o simbolismo maçônico

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O SIMBOLISMO MAÇÔNICO * FRANCISCO ARIZA A Maçonaria é uma instituição iniciática e esotérica que revela seu ensino através de determinados códigos baseados fundamentalmente no simbolismo construtivo. Isto é devido a Maçonaria atual ser em grande parte herdeira dos antigos grêmios de construtores, e embora hoje em dia os maçons já não construam edifícios, entretanto esse simbolismo segue estando vigente, entre outras razões porque é consubstancial à Ordem Maçônica e constitui seus gestos de identidade e sua razão mesma de ser, como veremos a seguir. Acima de tudo os símbolos maçônicos se referem a um conjunto de idéias relacionadas diretamente com o conhecimento da Cosmogonia, e portanto do homem, pois este é um cosmos em pequeno, um microcosmos, por dizê-lo em linguagem hermética. Precisamente os antigos construtores consideravam o Cosmos como seu modelo simbólico por excelência, e para levantar seus edifícios imitavam as estruturas desse modelo, reveladas sobretudo através das formas geométricas, entre as que destacam o círculo e o quadrado, símbolos respectivos do céu e a terra. Essas formas e estruturas simbólicas sempre respondem a uns arquétipos universais, a uns princípios que são coetâneos com qualquer tempo ou circunstância histórica ou pessoal. Não importa, como dizíamos, que os maçons de hoje não levantemos edifícios. O realmente importante é que esses mesmos princípios ou idéias os podemos conhecer através dos símbolos

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O SIMBOLISMO MANICO*

FRANCISCO ARIZA

AMaonaria uma instituio inicitica e esotrica que revela seu ensino atravs de determinados cdigos baseados fundamentalmente no simbolismo construtivo. Isto devido a Maonaria atual ser em grande parte herdeira dos antigos grmios de construtores, e embora hoje em dia os maons j no construam edifcios, entretanto esse simbolismo segue estando vigente, entre outras razes porque consubstancial Ordem Manica e constitui seus gestos de identidade e sua razo mesma de ser, como veremos a seguir.Acima de tudo os smbolos manicos se referem a um conjunto de idias relacionadas diretamente com o conhecimento da Cosmogonia, e portanto do homem, pois este um cosmos em pequeno, um microcosmos, por diz-lo em linguagem hermtica. Precisamente os antigos construtores consideravam o Cosmos como seu modelo simblico por excelncia, e para levantar seus edifcios imitavam as estruturas desse modelo, reveladas sobretudo atravs das formas geomtricas, entre as que destacam o crculo e o quadrado, smbolos respectivos do cu e a terra. Essas formas e estruturas simblicas sempre respondem a uns arqutipos universais, a uns princpios que so coetneos com qualquer tempo ou circunstncia histrica ou pessoal.No importa, como dizamos, que os maons de hoje no levantemos edifcios. O realmente importante que esses mesmos princpios ou idias os podemos conhecer atravs dos smbolos que decoram nossos templos, o mais importante dos quais justamente o que se refere a quem verdadeiramente o Autor de cujo Pensamento surge a Grande Obra da Criao, conhecido na Maonaria com o nome de Grande Arquiteto do Universo, e em outras tradies, como por exemplo a hindu, como o "Esprito da Construo Universal". O Grande Arquiteto do Universo o Princpio Supremo, a verdadeira chave de abbada ou pedra angular do Templo manico. sob a influncia de Esse princpio que os maons realizam nossos trabalhos dentro da Loja manica, uns trabalhos nos que junto ao estudo dos smbolos est a prtica do rito, obrigado qual a prpria Loja manica se torna um espao significativo anlogo mesma estrutura do Cosmos. Como mais tarde veremos, o simbolismo da Loja manica tambm um dos temas de meditao aos que nossa Ordem concede uma importncia muito relevante.E j que falamos do Grande Arquiteto, acreditam que conveniente assinalar que na Maonaria este no tem nenhum tipo de conotao religiosa. E no pode t-la porque a Maonaria no uma religio, como pode ser a catlica ou qualquer outra, mas sim uma organizao inicitica que entrega ao homem os meios e os conhecimentos necessrios para seu aperfeioamento como ser humano. No esqueamos que a Maonaria uma Cincia e uma Arte, e seu Princpio Supremo se manifesta como a Inteligncia que organiza o Cosmos, o Templo Universal, de acordo ao plano ideal concebido em sua Sabedoria, que como se diz no Livro da Lei Sagrada "tudo o fez em nmero, peso e medida". Isto nada tem que ver com um deus religioso ao qual se tenha que "adorar", como se