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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

EDUCAÇÃO DIGITAL: comportamento ético e seguro nainternet

SCHROEDER, Sandra Letícia1 [email protected]

Professora Pedagoga PDE/2013

PEREIRA, Rosangela C. B.2

[email protected]ª Ms Departamento de Pedagogia

UNICENTRO

RESUMO

O presente artigo objetivou, junto aos alunos do ensino médio, desenvolver umaformação teórica e prática quanto às questões relacionadas ao comportamento ético e seguro,preparando-os para que possam, diante das constantes inovações tecnológicas, utilizar ainternet e suas interfaces com segurança, direcionadaa pela conduta ética social e leis queorientam o seu uso. Como aporte teórico recorreu-se aos autores:Chauí(1994); Enguita (2004);Moran (1998); Bouer (2013); Levy (1993); Trautamann (2002), entre outros. A modalidade depesquisa foi pesquisa-ação e aprofundamento bibliográfico. Os resultados obtidosdemonstraram a importância da educação digital como um componente curricular visandooferecer suporte teórico e formativo no que tange as ações realizadas nos contextos virtuais.

Palavras-chave: educação digital; ética; segurança; novas tecnologias.

1. INTRODUÇÃO

A presença das novas tecnologias,em especial, o uso da internet, entre

outros fatores, aparece como uma das causas dos novos comportamentos

adotados na sociedade atual.

Tal atribuição às novas tecnologias e a responsabilidade para com os

novos contextos e níveis de exigência devem-se à promoção, entre outros

feitos, da globalização que deixa de lado os limites geográficos, para a

promoção da conectividade virtual e instantânea, possibilitando diferentes

formas de comunicação como videoconferências; blog; chat, fóruns, e-mails

entre outros.

1 Professora Pedagoga PDE/2013, atua como pedagoga no Colégio Estadual Ana Vanda Bassara – EFM e Profissional e Colégio Estadual Bibiana Bitencourt em Guarapuava/Paraná.2 Professora Coordenadora PDE/2013 – Docente do Departamento de Pedagogia (DEPED) na Universidade Estadual do Centro Oeste (UNICENTRO) em Guarapuava/ Paraná.

Como conseqüência, a educação, num contexto mundial, com intuito de

atender às novas demandas da sociedade decorrentes do uso das tecnologias,

vivencia alterações comportamentais dos envolvidos no processo educativo

solicitando novos conhecimentos que dêem conta das questões relacionadas

às novas formas de conectividade.

Na conectividade virtual, como na forma presencial, são exigidos

comportamentos considerados como adequados pelos padrões estabelecidos

pela sociedade num contexto universal como: respeito, gentileza, percepção e

comunicação como também cuidados com sua segurança.

No entanto, comportamentos realizados nos ambientes virtuais

decorrente da falta de conhecimento no que se refere à ética e à segurança

digital provocam, conseqüências nem sempre conhecidas pelos seus usuários

sejam crianças, jovens ou adultos.

Neste sentido, de acordo com a Organização das Nações Unidas para a

Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO, surge para a educação, um novo

desafio, ampliando sua responsabilidade, visto a importância que tem a escola

como ambiente social nos países em desenvolvimento.

De acordo com a UNESCO (2003):

A escassez de espaços públicos de lazer, cultura e convivência socialsaudável para crianças e jovens faz recair sobre a escola, comgrande freqüência, a responsabilidade de ser a única referênciapositiva de sociabilidade e formação para enorme parcela desseextrato da população visto que hoje elas contam com as interfaces dainternet como meio e local de socialização.

Enguita (2004, p. 46), corrobora com esta afirmação sobre o

alargamento da função da educação quando enfatiza que:

“(...) as nações não nascem, mas se fazem... O principal instrumentodeste processo é a escola, que serve para estender à massa dapopulação o que sem ela não seria nada mais do que cultura da elite,ou de uma elite...”

