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Oswald de Andrade Manifesto Antropófago e outros textos Organização e coordenação editorial jorge schwartz e gênese andrade

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Page 1: Oswald de Andrade...Revista de Antropofagia, ano i, n. 1. São Paulo, maio 1928. Edição fac-similar. Caixa modernista (org. Jorge Schwartz). São Paulo/Belo Horizonte: Editora da

Oswald de Andrade

Manifesto Antropófago e outros textos

Organização e coordenação editorialjorge schwartz e gênese andrade

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Copyright © 2017 by herdeiros de Oswald de Andrade

Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, que entrou em vigor no Brasil em 2009.

Penguin and the associated logo and trade dress are registered and/or unregistered trademarks of Penguin Books Limited and/or

Penguin Group (usa) Inc. Used with permission.

Published by Companhia das Letras in association with Penguin Group (usa) Inc.

imagens das páginas 45 e 47Revista de Antropofagia, ano i, n. 1. São Paulo, maio 1928. Edição fac-similar. Caixa modernista (org. Jorge Schwartz).

São Paulo/Belo Horizonte: Editora da Universidade de São Paulo/ Imprensa Oficial do Estado de São Paulo/Editora ufmg, 2003.

pesquisa, revisão e estabelecimento do texto oswaldianoGênese Andrade

revisãoHuendel Viana

Marise Leal

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip)(Câmara Brasileira do Livro, sp, Brasil)

Andrade, Oswald de, 1890-1954.Manifesto Antropófago e outros textos / Oswald de An-

drade ; organização e coordenação editorial Jorge Schwartz e Gênese Andrade. — São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2017.

isbn 978-85-8285-049-7

1. Modernismo (Literatura) 2. Textos — Coletâneas i. Schwartz, Jorge. ii. Andrade, Gênese. iii. Título.

17-03645 cdd-869

Índice para catálogo sistemático:1. Literatura brasileira 869

[2017]Todos os direitos desta edição reservados à

editora schwarcz s.a.Rua Bandeira Paulista, 702, cj. 32

04532-002 — São Paulo — spTelefone (11) 3707-3500

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Sumário

Sobre esta edição 7

Escolas & Ideias (1922) 15Manifesto da Poesia Pau Brasil (1924) 19falação (1925) 29Antologia (1927) 35Manifesto Antropófago (1928) 43Porque como (1929) 61uma adesão que não nos interessa (1929) 65Primeiro Congresso Brasileiro de Antropofagia

(1929) 71ordem e progresso (1931) 75

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Sobre esta edição*

Os textos reunidos neste volume são exemplares da verve de Oswald de Andrade, ao se estruturarem em torno das principais marcas de sua produção: a síntese, a argúcia e o humor. Neles é possível encontrar projetos estéticos, amplo repertório, tomadas de posição, crítica social, aná-lises certeiras e amplas da história do Brasil.

“Escolas & Ideias” foi publicado no segundo número da revista Klaxon, em junho de 1922, quatro meses depois da Semana de Arte Moderna e pouco antes do fulgurante encontro de Oswald com Tarsila do Amaral. Surpreende o estilo sintético e aforismático do texto, que pode ser consi-derado um antecipador dos manifestos. Aí o autor defende a experimentação em detrimento da interpretação, mencio-na os vanguardistas europeus, inclusive Blaise Cendrars, de quem se aproximaria em 1923, e relaciona Roger Aver-maete a Pedro Álvares Cabral, considerando aquele um “descobridor sem acaso”.

* Para mais informações sobre os textos, seu contexto de pro-dução e desdobramentos, ver Jorge Schwartz, Vanguardas lati-no-americanas: Polêmicas, manifestos e textos críticos (2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Edusp, 2008), especialmente as seções “Manifestos” (pp. 165-80), “Tensões ideológicas” (pp. 557-76) e “O Homem do Povo” (pp. 298-303). (n. c.)

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8 MANIFESTO ANTROPÓFAGO E OUTROS TEXTOS

No “Manifesto da Poesia Pau Brasil”, são propostos novos princípios para a poesia: a fusão de elementos cul-tos e populares, a incorporação do cotidiano, o registro da oralidade — a abolição do “falar difícil”, “a contribui-ção milionária de todos os erros” — como “fatos estéti-cos”, com vistas a uma “poesia de exportação”. Publicado originalmente no Correio da Manhã, do Rio de Janeiro, em 18 de março de 1924, foi concebido sob o impacto da apreciação do Carnaval carioca na companhia de Tarsila do Amaral e Blaise Cendrars, e também da temporada em Paris, em 1923, quando o autor frequentou os principais vanguardistas europeus e ficou a par de toda a produção estética europeia do período.

