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UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE BELAS-ARTES
OBJETOS (IN)ÚTEIS
Metodologias de incorporação em museus
O espólio desportivo da extinta Associação Académica da
Amadora
Diana Salomé da Natividade Fragoso
Dissertação
Mestrado em Museologia e Museografia
Dissertação orientada pela Profª. Doutora Alice Nogueira Alves
e pelo Doutor Luís Raposo Pereira
2018
RESUMO
A análise do atual panorama museológico, nacional e internacional, resulta na identificação de
diversos problemas no que diz respeito à gestão dos seus acervos. Entre eles estão os recursos
financeiros e humanos limitados, as coleções abandonadas em reservas, uma necessidade de se
aumentarem ou reorganizarem os seus espaços e uma diminuição na aquisição de objetos
relevantes. Por esses motivos, nas últimas décadas tem-se discutido a necessidade de se refletir
sobre a forma como os museus colecionam, e como isso pode ser estruturado através do
desenvolvimento de políticas de incorporação.
Neste processo é necessária uma metodologia com base numa abordagem funcional do objeto
museológico, fazendo-se uma distinção entre o objeto útil, em que se observa um equilíbrio entre
os custos e os benefícios da sua preservação, e o objeto inútil, com maior probabilidade de ser
abandonado numa reserva ou desafetado da coleção.
Como caso de estudo, é aqui tratado o espólio desportivo da Associação Académica da Amadora,
adquirido em 2014 pela Câmara Municipal da Amadora, com o intuito de ser incorporado no
Museu Municipal de Arqueologia da Amadora. Partindo dos trabalhos desenvolvidos no âmbito da
inventariação desta coleção, desenvolvemos uma metodologia que permitiu conhecer as
características dos objetos que se pretendiam incorporar, assim como o seu impacto para a gestão
do museu nomeadamente: o espaço e número de suportes necessários ao seu acondicionamento;
uma identificação do estado de conservação dos objetos e das intervenções de conservação e
restauro mais urgentes; o tempo médio despendido em cada objeto, para futura referência.
Tendo em conta os dados extraídos desta caracterização e impacto do espólio, foram discutidos
alguns critérios de seleção, assim como identificadas as principais lacunas da coleção, permitindo ao
museu construir uma coleção mais coerente com a sua missão, em parceria com a comunidade
desportiva e os restantes amadorenses.
Palavras-Chave:
Política de incorporações; desporto; preservação; coleções; gestão.
ABSTRACT
When analysing the current museological landscape, both internal as well as internationally, a host
of issues were identified, in regards to the management of collections in institutions, as well as
limited financial and human resources, collections abandoned in storage facilities, a necessity to
increase or reorganize spaces and a generalised decrease in the acquisition of relevant objects. For
that reason, in the last decades, there have been many discussions about the necessity to reflect
upon the manner in which museums collect, through the development of accessioning policies.
This methodology is founded upon the principle of functional approach of the museum object,
creating a distinction between the useful object, in which one may observe an equilibrium between
the cost and benefits of its preservation, and the useless object, with a bigger probability of
obsolescence, being abandoned in storage or deaccessioned from a collection.
As a case study, we consider Associação Académica da Amadora (Amadora Academic
Association)'s sports collection, acquired in 2014 by the municipal hall, with the purpose of being
accessioned in the Museu Municipal de Arqueologia da Amadora. With a basis in work developed
in regards to cataloguing this collection, we have developed a methodology which allowed us to
know the characteristics of the objects that were intended for accessioning, as well as their impact
to the museum's management, namely: the space as well as the necessary shelves for its placement;
an identification of the state of conservation of the objects and the most urgent interventions of
conservation and restoration; the average amount of time expended for each object, for future
reference.
Finally, taking into account the data extracted from the profile and impact of the collections, some
selection criteria were debated, as well as a focus on identifying their main gaps, allowing the
museum to build a more coherent collection with its mission, in a partnership with the sports
community.
Keywords:
Accession policy; sport; preservation; collections; management.
Agradecimentos
Gostaria de agradecer aos meus orientadores, pelo acompanhamento e sugestões que me
deram ao longo deste trabalho. Agradeço especialmente à professora Alice pela
paciência, apoio e incentivo.
À Câmara Municipal da Amadora e à Gisela Encarnação do Museu Municipal de
Arqueologia, que permitiram o estudo do espólio. À Associação de Arqueologia e
Protecção do Património da Amadora (ARQA) pelo investimento na conservação desta
coleção. À Gabriela Xavier pelos periódicos relativos à Associação Académica da
Amadora. À Vanessa Dias, pelos testemunhos da aquisição do espólio, mas
especialmente, pela amizade.
Aos meus amigos, que pacientemente discutiram comigo acerca dos assuntos que
figuram nesta dissertação: Gabriela da Rocha e João Maia.
Ao Rúben, “por tudo”, seja lá o que isso for.
Ao António Simão, que me ajudou a ser um pouco menos neurótica.
À minha tia Teresa pelo abracinho.
Aos meus pais, pelo extremo altruísmo, investimento e confiança que depositaram em
mim, ao longo destes 25 anos.
Índice de figuras
Figura 1 – As três dimensões do valor de conhecimento, segundo Michalski (1994, p.
249) ................................................................................................................................... 9
Figura 2 - Símbolo da Associação Académica da Amadora. ......................................... 27
Figura 3 - Síntese esquemática da relação entre os campos da ficha de inventário. Os
elementos a azul constituem as adições posteriores à reflexão realizada neste trabalho.44
Figura 4 - Conjunto de doze medalhas, aparentemente redundantes. ............................ 50
Figura 5 - Taça identificada como a primeira adquirida pelo clube. .............................. 52
Figura 7 - Faixa de vencedor do Campeonato Nacional de Hóquei em Patins 1995/96. 55
Figura 8 - Anzol de pesca. .............................................................................................. 56
Figura 9 - Temporizador de xadrez. ............................................................................... 56
Figura 10 - Par de patins de Hóquei. .............................................................................. 56
Figura 11- Peluche associado à modalidade de ginástica. .............................................. 57
Figura 12 - Suporte de vela............................................................................................. 57
Figura 13 - Fotografia da bolha de anóxia. ..................................................................... 59
Créditos fotográficos
Todas as imagens pertencem ao Museu Municipal de Arqueologia, exceto as figuras 1,
2 e 3.
Lista de acrónimos e siglas
A.A.A. – Associação Académica da Amadora
ICCROM - Centro Internacional de Estudos para a Conservação e Restauro de Bens
Culturais
ICOM – International Council of Museums
ICOMOS – International Council of Monuments and Sites
IMC – Instituto dos Museus e da Conservação
IPM – Instituto Português de Museus
MINOM – Movimento Internacional para uma Nova Museologia
ONU – Organização das Nações Unidas
RPM – Rede Portuguesa de Museus
UNESCO – United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization
1
Índice
Introdução ......................................................................................................................... 2
1. Enquadramento teórico ................................................................................................. 6
1.1. Patrimonialização e alargamento do conceito de património ................................ 6
1.2. Da utilidade do objeto .......................................................................................... 12
1.2.1. O significado como fator de utilidade ........................................................... 12
1.2.2. Preservação do objeto útil ............................................................................. 15
1.3. Da inutilidade do objeto ....................................................................................... 19
1.3.1. Conceito de inalienabilidade ......................................................................... 19
1.3.2. Características do objeto inútil ...................................................................... 22
2. Análise do espólio da extinta Associação Académica da Amadora ........................... 26
2.1. Recolha de alguns dados contextuais ................................................................... 26
2.1.1. O património desportivo e os seus valores .................................................... 29
2.2. Características gerais do espólio e abordagem inicial ......................................... 33
2.3. Metodologia de análise ........................................................................................ 35
2.3.1. Caracterização do espólio.............................................................................. 45
2.3.2. Avaliação do impacto da incorporação ......................................................... 51
2.3.3. Propostas ....................................................................................................... 60
Conclusão ....................................................................................................................... 71
Bibliografia ..................................................................................................................... 75
Anexos ............................................................................................................................ 82
2
Introdução
O tema desta dissertação parte de um problema prático que resultou numa reflexão
teórica. Por esse motivo, esta introdução começa pela apresentação do problema que a
motivou.
No ano de 2014, a Câmara Municipal da Amadora adquiriu, por compra, o espólio de
taças e troféus da Associação Académica da Amadora, através de um leilão decorrente
da insolvência do clube. Posteriormente, esta coleção foi direcionada para a sua
incorporação no acervo do Museu Municipal de Arqueologia. Com esse propósito, em
julho de 2016, decorreu uma atividade denominada «Conservação de Património
Desportivo», no âmbito do programa «Férias na Cidade +16». Foi nesse momento que
tivemos a oportunidade de orientar jovens amadorenses, entre os 16 e 25 anos, no
processo de higienização, registo fotográfico e inventariação desses objetos. Foi
também nesse contexto que nasceu esta dissertação.
Depois de entrar no museu, distribuído por diversas caixas, sem qualquer
documentação da qual se pudesse extrair informação acerca do seu conteúdo; a
instituição começou a incorporar arbitrariamente todo esse espólio desconhecido. Este
processo levantou-nos algumas questões teóricas sobre os procedimentos a serem
implementados e sobre a sua fundamentação.
Nesse contexto, analisámos a bibliografia referente ao panorama atual dos museus, a
um nível nacional e internacional, e identificámos as três principais dificuldades que
estas instituições enfrentam no que diz respeito à gestão das suas coleções: os
orçamentos reduzidos, as coleções marginais e uma necessidade de se aumentar ou
reorganizar o espaço de reserva. Para além disso, reconhecemos ainda a falta de
profissionais suficientes e/ou com a formação necessária, assim como a diminuição de
aquisições relevantes para as coleções. Como referência para estas questões,
fundamentámo-nos nos trabalhos de Gardner (2013) e de Elsa Pinho (2014), entre
outros que se encontram na nossa bibliografia final.
Com o intuito de combater estes constrangimentos, a gestão museológica tem
adotado diversas estratégias, que vão desde a desafetação das suas coleções, a uma
mudança na forma como estas instituições percecionam o ato de colecionar. Ambas têm
3
em comum o pressuposto de que os objetos museológicos devem obedecer a
determinados critérios, o que obriga a uma seleção, seja ela positiva ou negativa.
Ao identificarmos nesta incorporação uma ausência de critérios e uma passividade
perante esse processo, suspeitámos que esta poderia resultar num ónus excessivo para a
instituição, sobrepondo-se aos seus benefícios. Com base nestas constatações, e diante
da potencialidade de se aplicarem os princípios de gestão museológica aprendidos
durante o ano curricular do nosso mestrado, assumimos este espólio como um objeto de
estudo para determinar o impacto que a sua incorporação pode representar para este
museu. Adicionalmente, propusemo-nos a definir alguns critérios de seleção para esta
coleção.
Formalmente, organizámos a estrutura da presente dissertação em duas partes. A
primeira consiste num enquadramento teórico e numa recolha de ferramentas para a
construção dos parâmetros de análise, aplicados na segunda parte. As reflexões
debruçam-se sobre as instituições museológicas como agentes de valorização e os
constrangimentos que resultam da preservação dos seus acervos, com o objetivo de
identificarmos a extensão do ónus que esta representa e o tipo de critérios que poderão
ser aplicados ao espólio da Associação Académica da Amadora.
A nossa investigação iniciou-se pela caracterização do papel da seleção na
transformação do objeto comum em objeto patrimonial, através da análise da literatura
internacional e nacional dedicada ao estudo dos valores atribuídos no decorrer desse
processo. Entre os vários autores de projetos de investigação, monografias e artigos
científicos, entre as quais se encontram as figuras incontornáveis, como Davallon
(2002), Choay (2011, 2013), Muños Viñas (2004) ou Pearce (1992), existem também
alguns trabalhos académicos, entre os quais destacamos a tese de doutoramento de
Pedro Cardoso (2010).
Essa reflexão obrigou à consideração de outras duas questões: quem são os agentes
dessa valorização e que tipo de objetos estão suscetíveis a essa transformação. A
resposta a essas questões dependeu da análise de diversos instrumentos normativos e
orientadores internacionais, que influenciaram as políticas culturais e direcionaram o
património e as instituições museológicas para o desenvolvimento social das
comunidades. Consideramos que a Nova Museologia e os seus preceitos têm
influenciado a diversa documentação publicada pelo ICOM, UNESCO, ICOMOS e
4
MINOM, assim como a própria Lei-Quadro dos Museus Portugueses e a Lei de Bases
do Património Cultural, que são referências incontornáveis para a prática museológica
nacional e consequentemente, para a reflexão aqui desenvolvida.
Partindo deste enquadramento e diminuindo o foco para a realidade museológica,
constatámos que a definição dos critérios que fundamentam a seleção no processo de
incorporação, se baseiam numa abordagem funcional do objeto, ou seja, a ideia de que o
principal critério que define o que deve ou não ser incorporado seria a sua utilidade no
contexto destas instituições. Surgiu então uma questão fundamental: quais são as
características de um objeto com utilidade para um museu?
No desenvolvimento do nosso trabalho, percebemos que, de uma forma genérica, a
resposta a essa questão estaria relacionada com a função social que os museus têm
vindo a adotar desde os finais do século XX. Ao procurarmos uma resposta mais
objetiva à questão, constatámos a impossibilidade de determinar critérios objetivos para
a sua definição, pois estes dependem do projeto único de cada instituição museológica,
refletido através da sua política de incorporações.
Em seguida, invertemos a questão, procurando definir o significado do seu oposto, o
objeto inútil. Percebemos que este consiste no que apresenta um desequilíbrio na
relação custo-benefício, pendendo para o lado oneroso. No entanto, é particularmente
preocupante a sua presença numa coleção, pela impossibilidade que os museus públicos
têm de se descartarem da responsabilidade de garantir a preservação dos seus objetos,
pois estes são, de certa forma, inalienáveis.
A segunda parte deste trabalho, estrutura-se em três capítulos e compreende a
realização do objetivo que se definiu inicialmente: a avaliação do impacto desta
incorporação no museu e a definição de critérios de seleção para este espólio.
Com esse intuito, e reproduzindo o método aplicado na primeira parte para a
compreensão do processo de patrimonialização, entendemos que seria indispensável
conhecer os agentes que valorizam este tipo de coleções, a sua relação com as mesmas e
que tipo de objetos estavam suscetíveis a essa valorização. Este processo foi iniciado
pela recolha de alguns dados contextuais acerca da associação desportiva em questão,
assim como sobre os valores que estão associados a este tipo de património.
5
A caracterização da Associação Académica da Amadora foi limitada à escassa
documentação que lhe estava associada, recaindo principalmente sobre os seus estatutos
de 2009 e um Boletim publicado entre 1950 e 1953, resultando numa pequena história
da sua primeira década de existência e do contexto em que esta surge.
A síntese dos valores atribuídos aos objetos desportivos recaiu, em primeiro lugar,
sobre a consulta de literatura científica dedicada à sua exploração turística, identificada
como a estratégia de valorização mais comum, adotada pelas instituições desportivas
internacionalmente. Essa valorização contrasta com a função social dos museus, que
numa fação oposta, apresentam propostas para um «património desportivo» como refere
Bromberger (s.d.), que em Portugal se reflete nas contribuições académicas
apresentadas nas dissertações de mestrado dedicadas à musealização do Clube
Setubalense, apresentada por Anita Serafim à Faculdade de Belas-Artes da
Universidade de Lisboa (Serafim, 2014), e do Estádio Nacional, apresentada por Anne
Stroobant à Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias (Stroobant, 2011).
Também no segundo capítulo apresentamos uma descrição do primeiro contacto que
estabelecemos com a coleção, que se baseou no projeto de gestão e preservação
aplicado no museu Cosme Damião, cujos resultados foram publicados por Mariana
Basto, Inês Mata e Rita Costa (Basto et al., 2012). Partindo do cenário ali apresentado,
identificámos diversos problemas, nomeadamente: a dispersão dos objetos em diversos
fragmentos, a ausência de informação contextual relativa a determinados objetos e a
presença de agentes de degradação e de diferentes patologias, que punham em risco os
objetos e o acervo do museu.
O terceiro e último capítulo é constituído pela descrição dos objetivos propostos para
a resolução dos problemas encontrados, assim como por uma descrição da metodologia
aplicada, que consistiu em três fases distintas: a caracterização da coleção e a
diminuição da sua dissociação material e imaterial, a avaliação do impacto que esta
incorporação representa e um confronto entre os dados obtidos e a política de
incorporação do museu.
6
1. Enquadramento teórico
1.1. Patrimonialização e alargamento do conceito de património
A reflexão e a argumentação que corroboram esta dissertação assentam num conceito
base aparentemente óbvio: os objetos não têm um único valor intrínseco. Qualquer tipo
de valor é obrigatoriamente atribuído por um indivíduo ou por uma comunidade.
Em 1903, na sua obra O Culto Moderno dos Monumentos, Aloïs Riegl (2013)
confirma esta ideia, ao explicar o papel do sujeito moderno como o agente que valoriza
o objeto, assim como a instabilidade e a mutabilidade desses mesmos valores.
De facto, é na mudança de valores que surge o principal problema quando se fala em
seleção, podendo identificar-se duas visões opostas e radicais. Uma, mais conservadora,
tem incertezas relativamente ao que o futuro poderá valorizar e tem receio de abandonar
antigos valores, pois a desvalorização de um objeto poderá implicar a sua perda. Por
outro lado, uma visão progressista, semelhante à de Thomas Paine (1737–1809),
defende o direito «a começar um novo mundo» (Paine, 1920, p. 84) a cada geração, pois
«o mundo é tão novo para nós, quanto o foi para os primeiros humanos que existiram»
(Paine, 1817, p. 25).
O início do processo de patrimonialização – ou a transformação de um objeto comum
em património – pode ser entendido literalmente como uma descoberta, como o
resultado de uma escavação arqueológica ou de um achado fortuito ou, de um ponto de
vista mais figurativo, como um olhar diferente para um objeto já conhecido. A
patrimonialização do objeto «coevo» só poderá acontecer assim que exista uma rutura, e
o sujeito o passe a observar com estranheza. Quando se substituí o seu valor de uso ou
novidade, por outro, de memória, conhecimento ou antiguidade (Davallon, 2002). É
essa característica do processo que leva Davallon a defini-lo como uma «forma original
de produção de continuidade, de uma sociedade que privilegia a rutura e inovação, em
oposição à reprodução e à tradição»1. Apenas o distanciamento permitirá a mutação ou
o reconhecimento do valor patrimonial de um objeto, que nesse momento, já não será
coevo a quem o valoriza.
