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7 Cibele Lopes Barbará RGM 049807 Jamerson Lindoso RGM 38341 Orkut, relação de público e privado Universidade São Marcos São Paulo – 2006

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Cibele Lopes Barbará RGM 049807 Jamerson Lindoso RGM 38341

Orkut, relação de público e privado

Universidade São Marcos São Paulo – 2006

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Cibele Lopes Barbará RGM 049807 Jamerson Lindoso RGM 38341

Orkut, relação de público e privado

Trabalho apresentado à disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso II, do curso de Psicologia da Universidade São Marcos, sob a orientação do Profº Doutor Ricardo Franklin.

Universidade São Marcos São Paulo – 2006

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Agradecimentos

Agradecimento especial a Adriano Termignoni pela paciência, revisões, finais de

semana sem viajar e pelo testemunho de um momento muito especial...

Ao Ricardo Franklin pela orientação e por acreditar neste trabalho...

Ao Conrado Ramos pela transmissão dos conceitos da teoria crítica, pelo parecer e

por pontuar o “difícil trabalho de formiga”....

A Adriana pelo parecer e pelas provocações teóricas...

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Resumo

O principal objetivo deste trabalho é refletir sobre a relação de público e

privado no Orkut. Especificamente responder o que faz as pessoas colocarem suas

particularidades no Orkut. Para nós, este tipo de exposição tem relação com as

formas de controle social, cada vez mais mediada por computadores. Através de

matérias publicadas em jornais e revistas analisamos como o Orkut tem atuado no

contexto social, consolidando-se como poderosa mídia de comunicação. Buscamos

entender como a empresa Google atua no mercado mundial, fazendo o cruzamento

das informações de seus bancos de dados um produto que a cada dia vale mais nas

bolsas de valores internacionais. Por outro lado, tentamos investigar parcialmente o

comportamento dos usuários do Orkut, o que pensam e o que sentem em relação a

este sistema. Para isso realizamos 06 entrevistas com usuários do Orkut.

Adotamos como referencial teórico o conceito de indústria cultural de Adorno

(1947), que nos ajudou a analisar o Orkut de maneira mais crítica e social.

Palavras-chave: Orkut, Google, Internet, público, privado, privacidade, indústria

cultural, controle social.

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“A privacidade no leito é obtida com cortinas coloridas que correm e fios presos ao beliche de cima ou diretamente no teto.

_ O cortinório é de lei, devido que senão, tem gente olhando para mim o tempo todo. Sabe lá o que é isso, doutor, entra ano sai ano, nenhum minuto o senhor pode ficar na sua? É onde que muito companheiro de mente fraca perde as faculdades e dá cabo da própria existência”... (Estação Carandiru)

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Sumário

1) Introdução.......................................................................... 7

2) Racionalidade Tecnológica.............................................. 16 2.1- Positivismo Comteano e a ideologia racional 18

2.2- Tecnologia, homem e máquina 21

2.3- Aceleração tecnológica, econômica e Globalização

23

2.4- Indústria Cultural 25

3) Conhecendo a Internet...................................................... 29 3.1 – A Arpanet 29

3.2 - A sociedade em Rede 30

3.3 - A espaçonave da Informação 32

4) Orkut................................................................................... 33

5) Público e Privado na Internet........................................... 40 6) Método................................................................................ 48 6.1 – Sujeitos 48

6.2 – Procedimentos 48

7) Orkut, relação de público e privado: análise geral........ 49 7.1 – Expor e bisbilhotar: uma necessidade 51

7.2 – Individualidade: uma marca indelével. 57

7.3 – Conflitos de relacionamento no Orkut: uma possibilidade de reflexão

59

8) Conclusão.......................................................................... 63 9) Referências Bibliográficas............................................... 65

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1. Introdução 1

Já há algum tempo nos interessamos pelos temas capitalismo e globalização,

bem como pelas relações do homem com os meios de produção nesse contexto e

pelos acelerados processos das transformações tecnológicas deles oriundos, em

especial as ocorridas na Internet.

Somos usuários de muitos serviços prestados por esta rede de

comunicações: e-mail1, sites2 de pesquisa, banco eletrônico, programas de bate-

papo, entre outros. Nossa graduação funciona, em parte, por meio da Internet: os

comunicados de nossa universidade, nossas notas e mesmo alguns textos chegam

da universidade até nós mediados pela Internet. Já não podemos negar que ela faz

parte de nossas vidas cotidianas e, através dela, até mesmo na pesquisa para este

trabalho utilizamos diversos sites de buscas. Neste cenário, não demorou muito para recebermos em nossas caixas

postais convites para participarmos do Orkut3. Com um certo receio, inclusive por

não sabermos direito sobre o que se tratava, resolvemos esperar e adiar a entrada

em tal sistema de comunicação.

Passados alguns meses, já não eram só os convites via e-mail que chegavam

até nós. Muitos amigos que já participavam do Orkut cobravam nossa entrada,

perguntando por quê, afinal, não estávamos lá, já que “todos” da turma estavam.

Começamos a perceber, por onde passávamos, a tela do computador de alguém

com o navegador aberto no Orkut. E não foram poucos os lugares - no trabalho, na

faculdade, nas lojas com computadores dentro de shoppings. Já despertos para o

assunto, começamos a acompanhar matérias sobre o Orkut nos principais jornais da

cidade. Logo em seguida chegamos à conclusão de que era preciso conhecer o que

estava acontecendo e resolvemos aceitar um dos convites para entrar no site.

Verificamos, então, em que consiste o processo de ingresso na “lógica” do

Orkut. Os usuários têm a possibilidade de preencher um formulário detalhado sobre

1 E-mail, correio-e, ou correio eletrônico, é um método que permite compor, enviar e receber mensagens através de sistemas eletrônicos de comunicação. 2 Site ou sítio, mais conhecido pelo nome inglês site, de website ou Web site, é um conjunto de páginas Web, isto é, de hipertextos acessíveis geralmente via http na Internet. 3 Orkut é uma rede social filiada ao Google, criada em 22 de Janeiro de 2004 com o objetivo de ajudar seus membros a criar novas amizades e manter relacionamentos.

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suas preferências sexuais, gostos artísticos (música, literatura, cinema), descrição

de seu par perfeito, hábitos alimentícios e sociais etc. No total, são 80 campos que

variam entre gostos, preferências pessoais, dados profissionais, sentimentais e

cadastrais (endereço, telefones). Informações estas que, segundo uma enquete

realizada pela Folha de São Paulo (Assis, 2004), “90,9% das pessoas responderam

que jamais usaram o site para contar mentiras sobre si próprios” ao preencherem

estes campos.

Ao navegar pelo Orkut, percebemos que não só os perfis preenchidos são

usados pelos usuários para sua identificação, mas comunidades – que todos têm

possibilidade de criar ou simplesmente aderir - também são utilizadas para este fim.

Em breve análise, percebemos que, apesar da proposta original da criação de

comunidades neste site ser a discussão de temas de interesse, poucas delas são

usadas realmente para alguma troca. Elas parecem complementar o que faltou

acrescentar nos questionários de perfil, ou seja, em suas identidades pessoais de

usuários. Curioso é que a maioria dessas comunidades criadas tem como tema as

mais diversas preferências pessoais e maneiras de ser: “Tenho sono de manhã”,

“Sempre causo na balada (sic)”, “Eu amo Ovo Maltine do Bob´s”, “Eu fico viajando

enquanto dirijo”, ”Eu odeio esperar”, entre muitas outras.

Após algum tempo como usuários do Orkut, acompanhando o furor que este

site causou na mídia e o entusiasmo com que as pessoas próximas comentavam

sobre sua utilização, chegamos a uma pergunta fundamental: o que faz, afinal, as

pessoas tornarem públicas suas particularidades no Orkut?

Para nós, a princípio, este tipo de exposição tem relação com as formas de

controle social, cada vez mais mediada por computadores, que iniciaram sua

atuação principalmente no setor corporativo e que têm se estendido – ainda mais

sob a influência do advento da Internet - aos setores de entretenimento, como forma

de controle também das formas de sociabilização.

Bastos (2005) diz que o controle social tem origem no desejo dos “liberais

burgueses”, de organizar, de padronizar e classificar. Um projeto iluminista, cujo

objetivo é de dominar a natureza de maneira absoluta e positiva, livrando o homem

do caos, do imprevisível: Trata-se de um programa que busca a dominação do desconhecido, da natureza, e do caótico, visando atingir o desencantamento do mundo e, com isso, livrar os homens do medo e, desse modo, colocá-los na posição de senhores, via a dominação da razão, tendo

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penetrado em todos os estratos do complexo social (Bastos, 2005, p. 17).

Com raízes neste projeto iluminista, originado no século XVII, a indústria

capitalista lidou com os meios de trabalho e conseqüentemente modificou a

organização social e o entretenimento de tal forma positiva, buscando “eficácia

máxima” (Bastos, 2005), deixando cada vez menos espaço para a criação individual.

Se os processos de trabalho e sociabilização já são pensados, racionalizados, que

espaço sobra para que o indivíduo exerça seu potencial criativo?

Visto sob esta lógica, o Orkut nada mais é do que um sistema que padroniza

e direciona as formas de relacionamentos pessoais. Padroniza porque, apesar dos

usuários “possuírem” um espaço para escrever, colocarem fotos, etc., este é ainda

um sistema da Internet, previamente pensado e planejado, cheio de processos

prontos. Parece não haver muito espaço livre, que favoreçam formas espontâneas

de relacionamento.

Sennett (2001) diz exatamente que há uma confusão entre a vida pública e

íntima. Esta confusão entre ambas acaba por diminuir o espaço em que o homem

exercia papéis sociais e atuava como um ser público, além de experimentar e criar

novas relações, novos papéis. Outra conseqüência desta confusão é a perda da

capacidade de autodistanciamento (no sentindo de intervalo entre o que é pessoal e

o que é público) e discernimento crítico: As sociedades ocidentais estão mudando a partir de algo semelhante a um estado voltado para o outro para um tipo voltado para a interioridade – com a ressalva de que, em meio à preocupação consigo mesmo, ninguém pode dizer o que há dentro. Como resultado, originou-se uma confusão entre vida pública e vida íntima: as pessoas tratam em termos de sentimentos pessoais os assuntos públicos, que somente poderiam ser adequadamente tratados por meio de códigos de significação impessoal (Sennett, 2001, p. 18).

Assim, podemos pensar que nosso mundo ocidental, administrado e

padronizado pela utilização freqüente de tecnologia, invade o espaço privado do

indivíduo, absorvendo sua capacidade de pensar, racionalizar e criar, além de

“ganha terreno” para dominação.

Será que é por isso que o usuário do Orkut preenche seus dados num

sistema da Internet (público), com tanta facilidade e “naturalidade”? Será que o Orkut

não é um espaço que expõe a intimidade publicamente? E se esta intimidade é

pública, será que ela continua sendo intimidade?

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Para nós, a oportunidade de discutirmos sobre o Orkut poderá nos fazer

repensar sobre os limites objetivos e subjetivos contemporâneos do que é público e

privado.

Alguns esclarecimentos importantes devem ser feitos desde já. O primeiro diz

respeito sobre considerar a Internet como um meio de comunicação de massa,

assim como a televisão, o rádio, que abrange um grande número de pessoas. Hoje,

o Brasil “tem 13,2 milhões de internautas residenciais” (Alencar, 2006). Não é um

número pequeno. Segundo Silveira (2004) a Internet configura-se como mídia de

massa não só no Brasil, mas no mundo: A rede de computadores que forma a Internet saiu das redes de pesquisa de universidades e outras instituições para se tornar um sistema de comunicação que abrange grande parte do mundo, o que a transformou em parte de cultura de massa (Silveira, 2003 p.43)

Outro ponto diz respeito às várias teorias de comunicação para abordarmos a

Internet. Este é um assunto polêmico, que envolve questões epistemológicas e

pressupostos teóricos diferentes. Silveira (2004), em um artigo sobre a influência da

Internet na formação da identidade, fala que em linhas gerais poderíamos abordar o

assunto através de três referências teóricas de comunicação. Ele diz, em linhas

gerais que, assim como na psicologia, a comunicação também possui uma

diversidade de teorias, muitas vezes difícil de agrupar e classificar (Silveira, 2004). O

autor sugere então três linhas de pensamento: na área da comunicação “O

funcionalismo norte americano”, “A teoria da indústria cultural da Escola de

Frankfurt” e “Teoria Cibernética” (Silveira, 2004 p.43). No Funcionalismo, considera-

se a comunicação de massa tem como objetivos informar, interpretar e socializar.

Esta concepção irá analisar seus pontos positivos e negativos. Sobre esta escola,

diz Silveira (2004): A transmissão de informações, por exemplo, tem o duplo aspecto de colocar em pauta temas importantes para a sociedade, mas também o de gerar um excesso de informações que pode deixar o expectador ou o leitor confuso (Silveira, 2004 p. 43)

E mais adiante:

O funcionalismo norte-americano, em geral, deixa de lado a análise dos instrumentos tecnológicos e sua dimensão histórica, aspectos que possuem destaque em outras correntes teóricas (Silveira, 2004 p. 43).

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Sobre a teoria Cibernética, o autor explica que esta concepção considera que

os meios eletrônicos possibilitam que a comunicação utilize os vários sentidos da

percepção: O aforismo “o meio é a mensagem”, de Marshall McLuhan, resume a idéia central dessa teoria: o fato de que os meios eletrônicos, como rádio, cinema e televisão, permitem a expressão da comunicação através de vários sentidos (visão e audição) que haviam sido perdidos quando as tradições orais cederam espaço aos meios escritos depois do advento da imprensa (Silveira, 2004, p.44).

Já a teoria da indústria cultural, vê a comunicação de massa como um

produto da indústria cultural que produz em série como qualquer produto da cultura:

“A música, o cinema e as artes, nos meios de massa, são vistos como quaisquer

outros produtos do capitalismo, cuja comercialização visa apenas o lucro e a

expansão de mercados” (Silveira, 2004, p.44).

A polêmica entre elas é grande. Uns acham que a teoria funcionalista e a

Cibernética são otimistas demais, e não levam em conta, como vimos na citação

acima, a dimensão história com sua tendência de naturalizar (como se fosse inato) a

utilização de tecnologia como forma de comunicação. Já outros dizem que a teoria

da indústria cultural é pessimista demais e não deixa uma ponta de esperança para

o papel das mídias de massa (Silveira, 2004). Diferenças à parte (por enquanto),

existe uma convergência entre todas as teorias, segundo Silveira: (...) elas destacam a fragilidade do indivíduo frente aos meios de comunicação. Em todas teorias existe uma assimetria, uma diferença abissal entre o poder da mídia e a vulnerabilidade do indivíduo, visto como impotente e incapaz de resistir aos apelos da mídia (Silveira, 2004, p. 44)

Bem, até aqui apontamos as diferenças e a similaridade das teorias em

questão. Mas ainda queremos esclarecer mais alguns pontos relevantes, que

servirão como justificativa para a nossa escolha do referencial teórico para este

trabalho.

Continuando com o mesmo autor, em seu artigo ele ainda trás uma visão

simples e esclarecedora sobre as diferenças entre as mídias tradicionais, como a

televisão, o rádio, o cinema e a Internet. Apoiado em autores mais próximos da

teoria funcionalista, este vai dizer que o paradigma da comunicação de massa

pressupõe uma mensagem para muitos receptores, tendo estes pouca oportunidade

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de escolha, permanecendo somente na posição de receptor passivo. Para Silveira, a

Internet é diferente neste aspecto, pois permite uma interação maior e diferente: O modelo de comunicação da Internet pressupõe uma interatividade, em que se exige maior atividade do “receptor”, muitas vezes no próprio momento em que a transmissão está acontecendo. Em alguns casos, o “receptor” torna-se simultaneamente, comunicador ou, pelo menos, tem o poder de influenciar o comunicador no próprio instante da geração e transmissão de sua mensagem (Silveira, 2004, p.44). 2

Além da interatividade, o autor vai dizer que “pela primeira vez na História,

existe uma capacidade maciça de comunicação não intermediada pelas empresas e

meios de comunicação de massa” (Silveira, 2004, p. 45). E isso para ele “derruba,

em parte, a tese da vitimização do indivíduo frente aos meios de comunicação

(..)”(Silveira, 2004, p.45).

