+ülvaro cardoso gomes - o simbolismo

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  • 8/6/2019 +lvaro Cardoso Gomes - O Simbolismo

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  • 8/6/2019 +lvaro Cardoso Gomes - O Simbolismo

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    O SIMBOLISMO

    PRINCPIOS

    lvaro Cardoso Gomes

    Professor-associado de Literatura Portuguesa na Universidade de So Paulo

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    Sumrio

    1. Origens

    Marco inicial

    Crise do fim do sculo Esprito da decadncia Influncias romnticas

    2. Uma revoluo potica

    A teoria das correspondncias _ O poeta, um vidente

    O mistrio, a sugesto, a evocao

    O smbolo

    O Simbolismo e a msica

    A busca do novo entre os simbolistas

    3. Cronologia e expanso

    Anos de grandes polmicas

    O fortalecimento do Simbolismo em seu bero, a Frana

    O Simbolismo no resto da Europa e nas Amricas

    O Simbolismo nos pases de lngua portuguesa

    4. ndice de autores simbolistas

    5. Vocabulrio crtico6. Bibliografia comentada

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    Origens

    Marco inicial

    O Simbolismo surge no fim do sculo XIX, mais precisamente em 1857, quando o

    poeta Charles Baudelaire publica sua obra As flores do mal. Essa obra provocou o maior

    escndalo na poca, porque no s mexeu com temas-tabus em poesia, como tambm

    procurou criar um novo tipo de poesia. Devido ao escndalo, Baudelaire chegou, inclusive, a

    ser processado por obscenidade. Por que um ttulo to estranho para uma obra potica? Num

    dos prefcios desse livro, Baudelaire assim o explica:

    Poetas ilustres tinham dividido h muito tempo as provncias floridas do

    domnio potico. Pareceu-me prazeroso, e tanto mais agradvel, porque a tarefa era

    mais difcil, extrair a beleza do mal. (Les fleurs du mal. Paris, Garnier, 1961. p. 248.)

    Com base nessa poesia, Baudelaire compe um livro cheio de imagens alucinantes.

    Tendo como pano de fundo a Paris do sculo XIX, o poeta fala do tdio que os tempos

    modernos lhe inspiram, da solido existencial do homem, de amores fracassados e, sobretudo,de coisas srdidas, repugnantes, como acontece, por exemplo, no poema "Uma carcaa":

    As moscas zumbiam sob este ventre ptrido,

    De onde saam negros batalhes

    De larvas, que escorriam como um lquido espesso

    Ao longo dos vivos rasges.

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    ("Une charogne", ibidem, p. 34)

    Por que essa atrao pelo mal, por aquilo que convencionalmente no seria objeto deinteresse para um poeta? Ainda: como extrair beleza do mal? Na realidade, Baudelaire estava

    criando uma nova concepo de poesia. No passado, durante as eras clssicas e romnticas, a

    arte era ligada, de modo geral, ao bem, e a beleza era entendida como algo que fosse

    harmonioso, que provocasse sensaes agradveis nos leitores. Baudelaire evidentemente se

    insurge contra esse conceito de poesia e, por conseqncia, de belo; da sua inteno de extrair

    beleza tambm do que srdido, do que feio. Com isso, o poeta francs pretendia causar um

    choque no leitor passivo, acostumado com o convencional:

    Leitor pacfico e buclico, Sbrio e ingnuo homem de bem,

    Joga fora este livro saturniano, Orgaco e melanclico.

    Se no aprendeste tua retrica Com Sat, o

    astucioso deo, Joga-o! tu no compreenders

    nada, Ou acreditars que sou histrico.

    Mas se, sem se deixar encantar,

    Teu olho souber mergulhar nos abismos,

    Leia-me, para aprender a me amar;

    Alma curiosa que sofres

    E vais procurando teu paraso,

    Lastima-me!... seno, te maldigo!

    ("Epgrafe para um livro condenado", ibidem, p. 177.)