Neste contexto, a educação digital, a ser desenvolvida nas escolas,

necessita ir além de ensinar o uso técnico dos artefatos tecnológicos e sim

preparar os alunos para que possam, diante da fluência e das constantes

inovações tecnológicas, encontrarem-se preparados para atuarem eticamente

neste espaço.

Para tanto, os usuários destas novas formas comunicacionais precisam

adquirir conhecimentos específicos que os orientem em suas ações praticadas

nos meios virtuais, visto que, estas ações devem encontrar-se permeadas pela

ética e pelas normas jurídicas evitando constrangimentos e implicações legais

que o seu uso inadequado pode acarretar.

Ressalta-se aqui que a popularização da internet trouxe consigo efeitos

positivos: eliminação das barreiras geográficas, democratização do acesso à

informação, no entanto, seu uso sugere regras comportamentais também

conhecidas como netiqueta3 a serem utilizadas no mundo digital, as quais

devem ser consideradas no intuito de evitar gafes virtuais e situações em que o

usuário pode vir a sofrer prejuízo de ordem social, econômica e jurídica.

Numa pesquisa realizada em 2013 pelo projeto “Este jovem brasileiro”

desenvolvido pelo Portal Educacional com mais 10,5 mil alunos de 13 a 17

anos, de 75 escolas da rede particular de todo o Brasil responderam

anonimamente a um questionário online sobre seus hábitos de uso da internet,

relações virtuais, exposição, violência e situações hipotéticas que podem

ocorrer com quem usa a rede como forma comunicacional (BRASIL, 2013).

De acordo com Bouer (2013), coordenador da pesquisa, revelou que os

dados coletados mostram:

Uma série de comportamentos que merecem ser melhor entendidos ediscutidos. Como um espaço novo de relacionamento, ela exige umasérie de cuidados e limites que não estão claros, nem para ospróprios jovens, nem para os pais e professores (BOUER, 2013).

Conforme o mesmo autor, as questões estão indo além da imposição de

regras e limites quanto ao uso da internet, a existência dos perigos reais que

permeiam os meios virtuais. Para Bouer (2013), é importante que os próprios

alunos aprendam a criar seus filtros e lidar com essas situações de uma forma

mais segura e responsável.

A pesquisa mostrou dados importantes que mostram a mudança no

comportamento dos jovens diante das novas formas de conectividade:

Entre os participantes da pesquisa, 99% têm computador em casa,metade no próprio quarto, e 55% usam computador todos os dias,sendo que 40% usam Internet de 2 a 4 horas por dia durante asemana, mas 15% ficam conectados por mais de 8 horas. Nos finaisde semana, o número de horas de conexão é maior, e as redessociais (MSN, Facebook, Orkut) são a categoria mais acessada, oque sinaliza que muitos estão trocando horas de lazer econvivência com os amigos para ficar na frente do computador.Mais de 20% dos participantes avaliam que seu uso de Internet estáacima do normal ou se consideram dependentes e 17% enfrentam

3 Netiqueta: Termo utilizado para designar os comportamentos adequados no ambiente virtual.

conflitos com os pais por conta do excesso de uso (BOUER, 2013)(grifo da autora).

Outro aspecto que chama a atenção, na referida pesquisa foi a

forma como os jovens estão se relacionando:

Na pesquisa, 60% dos participantes da pesquisa já usaram a Webcomo forma de conhecer pessoas, sendo que desses, 27% usaramas redes sociais para tanto; 38% já fizeram amigos na Internet quetrouxeram para a vida real e 25% já “ficaram” com pessoasconhecidas por meio da rede. Ao se aproximar de um desconhecido,97% dizem não confiar logo de cara em quem conhecem pela rede -44% admitem a possibilidade de marcar encontros reais, 32% seriammuito cuidadosos, 10% teriam algum tipo de cuidado, mas 2% nãoteriam maiores preocupações (PORTAL EDUCACIONAL, 2013).