1 La patrimonialisation est une forme originale de production de continuité dans une société qui privilégie davantage
rupture et innovation que reproduction et tradition (Davallon, 2002). Tradução livre.
7
Isso significa que todo o património é, obrigatoriamente, uma herança, à qual poderá
ser aplicado o conceito progressista de «filiação inversa». Herdamos o que nos legaram,
mas valorizamos e transmitimos apenas aqueles objetos que reconhecemos como
construtores da nossa identidade (Davallon, 2002). Nessa perspetiva, a seleção é
inevitável. Não só porque não guardaremos tudo o que o passado nos legou, como
porque estamos condicionados a deixar às futuras gerações «apenas» a nossa identidade.
Se Davallon concebe a patrimonialização como a construção de uma continuidade,
Pedro Cardoso afirma que esse processo é um fenómeno bio-socio-cultural, que surge
como um mecanismo de adaptação aos constrangimentos dessa descontinuidade. Os
valores não estão presentes nos objetos, nem poderão estar nos significados atribuídos
numa época específica, mas sim numa relação entre ambos, que não é transmissível,
porque necessita de ser individualmente ativada através da experiência. Isso implica que
os mecanismos de atribuição de valor terão de estar presentes em cada indivíduo,
naquilo que o autor designa como «Estrutura do Valor Patrimonial». Este mapa
cognitivo codifica os diversos valores atribuídos pelo ser humano aos objetos, ou seja,
as características daquilo que é essencial à sobrevivência da espécie (Cardoso, 2010, pp.
115–118). Todos os valores estão presentes nessa estrutura, mas cada indivíduo e,
consequentemente, cada Sociedade de uma determinada época, os aplicará em
proporções diferentes:
[…] a característica de uma época passa a estar na «equação entre os
vários valores patrimoniais» que coexistem na Estrutura do Valor Patrimonial.
Porque são eles que são o motivo gerador da transformação patrimonial. E
cada época passará a ter um perfil de valor patrimonial particular. (Cardoso,
2010, p. 120)
Por esse motivo, esta inevitabilidade é animadora: os valores patrimoniais poderão
ser uma matéria de estudo, com o objetivo de se compreender uma determinada
comunidade, num determinado contexto de espaço/tempo. A valorização e a
desvalorização serão os principais indicadores da construção de uma identidade mais
autêntica e verdadeira para com os seus próprios princípios.
8
Esta construção é extensível ao contexto museológico, tomando como indicadores os
princípios implícitos nas políticas de gestão das coleções, que se refletem numa
conservação seletiva e na construção de critérios de incorporação e desafetação:
As politicas de organização de coleções, no seu sentido mais fundamental,
dos suportes que são comprados e como são utilizados para armazenar
materiais, ajudam a construir narrativas acerca do seu valor e importância,
partindo de uma estória já existente, levando-a ao episódio seguinte. Dando
continuidade à metáfora, o significado aumenta ou diminui, ou as personagens
desaparecem definitivamente, mas a narrativa mantem o seu impulso e coesão.
O mesmo se confirma nas desafiantes questões associadas à incorporação e
(especialmente) à desafetação, a sua gémea sombria2. (Pearce, 1992, pp. 135–
136)
No entanto, se a patrimonialização pressupõe a seleção, as questões tratadas em
seguida estão ligadas à definição dos agentes que a praticam, bem como ao tipo de
objetos suscetíveis a essa valorização.
Tomando como objeto de análise a Lei de Bases do Património Cultural, no seu
artigo 2º, são descritos doze interesses culturais e sete valores ou critérios de seleção:
O interesse cultural relevante, designadamente histórico, paleontológico,
arqueológico, arquitectónico, linguístico, documental, artístico, etnográfico,
científico, social, industrial ou técnico, dos bens que integram o património
cultural reflectirá valores de memória, antiguidade, autenticidade,
originalidade, raridade, singularidade ou exemplaridade. (Lei n.º 107/2001,
de 8 de setembro; ponto 3, artigo 2.º)
2 Policies about the organization of collections, in the most fundamental sense of what racking is bought and how it is
used to hold material, help in the construction of narratives about value and importance which pick up an existing
story and carry the serial forward into the next episode. To pursue the metaphor, sometimes the significance waxes
or wanes, or the characters disappear altogether, but the story retains its thrust and coherence. The same is true of
the vexed questions of acquisition and (especially) disposal, its dark twin (Pearce, 1992, pp. 135-136). Tradução
livre.
9
Na expressão «interesse cultural» está subentendida a ideia de que os valores são
obrigatoriamente atribuídos, permitindo que se coloque a seguinte questão: a quem
interessam estes bens?
Considerando que a maioria dos valores corresponde a áreas científicas específicas,
percebemos que interessam a quem as estuda. Consequentemente, também serão os
especialistas dessas áreas quem conseguirá identificar e justificar o valor desses objetos.
Está aqui implícita uma visão positivista, de uma «história aquisitiva, que acumula os
achados e as invenções para construir grandes civilizações», como defendeu Lévi-
Strauss em 1952 (2009, p. 28), ou mesmo um valor cognitivo, como Françoise Choay
refere na sua Alegoria do Património de 1992 (2013, pp. 119–120).
Os eixos do valor de conhecimento atribuídos aos objetos, concebidos por Michalski,
ilustram essa relação entre um valor científico, um valor de narrativa impessoal,
partilhado por diversas pessoas e um valor de narrativa pessoal, restrito a poucos
indivíduos (Michalski, 1994, pp. 250–251).
Figura 1 – As três dimensões do valor de conhecimento, segundo Michalski (1994, p. 249)
10
Este tipo de valorização científica resulta no que se designam como coleções
disciplinares, com um propósito de suporte a essas áreas. Distinguem-se das que têm
como intuito a «construção de uma identidade» (Knell, 2004, p. 20).
Esta segunda forma de colecionar será beneficiada pela democratização da atribuição
de valores e com um alargamento do conceito de património, que se desenvolve a partir
dos finais do século XX (Alves, 2014), bem como o nascimento da Nova Museologia.
O conceito de «desenvolvimento» é identificado com a ideologia atualmente
dominante, nascida depois da Segunda Guerra Mundial, que se manifesta criticamente
contra as ideias positivistas e contra o crescimento económico como fator único para a
determinação do valor de uma Sociedade (Cardoso, 2010, p. 123). Esta ideologia
compreende em si os conceitos de sustentabilidade, participação social, identidade e
promoção dos diretos humanos, que mobilizam diversas organizações internacionais,
como a ONU, a UNESCO e o ICOM (Cardoso, 2010, pp. 141–145).
Neste sentido, Françoise Choay desconfia do discurso globalista presente na
Convenção para a Protecção do Património Mundial, Cultural e Natural da UNESCO
(1972), em que é apresentada a ideia de um Património, cujo valor universal diz respeito
a toda a humanidade, independentemente do povo a que pertence. A autora receia que
uma dissolução das identidades particulares, a favor de uma industria do turismo, venha
a privilegiar a questão económica (Choay, 2011, p. 48), como se tem visto em diversas
ocasiões.
O discurso tem vindo a mudar e adotar uma preocupação com a preservação da
diversidade cultural face à globalização, como se pode ver em publicações como o
Documento de Nara sobre a Autenticidade (ICOMOS, 1994). O património cultural é
cada vez mais entendido como um reflexo de uma identidade, uma «memória que
resulta de uma interação tempo-espaço-homem», que se expressa no domínio da
imaterialidade (Aires-Barros, 2003, p. 262).
Em 2003, o património imaterial ganha visibilidade através da Convenção da
UNESCO para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial. Esta «descoberta» do
património intangível pode ser interpretada como a perceção de que a imaterialidade, o
significado e os valores que são atribuídos a um objeto (aqui encarado como qualquer
coisa que se torna objeto de um sujeito, e não como sinónimo de coisa tangível), são a
verdadeira motivação para a sua conservação (Avrami et al., 2000, p. 4). De facto, o
11
corpo que reproduz uma determinada dança, um mito ou um tipo particular de cesto,
também está condicionado pela sua materialidade, que é o verdadeiro suporte do seu
significado (Meneses, 2012, p. 31).
No seguimento desse raciocínio, Salvador Muñoz Viñas discorre sobre um valor
simbólico, correspondente a sentimentos, crenças ou ideologias, comuns a um grupo de
pessoas, ou atribuível apenas por um indivíduo (Muñoz Viñas, 2004, pp. 40–41). O
valor do património será apenas uma versão social do valor sentimental dado aos
objetos pessoais, análogo ao valor de narrativa impessoal de Michalski. Esta
generalização constitui uma democratização total da atribuição de valores, bem como
um alargamento do conceito de património.
Tudo pode ser património, todos os indivíduos podem e devem participar na
atribuição de valores (Convenção de Faro, 2005) e a museologia comunitária, através do
conceito de ecomuseu, tem vindo a transformar estas instituições em «espelhos» das
comunidades locais (Rivière, 1985, p. 182).
Posteriormente, na atualização de 2013 da Carta de Burra, foram também
considerados os «sítios com significado cultural». Além da inclusão de minorias, o
património é ali considerado de uma forma expandida. Não é apenas um objeto móvel,
um edifício ou uma ideia, é um conjunto de relações, ou mesma a preservação de um
ecossistema na sua vertente natural e cultural. Para que o significado cultural se
manifeste de modo autêntico, será necessário considerar a totalidade do sítio, do seu
«tecido», assim como o uso que lhe é atribuído.
Em síntese, além do processo de patrimonialização se caracterizar pela atribuição de
valores mutáveis, pode considerar-se que há um número infindável de símbolos.
Verificámos que não existem restrições ao tipo de objetos que passam por esse processo
de patrimonialização, porque o valor simbólico é compatível com todos os formatos; e
que cada época é caracterizada pelo seu paradigma ideológico, tendo o
«desenvolvimento» sido identificado, nas suas mais variadas vertentes, como a atual
motivação dos esforços comunitários.
12
1.2. Da utilidade do objeto
1.2.1. O significado como fator de utilidade
A musealização poderá ser vista como uma possível extensão do processo de
patrimonialização, quando o reconhecimento do valor antecede a incorporação. No
entanto, esse processo também pode ser iniciado no museu, constituindo então uma
forma particular de patrimonialização (Gob, 2009), que estará sujeita às mesmas
políticas de desenvolvimento e de democratização.
O Museu é uma instituição permanente sem fins lucrativos, ao serviço da
sociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público, que adquire, conserva,
investiga, comunica e expõe o património material e imaterial da humanidade
e do seu meio envolvente com fins de educação, estudo e deleite3.
Na definição de museu do ICOM é possível reconhecer a influência da Nova
Museologia, e da «função social» atribuída a um museu, para o desenvolvimento das
sociedades, da qual se enumeram algumas características (UNESCO, 2015):
1) Preservar a diversidade e a identidade das comunidades, perante a
homogeneização resultante do processo de globalização, mas sem que desta forma
se alienem do mesmo;
2) Desenvolver a economia da região, através do turismo e de outras atividades que
contribuam para o aumento da qualidade de vida da comunidade;
3) Promover a integração, a coesão social e a defesa pelos direitos humanos, através
da construção de espaços de reflexão e debate, sejam estes históricos, sociais,
culturais ou científicos;
4) Fomentar a acessibilidade e participação coletiva da sociedade.
A legislação nacional assume também essa intenção quando refere, no seu conceito
de museu, o dever de: «facultar acesso regular ao público e fomentar a democratização
3 Definição retirada do site do ICOM Portugal: http://icom-portugal.org/2015/03/19/definicao-museu/
(acedido a 01/05/2017).
13
da cultura, a promoção da pessoa e o desenvolvimento da sociedade» (Lei n.º 47/2004,
de 19 de agosto; alínea b), ponto 1, artigo 3.º).
Em síntese, este enquadramento conceptual identifica como objeto de estudo da
museologia as relações entre a cultura, a comunidade e o território, tendo em vista o seu
desenvolvimento. Considerando essa relação triangular, cada museu é único e,
obrigatoriamente, diferente de qualquer outro, seja pela sua temática ou pela
comunidade/região onde se insere (Veillard, 1985, p. 191). Este projeto distinto é
delineado pelo que se denomina de vocação e de missão. A vocação tem um caráter
descritivo, caracterizando a abrangência territorial do museu, o seu campo temático, a
sua natureza disciplinar e a sua dependência administrativa. Por outro lado, a missão de
um museu constitui a sua raison d’être, descrita de uma forma sintética e objetiva
(Antunes, 2012, pp. 41-43), a importância do museu para uma comunidade, inserida
num determinado território.
Ao redirecionar o foco da instituição para a comunidade ou para aqueles que
usufruem do museu, assiste-se a uma mudança na forma como o museu se perceciona a
si próprio e como comunica com o seu público. Este processo iniciou-se a partir da
década de 1960, quando os museus abandonaram uma estrutura curatorial, constituída
por diversos curadores/especialistas dos campos temáticos das coleções que
compunham os seus acervos, começando a adotar uma gestão discriminada por funções,
a partir do aparecimento dos departamentos de educação (Van Mensch, 2004, p. 4).
Desde então, têm vindo a ser definidas diferentes quantidades e designações para as
funções museológicas4, mas considera-se que se podem reduzir a apenas três tipos
elementares: a preservação, a investigação e a comunicação (Van Mensch, 2004, p. 10).
Se o propósito atual dos museus implica um maior contacto com a sua comunidade, à
comunicação é agora atribuída uma relevância que anteriormente não tinha, tomando
como «reféns» as restantes funções (Mayrand, 1985, p. 200). Por outro lado, o valor
simbólico é obrigatoriamente comunicativo, pois os objetos estão «imbuídos de uma
mensagem» (Muñoz Viñas, 2004, p. 41).
4 A Lei-Quadro dos Museus Portugueses reconhece este modelo, no seu artigo 7.º, criando uma lista de sete funções
museológicas: a) Estudo e investigação; b) Incorporação; c) Inventário e documentação; d) Conservação; e)
Segurança; f) Interpretação e exposição; g) Educação. Simplificando esta distinção: Preservação (constituída pela
incorporação, o inventário e documentação, a conservação e a segurança), Investigação (da qual fazem parte o estudo
e a investigação) e Comunicação (composta pela interpretação e exposição, bem como pela educação).
14
Considerando a incorporação como o início do processo de preservação – pois é essa
a intenção que está implícita no ato – é necessário ter em consideração a existência de
uma mensagem nos objetos que se destinam a esse processo e avaliar se esta se adequa
ao projeto social desse museu, implícito na sua missão e vocação. Em 1970, o ICOM
publicou uma lista de recomendações, denominada Ethics of Acquisitions, em que é
possível ler:
4. O significado do objeto (cultural ou científico) irá depender da sua
documentação completa. Como princípio, nenhuma aquisição deveria ser
efetuada sem esta documentação total, com a possível exceção de certos
objetos […] cuja documentação essencial poderá ser obtida através de
pesquisa sistemática após a aquisição5 (ICOM, 2005).
Isto significa que é possível conceber o objeto museológico como a soma da sua
materialidade e do seu significado, materializado e inteligível através da sua
documentação. De certa forma, esta ideia está patente na legislação portuguesa, quando
ali se determina que todos os inventários museológicos estão classificados como
património arquivístico de interesse nacional (Lei n.º 47/2004, de 19 de agosto; artigo
26.º).
Esta forma de conceber o objeto museológico obriga a uma interpretação funcional
destes objetos, focada no seu valor utilitário dentro da instituição. Assim sendo, os
museus não devem incorporar objetos sem utilidade previsível, deixando uma
incorporação arbitrária de fazer sentido. Ignorar este pressuposto resulta numa
acumulação de objetos abandonados em estantes de reservas, que se vão transformado
em arrecadações onerosas (Pinho, 2014, p. 237).
Contudo, é importante esclarecer que o termo inútil não implica, necessariamente,
que um objeto não tenha qualquer valor atribuível, pois, no que diz respeito ao
significado, este é apenas relativo à missão e à vocação de cada museu.
5 The significance of the object (cultural and scientific) will depend upon its being fully documented. As a matter of
principle no acquisition should be made without this full documentation, with the possible exception of certain
objects […] when the essential documentation relative to the latter may be obtained by systematic research after
acquisition. (ICOM, 2005) Tradução livre.
15
1.2.2. Preservação do objeto útil
Este modelo de política museológica, guiado por valores/missões, direcionado para a
comunicação da imaterialidade, vai obrigar a uma reflexão sobre o papel da
conservação nessa função social (Avrami et al., 2000, p. 3). Por outro lado, através da
adição de políticas de sustentabilidade, adota uma metodologia que se aproxima da
gestão das coleções, ultrapassando as suas preocupações estritamente relacionadas com
o tratamento material (Pereira, 2010).
O Código de Ética do ICOM afirma que, ao preservarem coleções, os museus
constituem-se como os seus guardiões, para o benefício da sociedade e do seu
desenvolvimento (ICOM, 2013, p. 3). A conservação, na sua conceção tradicional, será
apenas um meio ou uma necessidade, que resulta da condição efémera da matéria, o
recetáculo da informação, com a potencialidade de gerar a transformação e o
desenvolvimento, patentes na agenda ideológica da Nova Museologia.
É importante referir que os museus ainda conservam coleções6. Isto significa que um
aumento na importância da comunicação, não afetará a necessidade da preservação,
como afirma Philip Ward:
Preservação é a responsabilidade mais fundamental, já que sem ela, a
exposição é impossível e colecionar não faz sentido. (Ward, 1986, p. 1)
Paralelamente, o dilema entre «expor ou conservar» começa a ser entendido como
falso, prevendo-se que, num futuro próximo, os constrangimentos associados à
exposição de objetos especialmente delicados, serão ultrapassados pelo aperfeiçoamento
da conservação preventiva (Casanovas, 2008, p. 114). Os fundos e os recursos limitados
que os museus têm à sua disposição, podem levar a uma preferência pelo investimento
em atividades museológicas, legitimando e demonstrando publicamente a atuação da
instituição. Mais uma vez, neste contexto, a preservação, considerada como um trabalho
de «bastidores», tende a não ser vista como prioritária (Cassar, 1998, p.6).
