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CONTEÚDOS
Prefácio :: 11
Prólogo :: 15
Capítulo 1 Made in USA :: 19
Capítulo 2 É um xotes! :: 29
Capítulo 3 Amor com amor se paga :: 41
Capítulo 4 Sozinho em casa :: 51
Capítulo 5 Um verdadeiro campeão! :: 61
Capítulo 6 O tsunami :: 71
Capítulo 7 A roda de amor :: 81
Capítulo 8 O aniversário que tínhamos planeado :: 91
Capítulo 9 Uma homenagem em Évora :: 101
Capítulo 10 É Natal, Paulinho :: 109
Capítulo 11 Gala dos Campeões 2010 :: 121
Capítulo 12 Para o melhor pai do mundo :: 131
Capítulo 13 Já não há primavera? :: 141
6
Capítulo 14 Um ano sem ti! E a chegada do Dragãozinho Azul :: 149
Capítulo 15 A irmã do Paulinho... Desistir não foi a opção! :: 159
Capítulo 16 Obrigado :: 169
Capítulo 17 Miss you buddy! :: 185
Capítulo 18 Os estranhos sinais :: 7
Poema do avô para o Paulinho :: 212
19DESISTIR NÃO É OPÇÃO! : : PAULO SOUSA COSTA
CAPÍTULO 1
Made in USA
No primeiro mês de 2003, não muito longe de Nova Ior-
que, mais precisamente em Emmaus (no estado de Pensilvânia),
no “quartel -general” da revista Men’s Health, onde eu trabalhava,
tocou o telefone do meu gabinete, no Departamento Internacional.
– Sim, quem...? – Sem que eu conseguisse acabar a frase, a
minha namorada, Catarina, apressou -se a dizer:
– Paulo, já fui à farmácia, acabei de fazer o teste e...
– E...? E...? – disparei com uma enorme ansiedade, sabendo
obviamente de que teste estávamos a falar.
– E... estou grávida!
Seguiram -se uns minutos eufóricos de uma conversa trôpega
e sem grande nexo. Nem precisava de ter, afinal, estávamos ali os
dois, unidos por uma linha telefónica a desfrutar de uma notícia
por que tanto ansiávamos, mas que simultaneamente temíamos.
Eu já tinha uma enorme vontade de ser pai, muito antes de
conhecer aquela que viria a ser a mãe do meu primeiro (e único)
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filho. Ao contrário do que normalmente se diz, não são apenas
as mulheres que têm o famigerado “relógio biológico”: os homens
também o têm e, a determinada altura, desperta em nós a von-
tade de sermos pais. Foi exatamente o que senti a partir dos 20
e poucos anos – queria muito ser pai!
Quando a Catarina e eu percebemos que iríamos passar mui-
tos anos juntos, o tema dos filhos apareceu com naturalidade. Afi-
nal, não era apenas eu quem queria muito ter um filhote...
Mas, apesar desta vontade comum, a Catarina desenvol-
veu um problema de saúde, uma doença autoimune, que nos iria
atrasar o plano da paternidade. O problema agravou -se bastante,
tendo mesmo levado ao internamento da Catarina por três vezes
e obrigando -a a cirurgias muito complicadas.
Como se toda esta azáfama hospitalar não fosse suficiente, a
medicação que estava a ser utilizada para estabilizar a doença iria
impedir a Catarina de ser mãe... e o nosso sonho ruía a passos largos!
Mas tudo se inverteu com aquela chamada telefónica: pelos
vistos, a Catarina acabaria por engravidar, pois a doença que lhe
tinha sido detetada um par de anos antes estava agora controlada.
Ainda assim pairava no ar o perigo de a doença voltar, uma vez
que a gravidez lhe iria provocar enormes alterações hormonais...
seria sempre uma gravidez de risco para a mãe e para a criança.
Tínhamos de tomar uma decisão...
E a novidade que tanto queríamos ouvir, a de que íamos ser
pais, estava longe de ser pacífica. Mas não íamos desistir. Ambos
éramos pessoas muito positivas e estávamos decididos a lutar e a
encontrar médicos que nos ajudassem e apoiassem nesse processo;
o cenário de não trazermos aquela criança ao mundo estava com-
pletamente posto de parte.