Neste contexto, percebe-se que os jovens estão cada vez mais

dedicando parte do seu tempo navegando na internet, expondo-se, muitas

vezes, sem critérios e orientações, sujeitos a serem vítimas de pessoas mal

intencionadas e também a agirem de forma antiética ou ainda cometerem

crimes virtuais sem saberem que algumas ações realizadas nos meios virtuais

são consideradas como crimes virtuais e sofrem penalidades semelhantes as

que acontecem na vida real.

Encontra-se aí, um novo campo de abrangência para a atuação da

educação: a educação digital, a ser abordada no contexto escolar como uma

forma de compartilhar conhecimentos que colaborem na adoção de novas

posturas tanto éticas como de segurança diante dos meios virtuais.

Neste sentido, questiona-se: de que maneira a educação digital pode

colaborar para que as ações praticadas nos meios virtuais possam proteger os

alunos de conseqüências indesejáveis?

Visando responder tal questionamento, este estudo objetivou, junto aos

alunos do ensino médio, desenvolver uma formação teórica e prática quanto às

questões relacionadas ao comportamento ético e seguro, preparando-os para

que possam, diante das constantes inovações tecnológicas, utilizar a internet e

suas interfaces com segurança, direcionadaa pela conduta ética social e leis

que orientam o seu uso.

2. Inovações Tecnológicas na sociedade atual

As últimas inovações tecnológicas que ocorreram no século XX e XXI

superam as expectativas que a humanidade sonhava. Ao recordar que a

máquina a vapor, a eletricidade, o carro, o avião, a televisão, as inovações

ligadas à informatização provocaram mudanças no modus vivendi das

sociedades, contribuindo para a expansão do capitalismo, fortalecimento do

modelo urbano e para a redução das distâncias.

Juntamente com as constantes inovações tecnológicas, novas formas de

comportamento vão sendo adotadas pela sociedade. Hoje, de acordo com

Moran (1998), com as novas tecnologias da comunicação, principalmente com

a internet, podemos recorrer à mobilidade e a virtualização que nos libertam

dos espaços, tempos rígidos, previsíveis, determinados e com a digitalização,

nos permite a multiplicação de possibilidades de escolha e interação.

A partir da internet - wireless (sem fio) os artefatos tecnológicos criados,

caminham na direção da convergência, da integração, dos equipamentos

multifuncionais que agregam valor e diversos serviços.

Estes serviços e possibilidades, como por exemplo, os acessos às redes

sociais e diferentes sites, em qualquer lugar, tempo ou espaços produzem

novos comportamentos dos seus usuários, visto a possibilidade de mantê-los

conectados o tempo todo.

Como consequência, a presença das novas tecnologias da comunicação

e Informação (TIC) no cotidiano das pessoas estão mudando direta e

indiretamente, as formas de se comunicar, trabalhar, estudar, divertir-se,

produzindo conflitos antes impensáveis. As relações interpessoais estão

acontecendo de forma presencial e virtual.

No entanto, se por um lado as mudanças produzidas pelas novas

tecnologias estão auxiliando as pessoas, por outro, estão provocando

situações desagradáveis no sentido ético, social e judicial. São dilemas éticos

nos quais os sujeitos que recorrem às relações mediatizadas pelas novas

tecnologias, se vêem questionando quanto ao que é certo e errado, legal ou

ilegal, moral ou imoral. Porém, ao mesmo tempo em que a ética se torna um

assunto cada vez mais amplo e destinado a um público crescente, mesmo que

isto não seja expresso como tal, as reflexões teóricas continuam muito restritas

aos espaços acadêmicos.

A presença destes conflitos, suas causas e consequências e ainda o

conhecimento, acerca dos limites éticos e legais necessários, tornam-se

conteúdos que devem ser abordados em sala de aula.

Encontra-se aí, decorrente da dinâmica social e sua evolução, novos

saberes que merecem atenção especial dos professores visto que a escola é

reconhecida como um espaço de socialização do conhecimento, ambiente no

qual a reflexão, juntamente com a mediação do professor devem encontrar-se

sintonizadas com as questões atuais ligadas à vida de seus alunos: social,

política, cultural e econômica.

