paulokeller o trabalho imaterial do estilista

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31º. Encontro Anual da ANPOCS Seminário Temático 34 Trabalho e Sindicato na Sociedade Contemporânea 3ª Sessão Trabalho, Temas Emergentes O Trabalho Imaterial do Estilista, a Produção de Moda e a Produção de Roupa Paulo Fernandes Keller UNIEURO Centro Universitário Euro-Americano Brasília – DF 22 a 26 de Outubro de 2007 Caxambu – MG

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  • 31. Encontro Anual da ANPOCS

    Seminrio Temtico 34 Trabalho e Sindicato na Sociedade Contempornea

    3 Sesso Trabalho, Temas Emergentes

    O Trabalho Imaterial do Estilista, a Produo de Moda e a Produo de Roupa

    Paulo Fernandes Keller UNIEURO

    Centro Universitrio Euro-Americano Braslia DF

    22 a 26 de Outubro de 2007 Caxambu MG

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    O trabalho imaterial do estilista, a produo de moda e a produo de roupa.

    Resumo:

    Este artigo analisa o trabalho imaterial do estilista no contexto da produo e do sistema de organizaes da indstria da moda. Analisa a particularidade do trabalho imaterial do estilista enquanto trabalho de criao no campo da produo cultural, contudo, concebe a produo de moda como uma atividade coletiva. O artigo reflete sobre o trabalho imaterial do estilista em relao a outras ocupaes imateriais e materiais, ambas inseridas em uma rede de relacionamentos econmicos, sociais e simblicos. O artigo utiliza a distino analtica entre a produo de moda (imaterial) e a produo de roupa (material). Os produtos so distintos: enquanto a moda um produto simblico e intangvel atende a um desejo, a roupa um produto concreto e tangvel atende a uma necessidade. Mas, como a moda um smbolo cultural manufaturado, o artigo discute o elo entre a produo de moda e a produo de roupa, refletindo sobre a insero do trabalho imaterial do estilista na rede de relaes que forma a cadeia de valor das indstrias de confeco e de moda.

    Palavras chaves: trabalho imaterial; estilista; indstria da moda; indstria de confeco; sociologia do trabalho.

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    The immaterial work of fashion designer, fashion production and clothes production.

    Abstract:

    This paper analyzes the immaterial work of fashion designer in the context of both production and system of organization of fashion industry. It analizes the singularity of immaterial work of fashion designer as a work of creation in the field of cultural production. However, it conceives fashion production as a collective activity. The paper reflects on the immaterial work of fashion designer in relation to other immaterial and material occupations, both inside the network of economic, social and symbolic relationships. The paper uses the analytic distinction between fashion production (immaterial) and clothes production (material). The products are distinct: while fashion is a symbolic and intangible product it satisfies a desire, clothes are concrete and tangible products they answer a necessity. But, as fashion is a manufactured cultural symbol, the paper discusses the link between fashion production and clothes production, reflecting on the insertion of the immaterial work of fashion designer in the network of relationships that forms the value chain of the apparel and fashion industries.

    Key words: immaterial work; fashion designer; fashion industry; apparel industry; work sociology.

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    01. Introduo.

    Este artigo parte da premissa terica de que a reflexo sobre o trabalho imaterial deve se feita em relao com o trabalho material, e que ambas as formas de trabalho devem ser pensadas na sua insero em uma ampla rede de relacionamentos sociais, econmicos e simblicos. A reflexo sobre a particularidade do trabalho imaterial do estilista de moda (couturier ou fashion designer) feita por meio da anlise do ato de criao em sua relao com o seu meio social, assim como, enquanto parte do processo de produo de moda (imaterial), que por sua vez se articula com a produo de roupa (material). Esta reflexo busca contribuir com a discusso sobre as formas de trabalho imaterial na sociedade contempornea. O artigo tem por base pesquisa bibliogrfica e documental, utiliza ferramentas analticas da sociologia do trabalho, da sociologia da moda e da sociologia econmica especializada na anlise de redes de empresas na indstria de confeco.1 O trabalho imaterial do estilista visto enquanto uma ocupao tpica da sociedade ocidental moderna onde emerge a idia e a prtica de moda. A distino analtica entre a moda e a roupa fundamental. A moda um produto intangvel, imaterial e cultural, enquanto a roupa tangvel, material e concreta. Kawamura (2005) adverte que ftil tentar definir a moda como se ela estivesse em um item do vesturio ou em um acessrio, porque moda um produto intangvel e simblico.

    1 O segmento de confeces no Brasil, assim como em todo o mundo, se caracteriza por um alto

    grau de diferenciao. Este grau de diferenciao se apresenta em termos de matrias-primas utilizadas, processos produtivos existentes, padres de concorrncias e estratgias empresariais (IEL, 2000). H grande heterogeneidade em seus produtos, segundo dados da ABRAVEST (2007) h 21 segmentos distintos, incluindo artigos de cama, mesa e banho, os mais variados tipos de roupa e acessrios (entre outros citamos, Bons, Camisaria, Casual feminino, Casual masculino, Uniforme profissional, Ginstica, Infantil, Intima, Jeans, Praia, Surfwear). Segundo dados do IEMI (2001), em torno de 83% das empresas do setor de confeces esto voltadas para a produo de vesturio (indstria do vesturio). Se tomarmos o nmero de mo-de-obra empregada (direta e indireta) na indstria de confeco, veremos que o segmento do vesturio participa com cerca de 80% do total da mo-de-obra.

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    Esta distino organiza a anlise da produo de moda e de roupa, assim como, distingue a indstria da moda da indstria do vesturio. Contudo, estas indstrias esto bastante inter-relacionadas, j que o produto de moda um produto cultural manufaturado. impossvel negar a ligao da indstria da moda com a indstria do vesturio na atualidade. At o inicio da segunda metade do sculo 20 havia um gap entre a indstria da moda (sinnimo de alta costura e voltada para a classe alta) e a indstria do vesturio (sinnimo de produo em massa voltada para a classe trabalhadora). Desde a revoluo do ready-to-wear cresce a interdependncia entre as indstrias de moda e do vesturio. A anlise do trabalho imaterial do estilista no perde de vista a sua insero nas indstrias da moda e do vesturio, assim como a sua insero na extensa rede de relacionamentos que compe a cadeia de valor do produto de moda (a roupa com estilo) e suas metamorfoses em funo da globalizao. O estilista ou o fashion designer produz estilo que pode ou no se tornar moda. Estilo um modo distinto ou elegante de ser, agir ou viver, que vai alm do vestir. Moda um modo ou costume que prevalece em uma determinada poca, reflete os valores e os costumes de uma sociedade em um perodo do tempo. Isto implica que, para que haja Moda, deve haver um processo de difuso social. A indstria da moda, seus principais agentes (estilistas e editores/jornalistas de moda) e suas organizaes (empresas e cmaras sindicais) no produzem apenas o produto de moda (um item do vesturio e um bem de consumo de luxo que agrega um estilo e um valor simblico), mas difundem a idia e a cultura de moda (Kawamura, 2005). Trata-se de uma indstria paradoxal. A Moda est relacionada tanto ao mundo da iluso quanto a uma indstria extremamente complexa, multimilionria e extremamente criticada (Waddell, 2004), que alia glamour e trabalho precrio (Abreu, 1986; Klein, 2006). Neste sentido, o trabalho imaterial do estilista se articula ao trabalho imaterial dos profissionais da mdia, da propaganda e do marketing na divulgao do produto e da cultura de moda. Moda, desta forma, implica um conceito e um fenmeno socioeconmico.

