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A MULHER NO MERCADO DE TRABALHO No Brasil, mulheres são discriminadas, ganham menos e perdem emprego mais facilmente EM REVISTA SOCIAL ANO 2 Nº 5 março 2004 ISSN 1678 -152 x

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Para falar no papel da mulher e da discriminação sofrida no mercado de trabalho, esta edição especial do Observatório Social Em Revista procurou dar voz a elas, principalmente. As entrevistas com as ministras Nilcéa Freire e Matilde Ribeiro, respectivamente, trazem informações sobre as iniciativas governamentais para alterar a situação desigual das mulheres brasileiras. A diretora executiva da Secretaria Nacional Sobre a Mulher da CUT, Maria Ednalva Bezerra de Lima, informa sobre as iniciativas da Central na organização das trabalhadoras. E, finalmente, mulheres sindicalistas da Europa, América do Norte e do Brasil, pesquisadoras e especialistas falam, através de artigos e depoimentos, sobra "a dor e a delícia" de ser mulher em casa, no trabalho e no sindicato.

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A MULHER

NO MERCADO DE

TRABALHONo Brasil, mulheres são discriminadas,ganham menos e perdem emprego mais facilmente

EM

REVISTA

S O C I A L

ANO 2 Nº 5 março 2004

ISS

N1

67

8-1

52

x

EM

REVISTA

S O C I A L

CONSELHO EDITORIAL

EDITORAS

REDAÇÃO

APOIO COMUNICAÇÃO

PROJETO GRÁFICO&DIAGRAMAÇÃO

- Ano 3 - Nº 5Florianópolis - Santa Catarina - Brasil3.000 exemplaresGráfica BANGRAF

Kjeld A. Jakobsen

Maria José Coelho

Odilon Luís Faccio

Pieter Sijbrandij

Marques Casara (RJ 19126)

Banco Imagens OS:

Rosane Lima, Sérgio Vignes, Marques Casara,

Alberto C sar Araujo e Yan Boechat

Arquivo SEEB-Fpolis

Marcio Furtado e Valdir Cachoeira

Alessandra Pires, Walter André Pires

Coordenação de Comunicação do IOS

Mar o 2004

Maria José H.Coelho (Mtb 930Pr)

Sandra Werle (SC-00515-JP)

Eleonora de Paula e Souza Dias

Sandra Werle

Divulgação e

é

Ana Iervolino

Dauro Veras (SC-00471-JP)

Laura Tuyama (SC-00959-JP)

ç

FOTOGRAFIA

EDITORAÇÃO DE FOTOGRAFIA

REVISÃO

ISSN 1678 -152 x

CONSELHO DIRETOR

COORDENAÇÃO TÉCNICA

PRESIDENTE - Kjeld A. JakobsenCUT - João Vaccari NetoCUT - Rosane da SilvaCUT - Artur Henrique da S. SantosCUT - Maria Ednalva B. de LimaCUT - José Celestino Lourenço (Tino)CUT - Antonio Carlos SpisCUT - Gilda AlmeidaDieese - Mara Luzia FelterDieese - Wagner Firmino SantanaUnitrabalho - Francisco MazzeuUnitrabalho - Silvia AraújoCedec - Maria Inês BarretoCedec - Tullo Vigevani

Arthur Borges Filho - Coordenador AdministrativoClóvis Scherer - Coordenador Técnico NacionalMaria José H. Coelho - Coordenadora de ComunicaçãoOdilon Faccio - Coordenador InstitucionalPieter Sijbrandij - Coordenador de ProjetosRonaldo Baltar - Coordenador do Sistema de Informação

Quando nasci um anjo esbelto,desses que tocam trombeta, anunciou:vai carregar bandeira.Cargo muito pesado pra mulher,esta espécie ainda envergonhada.Aceito os subterfúgios que me cabem,sem precisar mentir.Não sou feia que não possa casar,acho o Rio de Janeiro uma beleza eora sim, ora não, creio em parto sem dor.Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.Inauguro linhagens, fundo reinos- dor não é amargura.Minha tristeza não tem pedigree,já a minha vontade de alegria,sua raiz vai ao meu mil avô.Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.

Mulher é desdobrável.Mulher é desdobrável.Mulher é desdobrável.Mulher é desdobrável.Mulher é desdobrável.EEEEEu sou.u sou.u sou.u sou.u sou.

Com licença poéticaCom licença poéticaCom licença poéticaCom licença poéticaCom licença poética

Adélia Prado

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6CONDENADA POR SER MULHERNo mercado de trabalho brasileiro mulheres são discriminadas, ganhammenos que os homens e perdem o emprego com mais facilidade

14ENTREVISTA - Maria Ednalva Bezerra de LimaDiretora Executiva da Secretaria Nacional sobre a Mulher Trabalhadorada CUT fala a respeito da organização das mulheres

18DEPOIMENTO - Salário da família para uma vidadignaCarolyn Kazdin - Centro de Solidariedade da AFL-CIO no Brasil(Central Sindical dos Estados Unidos)

20DISTRITO INDUSTRIAL DE MANAUSA presença invisível da mulher indígena na indústria da Zona Franca

28DEPOIMENTO - Oportunidades iguais?Astrid Kaag - FNV Mondiaal (Central Sindical da Holanda)

29ARTIGO - Maria Aparecida Silva BentoA mulher negra no mercado de trabalho

32DEPOIMENTO- Em busca de mais aliados e aliadasNeide Fonseca - CNB-CUT (Confederação Nacional dos Bancários)

34ENTREVISTA - Ministra Matilde RibeiroMinistra da Secretaria Especial de Políticas de Promoção para aIgualdade Racial fala sobre a luta contra racismo e discriminação

38DEPOIMENTO - Educação: uma chave para aigualdadeMerja Leskinen - Federação Educativa dos Trabalhadores (Finlândia)

40A MULHER NA POLÍTICAMesmo sendo maioria na população, presença feminina no parlamentonão chega a 10% dos cargos

42ENTREVISTA - Ministra Nilcéa FreireÀ frente da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, aministra fala sobre a situação das mulheres no Brasil

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(...)minha bisavó reclamava

que minha avó era muito tímidaminha avó pressionou minha mãe

a ser menos céticaminha mãe me educou

para ser bem lúcidae eu espero que minhas filhas

fujam desse cárcere

que é passar a vidaque é passar a vidaque é passar a vidaque é passar a vidaque é passar a vidatttttransferindo dívidasransferindo dívidasransferindo dívidasransferindo dívidasransferindo dívidas

Martha Medeiros

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45DEPOIMENTO - Estratégias das mulheres para ocomando corporativoLiv Torres - Instituto de Pesquisa Social Aplicada - FAFO (Noruega)

46O SINDICATO DE SAIASDe cada 100 sindicalizados no Brasil, 36 são mulheres. Nasdiretorias sindicais a ausência feminina é ainda maior

48DEPOIMENTO - Golpe baixoDiis Bohn - Central Sindical LO (Noruega)

50ARTIGO - Solange SanchesAs mulheres no mercado de trabalho brasileiro: desigualdade emudança

52DEPOIMENTO - O olhar sobre a desigualdadeElizabeth Bruzzone - PIT - CNT (Uruguai)

54ARTIGO - Susan Mara ZilliMulher, discriminação e direito do trabalho

56PERFIL - A cor da vitóriaEdineuza: uma história de sucesso num país marcado peladiscriminação

60ARTIGO - Linda Chavez-ThompsonProtegendo trabalhadoras imigrantes

62DEPOIMENTO - O trabalho da OIT para alcançar aigualdade de gênero no trabalhoManuela Tomei - Organização Internacional do Trabalho (OIT)

64ARTIGO - Vanessa PedroO feminismo vira pauta

68ARTIGO - Maria José H. CoelhoOh! Linda imagem de mulher

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IEM REVISTA

"Igualdade de oportunidades entre homens e mulheres". A bandeiralevantada pelas mulheres, cada vez mais presentes no mercado de traba-lho, reflete a organização crescente destas que, ao longo da história, têmprocurado novas formas de estarem inseridas na sociedade.

Para falar no papel da mulher e da discriminação sofrida no mercadode trabalho, esta edição especial do Observatório Social Em Revista pro-curou dar voz a elas, principalmente. As entrevistas com as ministras Nil-céa Freire e Matilde Ribeiro, das secretarias especiais de Política para asMulheres e de Políticas de Promoção para a Igualdade Racial, respectiva-mente, trazem informações sobre as iniciativas governamentais para alte-rar a situação desigual das mulheres brasileiras. A diretora executiva daSecretaria Nacional Sobre a Mulher da CUT, Maria Ednalva Bezerra de Lima,também informa sobre as iniciativas da Central na organização das traba-lhadoras. E, finalmente, mulheres sindicalistas da Europa, América do Nor-te e do Brasil, pesquisadoras e especialistas falam, através de artigos edepoimentos, sobra "a dor e a delícia" de ser mulher em casa, no trabalhoe no sindicato.

A discriminação de gênero e de raça é um dos aspectos estudadospelo Instituto Observatório Social nas multinacionais. As pesquisas apon-tam, em geral, mulheres com salários mais baixos, pouco ou nada presen-tes nos cargos de chefia e mais sujeitas a demissões. Um quadro que jácontém exceções e onde, a depender da disposição e organização, ho-mens e mulheres terão, sim, tratamento igual com respeito às diferenças.

Para fechar, esta edição nº 5 preparada pelo IOS traz dez grandespoetisas brasileiras, com imagens femininas captadas pela fotógrafa Ro-sane Lima, para sublinhar com poesia esta que pretende ser uma homena-gem às mulheres no Ano Nacional da Mulher e ao 8 de março, Dia Interna-cional da Mulher.

Conselho Editorial

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CONDENADAPOR SER MULHER

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7

No Brasil do século 21, as maioresempresas adotam um regime decastas em que as mulheres sãodiscriminadas, ganham menos

que os homens e perdem oemprego com mais facilidade.

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- No Brasil, de cada 10 cargos executivos exis-tentes nas grandes empresas, apenas um éocupado por mulheres.

- No nível de gerência, dois cargos são das mu-lheres e oito dos homens.

- Nas chefias, as mulheres são três e os ho-mens, sete.

- As mulheres também estão em menor núme-ro no chão das fábricas e nos cargos funcio-nais e administrativos: 3,5 contra 6,5.

Os dados foram coletados pela pesquisa PerfilSocial, Racial e de Gênero das 500 Maiores Em-presas do Brasil, realizada pelo Instituto Ethos emparceria com a Organização Internacional do Tra-balho (OIT), o Instituto de Pesquisa Econômica Apli-cada (IPEA), o Fundo de Desenvolvimento das Na-ções Unidas para a Mulher (Unifem) e a FundaçãoGetúlio Vargas (FGV-SP). A pesquisa foi conduzidapelo IBOPE entre julho e setembro de 2003.

Por que isso acontece, se a população bra-sileira tem mais mulheres do que homens?

Porque os homens têm prioridade sobre asmulheres, e a maioria das empresas faz discrimi-nação de gênero. A pesquisa do Instituto Ethos rea-firma essa constatação e mostra que o Brasil en-trou no século 21 sem dar às mulheres os mesmosdireitos concedidos aos homens.

Estudos realizados pelo Observatório Socialem 23 multinacionais no Brasil (disponíveis no sitede internet www.observatoriosocial.org.br) confir-mam que praticamente todas apresentam, em mai-or ou menor grau, algum problema ligado à discri-minação de gênero. Cabe destacar que diversaspesquisas não puderam ir a fundo devido à recusadas empresas em fornecer dados. Foi o caso, porexemplo, da rede de supermercados Wal-Mart. Mes-mo assim, foi possível apurar que a cadeia de su-permercados pratica discriminação de gênero: a mé-dia salarial das mulheres é menor que a dos ho-mens (pesquisa disponível em http://www.o b s e r v a t o r i o s o c i a l . o r g . b r / d o w n l o a d /ReGewalmartport.pdf).

Os homens ocupam 90% dos cargos execu-tivos nas grandes empresas brasileiras. Com umdetalhe: são brancos, o que também demonstra adiscriminação racial. Tanto as pesquisas do Obser-vatório Social quanto o estudo conduzido pelo IBOPEconstatam que a presença de mulheres e negros ébem reduzida se comparada à participação dessesgrupos na população economicamente ativa.

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Convenções da OITAs multinacionais instaladas no Brasil e as

empresas de capital nacional não adotam, em suamaioria, as convenções da OIT que tratam da igual-dade e da não discriminação no trabalho. As duasconvenções foram redigidas na década de 1950,quando a discriminação começou a ser discutidanos países desenvolvidos. Até hoje, contudo, elasainda não "pegaram" entre o empresariado brasi-leiro.

As convenções são as de número 100, sobrea Igualdade de Remuneração, de 1951, e a de nú-mero 111, sobre a Discriminação (emprego e pro-fissão), de 1958.

A Convenção nº 100 dispõe sobre a "igualda-de de remuneração entre a mão-de-obra masculi-na e a mão-de-obra feminina por um trabalho deigual valor", determinando que os países membrospromovam ou garantam meios compatíveis e mé-todos que assegurem tal igualdade.

A Convenção nº 111 define a discriminaçãoem relação ao emprego e trabalho como sendo todaa distinção, exclusão ou preferência fundamentadana raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascen-dência nacional ou origem social que tenha por efeito

destruir ou alterar a igualdade de oportunidades oude tratamento em matéria de emprego ou profis-são.

É gigantesca a distância entre o que propõe aOIT e a realidade do ambiente profissional brasilei-ro. Nesse sentido, é emblemático o depoimento deuma funcionária da Embratel:

"A mulher, para entrar na áreatécnica, tem que ter muito saco, mui-ta coragem, ter peito, porque senãovocê desiste. Além de ganhar bemmenos que todo mundo, você temuma sobrecarga de trabalho enormepara testar até a sua capacidade.Além de ser extremamente cobrada,você nunca atinge .... Se a meta daempresa é atingir 100% e você atin-giu 120%, você é avaliada como regu-lar. Então você não consegue entendernesse métier o que é excepcionalida-de. Entendeu? Você é mulher... Agorapro homem não tem esse problemanão."(http://www.observatoriosocial.org.br/downlo-ad/ReGeembratelport.pdf)

Fonte: Instituto Ethos/IBOPE

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CONDEN

ADAPORSER

MULH

ER“As mulherestambém estão atrás nochão das fábricas e noscargos funcionais eadministrativos: 3,5mulheres para 6,5homens.”

Ainda mais grave é a situação no ABN AMRO,o segundo maior banco estrangeiro em atuação noBrasil, com 22.500 funcionários. A pesquisa doObservatório Social apurou que o banco discriminaas mulheres (disponível em http://www.o b s e r v a t o r i o s o c i a l . o r g . b r / d o w n l o a d /ReGeabnport.pdf). Elas deixam de ser promovidas,sofrem assédio moral e trabalham muitas vezes emum ambiente inadequado à sua condição. Além dis-so, as mulheres ocupam funções de menor remu-neração. O ABN AMRO reconheceu e demonstroupreocupação com esse quadro, tendo criado umprograma específico para combatê-lo, denominado“Programa Diversidade”.

Dupla jornadaNo Brasil, é notório que a inserção da mulher

no mercado de trabalho acontece de maneira bem

mais precária que a do homem: baixos salários,ocupação de postos precários, discriminação nacontratação e na ascensão profissional. Sem falarque muitas mulheres ainda têm que cuidar dos fi-lhos e da casa, tarefas que lhes são tradicionalmen-te atribuídas.

O depoimento de uma funcionária da Hondailustra a afirmação acima:

"Na empresa, a maioria doscargos mais altos são exercidos porhomens e não por mulheres. Comoa empresa é muito grande, existemmuitos cargos de gerente geral, ge-rente, supervisor, coordenador echefe. Pelo que a gente sabe sãomais de 150 cargos desses, só quenão tem nem dez mulheres exercen-do essas funções".(http://www.observatoriosocial.org.br/downlo-ad/ReGehondaport.pdf)

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Por que a discriminação acontece?Por três motivos, segundo as pesquisadoras

Solange Sanches e Vera Lucia Mattar Gebrim, au-toras de "O Trabalho da mulher e as negociaçõescoletivas" (estudo publicado pelo Instituto de Estu-dos Avançados da Universidade de São Paulo):

- Dificuldades de inserção no mercadode trabalho: a mulher tem mais dificuldade doque o homem para arrumar emprego. Quan-do são demitidas, costumam ficar longos pe-ríodos sem ter uma colocação.

- Vulnerabilidade na inserção: as dificul-dades que elas encontram para entrar no mer-cado de trabalho refletem na qualidade doemprego obtido, muitas vezes sem carteiraassinada.

- Desigualdade na remuneração: os ren-dimentos da mulher no mercado de trabalhosempre é menor que o do homem.

O que precisa ser feito?Segundo as pesquisadoras, um dos espaços

mais importantes para a conquista de garantias aotrabalho da mulher, sem discriminação de gênero,é a negociação coletiva de trabalho. "É preciso au-mentar a negociação de garantias relativas à eqüi-dade de gênero", afirmam as pesquisadoras.

As mulheres brasileiras conquistaram espa-ços importantes após a promulgação da Constitui-ção de 1988, principalmente no que diz respeito àspolíticas públicas. Em relação ao trabalho, contudo,os avanços esbarram no preconceito, na discrimi-nação e no machismo que impera nas grandesempresas. A maioria delas, inclusive, tem um dis-curso muito bem fundamentado sobre práticas deresponsabilidade social. O desafio é transformar asmetas em ações reais. Nesse caso, como apontao presidente do Observatório Social Kjeld Jakobsen,é preciso buscar uma maior convergência entre aagenda sindical e as empresas socialmente respon-sáveis no campo da discriminação de gênero e raça,de maneira que seja cumprido o que a OIT escre-veu há meio século.

Fonte: PNAD/IBGE - 1998 Extraído de: Guimarães e Consoni, 2000: “As desigualdades reestruturadas” Pesquisa CUT-Finep

SETORES MULHERES HOMENSBens de Capital 13,6 86,4Alimentos 31,4 68,8Calçados 47,2 52,8Couro 17,9 82,1Informática 30,8 69,2Telecomunicações 34,2 65,8Têxtil 46,8 53,2Vestuário 76,1 23,9

DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DE HOMENS E MULHERESPOR ALGUNS SETORES DE TRABALHO

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O Instituto Observatório Social (IOS) concluiu, em2003, pesquisas em três empresas holandesas que atu-am no Brasil: Unilever, Philips e Akzo Nobel. Nas trêsempresas, em maior ou menor grau, foi confirmada a ten-dência apontada por outros estudos sobre o mercado detrabalho brasileiro, como o tratamento desigual de traba-lhadores e trabalhadoras, em relação a salários, presen-ça nos cargos de chefia e emprego.

