observador nuno oliveira 77469

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FINANÇAS PÚBLICAS Portugal teria défice excessivo a partir de 2016 sem renovação de medidas temporárias Ausência de renovação ou substituição das medidas temporárias em vigor, como o corte dos salários e da sobretaxa, fariam a economia crescer mais mas o défice seria superior a 3% a partir de 2016. | P13 LISTA VIP Diretor-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira demite-se Brigas Afonso apresentou demissão, na sequência da controvérsia com a “Lista VIP” de contribuintes. Pedido foi aceite pela ministra das Finanças. Paulo Núncio admite ir ao Parlamento dar explicações. | P15 FOTOGRAFIA Ciganos do Alentejo numa exposição em Nova Iorque O artista francês Pierre Gonord fotografou os últimos ciganos nómadas do Alentejo e os respetivos animais ao estilo de retratos pictóricos do barroco. A exposição está agora em Nova Iorque. | P34 Negociações técnicas com a Grécia “não estão a correr bem” Responsáveis da Grécia e da zona euro estão a atirar as culpas uns para os outros. Alexis Tsipras diz no parlamento que a quinta avaliação foi cancelada e que não será “intimidado por ameaças”. | P2-3

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Trabalho desenvolvido por Nuno Oliveira no âmbito da disciplina de Semiologia Tipográfica do mestrado em design da Universidade de Aveiro –2014/15, de redesenho para suporte papel do jornal Observador.

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FINANÇAS PÚBLICAS

Portugal teria défice excessivo a partir de 2016 sem renovação demedidas temporáriasAusência de renovação ou sub stituição das medidas temporárias em vigor, como o corte dos salários e da sobretaxa, fariam a economia crescer mais mas o défice seria superior a 3% a partir de 2016. | P13

LISTA VIP

Diretor-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira demite-seBrigas Afonso apresentou demissão, na sequência da controvérsia com a “Lista VIP” de contribuintes. Pedido foi aceite pela ministra das Finanças. Paulo Núncio admite ir ao Parlamento dar explicações. | P15

FOTOGRAFIA

Ciganos do Alentejo numa exposição em Nova IorqueO artista francês Pierre Gonord fotografou os últimos ciganos nómadas do Alentejo e os respetivos animais ao estilo de retratos pictóricos do barroco. A exposição está agora em Nova Iorque. | P34

Negociaçõestécnicas com a Grécia “não estão a correr bem”Responsáveis da Grécia e da zona euro estão a atirar as culpas uns

para os outros. Alexis Tsipras diz no parlamento que a quinta

avaliação foi cancelada e que não será “intimidado por ameaças”.

| P2-3

Negociações técnicas com a Grécia “não estão a correr bem”

FUTURO DA GRÉCIA

As negociações técnicas entre a Gré­cia e os representantes das insti­tuições credoras “não estão a correr bem”, disseram ao The Wall Street Journal fontes próximas do processo. No Parlamento de Atenas, o primeiro­­ministro Alexis Tsipras defendeu esta quarta­feira que a quinta avaliação do segundo resgate foi “cancelada” e que o que vale é o acordo obtido a 20 de fevereiro, um acordo que estendeu por quatro meses o acordo com a Grécia mas que fez depender a entrega de mais fundos do sucesso das negociações técnicas com Atenas. Tsipras garante que não se deixará “intimidar por ameaças”. “Responsáveis eleitos vão negociar com responsáveis eleitos e os tecno­cratas lidarão com tecnocratas”, afir­mou esta quarta­feira Alexis Tsipras

no Parlamento, consubstanciando a notícia desta manhã do The Wall Street Journal que citava fontes próximas da negociação técnica que diziam que “os gregos não estão a cooperar” e que os técnicos do BCE, FMI e Comissão Europeia não estão a conseguir ter acesso a dados importantes sobre as finanças do país. No Parlamento, Tsipras garante está “aberto ao diálogo e a suges­tões”, mas assegura que “não irá deitar burocratas ditarem medidas”. O primeiro­ministro grego pediu uma reunião com Angela Merkel, François Hollande, Jean­Claude Juncker e Mario Draghi para, à margem do Conselho Europeu de amanhã e sexta­feira, negociar com estes responsáveis uma solução para o impasse que subsiste.

Autor Edgar Caetano

Responsáveis da Grécia e da zona euro estão a atirar as culpas uns para os outros.

Alexis Tsipras diz no parlamento que a quinta avaliação foi cancelada e que não

será “intimidado por ameaças”.

“Responsáveis eleitos vão negociar com responsáveis eleitos e os tecnocratas lidarão com tecnocratas”

Alex Tsipras

Negociações técnicas com a Grécia “não estão a correr bem”

A falta de progressos nestas nego­ciações está a gerar grandes dúvidas sobre a forma como a Grécia irá conseguir superar a crise de finan­ciamento que enfrenta, algo que Tsi­pras chama uma “pressão ao nível da liquidez”. O primeiro­ministro diz que não quer tratamento “especial”, apenas “tratamento igual” quando pede que o BCE aumente os limites ao financiamento da banca grega e aos montantes de dívida de curto prazo que aceita como garantia.

O Estado grego conseguiu esta quar­ta­feira obter 1.300 milhões de euros num leilão de dívida a três meses, com uma taxa a rondar os 2,7%, o que ilustra as dificuldades de tesouraria de um país que já está a recorrer aos fundos de pensões públicos para financiar o Estado. Contrariando o que disse Yanis Va­roufakis, ministro das Finanças, na sexta­feira, Alexis Tsipras garante que o seu governo está “determinado a cumprir os compromissos assumidos

durante a campanha”. O Ministro das Finanças da Grécia disse em Itália que, a bem da “construção da confiança com os parceiros europeus”, o gover­no poderia adiar promessas eleitorais.

DESTAQUE ECONOMIA P03

Grécia, Alemanha e as reparações. Uma guerracomplicada.

A luta da Grécia pelas reparações de guerra vai muito além do atual Governo, mas a jurisprudência não parece estar do seu lado. Vai Atenas abrir mesmo uma nova frente de batalha com a Alemanha?

“A nossa obrigação histórica é reclamar o empréstimo forçado e as reparações”. As palavras de Alexis Tsipras, primeiro­ministro grego, na segunda­feira, são apenas mais um episódio daquela que ameaça ser uma longa saga em torno do tema das reparações de guerra. Esta quarta­feira, o ministro da Justiça, Nikos Paraskevopoulos, disse no Parlamento grego que estava pronto a assinar a lei a exigir reparações de guerra à Alemanha e a mandar apreender ativos alemães na Grécia. Do lado da Alemanha, um rotundo “não”. O Governo alemão acredita que a questão das reparações ficou resolvida nas conversações entre as potên­cias mundiais que levaram à reunião da Alemanha em 1990. “Acreditamos firmemente que a questão das reparações foi resolvida política e legalmente”, respondeu o porta-voz da chanceler alemã, Angela Merkel, na quarta­feira, em resposta ao ministro grego. Apesar de ter ganhado uma nova vida desde a eleição do Syriza para o Governo grego a 25 de janeiro, a questão das reparações alegadamente devidas pela Alemanha por danos causados pelos nazis durante a Segunda Guerra Mundial à Grécia (e não só) é um imbróglio de longa data e que ainda há pouco mais de dois anos estava em discussão no Tribunal de Justiça Internacional. Mas vamos por partes.

Os casos em causa

A 10 de junho de 1944, o corpo paramilitar do partido nazi conhecido como SS (Schutzstaffel) matou 218 mulheres, crianças e idosos na vila de Distomo, perto da cidade de Delfos. O caso foi levado aos tribunais alemães pelos gregos até ter sido rejeitado pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que considerou que os países estão “imunes” a processos movidos por “cidadãos”. Sem sucesso na Alemanha, os queixosos levaram a questão para a justiça grega que condenou a Alemanha a pagar 28 milhões de euros em reparações de guerra, que os alemães se recusaram a pagar. A justiça grega decidiu, então, tentar confiscar e vender propriedades do Governo alemão na Grécia, algo que foi bloqueado pelo Governo grego que não queria entrar em guerra aberta com Berlim. Eis que, em 2008, uma decisão da justiça italiana deu novo alento aos quei­xosos. O caso em mãos: a 29 de junho de 1944, as tropas alemãs mataram 250 civis na cidade de Civitella, na Toscânia. Mais de 40 anos após o mas­sacre, os familiares das vítimas processaram a Alemanha na justiça italiana, exigindo reparações. Depois de muitos anos a lutar, um dos queixosos, um cidadão italiano chamado Luigi Ferrini, viu o Supremo Tribunal de Justiça de Itália dar­lhe razão. O Supremo considerou que os indivíduos que viram os seus direitos humanos violados podiam, de facto, processar um país e exigir

Autor Nuno André Martins

P07

reparações de guerra. Ferrini foi preso pelos soldados alemães e enviado para um campo de concentração, onde foi obrigado a trabalhos forçados na produção de armamento para o Exército alemão. Mas os tribunais italianos foram ainda mais longe e decidiram que as decisões dos tribunais gregos podiam ser aplicadas em solo italiano. Ou seja, os gregos que viram a Alemanha condenada a pagar­lhes reparações de guerra, podiam exigir a apreensão e venda de ativos alemães em Itália para fazer este pagamento. Para isso, foi ordenada a apreensão e venda de uma propriedade alemã perto do lago Como, que servia de centro cultural italo­germânico. Os gregos exigem, ainda, a devolução de um empréstimo que os nazis obrigaram (prática comum) o Banco Central da Grécia a dar à Alemanha, de 476 milhões de marcos. Sem contar com juros, este valor podia ultrapassar os 13 mil milhões de euros atualmente.

