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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE ARTES
CURSO DE LICENCIATURA EM DANÇA
LEONARDO SANTOS DE MACEDO
O TRIBAL BELLYDANCE EM NATAL: UM OLHAR SOBRE O TRABALHO DA
SHAMAN TRIBAL COMPANY E SHAMAN TRIBAL STUDIO
NATAL/RN
2019
LEONARDO SANTOS DE MACEDO
O TRIBAL BELLYDANCE EM NATAL: UM OLHAR SOBRE O TRABALHO DA
SHAMAN TRIBAL COMPANY E SHAMAN TRIBAL STUDIO
Artigo apresentado para compor a avaliação final do Curso de
Licenciatura em Dança da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte - UFRN, como requisito parcial para obtenção do título
de Licenciado em Dança.
Orientadora: Profª. Ms. Renata Celina de Morais Otelo
NATAL/RN
2019
Macedo, Leonardo Santos de. O tribal bellydance em Natal : um olhar sobre o trabalho daShaman Tribal Company e Shaman Tribal Studio / Leonardo Santosde Macedo. - 2019. 57 f.: il.
Monografia (licenciatura) - Universidade Federal do RioGrande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes.Licenciatura em Dança, Natal, 2019. Orientadora: Prof.ª Ms. Renata Celina de Morais Otelo.
1. American tribal style. 2. Estilo tribal. 3. Fusion. 4.Shaman. 5. Tribal bellydance. I. Otelo, Renata Celina de Morais.II. Título.
RN/UF/BS-DEART CDU 793.3
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRNSistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Departamento de Artes - DEART
Elaborado por Leonardo Santos de Macedo - CRB-X
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
CURSO DE LICENCIATURA EM DANÇA
A comissão abaixo assinada aprova o trabalho intitulado: “O TRIBAL BELLYDANCE EM
NATAL: UM OLHAR SOBRE O TRABALHO DA SHAMAN TRIBAL COMPANY E
SHAMAN TRIBAL STUDIO”, elaborado por Leonardo Santos de Macedo:
Profª Ma. Renata Celina Morais Otelo – Orientadora
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Profº Dr. Marcílio de Souza Vieira – Examinador
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Profª Dra. Teodora de Araujo Alves – Examinadora
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
NATAL/RN
2019
“Talvez por ser tão diferente há que ver, ouvir, pensar e
avaliar [...] E quando se entende, ficamos deliciosamente
presos por essa magia que é o “mundo tribal”!”
(I Festival de Dança)
AGRADECIMENTOS
Sou grato primeiramente a Deus pelo dom da vida, por ser a luz que guia minha jornada
e a base que fortalece minhas escolhas.
À minha avó Alzira Santos (in memória) pela grande mulher que foi para nossa família.
Eternas saudades!
Ao meu pai William Francisco (in memória) pelos ensinamentos de cada dia e pelo
incentivo diário de lutar pelos meus sonhos e nunca desistir dos meus objetivos. Eternas
saudades!
À minha mãe Erineide Santos, por ser a maior inspiração que tenho na vida e para vida.
Grato pela sua força materna que chega para mim como energia renovadora. Te amo!
Aos meus irmãos Priscila, João Paulo e John Lenon pelos cuidados comigo desde
criança, sempre me protegendo e ensinando os melhores caminhos a seguir.
Aos meus sobrinhos Pedro Henrique, Nicole Dantas e Karoline Dantas pelo amor que
nunca me falta.
Aos meus professores de dança, dos grupos que participei e da graduação, por todo
conhecimento transmitido.
À Universidade Federal do Rio Grande do Norte, pela oportunidade e espaço de
construir conhecimento.
À Turma de 2015.1, especialmente aos amigos federais: Amanda Nogueira, Luciano
Silva, Luana Lopes, Larissa de Araújo, Jonathan Varela e Silas Braúna, pelos trabalhos em
grupo, pelos momentos dentro e fora da Universidade, pelo companheirismo e por se tornarem
pessoas de grande importância na minha vida para além dos muros acadêmicos.
À minha maravilhosa orientadora, Renata Otelo, que me conduziu de maneira
primordial nesse trabalho. Obrigado pelos ensinamentos, por sua paciência e por sempre
acreditar no meu potencial.
À Cibelle Souza em nome da Shaman Tribal Company e do Shaman Tribal Studio, por
me ensinar uma dança tão encantadora e pela disposição em me ajudar na pesquisa para esse
TCC e a minha turma do intermediário pelo companheirismo e partilha de tantos momentos.
Enfim, a todos que contribuíram e/ou contribuem de alguma maneira para minha
formação acadêmica, pessoal e artística.
O TRIBAL BELLYDANCE EM NATAL: UM OLHAR SOBRE O TRABALHO DA
SHAMAN TRIBAL COMPANY E SHAMAN TRIBAL STUDIO
RESUMO: O trabalho discute sobre a prática do Tribal Bellydance na cidade do Natal – Rio
Grande do Norte, através da Shaman Tribal Company e do Shaman Tribal Studio. A
Companhia, que possui um núcleo em Piracicaba – São Paulo e um núcleo em Natal-RN, está
em atividade há 13 anos sendo a maior referência do estilo dentro do estado. No decorrer do
texto apresento um mapa histórico caracterizando o Tribal Bellydance a partir dos estilos
American Tribal Style (ATS) e Tribal Fusion (Fusão Tribal) que são os estilos que servem de
base para a construção dessa dança. Cito ainda os grandes bailarinos/as que ao longo dos anos
contribuíram de forma significativa na divulgação do estilo pelo mundo e no que hoje
conhecemos por Tribal Bellydance. A metodologia do estudo é de abordagem qualitativa, de
natureza descritiva realizada a partir de revisão bibliográfica, relato de experiência e entrevistas
feitas com bailarinas residentes em Natal-RN. A partir da leitura de autores e pesquisadores da
área foi possível apresentar o estilo Tribal de maneira consistente, diluindo os mitos que o cerca
e mostrando os elementos e aspectos constituintes dessa dança. As entrevistas contribuíram na
contextualização da prática desse estilo na cidade do Natal e mostrou como essa dança pode ser
uma poderosa manifestação de autoconhecimento. Como avaliação para o estudo observei as
contribuições que o Tribal proporciona na vida de seus praticantes, permitindo que esses
acessem suas particularidades trazendo para a corporeidade suas emoções traduzidas em
movimentos.
Palavras-chave: ATS. ESTILO TRIBAL. FUSION. SHAMAN. TRIBAL BELLYDANCE.
THE PRACTICE OF TRIBAL DANCE IN NATAL: A LOOK AT THE WORK OF
SHAMAN TRIBAL COMPANY AND SHAMAN TRIBAL STUDIO
ABSTRACT: The work discusses the practice of Tribal Bellydance in the city of Natal - Rio
Grande do Norte, through the Shaman Tribal Company and the Shaman Tribal Studio. The
Company, which has a nucleus in Piracicaba - São Paulo and a nucleus in Natal-RN, has been
in business for 13 years and is the largest reference of style within the state. In the course of the
text I present a historical map featuring Tribal Bellydance from the American Tribal Style
(ATS) and Tribal Fusion (Tribal Fusion) styles that are the basis for the construction of this
dance. I also mention the great dancers who over the years have contributed significantly to the
spread of style throughout the world and in what we know today as Tribal Bellydance. The
methodology of the study is a qualitative approach, of a descriptive nature based on a
bibliographical review, experience report and interviews with dancers living in Natal-RN. From
the reading of authors and researchers of the area it was possible to present the Tribal style in a
consistent way, diluting the myths surrounding it and showing the elements and constituent
aspects of this dance. The interviews contributed to the contextualization of the practice of this
style in the city of Natal and showed how this dance can be a powerful manifestation of self-
knowledge. As an evaluation for the study I observed the contributions that Tribal provides in
the life of its practitioners, allowing them to access their particularities by bringing to their
corporeity their emotions translated into movements.
Keywords: ATS. FUSION. SHAMAN. TRIBAL BELLYDANCE. TRIBAL STYLE.
LISTA DE IMAGENS
Imagem 1: Mapa conceitual do Tribal Bellydance. Fonte: CÉZAR, 2017 ............................ 14
Imagem 2: Jamila Salimpuor e a Trupe Bal Anat, em 1970. Fonte: ANDRADE, 2011..........16
Imagem 3: San Francisco Classic Dance Troupe. Fonte: Portal Aerith Asgard. Disponível em:
<http://aerithtribalfusion.blogspot.com/search?q=masha+archer> Acesso em: 09 de maio 2019.
............................................................................................................................................ 17
Imagem 4: Carolena Nericcio e seu grupo FatChanceBellydance fazendo o puja no início da
apresentação. Fonte: Canal FatChanceBellydance. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=2fq9_zKu9rc Acesso em: 08 de maio 2019.....................20
Imagem 5: Apresentação do grupo FatChanceBellydance com bailarinas ao centro em roda e
bailarinas no fundo em formação de coro. Fonte: Canal FatChanceBellydance. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=nV134Q5ddVM Acesso em: 08 de maio 2019 .............. 21
Imagem 6: Bailarinas vestidas com figurino tradicional do ATS. Fonte: Portal
FatChanceBellydance. Disponível em: https://fcbd.com/community/gallery/ Acesso em: 09 de
maio 2019. ........................................................................................................................... 22
Imagem 7: Shaman Tribal Co. dançando com jarros em apresentação do pocket show Híbrida.
Fonte: Arquivo pessoal (2019). ............................................................................................ 26
Imagem 8: Aquarius Cia de Dança na Caravana Tribal Nordeste 2014. Fonte: Canal Kilma
Farias. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=KLrcIx0mxF8> Acesso em: 13 de
maio 2019.. .......................................................................................................................... 27
Imagem 9: Cia Lunay na Caravana Tribal Nordeste 2016. Fonte: Canal Kilma Farias.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=hVyFADGwp0E> Acesso em: 13 de
maio 2019.. .......................................................................................................................... 28
Imagem 10: Logo marca da Companhia Shaman. Fonte: Perfil do Instagram Shaman Tribal
Co. ....................................................................................................................................... 30
Imagem 11: Poster do espetáculo Las Nieblas. Fonte: Perfil do Instagram Shaman Tribal Co.
............................................................................................................................................ 31
Imagem 12: Poster do espetáculo Sonhos Lúcidos. Fonte: Perfil do Instagram Shaman Tribal
Co. ....................................................................................................................................... 31
Imagem 13: Poster do pocket show Híbrida. Fonte: Perfil do Instagram Shaman Tribal Co. 31
Imagem 14: Poster do V Hafla Shaman Tribal. Fonte: Perfil do Instagram Shaman Tribal Co.
............................................................................................................................................ 31
Imagem 15: Aula de Composição Coreográfica. Fonte: Arquivo pessoal (2019) .......................... 34
Imagem 16: Aula de Composição Coreográfica. Fonte: Arquivo pessoal (2019) .......................... 34
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 11
HISTÓRIA E CARACTERIZAÇÃO DO TRIBAL BELLYDANCE ............................ 14
O INÍCIO SEM O “TRIBAL” ....................................................................................... 15
AMERICAN TRIBAL STYLE (ATS) .......................................................................... 19
TRIBAL FUSION (FUSÃO TRIBAL) ......................................................................... 23
O TRIBAL BELLYDANCE NO BRASIL ........................................................................ 24
TRIBAL BRASIL ......................................................................................................... 25
O ESTILO TRIBAL EM NATAL ..................................................................................... 28
SHAMAN TRIBAL COMPANY ................................................................................. 29
SHAMAN TRIBAL STUDIO ....................................................................................... 33
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 37
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 40
APÊNDICES ...................................................................................................................... 42
11
INTRODUÇÃO
Este artigo tem como tema a prática do Tribal Bellydance na cidade do Natal, capital do
Rio Grande do Norte (RN), a partir do trabalho da Shaman Tribal Company e das aulas do
Shaman Tribal Studio. Pesquisando sobre o surgimento dessa dança, como ela é produzida
nesse cenário e o que a define, apresento um mapa histórico com a caracterização dos estilos
American Tribal Style (ATS) e Tribal Fusion (Fusão Tribal) que são os estilos base na
construção dessa dança. A bailarina Joline Andrade1 que é pesquisadora do estilo Tribal,
escreveu a primeira monografia do Brasil sobre essa temática, ela traz uma abordagem
contemporânea sobre as práticas do Tribal Bellydance apresentando o estilo da seguinte
maneira:
A dança tribal, popularmente chamada de dança étnica de “fusão”, surge como
proposta de agregar diferentes manifestações de danças étnicas das mais variadas regiões do mundo, e busca mesclar referências e matrizes de danças
tradicionais e transpô-las numa estética contemporânea atualizada. [...] É
relativamente recente no mundo da dança (surgiu em torno da década de 60, na
Califórnia, durante os movimentos contraculturais do Woodstock), mas bebe na fonte de diversas culturas antigas e mistura tudo numa alquimia contemporânea
(ANDRADE, 2011, p. 13).
O Tribal segundo Ferreira (2015), já foi considerado apenas como Bellydance (Dança
do Ventre) antes de ser sistematizado, pois a dança que era produzida já se utilizava dos
conceitos básicos do que hoje conhecemos por Tribal Bellydance.
A pesquisa aborda um estudo sobre como a prática do Tribal é feita na cidade do Natal-
RN a partir da ótica da diretora e bailarina da Shaman Tribal e de alunas do Estúdio Shaman.
A Companhia, que possui um núcleo em Piracicaba – São Paulo (SP)2 e um núcleo em Natal –
Rio Grande do Norte (RN), está em atividade há 13 anos e é considerada a maior referência do
estilo aqui no estado do RN. Para isso, trago uma contextualização sobre a Shaman contando
um pouco da sua trajetória pontuando os principais acontecimentos que o grupo vivenciou,
1 Bailarina, coreógrafa, professora, produtora e pesquisadora na área da dança é formada em licenciatura
em Dança e no curso de Dançarino Profissional pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), possui
Pós-Graduação (Especialização) em Estudos Contemporâneos sobre Dança nesta mesma universidade. Criadora do projeto "Tribal Tour", já ministrou diversos workshops em diferentes estados do Brasil e
participou de grandes eventos internacionais como dançarina e/ou professora.
2 Núcleo da Shaman Tribal Company com sede em Piracicaba (SP) dirigido por Paula Braz, que atua em paralelo ao núcleo de Natal (RN).
12
dentre eles: as produções de eventos e espetáculos, as participações em festivais dentro e fora
do país, a renovação do corpo de baile e as premiações conquistadas.
Além de mostrar esse entendimento coletivo por meio da diretora e bailarina do grupo
e individual através das alunas do Estúdio de Dança, trago a ideia de Tribal Bellydance a partir
da minha experiência em dança e enquanto aluno do Estúdio, e sou atualmente o único do
gênero masculino a fazer aulas.