Depois de ter desligado o telefone, ainda incrédulo e simulta-
neamente exultante, lembrei -me de que estava nos EUA, longe da
21DESISTIR NÃO É OPÇÃO! : : PAULO SOUSA COSTA
minha família e dos amigos de toda a vida, a quem neste momento
me apetecia gritar a boa nova: “Vou ser PAI!”
Sozinho no meu gabinete, sem poder dar largas ao contenta-
mento, decidi contar a novidade ao meu chefe, Bill Stump, o dire-
tor internacional da Men’s Health e o único grande amigo que eu
tinha a menos de 10 mil quilómetros de distância.
Era tanta a euforia em que me encontrava naquele momento
que confesso não me lembrar bem do meu percurso até ao gabi-
nete do Bill. De voz trémula disse:
– Hey buddy, do you have a minute?! I have something really important to tell you...
E sem que Bill Stump pudesse sequer respirar para respon-
der o que quer que fosse, disparei, como quem já não aguenta as
palavras na boca nem no coração:
– Catarina is pregnant!O Bill olhou para mim com a calma que demonstrava sem-
pre que estava prestes a dar -me um conselho. Eu chamava -lhe
o meu zen master, pela forma como me aconselhava nas alturas
mais difíceis, tanto a nível profissional como pessoal. E ali estava
mais um desses momentos; era a altura de o meu zen master me
dar a sua sempre valiosa opinião, até porque ele sabia de todos os
nossos planos em relação à paternidade e simultaneamente dos
nossos constrangimentos para termos um filho, devido à doença
da Catarina.
Eis que, após a minha emocionada intervenção, o meu zen mas-ter “disparou”, ao melhor estilo sniper norte -americano:
– Paulo, no worries. We are going to find the man who did it to Catarina... – E soltou de imediato uma gargalhada.
Nem podia acreditar. Tinha acabado de dar a notícia mais
importante da minha vida à única pessoa que me podia ajudar
naquele momento, e ele largou uma piada daquelas... Era o Bill
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Stump no seu melhor, que acabara inevitavelmente por originar
também em mim uma enorme gargalhada de felicidade.
O Bill mandou -me ir para casa, ter com a Catarina para irmos
festejar o momento mais importante das nossas vidas. Não sem
antes referir, no seu estilo zen master, que tudo iria correr bem, até
porque íamos concretizar o nosso grande sonho, o de sermos pais.
Na altura, o Bill e a Dori Stump já eram pais de duas crian-
ças maravilhosas: Kelley, de sete anos, e Kevin, de quatro, fruto
de uma educação baseada tão -somente no amor sem limites. Para
mim, ele foi a grande inspiração (para além do meu pai) em ter-
mos de paternidade. A relação que o Bill tinha com os filhos e a
sua atitude para com eles era tudo o que eu sempre sonhara que
um pai deveria ser: amigo e confidente, ou seja, o melhor amigo
dos seus filhos.
A partir desse momento, tudo o que eu mais queria era vir a
ser o melhor pai do mundo para aquela criança que ainda não era
gente, mas já tinha revolucionado o nosso dia e iria mudar as nos-
sas vidas para sempre. E de que maneira...
Ao chegar a casa, fui recebido com um enorme sorriso da
futura mamã que ainda segurava na mão o resultado positivo do
teste de gravidez, com o cuidado e carinho de quem segura nos
braços uma criança recém -nascida...
Havia naturalmente o sabor agridoce de uma notícia que podia
afetar -lhe a saúde, ou até mesmo a da criança, mas a vontade de
ser mãe ultrapassava qualquer receio. Sentíamos que o amor que
já nutríamos por aquele bebé ia ser mais forte do que todas as
possíveis adversidades. Sabíamos que iria correr tudo bem. Não
havia outra alternativa exceto encarar as coisas de uma forma posi-
tiva. “Vai correr tudo bem”, não nos cansávamos de repetir um ao
outro, com o sorriso cúmplice de quem partilha o mesmo “campo
de batalha” e está disposto a dar a vida por uma causa comum.
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Antes de recebermos a notícia de que iríamos ser pais, já está-
vamos naquela época a viver um verdadeiro sonho: o autêntico
american dream, literalmente falando.
Entre o convite que o João Ferreira (vice -presidente da Motor-
press Lisboa) me fez, no final do ano de 2000, para ser diretor
da revista Men’s Health – que seria lançada em Portugal no ano
seguinte – e o convite que Bill Stump, entretanto o meu chefe
internacional, me dirigiu para fazer parte da equipa de editores
internacionais da Men’s Health USA distaram menos de três anos.