De acordo com Rios (1999):

A escola é o espaço de transmissão sistemática do saberhistoricamente acumulado pela sociedade, que tem por objetivosformar indivíduos, capacitando-os a participar como agentes naconstrução dessa sociedade (p.34).

Se a função social da escola, entre outras, é a de formar alunos

participativos numa sociedade, hoje permeada pelo uso das infinitas

possibilidades comunicacionais, então os alunos precisam de conhecimentos

que lhes orientem quanto ao seu uso e estes conhecimentos referem-se à

Educação Digital.

A Educação Digital preocupa-se com a conscientização e

preparação das pessoas para o uso das tecnologias, permitindo-lhes atuação

correta, ética, livre de riscos ou com estes minimizados, de modo a não

incorrerem especialmente em práticas danosas e com conseqüências jurídicas

não desejadas.

Sua importância no contexto atual decorre do mau uso que muitos

usuários fazem da internet e suas interfaces, sem o conhecimento das

conseqüências jurídicas que tais ações podem acarretar.

Para Levy (1993):

A tecnologia não é natural, mas humana. Não se refere ainstrumentos, mas a como o homem trabalha. Refere-se igualmente acomo ele pensa. A tecnologia é uma extensão do homem e por isto éque uma mudança tecnológica sempre expressa e modifica nossavisão de mundo (p. 43).

Se as tecnologias permitem a adoção de novas visões de mundo

consequentemente os comportamentos também sofrem alterações. Porém,

com a rapidez com que as inovações tecnológicas estão alterando a forma de

viver das sociedades, a educação não está dando conta de promover

conhecimentos que permitam os usuários das novas tecnologias encontrarem-

se habilitado conceitualmente e operacionalmente para o uso ético dessas

tecnologias. Urgentemente, no mínimo, surge a necessidade de promover a

instrução elementar para o bom uso da tecnologia. Isto é, conhecimentos que

permitam o uso das novas tecnologias de forma ética, moral e respeitosa.

1.1Ética e Moral

Etmologicamente os termos: ética e moral possuem origens distintas

visto que a palavra ética vem do grego ethos que significa modo de ser de uma

pessoa ou caráter e a palavra moral tem origem do latim morales que significa

relativo aos costumes.

Ética de acordo com Chauí (1994), é um conjunto de valores morais

e princípios que norteiam a conduta humana na sociedade. A ética serve para

que haja um equilíbrio e bom funcionamento social.

Num contexto filosófico, a ética, encontra-se relacionada aos

valores morais que orientam o comportamento humano em sociedade

enquanto a moral são os costumes, regras, tabus e convenções estabelecidas

por cada sociedade.

Neste sentido, é originária do comportamento humano que justifica

as regras morais ou, tenta explicá-las de forma racional, científica e teórica. A

ética torna-se uma reflexão sobre a moral enquanto a moral apresenta-se como

um conjunto de regras aplicadas no cotidiano e recorrida cotidianamente por

cada indivíduo. Desta forma, são essas regras que orientam cada indivíduo,

norteiam suas ações e os seus julgamentos sobre o que é moral ou imoral,

certo ou errado, bom ou mal.

Ambas, na prática são muito semelhantes pois são responsáveis por

construir os alicerces que irão guiar a conduta dos indivíduos, determinando

seu caráter, altruísmo e virtudes orientando a forma de agir em sociedade.

Quanto à ética Trautmann (2002), afirma:

A ética relaciona-se estreitamente com as ciências do homem, vistoque o comportamento moral é uma forma específica docomportamento do homem, que se manifesta em diversos planos:psicológico, social, prático-utilitário, jurídico, religioso ou estético(p.35).

A mesma autora enfatiza que “não cabe à ética formular juízos de valor

sobre a prática moral de todas as sociedades de todas as épocas, em nome de

uma moral universal” (p. 34). Cabe à ética, explicar a razão de ser desta

pluralidade e das mudanças de moral, isto é, esclarecer o fato dos homens

recorrerem às práticas morais distintas e até opostas em diferentes lugares e

momentos históricos.