Quanto ao meu conhecimento sobre a linguagem da dança, iniciei nesse universo através
da cultura popular dançando em quadrilha junina de competição. Logo me apaixonei por esse
folguedo e durante 10 anos contribui para a preservação desse movimento que vem perdendo
força a cada ano. Foram experiências transformadoras, inclusive, atribuo minha vivência de
quadrilheiro como sendo o fator responsável por despertar o interesse de cursar Licenciatura
em Dança na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
O curso de Dança me proporcionou conhecer essa linguagem com outro olhar. Um olhar
acadêmico que pôs a Dança num lugar maior do que estava ao meu entendimento. Foi através
da graduação que entendi essa manifestação como uma ferramenta educacional potente na
construção do processo de ensino e aprendizagem, e que sua presença na educação básica é tão
importante como qualquer outra área do conhecimento. Durante os 4 anos de curso fui
estimulado através das disciplinas a pensar sobre como me tornar um bom professor, como
aprender a dar a melhor aula, quais estratégias utilizar, quais os melhores dispositivos para
tornar uma aula dinâmica, como me relacionar com os alunos, etc., tudo isso levando em
consideração os diversos contextos que poderia encontrar entre outros inúmeros fatores que
competem a formação de um professor.
Ao mesmo tempo, o viés artístico foi trabalhado na produção de composições, nas
apreciações de colegas e professores, no incentivo ao consumo da arte/dança na cidade e no
fazer crítico para como essa arte/dança é produzida dentro e fora da academia. As experiências
na graduação também me presentearam em conhecer outros estilos de Dança que fugiam das
minhas possibilidades, e foi no ano de 2015, mesmo ano que ingressei na UFRN, que tive o
primeiro contato com a dança Tribal ao apreciar a Companhia Shaman dançando no evento
“Todos os tons de Esmeralda”, promovido pela Cia Nawar3. Mal sabia eu que ali seria o início
de uma grande paixão na minha vida.
3 Companhia de Danças Árabes atuante em Natal.
https://www.youtube.com/watch?v=iVbpI21gVDw&t=7s
13
Meu encontro com o estilo Tribal se fortaleceu no ano de 2018 quando comecei a fazer
aulas no Shaman Tribal Studio e pude me reconectar a lembrança de quando assistir a
Companhia Shaman pela primeira vez. Foi através dessa memória que iniciei minha pesquisa
sobre esse estilo e sua prática na cidade do Natal. A partir do momento que comecei a vivenciar
essa dança regularmente, conhecer melhor suas variações e conceitos, a dialogar com corpos
tão distintos em aulas e apresentações, várias questões foram surgindo sem muitas respostas.
Eram sentimentos, angústias, emoções, desafios que me tomavam a cada novo movimento
aprendido.
O Tribal Bellydance assim como qualquer outra técnica de dança, exige um estudo
aprofundado e de longo prazo para se obter um resultado qualitativo em termos de movimento.
A presença do virtuosismo estava impregnada nas primeiras aulas pois eu tinha uma
preocupação exagerada de executar os movimentos com perfeição e isso começou a se tornar
algo incômodo. Ao mesmo tempo eu estava feliz por finalmente poder fazer as aulas de Tribal,
foi então que eu passei por um momento que não sabia se continuaria a fazer aulas porque
estava confuso com toda aquela situação de exposição ao novo. Mas, foi a própria Dança,
através dos ensinamentos da professora Cibelle Souza4, que me trouxe calmaria para não parar
e me fazer entender a força dessa Dança.
Hoje a construção desse trabalho tem um significado maior do que apenas contribuir
para minha conclusão no curso de Dança: é um agradecimento a dança Tribal por me acolher e
me permitir conhecer outras faces do meu eu.
A metodologia utilizada no estudo é de abordagem qualitativa, de natureza descritiva
realizada a partir de revisão bibliográfica, relato de experiência e entrevistas feitas com
alunas/bailarinas residentes em Natal. A partir dos textos consultados foi possível apresentar o
estilo Tribal Bellydance de maneira consistente, diluindo os mitos que o cerca e mostrando os
elementos e aspectos constituintes dessa dança. As entrevistas contribuíram na contextualização
da prática desse estilo nesta cidade e mostrou como essa dança pode ser uma poderosa
manifestação de autoconhecimento.
4 Formada em Psicologia, possui Especialização em Psicologia Fenomenológica Existencial, ambos pela
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), é diretora e bailarina da Shaman Tribal
Company e diretora e professora do Shaman Tribal Studio. Já atuou ministrando workshops em eventos dentro e fora do país. https://www.youtube.com/watch?v=_Ng_m6cWujg
14
HISTÓRIA E CARACTERIZAÇÃO DO TRIBAL BELLYDANCE
No final da década de 1960, na Califórnia (EUA), o Tribal Bellydance surge no mundo
contemporâneo com uma proposta ousada de fusionar diferentes danças étnicas praticadas pelo
mundo. Andrade (2011) afirma que o objetivo inicial era transpor as danças de matrizes
tradicionais para uma estética contemporânea tendo como referência a dança do Ventre, e
fusionando à conceitos e movimentos de danças como o Flamenco, dança Indiana, Break dance,
dança Moderna, Jazz, Dança-Teatro e até de práticas alternativas como o Yoga.
De acordo com o mapa apresentado algumas dessas manifestações tiveram influência
direta (linha reta) no processo de construção dos estilos ATS, ITS e Tribal Fusion. Outras
danças serviram como possibilidades de fusão nesses repertórios (linha pontilhada). Contudo,
o processo de hibridação do Tribal Bellydance não ficou limitado em torno desses estilos
iniciais, ele tomou proporções globais que resultou numa criação incontável de estilos e/ou sub
estilos por todo mundo. Andrade (2011) reforça esse acontecimento e diz que o uso das novas
tecnologias contribuiu nesse processo:
Diante da vasta difusão da dança tribal, por meio de recursos tecnológicos comunicacionais, seus processos de hibridação foram intensificados pelos
movimentos de globalização e ganharam complexidade, aumentando o teor das
tensões e estabelecendo relações entre elementos dos mais variados
(ANDRADE, 2011, p. 13).
Imagem 1: Mapa conceitual do Tribal Bellydance.
Fonte: CÉZAR, 2017.
15
Nesse contexto o Tribal foi se consolidando como uma dança potente em inovação de
repertório, já que possibilita a união de diferentes culturas numa mesma linguagem. Dentre seus
estilos encontramos o American Tribal Style (ATS) criado por Carolena Nericcio e o Tribal
Fusion (Fusão Tribal) desenvolvido por Jill Parker.
O INÍCIO SEM O “TRIBAL”
Para entender os processos de fusão do Tribal Bellydance, é importante fazer uma
descrição e discutir os estilos dessa dança que foram criados ao longo da história ocidental.
Suas categorias possuem especificidades que diferenciam aspectos importantes para o
reconhecimento do que “pertence” a cada estilo. No texto abordarei especialmente o começo
da prática por Jamila Salimpour, o American Tribal Style e o Tribal Fusion.
O movimento Tribal surgiu de maneira despretensiosa através da bailarina Jamila
Salimpour na Califórnia (EUA) em 1968. Segundo Ferreira (2015), esse movimento teve início
quando Jamila começou a fusionar outras linguagens de dança com a dança do Ventre, contudo
“apesar de ser consenso entre diferentes bailarinas a importância de Jamila Salimpour no Tribal,
o estilo que estava sendo desenvolvido naquela época ainda não era denominado “dança
Tribal”, era concebido ainda como Dança do Ventre” (FERREIRA, 2015, p. 11).
Salimpour teve uma vida dedicada as artes, iniciou sua trajetória no famoso circo
Ringling Brothers Circus aos 16 anos de idade, onde chegou a se apresentar com elefantes.
Segundo Espinosa (2018), a dança do Ventre entrou na vida de Jamila por volta dos 20 anos,
quando se encantou por bailarinos da Golden Era da dança do Ventre5. Ela passou a imitar os
passos que assistia nos filmes, até que uma funcionária da casa onde morava percebeu seu
talento para dança e a levou para se apresentar em festas e eventos. Contudo, foi somente aos
31 anos que Jamila passou a dançar profissionalmente em clubes da Califórnia. Logo após
começou a dar aulas por enfrentar dificuldades financeiras, sendo um começo difícil também
pela construção metodológica das aulas já que não existia material catalogado que pudesse
ajudar nos ensinamentos.
Espinosa (2018), apresenta informações importantes sobre como Jamila estudou os
movimentos para sistematizar a dança do Ventre, relatando que Jamila:
5 Conhecido também como Golden Age, foi um período compreendido entre as décadas de 1930 até
1990, como sendo épocas marcantes para história da dança do Ventre no mundo. Compreende um
período importante para o entendimento e a evolução dessa dança, além de ter revelado muitas bailarinas/os referências na construção desse estilo.
16
Estudou minuciosamente todos os toques de snuj que escutava e inclusive
desenvolveu algumas variações, o que culminou em seu primeiro manual de snujs (que vinha com uma fita para as pessoas escutarem o que estavam lendo)!
Ela também viajou para estudar com dançarinos de diversas modalidades de
dança oriental e publicou diversos estudos e pesquisas nessa área. Sua
importância é inegável também para a dança do ventre: ela foi, até onde se sabe, a primeira pessoa aqui no ocidente a dar nomes aos movimentos e sistematizar
o ensino da dança do ventre. Se você sabe identificar movimentos quando ouve
oito maia e queda turca, agradeça à Jamila! (ESPINOSA, 2018. Texto retirado
de artigo publicado no portal do Congresso Tribal).
Na intenção de ampliar seu repertório Jamila fez viagens à países do Oriente e Norte da
África onde se encantou pela cultura dos povos de tribos. Ao retornar para os EUA, ela fusionou
as diversas manifestações que conheceu nas viagens e criou uma espécie de dança-teatro, onde
usava principalmente adereços, figurinos e movimentos de danças étnicas orientais
(ANDRADE, 2011).
Nesse contexto Jamila criou a Trupe Bal Anat, observado na Imagem 2, que tem em seu
nome o significado “Dança da Deusa Mãe”. O grupo surgiu para se adequar as apresentações
da Renaissance Faire6, cuja foto anterior foi tirada na edição de 1970. Espinosa (2018) fala que
6 Feira renascentista que acontece anualmente na Califórnia e que visa representar aspectos da época
renascentista através de produtos, teatro, música e a dança. O grupo Bal Anat ganhou bastante
visibilidade ao dançar nessa feira.
Fonte: ANDRADE, 2011, p. 18.
Imagem 2: Jamila Salimpuor e a Trupe Bal Anat, em 1970.
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o grupo era composto por um público diverso de pessoas: homens, mulheres, crianças,
malabaristas, músicos, acrobatas, mágicos e dançarinos de vários estilos da dança Oriental. A
Trupe ainda foi responsável por criar uma estética única no estilo Tribal e por revelar grandes
nomes que deram continuidade no trabalho de Jamila após o encerramento da Trupe. John
Compton, Katarina Burda, Suhaila Salimpour (filha de Jamila) e Masha Archer foram alguns
destes nomes.
Jamila é considerada como o primeiro pilar na construção do estilo Tribal Bellydance e
teve como “sucessora” a bailarina Masha Archer, que foi responsável por expandir esse
trabalho. Masha tinha uma visão própria sobre a dança do Ventre e sentia uma necessidade forte
de mostrar essa dança no palco, tentando excluir a visão marginalizada que ela vinha sendo
tratada.
Nos anos 1970, Masha formou a San Francisco Classic Dance Troupe com um estilo
chamado de “Tribal Art Nouveau” usando referências das culturas oriental e europeia. A
estética do grupo usava figurinos em tons pastéis, joalherias de tribos antigas, e inspirações em
pinturas, ao som de músicas tradicionais folclóricas, músicas clássicas e óperas (ESPINOSA,
2013). Na imagem a seguir podemos contemplar um ensaio fotográfico realizado com as
bailarinas do San Francisco, usando o figurino característico criado pelo grupo.
Imagem 3: San Francisco Classic Dance Troupe.
Fonte: Portal Aerith Asgard. Disponível em:
<http://aerithtribalfusion.blogspot.com/search?q=m
asha+archer> Acesso em: 09 de maio 2019.
18
Apesar de ter uma importância expressiva na construção do Tribal, Archer não teve um
reconhecimento tão notório como Jamila e Carolena7. Isso fica claro pela escassez de
informações e registros sobre seu trabalho. Contudo, é importante reafirmar que os estudos de
Masha foram determinantes no desenvolvimento do ATS por Nericcio, formando o Tribal como
uma dança bem característica.
Sobre a dança do Ventre é importante ressaltar que essa surgiu no Oriente, décadas antes
do movimento Tribal. Não existem registros exatos com datas de quando ela surgiu exatamente,
mas sabe-se que ela nasceu no Egito por meio das dançarinas Ghawazze8 e Awalim9 e foi
batizada com esse nome através do orientalismo10 (LOURO, 2016, 38 min). Inicialmente era
praticada para fins ritualísticos, porém o cinema americano imprimiu um contexto performático
e artístico que gerou inúmeras interpretações erradas, categorizando a dança do Ventre como
uma dança de sedução (CÉZAR, 2017).
Por ser uma manifestação tão antiga, ela passou por transformações que culminou no
surgimento de uma variedade imensa de estilos. Na atualidade essa característica acaba sendo
um provocar de discussões, gerando interrogações para se saber qual “a verdadeira”, “a
original”, “a pura”, “a autêntica” dança do Ventre. Cristina Antoniadis11 classifica 5 estilos
dessa linguagem: Dança do Ventre tradicional, Dança do Ventre Clássica Oriental, Dança do
Ventre Clássica Ocidental, Dança do Ventre Moderna e Dança do Ventre Criativa ou Livre, em
que se diferenciam de acordo com os movimentos, a música, o figurino, os ritmos, entre outros
aspectos.
7 Foi aluna de Masha Archer e responsável pela criação do American Tribal Style (ATS).
8 Eram mulheres que viviam da arte, dançavam na rua para os estrangeiros como forma sobrevivência. Usavam vários adereços e roupas exageradas, movimentando braços, tronco e quadril. Não se tem
registros de quando iniciou o movimento Ghawazze, mas relacionam seu surgimento ao povo cigano.
9 O termo Awalim é plural de Almeh, mulheres versáteis que viviam nos haréns. Eram escritoras, poetisas e dançarinas. Se apresentavam por trás de biongos ou cortinas e nunca se mostravam para os homens na
hora da dança. Junto com as Ghawazze são consideradas como as primeiras dançarinas do Ventre.
10 É o termo usado para designar os estudos sobre as civilizações orientais, especialmente do Oriente
Médio, Extremo Oriente, Ásia Central e Índia, a partir de uma interpretação eurocêntrica por parte de
artistas e escritores ocidentais. 11 Professora, dançarina, coreógrafa, pesquisadora e produtora cultural. Trabalha com danças gregas e
orientais há mais de 20 anos. É coordenadora de cursos do “Pandora Danças” e diretora da Pandora Cia
de Danças, um grupo de danças orientais profissional. Foi supervisora e orientadora de danças libanesas do elenco da minissérie "2 Irmãos" produzida pelo diretor Luís Fernando de Carvalho/Rede Globo onde
participou de cenas de dança como atriz figurante.