6 Segundo a Lei Quadro dos Museus Portugueses, o conceito de museu implica a existência de uma coleção, como se
verifica no seu artigo 3.º.
16
Pegando novamente no conceito de objeto museológico, se o considerarmos como
portador de uma componente material e de outra imaterial, a conservação das coleções
torna-se na preservação do próprio significado, considerando as suas duas vertentes.
Para melhor refletir essa conceção expandida, utiliza-se o termo Preservação tendo em
conta quatro das sete funções museológicas, que a Lei-Quadro dos Museus Portugueses,
referidas anteriormente: a incorporação, o inventário e a documentação, a conservação e
a segurança.
Em 1990, Stefan Michalski nomeou nove agentes de deterioração para a avaliação do
estado de conservação de uma coleção: as forças físicas, o fogo, a água, as pestes, os
poluentes, a atividade criminosa, a radiação, a temperatura incorreta e a humidade
relativa incorreta (Michalski, 1990), mas foi Robert Waller (1994) quem trouxe para a
discussão os riscos associados à perda do significado (Alves e Frade, 2017, p. 2),
criando o «agente metafísico».
Este autor propõe uma forma de calcular a magnitude do risco a que a coleção está
exposta, através do produto de três fatores: a probabilidade/extensão de uma ocorrência,
a fração da coleção suscetível à ocorrência e a perda de valor. Este último fator, Loss of
Value (LV), é definido como uma redução da utilidade da coleção, dependente da
avaliação subjetiva de quem conhece as potencialidades dos objetos (Waller, 1994, pp.
13-15). Adicionalmente, a perda de valor de um objeto tem a capacidade de reduzir o
valor de toda a coleção. Desta forma, o significado é colocado como o alvo da
preservação, estando o mesmo, inevitavelmente, dependente da conservação da sua
componente material.
Mais tarde, este décimo agente de deterioração foi denominado por dissociação,
sendo afetado diretamente pelos aspetos legais, intelectuais e simbólicos dos objetos ou
das coleções, partindo do pressuposto de que os sistemas organizados tendem a tornar-
se caóticos. Este agente relaciona-se com os restantes, pelos motivos apresentados no
parágrafo anterior, mas está principalmente dependente da negligência e/ou ignorância
dos responsáveis pela gestão das coleções.
Se é verdade que as ocorrências mais catastróficas e severas são também as mais
raras ou esporádicas, existem outras que são contínuas e subtis, causadas por hábitos
deficientes, que vão provocando uma redução do valor a longo prazo. Um estudo
realizado em 2011, pelo ICCROM-UNESCO, às condições de reserva de 1490 museus
17
em todo o mundo, identificou os problemas mais frequentes. Daqui se concluiu que dois
em cada três museus acusam uma falta de suporte na gestão das suas atividades em
reserva, enquanto dois quintos referem a existência de uma grande quantidade de
objetos que necessitam de ser incorporados e um terço dos museus afirmam não
existirem procedimentos claros para a gestão das suas coleções. Um quarto não regista a
movimentação dos objetos ou a sua aquisição, e não têm um inventário geral das
coleções. A mesma percentagem não tem um sistema de identificação das zonas e dos
suportes das suas reservas. A quinta parte refere que existe uma grande quantidade de
objetos fora do local designado para a sua arrumação (ICCROM-UNESCO, 2011).
A ausência de políticas e protocolos para a manutenção e gestão das coleções e dos
seus espaços, ou para as situações de cedência temporária, assim como o constante
contacto com diferentes funcionários/voluntários (dois quintos dos museus apontam a
falta de funcionários com formação adequada), aumenta a probabilidade de ocorrência
de desastres e uma falta de estandardização na documentação. Esta diminuição de valor
tem como consequências a inutilidade do objeto em contexto museológico, aliada a um
esquecimento dos motivos originais da sua preservação, podendo levar a futuras
desafetações (Alves e Frade, 2017, p. 8).
Direcionando a reflexão para o tema desta dissertação, no processo de incorporação o
combate a este agente tem a maior importância. A má interpretação do valor de um
objeto, pressupõe a rejeição de elementos que podem ser relevantes para a coleção como
um todo ou, por outro lado, pode resultar na incorporação de objetos que não têm
qualquer utilidade no museu. Uma instituição que não se preocupa em registar esse
momento, em assegurar a proveniência lícita, em ter o comprovativo de propriedade, em
registar as deslocações internas, saber a localização dos objetos, ter a documentação e
realizar a marcação dos mesmos, arrisca-se a perdê-los, em parte ou totalmente, com
consequências para a sua futura utilização.
O risco será proporcional à quantidade de objetos que se pretende incorporar e esta
superlotação refletir-se-á, igualmente, em dificuldades na gestão dos espaços em
reserva. O mesmo estudo, anteriormente referido, aponta que dois terços dos museus
lidam com falta de espaço, enquanto dois quintos não contêm suportes adequados aos
objetos que constituem as suas coleções, ou mesmo suportes em geral, estando metade
destes superlotados. A quarta parte das instituições admite colocar objetos diretamente
18
sobre o chão e afirma que a circulação na área de reserva é difícil ou impossível
(ICCROM-UNESCO, 2011).
Como o intuito de atenuar estes problemas, o Código de Ética do ICOM prevê no
ponto 2.1, que os museus elaborem e tornem pública, «uma política de aquisições,
proteção e utilização dos acervos» (ICOM, 2013 p. 3).
Num primeiro momento, este tipo de política surge como uma forma de combater o
tráfico ilícito, que alguns museus sustentavam através das suas aquisições. Esta
discussão ganha importância através da convenção da UNESCO relativa às Medidas a
Adoptar para Proibir e Impedir a Importação, a Exportação e a Transferência Ilícitas
da Propriedade de Bens Culturais (1970), que, após um processo de debate, culminou
na construção do primeiro Código de Ética do ICOM, em 1986 (O’Keefe, 1998, pp. 20-
22).
Atualmente, as políticas de incorporação, além de compreenderem essas questões
legais e éticas, definem outros procedimentos que devem ser adotados para se evitar que
a dissociação ocorra durante o processo, bem como os objetivos e metas para a
construção das coleções. Cada museu constrói a sua política consoante as suas
particularidades, mas em geral, este documento deve definir (Gardner, 2013; Pinho,
2014, p. 212):
A missão e a vocação do museu, assim a visão definida para as suas coleções e
como estas serão construídas.
Os critérios para os objetos que poderão ser incorporados e a caracterização das
diversas coleções do museu, identificando aquelas constituídas por objetos pouco
utilizados e propondo formas de contrariar esse problema.
As possíveis aquisições que complementariam as coleções já existentes.
Os procedimentos e/ou a documentação auxiliar necessários para garantir a
proveniência lícita e a propriedade do objeto.
Uma avaliação dos custos inerentes à incorporação, tanto financeiros, como
relativos à duração do processo.
A Lei-Quadro dos Museus Portugueses também refere a necessidade de
implementação deste tipo de protocolo (Lei n.º 47/2004, de 19 de agosto; artigo 12.º.).
19
Em 2011, o IMC criou um normativo, que os museus e palácios seus dependentes
deveriam adotar, para a elaboração das suas políticas de incorporação, não tendo sido
verificada, até 2014, uma grande adesão por parte dessas instituições (Pinho, 2014, p.
212).
1.3. Da inutilidade do objeto
1.3.1. Conceito de inalienabilidade
Como expusemos nos capítulos anteriores, a problemática associada à acumulação
compulsiva não se prende apenas à falta de concordância com a função social atribuída
aos museus, mas também com a viabilidade da sua gestão interna. Para compreender
mais profundamente as consequências da incorporação de um objeto que não tenha
utilidade para um museu é necessário, novamente, analisar a legislação portuguesa.
A entrada de um objeto num museu é iniciada pela sua aquisição7, ou seja, pela
obtenção de algum direito de propriedade sobre o bem (Pinho, 2014, p. 181). Em
seguida é realizada a incorporação, ou seja, a formalização da aquisição, através da
atribuição de um número de inventário. Um bem adquire proteção legal através da sua
classificação ou registo de inventário (Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro; artigo 16.º.) e
o seu proprietário goza então de diversos direitos, mas para cumprir os propósitos desta
reflexão, frisam-se aqui os deveres de «conservar, cuidar e proteger devidamente o bem,
de forma a assegurar a sua integridade e a evitar a sua perda, destruição ou
deterioração» (Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro; alínea b), ponto 1, artigo 21.º).
Estes deveres contrariam o processo oposto, denominado como desafetação, que
poderá ou não resultar na perda do direito de propriedade obtido através da aquisição,
mas que implica um abatimento ao inventário. Do leque de modalidades possíveis, a
permuta ou a transferência do bem para outro museu é a única que não representa uma
total descredibilização da instituição perante a sua comunidade (nem um
constrangimento legal), contrariamente ao que acontece com as restantes, como a venda,
a deterioração, a destruição, o roubo/furto ou a perda de propriedade por aquisição
7 São previstas doze formas de incorporação, no ponto 2 do artigo 13.º da Lei n.º 47/2004, de 19 de agosto: compra,
doação, legado, herança, recolha, achado, transferência, permuta, afetação permanente, preferência, dação em
pagamento e expropriação. Aquisição não é sinónimo de compra.
20
ilegal do bem. Este tipo de acontecimentos reflete uma gestão deficiente das coleções à
guarda dos museus, perdendo estes a confiança de possíveis doadores, receosos de que
os seus objetos se deteriorem ou venham a ser vendidos (National Museum Directors’
Conference, 2003, p. 12).
Nos países anglo-saxões, como os Estados Unidos da América e o Reino Unido, esta
prática é prevista e encorajada mesmo em museus de tutela pública. A Holanda e a
Alemanha caminham para a sua maior aceitação, enquanto nos restantes países
europeus, este ato é ainda considerado como uma espécie de tabu (Szereda, 2016;
Vecco e Piazzai, 2015), tendo o Estado francês assumido essa relutância ao aplicar o
termo «inalienabilidade» na legislação referente às suas coleções públicas (Code du
Patrimoine; livro IV, título V, capítulo 1, artigo L451-5).
No caso português, a alienação de objetos enquadrados no «Regime Patrimonial de
Inventário» está legalmente prevista, mas constitui um processo complexo, sem
precedentes, contrariamente aos museus privados, que decidem autonomamente o
destino das suas coleções. A alienação de bens culturais de tutela pública é descrita no
artigo 7.º do Decreto de Lei n.º 307/94, de 21 de dezembro, em que se prevê a
transferência de bens do domínio público para o domínio privado do Estado. Este ato
necessita de autorização do Ministro da Cultura, depois de ouvido o parecer do órgão
consultivo (Lei n.º 47/2004, de 19 de agosto; artigo 65.º). Apesar disso, têm surgido
algumas discussões que promovem a prática da alienação - preferencialmente através da
venda - como uma forma de libertar os museus das suas coleções marginais, permitindo
desta forma o investimento na preservação dos acervos e em aquisições importantes
para a instituição (Brandão, 2011).
Por outro lado, os restritos orçamentos que as instituições museológicas têm
disponíveis para a sua gestão, levam alguns profissionais de museus a constatar que o
ato de colecionar deixou de constituir uma parte significante do seu trabalho. As suas
funções de afetação estão agora reduzidas à receção de eventuais legados , de recolhas
de trabalho de campo, no caso de museus com coleções disciplinares (Merriman, 2013,
pp. 249–250), ou têm um carácter reativo pontual, perante a possibilidade de compra ou
doação (Merriman, 2013, p. 254).
Segundo Elsa Pinho, também em Portugal se verifica uma ausência de proatividade
em aquisições, que muitas vezes resultam de compras não planeadas, após consulta dos
21
catálogos das leiloeiras (2014, pp. 242–243). Adicionalmente verifica-se uma
preferência relativamente a aquisições não onerosas, como um meio de crescimento das
coleções (2014, p. 78), aliada a uma dependência de depósitos, de média e longa
duração, de objetos de outras instituições, com o intuito de colmatar as suas lacunas
(2014, p. 198).
No entanto, não existem aquisições que sejam, verdadeiramente, não onerosas,
porque o custo referente à conservação das coleções é «implacavelmente cumulativo» e
será o mesmo, quer o museu colecione «lixo ou tesouros» (Knell, 2004, p. 32). Por esse
motivo, todas as modalidades de aquisição devem estar contempladas na política de
incorporações.
Os museus necessitam de abandonar uma forma de construir coleções baseada em
linhas pré-existentes, que lhes foram legadas pelas gerações anteriores, e adotar uma
estratégia que tenha em conta a missão e as características atuais da instituição. Esta
deve ir para além do que são a missão e a vocação do museu, porque estas são
demasiado vagas para serem utilizadas como parâmetro de avaliação num momento de
incorporação. A missão deve ser interpretada, tendo em consideração a própria
comunidade e os públicos da instituição (Gardner, 2013, pp. 211-214). Este exercício
permite aos museus planear antecipadamente as suas aquisições, inclusivamente através
de uma prospeção dos bens na propriedade de privados que poderiam colmatar as
lacunas das suas coleções, com o intuito de se defenderem da imprevisibilidade do
mercado (Pinho, 2014, 180), bem como se prepararem para tomar as medidas
necessárias para a preservação dos seus novos objetos.
De facto, podemos concluir que o principal ónus que um objeto representa para um
museu é o da obrigatoriedade da sua preservação, condicionada pela dificuldade da
instituição em se conseguir descartar dessa responsabilidade. Se um museu tiver
recursos humanos e financeiros abundantes, ao ponto de conseguir assegurar a
conservação de qualquer tipo de objeto (útil ou inútil), teoricamente, não existirá
nenhum impedimento. Contudo, a realidade dos museus é a oposta, na maioria das
vezes e o processo de incorporação não pode ser visto como um ato leviano, cabendo ao
museu avaliar a relevância de cada objeto para o seu acervo.
Esta ideia parece racional até se analisar o artigo 12.º da Lei-Quadro do Museus
Portugueses, em que se determina que os museus devem desenvolver a sua própria
22
política de incorporações, «que permita imprimir coerência e dar continuidade ao
enriquecimento do respectivo acervo de bens culturais» (sublinhado nosso). Logo em
seguida, no segundo ponto, é aconselhado que a «política de incorporações deve ser
revista e actualizada pelo menos de cinco em cinco anos». É aqui reconhecida a
mutabilidade dos museus e da sua comunidade, devendo a sua política de incorporações
refletir essa dinâmica. No entanto, não é considerada a dificuldade que isso representa
na atual conjuntura legal, criando-se um paradoxo. Como é que se concilia a relutância
pelo descarte de objetos, com uma constante mudança de valores e uma necessidade de
que a coleção reflita esses mesmos valores? Como é que é se mantem a coesão e a
relevância das coleções a longo prazo, aliada a uma gestão sustentável?
No contexto português tem sido sugerida a reafectação das coleções dos museus
públicos, com maior urgência para os que pertencem à RPM. Isto implica uma análise
individual das políticas de incorporações de cada museu, para que se possam distribuir
as coleções pelas instituições com melhores capacidades de as integrar nas suas próprias
missões (Pinho, 2014, p. 225). Esta opção apresenta-se como uma forma mais viável à
atualmente vigente e anteriormente referida, em que os museus dependem dos depósitos
a médio e longo prazo. A aplicação da ação de permuta entre instituições como
modalidade de desafetação consistiria num pequeno passo nesse sentido, não existindo
até 2014, memória desta prática no nosso país (Pinho, 2014, p. 197). Porém, essa
solução não apresenta resposta para aqueles objetos que não se enquadrem nos critérios
apresentados pelos museus recetores.
Considerando que não houve uma aderência pela parte dos museus portugueses ao
normativo para a construção de uma política de incorporação e que, consequentemente,
as coleções têm vindo a ser construídas sem uma séria definição dos critérios que devem
acompanhar esse processo, justificar a sua preservação pelo simples facto de que estes
são propriedade de um museu acaba por ser um raciocínio circular (Knell, 2004, p. 14).
1.3.2. Características do objeto inútil
A relevância de um objeto está intimamente relacionada com a missão e vocação do
museu, com a identidade da comunidade que o constrói e do território por ele abrangido.
23
A política de incorporações deve especificar as características dessa mesma identidade,
servindo assim como guia para a avaliação dos bens.
No entanto, sendo os museus guiados pela sua missão, não é possível identificar
concretamente o que é um objeto útil, senão através da ideia de que pode consistir em
qualquer coisa, desde que possa ser utilizado nesse contexto. Através das reflexões
anteriores, foi possível identificar três variáveis que determinam as características do
que consistiria no objeto inútil, que não deve ser incorporado.
As duas primeiras referem-se a questões éticas: o não enquadramento da missão do
museu, que corresponde apenas a um gasto de recursos sem que daí provenha qualquer
benefício (a-c); a ilegalidade da incorporação (d). A terceira variável corresponde a um
custo excessivamente elevado gasto na preservação do objeto, mesmo que este se insira
na missão definida para a instituição (e). Tendo em conta estes aspetos, podemos definir
os seguintes cinco tipos de objetos inúteis:
a) Objeto irrelevante
Se o bem não estiver associado a nenhum tipo de significado e o seu estudo não
permitir a obtenção de algum conhecimento sobre o mesmo para a sua futura
divulgação, este pode ser considerado inútil.
Apesar de no momento de incorporação, não ser difícil avaliar se o objeto reflete a
visão do museu e da comunidade, a sua irrelevância pode surgir no futuro, como
resultado de uma mudança de valores. Neste contexto, o objeto inútil pode ser um
objeto com valor, mas não para esse museu em concreto, podendo ali ser considerado
apenas como descontextualizado, no seio da coleção.
b) Objeto descontextualizado
Por vezes o objeto não reflete a missão de um museu, ou deixa de o fazer e outra
instituição poderá tirar maiores benefícios da sua aquisição (National Museum
Directors’ Conference, 2003, p. 7). Neste caso, o museu em questão poderá indicar
outro museu como recetor para uma possível doação, ou até transferir bens da sua
coleção para o mesmo, através de um contrato de depósito/comodato ou mesmo através
da desafetação. Pode ainda, através de permuta, adquirir um objeto que melhor se
enquadre na sua missão.
