para que ensinar histÓria?

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    FALSUM COMMITTIT, QUI VERUM TACET- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

    PARA QUE ENSINAR HISTRIAconsideraes imprprias em uma discusso circular1

    Por Dartagnan da Silva Zanela2

    Um livro um mudo que fala, um surdo que

    responde, um cego que guia, um morto que vive.

    (Pe. Antonio Vieira)

    - - - - - + - - - - -

    CONSIDERAES INICIAIS

    Qual o papel precpuo que um historiador deve

    desempenhar? Qual o dever primeiro deste ofcio para com

    a perene Verdade que se faz fugidia das mos humanas e que

    de ns, reles mortais, nos exige muitas das vezes uma

    dedicao reta e constante para que no nos percamos em

    possveis e humanos desatinos?

    Esta, no um pergunta simples de ser respondida

    e, por essa mesma razo, de uma reflexo salutar e

    desejvel para todos aqueles que desejam vicejar caminhos

    retos. Pergunta a qual, ir nortear nossas reflexes no

    correr destas laudas mal escritas por este indigno escriba.

    Secundariamente, nossas impuras mos, guiadas

    pelo nosso intelecto manco, iro tecer algumas

    consideraes sobre o uso de imagens caricatas no ensino de

    histria e bem como sobre a o exerccio de conscientizao1 Ensaio escrito para apresentao e discusso no Grupo de Rede organizadopela SEED do Estado do Paran.2Mestre em Cincias Sociais Aplicadas (UEPG, Ponta Grossa Pr), Especialistaem Pedagogia Escolar (IBPEX, Curitiba Pr) e Graduado em Histria (UNICENTRO,

    Guarapuava Pr). Autor de 20 livros, atualmente, professor QPM da RedePblica Estadual do Paran e das Faculdades Campo Real (Guarapuava Pr).

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    e da cidadania que tanto urge nestas terras cabralinas

    habitadas por desterrados de todos os continentes.

    Quanto a estas consideraes segundas, temos por

    modesto intento, suscitar algumas reflexes e colocar no

    centro da ciranda algumas questes que julgamos serem

    basilares para podermos realmente construir um novo olhar,

    realista e sincero sobre o ofcio de professor de Histria.

    1. HISTRIA? PRA QU?

    Esta a indagao que um educando sempre faz

    quanto inicia as aulas de histria em um ano letivo

    qualquer e, via de regra, o professor apresenta para ele

    uma resposta do gnero, para voc ser um cidado crtico

    ou, para voc explicar a realidade em que vive e por a

    vai. Ou seja: o aluno faz uma pergunta de fundamental

    importncia e os educadores, de um modo amplo e geral,

    respondem com um conjunto de expresses no significativas,

    como um reles topus (ARISTTELES; 1978).

    Ora, quando algum afirma que a histria

    fundamental para se entender a vida esquece-se que existem

    inmeras outras maneiras de se obter este tipo de

    entendimento que, em muitos casos, so to eficientes

    quanto o estudo da histria. E, o educando percebe que a

    maioria de sua vida continua sendo uma grande incgnita,

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    mesmo que um e outro fato da vida humana tenha sido

    explicado em um e outro aspecto de sua natureza e, por essa

    razo, no v a mesma relevncia na disciplina que o

    professor atribui, diga-se de passagem.

    De mais a mais, com essa inteno o professor j

    comea literalmente mentindo com ares de grande arrogncia,

    visto que, o mesmo se prope a explicar a vida e , na

    maioria dos casos, incapaz de entender a prpria e ser

    agente transformador da mesma. Grandes promessas no tornam

    algo significativo, mas sim, a sinceridade dos gestos.

    E, sendo assim, lembramos que historiadores como

    Peter BURKE sugerem que a funo da histria seria

    simplesmente organizar o cabedal informaes sobre o

    passado (1992) ou, como ensina-nos Eric HOBSBAWM, que o

    historiador deve sempre lembrar coisas que a sociedade

    insiste em esquecer (1998). Por esta vereda, ainda

    destacaramos as palavras de Gilberto FREIRE que nos

    adverte para o fato de que o ensino da histria deve ser

    livre, solto, desatado de preconceitos, o estudo dos

    tempores acti, leva-nos perto, o mais perto possvel,

    dessa eterna fugitiva, sempre a esvair-se, deixando apenas

    o perfume: a Verdade (1979). E mesmo Leopold von RANKE,

    que nos explica o importante poder mostrar o caminho

    correto e chegar a algum resultado que se sustente (1979).