Dessa forma, pode-se afirmar que a ética não cria a moral, porém

toda moral supõe determinados princípios, normas e regras de comportamento,

mas não é a ética que os estabelece na sociedade. A ética e a moral se

relacionam mutuamente.

Para Trautamann (2002), somos seres morais e as comunidades

humanas sempre criaram sistemas de valores e normas para possibilitarem a

convivência social, porque somos seres não determinados pela natureza ou

pelo destino. Neste sentido, a moral é compreendida como a ciência dos

costumes (Durkeim apud Vasquez ,1998).

A consciência ética surge com a desconfiança de que os valores

morais da sociedade – ou individuais – encobrem algum interesse particular

inconfessável ou inconsciente que rompe com as origens da moral.

Não é possível pertencer a um grupo social sem compartilhar da

mesma maneira de ver as coisas, dos mesmos valores e normas morais, da

mesma linguagem e outros fatores importantes na convivência social. Assim,

as novas gerações iniciam seu relacionamento com o mundo empreendendo a

cultura, contribuindo com novos questionamentos e soluções e

consequentemente surgirão outros problemas e situações que conflitarão com

os modelos e valores já estabelecidos pelo grupo social.

Desta forma, novos paradigmas surgem alterando valores, princípios

e modelos de funcionamento já existentes modificando também a vida dos

indivíduos pertencentes a esta sociedade.

1.2A construção da Moral e da Ética

Para Trautamann (2002, p.64), as pessoas não nascem boas ou más, é

a sociedade que as educa moralmente. A família, o convívio com as pessoas, a

mídia influenciam de modo marcante a conduta das pessoas desde sua

infância. Assim, pensar o comportamento adotado pelos jovens diante das

novas tecnologias presentes no cotidiano implica em compreender como a

moral é construída definindo a identidade dos indivíduos.

Para Piaget o desenvolvimento moral acontece também nas

interações da criança com a sociedade, pois nestas interações é que ela

constrói valores e regras. Piaget, em seus estudos, descreve os estágios da

construção da moral pela criança que são sucessivos e interdependentes:

primeiro estágio – motor individual - (até aos 02 anos): a criança realiza suas

ações de acordo com seus desejos e hábitos motores, age sozinha e não

existem regras para ela; segundo estágio - egocêntrico – (02 aos 05 anos): a

criança age de acordo com os exemplos e regras externas recebidas; terceiro

estágio – cooperação nascente – (entre 07 e 08 anos): a criança age com

outras a partir das regras estabelecidas; quarto estágio – codificação das

regras – (entre 11 a 12 anos): a criança compreende e reconhece as regras

estabelecida e age de acordo com elas.

Vale ressaltar que esta sequência não é linear, porém é contínua e

ininterrupta. No entanto, a aquisição da consciência da regra se dá de forma

mais suave, progressiva, seguindo etapas sequenciais: primeiro estágio – as

regras são estritamente motoras e quase inconscientes; segundo estágio – as

regras são vistas como sagradas e inatingíveis, não permitindo modificações e

a sua alteração é compreendida como uma transgressão ressaltando o

conceito de obediência sem argumentação ou questionamentos; terceiro

estágio – regra considerada como uma lei imposta pelo consentimento mútuo e

o respeito é obrigatório, porém as modificações são realizadas diante do

consenso entre os envolvidos dando lugar à autonomia intelectual que permite

desenvolver a capacidade de estabelecer relações entre objetos ou fatos.

Desta forma tanto o desenvolvimento da prática das regras quanto a

consciência dela revela-se como:

( )... um aspecto individual, não interativo com os pares, prosseguecomo algo exterior e sagrado, imutável pela coerção da autoridade evai sendo percebido como um valor que é legitimado pelo coletivo,pela discussão, reflexão com modificações e transformaçõesrealizadas pelo consenso mútuo de pessoas que aceitam e seentendem como iguais (TRAUTAMANN, 2012, p. 68).