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    Mas no s com o srdido, o feio, o repugnante, que Baudelaire se prope amodificar a atitude do leitor diante do mundo. A linguagem tambm trabalhada, para que se

    torne mais sugestiva, para que evite o derramamento emotivo. Baudelaire procurar fazer com

    que as palavras tenham um valor essencialmente musical e que sejam capazes de evocar as mais

    diversas sensaes.

    Esse carter revolucionrio de As flores do mal, na realidade, reflete a tentativa de

    Baudelaire de registrar ao nvel potico um descontentamento contra um modo de pensar o

    mundo e contra um modo de conceber a poesia e a arte em geral. Baudelaire ser, portanto, o

    arauto desse desconforto com um estado de coisas e, com isso, dar incio ao Simbolismo.

    Crise do fim do sculo

    Tanto a obra de Baudelaire quanto o Simbolismo surgem dentro da crise social,

    existencial e cultural do fim do sculo XIX. Para que a entendamos, contudo, temos de

    regressar aos meados do sculo XIX, quando houve, economicamente, grandedesenvolvimento industrial e, culturalmente, o homem buscou explicar os fenmenos atravs

    de uma postura cientfica.

    A Revoluo Industrial inicia-se nos fins do sculo XVIII, mas s atinge seu auge no

    sculo seguinte, com a produo em massa de mercadorias e com a crescente automatizao

    das indstrias. As grandes cidades comeam a crescer cada vez mais, e os camponeses

    abandonam o campo, em busca de melhores salrios nos centros urbanos. A era moderna

    parece nascer a: crescem a produo e o consumo dos bens manufaturados, e o homem cria a

    iluso de que o mundo se tornou menor, graas velocidade dos meios de locomoo. O

    resultado dessa obsesso com o progresso a intensa euforia, somada crena na onipotncia

    do homem, que se deixa guiar quase que exclusivamente pela razo.

    O intenso desenvolvimento industrial, por sua vez, est aliado ao cientfico. Alis,

    jamais poderamos pensar em Revoluo Industrial, se no houvesse nesse perodo um

    desenvolvimento espetacular das cincias, pois elas sero responsveis pelos inventos que tero

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    imediata aplicao nas indstrias. Mas a relao entre a Revoluo Industrial e as cincias no

    se restringe to-s inveno por parte destas de um melhor maquinado para o

    desenvolvimento das indstrias. O progresso industrial, que trouxe inegveis benefcios humanidade, tem seu paralelo numa concepo cientfica e materialista das coisas, que

    procurava explicar o sentido do universo quase que exclusivamente atravs da razo.

    Durante a vigncia da Revoluo Industrial surge, portanto, uma gerao de

    intelectuais que despreza a metafsica, em nome do conhecimento experimental da realidade.

    O mais importante deles foi Auguste Comte, criador do Positivismo, teoria cientfica, baseada

    na sociologia, que defendia a aproximao positiva, objetiva da realidade. Seguindo os

    postulados de Comte, Taine, com o Determinismo, tenta explicar o universo luz de

    determinantes fixos (a raa, o meio e o momento histrico). Cientistas como Darwin e

    Lamarck, por sua vez, buscam conhecer o homem a partir das teorias evolucionistas. Como se

    verifica, tanto Comte quanto Taine, Darwin e Lamarck se apiam num conhecimento

    eminentemente racionalista do real.

    A euforia provocada pela crena no progresso, pelas grandes descobertas cientficas,

    paradoxalmente acabaria por levar a sria crise. A Revoluo Industrial, ao criar a fantasia do

    paraso material do consumismo, da produo em massa de objetos, em determinado instante,

    mostra o outro lado da moeda. Os centros urbanos tornam-se mais agitados, mais ricos,contudo, expem, ao mesmo tempo, a misria dos aglomerados humanos dos bairros de lata.

