n a r r a do r, nu m a se gund a l eit u r a pod e in t e r p r e t a r o fe nm e no c om o

    s in t om a de c oe r nc ia e n t r e o ca m po t e m t ic o e o p l a no e s t r u t u r a l . O fa t o que

    t a m b m n s , o s le it o r e s n o s r e s s en t i m o s d o s o n h o p e r d id o d u r a n t e e s s es t e m p o sque a c r e d i t va mos se r de cons t r u o da na o a n go la na .

    P e r d e - s e u m a n a o . D e s fa z -s e a u t o p ia ?

    F e c ha do o l t im o c a p tu lo , o na r r a d o r que n o c um pr i ra a p r ome ssa d e de -

    fin i t iva e p r ud e n t e m e n t e oc u lt a r -s e , r e a pa r e c e no e spa o a que c ha m a eplogo

    p a r a n o e n c e r r a r a e s t r i a . A frase cur t a e , fug indo s conc luses a q ue a s an -

    lises devem cond uz i r, inves t e , um a vez ma is , na cont inu ida de d a d vida . Ren ova-

    da , a pe r p l e x ida d e n o pe r m it e r e spos t a s : a b r e - se a na r r a t iva pa r a o mu nd o que

    e t e r n i za - se e m m ovim e n t o . Em c ons t a n t e r o t a o , t a l c omo a h is t r ia do p a s que

    a juda a fa z e r e a c on t a r, a ob r a d e P e p e te l a r e d im e ns iona - se e a o p e s s im ism o t r a -

    z ido p e la de r r o t a j un t a m - se a lgum a s fr a n j a s da u t op ia de spe da a da p e la du r e za

    de u m c on te x t o hos t i l. Na s ob r a s s e gu in t e s , o s p r ob le ma s se r o r e tom a d os , o p r o -

    cesso h is tr ico de Angola out ras vezes rev is i tado , conf i rmando que o tema da

    c ons t r u o na c iona l pe r m a ne c e , s e ja na s im a ge ns m u l t ip l ic a da s d a r u na de Lu -

    an da , a legor ia cen t ra l de O desej o de K i an da, s e ja na m e m r ia do e sc r a vo mud o

    q u e e m A gloriosa faml ia( sua m a is r e c e n te pu b l ic a o ) r e la t a a s a ve n tu r a s dafa m lia Va n Dum na c ida d e sob o dom n io dos h o la nd e se s .

    En t r e a e m po lga o qu e c e r cou os a n os 70 e os de se nc a n ta dos a n os 90, a

    soc ieda de a ngolana v iveu convuls ivam ent e os d i lem as e a s imp oss ib i lida des a q ue

    e s t su je it o u m pa s e m c ons t r u o . Aps d c a da s d e gue r r a , o pa n o r a m a a ind a

    fe ito d e a n nc ios de p a z que se suc e de m se m que a pop u la o c ons iga ve r a l m da

    de s t r u i o im p ie dosa da s c ida d e s , dos m a ssa c r e s no c a m po , da i nvia b i lida d e da

    v ida in t e ns ific a nd o o s e n t ido d e u r g nc ia d e qu e m n o ou sa p r e ve r a ho r a s e gu in -

    t e . A vio lnc ia d i r ia e a imp revis ib i lida de d o m om ent o seguin te con s t i tu em fa t o-

    r e s d e p e r t u r b a o e le va d a m e s m o n o c o t id ia n o d e u m a g e n t e q u e a p r e n d e u a

    c onv iver c om a p r e c a r ie da d e e o e n fr e n t a m e n t o . Tud o le va r ia a o de s n im o , t od a -

    v ia a c onsc i nc ia da a m a r gu r a de s se t e m po n o pe r m it e qu e s e d a h i st r i a po r

    e nc e r r a da . P o r e n t r e o s e spa os m n imos , a lit e r a t u r a a ngo la na , que s e c onso l idou

    c om o p r o je to d a l ibe r t a o , va i e nc on t r a nd o b r e c ha s p a r a d r ib l a r a de se spe r a n -

    a . Por i sso , m esm o frag i lizado p e la fora dra m t ica do con tex t o a qu e c la ram en-

    t e s e r e f e r e , me smo a p r e se n ta ndo ( ou r e p r e se n ta ndo ? ) a lguma de b i l i da de no

    e xe r c c io de sua f un o , me smo pa r e c e ndo ( c om se us dup los ) impo te n te pa r a

    6 Idem , p . 316

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    ou t ros en sa ios R it a Ch a ves , P ep e t e la : rom a n ce e u t op ia ...

    pr o jet a r a t r g ic a m u l t ip l ic ida d e da o r de m que ha b it a , o na r r a do r p r e fe r e , r e to -

    m an do a i ron ia , exe rc ita r a fina a r te d a des conversa e , dec la ra :

    Com o bv io , no p ode ex i s t ir ep logo nem pon to f ina l pa ra um a es t r ia qu e com ea

    p o r p o r t a n t o 6

    P or t a n to . . .