Para Piaget apud Puig (1998, p.10), é a qualidade da assimilação

racional dos valores e regras que determinam morais diferentes sendo que a

moral é heterônoma quando as regras são legitimadas sem reflexão e a moral

torna-se autônoma quando as regras são compreendidas e legitimadas pela

razão de contratos realizados entre pessoas que se consideram livres e iguais.

Entende-se então, que a construção da moral e a aquisição da

consciência da regra, quando na individualidade, determinam os princípios

adotados e o comportamento decorre desses valores legitimados pela

sociedade a qual está inserido e a qual se identifica.

Neste contexto, encontra-se para a educação atual, de acordo com

Trautamann (2002, p.65), “uma tarefa que se destina a dar forma moral a

própria identidade, mediante um trabalho de reflexão e ação a partir das

circunstâncias do dia a dia”, isto é, promover a reflexão das regras adotadas

pelo coletivo bem como um comportamento ético e seguro que se apresente de

acordo com as solicitudes da atual sociedade.

1.3 Comportamento ético e seguro na internet

Cotidianamente somos desafiados a fazer escolhas, entre as coisas

que desejamos ou as que vão ao encontro do bem coletivo. E, quando estamos

diante das novas formas comunicacionais advindas das interfaces da internet:

e-mails, redes sociais, fóruns, chats, entre outras possibilidades, o indivíduo se

encontra diante das mesmas opções de escolhas comportamentais. São

desafiados a tomar decisões, porém a situação de virtualidade pode provocar

uma falsa crença da invisibilidade e da não responsabilidade diante das ações

que por vezes podem ser contrárias ao que já se encontram postas como ética

e segura.

Neste contexto encontra-se a escola que além de trabalhar com os

conteúdos e conhecimentos científicos historicamente acumulados atua com

valores e princípios éticos influenciando, de maneira significativa, a formação

das atitudes éticas tanto individual como coletivamente.

As ações desenvolvidas pelos professores como: sanções, prêmios,

elogios, contratos disciplinares e didáticos mostram seu lado profissional e

pessoal tornando-se um referencial para a construção dos valores para os

alunos.

Quando se trata das novas tecnologias, em específico, o uso da

internet, dilemas éticos surgem no decorrer do seu uso como: a proteção das

informações e dos dados compartilhados contra acessos não autorizados;

garantia da identidade dos usuários; uso devido dos dados e informações

vinculados; garantia da veracidade da informação difundida; a proteção contra

a cópia não autorizada de programas, dados e informações; criação de vírus

para a invasão de sistemas de arquivo de dados; a modificação deliberada de

dados e informações; a manutenção da privacidade, entre outros.

Neste sentido, Trautamann (2002), afirma que:

Pensar sobre atitudes, valores e normas é pensar também emcomportamentos. As atitudes são expressas na ação, na conduta. Nodia a dia muitas vezes, os comportamentos são incoerentes e atémesmo contraditórios, ou seja, na formação de atitudes vive-se umprocesso não linear. Em alguns momentos o comportamento deuma pessoa pode ser considerado imoral ou impulsivo (p.63).(grifo da autora)

Desta forma, quando se trata da virtualidade, nas relações interpessoais,

muitas ações e gestos podem ser interpretados de forma equivocada ou

considerada como inapropriadas para a situação. Como exemplos disso cita-

se: linguagem informal para situações formais de trabalho; uso de sinais que

demonstram emoções sugerindo raiva, grito, deboche, riso, ironia; comentários

maldosos ou irônicos que podem constranger; postagens intensivas e sem

critérios no seu cotidiano; assumir a identidade ou passar-se por outra pessoa;

postagem de vídeos sem permissão, entre muitas outras e quanto ao

comportamento seguro: invasão da privacidade; postagens de fotos e vídeos

com cenas de nudez e sexo; uso de imagens sem autorização; extorsões;

invasão e propagação de vírus que inutilizam arquivos; uso de senhas sem

autorização entre outros.