Alemanha ganha em Tribunal

A justiça italiana abriu a porta a pedidos de indemnização de toda a Europa e a Alemanha decidiu rapidamente colocar a Itália em Tribunal. Em dezembro de 2008, a Alemanha entrou com um pedido no Tribunal Internacional de Justiça, em Haia, alegando que, ao permitir que civis exigissem reparações num processo cível contra um país, a Itália violou as suas obrigações perante a lei internacional, que dão imunidade à Alemanha. No centro da disputa, e que acabou por ser fulcral na decisão, está o Tratado de Paz entre a Itália e os aliados – no qual a Alemanha nem sequer foi uma

Heinrich Himmler, líder das SS que durante a Segunda Guerra Mundial foram responsáveis por grande parte dos crimes contra a Humanidade do lado nazi

parte –, no qual a Itália aceita uma cláusula que abdica de pedir reparações de guerra. A Alemanha argumentava que esta ainda era válida, enquanto a Itália defendia que os acordos subsequentes (como o acordo de 1961 onde a Alemanha assume, voluntariamente, novas responsabilidades) criavam novas exigências. A Alemanha argumentou, por sua vez, que não se tratavam de novas exigências, mas de exigências antigas.

Finalmente, em 2012, os governantes alemães (e não só) respiravam de alívio. Depois de quatro anos de intensa disputa, o Tribunal Internacional de Justiça decidiu a favor da Alemanha. Segundo Haia, o caso italiano violava a imunidade da Alemanha de ser processada por tribunais nacionais, um princípio reconhecido pela lei internacional. Alguns especialistas argumentavam, na altura, que negar este princípio iria abrir um precedente que levaria à inundação dos tribunais. Mas outros, como a Amnistia Internacional, consideravam que a decisão era um “grande passo atrás em matéria de direitos humanos” e que violava o princípio consagrado na Convenção de Haia, de acordo com o qual “as vítimas de crimes de guerra podem processar o Estado responsável para obter reparações”.

Grécia não desistiu

Na quarta­feira, o Parlamento grego aprovou a criação de uma comissão especial formada para todos os partidos para calcular o valor que a Alemanha alegadamente deve à Grécia em reparações e em relação ao empréstimo forçado.

Autor Nuno André Martins

Representantes da Grécia, que se constituiu assistente no processo movido pela Alemanha no Tribunal Internacional de Justiça contra a Itália

P09

No entanto, este trabalho não é pioneiro. Em 2013, o Ministério das Finanças da Grécia terá pedido um relatório a um grupo de espe-cialistas para avaliar quanto seria o valor em causa. “Quanto nos deve a Alemanha” será o título do relatório secreto, de acordo com a revista alemã Der Spiegel. Depois de meses de trabalho, o relatório de 80 páginas terá chegado à conclusão que a Grécia “nunca recebeu qualquer compensação, seja pelos empréstimos que foi forçada a dar à Alemanha ou pelos danos sofridos durante a guerra”. O valor calculado pelos peritos não foi conhecido, tal como o relatório que não foi tornado público, mas o jornal grego To Vima, que diz ter tido acesso ao relatório, afirma que este valor atinge os 162 mil milhões de euros, a soma exigida, agora, por Alexis Tsipras, que corresponde a cerca de metade da dívida púbica grega. Segundo a revista alemã Der Spiegel, este relatório foi entregue pelo Ministério das Finanças ao então ministro dos Negócios Estrangeiros grego, Dimitris Avramapoulos, e ao primeiro­ministro, Antonis Samaras. A decisão teria de ser tomada ao mais alto nível, mas o relatório ficou na gaveta numa altura muito sensível do resgate. A Grécia tinha acabado a segunda fase da sua reestruturação de dívida e tinha a promessa, feita em novembro de 2012, do Eurogrupo de que iria discutir a sustentabilidade da sua dívida assim que conseguisse um saldo primário nas finanças públicas. Agora, o ministro da Justiça, Nikos Paraskelopoulos, ameaça fazer cumprir exatamente a decisão de 2000 da justiça grega, relativa ao massacre de Distomo, e de apreender ativos alemães. Só o Governo pode tomar essa decisão, algo que o Executivo grego em 2000 não quis fazer.

“Não devemos dinheiro aos alemães, eles é que nos devem”. Manolis Glezos do Syriza, ficou conhecido por em maio de 1941 ter subido à Acrópole e retirado a bandeira nazi colocada pelos ocupantes.

A Alemanha deve reparações à Grécia?

Esta questão, a avançar o processo pela Grécia contra a Alemanha, terá muitas nuances com base nas interpretações diferentes de alguns tratados. Mas não só. A Alemanha pagou, em 1960, cerca de 115 milhões de marcos alemães (cerca de 59 milhões de euros a valores da altura) de compensação às vítimas gregas dos crimes nazis. As vítimas dos campos de trabalhos força­dos receberam compensações individuais. Alexis Tsipras alega que estas reparações não cobrem a destruição causada durante a ocupação nazi da Grécia, entre 1941 e 1944.

Outra questão é a do valor das indemnizações que foi acordado. A certa altura, nas negociações de paz da conferência de Paris, a Grécia terá exigido 7,1 mil milhões de dólares de reparações de guerra à Alemanha. No entanto, este valor foi rejeitado e reduzido na altura para 45 milhões de dólares, que já terão sido pagos entre 1950 e 1990. Os empréstimos entram noutro pântano legal. Se for considerado uma espécie de dano de guerra, poderia ser objeto de reparação. Mas, de acordo com o tratado de 1990, a Alemanha não teria de pagar. Se for considerado apenas um empréstimo sem juros, o valor será muito reduzido. Sem juros, o empréstimo valeria cerca de 14 mil milhões de dólares a preços atuais. Com juros de 3% durante 66 anos, o valor em dívida subiria para 95 mil milhões de dólares.

“Não devemos dinheiro aos alemães, eles é que nos devem”. Manolis Glezos do Syriza, ficou conhecido por em maio de 1941 ter subido à Acrópole e retirado a bandeira nazi colocada pelos ocupantes.

P11

Mas mesmo o valor total é discutível. Segundo Albrecht Ritschl, um histo­riador de economia da London School of Economics, em vez de mais de 160 mil milhões de euros, o valor das reparações não ultrapassaria os 13 mil milhões de euros.

Uma questão política

No final do dia, mesmo que o valor seja reduzido, a Alemanha garante que pagou o que tinha a pagar e que não vai ceder nesta questão. Legalmente, um pagamento à Grécia podia criar o precedente legal necessário para que outros países, alguns de maior dimensão (como a França), exijam reparações à Alemanha. Outra das questões apontadas pela Grécia é o incumprimento da Alemanha de parte das dívidas da primeira guerra. Em 1953, no âmbito dos acordos de Londres, a Alemanha beneficiou de uma reestruturação de grande dimensão, com um perdão parcial e uma boa parte dos prazos de pagamento da dívida pública alemã a serem também estendidos para prazos mais longos o muito longo prazo. Com esse acordo, a Alemanha acabou por demorar 92 anos a pagar por completo essa dívida, desde o final da primeira guerra, até ao pagamento da última tranche em 2010. A Grécia pode seguir nos próximos meses para os tribunais internacionais, mas as decisões mais recentes não inspiram grande confiança para os lados das pretensões gregas.

Portugal teria défice excessivo a partir de 2016 sem renovação de medidas temporárias

FINANÇAS PÚBLICAS

Portugal até conseguiria reduzir o défice orçamental para menos de 3% do PIB este ano, mas, caso não sejam tomadas medidas para manter alguns dos cortes ou compensá­los, o défice voltará a superar os 3% em 2016 e nos anos seguintes até 2019, estima o Conselho das Finanças Públicas. Num relatório publicado sobre a situação e as condicionantes orça­mentais no período 2015 a 2019, o Conselho das Finanças Públicas alerta para um crescimento do valor do défice nos anos posteriores a 2015.

“Embora pareça viável a obtenção em 2015 de um défice inferior a 3% do PIB, permitindo encerrar o Procedimento por Défices Ex-cessivos, na ausência de políticas adicionais e não obstante a con-

vergência da economia para o seu crescimento potencial, o défice voltará a superar essa marca a partir de 2016”, diz a instituição liderada pela ex-administradora do Banco de Portugal Teodora Cardoso. Este cenário, no entanto, é expli­cado pela forma como o CFP faz as suas estimativas, que é através da utilização de um cenário de políticas invariantes, ou seja, o CFP não conta com as medidas que ainda não estão aprovadas e com aquelas medidas que exigem legislação anual para serem repostas. Entre estas medidas, e com grande impacto tanto no défice como na previsão de crescimento da econo­mia, estão, por exemplo, os cortes salariais na Função Pública que devem

Autor Nuno André Martins

Ausência de renovação ou

substituição das medidas

temporárias em vigor,

como o corte dos salários

e da sobretaxa, fariam a

economia crescer mais

mas o défice seria superior

a 3% a partir de 2016.

QUI, 16 | 04 | 2015ECONOMIA

P13

desaparecer no próximo ano se não forem aprovados novos cortes (no seguimento de uma decisão do Tribu­nal Constitucional) e da sobretaxa de 3,5% em sede de IRS, que também precisa de renovação anual no Orça­mento do Estado. Neste sentido, o CFP calcula que o défice este ano seria reduzido para 2,8%, mas este cresceria novamente para 3,3% em 2016 e 3,2% do PIB nos anos seguintes até 2019. Isto aconteceria, caso não avancem mais medidas, o PIB até cresceria mais que o previsto, superior a 2% de 2016 até 2019 (chegando mesmo aos 2,4% em 2017), mas mesmo com esse nível de crescimento, o problema das finanças públicas não seria resolvido e o défice mantinha­se nos valores referidos acima de 3%.

“O simples facto de a ausência de medidas em 2016 levar a um cres-cimento maior da economia não resolve o problema do orçamento”, afirmou esta quarta-feira Teodora Cardoso, durante a apresentação deste relatório na sede do CFP, em Lisboa.

QUI, 16 | 04 | 2015 ECONOMIA

Diretor-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira demite-se

LISTA VIP

António Brigas Afonso, diretor­geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), apresentou a demissão esta quarta­ ­feira, na sequência da controvérsia com a “Lista VIP” de contribuintes, confir­mou o Observador. O pedido foi aceite pelo Ministério das Finanças, confirma o Ministério em comunicado, sem adian­tar para já qualquer informação adicio­nal. Nada indica, para já, que o lugar de Paulo Núncio esteja em risco, apesar de a auditoria que foi determinada já ter indícios que a polémica lista, sempre categoricamente desmentida pelo Governo, poder existir. No cargo há nove meses, António Brigas Afonso, substituiu em julho o antigo chefe do fisco, José Azevedo Pereira. Antes disso, Brigas Afonso era subdiretor­geral da AT na área dos impostos especiais sobre o consumo.