se tratasse de algo que est fora do homem. Como diz a este respeito R. Gunon em um artigo titulado "A Ortodoxia Manica", pertencente ao volume II deEstudos sobre a Franco-Maonaria e o Companheirismo: "O smbolo do Grande Arquiteto do Universo no a expresso de um dogma, e que se se compreender como deve s-lo, pode ser aceito por todos os Maons, sem distino de opinies filosficas, porque isto no implica por sua parte o reconhecimento da existncia de um Deus qualquer". No , portanto a adscrio a um "dogma" o que se pede a quem entra pela primeira vez no templo manico, pois dos smbolos ali presentes no se desprende nenhum ensino desse tipo. No se trata de "acreditar" no smbolo, mas sim de compreend-lo, pois na medida em que o compreendemos e nos penetramos de seu significado profundo seremos um com a idia que o conforma. O maom toma ao smbolo como veculo de Conhecimento e no como um objeto de "culto", pois sabe que no ter que confundir o smbolo com o que este simboliza.Mas o fato de que a Maonaria no seja uma religio no impede que existam maons que em sua vida privada, e no exerccio de sua liberdade, pratiquem um credo religioso determinado, ou que no pratiquem nenhum. Isto Maonaria no tem que se lhe importar, pois essas crenas, sejam religiosas ou de qualquer outro tipo (filosficas, cientficas, polticas, etc.) tm que deixar-se, junto com os metais, na porta do Templo. Como diz o prprio Gunon em outro artigo titulado "A Gnose e a Franco-Maonaria", esta "deve ser pura e simplesmente a Maonaria. Cada um de seus membros ao entrar no Templo, deve despojar-se de sua personalidade profana e fazer abstrao de quanto seja estranho aos princpios fundamentais da Maonaria, princpios ao redor dos quais todos deveriam unir-se para trabalhar em comum na Grande Obra da Construo universal"1.Por diz-lo de algum jeito, o nico que a Maonaria "exige" de seus membros uma vontade firme no "desbastado" e "polimento" da pedra bruta, que como dizem alguns rituais " um produto grosseiro da Natureza, que a Arte da Maonaria deve polir e transformar". Esse desbastado e polimento justamente o smbolo do trabalho do maom consigo mesmo, o qual leva a cabo com as primeiras ferramentas que a Ordem lhe oferece depois de receber o influxo espiritual no rito de iniciao: o mao e o cinzel, smbolos respectivos da vontade e a reta inteno. A obra de regenerao no pode levar-se a cabo sem uma vontade firme e perseverante que a deseje, quer dizer, sem uma fora interior que influa e transmita seu poder criativo "matria relatrio" da psique desordenada e catica, simbolizada pela pedra bruta. Mas essa fora interior precisa ser dirigida e orientada pela inteligncia, ou melhor, pelo "rigor intelectual", que "distingue" aquilo que no ser conforme realidade essencial de sua natureza (o que esse ser em si mesmo), pelo que so apenas seus adornos suprfluos e ilusrios. Assim, como o cinzel da inteligncia, impulsionado pelo mao da vontade, o aprendiz vai limando e corrigindo as arestas e asperezas de sua pedra bruta, separando o "espesso do sutil", o "caos" do "ordem", o "profano" do "sagrado", operao alqumica que tem que converter-se em um rito cotidiano, em um exerccio de cada momento, pois tal separao constitui a premissa fundamental a cumprir nas primeiras etapas do processo inicitico, at que com pacincia e perseverana alcance esse aperfeioamento de que falvamos anteriormente, exemplificado na pedra cbica e esculpida.A iniciao, ou via no Conhecimento, desperta no homem suas qualidades inatas, que permanecem "adormecidas" ou "quietas" em seu estado ordinrio, semelhante por isso ao "sonho" e ao potencial. A influncia da iniciao no acrescenta nada que o homem no possua j e no forme parte de sua prpria essncia. Neste sentido, estamos totalmente de acordo com Arturo Reghini quando diz que esse aperfeioamento "est ligado ao conhecimento e ao reconhecimento da natureza humana e suas possibilidades inerentes. necessrio realizar o antigo preceito do orculo de Delfos: "conhece-te a ti mesmo". necessrio procurar em si mesmo o mistrio do ser, considerar a vida humana, suas funes, seus limites e a possibilidade de ultrapass-los, de intervir ativamente em seu curso, no abandon-lo deriva, em descobrir e em despertar os germens latentes, os sentidos e os poderes ainda desconhecidos, adormecidos e ocultos. necessrio, enfim, realizar uma obra de edificao espiritual, uma transmutao, alcanar a virtude e o conhecimento para que o miservel verme que repta pela terra se transforme em gloriosa mariposa voando livremente para a justia". Para