Os pesquisadores também não registraram a exis-tência de programas de caráter afirmativo que se propo-nham a promover os preceitos das Convenções que tra-tam da igualdade e da não discriminação no trabalho. AConvenções nº 100 (Igualdade de Remuneração) e a Con-

Pesquisas nas empresasholandesas confirmam tendência

TRATAMENTO DESIGUAL

Philips- Há predomínio de homens nos cargos de gerente e maioria dos mesmos nos cargos de chefia- A média de escolaridade das mulheres é superior

- As mulheres que atuam na Philips representam 35,65% da força de trabalho da empresa, desse total90,22% estão nas funções operacionais e, portanto, nas faixas salariais mais baixas

- Observa-se através das rescisões de contrato que a média do salário dos homens é 2,6 vezes maior queo das mulheres

- Os homens ocupam 89,47% dos cargos do nível executivo e 73,91% do nível intermediário- Embora não se tenha tido acesso a dados para uma comparação de funções iguais entre homens e

mulheres terceirizados e suas respectivas remunerações, foi possível depreender, a partir das informa-ções pesquisadas, que boa parte das mulheres que prestam serviço na Philips da Amazônia IndústriaEletrônica Ltda. encontra-se dentre as faixas salariais mais baixas

venção 111 (Discriminação no emprego e profissão), am-bas da OIT, são usadas como referência na análise dospesquisadores do IOS.

Os estudos realizados nas empresas alemãs fa-zem parte do projeto Monitor de Empresas desenvolvidopela FNV (Federatie Nederlandse Vakbeweging, centralsindical holandesa). O objetivo é gerar um conjunto deinformações atualizadas sobre as empresas, envolver ostrabalhadores e suas organizações sindicais na observa-ção e estimular o intercâmbio de informações entre enti-dades sindicais.

Acompanhe alguns resultados das pesquisas emrelação à discriminação de gênero nas três empresas:

CONDEN

ADAPORSER

MULH

ER

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Akzo Nobel- Os dados relativos às listas de contribuição sindical compulsória (imposto sindical) fornecidas pelos

sindicatos apontam que, na Organon, unidade da Akzo Nobel, em 1999, o salário médio femininocorrespondia a 44% da remuneração masculina; e o tempo médio de emprego da mão-de-obra masculinaera de 6,6 anos e das mulheres era de 7,4 anos

- Na divisão de revestimentos, em 2001, os trabalhadores da unidade "Tintas Decorativas", de São Paulo/SP, dos quais foi recolhido o imposto sindical para o Sindicato dos Químicos de São Paulo, o salário doshomens correspondia, em média, à 94% da remuneração feminina

- na AKzo Nobel, 1/5 da mão-de-obra é de mulheres, mas somente 3% conseguem alcançar cargos gerenciais(entre os homens esse percentual é de 14%). Na Organon, mais de 1/3 dos trabalhadores é do sexofeminino, e apenas 4% desempenha atividades gerenciais (entre os homens esse percentual é de 17%).Na Proquímio, as mulheres representam 17% da força de trabalho, mas não há mulheres em atividadesgerenciais. Na Eka, 1/4 do contingente empregado é de mulheres, mas apenas 1% delas está alocado emcargo gerencial (entre os homens há 11%). Na Repintura Automotiva, 14% da mão-de-obra são compostaspor mulheres, mas somente 4% delas possuem cargo gerencial (entre os homens há 17%)

Unilever:- Diferentemente do que ocorre em muitas empresas brasileiras, na Unilever as mulheres não recebem

menos do que os homens pelo exercício de funções equivalentes, de acordo com os próprios trabalhadores(a pesquisa não teve acesso à estrutura salarial da empresa)

- Em algumas unidades não há mulheres no setor de produção e o alegado pelos trabalhadores é que otipo de função exige força física; esse ponto de vista poderia limitar as oportunidades de promoção e apossibilidade das mulheres em obter melhores salários

- Em Vinhedo (SP), a maioria das mulheres está concentrada na área administrativa, dos 54 gerentes dafábrica, 18 são do sexo feminino, o que representa 33% do total

- Em reunião com sindicalistas de várias unidades no Brasil, foi apontado que mulheres dificilmente chegamao cargo de coordenadoras

- A baixa presença de mulheres negras em funções importantes da empresa é percebida por grande partedos trabalhadores

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CONDEN

ADAPORSER

MULH

ER

Instituto Observatório Social contacom Termo de Referência para

pesquisar discriminação de gênero

Para realizar as pesquisas nas multi-nacionais que atuam no Brasil, o Instituto Ob-servatório Social (IOS) desenvolve, desde suafundação, uma metodologia de pesquisa queestá em constante aperfeiçoamento. A obser-vação realizada considera aspectos da liber-dade sindical, negociação coletiva, trabalhoforçado, trabalho infantil, discriminação degênero e de raça, segurança e saúde do tra-balho, meio ambiente e responsabilidade so-cial empresarial.

Verificar se uma multinacional discri-mina ou não as mulheres, por exemplo, nãoé uma tarefa fácil, nem uma questão mate-mática. Empregar cem mulheres e cem ho-mens não significa tratá-los de forma igual,remunerá-los da mesma forma ou propiciaras mesmas condições de crescimento na car-reira. Assim, para a verificação da discrimi-nação de gênero e também os outros aspec-tos, são desenvolvidos Termos de Referência,em que a contextualização histórica, as refe-rências bibliográficas e de pesquisas e a le-gislação existente são colocadas, para con-solidar a metodologia e propiciar uma pa-dronização dos relatórios produzidos nas di-versas empresas.

"Atingir a igualdade de remuneraçãoe promover a igualdade de oportunidades en-tre mulheres e homens nos locais de traba-lho" é o título do Termo de Referência pre-parado pela professora doutora Paolla Ca-pellin, consultora do Instituto para o tema gê-nero. O documento apresenta a contextuali-zação dos direitos das mulheres na OIT (Or-ganização Internacional do Trabalho); refe-rências históricas da igualdade salarial e depromoção da igualdade de oportunidades, asdefinições metodológicas a partir das conven-ções 100 e 111 da OIT; a legislação brasilei-ra que trata do tema e os indicadores dispo-níveis para as pesquisas do IOS.

O Termo de Referência sobre gênero,além de indicar referências nacionais e in-ternacionais que permitem distinguir a exis-tência da discriminação, busca identificartambém as ações de promoção da igualdadede tratamento entre homens e mulheres. Éressaltada a importância da interação comos sindicatos dos trabalhadores nacionais einternacionais, para fomentar ações propo-sitivas na conquista desta igualdade de re-muneração e de oportunidades para traba-lhadores e trabalhadoras.

14

Atenta às questões de gênero,em fevereiro de 2004 a CUTcriou a Secretaria Nacional

Sobre a MulherTrabalhadora, estruturada

nos mesmos moldes dasdemais secretarias que

compõem as direçõesexecutivas da entidade

Compete a essa secretaria:- elaborar, coordenar e desenvolver

políticas no interior da CUT para apromoção das mulheres trabalhadoras naperspectiva das relações sociais de gênero,

raça e classe, subsidiando as instânciashorizontais e verticais e as entidades

filiadas nos seus respectivos âmbitos;- organizar as mulheres trabalhadoraspara intervir no mundo do trabalho e

sindical sobre as questões que interferemna vida destas mulheres enquanto

trabalhadoras.

A diretora executiva da Secretaria, MariaEdnalva Bezerra de Lima, conversou com

o Observatório Social Em Revista sobre aorganização das mulheres na Central,

sobre a discriminação sofrida pelasmulheres no mercado de trabalho, política

de cotas e sobre sua própria trajetória demulher trabalhadora e sindicalista:

O que muda no movimento sindical a partir dacriação da Secretaria Nacional sobre a MulherTrabalhadora, no 8º Congresso Nacional daCUT?

A criação da Secretaria Nacional sobre a Mu-lher Trabalhadora da CUT (SNMT/CUT) consolida 17anos de organização das mulheres no âmbito sindi-cal cutista. A Secretaria significa um salto de quali-dade e o reconhecimento da importância da contri-buição das mulheres enquanto sujeito social e políti-co, na estrutura sindical.

A política de gênero desenvolvida pela CUT,desde 1986, através da Comissão Nacional sobre aMulher Trabalhadora (CNMT) e agora pela SNMT, temcomo principal objetivo organizar as mulheres e sen-sibilizar trabalhadores e trabalhadoras, dirigentes sin-dicais da Central, para a superação das desigualda-des entre homens e mulheres no mundo do trabalhoe na sociedade em geral.

Nossas estratégias para superar a discrimina-ção e a exclusão social passam por identificar temasimportantes e prioritários que contribuam para a igual-dade de oportunidades no mundo do trabalho e sindi-cal. As demandas de trabalhadoras e trabalhadoressão diferenciadas dada a divisão sexual do trabalho eas relações de poder. Por isso é fundamental consi-derar a situação concreta das mulheres para a for-mulação do conjunto das políticas e da intervençãosindical.

Quais são as principais formas dediscriminação à mulher no mercado detrabalho?

As mulheres representam a maioria da forçade trabalho. No entanto, continuam a receber salá-rios inferiores aos dos homens. Pesquisas revelamque elas têm mais oportunidades de empregos (RAIS/2002). Porém, a remuneração da mulher é, em mé-dia, 82,3% da remuneração do homem. As mulheres

CUT cria Secretariada Mulher

15

com nível escolar superior completo só conseguemreceber 58% do salário dos homens com igual esco-laridade.

As mulheres deparam-se com as velhas e no-vas formas de discriminação. Além das diferençassalariais, há os obstáculos ao seu acesso aos car-gos mais elevados e qualificados do ponto de vistada valorização do trabalho e/ou cargos de chefia, ondeestão presentes a concentração do poder e os me-lhores salários. Muitas vezes, quando as mulheresocupam esses cargos, o posto de trabalho tende aser menos valorizado. Além disso, existem as discri-minações diretas e indiretas, como o estabelecimentode critérios para contratação que eliminam mulherescasadas e com filhos. O acesso e a permanência noemprego continuam vinculados a comprovação denão gravidez, limite de idade, experiência profissionale, em muitos casos, à religião, nacionalidade, etnia.No emprego, o assédio sexual e assédio moral noambiente de trabalho se intensificam. E, de formageneralizada, nota-se as limitações para conciliar otrabalho com as responsabilidades com a família e acasa, devido à permanência da divisão desigual en-tre os gêneros.

Um dos eixos de atuação da SNMT é aintervenção nas políticas públicas. Como sedará esta ação?

Pretendemos continuar atuando de forma de-cidida para que a especificidade da situação vividapelas mulheres seja incorporada na elaboração e naimplementação das políticas públicas, através da di-vulgação e mobilização em torno de bandeiras cen-trais e do diálogo com o governo, nos diferentes es-paços existentes.

Na organização sindical, a presença da mulherafirmou-se, inclusive, a partir da política decotas. A Comissão Nacional sobre a MulherTrabalhadora evoluiu com a criação daSecretaria Nacional sobre a MulherTrabalhadora. Quais os próximos passos?Como incluir as mulheres trabalhadoras nomovimento sindical?

A CNMT, em um primeiro momento, difundiu apolítica de gênero na CUT estabelecendo trabalhos einterface com outras políticas da Central. Ao longodesses 17 anos de desenvolvimento desta política vol-tada para as trabalhadoras com a perspectiva de gê-nero, sem dúvida, a implementação de cotas (míni-mo de 30% e máximo de 70% para ambos os sexosde participação nas instâncias de direção) foi um dosgrandes êxitos da nossa luta. Esta estratégia ainda éuma prioridade. Consideramos necessária a conti-nuidade deste debate para o fortalecimento das polí-ticas afirmativas e a busca da eqüidade de gênero

“As mulheres deparam-secom as velhas e novas formas de

discriminação. Além dasdiferenças salariais, há os

obstáculos ao seu acesso aoscargos mais elevados e

qualificados do ponto de vista davalorização do trabalho e/oucargos de chefia, onde estãopresentes a concentração do

poder e os melhores salários.”

ENTR

EVISTA

16

nas instâncias da CUT e em suas estruturas hori-zontais e verticais. A discussão em torno da partici-pação das mulheres requer um debate franco e clarono que se refere ao poder. Requer a adoção de me-didas compensatórias que estimulem, garantamcondições práticas, preparem e produzam mudan-ças mais radicais nas estruturas de poder e quebusquem desafiar os modelos já dados de repre-sentação e participação, já que o reconhecimentodas diferenças é fundamental para a conquista daigualdade entre homens e mulheres. Garantir a pre-sença e a participação das mulheres requer o esta-belecimento de condições favoráveis como crechenos eventos sindicais, horários de reuniões com-patíveis com a existência da dupla jornada de traba-lho e as responsabilidades familiares.

Percebemos que a participação efetiva dasmulheres no poder tem permitido um crescimentocoletivo enquanto sujeitos políticos, bem como pos-sibilitado a construção coletiva do discurso da clas-se trabalhadora sexuada, que vai além dos traba-lhadores homens como representação do masculi-no e do feminino. É necessário ampliar a capacita-ção de dirigentes para que as reivindicações dasmulheres ganhem maior prioridade no exercício dopoder e na mudança da convivência.

Como a SNMT vê a ação das multinacionaisno Brasil, em relação às mulherestrabalhadoras? O movimento sindicalbrasileiro pretende se articular com omovimento internacional, também nasnegociações em relação às temáticas degênero?

A articulação da CUT com o movimento sin-dical internacional já existe há muitos anos. Estaconstrução de relações com as entidades sindicaisde outros países e regiões vem num crescente. Atu-almente, como dirigente nacional representante daCUT Brasil, sou responsável pela comissão demulheres da CCSCS (Coordenadora de CentraisSindicais do Cone Sul), vice presidenta do Comitêde Mulheres da ORIT, membro do conselho Execu-tivo/ORIT (Organização Regional Interamericana deTrabalhadores) e integrante do Comitê Mundial de

Mulheres da CIOSL (Confederação Internacional dasOrganizações Sindicais Livres).

A SNMT faz parte do Conselho Diretor doObservatório Social. Como as pesquisasrealizadas pelo Observatório nasmultinacionais que atuam no Brasil podemfortalecer a atuação da Secretaria, no âmbitonacional e internacional?

Através dos resultados das pesquisas pode-mos orientar nossas ações e atuações sindicais,qualificando o desenvolvimento da política de gêne-ro da Central, nos diferentes níveis. Quanto maiorfor o nível de análise e cruzamento de dados daspesquisas com a ótica de gênero, maior é a possi-bilidade de identificação da realidade vivida pelasmulheres. Conseqüentemente, nossas interven-ções, principalmente, nas negociações coletivasalcançam um outro patamar.

Como mulher e dirigente sindical da CUT, faleum pouco sobre sua trajetória profissional epolítica.

Sou da Paraíba, professora e participava daAMPEP (Associação do Magistério Público do Es-tado da Paraíba). Naquela época, como funcionáriapública não podia me associar em sindicato. Em 84organizamos uma greve de 100 dias naquele Esta-do por melhores salários e condições nas escolaspúblicas. Esta greve contou com a solidariedade eapoio dos outros sindicatos e da CUT. Minha mili-tância se intensificou. Após a criação do sindicato,onde fui do conselho diretor, coordenei a comissãoestadual de mulheres da CUT/PB e fui integranteda comissão nacional sobre a mulher trabalhadorada CUT Nacional. Estive à frente da secretaria depolíticas sociais da CUT/PB. Desde 2000, faço par-te da Executiva Nacional da CUT. De 97 a 2003 fuicoordenadora da CNMT e hoje secretária nacionalsobre a mulher trabalhadora da CUT. Pela CUT, co-ordeno a comissão de mulheres da CCSCS, souvice presidenta da comissão de mulheres da ORIT eintegrante do comitê mundial de mulheres da CIOSL.

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Moço, cuidado com ela!Há que se ter cautela com esta

gente que menstrua...Imagine uma cachoeira às

avessas:cada ato que faz, o corpo

confessa.Cuidado, moço

às vezes parece erva, parecehera

cuidado com essa gente que geraessa gente que se metamorfoseia

metade legível, metade sereiaBarriga cresce, explode

humanidadese ainda volta pro lugarque é o mesmo lugar

mas é outro lugar, aí é que está:

Aviso da LuaAviso da LuaAviso da LuaAviso da LuaAviso da Lua que Menst que Menst que Menst que Menst que Menstrrrrruauauauaua

cada palavra dita,cada palavra dita,cada palavra dita,cada palavra dita,cada palavra dita, antes de dizer, antes de dizer, antes de dizer, antes de dizer, antes de dizer,homem, reflita...homem, reflita...homem, reflita...homem, reflita...homem, reflita...

(...)

Elisa Lucinda

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TTTTTTodos(as) nós sabemos das disparidadessalariais entre homens e mulheres. Tudo fica ainda maisgrave quando inserimos a variável raça. Ou seja, umamulher branca ganha menos que um homem branco,um homem negro ganha menos que uma mulher brancae uma mulher negra ganha ainda menos que umhomem negro. Porém, o que fazer para mudar quadrotão vil? Cientes de que é mais eficaz trabalhar emconjunto (mulheres e homens) do que fazer essajornada sozinhas, vamos aos fatos:

- de acordo com um estudo da AFL-CIO feito nosEstados Unidos, famílias de trabalhadoras(es)pagam um alto preço devido à discriminaçãosalarial de gênero;

- existe uma perda de aproximadamente US$ 200bilhões anuais, que significa uma perda média deUS$ 4.000 por ano em função das diferenças(discriminação) salariais;

- caso as mulheres casadas ganhassem o mesmoque seus colegas homens, sua renda familiarcresceria em torno de 6% e a taxa de pobrezadecresceria de 2.1% para 0.8 %;

- caso as mães solteiras ganhassem o mesmo queseus colegas homens, sua renda familiarcresceria em torno de 17% e a taxa de pobrezadecresceria a metade, ou seja, de 25.3% para12.6%;

- caso as mulheres solteiras ganhassem o mesmo

Representante doCentro de

Solidariedade dacentral sindical

norte-americanaAFL-CIO no Brasil.

CCCCCarolyn Karolyn Karolyn Karolyn Karolyn Kazdin.azdin.azdin.azdin.azdin.

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Salário dafamília para

uma vidadigna

que seus colegas homens, sua renda cresceria13.4% e a taxa de pobreza decresceria de 63%para 1%.

Podemos estar certos de que se tal estudo fosserealizado no Brasil, as conclusões seriam muitoparecidas, ou seja, mulheres ganhando menos implicaem homens ganhando menos. Desigualdade salarialafeta os homens negativamente, também. Igualdadesalarial ajuda os homens, também.

O Instituto ETHOS, em parceria com a FGV-SP, o IPEA, a OIT e a Unifem, divulgou em dezembroúltimo uma pesquisa executada pelo Ibope, intituladaPerfil Social, Racial e de Gênero das 500 Maioresempresas do Brasil e Suas Ações Afirmativas. Deacordo com os dados de tal pesquisa, as empresas emsua maioria esmagadora continuam sendo masculinas ebrancas. Quando divididos por gênero, conforme osníveis hierárquicos, encontramos 91% de homens e9% de mulheres, e quanto à raça, 96,5% de brancos,1,8% de negros e 1,7% de amarelos.

Para o Solidarity Center, AFL-CIO, tem sidoum privilégio trabalhar junto ao Observatório Social eà CUT na organização das mulheres trabalhadorasnegras e brancas. Representamos hoje 45% da mão-de-obra mundial; ainda somos 70% da populaçãomundial que vive na pobreza. No mundo, ganhamos75% do que ganha um homem, sem desagregar por

raça/cor/etnia. Quando se desagrega por etnia osdados tendem a ser bem piores para mulheres não-brancas.