19
A relação da dança do Ventre com o Tribal é estritamente construtiva e são responsáveis
por gerar uma infinidade de possibilidades para cena. São linguagens que dialogam e ao mesmo
tempo se afastam, e apesar da ligação “maternal” elas possuem especificidades que as
diferenciam. É importante falar sobre isso pois existe uma confusão muito grande gerada em
torno do que é dança do Ventre e o que é dança Tribal, pois existem aqueles que defendem que
se trata da “mesma coisa”, outros que conseguem distinguir algumas variantes mas acham que
toda dança é “igual” e ainda há os que sabem diferenciar uma da outra.
Acredito que essa confusão é gerada principalmente pelo fato do Tribal Bellydance ser
uma dança nova, contemporânea, e apesar de já ser reconhecida mundialmente ela não chega a
todos os públicos com a mesma intensidade. Nesse contexto percebo que cabe aos
pesquisadores/produtores/dançarinos dessa linguagem o dever de divulgar ainda mais a história
e os conceitos dessa dança, levando “a palavra do tribal” para outras culturas e outros públicos.
AMERICAN TRIBAL STYLE (ATS)
O Tribal Bellydance começou a ser sistematizado a partir da criação do American Tribal
Style (Estilo Tribal Americano), chamado popularmente de ATS. Esse foi o primeiro estilo
catalogado e patenteado dentro do Tribal, sendo considerado a base para a construção de outros
estilos.
Sua criadora foi a bailarina Carolena Nericcio, considerada um dos nomes mais
importantes na construção da linguagem Tribal. Segundo Ferreira (2015), Nericcio foi aluna de
Masha Archer e se formou como bailarina a partir de seu contexto. Ela começou a desenvolver
seu próprio estilo após Masha se aposentar encerrando a Cia San Francisco.
O ATS começa a tomar forma após Carolena pesquisar e estudar os elementos da dança
Flamenca e da dança Indiana, passando a fusionar esses elementos com os movimentos
aprendidos em sua formação. Nericcio organizou uma sequência de movimentos, catalogou e
nomeou essas sequências batizando esse sistema de American Tribal Style. O nome American
Tribal Style foi uma forma de distinguir o estilo Tribal, da dança do Ventre como estava sendo
praticada naquele momento e para reafirmar que o estilo foi criado nos EUA, sendo uma dança
de origem ocidental. Nesse contexto Carolena funda o grupo FatChanceBellyDance que se
tornou um marco no movimento Tribal, sendo a maior referência dentro do ATS (FERREIRA,
2015).
O ATS foi criado para ser dançado em grupo, na intenção de resgatar o sentido de tribo
e com um novo conceito de se fazer dança: o improviso coordenado por liderança. Esse conceito
20
consiste num improviso regido por regras, em que existe uma bailarina líder que deve ser
copiada pelas demais do grupo. Isso fica mais claro com a explicação de como se dançar o ATS:
A formação básica do ATS acontece sempre com a líder posicionada a esquerda,
a frente das demais bailarinas que estarão à direita. Quando é duo, a bailarina que está atrás, fica à direita, formando uma diagonal. Na formação de trio
acontece um triângulo, a posição dois fica no centro da formação um pouco
mais para o fundo, enquanto que a posição três fica na ponta direita, um pouco mais à frente da bailarina que está na posição dois. Na formação de quarteto a
mesma coisa acontece, o que muda é que a pessoa que está na quarta posição
assume o lugar da ponta, mas ao fundo do palco. No momento que a líder induz um giro, todas da formação irão liderar um pouco. Nesse momento é necessária
a prática do block of birds, que é a referência para que todas girem juntas na
mesma sincronia. [...] Além dessa formação mais comum de acontecer, também
pode ocorrer a formação de fade e a formação diagonal (FERREIRA, 2015, p. 42 e 43).
Além do improviso coordenado, outros elementos foram definidos para identificar o
ATS. O puja, a roda, o coro, os snujs, as músicas e o figurino, são componentes dessa linguagem
que possuem características próprias.
O puja faz parte de um ritual de reverenciamento no ATS, tem sua origem na religião
hindu e foi adaptado por Carolena para ser um momento de agradecimento em que cada
movimento possui um significado. Nericcio estabeleceu que esse ritual deve estar presente nas
aulas do estilo, mas também pode ser usado em apresentações. O puja se inicia “com mãos em
prece no coração e com as pontas dos dedos juntas; em seguida estende-se a mão esquerda e o
braço fazendo movimento de oferecimento, depois a direita também oferecendo aos cantos da
sala” (FERREIRA, 2015, p. 22), como podemos observar na Imagem 4 retirada de um vídeo
do canal FatChanceBellyDance.
Imagem 4: Carolena Nericcio e seu grupo FatChanceBellyDance fazendo o puja no início da
apresentação.
Fonte: Canal FatChanceBellyDance. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=2fq9_zKu9rc Acesso em: 08 de maio 2019.
21
A roda, é uma formação indispensável para se dançar ATS. Por meio dela acontece a
troca de liderança entre as/os bailarinas/os, os deslocamentos em giros, os inícios de
coreografias além de aparecer em outros momentos do improviso. Seu giro é no sentido horário
e sua forma básica, que pode variar no deslocamento, é com braços na posição média. É
apreciado que a roda faça um giro completo antes de mudar a líder.
O coro, é uma formação para quando existir mais de quatro bailarinas/os em cena. Seu
formato é em meia lua e fica ao fundo do palco, fazendo uma espécie de “plano de fundo” para
as/os bailarinas/os ao centro. Ferreira (2015) explica algumas regras sobre essa formação:
O coro [...] sempre tem uma líder, que é a bailarina que fica na ponta esquerda,
é essa bailarina que irá puxar a movimentação que será feita no coro [...]
Geralmente no coro não são feitos muitos movimentos, os movimentos alternam poucas vezes , e são movimentos menores, que não tiram a atenção do grupo
que está dançando na formação. No repertório rápido, as bailarinas do coro
também tocam snujs, e podem apenas fazer marcação de quadril para as colegas que estão na formação (FERREIRA, 2015, p. 49).
Podemos ver na imagem a seguir o grupo FatChanceBellydance numa apresentação de
ATS. O registro foi retirado de um vídeo da plataforma YouTube, postado no canal
FatChanceBellyDance. Com um grande número de bailarinas no palco o grupo se divide entre
a formação para o improviso e o plano de fundo em formato de coro.
Imagem 5: Apresentação do grupo FatChanceBellyDance com bailarinas ao centro
em roda e bailarinas no fundo em formação de coro.
Fonte: Canal FatChanceBellyDance. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=nV134Q5ddVM Acesso em: 08 de maio 2019
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Outro elemento característico no ATS são os snujs12, usados de acordo com as músicas
estão ligados diretamente aos repertórios de movimentos. Os estilos de músicas são
classificados em três interpretações: lento, lento dramático e rápido. O uso desse instrumento é
compreendido com uma extensão do corpo ao dançar, pois sua utilização é feita paralela aos
movimentos dialogando com a música e corporeidade.
Além dos elementos de execução e repertório, o figurino tradicional é indispensável na
estética ATS. O conjunto de acessórios e trajes formam o que chamamos de Dresscode, que
reúne elementos mínimos na composição do figurino, como mostra a Imagem 6 seguir. Apesar
de ser estabelecido um padrão nos acessórios e vestimenta, as bailarinas tem liberdade de
combinações conforme preferência, dependendo muito do contexto que será
dançado/apresentado. Ferreira (2015) aborda mais detalhes sobre esse conjunto:
No cabelo que está preso a bailarina pode utilizar flores, correntes e pingente, e
podem optar por usar turbantes. No busto deve ser sempre utilizado o choli, top utilizado na Dança Clássica Indiana e adaptado para o ATS. Esse top pode ter
um sutiã com medalha por cima, as bailarinas do grupo FatChanceBellydance,
inc tem o hábito de usar, porém é uma opção [...] As saias no ATS são bastante
volumosas, podem ter 7, 10, 12, 15 metros e fazer diferentes desenhos e formas, cruzando a ponta do lado num estilo mais flamenco, ou o formato [...] Por cima
da saia, geralmente são colocados xales e cintos de preferência das bailarinas,
os xales são feitos de crochê, tricô entre outros materiais, podendo também ter pompons em sua ponta. Além da saia, a calça bufante (pantalona) também é um
acessório importante no figurino, influência da Dança Indiana (FERREIRA,
2015, p. 52 e 53).
12 Instrumento percussivo de mão em formato de címbalos feito de metal. Usados um par em cada mão,
são presos no dedão e dedo médio por um elástico. Podem acompanhar a música inteira ou partes dela, além das paradas (breaks). É tocado no repertório rápido do ATS.
Imagem 6: Bailarinas vestidas com figurino tradicional do ATS.
Fonte: Portal FatChanceBellyDance. Disponível em:
https://fcbd.com/community/gallery/ Acesso em: 09 de maio 2019.
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A partir desse contexto é possível perceber o ATS como uma dança plural, que
possibilita inúmeras interações apreciativas e práticas em suas apresentações, e dentro dessas
interações registramos momentos de força, acolhimento, reconstrução, reconhecimento, ensino,
aprendizado e muita partilha. Esse sistema de improvisação coordenada oportuniza a
globalização dessa dança tão pouco conhecida por algumas culturas. Basta que bailarinas/os
que tenham estudado formados no ATS estejam disponíveis para compartilhar essa dança no
mesmo palco, por ser uma linguagem de códigos específicos o estilo permite essa dinâmica que
une diferentes culturas num mesmo lugar. “Hoje, o ATS® é um vocabulário mundial. Quem
conhece o estilo é capaz de dançar improvisando em grupo sem nunca ter dançado com aquelas
pessoas antes” (PIÑEIRO, 2013). Além disso o Tribal não exclui os corpos não convencionais
para o estilo, todos são abraçados e instigados da mesma maneira a se descobrirem como
querem ser.
TRIBAL FUSION
O American Tribal Style foi base para o surgimento de outros estilos no universo Tribal.
A principal vertente derivada do ATS foi chamada de Tribal Fusion (Fusão Tribal), mas ainda
existem o Neo Tribal e o Improvisational Tribal Style (ITS). A bailarina Aerith fala que:
Negar o ATS é negar sua origem; é negar seu código genético, como bem disse a Rebeca; é negar seus antepassados e toda a importância que estes fizeram em
sua História. Se a pessoa quer dar aula sem ATS, tudo bem, pode-se fazê-lo.
Mas NEGAR a existência e importância do ATS no tribal fusion, há algo errado
nisso. Nem Rachel Brice, nem Zoe Jakes, nem Ariellah(exemplo na entrevista realizada com a bailarina no blog), nem Kami Liddle, nem Mira Betz e tantas
outras bailarinas importantes negam isso. Pelo contrário, existem muitas
evidências que elas vêem a importância do estudo do ATS para as fusões com dança do ventre e não só tribal fusion. (ASGARD, 2013, Artigo publicado no
portal Aerith Tribal Fusion).
Para Ferreira (2015) o Tribal Fusion foi criado pela bailarina Jill Parker13 nos EUA, que
estudou ATS com Carolena e integrou do grupo FatChanceBellydance (FCBD). Parker, saiu
do FCBD e começou a desenvolver seu próprio estilo ao montar o grupo Ultra Gypsy, criando
fusões na dança que aprendeu com Carolena. No início do grupo ela se apropriou do método
13 Professora, bailarina e coreografa de Tribal. Foi integrante do grupo FCBD e aluna de Carolena
Nericcio. É considerada a criadora do estilo Tribal Fusion, fundou o grupo Ultra Gypsy Dance Teatre responsável por revelar grandes nomes da cena Tribal.
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ATS trabalhando o improviso coordenado, mas logo começou a mesclar figurinos, músicas e
movimentos da cultura ocidental.
Influenciada pelo movimento contemporâneo, a primeira grande mudança ocorre na
vestimenta tirando peças tradicionais do figurino ATS que foram inspirados nas danças de
matrizes. Na dança, ela fusiona movimentos do Breakdance, da dança Moderna e do Jazz
criando outra estética corporal para o Tribal e começa a utilizar outros tipos de músicas
incluindo principalmente, músicas ocidentais, com remixes, batidas e sons eletrônicos
(FERREIRA, 2015).
O grupo Ultra Gypsy é considerado pioneiro no estilo Tribal Fusion pois serviu de
inspiração para o surgimento de outros grupos. Ele formou grandes bailarinas como, Lady Fred,
Sharon Kihara, Rosen Harden, Rachel Brice e tantas outras (PARKER, 2017). Ferreira (2015)
destaca Rachel como uma grande referência no estilo atualmente, por ser responsável pela
expansão do estilo no mundo e por popularizar as performances solo de Tribal, desenvolvendo
ainda sua própria dança.
Existem outros nomes importantes no processo de construção do que hoje entendemos
por Tribal Bellydance, “tais como Mardi Love, Kami Liddle, Sharon Kihara, [...] e Zoe Jakes.
Essas bailarinas dão forma ao estilo a partir de suas experiências pessoais com outras danças
além do Tribal e da Dança do Ventre” (FERREIRA, 2015, p. 16).
E nesses processos foram surgindo subgêneros, a exemplo do Dark Fusion, Hip Hop
Fusion, Burlesque, Vintage, Tribal Brasil etc. Hoje não se sabe quantos subgêneros existem no
Tribal pois é difícil catalogar as fusões que surgem em diferentes danças do mundo todo.
Ressalvo que no consenso comum, para ser considerado Tribal Fusion deve existir a presença
de elementos do ATS na fusão proposta, fora isso a dança é tratada apenas como Fusão.
Novas contaminações estão sempre surgindo no movimento Tribal, isso me faz pensar
em alusão ao símbolo do infinito onde não existe fim. É instigante pensar essa dança como
dispositivo de criação, de surgimento, de renovação que não está propensa a um esgotamento.
Além de criar movimentos essa manifestação também cria culturas, aproxima pessoas e conecta
lugares num diálogo contínuo por meio da dança.
O TRIBAL BELLYDANCE NO BRASIL
A divulgação do Tribal Bellydance pelo mundo fez essa linguagem crescer em grandes
proporções, ganhando novos adeptos em várias culturas. Sua inserção no Brasil aconteceu
através da bailarina Shaide Halim no início dos anos 2000. Numa entrevista concedida ao portal
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Central Dança do Ventre, Halim fala sobre sua trajetória na dança e como iniciou seus estudos
no Tribal:
Meu primeiro contato com o Tribal foi em 1990, no Central Park, em Nova
York, numa apresentação da Rakkadu Gipsy Caravan. Na época eu ainda não tinha nenhum conhecimento em dança do ventre, que só comecei a estudar em
1994, mas já estudava ballet clássico, jazz e dança afro. (HALIM, 2008.
Entrevista concedia ao portal Central Dança do Ventre).
Se pensarmos no processo construtivo do Tribal em relação ao mesmo processo do
Brasil, percebemos uma aproximação entre eles. O Brasil é um país diverso e possui uma
cultura extensa ao longo de seu território, foi construído por uma mistura de povos e sua maior
característica é de ser um país híbrido biologicamente e culturalmente. Em contraponto esse
aspecto exclui o registro do Brasil possuir uma etnia única brasileira.