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    A moda enquanto um fenmeno social se d por meio da difuso da moda. A teoria sociolgica da difuso da moda surge com o discurso sociolgico clssico, mas, hoje, podemos falar em dois modelos sociolgicos que se aplicam ao estudo da moda: o modelo de cima para baixo e o modelo de baixo para cima. O modelo de cima para baixo (top-down model) de difuso da moda emerge dos estudos sociolgicos clssicos2. O discurso sociolgico clssico interpreta a difuso da moda por meio do conceito de imitao. Na perspectiva deste modelo, a difuso comea quando um estilo adotado por membros da classe social superior, se tornando moda, logo esta moda imitada e difundida por membros dos estratos sociais inferiores. Quando a moda atinge estes estratos ocorre a saturao e perda de valor. Ento surge outra moda (efmero) no estrato superior buscando uma nova forma de distino. A moda foi analisada pelos clssicos como smbolo e fruto da sociedade ocidental moderna, onde o sistema de estratificao social mais flexvel. A moda aparece como uma forma de distino de classe (na sociologia contempornea na anlise de Pierre Bourdieu) que institui fronteiras simblicas na sociedade legalmente democrtica e igualitria. Segundo Kawamura (2005: 78), a proposio geral implica que a difuso de idias (a crena na moda e o desejo de consumir moda) precede a sua expresso material (a compra e a satisfao deste desejo). A difuso da moda por meio do modelo de baixo para cima (bottom-up model) baseia-se no fato de que, desde a dcada de 1960, uma gama de novos estilos (aqui concebidos como subjetividades coletivas e formas de vida social) emerge de grupos de status social e econmico inferiores, sendo posteriormente adotados ou imitados por grupos de status sociais superiores. A moda da rua surge na modernidade tardia no seio de subculturas urbanas, onde nascem estilos como hippies, punk, etc (Crane, 2006: 14). Para Crane (2006: 29):

    2 Ferdinand Toennies, 1887; Herbert Spencer, 1896; Thorstein Veblen, 1899; Gabriel Tarde, 1903;

    Georg Simmel, 1904; W.G. Sumner, 1906.

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    Teoricamente, a moda acessvel s pessoas de todos os nveis sociais, tanto para a criao de estilos que expressem sua identidade, quanto para a adoo de estilos criados por empresas do ramo do vesturio.

    O modelo de baixo para cima nos mostra a importncia da difuso da moda a partir de grupos sociais de status inferiores, mostrando que o fenmeno moda no se restringe aos modos de vida e aos costumes dos grupos sociais de status superiores. Para nossa anlise, interessa o fato de que, os estilos que nascem da rua constituem matria-prima para o trabalho imaterial do estilista (ato de criao) na produo de moda, e que, atravs da magia da grife (Bourdieu, 1983) se transforma em um produto de luxo. Crane (2006: 45) afirma que, no modelo de baixo para cima, os novos estilos surgem de subculturas ou tribos urbanas, mas no apenas de estratos inferiores, mas de estratos sociais mdios como a comunidade artstica e a homossexual. Crane (2006) argumenta que o processo de difuso da moda bastante complexo nas sociedades contemporneas altamente fragmentadas, desafiando ambos os modelos. O modelo de cima para baixo foi a forma dominante de difuso da moda nas sociedades ocidentais at 1960, desde ento, o modelo de baixo para cima tem ajudado a explicar o fenmeno da moda. Concebemos que, na atualidade, o processo de difuso de moda, ocorre em um processo complexo de circulao de estilos vindos de diferentes origens. Um processo que envolve tanto o efeito de desaguamento (trickle-down), quando artistas de cinema, estrelas pop e celebridades disseminam moda, quanto o efeito borbulha (bubble-up), quando estilos nascem dos grupos sociais alternativos ou underground difundindo a moda de rua. A difuso de estilos de moda se realiza basicamente por meio de relacionamentos interpessoais - nos grupos sociais dos diversos estratos sociais - e por meio da ao articulada dos agentes da indstria da moda. A influncia da mdia tem se tornado cada vez mais importante na difuso da moda seja de cima para baixo seja de baixo para cima.

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    A reflexo sobre o trabalho imaterial do estilista concebe esta ocupao3 como uma atividade criadora e que parte de toda uma cadeia de operaes interligando design (produo de moda pesquisa, concepo e desenvolvimento do produto), manufaturamento (produo da roupa de moda), e distribuio (comercializao e divulgao). Sabemos que os limites deste artigo no permitem explorar cada uma destas operaes, mas pensamos ser til pensar o trabalho imaterial do estilista e a produo de moda em um contexto bem mais amplo.

    02. O trabalho imaterial.

    As mudanas recentes no mundo industrial e do trabalho trouxeram novas questes nos estudos do trabalho. A discusso envolve a emergncia do chamado capitalismo cognitivo (capitalismo ps-moderno ou economia informacional), centrado na valorizao de um capital dito imaterial, onde o conhecimento considerado como a fora produtiva principal (Gorz, 2005: 15). Para Gorz (idem), estas mutaes se fazem acompanhar de metamorfoses do trabalho:

    O trabalho abstrato simples, que, desde Adam Smith, era considerado como a fonte do valor, agora substitudo por trabalho complexo. O trabalho de produo material, mensurvel em unidades de produtos por unidades de tempo, substitudo por trabalho dito imaterial, ao qual os padres clssicos de medida no mais podem se aplicar.

