obras em prosa, - s48c8fec8b879096c.jimcontent.com · fernando pessoa, obras em prosa, ... d....

23
Publiquei em Outubro passado, pus à venda, propositadamente em 1 de Dezembro, um livro de poemas, formando realmente um só poema, intitulado Mensagem. Foi esse livro premiado, em condições especiais e para mim muito honrosas, pelo Secretariado de Propaganda Nacional. Fernando Pessoa, Obras em Prosa,org. João Gaspar Simões.

Upload: trinhbao

Post on 02-Dec-2018

226 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Publiquei em Outubro passado, pus àvenda,

propositadamente em 1 de Dezembro, um livro

de poemas, form

ando realmente um sópoema,

intitulado Mensagem. Foiesse livro premiado, em

condições especiais e para mim muito honrosas,

pelo Secretariado de Propaganda Nacional.

Fernando Pessoa,Obras em Prosa,org. João Gaspar Simões.

•Aqueles portugueses do futuro, para quem porventura

estas páginas encerrem qualquer lição, ou contenham

qualquer esclarecimento, não devem esquecer que

elas foram escritas numa época da Pátria em que

havia minguado a estatura nacional dos homens e

falido a panaceia abstracta dos sistemas. A angústia e

a inquietação de quem as escreveu, porque as

escreveu quando não podia haver senão inquietação

e angústia, devem ser pesadas na mão esquerda,

quando se tome, na mão direita, o peso ao seu valor

científico.

•Serão, talvez e oxalá, habitantes de um período mais

feliz ... aqueles que lerem, aproveitando estas páginas

arrancadas, na mágoa de um presente infeliz, à

saudade im

ensa de um futuro melhor.

Fernando Pessoa. Da República, Ed. Anca, Lisboa. 1978, p. 105

•Na obra evidencia-se a presença do

simbolismo esotérico, tendo o próprio autor

afirmado que Mensagem estáabundantemente

embebida em simbolismo templário e

rosacruciano.

•Os símbolos herm

éticos da tradição esotérica

dos Templários e do simbolismo estão

presentes na féinabalável por um ideal (ex: «O

Mostrengo»); na crença de que o Homem

cumpre a vontade divina, buscando por isso a

paz e o amor (ex.: «O Infante»).

A cruz constantemente presente na simbologia dos Rosas-cruzes

Números -Simbolismo esotérico

•Atentemos na estrutura tripartida da obra que reenvia

de im

ediato para o esoterism

o, pois o número trêsé

um número simbólico que remete para o secretismo

esótérico. Note-se que a principal divisão da obra é

em três partes, bem como a de O Encoberto.

•As outras subdivisões da obra correspondem também

a números de simbolismo esotérico, os números 5, 7

e 12. A primeira parte da obra, Brasão, está

subdividida em 5 partes, e cada uma, por sua vez, se

divide em 2, 8, 5, 1 e 3 poemas. A segunda parte, Mar

Português, éform

ada por 12 poemas. Na terceira

parte, a cada uma das três subdivisões

correspondem, respectivamente, 5, 3 e 5 poemas.

•Esta estrutura decorre do simbolismo numerológico

da obra, podendo, portanto, concluir-se que em

Mensagem tudo foi concebido com um objectivo

preciso: comunicação codificada que urge decifrar.

Estrutura de um mito

•Assim, a estrutura da Mensagem, sendo a de um

mito, numa teoria cíclica, a das idades, transfigura e

repete a história de uma pátria como o mito de um

nascimento, vida e morte de um m

undo; morte que

será

seguida de um renascimento. Desenvolvendo-a

como uma idade completa, de sentido cósm

ico, e

dando-lhe a form

a simbólica tripartida -Brasão, Mar

Português, O Encoberto -que se poderá

traduzir

como: os fundadores, ou o nascimento; a realização,

ou a vida; o fim das energias latentes, ou a morte:

essa que conterá

em si, como gérm

en, a próxima

ressurreição, o novo ciclo que se anuncia -o Quinto

Império. Assim, a terceira parte é

toda ela um fim,

uma desintegração; mas também toda ela cheia de

avisos, prenhe de pressentim

entos, de forças latentes

prestes a virem à

Luz: depois da Noite, e Torm

enta,

vem a Calma e a Antemanhã; estes são os Tempos.