O sentido de privacidade, muitas vezes, esvazia-se diante das novas

tecnologias promovendo o fim da individualidade tornando a vida privada em

pública em segundos e com alcance global.

Outro fator, são as espionagens eletrônicas através de áudio e vídeo,

uso de grampos telefônicos, invasões das contas correntes e cartões de

créditos; manutenção da integridade e disponibilidade das informações; uso

das tecnologias para fraudes, sabotagens, desvios de informações, cópias de

documentos e/ou softwares, entre outros.

São comportamentos e atitudes que necessitam serem levadas à

reflexão coletiva. Cabe ao espaço escolar, de acordo com Trautamann (2002,

p.80), assumir sua função na discussão dos dilemas éticos que envolvem as

novas tecnologias e o seu uso, não como uma instância normativa ou

normatizadora, mas como um local social privilegiado de construção dos

significados éticos necessários a vida em sociedade numa época marcada pela

velocidade e pela expansividade da informação.

Acredita-se que a tecnologia deve estar na escola como parceira no

processo de produção de conhecimento, como uma poderosa aliada, mas que

junto com esta parceria se faz necessário conhecê-la, saber o que se pode

fazer com ela, descobrir e inventar contribuições que ela possa trazer,

experimentar, arriscar, acertar e errar. No entanto, suas ações devem ser

conduzidas pelo caráter ético e seguro para assim obter real benefício dos que

a ela recorrem.

3 Intervenção pedagógica

Como parte integrante do Programa de Desenvolvimento Educacional –

PDE/2013, havia a necessidade de uma intervenção pedagógica como etapa a

ser seguida do programa de formação continuada de professores da rede

estadual de educação do Paraná. Visando tratar doa temática comportamento

ético e as novas tecnologias foi escolhido, como local para a intervenção

pedagógica, o Colégio Estadual Ana Vanda Bassara – ensino fundamental,

médio e profissional, juntamente com um grupo de alunos do ensino médio,

necessitou inicialmente, do pesquisador, a realização de uma pesquisa tipo

Estado da Arte (ROMANOWSKI e ENS, 2006), para que fosse levantado o

número de publicações existentes na área, visando direcionar o

encaminhamento dos estudos. Vale ressaltar que não existem muitas

produções nesta área de pesquisa.

Em seguida, foi realizado um aprofundamento bibliográfico para dar

suporte teórico às ações a serem desenvolvidas nas 32 horas aulas que foram

divididas em 03 unidades temáticas.

No colégio, a constituição do grupo de alunos se deu a partir de

convite às turmas do ensino médio após elucidação do projeto de intervenção

pedagógica. Foi organizado um grupo com 15 componentes.

Os encontros aconteceram no laboratório de informática e contaram

com oito encontros de 04 horas cada.

O primeiro encontro contou com a explanação sobre o conceito de

ética e comportamento ético e um debate sobre comportamento ético nos

meios virtuais. Em seguida, o grupo realizou pesquisa virtual para posterior

levantamento de comportamentos que os alunos consideram como antiéticos

realizados nos meios virtuais.

No segundo encontro houve uma explanação e debate sobre a

Netiqueta e em seguida a elaboração de um quadro comparativo num grande

painel, entre os diferentes comportamentos encontrados na internet e as regras

apresentadas na Netiqueta. Ao término os alunos colocaram o painel em

exposição no saguão do colégio.

No terceiro encontro foi abordado o tema Segurança Digital; crimes

virtuais e as penalidades civis e ainda uma pesquisa virtual sobre a temática e

exemplos de crimes cometidos via internet.

No quarto encontro, os alunos elaboraram um questionário com

questões fechadas para ser respondido pelos colegas da sala de aula, visando

verificar o conhecimento que os alunos possuíam referente a ética e segurança

digital.

No quinto encontro realizaram a tabulação dos dados coletados e a

construção dos gráficos com os resultados obtidos.