Em declarações aos jornalistas esta quarta­feira, transmitidas pela SIC Notícias, Paulo Núncio diz que “esta não é o momento para clarificar” a situação. O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais garante estar “totalmente disponível” para ir ao Parlamento, “porque entendo que o Parlamento é o local certo para que sejam prestados mais esclare­cimentos sobre esta matéria”. Paulo Núncio acrescentou que “o governo recebeu da AT a confirmação de que não existia essa lista mas, por outro lado, existem rumores e notícias em sentido contrário”. Ouvido pela TSF, Paulo Ralha, presi­dente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, diz que recebeu a notí­cia “com um misto de surpresa e de fatalidade”. “O Dr. Brigas Afonso não

Autor Edgar Caetano

Brigas Afonso apresentou

demissão, na sequência da

controvérsia com a “Lista

VIP” de contribuintes.

Pedido foi aceite pela

ministra das Finanças.

Paulo Núncio admite ir ao

Parlamento dar

explicações.

QUI, 16 | 04 | 2015POLÍTICA

P15

pode ser responsabilizado pelo que se passou com a Lista VIP, mas é respon­sável máximo da casa”, acrescentou Paulo Ralha, elogiando a “franqueza” do agora ex­diretor­geral da AT. Paulo Ralha diz que António Brigas Afonso terá sido “apanhado desprevenido” pela existência desta lista quando assumiu o cargo. A existência de uma lista de contri­buintes VIP, personalidades mediáticas de várias áreas, terá sido divulgada numa formação para inspetores tribu­tários estagiários realizada a 20 de ja­neiro. A notícia, avançada pela revista Visão, tem por base o testemunho de participantes na sessão que decorreu na Torre do Tombo, que contrariam a versão oficial do governo segundo a qual a tal lista não existe. Também o presidente do Sindicato dos Traba­lhadores dos Impostos (STI), Paulo Ralha, veio a afirmar que existe uma bolsa de contribuintes VIP no Fisco. Depois de ter repetido que “nunca foram dadas instruções à Autoridade Tributária para elaborar qualquer tipo de listas de contribuintes”, o secretá­

rio de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, garantiu que a sua res­posta não implica que esteja afastada a realização de uma auditoria ao caso da lista VIP de contribuintes, que foi sugerida por um vice­presidente do PSD e defendida pelo PCP e Bloco de Esquerda. Paulo Núncio insistiu nunca ter “elaborado ou entregado” qualq uer lista de contribuintes à Autoridade Tributária (AT), assim como nunca ter dado “instruções” para a AT o fazer. Na segunda­feira, inspetores da Auto­ridade Tributária denunciaram um “clima de medo, insegurança e intran­quilidade” na sequência do aviso de que haveria uma lista VIP de contri­buintes, que ao ser consultada faria disparar um alarme informático. Nesse mesmo dia, o Ministério das Finanças mandou abrir uma auditoria à alegada lista VIP de contribuintes da Autoridade Tributária. “Tendo em conta notícias vindas recentemente a público, o Ministério das Finanças comunica que solicitou hoje à Inspe­ção­Geral de Finanças (IGF) a abertura de um inquérito sobre a alegada exis­

QUI, 16 | 04 | 2015 POLÍTICA

tência de uma lista de contribuintes na Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), cujo acesso seria alegadamente restrito. Este inquérito, a realizar pela IGF, enquanto entidade externa da AT, destina­se a realizar o apuramento de todos os factos relativos a este assunto”, informou o gabinete de Maria Luís Albuquerque no dia 16.

JUSTIÇA

A Procuradoria­Geral da República (PGR) está a recolher informação sobre a existência de uma eventual lista de con­tribuintes VIP na Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), com o objetivo de avaliar se vai dar início a algum procedimento, informou fonte da PGR. “A PGR encontra­se a coligir informa­ção sobre essa matéria, com vista a avaliar da necessidade de iniciar pro­cedimentos que mostrem pertinentes, no âmbito das atribuições do Ministério Público”, refere a PGR numa resposta à Lusa. Na segunda­feira, o Ministério das Finanças anunciou ter solicitado à Inspe­ção­Geral de Finanças (IGF) a abertura de um inquérito sobre a existência desta lista na Autoridade Tributária e Aduanei­ra (AT), explicando que este inquérito surgiu “tendo em conta notícias vindas recentemente a público”. O presidente do Sindicato dos Tra­balhadores dos Impostos (STI), Paulo Ralha, afirma que existe a referida lista de contribuintes VIP e que foi o chefe de divisão dos serviços de auditoria da Autoridade Tributária e Aduaneira,

que informou os trabalhadores da sua existência numa ação de formação para 300 inspetores tributários. O sindicalista relaciona esta lista de contribuintes com os 140 processos disciplinares que foram abertos a traba­lhadores que, alegadamente, acederam a informação de contribuintes dessa lista VIP. O STI acrescenta que os processos disciplinares aos trabalhadores dos impostos começaram a ser aplicados desde dezembro, depois de ter sido noti­ciado que os funcionários da AT estavam a ser investigados por alegadamente terem consultado os dados fiscais do primeiro­ministro, Pedro Passos Coelho. Mas o diretor­geral da AT, António Brigas Afonso, “desmente que tenha recebido qualquer tipo de lista da parte do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais”, Paulo Núncio, tal como noticiou a revista Visão. Num debate no parlamento, também o primeiro­ministro negou que exista na Autoridade Tributária uma qualquer ‘bolsa VIP’ destinada a contribuintes considerados especiais.

Autoria Agência Lusa

A Procuradoria-Geral da

República quer analisar

a necessidade de iniciar

procedimentos que se

mostrem pertinentes para

enfrentar a questão da

existência de uma lista VIP

de contribuintes.

QUI, 16 | 04 | 2015PAÍS

PGR recolhe informação sobre lista de contribuintes VIP

P17

PLANO NACIONAL DE VACINAÇÃO

QUI, 16 | 04 | 2015 PAÍS

O ministro da Saúde admitiu a possibili­dade de a vacina pneumocócica Preve­nar vir a constar do Plano Nacional de Vacinação (PNV), o que teria custos na ordem dos 12 milhões de euros anuais. “Ainda pode acontecer”, disse Pau­lo Macedo aos jornalistas no final da cerimónia da tomada de posse da nova direção da Inspeção Geral das Atividades em Saúde (IGAS), liderada por Leonor Furtado. Questionado pelos jornalistas sobre o recente anúncio de que o Estado vai comparticipar a vacina Prevenar (contra a pneumonia, meningite e septicémia), disponibilizando uma verba de seis milhões de euros até fim do ano para apoiar famílias mais necessitadas, Paulo Macedo remeteu para final do mês mais detalhes. Contudo, sublinhou que a intenção anunciada pelo Governo irá permitir uma “maior equidade”, no sentido em que mais crianças poderão ter acesso a esta vacina. Atualmente, disse, são administradas mais de cem mil doses anuais, pagas pelas famílias. O Governo está a pon­

derar uma comparticipação que pos­sa abranger mais crianças vacinadas através do serviço nacional de saúde, o que “dá um conjunto muito alargado de crianças vacinadas”. A forma como esta comparticipação será feita dependerá das negociações em curso com os laboratórios respon­sáveis pela vacina. Na cerimónia da tomada de posse da nova inspetora­geral da IGAS, Paulo Macedo enalteceu a importância deste organismo, nomeadamente em áreas como o combate à fraude. Na sua intervenção, Leonor Furtado disse que a atuação da IGAS deve assentar em dois princípios: “proteção das pessoas, por respeito dos direitos humanos, e defesa do interesse públi­co, visando a utilização dos recursos públicos”.

Autoria Agência Lusa

Paulo Macedo admitiu a

possibilidade de a vacina

pneumocócica Prevenar

vir a constar do Plano

Nacional de Vacinação,

o que teria custos na

ordem dos 12 milhões

de euros anuais.

Ministro da Saúde admite incluir vacina Prevenar no Plano Nacional de Vacinação

CASO PETROBRAS

A Petrobras vai sair do escândalo de corrupção em que está envolvida “mais forte, mais competitiva e mais capacita­da”, afirmou Manuel Ferreira de Oliveira, presidente da Galp Energia, à margem de uma intervenção em Lisboa. Considerando que o problema que se vive na petrolífera estatal brasileira “foi ali implantado” e “quanto mais depressa se resolver melhor”, Ferreira de Oliveira afirmou que a empresa “vai sair deste processo mais forte, mais competitiva e mais capacitada”. O presidente da Galp Energia falou à agência Lusa antes do início da palestra

“Oportunidades de negócios decorren­tes das descobertas de O&G [sigla inglesa para petróleo e gás] na CPLP”, organizada no auditório da Auditório da SRS Advogados pelo Fórum de Ad­ministradores de Empresas no âmbito da iniciativa “Encontros de Gestores”. Defendendo que a Petrobras “é, in­discutivelmente, a empresa petrolífera do mundo com mais saber e mais experiência na exploração e produ­ção de petróleo e gás no ‘ultra deep offshore’ [exploração em águas muito

profundas] “, o responsável da Galp sublinhou que “o conhecimento está lá, os profissionais estão lá, e são do melhor que há no mundo”. Apesar de considerar que o escândalo de corrupção em torno da Petrobras é

“um processo difícil para todos os que estão a vivê­lo no dia­a­dia” e perante o qual a empresa brasileira “tem pela frente um trabalho gigantesco”, Ferreira de Oliveira disse acreditar que “o resul­tado vai ser positivo”. “Esta situação entristece­nos a todos, entristece e muito a esmagadora maio­ria dos colaboradores da Petrobras, porque, às vezes, ao falar dos proble­mas que estão hoje nas páginas dos jornais, esquecemos que 99,99% dos trabalhadores da empresa são pessoas tão dignas, competentes e profissionais como todos nós”, sublinhou à Lusa, desejando que, “passada esta onda de preocupação, se regresse à nor­malidade necessária para a Petrobras poder cumprir o seu dever”. No início de fevereiro, o presidente da Galp Energia havia declarado não estar a sentir “implicações materiais”

Autoria Agência Lusa

Manuel Ferreira de

Oliveira, presidente da

Galp Energia, declarou que

a Petrobras será “mais

forte, competitiva e

capacitada” após o

escândalo.