Em pouco mais de um par de anos saltava da cadeira de dire-
tor da Men’s Health de Portugal para a de editor internacional da
Rodale, editora de inúmeras revistas nos Estados Unidos, com
instalações na Terceira Avenida, em Manhattan, Nova Iorque e
em Emmaus (Pensilvânia).
Adorava o que fazia em Portugal: dirigir uma revista mas-
culina tão conceituada em todo o mundo. Ajudar a mudar a consci-
ência do homem português, tentando quebrar a barreira masculina
e bacoca de que os homens têm de ser “feios, porcos e maus”, era
um enorme desafio para mim, quer em termos profissionais quer
pessoais. Porém, o desafio de ir viver para um país como os EUA e
poder continuar lá a trabalhar na Men’s Health – ficando respon-
sável por países como Espanha, África do Sul, Rússia e, natural-
mente, Portugal, e pertencendo à equipa de editores internacionais
– era simplesmente irrecusável!
Não foi necessário refletir muito; quando dei por mim, estava
com a Catarina num voo da TAP rumo ao aeroporto internacional
John F. Kennedy, com malas, bagagens e ambição para uma nova
aventura num país que eu mal conhecia e onde a Catarina nunca
tinha estado. Lembro -me da cara dela dentro da limusina em que nos
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foram buscar, a atravessar Nova Iorque e a olhar um pouco assustada
para os arranha -céus que nos pareciam querer dar as boas -vindas.
Nas ruas, a mancha amarela provocada pelas centenas de yellow cabs passava a correr diante de nós, e uma verdadeira sinfonia de
buzinadelas ia-nos zunindo nos ouvidos. É uma melodia típica nas
ruas da Big Apple, mas simultaneamente assustadora para quem,
como nós, ali chega aos trambolhões.
Atravessámos Nova Iorque naquele dia sem falar praticamente
um com o outro. A emoção, o espanto e a saudade que começou
logo no aeroporto da Portela impediam qualquer tipo de conversa.
Os pensamentos andavam demasiado depressa para que as pala-
vras os conseguissem acompanhar.
Lembro -me do ar apreensivo da Catarina a espreitar de forma
desconfiada para os enormes edifícios que mal deixavam ver o céu.
A menina que crescera em Cantanhede, entre a subtileza natural
do campo e o perfume de uma cidade orgulhosamente pequena,
estava agora numa limusina a rasgar as ruas de Manhattan, car-
regada de incertezas.
Certeza tinha apenas uma: estávamos em Nova Iorque e não
era de férias. Dois dias depois, um novo gabinete e toda uma rotina
completamente diferente esperavam por mim.
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Agosto de 2002, Emmaus, Alentown, Pensilvânia.
Fazia um calor que até nos era familiar, mas, fora isso, nada
mais o era... Encontrávamo -nos a milhares de quilómetros de casa,
num país que não era o nosso, a falar uma língua que também não
era a nossa e a tentarmos enquadrar -nos numa cultura com a qual
claramente não nos identificávamos.
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No entanto, há uma década, era tudo mais fácil: havia mais
dinheiro, muito mais investimento e a palavra crise, que até era
comum aos nossos ouvidos (sempre o foi no dicionário luso...), não
se ouvia nos Estados Unidos. Acabávamos de chegar à terra do
Tio Sam no início do milénio das facilidades. Tudo era fast and easy! Assim como acabaria por ser a nossa adaptação.
A economia norte -americana dava sinais claros de prosperi-
dade e, no que respeita à editora para a qual eu tinha ido traba-
lhar, lançava a revista Men’s Health em dois a três países novos
por ano! Na altura, já era editada em 25 países e a tendência seria
para aumentar a penetração no mundo, daí a aposta no reforço do
departamento internacional, para o qual eu tinha sido contratado.
Estavam ainda a preparar novos lançamentos de outras revistas,
como a Prevention, e tinham já no laboratório editorial um novís-
simo projeto, prestes a aparecer no mercado feminino, chamado
Women’s Health.
Eram anos dourados, principalmente quando comparados com
os que hoje vivemos. E se havia um lugar onde era possível sentir
a bonança esse lugar era os EUA.