Oswald defende uma revisão cultural do país a par-tir da valorização do elemento primitivo tão presente em nosso cotidiano, na esteira do que fizeram os cubistas eu-ropeus ao tê-lo como suporte estético-exótico. Paralela-mente ao gesto revolucionário — “Bárbaro e nosso” —, reivindica a recuperação de elementos autóctones aliados às conquistas tecnológicas do século xx — “Um misto de ‘dorme nenê que o bicho vem pegá’ e de equações”.

O texto “falação” é uma retomada dos principais pontos desse manifesto, condensando vários tópicos e sintetizando-o em mais de cinquenta por cento. O títu-lo escolhido evidencia a importância da oralidade para essa nova poesia, e o fato de que seja o texto de abertura do livro Pau Brasil, publicado em 1925, chama a atenção para a realização dos princípios que o manifesto apregoa.

Assim como o anterior, “Antologia”, de 1927, não é, a rigor, um manifesto. Sua inclusão neste volume deve-se a seu caráter único no conjunto da produção oswaldiana. Ao levar ao extremo o trocadilho como estratégia de com-posição, Oswald produz um de seus textos mais cômicos e beligerantes. Os alvos são Plínio Salgado, Cassiano Ri-cardo e Menotti Del Picchia, que começaram a publicar nesse ano textos que propõem um novo programa nacio-

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nalista e têm a anta como ícone, como demonstra o título de vários deles, “A revolução da anta”, “O significado da anta” — logo reunidos no volume O curupira e o carão, no mesmo ano de 1927. Tendo a paronomásia como ar-cabouço, Oswald ridiculariza tudo que possa se referir à anta, no texto mais mordaz, porém menos conhecido, do conjunto — publicado com o pseudônimo João Miramar, na coluna Feira das Quintas, que o autor mantinha no Jornal do Commercio, de São Paulo.

Já o “Manifesto Antropófago” não só se constitui em um dos textos mais célebres do autor, como também é o que teve, e ainda tem, maior repercussão e mais desdobra-mentos no contexto cultural brasileiro, e maior divulgação no exterior. Concebido em janeiro de 1928, impulsionado pelo quadro Abaporu, de Tarsila do Amaral, com que Os-wald foi presenteado em seu aniversário, foi publicado no primeiro número da Revista de Antropofagia, em maio do mesmo ano, acompanhado do desenho da referida obra.

Com a proposta de assimilar as qualidades do inimi-go estrangeiro para fundi-las às nacionais — “Mas não foram cruzados que vieram. Foram fugitivos de uma ci-vilização que estamos comendo, porque somos fortes e vingativos como o Jabuti” —, apresenta uma síntese dialética que procura resolver a questão da dependência cultural, por meio da transculturação. Suas fontes explí-citas são Marx, Freud, Breton, Montaigne e Rousseau, a partir das quais relê a história do Brasil, privilegiando elementos das matrizes indígena e africana, repudiando a imposição da cultura europeia e valorizando a cultura popular — “Nunca fomos catequizados. Fizemos foi Car-naval”. Suas propostas mais ousadas são o novo marco inicial dessa história, fixado como a deglutição do Bispo Sardinha, em 1554, pelos índios caetés, e a reelaboração da dúvida existencial hamletiana, “Tupi or not tupi”. Po-rém a mais citada é aquela que sintetiza o espírito oswal-diano: “A alegria é a prova dos nove”.

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10 MANIFESTO ANTROPÓFAGO E OUTROS TEXTOS

Os breves textos “Porque como”, assinado com o pseudônimo Marxillar, e “uma adesão que não nos inte-ressa”, com autoria atribuída a Poronominare, dão conti-nuidade à polêmica com o grupo da Anta. Publicados em 1929, na segunda fase — “segunda dentição”, nas pala-vras dos editores — da Revista de Antropofagia, marcada pela virulência dos textos, o primeiro, acompanhado pelo desenho Antropofagia, de Tarsila do Amaral, reivindica a retomada dos valores do clã primitivo, como forma de criticar a sociedade brasileira repressiva e classista. O segundo acusa os verde-amarelistas de um conserva-dorismo que passa pelo romantismo de José de Alencar, de serem classistas e manterem o status quo da cultura brasileira colonizada pelos valores europeus. Cabe res-saltar o significado dos pseudônimos: Marx devorado pelo aparato responsável pelo movimento da mastigação, na síntese Marxillar; o nome indígena Poronominare, que designa o deus da criação do povo baré, da Amazônia.