    Estas mudanas no mundo do trabalho so quantitativas e qualitativas. Por um lado, h uma reduo quantitativa do trabalho vivo material (o operrio fabril clssico), em funo do processo de automao industrial (tendncia de reduo do trabalho vivo e aumento do trabalho morto), h tambm uma transformao setorial da fora-de-trabalho com aumento do nmero de trabalhadores ligados ao setor de servios. Por outro lado, ocorre uma alterao qualitativa desta fora

    3 Segundo a Classificao Brasileira de Ocupaes (CBO) do Ministrio do Trabalho e Emprego

    (MTE) a profisso de estilista aparece sob o cdigo 7630 Profissionais polivalentes da confeco de roupas (Ttulo 7630- 10).

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    com a emergncia de novas formas de trabalho vivo imaterial, seja no setor indstria, seja no setor de servios. Na abordagem de Gorz (2005: 19):

    O fornecimento de servios, esse trabalho imaterial, torna-se a forma hegemnica do trabalho; o trabalho material remetido periferia do processo de produo ou abertamente externalizado. Ele se torna um momento subalterno desse processo, ainda que permanea indispensvel ou mesmo dominante do ponto de vista qualitativo. O corao, o centro da criao do valor, o trabalho imaterial.

    Antunes (1999: 120) ressalta que, apesar da necessidade imperiosa dO Capital reduzir a sua dimenso varivel e conseqentemente expandir sua parte constante, no implica que O Capital possa continuar se reproduzindo sem o trabalho vivo. Lazzarato & Negri (2001: 29) afirmam que: O capital ele mesmo a contradio em processo, pelo fato de que tende a reduzir o tempo de trabalho, enquanto do outro lado pe o tempo de trabalho como nica medida e fonte da riqueza. Mas como o Capital depende do trabalho para se reproduzir, ele passa a depender tanto do trabalho material quanto do trabalho imaterial. Para Antunes (1999: 125), a crescente imbricao entre trabalho material e imaterial constitui uma tendncia no mundo contemporneo com a expanso do trabalho dotado de maior dimenso intelectual. Esta expanso engloba a informatizao das atividades industriais, a expanso do setor de servios e a crescente importncia de atividades profissionais ligadas aos setores de comunicao, propaganda e marketing, design, pesquisa cientifica e criao de softwares, entre outros. H, desta forma, para este autor, um alargamento das atividades denominadas imateriais (p. 127). Na perspectiva de Antunes (1999: 129), o trabalho imaterial exemplifica o processo contemporneo de alargamento, ampliao e complexificao do trabalho. Partilho, com este autor, a preocupao em pensar, seja a imbricao crescente entre trabalho material e trabalho imaterial, seja a subordinao das

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    formas de trabalho (material e imaterial) lgica da produo de mercadorias e de capital. No livro Imprio, Hardt & Negri (2004, p. 48) falam do trabalho de um grupo de autores marxistas italianos contemporneos que usam o termo trabalho imaterial em suas anlises que partem de dois projetos de pesquisa coordenados. O primeiro projeto consiste na anlise das recentes transformaes do trabalho produtivo e sua tendncia a se tornar, cada vez mais, imaterial. Para estes autores: O papel central previamente ocupado pela fora de trabalho de operrios de fbrica na produo da mais-valia est sendo hoje preenchido, cada vez mais, por fora de trabalho intelectual, imaterial e comunicativa. O segundo projeto de pesquisa desenvolvido por esta escola consiste na anlise da dimenso imediatamente social e comunicativa do trabalho ativo na sociedade capitalista contempornea, que com isto prope o problema das novas configuraes de subjetividade, em seu potencial de explorao e de revoluo.4 Seria no setor de servios da economia onde haveria um modelo mais rico de comunicao produtiva por se basear na permuta contnua de informaes e conhecimentos, assim, os autores argumentam que: Como a produo de servios no resulta em bem material durvel, definimos o trabalho envolvido nessa produo como trabalho imaterial ou seja, trabalho que produz um bem imaterial, como servio, produto cultural, conhecimento ou comunicao (idem, p.311). A ampliao das formas de trabalho imaterial tem papel importante para o vigente sistema produtor de mercadorias, este sistema passa a depender de forma crescente do trabalho imaterial. Segundo Lazzarato & Negri (2001: 45) o trabalho

    4 Na seo 3.4 (Sociologia do Trabalho Imaterial), Hardt & Negri (2004: 310/15) afirmam que A

    transio para uma economia informacional envolve, necessariamente, uma mudana na qualidade e natureza do trabalho.4 Ao final da seo 3.4 (idem), os autores resumem suas anlises e distinguem trs tipos de trabalho imaterial que impulsionam o setor de servios na economia informacional: 1- Trabalho imaterial envolvido na produo industrial que foi informatizada, ou seja, incorporou tecnologias da informao de um modo que transforma o prprio processo de produo. A prpria atividade fabril vista como servio; 2- Trabalho imaterial de tarefas analticas e simblicas (manipulao inteligente e criativa, de um lado, e, trabalhos simblicos de rotina, de outro); 3-Trabalho imaterial que envolve a produo e manipulao de afetos e requer contato humano (virtual ou real).

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    imaterial tem a funo de ativar e organizar a relao entre a produo e o consumo. Hardt & Negri (2004: 314) ressaltam que: O trabalho imaterial envolve de imediato a interao e a cooperao social. Para estes autores evidente a importncia do trabalho imaterial - intelectual, cognitivo, criativo e comunicativo - dentro das metamorfoses econmicas, sociais e laborais contemporneas. O trabalho imaterial se torna o centro da criao do valor (Gorz, 2003) e adquiri papel central para o sistema produtor de mercadorias. Argumentamos a pertinncia da centralidade da categoria trabalho (seja ele material ou imaterial) enquanto trao especifico da espcie humana e um denominador comum e uma condio de toda vida humana em sociedade (Friedman, 1962: 19). Este artigo analisar o trabalho imaterial do estilista de moda enquanto uma ocupao articulada a outras formas de trabalho imateriais e materiais, a partir de sua insero no processo de produo de moda em conexo com o processo de produo de roupa. Esta investigao oferece subsdios para pensar a particularidade do trabalho imaterial do estilista e do produto de moda, a criao de valor na indstria da moda, e, por fim, como esse valor apropriado enquanto produto de toda uma gama de atividades econmicas que forma a cadeia de valor do produto de moda. Dar-se- nfase ao trabalho imaterial do estilista inserido na cadeia do produto sem perder de vista a imensa gama de trabalhos materiais e imateriais interconectados nas diversas etapas: design, manufaturamento, comercializao e consumo.