24
c) Objeto redundante
A incorporação de um objeto - ou conjunto de objetos - idêntico a outro já existente
numa coleção pode resultar numa redundância dentro da instituição. Por outro lado,
também pode ser uma mais-valia, caso o seu estado de conservação lhe conferira uma
melhor leitura, ou se estiver mais bem documentado. Consequentemente, o bem
substituído perderá o seu valor no seio da instituição.
Uma pesquisa intensa, que preceda a incorporação de um objeto, pode evitar a
aquisição de um bem, em detrimento de outro, igualmente disponível e de valor
superior. No entanto, nem sempre é possível prever o que poderá surgir no mercado ou
que tipo de doações o museu receberá no futuro.
d) Aquisição ilegal
Neste ponto estão incluídos os objetos provenientes de tráfico ilícito, assim como a
incorporação de objetos em situação de depósito ou comodato. Este tipo de
incorporação poderá resultar na desafetação do objeto, a processos judiciais e à
consequente descredibilização do museu.
Podemos inserir aqui outras questões éticas que, mesmo não constituindo
ilegalidades, poderão dar origem a conflitos e à desafetação dos bens. Enunciando
apenas alguns exemplos, estão incluídas neste ponto as incorporações de restos
humanos (Lohman, 2012) ou objetos «etnográficos» que subsistem ainda como
símbolos de culto (Pickering, 2015).
e) Estado de conservação
Nesta característica incluem-se os bens cujo estado de conservação seja muito mau
ou os objetos efémeros, para os quais não se preveja possibilidade de salvaguarda, cujos
custos e especiais condições de preservação, o museu não consiga suportar ou oferecer.
Por vezes, as instituições museológicas aceitam este tipo de circunstâncias por vergonha
de assumir o seu fracasso (National Museum Directors’ Conference, 2003, p. 4). No
entanto, o próprio ato de incorporar um objeto com estas características obrigará o
museu a realizar uma futura desafetação, pela sua inevitável destruição. Isso constitui,
obviamente, uma falha na função de preservação.
No caso português esta questão não tem sido considerada. Segundo o que se encontra
instituído, sempre que um museu deseje realizar um negócio privado, através de
25
compra, a instituição deve emitir o seu parecer à tutela, a fim de receber a autorização
necessária. As suas apreciações tendem a focar-se numa avaliação da relevância dos
elementos contextuais, na importância do objeto no contexto das suas coleções e na
adequação do preço. No entanto, até ao ano de 2014, não foram encontradas quaisquer
referências ao estado de conservação desses objetos (Pinho, 2014, pp. 182–183).
26
2. Análise do espólio da extinta Associação Académica da Amadora
2.1. Recolha de alguns dados contextuais
A vida desportiva Clubista não se cifra em ganhar ou perder jogos. Deve
animá-la o empenho da educação integral, da elevação do nível dos seus
agremiados sob todos os aspectos e no desenvolvimento da camaradagem.
Por Cunha Leão, no 9º aniversário da A.A.A.
(Lopes, 1950-1953, n.º 4, p.1)
A Associação Académica da Amadora é oficialmente fundada no dia 26 de janeiro de
1942, na então vila da Amadora, freguesia do município de Oeiras (Pereira, 1950, p. 4).
No entanto, já era um projeto com cerca de um ano de idade, visto que em 1941:
[…] um grupo de estudantes da Amadora, foi convidado a realizar um
encontro de hóquei em patins, na vizinha vila de Sintra, e esse facto deu lugar
a uma tremenda dificuldade: A escolha do nome com que iriam actuar, porém,
breve e a contento foi resolvido unanimemente que alinharia sob a designação
de «Associação Académica da Amadora». (Pereira, 1950, p. 4).
Tinha como função social desenvolver a prática da educação física, do desporto e da
educação e formação, em geral, e proporcionar aos seus associados meios de convívio
social, cultural e desportivo (Conservatória do Registo Comercial da Amadora, 2009,
art.º 2). De acordo com os seus estatutos:
27
A A.A.A. tem como símbolo um losango preto com as
iniciais A.A.A. em branco na metade superior e com cinco
quinas em preto, implantadas em escudo branco na
metade inferior, ladeado por dois triângulos brancos
(Conservatória do Registo Comercial da Amadora, 2009,
art.º 7).
Não foi coincidência que esta associação tenha nascido de um jogo de hóquei, pois as
freguesias de Benfica e Amadora partilham o berço da prática deste desporto em
Portugal (Pereira, 1950, p. 10; Lopes, 1950-1953, n.º 8, p. 2). Álvaro Simão Lopes,
amadorense e atleta da seleção portuguesa, vencedora do Campeonato Europeu e
Mundial de 1947, afirma: «A Amadora foi sempre um viveiro de patinadores. Eu sou do
tempo em que se aprendia a patinar e a andar quase ao mesmo tempo» (Pereira, 1950, p.
6). Este clube surge então com o objetivo de manter a tradição da patinagem na
localidade e será a modalidade pela qual será reconhecido durante o seu tempo de vida.
Apesar de ter sido fundado com a prática de diversas modalidades, nomeadamente
hóquei em patins, patinagem artística, ginástica, ténis de mesa, basquetebol, voleibol,
andebol, cicloturismo e rugby (Pereira, 1950, p. 4), apenas as três primeiras
conseguiram sobreviver aos primeiros anos do clube, consequência da sua instabilidade
financeira e da inexistência de instalações próprias para os treinos (Lopes, 1950-1953,
n.º 8, p. 1; Pereira, 1950, p. 12). Em 1949, o clube consegue recuperar algumas das suas
secções, nomeadamente as de basquetebol, ténis de mesa e andebol de sete, tendo os
atletas recomeçado a competição a partir do ano de 1950 (Lopes, 1950-1953, n.º 1, pp. 2
e 4; Pereira, 1950, pp. 12 e 15).
Com a vitória da seleção portuguesa de hóquei, no Campeonato Mundial de 1947,
assiste-se também à valorização da modalidade de patinagem artística, que inicialmente
era vista como uma atividade secundária e complementar ao hóquei em patins. O
contacto próximo com as patinadoras participantes nessa modalidade, inspirou diversas
jovens na sua prática. Uma dessas atletas foi Maria Virgínia de Aguiar, da Associação
Académica da Amadora, que alcança o título de Rainha do Patim de 1950 (Lopes, 1950-
1953, n.º 1, p. 2).
Figura 2 - Símbolo da
Associação Académica
da Amadora.
28
A Associação Académica da Amadora não estava só vocacionada para o desporto: a
faceta cultural ficou bem patenteada na fundação de uma biblioteca para sócios, com
cerca de 900 obras, e na realização de diversos «serões culturais» caraterizados pela
visualização de documentários cinematográficos, conferências, palestras, recitais
poéticos, bailes de Carnaval, matinées e soirées (Pereira, 1950, p. 12). Em 1950, a
associação publica o seu primeiro volume do Boletim da Associação Académica da
Amadora, dirigido por Álvaro Simões Lopes e editado por Fernando Carreira.
No ano de 1951, a Associação tinha cerca de 1300 sócios, que se impunham aos 100
do Clube de Futebol Estrela da Amadora. Existem referências à hipótese de fusão entre
os dois clubes, o que nunca foi do interesse da Associação Académica da Amadora, que
via na modalidade do futebol uma ameaça ao investimento financeiro e ao
desenvolvimento das restantes modalidades (Lopes, 1950-1953, n.º 6, 1951, p. 2). Nesse
mesmo ano, foi organizado o Festival Desportivo, com a realização de jogos de hóquei
em patins e voleibol, e foi criada a seção de Campismo, com a absorção de onze
elementos do antigo Núcleo Campista da Amadora (Lopes, 1950-1953, n.º 7, 1951, p.
4).
Na primeira década de existência, a Associação operou sem pavilhões desportivos
próprios e, por esse motivo, os atletas treinavam nos espaços cedidos pelos Recreios
Desportivos da Amadora, só às sextas-feiras. Posteriormente, a realização de
espetáculos cinematográficos nesse local e no mesmo dia da semana, impediu que a
Associação ali prosseguisse com os seus treinos. Também existem referências à
utilização do campo de Jogos do Clube de Futebol Estrela da Amadora para a realização
de jogos de andebol (Lopes, 1950-1953, n.º 2, 1951, p.3)
Em 1951, a nomeação de uma «Comissão Pro-Rink» deu início a um projeto de
construção do tão desejado ringue, com a ambição daí se realizar o Campeonato do
Mundo de Hóquei em Patins (Lopes, 1950-1953, n.º 12, 1950, p. 3). Este espaço acabou
por ser inaugurado a 29 de agosto de 1953, com a presença do então Ministro da
Educação Nacional, Fernando Andrade Pires de Lima. (Lopes, 1950-1953, n.º 22, 1953,
p.1).
29
2.1.1. O património desportivo e os seus valores
No primeiro capítulo deste trabalho foram definidos e identificados os critérios de
incorporação de um objeto, do ponto de vista da sua utilização num contexto
museológico. Neste capítulo é realizada a identificação dos valores e narrativas,
associadas ao património desportivo, que possam auxiliar na definição do que constitui
um objeto útil, neste contexto.
Apesar do claro valor atribuído ao desporto, a facilidade com que este tem sido
associado ao lazer, ao fútil ou ao efémero (Bromberger, s.d., p. 1), poderá constituir o
motivo para não se ter ainda realizado um levantamento sistemático ou mesmo
classificado o património desportivo imóvel português, com exceção do estádio 1.º de
Maio de Braga, Monumento de Interesse Público desde 2012 (Portaria n.º 740-FO/2012,
DR, 2.ª série, n.º 252, de 31-12-2012)
Devido à proximidade temporal dos objetos associados a este tipo de património, o
seu descarte, substituição ou destruição é frequente (Wood, 2005, p. 138). Como
também se verificou durante o processo de insolvência da Associação Académica da
Amadora, ocasião em que a autarquia adquiriu o espólio do clube, mas descartou as suas
instalações, cuja importância se pode considerar enorme tendo em conta a sua história.
O património desportivo móvel tem sido reunido maioritariamente por
colecionadores privados de memorabilia ou pelos próprios clubes (Stroobant, 2011, p.
44; Wood, 2005, p. 139). Os critérios e motivações que permitem a construção destas
coleções poderão ser importantes indicadores dos valores atribuídos a este tipo de
objetos, mas nem sempre coincidem com as vocações ou missões das instituições
museológicas.
No domínio do valor simbólico, este tipo de património tem sido relacionado com o
sentimento de «nostalgia», estimulado por uma memória associada a um sentimento
positivo – tendo grande parte origem na época da infância – que contrasta com um
presente negativo ou com um futuro incerto. Essa memória pode nascer de dois tipos de
experiência: a direta e pessoal, referente ao momento, e a indireta ou histórica, que
chega ao sujeito através de relatos ou objetos que o remetem para outro tempo. É
possível então identificar três tipos de agentes da valorização. Dois estão relacionados
com a experiência direta: o primeiro é o caso dos atletas, dos treinadores ou da equipa
30
em geral; o segundo o dos adeptos e dos sócios, ou de quem assiste e apoia. O agente da
experiência indireta compreende todos os anteriores, na sua relação com um passado
que não tiveram oportunidade de vivenciar (Cho et al., 2014, pp. 15–16).
A definição destes agentes é da maior importância quando se considera o património
dos clubes extintos porque, ao deixar de existir a experiência direta, o valor simbólico
que lhe está associado tenderá a desaparecer juntamente com os últimos ex-atletas, ex-
sócios e adeptos.
Independentemente da natureza da experiência vivenciada, existem sempre
elementos que provocam um sentimento de nostalgia pelo património desportivo. No
entanto, se houver uma maior associação à experiencia direta, a nostalgia é despertada
pela memória da admiração, não só pelos clubes, mas também por atletas e treinadores
específicos; assim como pelos espaços onde decorreram as atividades, a sua ambiência
particular, os sons, os cheiros, ou mesmo o gosto da comida típica desse tipo de eventos.
A segunda dimensão caracteriza-se pelas memórias positivas de socialização, tanto
entre os atletas, como nos grupos que assistem a um evento desportivo. Os
inesquecíveis primeiros contactos com uma modalidade, através de amigos ou
familiares. Podem ainda definir-se uma terceira e uma quarta dimensões, que remetem
para a construção da identidade nas suas vertentes individual e coletiva (Cho et al,
2015).
No entanto, a ideia de que a cultura desportiva esteja estritamente ligada à nostalgia é
criticada por limitar a sua valorização a um passado idealizado e glorioso, da qual
derivam as atrações turísticas e os designados Halls of Fame. Esta perspetiva coincide
com uma visão positivista do desporto, que prioriza a eficácia e o rendimento, sobre o
culto ao corpo, que surge na segunda metade do século XIX (Costa, s.d., p. 102).
Atualmente, o património desportivo, tendo o museu como meio de divulgação,
priorizaria a educação sobre a veneração (Ramshaw and Gammon, 2005, pp. 237-238),
sendo possível uma distinção entre as narrativas que estão inseridas num universo
estritamente desportivo e as que o transcendem (Ramshaw and Gammon, 2005, p. 232).
O estudo das atividades desportivas constitui não só um contributo para a história da
recriação, mas também para a o estudo da Sociedade como um todo (Wood, 2005, p.
137), por serem transversais aos diversos grupos que compõem a cultura humana, no
espaço e no tempo (Costa, s.d., p. 101). É pertinente relembrar que neste universo não
31
estão apenas inseridas as atividades institucionalizadas, mas também os jogos
tradicionais dos diferentes povos, incluídos na Recomendação sobre a salvaguarda da
cultura tradicional e popular, da UNESCO (1989).
Paralelamente, o desporto institucionalizado, de uma forma análoga à museologia,
consiste numa ferramenta para o desenvolvimento das sociedades, tal como é descrito
na Carta Internacional da Educação Física e do Desporto (UNESCO, 1978) em que se
demarca o objetivo de:
[…] colocar o desenvolvimento da educação física e do desporto ao serviço
do progresso da humanidade, promover o seu desenvolvimento e incitar os
governos, as organizações não governamentais competentes, os educadores, as
famílias e os próprios indivíduos a nela se inspirarem, a difundi-la e pô-la em
prática. (UNESCO, 1978)
As instituições têm o dever de promover o desenvolvimento das «aptidões físicas,
intelectuais e morais», dos valores humanos fundamentais, da amizade e da cooperação,
da acessibilidade universal à atividade física. O desporto tem uma «função pedagógica e
sanitária» e a competição é uma ponte de união entre os povos.
Esta compatibilidade privilegiada entre as instituições desportivas e museológicas
fundamentou o aparecimento dos museus desportivos, como foi o caso do projeto de
musealização do Club Setubalense (Serafim, 2014).
Relativamente ao tipo de objetos relacionados com a prática desportiva que estão
suscetíveis a essa valorização, alguns autores apresentam diversas formas de
categorização.
Inserido na categoria de património imóvel, estão os edifícios e os sítios, como os
estádios, os hipódromos ou os refúgios de alpinistas (Bromberger, s.d., p. 4), assim,
como os locais de origem de um determinado desporto, evento ou de produção de
equipamentos desportivos (Ramshaw e Gammon, 2005, p. 234). Este é o caso da cidade
de Manchester, considerada como um foco de atividade desportiva, tem ainda pequenas
companhias que aplicam os métodos tradicionais de produção de tacos de lacrosse e é
também a origem de algumas empresas multinacionais do setor, como é o caso da
Reebok (Wood, 2005, p. 140). É possível ainda inserir nesta categoria o património
32
natural desportivo, associado, na sua grande maioria, às atividades que implicam uma
vitória do ser humano sobre a hostilidade da Natureza, da qual, entre outros, o Monte
Evereste se pode considerar um exemplo (Stroobant, 2011, p. 48).
Relativamente à categoria do património móvel, Bromberger (s.d., pp. 5-6) distingue:
1) As representações artísticas (Belas-Artes).
2) Os arquivos audiovisuais em formato fotográfico e videográfico.
3) Os objetos e gestos emblemáticos do desporto, onde se inserem os equipamentos
e os instrumentos desportivos, as taças, os troféus, as medalhas, assim como os
galhardetes e as bandeiras dos adeptos;
4) Os textos impressos e publicados, que incluem a documentação pública, como os
cartazes e os bilhetes, assim como a privada, como os contratos dos jogadores ou
o registo das suas dietas alimentares.
Na sua dissertação de mestrado, Anne Stroobant adota uma categorização
semelhante, mas expande o grupo das representações artísticas aos «selos e cartazes».
Cria o grupo «documentos históricos», em que agrupa os arquivos audiovisuais, os
textos impressos e as manifestações imateriais, como hinos, cânticos e outros
testemunhos orais. Adicionalmente, considera outra categoria intitulada de «produtos
derivados», que compreende os objetos efémeros, frequentemente associados a
atividade comerciais, como «cartazes publicitários, produtos de marketing, objectos
decorativos e bijutaria com motivos de desporto, coleccionáveis de todo o tipo»
(Stroobant, 2011, p. 48).
33
2.2. Características gerais do espólio e abordagem inicial
Como referimos anteriormente, o espólio da Associação Académica da Amadora foi
adquirido pela Câmara Municipal da Amadora, através de compra num leilão, no dia 26
de novembro de 2014, resultante do processo de insolvência do clube (Assembleia
Municipal da Amadora, 2014).
Numa primeira análise, podemos verificar a existência de um grande número de
objetos, de carácter heterogéneo, composto maioritariamente por taças e troféus.
As descrições existentes dos espaços de depósito da Associação indicam que a
maioria dos objetos estaria numa arrecadação, sem qualquer tipo de suporte, assente
diretamente no chão; outros estavam expostos e distribuídos por diversas salas e
gabinetes. Através de um exame organolético inicial, foi possível identificar sujidade
superficial e a presença de colonização biológica, composta por aracnídeos e insetos
xilófago, no interior da madeira que constitui as bases das taças, assim como a
existência de processos de corrosão ativa nos metais e ligas constituintes de algumas
taças.