Todos(as) nós perdemos quando as mulheresganham menos, em especial as mulheres negras noBrasil. As mesmas representam um enorme contigenteaqui, diferentemente dos Estados Unidos, onde apopulação afro-americana não ultrapassa 15% dapopulação.

O lugar da mulher é também no seu sindicato!Com as transformações no mercado de trabalho, ossindicatos também têm que se transformar. Nós,mulheres, temos que ocupar o nosso espaço nossindicatos. Como 45 % da força de trabalho quesomos, temos que nos sentir a vontade no sindicatoem busca de nossa integração. Precisamos estarprontas para assumir posições de liderança.

É sobre poder que estamos falando: poder namesa de negociação; poder para conquistar uma vidade qualidade, com trabalho digno, salário igual, e apossibilidade de educar nossos filhos e cuidar denossas famílias numa sociedade justa, semdiscriminação. Sim! Um outro mundo é possível. Eestá sendo construído aqui no Brasil com a busca dejustiça social e econômica para a nação, capacitandoas pessoas a terem voz no trabalho, junto aos seusgovernos e em suas comunidades.

DEP

OIM

ENTO

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A presença (in)visível DISTRITO INDUSTRIAL DE MANAUS

20

A presença (in)visível

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da mulher indígenaNa década de 1980,

um grupo de professoresdas Universidades doAmazonas e Paráparticipou de um estudosobre "A Mobilidade doTrabalho Feminino nasIndústrias de Belém eManaus". Nele, foianalisado o conceito demobilidade, não apenascomo deslocamento, masna concepção marxistaque diz respeito a como amão-de-obra é atraída erecrutada paradeterminados tipos deatividades produtivas;como ela é utilizada eesgotada no processo; ecomo é dispensada. Comisso foi possível esclarecerpor que 75% da mão deobra era feminina; porque era tão jovem e porque a tipologia da seleçãopreferia pessoas de traçosmais asiáticos, traçosmais finos.

21

da mulher indígenaEleonora de Paula e Souza Dias

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Parte dessa pesquisa associava a habilidade manu-al e também o fato de essa população não ter sido agri-cultora - portanto não tinha mãos grossas e calejadas pe-los trabalhos agrícolas manuais - como um dos pré-requi-sitos para a contratação. Por isso contratavam mais mu-lheres. As indústrias de montagem àquela época necessi-tavam de destreza manual e, principalmente, mãos extre-mamente finas para serem mais sensíveis ao manuseio doscomponentes. Em algumas empresas se aplicava um testeem que as jovens manuseavam e jogavam para cima bo-las de isopor para ver se elas tinham as mãos longas efinas e leveza suficiente para o aperfeiçoamento da mon-tagem e do acabamento. Esse era um dos motivos pelosquais as indústrias queriam mulheres jovens, fenotipica-mente mais asiáticas e pessoas do interior que vinham paraManaus.

Na análise desse estudo, percebe-se a presençainvisível da mulher indígena no que foi considerado fenóti-po asiático. São as índias com destreza manual e tantosoutros requisitos tais como: concentradas, assíduas, re-servadas e pouco falantes. O perfil da operária ideal, se-gundo o tecnólogo Raimundo Pinto. Ele trabalhou duran-te 24 anos no Distrito Industrial em três grandes empresasonde, nas linhas de produção, no auge da Zona Franca,apenas dois operários se identificaram como indígenas.

Não há nenhum levantamento específico da pre-sença de mulheres indígenas no Distrito Industrial de Ma-naus; nem no Departamento Feminino do Sindicato dosMetalúrgicos esse dado é conhecido no entanto, os tra-ços indígenas marcam as feições das mulheres sindica-listas. Adede Maria Farias da Silva, assessora do Sindi-cato pela Confederação Nacional dos Metalúrgicos, pós-graduada em Gestão, Planejamento e Qualidade, diz quea presença da mulher indígena não está invisível, mas "ca-muflada" nas diversas nacionalidades nativas diluídas napopulação não-indígena.

Nas indústrias esse dado também não existe. Entãono Amazonas as mulheres indígenas não estão inseridas noParque Industrial da Zona Franca de Manaus? Essa poderiaser a constatação pelos dados apurados, porém a realidadeé outra. As mulheres indígenas estão realmente inseridas noPólo Industrial, basta acompanhar a chegada dos ônibus aoDistrito às seis horas da manhã. Não se ouve ninguém falan-do a língua materna de seu povo, ou mesmo o Nhengatu(variação da língua Tupi adaptada pelos Jesuítas e usada paraunificar a comunicação em todo o país, utilizada ainda hojeem muitas regiões amazônicas por índios e não-índios), masa tez morena, os olhos amendoados e os cabelos negros evi-denciam a presença indígena.

A não identificação, então, seria receio do precon-ceito? A doutora em Sociologia e secretária de Estado deCiência e Tecnologia Marilene Corrêa da Silva Freitas,uma das participantes do estudo sobre Mobilidade doTrabalho Feminino, discorda e justifica: "A população médiae as pessoas que formam a opinião pública não sabemque é uma ideologia de nacionalização brasileira ignoraras nacionalidades e as nações indígenas. Existem dados epesquisas sobre esse processo de destribalização na ci-dade, os grupos e nações foram destribalizados, desterri-torializados, eles moram na cidade mas continuam comsuas identidades no âmbito privado e da comunidade. Noâmbito da sociedade eles concorrem como todo ser hu-mano ao mercado de empregos, a uma vida de controlesocial difuso, a um padrão mais ocidental de organizaçãosocial. A própria ideologia nacionalizante fala que a po-pulação majoritária já é cabocla, não fala que ela é devárias nacionalidades indígenas. Assim, busca-se com issofazer desaparecer as diferenças e dizer que nós temosuma participação na composição nacional como des-cendentes de índios, e não como índios propriamente di-tos. Nesse sentido ninguém fazia discriminação com asmulheres porque elas eram índias, ou descendentes; pelocontrário, queria até porque elas têm a pele mais fina, asmãos finas e leves."

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A revelaçãoda identidade

A identidade é uma coisa muito mais complexado que simplesmente ser discriminado e ocultar o nome,destaca a socióloga Marilene Corrêa. "A identidade serevela na comida, no comportamento, na postura cor-poral, na etiqueta, na preservação da tradição, na pre-servação da língua, na transmissão dos hábitos e doconhecimento tradicional para os filhos". E assim serevelaram indígenas as operárias da Philips, todas ama-zônidas com ascendência indígena muito próxima.

"Eu nunca falei 'sou índia', mas as pessoas falame não fico chateada. Sou do Pará e sei que tanto aquicomo lá é terra de índio. Sei que sou uma índia, quetenho sangue de índio e tenho orgulho por isso" declaraa operadora de montagem Ângela Maria Meira, 30anos, paraense de Santarém, trabalhando na empresahá seis anos.

Suellen Lima Bezerra, 20 anos, operadora deprodução, é de Parintins, a terra do Boi Bumbá e daCunhã-Poranga (moça bonita em Tupi e personagemdo Boi Bumbá de Parintins). Ela também se reconhececomo índia: "A minha própria aparência mostra isso.Minha avó era índia e quando dizem que pareço comíndio fico feliz".

Missilene Lima, estagiária de engenharia, e Te-reza Cruz, operadora de produção, seguem na mesmalinha, destacando que só recebem elogios pelos traçosindígenas marcantes e que nunca se sentiram discrimi-nadas na empresa, pelo contrário, sentem-se valoriza-das pelo seu potencial, revelando ainda que mulherescom as mesmas características ocupam cargos de che-fia. Portanto, concluem que a presença da mulher in-dígena no Distrito Industrial de Manaus é só motivo deorgulho.

"Eu nunca falei 'sou índia', mas as pessoas falam e não fico chateada.Sou do Pará e sei que tanto aqui como lá é terra de índio. Sei que sou uma

índia, que tenho sangue de índio e tenho orgulho por isso" declara aoperadora de montagem Ângela Maria Meira, 30 anos, paraense de Santarém.

TRABALH

ADORAIN

DÍG

ENA

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A reinvenção da identidade

Dados do censo sobre a população indígena mos-tram um aumento significativo, não só pela taxa de cres-cimento, maior que da população não-índia, mas peloreconhecimento de novos povos indígenas pela Funda-ção Nacional do Índio (Funai). Há poucos anos se diziaque no município de Barcelos (cidade localizada às mar-gens do Rio Negro/AM) não havia índios. Agora, vive-se um processo de redescoberta da identidade. Umexemplo disso é o professor desconhecido que se ele-geu presidente da Federação das Organizações do AltoRio Negro - FOARN, uma das maiores organizaçõesindígenas brasileiras. O ilustre desconhecido se reco-nhece pertencente ao povo Baré.

Esse é um processo de re-etnização, ou "reinven-ção identitária", conforme Marilene Corrêa: "Não se podedizer que estão recuperando a identidade ancestral, pois

estão adaptando a identidade ancestral ao momento his-tórico em que vivem".

A índia Dessana (povo indígena que habita a re-gião do Rio Negro, município de São Gabriel da Ca-choeira/AM) Zelinda Saldanha da Silva, 31 anos, ope-radora da Showa há três anos, sabe que é índia. Mas foicriada pensando que índio era aquele de tanga, e não seapercebia que entendendo a língua dos seus parentesmais próximos, que falavam o Tukano - índios do RioNegro, considerados como grupo hegemônico da re-gião -, estava afirmando sua identidade indígena.

Hoje, técnica de enfermagem, cursando ServiçoSocial e trabalhando como operadora, continua sendoíndia, só que numa outra realidade, distante da que vive-ram seus avós e até mesmo seus pais. "Aqui na empresatemos outras índias, só que elas não dizem 'eu sou índia',eu também não falo, todo mundo já vê que sou índia,mas não sou tratada de maneira diferente por isso".

A índia Dessana Zelinda é operadora da Showa

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Cultura tradicional & tecnologia

Os colonizadores em sua época tinham convic-ção de que não poderiam interiorizar o Estado NacionalBrasileiro, nem poderiam dar um passo a cerca do apro-veitamento produtivo dos recursos naturais sem a mão-de-obra Tapuia (eram todos os índios genéricos). O pró-prio Estado Nacional já sabia que era à força de traba-lho local, a força da população indígena, transformadaem mão-de-obra, que seria capaz de interiorizar o Esta-do Nação.

Trazendo essa concepção para a realidade do PóloIndustrial da Zona Franca, possivelmente, pode ter sidoesse o mesmo pensamento dos empresários, ao instala-rem suas indústrias em Manaus. Eles reconheceram aforça da mão-de-obra feminina e indígena e, ainda, queos índios são perfeitamente adaptáveis às formas pro-dutivas não exploratórias e modernas.

A Nokia, unidade de Manaus, é um exemplo daconvivência, no cotidiano, do conhecimento tradicionalcom a alta tecnologia, como mostraram em seus relatosas operárias Estelita Mota, Alexsandra Dantas e Mar-cilene Oliveira. As três são amazonenses de regiõesdíspares, porém, unificam-se contando as práticas decura que utilizam com plantas em forma de chás, ba-nhos e xaropes.

Estelita é a que tem traços indígenas mais fortes.Na reconstrução de sua identidade descobre-se que otom da pele, mais acentuado, vem do avô, um gregoque fugiu da guerra e aqui casou com uma índia. Elaconta que sua mãe, mesmo morando em Manaus, quan-do chegava a hora de ter criança, ia para o interior embusca da avó, que era índia, para ter os filhos de formanatural, ou seja, como os índios. Técnica em eletrônicae cursando Fisioterapia, ela confessa que os traçosindígenas só lhe dão prazer.

"Só a mão-de-obra Tapuiaé capaz de dominar a

Amazônia"

(relato de colonizadores)

TRABALH

ADORAIN

DÍG

ENA

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Alexsandra é uma incorporação da Cunhã-Po-ranga, confirmando sem modéstia que se acha boni-ta, justamente pelos traços indígenas. Em sua casa,conta, é passada uma tradição de pais para filhos douso e preparo de remédios naturais. Marcilene seconsidera uma Sateré-Mawé (povo indígena que ha-bita a região do Baixo Amazonas, são consideradosFilhos do Guaraná), sua família morava numa locali-dade chamada Maloca e recorda-se de, quando cri-ança, ter participado de danças tradicionais dos ín-dios da região. O uso de ervas está tão arraigado noseu dia-a-dia que ela chega a medicar alguns colegasda empresa.

A glamourizaçãoda mulher amazônica

"Estamos vivendo uma redescoberta da pre-sença da mulher indígena, esse é um bom momentonão só para elas, mas para toda a problemática étni-ca. Antes não era assim. Essa presença é mais mar-cante por conta das bases sociais do trabalho", afir-ma Marilene Corrêa, enfatizando que essa desco-berta valoriza os traços fenotípicos não só pelo exo-tismo, que às vezes se torna pejorativo, mas deforma positiva em função da beleza, da graça, dadiferença, um lado valorizado que é reconhecido empassarelas de moda, na Cunhã-Poranga - é a gla-mourização da reinvenção étnica.

Indígenas e trabalho

A polêmica sobre a demarcação da Terra Indíge-na Raposa Serra do Sol trouxe de volta a pecha discri-minadora do índio preguiçoso, disseminada no Brasilatravés da história. Essa não é a mesma forma de pen-sar dos gestores do Pólo Industrial de Manaus, que re-conhecem a potencialidade da força de trabalho localamazônica, onde estão inseridos os índios. Um dado quenão é novo para a socióloga Marilene Corrêa: "Aspessoas que lidam diretamente com o processo de adap-tação da produção à mão-de-obra do Distrito Industrialsempre a consideraram como uma das mais produtivasdo mundo, tendo um padrão de produtividade maior doque em outras cento e poucas zonas francas que exis-tem, e essa é uma das variáveis por que as empresasvêm para cá. Não é só pelo salário barato, é pela qua-lidade do acabamento do trabalho e pelo grau de pro-dutividade que essas indústrias têm."

O que se percebe é ignorância em alguns discur-sos de políticos que consideram os índios como empe-cilho ao desenvolvimento, privilegiando o grande capitalem detrimento aos direitos dos povos indígenas, dei-xando no seu rastro o caos ambiental. “Quem é que lu-cra com isso, desqualificando o índio dessa forma?”,questiona a secretária de Ciência e Tecnologia. "Sãoexatamente migrantes que pensam que a Amazônia nãotem ordenamento territorial. Os mesmos que invademApuí, Roraima, Sul de Lábrea. Eles vêm com um pro-pósito só - ‘aquele povo de lá é preguiçoso, não sabetrabalhar a terra’”, finaliza. E ao considerarem as mu-lheres indígenas incapazes de lidar com alta tecnologia,procuram recriar e redefinir suas identidades.

Ângela Maria, Suellen e Missilene, operárias da Philips Estelita, da Nokia: traços indígenas fortes

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A vida tem duas faces:Positiva e negativaO passado foi duro

mas deixou o seu legadoSaber viver é a grande

sabedoriaQue eu possa dignificar

Minha condição de mulher,Aceitar suas limitações

E me fazer pedra de segurançados valores que vão

desmoronando.Nasci em tempos rudes

Aceitei contradiçõeslutas e pedras

como lições de vidae delas me sirvo

Cora Coralina

Aprendi a viver.Aprendi a viver.Aprendi a viver.Aprendi a viver.Aprendi a viver.

Assim eu vejo a vidaAssim eu vejo a vidaAssim eu vejo a vidaAssim eu vejo a vidaAssim eu vejo a vida

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Oportunidadesiguais?

Coordenadora doProjeto Monitor deEmpresas - FNV

Mondiaal (Holanda)

SSSSSAstAstAstAstAstrrrrrid Kid Kid Kid Kid Kaagaagaagaagaag

Sempre achei óbvio que iria estudar e trabalhar. Minha mãetinha sua própria loja. Minhas irmãs e eu fomos estimuladas para fazercarreira. Juíza, piloto ou cirurgiã, essas seriam carreiras para mim,segundo meu pai. Muita discussão sobre feminismo ou emancipaçãona realidade não teve. Quando comecei, em 1980, a estudarsociologia, vivi os anos finais da segunda onda feminista. O período deação verdadeira já tinha passado, mas participei empolgada da últimagreve de mulheres e visitava de vez em quando a Casa da Mulher.Mas, honestamente, não me sentia realmente em casa. Tinha o tempotodo o sentimento de que não estava tratando da minha situação.Porém, ao mesmo tempo aprendia que estudar não era algo tão óbvioquanto eu pensava. Que mulheres, sim, têm menos oportunidades, eque homens dominam a política, as empresas e os sindicatos. Comeceio meu trabalho sindical na juventude da FNV (Central Sindicalholandesa). Lá, naquele tempo, tinha um razoável número de mulheresjovens. Então, pensava: aqui tudo acontece com igualdade. Paradepois notar que o presidente era bastante machista. E falando dossindicatos e da Central: basicamente homens de idade com um estilode liderança e discussão meio bruscos. A FNV Mondiaal(Departamento de Cooperação Internacional da Central), ondetrabalho atualmente, é formada majoritariamente por mulheres. Dentroda FNV e dos sindicatos tem muito mais mulheres que há 15 anos.Conseguimos mais mulheres filiadas e conquistamos muito para amulher trabalhadora nos últimos anos. Não obstante, o movimentosindical não consegue forçar um verdadeiro rompimento narepresentação da mulher. Por exemplo: no momento não temosnenhum sindicato com uma presidente mulher.

Eu dedico meu tempo ao tema da responsabilidade socialempresarial e o comportamento das multinacionais em países emdesenvolvimento. Embora em empresas como a Philips e a Aholdtrabalhem muitas mulheres, o alto escalão é principalmente masculino.E também nos sindicatos eu estou vendo muito mais homens quemulheres. No Brasil encontro mais mulheres que nos nossossindicatos. Em cooperação com o Instituto Observatório Socialpesquisamos, entre outros, até que ponto empresas discriminam. Oque se nota em quase todas as situações é que mulheres ganhammenos para trabalhos similares e quase não são representadas no altoescalão. Ao mesmo tempo, as mulheres entrevistadas nas pesquisasdizem que têm oportunidades iguais.

Mas oportunidades iguais não é a mesma coisa que tratamentoigual. Mesmo quando nós mesmas pensamos assim.