    03. O trabalho imaterial do estilista: o estilista, a produo e o sistema de organizaes da indstria da moda.

    O trabalho do estilista um objeto de anlise interessante para se pensar, no apenas a atividade imaterial o criador, seu processo de criao e sua insero em um meio social mas tambm, a forma como o trabalho de criao se

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    materializa na roupa (com estilo). Isto implica refletir sobre a relao da produo de moda com a produo do vesturio. Iremos refletir primeiro sobre o trabalho imaterial do estilista enquanto uma ocupao ou uma forma de trabalho, sua legitimidade social e sua origem. A ocupao estilista de moda (couturier ou fashion designer) uma figura tipicamente moderna que emerge na sociedade ocidental na segunda metade do sculo 19. O ingls Charles Frederick Worth (1826-1895), por ironia no era francs, inaugurou o seu primeiro salo de moda Worth & Bobergh em 1857, na rue de la Paix, em Paris, junto com o comerciante de sedas sueco, Otto Gustav Bobergh (Lehnert, 2001: 8). Worth eleva a posio de costureiro para o status de criador de moda (estilista-artista) transformando a maison Worth em uma verdadeira instituio, dado a sua capacidade de conjugar o negcio de moda com a sua qualidade de artista. Aps Worth, o costureiro (construtor de roupa) adquire status de artista (criador de moda). O surgimento do criador de alta costura, da qual Worth pioneiro, insere-se no processo de institucionalizao da moda com o surgimento de suas organizaes. Segundo Lipovetsky (1989: 71):

    (...) a verdadeira originalidade de Worth, de quem a moda atual continua herdeira, reside em que, pela primeira vez, modelos inditos, preparados com antecedncia e mudados freqentemente, so apresentados em sales luxuosos aos clientes e executados aps escolha, em suas medidas.

    Mas o que faz um estilista de moda? A resposta mais simples seria que ele desenha roupas (sempre com estilo), uma espcie de artista das roupas. Mas a ocupao de estilista no pode ser confundida com a de ilustrador de moda. Segundo Kawamura (2005), Paul Poiret (1879-1944) tinha um ilustrador de moda que esboava seus desenhos, Poiret fazia o drapeado e tinha habilidade e conhecimento sobre a construo de uma pea de roupa. Quais seriam os conhecimentos e habilidades que estariam sendo demandados na realizao do trabalho de estilista? Seria um conjunto de

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    habilidades. Em primeiro lugar viriam as habilidades bsicas de desenho, o conhecimento tcnico da construo da roupa, a familiaridade com os insumos da produo da roupa (tecidos e aviamentos), enfim, saberes sobre o lado tcnico da confeco do vesturio. Em segundo lugar, um gosto esttico capaz de projetar produtos atraentes, a capacidade de unir a beleza e a praticidade atravs da harmonia de cores e da combinao perfeita de materiais. Contudo, para Kawamura (2005), hoje, o foco est na capacidade do estilista produzir e reproduzir uma imagem glamourosa e atrativa para os consumidores. O criador de estilo (para ser mais preciso) necessita da tcnica e da esttica, da capacidade de criar e inovar na produo de moda, e, por fim, da capacidade de construir e de sustentar a sua imagem pessoal e a de sua marca. O estilista de moda moderno reivindica para si o status social de artista. Aps Worth, da tradio do arteso construtor de roupas (costureiro - alfaiate) surge o artista criador de um estilo que expressa um conceito e que se projeta como uma imagem. O estilista uma figura central na produo de moda devido a esta capacidade de criao. Ele um ator fundamental dentro do conjunto de atores e de organizaes que envolvem o sistema de moda. Mas ele parte da produo de moda que coletiva. Aqui interessa-nos pensar essa capacidade particular de criar. Descartamos conceber o estilista como um gnio. Iremos pensar a insero do estilista no meio social porque concebemos a criatividade como socialmente construda. O estilista um ator social, ele tem uma experincia de vida e isto tem implicaes no ato de criao. Bourdieu (1983) chama a ateno para a necessidade de refletir sobre os determinismos sociais que deixam sua marca na obra de arte. Estes determinismos sociais estariam presentes, por um lado, na trajetria de vida que forma o habitus do produtor de estilo, ou seja, o estilista enquanto sujeito social que passa por um processo de socializao ao longo de sua experincia de vida, na famlia, na classe social, na escola, nos grupos scio-culturais, na empresa e no mercado. Por outro lado, atravs das demandas e das

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    coeres sociais inscritas na posio que ele ocupa num certo campo (mais ou menos autnomo) de produo. Para Bourdieu (1983: 164):

    O que se chama criao o encontro entre um habitus socialmente constitudo e uma certa posio j instituda ou possvel na diviso do trabalho de produo cultural (e, alm disso, em segundo lugar, na diviso do trabalho de dominao). O trabalho atravs do qual o artista faz sua obra e, inseparavelmente, se faz como artista (e, quando isto faz parte da demanda do campo, como artista original, singular), pode ser descrito como a relao dialtica entre sua funo que, freqentemente, pr-existe e sobrevive a ele (com obrigaes, por exemplo, a vida de artista, os atributos, as tradies, os modos de expresso, etc.) e seu habitus que o predispe de forma mais ou menos completa para ocupar esta funo ou o que pode ser um dos pr-requisitos inscritos na funo para transform-lo mais ou menos profundamente.

    O estilista precisa ser rotulado como artista para ser legitimado como criador de moda. Para Kawamura (2005) a qualidade artstica do estilista no natural, mas socialmente construda. Bourdieu (1983) mostra o ato de criao como encontro entre o habitus (sistema de disposies duradouras e transponveis) do criador e a sua posio no campo da produo de moda. O habitus do estilista funciona enquanto mediador entre os condicionamentos sociais, presentes na sua experincia, e a sua prtica social. Neste sentido, o estilista exterioriza aquilo que ele interiorizou, seja na sua trajetria de vida, seja na sua prtica cotidiana de trabalho e de vida. No ato de criao o habitus funciona como princpio gerador de novos estilos e de novos produtos. Lazzarato & Negri (2001: 46) analisando o ciclo da produo imaterial, afirmam que a matria-prima do trabalho imaterial a sua subjetividade e o ambiente ideolgico no qual esta subjetividade vive e reproduz. Nesta perspectiva, o trabalho de criao do estilista se desenvolve a partir de seu habitus no encontro com as demandas e coeres de sua posio no campo,

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    assim como, envolve uma apropriao criativa das subjetividades coletivas e das formas de vida. O estilista produz conceitos e estilos a partir de uma leitura particular das diversas formas de vida e das subjetividades coletivas, passadas e presentes. Nas sociedades contemporneas, a emergncia de diversos estilos nas subculturas urbanas se tornou fonte de criao para inmeros estilistas, alimentando o processo de inovao. Para Lazzarato & Negri (2001): O trabalho imaterial se constitui em formas imediatamente coletivas e no existe, por assim dizer, seno sob a forma de rede e de fluxo (p.50), os elementos criativos, de inovao, so estritamente ligados aos valores que somente as formas de vida produzem (p. 52).