QUI, 16 | 04 | 2015MUNDO

Galp: Petrobras sairá do escândalo “mais forte, competitiva e capacitada”

P19QUI, 16 | 04 | 2015 MUNDO

nos projetos em que estava envolvido com a Petrobras”. A situação na petrolífera brasileira levou a presidente brasileira, Dilma Rousseff, a anunciar um conjunto de medidas, que submeterá ao Congresso, para reforçar o combate à corrupção. Entre as medidas propostas consta uma que regulamenta uma lei contra a corrupção já aprovada sobre as práticas ilícitas no setor privado, endurecendo as penas para os empregadores que se envolvam em crimes contra o erário público. Essa medida pode afetar diretamente 18 empresas privadas contra as quais a procuradoria­geral instaurou dois processos administrativos por alegado envolvimento na rede de corrupção na Petrobras. No âmbito deste escândalo, estão também sob investigação 50 políticos, na sua maioria da base de apoio a Dilma Rousseff, e entre os quais o tesoureiro do Partido dos Trabalhadores (PT), João Vaccari, por supostas manobras para conseguir dinheiro da Petrobras para as campanhas do partido no poder.

POLUIÇÃO

Paris perdeu a Torre Eiffel entre as partículas da poluição, que for­maram uma nuvem baça sobre a capital francesa durante esta quarta­feira. A notícia é publicada pelo ABC. A Airparif, a companhia respon­sável por controlar a qualidade do ar parisiense, afirmou que os níveis de contaminação são con­sistentes e que “se não tivermos ultrapassado os níveis máximos, não estaremos muito longe”. A poluição que está a sufocar Paris é criada pelos gases liber­tados pelos automóveis e pelas indústrias, que têm lançado para o ar as partículas mais nocivas para a saúde humana. Chamam­se PM10 e são capazes de penetrar nos pulmões e no sistema circulatório.

Autoria Observador

A capital pariense está

debaixo de uma nuvem

de poluição que obrigou

as autoridades a diminuir

os limites de velocidade

em 20 quilómetros.

QUI, 16 | 04 | 2015MUNDO

Torre Eiffel foi engolida pela poluição atmosférica

A fraca visibilidade criada pelo smog que se abateu na cidade europeia obrigou as autoridades a diminuir os limites de velocidade nas estradas. A polícia pode ainda proibir a entrada de carros na capital, obrigando a população a viajar em transportes públicos. Esta foi uma medida adotada o ano passado, depois de uma crise ambiental de grandes dimensões.

P21QUI, 16 | 04 | 2015 DESPORTO

Mónaco, de Leonardo Jardim, apura-se para os quartos de final da Liga dos Campeões

FUTEBOL

O Mónaco, treinado pelo português Leonardo Jardim, qualificou­se na terça­feira para os quartos de final da Liga dos Campeões de futebol, apesar de ter perdido em casa com o Arsenal, por 2­0. Na segunda mão dos oitavos de final, o francês Olivier Giroud (36 minutos) e o galês Aaron Ramsey (79) deram o triunfo ao Arsenal, insuficiente contudo para o conjunto inglês dar a volta ao 3­1 na primeira mão, permitindo aos monegascos, que tiveram João

Autoria Agência Lusa

Mónaco, treinado

pelo português

Leonardo Jardim,

qualificou-se para

os quartos de final

da Liga dos Campeões

de futebol, apesar de

ter perdido em casa

com o Arsenal, por 2-0.

Moutinho e Bernardo Silva em campo, chegar pela primeira vez aos ‘quartos’ desde 2003/04. No outro encontro da noite, o Atlético de Madrid, finalista em 2013/14, e o Bayer Leverkusen vão disputar o pro­longamento, depois de Mario Suarez ter empatado a eliminatória, com um golo aos 27 minutos.

Eles estão na faculdade. E podem ser expulsos a qualquer momento. A guerra está nos tribunais.

Pedro tem 23 anos e está no terceiro ano de medicina, na Universidade de Lisboa. Em 2012, foi um dos 183 alunos provenientes do ensino recor-rente que acedeu ao ensino superior sem fazer exames nacionais, poucos meses depois de o ministro Nuno Crato ter mudado as regras de acesso e ter imposto a realização de exames. O Ministério recorreu da decisão dos tribunais e, no ano passado, Pedro recebeu um cartão vermelho, que é como quem diz uma carta da Direção­Geral do Ensino Superior (DGES) com ordem de expulsão da universidade. Não obedeceu. “Lembro­me de ter visto no Facebook, no início do ano passado, que o Mi­nistério da Educação estava a notificar os alunos que tinham vindo do ensino recorrente, mas como eu não tinha recebido carta nenhuma fiquei descansado. Até que em abril lá chegou a carta da DGES a dizer que a minha média tinha sido recalculada com base nas notas do ensino regular e como eu não tinha posto mais nenhuma opção de ingresso depois da Universidade de Lisboa, perdia a colocação”, recorda Pedro, que prefere manter o anonimato, por saber que “o recorrente é muito mal visto”. Pedro não abandonou a universidade porque o seu advogado voltou a recorrer para os tribunais, mas está longe de estar tranquilo. “Não sei o que é que hei de esperar do amanhã. Estou a estudar hoje e não sei se amanhã me podem mandar embora, nem posso fazer projetos. Os meus colegas vão todos de Erasmus no próximo ano e eu nem posso sequer pensar em concorrer”, lamenta, com o olhar caído sobre as mãos.

De 18,6 para 19,5 valores e entrada direta para medicina

Recuemos um pouco no tempo. Estamos em 2010 e Pedro termina o ensino secundário regular com uma média interna de 18,6 valores. Uma média elevada, mas não suficientemente alta para conseguir entrar num curso de medicina. Decide ficar mais um ano a fazer melhoria de notas. Matricula­se no ensino recorrente – uma vertente de educação para adultos que permite

Autora Marlene Carriço

Entraram na universidade e estão a tirar cursos superiores. Mas o Ministério entende que devem voltar a fazer exames e quer mandá-los embora. A guerra (e o percurso deles) está na mão dos tribunais.

“Não sei o que é que hei de esperar do amanhã. Estou a estudar hoje e não sei se amanhã me podem mandar embora, nem posso fazer projetos. Os meus colegas vão todos de Erasmus no próximo ano e eu nem posso sequer pensar em concorrer”.

Pedro (nome fictício)

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fazer o ensino secundário num só ano e até sem assistir a aulas – e prepara­se para os exames de ingresso ao curso de medicina (biologia, matemática e física e química). Em 2011 Pedro termina o recorrente com uma média interna de 19,5 valores e consegue melhores notas nos exames das cadeiras específicas. Feitas as contas: 18,1 valores. Uma média que lhe valeu o ingresso nesse ano em medicina, embora na última opção. A adaptação não correu da forma desejada e o estudante meteu imediatamente na cabeça que no ano seguinte iria pedir transferência para outra universidade, com os exames, ainda válidos, que tinha feito em 2011 e aproveitando a nota interna do recorrente. Acontece que em 2012, já na primavera, Pedro apercebeu-se que o ministro Nuno Crato tinha alterado as regras de acesso ao ensino superior para os alunos do ensino recorrente e, a conselho de um amigo do pai, procurou a ajuda do advogado Jorge Braga, que já estava a defender um grupo de alunos nesta mesma causa. “Só sei contar que ganhámos em tribunal, que entrei na Universidade de Lisboa e não mais pensei no assunto, até a carta da DGES ter aparecido, no ano passado. Dizia que a minha matrícula seria anulada pois a minha média, recalculada, baixava e eu não tinha colocado mais nenhuma hipótese, naquele ano, a seguir a Lisboa. O meu pai está mais por dentro destas questões jurídicas do que eu. Na verdade não percebo muito bem a terminologia que o Dr. Jorge usa. Eu limito­me a estudar e desde que recebi a carta ainda tenho tirado melhores notas”, conta o estudante.

O que mudou com Nuno Crato?

A mudança das regras de acesso ao ensino superior para os alunos vindos do recorrente ocorreu a meio do ano letivo. Em fevereiro de 2012 foi publicado o diploma que aproxima as condições de candidatura ao ensino superior por parte dos alunos dos cursos científico­humanísticos do ensino recorrente, daquelas a que estão sujeitos os alunos do ensino regular. Na prática, os alunos do recorrente que se querem candidatar ao ensino superior passaram a ter de fazer os exames finais nacionais como os alunos do ensino regular, sem prejuízo de ser suficiente a ava­liação interna para os alunos que apenas queiram obter a certificação da conclusão desses cursos. Além disso impediu­se que os alunos que tivessem completado o ensino secundário regular se matriculassem em curso idêntico no recorrente para subir nota.

As alterações introduzidas vieram, sublinha o Ministério da Educação ao Observador, “restaurar a matriz do ensino recorrente”. “O seu propósito foi pois o de pôr termo à prática, que se veio a revelar abundante, de utilizar o ensino recorrente como via rápida e acessível para o ingresso no ensino superior, frustrando as expectativas de todos os que seguiram o percurso normal”, acrescentou fonte oficial do Ministério de Nuno Crato. Os casos mais flagrantes e polémicos prendiam­se com alunos que tiravam notas baixas no regular e iam subir notas para o recorrente para conseguir entrar em cursos de médias elevadas, como medicina. Mas este diploma acabou por ser objeto de litígio. Isto porque o ministro Nuno Crato entendia que as novas regras se deveriam aplicar a todos os alunos vindos do recorrente que acedessem ao ensino superior naquele mesmo ano e os alunos entenderam que não.