Aqui então colocamos alguns questionamentos nossos. Acreditamos que não

podemos generalizar o Orkut com a Internet. O Orkut é um site de relacionamento

que funciona através da Internet. Portanto tem características e modos de

funcionamento que não podem ser igualadas à Internet. Outra questão é que o Orkut

é criação e propriedade de uma empresa privada chamada Google4. Além disso,

não devemos deixar de levar em conta que o Orkut foi pré-planejado. Seus

conteúdos, os campos, as formas de funcionamento são estipulados pelos seus

criadores e não pelos usuários. Sabemos que o usuário tem a opção de colocar ou

não, por exemplo, seu telefone. Mas como pudemos perceber, a grande maioria

preenche os formulários com informações verdadeiras.

Alguns podem nos perguntar sobre a liberdade de comunicação do usuário no

Orkut ou sobre as novas formas de comunicação que dele podem surgir. Em

resposta a estes questionamentos, trazemos o seguinte contraponto para

refletirmos: será que escrevermos o que nos vem à mente em uma mídia de massa

pode ser considerado exercício de liberdade? Por exemplo, uma pessoa que fala o

que quer na televisão pode ser considerada livre? 3Adorno (1947), em seu texto sobre a indústria cultural, faz uma analogia

interessante sobre dois automóveis de marcas famosas e diz que as discussões

entre suas diferenças são ilusórias e, no final, ambos automóveis produzidos são

4 Google é o nome da empresa que criou e mantém o maior site de busca da internet, o Google Search. O serviço foi criado a partir de um projecto de doutorado dos então estudantes Larry Page e Sergey Brin da Universidade de Stanford em 1996.

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apenas carros: “O esquematismo do procedimento mostra-se no fato de que os

produtos mecanicamente diferenciados revelam-se, no final das contas, como

sempre os mesmos” (p. 12). Mais adiante ele vai dizer que estas escolhas dão ao

homem uma sensação ilusória de liberdade. Liberdade seria expressa pelas

escolhas: “As qualidades e as desvantagens discutidas pelos conhecedores servem

apenas para manifestar uma aparência de concorrência e possibilidade de escolha”

(Adorno, 1947 p. 12). As “novas formas” de comunicação do Orkut (e também da

Internet) não seriam detalhes mais refinados, lançados de tempos em tempos como

uma versão avançada, assim como os modelos dos automóveis? Não seria então

um produto, com as qualidades x, y e z? 4

Pensamos que o Orkut pode até ser visto como uma nova forma de

comunicação, dentro de um cenário social já estabelecido. Por isso questionamos

esta liberdade. Para a teoria crítica, afirmar um pensamento como este seria

naturalizar a tecnologia como se esta tivesse “brotado” da cultura, não distinguindo

sua história e a ideologia que a permeia. Enfim, a discussão é polêmica, mas não

achamos que devamos nos centrar nela, pois fugiria da nossa discussão central. De

fato temos que concordar que o Orkut supre uma demanda, haja visto seu sucesso.

Que demanda, que necessidade é esta, talvez seja um ponto plausível de

discussão, que iremos aprofundar durante o nosso trabalho.

Baseados então nos questionamentos acima, e também na crença da

importância da relação dialética5 entre o homem e a natureza, escolhemos como

referencial teórico à teoria crítica de Adorno.

Também é necessário declarar a delimitação do nosso objeto de estudos.

Pareceu simples, num primeiro contato, mas ao longo do nosso trabalho, o Orkut se

revelou um objeto complexo, com vários eixos para análise.

O primeiro eixo encontrado foi o Orkut e a relação com a construção da

identidade. Como o Orkut pode influenciar a construção desta? O Orkut permite a

esta identidade se atualizar, transformar-se historicamente, ou favorece com que ela

se cristalize? Neste caso poderíamos utilizar como referencial a teoria de Ciampa,

em que a identidade é considerada um processo de constante identificação e

interação com o momento histórico (Derner, 2000, p. 33).

5 É ao negar-se sua relação imediata com a natureza, como irracionalidade instintiva e pulsional, que a natureza humana, enquanto tal, se constitui. A natureza humana é, pois, na essência, natureza mediada e não “natureza natural” (Ramos, 2004 p.57)

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O segundo eixo de análise poderia ser uma analogia entre o Orkut e o

conceito de racionalidade tecnológica de Marcuse. Um estudo aprofundado desta

relação nos faria entender talvez se a lógica com a qual foi construído o Orkut pode

ser uma lógica racional mecanicista que domina e muda as formas de

relacionamento. Apesar de colocarmos a racionalidade tecnológica como capítulo

deste trabalho, acreditamos que, pela profundidade do tema, uma pesquisa mais

aprofundada poderia ser realizada.

As comunidades do Orkut constituem o terceiro eixo de análise, se entendidas

através da teoria de representação social de grupos-nome. Os grupos-nome

segundo Carvalho (2002), seriam os grupos virtuais, que não existem materialmente

facilitando um relacionamento menos social: Chamamos de grupos-nome a esses grupos virtualizados, que não têm presença material, mas apenas imagética. Os grupos-nome tendem a ser mais freqüentes do que os grupos “vivos” na medida em que facilitam um relacionamento mais descompromissado entre os indivíduos e, portanto mais confortável pela facilidade com a qual os indivíduos poderiam “trocar” de grupo social (Carvalho, 2002 p.01).

Esta discussão talvez nos levasse a pensar como estas comunidades (e

também o Orkut), sendo virtuais, podem propiciar a diminuição da interação social

reforçando relações menos intensas e compromissadas. Segundo Carvalho, o

resultado destas comunidades virtuais é principalmente “a ampliação de

mecanismos de controle e manipulação social e o incremento da violência (Carvalho,

2002, p. 01)”.

Enfim, são várias as possibilidades de pesquisa e entendimento sobre o

Orkut. Cada uma delas um projeto de pesquisa independente, que nos tomaria

tempo e nos distanciaria do objetivo escolhido para nosso trabalho de conclusão de

curso que é a relação de público e privado.

Para contextualizar o estudo sobre o Orkut e a relação de público e privado,

estruturamos da seguinte maneira nosso trabalho:

Nesta introdução, discutimos um pouco sobre nosso percurso, a constituição

do problema de pesquisa, o enfoque teórico e a delimitação do trabalho.

No segundo capítulo trouxemos alguns conceitos importantes que podem

gerar uma reflexão crítica sobre a inserção da tecnologia na vida homem. Sua

história, suas influências e principalmente a ideologia que permeia sua utilização.

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No terceiro capítulo, trazemos um pouco da história da Internet.

No quarto e quinto, começamos a nos aprofundar no Orkut, contando um

pouco sobre seu surgimento e alguns fatos importantes que aconteceram através da

sua utilização ou com a sua participação. Também aqui discutimos sobre a

veiculação de informações e o contrato do Orkut. Falamos também sobre a relação

de público e privado na Internet.

No sexto capítulo, explicamos nosso método de trabalho.

No sétimo, nossa análise sobre o Orkut e as relações entre público e privado.

No oitavo algumas reflexões e o encerramento do nosso trabalho.

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2. Racionalidade Tecnológica. 5

Para sobreviver e autoconservar a espécie, o homem, desde os tempos

primevos tenta controlar a natureza através de tecnologias. Este tipo de “avanço”

sobre a natureza, como nos diz Crochik (1998), trouxe uma lista infindável de

vantagens e confortos para o homem ocidental: Um retrospecto da história da civilização ocidental mostra-nos o domínio dos homens sobre o fogo, os animais, os mares e, atualmente sobre o espaço. A medicina caminhou de explicações mitológicas para observações naturais com justificativas racionais, o que lhe permitiu prolongar a sobrevivência e aliviar a dor humana (Crochik, 1998, p.39).

Apesar do conforto que este “avanço” trouxe, devemos estar atentos às

conseqüências dele sobre o homem. Álvaro (2003) vai nos dizer que, ao controlar a

natureza, o homem também teve de ser controlado por esta tecnologia: Como a finalidade da ação humana foi a autoconservação, a intervenção para a qual a tecnologia foi desenvolvida concorda com essa finalidade. Como essa intervenção pressupõe manipulação, a tecnologia está comprometida com a dominação da natureza e do próprio homem (Álvaro, 2003, p.1).

Ao utilizar a tecnologia para dominar a natureza, este homem passa grande

parte do seu tempo ocupado em operá-la e manuseá-la. Desta forma, há uma

inversão de papéis e a tecnologia torna-se o objetivo e o homem o instrumento

encarregado de fazê-la funcionar. Esse cenário torna-se ainda mais evidente com o

surgimento do capitalismo e das indústrias, em que a utilização dos maquinários e

técnicas de administração modificou as formas de trabalho em vários aspectos. Se

antes, grande parte dos homens participava de todo o processo de produção, com a

industrialização, eles passam a executar somente um fragmento deste. Grande parte

do seu tempo é despendida em ações previamente pensada, de maneira

fragmentada e padronizada, visando alcançar maior eficácia produtiva.

As fábricas tipicamente Taylor-fordistas6 do início do século XX ilustram o que

queremos dizer com padronizado e fragmentado. Codo (1995), em um artigo sobre

6 Taylorismo foi desenvolvido por Frederick Winslow Taylor (1856-1915), engenheiro estadunidense, que embora tivesse sido ligado aos setores operacionais da empresa, é considerado o “pai da administração científica”. Foi ele quem elaborou os primeiros estudos essenciais: Fordismo Idealizado pelo empresário estadunidense Henry Ford (1863-1947), fundador da Ford Motor Company, o fordismo se caracteriza por ser um método de produção caracterizado pela produção em série, sendo um aperfeiçoamento do taylorismo.

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saúde e qualidade no ambiente de trabalho, traz um exemplo de como estas

indústrias organizavam a produção: (...) quinze segundos para a realização de tarefas sempre absolutamente iguais; um cronometrista afoito em busca de alguns segundos a mais; a barganha mesquinha pelo tempo; o temível e temido controle de qualidade no final da linha, capaz de responsabilizar a qualquer momento este ou aquele operário por um erro que para ele seria fatal; as mãos que se movem como que desligadas do cérebro, como as pupilas que se dilatam à luz, sem vínculos com a consciência do autor do gesto; as tarefas divididas e divididas as infinitum (Codo p.146).

O homem, então, inserido neste contexto fabril passa a ser mero “executador”

da tecnologia: o planejamento é separado da execução, a produção de um produto é

fragmentada em várias tarefas e executadas por apenas um funcionário de maneira

repetitiva. A produção está previamente pensada. Já se sabe como deve ser feita,

como fazê-la e o tempo que deve ser gasto para a sua produção. E para que tudo

isso funcione exatamente como pré-concebido, surge então o “controle de

qualidade: alguém sempre a postos, vigiando o trabalho dos operários,

determinando se podem ou não e quando podem conversar; como, quanto e quando

fazer; que momentos utilizar (Codo, 1995)”.

Assim, com todo este cenário fabril descrito, podemos pensar que esta

tecnologia pautada na eficácia e controle da produção modificou a vida do homem

não só em relação às formas de trabalho, mas também fora dele. Seu tempo de

lazer e descanso foi organizado de acordo com sua jornada de trabalho. Seu

consumo pelo seu salário, sua convivência com os funcionários da fábrica, seu

trajeto na cidade, de acordo com a localização do trabalho e assim por diante.

Também podemos pensar que, com o crescimento das cidades e a

conseqüente urbanização, a tecnologia manteve sua primazia como nas fábricas. A

vida do homem também passa a ser “ordenada” por ela. Basta pensarmos nos faróis

de trânsito, na eletricidade, nas calçadas, etc. Da mesma forma que nas fábricas,

esta tecnologia é planejada e aplicada visando o controle da massa populacional

crescente. Se nas cidades não há o objetivo direto de aumentar a produção, há o

interesse de manter a ordem e o controle. As formas com que este homem passa a

se relacionar socialmente, seus hábitos e atitudes também são modificados,

tornando seu cotidiano cada vez mais padronizado, fragmentado e uniforme. De

acordo com Crochik (1998), “as diversas esferas sociais passam a ser mediadas

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pelas mesmas categorias que regem a produção material, tais como a uniformidade

e a fragmentação, que visam ao máximo de eficiência com um mínimo de dispêndio

(p. 17)”.

Assim a racionalidade implícita na tecnologia ultrapassa as paredes das

indústrias e permeia as relações do homem com a sociedade, de maneira a

transformá-la. Sua relação com o mundo é freqüentemente mediada e/ou

organizada por um tipo de tecnologia.

Nosso objetivo com este capítulo é que o leitor entenda a importância que a

tecnologia assumiu perante a sociedade e suas conseqüências. Assim como

expusemos, na Introdução, a relação da Racionalidade Tecnológica com o Orkut

seria por si só uma pesquisa. O que queremos dizer com tudo isso é que este

homem, que opera esta tecnologia, perde a noção geral do seu contexto histórico e

do processo de produção geral. Nos termos da teoria crítica, este homem aliena-se,

perdendo a possibilidade de atuar de maneira mais crítica.

Descrevendo o processo de alienação desta maneira, o leitor pode nos

perguntar como esta alienação pode acontecer e o homem agir de maneira tão

passiva? Acontece que este processo não é linear e, por ser alienante, não é claro

para todos. Além disso, há uma idéia de que tecnologia é a ferramenta do progresso

e este tem como finalidade o bem estar comum. Assim como começamos o capítulo,

este avanço sobre a natureza trouxe de fato muitas vantagens para o homem, mas o

que questionamos aqui, e assim entendemos a possibilidade de uma visão um

pouco mais crítica, é o que está por trás deste chamado progresso e do “bem

comum”. Será que é mesmo comum, para todos? Enfim, achamos interessante

explorarmos um pouco mais sobre a Racionalidade Tecnológica, falando agora

pouco sobre esta a ideologia que a sustenta.

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2.1 Ideologia77 da racionalidade tecnológica

Para entender da ideologia que sustenta a racionalidade tecnológica, iremos

abordar dois elementos presentes na racionalidade tecnológica: o positivismo

Comteano, que como método científico colabora com o avanço da forças produtivas

(Crochik, 1998) e a conversão da tecnologia em ideologia. 6A teoria de Comte nasce no século XIX, no seio da sociedade capitalista, dos

ideais liberais burgueses, que tinham como objetivo organizar a natureza e dominá-

la, livrando o homem do caos e do desconhecido, através da razão (Bastos, 2005).

Comte propõe que o mesmo método utilizado nas ciências naturais pode ser

utilizado para estudar o ser humano e os fenômenos sociais. Afirma que o fato social

deve ser tratado como um objeto separado do seu contexto social e de suas

relações mais complexas. O homem que vive nesta sociedade deve ser separado

dela para ser estudado como objeto em si mesmo. Comte propõe que estudando o

indivíduo separadamente, encontrará nele uma estrutura de funcionamento que

explicará em conseqüência o funcionamento da sociedade e se tornará uma verdade

universal. Assim, sua concepção elimina a possibilidade de que o homem se

constitui historicamente e sua relação com a sociedade em que vive. Como se não

houvesse causa sem efeito.

Crochik (1998) vai então afirmar que este método positivo, que separa o

homem da possibilidade de se entender historicamente, confirma a racionalidade da

produção e também impossibilita que este homem tenha a consciência sua

produção:

Se o método científico é fundamental para o controle da natureza e, assim, para a liberdade frente ao mito, quando ele transforma os fenômenos sociais e individuais em natureza a ser entendida para ser previsível, atesta a racionalidade dos processos de produção, pois, a indiferênciação lógica dos objetos submetidos ao método científico, não deixa de corresponder a indiferênciação dos objetos na produção material (Crochik, 1998, p.18).

Assim como o homem perde a capacidade de se reconhecer na sua história e

na relação com a sociedade, também perde a capacidade de se reconhecer através

7 Utilizamos aqui as palavras de Crochik para sustentar o conceito de ideologia: (...) Um conjunto de representações, pensamentos e crenças, formado com base em uma realidade que se apresenta como ilusória, sendo ela própria atividade social, que tem como função ocultar as contradições da realidade, que envolvem, de um lado, a força de trabalho e, de outro lado, os donos do meio de produção; de um lado, as relações sociais e, de outro, a natureza. Essa ocultação ocorre sob a forma de justificação da realidade estabelecida, que, dessa forma, a perpetua.(pág 40). Para aprofundar ainda mais o conceito: Chauí, M. O que é Ideologia. São Paulo, Brasiliense, 1981.

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do processo de criação e elaboração de seu produto. Desta forma, a conseqüência

do método positivo é que se o pensamento é destacado do todo, ele perde a

capacidade de compreensão, de sentido. E assim, qualquer resultado encontrado

através deste método torna-se uma realidade universalizada e irrefutável. A verdade

passa ser domínio exclusivo da ciência positiva e dos poucos que se utilizam dela.