DEP

OIM

ENTO

29

TRABALH

ADORANEG

RA

Dentre os debates que colocaram asrelações raciais e de gênero na agenda de

importantes setores do movimento sindicalnos últimos dois anos está a III Conferência

Mundial Contra o Racismo. Diagnósticoscontundentes ganharam visibilidade naimprensa, reafirmando informações quedeixam nítida a permanência da mulher

negra no patamar da sociedade brasileira, eem particular no mercado de trabalho,

mesmo diante da melhoria (relativa) dainserção e mobilidade das mulheres em

geral. Dos diagnósticos preparados peloDIEESE/SEADE, IBGE e IPEA,

destacamos:

A mulher negrano mercado de

trabalho

29

- O salário médio da trabalhadora negra continua sendo a metade do salárioda trabalhadora branca

- A trabalhadora negra continua sendo aquela que se insere mais cedo e é a última asair do mercado de trabalho

- Mesmo quando sua escolaridade é similar à escolaridade da companheira branca, adiferença salarial gira em torno de 40% a mais para a branca

- Mulheres negras têm um índice maior de desemprego em qualquer lugar do país. A taxade desemprego das jovens negras chega a 25% - uma entre quatro jovens negras estádesempregada

- Mulheres negras estão em maior número nos empregos mais precários. 71% das mulheresnegras estão nas ocupações precárias e informais; contra 54% das mulheres brancas e48% dos homens brancos

- Os rendimentos das mulheres negras em comparação com os homens brancos nas mesmasfaixas de escolaridade em nenhum caso ultrapassa os 53% mesmo entre aqueles quetêm 15 anos ou mais de escolaridade

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FONTES:Articulação de Mulheres Negras Brasileiras. Contribuição para a III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação

Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata. 2001.Articulação de Mulheres Negras Brasileiras. Um retrato da discriminação racial no Brasil. Brasília: 2001.Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos - DIEESE. Negociação coletiva e eqüidade de gênero

no Brasil: cláusulas relativas ao trabalho da mulher no Brasil - 1996-2000. Pesquisa DIEESE N º 17. São Paulo: DIEESE, 2003.

A despeito da situação caó-tica dessas trabalhadoras, parecehaver um acordo tácito de omis-são e silêncio entre o Estado, lide-ranças em geral, o patronato eseus representantes (que avaliame cuidam da mobilidade do traba-lhador dentro das organizações),e dos acadêmicos que pesquisama área do trabalho. Quando se ma-nifestam, as lideranças aindainsistem em apontar como soluçãopara a situação da mulher negraas políticas universais, mesmo in-formadas por inúmeros estudos deque as políticas universais não di-minuem os diferenciais entre ne-gros e brancos. Um estudo recen-te revela como as políticas univer-sais mantêm paralela a situaçãode negros e brancos ao longo dedécadas:

O que se observa aqui é quemelhoraram as situações de ne-gros e brancos, mas a diferençaentre os dois grupos não se alte-rou, continua intocável e os gráfi-cos seguem como linhas parale-las. Desta forma, as chamadas po-líticas universais não alteram o qua-dro das desigualdades raciais, ape-nas garantem sua perpetuação.

No território das empresasonde a realidade das relações ra-ciais é dramática, por pressão dosmovimentos sociais, amplia-se,ainda que timidamente, a discus-são sobre políticas de diversidade,mas os resultados são ainda pro-fícuos.

O Perfil Social, Racial e deGênero das 500 Maiores Empre-sas do Brasil e suas Ações Afir-mativas revela que 40% das em-presas pesquisadas dizem terações de promoção da diversida-de, sendo a mais comum os pro-gramas de contratação de pesso-as com deficiência - 32%. No en-tanto, apenas 1% conta com pro-gramas de capacitação profissio-nal de negros. O estudo revela ain-da que nas maiores empresas doPaís, apenas 1,8% dos cargos dediretoria são ocupados por negros,9% por mulheres e 1% por pesso-as com deficiência.

Esta situação de intensadesigualdade que se perpetua aolongo do tempo mereceu especi-al atenção do Movimento de Mu-lheres Negras e de dirigentes sin-dicais negras que atuaram, nosúltimos três anos, no contexto daConferência Mundial Contra oRacismo. Imbuído da certeza deque, se não houvesse uma açãoespecífica de combate ao racis-mo e um plano de políticas deação afirmativa, a situação derelações raciais no Brasil nãomudaria, o movimento de mulhe-res negras foi à Durban. E de-flagrou uma série de ações, tan-to junto ao movimento feministaquanto ao sindical, sendo consi-derado o mais importante ator nocontexto da Conferência.

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Maria Aparecida Silva BentoDoutora em Psicologia Social

Diretora do CEERT - Centro de Estudos dasRelações do Trabalho e Desigualdades

TRABALH

ADORANEG

RA

O Documento final da IIIConferência Mundial Contra o Ra-cismo, Discriminação Racial, Xe-nofobia e Intolerância Correlataexplicita, para o governo brasilei-ro, as recomendações para priori-zar trabalho, saúde e educação.Entre as principais metas, desta-cam-se:

Dessas recomendações,merece destaque o fato de que aidéia de ações afirmativas provo-cou um acalorado debate público.

Observando os argumen-tos contrários às ações afirmati-vas podemos constatar que essesnão estão só no discurso dos rea-cionários ou dos alienados, mastambém de lideranças que se di-zem progressistas e preocupadascom as desigualdades em nossopaís. Embora esses programasestejam necessitando de uma ava-liação crítica, em particular do Mo-vimento Negro, chama a atençãoo fato de que os argumentos colo-cados não se sustentam, revelamfalta de informação básica, falta dereflexão e uma grande resistênciaà implementação de ações concre-tas contra as desigualdades.

Ações afirmativas são vistascomo assistencialistas, "privilegi-ando negros", discriminando bran-cos, inconstitucionais - o que re-

vela falta de informação, reflexãoe defesa de interesses e privilégi-os. Ou seja, o combate às desi-gualdades é ainda um elemento dediscurso. Na prática, persiste umagrande resistência a repensar lu-gares de poder e de privilégio, hojeocupados apenas pelos brancos ebrancas, em qualquer instituição

que seja foco dessa discussão.Observando esta resistência e oposicionamento tímido das mulhe-res no movimento sindical frenteàs violações dos direitos das tra-balhadoras negras, cabe pergun-tar: as mulheres no movimento sin-dical lutam por igualdade de trata-mento e oportunidade para todasas mulheres, ou gênero é um as-sunto somente para mulheresbrancas? Há uma indignação comrelação à violação dos direitos detodas as trabalhadoras, incluindoas negras? Os movimentos demulher e sindical podem investirconcretamente, ou apoiar açõesconcretas no combate às desigual-dades raciais no trabalho? É pos-sível lutar contra a opressão de gê-nero sem destacar explicitamenteo segmento que há 20 anos vemsendo apontado pelos órgãos depesquisa como o mais discrimina-do do mercado de trabalho: asmulheres negras?

- A inclusão do quesito raça/cor nos formulários oficiais

- A implementação efetiva da Convenção 111

- O desenvolvimento de programas destinados a afro-descendentes quepromovam a igualdade de oportunidades no emprego e outras iniciativasde ações afirmativas ou positivas

- Medidas para a remoção dos obstáculos e para a promoção do acessoigual e a presença eqüitativa de afro-descendentes em todos os níveis dosetor público

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RRRRRNNNNNeideideideideide Fe Fe Fe Fe Fonseca..onseca..onseca..onseca..onseca..

Rousseau, considerado um pensadorprogressista, dizia que a mulher era "dotada decaracterísticas físicas e morais, como a passividade ea subordinação, condizentes com as funçõesmaternas e a vida doméstica", e em relação aoshomens que "seriam mais aptos à vida pública, aotrabalho e às atividades intelectuais". A ironia maiorera que Rousseau afirmava que, se a naturezafeminina não desse conta da função para a qualestava destinada, "era preciso criar o hábito daobediência, através da disciplina e doconstrangimento constantes", ou seja, ele erafavorável à violência contra a mulher, com ajustificativa de domesticá-la.

Começo assim meu depoimento, porque deRousseau aos dias atuais muitas coisas mudaram,muitas revoluções, principalmente tecnológicas,contribuíram para o avanço da humanidade,entretanto, a essência do "pensamentorousseauniano" ainda está viva, latente entre nós, empleno século XXI.

Esses valores atribuídos a homens e mulheresestão expressos tanto nas relações familiares, osespaços privados, quanto nas relações laborais, ouespaços públicos. As diferenças tomam maioresdimensões ao agregarmos o recorte racial ao recortede gênero.

O aumento da inserção da mulher não veioacompanhado de uma política de valorização dotrabalho por ela exercido. Nem o cuidado com osfilhos passou a ser compartilhado, criando-se assim adupla jornada.

Secretária de Políticas Sociaisda CNB-CUT (Confederação Nacional

dos Bancários)Formada em Serviço Social pela FMU

Formada em Direito pela USFEspecialista em Direito Constitucional e

Político pela UniFMU

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Em busca demais aliados e aliadas

DEP

OIM

ENTO

Mas foi com a retomada da ação sindical nofinal da década de 70, quando as negociaçõescoletivas ganharam força, que as mulheres seorganizaram em seus sindicatos, criando uma pautade reivindicações específicas, o que não foi e nãotem sido uma luta fácil, pois muitas vezes tem-se queconfrontar idéias e princípios com os próprioscompanheiros sindicalistas.

As reivindicações das mulheres não dividiam aluta como diziam, pois eram, e ainda são visíveis asdiferenças de oportunidades e de tratamento dadoaos homens e às mulheres, negros e brancos, pelomercado de trabalho.

Embora com o nível educacional em médiaacima dos homens, as mulheres tanto brancas quantonegras estão em pior situação, enfrentam toda sortede discriminação desde o ingresso até a mobilidadeocupacional.

A categoria bancária sempre foi muitoorganizada e pioneira. As mulheres não perderamtempo, já há alguns anos existem comissões,secretarias e departamentos que discutem o tema. Ointeressante tem sido trazer os bancários para essesgrupos de discussão. A CNB - ConfederaçãoNacional dos Bancários através da Secretaria dePolíticas Sociais, coordena a articulação, comautonomia dos sindicatos para trabalharem o tema.

Conseguimos uma organização tão forte esólida nacionalmente, que conquistamos uma cláusulade igualdade de oportunidades em nossa ConvençãoColetiva.

Foram anos de lutas, lágrimas, brigas,acertos e desacertos, mas que valeram a pena.Mesmo porque tudo vale a pena quando é paratransformar o mundo em um espaço de inclusão,eqüidade e igualdade, respeitando-se as diferençasque temos.

De Rousseau aos nossos dias, muitasmulheres tombaram em nome da luta por igualdade,e a todas elas meu tributo, meu respeito. Sei quesem as pioneiras, hoje muitas não estariamocupando os espaços que ocupam.

Entretanto, o contexto atual está cada vezmais adverso para os trabalhadores e astrabalhadoras. A mulher é sem dúvida umacompetidora no mercado de trabalho, e umacompetidora à altura, bem preparada. No entanto,os talentos adquiridos aliados aos talentos natosnão têm se traduzido em maiores e melhoresoportunidades. Destacar algumas mulheres comoexecutivas bem sucedidas é uma estratégia que nãoengana, pois a realidade está dada.

Além do disciplinamento proposto peloprogressista Rousseau, traduzido em violênciadoméstica, ainda enfrentamos o assédio sexual,assédio moral, discriminação racial, remuneraçõesinferiores e uma mobilidade profissional bastanterestrita.

O velho chavão de que a luta continua é cadadia mais atual. As mulheres, todos os dias, aolevantarem-se, talvez pensem como eu: “Hoje émais um dia de batalha na luta sem trégua pelabusca da humanidade das mulheres e dos negros enegras, e preciso ganhar mais aliados e aliadas”.

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"Como é bom saber que se pode furarcercos e vencer barreiras neste Brasil tãodesigual, isso torna ainda mais saboroso eresponsável o caminho da ministra de coordenara Secretaria." A afirmação é da Ministra MatildeRibeiro, que assumiu a Secretaria Especial dePolíticas de Promoção para a Igualdade Racial(SEPPIR), criada pelo governo Lula em 21 demarço de 2003 (Dia Internacional da Eliminaçãoda Discriminação Racial).

Matilde Ribeiro nasceu em 29 de julho de1960 em Flórida Paulista (SP). É graduada edoutoranda na Faculdade de Serviço Social daPontifícia Universidade Católica de São Paulo(PUC/SP).

Exerceu o cargo de assessora do Centro deEstudos sobre Trabalho e Desigualdades(CEERT) e do Sindicato dos Metalúrgicos do ABCnas questões de gênero e raça. De 1995 a 1997,coordenou o Programa Relações Sociais deGênero no Instituto Cajamar. Foi professora daFaculdade de Serviço Social das FaculdadesMetropolitanas Unidas (FMU) e coordenadora daAssessoria dos Direitos da Mulher da Prefeiturade Santo André no mesmo período. Fez parte da

"Penso que é urgente aimplementação de políticaspúblicas que melhorem as

condições de vida das mulheresna cidade e no campo, de acesso

a terra, reforme agrária, ummelhor uso e conservação do

meio ambiente. Para que elasnão mais sofram com o descaso e

a violência sexista, para quepossam trabalhar sem temer

violações de seus diretos."

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ENTR

EVISTA

Matilde RibeiroMulher, negra, ministra de governo

coordenação do Programa de Governo Lula e daequipe de transição em 2002, sendo responsávelpela questão racial.

Em entrevista para o Observatório Social EmRevista, ela fala sobre o papel de sua Secretaria deGoverno na luta contra o racismo, o preconceito e adiscriminação racial no país, a política de cotaspara negros nas universidades e as políticas quepretende implementar em relação às mulheresnegras:

As questões racial e de gênero sãointercruzados no Brasil?

Sim. A política pública de inclusão social é oeixo que estrutura o nosso trabalho, tanto emrelação à população negra quanto em relação àsmulheres negras. Nesse sentido, surgem no Brasil,como pontos importantes que se cruzam, apromoção da igualdade racial e os direitos dasmulheres. A criação de organismos que combatama desigualdade une a vontade política do governo àspossibilidades concretas de superação dessasdesigualdades. Para que isso se transforme emrealidade é preciso centrar atenção nas condições

de vida e nas percepções das mulheres, saberquem são elas, onde e como vivem, sem perder ofoco na real situação da população e da mulhernegra brasileira.

No caso das mulheres negras e dasmulheres pobres, a sua vasta capacidade detrabalho e produção não é proporcional àscondições de vida: elas são chefes de família quecomeçam a trabalhar cedo: no horário e na idadecom dupla jornada de trabalho que alcança, àsvezes, entre 10 a 18 horas. Além disso, sofremcom as condições de trabalho, estudo eassistência, e com a displicência dosempregadores, que nem sempre garantem seusdireitos com a carteira assinada.

Em nossa sociedade, por intermédio daperpetuação do machismo, são muitos os estigmasem relação à mulher, seja de objeto sexual ou desubserviência. Tais estigmas interferem, naconstrução da identidade, nos direitos reprodutivos,na sexualidade, na anticoncepção, na maternidade,na posição que ocupa na família, união oucasamento. São acentuados pelo preconceito, sejada região de onde vem essa mulher, seja pela corde sua pele, seja pela sua idade.

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Portanto, a questão racial e étnica estáprofundamente intercruzada com a questão degênero, seja pela violência da opressão degênero, seja pelas especificidades que envolvema vida e as lutas das mulheres negras eindígenas, das trabalhadoras rurais e dasmigrantes. Penso que é urgente a implementaçãode políticas públicas que melhorem as condiçõesde vida das mulheres na cidade e no campo, deacesso a terra, reforma agrária, um melhor uso econservação do meio ambiente. Para que elasnão mais sofram com o descaso e a violênciasexista, para que possam trabalhar sem temerviolações de seus diretos.

Quais são os principais desafios na lutacontra o racismo, o preconceito e adiscriminação racial no Brasil?

Sabemos da profunda disparidade sócio-econômica existente entre negros e brancos nasociedade brasileira. O principal desafio diante darealidade do racismo, do preconceito e dadiscriminação racial vivida pela população negraestá em fazer com que o Estado brasileiro tenhauma atuação coerente na formulação e execuçãode políticas sociais que priorizem programas quecontribuam para reduzir os índices dasdesigualdades raciais entre a população negra ea população branca.

O desafio do Estado e da sociedade emgarantir os direitos fundamentais a todos oscidadãos implica o reconhecimento de quevivemos num país marcado historicamente pordesigualdades raciais, responsáveis pelaexistência de graves desequilíbrios em termos deoportunidade e tratamento; ou seja, implicareconhecer que o fator racial e étnico constituielemento importante na distribuição deoportunidades de emprego, serviçoseducacionais e outros benefícios públicos eprivados.

Nesse sentido, minha opinião é favorável àadoção de políticas de ações afirmativas voltadaspara a população negra. No entanto, não se tratade excluir as políticas universalistas na medidaem que tais políticas focalizem a questão racial.Isso significa dizer que adoção do recorte racial ede gênero, por exemplo, por um Programa deCombate a Pobreza, poderá ter um impactosignificativo na redução dos índices dasdesigualdades raciais no Brasil, considerandoque a população negra constitui quase 70%

daquelas pessoas que estão abaixo da linha depobreza. Certamente, o impacto será possíveldesde que sejam indicadas metas diferenciadasque permitam produzir a visibilidade, omonitoramento e avaliação das açõesimplementadas para reduzir as desigualdadesraciais.

Se adotarmos tal estratégia naimplementação das políticas sociais, creio que asmudanças serão profundamente significativas nospróximos quatro anos. Se conseguirmos reverterao menos parte desse quadro, após quatro anosde governo, já podemos nos sentir vitoriosos. Esteé o nosso desafio, do governo e da sociedadebrasileira.

Que políticas a sua Secretaria pretendeimplementar em relação às mulheres negras?

A violação dos direitos humanos combinacom a opressão de raça e gênero e afetadiretamente as mulheres negras, demarcando umcenário de desagregação social e de redução daqualidade de vida. A articulação da temática deraça e gênero é um princípio orientador da PolíticaNacional de Promoção da Igualdade Racial daSEPPIR. Nesse sentido, entre as diretrizes e asações a serem desenvolvidas pelos programas depromoção da igualdade racial, destacamos odesafio presente nas áreas da saúde, educação etrabalho. Como exemplo, cito o Programa deFortalecimento Institucional GRPE - Gênero,Raça, Pobreza e Emprego, uma parceria entre aSEPPIR e a OIT, que envolve articulação e umagestão compartilhada entre diversos Ministérios,Governos Estaduais e Municipais e a sociedadecivil com a finalidade de desenvolver um conjuntode ações voltadas para as mulheres negras nocampo da capacitação, geração de emprego,trabalho e renda.

A política de cotas é o caminho para colocarnegros e negras na universidade?

É uma medida emergencial. Para superar oracismo é preciso políticas públicas e açõesafirmativas concretas, as quais já estão sendotrabalhadas pela SEPPIR.

A adoção de cotas para acesso epermanência da população negra nas instituiçõesde ensino superior e do ensino profissional etécnico de nível médio são realmente necessáriascomo medidas que contribuam para reduzir

3737

desigualdade de oportunidadeseducacionais existentes entre osestudantes negros e brancos.

As cotas são necessárias parafavorecer um equilíbrio mais justo dasoportunidades entre alunos negros ebrancos, não se tratando, portanto, de umprivilégio, mas da ação afirmativa de umdireito, na medida em que apenas cerca de2% dos universitários brasileiros sãonegros.

Devemos considerar que, até adécada de 1930, tínhamos instrumentoslegais proibindo o acesso da populaçãonegra a educação em geral, como porexemplo, as exigências que eram feitas aosex-escravos - portanto, homens e mulhereslivres - através de diversas leis que osproibiam de freqüentar a escola, quevigoraram entre 1888/1889 até aConstituição de 1934. Por isso, parecenatural que nos últimos 70 anos deeducação superior no Brasil, os negros enegras continuem sendo excluídos ebarrados às portas das universidades.Imaginem que, anualmente, dos 1milhão e200 mil alunos que se inscrevem nosvestibulares, apenas 123 mil ingressamnas universidades e destes, somente 2%são negros. Então, se aplicarmos uma cotade 20%, em quatro anos - média deduração dos cursos - nós teremos mais de100 mil alunos negros se formando a cadaquatro anos, apenas nas 53 universidadespúblicas federais. Imaginem o impactodeste fato na população negra brasileira e otalento deste contingente populacional aserviço da sociedade brasileira.