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    De nossa parte, cremos que, atravs de nossa

    parca experincia junto ao magistrio desta disciplina, o

    professor de histria sempre deve ter em vista quatro

    funes que so inerentes ao seu ensino (ZANELA, 2008a).

    Primeira de que a histria deve sempre lembrar as pessoas

    que acontecimentos que no devem ser esquecidos e, em

    segundo lugar, inspir-las. Assim afirmamos, fazendo uma

    modesta analogia com a mitologia grega, quando esta nos

    conta que Zeus ao ver o homem, percebeu que ele sofria de

    uma grave falha que era o esquecimento e, por isso,

    presenteou-nos com a memria, para o primeiro caso, e com

    as musas, para o segundo (MNARD; 1991).

    Em terceiro lugar, esta, a histria, teria por

    funo propiciar momentos de reflexo sobre o sentido da

    vida (no de explic-la) e (ZANELA; 2008b), por fim, sempre

    quando possvel, nos divertir com suas laudas cmicas e

    mesmo com suas agruras (COSTA; 2003). Ora, ou vo me dizer

    que o riso pelo riso no faz parte do aprendizado da vida?

    Ou temos que ter um fundo politicamente-correto por traz

    das gargalhadas para que elas possam ter validade?

    Ingenuidade, ao nosso ver, seria a pfia e

    perigosa crena de uma pessoa estar autorizada a falar em

    nome de toda humanidade e ministrar a um mancebo o que ele

    dever pensar sobre A e sobre B. Inocncia sinistra que

    se faz transparecer nos colquios da maioria dos

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    professores desta disciplina que eles tm a misso de

    conscientizar as pessoas.

    Tamanho o grau de inconsistncia de declaraes

    desta monta que os seus autores em nenhum momento se

    flagram do grande vexame que do ao se apresentarem como

    sendo portadores deste estandarte, pois, tanto se preocupam

    em conscientizar a sociedade que se esquecem que a

    conscincia uma categoria individual e inata (ALBERTUNI;

    2006) e que, como tal, s se manifesta e se desenvolve a

    partir do prprio indivduo e no de modo sistemtico e

    massivo, a partir de uma interveno externa (CARVALHO;

    2001) de uma pessoa que, na maioria das vezes, de tanto se

    preocupar com a ordem das aes dos demais se esquece de

    avaliar e ponderar sobre as suas prprias (ZANELA; 2006).

    Por isso, no fim deste nterim, gostaramos de

    lembrar aquela clebre ponderao do historiador Marc BLOCH

    ([s/d]), que nos ensina que a histria intil, para o

    homo faber, mas que, tem a sua importncia para o homo

    sapiens. Todavia, tentar dar uma determinada utilidade para

    o saber histrico para assim melhor apetecer ao homo faber

    sem elev-lo um crime intelectual duplo: o de diminuir a

    magistra vitae e de enganar as almas incautas com uma

    pseudo-criticidade, tal qual nos vemos hoje no cenrio

    educacional brasileiro.

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    2. DA INTERVENO DO PROFESSOR

    As maneiras que um professor pode intervir em uma

    sala de aula e bem como dentro de sua Instituio de Ensino

    so as mais variadas possveis. Porm, o que fundamental

    lembrarmos que nem toda aula deve ser um show, pois, o

    professor, humano e no tem a obrigao de sempre dar a

    melhor aula de sua vida, pois, muitas das vezes, inmeras

    variveis que acabam condicionando o seu fazer pedaggico

    e, inclusive, muitas vezes a sua prpria desmotivao em um

    determinado dia.

    Como todo e qualquer indivduo, um professor tem

    os seus altos e baixos e, de mais a mais, nem mesmo os

    canais de televiso que tem toda uma parafernlia

    tecnolgica no so capazes de darem o melhor de si, quem o

    diga um professor mal remunerado e mal equipado.

    Entretanto, antes de darmos continuidade as nossas

    ponderaes, destacamos que tal situao de modo algum deve

    servir de justificativa para que no tomemos uma postura

    auto-crtica em relao a nossa prtica educacional

    (ZANELA; 2008c).

    Dito isso, voltemos ao ponto do conto que, a

    nosso ver, simples e, por isso mesmo, to desdenhado.

    Quanto se fala em realizar uma interveno o professor

    acaba ficando to preso e aficionado com os recursos que

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    ele ir utilizar para incrementar o seu trabalho ou mesmo

    para motivar os agentes envolvidos que acaba confundindo

    estes recursos com a prpria tnica da interveno.