obter esse fim, o mesmo Reghini nos diz que no existe outro meio que "o trabalho manico baseado e sustentado pela iniciao simblica, quer dizer, conferida e obtida atravs da inteligncia dos smbolos manicos familiares, a imagem da obra de arte que se realiza com os instrumentos do ofcio".2A expresso "conhece-te ti mesmo" deveria figurar tambm no frontispcio dos templos manicos. Na verdade, nada h mais importante para o homem que conhecer sua verdadeira identidade, saber quem h detrs dessa mscara que chamamos "personalidade", e que a Maonaria identifica com os metais do homem velho, "submerso, como dizem os rituais, nas mais profundas trevas".Como estamos vendo, a idia de transmutao tem muito que ver com o processo alqumico, e de fato a "Arte Real" manica, desenvolvida atravs dos trs graus de aprendiz, companheiro e mestre, idntica "Grande Obra" da Alquimia, pelo que pode fazer uma transposio totalmente coerente entre o simbolismo alqumico e o simbolismo construtivo e arquitetnico. A pedra bruta da Maonaria , neste sentido, quo mesmo a "matria prima" da Alquimia: tanto em uma como em outra esto contidas de maneira potencial ou virtual todas as possibilidades que conduzem ao homem para sua regenerao, possibilidades que, no caso do aprendiz maom, comearo a desenvolver-se e a crescer abrigadas influncia espiritual ou intelectual (pois ambos os conceitos expressam o mesmo) transmitida atravs dos smbolos e ritos da Ordem.O Smbolo e o RitoVamos ver, pois, alguns desses smbolos que constituem, junto aos ritos, o patrimnio vivo e o verdadeiro tesouro da Tradio Manica. Em altares de uma maior claridade, podemos classific-los da seguinte maneira: em smbolos geomtricos e visuais; em smbolos sonoros e vocais; e por ltimo em smbolos em movimento, que no so outros que os ritos.Sobre a importncia dos smbolos geomtricos e visuais na Maonaria basta recordar que antigamente se identificava esta com a prpria Geometria, o que perfeitamente lgico pois esta ltima encontra sua aplicao natural na arquitetura. Efetivamente, a palavra geometria deriva deGeo(terra) emetron(medida), quer dizer "medida da terra", o que certamente tem muito que ver com o ofcio de construtor assim que este delimita um espao com o fim de realizar sua obra.Por outro lado, o simbolismo geomtrico , igual que o numrico, uma das heranas mais importantes que a Maonaria recebeu que a tradio pitagrica. Ter que recordar que as confrarias medievais de construtores procediam diretamente dos colgios artesanais da antiga Roma, e que estes tinham recebido grande parte de seus conhecimentos sobre geometria diretamente dos pitagricos. Uma filiao jamais interrompida existiria ento entre a Ordem manica e a pitagrica, at o ponto de que muitos maons viram na Maonaria uma adaptao do Pitagorismo aos tempos atuais. O certo que nas lendas manicas Pitgoras figura, junto ao deus Hermes, como um dos fundadores mticos da Ordem. Efetivamente, nessas lendas tanto Pitgoras como Hermes so os que encontram as duas colunas (assimiladas posteriormente s colunas J. e B. do templo manico) onde se gravou todo o saber que remontava s prprias origens da humanidade, e entre as que se encontravam as artes e cincias da Cosmogonia. Como diz a este respeito Federico Gonzlez no artigo"Tradio Hermtica e Maonaria", aparecido no mesmo N 13-14 de SYMBOLOS, essas duas colunas "configuram os dois grandes afluentes sapienciais que nutriro a Ordem: o hermetismo que assegurar o amparo do deus atravs da Filosofia, quer dizer, do Conhecimento, e o pitagorismo que dar os elementos aritmticos e geomtricos necessrios que reclama o simbolismo construtivo; deve-se considerar que ambas as correntes so direta ou indiretamente de origem egpcia. Igualmente que essas duas colunas so as pernas da Me Loja manica, pelas quais parido o Nefito, quer dizer, pela sabedoria de Hermes, o grande iniciador, e por Pitgoras, o instrutor gnstico." Poderamos ento dizer que a Maonaria a confluncia natural dessas duas correntes constitutivas da Tradio Unnime, e que nela so s uma, conformando sua identidade e seu ser.Voltando para simbolismo geomtrico, devemos considerar dentro deste s prprias ferramentas ou utenslios. Concretamente falamos do nvel, do prumo, do esquadro e do compasso. Todas elas esto relacionadas diretamente com as formas geomtricas fundamentais. Por exemplo, o prumo claramente um smbolo da vertical, e do nvel da horizontal. No simbolismo construtivo ambas so indissociveis e se necessitam mutuamente, pois a verticalidade do edifcio, quer dizer, sua perpendicularidade, vem