Entretanto, o ideal é transformarmosessa escola de hoje em escola pública dequalidade, com acesso irrestrito a todos osbrasileiros, independentemente de cor,credo ou posição social, inibindo, dessaforma, esse grande comércio que virou aeducação brasileira. Nesse sentido, aimplementação da Lei 10.639, que tornaobrigatório o ensino da Cultura Afro-Brasileira, da História do Negro no Brasil eda África no ensino fundamental e médio, éuma medida importante para melhorar aqualidade da nossa escola e a igualdade dedireitos que queremos respeitados pelasnossas crianças e jovens no futuro.

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38

1 Besides brotherhood we need global sisterhood.Nota da tradução: a autora faz um jogo entre brotherhood, fraternidade, com sisterhood,que seria a versão feminina da palavra (brother = irmão, sister = irmã). O jogo degêneros não se mantém na tradução direta das palavras.

Educação:uma chave para a

igualdade

OOOOO

MMMMMerjerjerjerjerja La La La La Leskinen.eskinen.eskinen.eskinen.eskinen.

DEP

OIM

ENTO

Secretária internacional daFederação Educativa dos

Trabalhadores, Educadora deAdultos, Jornalista

Finlândia

Os educadores de adultos acreditam que aalfabetização é uma chave para um outro mundo. Apobreza é um obstáculo para a aprendizagem. Quase umbilhão de pessoas no mundo não podem ler ou escrever outêm dificuldades com essas habilidades. A abolição dapobreza é o nosso desafio comum. Nós precisamos dacooperação global.

A Finlândia se desenvolveu, em algumas décadas, deum estado agrícola pobre para um estado de bem-estar. Omovimento trabalhista finlandês e o trabalhismo forte dasmulheres caminharam à frente dos construtores de bem-estar. A participação feminina no mercado de trabalho émuito alta. Desde a década de 1980, as mulheres têmeducação mais elevada que os homens em todas as faixasetárias. As mulheres finlandesas ganharam o direito aosufrágio nas eleições parlamentares em 1906 e nas eleiçõesmunicipais em 1917. Hoje há 37,5% de mulheres noParlamento e 34,4% como conselheiras municipais. OPresidente da República é uma mulher. Há quase 50% deministras no gabinete.

No entanto, construir o bem-estar e a igualdade nãofoi fácil e está se tornando mais difícil. A globalização estácolocando novos desafios no Sul e no Norte. Em vez deuma competição mútua ou do medo e da amargura deperder os empregos, precisamos mais do que nunca desolidariedade. Além de fraternidade1 , precisamos deirmandade global.1

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Às seis da tardeas mulheres choravamno banheiro.Não choravam por issoou por aquilochoravam porque o pranto subiagarganta acimamesmo se os filhos cresciamcom boa saúdese havia comida no fogoe se o marido lhes davado bome do melhorchoravam porque no céualém do basculanteo dia se punhaporque uma ânsiauma doruma gasturaera só o que sobravados seus sonhos.Agora

o dia se põeos filhos crescemo fogo esperae elas não podemnão queremchorar na condução

Às seis da tardeÀs seis da tardeÀs seis da tardeÀs seis da tardeÀs seis da tarde

às seis da tardeàs seis da tardeàs seis da tardeàs seis da tardeàs seis da tardeas mulheresas mulheresas mulheresas mulheresas mulheresregressam do tregressam do tregressam do tregressam do tregressam do trabalhorabalhorabalhorabalhorabalho

Marina Colasanti

40

O ano de 2004 é o Anoda Mulher, conforme a Lei10.745, sancionada pelopresidente Luiz Inácio Lulada Silva, com o objetivo de"estabelecer condições deigualdade e justiça nainserção da mulher nasociedade".

A presença femininano governo atual foiassegurada pela criação daSecretaria Especial dePolíticas para as Mulheres,comandada pela ministraEmília Fernandes e, emseguida, pela ministra NilcéaFreire. Em 21 de março de2003, "Dia Internacional PelaEliminação daDiscriminação Racial", foiinstituída a SecretariaEspecial de Políticas dePromoção para a IgualdadeRacial, cuja titular é aministra Matilde Ribeiro.

No dia 17 de fevereirodeste ano foi realizado olançamento oficial do Ano daMulher, no Senado Federal.A ministra Nilcéa Freiredisse que a sua pasta quercompartilhar os trabalhoscom a Câmara e o Senadopara construir um futurodiferenciado para a mulher."Temos que trazer osignificado da trajetória damulher e de suasconquistas, muitas vezesainda no papel, para ocotidiano", afirmou.

A mulher napolítica

(Fonte: Folha Online - http://www1.folha.uol.com.br/folha/especial/2002/eleicoes/curiosidades.shtml)

Voto femininoA abertura do voto para as mulheres aconteceu pela

primeira vez em 1928, no Rio Grande do Norte.Mas o sufrágio feminino só foi oficializado quatro

anos depois, por meio de um decreto-lei assinado porGetúlio Vargas. A partir de 1932, as mulheres casadas edevidamente autorizadas pelos maridos puderam votar.

Quatorze anos depois, em 1946, caíram as restriçõesao voto da mulher, que passou, finalmente, a seruniversal.

Primeira mulherA primeira mulher eleita para uma prefeitura no

Brasil foi a fazendeira Alzira Soriano, em 1928, na cidadede Lajes, no Rio Grande do Norte. Mas ela não exerceu omandato, pois a Comissão de Poderes do Senado impediuque Alzira tomasse posse e anulou os votos de todas asmulheres da cidade.

Primeira deputadaA paulista Carlota Pereira de Queiroz foi a primeira

mulher eleita deputada federal, em 1933, por São Paulo.

SenadoraA primeira senadora brasileira foi Eunice Michilles,

do Amazonas; ela era suplente e assumiu o cargo em1979, após a morte do senador João Bosco Ramos deLima.

Senadora negraO Acre foi o primeiro Estado do país que elegeu

uma senadora negra, a médica Laélia Alcântara. Asegunda foi a governadora do Rio Benedita da Silva, doPT.

GovernadoraEm 1994, Roseana Sarney foi a primeira mulher a

ser eleita governadora no Brasil, no Maranhão. Mas aprimeira a governar um Estado foi Iolanda Fleming, em1986, no Acre, para completar o mandato de Nabor Júnior.

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Dia da conquista do votofeminino no Brasil

24 de fevereiroDia internacional

da mulher

8 de marçoDia internacional

pela eliminação dadiscriminação racial

21 de março

Dia nacionalda mulher

30 de abrilDia nacional de luta contra

a exploração sexual decrianças e adolescentes

18 de maioDia internacional

de luta pela saúdeda mulher

28 de maio

Dia de combateà mortalidade materna

28 de maioDia Internacional da

Mulher NegraLatino-americana e Caribenha

25 de julhoDia Internacional contra a

Exploração Sexual e o Tráficode Mulheres e Crianças

23 de setembro

Dia pela descriminalizaçãodo aborto na América

e Caribe

28 de setembroDia nacional de luta contra

a violência à mulher

10 de outubroDia nacional

da consciência negra

20 de novembro

Dia internacional pelaeliminação da violência

contra a mulher

25 de novembroDia mundial

de combate à AIDS

1º de dezembroDia mundial

dos Direitos Humanos

10 de dezembro

DATAS IMPORTANTES NA LUTA PELA IGUALDADE

MULHERES HOMENS TOTAL

53 541 594

DEPUTADOS E SENADORES DO BRASIL EM 2002

Poder LegislativoNo Brasil, as mulheres

constituem mais de 50% dapopulação. Entretanto, noParlamento (Câmara deDeputados e Senado), elas sãomenos de 10% do total. Asmulheres tiveram asseguradona Constituição o direito de votare de ser votadas há 72 anos

mas, desde então, continuamvotando mais nos homens.

Mesmo assim, 8,2% dedeputadas e 12,3% desenadoras já representam umcrescimento da presençafeminina no poder Legislativo,talvez como efeito da "lei decotas", aprovada em 1995. Pelosistema de cotas, os partidossão obrigados a inscrever no

mínimo 20% de mulheres naschapas proporcionais.

Embora ainda pequena, apresença das mulheres noparlamento coloca em pautatemas importantes como aproteção da mulher no trabalho,leis que combatem a violênciadoméstica, o cuidado infantil, acriação de mecanismos paraaleitamento materno e outros.

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Políticas públicas paramudar o cotidiano da

mulher brasileira

A Ministra Nilcéa Freire encara aSecretaria Especial de Políticas para

as Mulheres como uma escolha, "a deestar num governo onde eu acredito

que possa realizar". Seu cargopermanente é ser professora de

universidade pública, completa. Elafoi a primeira mulher a assumir a

reitoria da Universidade do estado doRio de Janeiro (UERJ), eleita para a

gestão 2000/2003. No período de 1996a 1999, ocupou a vice-reitoria da

Universidade.

Hoje, aos 51 anos deidade, seu currículo retrata umatrajetória de profundoenvolvimento com aUniversidade, onde se graduouna Faculdade de CiênciasMédicas em 1978. O curso foiinterrompido por um ano deexílio no México, devido à suaparticipação no movimentoestudantil contra a ditaduramilitar.

Nilcéa foi residente emParasitologia no Hospital

Universitário Pedro Ernesto(HUPE). Em 1984, realizouestágio de pesquisa no Museude História Natural de Paris. Émestra em Zoologia pelo MuseuNacional/UFRJ e trabalhou noLaboratório deEsquistossomose da FundaçãoOswaldo Cruz, em projetosfinanciados pela OrganizaçãoMundial de Saúde.

Para o ObservatórioSocial Em Revista, falou sobreo cargo que assumiu no governo

federal e sobre a situação dasmulheres no Brasil:

Qual é a situação atual damulher no mercado detrabalho?

- Ainda é uma situaçãodesigual. O mercado detrabalho, de certa forma, nãoprivilegia a competência. Muitasvezes as escolhas discriminamas mulheres, pagam saláriosinferiores a elas para atividadesiguais as dos homens e, em

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muitos casos, as mulheres sãopreteridas mesmo quando têm omesmo nível de escolaridadedos homens. O rendimentomédio das mulheres ocupadascontinua sendo cerca de 35%inferior ao dos homens.

As mulherescorrespondem a pouco mais dametade da população brasileirae constituem, aproximadamente,42% do mercado de trabalho esão responsáveis pelo sustentode aproximadamente 1/3 dasfamílias no Brasil. No entanto,essas são as mais atingidaspelo desemprego e pelocrescimento do setor informalda economia. Entre as queestão inseridas no mercado detrabalho formal, o maiorcontingente se concentra nospostos de trabalho maisdesqualificados, nas funções demenor prestígio social e commenor remuneração.

As desigualdades sociais,marcadas pelo viés de gênero,tornam-se mais graves quandose inclui o componente racial:44% da população feminina écomposta de mulheres negras eas famílias chefiadas por essapopulação são as mais pobresdo país (muitas, abaixo da linhade pobreza).

A mulher avançousocialmente, mas opreconceito não acabou.Diversos estudos apontam adesigualdade deoportunidades das mulheresno Brasil...

- Por isso, nós estamosaqui. Se não houvesse maisdesigualdade entre homens emulheres no País, se o mercadode trabalho absorvesse demaneira equânime homens emulheres com igual nível deescolaridade, se as mulheresnão sofressem, no âmbitodoméstico, tanta violênciaquanto ainda sofrem não seria

Se não houvesse maisdesigualdade entre homens e

mulheres no País, se o mercadode trabalho absorvesse de

maneira equânime homens emulheres com igual nível de

escolaridade, se as mulheres nãosofressem, no âmbito doméstico,

tanta violência quanto aindasofrem, não seria necessária aexistência de uma SecretariaEspecial de Políticas para as

Mulheres.

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necessária a existência de umaSecretaria Especial de Políticaspara as Mulheres. Houve muitasconquistas ao longo dos anos.No entanto, há ainda um longocaminho a ser percorrido. Nestegoverno nós temos aexpectativa de que essasconquistas sejamtransformadas em políticaspúblicas que efetivamentemudem o cotidiano dasmulheres no nosso país.

Recentes pesquisasmostram a crescenteparticipação das mulheres nomercado de trabalho, o aumentode sua importância econômica,bem como sua responsabilidadepelo sustento da família e,também, o seu destaqueprofissional em vários setores.Porém, a sociedade brasileiraainda deixa transparecer fortestraços do modelo patriarcal. Sãocomuns as situações dediscriminação e de opressão àsmulheres, entre elas oscrescentes registros deviolência doméstica. Na esferado trabalho, ao mesmo tempoque reflete valores sociais queatribuem um papel secundárioàs mulheres, contribui para areprodução das chamadas"imagens de gênero", o quepode ser observado através dadivisão sexual do trabalho, dasegmentação ocupacional, dasbarreiras ao acesso,permanência e promoção noemprego, das menorespossibilidades de acesso àqualificação profissional e deascensão nos postos maiselevados nas empresas.

A senhora esteve à frente daUERJ, como reitora, quandoesta foi pioneira no país naadoção de uma política decotas para negros. A políticade cotas é o caminho paracolocar os negros e asmulheres negras nauniversidade?

Eu entendo que a políticade cotas é um instrumento deação afirmativa importante. Emdeterminados momentos dahistória, e eu acredito que noBrasil estamos num momentodesses, é preciso acelerar oprocesso de inclusão e ascotas, portanto, são uminstrumento legítimo e válidopara acelerar esse processo.

O presidente Lula instituiu2004 como o "Ano daMulher". O que está sendoprogramado para este ano?

A 1ª Conferência Nacionalde Políticas para as Mulheresocorrerá nos dias 15, 16 e 17de julho é uma das principaisatividades. Na verdade ela jáestá acontecendo em nível demunicípios e dos estados. AConferência definirá um planode políticas para as mulheres,ou seja, um conjunto dediretrizes que os movimentossociais e feministas e demulheres, toda a sociedade eesferas governamentais federal,estadual e municipal passarão ater como um guia de definiçãode suas políticas.

Quais são seus objetivoscomo ministra de umaSecretaria Especial paraMulheres?

Nossa missão, enquantosecretaria, é ser umaassessoria especializada àPresidência da República nosentido de propor políticas,projetos e ações, além depromover através do trabalhoconjunto com os diferentesministérios a garantia de açõessobre a questão da mulher emtodas as políticasgovernamentais.

Nosso trabalho consisteem promover a diminuiçãodessas desigualdades salariaisentre homens e mulheres, de

melhorar o acesso dasmulheres ao mercado formal,por meio de ações em parceriasnos âmbitos federal, estaduais emunicipais. Para tanto,incluímos em nosso PlanoPlurianual o programa Igualdadede gênero nas relações detrabalho, que visa garantir ainclusão das mulheres nomundo do trabalho, comacesso, ascensão, salários edemais direitos trabalhistas, emcondições de igualdade entrehomens e mulheres, através deapoio a projetos que contribuíampara a melhoria das condiçõesde trabalho das mulheres. Emparceria com outras Secretariase Ministérios estamosparticipando do Programa deFortalecimento da OIT: Gênero,Raça, Pobreza e Emprego(GRPE), que promove acapacitação de gestorespúblicos nas temáticas degênero, raça, pobreza eemprego, visando a formação,desenvolvimento de projetos,assistência técnica emonitoramento das açõesimplementadas e da ComissãoTripartite para Igualdade deOportunidades entre homens emulheres no emprego, noâmbito dos países do Cone Sul,em conjunto com a OIT,objetivando promover umapolítica pública de igualdade deoportunidade e tratamento;incorporar as questões degênero na programação,execução, supervisão eavaliação das atividadeslevadas a cabo pelosMinistérios do Trabalho daregião; incentivar e apoiar asiniciativas adotadas pelasentidades da sociedade civil;oferecer assessoria técnica ainiciativas parlamentares sobreo tema e implementarformas de difundir a legislaçãolaboral.

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OOOOO

Liv TLiv TLiv TLiv TLiv Torres.orres.orres.orres.orres.

DEP

OIM

ENTO

O mercado de trabalho é o mais importante canalpara a independência e a liberação das mulheres. Noentanto, conhecemos a história. As mulheres têm poucapresença nas posições mais altas e estão excessivamentepresentes nos cargos não-especializados. Estamos sub-representadas nos cargos bem pagos e excessivamentepresentes nos mal pagos. Apesar dos acordos e diretrizesinternacionais, a discriminação parece ser um dos poucosfenômenos internacionais que atravessa fronteirasgeográficas, culturais e regionais. Nossos estudos, tanto naNoruega como na África do Sul, mostram que ossindicatos infelizmente não são diferentes de outrosorganismos, quando se trata da baixa representatividadedas mulheres nas posições influentes.

A legislação e a obrigatoriedade nacional contra adiscriminação são essenciais. A passagem das jovens pelosistema educacional é importante para encaminhar aquestão da discriminação no mercado de trabalho, masesperar por isso para resolver nossos problemas é, namelhor das hipóteses, um teste de paciência. Comitês demulheres em sindicatos e no trabalho são importantes, mascarregam o risco de marginalizar as questões das mulherese a sua representação. Cotas para mulheres ou umalegislação nacional, atual, com essa finalidade, parecemestar entre nossos poucos expedientes de sucesso. Demodo similar, os sistemas de "discrimação positiva"implementados em diversos municípios para obter umarepresentatividade melhor em posições elevadas pareceser um caminho produtivo. A luta por remuneraçãoigualitária em cargos iguais deveria ser colocada comoprioridade na agenda dos sindicatos em todo o mundo. Éigualmente importante, para a luta das mulheres e para orecrutamento e influência sindical, assegurar que tenhamosuma representação igualitária de mulheres e homens nasaltas posições e o quanto antes, melhor.

Estratégias dasmulheres para o

comando corporativo

Diretora de pesquisa,Instituto de Pesquisa Social

Aplicada FAFONoruega

46

As mulheres constituem amaioria da população brasileira.De acordo com o IBGE, dos169.799.170 brasileiros, 50,78%são mulheres e 49,22% são ho-mens. Vários estudos têm busca-do traçar o perfil destes brasileirosquanto à sua condição social, àeducação ou ao mercado de tra-balho. Eles apontam várias carac-terísticas, como:

As faces que pediram as "diretas já!" no Brasil e as caraspintadas que provocaram o impeachment de Collor eram dehomens e mulheres. As imagens das passeatas e das greves

registram cidadãos e cidadãs que constróem a história de lutados trabalhadores. As mulheres estão cada vez mais presentes

nas fábricas e nas ruas. Mas, da mesma forma que nasempresas as mulheres estão ausentes das chefias, nas diretoriasdos sindicatos e nos espaços de poder elas também são minoria.

O poder não gosta muito de vestir saias.