    As demandas e as coeres sociais que surgem da posio ocupada pelo estilista no campo da produo de moda a complexa indstria da moda - nos levam a refletir sobre a sua relao com a produo de moda e com o sistema de organizaes que compe o mundo da moda. O estilista figura central, mas interligado a outros profissionais na produo coletiva da moda.

    O trabalho imaterial do estilista produz valor, enquanto um processo de criao que se apropria e re-inventa formas de vida e subjetividades coletivas, se tornando processo de valorizao.5 A atividade criativa no se alimenta apenas do tempo de trabalho no ateli, mas do seu tempo de lazer ou da sua vida social em geral. O depoimento do estilista carioca Napoleo Fonyat (marca Sandpiper) ilustra bem a questo do tempo de trabalho do estilista (Disitzer & Vieira, 2006: 63):

    Como estilista, eu tento estar em todas as praias e preciso lidar com pessoas que entendam essa necessidade. Ento, no d para trabalhar comigo uma pessoa que

    5 Para Lazzarato & Negri (2004): O processo de comunicao social (e o seu contedo principal: a

    produo de subjetividade) torna-se aqui diretamente produtivo porque em um certo modo ele produz a produo. Percebendo (...) a produo da subjetividade como contedo da valorizao (p.47).

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    no entenda de msica, que no v praia, que no freqente cinema, que no v a livrarias, que no seja um cuidadoso observador social. Tem que ir a tudo e tem que ser estudioso, porque informao sem conexo no funciona.

    Esse depoimento ajuda a refletir: primeiro, sobre o tempo de trabalho do estilista, que vai alm das horas convencionais de trabalho no ateli, envolve os circuitos scio-culturais deste campo de produo cultural; segundo, sobre a importncia da observao social enquanto contato com as formas de vida e as subjetividades coletivas que constituem a matria-prima do trabalho imaterial do estilista. nesse sentido que a produo de estilo a partir desta matria-prima se torna produtiva e geradora de valor. A produo de moda resultado da ao articulada de seus agentes: primeiro, os estilistas; segundo, os profissionais da mdia, da propaganda e do marketing (editores e jornalistas de moda, profissionais de marketing e de propaganda); e, terceiro, os consultores de moda (profissionais que fazem previso tecnolgica e mercadolgica nos fashion bureaus). Estes agentes esto articulados no processo de produo e de disseminao do produto e da cultura de moda. Para Bourdieu (1983: 161): O que faz o valor, o que faz a magia da grife, o conluio de todos os agentes do sistema de produo de bens sagrados. A anlise do trabalho do estilista e da produo de moda deve levar em considerao o fato de que, o sistema de moda tem adquirido uma nova configurao, quando um nico gnero de moda, a alta costura, deu lugar a trs categorias de estilo: primeiro, a moda luxo (alta costura e prt--porter luxo); segundo, a moda industrial (prt--porter e produo industrial); e, terceiro, a moda que emerge da rua (Crane, 2006). Para Crane (2006), o sistema de moda se torna mais descentralizado (com os plos de moda6 globais: Paris, Londres, Nova Iorque, Milo e Tkio) e mais complexo (maior nmero de agentes e de organizaes). Paris a capital simblica da moda e o sistema de moda francs o grande centro da moda

    6 A cidade de So Paulo tem adquirido importncia crescente no mercado de moda na Amrica

    Latina, o que a tornaria um importante plo de moda global com destaque no cenrio econmico latino-americano (ver a matria: Moda brasileira define identidade no Jornal Gazeta Mercantil [Empresas & Carreiras], 31/12/2001).

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    mundial. A posio hierrquica dos estilistas depende de sua atuao nas diversas categorias de estilo e de sua integrao no sistema de moda. A hierarquia envolve desde a alta costura at a confeco industrial, passando pela revoluo do prt--porter que altera a produo de moda, ao se colocar a meio caminho entre o luxo da alta costura e o bsico da indstria de confeco. No topo da hierarquia, os estilistas reivindicam para si o status de criador (artista ou artista-arteso) com maior nfase em produtos de moda onde os valores estticos so mais importantes do que a sua praticidade. Na base da hierarquia, apesar dos estilistas buscarem incorporar valores estticos nas peas do vesturio, estes precisam ser prticos e funcionais.7 Apesar da produo de moda remeter ao efmero, a ocupao de estilista se torna possvel com a institucionalizao, a sistematizao e a regulao da produo e da divulgao do produto de moda que se desenvolve na Frana desde Worth. Como diversos autores afirmam (Kawamura, 2005; Waddell, 2004), a indstria da moda no produz apenas o produto de moda, mas trabalha para sustentar a crena das pessoas na moda. A indstria da moda envolve toda uma rede de relacionamentos individuais e organizacionais. O produto da indstria da moda no se reduz a um item do vesturio (roupa e acessrios) por incorporar valores estticos e simblicos. Enquanto a moda um produto simblico e intangvel, a roupa um produto concreto e tangvel. Se o consumo do vesturio ocorresse apenas pela

    7 Os estilistas podem atuar profissionalmente em diversas posies no campo da produo de

    moda. Primeiro - na produo de moda luxo (sob medida e prt--porter luxo): (i) na equipe de criao de uma casa de alta costura em um ateli parisiense, que pode ser propriedade de um conglomerado econmico importante (por exemplo, Louis Vuitton Mot Henessy [LVMH]), ou, (ii) em um ateli em qualquer outro plo de moda, onde as possibilidades do estilista ser o dono do ateli so bem maiores. Segundo - na produo de moda industrial (prt--porter): (i) em um departamento de criao de uma empresa de design que presta consultoria, seja para empresa produtora de vesturio em escala industrial, seja para empresa varejista que subcontrata a sua produo de roupa; (ii) na equipe de criao de moda em uma empresa de porte mdio e pequeno que pode produzir ou subcontratar (parte ou o todo) da produo de roupa; (iii) em um departamento de criao de uma empresa varejista que subcontrata a produo da roupa. Enfim as possibilidades de insero profissional do estilista no mercado de moda global so bastante diversificadas.