Reis (1961) apresenta uma investigação densa sobre a formação do Brasil a partir dos
povos europeus, negros e índios, ele afirma que:
No Brasil, onde o povoamento se realizou e se tem realizado por grupos os mais diversos em aspectos raciais e culturais, onde as migrações não tiveram
intensidade e distribuição iguais em nosso imenso território, difícil se torna
determinar a etnia brasileira [...] As ligações inter-raciais com elementos diversos: branco e negro, branco e índio, negro e índio, etc., criaram um certo
número de "tipos" que se distribuíram nas várias áreas. (REIS, 1961, p. 323)
Essa miscigenação permitiu além da mudança biológica uma construção quase infinita
de costumes populares. Dentro dessa diversidade encontramos manifestações artísticas que são
próprias do nosso país e que surgiram a partir de vários contextos, são diferentes linguagens
que se estendem pelas danças, festas tradicionais, brincadeiras infantis, lendas, músicas,
manifestações religiosas, entre outras. Esse aspecto de miscigenação aproxima a cultura popular
brasileira da dança Tribal que tem na hibridação sua maior referência construtiva. É partindo
desse pressuposto que compreendo o surgimento do estilo Tribal Brasil desenvolvido pela
bailarina Kilma Farias.
TRIBAL BRASIL
O Tribal Brasil surgiu a partir da fusão de danças populares e afro-brasileiras com a
linguagem da dança Tribal no ano de 2003. A percussora desse estilo foi a professora,
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coreografa e bailarina Kilma Farias14 (João Pessoa – PB). Ela sistematizou esse subgênero,
criando inúmeras possibilidades de dança em diferentes contextos. Nessa linguagem é muito
comum o uso de danças nordestinas, como o coco, o caboclinhos, o xaxado e o maracatu, além
de contemplar também as danças dos orixás. Mas ainda é possível dialogar com outros estilos
como o Toré15 e as danças urbanas por exemplo (FARIAS, 2014).
O uso de adereços e acessórios são indispensáveis nessa estética, não somente pelo
embelezamento, mas por trazer representações que contextualizam essas fusões. Podemos
encontrar elementos como: o jarro que representa a fertilidade; a espada, fazendo referência a
identidade guerreira; o espelho, característico do Orixá Oxum e das sereias; a taça, forte símbolo
do cristianismo; as flores, representando a natureza e a fertilidade da terra etc. Farias (2014)
reforça que esses e outros elementos constituem um sistema de adornos que permite
ressignificações a cada nova dança.
14 Formada em Jornalismo, é graduanda do curso de Licenciatura em Dança pela Universidade Federal
da Paraíba (UFPB). Dirige a Cia Lunay, é bailarina, coreógrafa e proprietária do Studio Lunay, sendo
ainda uma das organizadoras da Caravana Tribal Nordeste. Autora do projeto “Cultura em Movimento” em João Pessoa-PB, foi responsável por desenvolver e sistematizar o estilo Tribal Brasil. Autora do livro
“Dança do Ventre da Energia ao Movimento”, já ministrou aulas e workshops nos Estados Unidos,
Argentina e Peru. 15 Ritual de cantos e danças sagradas, incluindo práticas religiosas e indígenas. Tem por objetivo a
comunicação com os encantos ou encantados que vivem no Reino da Jurema, referência à bebida feita
com a casca da raiz da juremeira. Quanto à dança, propriamente dita, ela assume características diferentes em cada comunidade.
Imagem 7: Shaman Tribal Co. dançando com jarros em
apresentação do pocket show Híbrida.
Fonte: Arquivo pessoal (2019).
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A música também é um elemento importante no reconhecimento do Tribal Brasil.
Geralmente os repertórios usados nas fusões são de músicas tradicionais das danças populares
brasileiras, sendo essas com letras ou apenas instrumental. Músicas de bandas e cantores
nordestinos também são usadas com frequência nas composições. Porém, a presença constante
da cultura nordestina no Tribal Brasil não exclui a possibilidade de fusionar com danças
originárias de outras regiões, assim como na influência estética e musical.
No intuito de divulgar o Tribal Brasil e a dança Tribal pela região Nordeste, foi criado
a “Caravana Tribal Nordeste” (CTNE), um evento onde grupos de vários estados puderam
compartilhar seus estudos entre si, Souza (2019) relata em entrevista o objetivo desse projeto:
A “Caravana Tribal Nordeste” (CTNE), é a proposta de grupos aqui do Nordeste de movimentarem o Tribal aqui, [...] surgiu através da Kilma Farias de João
Pessoa (PB), e a ideia era basicamente ser um evento itinerante que acontecia a
cada 2 meses em um estado aqui do Nordeste, e juntou Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Bahia a princípio, nos primeiros 2 anos. E a cada 2 meses
a gente ia para uma dessas cidades e os grupos davam aula uns para os outros,
e o grupo que sediava tinha que providenciar uma oficina de uma dança regional, e foi aí que a gente estudou caboclinho, coco, afoxé, danças dos orixás,
tudo isso foi estudando dentro da Caravana (SOUZA, 2019. Entrevista
concedida em 15 de abril).
A criação desse evento foi importante não somente para divulgação do Tribal, mas
também por proporcionar um intercâmbio cultural entre grupos/dançarinos/pesquisadores de
outros gêneros da dança, oportunizando um diálogo de diferentes modos de se pensar e
fazer/produzir essa dança. Nesse aspecto a diversidade rompe fronteiras e dissolve quaisquer
diferenças quando se amplia o reconhecimento das inúmeras maneiras de ser sujeito.
Imagem 8: Aquarius Cia de Dança na Caravana Tribal
Nordeste 2014.
Fonte: Canal Kilma Farias. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=hVyFADGwp0E>
Acesso em: 13 de maio 2019.
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As Imagens 8 e 9, mostram dois grupos em apresentação no evento “Caravana Tribal
Nordeste”. Em 2014 com a Aquarius Cia de Dança e em 2016 com Cia Lunay, respectivamente.
Esses grupos estiveram presentes em várias edições do evento, o que ajudou significativamente
na divulgação do trabalho realizado por eles em outros estados da região Nordeste.
O ESTILO TRIBAL EM NATAL
O Tribal Bellydance foi se expandindo em todo país e não demorou muito até chegar no
Rio Grande do Norte. Por aqui ele começou a ser praticado em Natal de maneira bem tímida
por bailarinas da dança do Ventre, através de um DVD com vídeos do programa Bellydance
Superstar. Segundo Souza (2019), os primeiros passos foram dançados por um grupo de estudos
dirigido pela professora Eliete Monteiro, em 2006, que dava aulas de dança do Ventre na época.
Na entrevista concedida por Souza (2019), ela relata sua trajetória na dança e fala sobre esse
começo da dança Tribal em Natal:
Fiz 4 anos e meio de Dança do Ventre com a professora Eliete Monteiro que na
época era conhecida como Aenia Shake, e foi através dela também que conheci o Tribal. Nas aulas de vídeo que ela passava ela mostrou um vídeo da
Bellydance SuperStar, que tinha uma apresentação do grupo The Indigo,
formado pelos grandes nomes como Rachel Brice, Sharon Kihara, Zoe Jakes e
etc. Eu vi aquilo e fiquei ensandecida, meu Deus é isso que eu quero fazer.
Fonte: Canal Kilma Farias. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=KLrcIx0mxF8> Acesso em: 13 de maio 2019.
Imagem 9: Cia Lunay na Caravana Tribal Nordeste 2016.
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Porque, na Dança do Ventre, apesar de ser muito prazeroso eu me sentia muita
desengonçada [...] E no Tribal me identifiquei com o visual principalmente, e com a dança. Não existia o Tribal aqui em Natal e minha professora estudava
por vídeo, ela montou um grupo de estudos por vídeos e a gente começou a
estudar o Tribal por vídeo. (SOUZA, 2019, Entrevista parte 1/3).
Existia uma dificuldade maior em estudar pelos vídeos, pois o fato de não haver
bailarinas profissionais de Tribal na Cidade impossibilitava a limpeza dos movimentos, o que
resultava numa dança cheia de interrogações. Mas a vontade visceral de aprender sobre essa
dança manteve uma chama acesa e mesmo com pouca informação o Tribal foi se fortalecendo
na dança em Natal e atualmente vem conquistando cada vez mais notoriedade por suas
produções.
Atualmente esse estilo é ofertado em 03 escolas de dança na Cidade: Evidance
Academia de Dança, Estúdio de Dança Estesia ambos com a professora Giovana Pessoa, e no
Shaman Tribal Studio que é dirigido por Cibelle Souza. Além das aulas, o Tribal também é
praticado através da Shaman Tribal Company, única Companhia do estilo atuante no estado do
RN.
SHAMAN TRIBAL COMPANY
A Companhia Shaman surgiu através das bailarinas Paula Braz e Ellen Paes em 2006,
paralelo ao começo da prática do Tribal em Natal. Inicialmente sua formação aconteceu pela
necessidade dessas bailarinas em dançar o estilo que tanto se identificavam e com a proposta
de trabalhar o sagrado feminino e as danças ancestrais. Outras bailarinas se juntaram a Ellen e
Paula para uma apresentação no Café Salão da Nalva Melo, Janine, Bartira e Vivian, e
posteriormente Regina Silva e Cibelle Souza.
O nome Shaman foi sugerido por uma das bailarinas que integrou a primeira formação,
Souza (2019) explicou como foi esse processo:
O nome foi sugerido por Bartira Calado que é nossa Shaman. Ela tem
descendência indígena e faz estudos shamanicos com grupos aqui em Natal e
fora do estado também. E aí discutindo o conceito de tribo, o que era Tribal, do empoderamento, do resgate da ancestralidade do feminino através da dança que
foi a primeira pegada que a gente teve no Tribal, aí Bartira sugeriu o nome
Shaman a partir desse conceito. E aí as meninas gostaram e ficou Shaman
Tribal. Quando ela surgiu, surgiu Shaman do jeito que fala em português, com x e acento tio no “mã”. E no decorrer dos anos começamos a trabalhar com
bailarinas de fora do país, e elas não sabiam falar “Xamã” com x pela
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dificuldade da pronúncia, já que nos Estados Unidos o x tem outro som. Então
em reunião com a Paula, a gente entendeu que para facilitar nosso contato com as bailarinas de fora a gente precisava escrever o nome Shaman em inglês. E
passou a se chamar Shaman Tribal Company (SOUZA, 2019, Entrevista parte
1/3).
Depois de um tempo a Shaman sofreu mudanças no corpo de baile, Paula Braz se mudou
para São Paulo (SP) e Cibelle assumiu a direção da Companhia. Sem querer deixar o universo
Tribal, Paula em decisão com Cibelle decidiu expandir o trabalho da Companhia e abriu um
núcleo em Rio Claro (SP), que contava com a participação das bailarinas Gabriela Goés, Jamille
Berbare, Paloma Maioral e Ludmila Rentas.
Já em Natal, a Shaman foi desenvolvendo um trabalho de “formiga” construindo seu
espaço nesse cenário. Em 13 anos de existência foram vários objetivos alcançados que
contribuíram para a consolidação da Companhia como sendo uma das melhores do Brasil.
Dentre os principais acontecimentos que o grupo vivenciou estão as produções de eventos e
espetáculos, as participações em festivais dentro e fora do país além das premiações.
Imagem 10: Logo marca da Companhia Shaman.
Fonte: Perfil do Instagram Shaman Tribal Co.
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PRODUÇÕES SHAMAN TRIBAL
Imagem 13: Poster do pocket show Híbrida.
Fonte: Perfil do Instagram Shaman Tribal Co.
(2019)
Imagem 14: Poster do V Hafla Shaman Tribal.
Imagem 11: Poster do espetáculo Las Nieblas.
Fonte: Perfil do Instagram Shaman Tribal Co.
(2015)
Imagem 12: Poster do espetáculo Sonhos Lúcidos.
Fonte: Perfil do Instagram Shaman Tribal Co.
(2018)
Fonte: Perfil do Instagram Shaman Tribal Co.
(2018)
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Se apropriando de conceitos em torno do sagrado feminino, do empoderamento, do
resgate da ancestralidade através da dança, de tribo entre outros, a Companhia foi trabalhando
esses conceitos nos espetáculos, pocket shows e outras produções.
Para o espetáculo “Las Nieblas” a inspiração se deu a partir dos vários arquétipos de
mulheres construídos ao longo da história e dos mitos e lendas de várias tradições que mostram
a força da união feminina. Já no espetáculo “Sonhos Lúcidos” o conceito foi inspirado a partir
do surrealismo e o misterioso mundo dos sonhos, misturando o real com o imaginário
transpondo tantas histórias em corporeidade. O pocket show Hídrida é um projeto que permeia
o imaginário e a criatividade, reforçando a mulher como um ser plural e complexo, que pode e
deve exercer sua liberdade quanto à sexualidade, corpo, beleza, fundamentada em suas origens
ainda que tomada por sua capacidade de reinvenção.
O evento Hafla é compreendido como uma “Mostra” de caráter intimista, onde as turmas
do Studio Shaman e as bailarinas da Companhia realizam apresentações sem a preocupação de
receber críticas, onde o foco principal é de se divertir, confraternizar e até perder um pouco da
timidez de dançar para um público.
Hoje o corpo de baile Shaman Tribal (núcleo Natal) conta com 13 bailarinas em
atividade. O ingresso para integrar a Companhia é por meio de audição que acontece sem
período determinado, dependendo muito da necessidade do grupo. Os ensaios (núcleo Natal)
acontecem duas vezes por semana com 3 horas de duração cada ensaio e com intervalo de 15
minutos.
A Companhia já viajou pelo Brasil e outros países, onde fez participações em eventos e
festivais contando com apresentações no Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Bahia, Paraíba,
Chile, Colômbia, Argentina e Estados Unidos. Algumas participações são feitas pelo núcleo de
São Paulo, dependendo muito da proposta e da logística (SOUZA, 2019).
O trabalho da Companhia Shaman sem dúvidas é uma das grandes referências do estilo
Tribal no cenário da dança brasileira. Sua dança, definida como “dança étnica contemporânea”
possui um nível técnico e estético surpreendente que é fruto de um trabalho árduo de muita
pesquisa e estudo contínuo, pois o Tribal é um estilo em constante renovação.
Sobre a cena natalense, o espaço conquistado ainda não é o esperado e por muito tempo
as possibilidades nem existiam, mas hoje, por uma insistência resiliente, as possibilidades estão
começando aparecer nos eventos e competições de dança em Natal, o que é inspirador para que
esse trabalho não cesse.
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SHAMAN TRIBAL STUDIO
O Studio Shaman está localizado na Rua Humberto Monte, número1964, no bairro de
Capim Macio, zona sul de Natal. Antes de funcionar nesse endereço as aulas aconteciam num
espaço alugado localizado na Av. Prudente de Morais. Segundo Souza (2019) o Studio surgiu
devido a necessidade em formar bailarinas para a Companhia Shaman e pela procura do público
que começava a tomar conhecimento desse estilo. No prédio atual o Studio divide as atividades
com um Studio de Música dirigido pelo esposo de Cibelle, e que comporta dois banheiros, uma
cozinha, uma sala de recepção e uma sala de aula apropriada para prática de dança, além de
contar com um espeço exclusivo para as atividades de música.