Alunos venceram em tribunal. Ministério não baixou armas e a “guerra” continua

O advogado Jorge Braga tem sido um dos rostos desta luta que opõe os alunos do recorrente ao Ministério da Educação. Em 2012 apresentou dois processos no Tribunal Administrativo do Circulo de Lisboa, re-presentando um total de 285 alunos, e venceu os dois. O advogado considerava que o diploma de fevereiro de 2012 devia conter uma regra de transição para estes alunos “que não tinham sido formatados para fazer exames naquele ano”, explicou ao Observador. Os alunos acabaram por poder candidatar-se e 183 conseguiram colocação. O Ministério, que recorreu das decisões, criou na altura 163 vagas adicionais para que os alunos do regular não fossem prejudicados.

“O propósito [das alterações às regras de acesso] foi pois o de pôr termo à prática, que se veio a revelar abundante, de utilizar o ensino recorrente como via rápida e acessível para o ingresso no ensino superior, frustrando as expectativas de todos os que seguiram o percurso normal”.

Fonte oficial do Ministério da Educação e Ciência

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Um dos processos acabou por subir para o Tribunal Central Administrativo Sul e como este tribunal decidiu que “a própria norma era inconstitucional porque violava o princípio da confiança jurídica, o Ministério Público (MP) teve obrigatoriamente que recorrer para o Tribunal Constitucional”, conta Jorge Braga, lembrando que o recurso do MP dava razão aos alunos. O outro processo, que entrou mais tarde, seguiu para o Supremo Tribunal Administrativo (STA) do Sul. Segundo o advogado, o Constitucional decidiu que a norma não era inconstitucional para “todos os alunos matriculados no ensino secundário recorrente” e o STA seguiu a mesma linha. Jorge Braga re­correu do acórdão do TC para o Plenário e do STA para o Constitucional. A resposta do Constitucional foi idêntica à primeira. A partir desse momento, Jorge Braga percebeu que só teria como salvaguardar os direitos dos alunos que tinham estado matriculados no recorrente antes de 2011/2012. Restavam­lhe 11 dos 183 que tinham entrado no ensino superior. E é por esses que se tem batido.

“O TC claramente excluiu da decisão os alunos que já haviam terminado o ensino recorrente naquele ano, portanto esses alunos que eram detentores de um certificado de habilitações académicas podiam, deviam e teriam sempre que se candidatar”, argumenta o advogado. Acontece que perante a decisão do Constitucional e do STA, a Direção­Geral do Ensino Superior (DGES) não perdeu tempo e começou a notificar os alunos, numa carta em que decidia o seu futuro. Foi o pretexto para Jorge Braga contra­atacar: “eles aplicaram um ato administrativo an-tes do tempo, antes do trânsito em julgado das decisões, portanto violaram uma decisão judicial. Eu recorri e suspendi a decisão dos tribunais”, relatou.

“O TC claramente excluiu da decisão os alunos que já haviam terminado o ensino recorrente, portanto esses alunos que eram detentores de um certificado de habi-litações académicas podiam, deviam e teriam sempre que se candidatar”.

Jorge Braga, advogado

O advogado apresentou providências cautelares individuais, uma por cada um dos 11 alunos, às quais ficou acoplada uma ação principal. Só a providência de Pedro não foi ganha. O Ministério voltou a recorrer e Jorge recorreu da decisão da providência do Pedro para o Supremo Tribunal Administrativo que, por sua vez, se recusou a revisitar o processo, obrigando o advogado a recorrer para o Pleno da Secção. Em resposta ao Observador, o Ministério esclareceu que “está obriga-do a executar todas as sentenças judiciais proferidas no âmbito de processos em que é parte, independentemente de o conteúdo da sentença (acórdão) lhe ser favorável”. Assim, “foram retificadas as classificações de ensino secundário dos autores das ações que foram candidatos ao concurso nacional de acesso e ingresso no ensino superior público para matrícula e inscrição no ano letivo 2012­2013. E daí resultaram diferentes resoluções: aqueles que perderam a certificação de conclusão do secundário (por não terem feito exames nacionais) foram “excluídos”; os que, após retificação das notas (tendo em conta as do ensino regular que tinham frequentado anteriormente), não conseguiram média para entrar em nenhuma das hipóteses apresentadas em 2012/13 perderam colocação; outros foram notificados para mudar de instituição de ensino. Sem adiantar números, o Ministério da Educação revela que “muitos dos alunos que moveram as mencionadas ações não chegaram a candidatar-se ao concurso nacional de acesso de 2012 e “dos que concorreram, uma parte significativa ou manteve a colocação ou foi colocada noutro par instituição/curso”. “Houve também alunos não colocados, nomeadamente por terem limitado as opções de candidatura, e só os alunos que não reuniam as condições de acesso ao ensino superior, por não terem realizado os exames finais nacionais, é que ficaram na situação de excluído, sendo este número residual”, concluiu.

Pedro já só pede para concluir este ano letivo

Desde que recebeu a carta da DGES que Pedro e a sua família têm vivido num “sobressalto”. E Pedro não é caso único. Há mais estudantes a viver idêntico dilema. Só Jorge Braga representa 11. E nem todos estão em me­dicina. Há alunos de engenharias, pilotagem e outros cursos. Pedro, com boa média e apenas uma cadeira em atraso do primeiro ano, que vai fazer agora no segundo semestre, já só pede tempo para “acabar este ano letivo”. Concluindo o terceiro ano obtém o grau de licenciado o que lhe “daria oportunidade de concorrer a outras faculdades de medicina como licenciado”, explica. Se a decisão judicial chegar antes do final do ano letivo e tiver de sair da universidade, “apenas me garantem as cadeiras que fiz” e “terei de repetir

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exames de ingresso para voltar a aceder ao ensino superior”. “Fico com a nota interna do regular (186 valores) e teria de ficar um ano em casa para me preparar para os exames”, detalha. Mas o advogado Jorge Braga lembra que mesmo que Pedro tente concorrer a outra faculdade de medicina como licenciado, “vai sempre estar dependente do número de vagas para transferências, que costuma ser inferior a 10% do total das vagas da instituição”.

Neste momento, Jorge Braga só quer que as providências sejam todas decretadas. Quanto à ação principal? “Acho que temos uma boa probabilidade de ganhar a ação porque o ato do Ministério, de expulsar os alunos, é nula”. E se os alunos entretanto já tiverem sido expulsos e vier a ser-lhes dada razão mais à frente, na ação principal? “Os alunos podem exi-gir uma indemnização ao Estado, correspondente ao valor do salário que iriam auferir até ao fim da sua vida profissional”, exemplificou. “Se eles perderem a ação principal perdem uma habilitação literária pois terão de fazer os exames nacionais pelo recorrente ou então terão de aceitar ficar com a média mais baixa que já tinham obtido no regular”. Além disso terão de fazer os exames de ingresso no ensino superior e voltar a candidatar­se, podendo pedir equivalência das cadeiras já feitas. “Tento não pensar muito no assunto”, afirma Pedro, que, apesar de tudo, não deixa de reconhecer que o ensino recorrente, como estava montado, era “injusto”. E embora a situação em que se encontra atualmente não seja a ideal, Pedro espera que se prolongue. “Pelo menos devia demorar até se­tembro ou até às eleições para ver se nos deixam terminar o curso”, remata, com um sorriso nervoso.

“Acho que temos uma boa probabilidade de ganhar a ação principal porque o ato do Ministério, de expulsar os alunos, é nula. Se assim for e se os alunos já tive-rem abandonado os estudos, poderão vir a pedir uma indemnização ao Estado”.

Jorge Braga, advogado

‘Leviatã’ a longa tragédia da sociedade russa

CINEMA

Mais do que um mero libelo “anti-Putin”, o filme “Leviatã”, de Andrei Zyvagintsev,

é uma história feia e bruta sobre os atavismos políticos, culturais e sociais da Rússia,

da corrupção ao fatalismo.

Os media, com a televisão à cabeça, têm o mau hábito de reduzir uma obra de arte a um estereótipo, simplificando­a numa frase ou numa etiqueta para consumo colectivo e retirando­lhe assim a riqueza, os significados e a complexidade. A mais recente vítima desta tendência é “Leviatã”, a quarta longa­metragem do cineasta russo Andrei Zyvagintsev, que chega hoje a Portugal rotulado como “o filme anti­Putin”. Nada mais confrangedor e reducionista do que limitar a um libelo contra o actual ocupante do Kremlin o que é na realidade um filme sobre os trágicos atavismos culturais, políticos e sociais da Rússia – a corrupção de alto a baixo e do centro às periferias, a tirania tentacular do Estado, a promiscuidade da Igreja Ortodoxa com o poder, os vasos comunicantes deste com o mundo do crime, o peso da burocracia e a força dos tiranetes locais, a impotência do cidadão comum perante a arbitrariedade pública, o embrutecimento da sociedade pela bebida, o fatalismo da sociedade civil –, que Zyvagintsev ilustra através de história sobre a eterna impotência do cidadão russo pe­rante a arbitrariedade estatal, perante o peso e a força de um monstro. Um leviatã que já se chamou czarismo e depois comunismo, e que se mantém com as roupagens de um novo regime, com novas caras e a mesma velha indiferença e prepotência para com as pessoas comuns. Putin é apenas mais um, aquele que controla o monstro nesta altura, como o realizador mostra na sequência em que o protagonista e a sua família e amigos