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    necessidade bsica8 (valor utilitrio, como, por exemplo, se proteger do frio ou do calor), a produo de confeccionados cairia drasticamente. O consumo de moda envolve a produo do desejo de moda que alimenta a produo da roupa de moda. Kawamura (2004: 37) mostra a rede institucional no moderno sistema de moda francesa tendo ao centro La Fedration Franaise de La Couture, du Prt--porter des Couturiers et des Crateurs de Mode, que congrega as cmaras sindicais da alta costura, do prt--porter, da moda masculina e, bem recente, de profissionais de atividades conexas. Os agentes e as organizaes importantes desta rede sos os produtores do produto e da cultura de moda: os estilistas renomados e suas cmaras sindicais e os influentes profissionais da mdia e da propaganda.9 Estes agentes se articulam, seja na criao de uma ideologia de moda (o efmero e o desejo do novo) seja na determinao (julgamento) de quais itens podem ser considerados como sendo da moda.10 Kawamura (2005) chama os profissionais da mdia e da propaganda (em particular os editores de moda) de gatekeepers. Estes profissionais fazem julgamentos estticos, o que tanto colabora com a difuso da moda quanto legitima a insero e a manuteno do estilista no sistema. A insero do estilista no sistema de moda vital porque marca sua atividade profissional e o rotula como um criador. O estilista torna-se reconhecidamente criativo ao ser aceito e legitimado pelo sistema. O sucesso e a fama do estilista se explicam no apenas pelo seu talento e criatividade, mas pela sua posio na estrutura do sistema e a forma como consegue obter o status oficial de criador de moda.

    8 Segundo Jones (2005: 24), Tericos da cultura e estudiosos da vestimenta fixaram o foco em

    quatro funes prticas das roupas: utilidade, decncia, indecncia (isto , atrao sexual) e ornamentao. Em seu livro Consumer Behaviour Towards Dress [Comportamento do consumidor em relao s roupas, 1979] Georges Sproles aponta quatro funes adicionais: diferenciao simblica, filiao social, auto-aprimoramento psicolgico e modernismo. 9 Tambm faz parte da rede a Associao Nacional para o Desenvolvimento das Artes e da Moda

    ligada ao Ministrio da Cultura francs. 10

    As entidades reguladoras em outros plos de moda so: no Reino Unido The British fashion Council, quepromove o London Design Collections e a London Fashion Week, em parceria com a indstria; nos Estados Unidos The Council of Fashion Designers of Amrica; e, na Itlia Camera Nazionale della Moda Italiana (Jones, 2005).

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    04. A relao entre a produo de moda e a produo de roupa.

    A moda um produto imaterial e a roupa um produto material, esta distino analtica importante. Mas no podemos negar o fato de que a roupa se transmuta em moda, assim como a moda constitui um produto simblico manufaturado. A reflexo sobre a interdependncia entre a produo de moda e a produo de roupa se d a partir de duas concepes: primeiro, a roupa se transmuta em moda por meio da magia da grife (Bourdieu, 1983 e 2004); segundo, a roupa constitui a matria-prima onde a moda formada (Brenninkmeyer, 1963: 6 apud Kawamura, 2005: 1). Como um item do vesturio pode se tornar algo de alto valor? Uma pea de roupa que atende a uma necessidade bsica no se transforma automaticamente em uma pea fashion antes de passar pela transmutao que a magia da grife produz. Para Bourdieu (1983: 171) a magia da grife um produto do sistema de moda. Bourdieu (1983) fala do poder de transmutao e de criao de valor que a magia da grife produz no item do vesturio.

    Sabemos que a magia da grife pode multiplicar extraordinariamente o valor de qualquer objeto onde aplicada, um perfume, sapatos, at mesmo, e um exemplo real, um bid. Trata-se, neste caso, de um ato mgico, alqumico, pois a natureza e o valor social do objeto so modificados sem que nada tenha alterado sua natureza fsica ou qumica (estou pensando nos perfumes) dos objetos em questo.

    A moda enquanto um produto simblico manufaturado nos leva a refletir sobre a produo da roupa (de moda), seja produzida para o mercado de luxo (alta costura e prt--porter luxo) seja ela produzida para o mercado de moda industrial (prt--porter e produo em massa). A produo de roupa na categoria moda luxo ocorre nos plos de moda globais (Paris, Nova York, Londres, Milo e Tquio), e em outros plos (Rio de

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    Janeiro e So Paulo, por exemplo). A produo da alta-costura e do prt--porter luxo, em geral, feita por equipe de alta qualificao nos atelis. A produo de moda luxo no se reduz a uma produo sob medida, mas envolve, basicamente, a criao original, o uso de materiais sofisticados e a manufatura altamente especializada. Segundo Crane (2006: 287), o custo para ingressar na indstria da moda no segmento luxo, intensificou-se, em parte, devido globalizao: no final da dcada de 1980, a quantia necessria para estabelecer um negcio de alta-costura em Paris podia ser bancada apenas por um conglomerado. Tanto os jovens estilistas quanto os demais profissionais das maisons tendem a serem empregados de grandes empresas, em geral propriedade de algum conglomerado de bens de luxo. Desde a dcada de 1970 as grandes casas parisienses se sustentam principalmente por meio dos royalties obtidos pelo sistema de licenciamento de uma diversidade de produtos (perfumes, cosmticos e acessrios). A alta costura deixa de ser o principal produto comercializvel das maisons. A clientela da alta costura se tornou reduzida e a clientela do prt--porter luxo expandiu-se.11 Surge uma nova fase da Alta Costura metamorfoseada em vitrine publicitria de puro prestgio (Lipovetsky, 1989: 109). Estas mudanas trazem implicaes importantes, tanto para o estilista quanto para o pessoal empregado nos atelis. Em relao aos estilistas surge, primeiro, a dificuldade financeira de o jovem estilista abrir uma maison em Paris, ou em qualquer outro plo de moda global, devido intensificao da concorrncia e ao poder dos conglomerados, levando-o a ser empregado de uma corporao; segundo, a dificuldade que os estilistas consagrados experimentam de conciliar a administrao do seu negcio e a superviso da criao de estilos. As mudanas nos negcios de moda luxo provocam uma reduo do pessoal empregado nos atelis. Dados apresentados por Lipovetsky (1989: 108) ilustram essa tendncia no final do sculo XX:

    11 Segundo Palomino (2003: 26): Estima-se que o nmero de compradores de alta-costura no

    mundo hoje no ultrapasse 500 (para termos uma idia do declnio, em 1980 eram 2 mil).

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    O pessoal empregado traduz essa irreversvel evoluo: nos anos 1920, Patou empregava 1300 pessoas em seu ateli; Chanel, antes da guerra, empregava 2500; Dior, 1200 na metade dos anos 1950. Hoje as vinte e uma casas classificadas como Costura-Criao no empregavam, em seus atelis de sob medida, mais do que umas 2 mil operrias e no vestem, nesse filo, mais do que 3 mil mulheres no mundo.