Concordamos novamente com Crochik (1998, p.34) quando nos diz que, “a reflexão

cede sua produtividade a mera receptividade. Os fatos que se apresentam tal qual

são na aparência devem ser entendidos em si mesmos”.

A razão e a reflexão são destituídas do homem comum, que perde a

possibilidade de entendimento e sentido da realidade que vive e do seu contexto

histórico.

De acordo com a teoria crítica, é na relação dialética entre homem e natureza

que existe a possibilidade de emergirem contradições e conseqüente reflexão sobre

ambas. Na teoria positiva estas contradições são consideradas um erro, e se elas

existem não podem ser verídicas (Crochik, 1998). Podemos, portanto, pensar que o

resultado desta ciência positiva se torna um ideal que deve ser alcançado, pois

exprime uma verdade perfeita, sem contradições.

O trabalho organizado positivamente fará então com que o homem comum

deixe de perceber a si mesmo e o fruto do seu trabalho, já que está alienado.

Segundo Crochik (1998, p.30) “[...] porque esse não o faz para si, e é alienado do

patrão, porque esse não pode se reconhecer no objeto construído, além de não se

apropriar de seu valor, mas apenas de seu valor de troca”.

Esta mesma ciência positiva que descrevemos acima, que acredita nesta

separação entre o homem e a sociedade, causa e efeito, também acredita na

imparcialidade e neutralidade entre o sujeito do conhecimento (cientistas) e o objeto.

Como se fosse possível este homem que conhece separar-se totalmente (inclusive

emocionalmente) do seu objeto de conhecimento. Esta crença na imparcialidade

compromete o entendimento do homem em relação às verdadeiras intenções dela.

Chauí (2002) discute que o senso-comum entende a ciência e a tecnologia

aplicada como imparcial e desinteressada de qualquer outro objetivo que não o bem

da humanidade e a resolução dos problemas dela. E quando a entendem desta

forma, deixam de perceber que as ciências e as tecnologias por ela aplicada são

instrumentos econômicos e políticos:

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(...) o senso comum vê a ciência desligada do contexto e das condições de sua realização e de suas finalidades. Eis porque tende a acreditar na neutralidade científica, na idéia de que o único compromisso da ciência é o conhecimento verdadeiro e desinteressado e a solução correta de nossos problemas (Chauí, 2002, p.282).

Além disso, Chauí (2002) diz que o senso comum, além de não perceber a

relação entre a ciência e os meios produtivos, reconhece a tecnologia apenas pelos

seus resultados mais imediatos, que podem ser utilizados diretamente, como vídeo

game, televisão a cabo, etc. E como para utilizá-los, recebemos instruções e

informações um tanto complexas, tendemos a misturar o conhecimento cientifico

com seus efeitos tecnológicos. Preocupados com o consumo destes, o senso

comum perde a possibilidade de reconhecer suas origens: Não percebemos que as pesquisas científicas são financiadas por empresas e governos, demandando grandes somas de recursos que retornam, graças aos resultados obtidos, na forma de lucro e poder para os agentes financiadores (Chauí, 2002, p.285).

Perdemos a consciência do poder econômico, político e também social que

ciência e a tecnologia possuem: Uma das características mais novas da ciência está em que as pesquisas científicas passaram a fazer parte das forças produtivas da sociedade, isto é, da economia. A automação, a informatização, a telecomunicação determinam formas de poder econômico, modos de organizar o trabalho industrial e os serviços, criam profissões e ocupações novas, destroem profissões e ocupações antigas, introduzem a velocidade na produção de mercadorias e em sua distribuição e consumo, modificando padrões industriais, comerciais e estilos de vida (Chauí, 2002, p.286).

Assim, quando a ciência e a tecnologia perdem o propósito de auxiliar a

adaptação humana, no sentido de aumentar suas capacidades em relação à

natureza, tornando-se uma questão econômica e política, podemos dizer que estas

se converteram em ideologia. Já não têm o propósito e a finalidade do bem comum e

sim de dominação, poder e exploração.

Além destes aspectos da ideologia da racionalidade tecnológica descritos

neste capítulo, há mais um que gostaríamos de falar um pouco, considerando

complementar para a reflexão sobre a racionalidade tecnológica. Convidamos o

leitor a entender um pouco mais sobre a relação da tecnologia, do homem e da

máquina.

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2.2 Tecnologia, homem e máquina.

Se o objetivo do capitalismo é o aumento da produção de bens materiais,

além de organizar o trabalho de forma racional, foi necessário criar novas

tecnologias e introduzir as máquinas no cenário produtivo.

Para produzir em quantidade e com velocidade, de maneira mais rentável, o

sistema capitalista industrial utilizou-se de tecnologia deixando de lado qualquer

outra forma de produção (Álvaro, 2003).

Se antes o trabalhador usava ferramentas para produzir, após o período

industrial houve uma inversão e este homem passa a servir as máquinas. Nesta

inversão, acentua-se a alienação do homem em relação ao seu trabalho, como nos

diz Crochik: Apresentando-se independentemente de seus usos, a máquina converte-se “em si”, ocultando o porque foi feita, ao mesmo tempo que, enquanto mercadoria, oculta o processo de produção que a gerou. (Crochik, 1998, p.42).

Aliada ao discurso positivista, a tecnologia ao longo do tempo passou a

representar progresso tecnológico. Um troféu do homem em relação à dominação da

natureza. Como se esta fosse o resultado da organização como um todo, natural da

mesma forma que as relações sociais, a utilização da técnica. Assim nos ensina

Marcuse (1969, p.151): “A máquina é indiferente aos usos sociais que lhe são

dados, desde que tais usos permaneçam dentro de suas possibilidades técnicas”.

Naturaliza-se, assim, a tecnologia como se o que define sua utilização é o homem e

a utilidade que este fará dela. Como se uma máquina ou um computador pudessem

servir da mesma forma um homem e suas diferentes “intenções”. Como se esta

estivesse disponível para o homem comum e fosse um instrumento criado de

maneira independente das intenções dos seus criadores. Acontece que na sua

criação já está implícita sua utilização. Porém, como lembrará Marcuse (1969,

p.150): “Quando a técnica se torna a forma universal de produção material,

circunscreve toda uma cultura; projeta uma totalidade histórica - um mundo.”

Queremos deixar claro que não estamos de forma alguma questionando o

grande benefício e conforto que a tecnologia e seus aparatos trouxeram à

humanidade. Mas faz-se necessário fazer um contraponto nesta relação da

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tecnologia, do homem e da máquina, para, quem sabe, provocar uma reflexão sobre

estas, sem que naturalizemos sua utilização. Para nós, não há como estudarmos as

formas de tecnologia e a sua relação com o homem, sem levarmos em conta seu

contexto histórico e cultural.

Assim, a utilização das máquinas, tecnologias e afins, tornou-se uma

constante na vida do homem. Principalmente após a 2ª guerra mundial, que

determinou uma grande aceleração no desenvolvimento delas.

2.3 Aceleração tecnológica, econômica e Globalização.

A 2ª guerra mundial foi um marco divisor entre a chamada era industrial e

pós-industrial, principalmente pelo grande desenvolvimento dos setores de serviços,

comunicações e informações (Sevcenko, 2001).

Durante a 2ª guerra, o adversário que tivesse em mãos uma tecnologia

inovadora teria vantagens em relação ao concorrente. Durante e após o período da

guerra, novas técnicas foram criadas e utilizadas pela população em geral, em um

curto espaço de tempo. Aceleração que continua até os dias de hoje e alcança tal

velocidade, que um indivíduo seria incapaz de acompanhar todas essas inovações

por completo.

Com o fim da guerra, os EUA ficaram numa posição privilegiada em relação

aos outros países. Sua moeda, o dólar, tornou-se padrão internacional. Sua

hegemonia tornou-se ainda mais consolidada com os “tratados multilaterais”

destinados a garantir a estabilidade dos mercados e a reduzir práticas protecionistas

e barreiras alfandegárias (Sevcenko, 2001). Seu crescimento econômico foi enorme.

Outro marco fundamental que se soma à aceleração tecnológica, foi que em

meados dos anos 70 os EUA decidiram abandonar o padrão ouro, tornando-se livres

economicamente dos controles locais políticos e financeiros do Banco Central. Como

nos diz Sevcenko, os resultados destas mudanças favoreceram principalmente as

empresas multinacionais, que puderam se multiplicar e exercer um poder de

barganha frente a outros países e aos próprios governos internacionais: Foi com as medidas de liberação dos anos 70 que elas encontraram o campo fértil e ideal para a sua difusão sistemática por todo o mundo. É daí que data o fenômeno que foi propriamente denominado “era da globalização” (Sevcenko, 2001 p. 28).

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Podemos pensar que esta globalização, aliada à multiplicação das redes de

computadores e comunicação, tornou estas empresas grandes hegemonias. A

aceleração tecnológica e a organização dos negócios foram tão rápidas que se

esquivaram a quaisquer controles, fiscalizações, fugindo do domínio e participação

dos órgãos políticos.

As grandes corporações ganharam grande mobilidade, podendo mudar para

outras regiões quando desejassem. Se as condições locais não fossem vantajosas,

procuravam maiores vantagens fiscais, e baixos custos de mão-de-obra. Assim, o

Estado e a sociedade ficam “a mercê” dessas empresas. Até os sindicatos dos

operários perdem seu poder de negociação, e as conseqüências desta globalização

reduzem-se no “aumento da marginalidade, da violência, do declínio do espaço

público e da convivência democrática” como nos diz Sevcenko (2001, p. 32).

Além desta “tradução prática”, outra conseqüência dessa hegemonia

poderosa das corporações é que seu ganho, seu lucro, já não é mais só com o

produto fabricado e, sim, com lucro imediato das ações e de seus acionistas

(Sevcenko, 2001). E para isso também houve uma mudança no funcionamento

interno dessas corporações: processos de enxugamento, racionalização de

processos, reengenharias, fusões, entre outros artifícios visando sempre o lucro

imediato.

Todas estas mudanças econômicas que ilustramos aqui permitem que

imaginemos como o comportamento humano, os valores morais e culturais também

tiveram que se transformar com o tempo. Transformações estas potencializadas pela

publicidade e o consumismo, como confirma Sevcenko: Esses fatores foram a publicidade e o consumismo que, fortalecidos pela desregulação dos mercados, pela revolução nas comunicações e pela concentração de renda, se tornaram a ideologia por excelência das sociedades neoliberais e o estofo de ilusões que veio preencher o vazio do “pensamento único” (Sevcenko, 2001 p. 47).

Até agora, fizemos um breve percurso através de temas pertinentes à

racionalidade tecnológica. Nosso objetivo não é de nos aprofundar em cada tema,

mas situar o leitor, através da história da evolução tecnológica e as principais

influências e conseqüências na vida do ser humano. Consideramos este percurso e

os temas abordados extremamente relevantes para que possamos entender nosso

objeto de estudo: o Orkut. Assim, convidamos o leitor a entender mais um tema

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pertinente aos nossos estudos e, como vimos, bastante influenciador no

comportamento social: a indústria cultural.

2.4 Indústria cultural Nos capítulos anteriores estivemos falando sobre a ideologia que permeia as

relações de trabalho, as mudanças econômicas e tecnológicas que surgiram com a

globalização e que acentuaram a impossibilidade do homem de adquirir uma

consciência crítica da sociedade. Neste capítulo, falaremos de mais um conceito que

nos ajudará a contextualizar historicamente nosso objeto de estudos: A indústria

cultural. Um conceito criado por Adorno que difere do conceito de Cultura de Massa

(Álvaro, 2003).

A indústria cultural nasce no seio de todas as mudanças econômicas e

tecnológicas que discorremos até o momento. Com a migração de grande parte da

população rural para as cidades, e com as mudanças que a tecnologia e a

industrialização impunham ao cotidiano das pessoas, foram se abrindo espaços nos

finais de semana, feriados, folgas e algum dinheiro para gastar (Sevcenko, 2001).

Logo, a lógica industrial utilizada em bens de consumo, passou a ser utilizada

também no lazer e entretenimento: Como a ópera, o teatro e os salões de belas artes eram luxos reservados aos abastados, alguns empresários vislumbraram a oportunidade de investir nas duas formas baratas de lazer possibilitadas pelo desenvolvimento da eletricidade: o cinema e o parque de diversões (Sevcenko, 2001 p. 77).

Assim, como nos diz Sevcenko, que as inovações do desenvolvimento da

eletricidade possibilitaram a existência do cinema, do parque de diversões, também

propiciaram um excelente meio de ganho, em grande escala. Outras evoluções

tecnológicas no setor de entretenimento passaram a influenciar os moradores

urbanos: as músicas tocadas na eletrolas passaram das casas para os salões de

festas, teatros, etc. A transmissão de rádio, de aparelhos individuais, para as ruas,

carros e restaurantes. Todas estas mudanças, não só da vida industrial, mas

também agora das horas de lazer dos trabalhadores, passaram a influenciar o

cotidiano das pessoas. Sobre isso nos diz Sevcenko (2001, p. 76): ”O sistema

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cultural inteiro adquiria uma nova consistência, na medida em que a eletrônica

permitia uma interação sinérgica entre todos estes recursos”.

Para Adorno, as conseqüências da indústria cultural são muito mais

profundas do que pensá-la somente como uma indústria produtiva. Além de vender

cultura, ela impossibilita que o homem comum possa criar realmente uma cultura.

Faz com este fique identificado com uma cultura pré-estabelecida pela lógica da

dominação. Assim nos diz Adorno: Por hora a técnica da indústria cultural só chegou à estandardização e à produção em série, sacrificando aquilo pelo qual a lógica da obra se distinguia da lógica do sistema social. Mas isso não deve ser atribuído a uma lei de desenvolvimento da técnica enquanto tal, mas à função na economia contemporânea. A necessidade, que talvez pudesse fugir ao controle central, já esta reprimida pelo controle da consciência individual (Adorno, 1947 p.9).

Segundo o autor, as obras de arte que eram expressões individuais contra a

organização, perderam sua principal característica de possibilitarem uma tensão

entre o particular e social, transformando-se, com a indústria cultural, em arte para

assimilação da cultura pré-estabelecida pela dominação: A indústria cultural se desenvolveu com a primazia dos efeitos, da performance tangível, do particular técnico sobre a obra, que outrora trazia a idéia e com essa foi liquidada. O particular, ao emancipar-se, tornara-se rebelde, e se erigia, desde o Romantismo até o Expressionismo, como expressão autônoma, como revolta contra a organização (Adorno, 1947 p.14).

Portanto, com a indústria cultural, perde-se a possibilidade de “revoltar-se”

contra a organização social, através do impacto que estas obras poderiam causar no

homem, gerando uma consciência transformadora. As obras de arte passam a ter

valor de produto. “Algo para ser consumido e não para ser conhecido, fruído” (Chauí,

2002, p.330).

Assim como as obras de arte, a cultura popular, nascida espontaneamente

através das relações humanas, passa a desaparecer e perder lugar para uma cultura

criada dentro de um ambiente urbano, produzida por uma indústria de cultura. O

cotidiano destas pessoas modificado pela vida operária e urbana acaba mudando as

formas de transmissão cultural de valores, a forma como antes em contato direto

com a natureza podiam olhá-la e modificá-la.

Esta impossibilidade de transformação que gera a indústria cultural, segundo

Adorno, advém da idéia de progresso, de ordem e harmonia que ela passa para o

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homem comum. “A cultura contemporânea a tudo confere um ar de semelhança.

Filmes, rádio e semanários constituem um sistema. Cada setor se harmoniza em si e

todos entre si” (Adorno, 1947,p.7). Sua inserção na vida do homem é tamanha que

sobra pouco espaço para que o homem crie formas novas, individuais e

espontâneas de cultura. Como nos diz Álvaro (2003, p.16) sobre a indústria cultural:

“Nesta os diversos meios de expressão somam-se deixando quase nenhum espaço

para a liberdade, para o pensamento autônomo, para a originalidade”.

Sobre esta harmonização dos diversos meios de expressão, Adorno irá dizer

que também “meios técnicos tendem a uma crescente uniformidade recíproca”

(Adorno, 1947, p.12). Em seu texto ele fala especificamente sobre a síntese da

televisão com o rádio e o cinema, mas aqui fazemos uma analogia com a Internet,

considerando que esta tem como característica a integração do vídeo, da imagem,

da animação, etc, num só meio de comunicação de massa. Esta integração,

segundo o autor intensificaria o “empobrecimento dos materiais estéticos” e ainda

mais a harmonização dos diferentes meios de produção: A televisão tende a uma síntese do rádio e do cinema, retardada enquanto os interessados ainda não tenham negociado um acordo satisfatório, mas cujas possibilidades ilimitadas prometem intensificar a tal ponto o empobrecimento dos materiais estéticos que a identidade apenas ligeiramente mascarada de todos os produtos da indústria cultural já amanhã poderá triunfar abertamente (Adorno, 1947 p.12).