sendo dada pelo perfeito nivelamento do mesmo. E por sua vez esse nivelamento a resultante de um equilbrio que se consegue obrigado presena constante de um eixo vertical, que assinala o "justo meio" que impede qualquer desnivelamento. O prumo e o nvel representam ento os dois eixos de coordenadas que tornam possvel o levantamento harmonioso de toda a construo.O mesmo ocorre com o esquadro, que se forma pela unio de uma vertical e uma horizontal. Com esta ferramenta tambm construmos a figura do quadrado, e igualmente a cruz se unirmos dois esquadros por seus vrtices respectivos. Ambas as figuras so inseparveis da idia de quaternrio; assim: os quatro elementos, os quatro pontos cardeais, as quatro estaes, os quatro perodos cclicos da humanidade, as quatro fases da lua, os quatro perodos da vida humana, etc., quer dizer tudo que relacionado com a terra e o terrestre. Em realidade o esquadro um ngulo reto, e ele est destinado a "esquadrar" a pedra durante seu processo de polimento, depois de ter sido trabalhada pelo mao e pelo cinzel. Recordemos, enfim, que em latim esquadro se diz "norma", indicando assim a idia de ordem, ou de "enquadramento" que faz possvel a ordem, especialmente a do pensamento, que se faz una com a Inteligncia que reflete, que est simbolizada pelo compasso.Quanto a esta ltima, bvia sua relao com o crculo e com todas as figuras que tendem circularidade. Mas as formas circulares sempre so geradas a partir de um centro prvio, que precisamente o que assinala um dos dois braos do compasso, aquele que permanece imvel enquanto o outro gira a seu redor. O centro da circunferncia seria, pois, uma imagem simblica do Princpio, e a circunferncia mesma, uma imagem por sua vez da multiplicidade, da manifestao, surgida ou gerada pela irradiao dEsse princpio, que permanece no obstante imutvel enquanto tudo gira, troca e muda a seu redor. Por isso o compasso um dos smbolos que se associam diretamente com a atividade criadora do Grande Arquiteto, como o testemunham numerosas gravuras onde lhe representa com um compasso na mo riscando o plano de sua obra, quer dizer do cosmo.Outras duas figuras geomtricas importantes so o Delta Luminoso (de forma triangular) e a Estrela de cinco pontas ou Estrela flamgera, smbolos respectivos do Grande Arquiteto e do homem plenamente regenerado que retornou ao centro de si mesmo. D-se a circunstncia de que tanto o Delta como a Estrela flamgera so de origem pitagrica, pois esto intimamente relacionados com aTetraktys(que tem tambm forma triangular), e com o Pentalfa ou Estrela pentagramtica respectivamente, signo distintivo, este ltimo, da confraria pitagrica.Entre o segundo grupo de smbolos, os sonoros e vocais, encontramos as "palavras sagradas" e as "palavras de passe", assim como as lendas relatadas nos distintos graus. Tudo isto forma parte do ensino oral da Maonaria, que se complementa perfeitamente com o ensino visual prprio do simbolismo geomtrico. As "palavras sagradas" se denominam assim se porque representam diferentes nomes do Grande Arquiteto. Cada grau manico est simbolizado e tem sua prpria palavra sagrada. O significado dessa palavra d sentido e orienta os trabalhos rituais e simblicos que se desenvolvem em cada um desses graus. Por isso to importante para o maom conhecer esse significado, pois para ele ser um ponto de referncia axial constante e permanente que lhe guiar ao longo de todo seu processo inicitico.No menos importantes so as "palavras de passe", assim chamadas porque elas permitem "passar" de um grau a outro, o que as relaciona diretamente com a simblica de passagem ou de trnsito, comum a todas as tradies iniciticas. A expresso "estar em posse da palavra de passe" quer dizer que o maom culminou uma etapa dentro de seu processo de Conhecimento, que progrediu nas "via que lhe foram riscadas" desde antigo por sua tradio, e que portanto est preparado interiormente para receber o "aumento de seu salrio".E por ltimo esto os smbolos em movimento, que como dissemos no so outros que os ritos. O rito pe em prtica a idia que o smbolo expressa. Representa o desenvolvimento e a vivncia dessa idia, quer dizer, de faz-la efetiva mediante sua permanente reiterao. De nada serviria compreender o que o smbolo manifesta se depois essa compreenso no se viver como uma realidade verdadeiramente transformadora. Por isso mesmo to importante o rito dentro da Maonaria, pois sem essa constante vivificao dos smbolos os trabalhos que se fazem na loja manica careceriam de toda "fora e vigor", convertendo-se em meras alegorias