Atualmente são ofertadas 4 modalidades na grade de aulas: Tribal Fusion, Tribal Kids,
Dança Contemporânea e Yoga. Sendo 9 turmas de Tribal Fusion, 1 turma de Tribal Kids, 1
turma de Dança Contemporânea e 4 turmas de Yoga, atendendo uma média de 75 alunos. As
aulas de Tribal Fusion são dívidas em 3 níveis de aprendizados: iniciante, intermediário e
avançado. A diretora e professora do Studio, Cibelle Souza, é responsável pela organização dos
conteúdos e estudos que caracterizam os níveis.
A metodologia utilizada nas aulas de Tribal Fusion16, dialoga na práxis teórico-prático.
Trabalhando autores que contextualizam a história do Tribal, a professora Cibelle traz um
conteúdo introdutório sobre os grandes pesquisadores dessa dança e seus principais estilos para
compor as aulas teóricas iniciais. Já nas aulas práticas, além dos movimentos específicos e
codificados do Tribal são desenvolvidos exercícios e estudos em diversos conteúdos da dança:
improvisação, composição coreográfica, níveis espaciais e fatores do movimento são alguns
desses conteúdos.
As aulas práticas são divididas em 03 momentos, organizadas da seguinte maneira:
1º Momento: A aula inicia com o aquecimento das articulações e musculatura do corpo,
através de exercícios aeróbicos, de contração e relaxamento sendo esses exercícios estáticos
e/ou dinâmicos e exercícios de percepção.
2º Momento: O estudo dos movimentos acontece por meio de uma sequência
coreográfica. São pequenas células estudadas repetidas vezes para compor essa sequência ao
final da aula. Durante esse estudo vão sendo incorporados novos movimentos e revisados
16 A partir da proposta da pesquisa irei tratar especialmente sobre os processos da turma intermediário I, do sábado, da modalidade Tribal Fusion.
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movimentos anteriores já estudados. Ao final da aula registramos em vídeo a sequência que é
compartilhada com todos da turma para ser estudada em outros momentos.
3º Momento: A aula finaliza com um relaxamento para desacelerar o corpo e refletir
sobre os conteúdos/movimentos aprendidos na aula.
Outra possibilidade de aula parte da exploração de movimentos e criação de células
coreográficas elaboradas pelos próprios alunos. Nas imagens 15 e 16 a seguir, a professora
Cibelle Souza, da turma Intermediário I, fez o registro de uma aula nesse formato. De início é
feito uma revisão dos movimentos estudados e logo após os alunos dispõe de um tempo para
elaborar suas sequências.
Os processos de ensino e aprendizagem trabalhados no Studio Shaman são considerados
uma modalidade da educação informal, que compreende aspectos processuais semelhantes da
educação formal, contemplando o planejamento de aulas com seus objetivos, conteúdos,
metodologias, avaliação etc.
O Studio é uma escola que pode viabilizar a atuação do graduando em Dança na
atividade obrigatória do Estágio IV, possibilitando relacionar os conteúdos estudados na
academia, com a prática pedagógica do campo de atuação.
Imagem 15: Aula de composição
coreográfica.
Fonte: Arquivo pessoal (2019).
Imagem 16: Aula de composição
coreográfica.
Fonte: Arquivo pessoal (2019).
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Durante as aulas também acontecem os processos de criação das coreografias a serem
apresentadas nas Mostras de final de ano. Esse processo de composição é feito de forma
colaborativa, com uma ideia inicial sugerida pela professora e a contribuição da turma pensando
figurino, música, movimentos e desenhos coreográficos.
A partir do relato de alunas bailarinas da turma Intermediário I, foi possível
compreender o que essa dança representa para cada uma em sua individualidade. Escolhi 03
alunas da turma que já possuíam experiência com mais de 01 ano na prática do Tribal, pois
acredito que esse tempo de vivência permitiu uma fala com propriedade para a proposta do
trabalho.
O entendimento sobre o que é essa dança é descrito de várias formas nos depoimentos
coletados, seja no sentido cognitivo, motor e/ou comportamental. Esses pontos ficam evidentes
nos depoimentos mostrados a seguir:
“Partindo do lado “prático” é terapêutico, me auxilia a aprender a lidar com a
ansiedade, é um exercício que foge do convencional das academias. Agora
partindo do lado “romântico”, é minha grande paixão, descobri que possui muitas nuances, que posso sempre aprender mais, ao qual nunca me canso.
Sobretudo explorar vários caminhos e aprender a ter paciência com meu corpo,
ele vai responder!”
“Para mim o tribal é literalmente uma fusão de culturas. É um estilo de dança
que engloba várias vertentes e ao mesmo tempo dá uma maior liberdade de
criação para quem tá dançando.”
“Para mim o Tribal é uma dança não somente de fusão [...] eu vejo mais como
uma libertação de certas amarras, te dando mais possibilidades de você criar outros estilos, de você talvez se encontrar mais na dança. [...] O Tribal é
diferente, eu percebo que a liberdade é muito maior na parte de criação. Então
eu vejo como se fosse um grito, as vezes que você está bem preso e você consegue sair dessa prisão.”
Através desses relatos, percebo a importância do Tribal realizado no Studio Shaman,
tendo o Tribal Fusion como foco. Destaco não somente a disposição corporal e criativa como
fortes elementos dessa dança, mas a importância de valorizar outros aspectos do cotidiano
relacionados ao emocional. Esses aspectos por muitas vezes são potencializados na dança
através dos movimentos, mas existem outros elementos que contribuem nesse processo: a
música, a apreciação estética, os estudos coletivos entre outros, são ferramentas importantes
nessa construção.
O Shaman Tribal Studio abraça diferentes pessoas independente de idade, cor, gênero
ou classe social. E essa condição, em diálogo com as ferramentas potencializadoras, reconhece
36
o Tribal como sendo um dispositivo que reforça a diversidade, e é nessa diversidade que
encontramos crescimento e beleza mais do que quando se estabelece um biotipo específico para
realizar qualquer dança.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Tribal Bellydance é reconhecido mundialmente como uma manifestação artística da
dança. Porém esse reconhecimento não atinge todos os públicos da mesma maneira, o que acaba
provocando questionamentos sobre o que de fato compõe essa dança.
Contextualizar a história do Tribal para um público leigo ou com pouco conhecimento
sobre o assunto é importante para dissolver interpretações erradas construídas, em alguns casos,
pela falta de informações. Evitando que se perpetue uma dança com propostas diferentes da
qual ela foi criada.
É obrigação do professor de dança (nesse caso dos estilos ATS e Tribal Fusion) estudar
a história do estilo, pesquisar autores reconhecidos que tratam sobre o tema e refletir sobre
como se deu esse processo inicial e como ele é tratado até os dias atuais. É um estudo de
renovação constante, assim como para qualquer outro conteúdo que se tenha interesse em
pesquisar e trabalhar.
O American Tribal Style possui uma importância significativa para o que hoje
chamamos de Tribal Bellydance. O exercício de criação desse sistema de sequências
possibilitou experimentar processos de fusão, de criação e percepção, que inspiraram o
surgimento de novos estilos, ou seja, novas formas de mover o corpo.
No meu entendimento esses processos ajudam na particularidade de cada indivíduo.
Atuando como elemento facilitador de descobertas, seja na dança ou nas outras áreas do
conhecimento. Importante destacar que o conhecimento sobre outras culturas, fortalece e torna
possível ao indivíduo um desenvolvimento com maior autonomia. O ATS proporciona esse
fortalecimento por ter essa característica de fusão de diferentes culturas numa única
manifestação.
Com o estilo Tribal Fusion as possibilidades foram ainda maiores. Um novo conceito
surgiu trazendo infinitas combinações de movimentos, músicas e figurinos. Foram criados
subgêneros dessa vertente, como o Dark Fusion, Hip Hop Fusion, Burlesque, Vintage e Tribal
Brasil, que contemplou diversos povos e suas culturas, funcionando como uma ponte de
aproximação entre essas culturas. Reforço que esse intercâmbio cultural transforma o indivíduo
e o seu desenvolvimento, podendo afetar ainda outros indivíduos em seu torno.
Essa prática no Brasil foi porta para o estudo de novas fusões. A bailarina Kilma Farias
ao criar o Tribal Brasil considerou conceitos de danças brasileiras que se assemelham aos
conceitos iniciais do Tribal, permitindo diálogos com uma riqueza infinita de movimentos.
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Pensando a dança popular brasileira como uma linguagem que transmite histórias e apresenta
marcas de sua própria dança, a fusão com ATS e Tribal Fusion permite ressignificar no presente
possibilidades outras na vida de cada indivíduo.
O Tribal Brasil surgiu na região Nordeste e por isso tem maiores adeptos nos estados
que compõe essa região. No Rio Grande do Norte a prática desse estilo é trabalhada na Shaman
Tribal Company com frequência. Souza (2019) relata que por muito tempo a Companhia
pesquisou danças populares como o Coco, o Cavalo-marinho e o Caboclinhos para compor os
trabalhos desenvolvidos pelo grupo.
O trabalho consistente da Companhia Shaman inspira outros grupos (de dança) dentro
e fora do estado. É evidente que esse reconhecimento é fruto de um trabalho persistente, de
muita dedicação e respeito ao público consumidor do estilo Tribal. Mais do que isso, é
admirável ver a Shaman resgatando conceitos tão importantes na construção do indivíduo e que
são projetados com uma delicadeza e qualidade impressionantes. Hoje é possível afirmar que
este é sem dúvidas um dos grupos mais importantes na construção do Tribal no país.
Para compor a construção dessa pesquisa, foi necessário fazer entrevistas realizadas com
alunas do Studio Shaman, que serviram como ponto norteador para avaliação do trabalho.
Observei a partir desses relatos transformações proporcionadas pela prática do Tribal que
surgem nas narrativas dos corpos dessas bailarinas. Nas entrevistas notei particularidades que
compõe a individualidade de cada bailarina, o que é normal perceber levando em consideração
que somos indivíduos distintos socio-culturalmente.
Um ponto observado em comum citado pelas alunas nas entrevistas foi a relação com o
corpo e suas transformações. As mudanças físicas sentidas por elas após iniciarem na prática
do Tribal contribuíram de forma positiva na melhora da qualidade de vida. A aceitação desse
corpo também foi colocada em questão, ficando evidente quando uma das alunas afirma que o
Tribal “mudou a forma que vejo meu corpo, a amar o meu corpo como ele exatamente é, com
as cicatrizes, estrias, e toda a história que ele carrega.”
Esse trabalho foi importante por tamanha proporção que tomou, me permitindo
conhecer histórias expressivas de grupos, companhias, bailarinas/os, pesquisadores,
professoras/os e alunas que reforçam a prática do Tribal como uma manifestação poderosa de
autoconhecimento. Estimulou ainda um desejo maior em trabalhar questões pouco discutidas
no tema “Tribal Bellydance”. Contudo, escrever e discutir essas questões é um desafio constante
mas prazeroso duas vezes mais, e especialmente a experiência de falar sobre a história do Tribal
em Natal foi uma abertura para outros conhecimentos e oportunidades.
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Concluo reconhecendo o Tribal Bellydance como uma manifestação capaz de me fazer
refletir para uma nova percepção sobre a dança. Suas inúmeras possibilidades de produzir
movimentos dialoga com conceitos e conteúdos dessa linguagem de maneira muito
significativa. São experiências que transformam o indivíduo em sua totalidade, facilitando os
processos de compreensão do corpo na dança.
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REFERÊNCIAS
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de transgressões em tempos de globalização contra hegemônica. Monografia 34 p. (Pós-
Graduação em Estudos Contemporâneos sobre Dança). Universidade Federal da Bahia,
Salvador, 2011.
CÉZAR, Melissa F. de Oliveira. Mulheres que dançam. Relatório de fundamentação do
projeto experimental, modalidade Mídia Digital – Website. Faculdade Campo Limpo Paulista,
2017.
FERREIRA, Tamiris Aline. Dança Tribal – Corpo, movimento e aprendizado: trajetórias
e narrativas de bailarinas de Florianópolis/SC. (TCC - Graduação - Curso de Ciências
Sociais, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, UFSC) Universidade Federal de Santa
Catarina, 2015.
REIS, P. Pereira dos. A miscigenação e a etnia brasileira. Revista de História. Departamento
de História, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo,
1961.
SAID, Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Edward W. Said:
tradução Tomás Rosa Bueno – São Paulo: Companhia das letras, 1990.
SUZART, Elizabete Costa. Toré, um dueto de forças que reúne povos ancestrais. Congresso
internacional sobre Culturas, Memória e Sensibilidade: Cenários da Experiência Cultural
Contemporânea. Cachoeira, Bahia, 2018.
ONLINE
ANDRADE, Joline Teixeira Araújo. Biografia. Disponível em:
<https://www.jolineandrade.com/biografia>. Acesso em: 06 de mai. 2019.
ESPINOSA, Natália. Jamila e o legado Salimpour. Congresso Tribal. Disponível em:
<https://congressotribal.com/2018/01/29/jamila-e-o-legado-salimpour/> Acesso em: 08 de
maio 2019.
ANTONIEDIS, Cristina. A dança do ventre e seus estilos. Central da Dança do Ventre.
Disponível em: <https://www.centraldancadoventre.com.br/publicacoes/artigos/26/a-danca-
do-ventre-e-seus-estilos/469> Acesso em: 10 de maio 2019.
41
FARIAS, Kilma. A dança como religare e instrumento de tolerância e paz. Portal Projetando
Tribal Brasil. Disponível em: < http://projetandotribalbrasil.blogspot.com/> Acesso em: 13 de
maio 2019.
LOURO, Carol. A história da dança do ventre. Canal Hob Salam. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=tabOgZ8ty6I> Acesso em: 09 de meio 2019.
ROQUE, Tâmara. Documentário: Tribal Brasil, construindo um estilo de dança.
Documentário produzido para conclusão do curso de Comunicação Social – Habilitação em
Rádio e TV, Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Disponível em: <
https://www.youtube.com/watch?v=PszKX0fts1U> Acesso em: 10 de maio 2019.
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APÊNDICES
ENTREVISTA COM CIBELLE SOUZA, CONCEDIDA EM 15 DE ABRIL DE 2019.
Me fale sobre sua trajetória. Vida acadêmica, profissional e artística.
- Sou formada em Psicologia, pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), e
tenho especialização em Psicologia Fenomenológica Existencial também pela UFRN.