Para o processo de transferência, entre instituições, os objetos foram acondicionados
em caixas de papelão pelos funcionários do Museu Municipal de Arqueologia. A
necessidade de se agilizar este processo, resultou numa associação pouco cuidada dos
objetos à informação existente sobre a sua história e contextualização. Algumas caixas
tinham escrito no exterior a modalidade correspondente, mas a maioria não tinha
qualquer identificação. De um modo geral, verificámos que as caixas continham objetos
de diversas modalidades, sendo óbvia a separação entre os objetos mais antigos e os
mais recentes.
Nessa ocasião, também foi adquirido um inventário antigo do espólio, realizado pela
própria Associação, contendo referência a objetos relativos ao período entre 1942 e
1987. Este documento revelou-se um instrumento fundamental para combater a
dissociação de fragmentos e da informação relativa aos objetos ali referidos.
Já em reserva, o primeiro contacto com o espólio baseou-se na metodologia de
preservação sistemática aplicada no Museu Cosme Damião (Basto et al., 2012). Este
processo englobou duas ações distintas: a higienização e o acondicionamento, tendo
em vista a implementação imediata de estratégias de conservação; e o registo do
34
espólio, que englobou o levantamento fotográfico e a compilação de dados existentes e
das características dos objetos.
Para o efeito, e como já referimos, a Câmara Municipal da Amadora criou uma
atividade entre os dias 4 e 26 de julho de 2016, denominada «Conservação de
Património Desportivo», inserida no projeto «Férias na Cidade». Nesta atividade
orientámos dois turnos de dez jovens, com idades entre os 16 e os 25 anos. Apesar desse
esforço, e considerando a dimensão do espólio, este período de tempo não foi suficiente
para completar todo o processo, tendo o restante sido realizado pela autora deste
trabalho, entre os meses de outubro de 2016 e janeiro de 2017. Este processo foi
realizado em cadeia, atravessando as seguintes fases:
1. Atribuição de número de inventário: tratando-se de uma atividade em cadeia,
com diferentes pessoas envolvidas, este passo permitiu que cada objeto
progredisse por todo o processo, diminuindo o risco de dissociação ou confusão
entre objetos.
2. Registo fotográfico inicial: levantamento fotográfico do estado de conservação
dos objetos que precedeu a higienização. Foram registadas as vistas frontal,
posterior e laterais dos objetos tridimensionais, ou frente e verso, no caso de
objetos bidimensionais. Todos as fotografias foram acompanhadas por uma
escala.
3. Higienização: limpeza mecânica e a seco, com o objetivo de se retirar a sujidade
acumulada à superfície, com ajuda de pincéis de cerdas macias, panos de
microfibras e aspirador.
4. Registo fotográfico final: depois da higienização os objetos foram fotografados,
seguindo os mesmos procedimentos do registo inicial, com a adição do registo de
alguns pormenores de maior relevância.
5. Inventário: preenchimento da ficha de inventário criada pelo Museu Municipal de
Arqueologia.
6. Acondicionamento: cada objeto foi acondicionado num saco de polietileno. O
número de inventário foi colado na zona interior do saco e os sacos não foram
selados para se evitar a condensação no seu interior. Posteriormente, os objetos
foram organizados por modalidades.
35
2.3. Metodologia de análise
A metodologia aqui desenvolvida deve ser interpretada como um exercício, não se
considerando relevante determinar se este museu contém, de facto, as condições
necessárias à incorporação desta coleção. Tivemos como objetivo a elaboração de um
relatório que possa ser comparado com a política de incorporações e a um Facilities
Report de qualquer instituição que se propusesse incorporar este espólio nos seus
acervos. A nossa metodologia foi construída para poder ser aplicada ou adaptada a
situações análogas, ou com características semelhantes às apresentadas: a incorporação
de um espólio de grandes dimensões com pouca informação associada. Este processo
decorreu tendo em vista três objetivos:
1. Caracterizar o espólio da Associação Académica da Amadora e compreender os
critérios aplicados pelo clube na construção desta coleção – capítulo
«Caracterização do espólio»;
2. Avaliar o impacto desta incorporação numa instituição museológica – capítulo
«Avaliação do impacto da incorporação»;
3. Apresentar propostas para a incorporação e construção da coleção, no seio do
Museu Municipal de Arqueologia da Amadora – capítulo «Propostas».
A obtenção de resultados decorreu de análises quantitativas e comparativas dos
dados extraídos dos campos que constituem a ficha de inventário (Anexo 1), que o
museu elaborou para o registo deste espólio. Inicialmente, esta ficha priorizava a
contagem e a classificação dos elementos constituintes do espólio, a diminuição da
dissociação entre fragmentos, a transcrição das informações contidas nos objetos e a
identificação do seu estado de conservação. Para atingir todos os objetivos propostos,
no decorrer deste trabalho foram adicionados novos campos tendo em vista a obtenção
de dados relativos aos requisitos de acondicionamento, a diminuição da dissociação
imaterial, assim como outros campos complementares aos existentes. A base de dados
que resultou deste estudo foi construída a partir do software Microsoft Office Access.
Objetivo 1 – Caracterização do espólio
A caracterização deste espólio consistiu num passo indispensável para o
cumprimento dos outros dois objetivos.
36
Não seria possível avaliar o impacto desta incorporação, sem se definir o número
total de objetos que constituem este espólio; ou apresentarem-se propostas para o seu
futuro, sem conhecer as suas diversas tipologias, a informação contextual inscrita na sua
matéria ou os critérios que fundamentaram o crescimento desta coleção.
Apesar de o objetivo de se saber a quantidade de objetos que constituem o espólio,
ser facilmente concretizado através da contagem dos números de inventário,
verificámos a existência de fragmentos dissociados do seu objeto original (como asas,
tampas e bases), com números de inventário individuais. Este facto implica que a
quantidade real de objetos será menor do que a indicada por esse valor. Por esse motivo,
este estudo iniciou-se, obrigatoriamente, pela diminuição da dissociação material,
através da criação de campos que permitissem encontrar a correspondência desses
fragmentos. Evitando a sua futura incorporação separada e, consequentemente, a
existência de dois ou mais números de inventário diferentes, para um mesmo objeto.
Inicialmente, esta questão já era uma das preocupações do museu, sendo possível
identificar na primeira versão da ficha de inventário alguns campos destinados a esse
fim:
<gravação na placa> Transcrição dos elementos inscritos em placas ou
autocolantes com propósito análogo.
<dimensões da
placa>
Dimensões da placa dissociada ou das marcas vestigiais nas
bases, que comprovam a sua ausência.
<diâmetro da tampa> Diâmetro da tampa dissociada.
<diâmetro da boca> Diâmetro de todas as bocas de taças.
<integridade> Indicar se um objeto contém fraturas ou lacunas.
Tabela 1 - Campos originalmente contemplados na ficha de inventário do museu, com o intuito de
diminuir a dissociação material.
No decorrer deste processo, como resultado da reflexão no contexto desta
dissertação, ao campo da <integridade> foi adicionada uma diferenciação entre
«fragmentação» e «dissociação», permitindo diferenciar aqueles objetos que estão
fragmentados/fraturados, mas completos, daqueles que contêm lacunas. Para facilitar o
37
cruzamento de dados foram ainda criados dois campos designados <tipologia do
fragmento> e <fragmento em falta>, que permitiram uma identificação mais imediata
dos diversos fragmentos existentes.
Este método possibilita apenas a criação de uma lista de possíveis correspondências,
não permitindo a identificação indubitável do fragmento que se procura. Tomando como
exemplo uma asa dissociada, facilmente se identifica, entre o leque de taças que
apresentam vestígios de solda na copa, a correspondência. O mesmo não poderá ser
feito em relação às tampas dissociadas, porque não é possível perceber, através da
observação direta, as taças que teriam esse elemento inicialmente. A solução encontrada
passou por diminuir o número de taças a que cada tampa poderá corresponder, através
de uma relação entre os seus diâmetros.
No decorrer do processo verificámos que alguns objetos estavam marcados, através
de um autocolante com um número de inventário. Após a descoberta do livro de
inventário antigo, numa das caixas que continham o espólio, foi possível adicionar outra
estratégia destinada ao combate da dissociação material, a partir do cruzamento de
informação contextual. Existem taças que contêm informação na copa, mas na sua base
não existe placa ou esta constitui uma lacuna. Nos casos em que uma dessas bases
apresentava um autocolante legível, foi possível confrontar a informação extraída do
livro com aquela transcrita para a base de dados. O mesmo método foi aplicado às
placas dissociadas. A existência desse livro permitiu ainda reassociar outra informação,
que não estava explícita nos objetos.
Sempre que nos referimos à informação transcrita para a base de dados, esta
consistiu num levantamento das informações inscritas em placas, copas de taças, faces
de medalhas, impressas em galhardetes ou descritas no inventário antigo. O inventário
inicial do museu continha campos destinados à recolha desse tipo de informações:
<modalidade> Modalidade desportiva a que o objeto está relacionado, se
aplicável ou conhecida.
<nome do evento> Nome do evento desportivo a que se refere o objeto, se
aplicável.
<organização> Nome da(s) entidade(s) que organizaram o evento.
38
<data do evento> Data do evento desportivo.
<época desportiva> Época desportiva em que está inserido o evento.
<local> Local onde se realizou o evento.
<prova> Prova realizada, inserida na modalidade (ex.: partidas rápidas
ou semirrápidas (xadrez); pesca de rio ou mar; em equipa ou
individual).
<escalão> Escalão etário dos atletas.
<categoria> Nível competitivo do atleta ou equipa.
<género> Género dos atletas.
<classificação> Classificação do atleta/equipas comprovada pelo objeto.
Tabela 2 - Campos originalmente contemplados na ficha de inventário do museu, com o intuito de
recolher a informação contextual escrita nos objetos.
Considerámos a informação do primeiro campo de maior relevância, pois permite
apontar os potenciais agentes de valorização. É importante referir que nem todos os
objetos estão associados a uma modalidade, sendo, nesse caso, relevantes para o clube,
de um modo geral.
Adicionámos um campo destinado ao registo do <número de inventário antigo> e
outro, denominado <função>, que permitiu definir a relação que esses agentes têm com
os objetos. Procurámos caracterizações objetivas, que refletissem o motivo de existência
de determinado objeto, não se compreendendo aqui o valor simbólico a ele associado,
porque este não é intrínseco e os objetos raramente o transmitem. Durante a sua
determinação, tivemos em consideração as categorias descritas no capítulo dedicado aos
valores atribuídos ao património desportivo. Considerando que este espólio é composto
na sua totalidade por objetos móveis e essas categorias pouca distinção fazem entre os
diversos tipos possíveis, optámos por criar outras especificações:
Classificação
Servem como testemunho de classificação numa prova,
independentemente da posição em que o atleta/equipa ficou
colocado/a.
Participação Testemunham a participação num evento, sem que lhes esteja
39
associada uma classificação.
Comemoração /
Homenagem
Comemorativos de datas relevantes ou que se destinam a
homenagear o clube pelo seu aniversário ou contribuição
desportiva.
Símbolos / Heráldica Representam símbolos ou brasões, em que estão inseridos os
galhardetes e os instrumentos de claque.
Técnica Equipamentos utilizados pelos atletas/árbitros na prática
desportiva.
Documental
Documentos audiovisuais ou impressos, que compreendem os
registos intencionais ou não intencionais do universo do
clube.
Divulgação Publicitam um evento ou o clube.
Indeterminada Aplicada a objetos que apresentam dúvidas relativamente à
sua função.
Tabela 3 - Descrição das categorias funcionais definidas para os objetos.
Finalmente, o inventário inicial previa também o registo da <tipologia> de cada um
dos objetos. Esta categorização, em relação com as funções, permitirá fazer uma
caracterização deste espólio e compreender os critérios que motivaram esta coleção,
aplicados pelo clube, no seu período de atividade.
Objetivo 2 – Avaliação do impacto da incorporação
Segundo os dados obtidos na primeira parte desta dissertação, relativos aos requisitos
de preservação dos objetos em museus, foi possível identificar quatro parâmetros para a
avaliação do impacto:
O cálculo do volume total do espólio, que permitirá definir o número de
estantes necessárias ao seu acondicionamento, assim como a área de reserva
que estas ocuparão;
O estado e conservação do espólio, que permitirá determinar os objetos que
necessitam de intervenções de conservação e restauro;
40
O tempo e os recursos humanos despendidos na higienização e documentação
dos objetos;
O custo de manutenção de cada objeto a longo prazo, que constitui um dado
indispensável para a prática da gestão museológica e que necessita de uma
investigação mais aprofundada, tendo em vista a criação de metodologias de
avaliação e cálculo. Por esse motivo, não integrará esta avaliação.
A metodologia de acondicionamento aqui proposta partiu das necessidades dos
objetos encontrados, daí se extraindo as características dos equipamentos e
infraestruturas necessários. Para tal, foi utilizada uma abordagem por múltiplas camadas
de proteção de um objeto (NPS Museum Management Program, 2012, p. 2):
1. Material de acondicionamento: está em contacto direto com o objeto. Este
depende da conformação e dimensões do objeto. Em sistemas de microclima,
depende ainda dos materiais constituintes.
2. Contentor: caixa ou gaveta que contém o objeto, podendo este espaço ser ou não
partilhado com outros objetos. Tal como no ponto anterior, este contentor
depende da conformação e das dimensões do objeto.
3. Suportes: estrutura onde são colocados os contentores, dependendo do espaço
ocupado pelos mesmos.
4. Sala: paredes interiores do edifício, que constituem a sala onde os suportes são
colocados. Em sistemas de controlo ambiental mecânico, estes espaços são
condicionados pelas condições de conservação dos materiais constituintes.
5. Edifício: paredes exteriores do edifício onde está implementada a reserva. Para o
contexto apresentado, não constituí uma variável, logo não será considerado.
O controlo ambiental através de microclimas na primeira camada foi prática comum
na primeira metade do século XX, tendo sido substituída pelo controlo mecânico de
desumidificadores e sistemas de ar condicionado (Michalski, 2016, pp. 10-11). Isto
significa que os materiais constituintes dos objetos estarão relacionados com a quarta
camada, ou a sala onde estão acondicionados. Nesta metodologia será adotada a
segunda opção, que coincide com a utilizada no museu que acondicionará este espólio.
Partindo do esquema de camadas é possível identificar os três tipos de dados cuja
extração é necessária para a definição de uma estratégia de acondicionamento: as
dimensões totais, o material constituinte e a quantidade de objetos. Relativamente à
41
forma do objeto, neste estudo consideramos que corresponde às suas dimensões totais,
tendo como objetivo o seu acondicionamento numa caixa.
A quantidade será determinada através da concretização do primeiro objetivo, como
foi referido anteriormente. A ficha de inventário original do museu continha um campo
para a identificação do material constituinte das bases das taças ou troféus, com o
objetivo de identificar os objetos propensos à infestação por inseto xilófago, tendo sido
necessário adicionar dois novos campos: <dimensões totais> e <outros materiais>
constituintes em elementos para além da base.
O cálculo dos espaços baseou-se no método criado por Sue Walston e Brian Bertram,
no seu artigo intitulado Estimating Space for the Storage of Ethnographic Collections.
Desta forma, foi possível determinar o número de estantes que o museu necessita para
acondicionar o espólio, assim como a área de pavimento que estas ocupam na reserva.
O primeiro passo, que foi igualmente o maior desafio, constituiu a escolha da
organização do espólio. A disposição ideal toma como prioridade os requisitos
ambientais dos objetos, no entanto, funcionalmente, seria preferível organizá-lo
consoante o tamanho dos objetos, o espaço disponível ou segundo a forma como a
coleção será futuramente utilizada (Simmons, 2013, p. 240).
Percebemos que procurar um maior aproveitamento do espaço, organizando os
objetos por alturas semelhantes, resulta numa dispersão total dos objetos, que fariam
mais sentido numa relação de proximidade. No entanto, ao separar unicamente através
de uma lógica de conjunto – por materiais constituintes, por modalidades ou por
tipologias – o número de prateleiras e, consequentemente, de estantes necessárias ao
acondicionamento dos objetos aumenta consideravelmente. Paralelamente, quando
considerada a totalidade do espaço que sobra, constatamos que esta corresponde a
diversas prateleiras vazias. Esse facto não é assim tão problemático, quando se
considera a necessidade de planear a possível expansão da coleção, um parâmetro que,
no artigo anteriormente referido, é calculado através da adição de 20% do volume atual,
para uma margem de tempo de 10 anos (Walston e Bertram, 1992, p. 140). Essa
percentagem não foi aplicada nos cálculos efetuados neste estudo e, em contrapartida,
houve uma maior liberdade para atribuir mais coerência à organização do espólio, que
resultou na elaboração de distintos conjuntos.
42
O suporte escolhido para esta arrumação hipotética e idealizada foi uma estante, com
prateleiras ajustáveis, com as dimensões: 200x100x50 cm (altura x largura x
profundidade). Este modelo, que também é utilizado pelos autores do método, é um dos
mais comuns e acessíveis, permitindo chegar a resultados mais realistas. A altura das
prateleiras corresponde a múltiplos de 10 cm. Sempre que estas tivessem uma altura
entre os 5 e os 10 cm, determinou-se que seria preferível trocá-las por gavetas, por
considerarmos ser mais seguro que objetos de pequenas dimensões estejam confinados a
um espaço que os contenha. Por outro lado, torna-se difícil manipular objetos em
prateleiras de altura tão reduzida.
Após ter sido definida a organização – que será apresentada e fundamentada no
próximo capítulo – calculámos o número de prateleiras necessárias, tendo em
consideração que cada uma tem a capacidade de acondicionar uma área correspondente
a 5000 cm2 (100x50 cm). Para cada conjunto, calculámos a área ocupada pelos
diferentes objetos (através do produto da sua largura e do seu comprimento) e
organizámos os elementos por ordem decrescente de altura. À área foi adicionada uma
margem, correspondente ao espaço entre objetos no interior da prateleira, multiplicando
o seu valor por um fator de 1.3, cujo resultado foi arredondado às unidades (Walston e
Bertram, 1992, p. 140).
Partindo sempre dos elementos de maior altura, colocámos objetos até perfazer a área
determinada para cada prateleira. A altura do objeto de maiores dimensões determinou a
altura da prateleira. Por exemplo, se o objeto mais alto medir 54 cm, a prateleira terá 60
cm de altura. Na maioria das vezes, a última prateleira ou gaveta não ficou com a sua
área totalmente preenchida.