Adorno vai dizer ainda que além de harmonizar os meios de expressão, a

indústria cultural faz com que o homem perca a possibilidade de refletir, quando

entrega para ele produtos prontos, já pensados e classificados. Tudo está

classificado e esquematizado, o final já está revelado, não há nada para se

descobrir. Este “esquematismo” como diz ele, é “um primeiro serviço ao cliente”

(1947,p.13). E ainda diz que “para o consumidor, não há mais nada a classificar que

o esquematismo da produção já não tenha antecipadamente classificado”

(1947,p.13). O homem então permanece em posição de expectador.

Outro ponto importante sobre a indústria cultural é que, enquanto sistema de

dominação, mantém sua hegemonia, criando necessidades para o homem em forma

de produtos prontos. O consumo destes passa a ser equiparado à diversão. E

“divertir-se significa estar de acordo” (Adorno,1947,p.41). Em outras palavras,

divertir-se para o homem comum significa não pensar, fugir de todo incômodo,

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desconforto que a realidade possa lhe causar. O prazer significa nenhum esforço e

extingue a oportunidade do homem de entrar em contato com outra realidade, que

lhe dê condições para um discernimento crítico. Como nos diz Adorno: Divertir-se significa que não devemos pensar, que devemos esquecer a dor, mesmo onde ela se mostra. Na base do divertimento planta-se a impotência. É, de fato, fuga, mas não como pretende, fuga da realidade perversa, mas sim do último grão de resistência que a realidade ainda pode haver deixado. A libertação prometida pelo entretenimento é a do pensamento como negação (Adorno, 1947 p.41).

Com todo este cenário da indústria cultural descrito acima, podemos pensar e

indagar que as formas culturais populares não deixaram de existir. De certa forma,

as conhecemos e ainda reservamos alguns traços delas em nossas vidas. O que

ainda ressaltamos é que na maioria são formas culturais populares comunicadas em

massa, através de formas tecnológicas e padronizadas. Sobre esta cultura

industrializada, Sevcenko faz uma síntese que nos ajudará a entender melhor este

pensamento: Subsistem ainda elementos da cultura popular, que são metodicamente selecionados e incorporados pela indústria do entretenimento, mas eles estão descontextualizados, neutralizados e encapsulados em doses módicas, para uso moderado, nas horas apropriadas. Seu fim não é o êxtase espiritual dos rituais populares tradicionais, mas propiciar a seres solitários, exauridos e anônimos, a identificação com as sensações do momento e com os astros, estrelas e personalidades do mundo glamouroso das comunicações. Além, é claro, de preencher o vazio de suas vidas emocionais e o tédio e rotinas mecânicas com a vertigem dos transes sensoriais e experiências virtuais de potencialização, multiplicação e superação dos limites de tempo e espaço. Tudo calculado, compactado e servido ao custo de um tostão (Sevcenko, 2001 p. 79).

Assim, discorrido o cenário social influenciado pelo surgimento da indústria

cultural, abrimos espaço para que o leitor conheça mais sobre o surgimento da

Internet e sua história.

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3. Conhecendo a Internet

Para compreendermos um pouco mais sobre a Internet será necessário

observarmos cuidadosamente as raízes de onde provém o seu surgimento.7 “A

historia da Internet serve para compreendermos a sua evolução posterior” (Castells,

2004 p. 24).8

O contexto cultural e o momento histórico no qual surgiu a Internet é um dos

fatores propulsores que viabilizaram o desenvolvimento da Rede de computadores

na sociedade norte-americana.

Durante as décadas de 60 e 70, russos e americanos disputavam a

supremacia militar que marcou o apogeu da guerra fria e, para garantir a conquista

diante do adversário, ambos os governos investiam em tecnologias de uso militar.

Armas inteligentes e um sistema de defesa capaz de resistir a um possível ataque

nuclear era uma das ambições dos americanos. Já os russos, investiram no bem-

sucedido programa espacial e, já em 1957, deram um passo importante ao colocar

em órbita o satélite espacial Sputnik8. Segundo Castells (2004), foi este

acontecimento que mobilizou o departamento de defesa dos Estados Unidos a criar

um ambicioso projeto tecnológico denominado: Arpanet 9. O objetivo inicial era estabelecer a comunicação entre o centro de comando e

as bases militares, unido-os através de uma rede de computadores. Um sistema de

comunicação inovador no qual as informações pudessem ser transmitidas de forma

rápida e segura.

3.1 A Arpanet

Inicialmente idealizado por Paul Baran, este sistema de comunicação,

revolucionário para os padrões da época, marcou o inicio de um novo tempo no

setor das telecomunicações e da informática interativa. Por isso, é nesta Rede

Arpanet que repousam as bases da Internet e, embora restrita ao uso militar e

8 O Sputnik era uma esfera de aproximadamente 50 cm e pesando 83,6 kg. Ele não tinha nenhuma função, a não ser transmitir um sinal de rádio, "beep", que podia ser sintonizado por qualquer radio-amador. O satélite orbitou a Terra por seis meses antes de cair. 9 Arpanet, acrônimo em inglês de Advanced Research Projects Agency Network (ARPANET) do Departameto de Defesa dos Estados Unidos da América, foi a primeira rede operacional de computadores à base de comutação de pacotes, e o precursor da Internet.

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acadêmico, esta rede, segundo Castells, as características principais que

viabilizariam o desenvolvimento da Internet. 9 A Arpanet continha três princípios sobre os quais ainda hoje opera a Internet: Uma estrutura reticular, um poder de ligação distribuído entre os diversos nós e uma redundância de funções na rede, para minimizar o risco de corte nas ligações. Estas características representavam a resposta às necessidades militares de segurança: flexibilidade, ausência de um centro de comando e a máxima autonomia em cada nó (Castells, 2004, p. 34).

Estas características verticais da Arpanet propiciaram a criação de um canal

aberto, ou seja, havia grandes possibilidades de conectar a Rede Arpanet a outras

Redes e isto foi possível graças ao protocolo de Rede TCP/IP (TCP: Transport

Control Protocol e IP: Internet Protocol), desenvolvido por Vinton Cerf e Robert Kahn

em 1974. O Protocolo é uma linguagem que possibilita a comunicação entre

computadores ligados em rede, ou seja, a maneira como são entendidos os dados

enviados e recebidos. No protocolo TCP/IP, cada máquina terá sua identidade

própria e única na rede chamada de Endereço IP (Castells, 2004).

Para muitos, este protocolo não só possibilitou a ligação entre as redes, mas

também marcou o início de sistema padronizado na Internet que futuramente viria

beneficiar o monopólio empresarial das empresas de softwares10. Este é o caso da

Microsoft, do mega empresário americano Bill Gates, que teve a idéia de integrar o

protocolo TCP/IP ao navegador Internet Explorer11 que, por sua vez, está

obrigatoriamente ligado ao programa Windows12, desde então o software mais

vendido do mundo.

3.2 A sociedade em Rede. A Arpanet foi apenas o inicio, o projeto piloto a partir do qual se consolidaria a

comunicação interativa realizada e mediada pelo computador. Esta tecnologia foi se

tornando cada vez mais objeto de estudo em vários outros centros e universidades

mundo afora, e no meio acadêmico o debate é extenso, isto porque, com a

prosperidade da Internet, surgiu também uma linha divisória entre vários pensadores

10 Software, logicial ou programa de computador é uma sequência de instruções a serem seguidas e/ou executadas, na manipulação, redirecionamento ou modificação de um dado/informação ou acontecimento. 11 O Internet Explorer, também conhecido como IE ou MSIE, é um navegador de licença proprietária produzido inicialmente pela Microsoft em 23 de agosto de 1995. 12 Windows é um sistema operacional extremamente popular, criado pela Microsoft, empresa fundada por Bill Gates e Paul Allen.

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que estudam o impacto que essa tecnologia causou e vem causando nas relações

humanas. Atualmente, temos uma corrente teórica que exalta o advento da Internet

como um fenômeno da capacidade humana de sistematizar e coordenar as funções

de modo a tornar as faculdades do corpo além do limite do espaço e do tempo. Isto

é o que nos diz Farah, (2004) ao comentar a ascensão da Internet da seguinte

maneira:

A Arpanet, primórdio da Internet, surgiu com este propósito. A rede é um sistema que dá forma e sentido ao processo de formação de equipes, sob o ponto de vista da comunicação do conhecimento, a equipe, os grupos, as sociedades estão mais firmemente consolidadas do que a tempos atrás. Enquanto um único pensador da antiguidade retinha uma quantidade de informação relevante que fazia dele um gênio, a equipe hoje faz fluir uma quantidade maior de informação – é a equipe que é ou não genial. (Farah, 2004, p. 84).

Nesta mesma linha teórica, Lévy (2000) aponta o acontecimento da revolução

industrial e a conquista do capitalismo no ocidente como início de um novo tempo na

relação do homem com a informação e, com o conhecimento propriamente dito

(Levy, 2000). O autor considera que o surgimento da Internet ocasionou uma

ampliação substancial nas relações humanas, porque, através da rede, o homem

pode almejar uma linguagem universal, os entraves físicos e ideológicos que

limitavam a comunicação foram libertados pelo surgimento dos canais de

comunicação que se expandem pela Internet.

Em contrapartida ao enfoque otimista de Lévy, Virilio (1993) indaga que “No

século XIX, assiste-se, portanto, a um processo de reagrupamento de atividades

industriais sobre o qual a imprensa instala discretamente um controle” (p. 45). Ou

seja, os meios de comunicação aproveitaram a praticidade da Rede para alargar os

seus domínios. Por exemplo: Um jornal impresso com edição diária e que cobria

uma população local, poderia ser atualizado on-line e ser acessado por qualquer

pessoal em qualquer parte de planeta.

Para nós, é incontestável a transformação que a Internet gerou nas redes de

comunicações, mas concordamos com Virilio quando comenta que o sistema

organizado de dominação veio de carona com a Internet. Isto porque, ao navegar

por um ambiente web13, o usuário está limitado por um espaço que foi

estrategicamente pensado, planejado por um outro indivíduo que, provavelmente,

trabalha em uma instituição privada. É justamente neste ponto que acreditamos que

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a Internet, mais do que um instrumento facilitador da aprendizagem e do progresso

está fadado aos ideais de dominação, pois na ilusão de liberdade o sujeito se

submete às regras e padrões de um software. Sua comunicação está limitada dentro

de um formato pré-estabelecido de ação calculada. Tal comprovação é observada

ao analisarmos o conceito de software: é uma seqüência de instruções a serem

seguidas e/ou executadas na manipulação, redirecionamento, modificação de um

dado/informação ou acontecimento. 10

3.3 A espaçonave da Informação.

Independentemente do seu uso militar, a Internet nasceu da necessidade de

transmitir e receber informações. Podemos com isso pensar que a comunicação

sempre foi uma premissa da Internet. Se o rádio e a televisão ocuparam o status de

veículos de Informação, a criação da World Wide Web14, por Benners-Lee, em 1990,

fez da Internet a Espaçonave da Informação. Para Castells, era o inicio da era

digital: Benners-Lee definiu e elaborou um software que permitia tirar e introduzir informações de e em qualquer computador ligado através da Internet. E em colaboração com Robert Cailliau, construíram o programa navegador/editor (browser/editor), em dezembro de 1990, e chamaram World Wide Web. A este sistema de Hipertexto, deste modo, no inicio dos anos 90 a Internet já estava totalmente privatizada e a sua arquitetura técnica aberta ao público permitia a ligação em rede de todas as redes de informáticas de qualquer ponto do planeta. (CASTELLS, 2004, p. 32).

A World Wide Web uniu as redes do mundo inteiro e os usuários da Internet

podiam conversar de forma on-line a partir de qualquer parte do mundo. Desde sua

criação até os dias atuais, a Internet vem se inserindo cada vez mais no cotidiano

das pessoas. Sua utilização modificou o fluxo de trabalho e a vida da maioria das

pessoas. Na busca de trabalho de pesquisas, no trâmite das informações

financeiras, na velocidade das informações em jornais e revistas, no relacionamento

entre pessoas, no lazer etc. E é neste contexto que surge o Orkut, um dos diversos

serviços da rede sob a forma de entretenimento.

13 Web" ou "WWW" para encurtar -- ("teia do tamanho do mundo", traduzindo literalmente) é uma rede de computadores na Internet que fornece informação em forma de hipertexto. 14 World Wide Web, é o mesmo que Web.

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4. Orkut:

O Orkut é um site de relacionamento on-line, criado e mantido pela maior

empresa de pesquisa on-line da Internet, o Google. Segundo dados da Folha de São

Paulo, esta empresa já foi chamada de “memória do mundo” e “barômetro da

humanidade”, justamente por “abrigar e ter acesso a tantas e tão íntimas

informações de tantos internautas” (Dávila, 2005A).

A história da sua criação tem várias versões. A oficial é de que o Google tem

como política interna dividir o tempo de trabalho de seus funcionários em três partes:

tempo para as tarefas cotidianas, tempo para lazer e tempo para desenvolvimento

de idéias pessoais. E foi neste último que Orkut Buyukkokten, 30 anos, criou o site

de relacionamentos virtuais, batizando o projeto com o próprio nome.

O site foi lançado no início de 2004 e calcula-se que hoje há em média 6

milhões de pessoas com páginas e perfis disponíveis. Deste universo, 71,92%, em

média, são usuários brasileiros. O sucesso nacional é tamanho que a cerca de

quatro meses, a empresa disponibilizou uma versão em português do Orkut (Dávila,

2005B).

Há mais de um ano, temos acompanhado através de jornais, televisão e

revistas as mais diversas matérias sobre o Orkut. O mais surpreendente é que não

são só assuntos tecnicistas, pertinentes às novidades do serviço, mudanças de

configurações etc. São matérias relacionadas a acontecimentos importantes que têm

a participação do Orkut em suas histórias ou eventos.

Tornou-se freqüente as intervenções das polícias (federal e estaduais) no site.

Comumentemente estas instituições têm buscado informações no Orkut para auxiliar

as investigações de crimes, praticados externamente, através do Orkut, ou no

próprio site de relacionamento. Em meados de junho deste ano, um garoto de 18

anos foi o primeiro usuário brasileiro do site a ser identificado como autor de crime

de racismo. Tal garoto criou uma comunidade com o título “Sou contra as cotas pra

pretos” (sic), em que dizia que era contra as vagas disponibilizadas para afro

descendentes nas universidades e que “o lugar desses macacos sujos é na floresta;

e não na faculdade” (Tomaz, 2005). Já em agosto deste ano, um taxista morador do

Rio de Janeiro foi preso acusado de fazer parte de uma quadrilha que utilizava o

Orkut para vender drogas. Em março, a polícia prendeu 2 irmãos moradores da

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cidade de Ribeirão Preto, acusados de mandar matar um colega que havia postado

numa comunidade do Orkut “mensagens que revelavam suas preferências sexuais”

(Magalhães, 2005).

Não só a polícia utiliza as informações ali disponíveis. Os profissionais de

recursos humanos de grandes empresas têm utilizado o site como uma ferramenta

de recrutamento e avaliação de funcionários. Segundo uma reportagem da revista

digital “Sua Carreira”, as empresas não só usam para contratar, como também para

demitir: Foi o que ocorreu com a gerente de telemarketing Clarissa

Sormani. Uma funcionária certa vez entregou a ela um atestado médico por estar com o braço quebrado. “Ela até veio de gesso”, diz. A funcionária, aparentemente impossibilitada de trabalhar, faltou durante uma semana. “Um dia, aleatoriamente, entrei na página dela e, nos recados, vi amigos perguntando ‘como estava a praia'. E ela ainda respondia dizendo que tudo havia dado certo, ou seja, a mentira do braço quebrado havia colado”, conta a gerente. Mas foi por pouco tempo. Clarissa esperou que ela retornasse ao trabalho para, então, demiti-la (Janini, 2005)

Através destes exemplos, podemos perceber que a utilização do Orkut,

principalmente pelos brasileiros, tem atualmente uma importante dimensão social,

fazendo parte da história de muitos usuários, atuando como poderosa mídia de

comunicação. Participação tão efetiva, que a novela recentemente exibida pela rede

Globo, teve seu conteúdo alterado pela autora Glória Perez, devido as mensagens

recebidas em sua página no Orkut. Segundo a reportagem do jornal: Como o rodeio é um dos principais assuntos da trama, Glória

Perez recebeu mensagens agressivas em sua página no Orkut (site de relacionamentos na Internet) com fotos de sua filha Daniella Perez morta. As 8.000 mensagens vieram de um grupo que se intitula “Defensores de Animais”. A escritora deu queixa à polícia (Reipert, 2005).