Se as mulheres são maiorianumérica mas estão em menornúmero no mercado de trabalho,estes índices ficam ainda mais dís-pares quando se trata da presen-ça feminina nos sindicatos: decada 100 brasileiros sindicaliza-dos, pouco mais de 36 são mulhe-res.

O Censo Sindical do IBGE,realizado em 2001, indicou que

esta baixa participação acontecetanto na composição do quadro deassociados quanto nas diretoriassindicais. Mesmo quando estãopresentes nas diretorias, as mulhe-res geralmente não estão nos car-gos considerados mais importan-tes, que são: a presidência, a se-cretaria geral e a tesouraria.

Em publicação lançada pelaCUT, organizada pela então Co-

missão Nacional sobre aMulher Trabalhadora (hojetransformada em Secreta-ria na estrutura da Central),as mulheres apelam poruma reflexão sobre a vivên-cia dos sindicatos pois, se-gundo o texto, "para se ocu-par este lugar com um olharvoltado para a democracia,paga-se um preço muitoalto devido à forma comoestá organizado o espaçopúblico; um lugar pensadopara os homens e constru-ído com base na ideologiapatriarcal".

- os dados do IBGE sobre a PEA (População Economicamente Ativa) apontamque as mulheres são minoria no mercado de trabalho (41,9% de participaçãofeminina e 58,1% de participação masculina);

- estudos do Dieese constatam que as mulheres encontram dificuldades paraentrar e atuar no mercado de trabalho, há proporcionalmente menosmulheres nos postos de trabalho mais protegidos por lei e de melhorqualidade;

- ainda de acordo com o Dieese, as mulheres são mais escolarizadas (85,4%delas, contra o índice masculino de 85,1%);

- a Fundação Perseu Abramo estima que a mulher gaste semanalmente 40horas desempenhando trabalhos domésticos, independentemente de ser sódona-de-casa ou não, enquanto a média dos homens ficou em torno de seishoras por semana.

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O Sindicato desaias

O Sindicato desaias

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Mãe, esposa, trabalhadora,sindicalista...

Publicações feministas dediversos sindicatos e entrevistascom sindicalistas apontam, ainda,a grande dificuldade das mulheresem viver a militância sindical. A ter-ceira jornada, somada à do traba-lho e à doméstica, é uma das prin-cipais, pois ela implica no reconhe-cimento das desigualdades. Pro-piciar a participação da mulher nosindicato significa criar condiçõescomo a presença de creches noseventos sindicais ou horários dereunião compatíveis etc. Outra di-ficuldade que pode ser citada é his-tórica: a herança do distanciamen-to das mulheres da política e davida pública.

Para vencer esta barreira,uma das iniciativas é a adoção dapolítica de cotas para a participa-ção das mulheres. A Central Úni-ca dos Trabalhadores possui umapolítica de participação nas instân-cias de direção de no mínimo 30%

e no máximo 70% para ambos ossexos. Conforme avaliação de Ma-ria Ednalva de Lima, diretora exe-cutiva da Secretaria Nacional So-bre a Mulher Trabalhadora da CUT,em entrevista nesta edição(pág.14), "ao longo desses 17 anosde desenvolvimento desta políticavoltada para as trabalhadoras coma perspectiva de gênero a imple-mentação de cotas foi um dosgrandes êxitos da nossa luta".

A partir do final da década de1980, começam a surgir nas cen-trais sindicais as comissões ou se-cretarias de mulheres, onde osdebates geram propostas deações sindicais e trazem a possi-bilidade das mulheres de se orga-nizar e influir nas políticas e práti-cas sindicais.

Há uma questão cultural aser vencida, a de que "sindicato élugar para homem". Mesmo comas resistências, a estratégia geraltem sido a de fomentar e manter aparticipação das mulheres em to-das as instâncias da vida sindical.

Para a jornalista Maria Rita Kehl,que analisou a participação dasmulheres nos sindicatos em arti-go para a revista Teoria e Debatenº 23, "apesar das disputas, dosreceios, da grosseria de algunscompanheiros de militância, queainda tentam minimizar a partici-pação das mulheres e reduzi-lasà posição de 'gostosonas', que nãodeveriam estar nas assembléias eportas de fábricas, o fato é que acrescente participação das mulhe-res na vida sindical - inclusive emposições de poder - só traz cres-cimento para ambos os sexos. Se,de um lado, os homens vão apren-dendo que o relacionamento comuma feminista - ou seja, uma mu-lher que se sente em pé de igual-dade com eles - é muito mais enri-quecedor do que com uma mulhersubmissa, dependente e chora-mingas, por outro, as mulheres re-conhecem estar rompendo comuma alienação secular e conquis-tando cidadania, autonomia e com-petência."

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MULH

ERSIN

DICALISTA

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EEEEEDiis Bohn.Diis Bohn.Diis Bohn.Diis Bohn.Diis Bohn.

DEP

OIM

ENTO

Diretora da CentralSindical

LO Noruega

Ela era uma presidente sindical valorosa edestacada. O trabalho árduo com colegas, amaioria do sexo masculino, a tinha deixadoresistente e forte. Muitas vezes era foco dasatenções. Ressentia-se com o fato de os homensfalarem horas a fio, sem irem ao ponto dodebate.

Um deles ficava no encalço do seutrabalho como líder sindical e tentava enfrentá-laem todas as discussões. Mas ela era lúcida eapresentava suas posições de um modo quetodo mundo entendia.

Um dia eles tiveram uma briga dura eamarga. Discutiram por horas. Ela expôs muitobem suas posições. Os outros acabaramaceitando o ponto de vista dela e lhe deram oapoio de que precisava. Com exceção do Rival.Ele estava extremamente amargo e bravo pornão ter sido capaz de vencê-la.

À noite eles tiveram uma reunião socialnum restaurante. Quando faziam fila para acomida, o Rival se aproximou por trás dela. Sepôs muito perto, sobressaindo-se sobre ela -com a mão em seu traseiro e uma expressãozombeteira no rosto.

Ela chorou amargamente naquela noite.Ele a venceu no final, com um único,condescendente toque de mão.

Golpe baixo

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Direitos conquistadosA emancipação feminina, a opção pessoal por

um projeto profissional, o desemprego, a respon-sabilidade de chefiar a família, enfim, vários são osmotivos que têm levado as mulheres ao mercadode trabalho. A maioria delas, entretanto, atua noscargos menos remunerados e menos protegidospor lei.

No mercado de trabalho, as negociações co-letivas tornaram-se significativas na definição deregras e condicionantes das relações de traba-lho. É através delas que as mulheres conquista-ram garantias ao trabalho e buscam a eqüidadede gênero.

O Dieese publicou, em agosto de 2003, o es-

tudo "Negociação Coletiva e Eqüidade de Gênerono Brasil - Cláusulas relativas ao trabalho da mu-lher 1996-2000", onde apresenta dados compiladosde 94 documentos entre convenções e acordos co-letivos, abrangendo 30 categorias profissionais, como objetivo de localizar, sistematizar e analisar as clá-usulas que abordam o trabalho da mulher e as rela-ções de gênero no trabalho.

As negociações coletivas têm se mostradoimportantes para introduzir garantias ausentes nalegislação e mesmo ampliar os direitos já previs-tos. Mesmo restritas a algumas categorias, estascláusulas abrem espaço para a negociação emoutras frentes. Veja alguns dos temas abordadosnestas negociações:

TEMA TIPO DE CLÁUSULAGestação Estabilidade gestante

Função compatível à gestanteLiberação de gestante antes do término jornada de trabalhoExame pré-natalAtestado médico de gravidezPrimeiros socorros para partoInformações sobre riscos à gestante

Maternidade/Paternidade Licença maternidadeLicença paternidadeEstabilidade do paiGarantias à lactanteCrecheAcompanhamento de filhosDependentes portadores de deficiênciaAuxílio natalidadeGarantias na adoção

Responsabilidades familiares Acompanhamento de cônjuges e/ou familiaresAuxílio educaçãoAssistência à saúdeAuxílio dependentes

Condições de trabalho Direito de trabalhar sentadaRevista de pessoalAssédio sexualFornecimento de absorventesFornecimento de sapatos e meias

Exercício do trabalho Qualificação e treinamento

Saúde da mulher Prevenção do câncer ginecológicoAIDSLicença abortoEstabilidade abortoRetorno de licença maternidade

Eqüidade de gênero Garantias contra a discriminação

MULH

ERSIN

DICALISTA

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Na comparação entre homens e mulheres, agrande maioria da população feminina é a assalari-ada com carteira assinada e está ocupada no setorpúblico nas regiões metropolitanas analisadas pelaPED - Pesquisa de Emprego e Desemprego, abran-gendo Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salva-dor, São Paulo e Distrito Federal - enquanto aoshomens são reservados os empregos no setor pri-vado, com e sem carteira de trabalho.

O Brasil se caracteriza por um mercado emque grande parte dos trabalhadores ocupa postosde trabalho precários, sem acesso aos direitos so-ciais e trabalhistas, com jornadas extensas, alémdos limites legais. Essa situação atinge homens emulheres. As mulheres apresentam maior grau de

AS MULHERES NO MERCADO DETRABALHO BRASILEIRO:

Fazer parte de um grande contingente detrabalhadoras, com escolaridade crescente e experiênciade trabalho, não garantiu, até este momento, tratamento

igualitário para as mulheres no mercado de trabalho,embora essas condições venham lentamente se

modificando. As mulheres ganham menos e estãodesempregadas em maior proporção do que os homens.

Além disso, continuam sendo majoritárias nas atividadesclassicamente consideradas femininas nos setores ligados

às atividades sociais e esmagadoramente presentes noemprego doméstico. No que se refere às condições em que

exercem seu trabalho, as mulheres são também aquelasque apresentam maior vulnerabilidade na sua inserção

no mercado de trabalho, ocupando os postos maisprecários em maior proporção.

vulnerabilidade em todas as regiões, que se deve, emgrande parte, ao emprego doméstico para este grupo.

As mulheres ganham menos que os homensem todas as regiões da pesquisa. As diferenças derendimentos não dependem do grau de formalizaçãoda atividade, função ou cargo exercido, ou do nível deescolaridade. Uma das explicações para a desigual-dade está no fato de que as mulheres ocupam maisfreqüentemente setores de atividade econômica quetradicionalmente pagam salários menores: prestaçãode serviços domésticos, pessoais e outros serviçosnão especializados, com fortes restrições a sua as-censão aos melhores postos de trabalho na estrutu-ra ocupacional.

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Solange SanchesSocióloga, especialista em Economia

e Gestão das Relações de TrabalhoCoordenadora das Pesquisas de Emprego e

Desemprego do DIEESE

DESIGUALDADEE MUDANÇA

Melhores níveis de escolaridade têm como con-trapartida rendimentos mais elevados, como regrageral. No entanto, não significam igualdade de remu-neração no caso das mulheres. Enquanto para oshomens atingir o grau superior significa aumentarseus rendimentos 4,2 vezes, para as mulheres, omesmo esforço eleva 3,6 vezes sua remuneração.Esses dados demonstram não somente diferencia-ção de remuneração para os mesmos níveis de es-colaridade. Mostram também que a disparidade tendea tornar-se maior conforme a escolaridade cresce.

Assim, pode-se concluir que os atributos con-siderados essenciais para a ascensão no mercadode trabalho não produzem efeitos sobre a discrimi-nação praticada contra a mulher, que mantém pata-mares salariais inferiores aos dos homens seja qualfor seu nível de instrução ou ocupação.

O desemprego, fenômeno que penaliza a to-dos e se constituiu no problema central do país naúltima década, adquiriu feições femininas. Historica-mente, as taxas de desemprego sempre foram maiselevadas entre as mulheres, em comparação comas verificadas entre os homens, independentementedo ritmo de crescimento da economia. No entanto,foi durante os anos 90, em situação que permaneceaté hoje, que as mulheres ultrapassaram a marca dos50% do contingente de desempregados em grandeparte das regiões metropolitanas estudadas pelaPED. As mulheres têm taxas de desemprego superio-res às dos homens em até sete pontos percentuais.

O caminho em busca da igualdade mostra-sebastante longo: há vários obstáculos a vencer até queas mesmas oportunidades, condições e reconheci-mento estejam assegurados a todos, desaparecidas

todas as formas de discriminação. É necessário lem-brar que, dentre todas, as mulheres negras sofrem amais pesada carga de discriminação, vivendo umasituação de dupla diferenciação: de sexo e racial.Dentre todos, são aquelas que vivenciam as piorescondições de vida, trabalho e remuneração. No estu-do "Mulher Negra: dupla discriminação nos merca-dos de trabalho metropolitanos", o DIEESE mostraque as mulheres negras recebiam, no biênio 2001-2003, somente 53% dos rendimentos dos homensnão negros na região metropolitana de Belo Horizon-te e apenas 35,% na mesma comparação, em Sal-vador.

É por essa razão que as organizações dasmulheres, especialmente no movimento sindical, sem-pre se reuniram em torno da idéia da igualdade paratodos.

É preciso investir na negociação coletiva paraassegurar melhores condições de trabalho para to-dos e criar mecanismos para impedir a discrimina-ção. Para isso, é de suma importância que as mu-lheres conheçam seus direitos, estejam presentes eatuantes nas organizações sindicais e se preparempara participar na negociação coletiva, desde os lo-cais de trabalho até as mesas de negociação, nãosomente entre trabalhadores e empresários, mastambém nos espaços institucionais para discussãodas políticas públicas.

No capítulo dos direitos do trabalho, o reconhe-cimento do vínculo de trabalhadores e trabalhadoras,expresso na carteira de trabalho assinada, tem im-pactos diretos para o acesso aos benefícios sociais(como FGTS, garantia de 13º salário, férias e abonode férias, auxílio doença, licença maternidade, porexemplo), à aposentadoria e até mesmo ao crédito.

Acima de tudo, é preciso que o país tome ocaminho para o crescimento com distribuição de ren-da, para que sejam gerados os postos de trabalhonecessários para resolver o desemprego e a rendapara melhorar a qualidade de vida da população erealimentar a expansão da economia. Aumentar a ri-queza do país e melhor dividi-la dará a todos, homense mulheres, melhores oportunidades para construir aigualdade e assegurar condições de vida e trabalhodignas para todos.

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MMMMM

ElizElizElizElizElizabababababeth Bruzzone.eth Bruzzone.eth Bruzzone.eth Bruzzone.eth Bruzzone.

DEP

OIM

ENTO

Departamento deGênero e Eqüidade da

Central Sindical PIT-CNT(Uruguai)

Meu nome é Elizabeth Bruzzone, 45 anos, bancáriapor profissão e sindicalista por convicção.

Minha atividade sindical começou faz 23 anos nosindicato da AEBU (Associação de EmpregadosBancários do Uruguai), um sindicato totalmente masculinoe com profundas raízes machistas.

O primeiro passo foi fazer parte da representaçãodo próprio Banco ao qual ainda pertenço (era aindaépoca da ditadura), e o objetivo maior era somarcompanheiros e companheiras ao trabalho sindical queseria retomado com o primeiro governo democrático.

Logo depois, ingressei no Conselho do SetorBancário Oficial, que reúne todos os bancos estatais dopaís e onde se tratam dos temas dos quatro BancosOficiais.

É aí onde ficam para mim mais visíveis asdesigualdades de gênero e começa meu trabalho maisespecífico, buscando promover a igualdade entre homense mulheres em todos os níveis dos projetos que sãogerados no sindicato.

A maior dificuldade foi demonstrar e conscientizaràs companheiras e aos companheiros da existência dessasdesigualdades, inclusive em nossa organização sindicaldesde sua conformação, seus ritmos, horários, linguagem,plataformas, planos de trabalho etc.

Sou delegada da AEBU no Departamento deGênero e Eqüidade da Central PITCNT, onde minhamaior responsabilidade é a Secretaria Técnica daComissão de Mulheres da Coordenadoria de CentraisSindicais do Cone Sul e, logicamente, também, o trabalhoe compromisso com as companheiras dos diversossindicatos que constituem o Departamento.

Romper as barreiras culturais “machistas” denossas sociedades é tarefa árdua e lenta, que requer umtrabalho em conjunto entre homens e mulheres e queimplica em evoluir a estágios superiores da civilização queconduzam à igualdade, o respeito e à melhoria naqualidade de vida de todos os seres humanos.

O olhar sobre adesigualdade

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Assim foi modelado oobjeto:para subserviência.Tem olhos de ver e apenasentrevê. Não vai longeseu pensamento cortadoao meio pela ferrugemdas tesouras. É um mitosem asas, condicionadoàs fainas da lareiraSeria uma cântaro debarro afeitoa movimentos incipientessob tutela.Ergue a cabeça porinstantese logo esmorece por forçade séculos pendentes.Ao remover entulhosleva espinhos na carne.Será talvez escasso ummilêniopara que de justiçatenha vida integral.

segundoas leis da própriamodelagem.

Henriqueta Lisboa

Modelagem / Mulher

PPPPPois o modeloois o modeloois o modeloois o modeloois o modelodeve ser indefectíveldeve ser indefectíveldeve ser indefectíveldeve ser indefectíveldeve ser indefectível

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As mulheres formam umgrupo social explorado em proces-sos sociais de transferência deenergia e poder. É evidente que aopressão não se combate apenasatravés de normas jurídicas, umavez que não decorre só de umacondição legal. Porém, não senega a importância de normas,convenções e tratados internacio-nais para coibir condutas de opres-são. O enfoque deste artigo é a dis-criminação sofrida pelas mulheresno trabalho e a dificuldade na rea-lização da prova perante o judiciá-rio.

O artigo 5º da Constituiçãode 1988 assegura a igualdade detodos perante a lei, "sem distinçãode qualquer natureza (...)". Entre-tanto, a liberdade de escolha en-contra limites na realidade cotidia-na. As diferenças fisiológicas sãoutilizadas para justificar a divisãosexual do trabalho. A partir delasse formam as construções cultu-rais que assinalam determinadosatributos às pessoas ou grupossociais. Assim se estabelece abase que regula o direito ao aces-so de recursos, transmissão des-ses e apropriação do trabalho pe-los demais.

A Constituição reconhece ostratados e convenções internacio-nais ratificados pelo governo bra-sileiro. Entre os destaques, cita-mos a Convenção sobre a Elimi-nação de Todas as Formas de Dis-criminação Contra a Mulher (1979),da OIT. Ela compromete os Esta-dos partes a adotar todas as me-didas apropriadas para eliminar adiscriminação contra a mulher noemprego, a fim de assegurar asmesmas oportunidades de empre-go, o direito de escolha da profis-são e emprego, a igualdade de re-muneração para trabalhos de igual

Mulher,discriminação e

direito dotrabalho

É evidente que a opressão não secombate apenas através de normasjurídicas, uma vez que não decorre sóde uma condição legal. Porém, não senega a importância de normas,convenções e tratados internacionaispara coibir condutas de opressão.

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valor, a seguridade social e a pro-teção à saúde. Determina a proibi-ção de despedida por gravidez oulicença maternidade e a discrimi-nação por casamento ou estadocivil. Manda, ainda, investir emserviços sociais para permitir queos pais combinem as obrigaçõesfamiliares com as do trabalho e davida pública, especialmente medi-ante o fomento de creches.