Tendo determinado o número total de prateleiras, somámos os produtos dos números
de prateleiras e das suas alturas. Considerando, por exemplo, que seriam necessárias 9
prateleiras de 20 cm e 8 prateleiras de 30 cm: perfazia-se um total de 420 cm. Deste
cálculo resultou a altura total do conjunto de prateleiras, que ao ser dividido pela altura
de uma estante, permitiu determinar o número total de estantes necessárias.
O espaço ocupado pelas estantes na área de reserva depende da conformação
definida para as mesmas, sendo impossível determinar concretamente qual será,
obrigando esse estudo à divulgação das plantas da reserva do museu. É possível, no
entanto, definir uma distância ideal entre fileiras de estantes, que corresponde à largura
43
de cada uma, possibilitando a manipulação de um eventual objeto que a preencha
totalmente. Este valor é apresentado como o mínimo necessário, sendo aconselhada uma
distância maior (Walston e Bertram, 1992, p. 141).
Com o intuito de se determinar o estado de conservação dos objetos, a versão
original da ficha continha os seguintes campos:
<estado> Permitia selecionar uma de três opções: 1. necessita de conservação
e restauro; 2. com conservação; 3. com conservação e restauro.
<corrosão> Identificação de produtos de corrosão.
<infestação> Identificação de infestação de inseto xilófago ou de
microrganismos.
Tabela 4 - Campos originalmente contemplados na ficha de inventário do museu, com o intuito de se
aferir o estado de conservação.
O primeiro campo reflete a intenção do museu em tornar este inventário definitivo,
ao acrescentar a possibilidade de um objeto ser submetido a uma intervenção de
conservação ou restauro. Considerámos, para os objetivos definidos no âmbito deste
trabalho, que apenas a primeira opção faria sentido, com o intuito de identificar aqueles
objetos que necessitam desse tipo de investimento. As duas patologias presentes na
ficha foram especialmente selecionadas, por terem sido os dois principais problemas
identificados numa primeira abordagem à coleção, aliados à já referida fragmentação e
dissociação dos diferentes elementos. Os objetos infestados foram imediatamente
separados do restante conjunto e colocados em quarentena, evitando-se a propagação
dos insetos pela restante coleção.
Devido à probabilidade de surgirem outros tipos de patologias, foi adicionado um
campo designado <observações>, destinado ao seu registo ou ao de outras
particularidades relativas ao seu estado de conservação. Este método permite uma
descrição mais pormenorizada do estado de conservação, mas dificulta a extração da
informação necessária, para uma determinação mais concreta de futuras intervenções
necessárias. Teria sido mais funcional adicionar novos campos que contemplassem cada
uma das patologias encontradas, consoante estas fossem surgindo.
44
Finalmente, foi possível obter alguns dados estatísticos referentes ao tempo médio
despendido na higienização, no levantamento fotográfico e na elaboração da
documentação museológica. Estes permitem estimar o tempo e os recursos humanos
que serão necessários despender em incorporações futuras. Segundo o CIDOC, 30
minutos é o tempo mínimo estimado, para o registo de um objeto (Crofts, 2012). Como
este valor é apresentado sem qualquer metodologia que o fundamente, foi feita uma
comparação com o tempo despendido na elaboração deste registo, sendo apenas
considerando o período em que a autora desta dissertação trabalhou individualmente.
Figura 3 - Síntese esquemática da relação entre os campos da ficha de inventário. Os elementos a azul
constituem as adições posteriores à reflexão realizada neste trabalho.
Objetivo 3 - Propostas
O capítulo destinado a este objetivo inicia-se por uma pequena caracterização da
instituição, seguida por uma análise crítica à sua política de incorporação, com
sugestões para a sua atualização.
É feita uma comparação entre essa política de incorporação e os dados obtidos
durante o processo de caracterização e avaliação do impacto, tendo em vista a exclusão
dos objetos que não se inserem nos critérios aí apresentados. Este processo depende da
determinação de objetos que contêm especiais fragilidades, relativamente à ausência de
elementos contextuais. Esta falta é determinada pelo desconhecimento da modalidade a
que pertence e/ou a função que teria no universo do clube.
45
1835
98
338
Restituídos Dissociados
Adicionalmente, são apresentadas algumas sugestões para a seleção deste espólio,
aliando-se as «características do objeto inútil», definidas na primeira parte desta
dissertação, com as particularidades desta coleção. Por fim, são apresentadas algumas
propostas para o crescimento desta coleção, tendo em conta algumas das lacunas
identificadas.
2.3.1. Caracterização do espólio
Após a finalização do registo, foi compilado
um total de 2 271 objetos. Dos 1 032 registos do
livro de inventário antigo encontrámos a
correspondência de 528 objetos, ou seja, cerca de
51%. Relativamente à associação dos diversos
fragmentos, os dados são apenas relativos àqueles
casos em que foram encontradas
correspondências, após já lhe ter sido atribuído
um número e registo no inventário. Por esse
motivo, outros objetos que estavam inicialmente
dissociados, mas que foi possível encontrar a sua
correspondência imediatamente, não estão incluídos nestes dados estatísticos.
Tendo em conta os resultados do gráfico, existem 338 objetos dissociados e foram
restituídos 98 fragmentos. Por esse motivo, determinámos que o espólio é atualmente
constituído por 2 222 objetos, constituindo a diferença entre o número inicial e os 49
pares. A maioria das correspondências foram efetuadas a partir da relação entre o livro
antigo e os elementos transcritos dos objetos, por este método permitir um cruzamento
mais imediato e fiável das informações.
Gráfico 1 - Quantidade de objetos
dissociados e restituídos.
46
Gráfico 2 - Relação entre objetos dissociados e possíveis correspondências.
Até ao momento, ainda não foi possível afirmar quais destes objetos estão, de facto,
dissociados e quais são simplesmente lacunas, que precedem a entrada deste espólio no
museu. Analisando os dados no Gráfico 2, é possível verificar que existe alguma
coincidência entre os fragmentos dissociados e as lacunas existentes, não sendo, porém,
total. Como foi previsto, o maior desafio corresponderá à futura restituição das tampas,
o que, em alguns casos, apenas será possível através de uma caracterização química das
ligas existentes (Figueiredo et al., 2013).
Para uma melhor sistematização da informação, aplicámos 48 designações
tipológicas diferentes. No entanto, como se pode verificar na tabela seguinte, este
espólio é maioritariamente constituído por taças, troféus, placas e medalhões
comemorativos, medalhas, galhardetes e crachats.
Designação Quantidade
Taça 1063
Troféu 259
Medalha 130
Placa 102
Medalhão 100
Galhardete 88
Crachat 62
Salva 20
Taça-troféu 13
Prato 11
0
20
40
60
80
100
120
140
Existentes Em falta
47
Fotografia 10
Azulejo 8
Fita 8
Jarra 7
Cartaz 6
Diploma 6
Faixa de tecido 6
Pirâmide de vidro 6
Emblema 5
Carreto 4
Equipamento 4
Anzol 3
Boia 3
Brasão 3
Pote 3
Documentação do clube 2
Bandeira 2
Cone de vidro 2
Miniatura 2
Ovo de cerâmica 2
Patins 2
Porta-chaves 2
Temporizador 2
Travessa 2
Alfinete 1
Ânfora 1
Cachecol 1
Colher 1
Copo 1
Miniatura de stick de hóquei 1
Notícia em jornal 1
Boneco de peluche 1
Quadro 1
Raquete de barro 1
Relevo pintado à mão 1
Relógio 1
Suporte de vela 1
T-shirt 1
Vaso 1
Tabela 5 - Relação entre as designações dos objetos e as suas quantidades. Nesta lista não estão incluídos
os fragmentos dissociados, que não permitem identificação concreta da tipologia.
Tendo em conta a distinção dos objetos por funções, identificámos uma quantidade
elevada de objetos de classificação. Suspeitamos que, os objetos cuja identificação
apresenta algumas dúvidas (indeterminada), estarão, na sua maioria, inseridos na função
de participação.
48
Função Quantidade
Classificação 1033
Indeterminada 728
Participação 180
Comemoração / Homenagem 146
Símbolos / Heráldica 97
Técnica 19
Documental 13
Divulgação 6
Tabela 6 - Relação entre as funções definidas e a quantidade de objetos.
Considerando os dados apresentados, relativamente às tipologias e funções dos
objetos, este espólio parece ter resultado de uma acumulação de elementos que
resultaram da participação em eventos, tanto ao nível da classificação, como das
pequenas lembranças e galhardetes oferecidos pelos seus organizadores. Os objetos
inseridos na função documental estão, na sua maioria, registados no inventário antigo,
tendo sido pequeno o investimento nesse tipo de objetos.
Relativamente ao número de modalidades, foram identificados dezoito tipos
diferentes: o andebol, o basquetebol, o bilhar, a columbofilia, as corridas de patins, a
fotografia, o futebol, o futebol de salão, a ginástica, o hóquei em patins, o judo, o karaté,
a luta greco-romana, a patinagem artística, a pesca desportiva, o ténis de mesa, o
voleibol e o xadrez.
Como foi referido anteriormente, em algumas caixas que continham os objetos
encontrava-se escrita a modalidade a que correspondiam. Desta forma, foi possível
identificar essa categoria em certos elementos, que, de outro modo, não teriam nenhuma
identificação. Dentro de uma das caixas identificadas por «ginástica» foram encontrados
diversos galhardetes, provavelmente trocados por atletas dessa modalidade. Associar o
galhardete à modalidade é importante para reconstruir a sua história no clube, pois
determina os locais e os adversários com que esta estabeleceu uma relação. Em alguns
casos, até é possível prever, quando é que o galhardete foi adquirido, através da sua
relação com outros objetos e com a documentação existente.
49
Gráfico 3 - Relação entre as modalidades e a quantidade de objetos.
Foram adicionadas outras duas categorias com a designação «Clube» e «Geral», que
correspondem aos objetos que representam a Associação Académica da Amadora e o
seu relacionamento com outros clubes, respetivamente. A parcela de objetos cuja
modalidade ficou definida como «Desconhecida», por não existir informação suficiente
que permitisse compreender onde é que os mesmos se poderiam inserir, compreende um
total de 377 objetos.
Partindo destes dados é possível concluir que a modalidade de hóquei em patins tem
maior relevo do que as restantes, seguida pela ginástica, pelo xadrez, pela pesca
desportiva e pelo ténis de mesa. Com menor relevo, identificam-se as modalidades de
andebol, basquetebol, futebol de salão e judo. As restantes refletem uma participação
pontual, ou apenas durante um curto espaço de tempo, não sendo, à primeira vista,
representativas desta associação desportiva.
É importante evidenciar que, provavelmente, a Associação Académica da Amadora
apenas reteve as classificações coletivas, podendo estas relações mudar, caso se
adicionem as classificações individuais dos atletas, em modalidades que o prevejam.
Esta situação é comprovada pelo número reduzido de objetos de função classificativa,
47
57
377
1
2
3
4
4
5
8
8
9
26
29
30
42
213
196
215
283
663
0 100 200 300 400 500 600 700
Geral
Clube
Desconhecida
Karaté
Fotografia
Columbofilia
Corridas de Patins
Luta Greco-Romana
Futebol
Bilhar
Patinagem Artística
Voleibol
Judo
Basquetebol
Futebol de Salão
Andebol
Pesca Desportiva
Ténis de Mesa
Xadrez
Ginástica
Hóquei em Patins
Quantidade
Mo
dal
idad
es
50
na modalidade de ginástica, sendo esta maioritariamente composta por troféus de
participação, assim como referências a provas em equipa, na maioria dos objetos de
classificação de pesca desportiva, ténis de mesa e xadrez.
Equipa Individual
Xadrez 89 5
Ténis de Mesa 86 1
Pesca Desportiva 46 1
Judo 12 0
Desconhecida 6 0
Ginástica 3 0
Luta Greco-romana 2 0
Corridas de Patins 1 0
Karaté 1 0
246 7
Tabela 7 - Comparação entre a quantidade de objetos de classificação, em equipa ou individual.
Finalmente, foi identificado um total de 70 objetos – 37 medalhas, 15 medalhões, 5
fitas e 13 crachats – que apresentam a mesma tipologia e a mesma gravação, podendo
estes ser considerados como redundantes no contexto do espólio.
Figura 4 - Conjunto de doze medalhas, aparentemente redundantes.
51
2.3.2. Avaliação do impacto da incorporação
Relativamente ao impacto espacial do espólio, foi escolhida uma organização por
objetos com uma conformação/tipologia ou materiais constituintes semelhantes.
Excecionalmente, foram organizados unicamente pela sua função, como é o caso de
alguns objetos de «Técnica». Foram excluídos do cálculo os pequenos objetos
dissociados e sem informação contextual, cumulativamente, para os quais se
contabilizou uma estante própria.
Foram definidos os seguintes grupos:
Grupos Material Conformação Função
Taças e troféus mistos x -
Medalhas mistos x x
Salvas e placas mistos x x
Crachats e medalhões metal x x
Têxteis tecido x -
Documentos gráficos papel x x
Técnica - - x
Outros objetos - - -
Tabela 8 - Conjuntos definidos para determinação dos suportes necessário, em função das suas
características.
Taças e Troféus
Este grupo é constituído por diversos materiais: metal, madeira, MDF, pedra,
poliresina, acrílico e plástico. Tendo em conta que este tipo de objetos é composto, ou
seja, são constituídos por bases e topos de materiais distintos, a separação por matéria
implicaria a sua desconstrução física. Este tipo de procedimento resultaria num risco
elevado de dissociação entre os fragmentos, caso se viesse a perder o registo da sua
correspondência.
52
Devido ao risco dessa inevitabilidade, tomámos a
decisão de os agrupar pela sua tipologia, por
considerarmos ser esta uma organização lógica e
que, devido à sua conformação comum, permitia um
bom aproveitamento do espaço.
O maior desafio consistiu em tentar encontrar um
equilíbrio entre a utilização espacial e a
aglomeração dos objetos por modalidade. A soma
da área total ocupada por estes objetos corresponde a
366 869 cm2, o que implica, no mínimo, a ocupação
de 74 prateleiras, com 3 131 cm2 de espaço livre (Método 1). Uma organização que
agrupasse os objetos por modalidades resultaria na ocupação de 80 prateleiras, com 33
131 cm2 desocupados (Método 2).
Altura das
prateleiras (cm)
Quantidade
de prateleiras Altura total (cm)
10 1 10
20 5 100
30 18 540
40 26 1040
50 13 650
60 7 420
70 2 140
80 1 80
90 1 90
3070
Número total de estantes 16 (15,35)
Área livre (cm2) 3 131
Tabela 9 - Cálculo número de estantes necessárias para o acondicionamento de taças e troféus (Método 1).
Altura das
prateleiras (cm)
Quantidade
de prateleiras Altura total (cm)
10 0 0
20 3 60
30 21 630
40 27 1080
50 15 750
Figura 5 - Taça identificada como a
primeira adquirida pelo clube.
53
60 7 420
70 2 140
80 4 320
90 1 90
3490
Número total de estantes 18 (17,45)
Área livre (cm2) 33 131
Tabela 10 - Cálculo número de estantes necessárias para o acondicionamento de taças e troféus (Método 2).
Medalhas
Este grupo é constituído por medalhas de metal, com função de classificação que, na
maioria dos casos, contêm uma fita de tecido. Pelas mesmas razões apresentadas
anteriormente, a separação entre os dois materiais não seria aconselhável. Para a
determinação dos espaços ocupado por estes objetos não houve necessidade de
distinguir entre modalidades, porque todos eles têm uma altura (espessura da medalha)
semelhante. Foi definida para as gavetas uma altura de 5 cm.
Altura das
gavetas (cm)
Quantidade
de gavetas Altura total (cm)
5 4 20
Número total de estantes 1 (0,1)
Área livre (cm2) 2 982
Tabela 11 - Cálculo número de estantes necessárias para o acondicionamento das medalhas.
Salvas e placas
Este grupo é maioritariamente constituído por metais e, adicionalmente, por madeira
na base das placas. Todos têm em comum o seu carácter comemorativo e honorífico,
maioritariamente direcionado ao clube, assim como uma altura semelhante. Foram
definidas para o seu acondicionamento as gavetas com uma altura de 10 cm.
54
Altura das
gavetas (cm)
Quantidade
de gavetas Altura total (cm)
10 9 90
Número total de estantes 1 (0,45)
Área livre (cm2) 3 230
Tabela 12 - Cálculo número de estantes necessárias para o acondicionamento das salvas e das placas.
Crachats e medalhões
A maioria destes objetos é constituída por ligas metálicas, exceto um pequeno
número composto por acrílico, plástico ou PVC, sendo os seus tamanhos semelhantes.
Tendo em conta a pequena dimensão dos crachats, a individualização deste grupo
resultaria numa considerável área livre. A união com os medalhões permitiu um maior
aproveitamento do espaço. Apesar de se dividirem entre as funções «Comemorativa /
Homenagem» e «Participação», de modo geral, constituem um testemunho de
participação num determinado evento. A altura definida para as gavetas foi 5 cm.
Altura das
gavetas (cm)
Quantidade
de gavetas Altura total (cm)
5 2 10
Número total de estantes 1 (0,05)
Área livre (cm2) 1 436
Tabela 13 - Cálculo número de estantes necessárias para o acondicionamento dos crachats e dos
medalhões.
Têxteis
Este grupo é constituído maioritariamente por têxteis, como galhardetes,
equipamentos desportivos, faixas de classificação, bandeiras, um cachecol e um
pequeno número de galhardetes de PVC, com varetas estruturais de metal ou plástico. A
sua individualização é justificada por uma uniformidade nos materiais constituintes e na
conformação, de configuração plana. A altura definida para as gavetas consiste em 5
cm.
55
Figura 6 - Faixa de vencedor do Campeonato Nacional de Hóquei em Patins 1995/96.
Altura das
gavetas (cm)
Quantidade
de gavetas Altura total (cm)
5 14 70
Número total de estantes 1 (0,35)
Área livre (cm2) 2 177
Tabela 14 - Cálculo número de estantes necessárias para o acondicionamento dos têxteis.
Documentos gráficos
De forma semelhante ao grupo anterior, existe uma uniformidade no material
constituinte (papel ou papel fotográfico) e na conformação, tendo adicionalmente uma
função comum. Foi definida para as gavetas uma altura de 5 cm.