    A automatizao, que leva produo de manufaturados em srie, transforma o

    operrio numa engrenagem da mquina. A obsesso pelo consumo, pela produo

    desenfreada de novidades, leva ao modismo, ao princpio de que tudo transitrio,

    inclusive os critrios de gosto e de arte. Os objetos artsticos, como as mercadorias,

    passam a ser consumidos vorazmente e, por causa disso, tm curta durao. Em

    conseqncia, o homem passa a ter a sensao de que vive num mundo fragmentrio e devalores efmeros. Quanto gerao da "Razo Triunfante", tem suas certezas abaladas por

    novas concepes de mundo, que desprezam os mtodos de abordagem do real, fundados

    em pressupostos experimentalistas. Arthur Schopenhauer, em sua obra O mundo como

    vontade e representao (1819), concebe a realidade como mera "representao", iluso de

    nossos sentidos, portanto inacessvel abordagem positiva e experimental. O ato de

    conhecer, ao contrrio do que acreditavam os positivistas, algo impossvel, limitado e

    por isso mesmo acarretar sofrimento ao homem:

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    medida que o conhecimento se torna mais claro e que a conscincia

    aumenta, o sofrimento cresce, chegando no homem ao grau supremo; e neste

    ponto tanto mais violento quanto melhor o homem dotado de lucidez do

    conhecimento, quanto mais excelsa a sua inteligncia: aquele em que est o gnio,

    sempre aquele que maiormente sofre. (3. ed. So Paulo, Brasil Ed., 1963. p. 77.).

    Isto se d pelo fato de a vontade (e no a razo, como queriam os positivistas)

    impulsionar cegamente o homem conquista do mundo. Mas como a realidade mera iluso,

    resulta da que nada h que conquistar:

    Querer e aspirar, eis toda sua essncia (do homem), estreita-mente igual a

    uma sede que nada pode mitigar. Mas a base de cada querer uma falta, uma

    indigncia, a dor. (Ibidem, p. 80).

    Concebendo desse modo a realidade e o ser, Schopenhauer rejeita a crena eufrica

    no progresso, nos procedimentos racionais e sobrevaloriza a passividade, o abandono de

    qualquer ambio. O pessimismo schopenhauriano far escola dentro do Simbolismo,principalmente no que diz respeito ao culto da dor e da atitude passiva diante da vida.

    Discpulo de Schopenhauer, Nicolau von Hartmann, em sua Filosofia do in-

    nconsciente (1869), cria a idia do Inconsciente, entidade desconhecida que existe por detrs

    de tudo e que totalmente inacessvel. Espcie de divindade oculta e indiferente ao destino do

    ser, o Inconsciente, segundo Hartmann, daria explicao aos fenmenos, mas essa explicao

    no chegaria ao conhecimento do homem. Desse modo, o filsofo alemo contraria

    frontalmente a um Taine e a seus princpios deterministas. O sentimento de impotncia diante

    do enigma do universo, de acordo com as teorias de Hartmann, ser outro dos tpicos

    fundamentais da poesia do fim do sculo XIX. Um poeta como o portugus Antero de

    Quental, que comeou sua carreira literria dentro do Realismo, assim expressar seu

    pessimismo frente incgnita em que se transformou o universo, regido pela fora

    desconhecida do "inconsciente":

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    Junto do mar, que erguia gravemente

    A trgica voz rouca, enquanto o vento

    Passava como o vo dum pensamento

    Que busca e hesita, inquieto e intermitente,

    Junto do mar sentei-me tristemente,

    Olhando o cu pesado e nevoento,

    E interroguei, cismando, esse lamento

    Que saa das cousas, vagamente...

    Que inquieto desejo vos tortura,

    Seres elementares, fora obscura?

    Em volta de que idia gravitais?...

    Mas na imensa extenso, onde se esconde

    O inconsciente imortal, s me responde

    Um bramido, um queixume, e nada mais...

    (Oceano nox. Apud MOISS, Massaud. A literatura portuguesa atravs dos textos.