    O caso do estilista carioca Carlos Tufvesson ilustra nossa reflexo sobre a produo de moda luxo e como ela se materializa na roupa. O estilista desenvolve um trabalho chamado de livre inspirao em alta costura uma espcie de costura brasileira do luxo (Disitzer & Vieira, 2006: 45). Como o prprio termo haute-couture se tornou uma marca registrada da cmara sindical da alta costura francesa, se convencionou chamar de moda luxo a atividade inspirada na alta costura.

    Nesse sentido, Carlos Tufvesson desenvolve uma moda diferenciada, exclusiva, luxuosa, quase inteiramente feita mo e produzida em pequenas quantidades. Tufvesson, como estilista de moda luxo, valoriza o glamour e a elegncia e procura associar sua imagem ao mundo das artes. Segundo Disitzer & Vieira (2006: 46): A primeira coleo com o nome do estilista foi lanada no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro em outubro de 1999. Tufvesson desenvolve trs linhas principais: ateli (sob medida); prt--porter luxo (acabamento artesanal) e jeans chic. Ambas a linhas seguindo os parmetros do luxo. No segmento de prt--porter luxo a sua produo total gira em torno de 900 peas (idem, p.49). Disitzer & Vieira (2006: 48) apresentam dados importantes sobre como ocorre o processo de trabalho no interior do ateli:

    Feito o desenho da roupa, o estilista o encaminha para modelagem, depois para o corte e, em seguida, para a montagem (...). A equipe do ateli composta de 48 pessoas. A maioria delas est na linha de produo. So costureiras, acabadeiras, modelistas e bordadeiras. Tudo feito internamente (...) Tudo feito aqui, explica o estilista.

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    A produo da roupa com estilo ou da roupa de moda no mbito da moda industrial ou do prt--porter parte de um processo que Lipovetsky (1989) chama de democratizao da moda, de moda industrial de massa, de estetizao da moda industrial e de dessacralizao da moda. No espao deste artigo no podemos discutir profundamente a revoluo que o prt--porter empreende no mundo da moda, redefinindo tanto a alta costura quanto a confeco industrial. Para Lipovetsky (1989: 113) a oposio criao original de luxo x reproduo industrial de massa j no comanda o funcionamento do novo sistema. Para o autor, surgem colees de vanguarda entre os grandes criadores do prt--porter e a moda industrial no pode mais ser assimilada cpia vulgar e desagradada dos prottipos mais cotados (idem). A reflexo sobre o elo entre a produo de moda e a produo de roupa nos conduz a toda uma rede de relacionamentos econmicos entre as empresas da indstria da moda e as empresas da indstria do vesturio. Esta reflexo se d a partir do caso particular da moda industrial, devido ao fato de que, no caso da moda luxo a roupa tende a ser produzida dentro do prprio ateli. Na abordagem da cadeia de valor do produto, devemos considerar toda a gama de atividades econmicas e de trabalho (imateriais e materiais) interligadas, que adicionam valor sucessivamente, e que so necessrias pra trazer o produto, desde a concepo, at o consumidor final. No caso da moda industrial, esta cadeia de relacionamentos tende a ser global por meio das formas de subcontratao internacional. As etapas de criao, produo, comercializao e consumo se fragmentam em empresas interligadas em diferentes paises e continentes. Como Gorz (2003: 19) afirma: o trabalho material remetido periferia do processo de produo ou abertamente externalizado. As empresas lderes do setor do vesturio dos paises avanados tendem a se desvencilhar dos produtos massificados e se concentrar na produo de itens do vesturio sensveis ao fator moda. As empresas lderes do vesturio global passam a enfocar as atividades de design, de marketing e de gerenciamento da marca, deixando a produo material

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    da roupa para empresas subcontratadas nos pases em desenvolvimento (Leste e Sudoeste da sia, Mxico e Bacia do Caribe, principalmente). A indstria de confeco tem sido caracterizada pela produo global e por redes de comrcio desde pelo menos a segunda metade do sculo 20. Para Gereffi (2005), que investigou as conexes interfirmas na indstria do vesturio global, as empresas lderes nesta cadeia dirigida pelo comprador so de trs tipos: (1) os varejistas este grupo composto pelas grandes cadeias de distribuio ou redes de desconto (Wal-Mart, por exemplo), pelas lojas de departamento (J.C. Penney, por exemplo), e pelos varejistas especializados (GAP, por exemplo); (2) os intermedirios ou negociantes estratgicos este grupo composto por empresas de moda que controlam as maiores marcas da indstria do vesturio, se concentram nas atividades de design e marketing, mas no tem fbricas (Tommy Hilfiger, Ralph Lauren e Nike, por exemplo); (3) e os fabricantes com marca prpria que subcontratam parte da produo da roupa (Wrangler, por exemplo). Todas estas empresas lderes podem ser agrupadas em apenas duas: as empresas que controlam as grandes cadeias de varejo (marcas populares) e as empresas que dominam as grifes (marcas de luxo). Segundo Gereffi (2005), todas as empresas lderes utilizam redes de subcontratao global. Gereffi (2005) apresenta a diviso internacional do trabalho na cadeia de valor de confeco onde empresas de paises diferentes (EUA/sia) formam uma hierarquia de produo: as norte-americanas produzem o design e o marketing de moda e geram grandes pedidos, as japonesas fornecem as mquinas de costura, as de paises do leste asitico fornecem o tecido, e as empresas das economias asiticas de salrio mais baixo costuram a roupa. As redes de subcontratao internacionais incluem centenas de fbricas em vrias regies do mundo. Como a produo de confeccionados ainda uma atividade quase ou relativamente intensiva em trabalho, a fabricao tipicamente realizada em paises onde o custo da mo-de-obra muito baixo. O filme-documentrio The Corporation12 apresenta alguns casos tpicos, um deles aborda

    12 The Corporation Um filme de Mark Achbar, Jennifer Abbott & Joel Bakan. Dirigido por Achbar e

    Abbot, escrito por Joel Bakan. 144 min. Big Picture Media Corporation. O documentrio foi baseado no livro The Corporation: the pathological Pursuit of Profit and Power de Joel Bakan.