quando no em atos puramente mecnicos. Neste sentido a meditao, a concentrao e o trabalho sobre os smbolos constituem tambm uma forma do rito, pois o fim ltimo deste gerar um estado apto para a compreenso das realidades superiores veiculadas pelos smbolos. Dir-se-ia, pois, que o rito, realizado nestas condies, uma "meditao em ao", e isto pode fazer-se tanto no interior da Loja manica, como no mundo, que a loja universal.Poderamos ento dizer que a Maonaria ela mesma um rito, da que tambm se denomine "a Ordem", como sinnimo da prpria ordem csmica. Por isso mesmo, na Loja manica (imagem simblica dessa ordem) tudo se cumpre segundo o rito, e todos os gestos e signos rituais realizados no interior da mesma tm que ser considerados como o que so: veculos transmissores do ensino simblico e de sua influncia regeneradora. Verdadeiramente no h maior rito que a busca do Conhecimento, pois nela o homem encontra o prprio fundamento de sua existncia. Essa busca um "ato consciente", e tudo o que a partir de ento realizado, experimentado e vivido durante seu desenvolvimento passa a ser significativo, a ter um sentido que nos "orienta" no labirinto deste mundo perecvel e nos impulsiona para o encontro de nosso verdadeiro ser e origem.A Loja, imagem do mundoFalaremos agora do simbolismo da Loja manica, e o primeiro que chama nossa ateno a prpria palavra Loja, virtualmente idntica a Logos, que significa justamente a Palavra ou o Verbo com que o Grande Arquiteto cria o mundo ou cosmo. Igualmente, Loja manica, se no etimologicamente sim ao menos em seu sentido simblico, idntica palavra snscritaloka, que quer dizer "mundo", "lugar", e por extenso "cosmos". Por outro lado, tambm se d uma identidade entre Loja, Logos e o gregolyke, que significa "luz". Deste modo aloggia um termo tcnico de origem italiana utilizada em arquitetura para designar uma galeria coberta e aberta, composta por arcos apoiados sobre colunas e situados geralmente nas partes elevadas dos edifcios, como o caso por exemplo dos "parasos" dos teatros.Aqui temos, resumido, o que distingue acima de tudo Loja manica, que como dizem os antigos rituais " um lugar muito iluminado e muito regular", tal qual o cosmos sado do Logos criador ou Esprito da Construo Universal. A luz pois sinnimo de Cosmo, enquanto que a escurido ou as trevas se assimilam ao "caos" anterior ao Cosmo. As trevas em que se encontra a Loja antes da abertura dos trabalhos simbolizam justamente esse "caos" pr-csmico, e a prpria abertura deveria representar a gradual "iluminao" dessas trevas. Em realidade a abertura da Loja manica um rito cosmognico que os maons realizam constantemente, e ao se estud-la atentamente, a simblica desse rito se ver com claridade que se trata de um verdadeiro rito de fundao ou de criao de um espao e um tempo significativos anlogos prpria estrutura do cosmos. A descrio simblica da Loja reproduz precisamente essa estrutura: Qual a forma de tua Loja? Um retngulo. Em que sentido se orienta seu comprimento? Do Oriente ao Ocidente. E sua largura? Do meio-dia ao Setentrio. E sua altura? Da superfcie da terra at os cus (o Znite) E sua Profundidade? Da superfcie at o centro da terra (o Nadir) Que significam estas direes? Que a maonaria Universal.Podemos observar que essas direes conformam uma cruz tridimensional, cujos ex de coordenadas comprido, largo, alto e baixo conformariam a estrutura interna da Loja manica, a imagem mesma do cosmo. Esse retngulo em realidade um dobro quadrado, que se orienta horizontalmente de Oriente ao Ocidente segundo seus lados largos e de Meio-dia a Norte segundo seus lados largos. a partir do centro do retngulo que a Loja manica se orienta verticalmente para o mais alto dos cus (o Znite) e para o mais profundo da terra (o Nadir), adquirindo assim sua verdadeira dimenso universal. A essa altura e a essa profundidade se refere a conhecida expresso: "na Loja manica de So Joo se elevam templos virtude e se cavam masmorras para o vcio".Essa estrutura vertical tambm aparece projetada no plano base da Loja manica, que est dividida em trs partes bem diferenciadas, a imagem mesma do Templo do Salomo, prottipo do templo manico. O cu est representado pelo semi-crculo situado ao Oriente, que tem forma semicircular, e que recebe, ao igual que no templo do Salomo, o nome doDebir. A ele se sobe por trs degraus ou graus, que se referem idia de elevao gradual e hierarquizada a outros planos ou nveis superiores de realidade. A terra est simbolizada peloHikal, que todo o espao restante da Loja manica at as duas colunas