“Algumas teses antropofágicas” para o Primeiro Con-gresso Brasileiro de Antropofagia, atribuídas ao Clube dos Antropófagos de São Paulo, divulgadas em um dos últimos números da revista, encerram esse núcleo. Em um sintético “decálogo”, revelam princípios baseados em rei-vindicações socialistas e anarquistas, tais como: o divór-cio; a “maternidade consciente”, isto é, a legalização do aborto; a “impunidade do homicídio piedoso”, ou seja, a eutanásia; “a supressão das academias e sua substituição por laboratórios de pesquisas”. Não foram apresentadas outras teses e o evento, previsto para o final de setembro de 1929, não chegou a se realizar.

O último manifesto de autoria de Oswald de Andrade é “ordem e progresso”, publicado em 1931 no primeiro número de O Homem do Povo, periódico fundado com Pagu, sua esposa nesse momento. Trata-se de uma época de militância, quando se filia ao Partido Comunista, rene-ga seu passado burguês e boêmio, mas, mantendo o mes-

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mo humor de antes, denuncia a exploração do homem pelo homem — “com uma imensa e clara simpatia pelas reivindicações da nossa gente explorada” — e das maté-rias-primas nacionais pelos estrangeiros. Ao destacar o fato de que predominam nas exportações o café, o fumo, o açúcar e a banana, cunha a expressão “país de sobre-mesa”, que virá a ser o título de um artigo publicado em 1937, na revista Problemas. Marcada pela crítica social e por duros ataques às elites e às instituições tradicionais, o que levaria a seu fechamento, a publicação é a mais breve entre aquelas das quais Oswald participou, mas talvez a que tenha provocado maior agitação no cenário cultural e social paulista. Em suas páginas, foram defendidas al-gumas das ideias que nortearam as teses do irrealizado Congresso de Antropofagia.

Podemos afirmar que “Escolas & Ideias”, pelo que foi apontado inicialmente, traz o “Manifesto da Poesia Pau Brasil” em incubação; este, por sua vez, antecipa o ideá-rio antropofágico — quanto à valorização do elemento nacional, à recuperação do elemento primitivo no homem civilizado, à revisão dos conceitos de bárbaro e primiti-vo —, mas, enquanto o manifesto de 1924 privilegia as questões estéticas, o de 1928 ressalta as dimensões revo-lucionárias e utópicas. Une-os a opção pelo aforismo, a linguagem metafórica, o humor, a síntese e as citações nem sempre explícitas e às vezes quase cifradas.

Da mesma forma, “Antologia” antecipa a polêmica Antropofagia versus Verde-amarelismo, que tem seu auge quando os partidários da Anta publicam o “Manifesto Nhengaçu Verde-Amarelo”, em 1929. Embora estes tam-bém busquem definir a identidade nacional brasileira, recusam todo elemento estrangeiro, defendem as institui-ções conservadoras e se revelam reacionários. Nas críti-cas publicadas nas páginas da segunda fase da Revista de Antropofagia, assinadas com pseudônimo, Oswald segue a mesma linha agressiva e debochada que caracterizou o

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texto de 1927, acentuando-se o aspecto comunista e o ca-ráter libertário.

O mesmo tom e a mesma estratégia de pseudônimos usados também por outros membros da revista se esten-dem a outros textos dessa época e desembocam em rompi-mentos com grandes amigos e companheiros do modernis-mo, como Paulo Prado e Mário de Andrade — no mesmo ano de 1929, o casamento de Oswald com Tarsila do Ama-ral termina —, fatos que marcam o fim da década de 1920 e da fase áurea do movimento modernista brasileiro.