Altura das
gavetas (cm)
Quantidade
de gavetas Altura total (cm)
5 7 35
Número total de estantes 1 (0,175)
Área livre (cm2) 4 372
Tabela 15 - Cálculo número de estantes necessárias para o acondicionamento dos documentos gráficos.
56
Figura 7 - Temporizador de xadrez. Figura 8 - Anzol de pesca.
Figura 9 - Par de patins de Hóquei.
Técnica
Este grupo consiste no agrupamento dos objetos de função «Técnica», com exceção
dos equipamentos desportivos, que ficaram associados aos outros têxteis. Aqui estão
incluídos os patins de hóquei, os temporizadores de xadrez e as boias, os anzóis e os
carretos de pesca desportiva. Sendo possível acondicioná-los inteiramente numa só
gaveta de 20 cm de altura, considerámos que consistia num grupo coerente.
Altura das
gavetas (cm)
Quantidade
de gavetas Altura total (cm)
20 1 20
Número total de estantes 1 (0,1)
Área livre (cm2) 1 801
Tabela 16 - Cálculo número de estantes necessárias para o acondicionamento do grupo com função
técnica.
57
Figura 10- Peluche associado à modalidade de
ginástica. Figura 11 - Suporte de vela.
Outros objetos
Aqui estão inseridos os restantes objetos, que por terem tipologias específicas, não se
enquadram nos restantes grupos. Relativamente à sua função, consistem,
maioritariamente, em objetos comemorativos ou em testemunhos de participação em
eventos. É possível fazer uma separação por três grupos principais: cerâmica e vidro,
madeira e materiais variados. A título de exemplo, este último grupo compreende um
boneco de peluche, um suporte de vela em metal ou uma pintura naïf sobre tela.
Altura das
prateleiras (cm)
Quantidade
de prateleiras Altura total (cm)
10 4 40
20 1 20
40 1 40
100
Número total de estantes 1 (0,5)
Área livre (cm2) 3 841
Tabela 17 - Cálculo número de estantes necessárias para o acondicionamento dos objetos de tipologias
específicas.
Através destes dados é possível calcular o total de estantes necessárias. Tendo em
conta que todos os grupos apresentam um resultado em forma de fração, a sua soma
58
resultará numa estrutura mais compacta. No entanto, é importante considerar que estas
estantes não devem estar todas no mesmo espaço, devendo inserir-se em reservas
técnicas com as condições ambientais adaptadas cada tipo de material. Por esse motivo,
as prateleiras/gavetas que continham os «têxteis» e os «documentos gráficos» são
contabilizadas individualmente.
Objetos Quantidade de estantes
(Método 1)
Quantidade de estantes
(Método 2)
Taças e troféus 15,35 17,45
Medalhas 0,1 0,1
Salvas e placas 0,45 0,45
Crachats e medalhões 0,05 0,05
Têxteis 1 1
Documentos gráficos 1 1
Técnica 0,1 0,1
Outros objetos 0,5 0,5
Dissociados 1 1
20 (19,55) 22 (21,65)
Área de pavimento (m2) 10 11
Tabela 18 - Cálculo do número de estantes necessárias ao acondicionamento do espólio e da área de
pavimento ocupado pelas mesmas.
Tendo em conta os resultados, serão necessárias entre 20 e 21 estantes, que
correspondem a uma ocupação do pavimento entre 10 e 11 m2.
Relativamente ao estado de conservação do espólio, foram identificados quatro
principais problemas: dissociação, fragmentação/fratura dos objetos; infestação por
inseto xilófago; presença de produtos de corrosão nas ligas metálicas. Adicionalmente
foram identificadas fissuras e deformações em diversos elementos metálicos, resultantes
de forças físicas, fissuras nas madeiras e destacamento da tinta que cobre as bases, bem
como patines sobre as ligas metálicas (ver «outros», no Gráfico 4).
59
Gráfico 4 - Resultados da análise do estado de conservação do espólio.
Considerámos da maior urgência a interversão nos objetos que apresentam produtos
de corrosão ativa, assim como indícios de infestação de inseto xilófago, para se evitar a
sua destruição parcial ou total. Neste sentido, no segundo caso, o museu optou pelo
tratamento das madeiras através de uma bolha de desinfestação por anoxia8.
Figura 12 - Fotografia da bolha de anóxia.
8 Considerando o volume do espólio infestado, que correspondia a 5m3, optámos pelo método in situ.
358 399
346
189
338
1065
0
200
400
600
800
1000
1200
Corrosão /
Oxidação
Infestação Outros Fraturados Dissociados Sem
problemas
Qu
an
tid
ad
e d
e o
bje
tos
Patologias e agentes de degradação
60
Esta ação não exclui a necessidade de possíveis intervenções de consolidação, ou
mesmo substituição, de algumas bases estruturalmente afetadas pelos canais construídos
por estes insetos.
As intervenções para resolver as restantes patologias podem ser distribuídas ao longo
do tempo, não tendo um impacto imediato nos recursos financeiros do museu.
Por fim, apresentamos os dados relativos ao tempo despendido neste processo. Foi
feita uma contagem, num período de tempo que correspondeu a 364 horas, em que
foram realizados o registo fotográfico inicial e a higienização de 389, o inventário de
1095 e o registo fotográfico final de 800 objetos:
Ação Objetos (u) Total
horas
Total
minutos
Minutos / Objeto
Fotografia inicial 389 19 1140 2,9
Higienização 389 21 1260 3,2
Registo de inventário 1095 281 16860 15,4
Fotografia final 800 43 2580 3,2
25 (24,8)
Tabela 19 - Tempo despendido, por indivíduo, na higienização, no levantamento fotográfico e na
inventariação dos objetos.
Os cálculos determinaram um valor correspondente a cerca de 25 minutos por
objetos, incluindo todo o processo. Considerando a totalidade do espólio (2270),
corresponde a um total de cerca de 946 horas.
2.3.3. Propostas
A política de incorporação
O Museu Municipal de Arqueologia da Amadora, instituição detentora da coleção da
Associação Académica da Amadora, foi criado em abril de 1998, abrindo as suas portas
ao público em dezembro do ano seguinte. A 18 de maio de 2009, a Câmara Municipal
da Amadora publicou o Regulamento do Museu Municipal de Arqueologia, mais tarde
retificado, a 29 de abril do ano seguinte (Câmara Municipal da Amadora, 2010). Tendo
61
em conta estas datas, existem diversas informações que necessitam de atualização neste
documento; como as moradas e a denominação dos espaços, os horários do museu e os
seus órgãos de tutela. Por esse motivo, a informação aqui apresentada poderá não
coincidir com o que consta no documento referido.
Com uma vocação interdisciplinar – História/Arqueologia e Etnografia/Antropologia
– o museu assume como missão «a investigação, incorporação, documentação,
conservação, interpretação, valorização, divulgação e estudo do património histórico e
arqueológico da Amadora» (Câmara Municipal da Amadora, 2010, p. 2). A sua tutela é
pública, sob a administração local do Município da Amadora, dependendo da Divisão
de Intervenção Cultural, do Departamento de Educação e Desenvolvimento
Sociocultural, a sendo a sua abrangência territorial constituída por este concelho.
Segundo este regulamento, o museu foi concebido com uma estrutura polinucleada
evolutiva, compreendendo o Núcleo Museográfico do Casal da Falagueira9 e o Núcleo
Monográfico da Necrópole de Carenque, classificados, como Património Imóvel de
Interesse Municipal (Câmara Municipal da Amadora, 2006, p. 25) e Monumento
Nacional (Decreto n.º 26 235 de 20/01/1936), respetivamente. Adicionalmente, realiza
visitas à villa romana da Quinta da Bolacha, classificada como Imóvel de Interesse
Público (Portaria n.º 740-DI/2012, de 24 de dezembro de 2012), localizada num terreno
de propriedade é privada. Nos últimos anos, tem investido na escavação da necrópole
romana do Moinho do Castelinho e no estudo das suas estruturas e dos materiais
recolhidos (Encarnação et al., 2016).
Neste momento, o Núcleo Museográfico da Falagueira, estão patentes quatro
exposições permanentes e uma temporária. As permanentes intitulam-se «Da Pré-
história à Idade Média», «Amadora Rural – Aldeia da Falagueyra», «Aqueduto das
Águas Livres», que abordam a ocupação humana deste território e a consequente
alteração da sua paisagem, em diversos períodos históricos; e a «G.E.A.R. – Grupo de
Esquadrilhas de Aviação República», referente a uma unidade sediada na Amadora,
entre 1919 e 1938, no local de partida e chegada de diversas viagens às antigas colónias
africanas e asiáticas. A exposição temporária é dedicada à «A Fábrica de Espartilhos
9 Além de conter as exposições permanentes e temporárias, o Núcleo Museográfico do Casal da Falagueira constituí a
sede do Museu Municipal de Arqueologia desde a sua abertura em maio de 2008 (Câmara Municipal da Amadora,
2010, p. 2).
62
Santos Mattos», uma indústria que contribuiu para o desenvolvimento económico e
social desta região, entre 1895 e 1960.
O museu compreende ainda a reserva de materiais arqueológicos, o laboratório de
conservação e restauro, o arquivo de jazidas arqueológicas e uma biblioteca temática de
arqueologia, todos incorporados num edifício distinto, denominado como Reservas
Culturais da Amadora, na rua da Ordem Militar do Hospital, na Amadora.
Um protocolo com a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, da Universidade
Nova de Lisboa, prevê a utilização do laboratório do museu também como um espaço
de aprendizagem, através do estudo, inventário e divulgação dos materiais recolhidos,
assim como a própria prática de escavação, pelos alunos dos cursos de Arqueologia.
O regulamento do museu contém dois anexos:
I) «Política de Incorporações dos bens culturais do Museu Municipal de
Arqueologia da Amadora»;
II) «Normas e procedimentos de conservação preventiva».
A informação contida na «Política de Incorporações» será aqui analisada,
salientando-se as suas lacunas, em comparação com o normativo publicado em 2011,
pelo IMC10
, com o objetivo de se extraírem desta análise alguns critérios de seleção
para o espólio da Associação Académica da Amadora.
Como ponto de partida, deve ser referido o ponto 2, artigo 2.º, em que se encontram
definidos os seguintes objetivos:
a) Dar continuidade a uma política de bens culturais de acordo com a sua
vocação, imprimindo coerência, continuidade e enriquecimento do respectivo
acervo, nomeadamente materiais arqueológicos, azulejos, numária, fotografias
e outros objectos fundamentais à sua historia e contextualização.
b) Incorporar objetos que, embora possuam uma identidade singular,
possam contribuir para a valorização das colecções existentes e com elas, por
qualquer forma, se relacionem, evidenciando passos de um processo de
evolução.
(Câmara Municipal da Amadora, 2010, p. 13)
10
Vide Pinho, 2014, Vol. 2 (Anexos)
63
Sendo adicionados outros critérios no artigo 5.º, denominado «Requisitos de
Incorporação»:
a) Os objectos incorporados devem relacionar-se com os objectivos e
vocação deste Museu;
b) A incorporação deverá ser feita mediante prova da sua existência legal e
constituir uma mais valia para o seu acervo;
c) O estado de conservação dos bens culturais e museológicos deve ser bom
ou razoável, com excepção para os provenientes de intervenções
arqueológicas;
d) As incorporações sujeitas a condições especiais devem ser recusadas, se
as condições propostas forem consideradas contrárias aos interesses do
Museu e do seu público.
(Câmara Municipal da Amadora, 2010, p. 14)
Adicionalmente, no artigo 6.º, é referida a documentação e a informação necessárias
à incorporação nas diferentes modalidades, da qual se cita a compra, assim como os
requisitos de conservação:
2. No processo de aquisição, o vendedor deverá estar devidamente
identificado, possuir certificado e título de propriedade legal, além de um
conjunto de elementos que ajudem à classificação da obra: autenticidade,
identificação, autoria, dados relativos ao fabrico (quando se trate de
artefactos), região, percurso histórico, contexto social e cultural em que foi
produzido e valor estimado em termos de mercado.
[…]
8. Verificabilidade de condições espaciais e ambientais adequadas à
preservação do bem.
(Câmara Municipal da Amadora, 2010, p. 14)
64
Dos pontos transcritos, salientamos uma insuficiente descrição das características da
coleção, começando pelo «enquadramento temático e disciplinar», assim como pelas
«balizas cronológicas». É ignorada a existência das coleções de etnografia,
apresentando-se um museu de história e arqueologia e, consequentemente, não
explicando como as suas diferentes coleções se relacionam entre si. Da mesma forma,
não são identificadas as principais incorporações dos últimos dez anos, nem as lacunas
concretas das suas coleções ou os objetivos específicos de aquisição, tendo em vista o
seu preenchimento.
Uma análise cuidada do documento permite-nos compreender que foi procurada a
coerência que é proposta na Lei-Quadro dos Museus Portugueses, apesar de não ser
explícita uma reflexão sobre as coleções específicas deste museu, que assim se podem
considerar como «marginais»; e também não serem realizadas propostas para o seu
futuro. Neste contexto, expressões como «a incorporação deve constituir uma mais valia
para o seu acervo» acabam por se tornar vazias.
Relativamente às condições para a incorporação de bens, seria pertinente salientar a
importância da obtenção do historial completo dos objetos, de forma a se evitarem
aquisições ilegais. Pelo mesmo motivo, um documento desta natureza deveria também
indicar a necessidade das aquisições se enquadrarem na legislação nacional, assim como
convenções, tratados e acordos internacionais, especialmente aqueles que dizem
respeito ao tráfico ilícito de bens culturais ou de fauna e flora protegidas.
Estes aspetos refletem a necessidade de uma atualização do regulamento do museu,
para se facilitarem futuras aquisições. Para o trabalho que se pretende desenvolver nesta
dissertação, será necessário lidar com essa ambiguidade, partido da interpretação da
missão do museu.
O enquadramento do espólio no museu
Tendo em conta os aspetos referidos ao longo deste trabalho, consideramos que o
espólio em estudo se enquadra na missão do museu, pois é constituído por objetos que
poderão ser considerados como património histórico da Amadora.
Este facto comprova-se pela leitura da ata da sessão ordinária da Assembleia
Municipal da Amadora, de 20 de novembro de 2014, seis dias antes do referido leilão.
65
Nessa ocasião, foram realizadas diversas referências à importância da Associação
Académica da Amadora para os munícipes deste concelho (Ata n.o 16/2014 - Sessão
Ordinária, 2014). Entres estas destaca-se a intervenção de um cidadão, inscrito para
representação do público, que questionou a Assembleia sobre as ações que se
pretendiam tomar face ao espólio móvel da Associação, tendo em consideração «tudo
aquilo que representa as memórias e as conquistas, que foram feitas pelo esforço de
maioritariamente amadorenses». O deputado Carlos Almeida chamou também a atenção
para os pavilhões da Associação, que iriam no mesmo dia a leilão, separadamente, pois
«também são património e também são memória da Cidade […] quem entrar ali
naqueles pavilhões e olhar para aquelas paredes, vê lá referências à história e à memória
da Cidade» (Ata n.o 16/2014 - Sessão Ordinária, 2014, fol. 2); referindo ainda a sua
futura utilidade para fins desportivos, possibilitada pela qualidade das instalações (Ata
n.o 16/2014 - Sessão Ordinária, 2014, fol. 8). A própria presidente da Câmara, Carla
Tavares, demonstrou o interesse da compra do espólio móvel, no entanto, alegava não
existirem meios para adquirir, restaurar e gerir os pavilhões, fazendo ainda as seguintes
afirmações: «eu também antes de ser Presidente da Câmara, sou tão da Amadora como
o senhor deputado, também andei na Associação Académica da Amadora […] toda
aquela zona e a Associação Académica da Amadora tem para todos nós, um enorme
valor sentimental e fazem parte da memória da nossa cidade»(Ata n.º 16/2014 - Sessão
Ordinária, 2014, fol. 9).
Aquisição e incorporação
Relativamente ao meio de aquisição, como se viu anteriormente, a proveniência da
coleção é conhecida, tendo sido adquirida de forma legal, na sua totalidade, não
constituindo, aparentemente, qualquer problema este aspeto. Apesar disso, a
documentação associada aos objetos é reduzida, limitando a sua incorporação, e uma
perceção completa da sua importância.
Com base nas reflexões realizadas da primeira parte deste trabalho e os dados
relativos ao espólio, obtidos nos capítulos seguintes, foi possível identificar três
problemas/discussões a ter em conta na seleção dos objetos desta coleção que devem ser
incorporados:
66
a) Informação e valor de uso museológico
Como vimos anteriormente, os objetos que levantam mais questões são os que
designamos por inúteis. Existem 728 objetos, cuja função é desconhecida e 377 sem
modalidade associada, o que os coloca, atualmente, na categoria de irrelevantes.
Estes objetos não devem ser incorporados na coleção, mas a sua total alienação
também não é aconselhável. De facto, apesar de não nos conseguirmos aperceber neste
momento da importância deste tipo de objetos, porque só é possível avaliar o valor de
um objeto quando se tem pleno conhecimento do seu significado; isto não significa que
a informação necessária para o conseguirmos fazer não venha a ser disponibilizada no
futuro (National Museum Directors’ Conference, 2003, p. 13).
Relativamente aos objetos redundantes, não se aplica esta dúvida, devendo estes ser
excluídos do processo.
b) Classificação e valor de conquista
À primeira vista, parece sensato considerar que os objetos que representam uma
maior classificação num evento desportivo serão mais importantes do que os restantes,
visto que um dos valores mais atribuídos ao património desportivo é o do símbolo da
conquista. Seguindo esse raciocínio, poder-se-iam incorporar apenas os objetos
referentes às três primeiras classificações (ouro, prata, bronze).
No entanto, existem informações contextuais que se devem ter em consideração, tais
como a quantidade de participantes numa determinada prova. Se uma equipa/atleta
compete com apenas dois adversários, naturalmente terminará a prova com uma dessas
três classificações, representado uma medalha de bronze o último lugar, ou seja, uma
derrota. O oposto também pode ser considerado: um 6.º lugar numa prova em que
competem noventa concorrentes, pode ser considerado uma conquista, como é o caso da
taça do Campeonato de Lisboa de ténis de mesa, de 1950 (Pereira, 1950, p. 4)
Poder-se-ia ainda considerar que o valor atribuído a essa taça diminuiria assim que o
clube conquistasse o primeiro lugar do mesmo evento. No entanto, estas diferentes
classificações permitem criar narrativas acerca da história de cada modalidade. Este 6.º
lugar, num clube com parcos anos de existência, é considerado como uma conquista. O
67
mesmo acontece com a primeira taça conquistada após o renascimento de uma
modalidade, qualquer que seja a sua classificação.