    Ora, a natureza de uma interveno humana no se

    define pelo recurso que ela usa, mas sim o intento que a

    leva a realizar este algo. O uso de um determinado filme,

    de matrias jornalsticas da poca, de crnicas, msicas e

    mesmo de charges e nexos-murais, no definem a natureza de

    uma interveno, mas sim e unicamente a inteno desta. De

    nada adianta, em termos pedaggicos, realizarmos inmeras

    atividades com o uso de inmeros recursos se no temos

    claramente definido em nosso horizonte o que pretendemos

    com toda a parafernlia proposta.

    E, quando o fazer pedaggico acaba singrando por

    veredas como esta, via de regra, naufraga, por esquecer de

    trabalhar este elemento, que a finalidade real do gesto

    educacional e, por acabar se despreocupando do elemento

    motivador central, que o conhecimento que o professor tm

    do assunto que estar sendo ministrado, visto que, aprender

    uma jornada solitria que, em muitos casos, precisa de um

    bom guia que conhea bem as picadas e trilhas do aprender

    para bem orientar o seu aventureiro.

    Por isso, humildemente, sugeriria a todos os meus

    colegas de seara que, antes de pensarmos qualquer

    interveno diferenciada em sala de aula nos perguntarmos:

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    (i) o que pretendo com esta prtica? (ii) o que sei

    realmente sobre este assunto? Tenho realmente uma viso

    relativamente ampla sobre este tema?

    Infelizmente, o no se dedicar ao aprofundamento

    dos saberes de sua seara e das prximas algo comum em

    meio a todas as profisses e, inclusive e principalmente,

    no magistrio. Se perguntarmos a maioria dos educadores que

    se arrogam a misso de conscientizadores, quantos livros

    ele leu e coment-los, este, com certeza, passar vergonha.

    Alis, toda e qualquer proposta superficial por

    si s se auto-denuncia pela fragilidade do que est sendo

    apresentado e, muitas das vezes os educadores no se

    flagram desta situao indecorosa por preocuparem-se em

    demasia em conscientizar a todos sem antes tomar

    conscincia de si.

    Um outro bom exemplo do que estamos apontando

    fora um projeto de reciclagem apresentado por uma educadora

    em uma feira de cincia onde todo o material que fora

    utilizado pela mesma teve como destino uma fogueira nos

    fundos do colgio. Uma ao de interveno apenas para

    ingls ver onde, alis, os prprios alunos apenas decoraram

    as falas a serem ditas mecanicamente aos visitantes.

    Podemos dizer o mesmo com relao ao uso de

    iconografias em sala de aula. Podemos nos indagar das

    seguintes cenrios que podem vir a se desenhar. Os alunos

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    Este presente ensaio tinha por objetivo realizar

    uma sucinta reflexo sobre uma possvel interveno

    pedaggica diferenciada em uma sala de aula na disciplina

    de histria e sobre a relevncia desta disciplina.

    Ponderou-se tambm sobre os desvios mais

    freqentes que se d a disciplina de histria por no se

    ter claro qual a natureza especfica deste saber e por

    confundir-se o objetivo da interveno pedaggica com o

    objeto que utilizado como elemento motivador da mesma.

    Assim procedemos por crermos que um professor

    deve sempre ter em mente que uma sala de aula um espao

    de encontro entre ilustres desconhecidos e que, por essa

    mesma razo, se no temos claro o que desejamos realizar

    neste ambiente, se ns no estamos plenamente convictos e

    cientes do que pretendemos, no seremos capazes de

    convencer ningum de algo que, nem mesmo ns estamos

    seguros.

    E, por fim, se desejamos realmente propiciar ao

    nosso educando a edificao de um horizonte mais amplo para

    as janelas de sua alma, devemos demonstrar essa

    possibilidade atravs de nossa forma de olhar e em nossa

    maneira de agir e, uma mudana nesta forma do ser

    professoral, em si, seria uma herclea proposta de

    interveno.

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    OLIVEIRA, Lcia Maria Siqueira de. P ro po st a d einterveno na escola. s/ed.: 2008. Texto em formatoWord. Disponvel na Internet: http://e-escola.pr.gov.br.ZANELA, Dartagnan da Silva. Para que serve a histria? Anotaesde aula. 2008a, [s/ed.]. Documento manuscrito.

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    __________. NOTAS SOBRE O ENGAJAMENTO E CRITICIDADE. 2006.Disponvel na Internet: http://dartagnanzanela.k6.com.br.

    __________. PARA APRENDER parte XVII. 2008c. Disponvel naInternet: http://dartagnanzanela.k6.com.br.

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