A Convenção nº 111 da Or-ganização Internacional do Traba-lho também trata da discriminaçãode emprego e ocupação, enquan-to a Convenção nº 100 é mais es-pecífica quanto à promoção daigualdade de oportunidades noemprego. Todos esses temas serelacionam aos direitos humanose não podem ser pensados de for-ma hierarquizada, com prevalên-cia de alguns sobre os outros.

O artigo 461 da Consolida-ção das Leis Trabalhistas (CLT)proíbe a distinção de remuneraçãoentre os que exercem idêntica fun-ção, na mesma localidade e parao mesmo empregador. A Lei nº9.029/1995 elenca práticas discri-minatórias que constituem crimes.Por exemplo, a exigência, pelo em-pregador, de testes relativos à es-terilização ou estado de gravidez.Ou ainda, a adoção de medidasque induzam à esterilização gené-tica.

A CLT também proíbe anún-cios de emprego que façam refe-rência ao sexo, salvo quando anatureza da atividade o exigir; arecusa de empregar, promover oumotivar a dispensa do trabalho emrazão de sexo, idade, cor, situaçãofamiliar ou estado de gravidez; con-siderar o sexo, a idade, a cor ousituação familiar como determi-nante para fins de remuneração,

formação profissional e oportunida-des de ascensão profissional; im-pedir o acesso ou adotar critériossubjetivos para inscrição em con-cursos em empresas privadas, emrazão de sexo, idade, cor, situaçãofamiliar ou estado de gravidez; pro-ceder revistas íntimas nas funcio-nárias.

Os tribunais têm coibidodespedidas arbitrárias dos(as)portadores(as) do vírus do HIV,desde que o(a) empregado(a)comprove a discriminação. Issorepresenta uma dificuldade, poisnem sempre há pessoas dispos-tas a testemunhar sobre o fato.Ademais, no direito brasileiro, oempregador tem o poder de demi-tir sem qualquer motivo. Felizmen-te, alguns tribunais têm entendidoque a despedida logo após a em-presa tomar conhecimento de quea pessoa é soropositiva faz presu-mir a discriminação.

A Portaria Ministerial nº 869/92 do Ministério da Saúde e do Tra-balho proíbe, no Serviço PúblicoFederal, a exigência de teste paradetecção do vírus da aids, tantonos exames pré-admissionaisquanto nos exames periódicos desaúde. Esta exigência tambémpode ser compreendida para astrabalhadoras em empresas priva-das.

Violência contra a mulhere assédio sexual:

A Lei nº 10.224/2001 defineassédio sexual como a conduta de"constranger alguém com o intuitode obter vantagem ou favoreci-mento sexual, prevalecendo-se oagente da sua condição de empre-go, cargo ou função". O crime en-volve relação de poder, sujeição davítima, ofensa a sua dignidade, epor fim, afeta a liberdade sexual.

O governo brasileiro sancio-nou a Lei nº 10.778 que entrará emvigor no prazo de 120 dias a con-tar de sua publicação, ocorrida em24 de novembro de 2003. Ela es-tabelece "notificação compulsória,no território nacional, do caso deviolência contra a mulher que foratendida em serviços de saúdepúblicos ou privados". As informa-ções devem ser sigilosas para pre-servar a identidade da vítima.

A prova judicial cabe à vítima,o que se torna difícil, pois geralmen-te o agressor age sem testemu-nhas. É necessário que o enfoqueda discussão não ocorra apenasquando houver o rompimento docontrato de trabalho. Deve-se evi-tar que essas condutas ilícitasaconteçam e buscar que as mu-lheres possam assegurar sua liber-dade sexual e de trabalho.

A apreciação da provapelo judiciário

Na distribuição do ônus daprova - quem deverá provar a afir-mação de fato - deverá o (a) julga-dor (a) presumir que houve discri-minação quando estiver social-mente comprovado que as pesso-as pertencentes àquele grupo so-cial são vítimas de discriminação.O princípio da inversão do ônus daprova é previsto no Código do Con-sumidor, que determina ser do réua prova da ausência de culpa, doloou dano.

O mesmo princípio pode seraplicado em algumas situaçõesem que há alegação de discrimi-nação, tal como vem acontecen-do com indivíduos soropositivosdemitidos tão logo a empresa tomeconhecimento desta situação. Nes-ta hipótese, há presunção que adespedida foi discriminatória.

Susan Mara ZilliDoutoranda em Direitos Humanos pela

Universidade Pablo de Olavidee diretora do Instituto DECLATRA

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Conhece alguém que ocu-pa cargo de chefia em uma em-presa?

Se conhece, esse chefeprovavelmente é homem.

Esse homem, com toda acerteza, não é negro, pois a mai-oria das grandes empresas bra-sileiras prefere os brancos aosnegros e os homens às mulheres.

Sendo assim, EdineuzaAparecida Cândido tinha tudo paradar errado: ensino fundamental in-completo, mulher, negra, mãe,pobre. Em resumo: uma pessoacom grandes chances de ser ex-cluída do mercado de trabalho for-mal. "Se vai fazer uma entrevistae tem um branco e um negro, con-tratam o branco", diz ela.

As coisas começaram amudar em 1997, quando foi con-tratada para trabalhar na linha deprodução da Fersol, uma das pou-cas empresas brasileiras onde

Chefe de uma equipeformada por oito homens e uma

mulher, Edineuza é umaexceção no mercado de trabalho

brasileiro, marcado pelopreconceito e pela discriminação

racial

A COR DAVITÓRIA

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raça e sexo não são considera-dos na seleção dos funcionários.A Fersol produz defensivos agrí-colas e está localizada em Mai-rinque, a 80 quilômetros de SãoPaulo.

Em sete anos, Edineuzaprotagonizou uma impressionan-te ascensão profissional e pesso-al: terminou o ensino fundamen-tal na escola da própria empresa,cursou o ensino médio e em mar-ço deste ano assistiu sua primei-ra aula na faculdade de gestãoambiental da Universidade de So-rocaba.

Ao mesmo tempo que pro-gredia nos estudos, crescia tam-bém na fábrica. Hoje, tem um car-go de chefia na área de seguran-ça e meio ambiente e coordenauma equipe de nove funcionários,dos quais oito são homens. Umdeles é o líder de jardinagem Leo-

nildo Cândido, 29 anos, seu pró-prio marido.

Ao mesmo tempo que es-tudava à noite e trabalhava duran-te o dia, encontrou tempo para,junto com Leonildo, construir aprópria casa em um terreno doa-do por seu pai. "Ainda faltam osladrilhos, a pintura, mas devagar-zinho a gente vai fazendo", expli-ca ela.

Dupla jornada

Edineuza é uma vencedorae representa uma exceção nomercado de trabalho brasileiro,caracterizado por enxugamentose achatamentos salariais, em queconquistar uma promoção é tãoraro quanto acertar na loteria. Aseu favor pesa a política de recur-sos humanos da empresa ondetrabalha, que tem como orienta-

ção privilegiar a diversidade nahora da contratação. "Aqui nãotem discriminação e não importase o funcionário é homem oumulher, pois todos são tratadoscom igualdade", garante Edineu-za.

Ela só não conseguiu esca-par de um destino comum a qua-se toda mulher brasileira: além detrabalhar, tem que cuidar da casa.O marido bem que se esforça eajuda quando pode, mas é ela quelava a louça, limpa a casa, dá ba-nho na filha de três anos, preparaa comida.

Onde arruma tempo? "Cadaminuto da vida é importante e agente está sempre correndo paraconseguir fazer tudo o que preci-sa", diz ela.

Alegre, comunicativa, paci-ente e perseverante. Assim Edi-neuza é definida pelos colegas detrabalho. Na empresa, é contagi-

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ante a maneira como ela se rela-ciona com os subordinados, quetratam ela com alegria e uma cer-ta reverência.

Por trabalhar em uma indús-tria que lida com produtos alta-mente tóxicos, Edineuza ocupaum cargo estratégico e não podeerrar. "É preciso estar atento, umcuidando da segurança do outro",explica ela.

Aos 24 anos de idade e comum salário de R$ 1.600, Edineu-za ganha quase três vezes maisque o marido, o que representauma outra peculiaridade em suavida, pois na maioria dos laresbrasileiros a situação é a inversa."Se tudo der certo, posso até che-gar a um salário em torno de R$4.000. Basta continuar os estu-dos e seguir firme na empresa".

O marido não se importaem ganhar menos do que ela e

ser seu subordinado na empresa."Tenho grande admiração e res-peito pela minha mulher", revela.

Leonildo ajuda nos trabalhosdomésticos principalmente aossábados, dia da faxina geral e defazer as coisas que a correria dasemana não permitiu: limpar oquintal, lavar a roupa acumuladano tanque, fazer compras no su-permercado, tocar a obra dacasa. Aos domingos, nada dedescanso, pois é dia de chamaros amigos para um churrasco."Aos domingos a casa está sem-pre cheia. É o nosso momento delazer, de curtir a vida", conta Edi-neuza.

Planos futurosJá que o casamento vai

bem e o trabalho ainda melhor,Edineuza, o marido e a filha já

pensam em vôos mais altos. Vãoterminar a casa e colocar a pro-priedade à venda, pois queremmudar para um lugar melhor. Obairro onde vivem em Mairinquenão tem saneamento básico e asruas não são pavimentadas. Leo-nildo, por outro lado, tem seu so-nho particular: terminar o ensinofundamental na escola da Fersol.Quer seguir os passos da espo-sa, cursar o ensino médio, serpromovido na empresa.

Edineuza, Leonildo e a filhaVanessa vivem sua história desucesso, uma grande vitória emum país ainda marcado pela dis-criminação e pela desigualdade.Não é um conto de fadas, masuma história de luta e perseveran-ça, um exemplo principalmentepara empresas que ainda se pre-ocupam com a cor e o sexo dosseus trabalhadores.

Não é um conto defadas, mas umahistória de luta eperseverança...

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Aflição de não ser, amor, aquelaQue muitas filhas te deu, casou donzelaE à noite se prepara e se adivinhaObjeto de amor, atenta e bela.

Aflição de não ser a grande ilhaQue te retém e não te desespera.(A noite como fera se avizinha)Aflição de ser água em meio à terraE ter a face conturbada e móvel.E a um só tempo múltipla e imóvelNão saber se se ausenta ou se te espera.Aflição de te amar, se te comove.

Hilda Hilst

Aflição de ser eu eAflição de ser eu eAflição de ser eu eAflição de ser eu eAflição de ser eu enão ser outnão ser outnão ser outnão ser outnão ser outra.ra.ra.ra.ra.

E sendo água, amor,E sendo água, amor,E sendo água, amor,E sendo água, amor,E sendo água, amor,querer ser terraquerer ser terraquerer ser terraquerer ser terraquerer ser terra.....

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O Rio Suite Hotel é um esta-belecimento turístico caro e luxu-oso em Las Vegas. Até dois anosatrás, porém, seus empregados,incluindo muitas mulheres imi-grantes, recebiam salários tãobaixos que ficavam sem seguro-saúde para si próprios e seus fa-miliares. Quando uma funcionáriaficava doente, não conseguia pa-gar os 200 dólares das receitas deantibióticos - restando-lhe apenas"dizer a si mesma que já estavase sentindo melhor", como diz afuncionária do Rio Hotel, Maria Po-sada. Em 2001, Posada e seuscolegas criaram um sindicato emconjunto com os Empregados emHotéis & Restaurantes - e hojeconseguem pagar seguros-saúdee até mesmo participar de um pla-no de aposentadoria.

Para muitos habitantes dospaíses em desenvolvimento quesofrem perseguição política ou re-ligiosa, guerra civil ou fome - ouque não conseguem sustentarsuas famílias com os ínfimos sa-lários disponíveis - trocar seus la-res pelos Estados Unidos pareceser a única forma de escapar aociclo de pobreza criado pela eco-nomia global movida pelas gran-

ProtegendoTrabalhadoras

ImigrantesAs mulheres imigrantesque fazem parte da forçade trabalho são muitasvezes as pessoas maisprejudicadas no mercadode trabalho, em razão dasbarreiras étnicas, degênero e idioma.

des corporações. Nelas, os em-pregadores competem por lu-cros, instalando-se em locaisonde a força de trabalho é bara-ta e os trabalhadores podem serexplorados.

Muitos dos imigrantes re-cém-chegados, porém, assu-mem os empregos que os nor-te-americanos não querem:aqueles que são mais sujos,mal-pagos e perigosos.

Além disso, os imigrantesnos Estados Unidos freqüente-mente enfrentam as formas

mais duras dos problemas noambiente de trabalho que afetama todos os empregados, imigran-tes ou não: a interferência dosempregadores em nosso direitode melhorar salários e condiçõesde trabalho através da sindicali-zação. Diante da discriminaçãoe dos abusos nas mãos de pa-trões inescrupulosos, os traba-lhadores travam uma persisten-te luta por dignidade e respeito,tanto como trabalhadores quan-to como seres humanos.

As mulheres imigrantes

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que fazem parte da força de tra-balho - especialmente aquelasque não possuem documentos -são muitas vezes as pessoasmais prejudicadas no mercadode trabalho, em razão das barrei-ras étnicas, de gênero e idioma.Elas tendem desproporcional-mente mais a encontrar-se emsituações de pobreza e dificulda-des, que atingem a elas, a seusfilhos e demais familiares.- As mulheres imigrantes recebem

salários muito menores do queos homens nascidos nos EstadosUnidos.

- As mulheres estrangeiras recebem60 centavos para cada dólar re-cebido por um homem nascidonos Estados Unidos.

- As trabalhadoras imigrantes ten-dem muito mais a realizar os tra-balhos que pagam menos. Entreas trabalhadoras estrangeiras,55,5 % recebiam menos de25,000 dólares anuais, em com-paração com 44,1% das traba-lhadoras nascidas nos EstadosUnidos.

- As trabalhadoras imigrantes têmmenos acesso a benefícios comoassistência médica. Entre as mu-lheres de baixa renda, apenas32% das imigrantes com cidada-nia e 23% das imigrantes sem ci-dadania contam com assistênciamédica vinculada ao emprego.

- As trabalhadoras imigrantes ten-dem mais a sofrer assédio sexu-al no local de trabalho. O núme-ro de trabalhadoras imigrantesque cadastraram denúncias deassédio sexual junto à ComissãoFederal de Igualdade de Opor-tunidades de Emprego (EqualEmployment Opportunity Com-mission) aumentou em 143% naúltima década, enquanto os ín-dices gerais de denúncias por

assédio sexual entre as trabalha-doras declinou nos últimos anos.

Os empregadores dos Es-tados Unidos têm uma longa his-tória de exploração dos medos edas diferenças para criar desu-nião entre os trabalhadores. Hoje,eles ameaçam denunciar os tra-balhadores não legalizados e en-viá-los de volta a seus países deorigem, para forçá-los a trabalharhoras-extra, muitas vezes porbaixos salários e em condiçõesprecárias.

Uma brecha nas regula-mentações da imigração nos Es-tados Unidos facilita a violaçãodos direitos dos trabalhadorespor parte dos patrões. A lei puneapenas os empregadores que'sabidamente' contratam trabalha-dores sem documentos. No mun-do real, especialmente em ummercado de trabalho em que osempregos de baixos salários sãodisputados, os empregadorescontratam trabalhadores em situ-ação irregular com a maior facili-dade e nada dizem - enquanto ostrabalhadores não reclamam.Mas quando estes afirmam seusdireitos trabalhistas, os emprega-dores ameaçam denunciá-los aogoverno federal.

Neste país, a reestrutura-ção da economia mundial temcausado um declínio nos empre-gos ligados à manufatura e umenorme aumento nos serviçosde baixa remuneração. À me-dida que as grandes empresasdeslocam seus empregos parafora dos Estados Unidos embusca dos salários mais baixose de menor regulamentação, ospadrões trabalhistas caem, tan-to aqui como no exterior.

Na indústria de varejo nosEstados Unidos, que oferece bai-

xos salários, por exemplo, as mu-lheres ocupam cerca de 55% dosempregos, de acordo com o U.S.Bureau of Labor Statistics. Naslojas Wal-Mart, 72 % dos traba-lhadores temporários são mulhe-res, de acordo com o sindicatoUnited Food and CommercialWorkers. Os baixos salários e oalto preço dos seguros de saúdefazem com que 46% dos traba-lhadores da Wal-Mart não tenhamcondições de pagar por previdên-cia de saúde, de acordo com umnovo estudo da AFL-CIO.

Nesse contexto, os traba-lhadores em todas as naçõessão vítimas da ganância dasgrandes corporações.

Os sindicatos nos EstadosUnidos estão resistindo com fir-meza na exigência de proteçãoaos direitos dos trabalhadoresimigrantes, buscando frustrar astentativas dos empregadores deexplorar os imigrantes e de jogaros trabalhadores uns contra osoutros.

Na defesa da justiça sociale econômica para todas as pes-soas, o movimento sindical de-clarou que a liberdade de esco-lher um sindicato é a questão dosdireitos humanos do século 21.Os sindicatos têm a responsabi-lidade de lutar por bons empre-gos para todos os trabalhadores,porque os sindicatos proporcio-nam uma vida digna para os tra-balhadores e ajudam a construirmelhores comunidades. Atravésde sua união em sindicatos, asmulheres trabalhadoras, sejamimigrantes ou nativas, ajudam asuperar as barreiras criadas peladiscriminação, a equilibrar as exi-gências profissionais e familiarese a terem voz em seu local de tra-balho - assim como fez MariaPosada.

Linda Chavez-Thompson, Vice-Presidente Executiva da AFL-CIO

e Presidente da OrganizaçãoRegional Interamericana de

Trabalhadores - ORIT

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AAAAAManuela TManuela TManuela TManuela TManuela Tomei.omei.omei.omei.omei.

DEP

OIM

ENTO

Organização Internacionaldo Trabalho - OIT

(Genebra)Responsável pelo RelatórioGlobal sobre Discriminação

O trabalho da OIT paraalcançar a igualdade de

gênero no trabalhoAs mulheres ingressaram no mercado de trabalho

remunerado em enorme quantidade desde o início da década de1990 e tiveram ganhos importantes no local de trabalho. Todavia,em nenhuma parte a igualdade de gênero foi alcançada: em todosos lugares as mulheres ganham menos que os homens, mesmoquando elas são tão qualificadas ou até mesmo mais qualificadasdo que eles; as mulheres estão sub-representadas nos empregosde alta remuneração e excessivamente representadas emtrabalhos de baixa remuneração; as mulheres são as primeiras aserem demitidas e são mais prováveis no trabalho informal doque os homens. Essa brecha tem que ser fechada se se quer falarseriamente em justiça social, direitos humanos e eficiência, e aOrganização Internacional do Trabalho (OIT) está comprometidaa alcançar essas metas.

A eliminação da discriminação e a promoção da igualdadede gênero no mundo do trabalho está no coração do programade trabalho da OIT. A OIT promove e monitora aimplementação de padrões de trabalho relacionados à igualdadede gênero; fornece conselho técnico para os governos paraassegurar que os sistemas estatísticos nacionais computem otrabalho que as mulheres fazem e que as reformas às leistrabalhistas e aos sistemas de relações industriais não ampliem asdesigualdades de gênero; ajuda as organizações de trabalhadorese de empregadores a fazer suas estruturas mais equilibradas emtermos de gênero e ajuda os sindicatos a alcançar ostrabalhadores desorganizados, dos quais a maioria é de mulheres.