Em virtude do contrato assinado com a Rodale, eu vinha todos
os meses a Portugal, onde ficava dois ou três dias e depois voltava
para os EUA. A Rodale não só me pagava as despesas relativas ao
voo como ainda enviava uma limusina Lincoln Luxury Sedan para
me ir levar e buscar ao aeroporto. Ou não estivéssemos nos States…De facto, vivia num mundo quase de fantasia, com muito tra-
balho, é certo, mas com regalias que habitualmente apenas via nos
filmes... norte -americanos, claro. Sentia -me como um príncipe em
Nova Iorque! Vivíamos numa cidade onde não havia prédios e os
passeios eram forrados de relva. Os carros eram todos enormes e movidos a gasolina, naturalmente, até porque o preço do galon
era inferior ao preço do litro em Portugal, apesar de um galon
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representar quase quatro litros. Com apenas 20 dólares atestava o
“meu” enorme e americano Buick Lesabre. Em Roma sê romano...
O nosso programa de fim de semana era quase sempre o
mesmo: íamos a Nova Iorque ver uma peça na Broadway, pas-
sear no Central Park, ou visitar os inúmeros museus que lá exis-
tem, do MoMA ao MET, passando pelo Guggenheim. Ou então,
limitávamo -nos a calcorrear avenidas abaixo e avenidas acima, sem-
pre com a certeza de estarmos a viver um sonho tornado realidade.
Assistir a um jogo de futebol americano, num estádio com mais
de cem mil pessoas, ou ir ver um jogo de basquetebol dos New
York Nicks e cruzarmo -nos com Woddy Allen ou com Spike Lee
num dos elevadores do Madison Square Garden passou a estar ao
nosso alcance em troca de um simples obrigado a quem nos ofe-
recia os bilhetes VIP.
A autoestrada 78 acabou por ficar nossa amiga íntima, tan-
tas foram as vezes que fizemos o trajeto Emmaus/Nova Iorque/
Emmaus – a mesma highway que utilizávamos para assistir aos
jogos do Penn State, em State College, uma das equipas mais
emblemáticas do Futebol Americano Universitário.
Nunca esquecerei a primeira vez em que o Bill Stump me con-
vidou para assistir a um jogo em State College e combinou a hora
de partida para as seis da manhã! “Deve ser muito longe”, pen-
sei eu, mas o Bill referiu -me que ficava apenas a três horas dali.
A chegada estava prevista para as nove horas e, por isso, ainda
mais intrigado fiquei:
– Mas a que horas começa o jogo, às dez? – perguntei, admi-
rado.
– Nope – disse ele, a sorrir – at 3 p.m. – Completou a resposta.
A questão é que estes jogos universitários são uma verda-
deira festa! Começam inevitavelmente bem cedo, com os adep-
tos a chegarem aos parques de estacionamento improvisados,
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mas muito bem organizados, nos vastos relvados que circundam
o emblemático Beaver Stadium.
Depois de estacionar, é altura de dar início ao que eles deno-
minam como “Tailgate Party”: começa -se a descarregar dos car-
ros enormes quantidades de comida, cerveja e tudo o que se
possa imaginar que as mulheres tenham estado a cozinhar no
dia anterior, como os deliciosos brownies da Dori... Há até quem
leve o grelhador! Uma comemoração em grande, que em Por-
tugal se chamaria piquenique e que começa seis horas antes do
jogo! Nunca tinha bebido uma cerveja tão cedo, como aquela que
o Bill me empurrou às nove da manhã, como símbolo da minha
estreia em matéria de Tailgate Party.
– Welcome buddy! – exclamou, brindando comigo e com os
nossos outros dois companheiros de Tailgate. Brindei e sorri,
olhando à minha volta e para o parque de estacionamento que já
estava repleto de carros com os porta -bagagens abertos. A Amé-
rica no seu melhor!
Tempos de bonança e de muita felicidade, vida de príncipe
mas sempre com os pés assentes na terra. Ou melhor, em Portu-
gal... E no meio de tantas sensações agradáveis que vivemos nos
Estados Unidos, a melhor e mais importante da nossa vida foi
certamente a gravidez da Catarina. Como eu costumava dizer,
fomos dois à descoberta e voltámos três, ainda que o terceiro ele-
mento tivesse viajado sem pagar bilhete no voo de regresso da
TAP, uma vez que ainda habitava na barriga da mamã.
Dizia muitas vezes ao meu filhote, em tom de brincadeira,
que um dia lhe ia fazer uma tatuagem na nuca com a inscrição
“Made in USA”.