No sexto encontro o grupo foi dividido em duas equipes e cada um

elaborou uma apresentação utilizando o PowerPoint e que foi exibida para as

turmas do ensino fundamental visando a divulgação das regras da Netiqueta e

outra sobre condutas de segurança no espaço virtual e as conseqüências

legais.

No sétimo encontro os alunos elaboraram uma apresentação

utilizando o aplicativo Move Maker no qual continha som, imagens que

retratavam comportamentos impróprios nas escolas ao utilizarem as redes

sociais.

No oitavo encontro e último, houve a finalização da intervenção

pedagógica do projeto com a apresentação deste pequeno ensaio de filme, no

laboratório de informática, para alguns alunos e convidados do Núcleo

Regional de Educação de Guarapuava/PR.

Com a intervenção pedagógica foi percebido que os alunos

desconheciam as regras básicas a serem utilizadas nos meios virtuais

principalmente nas redes sociais que são as mais utilizadas por eles.

Muitos dos participantes demonstraram espanto ao saberem que seus

computadores possuem endereço (IP) a qual pode ser rastreada toda e

qualquer postagem nele realizada. Quando abordadas as questões legais,

demonstraram muito interesse e logo queriam pesquisar em diferentes sites,

possíveis casos que configurassem crimes virtuais.

Um aspecto relevante apresentado foi a vontade de divulgar os

conhecimentos que estavam sendo obtidos em cada encontro. E, ao aplicarem

o questionário ficaram ainda mais surpresos com a ausência do conhecimento

dos colegas ao utilizarem as redes sociais. Para os alunos, isto justificava os

inúmeros casos já ocorridos no próprio colégio envolvendo alunos como

postagem de fotos sem a devida permissão; comentários maldosos e fofocas

causando intrigas e até brigas, entre outros.

Quando questionados sobre os encontros, todos foram unânimes ao

afirmarem que gostaram da maneira como foram abordadas as temáticas,

como as tecnologias foram utilizadas para a pesquisa e construção de novos

conhecimentos. Ressaltaram que, atividades nas quais são utilizadas as

tecnologias, despertam para a pesquisa de forma diferenciada da comumente

utilizada em sala de aula. E quanto aos conteúdos afirmaram que todos

deveriam possuir o conhecimento que eles adquiriram para depois fazerem uso

da internet.

4 Considerações Finais

As inovações tecnológicas e decorrentes, a internet, como algo presente

em nosso cotidiano, alterou o comportamento social produzindo novas

necessidades inclusive à educação. E o contexto educacional, como tal precisa

atender a esta demanda que inclui formação teórica e operacional.

A partir da intervenção pedagógica realizada ficou ainda mais evidente a

necessidade da educação digital como componente curricular. A abordagem

das temáticas que envolvem o comportamento ético e seguro na internet

evitaria que os alunos cometessem ações inapropriadas e até crimes virtuais.

Muitas podem ser as ações pedagógicas que podem ser desenvolvidas

nas salas de aula, nos Laboratórios de Informática e até mesmo recorrendo

aos artefatos que os alunos carregam consigo constantemente, o celular.

Cabe, então aos profissionais da educação, uma formação que os capacite

quanto às questões que envolvem a educação digital.

Neste contexto, se faz necessário que os professores e todos os

envolvidos na comunidade escolar, conheçam os efeitos legais de ações

inadequadas, mostrar aos alunos que a ética se aplica tanto na vida real

quanto na virtual; mostrar através de pesquisas, casos que demonstrem

comportamento impróprio e o comportamento ético como forma de respeito ao

próximo e a si mesmo.

Quando se entende a educação numa concepção humanista, entende-

se que ela deve ir além da apropriação dos conteúdos científicos e formação

sujeitos capazes de viverem com autonomia pautados nos referencias éticos

universais e isso considera-se como um desafio contemporâneo para a

educação, não só brasileira como global.

REFERÊNCIAS

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ENGUITA, M. F. “Educar em tempos incertos”. Porto Alegre, RS: Artmed,2004.

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