J. e B., que suportam o "prtico da entrada", semelhante ao que no templo do Salomo se denominava oulam. Diz-se que o "prtico da entrada" no est nem dentro nem fora da Loja manica. , pois, um lugar de trnsito, ou de passagem, que o maom deve atravessar vindo das trevas do mundo profano, o qual propriamente o mundo inferior.Essa mesma idia de elevao assinalada pelos trs degraus que conduzem aoDebir, encontramo-la tambm no altar ou ara, proveniente do latimaltare, cuja raiz,altus, significa lugar alto ou elevado. Em muitas culturas tradicionais os altares (como os templos) erigiam-se na sumidade das montanhas, ou das pirmides escalonadas, como no caso das civilizaes pr-colombianas, ou dos zigurates babilnicos, para pr s dois exemplos. O altar est situado no prprio centro da Loja manica, e em torno dele nos deslocamos e efetuamos nossos ritos. portanto o "ponto geomtrico" ou "corao" da Loja manica, e por ele passa simbolicamente o prumo do Grande Arquiteto que une o cu com a terra. Tambm se chama "Altar dos juramentos" porque sobre ele realizamos os compromissos e "alianas" que contramos com a Ordem e com o Esprito que a vivifica. Esse juramento se cumpre em presena das "Trs Grandes Luzes" da Maonaria, o Livro da Lei Sagrada, o Compasso e o Esquadro, que so dispostos precisamente sobre o altar. Em quase todas as Lojas manicas esse Livro no outro que a Bblia, mas esta tambm pode ser substituda por qualquer dos livros sapienciais da humanidade, que uma amostra mais do carter verdadeiramente universal da Maonaria. O realmente importante que nesse Livro se recolha a voz da Sabedoria Perene, cuja essncia est por cima das formas particulares que esta possa adotar para manifestar-se. O mesmo podemos dizer do compasso e do esquadro, ferramentas cujo simbolismo, como j vimos, est ligado diretamente com a idia de uma Cosmogonia sempre viva e atual.Voltando de novo para o Oriente, sobre a parede do fundo encontramos o Delta luminoso com o Tetragrama ou nome inefvel do Grande Arquiteto no centro. Como j dissemos este Delta um tringulo com o vrtice para cima, figura que expressa a realidade dos princpios universais, vez que a primeira estrutura prototpica que se expressa em todos os planos da manifestao como uma fora que cria, outra que conserva e uma terceira que destri, ou melhor, transforma. Estas trs idias-foras surgem de um Princpio nico, que fica simbolizada no Delta por um s olho que s vezes substitui ao Tetragrama, mas que vem a referir-se ao mesmo sentido de presena imutvel da deidade no seio mesmo da manifestao. Alm disso, a manifestao, desde sua realidade mais sutil at a mais densa e material, est simbolizada pelas quatro letras que compem o Tetragrama:Iod, H, Vau, H, correspondendo-se cada uma delas com os quatro nveis ou mundos que constituem a existncia universal, e que so os mesmos que se encontram na rvore da Vida cabalstica. Neste nome do Grande Arquiteto fica pois resumida a obra da criao, e seu conhecimento se vincula diretamente com a busca da "Palavra Perdida".Mas a Loja manica no s uma estrutura esttica como tampouco o universo a no ser dinmica tambm, podendo ser visualizada como uma roda, imagem da "roda do cosmo" ouRota Mundi. Isto est expressamente indicado pelas doze colunas ou pilares que emolduram o recinto da Loja manica, e que equivalem aos doze signos zodiacais. Cinco destas colunas esto situadas a Norte, cinco mais a Meio-dia, e as duas restantes (as colunasJakineBoaz) ao Ocidente, justo no prtico da entrada.Diremos que o zodaco (que quer dizer precisamente "roda da vida") como o marco do universo visvel, e seu movimento cclico, unido ao dos planetas e demais constelaes, influi na mudana alternativa das estaes e na manuteno e renovao da vida do cosmo e do homem. Disto se deduz que a Maonaria no desconhece a antiga cincia da astrologia, que junto alquimia revela tambm os mistrios do cu e da terra.As colunasJakineBoazse vinculam especialmente com a simblica dos dois solstcios, e portanto com as duas fases ascendente-descendente do ciclo anual. Elas se assimilam, pois, aos duas So Joo, o Batista e o Evangelista, e aos dois rostos do deus romano Jano, e em conseqncia "porta dos homens" e a "porta dos deuses", respectivamente. Estas so as portas zodiacais de Cncer e Capricrnio, que correspondem entrada do vero e do inverno, quer dizer o descida e a ascenso da luz solar. As portas solsticiais cumprem um papel muito importante dentro do processo inicitico, que, no deve esquecer-se, reproduz exatamente as etapas do desenvolvimento cosmognico.Para