As informações pessoais e comunidades disponíveis parecem ser infinitas e

inimagináveis, à primeira vista. Não surpreendem só em relação ao número, mas na

diversidade de temas. Quem iria imaginar, por exemplo, que Suzane Von Richthofen

- a adolescente que junto do namorado e cunhado matou os pais e chocou milhares

de pessoas - tivesse comunidades criadas por fãs como “Eu amo essa menina”, “Eu

amo a Suzane Richthofen” etc. Juntando todas são mais de 400 pessoas

adicionadas nas comunidades de apoio a Suzane.

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Apesar dos usuários possuírem um recurso de permissões e restrições, em

que escolhem quais pessoas (amigos, conhecidos, desconhecidos) poderão ver

suas informações, grande parte delas estão liberadas para qualquer pessoa

cadastrada consultar. A única restrição no caso é receber um convite por e-mail. Se

não fosse desta maneira, a polícia ou as grandes corporações, conforme citamos,

não conseguiriam utilizar o Orkut como uma ferramenta de trabalho. Os usuários

colocam fotos da família, amigos, namorados, cachorro etc. Detalhes sobre seus

gostos e costumes, e o mais impressionante é que em muitos é possível encontrar

dados de localização, como e-mail, telefone e até endereço residencial.

Em uma entrevista concedida a Folha de São Paulo, Orkut Buyukkokten diz

que “Não faz parte de seus planos vender as informações contidas nas páginas

pessoais para empresas”, dados e hábitos “que valeriam ouro na publicidade virtual”

(Dávila, 2005B). No contrato de utilização do Orkut há cláusulas, em inglês, que

garantem que nada será feito pela empresa sem aviso prévio e consentimento do

usuário. Mas o que garante que uma empresa tão visada quanto o Google, não

tenha sua base de dados copiada por hackers16, concorrentes ou por funcionários

insatisfeitos?

Em 2004, foi criado o "Orkut Personal Network GeoMapper". Site que permite

que o usuário veja geograficamente as ligações entre ele e os amigos do Orkut, e as

relações entre os amigos dos amigos. O site, que começou a gerar polêmica

justamente pela discussão de privacidade, só funciona para usuários norte-

americanos. Mas a grande questão é que o GeoMapper só pôde ser desenvolvido

pois um colega de Rolan Yang conseguiu uma cópia do banco de dados do site de

relacionamentos (Folha de São Paulo Online, 2005A).

Pesquisando sobre o assunto, descobrimos que a empresa Google tem

crescido seu número de serviços na Internet. Além do Orkut, e do polêmico

GeoMapper, o Google tem o maior site de pesquisa na Internet e há pouco tempo

lançou um serviço chamado Google Earth17. Neste serviço o usuário instala um

programa local, e pode visualizar, através de fotos de satélites, todas as ruas e

casas do mundo. Apesar das imagens não serem atualizadas diariamente, o serviço

tem recebido críticas e protestos de governos asiáticos, como, por exemplo, a Coréia

do Sul: O argumento do governo sul-coreano é o de que o serviço não só mostra como fornece a localização exata em latitude e longitude, por

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exemplo, da Casa Azul, a residência presidencial oficial, assim como de bases militares do país, que tecnicamente continua em guerra com seu vizinho, a ultrafechada Coréia do Norte. (Dávila, 2005C).

Com todos estes serviços e informações tão relevantes, o Google passa a

acumular e monopolizar uma grande quantidade de informações, que além de correr

perigo em relação a ataques virtuais, pode cruzar todas as informações dos serviços

prestados e ter em mãos a descrição completa de milhares de pessoas. Imaginem o

cruzamento dos dados pessoais do Orkut, com o do Google (site de pesquisa), as

relações do GeoMapper e por final do Google Earth.

Lendo o contrato de privacidade do Google para todos os seus serviços

encontramos cláusulas que declaram esta possibilidade: Nós podemos processar informações pessoais para fornecer nossos próprios serviços. Em alguns casos, nós podemos processar informações pessoais em nome de e de acordo com as instruções de terceiros, tais como nossos parceiros de propaganda (Google, 2005).

Quando você usa os serviços do Google, os nossos servidores automaticamente registram a informação que o seu browser envia sempre que você visita um site da web. Estes registros do servidor podem incluir informação, tal como solicitação da web, idioma do browser, data e hora de sua solicitação e um ou mais cookies que podem identificar o seu browser (Google, 2005). Podemos combinar a informação que você submete em sua conta com a informação de outros serviços do Google ou terceiros a fim de fornecer-lhe uma experiência de navegação melhor e para melhorar a qualidade de nossos serviços. Para alguns serviços, nós podemos lhe dar a oportunidade de optar por não participar de combinar tal informação (Google, 2005).

Não é à toa que “receitas com anúncios on-line registraram crescimento de

30% em 2005, atingindo um novo recorde, US$ 12,5 bilhões (contra US$ 9,63

bilhões em 2004)” (Folha Online, 2006). Grande parte deste “faturamento de

publicidade responde por quase todas as receitas da empresa de buscas na rede

Google” (Folha Online, 2006).

E não é só de propaganda que vive o Google. Como qualquer grande

empresa ocidental que vive na era da globalização. Seus lucros já não estão

baseados apenas nos serviços, mas também nas ações da bolsa de valores

internacional. O que tem aumentado mais ainda seu poder no mercado: O lucro do Google aumentou 60% no primeiro trimestre em relação ao mesmo período do ano passado, chegando a US$ 592,3 milhões.

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No primeiro trimestre de 2005, o lucro havia sido de US$ 369,2 milhões. Os ganhos maiores foram conseqüência do bom resultado da propaganda on-line administrada pelo Google. O anúncio do resultado trimestral após o fechamento das Bolsas dos EUA fez as ações da empresa de internet subirem até 7% no "after hours" do pregão (Folha Online, 2006B).

Varian e Shapiro vão dizer que assim como as empresas de pesquisa de

mercado procuram entender profundamente os consumidores para gerar novos

produtos e novas propagandas, as empresas de serviços gratuitos fazem o mesmo,

com algumas “vantagens”: Em contrapartida, os servidores da Web podem observar o comportamento de milhões de clientes e produzir de imediato um conteúdo personalizado, empacotado junto com anúncios personalizados. ”...” A informação acumulada por esses poderosos servidores da Web não se limita ao comportamento atual dos usuários; eles também podem acessar imensos bancos de dados com informações históricas e demográficas sobre os clientes (Varian e Shapiro, apud Lemos, 2000)

Lemos (200) acredita que a estratégia dos serviços gratuitos da Internet em

oferecer um serviço e em troca recolher e processar informações dos usuários para

a propaganda direcionada não é mistério: “(...) já podem ser consideradas um tipo de

sabedoria convencional compartilhada pelos principais players do mercado” (Lemos,

2000). Informa ainda que esta “troca” entre empresas digitais e usuários já é uma

prática comum: A concessão de informações por parte dos consumidores e as possibilidades do seu uso comercial por parte dos provedores passa a representar uma regra "aberta" do jogo, uma característica típica do modo de funcionamento da Internet, uma espécie de "preço" pago pelos internautas pela utilização do serviço gratuito (...)" (Lemos, 2000).

Ser uma prática comum entre as empresas digitais parece evidente. O que

não está claro, para nós, é se esta é uma regra “aberta do jogo”. Será que o usuário

do Orkut e de outros serviços Google realmente entende este funcionamento? Será

que a regra está tão clara assim?

Não podemos deixar de comentar dois acontecimentos de janeiro deste

ano (2006) que envolvem a empresa Google e que nos fizeram refletir um pouco

mais sobre a propriedade das informações. Apesar de não serem sobre o Orkut

especificamente, será uma reflexão que, acreditamos, possibilitará ao leitor construir

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uma analogia imediata com o mesmo. Importa-nos aqui entender as relações do

Google com o mercado para compreendermos melhor o próprio Orkut.

Para oferecer seus serviços na China, mercado potencial para a empresa, o

Google aceitou restringir alguns conteúdos considerados pelo país como impróprios

e polêmicos. “Por exigência do governo do país, foram censuradas buscas

polêmicas, como “massacre da Praça Tianamen”, “Tibete”, “Independência de

Taiwan”, “Dalai Lama” ”(Folha Online, 2006).

Em paralelo, no mesmo mês, o departamento de justiça Norte Americano

solicitou do Google e de outras empresas com os mesmos serviços uma relação

com “todos os termos procurados pelos seus usuários de 1º de junho a 31 de julho

de 2005, além de uma relação de um milhão de contas, selecionadas a esmo”

(Silvestre, 2006). Segundo o governo americano essas informações iriam ajudá-los a

proteger “a lei de Proteção dos Menores Online” (Silvestre, 2006). Diante dessa

solicitação, o Google nega o pedido do governo Norte Americano, justificando que a

liberação de tais informações vai contra sua política de privacidade (Silvestre, 2006).

Estes dois acontecimentos nos fizeram pensar na informação como produto,

ou seja, o Google aceita a restrição para entrar em um mercado interessante como a

China e nega as informações para o governo americano justificando sua atitude

como legítima e dentro das regras de privacidade. Neste momento questionamos as

informações negadas ao governo americano, são de quem? Do Google ou dos

usuários que fizeram a busca em seus serviços? Será que se o governo Norte

Americano tivesse, em vez de exigido, oferecido uma proposta comercial de

interesse ao Google, este teria liberado algumas informações? Segundo uma

entrevista da Folha de São Paulo Online (2006), com John Battelle co-fundador da

Wired, “O Google agiu com a China como qualquer empresa que quer trabalhar na

China e aceitou jogar pelas regras do país” e mais adiante “Foi uma decisão de

mercado” (Folha OnLine, 2006). A decisão de restringir (diversificação de produto)

para acessar um novo mercado (segmento ou nicho) potencial pode nos mostrar

como o Google gerencia as informações de seu banco de dados, provindas de nós

usuários, como um produto que pode ser manipulado de acordo com as regras de

mercado e da economia.

A possibilidade de dominar o mercado, no caso do Google, não é mais pela

genialidade e a novidade do algoritmo de busca e sim pelo potencial de recolher,

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armazenar e processar o maior número de informações possíveis: “Não se trata

mais tanto da eficácia desse ou daquele algoritmo quanto de seu prodigioso poder

de cálculo, de processamento e armazenamento da informação” (Foucart, 2006).

Pensamos que toda esta discussão sobre o Orkut e Google, tem incidência

direta na relação entre o público e privado. Por isso convidamos mais uma vez o

leitor a nos acompanhar, agora de maneira um pouco mais aprofundada esta

relação.

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5. Público e privado da Internet

Escrever sobre a relação público e privado não é uma tarefa fácil. A primeira

dificuldade é que o limiar entre um e outro muda conforme o contexto histórico em

que é estudado. Muitas vezes, para entendê-lo, é necessário retomarmos o percurso

histórico do ocidente até os dias atuais, para termos uma base de comparação. O

assunto poderia ser visto sob diversos enfoques teóricos e também sob diversos

ângulos, o que torna o assunto ainda mais complexo. Especialmente hoje, dentro do

contexto contemporâneo, o tema tem sido muito estudado e é assunto polêmico em

diversas áreas de saber, devido à velocidade com que as Tecnologias de

Informação e Comunicação e as redes digitais têm se inserido e modificado nossas

vidas em vários âmbitos. Como diz artigo da Fapesp: A convergência digital entre telefonia, internet e telecomunicações (rádio e TV) prenuncia modificações de grande amplitude e profundidade não apenas nos comportamentos e relações humanas e institucionais, mas também nos padrões de conexão entre as infra-estruturas de todos os setores da vida econômica e social. Essas mudanças têm como fator determinante o desenvolvimento de tecnologias de informação e comunicação operadas por meio de redes digitais interativas (Fapesp, 2005).

Tal tema, que se refere à convergência digital em nossa cultura, tem

vários nomes, como sociedade do conhecimento, sociedade da informação,

Economia do conhecimento, entre outros (Lemos, 2000). Seu impacto em nossa

cultura é tão grande que estudiosos de várias áreas de conhecimento tem “corrido

atrás” para dar conta de tantas transformações que dela decorrem. Os educadores,

por exemplo, tem estudado o impacto da Sociedade da Informação na educação,

outros têm estudado a exclusão digital, outros, as novas formas de economia, e

assim por diante. Dentro do nosso tema, que é a relação entre o público e o privado,

há também vários assuntos e objetos de estudos, em geral temas sobre a

propriedade privada e a propriedade pública, a privacidade, as transformações do

público, etc. Dentro de tantos temas e tantos aspectos, abordaremos aqueles que

acreditamos que nos ajudará a contextualizar a discussão sobre o Orkut e também a

reflexão do motivo das pessoas colocarem suas particularidades nele.

Santos (2001), em um artigo sobre os limites e rupturas na esfera da

informação, abre uma discussão interessante sobre a violação da privacidade. Em

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seu artigo o autor diz que, além do exibicionismo que a Internet oferece, “há um

modo muito mais sutil e perverso da vigilância eletrônica o de violar a privacidade,

método que prescinde da instalação de câmaras no espaço domiciliar e até mesmo

do consentimento do vigiado que se encontra superexposto” (Santos, 2001).

Segundo o autor, este método diz respeito ao cruzamento de informações e a

possibilidade de processamento que as empresas digitais podem fazer: Trata-se do cruzamento e processamento dos dados que cada um de nós gera ao entrar, sair e transitar nos diversos sistemas informatizados e nas diversas redes que compõem a vida social contemporânea (Santos, 2001).

Este processamento de informações já acontece com várias empresas, em

vários setores, inclusive com o Google, como descrevemos no capítulo anterior. O

cruzamento dessas informações pode chegar a um nível tão complexo, como diz

Santos, que a vida do homem poderá ser controlada e mapeada por completo num

futuro muito próximo.

Segundo ele, o avanço do capitalismo e a evolução das tecnologias tomaram

“conta do planeta e se converteram em estratégia de dominação, em escala global”

(Santos, 2001). A cultura contemporânea está “sendo rapidamente desmaterializada,

isto é digitalizada e reelaborada na esfera da informação” (Santos, 2001). Este

avanço do capitalismo e esta desmaterialização da cultura, segundo Rifkin, está

mudando as formas de atuação da economia. Ele chama estas novas formas de

comercialização de Era do Acesso e a descreve da seguinte maneira: A Era do Acesso é definida, acima de tudo, pela crescente transformação de toda experiência humana em mercadoria. Redes comerciais de toda forma ou tipo tecem uma teia em torno da totalidade da vida humana, reduzindo cada momento da experiência vivida à condição de mercadoria. Na era do capitalismo proprietário, a ênfase recaía na venda de bens e serviços. Na economia do ciberespaço, a transformação de bens e serviços em mercadorias torna-se secundária face à transformação das relações humanas em mercadorias. Numa nova e acelerada economia de rede em permanente mudança, prender a atenção dos clientes e consumidores significa controlar o máximo possível do seu tempo. (Rifkin, apud Santos, 2001)

Para Santos, com esta nova forma de economia definida por Rifkin como “Era

do Acesso”, a relação com o consumidor passa a ser encarada de maneira diferente: Com a era do acesso dá-se, portanto, uma mudança de perspectiva que traz para o centro da atividade econômica o controle do tempo

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do consumidor. O consumidor não é mais um alvo do mercado, ele torna-se o próprio mercado, cujo potencial é preciso conhecer, prospectar e processar (...) não se trata mais de tentar vender um único produto para o maior número possível de consumidores, mas sim de tentar vender para um único consumidor o maior número possível de produtos, durante um longo período de tempo. Em outras palavras, é preciso poder acessar o consumidor e torná-lo cativo (Santos, 2001).

Este controle do tempo do consumidor aliado às técnicas de marketing, tem

feito, segundo o autor, muitos profissionais da área calcularem o “valor do tempo de

vida”, uma medida que tenta prever o potencial de venda em cada vida humana.