Trabalhei durante 7 anos como Psicoterapeuta Clínica e por 4 anos como Psicóloga Social pela
Prefeitura de São Gonçalo do Amarante. Em 2016 ingressei no curso de Licenciatura em Dança
na UFRN, cheguei a cursa 1 ano, mas não consegui dar continuidade ao curso. Minha trajetória
na dança começou ainda criança quando fiz 4 meses de balé aos 5 anos de idade, mas por uma
preferência da minha mãe ela me tirou das aulas de balé e me colocou para fazer natação. Voltei
a dançar somente aos 21 anos por um convite de uma amiga que me levou para assistir uma
aula de dança do Ventre. Estava passando por um momento difícil na minha vida pessoal e no
momento que eu entrei na sala de aula entendi que era aquilo que faltava na minha vida desde
criança, no fundo eu queria ter ficado nas aulas de dança quando criança. Fiz 4 anos e meio de
dança do Ventre com a professora Eliete Monteiro que na época era conhecida como Aenia
Shake, e foi através dela também que conheci o Tribal. Nas aulas de vídeo que ela passava ela
mostrou um vídeo da Bellydance SuperStar, que tinha uma apresentação do grupo The Indigo,
formado pelos grandes nomes como Rachel Brice, Sharon Kihara, Zoe Jakes etc. Eu vi aquilo
e fiquei ensandecida, meu Deus é isso que eu quero fazer. Porque, na dança do Ventre, apesar
de ser muito prazeroso eu me sentia muita desengonçada porque eu achava uma dança muito
delicada e eu nunca me senti uma mulher delicada, sempre me achei uma mulher muita
agressiva, fisicamente agressiva, não uma pessoa louca agressiva, e eu tinha muita dificuldade
de ser delicada na dança do Ventre. E no Tribal me identifiquei com o visual principalmente, e
com a dança. Não existia o Tribal aqui em Natal e minha professora estudava por vídeo, ela
montou um grupo de estudos por vídeos e a gente começou a estudar o Tribal por vídeo. Minha
formação em Tribal depois se deu porque sai de Natal para estudar e conseguir estudar com os
grandes nomes, participando de festivais, workshops, cursos de formação. Estudei com quase
todas grandes bailarinas que admiro quando estiveram no Brasil e fui até os Estados Unidos
para estudar com as que faltavam.
A partir das suas experiências com a dança e na dança. Qual a importância dessa
manifestação na sua vida?
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- A dança é a minha vida. Eu não sei ser sem dançar, o dia que não danço é um dia muito ruim,
fico depressiva. São dias que não tenho vontade de sair da cama, já que não tem dança fico
deitada o dia inteiro. Mas eu acabo dançando em casa, sozinha mesmo. E passou a ser o norte
principal da minha vida atualmente. Obviamente que tem coisas importantes na minha vida,
família, amigos, meu casamento, minhas cadelas que tenho 3 e amo, são muito importantes para
minha vida. Mas a dança é que me norteia, é a única que eu digo hoje em dia que não conseguiria
viver sem se tirar a dança de mim não sei o que faria.
E como você define sua dança enquanto artista?
- É expressão, é movimento de ser no mundo, é existência. É a forma como eu enxergo de existir
no mundo é a dança, é como eu consigo me comunicar melhor. É a forma que consigo ser
sincera comigo mesma, é quando eu não consigo mentir, disfarçar. E eu acho isso ótimo porque
eu odeio mentir, disfarçar as vezes no dia a dia a gente é meio que obrigado pelas vivencias.
Então é o momento que sou cem por cento eu, sincera e reafirmo que acredito ser a melhor
forma de me comunicar com as pessoas.
Levando em consideração a sua atuação em Natal. Como você compreende a dança Tribal
na cena de dança em Natal?
- Eu percebo que o Tribal tem causado cada vez mais curiosidade nas pessoas, é algo novo aqui,
muita gente não conhece ainda. Mas eu acho interessante perceber como nos últimos anos cada
vez uma quantidade maior de pessoas sabe o que é, tipo, antigamente a gente precisava explicar
o que era o estilo, hoje em dia falo: danço Tribal, e as pessoas: ah, Tribal. Então percebo que é
um movimento em ascensão, em crescimento aqui em Natal. Mas eu acho que as pessoas ainda
se confundem um pouco sobre o que é o estilo, muito ainda se acha que é dança do Ventre, mas
uma boa parcela já percebe que não é bem dança do Ventre. E eu acho que é isso que tem
despertado a grande curiosidade das pessoas tentarem entender o que é esse estilo mesmo. E
chama muito atenção visualmente então termina que as pessoas veem o impacto visual e tentam
entender o que está por trás daquele impacto visual, como se chega ali.
Você acredita que o Tribal já conquistou seu espaço na dança de Natal?
- Eu acredito que ela está começando a ganhar, mas ainda não existe um espaço real. Mas
existem as possibilidades de espaço, pois antes não existiam nem as possibilidades de espaço.
A gente durante muito tempo tivemos que criar as possibilidades de espaço, e hoje em dia eu
percebo que as possibilidades de espaço existem, quando por exemplo, vai ter um festival como
o Tanz, e entre as categorias de competição já existe a categoria Tribal, e antes não existia. Tipo,
antes quando a gente ia participar de um evento de dança aqui, a gente nunca sabia em qual
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categoria se inscrever. Porque se inscrevia na dança contemporânea, diziam que não é dança
contemporânea, apesar que o Tribal também é conhecido como dança étnica contemporânea,
mas não é “contemporâneo tradicional” então as pessoas do contemporâneo não nos
encaixavam no contemporâneo, e ai se a gente tentava entrar como dança do ventre as pessoas
não nos encaixavam com dança do ventre, então durante muito tempo o complicado era que
não existia onde se encaixar, hoje em dia já existe onde se encaixar, as pessoas já entendem
mais ou menos onde a gente fica. Mas ainda não é um espaço que eu acho que deveria ter, como
os outros estilos de dança já tem. Mas ao mesmo tempo, na verdade aqui em Natal eu acho que
são poucos os estilos de dança que tem um real espaço. Porque existem vários outros grupos de
dança ou de estilos de dança que as pessoas de uma forma geral, as pessoas leigas sabem o que
é aquela dança, porém isso não significa que aquela dança tem um espaço dentro da comunidade
de dança da cidade. Por exemplo, Danças Urbanas, todo mundo sabe o que é Dança Urbanas,
mas eu acredito que o espaço das Danças Urbanas ele é muito limitado ainda dentro da cidade.
Eu percebo que também é um movimento em ascensão, mas que acontece muito nas periferias
que é de onde as Danças Urbanas nasceram, então eu percebo que trabalham com isso fazendo
um movimento maior nesses espaços. Mas não tem um espaço tão grande quando a gente vai
para os grandes lugares, tipo os grandes teatros, essas ocupações elas ainda não existem. Mas
isso acontece com vários outros estilos como a dança de salão, a dança popular. E o tribal para
mim está no mesmo lugar que essas outras danças, ele ganhou um certo espaço porque as
pessoas já sabem o que é. Mas a nível de público, eu acredito que existe sim um público que
consome, mas a nível de comunidade de dança, a comunidade ainda não abraçou.
Você acredita na dança (em geral) como uma manifestação transformadora? Por quê?
- Sim. Porque eu vivi isso. Eu basicamente acredito porque foi isso que aconteceu para mim.
Minha vida é o que ela é hoje porque a dança apareceu nela, antes da dança eu era uma pessoa
e hoje sou outra. E posso dizer que a melhora foi só positiva. Eu costumava ser uma pessoa
muito negativa, muito estressada, insegura, eu não gostava de mim, eu não me aceitava e tudo
isso mudou através da dança, eu passei a me aceitar, acreditar no meu potencial, me relacionar
melhor com as outras pessoas, tudo isso através da dança. E minha formação em Psicologia,
sempre me mostrou que as artes elas são terapêuticas, tanto que existe um segmento da
Psicologia que é a arte terapia, que é a terapia através da arte mesmo. Eu cheguei a considerara
inclusive fazer o mestrado em algo do tipo, mas eu acho que isso já acontece de uma forma
natural pra mim, porque minha formação em Psicologia não me abandona, não é porque parei
de trabalhar com a Psicologia que ela me abandonou, e termino trazendo isso para dança. Agora
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independente da minha experiência enquanto psicóloga ou não, eu percebo nesses anos todos
que eu trabalho com dança o quanto todas as pessoas que se aproximaram de mim, tô falando
de mim porque é minha experiencia, o quanto elas saíram modificadas depois, as que saíram,
porque muitas nem conseguiram sair e permanecem até hoje. E as que saíram sempre saíram
modificadas, com muita frequência acontece de pessoas se afastarem por motivos de força
maior, mas sempre que eu encontro com essas pessoas elas me falam o quanto sentem falta de
poder estar praticando a dança e mais cedo ou mais tarde elas acabam voltando sempre. Então
percebo que sim, a dança é muito transformadora principalmente nesse sentido, porque ela
move por dentro, ela não move só por fora. Quando a gente se move por fora a gente acaba
movendo por dentro também, e ai quando você move por dentro vai entendendo que certas
coisas não cabem mais, que certas coisas são mais importantes para você, e que você precisa
dar mais atenção para algo que antes não dava, principalmente no sentido de empoderamento,
de auto respeito, de você respeitar quem você quer ser. Eu acho que a dança ajuda muito nesse
sentido, de você se libertar aos poucos das amarras que a sociedade nos impõe de certa forma,
que são muitas. E aí a dança ela vem pra te mostrar que você pode ser o que você quiser ser
enquanto ta dançando, e aí de tanto você ser enquanto você ta dançando, você começa a
entender que pode ser quem quer quando não está dançando e isso modifica sua realidade.
Como e quando surgiu a Shaman Tribal?
- Existem duas versões, uma mais simples e outra mais extensa. A primeira versão é que a
Shaman surgiu de um projeto piloto de uma experiencia de duas amigas minhas, a Paula Braz
que é minha socia até hoje em São Paulo e a Ellen Paes que não trabalha mais com dança
atualmente. Elas faziam dança do Ventre e a professora delas organizou um grupo de dança e
elas queriam fazer alguma coisa de Tribal e se juntaram e foram se apresentar, e essa foi a
primeira apresentação da Shaman, depois que isso aconteceu algumas outras meninas que
dançavam com elas se juntaram para aprender o Tribal e uma delas sugeriu o nome Shaman
Tribal, por ser um líder espiritual de um tribo. Eu só cheguei depois porque já era amiga delas
e fui convidada para ser diretora. A segunda versão, mais estendida é de que eu dançava com a
Elite Monteiro e elas dançavam com a Dandara, uma outra professora de dança do Ventre aqui
de Natal. Mas a Ellen já era minha amiga na vida, fora da dança. E foi conversando com ela
sobre dança que eu perguntei se ela já tinha ouvido falar de Tribal e ela disse que não, então
apresentei o Tribal para ela através de um DVD. Daí eu emprestei o DVD para ela e ela levou
para a Paula Braz e elas tiveram a mesma vontade que eu fiquei de aprender mas sem tem quer
ensinar, então elas assim como eu e minha professora começaram a estudar pelo DVD, e foi
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assim que elas começaram também. E aí logo depois que elas montaram o grupo, elas me
perguntaram se eu não gostaria de dança com elas já que minha professora trabalhava com
Dança do Ventre e elas estavam fazendo esse grupo de estudo de Tribal, e eu tive interesse de
ir. A princípio eu fiquei fazendo Dança do Ventre e Tribal ao mesmo tempo, mas depois eu
percebi que não queria mais dançar Dança do Ventre e só queria dançar Tribal e fiquei só no
Tribal junto com elas. E quando entrei já foi como diretora, elas começaram os estudos em 2006
e eu entrei em 2007.
Existe um conceito ou conceitos que define a Companhia Shaman? E de onde surgiu o
nome Shaman?
- O nome foi sugerido por Bartira Calado que é nossa Shaman. Ela tem descendência indígena
e ela faz estudos shamanicos com grupos aqui em Natal e fora do estado também. E aí
discutindo o conceito de tribo, o que era Tribal, do empoderamento, do resgate da
ancestralidade do feminino através da dança que foi a primeira pegada que a gente teve no
Tribal, aí Bartira sugeriu o nome Shaman a partir desse conceito. E aí as meninas gostaram e
ficou Shaman Tribal. Quando ela surgiu, surgiu Shaman do jeito que fala em português, com x
e acento tio no “mã”. E no decorrer dos anos começamos a trabalhar com bailarinas de fora do
país, e elas não sabiam falar “Xamã” com x pela dificuldade da pronúncia, já que nos Estados
Unidos o x tem outro som. Então em reunião com a Paula, a gente entendeu que para facilitar
nosso contato com as bailarinas de fora a gente precisava escrever o nome Shaman em inglês.
E passou a se chamar Shaman Tribal Company. E as coisas que norteiam para a gente desde o
princípio foi esse conceito primário de fazer o resgate do feminino, dos vários arquétipos do
feminino que as vezes é sufocado pela sociedade ocidental principalmente, não que na
sociedade oriental não tenha, pois lá a mulher também é muito sufocada. Essa coisa de resgatar
o poder do feminino que é tão jogado para debaixo do tapete. E a base do Tribal, quando a gente
vai lá atrás estudar o Tribal Fusion, a gente percebe que desde o ATS criado pela Carolena
Nericcio com esse intuito de ser uma dança criada para mulheres e enaltecer o feminino, até
antes dela a família Salimpour, sempre teve essa visão de usar a dança com uma forma de
comunicar a força da mulher, de não mostrar a mulher apenas como sendo um ser frágil, mas
de mostrar que na verdade a mulher ela pode ser a líder, ela pode estar na frente, ela pode
escolher os caminhos e ser independente e não precisar de ninguém. Então eu acho que isso é
a principal base de trabalho da Companhia. E aí dentro disso com o tempo a gente foi
amadurecendo, eu e a Paula, porque a Ellen se afastou em 2008, fomos amadurecendo esses
conceitos e entendendo também o papel de feminismo nisso tudo e as questões de contracultura,
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e a gente foi entendendo e os conceitos ficaram mais claros. O conceito de sororidade, que é a
irmandade entre mulheres, o conceito da não competitividade que está junto com a sororidade,
e fomos trazendo isso para dentro do trabalho. E foi a primeira coisa que pensamos de passar
no nosso trabalho que a capacidade da força feminina, o resgate de quem nós somos, sabendo
que acima de tudo nós temos que respeitar umas às outras, que a gente não pode querer atingir
o nosso crescimento ou nosso objetivos passando por cima umas das outras. E aí termina que,
apesar de ser uma dança como falei, criada por mulheres e para mulheres, muitos homens se
aproximaram dessa dança, principalmente o grupo LGBT, que é um grupo que também não tem
espaços, que também é dizimado pela sociedade, que também precisa de mais afirmação, e aí
foi crescendo mais nesse sentido, de homens advindos desse público que começaram a adentrar
e hoje em dia tem todo tipo de gente na verdade, porque é bem abrangente. E sexualidade nem
é a questão, gênero não é uma questão mais.
Qual estilo ou estilos são trabalhados na Companhia?