Dalila L. Pereira da Costa, O Esoterism

o de Fernando Pessoa, Lello

e Irm

ãos Editores

Primeira Parte -Brasão

Beliumsinebelo

•A primeira parte, Brasão, revela, de modo

singular, a edificação da Pátria portuguesa,

através de figuras emblemáticas da História de

Portugal, os heróis bravos e magníficos, as

mulheres excepcionais que os conceberam,

todos agindo por vontade divina.

•A galeria dos heróis, que Deus sagrou «em honra e

em desgraça»para a nostalgia e demanda do Infinito

(«0 mar sem fim é

português», estánaMensagem em

função do futuro que nebulosamente prenunciam.

Depois dos medalhões do «Mar Português»

vêm os

símbolos e avisos do Encoberto. 0 passado, na lógica

misteriosa das nações, inclui o porvir. Os pinhais de

D. Dinis, ao serem agitados pelo vento, sussurram

como «um trigo de Império», prefiguram o marulho

das ondas que as naus profundas hão-de sulcar. 0

plano transcendente vai-se

realizando, tem de ser. A

predestinação nacional lê-se nas trovas do Bandarra.

Por isso o poeta sabe com íntim

a certeza que

Portugal vai cumprir-se.

JACINTO DO PRADO COELHO, Diversidade e Unidade em Fernando Pessoa, 7ªed., Editorial V

erbo

O poema Ulisses

A im

portância do mito

1. Divida, justificando, o poema em partes.

2. Atente na primeira estrofe.

2.1. Destaque a perífrase aípresente.

2.2. A que mitos se faz referência nessa estrofe?

2.3. Que valor simbólico têm esses mitos?

3. Indique a que momento singular alude o poema.

(Atente no sentido dos deícticos «este»e «aqui»da

2ªestrofe.)

4. Explique o sentido da segunda estrofe.

5. Atente na terceira estrofe.

5.1. Que efeito tem o mito ou lenda sobre a realidade?

5.2. Entendendo como sendo Portugal a vida que morre,

que se conclui?

6. Interprete, agora, o primeiro verso do poema.

1. O poema integra três partes distintas, correspondentes a cadauma das

estrofes:

1ªparte: introdução -o mito e o seu poder redentor;

2ªparte: desenvolvimento do tema do mito de Ulisses;

3ªparte: conclusão -efeito do mito sobre a realidade; retoma do poder

redentor do mito, jásugerido na introdução.

2.1. «O corpo morto de Deus, / Vivo e des-nudo.»Perífrase de Cristo

crucificado.

2.2. Ao mito do Sol e ao mito da crucificação de Cristo. [Note-se a heresia: a

Paixão de Cristo éapresentada como um mito e não como um facto

histórico.]

2.3. O Sol renasce todos os dias; o Cristo crucificado ressuscita. Assim, um

e outro são mitos ligados ao poder de redenção, de renascimento.

3. Alude-se àcriação lendária de Lisboa, a Olissipo(«aqui»), fundada por

Ulisses («Este»).

4. Mais do que o facto histórico concreto éa im

aginação e o sonho que

libertam energia criativa. Um povo define-se melhor pelos seus mitos do

que pela sua História.

5.1. O mito passa a fazer parte do ser colectivo (cf. v. 11), transform

ando a

realidade, por força da sua energia criativa (cf. v. 12), dando um sentido à

nossa existência.

5.2. O Portugal que morre éo do presente decadente, éo que precisa de

renascer, éo que precisa da redenção que a vivência criativa do mito

faculta.

6.

CONCLUSÃO

•Ulisses éo primeiro herói a desfilar na obra M

ensagem.

•O poema inicia-se com um oxímoro

que nos remete para o

facto de o mito ser o nada, não existir, mas éuma enorm

e

força, ser tudo, porque éfecundante, éa base lendária de

explicações que entram na realidade.

•A primeira estrofe apresenta uma definição, pelo que as

form

as verbais estão no presente do indicativo.

•Na segunda estrofe, iniciada pelo deíctico este, referente ao

lendário Ulisses, que terá

aportado na cidade de Lisboa, os

verbos encontram-se predominantemente no pretérito perfeito

do indicativo.

•Na última estrofe, uma espécie de conclusão que reitera a

importância do mito, os verbos encontram-se novamente no

presente, porque «a lenda se escorre / A entrar na realidade».

•O poema é

constituído por três quintilhas, com versos rimados

(«ababa»), de sete e quatro silabasmétricas.