Para que um cálculo deste seja possível o cruzamento destas informações torna-se

ferramenta necessária: Através de apropriadas técnicas de modelização computadorizada, é possível utilizar essa massa de dados brutos de cada indivíduo para antecipar futuros desejos e necessidades e mapear campanhas direcionadas para engajar os consumidores em relações comerciais de longo prazo (Santos, 2001).

Assim, mapeados os dados e transformados em informações que podem ser

lidas pelos profissionais de marketing e empresas, será possível classificar a vida do

ser humano e prever seus gastos enquanto vive.

Queremos lembrar aqui, que não só os dados dos sites e serviços da Internet

podem ser recolhidos e cruzados. Já existem hoje tecnologias de código de barras

que inseridas nos produtos, permitem acompanhamento via satélite. Também

atualmente já em funcionamento micro-chips que, instalados nos carros (ou até em

humanos), permitem acompanhamento via satélite. Enfim, são tantas tecnologias

deste tipo em desenvolvimento ou já estão em uso que precisaríamos de mais de

um capítulo deste trabalho para falarmos de todas.

Esta discussão sobre o controle do tempo, a classificação e a “coisificação”

da experiência humana em produto, parece já ter sido antecipada por Adorno

quando este fala do mecanismo da indústria cultural: O princípio básico consiste em lhe apresentar tanto as necessidades como tais, que podem ser satisfeitas pela indústria cultural, quanto por outro lado organizar antecipadamente essas necessidades de modo que o consumidor a elas se prenda, sempre e apenas como eterno consumidor, como objeto da indústria cultural (Adorno, 1947, p.37).

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Este trecho de Adorno cabe exatamente na discussão que trouxemos até

aqui. O que é o perigo do cruzamento das informações dos bancos de dados senão

“organizar antecipadamente as necessidades” e mostrar ao homem “que podem ser

satisfeitas pela indústria cultural”? O que seria o “valor do tempo de vida” senão a

afirmação do homem comum como “eterno consumidor, como objeto da indústria

cultural”? Como diria Tocqueville: “Sob o monopólio privado da cultura sucede o fato

que a tirania deixa livre o corpo e investe diretamente sobre a alma” (Tocqueville,

apud Adorno, 1947, p.25)

Quando dissemos lá no começo do capítulo que este assunto é polêmico e

tem sido estudado por diversas áreas de conhecimento não foi à toa. Segundo

Santos (2001), com a consolidação das redes digitais, a preocupação torna-se

intensa e adquire duplo movimento: No plano econômico instaurou-se a corrida do capital global pelo controle e colonização das redes, estratégia que consistiu num primeiro momento em promover a privatização das telecomunicações para, numa segunda fase, assegurar a privatização de todo o campo eletromagnético, o que está em vias de acontecer. Mas por outro lado, no plano jurídico-político, a possibilidade de extensa e intensa exploração das informações relativas ao usuário colocou em questão o impacto das novas tecnologias sobre a cidadania e a democracia, na medida em que ficavam abalados o direito à privacidade e a liberdade de informação (Santos, 2001).

Esta discussão sobre o direito à privacidade e a liberdade de informação,

além de suscitar questões éticas, levanta também uma preocupação no sentido

jurídico. Em seu artigo, Santos (2001) faz uma síntese das leis brasileiras existentes

e mostra como o cidadão brasileiro está descoberto de proteção legal: Na verdade, como a proteção constitucional à privacidade antecedeu as possibilidades técnicas de acesso e manipulação dos dados a partir das redes digitais, há um evidente vazio legal que aparentemente deixa os internautas brasileiros indefesos (Santos, 2001).

Ele ainda vai dizer em seu artigo, que mesmo com as últimas alterações nas

leis realizadas pelo Senado em 1996, elas ainda deixam um “vazio” no que diz

respeito a proteção do homem comum. Parece que estas alterações foram feitas

pensando muito mais “em proteger o Estado e as empresas contra os hackers do

que a inviolabilidade do cidadão comum” (Santos, 2001).

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Para Lemos (2000), a questão da privacidade on-line no Brasil tem a

tendência de tornar-se tão importante quanto nos Estados Unidos. Para ele, uma

solução para o problema seria “se além de importarmos tendências de

desenvolvimento tecnológico e econômico, também importássemos a cultura de

proteção dos direitos do consumidor” (Lemos, 2000). Ainda assim deixamos uma

questão: Será isso suficiente para proteger a privacidade e o valor da vida humana?

Outra discussão interessante e pertinente ao nosso trabalho, é o estudo que

Sennett (2001) faz em seu livro intitulado “O declínio do homem público – as tiranias

da intimidade” Para Sennett, o declínio do homem enquanto ser público é uma

conseqüência do que ele chama de “ideologia da intimidade”. Esta ideologia tem

relação com a crença de que a aproximação íntima entre as pessoas é um “bem

moral” e só através desta aproximação íntima é possível desenvolver a

personalidade individual. Sob a ótica desta ideologia, todas as dificuldades da

sociedade são explicadas como causa da “impessoalidade, da alienação e da frieza”

(Sennett, 2001). Com suas palavras: Relacionamentos sociais de qualquer tipo são reais, críveis e autênticos, quanto mais próximos estiverem das preocupações interiores psicológicas de cada pessoa. Esta ideologia transmuta categorias políticas em categorias psicológicas (Sennett, 2001, p.317)

Esta ideologia é conseqüência do modo como o capitalismo foi criando uma

“contradição na cultura do século passado” (Sennett, 2001 p.319). Naquele

momento, o homem perde seu espaço de atuação pública e passa a buscar

significações pessoais nos domínios privados da vida, principalmente nas famílias: (...) as pessoas procuraram encontrar significações pessoais em situações impessoais, em objetos e nas próprias condições objetivas da sociedade. Não podiam encontrar tais significações; à medida que o mundo se tornou psicomórfico, tornou-se também mistificador. As pessoas tentaram, portanto, fugir e encontrar nos domínios privados da vida, principalmente na família, algum princípio de ordem na percepção da personalidade (Sennett, 2001 p. 318).

Tal mudança no cenário cultural e social fez o homem buscar estabilidade e

confiança na aproximação íntima com o outro. As relações sociais e políticas não

geravam mais a confiança necessária para que este homem pudesse atuar

socialmente: “Assim, o passado construía um desejo secreto de estabilidade naquele

desejo aberto de aproximação entre seres humanos” (Sennett, 2001).

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Esta busca de intimidade gerou, segundo Sennet, uma série de problemas.

Numa relação baseada na intimidade, a transformação não é aceita por nenhuma

das partes. Se ela acontece, é significado de traição. As expectativas em relação ao

outro ficam cada vez mais exacerbadas. “Uma tal personalidade se moldará na

expectativa, se não na experiência, da confiança, do afeto, do conforto” (Sennett,

2001). Nestas condições o homem passa a encarar e acreditar que o mundo é justo,

confiável, não agressivo e que todos devem ser assim. Aqueles que não são íntimos

são encarados como estranhos e aversivos. Como um homem, que encara o mundo

desta maneira pode lidar com as contradições, com as injustiças? Que

personalidade é esta construída com base na intimidade? Nas palavras de Sennett: Como pode ser ela suficientemente vigorosa para se movimentar num mundo fundado na injustiça? Será verdadeiramente humano propor a seres humanos a máxima que suas personalidades “se desenvolvem”, que eles se tornam “mais ricos” emocionalmente, na medida em que aprendam a confiar, a ser abertos, a partilhar, a evitar a manipulação dos outros, a evitar desafios agressivos para obter condições sociais, ou a minar essas condições para proveito pessoal? Será humano formar “eus” brandos para um mundo áspero?Como resultado do imenso temor diante da vida pública que atacou o século passado, resulta hoje um senso enfraquecido da vontade humana (Sennet, 2001 p. 318-319)

Este “temor diante da vida pública” que tem como resultado “um senso

enfraquecido da vontade humana”, segundo Sennett, aparece também nos textos de

Adorno. Se relembrarmos, no capítulo da indústria cultural, uma das principais

críticas do autor é em relação a posição passiva do homem frente a uma cultura

harmônica, que o impede de entrar em contato com o conflito e gerar

transformações. Podemos então fazer uma analogia entre o “senso enfraquecido da

vontade humana” e a passividade e alienação do homem frente à indústria cultural.

Selecionamos uma citação de Adorno que pode nos ajudar a refletir. No trecho de

onde tiramos a citação, Adorno esta falando como é difícil um homem, inserido nesta

cultura dominante, fazer resistência e não se adaptar nesta cultura reificada: A passividade do indivíduo o qualifica como elemento seguro. Assim o trágico é liquidado. Antigamente, a substância do trágico estava na oposição do indivíduo à sociedade. Ele exaltava “o valor e a liberdade de ânimo diante de um inimigo potente, de uma adversidade superior, de um terrível problema”. Hoje, o trágico se dissolveu no nada da falsa identidade entre sociedade e sujeito, cujo horror se vislumbra ainda na aparência fraudulenta do trágico. (Adorno, 1947 p. 54-55)

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Este ponto convergente na posição de ambos parece, para nós, de extrema

importância, para entendermos como o homem vai construindo os limites entre o

público e o privado e também como este encara subjetivamente o mundo social.

Apesar de acreditar que exerce um papel social através da troca de intimidades,

parece que não exerce seu papel social de fato, permanecendo passivo frente a

cultura dominante, ao “trágico” e a injustiça do mundo.

Sennett diz que esta ideologia da intimidade, que privilegia o homem e suas

relações pessoais, acaba desconsiderando os meios e as medidas com que as

ações sociais são realizadas. E, para ele, essa desconsideração é, na verdade,

forma de pacificação política: (...) “a mitologia segundo a qual homens são mais

importantes medidas (para utilizarmos a expressão de Junius) revela-se realmente

como uma receita para a pacificação política” (Sennet, 2001). E aí está o declínio do

homem tido como público, social. Ele passa a se relacionar somente com aqueles

que considera íntimo, e esta confusão faz com que, na verdade, o homem deixe de

se relacionar socialmente. Um exemplo simples e bem próximo de nós são os

grupos de estudos formados dentro das salas de aula. Os alunos reúnem-se não

pelos temas aos quais se interessam e sim pela intimidade e afinidades que têm uns

com os outros.

Segundo o autor, a falta desta intimidade gera no homem um vazio, um medo.

E isso faz com ele conceba o público, como alguém que irá declarar sua

personalidade e suas intenções e, por isso, poderá ser eleito ou não. Já não importa

o que o político faz, qual sua medida e sim quem ele aparenta ser. A escolha política

parece ser uma escolha pessoal – gostar ou não gostar do político, ir ou não com a

“cara” de fulano: Em resposta ao medo da vacuidade, as pessoas concebem o político como um domínio em que a personalidade será declarada vigorosamente. Assim, eles se tornarão os expectadores passivos de uma personagem política que lhes ofereça suas intenções, seus sentimentos, mais do que seus atos, para a consumação deles (Sennet, 1947 p. 319).

Mais adiante ele conclui: Ora, quanto mais as pessoas conceberem o domínio político como a oportunidade para se revelarem umas às outras, compartilhando de uma personalidade comum, coletiva, tanto mais serão desviadas do uso de sua fraternidade para transformarem as condições sociais. Manter a comunidade se torna um fim em si mesmo; o expurgo

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daqueles que realmente não pertencem a ela se torna a atividade da comunidade (Sennet, 1947 p. 319).

Seguindo esta linha de pensamento, o Orkut parece ser justamente um lugar

público onde “as pessoas têm a oportunidade” de revelar suas intimidades umas às

outras.

Alienado pela ideologia da intimidade, o homem tende a recusar qualquer

barreira na comunicação. E nesta recusa, tendemos a intensificar os termos da

personalidade, sendo mais direto, mais aberto e mais autêntico nas relações uns

com os outros (Sennett, 2001). Segundo o autor, é justamente baseada nesta

necessidade de expressão sem barreiras, que as tecnologias do século XX foram

criadas.

Mostrar-se, exibir-se e afirmar a personalidade torna-se urgente na medida

em que não há espaço de atuação social e política. Parece que fazemos isso sem

nos dar conta de que ficamos vulneráveis e expostos: “(...) apesar de termos

venerado a idéia da facilidade de comunicação, ficamos surpresos com o fato de

que a “mídia” resulte numa passividade ainda maior da parte daqueles que são

expectadores” (Sennet, 2001).

Parece que o Orkut veio justamente atender esta necessidade, principalmente

quando permite que as intimidades sejam reveladas e acompanhadas diariamente.

Estamos tão alienados pela ideologia da intimidade que “Não conectamos nossa

crença na comunicabilidade absoluta com os horrores dos meios de comunicação de

massa porque recusamos a verdade básica que uma vez deu forma à cultura

pública” (Sennett, 2001). E assim, conectados através da rede, vamos deixando

nossas informações em público, em bases de dados particulares, que a qualquer

momento podem ser cruzadas.

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6. Método

6.1 Sujeitos Nosso critério para escolha dos participantes foi unicamente de serem ou

terem sido usuários do Orkut. As seis pessoas entrevistadas foram escolhidas

aleatoriamente, no pátio da faculdade São Marcos, nas empresas onde trabalhamos

e em um cybercafé da cidade de São Paulo. As entrevistas foram feitas face a face

6.2 Procedimento A fim de tentar responder nosso problema de pesquisa, criamos algumas

perguntas sobre a utilização do Orkut. Estas perguntas apenas nos serviram de

apenas para referência. Nem todas as perguntas foram feitas em todas as

entrevistas, muitas surgiram na hora, de maneira espontânea, conforme a resposta

dos participantes. Podemos dizer que foi um simples “bate-papo”. Algumas

perguntas que fizemos:

- Você é usuário(a) do Orkut?

- Há quanto tempo você é usuário(a) do Orkut?

- Como foi que você entrou no Orkut?

- De quem você recebeu o convite?

- Você leu o contrato/termo de adesão do Orkut?

- Qual foi a primeira coisa que você fez ao entrar no Orkut?

- Você preencheu o cadastro de perfil?

- Porque que as pessoas colocam suas particularidades no Orkut?

- O que você acha legal no Orkut? E o que você não acha legal no Orkut?

- As pessoas costumar ler as mensagens dos outros?

- Etc.

Na análise além dos relatos recolhidos nas entrevistas, utilizamos também

como fonte de informação, reportagens sobre o Orkut e seus usuários, publicados

nos principais jornais. Fizemos uma análise e interpretação dos dados qualitativa,

utilizando os referenciais teóricos já citados anteriormente.

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7. Orkut, relação de público e privado: análise geral

Todos as pessoas entrevistadas por nós concordam, cada qual à sua

maneira que o Orkut as expõem publicamente: “Ele é legal porque assim, você tem acesso a vida de todo mundo, né?”. “O que chamou atenção assim... Que é tudo muito aberto. Que tem pessoas que elas não tem noção, elas colocam o telefone, e elas abrem a vida delas, assim, escancaram mesmo a vida, e elas não têm muito, elas não têm limite mesmo (Amanda).” “Ali fica muito exposto, né? E principalmente essa historia de não ter sigilo, você pode ver mensagens dos amigos dos amigos, então acaba te expondo de uma certa forma(...)”(Edna).

Os trechos acima fundamentam a idéia de que as pessoas têm a sensação de

exposição, porque estão em um espaço público, social. Apesar de ser um sistema

virtual o Orkut consiste como um espaço social e “aberto” a todos. Mesmo sendo

acessível somente para convidados, fica patente que qualquer pessoa pode entrar

ali. Sobre isso fala Edna: “(...) você não sabe quem tá lendo aquilo”. Basta receber

um convite via e-mail.

Uma comparação entre a praça de uma cidade qualquer com o Orkut basta

para encontrar características em comum. Ambos são públicos porque podem ser

utilizados por qualquer pessoa e dão a sensação de espaço aberto, onde sempre

tem um outro que pode observar, olhar uns aos outros. Como características

incomuns percebemos que para utilizar a praça não é necessário expor preferências,

gostos e intimidades. Enquanto no Orkut, este é um pré-requisito fundamental para

participar. Porém, a sensação do controle social exercido na praça é mais evidente

para quem a utiliza. É mais claro para todos que este controle social é também

realizado pelas leis governamentais. O Orkut, ao contrário, gera uma sensação de

impunidade. Um local público onde as pessoas podem fazer e falar o que quiserem,

como aponta Carpanez: "As pessoas acreditam que estão amparadas pela liberdade

de expressão, mas esse princípio não é absoluto. Ele tem limites que estão listados

na constituição e suas punições são previstas pelo código penal" (Carpanez, 2005).