- Na Companhia a gente usa como base o ATS e o ITS (Improvisacional Tribal Style). Usamos
com base esses movimentos para nortear o todo, porque dentro do meu conceito e do que eu
entendi estudando com todos as bailarinas que estudei, para gente poder caracterizar a nossa
dança como Tribal Fusion, a gente precisa beber dessa fonte, porque senão eu tô fazendo apenas
uma dança de Fusão. Se eu misturo a Dança do Ventre com a Dança Indiana não é Tribal, é
uma fusão apenas. E para fazer sentido a gente bebe dessa fonte do ATS e ITS. E eu acho que
hoje em dia cabe um pouco de tudo, no nosso início a gente gostava muito de estudar a cultura
matriarcal, então as danças de roda era influencia nossa, as danças ancestrais, e a gente também
bebia muito das danças afro-brasileiras, do nosso resgate ancestral. Então durante muito tempo
a gente fez uma pesquisa longa sobre as danças populares, como o Coco, o Cavalo-marinho, o
Caboclinhos etc. E a gente foi atrás de conhecer um pouco esses estilos para poder usar deles
também dentro da nossa fusão. Mas hoje em dia eu acho que, como a gente foi crescendo mais
cenicamente, como a gente foi amadurecendo mais artisticamente a Companhia, a gente foi
entendendo que não queiramos limitar o nosso estilo a só um tipo de fusão, então hoje em dia
a gente fusiona com um pouco de tudo, as danças urbanas estão presentes a bastante tempo
também, mas de uns tempos para cá a gente começou a usar bastante dança contemporânea do
contemporâneo clássico, a gente usou fusão com balé também, fusão com dança cigana,
capoeira, então hoje em dia esse leque está bem aberto. Que é o que eu acho mais barato do
Tribal na verdade, é a gente saber que a gente pode estar sempre criando uma nova fusão e não
precisa ficar ali repetindo dentro de um estilo, eu posso estar sempre agregando outros estilos,
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só que sempre mantendo a base dentro do ATS e do ITS para que isso não se perca. O trabalho
teatral também foi ficando cada vez mais forte, dentro da Shaman hoje em dia um papel bem
incisivo pra os últimos espetáculos que montamos com temática a gente já quis fazer um
trabalho teatral mais forte, e claro que as vezes fazemos shows que funcionam como mostra, a
exemplo do próprio Híbrida que apresentamos a poucos dias, não era uma história contada, mas
a coisa do teatro tem ficado mais forte nos estudo de expressão, fisicamente e facialmente para
além do movimento da dança em si, usar o movimento da dança como uma forma de expressar
cenicamente.
Como acontece o ingresso para fazer parte da Companhia?
- A gente faz audições. De tempos em tempos, dependendo do trabalho que a gente está
desenvolvendo, a gente entende se precisamos de mais gente ou não. Porque como e um estilo
muito específico, nem todo mundo tem experiencia do estilo, mesmo quando as pessoas entram,
e a maioria são minhas alunas que estudam comigo durante algum tempo e depois de um tempo
estudos, abre audição e entram. Mas já aconteceu de pessoas que não eram minhas alunas de
fazerem a audição e entrarem. E aí, independentemente de ser ou não, quando as pessoas entram
a gente precisa de um tempo para amadurecer essas pessoas dentro da Companhia para elas
entenderem tudo isso que a gente está conversando. Qual é da companhia? O que que a gente
quer dessas pessoas? Qual tipo de trabalho que a gente quer realizar? Então isso é uma coisa
que a gente percebe que só vai caindo a ficha quando a gente vai vivenciando. Então eu não
abro audição sempre porque senão eu estaria sempre com o grupo “verde”, e o que eu
geralmente faço é abrir audição com uma média de 2 em 2 anos porque eu preciso de mais ou
menos 1 ano pra fazer as pessoas entenderem a Companhia e 1 ano para amadurecer essas
pessoas. E aí quando eu percebo que quem está ali comigo está maduro eu entendo que posso
trazer outras pessoas e fazer o mesmo trabalho com essas outras pessoas. E com certa frequência
tem a haver com a demanda de espetáculo também. Para o espetáculo “Las Nieblas” a Shaman
só tinha 8 pessoas e eu precisava de mais para fazer os efeitos que eu queria, então a princípio
eu abrir uma audição para o espetáculo e entraram 32 meninas para cena. Serviu para eu
entender que não é o que eu quero, eu não quero abrir audições para espetáculo porque eu
preciso que as pessoas estejam imersas dentro da Companhia e entendam o que eu espero delas,
pra que o trabalho flua, porque trabalhar com essas 32 pessoas foi muito desgastante porque
muitas delas não entendiam o que significava participar daquele espetáculo. E aí os conceitos
básicos da Companhia se perderam um pouco, os conceitos de sororidade, o conceito de não
competitividade, eu me peguei em alguns momentos percebendo as meninas competindo entre
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si, e por mais que eu tentasse intervir e tentar falar o que eu esperava daquilo ali, era muito
porque elas estavam se encontrando para um ensaio especifico, e nem todas se encontravam o
tempo todo porque elas só vinham para os ensaios da cenas que elas estavam, então o trabalho
amadureceu de uma forma muito diferente e eu entendi que isso não funciona. E no espetáculo
posterior, o “Sonhos Lúcidos”, eu abri uma audição para o corpo de baile da Companhia.
Hoje quantas são no corpo de baile?
- No núcleo de Natal são 13 e no núcleo de São Paulo também são 13. No total são 26 bailarinas.
Como acontecem os ensaios?
- Aqui no núcleo Natal os ensaios acontecem nas terças e quintas, com 3 horas de ensaio. E
dependendo da demanda marcamos ensaio extra.
Me fale os sobre os espetáculos que a Shaman já produziu.
- Como eu e a Paula trabalhamos em cidades distantes, mas a gente trabalha juntas e tem
funcionado assim até hoje, porque a gente tenta sempre se manter trabalhando juntas mesma a
distância. E enquanto a gente morava na mesma cidade, a gente tinha ideais de espetáculos que
a gente queria desenvolver, e aí a gente vem desenvolvendo essas ideias e vem conversando
sobre as ideias e amadurecendo elas. Só tem um espetáculo que a ideal surgiu depois que ela se
mudou para São Paulo, que ela está trabalhando atualmente, que foi uma ideia que tive aqui e
ela desenvolveu lá, que se chama “Sororita”. Mas todos os outros a gente desenvolveu os
conceitos e começaram como pocket shows, muito humildemente quando a gente ensaiava na
garagem de casa e não tínhamos Studio ainda e a gente tinha só o vislumbre da ideia e como a
gente foi se profissionalizando, a gente pensou que seria bacana dar continuidade nesses
conceitos. Dos espetáculos produzidos aqui em Natal, “Híbrida” foi a primeira ideia que
tivemos de espetáculo. Então nós chegamos a ser aprovados na lei Djalma Maranhão, mas não
conseguimos captar recurso e não conseguimos colocar em prática. Mas conseguimos fazer
uma versão menor que chamamos de “Experimentando Híbrida”, porque a gente quis
experimentar o conceito e apresentamos lá no Café Salão da Nalva Melo. E assim também
surgiu o “Las Nieblas”, ele surgiu em 2008 e a gente não tinha como colocar em pratica a nível
de espetáculo como a gente queria e fizemos um pocket show, uma coisa menor, com menos
gente, menos tempo e aconteceu no antigo BudaPub. O “Sonhos Lúcidos” surgiu quando
trouxemos a Mira Betz em 2011, que foi a primeira bailarina que a gente trouxe de fora, e
trouxemos ela para São Paulo, e aí a gente chamou o show do festival de “Sonhos Lúcidos”
porque a gente já queria trabalhar com o conceito mas mais uma vez a gente não tinha como
colocar em pratica só a gente e colocamos pro evento, e ele já funcionou com cenário digital,
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que a gente sempre gostou de trabalhar com esse tipo de recurso. O que nos impede de usar
mais vezes é a questão financeira porque saí bastante caro usar. Mas desde o princípio nossa
ideia era misturar as artes, usar outras artes cênicas como forma de contextualizar o espetáculo.
Teve ainda o “La Belle Époque” que falava sobre as danças de cabaré dos anos 1920 que foi
apresentado no Colégio Salesiano. Esses foram os espetáculos produzidos. E depois que a Paula
foi para São Paulo, nós começamos a entender a necessidade de cada núcleo e durante um tempo
ficou com um núcleo bem pequeno lá e eu fiquei com um maior aqui. Então eu comecei a
desenvolver os espetáculos maiores aqui, e hoje em dia ela está com um núcleo enorme lá e
consegue dar conta dos espetáculos do jeito que ela gostaria de fazer por lá. E quando a
Companhia completou 10 anos de existência em 2016 nós refizemos o espetáculo “Las Nieblas”
com a participação dos dois núcleos. E depois de 2 anos trabalhando esse espetáculo decidimos
montar o “Sonhos Lúcidos” que estreou em 2018.
Fale-me sobre as participações da Companhia em eventos e festivais, nacionais e
internacionais.
- Aqui em Natal a gente costuma participar sempre dos eventos das parcerias, grupos de dança
do ventre nos convida bastante para participar de eventos basicamente. Fora daqui a gente
participou durante 2 anos de um projeto chamado “Caravana Tribal Nordeste”, que é a proposta
de grupos aqui do Nordeste de movimentarem o Tribal aqui, porque o Tribal cresceu no Brasil
basicamente no sudeste, e aí a gente queria tirar isso de lá e dizer que a gente também tem tanta
gente boa aqui e não precisamos necessariamente ir para lá pra estudar. E desenvolvemos essa
ideal, que surgiu através da Kilma Farias de João Pessoa (PB), e a ideia era basicamente ser um
evento itinerante que acontecia a cada 2 meses em um estado aqui do Nordeste e juntou Paraíba,
Pernambuco, Rio Grande do Norte e Bahia, a princípio, nos primeiros 2 anos. E a cada 2 meses
a gente ia para uma dessas cidades e os grupos davam aula uns para os outros, e o grupo que
sediava tinha que providenciar uma oficina de uma dança regional, e foi aí que a gente estudou
caboclinho, coco, afoxé, danças dos orixás, tudo isso foi estudando dentro da Caravana. E
paralelo a esse evento nós íamos estudar fora tanto para estudar, porque as bailarinas que
vinham de fora em sua maioria era para a região sudeste. Fomos para o Rio de Janeiro, São
Paulo, Brasília e outros estados. E para fora do país fomos para o Chile, Colômbia, Argentina
e para os Estados Unidos participar do Festival “Berço do Tribal”. E algumas participações são
feitas pelo núcleo de São Paulo e outras pelo núcleo Natal, depende muito proposta e da
logística.
E sobre premiações.
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- Para ser sincera eu não gosto de competição. Só participamos de competição para dar
visibilidade para a Companhia pois foi assim que a gente foi conseguindo que os outros estilos
de dança soubessem da nossa existência. Mas já ganhamos algumas Mostras, como no Festival
Tanz do ano passado (2018).
E a partir de todas essas produções da Companhia apresentadas aqui em Natal, você
enquanto diretora e bailarina, como você compreende a dança Tribal na cena de dança
em Natal?
- Enquanto diretora, eu acho que a gente é menosprezada. Eu acho que as pessoas duvidam
muito do nosso potencial porque elas nos colocam num patamar de Dança do Ventre e não que
eu ache que ser colocada nesse patamar é menosprezo, o problema é que as pessoas aqui
menosprezam a dança do ventre e aí nos colocam nesse patamar porque elas enxergam na dança
do ventre uma dança que existe para seduzir, e aí quando eles nos colocam nesses patamar é
como se não existisse seriedade, como se o trabalho não fosse maduro, não fosse cênico, como
se não fosse artístico, como se fosse rebolar. E aí eu percebo que o Tribal é um pouco
menosprezado pela cena cultural aqui de Natal, não pelo público. O público de uma forma geral,
ainda existe muita gente que não sabe o que é, mas o que sempre acontece é que essas pessoas
que não sabe o que é, quando vão assistir, quando saem de lá sempre dizem a mesma coisa: “eu
não imaginava que era isso”, “nossa, minha gente”, “tem muita qualidade nesse trabalho”,
“como é que vocês não estão rodando com essa espetáculo pelo país”. Eu sempre ouço esses
comentários, mas o problema é que as pessoas que trabalham com cultura, elas não consomem,
elas não se dispõem. Em todos espetáculos que a gente fez aqui em Natal a gente sempre separa
ingressos para mídia, quem trabalha com imprensa, e para pessoas que trabalham com cultura,
e agente convida essas pessoas e elas nem retiram os ingressos. Então assim, elas não sabem
realmente o que é o estilo, e eu acho que isso sabota um pouco a gente, porque como as pessoas
podem dar suporte ou se interessar por uma cena que elas não se dispõem a conhecer, então
enquanto diretora para mim isso é um tanto quanto frustrante, e confesso que isso me
desestimula um pouco a consumir as artes dessas outras pessoas também, porque durante muitos
anos eu acompanhei o trabalho de todos os grupos culturais aqui de Natal sempre fiz muita
questão de estar presente, mas aí eu comecei a perceber que o contrário não acontece, as vezes
as pessoas não veem prestigiar o nosso e isso desestimula um pouco. Mas eu continuo
consumindo o trabalho dessas pessoas porque eu consumo arte, porque eu sou artista e enquanto
artista eu preciso consumir arte para poder me alimentar de arte e poder produzir arte.
Quando surgiu o Studio? E como surgiu a ideia de dar aulas?
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- Eu confesso que eu não queria dar aula, porque, eu achava que eu não tinha jeito para dar aula,
porque eu tinha muita dificuldade de falar em público. De tipo, ter reações físicas no corpo
quando tinha que falar em público. Quando era do curso de Psicologia que eu tinha que dar aula
ou coisa assim, eu tinha comichão, ficava com marcas vermelhas e coçava muito, eu dava aula
do começo ou fim olhando pra porta, querendo sair e um professor meu apontou isso pra mim:
você já percebeu que dá aula olhando pra porta? E eu: Já. Porque minha vontade é de sair
correndo eu odeio ter que falar em público, eu gaguejava e eu não me sentia segura mesmo de
falar em público e não me imaginava dando aula. E mais ainda eu achava minha dança muito
fraca para achar que eu tinha capacidade de ensinar alguém por muito tempo. Mas assim, a
Paula começou dando aula primeiro do que eu e ela estimulou isso muito em mim: Por que você
não dá aula? E eu: Não me imagino dando aula não, quem danado vai querer fazer aula comigo,
eu lá sei dar aula. E ela dizia: claro que sabe! E durante muito tempo ficou assim, a gente
ensaiava na casa dela. Quando ela se mudou, ficamos sem ter onde ensaiar e ficou a dúvida se
a companhia ia acabar o não, e decidir assumir sozinha e vou continuar dirigindo aqui e ela vai
montar um corpo de baile lá (São Paulo) e vai dirigir lá. E aí a gente começou a ensaiar garagem
da casa de Bartira (que era integrante da companhia) e ficamos durante 06 meses ensaiando
nesse local. Só que começou a ficar insustentável a situação porque gerada uma demanda e era
desconfortável pela família dela morar na casa. Então eu sai da Psicologia Clínica e fiquei
trabalhando somente pela Prefeitura em São Gonçalo, e conversando com uma bailarina
resolvemos alugar um espaço para dar continuidade e ter um local para a Shaman ensaiar. E foi
quando começaram a surgir os gastos com a Companhia e entendemos que precisávamos
arrecadar dinheiro. A primeira pessoa a dar aulas foi Regina (que era bailarina da companhia),
mas depois ela precisou parar e eu fui incentivada pelas outras meninas a começar dar aulas. E
foi quando eu entendi que enquanto diretora da companhia e do Studio eu precisava dar aulas,
até porque o público começaria a procurar por essas aulas. Então comecei a fazer uns testes
primeiro com as meninas da companhia e tive um retorno positivo. No começo eu achei foi bem
difícil, mas depois eu percebi que dar aula de dança não tão difícil assim, quanto dar aula de
Psicologia. E acredito que seja pelo fato de me sentir em casa com a dança, pois falo com
propriedade do que estou fazendo, então é tranquilo falar sobre dança. E foi libertador! Daí a
Regina me disse que não ia poder continuar com o Studio, então eu conversei com meu marido
(que tinha o desejo de montar um Studio de música) e resolvemos um montar um Studio de
música e de dança. E em 2011 montamos o Studio no atual endereço.