Autor Eurico de Barros

vão fazer um piquenique de aniversário na natureza, que consiste essencial­mente em beber vodka e fazer tiro ao alvo. Primeiro, a garrafas da bebida nacional, depois às fotografias dos homens que lideraram o país quando ainda se chamava União Soviética, e a seguir no pós­comunismo. O leviatã do sistema sobrevive aos seus líderes, e resta aos governados disparar contra os seus retratos, para cevar toda a raiva, revolta e impotência que os amarfanha por dentro Este filme de Andrei Zyvagintsev é, no entanto, mais explicitamente “contra” o regime do que a sua obra de estreia, o magnífico e enigma­ticamente alegórico “O Regresso”, que revelou o cineasta ao mundo vencendo o Festival de Veneza em 2003. Bem como a sua realização anterior, “Elena” (2011), que, pela subtileza na descrição das desigual­dades e injustiças da actual sociedade russa, alguns poderão com toda a legitimidade preferir a este mais óbvio e demonstrativo “Leviatã” (são claros os paralelos feitos por Zyvagintsev

com a narrativa bíblica de Job, só que no final do filme, o seu herói, Kolia, em vez de ser recompensado pelo sofrimento que lhe foi infligido, é ainda mais implacavelmente martirizado). Ironicamente, o realizador foi ins­pirar­se num facto real ocorrido em 2004 nos EUA (revoltado contra a Câmara Municipal da cidade onde vivia na sequência de um contencioso sobre terrenos, um homem meteu­se num tanque, destruiu vários edifícios públicos e depois suicidou­se) para escrever, com Oleg Negin, “Leviatã”, que ganhou o Prémio de Melhor Argu­mento no Festival de Cannes, o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro e esteve candidato ao Óscar na mesma categoria Kolia (estupendo Aleksei Serebrya­kov), um mecânico, vive e trabalha numa casa com vista para o Mar de Barents, que pertence à sua família há várias gerações. O ma­fioso presidente da câmara local cobiça o terreno e procura expro­priar Kolia e a família manipulando a polícia e os tribunais e obrigando­o

QUI, 16 | 04 | 2015MUNDO

a aceitar uma indemnização ridícula, para, suspeita este, construir uma mansão luxuosa para si ou especular no mercado imobiliário com os seus capangas do meio da construção civil. Kolia recorre a um velho amigo e camarada da tropa, Dimitri, advogado em Moscovo. Este recorre aos seus conhecimentos na capital, compila um dossier com todos os podres do autarca, e confronta­o com ele. Só que nem este se deixa intimidar, como também Dimitri se envolve de forma imprudente com a mulher de Kolia. E tudo o que pode acontecer de mau, acontece. A Rússia que Andrei Zyvagintsev aqui filma é uma terra de homens e mulheres corruptos, desesperados, comprados ou resignados, onde a revolta é um gesto inútil que a máquina da burocracia, o peso do dinheiro ou a violência dos podero­sos se encarregam de neutralizar, e onde toda a gente bebe vodka até ao entorpecimento. Mais do que um filme pessimista, “Leviatã” é um filme fatalista. E é

um fatalismo pesado, ancestral, en­raizado, profundamente russo, sem solução nem redenção, muito embora o realizador tenha dito que queria que “Leviatã” fosse também enten­dido como “uma parábola universal” sobre a batalha do indivíduo contra a omnipotência do Estado. Só que na Rússia essa batalha continua, século atrás de século, regime após regime, a ser trágica e repetidamente inglória.

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Autor Tiago Pais

Já não é a primeira vez que Pierre Gonnord, fotógrafo francês com residência em Madrid, se dedica a fotografar comunidades marginalizadas de forma quase pictórica, a fazer lembrar retratos em tela do século XVII ou XVIII. Fê­lo em vilas isoladas de França e Espanha, na América do Sul, com membros da yakuza, no Japão, com jovens sem­abrigo, cegos, agricultores ou mineiros um pouco por toda a Europa. Para este trabalho, contudo, Gonnard veio até território nacional. Inserido numa residência no âmbito da Trienal no Alentejo, com quem colabora em vários projetos, o artista explorou a fronteira raiana junto a Portalegre e encontrou nos ciganos nómadas do Alentejo as personagens perfeitas para The Dream Goes Over Time (originalmente intitulado Au­Delà du Tage). Mais uma vez, e à imagem do seu trabalho anterior, Gonnard assina uma coleção de retratos íntimos com um estilo pictórico muito acentuado, não só dos membros da comunidade da região mas também dos respetivos ani­mais. O fotógrafo deparou­se com a família, pela primeira vez, quando estes se deslocavam a bordo de uma carroça a caminho do seu acampamento. Viajou e conviveu com eles durante semanas até ganhar confiança e afeto suficientes para os poder fotografar, sendo que muitos deles nunca sequer tinham visto uma câmara até aí. Depois de já ter sido mostrado em 2013, em Évora, no âmbito da Trienal e em 2014 no Centro Andaluz de Fotografia, o trabalho atravessa o Atlântico e chega agora a Nova Iorque: está patente na galeria Hasted Kraeutler até 25 de abril.

FOTOGRAFIA

Risotto de bacalhau

Quando tinha aí uns três ou quatro anos, o meu filho mais velho chama­va arroz maroto ao arroz malandro. Sempre que penso em risotto, lembro­me desta associação patusca, não só pela rima mas também porque o risotto pode revelar­se bem maroto na hora de o cozinhar. Não é à toa que no Masterchef Austrália o risotto é considerado o “prato da morte”: fazer e apresentar um risotto irreprovável, cremoso, nem demasiado ensopado nem demasiado seco ou demasiado cozinhado, é um dos desafios que mais faz tremer os concorrentes. Felizmente, a nossa cozinha não é o estúdio do Masterchef. Nela podemos cozinhar sem cronómetro. Podemos ter amigos ao pé e um copo de vinho na mão. O risotto é o prato ideal para conviver enquanto se cozinha: os

braços vão­se revezando e temos a certeza de que estamos todos quando ficar no ponto. E se por algum motivo não sair perfeito, não há críticas do Matt Preston, nem desafio de elimi­nação. Há é uma nova desculpa para nos juntarmos outra vez.

Teresa Rebelo é autora do blogue Lume Brando.

Autora Teresa Rebelo

No Masterchef Austrália chamam ao risotto “o prato da morte”, mas Teresa Rebelo,

do blogue Lume Brando, ajuda-o a sair vivo do desafio.

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Para quatro pessoas

2 lombos de bacalhau8 fatias de bacon320 g de arroz para risotto1 cenoura2 cebolas5 dentes de alho1 folha de louro1 talo de alho francês1 ramo de salsa1 copo de vinho branco120 g de queijo da Ilha raladoAzeite qbSal qbPimenta preta qb

Num grelhador ou frigideira anti­aderente, cozinhe 4 fatias de bacon até esta­rem bem tostadas e crocantes. Retire­as e reserve­as sobre papel de cozinha.Leve ao lume uma panela com água onde colocou os lombos de bacalhau, a cenoura descascada e partida às rodelas, o alho francês lavado e partido em pedaços, dois dentes de alho esmagados, uma cebola descascada partida ao meio, a folha de louro, metade do ramo de salsa e um fio de azeite. Deixe ferver e cozinhar até o bacalhau começar a lascar, o que deve ser muito rápido, uns 5 minutos desde que começa a ferver. Retire o bacalhau para um prato e deixe arrefecer até conseguir lascá­lo. Reserve. Coe a água onde cozeu o bacalhau, que deve perfazer cerca de 1,3 litros. Prove este caldo, retifique de sal se for necessário e mantenha­o quente. Entretanto leve a refogar num fundo de azeite a outra cebola e três dentes de alho, tudo picado, e ainda as restantes fatias de bacon partidas em pe­quenos pedaços. Deixe alourar e junte o arroz para risotto. Deixe fritar um pouco, mexendo sempre. Adicione o vinho branco e mexa até evaporar. A partir daqui vá juntando aos poucos o caldo onde cozeu o bacalhau, mexendo sempre e juntando mais caldo sempre que já tiver evaporado. Deve demorar cerca de 25 minutos, em lume médio, até o grão do arroz ficar cozinhado al dente e pode ser que não precise de usar todo o caldo. Quase no final da cozedura, junte as lascas de bacalhau, a restante salsa picada e metade do queijo ralado. Retifique o sal se necessário, e tempere com pimenta preta acabada de moer. Envolva bem e retire do lume. Sirva com mais queijo da Ilha ralado e o bacon tostado partido em pedacinhos.

Imagens raras de Marilyn Monroe vão a leilão

Imagens raras de Marilyn Monroe vão a leilão

Autora Ana Cristina Marques

Bert Stern, que faleceu em 2013, não foi o primeiro homem a fotografar Marilyn Monroe, mas foi um dos últimos. Foi em junho de 1962 que o fotó­grafo e a atriz norte­americanos se encontraram e se fecharam num quarto de hotel, em Los Angeles, durante três dias. O objetivo? Registar aquelas que seriam as últimas fotografias profissionais da estrela que nasceu Norma Jeane Baker — as imagens ficaram conhecidas, muito a propósito, como “A Última Sessão”. Pouco tempo depois, Marilyn aparecia morta. Recordada a lição de história/cultura, a notícia: um conjunto de impressões, incluindo das referidas fotografias, vai ser leiloado no próximo dia 10 de março no Estado norte­americano do Texas, na Heritage Auctions Texas. Espera­se angariar, no total, cerca de 70 mil euros. Nas imagens de “A Última Sessão” – que fizeram uma pequena excursão a Portugal em 2011, numa exposição temporária a ocupar a Fundação D. Luís I, em Cascais — é possível encontrar uma Marilyn sedutora, à se­melhança do que sempre foi, mas também real. Rugas de expressão que a idade fez por vincar, poros da pele em evidência e até a cicatriz de uma operação à vesícula fazem parte de um registo artístico invulgar permitido pela estrela de Hollywood. Há fotografias marcadas a caneta vermelha, marcas dos negativos que a própria atriz rejeitou com um xis, na altura. Mas há também cópias de fotografias raras tiradas um mês depois de Stern, escreve o jornal britânico Telegraph. O fotografo de serviço foi, desta vez, o amigo próximo da atriz, George Barris, homem que Marilyn conheceu quando estava a trabalhar no filme de 1955, O Pecado Mora ao Lado. Neste caso, a loira posa sobre a areia de uma praia californiana e mostra um lado mais brincalhão — entre outras fotografias a preto e branco registadas no interior de uma casa. As fotos de Barris destinavam­se a um livro sobre a estrela de 36 anos que ficou em suspenso depois da sua trágica morte.