A OIT reforçou seu trabalho para a igualdade de gênero,inclusive em suas próprias estruturas, em 1999, com a adoção doplano de ação do Diretor-Geral acerca da dominação de gênero.O plano de ação identifica os passos requeridos para assegurarque a OIT encaminhe a igualdade de gênero em todo o seutrabalho e seus programas. De outubro de 2001 a abril de 2002a Organização levou a cabo a primeira Auditoria de Gênero nosistema da ONU, que revisou a implementação da política. ODRH colocou em movimento várias estratégias para assegurarum maior equilíbrio de sexos entre o pessoal, especialmente nosníveis mais altos. Houve um crescimento constante, embora lento,no número e na proporção de mulheres em todos os níveis ealgumas medidas “tímidas” de reconciliação entre trabalho/famíliaforam adotadas. Há muito para ser feito, mas nós estamos indoem frente, na direção certa.

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(...)

projetistas de um tempo novo,seguindo as curvas de batalhas infinitas,

andando sobre os próprios pés,conjugando nosso próprio verbo,

e erguendo com as próprias mãos um cotidiano antes programado

para bordar casar e cozinhar.

Agora o mundo nos anuncia eanunciamos o mundo.

Sem protocolos ou marcações detempo.

Não é uma vida fácil. Ela arde o sufoco das horas,

das decepções... dos medos...dos sustos e da fome.

No sufoco das cobrançasamargas e traiçoeiras.

Na competitividadeanimalesca.

Mas estamos de péna arte e no estilo.

Revelando intimidades e descobertas.Rasgamos as indumentárias dos nobres

e preferimos o confortoda modelagem perfeita

do abraço de quem abre-se em conchapara acolher

a criação de Deuse do homem.

(...)

Leda Maria

SomoSomoSomoSomoSomos Marias Bonitas, s Marias Bonitas, s Marias Bonitas, s Marias Bonitas, s Marias Bonitas, carinhocarinhocarinhocarinhocarinhosas, sofridas,sas, sofridas,sas, sofridas,sas, sofridas,sas, sofridas,

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Uma análise da presençado feminismo na coberturado jornal Folha de S. Paulo

sobre a Guerra noAfeganistão

"O feminismovira pauta"

"O feminismovira pauta"

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Os atentados de 11 desetembro de 2001 recolocaramem cena diversos temas. Entreeles o feminismo.Freqüentemente ouviu-se falar notema mulher e guerra. Esta éuma breve reflexão sobre esseinteresse renovado pelofeminismo na imprensa após osatentados, principalmente durantea invasão dos Estados Unidos aoAfeganistão. Por que o feminismovolta a ocupar as páginas dosjornais? Em alguns momentos asreflexões feministas são usadaspara justificar a guerra e, emoutros, aparecem explodindoesses mesmos interesses.

As páginas dos jornaisbrasileiros trouxeram em suacobertura pós-atentadosreportagens, artigos, entrevistase editoriais sobre religião, tortura,antiamericanismo, nacionalismo,terrorismo e também ofeminismo. Num momento emque a política internacionalpassou a ser o foco dos debatesnas TVs, nos círculosacadêmicos, nos bares, ofeminismo voltou à cena nosmeios de comunicação. Por queas discussões sobre osatentados e a guerra noAfeganistão incentivaram que sefalasse sobre feminismo nocotidiano das editorias, numaépoca em que o conceito pareciadesgastado?

O feminismo reaparecepara discutir as condições devida das mulheres doAfeganistão, a proibição deestudar, a proibição de trabalhar

e de mostrar o rosto. É comumencontrar matérias denunciandoas más condições de vida dapopulação feminina noAfeganistão em contraponto comas diversas conquistas dasmulheres ocidentais.

Feministas da academiaescreveram sobre os motivos econseqüências da guerra noAfeganistão. Apesar de essestextos alcançarem menosleitores do que os publicados nosjornais, a produção feministapode criar bases para abalar osenso comum. Um grupo dosEstados Unidos aponta, emartigo, o discurso salvador dasmulheres afegãs pelo Ocidentecomo uma forma de legitimar nãoapenas o ataque a gruposextremistas como a instituiçõesculturais e religiosas islâmicas.Esse texto é um manifesto arespeito dos atentados de 11 desetembro, escrito em outubro. Oponto principal do texto é: nãofaçam a guerra em nome dasmulheres ou do feminismo. Oartigo termina com um pedido aoutras feministas: "A mobilizaçãonacional e internacional pelaguerra não está autorizada aprosseguir em nosso nome enem de ser taxada como'interesse das mulheres'."

O texto das feministascoloca a análise crítica da mídiano centro da discussão sobre otema. As autoras propõem umaanálise que mostre os efeitosrepressivos dos discursosnacionalistas. Elas avaliavam quea mídia tem tratado as mulheres

muçulmanas simplesmentecomo "vítimas" do "barbarismoislâmico".

A cobertura da mídia emgeral tem estado também emsintonia com o uso do que asautoras chamam de "discursosterapêuticos", especialmente naTV, que trata os atentadosapenas como traumasindividuais e excluem leituraspolíticas e históricas. Ainda quemuitos dos textos jornalísticostratem de tais temas comtamanha simplificação, apresença de debates sobre ofeminismo e de depoimentos ereflexões de feministas começaa minar o discurso simplificador.Nas entrelinhas e nas pequenasbrechas, as feministastrouxeram de volta algumdiscurso mais crítico,contestador, não-hegemônico epolítico em relação a um tomuníssono sobre a guerra contra oAfeganistão. Os discursosfeministas de certo modosubvertem o discurso simplistadentro da própria imprensa. Hátextos que tratam das condiçõesde vida das afegãs, mas tentamnão apenas reproduzir o sensocomum e passam a relativizartambém a maneira como asmulheres vivem no Ocidente.

A Folha de S. Paulopublicou duas páginas nocaderno "mundo" de 27 dejaneiro de 2002 sobre mulherese feminismo, comparando ediscutindo as muçulmanas e asocidentais. Uma das matérias éuma entrevista com a feminista

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Vanessa PedroJornalista e doutoranda em Literatura

(Universidade Federal de Santa Catarina)

egípcia Nawal Saadawi, que temno título uma opinião daentrevistada: "'Problema épolítico, não religioso', dizfeminista". Na entrevista de meiapágina a feminista tentardesmistificar o "avanço" dasmulheres no Ocidente emdetrimento das pequenasconquistas das mulheresorientais. Saadawi critica todasas religiões afirmando que deuma forma ou de outra elascolocam os homens acima dasmulheres. Ela critica todos ossistemas de poder sobre osquais é questionada, do governoà religião e até mesmo ademocracia da maneira como éconstruída: "Meus pais erammuçulmanos. Eu sou uma livrepensadora".

A questão é que ofeminismo está em pauta comojamais esteve na última década eganhou uma outra estatura,diferente das acusações desenso comum de outros tempos.Nos textos, as feministas têmautoridade para tratar dequestões que digam respeito aosdireitos das mulheres, à análisedas relações de poder entre osgêneros, como isso acontecedentro dos Estados e dasreligiões. E nas colocaçõessobre feminismo estiveram aspropostas de vanguarda paratratar dos eventos relacionadosaos atentados e às guerras queaconteceram depois. Nestesentido, o discurso dos governose da imprensa que tentaramjustificar uma invasão noAfeganistão, usando

reivindicações e discussõesfeministas para legitimar umapresença e um controleocidentais no país, foi minado pordeclarações, entrevistas edepoimentos de feministas, quemostraram que a história e acultura são menos simples doque uma notícia de guerra podequerer mostrar. Publicaçõescomo a Folha de S. Paulo eoutros jornais foram qualificadase desnorteadas pela presençadas feministas acadêmicas emilitantes do Brasil e de outrospaíses, que há muito não eramautoridades e fontes daimprensa.

A guerra foi um tema quelevou a imprensa a tratar defeminismo e das condições sociaisdas mulheres. Acabada aquela

guerra, aos poucos o país foisaindo da pauta dos jornais. Ejunto com ele o feminismo, queparece ter recebido menosmanchetes após a investida sobreo Afeganistão, ainda que as afegãsnão tenham voltado à escola.

Por que então ofeminismo voltou a ocupar aspáginas de jornal durante aguerra e por que mais se falouem feminismo e não em relaçõesde gênero? Arrisco dizer que apolítica está no cerne dasquestões que sempreenvolveram os movimentosfeministas. Desta maneira, tratarde questões políticas, nãoapenas de políticas de governo, etratar politicamente as questõessociais e culturais aproximaram ofeminismo do debate.

A questão é que ofeminismo está em pauta comojamais esteve na última décadae ganhou uma outra estatura,

diferente das acusações de sensocomum de outros tempos.

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Falas muito de Marx,de divisão de tarefas,de trabalho de base,

mas quando te levantasnem a cama fazes...

Leila Míccolis

Vã filoVã filoVã filoVã filoVã filosofia...sofia...sofia...sofia...sofia...

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copéia brasileira. A exploração e ex-posição extenuante da imagem damulher levantam questões como:

Por que a imagem feminina?Ela é o público-alvo?Ela representa o objeto de de-

sejo?É ela quem define o destino do

orçamento doméstico?Refletir sobre essas indagações

e avançar sobre a condição da mulhercontemporânea não é um assunto res-trito ao mundo feminino/feminista, poistudo que diz respeito à mulher temimpacto direto no mundo capitalista.

Convivemos há anos com a ima-gem da camponesa com um balde demadeira na cabeça estampada nas la-tas de Leite Moça ou, mais recente-mente, com as partes expostas dasdançarinas de pagode (axé, samba,rumba...) vendendo toda sorte de obje-tos. Às vezes elas não têm nada, ouquase nada a ver com os produtos ofer-tados, mas nos acostumamos a es-sas imagens e apelos.

Oh! linda imagemde mulher

Em 1808 surgiu o primeiro jor-nal do Brasil, Gazeta do Rio de Janei-ro, e junto com ele o primeiro anúncioregistrado: "Quem quiser comprar umamorada de casas de sobrado com fren-te para Santa Rita, fale com Joaquinada Silva, que mora nas mesmas ca-sas..."

Este anúncio inaugura no Brasilos "classificados", pequenos textossem ilustrações, alguns até sem títu-lo. Anos mais tarde, em meados de1860, outros meios passaram a fazerparte do cotidiano do brasileiro, comopainéis de rua, bulas de remédios epanfletos de propaganda. Em 1875 osjornais Mequetrefe e O Mosquito sur-giram com a novidade dos reclamesilustrados.

Seja na venda de "Bicycletas"ou no reclame da "Loja da Índia", a fi-gura feminina era amplamente utiliza-da, ora como usuária do produto, oraencarnando alguma "Deusa" que ilus-trava um anúncio de água de colôniaou de algum produto exótico da farma-

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A fogueira do preconceito: a mulher e o trabalho

A situação da mulher no mer-cado de trabalho, a mulher e o traba-lho, o trabalho e a mulher, o ovo e agalinha. No começo era o verbo? Não.No começo era a mãe.

Não há espaço para detalhar atese (não minha, mas da qual sou umaentusiasta) de que a invenção do tra-balho passa por mãos femininas - aobrigação de alimentar a prole estavaao encargo das mulheres. Todo o ins-trumental daquela época era destina-do ao processamento de alimentos.Cortar, triturar, esmagar e descascareram algumas das funções dos pe-quenos instrumentos feitos de pedra,em geral machados de pedra lasca-da ou pequenos seixos rolados. As-sim, acredito que as primeiras facasguinzo e os primeiros tupperwares dahistória da humanidade possam tersido elaborados por mulheres.

Avançando no tempo, já na eraindustrial, a mulher foi usada nos pe-ríodos de crise da humanidade, comoas guerras e as pestes, de acordocom os interesses da classe domi-nante, para ser marginalizada a se-guir, quando não interessava mais suaparticipação. O amor materno, a mãeque "sofre no paraíso", aparece no iní-cio do capitalismo, junto com a fabri-cação da domesticidade e da nova fe-minilidade. O capitalismo precisava demão-de-obra farta e barata. Esta épo-ca é marcada pela masculinização dasociedade, na busca de maior produ-tividade. O controle exacerbado ao

Ao longo dos anos a propagan-da vem apresentando a mulher ao sa-bor dos interesses vigentes, e na bus-ca da correspondência entre a vidareal e a figura apresentada pelos "re-clames" publicitários, já usamos RU-GOL e às 20, 30 ou 40 primaveras con-quistamos corações, nos banhamoscom LUX, que já foi LEVER, pois noveem cada dez estrelas de cinema tam-bém usam, lavamos a roupa comOMO, o que sem dúvida lava maisbranco, saboreamos DORIANA por-que nossa família merece o melhor,fumamos CHARM, cozinhamos comSAZON e com amor, apesar de nãoser CICA que bons produtos indica,atingimos o auge de nossa liberdadeusando TAMPAX e por fim estamosvencendo a maior de todas as bata-lhas com P-STOCK da Vichy reduzin-do de 1 a 4 centímetros do culote eeliminando completamente a celulite.

Seria injusto acharmos que éa propaganda a única responsávelpela consolidação da imagem da mu-lher ideal, ou melhor, idealizada - jo-vem, magra, bonita, sensual e, nomáximo esperta, nunca inteligente,cabelos com brilho, sem celulite enunca de mau humor. A publicidade éum poderoso instrumento, uma armaque brinca, pisoteia e atinge por fimo coração do nosso ponto mais frágil- a vaidade.

qual os operários eram submetidossepara gradualmente o homem do pro-duto do seu trabalho, desencadean-do um processo de divisão que en-volve os mais diferentes aspectos: opai dos filhos e da mulher, o públicodo privado, a infância da fase adulta,a vontade da emoção, o corpo damente, a sexualidade do afeto.

Em 1911 o número de mulhe-res que trabalhava fora de casa esta-va próximo de oito milhões. Em mea-dos de 1920 o direito ao voto é conce-dido à mulher na maioria dos paísesindustrializados, esvaziando assim omovimento sufragista, que se resumiuao movimento pelo voto feminino.Aproveitando a onda conservadoraque marca o fim da Primeira GuerraMundial, Freud dá uma base científi-ca ao culto da domesticidade. Destaforma, retrocede a manifestação quenos anos 20 alterara a figura da mu-lher: saias e cabelos mais curtos, ros-to pintado e jazz.

A Grande Depressão, nos anos30, coloca a mulher trabalhadoracomo o primeiro elemento a ser des-cartado, com o aval da sociedade edas próprias mulheres. Elas eram asprimeiras a ser despedidas para dar

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Maria José CoelhoJornalista.

Coordenadora de Comunicação doInstituto Observatorio Social.

lugar aos homens. Este comportamen-to é reacionário pois, ao invés de pro-por diferentes soluções para a crise,questionando o capitalismo e seus efei-tos, aprofunda a distância entre traba-lhador e trabalhadora.

Certamente não é a publicidadea responsável por este movimento deabsorver e descartar a mulher no mer-cado de trabalho, mas ela foi um dosmecanismos que colaboraram profun-damente para atender aos interessesdeste mercado.

O período que compreende aSegunda Guerra Mundial consagra naAlemanha Nazista "a mulher feminina"e o "homem masculino", cabendo àmulher o papel de reprodutora da raçapura. Era a ideologia do Kinde, Kirche,Küche - crianças, igreja, cozinha. Em1943, no auge da guerra, com a maio-ria dos homens envolvidos na linha defrente, as mulheres entram novamentepara a produção e passam a realizartrabalhos nas fábricas, em áreas de ris-co, incentivadas e obrigadas a atuarem setores onde a presença masculi-na antes imperava.

Nos anos 50, com a consolida-ção da sociedade de consumo, a mu-lher é requisitada em massa a ocupar

os postos de trabalho. Mas a falta dequalificação - resultado de anos deafastamento do processo produtivo -reserva para a mulher os menores sa-lários (metade do salário do homem,nos Estados Unidos e Europa). A or-ganização das mulheres começa adesenhar-se a partir desta constata-ção, discutindo seus direitos, traçan-do as primeiras linhas para a emanci-pação.

Ao discorrer a respeito da cons-trução da imagem da mulher, não sepode deixar de citar as pin-ups quemarcam os anos 50, na esteira da cul-tura ocidental imposta pelos EstadosUnidos a partir da guerra fria. O ameri-can-way-of-life estabelece as normaspara a felicidade perfeita - a casinhacom cercas brancas, o liquidificador, oChevrolet (ou Ford) na garagem, filhosloirinhos, a mulher dona-de-casa, ocachorro brincalhão, os vizinhos amis-tosos. Nesta ordem. A mulher comoobjeto, não como sujeito do mundo ide-al. Ela mesma se enxergando nestecenário como parte do elenco de suaprópria vida.

Enfim, terminamos o século XXcom a mulher ocupando um númeroexpressivo de postos no mercado de

trabalho. É cada vez maior a presençada mulher no mundo acadêmico e nosmais diversos setores. Mas neste iní-cio de século ainda nos deparamos comas mais diferentes expectativas em re-lação à mulher: em que momento de-vemos deixar de ser a filha recatadapara sermos a fêmea sensual? Quan-do sair da cozinha para assumir a dire-ção de uma empresa? Por que deixarde desfrutar as delícias de ser mãepara encarar um trânsito caótico?

Esta reflexão sobre o assuntonão tem a pretensão de dar respos-tas. Talvez a grande 'sacada' seja en-contrar as perguntas - o que somos?Quem somos? O que realmente que-remos ser? A mulher da imagem, per-feita, construída no imaginário mascu-lino (e feminino) que nos massacra di-ariamente em todas as mídias do pla-neta, com a bunda empinada, sem ru-gas, sempre sorridente e pronta para osexo (com as unhas feitas); ou a ima-gem da mulher - corpo, cabeça emembros, que trabalha, estuda, con-cebe, grita, ri, alisa o cabelo, encres-pa o cabelo, faz ginástica e lasanha,brinca de boneca e dirige caminhão,mas sabe, como ninguém, a "delíciade ser o que é".

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É preciso não esquecer nada:nem a torneira aberta nem o fogo aceso,

nem o sorriso para os infelizesnem a oração de cada instante.

É preciso não esquecer de ver a nova

borboletanem o céu de sempre.

O que é preciso é esquecer o nosso rosto,

o nosso nome, o som da nossa voz, o ritmo donosso pulso.

O que é preciso é ser como se já não

fôssemos,vigiados pelos próprios olhos

severos conosco, pois o resto não nos pertence.

É preciso não esquecer nadaÉ preciso não esquecer nadaÉ preciso não esquecer nadaÉ preciso não esquecer nadaÉ preciso não esquecer nada

O que é preciso esquecer é o dia O que é preciso esquecer é o dia O que é preciso esquecer é o dia O que é preciso esquecer é o dia O que é preciso esquecer é o diacarregado de atocarregado de atocarregado de atocarregado de atocarregado de atos,s,s,s,s,a idéia de recompensa e de glória.a idéia de recompensa e de glória.a idéia de recompensa e de glória.a idéia de recompensa e de glória.a idéia de recompensa e de glória.

Cecília Meireles

72

Avenida Mauro Ramos, 1624 sala 202Centro Florianópolis - SCBRASIL CEP: 88020-302

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