os pitagricos, pela porta de Cncer as almas penetram no "antro das ninfas", que tal qual a caverna platnica, outra imagem do mundo. Ali o maom, atravessando as duas colunas como se fosse parido por elas, comea a percorrer sua viagem horizontal ou terrestre, at chegar ao centro de si mesmo, ao altar de seu corao, aonde se abre outra porta, a de Capricrnio, atravs da qual inicia outra viagem, esta vez vertical e celeste para a cpula e para a clave de abbada que coroa os mistrios da cosmogonia, dando acesso assim aos estados metafsicos e incondicionados. Quer dizer, que o homem "entra por uma porta e sai por outra, e no nterim assinalado pelo espao e pelo tempo tem a oportunidade de reconhecer-se e escapar dessa condio pela identificao com outros estados do ser universal, que pode vivenciar por meio da conscincia individual semelhante conscincia universal e que constituem a possibilidade da regenerao particular e tambm da universal, sempre, claro est, tomando como suporte a gerao e a criao no espao e o tempo"3. Este mesmo processo pode ver-se tambm na mitologia de grande nmero de heris e deuses revestir, como o caso do Osris, Quetzalcoatl, Mitra, Cristo e o prprio mestre Hiram.No centro da Loja manica se estende o "pavimento mosaico", tapearia de quadros brancos e negros exatamente iguais que os do tabuleiro de xadrez, cujas origens so tambm simblicos e sagrados como o da maioria dos jogos. O pavimento mosaico , sem dvida, um smbolo da manifestao que, efetivamente est determinada pela luta e delicado equilbrio que entre si sustentam as energias positivas, masculinas e centrfugas (yang, luminosas) e as energias negativas, femininas e centrpetas (yin, escuras), expressas tambm na alternncia dos ritmos e ciclos da natureza e o cosmo. Essas mesmas energias esto representadas pelo Sol e a Lua, que na Loja manica se encontram presidindo o Oriente, a um e outro lado do Delta luminoso.Recordaremos que a cor branca simboliza as energias celestes, e a cor negra as terrestres. As primeiras se opem s segundas, e vice-versa, ao mesmo tempo que se complementam e conjugam (atradas como os plos positivo e negativo de um m), determinando em sua perptua interao o desenvolvimento e a prpria estrutura da vida csmica e humana. Essa estrutura se gera igualmente pela confluncia de um eixo vertical celeste e outro horizontal terrestre (exemplificados no pavimento pelas linhas transversais e longitudinais), conformando uma malha ou trama cruciforme, um quadriculado, enfim, que reflete as tenses e equilbrios a que est submetido a ordem da criao. Do mesmo modo, tambm pode equipar-la vertical ao tempo e a horizontal ao espao (o primeiro ativo com respeito ao segundo, ao que molda permanentemente), quer dizer, s duas coordenadas que estabelecem o "enquadramento" que permite a existncia de nosso mundo e de todas as coisas nele includas. A idia dessa ordem est j implcita no significado da palavra 'mosaico', que deriva do gregomuseion, literalmente "templo das musas", expresso esta que convm perfeitamente Loja manica manica, aonde como estamos vendo cada uma de suas partes e a totalidade de seu conjunto constituem uma sntese simblica da harmonia universal.No prprio meio do pavimento mosaico se dispe o "quadro da Loja manica", que um esquema sinttico de todo o templo manico, alm de constituir um suporte simblico para a meditao e a concentrao. Efetivamente, o quadro da Loja manica, ao conter em seu interior o desenho dos smbolos mais significativos e importantes, torna-se por isso um veculo da influncia espiritual na Maonaria.Antigamente o quadro da Loja manica se riscava diretamente sobre o cho antes de iniciar os trabalhos, e era apagado quando ditos trabalhos tocavam a seu fim. Isto d a medida da importncia que tinha o dito quadro nos ritos cosmognicos dos construtores, pois na verdade o traado dos diferentes smbolos constitua em si mesmo um rito destinado a "atrair" e fazer presente no espao significativo da Loja manica as idias-foras contidas nesses mesmos smbolos, e que depois se plasmariam na edificao. Embora hoje em dia nas oficinas manicas j no se tenha o costume de desenhar o quadro da Loja manica, entretanto a influncia desses smbolos continua estando presente, at o ponto de que sem a presena do quadro os trabalhos no se podem abrir. Em qualquer caso, o traado do quadro da Loja manica um exerccio ritual de meditao e concentrao nos smbolos que o maom poderia praticar sempre que o desejasse.E por ltimo mencionar que ao redor do pavimento de mosaico e do quadro da Loja manica se