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    o caso dos trabalhadores da indstria do vesturio em regies da Bacia do Caribe, onde as empresas produtoras so subcontratadas de empresas detentoras de grife. No documentrio, o funcionrio do National Labor Committee (setor do vesturio) da Cidade de Nova York mostrava uma camisa comprada pelo preo de US$ 14,99 enquanto quem fez ganhou US$ 0,03 por pea, em seguida o funcionrio mostrou uma jaqueta da grife norte-americana Liz Claiborne (prt--porter) que foi adquirida por US$ 178,00 enquanto que as costureiras de El Salvador ganhavam US$ 0,74 por pea. Os grandes varejistas e os negociantes estratgicos detentores de marcas famosas tendem a depender das redes globais que fornecem o pacote completo13, estabelecendo conexes com fornecedores da sia. Enquanto que os fabricantes com marcas prprias tendem a criar redes de produo regionais com foco na montagem14. As redes de produo regionais fornecedoras de confeccionados configuram trs conexes principais: (1) EUA com suas redes de fornecimento localizadas predominantemente no Mxico, Amrica Central e Caribe; (2) Europa com seus principais fornecedores regionais localizados no norte da frica e na Europa oriental; (3) sia, com os fabricantes das economias de mo-de-obra mais cara (como Hong Kong) subcontratando produtores de economias onde a mo-de-obra mais barata (China e outras) (Gereffi & Memedovic, 2003). Enquanto desverticaliza a produo utilizando a subcontratao internacional (redes globais ou regionais), as firmas lderes da indstria do vesturio fortalecem suas atividades nos segmentos de maior valor agregado (design e marketing). Segundo Gereffi & Memedovic (2005, p.3), ao contrrio das cadeias dirigidas pelo produtor, onde os lucros vm da escala, volume e dos avanos tecnolgicos,

    (...) nas cadeias dirigidas pelo comprador o lucro vm das combinaes de pesquisa de alto valor, projeto, vendas, marketing e servios financeiros, permitindo aos varejistas, designers e marketers agirem como negociantes estratgicos ligando

    13 A empresa contratante envia o prottipo e a ficha de referncia do item do vesturio para a

    empresa contratada, que se responsabiliza pela confeco da roupa, desde a compra dos insumos. 14

    O tecido fabricado nos EUA ser enviado j cortado para a costura no Mxico.

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    fbricas estrangeiras e comerciantes com nichos de produtos nos seus principais mercados consumidores.

    O caso do estilista carioca Napoleo Fonyat e de sua marca SANDPIPER ilustra, primeiro, a figura do estilista menos artista e mais arteso e empresrio e, segundo, a tendncia de as empresas de moda industrial se voltar para a gerncia da marca, passando a subcontratar a produo da roupa. A marca Sandpiper conhecida pelo estilo urbano, despojado e esportivo, possui 23 lojas prprias, seis franquias e duas lojas conceito (Disitzer & Vieira, 2006: 58). O depoimento deste estilista evidencia sua percepo da indstria de moda: Moda no artes plsticas, exige engenharia, tcnica, aplicabilidade (Disitzer & Vieira, 2006: 60). A relao entre a produo de moda e a produo de roupa (com estilo) flui entre a empresa detentora da marca Sandpiper e as empresas produtoras subcontratadas. Vejamos o depoimento do estilista Napoleo Fonyat:

    Eu aprovo pessoalmente todas as modelagens, tenho modelista e uma sala de pilotagem industrial, mas no produzo nada internamente (...) Da sala de pilotagem industrial, as peas saem perfeitas (...) o prottipo segue diretamente para a fbrica que vai produzi-la em srie, j com todas as indicaes necessrias (...) Disitzer & Vieira (2006: 60/61).

    A empresa Sandpiper passou a utilizar a subcontratao da produo da roupa por volta da metade da dcada de 1990 e terminou por fechar a sua fbrica.

    O grosso da produo feito na China. Muita coisa tambm confeccionada na Indonsia. No Brasil, a produo esta distribuda entre os estados de Santa Catarina, Paran, Minas Gerais, Esprito Santo e Rio de Janeiro (Disitzer & Vieira, 2006: 61).

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    05. Concluso

    O trabalho imaterial ganha importncia crescente no capitalismo contemporneo. A reflexo sobre o trabalho imaterial do estilista, em particular, entretanto, assim como as anlises sobre outras formas de trabalho imateriais, no deve ser pensada isoladamente das formas de trabalho materiais. Nesse sentido que esta investigao procurou, seja entender a origem e os significados da ocupao estilista de moda ou fashion designer , seja esta forma de trabalho inserida no campo de produo de moda e na ampla rede que compe a cadeia do produto das indstrias do vesturio e da moda. A anlise buscou articular, por meio de um caso emprico, a anlise do trabalho imaterial com a anlise do trabalho material, ambos inseridos em uma ampla rede aqui chamada de cadeia de valor ou do produto. A investigao deste caso emprico demonstra a centralidade da categoria trabalho (seja ele imaterial ou material) na criao de valor, ressaltando a importncia que o trabalho imaterial adquiri nesta criao e a tendncia das empresas de externalizar o manufaturamento. A criao de valor do produto de moda se d por meio das diversas formas de trabalho sejam elas imateriais ou materiais articuladas na cadeia do produto. Como afirmou Bourdieu (2004: 155): Toda teoria econmica da produo de bens simblicos que leva em conta apenas os custos de fabricao dos objetos considerados em sua totalidade falsa. Assim, a produo de moda cria valor, mas no cria a partir do nada. A matria-prima dos profissionais da indstria da moda, em particular os fashion designers, formada pelas subjetividades coletivas e as diversas formas de vida social na sociedade contempornea. Da a pertinncia do atual modelo sociolgico bottom-up que explica o fenmeno socioeconmico moda, a emergncia de estilos da rua. A produo de moda enquanto criao de valor se apropria das diversas formas de vida social e suas subjetividades, transmutando-as em produtos de grife para o mercado consumidor. Formando um ciclo que envolve o design (a criao

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    que se apropria de formas de vida social), a manufatura, a distribuio e o consumo.

    Mas a questo da apropriao do valor produzido ao longo da cadeia do produto permanece. O artigo procurou demonstrar que o valor produzido pelas diversas formas de trabalho (sejam elas materiais ou imateriais) tende a ser apropriado pelos conglomerados que atuam nos negcios de moda luxo (alta costura e prt--porter luxo) e pelas empresas lideres de moda industrial (prt--porter e produo em massa). O artigo mostrou - por meio da articulao entre a produo de moda e a produo da roupa - a explcita diviso internacional do trabalho neste setor, onde as empresas dos pases centrais buscam concentrar-se nas atividades estratgicas e de maior valor, deixando as atividades essencialmente manufatureiras para os pases em desenvolvimento. Esta reflexo enfatiza as diferenas e ao mesmo tempo a interdependncia entre a produo de moda e a produo de roupa, assim como mostrou as diferenas entre as funes desempenhadas pelas empresas lderes e pelas fornecedoras dos pases em desenvolvimento.

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    06. Referncias bibliogrficas.

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