Os anos 1930 se iniciam sob o impacto do surgimento de Pagu, com quem Oswald iniciara um romance, viria a se casar e ter um filho. “ordem e progresso”, que intensi-fica as ideias lançadas em “Porque como”, marca o início de uma fase menos eufórica, mais comprometida, da qual não estão ausentes a comicidade e o sarcasmo. O lema da bandeira do Brasil que desaparecera da capa de Pau Bra-sil reaparece no título desse texto, o qual reivindica a “or-dem econômica, progresso técnico e social”, que, passados quase noventa anos, ainda não alcançamos plenamente. O círculo se fecha evidenciando a atualidade de Oswald, mas também a falta que fazem sua argúcia e humor no contexto econômico, social e político mundial — marca-do pelo aumento das desigualdades e por uma nova onda conservadora — que constitui o cenário desta publicação.

nota editorial

Para o estabelecimento de texto desta edição, foram con-sultados:

“Escolas & Ideias”. Klaxon, n. 2, São Paulo, 15 jun. 1922, p. 15.

“Manifesto da Poesia Pau Brasil”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 18 mar. 1924; Revista do Brasil,

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ano viii, vol. xxv, n. 100, São Paulo, abr. 1924, pp. 361 -3; Letras e Artes, A Manha, Rio de Janeiro, 17 fev. 1952, p. 5.

“falação”. Pau Brasil. Paris: Au Sans Pareil, 1925, pp. 18--21; Poesias Reunidas O. Andrade. São Paulo: Edições Gaveta, 1945, pp. 18-20.

“Antologia”. Jornal do Commercio, São Paulo, 24 fev. 1927, p. 3; Clima, n. 4, São Paulo, set. 1941, pp. 137-9.

“Manifesto Antropófago”. Revista de Antropofagia, ano i, n. 1, São Paulo, maio 1928, pp. 3 e 7.

“Porque como”. Revista de Antropofagia, 2. dentição, n. 6, Diário de S. Paulo, São Paulo, 24 abr. 1929, p. 10.

“uma adesão que não nos interessa”. Revista de Antro-pofagia, 2. dentição, n. 10, Diário de S. Paulo, São Paulo, 12 jun. 1929, p. 10.

“Primeiro Congresso Brasileiro de Antropofagia. Algu-mas teses antropofágicas”. Revista de Antropofagia, 2. dentição, n. 15, Diário de S. Paulo, São Paulo, 19 jul. 1929, p. 12.

“ordem e progresso”. O Homem do Povo, n. 1, São Pau-lo, 27 mar. 1931.

Foram mantidas as opções adotadas por Oswald de An-drade quanto ao não uso de destaque de palavras estran-geiras e ao uso de iniciais maiúsculas em alguns substan-tivos comuns como forma de ressaltar o tema abordado; foram respeitadas as opções do autor também quanto à ortografia (a não atualização de alguns nomes próprios e o abrasileiramento de outros) e foram corrigidos erros tipográficos evidentes.

(n. c.)

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Publicado originalmente na Klaxon, n. 2, São Paulo, 15 jun. 1922, p. 15. (n. c.)

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(NOTAS PARA UM POSSÍVEL PREFÁCIO)

Roger Avermaete em extensão. Toda arte realista, interpre-tativa, metafísica.

A única arte excelente — a que fixa a realidade em função transcendental.

O péssimo = a interpretação = Romantismo. Vejam o ruim de Shakespeare, o ruim de Balzac. Zola inteiro. José de Alencar inteiro. Coelho Neto inteiro.

O Eu instrumento não deve aparecer. Estabelecer a metafísica experimental. Tinham razão os bons natura-listas. À morte o Eu estorvo, o Eu embaraço, o Eu pêsa-mes. Mal de Maupassant e de Flaubert — unilateralida-de. Desconheceram o imperativo metafísico.

Os grandes — Cervantes, Dante, depois dos gregos que primeiro fixaram a realidade em função da eternida-de = o segredo.

Os gregos, depois dos profetas. Todos, precursores e futuristas, na mesma medida da Relação.

Derivou daí uma lei de escolha, fazendo entrar para artistas, mais gente.

Quem atingiu, atingiu. E selecionar nos enormes, nos gênios. Saber ver os que fizeram, na arte, como Aristó-teles, como Thomas de Aquino, como Kant. Sempre na medida da Relação, na medida do Segredo. “Por cima de

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mim, o estrelado céu; a lei moral dentro de mim.” Soma: Metafísica + Realidade = Luz. Licht, mehr Licht! A su-gestão dos assuntos = toda a história do mundo = toda a história do Exílio = A Divina Comédia, Fausto.