encontram os trs pilares da Sabedoria, da Fora e da Beleza. Os pilares so tambm as "Trs Pequenas Luzes" da Maonaria, e s quais no terei que confundir com as "Trs Grandes Luzes" j mencionadas. Diremos que em algumas Lojas manicas os trs pilares esto consagrados deusa Minerva (a Sabedoria), a Hrcules (a Fora) e a Vnus (a Beleza).Os pilares so acesos durante a abertura dos trabalhos e apagados instantes antes de seu fechamento, o que leva a pensar que, e ao igual que ocorre com o quadro de Loja, estes pilares desempenham um papel de suma importncia no que se refere ao desenvolvimento do ritual manico em qualquer de seus graus. Neste sentido recordaremos que o significativo nome de "estrelas" com o que tambm se conhecem os trs pilares alude sem dvida ao carter celeste que se desprende de sua simblica, pois claro que se tratam das "idias" reitoras que tm que presidir os trabalhos manicos, pois como se dizem nos rituais "a Sabedoria concebe, a Fora executa e a Beleza adorna".Atendendo ao que se menciona a este respeito durante o ritual de abertura essas estrelas devem "fazer-se visveis" a fim de que esses trabalhos sejam "iluminados" e se desenvolvam em harmonia com os planos do Grande Arquiteto. Como dissemos mais acima, a penumbra em que est sumida a Loja manica antes do sistema de iluminao dos pilares exemplificam as "trevas" primitivas que precederam a formao da ordem csmica, pelo que se deduz que a iluminao da Loja manica deveria representar um smbolo mais da ao do Fiat Lux, ou Faa-a Luz!, Cosmognico emanado da Palavra ou Verbo criador.Considerados do ponto de vista microcsmico, estes trs princpios tambm representam trs qualidades ou estados da alma humana, os que vividos no interior da conscincia fazem possvel sua transmutao e contribuem, portanto, edificao do templo espiritual, do qual o templo material a representao simblica. Precisamente os trs pilares se vinculam respectivamente com o Venervel Mestre, o Primeiro Vigilante e o Segundo Vigilante, quer dizer com os trs principais oficiais da Loja manica (chamados as "trs luzes"), aqueles que se encarregam de dirigir e "ordenar" os trabalhos que nela se realizam. So estes trs oficiais os que acendem ou iluminam os pilares (e tambm os que os apagam durante a clausura), pronunciando ao mesmo tempo que isto se cumpre, as invocaes claramente alusivas construo do templo interior e do templo exterior.No Rito Escocs Antigo e Aceito essas invocaes so as seguintes:Que a Sabedoria do Grande Arquiteto presida a construo de nosso edifcio!Que a Fora o sustente!Que a Beleza o adorne!No ento casual que seja precisamente ao redor deste quadro e dos trs pilares onde tem lugar o rito da "cadeia de unio", no qual se invoca a potncia criadora e iluminadora do Grande Arquiteto, e implicitamente tambm a de todos os irmos e irms pulverizados pela face da Terra, sem nos esquecer de quo antepassados passaram ao oriente Eterno e que contriburam com seu esforo, sacrifcio e entrega Verdade e ao Conhecimento edificao da Grande Obra Universal. E esta invocao vertical se realiza mediante a unio encadeada e fraterna de todas as foras vivas presentes na Loja manica, quer dizer de todos os componentes da mesma, que estabelecem assim uma comunicao sutil entre suas respectivas individualidades, servindo como suporte para a manifestao da influncia espiritual.Como se diz no livroSmbolo, Rito, Iniciao. A Cosmogonia Manica,cap. 33, e com isto j terminamos, a cadeia de unio"constitui um crculo mgico perfeito de concentrao de vibraes, um dnamo gerador, no unicamente capaz de transmitir seu fora a cada um dos integrantes a no ser a de emanar a outros espaos visveis e invisveis; uma forma ativa da invocao e tambm um encantamento de amparo para todos aqueles que tm a graa de participar dos mistrios da Arte Sagrada, chamado-los guardies do Templo da sabedoria salomnica, imagem de todos os templos, os que como parte de suas funes devem saber estreitar suas filas e trabalhar de modo harmnico, tendente perfeio".

NOTAS

*Conferncia pronunciada em uma Loja manica de Buenos Aires, Repblica Argentina, em 7 de Dezembro de 2000.Francisco Ariza colaborador deSYMBOLOS: Arte - Cultura - Gnosis e diretor da Revista telemticaEl Taller.

1Artigo traduzido no N 13-14 da revista SYMBOLOS, pgs. 192-195:"La Gnosis y la Franc-Masonera".

2Consideraes sobre o ritual do Aprendiz Franco-maom. Ed. Arch, Milano.

3Federico Gonzlez,La Rueda, Una imagen simblica del cosmos (A Roda. Uma imagem simblica do cosmo),cap. VII.

http://hermetismoymasoneria.com/psimbolismo_maconico.htm