Além do Tribal, você oferece outras modalidades?
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- Inicialmente pensei em fazer do Studio um lugar que não existe aqui em Natal e as danças vão
poder se integrar e os artistas vão se conhecer e vai ser um local de referência. Uma ideia bem
utópica. Mas na prática é bem complicado se trabalhar com vários estilos dentro de um espaço
e eu percebi que para poder fazer isso eu tinha que ser muito mais administradora do que artista.
E foi quando entendi a realidade de algumas escolas aqui de Natal, que eu antes criticava porque
eu entendi que na verdade pra se ter uma academia de dança é diferente de você ter um Studio
de dança pois as demandas são diferentes. Hoje as modalidades oferecidas são: Tribal, Yoga,
Dança Contemporânea e Tribal Kids.
Existe um público alvo?
- Existe e não existe. Porque assim, todas as pessoas são bem-vindas, idade, raça, gênero. Como
eu disse, essa questão pra mim não existe a bastante tempo. Apesar de que a princípio o público
alvo seriam mulheres porque é um estilo que foi desenvolvido por mulheres. Mas isso já foi
sublimado pois hoje em dia já tem meu aluno, já passaram outros meninos por aqui. E eu acho
muito interessante a ótica da dança sendo dançada por outros corpos que não os nossos para os
quais a dança foi criada, pois acho interessante essa coisa do ir contra. A própria contracultura
que gera coisas riquíssimas. O que eu percebo num movimento natural a maior parte das pessoas
que chegam aqui são universitárias ou recém-formadas, é um público que gira mais em torno
dos 18 e os 30 e poucos anos, mas já tive alunas de mais de 50 anos. Então não existe uma
regra, nem um corpo específico e eu gosto que seja assim, eu gosto que não exista porque eu
gosto da diversidade mesmo, eu acho que na diversidade a gente encontra crescimento e beleza
mais do que quando a gente estabelece um biotipo ou um gênero específico para realizar aquilo
ali.
Quantas turmas tem atualmente no Studio? E quantos alunos/as?
- São 09 turmas de Tribal, 01 turma de Dança Contemporânea, 04 turmas de Yoga e 01 de
Tribal Kids. Em torno de 75 alunos no total.
Quem são os professores?
- Cibelle Souza, Kadja Silva e Deua Medeiros no Tribal, Alana Reis no Yoga, Alexandre
Américo na Dança Contemporânea e Lara Kuhn no Tribal Kids.
Como você enxerga sua relação de professora com os alunos/as nesse processo de ensino
e aprendizagem?
- É uma troca muito rica, é muito bonito. E eu quero te dizer que é combustível pra mim. Cada
pessoa que eu percebo chegar aqui, que com muita frequência as questões são muito parecidas,
de limitação corpórea, de preocupação, de não mostrar a barriga, principalmente as meninas,
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das mulheres mais velhas, como por exemplo dar usando só um top e a barriga toda de fora. As
limitações que são impostas que não são nossas e eu vejo as pessoas chegarem aqui com todas
essas limitações e quando eu as vejo se transformando e se libertando é muito bonito, fico bem
emocionada com isso. E pra mim isso serve muito de estímulo pra entender que estou fazendo
a diferença de alguma forma e acho que termina sendo uma relação de retroalimentação, eu me
alimento de vocês e vocês de alimentam e a gente se alimenta junto e ai é o real sentido de
comunidade de que somos mais fortes, eu sinto na pratica que isso existe e por isso que acho
que isso tudo é muito rico, á aprendizado mutuo e vocês me modificam a cada aula que eu dou
eu não sou mais a pessoa que eu era antes daquela aula e nem vocês são a pessoa que vocês
eram antes da aula, é muito bonito. E hoje em dia eu me descubro muito feliz sendo professora.
ENTREVISTAS COM ALUNAS DA TURMA INTERMEDIÁRIO, CONCEDIDAS EM
22 DE MAIO DE 2019.
Mariana Del Picchia
A quanto tempo você pratica Tribal Bellydance e como surgiu o desejo de praticar esse
estilo?
- Comecei a praticar tribal há quase 2 anos. O interesse surgiu de uma colega que é dançarina e
professora, e sempre vendo ela dançar comecei a me informar e a ter uma curiosidade.
O que mudou na sua vida (pessoal, profissional, artística etc.), desde que você iniciou no
Tribal Bellydance?
- Eu acho que a coisa que mais mudou para mim foi a minha relação com meu corpo e com a
minha criatividade. Hoje em dia eu tenho muito mais facilidade de lidar com o processo
criativo, e desenvolvi uma relação mais saudável com meu corpo. Eu tenho uma percepção mais
positiva sobre mim mesma e isso me motiva não só dentro da dança como em todas as outras
áreas da vida.
Para você, o que é Tribal Bellydance (a dança)?
- Para mim o tribal é uma literalmente uma fusão de culturas. É um estilo de dança que engloba
várias vertentes e ao mesmo tempo dá uma maior liberdade de criação para quem tá dançando.
Fale sobre sua experiência no Tribal Bellydance.
- Bom, eu sou suspeita pra falar sobre o tribal porque desde o início quando via as dançarinas
de tribal em palco eu já sentia algo diferente, como uma sensação de pertencimento. E depois
que comecei a praticar, isso só aumentou. Foi como se eu tivesse encontrado um lugar no mundo
que eu pudesse chamar de meu. E assim foi com o passar do tempo, eu fui desenvolvendo não
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só a técnica como também o amor pela dança, que sempre existiu em mim, mas estava
adormecido. Eu fiz ballet quando era mais nova durante um tempo, mas eu tinha uma
maturidade diferente e lidava com a dança de uma forma menos comprometida. O tribal
resgatou em mim esse amor, e hoje o tribal é uma prioridade na minha vida.
Kaline Menezes
A quanto tempo você pratica Tribal Bellydance e como surgiu o desejo de praticar esse
estilo?
- Pratico Tribal Bellydance há dois anos e meio. Surgiu da curiosidade, quando vi a Shaman
Tribal dançando no Teatro Riachuelo no final de 2016, vi uma coreografia e fiquei
perdidamente apaixonada! Me marcou!
O que mudou na sua vida (pessoal, profissional, artística etc.), desde que você iniciou no
Tribal Bellydance?
- Nossa... por onde começo? (Rsrsrs) Em primeiro momento mudou a forma que vejo meu
corpo, a amar o meu corpo como ele exatamente é, com as cicatrizes, estrias, e toda a história
que ele carrega. É não odiar o que não vê refletido no espelho, pelo contrário, é abraçar, aceitar
e aprender a amar. Porque a gente nasce aprendendo a se odiar, desde o cabelo, o corpo e
sobretudo tudo que faz parte de nós. E quando olhar para o corpo de outra mulher, totalmente
diferente do seu e com sua forma única, amá-lo também e se ela tiver dificuldades também a
ajudar nesse processo é ser mais sensível nesse sentido. O Tribal te liberta do rótulo do corpo
padrão, é onde podemos vivenciar essa experiência sensorial de auto aceitação. A gente pensa
que é bem resolvido em relação a isso, quando se depara procurando mil defeitos, que aos olhos
da sociedade nós temos ao mesmo tempo não somos ensinadas a nos amar e nos aceitar. E não
mais importante, mudou a minha forma de entender como funciona o empoderamento feminino,
tomar o poder sobre algo, sobre si, muitas vezes é um processo delicado, difícil e demorado,
pois muitas vezes não entendemos como funciona essa dinâmica. Particularmente, enxergo esse
empoderamento de forma mais ampla, tentando sair “da minha confortável bolha” e entender a
história de outra mulher, com toda a sua trajetória de vida, em um país que tem o machismo
enraizado em sua cultura. Não é somente eu que tenho uma luta, uma caminhada, todas nós
tempos e se faz importante refletir e compreender a luta de outra mulher. Quando engravidei,
fiz questão de continuar dançando, tanto para me ajudar a trabalhar a ansiedade, como também
a quebrar o tabu que mulher grávida não “pode” ou que é “feio” mostrar a barriga. Foi
necessário reaprender a desconstruir! Foi uma das experiências mais loucas e mais lindas de
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minha vida, dancei no comecinho da gestação até uma semana antes de minha filha Catarina
nascer!
Para você, o que é Tribal Bellydance (a dança)?
- Partindo do lado “prático” é terapêutico, me auxilia a aprender a lidar com a ansiedade, é um
exercício que foge do convencional das academias. Agora partindo do lado “romântico”, é
minha grande paixão, descobri que possui muitas nuances, que posso sempre aprender mais, ao
qual nunca me canso. Sobretudo explorar vários caminhos e aprender a ter paciência com meu
corpo, ele vai responder!
Fale sobre sua experiência no Tribal Bellydance.
- Tudo começou quando vi a coreografia “Carcará” da Shaman Tribal Studio, no final de 2016,
no Teatro Riachuelo, foi amor à primeira vista... (rsrsrs) Sendo que na época eu já conhecia
uma bailarina da Companhia, ao qual me convidou para conhecer mais o estilo no começo de
2017. Todo o Studio realiza workshops nas férias de começo de ano e fui fazer oficinas, por
curiosidade. A partir disso o “bichinho do Tribal” me picou... rsrsrs e comecei a fazer parte das
turmas do Básico, porém eu era muito apressada e não conseguia desacelerar para aprender, foi
algo que fui trabalhando aos poucos. Depois, rolou minha apresentação com as turmas do Studio
no Hafla, isso já em 2017, (festa étnica contemporânea realizada pela Shaman Tribal Studio
com o objetivo de o público conhecer mais sobre o estilo), desde então não parei mais. Já dancei
no Teatro de Cultura Popular, Cine Teatro de Parnamirim e Centro de Convenções de Natal,
juntamente com minhas turmas do Studio. Atualmente faço parte das turmas de Iniciante e
Intermediário I. E não me vejo mais sem a dança. Só ela salva!
Shenia Eliane
A quanto tempo você pratica Tribal Bellydance e como surgiu o desejo de praticar esse
estilo?
- Eu pratico desde 2016. Esse desejo surgiu quando fui a um evento no Teatro Riachuelo, senão
me engano foi em 2014, e era a comemoração de 4 anos da Companhia Nawar. Nessa época eu
fazia Dança do Ventre na Evidance. E no final do evento teve uma apresentação da Companhia
Shaman, eu achei muito interessante a proposta pois além de dançar em pé também existiam
momentos no chão e isso me interessava. Inclusive o tipo de música que elas utilizavam também
me chamou atenção, que é completamente diferente do que eu estava acostumada a trabalhar
na Dança do Ventre. E foi ali que eu descobri que talvez esse estilo fosse o meu, e não a Dança
do Ventre.
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O que mudou na sua vida (pessoal, profissional, artística etc.), desde que você iniciou no
Tribal Bellydance?
- Na vida pessoal, o Tribal me permitiu fazer novas amizades, ver que pessoas de estilos
diferentes, com histórias de dança completamente diferentes da minha, como a gente pode se
integrar. Melhorou bastante a questão da minha postura, de eu ter mais vontade na hora do
trabalho, já que sou dentista e trabalho muito tempo sentada. Então quando eu vou para aula de
dança, aquilo me traz um prazer. É tanto um lazer, como sinto também como um objetivo de
sempre querer melhorar os meus movimentos, então isso me ajuda a liberar as tensões as vezes
que eu guardo durante o meu trabalho. Me sinto um pouco mais livre, para mim melhorou cem
por cento. E não vejo minha vida hoje sem a dança., sem fazer dança Tribal.
Para você, o que é Tribal Bellydance (a dança)?
- Para mim o Tribal é uma dança não somente de fusão, por exemplo: sabemos que ela tem base
no ATS, tem uma base forte no Flamenco. Mas pessoalmente para mim, eu vejo mais como
uma libertação de certas amarras, te dando mais possibilidades de você criar outros estilos, de
você talvez se encontrar mais na dança. O que eu percebi que na Dança do Ventre isso era meio
limitado, eu me sentia um pouco “podada”. E já no Tribal é diferente, eu percebo que a
liberdade é muito maior na parte de criação. Então eu vejo como se fosse um grito, as vezes que
você está bem preso e você consegue sair dessa prisão.
Fale sobre sua experiência no Tribal Bellydance.
- Como falei antes, comecei no Tribal em 2016. Primeiro eu fui participar de um workshop para
ver como era a didática do Studio. E nesse workshop trabalhamos movimentos de floreios,
trabalhou a improvisação coordenada, e foi bem interessante porque nesse workshop a gente
trabalhou com as meninas da Companhia. Tinham alunas do Studio, mas majoritariamente eram
meninas da Companhia, e foi incrível. Foi quando eu percebi que era um estilo que eu iria me
identificar muito mais. Comecei a fazer as aulas, e foi quando a turma do sábado foi formada,
e no início eram apenas 08 alunas e no decorrer do ano foram saindo e entrando novas alunas.
Nesse mesmo ano a gente teve o primeiro Hafla, e a turma de origem, a gente se apresentou e
era uma coreografia bem simples, mas bem emocionante. No final desse mesmo ano teve a
Mostra de alunas e apresentamos a coreografia das Gueixas. Em 2017 tivemos grandes
mudanças, saíram boa parte turma a ponto de quase encerrar por falta de alunas. Mas foram
entrando outras pessoas e a turma se manteve, o que me deixou muito feliz porque eu não tinha
possibilidade de fazer aula durante a semana. E novamente nos apresentamos no final do ano e
foi maravilhoso. Já 2018, que foi quando você entrou, outras pessoas da turma saíram e a gente
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teve durante o caminho alguns dessabores na turma, mas nada que pudesse afetar. Infelizmente
isso foi o que me levou a não apresentar no final do ano. E hoje em dia quando eu vejo os
primeiros vídeos, consigo notar o quanto conseguir evoluir. Questão de movimentação, questão
de saber trabalhar em grupo. Antigamente eu não pensava em questão de me apresentar em
dupla ou trio, e hoje em dia é algo que me interessa fazer e acho que eu consigo trabalhar com
outra pessoa sem necessariamente ser uma coreografia montada pela professora. Para ser algo
mais significativo. Em caso de solo ainda não me vejo fazendo, não é algo que me da vontade
de apresentar. E falando sobre esse ano, acho interessante a proposta de criar seus “minis solo”,
mas não sei ainda se é algo que eu gostaria de apresentar, pois ainda tenho certa insegurança na
minha dança. Mas espero que eu consiga encontrar minha identidade no Tribal.