“Plano Juncker” – 315 mil milhões em 3 anos. Para quê?

por Vasco Gandra

Desde que a crise económica e finan­ceira atingiu a Europa que os níveis de investimento caíram, e em alguns Estados­membros desceram mesmo de forma drástica.Assim, no segundo semestre do ano passado o investimento na UE foi 15% inferior ao de 2007, antes do início da crise. Ou seja, comparativamente ao pico registado naquele ano, os investimentos diminuíram 430 mil milhões de euros, segundo a Comis­são Europeia (CE) e o Banco Europeu de Investimento (BEI). Portugal (­36%) está no grupo de países onde a queda de investimento foi mais acentuada nos últimos anos juntamente com Itália (­25%), Espanha (38%), Irlanda (­39%), Grécia (­64%).A crise produziu uma queda de inves­timento que, consequentemente, está a atrasar a recuperação económica na União Europeia, retoma essa que é ainda mais débil na zona euro. Por exemplo, para acompanhar o ritmo de investimento nos Estados Unidos, a UE deveria ter investido mais 540 mil milhões de euros, de acordo com as estimativas do executivo comunitário e do BEI.A principal razão avançada para ex­plicar a debilidade persistente dos

1. Um Plano de Investimento para a UE. Porquê?

2. Quais os objetivos?

3. De onde vem o dinheiro?

4. Como funciona?

5. Que projetos serão escolhidos?

6. Quem selecciona os projetos?

7. Há o risco de os contribuintes europeus perderem dinheiro?

8. Quais os países que já contri-buíram?

9. Portugal vai beneficiar do Plano de Investimento da UE?

Um Plano de Investimento para a UE. Porquê? Pergunta 1 de 9

níveis de investimento está no baixo nível de confiança dos investidores que, fatalmente, resulta na incapaci­dade de assunção de riscos. Trata­se portanto de quebrar o ciclo vicioso de falta de confiança e subinvestimento. Para voltar a colocar a UE na senda do crescimento e da criação de em­prego, o atual executivo comunitário propôs no início do mandato, em novembro, um Plano de Investimento de 315 mil milhões de euros, também conhecido por “Plano Juncker”. “A minha primeira prioridade como pre­sidente da Comissão será reforçar a competitividade da Europa e estimular o investimento para a criação de emprego”, afirmou o presidente Jean­Claude Juncker ao apresentar as suas orientações políticas no Parlamento Europeu, em julho do ano passado.

O Plano de Investimento assenta em três eixos: mobilizar financiamento, melhorar o ambiente para o inves­timento e fazer com que esse di­nheiro chegue à economia real com o objetivo principal de estimular o crescimento económico e a criação de emprego na UE.Trata­se de mobilizar energias, inverter a queda de investimento, correspon­der às necessidades da economia eu­ropeia, de promover a competitividade em setores estratégicos da UE, de reforçar o capital humano, a capaci­dade produtiva, as infraestruturas e

Quais os objetivos? Pergunta 2 de 9

as interconexões (energéticas) vitais para o mercado único comunitário. Segundo as previsões do executivo comunitário, o Plano de Investimento tem potencial para acrescentar entre 330 mil milhões a 410 mil milhões de euros ao PIB da União Europeia, e criar de 1 a 1,3 milhões de novos postos de trabalho até 2017.

1. Um Plano de Investimento para a UE. Porquê?

2. Quais os objetivos?

3. De onde vem o dinheiro?

4. Como funciona?

5. Que projetos serão escolhidos?

6. Quem selecciona os projetos?

7. Há o risco de os contribuintes europeus perderem dinheiro?

8. Quais os países que já contri-buíram?

9. Portugal vai beneficiar do Plano de Investimento da UE?

O “Plano Juncker” pretende mobilizar pelo menos 315 mil milhões de euros durante os próximos 3 anos. Uma mo­bilização de fontes de financiamento público e privado, em que cada euro será utilizado para gerar investimento privado suplementar e, ponto impor­tante, sem aumentar a dívida.O objetivo é colocar a circular o di­nheiro que está parado nas contas bancárias das empresas e cidadãos e canalizá­lo para investimentos pro­dutivos. A base de todo o Plano é o novo Fundo Europeu para Investi­mentos Estratégicos (FEIE), criado em conjunto com o Banco Europeu de Investimento, com o objetivo de apoiar investimentos de longo prazo e facilitar o acesso das PME e em­presas de média capitalização ao financiamento de risco.O FEIE funcionará como uma garantia que tem por base 16 mil milhões de euros do orçamento da UE, aos

De onde vem o dinheiro? Pergunta 3 de 9

quais se juntam 5 mil milhões de euros do BEI. No total, 21 mil milhões que servem como amortecedor de riscos, de garantia que absorverá o risco mais elevado em investimentos estratégicos.A Comissão e o BEI acreditam que o Fundo terá um efeito multiplicador até 15 vezes (daí o total de 315 mil milhões). Ou seja, cada euro mobili­zado através do Fundo vai trazer 15 euros de investimento total. As duas instituições consideram que este in­vestimento também será potenciado pelo efeito de alavanca dos fundos estruturais.Os vinte e oito Estados­membros foram convidados a contribuir para o Fundo, diretamente ou através dos bancos de fomentos nacionais, bem como os investidores privados. O FEIE deverá ser aprovado pelo Conselho e pelo Parlamento Europeu para estar operacional em junho.

O Fundo Europeu de Investimentos Estratégicos (FEIE) deverá ter gestão e sede no Banco Europeu de Investi­mento. É cofinanciado pelo BEI (5 mil milhões de euros) e pelo orçamento da UE (16 mil milhões).O FEIE é um amortecedor de riscos, como uma garantia, serve de proteção parcial contra riscos, de proteção contra riscos iniciais. O objetivo é conseguir atrair projetos de risco mais elevado mas de alto valor es­tratégico para a União Europeia, e que de outra forma não encontrariam financiamento. Com esta assunção de riscos em relação a projetos decisivos e complexos, a UE vai mais longe do que os atuais programas comunitários e do BEI.Esta “rede” contra riscos permitirá ao BEI oferecer produtos que cobrem mais riscos do que os seus produtos habituais. Assim, deverá ser possível investir em projetos de elevado valor

Como funciona? Pergunta 4 de 9

acrescentado mas que por compor­tarem mais riscos não conseguem financiamento.O executivo comunitário estima que o Fundo (21 mil milhões) terá um efeito multiplicador até 15 vezes (daí o valor de 315 mil milhões). O efeito multiplicador é o quociente entre o volume financeiro total dos projetos gerados em resultado da intervenção do Fundo e o capital público inicial mobilizado para lançar o Fundo. A lógica subjacente ao efeito multipli­cador do FEIE é que uma pequena proporção de capital público utilizada como capacidade de assunção de riscos permitirá atingir uma quota muito maior de capital privado para investir nos projetos.O FEIE vai financiar projetos estra­tégicos e de longo prazo em toda a UE e uma parte servirá para apoiar investimentos das PME e das empre­sas de média capitalização.

1. Um Plano de Investimento para a UE. Porquê?

2. Quais os objetivos?

3. De onde vem o dinheiro?

4. Como funciona?

5. Que projetos serão escolhidos?

6. Quem selecciona os projetos?

7. Há o risco de os contribuintes europeus perderem dinheiro?

8. Quais os países que já contri-buíram?

9. Portugal vai beneficiar do Plano de Investimento da UE?

“Estes investimentos suplementares devem centrar­se nas infraestruturas, nomeadamente nas redes de banda larga e redes de energia, bem como nas infraestruturas de transporte em centros industriais; na educação, in­vestigação e inovação; nas energias renováveis e na eficiência energética. É conveniente afetar recursos signifi­cativos a projetos suscetíveis de ajudar os jovens a voltarem a encontrar em­pregos”, anunciou Jean­Claude Juncker no Parlamento Europeu, em julho.Assim, a Comissão Europeia propôs que o novo Fundo apoie os inves­timentos nas infraestruturas estra­tégicas (investimentos no digital e em energia, em consonância com as políticas da União), nas infraestruturas de transportes em centros industriais, educação, investigação e inovação, os investimentos criadores de emprego, designadamente através do financia­mento de PME e de medidas a favor do emprego dos jovens e nos projetos sustentáveis e “amigos” do ambiente.Para ser selecionado cada projeto deve obedecer a vários critérios: ter

Que projetos serão escolhidos? Pergunta 5 de 9

valor acrescentado europeu (e apoiar os objetivos da UE), ser viável e repre­sentar valor económico, e ter início, o mais tardar, nos próximos três anos, ou seja, que represente uma expec­tativa razoável de investimento no período de 2015­17.Vai ser constituída uma reserva de projetos europeia. Esta lista dinâmica e atualizada facultará informações aos investidores sobre os projetos disponíveis existentes e os futuros. Os investidores podem assim tomar decisões com base em informação fiável e transparente.Uma task force conjunta entre a Co­missão e os BEI já identificou cerca de 2000 projetos potenciais apresen­tados pelos Estados­membros, num montante de 1,3 biliões de euros. Em Portugal, por exemplo, o aumento das interconexões elétricas com Espanha (e França) é um dos projetos que encaixa nos critérios de seleção.O facto de um projeto ser inscrito na reserva não significa necessariamente que vai ser financiado pelo Fundo.

O FEIE será “governado” por dois órgãos. O Conselho de Direção (CD) determina a orientação geral e em matéria de investimento, o perfil de risco, as políticas estratégicas e a repartição dos ativos do Fundo, em conformidade com as orientações políticas da CE.O Comité de Investimento é respon­sável perante o CD, examinará os projetos específicos e selecionará aqueles que vão beneficiar de apoio (não haverá quotas geográficas ou setoriais). Este órgão é composto por um grupo de peritos independentes e um diretor executivo que assumirá a gestão corrente do Fundo.

Quem selecciona os projetos? Pergunta 6 de 9

Por outro lado, será aberto uma es ­ pécie de balcão único à escala da UE, uma plataforma europeia de acon­selhamento ao investimento para assessorar, identificar e elaborar pro­jetos, e facultar assistência técnica para os tornar mais atrativos para os investidores.