Assim o Orkut representa um espaço público que permite às pessoas uma sensação

de liberdade ilimitada, de expor-se aparentemente sem conseqüências.

Outro detalhe que achamos interessante é que para os entrevistados a

exposição exagerada que muitas pessoas fazem no Orkut está ligada principalmente

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aos dados objetivos: telefone, e-mail, Rg, CPF e endereço. Colocar informações

subjetivas, gostos pessoais e “informações afetivas” parece não ser um grande

problema. Os relatos de Amanda e Edna nos servem de exemplo: “O que chamou atenção assim... Que é tudo muito aberto. Que tem pessoas que elas não tem noção, elas colocam o telefone, e elas abrem a vida delas, assim, escancaram mesmo a vida, e ela não tem muito, elas não têm limite mesmo”. (Amanda). “É, (Pausa), assim, perguntas mais subjetivas assim eu respondi né, pra falar sobre você mesmo às vezes eu coloco uma letra de música, mais assim (pausa), numero de telefone e e-mail eu não deixo. Disponível, né? Isso eu não preenchi (...) Telefone, dados do endereço, os dados mais pessoais mesmo rg, cpf, tudo que é nesse sentido pessoal que eu acredito não ser legal pra tá disponibilizando algo que pode ser invadido a qualquer momento”. (Edna).

Privados são os números e dados objetivos. Os dados subjetivos são livres

para serem mostrados em público. Assim como muitos artistas da TV, que permitem

mostrar suas emoções e seus gostos num programa nacional, mas que omitem

dados objetivos e concretos para manter a sua privacidade. Parece que este limite

entre público e privado é o “modelo” utilizado pelos usuários do Orkut.

Quando perguntamos a eles se achavam que havia algum “problema” ou

“perigo” em colocarem suas particularidades no Orkut nenhum deles comentou

sobre o banco de dados do Google. Para os participantes o perigo é externo, tal

como seqüestros, invasão de hacker e racismo. Vamos ouvi-los: “ Pensar na família, com esse negocio de seqüestro você pode tá ali numa brincadeira mas outra pessoa pode tá ali pra fazer o mal, pode pegar o seus dados e simular um seqüestro, e você passar por uma situação que não tem necessidades”. (Thais). “Alem de invasão, tem muito racismo, e isso é claro. Isso é, eu acho que o perigo não é o Orkut, o perigo é as pessoas que utilizam, até porque pelo número de pessoas que tão lá, não tem nenhum tipo de controle contra racismo, mensagens, então são geradas no Orkut sem nenhum preconceito, sem nenhum tipo de medo relacionado”. (Lucas).

Questionamos Lucas (especialista em programação de sistemas Web) se não

havia algum problema em colocar as suas particularidades no Orkut, em um banco

de dados de uma empresa particular, no caso do Google. Ele responde que não vê

problema, desde de que esta informação não seja distribuída pela Internet: “Bom, é depende de que informação pessoal isso tá se tratando. No caso, eu acho que tem informação pessoal que tem que ser passada

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de forma sigilosa, ela não pode ser distribuída de maneira livre na lnternet. Uma informação que não é sigilosa, eu acredito que não tem nenhum problema, seja qual for o veiculo que tá divulgando isso, agora fora isso, eu acredito que seja errado pela importância da informação que tá sendo repassada”. (Lucas).

Parece que os usuários em geral, mesmo sendo especialistas da área de

informática não vêem nenhum problema em deixar as informações em um banco de

dados particular, de uma empresa. A possibilidade do cruzamento de informações

não é evidente para eles. O Orkut é sempre visto como um serviço web, mas parece

não haver um questionamento mais aprofundado sobre o Orkut ser uma empresa

privada e, como tal, obter lucros. Também parece não haver um questionamento de

como, qual a forma, que esta empresa obtém lucro. Tal afirmação parece ser tão

verdadeira que quando perguntamos se eles haviam lido o contrato de adesão e

privacidade, a resposta foi unânime. Lucas responde: “Não, e não conheço ninguém

que leu (Lucas)”. Amanda também diz que não leu ainda associa isso ao fato de

nenhum brasileiro ter o hábito de ler contrato nenhum: “Não li (...) porque eu sou

brasileira né, brasileiro não lê termo” (Amanda). Thais também nos dá a mesma

resposta: “Sinceramente? Porque eu nem li. Isso eu não li” (Thais).

7.1 – Expor e bisbilhotar: uma necessidade

Ao mesmo tempo em que há um lado negativo em expor-se, verificamos

através dos relatos que expor publicamente as particularidades tem relação com

fazer-se conhecer, mostrar a personalidade. Vejam a relação que Amanda faz: “É

assim, um exibicionismo, e as pessoas colocam mais assim as coisas pra se

aparecer mesmo, pra chamar atenção, pra falar eu sou legal”.

Tânia parece fazer a mesma relação: “(...) alguém te elogiar e todo mundo vê,

fala nossa! Como você é tão querida, realmente é isso, sei lá isso é legal”.

Na resposta de Edna também encontramos o mesmo sentido: “(...) você

acaba mostrando um pouco de você, é aí que as pessoas vão começar a se

interessar por você”.

A resposta de Thais evidencia ainda mais esta relação: “Necessidade de se aparecer, (risos), mas realmente eu friso isso, pura carência, uma necessidade de se expor, de chamar atenção a qualquer custo, de que as pessoas têm que lembrar de mim, têm que lembrar, têm que escrever, têm que deixar um depoimento sobre o

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que eu sou, acho que é uma necessidade de se auto afirmar”.

Lucas também é explícito: “Eu acho que o Orkut é o canal de entrada pra

você mostrar a sua personalidade”.

Além desta necessidade de exposição, percebemos através das entrevistas

que há uma necessidade de olhar a vida alheia, de “bisbilhotar” o outro. Quando

questionamos se as pessoas costumam ler as mensagens alheias, Edna responde:

“Vêem, (risos), todo mundo lê, por mais que fale que não, mas todo mundo lê”.

Pamela têm a mesma resposta: “eu olho, eu bisbilhoto, ah, isso eu faço”.

Verificamos que elas fazem, mas e as outras pessoas? Costumam fazer isso

no Orkut? Edna responde: “Sim, com certeza sim, não tem um que não veja, se fala

que não lê é mentira (...)”.

Lucas faz a mesma afirmação: “(...) com certeza a primeira coisa que você faz

ao visitar o perfil é visitar os scraps das pessoas, vê com quem ele conversa, com

que ele tem amigos, e por aí vai”.

Parece não haver dúvidas que olhar as mensagens, navegar pelo Orkut

acompanhando a vida das pessoas é uma atitude comum entre os usuários. Uma

lógica que explicaria tal comportamento seria: Eu posso ver sua vida, eu sei algo

sobre você, e por isso possuo um conhecimento, um saber. E quem sabe alguma

coisa que o outro não sabe, fica numa posição privilegiada, destacada dos demais.

Mas ainda não satisfeitos nos perguntamos o motivo desta necessidade de

exposição? Como diz a Thais uma “necessidade de se expor, de chamar a atenção

a qualquer custo”? Ou então achar o Orkut interessante porque ele dá acesso às

particularidades das pessoas? Como diz Amanda: “(...) é legal porque assim, você

tem acesso a vida de todo mundo né?”.

Para nós, esta necessidade de “exposição” e de “bisbilhotar” a vida alheia,

tem relação com o consumo de imagens e com a competitividade implícita na lógica

de atuação do sistema capitalista contemporâneo.

Para que esta lógica fique clara é preciso antes ressaltar dois conceitos da

indústria cultural que deram base para a construção desta.

O primeiro é que segundo Adorno “divertir-se significa estar de acordo”

(Adorno,1947). E este divertimento faz com que as pessoas procurem não pensar,

fugir de todo incômodo e desconforto que a realidade possa lhe causar. O prazer

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significa nenhum esforço e extingue a oportunidade do homem de entrar em contato

com outra realidade, que lhe de condições para um discernimento crítico: Divertir-se significa que não devemos pensar, que devemos esquecer a dor, mesmo onde ela se mostra. Na base do divertimento planta-se a impotência. É, de fato, fuga, mas não como pretende, fuga da realidade perversa, mas sim do último grão de resistência que a realidade ainda pode haver deixado. (Adorno, 1947 p.41).

Para o autor a “libertação prometida pelo entretenimento é a do pensamento

como negação”, ou seja, a indústria cultural ao propor divertimento através dos

meios de comunicação de massa, faz com que o homem desacostume da sua

subjetividade, pense e reflita menos: tudo vem pronto para ser utilizado. “É só abrir e

consumir”.

O segundo conceito diz respeito à forma com que o homem comum é tratado

pelo sistema capitalista: uma como trabalhador e outra como consumidor. Se está

em seu trabalho ele é o trabalhador. Se está fora dele, em seu tempo de lazer e

divertimento, é considerado em geral como consumidor. Para Adorno (1947), a

influência do capitalismo se dá através das formas de organização do trabalho e fora

dele através do divertimento: Não obstante, a indústria cultural permanece a indústria do divertimento. O seu poder sobre os consumidores é mediado pela diversão que, afinal, é eliminada não por um mero diktat, mas sim pela hostilidade, inerente ao próprio princípio do divertimento, diante de tudo que poderia ser mais do que divertimento (Adorno, 1947 p. 30).

Para ele o divertimento “ingênuo”, em forma de arte, que fazia parte do

processo de subjetividade humana frente à vida, frente ao conflito, foi transformado

em produto. A diversão é então passível de ser consumida através de produtos

altamente sofisticados tecnologicamente: A indústria cultural pode se vangloriar de haver atuado com energia e de ter erigido em princípio a transposição – tantas vezes grosseira – da arte para a esfera do consumo, de haver liberado a diversão da sua ingenuidade mais desagradável e de haver melhorado a confecção das mercadorias (Adorno, 1947 p. 28).

Mas este consumo não se dá somente através dos produtos propriamente

ditos, mas através da identificação do homem com as imagens (milhares delas) que

as mídias de massa produzem diariamente. Se o homem fica numa condição

passiva, de consumidor, desprovido de uma reflexão um pouco mais crítica do todo,

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este acaba ajustando-se às imagens maravilhosas, de vidas felizes, do corpo

esculpido, etc. “A indústria cultural fornece como paraíso a mesma vida cotidiana”

(Adorno, 1947). Os homens consomem imagens e estilos produzidos pelo sistema

capitalista: O princípio básico consiste em lhe apresentar tanto as necessidades como tais, que podem ser satisfeitas pela indústria cultural, quanto, por outro lado, organizar antecipadamente essas necessidades de modo que o consumidor a elas se prenda, sempre e apenas como eterno consumidor, como objeto da indústria cultural (Adorno, 1947, p.37).

Podemos pensar então, através destes conceitos de Adorno, que assim como

a televisão, a Internet e o próprio Orkut trazem imagens de felicidade, de beleza, de

sucesso, de fama. Amanda nos fala deste mundo aparentemente feliz: “No Orkut

todo mundo é feliz, todo mundo é lindo, é só todo mundo sorrindo, ninguém é assim

(pausa), você vê naquela parte quem sou eu, né? Eu sou uma pessoa muito

simpática, etc”.

O interessante no caso do Orkut em comparação á televisão, por exemplo, é

que estas imagens de “felicidade”, de “sucesso” são compostas pelos usuários do

Orkut. É aí que está nossa questão. O homem está tão acostumado a consumir

imagens, a se identificar com elas, que tornar-se imagem pode parecer

subjetivamente uma oportunidade de ser feliz. Ora, não são as pessoas felizes que

aparecem, que fazem sucesso? O sucesso não é sinal de felicidade e vice-versa?

O Orkut parece exatamente dar a oportunidade às pessoas de criarem suas

imagens, suas personalidades. Tânia conta que a primeira coisa que fez no Orkut foi

colocar fotos: “A primeira coisa que eu fiz foi colocar uma foto, foi a primeira coisa.

Antes de preencher todos os dados foi a foto”.

Thais confirma esta “oportunidade”: “Se você colocar foto, normalmente

pessoas que não te conhecem, vêem sua foto, te acham bonita, te acham

interessante de algum aspecto no seu estereótipo, aí sim, você chama a atenção

(...)”.

No Orkut, além de criarem suas imagens, suas personalidades cada qual a

sua maneira, as pessoas têm a oportunidade de aparecer, de ser olhadas, de “ser

consumidas”. Assim como os artistas da televisão são “consumidos”. Aparecer, ser

notado, expor-se aos “olhos do público” parece ser a forma que encontraram para

existir, alcançar um lugar ao sol. Se antes, nos textos de Adorno os homens

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“apenas” se identificavam com os trejeitos, a roupa da moda das celebridades, hoje,

além disso, eles estão em busca de tornar-se a própria celebridade.

Perguntamos para Lucas qual era a diferença entre o Orkut e o programa Big

Brother da televisão. Sua resposta dispensa comentários: “Bom, alem de ser um canal aberto, onde o mundo vê algumas pessoas que é no caso a TV, você pega o Orkut, ah, o mundo vê o próprio mundo. É como se fosse o pessoal da TV, também vendo o mundo que tá assistindo eles, é essa a possibilidade do Orkut. É como se fosse um Big Brother com câmera visualizando quem tá dentro da casa e quem tá fora assistindo, então é essa visualização, e é um canal infinito de informações, coisa que o Big Brother fica fechado a uma única casa”. (Lucas).

Além da necessidade de expor-se que acabamos de destacar, há também a

competitividade implícita na lógica capitalista. Esta competitividade faz com que as

pessoas busquem constantemente um diferencial, um detalhe que as faça diferentes

dos demais para que possam ser aceitas, para que tenham um “lugar” social

reservado, seja no âmbito profissional ou pessoal. Podemos pensar que buscar um

diferencial, um atrativo, hoje em dia tornou-se tão imprescindível quanto difícil. Com

a diversidade de produtos e informações disponíveis (potencializadas pela

globalização), a concorrência ficou cada vez maior. O inusitado, a surpresa são

quase impossíveis. Quando se pensa em algo, em um estilo, logo aparece alguém

igual. Qualquer detalhe pode ser relevante para identificar-se e subjetivamente

“reforçar o contorno” da individualidade diante da “massa” de pessoas.

Quando questionamos Lucas do por que do sucesso do Orkut e do Big

Brother, ele responde: "Porque é uma forma de saber da vida alheia” Lucas). Em

seguida perguntamos como é isso de saber da vida alheia, e ele nos esclarece (os

grifos são nossos): “É Bom! Não só pra conhecer alguma pessoa tal outra, até te enxergar tem outras pessoas, geralmente o povo começa a olhar em volta das informações, procurar pessoas como você tal, isso acaba virando uma rotina, e de rotina acaba virando uma necessidade, você acaba descrevendo opções e coisas a mais, por exemplo: Pôxa! Eu já to cansado de me vestir assim, vamos procurar um novo jeito de se vestir. Se você olhar no Big Brother, vai tá o canal da moda, mas se você entrar numa comunidade você ta se tocar de novas informações, novos estilos, então acaba virando necessidade, conhecer da vida alheia pra se conhecer melhor”. (Lucas).

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Adorno fala sobre a alta competitividade dos produtos, onde os fabricantes se

esmeram em criar um pequeno diferencial que torne seu produto competitivo no

mercado: As qualidades e as desvantagens discutidas pelos conhecedores servem apenas para manifestar uma aparência de concorrência e possibilidade de escolha. (...) A medida unitária do valor consiste na dose de conspicuous production, de investimento ostensivo. A diferença do valor orçado na indústria cultural não tem nada a ver com a diferença objetiva de valor, com o significado dos produtos (Adorno, 1947 p.12).

Podemos fazer uma analogia desta citação de Adorno com a competitividade

que o homem tem adotado para se diferenciar um do outro. Assim como os produtos

ficam cada vez mais semelhantes e competitivos, os homens também seguem a

mesma lógica na disputa social. Se este homem é aquele tratado como consumidor

(objeto da indústria cultural) e que tal como dissemos nos capítulos anteriores esta

sendo “mapeado” através do cruzamento de informações, podemos pensar, assim

como os profissionais de marketing, que o produto não é mais o objeto ou o serviço,

mas um estilo de vida, uma personalidade ideal. “Consuma isso e torne-se aquilo”.

Não é esta a mensagem implícita na propaganda, na publicidade?