Existe ainda a possibilidade de, por alguma razão, um determinado objeto, de uma
classificação inferior, estar associado a uma memória ou ter um significado que
ultrapasse o valor da conquista.
Neste critério, podemos ainda incluir os «troféus/medalhas» de participação. Estes
objetos contêm informações relevantes sobre os eventos em que o clube participou nas
diversas modalidades. A partir desses dados, seria possível expandir a investigação
acerca da atuação do clube. Por exemplo: podemos verificar que este tipo de objetos
existe em maior número na modalidade de ginástica, o que indica que, provavelmente,
os troféus referentes às classificações estarão na posse dos atletas, que terão participado
individualmente nas provas. Um registo fotográfico, aliado a uma recolha da
informação contida nestes elementos, poderá substituir a sua incorporação, visto que
dificilmente poderão ser integrados numa narrativa de um modo individual. Uma
exceção seria a participação em eventos internacionais, o que, por si só, reflete o
investimento do clube nos seus atletas e a sua relevância fora das nossas fronteiras.
c) Antiguidade e outros valores estéticos
Como foi afirmado por Riegl (2013), os objetos mais antigos, contêm um valor
estético reconhecido tanto pelos «conhecedores», como pelos leigos. Isto significa que
independentemente da relevância que estes objetos possam ter para a história do clube,
serão privilegiados pela sua aparência, que pode, inclusivamente, ajudar na sua datação.
Este valor constitui-se como prova a sua antiguidade e relaciona-se com as pessoas que
ainda vivenciaram essa época.
No presente caso, tendo em conta que o clube faliu em 2014, o espólio é constituído
por muitos objetos do século XXI, sendo o mais recente desse mesmo ano. No decorrer
dos trabalhos de inventariação verificámos que, a partir de cerca da década de 1990, as
taças e troféus deixam de ser feitos com a preocupação de se garantir a sua longevidade.
Estas datas também coincidem com um abandono do registo no livro de inventário da
associação, cujo último objeto data de 1987.
68
Este facto comprova-se quando verificamos que a maioria dos casos de corrosão de
metais está associada a objetos recentes, enquanto que o inseto xilófago está presente
nas melhores madeiras dos objetos mais antigos. Se entre as décadas de 1940 e 1980
predominaram o bronze, o latão, a prata e a madeira, posteriormente os objetos são
constituídos por ligas de ferro com diferentes banhos, por MDF e contraplacado, por
plástico e/ou por vidro. A introdução de materiais de um custo inferior refletiu-se na
aparência dos objetos e, inevitavelmente, no valor que lhes poderá ser atribuído. Serão
também estes que irão apresentar maiores problemas no futuro, devido à instabilidade
dos seus materiais.
Em museus como o Cosme Damião, a incorporação de objetos muito recentes e de
fraca qualidade será comum, apesar de existir um maior investimento na construção e
acabamento de taças/troféus, por parte dos organizadores de ligas e campeonatos de
maior relevância, em que o Sport Lisboa e Benfica também participa. No entanto, sendo
este um clube em atividade, com diferentes modalidades, é expectável que os adeptos
queiram encontrar no seu museu as provas físicas das suas mais recentes conquistas,
seja qual for a sua aparência.
A Associação Académica da Amadora, como um clube extinto, inevitavelmente,
estará associada a um sentimento saudosista, que cada vez se distanciará mais de um
valor de contemporaneidade, esperando-se que a marca da «idade» revele a história das
vitórias das gerações anteriores de atletas que a representaram.
Por esse motivo, é necessário ter em consideração que, no caso de uma taça que
represente uma vitória num campeonato recente, o seu valor simbólico irá sobrepor-se
sempre a qualquer outro, por mais vulgar que seja a sua aparência.
O envolvimento da comunidade
Estas três discussões são sintomáticas de uma necessidade latente de se determinar o
significado simbólico destes objetos para a comunidade que com eles se relaciona.
Podemos afirmar, com alguma segurança, que o livro de inventário realizado pela
associação é composto, na sua totalidade, por objetos que são relevantes para a
Associação Académica da Amadora, pois a sua construção consiste, por si só, num ato
de seleção e valorização. No entanto, dessa lista, foram apenas identificados 528
69
números de inventário e, por outro lado, esta compreende apenas parte de todo o espólio
adquirido pela Câmara Municipal da Amadora. É essencial estabelecer contacto com os
antigos dirigentes, atletas, sócios e adeptos do clube, pois apenas eles que podem dar
resposta às questões enunciadas.
Caso se pretendam colecionar outros objetos que demonstrem as conquistas do clube,
de forma análoga a uma Hall of Fame, o museu deverá investir na recolha de
documentos informativos, em formato audiovisual, notícias em periódicos, cartazes,
bilhetes, fichas de jogo e classificações individuais, que complementem o atual espólio
de taças e troféus. Este caminho é o mais acessível, mas é também o que oferece menos
potencialidades.
Outra ideia interessante, considerando a relação entre o território da Amadora e a
prática das atividades de patinagem, onde está inserida a patinagem artística e, com
maior relevância, o hóquei em patins, seria a de se aproveitar uma boa oportunidade
para se desenvolver uma coleção direcionada a estes desportos específicos. Isso
implicaria um investimento na aquisição de objetos documentais e publicitários, mas,
especialmente, no aumento da quantidade de objetos inseridos na função «técnica»,
como outras tipologias de patins, sticks e bolas de hóquei, vestuário desportivo e outros
equipamentos. Para colmatar esta lacuna, a realização de um apelo aos envolvidos com
o clube ao longo doa anos, talvez surtisse efeitos interessantes.
Para se poderem fazer escolhas desta natureza e se poder construir esta coleção de
uma forma mais consciente, o museu deverá refletir sobre a sua missão social e como é
que estes objetos podem ser utilizados para esse fim. Deverá também ponderar quais as
possíveis narrativas que poderão surgir dessa missão, tomando como ponto de partida os
testemunhos da comunidade que tem uma relação mais estreita com estes objetos.
O estado de conservação dos objetos
Do trabalho desenvolvido, resultou também o reconhecimento de que o estado de
conservação poderá constituir o critério mais objetivo para a seleção das peças
incorporáveis, sendo possível verificar que alguns casos não se podem sequer classificar
como de «bom» ou «razoável». De facto, a ausência de definições para esses critérios na
política de incorporação acaba por complicar esta definição de escalas. Por esse motivo
70
decidimos adotar as definições adotadas pela DGPC nos manuais de normas de
inventário:
Estado Normas Gerais / Mobiliário Ourivesaria
Muito bom «em perfeito estado de
conservação»
«incólume, quer do ponto de vista físico,
quer […] da estabilidade físico-química»
Bom
«estabilizada, em bom estado»,
pode apresentar «desgaste
natural, algumas lacunas ou
falhas»
«estabilizada», pode apresentar «riscos,
pequenas deformações e/ou fissuras»
Regular «necessita de intervenção»
«deformações (ou fissuras) ou uma pátina
(e/ou concreções desfigurantes), que põem
em risco o seu equilíbrio físico e físico-
químico»
Deficiente «é urgente intervir»
«deformações ou falhas que põem em risco
a sua estabilidade física e que apresenta
sinais de corrosão activa,
exigindo intervenção urgente»
Mau «com graves problemas, muito danificada ou mutilada»
Tabela 20 - Critérios para a determinação do estado de conservação definidos para este trabalho (Alves et
al, 2011; Pinho e Freitas, 2000; Alarcão e Pereira, 2000).
Seguindo este critério, a política de incorporação, obrigatoriamente, exclui 513
objetos. O valor é inferior à soma dos dados apresentados no Gráfico 4, pois existem
122 objetos que apresentam produtos de corrosão e infestação de inseto xilófago.
71
Conclusão
Depois de desenvolvido todo o trabalho de investigação aqui apresentado, e
realizadas as reflexões resultantes da sua aplicação prática, foi possível concluirmos que
a seleção é um processo inevitável para a construção da nossa identidade cultural,
estando sujeita a uma constante mudança de valores refletida nos objetos sujeitos a essa
valorização.
Vimos também que depois da Segunda Guerra Mundial os esforços internacionais se
direcionaram para a união e para o desenvolvimento das comunidades, e que as
instituições museológicas adotaram esse propósito como seu. Isto significa que os
museus passaram a depender de uma interação mais estreita e significativa com os seus
públicos. Paralelamente, reconhecemos que o verdadeiro instrumento que permitia essa
comunicação estava presente nos significados que atribuímos aos objetos.
Por esse motivo, a definição do que será um objeto (in)útil para uma instituição
museológica depende do projeto único que esta adota, tendo em vista o
desenvolvimento da sua comunidade. Este é avaliado consoante a sua capacidade de
cumprir o seu papel como instrumento de ação social.
Por outro lado, a questão da preservação, material e imaterial, foi identificada como
o principal ónus que um objeto representa para as instituições museológicas, aliado a
uma inalienabilidade das coleções públicas. Por esse motivo, concluímos que a
sustentabilidade dos museus depende da definição de políticas de incorporação
coerentes com a sua missão.
Partindo destes dados, conseguimos definir no que consistiria um objeto inútil,
questionando o carácter ético e sustentável da incorporação.
No decorrer da investigação, e considerando que a necessidade de alterar e imprimir
consciência na forma como os museus constroem as suas coleções, se discute desde a
década de 1990 (Knell, 2004, p. 11), fomos levados a questionar a relevância deste
assunto para o panorama atual da gestão museológica. No entanto, quando observámos
as estatísticas relativas aos museus portugueses e às suas práticas, constatámos que as
incorporações ainda se baseiam em critérios arbitrários, dependendo da
imprevisibilidade das doações e do mercado, ou mesmo das opiniões de um grupo
restrito de indivíduos. A resistência existente relativamente à implementação destas
72
medidas, tão importantes numa época de crise e limitados recursos financeiros e
humanos, comprovada pela incorporação estudada nesta dissertação, demonstra como
estas questões ainda precisam de ser discutidas.
Por outro lado, as políticas de incorporação constituem uma forma de se impedirem
futuras incorporações de objetos inúteis, mas não resolvem as incoerências presentes
atualmente nas coleções dos museus portugueses; apesar de permitem determinar quais
os objetos que estão de acordo com o projeto definido para o museu e quais deveriam
ser transferidos para outra instituição ou mesmo alienados/desafetados.
Considerando que estas coleções foram crescendo ao longo de várias décadas, com
critérios de seleção que, por vezes, já não coincidem com aqueles que atualmente
atribuímos ao património, é necessário ponderar se faz sentido guardarmos aquilo que já
não compreendemos, que já não reflete os nossos valores.
Tomámos como objetivo desta dissertação demonstrar o ónus que uma incorporação
irrefletida poderá representar para o museu, partindo do exemplo do espólio da
Associação Académica da Amadora, promovendo a definição de critérios de seleção e o
desenvolvimento de políticas de incorporação.
No decorrer do nosso trabalho identificámos e fornecemos dados para os seguintes
parâmetros de avaliação do impacto de uma incorporação: o investimento no
acondicionamento imediato dos objetos, a identificação da necessidade de intervenções
urgentes de conservação e o tempo médio despendido em cada objeto durante este
processo.
Deste estudo foi possível calcular o número de estantes que o museu necessita de
adquirir para acondicionar esta coleção, assim como o espaço que ocuparão em reserva.
Tendo sido descriminados os objetos cujo estado de conservação se determina como
deficiente ou mau, o museu pode agora tomar as devidas previdências para impedir a
sua degradação ou, por outro lado, ponderar se a sua incorporação se reflete em maiores
benefícios ou prejuízos.
Através da ação de desinfestação foi possível subtrair um dos constrangimentos
incluídos nesta aquisição (apesar do custo associado), restando ao museu tomar decisões
acerca dos objetos em que ainda não se verifica uma adequação aos critérios exigidos
pela política de incorporação. Não tendo sido um espólio comprado diretamente pela
73
instituição, consistindo numa aquisição imposta pela autarquia, pode não ser tarde
demais para contrariá-la com o referido documento. Percecionando o inventário
realizado, não como um registo de aquisição, mas apenas como tendo os propósitos
propostos na segunda parte desta dissertação: a caracterização do espólio, e a avaliação
do impacto da incorporação e da sua concordância com a missão do museu, para se
poder definir a sua contextualização no museu, mesmo antes da sua afetação legal. Esta
antecipação, poderia resolver muitos dos problemas relacionados com a quantidades de
objetos inúteis que as nossas coleções têm atualmente.
A seleção efetiva dos objetos não foi um dos objetivos desta dissertação devido a
duas limitações. Em primeiro lugar, por se ter constatado que a seleção não é possível
sem o pleno conhecimento do significado dos objetos. Esse tipo de informação só
poderá ser adquirida após uma profunda investigação de todos os objetos constituintes
da coleção, que compreende 2 222 unidades, bem como de uma pesquisa documental
aprofundada, através do recurso a fontes escritas e orais coevas, no seio da comunidade
que constituiu esta Associação, para se poder obter a informação necessária sobre os
objetos ali existentes. Em segundo lugar, porque essa responsabilidade deve ser
partilhada entre os profissionais do museu e os antigos dirigentes, atletas e sócios da
Associação Académica da Amadora. A contribuição contida neste trabalho é a de
mostrar a necessidade de existir uma seleção e a discussão de possíveis critérios,
tornando-a mais consciente e ponderada.
Adicionalmente, o registo sistemático de todos estes objetos consiste numa referência
para uma futura história da Associação, que neste momento se encontra dispersa por
diversos periódicos e na memória dos habitantes do concelho da Amadora.
Este exercício constitui ainda um ponto de partida para a criação de uma metodologia
que permita determinar o impacto em todas as variáveis que afetem a gestão dos
acervos. Com esse intuito, identificámos a necessidade de dados mais concretos
relativamente ao custo dessas intervenções de conservação e restauro, que variam
consoante a existência de um profissional dessa área nos quadros do museu, ou dos
preços praticados pelas empresas que fornecem esse serviço.
Da maior importância, considerando a velocidade a que as coleções têm vindo a
crescer, seria averiguar o custo médio anual de cada objeto, com o intuito de se prever o
74
impacto da incorporação a longo prazo. Estes dados ajudariam ainda a prever o valor
dos orçamentos anuais destinados à preservação de cada acervo.
75
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82
Anexos
Anexo 1
1. IDENTIFICAÇÃO
Número de inventário Segue um formato alfanumérico, «AAA» - como referência à Associação
Académica da Amadora – seguido de um número de quatro dígitos (ex:
AAA0001; AAA0002…).
Designação Designação do objeto, ex: taça, troféu, medalha, patins, etc…
Localização Localização temporária atribuída ao objeto, no interior das reservas do
museu.
Número de inventário
anterior
As inscrições contidas nas taças ou, por vezes, autocolantes que
indicam o número de inventário, permite identificar e correlacionar com
os registos escritos no inventário elaborado pela A.A.A., entre 1942 e
1987.
Objeto associado Número de inventário de fragmentos que pertençam ao objeto em
questão.
Tipo de fragmento Em caso de dissociação, caracterizar o tipo de fragmento, ex: asa, base
(de taça ou troféu), tampa, etc…
Fragmento em falta Fragmento dissociado do objeto.
Descrição Descrição sumária do objeto e das características que o distinguem.
2. INSCRIÇÕES
Placa Indicação de existência de placa ou vestígios da mesma.
Dimensões da placa (cm) Dimensões da placa ou da marca vestigial.
Gravação na placa Transcrição dos elementos inscritos na placa.
Outra gravação Transcrição de outras inscrições, nomeadamente gravações na copa,
autocolantes…
3. HISTORIAL
Função Função do objeto no contexto desportivo, ex: classificação, homenagem,
comemorativa…
Modalidade Modalidade desportiva a que o objeto está relacionado, se aplicável ou
conhecida.
Nome do evento Nome do evento desportivo a que se refere o objeto, se aplicável.
Organização Nome da(s) entidade(s) que organizaram o evento.
Data Data do evento desportivo.
83
Época Época desportiva em que está inserido o evento, ex: 1992/1993.
Local Local onde se realizou o evento.
Prova Prova realizada, inserida na modalidade (ex: partidas rápidas ou
semirrápidas (xadrez); pesca de rio ou mar; em equipa ou individual…
Escalão Escalão etário dos atletas, ex: benjamins, juniores, séniores, etc…
Categoria Nível competitivo do atleta ou equipa, ex: equipa B, 1ª divisão, etc…
Género Género dos atletas: masculino, feminino ou misto.
Classificação Classificação do atleta/equipas comprovada pelo objeto, ex: “1º lugar”,
“campeão”, “disciplina/fair-play”, “melhor defesa”…
4. INFORMAÇÃO TÉCNICA
Tampa Indicação de existência de tampa.
Diâmetro da tampa (cm) Diâmetro da tampa, se dissociada.
Diâmetro da boca (cm) Diâmetro da boca da taça, caso se verifique a inexistência de tampa.
Altura da base (cm) Altura da base, se dissociada.
Diâmetro da base (cm) Diâmetro da base, se dissociada.
Altura sem base (cm) Altura sem base, de elementos dissociados da mesma.
Asas Indicação de existência de asas.
Dimensões totais (cm) Dimensões totais do objeto: altura, largura e profundidade.
Base (material) Material que constitui a base, caso exista.
Outros materiais Outros materiais que constituam o objeto.
5. CONSERVAÇÃO
Estado geral Indica se o objeto necessita de tratamento ou não.
Integridade Integridade do objeto, divide-se em quatro opções: inteiro, sem
fragmentação ou dissociação; fragmentado, sem dissociação, mas
dividido em fragmentos; dissociado; dúbio, potencial caso de
dissociação.
Corrosão Informa sobre a existência de produtos de corrosão.
Infestação Informa sobre a existência de infestação na madeira constituinte.
Observações Observações pertinentes, que complementem a análise ao estado de
conservação.