1. Um Plano de Investimento para a UE. Porquê?

2. Quais os objetivos?

3. De onde vem o dinheiro?

4. Como funciona?

5. Que projetos serão escolhidos?

6. Quem selecciona os projetos?

7. Há o risco de os contribuintes europeus perderem dinheiro?

8. Quais os países que já contri-buíram?

9. Portugal vai beneficiar do Plano de Investimento da UE?

Segundo a Comissão e o BEI, a ga­rantia do orçamento da UE permite ao BEI oferecer produtos com maior valor acrescentado, mas também intrinsecamente com maior risco. Mas os riscos deverão ser atenuados por uma gestão que beneficia da expe­riência e das competências do BEI.Por outro lado, o comité de investimen­to que junta peritos independentes vai supervisionar as atividades do FEIE. Haverá uma remuneração adequada do risco, que será mantida no Fundo para compensar perdas e é criada um Fundo de Garantia da UE que assegurará uma reserva de liquidez para o orçamento da União em relação

a eventuais perdas incorridas pelo FEIE no quadro do apoio prestado aos projetos.É também garantida uma monitori­zação profissional do risco e a pos­sibilidade de reajustar as orientações relativas aos riscos na eventualidade de uma evolução adversa no início da carteira.

Os vinte e oito Estados­membros da EU foram convi dados a contribuir para o Fundo, diretamente ou através dos bancos de fomento nacionais ou de organismos públicos que sejam propriedade dos Estados­membros ou por eles controlados.Até agora só a Alemanha (8 mil mi­lhões de euros), Espanha (1,5 mil milhões), França (8 mil milhões) e Itália (8 mil milhões) anunciaram con­tribuições para o Fundo.Estas contribuições nacionais não são tidas em conta para o cálculo do défice. Numa comunicação relativa ao recurso à flexibilidade prevista pelas

Quais os países que já contribuíram? Pergunta 8 de 9

regras atuais do Pacto de Estabilidade e de Crescimento, o executivo co­munitário traçou em Janeiro as suas orientações sobre esta matéria. Por forma a estimular os Estados­mem­bros a abrirem os cordões à bolsa, as contribuições nacionais para o FEIE não são tidas em consideração no quadro da avaliação do ajustamento orçamental.

Quais os países que já contribuíram? Pergunta 8 de 9

1. Um Plano de Investimento para a UE. Porquê?

2. Quais os objetivos?

3. De onde vem o dinheiro?

4. Como funciona?

5. Que projetos serão escolhidos?

6. Quem selecciona os projetos?

7. Há o risco de os contribuintes europeus perderem dinheiro?

8. Quais os países que já contri-buíram?

9. Portugal vai beneficiar do Plano de Investimento da UE?

Portugal vai beneficiar do Plano de Investimento da UE?

Pergunta 9 de 9

Os vinte e oito Estados­membros da UE apresentaram cerca de 2000 potenciais projetos, num total de 1,3 biliões de euros. Destes, mais de 500 mil milhões de euros em projetos que podem ser realizados nos próximos 3 anos, segundo dados da Comissão e o BEI.Mas o facto de os projetos se en­contrarem nesta lista preliminar não significa que vão ser financiados pelo

“Plano Juncker“. Apenas uma parte será escolhida. A constituição daquela lista é um primeiro passo. O objetivo é criar uma reserva de projetos trans­parente e viável que restabeleça a confiança dos investidores e permita desbloquear o financiamento do setor privado.Portugal apresentou até agora 113 projetos que atingem um valor glo­bal de 31,8 mil milhões de euros, dos quais 16,1 mil milhões euros no período 2015­2017. As áreas dos transportes e da energia são as que mais projetos incluem. De acordo com fontes do executivo português, a atual distribuição dos projetos nacionais candidatos ao Plano de Investimento é a seguinte: transportes 31%, energia 30%, infraestrutura social 24%, recur­

sos e ambiente 9%, e conhecimento, inovação e economia digital 6%.Alguns dos projetos mais emblemá­ticos na área dos transportes e da energia apostam no reforço das liga­ções entre Portugal e Espanha. Assim, por exemplo, a construção de uma ligação ferroviária para transporte de mercadorias entre os portos de Lisboa e Sines e Madrid, o reforço da linha ferroviária entre Portugal e Vigo, ou novas ligações rodoviárias entre os dois países. Na área da energia, vários projetos inserem­se no espírito da futura União Energética que pretende atingir 10% nas interconexões entre os Estados­membros. Estas interli­gações deverão permitir a Portugal e Espanha exportar energia elétrica para o resto do espaço comunitário.A escolha dos projetos enviados pelos Estados­membros não obedece a quotas geográficas nem setoriais. Certo é que nem todos os proje­tos que Portugal e restantes países apresentaram serão escolhidos. As propostas nacionais devem passar pelo crivo de um comité de peritos independentes e obedecer a uma série de critérios.

Há qualquer coisa de obsessivo na ideia de crescimento económico em Portugal como no resto do mundo. Lê­se e ouve­se por todo o lado, sobretudo no terreno dos «slogans» políticos para uso imediato,

e até se percebe porquê em contexto de crise. Contudo, a verdade é que se trata, em especial na União Europeia, de um objectivo ultrapassado pela realidade, contraditório com outros importantes desideratos colectivos e contrariado por características sociais tão determinantes como o enve­lhecimento populacional. Com efeito, as sociedades maduras são demasiado complexas para obedecer automaticamente ao estímulo económico decretado pelo Estado, daí que o recente «quantitative easing» do BCE esteja condenado a esgotar os seus efeitos rapidamente. Em sociedades como as integradas na UE, em particular no euro­grupo, há sempre forças a operar em simultâneo a favor e contra o crescimento económico, sendo o resultado final tudo menos automático. Vejamos. Numa recente lista do FMI – uma instituição especializada em oferecer receitas milagrosas para o crescimento económico ­, eram apon­tados os países com menor crescimento desde 1999 até ao esperado em 2019. Ora, oito dos nove países mais relevantes dessa lista pertencem à UE (sete dos quais ao euro) e o outro é o Japão. Todos estes países, onde a Itália, o Japão e Portugal são os três com menor crescimento ao longo daquelas duas décadas (menos de 1% ao ano e os outros cinco países entre 1% e 1,5%), todos eles se caracterizam – uns mais, outros menos – por possuírem rendimentos per capita acima e, na maioria dos casos, muito acima da média mundial. Não se trata, portanto, de pobreza; comparativamente, são países ricos ou, pelo menos, remediados como Portugal. Em suma, estamos a falar de sociedades que, tendo atingido um determinado patamar de prosperidade superior a 20.000 dólares por habitante, encontram dificuldades estruturais para crescer economicamente (na China são $7.000 e na Índia $1.500). As razões variam e certos países, como Portugal e a Grécia tipicamente, co­meçaram a deixar de crescer mais cedo do que outros, como (por ordem da lista em questão) a Dinamarca, a Alemanha, a França, a Bélgica, a Holanda e até a Croácia (que ainda não entrou para o euro), todos abaixo de 1,5%. Independentemente das diferenças de riqueza e de cultura, há contudo

O crescimento na União Europeia é um objectivo

ultrapassado pela realidade, contraditório com outros

importantes desideratos colectivos e contrariado por

características sociais determinantes.

QUI, 16 | 04 | 2015OPINIÃO

CRESCIMENTO ECONÓMICO

A retórica do crescimento

Autor Manuel Villaverde Cabral

A retórica do crescimentosemelhanças decisivas entre os países de mais lento crescimento, incluindo o Japão. São três os traços comuns mais importantes: a demografia (elevada longevidade e baixa fecundidade); o consequente peso das reformas e das despesas de saúde, seja qual for o sistema de segurança social; e a melhor protecção ambiental do mundo (Portugal é, segundo o Eurostat, o 6º país da UE com maior peso das energias renováveis). É isto que se pretende trocar pelo crescimento do antigo «terceiro mundo»? Ou é por isto que a Europa tem os custos acrescidos e as dificuldades de crescimento que conhecemos?Para além desses três factores maciços, que não há partido político algum que os mude significativamente, em especial o demográfico, há ainda o fac­tor do mercado de trabalho. As comparações são mais complicadas mas é evidente que os mercados de trabalho europeus se ressentem, do ponto de vista do crescimento, dos corporativismos sindicais que os USA e o Reino Unido já desmantelaram em parte, enquanto o «terceiro mundo» nunca os chegou a ter. Além desses corporativismos, de que as empresas estatais de transportes como a TAP são o exemplo mais flagrante, os mercados de trabalho são condicionados, uma vez mais, pela demografia e pelo conflito entre as velhas e as novas gerações, que afectam a composição da população activa e daí as crescentes migrações internacionais. Se e quando a Europa minimizasse os efeitos destes 3 + 1 problemas estruturais – demografia, «estado social» e ambientalismo, mais o mercado do trabalho – poder­se­ia falar sem demagogia de crescimento e da criação de emprego. Mas nessa altura restaria o último factor anti­desenvolvimen­tista, a saber, a adesão subjectiva de grande parte da população europeia à austeridade, não no sentido meramente fiscal mas sim cultural do termo, e é isto que ainda não foi entendido pelos economistas da era keynesiana… Há pois fortes indícios de que não é a falta de crescimento que condiciona os valores sociais e políticos. São, sim, a demografia, a defesa do «estado social» e do ambiente, assim como o fosso inter­geracional, que condi­cionam as opções economicistas ultrapassadas dos partidos que apenas sabem angariar votos prometendo mais gastos e mais empregos públicos. Prometer o crescimento é uma frase feita mas, além de falsa, já não cor­responde àquilo que ambiciona porventura a maioria dos europeus, para quem não seriam necessários mais do que 2% de crescimento anual para 2% de inflação, segundo a fórmula mágica alemã. Em todo o caso, na minha opinião, o problema da sociedade portuguesa é muito menos uma questão de crescimento do que uma profunda questão de desigualdade interna; não é tanto um problema de competição externa como de redistribuição interna. Era disto que devíamos estar a falar para as próximas eleições.

P51QUI, 16 | 04 | 2015 OPINIÃO

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