Procurar um detalhe, algo que desperte uma possível transformação (talvez

um conflito quem sabe?) pode explicar a necessidade de olhar, de “bisbilhotar” a

vida alheia. Olhar o outro e encontrar um detalhe, um saber sobre algo que

mantenha a individualidade, e de alguma maneira o torne melhor parece ser a lógica

desta necessidade. Quando perguntamos, justamente o que é “legal” no Orkut,

Thais e Amanda respondem (os grifos são nossos): “Ah, você pode, vamos supor, tem uma menina que gosta do seu namorado, aí você vai lá e fala, “oi meu amor tudo bem”? Só pra pisar em cima da outra e falar ele é meu (risos), é a única coisa legal, mas de resto é só pra mostrar: esse é meu, só pra mostrar que você possui uma coisa que outra pessoa deseja”. (Thais).

“Ele é legal porque assim, você tem acesso a vida de todo mundo, né? Ao mesmo tempo assim, você acaba descobrindo as coisas, e (risos), tem coisas que você acha legal, tem coisas (risos), que você não gosta”. (Amanda).

O Orkut parece ser um banco de informações valiosas, não só para o Google,

mas também para os próprios usuários: “conhecer da vida alheia pra se conhecer

melhor” (Lucas). São tantas pessoas, há tanta diversidade e detalhes no Orkut que

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as pessoas tem a impressão de que poderão “escolher quem querem ser”. “São

livres para ser quem quiser”. São livres para “montar” seu estilo, sua personalidade.

Terá a chance de se destacar da massa quem rapidamente encontrar um

cruzamento de estilos que ninguém tenha feito ainda.

7.2 – Individualidade: uma marca indelével

O problema da individualidade, de acordo com Adorno, é que nunca houve e

nunca haverá “um lugar ao sol” para todos. Não pelo menos da maneira como os

usuários do Orkut vêm buscando: Apenas uma terá a grande chance, somente um será famoso, e mesmo se todos, matematicamente têm a mesma probabilidade, todavia, para cada um, esta é tão mínima, que ele fará melhor em esquecê-la de imediato e em se alegrar com a fortuna do outro, que muito bem poderia ter sido ele próprio e que no entanto, nunca o será (Adorno, 1947 p. 42).

A lógica do capitalismo e da indústria cultural, que retira a possibilidade de

conflito, de reflexão, igualando o divertimento ao consumo faz com que tudo se torne

harmônico, moldando da “mesma maneira o todo e as partes” (Adorno, 1947): A conciliação do universal e do particular, regra e instância específica do objeto, por cuja única atuação o estilo adquire peso e substância, é sem valor porque já não cumpre qualquer tensão entre dois pólos extremos que a tocam: eles são transpassados por uma turva identidade, o universal pode substituir o particular e vice-versa (Adorno, 1947 p. 21).

Justamente esta “conciliação” entre o universal e o particular, que aqui

podemos traduzir entre o público e o privado (individuo), faz com que ambos se

confundam, se misturem. Não há conflito entre o homem e o meio em que vive. Por

isso, conforme Adorno, o homem torna-se um ser “genérico”: A indústria cultural perfidamente realizou o homem como ser genérico. Cada um é apenas aquilo que qualquer outro pode substituir: coisa fungível, um exemplar. Ele mesmo como indivíduo é absolutamente substituível, o puro nada (...). (Adorno, 1947 p. 43)

Entendemos a indústria cultural como um grande banco de dados, em que os

dados estão sendo cruzados cada vez mais, criando uma diversidade de

informações já consolidadas, prontas. Nos últimos anos, temos tido cada vez menos

dados novos inseridos neste banco, causando cada vez menos possibilidades

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“novas” de informações. Se os indivíduos se diferenciam desta massa de dados

justamente por pequenos detalhes (novos cruzamentos), podemos chegar à

conclusão que este individuo, esta unidade particular, está fadada a desaparecer.

Talvez por isso o Orkut seja um recurso “tão bem vindo” pelas pessoas.

Adorno fala sobre a “produção” dos indivíduos pela indústria cultural: O individual se reduz à capacidade que tem o universal de assinalar o acidental com uma marca tão indelével a ponto de torná-lo de imediato identificável. Mesmo o mutismo obstinado ou os modos eleitos pelo indivíduo que se expõe são produzidos em série, como as fechaduras Yale, que se distinguem entre si por frações de milímetros (Adorno, 1947 p. 56).

Parece que os usuários do Orkut encontram nele a oportunidade de buscar e

pesquisar “uma marca indelével” que os faça diferentes dos demais. A

individualidade é como diz Adorno “simples encruzilhadas das tendências do

universal” (Adorno, 1947). Não encontrar este diferencial (informação nova para se

identificar) ou não ser reconhecido (olhado pelo outro) pode gerar angústia, como diz

Thais: Eu comecei a vê que quando você não entra no Orkut, não vê uma mensagem, "oi, tudo bem”? Você começa a pensar “ai, tô em baixa”, as pessoas não estão me escrevendo mais, ou então tão me mandando recadinhos rápidos ou, ah! Ninguém se interessa por mim. Aí você começa a vê que sua personalidade começa a mudar.

Nos parece justamente que lidar com a angústia, com o conflito torna-se mais

difícil estando o homem alienado, desacostumado à subjetividade. Evitar o conflito e

sua conseqüente reflexão nos parece um sintoma da sociedade capitalista

contemporânea, encontrada não só no Orkut como relatamos, mas também em

outros setores como, por exemplo, no âmbito da saúde com a utilização exagerada

de remédios para dor, depressão, etc.

Interessante é pensarmos que é o próprio homem, identificado com as

imagens produzidas pela indústria cultural, quem faz a manutenção desta lógica

capitalista. Adorno fala sobre isso: Os consumidores são operários e os empregados, fazendeiros e pequenos burgueses. A totalidade das instituições existentes os aprisiona o corpo e alma a ponto de sem resistência sucumbirem diante de tudo o que lhes é oferecido. E assim como a moral dos senhores era levada mais a sério pelos dominados do que pelos próprios senhores, assim também as massas enganadas de hoje são

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mais submissas ao mito do sucesso do que os próprios afortunados (Adorno, 1947 p 26).

Não são os próprios usuários que preenchem seus dados no Orkut?

Almejando o sucesso, a felicidade propagada pela indústria cultural? Assim como

Adorno nos fala “ao sucumbirem diante de tudo que lhes é oferecido”, preenchendo

seus dados no Orkut, por exemplo, o homem consolida a totalidade desta lógica.

Este cenário parece ficar ainda mais confuso com a utilização dos recursos

avançados da tecnologia. Tal como dissemos nos capítulos da racionalidade

tecnológica, a tecnologia avançada que busca se aproximar da realidade, do

cotidiano das pessoas parece confundi-las ainda mais. No Orkut, pudemos verificar

que a tecnologia avançada ali aplicada, gera uma sensação de naturalidade,

confundindo o que é público e privado, fazendo as pessoas esquecerem de onde

estão. Em uma das entrevistas quando questionamos Edna sobre as pessoas lerem

as mensagens umas das outras e suas conseqüências ela fala justamente sobre as

pessoas perderem a noção e escreverem no Orkut como se estivessem ao vivo.

Vejam só: “É porque, tem gente que escreve lá como se tivesse ao vivo né, e não dá

pra ter esse tipo de liberdade, (risos). É diferente né, então pode causar problemas”

(Edna).

Adorno nos diz que esta aproximação do cotidiano, causada pela tecnologia

avançada na indústria cultural, reduz a tensão entre a imagem e o cotidiano,

facilitando a identificação das pessoas com seus produtos: “É este o ideal da

naturalidade em cada ramo, que se afirma tanto mais imperiosamente quanto mais a

técnica aperfeiçoada reduz a tensão entre a imagem e a vida cotidiana” (Adorno,

1947 p. 18). Portanto acreditamos, tal como Edna e Adorno nos disseram, a forma

com que o Orkut é construído facilita a exposição das pessoas, de suas

particularidades no Orkut, sem refletir de maneira mais crítica.

7.3 – Conflitos de relacionamento no Orkut: uma possibilidade de reflexão

Outro aspecto que podemos verificar no relato dos participantes é de que o

Orkut é um “destruidor de relacionamentos”. Esta informação apareceu em quase

todas as entrevistas: “O Orkut hoje em dia tá se tornando destruidor de

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relacionamentos, casamentos, que há muito tempo às pessoas estavam juntas”

(Edna).

Percebemos que esta facilidade de exposição das particularidades e de

“bisbilhotar” a vida alheia proporcionada pelo Orkut causa problemas nos

relacionamentos da vida real. Quando surge este assunto na entrevista com Edna,

perguntamos se ela teve alguma experiência deste tipo com o Orkut ,ela responde

que sim e conta sua história: Já, pra mim já! Pra muita gente que eu conheço. Teve um rapaz que eu conhecia do colégio, ele era bem mais velho só que assim, a gente estudou no mesmo colégio e aí ele lembrou que a gente se via assim tal, e aí ele começou a colocar mensagens que queria me reencontrar, queria sair, tava interessado mas eu já namorava na época há mais de três anos. Então ficou uma situação chata porque o meu namorado lia inevitavelmente. Perguntava: quem é essa cara? O que você está fazendo? Porque você não corta logo? Então né, vários amigos meus já devem ter citado, tem até comunidade lá. “Orkut destrói relacionamentos” (risos), então muita gente, eu já vi até é fechar né, sair do Orkut por conta de brigas com o namorado.

Thais também conta o problema que o Orkut lhe causou: (...) Teve uma vez que o meu namorado leu uma mensagem que um ex-namorado ia se casar, e na época eu tive uma enxaqueca, aí ele associou isso, que o fato do outro ir casar, eu fui parar no hospital com enxaqueca, e não tinha nada haver, eu já sabia disso ha mais de um mês, e por causa de uma mensagem ele associou a isso.

Pensamos que este conflito de relacionamento no Orkut é conseqüência da

necessidade de exposição e de olhar a vida alheia causada pela lógica capitalista na

vida contemporânea. No afã de se tornarem uma imagem de sucesso, de se auto-

afirmarem, de alcançarem o sucesso, parece que as pessoas se esqueceram do

outro. Alienadas a necessidade de se tornarem alvo do desejo alheio, parece que

estas pessoas excederam seus próprios limites de privacidade e as conseqüências

que isso poderia lhes causar. Esta imagem narcísica criada no Orkut é “quebrada”

de alguma maneira pelo incomodo da outra pessoa. O conflito aparece justamente

na contradição entre o que se mostra e no que o outro vê.

O que é um problema para nossos entrevistados para nós de alguma maneira

é uma solução. É neste momento que, de alguma forma, as pessoas se voltam para

a reflexão. O conflito de relacionamentos gerado pela exposição no Orkut causa

ruído, aumentando a tensão entre a imagem e a vida cotidiana.

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Este conflito fez nossa entrevistada Thais refletir sobre o que era o Orkut e

sobre o porquê destes problemas. Vejam o que ela conta: (...) eu comecei a ver que

dava problemas. Ciúmes, às vezes conversas que não tinham nada a ver. Ali, às

vezes, a pessoa vê e dá a entonação, faz a fantasia que quiser na cabeça. Aí, vira

encrenca, né?

O mundo ilusório do Orkut começa a ficar evidente para ela. Suas

particularidades ali expostas não mostram o que ela é de fato. São lidas pelos outros

como lhes convém: Então, as pessoas começam a interpretar conforme o que convém, e não realmente o que é ali, ou que uma mensagenzinha: ah, foi um filminho, aí eu entro lá e vejo: ah, que filminho foi esse? O que foi bom? Começa a interpretar conforme os seus olhos, e não realmente o que foi.

Para ela o sucesso proporcionado pelo Orkut, de “chamar atenção”, fica sem

sentido. Para Thais os relacionamentos no Orkut são superficiais: “Totalmente

superficial. Aquela coisa de chamar atenção, eu vou achar que as pessoas tão

lembrando de mim pelo que eu sou e não é”. Thais fala que esta necessidade de

auto-afirmação é conseqüência do que ela chama de “carência”. Perguntamos o por

que desta “carência” e vejam o que ela responde: Porque hoje em dia as pessoas não conversam mais, poucas são as pessoas que sentam no almoço com os pais, almoçam juntos, tem irmãos unidos, e o que acontece? Os jovens começam a buscar amigos fora, e nesses amigos vem as encrencas, né? Como pode pensar, nossa! Mais é só um Orkut, como pode causar isso tudo? Mas se você começar a ligar as coisas, vai ver que tem muita coisa por baixo.

No final ela conta que resolveu sair do Orkut: “Brigas com o namorado, entre

outras coisas, que eu sai” (Thais). Através deste relato, percebemos que o conflito

que Thais enfrentou fez com que refletisse e tomasse esta decisão. Segundo uma

reportagem da Folha de São Paulo o mesmo aconteceu com outras pessoas que

resolveram sair do Orkut: Um dos principais motivos para a solução radical do universo on-line é a invasão de privacidade. (...) Como conseqüência do exagero, muitos viram o lado negativo da ferramenta, optaram por ser anônimos no universo virtual e clicaram no “encerrar conta" (Carpanez, 2005).

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Outros que de alguma maneira também vivenciaram algum conflito decidiram

mudar seu comportamento na Internet e continuar no Orkut: “Muitos dos internautas

que embarcaram na empolgação inicial do Orkut - quando ninguém sabia ainda

como lidar com a novidade - consideram ter exagerado na divulgação das

informações e mudaram seu comportamento na internet” (Carpanez, 2005).

Para nós fica evidente que este conflito, este ruído encontrado no Orkut pode

ser a oportunidade para as pessoas refletirem sobre sua utilização. O limite entre o

que é público e o que é privado pode, neste momento, ser reconsiderado e re-

criado.

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8.0 Conclusão

O objetivo deste trabalho é refletir sobre a relação de público e privado no

Orkut e especificamente entendermos porque as pessoas colocam suas

particularidades nele. Para isso estudamos “dois lados” do cenário que envolve o

Orkut. De um lado verificamos como o Orkut tem atuado efetivamente no contexto

social, principalmente brasileiro, consolidando-se como poderosa mídia de

comunicação. Contextualizamos como a empresa Google atua no mercado mundial,

fazendo o cruzamento das informações de seus bancos de dados um produto que a

cada dia vale mais nas bolsas de valores internacionais. Por outro lado, tentamos

investigar parcialmente o comportamento dos usuários do Orkut, o que pensam e o

que sentem em relação a este sistema. Acreditamos que esta discussão do Orkut e

a relação entre público e privado vão para além deste sistema específico. O que

encontramos pode ser transposto para outros âmbitos sociais e contribui para

reflexão sobre o impacto da convergência digital na cultura atual.

O que pudemos verificar em comum, entre estes “dois lados”, é a valoração e

poder que a informação tem na atualidade. Para a indústria cultural, a combinação

das informações, que chamamos de cruzamento das informações, possibilita cercar

e cativar por longo tempo o consumidor, criando necessidades e oferecendo-lhe

produtos sob medida, prontos para serem consumidos.

Para as pessoas, estas informações parecem ter importância na medida em

que lhes oferecem pequenas marcas, que podem diferenciá-las da massa dando um

contorno para sua individualidade. Estas informações vem suprir a necessidade que

sentem de manterem-se únicas, indivisíveis. “Bisbilhotar” a vida alheia em busca de

detalhes é a possibilidade de construírem um estilo, uma combinação de

informações que as representem e as diferenciem dos demais. Para validar sua

“combinação”, se expõem, buscando o olhar do outro para confirmar sua existência.

Ao mesmo tempo em que se identificam com as imagens produzidas, buscam ser

objeto de identificação. Ao se exporem, as pessoas parecem ter a ilusão de que

estão ocupando um espaço dentro da massa. Uma sensação de que sua

privacidade “cresceu”, de que ocupa um espaço maior publicamente. Mas o que

pudemos perceber é que sua privacidade diminuiu. Quando se expôs tornou público

aquilo que era privado. Paradoxalmente no Orkut, aquilo que era privado ficou

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publicado dentro de um banco de dados de uma empresa global, privada. Além

disso o cruzamento de informações, entre os diversos banco de dados das

empresas, pode chegar a tal complexidade que o homem comum poderá ser

monitorado e classificado, sem se dar conta do que esta acontecendo.

Portanto podemos concluir que a valoração da informação para “ambos os

lados”, parece criar um “looping”, que se intensifica quanto mais se fragmenta,

fazendo a industria cultural mais totalitária. Como diz Adorno: “Em cada espetáculo

da indústria cultural, a frustração permanente que a civilização impõe é,

inequivocamente, outra vez imposta. Oferecer-lhes uma coisa e, ao mesmo tempo,

priva-los dela é processo idêntico e simultâneo” (1947p. 37).

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