A sugestão dos poemas definitivos — O livro de Job, Prometheu, Édipo, Hamlet, A tempestade, Dom Quichot-te, Brand e Peer, As Flores do Mal.

Benditos os que reagiram contra a Interpretação — Rimbaud, Lautréamont, Apollinaire e a Corja até Cen-drars, Soffici, Ronald, Mario de Andrade, Manuel Bandei-ra, Luiz Aranha — O Homem e a Morte, Soror Dolorosa, Ribeiro Couto inédito e Serge. Antonio Ferro genial.

E Juan Gris, pelo processo, pelo round, pela raiva pro-vocada nos interpretadores de bois. Benditos, Brecheret, Malfatti, Di Cavalcanti. Avermaete, exato, descobrir. Pe-dro Álvares Cabral sem acaso.

Definir mais ensinar, berrar. Três pinturas. Não só. Três maneiras de arte. Realista, Interpretativa, Metafísi-ca. Fora a interpretação! Lei da Metafísica Experimental: Realizar o infinito.

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Manifesto da Poesia Pau Brasil

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Publicado originalmente no Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 18 mar. 1924. (n. c.)

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A Poesia existe nos fatos. Os casebres de açafrão e de ocre nos verdes da Favela, sob o azul cabralino, são fatos estéticos.

O Carnaval no Rio é o acontecimento religioso da raça. Pau Brasil. Wagner submerge ante os cordões de Bo-tafogo.

Bárbaro e nosso. A formação étnica rica. Riqueza ve-getal. O minério. A cozinha. O vatapá, o ouro e a dança.

*

Toda a história bandeirante e a história comercial do Brasil. O lado doutor, o lado citações, o lado autores co-nhecidos. Comovente. Rui Barbosa: uma cartola na Sene-gâmbia. Tudo revertendo em riqueza. A riqueza dos bailes e das frases feitas. Negras de jóquei. Odaliscas no Catum-bi. Falar difícil.

*

O lado doutor. Fatalidade do primeiro branco aportado e dominando politicamente as selvas selvagens. O bacharel.

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OSWALD DE ANDRADE22

Não podemos deixar de ser doutos. Doutores. País de do-res anônimas, de doutores anônimos. O império foi assim.

Eruditamos tudo. Esquecemos o gavião de penacho.A nunca exportação de poesia. A poesia anda oculta

nos cipós maliciosos da sabedoria. Nas lianas das sauda-des universitárias.

*

Mas houve um estouro nos aprendimentos. Os ho-mens que sabiam tudo se deformaram como borrachas sopradas. Rebentaram.

A volta à especialização. Filósofos fazendo filosofia, críticos crítica, donas de casa tratando da cozinha.

A Poesia para os poetas. Alegria dos que não sabem e descobrem.

*

Tinha havido a inversão de tudo, a invasão de tudo: o teatro de tese e a luta no palco entre morais e imorais. A tese deve ser decidida em guerra de sociólogos, de ho-mens de lei, gordos e doirados como Corpus Juris.

Ágil o teatro, filho do saltimbanco. Ágil e ilógico. Ágil o romance, nascido da invenção. Ágil a poesia.

A Poesia Pau Brasil. Ágil e cândida. Como uma criança.

*

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MANIFESTO DA POESIA PAU BRASIL 23

Uma sugestão de Blaise Cendrars: — Tendes as loco-motivas cheias, ides partir. Um negro gira a manivela do desvio rotativo em que estais. O menor descuido vos fará partir na direção oposta ao vosso destino.

*

Contra o gabinetismo, a prática culta da vida. Enge-nheiros em vez de jurisconsultos, perdidos como chineses na genealogia das ideias.

A língua sem arcaísmos, sem erudição. Natural e neo-lógica. A contribuição milionária de todos os erros. Como falamos. Como somos.

*

Não há luta na terra de vocações acadêmicas. Há só fardas. Os futuristas e os outros.

Uma única luta — a luta pelo caminho. Dividamos: Poe-sia de importação. E a Poesia Pau Brasil, de exportação.

*

Houve um fenômeno de democratização estética nas cinco partes sábias do mundo. Instituíra-se o na-turalismo. Copiar. Quadro de carneiros que não fosse lã mesmo, não prestava. A interpretação no dicionário oral das Escolas de Belas-Artes queria dizer reproduzir igualzinho… Veio a pirogravura. As meninas de todos os lares ficaram artistas. Apareceu a máquina fotográ-

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