    So Paulo, Cultrix, s.d. p. 320.).

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    Esprito da decadncia

    Os malefcios advindos da Revoluo Industrial (o inchamento das grandes cidades,

    os bairros de lata, a obsesso com as modas), somados dvida quanto eficcia dos mtodos

    cientficos para compreender o real, instauraram de vez a crise que estava latente no ar. O

    homem que acreditava ter acesso aos segredos do universo, via razo e via progresso, v de

    repente que tudo no passa de iluso, que o universo regido por foras incontrolveis que ele

    desconhece completamente. Esse sentimento leva-o descrena, ao desalento e faz com que

    adote uma postura de desprezo em relao a tudo que lembra o mundo burgus da luta, daoperosidade, da conquista.

    Refletindo o pessimismo do perodo, surge nessa poca um tipo de

    homem que volta s costas sociedade materialista e que procura cultivar dentro

    de si as sensaes mais refinadas. Esse homem, conhecido como decadente, fecha-

    se em sua torre de marfim e s na orgulhosa solido que parece encontrar

    conforto para o sofrimento proveniente do desconforto com o mundo grosseiro e

    hostil. O simbolista Verlaine, num poema como "Langor", expe um sentimentode decadncia, um sentimento de prazer mrbido, doentio, como se desejasse que

    os valores da civilizao ocidental cassem por terra:

    Eu sou o Imprio no fim da decadncia, Que olha passar os grandes Brbaros

    brancos Compondo acrsticos indolentes Num estilo de ouro onde o langor do sol

    dana.

    A alma solitria sofre no corao de um denso tdio.

    Alm se diz que por causa de grandes combates sangrentos

    Oh no ser capaz disso, sendo to frgil, de votos to lentos,

    Oh no querer florir um pouco esta existncia!

    Oh no querer, oh no poder morrer um pouco! Ah! tudo foi bebido!

    Bathylle, terminaste de rir? Ah! tudo foi bebido,

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    tudo foi comido! Nada mais a dizer!

    Somente um poema um pouco simplrio

    que se lana ao fogo,

    Somente um escravo um pouco libertino que vos negligencia,

    Somente um tdio por no se saber o que vos aflige!

    (O Euvres potiques completes. Paris, Gallimard, 1965. p. 370-1.)

    Dessa maneira, possvel dizer que o homem ativo, amante do progresso, dos

    meados do sculo XIX, cede lugar ao homem de sentidos refinados, um aristocrata, que cultivaprazeres extravagantes e que manifesta o maior desprezo pela vida social.

    O melhor exemplo desse anti-heri do fim do sculo Des Esseintes, a personagem

    principal de s avessas(1884), estranho romance de Joris-Karl Huysmans. Essa obra,

    praticamente sem enredo, trata de um nobre que resolve abandonar a sociedade burguesa

    materialista e se refugia numa propriedade no campo. L, tranca-se, isola-se e passa o tempo

    cultuando as coisas que mais ama: a leitora de velhos livros do tempo da decadncia latina, os

    poentas malditos modernos, as sensaes extravagantes, como o odor de especiarias e

    perfumes, a viso de plantas exticas, etc. Sua casa torna-se, desse modo, o espao reservado

    para o gozo de tudo que artificial, tudo que contrrio opinio comum:

    Seu desprezo pela humanidade aumentou; compreendeu enfim que o mundo

    se compe, na maior parte, de sacripantas e imbecis. Decididamente, no tinha

    nenhuma esperana de descobrir em outrem as mesmas aspiraes e os mesmos

    rancores, nenhuma esperana de acasalar-se com uma inteligncia que se

    comprazesse, como a sua, numa estudiosa decrepitude; nenhuma esperana de

    associar-se a um esprito penetrante e torneado como o seu, de um escritor ou de um

    letrado.

    [.-]

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    A essa altura, j sonhava com uma refinada tebaida, num deserto confortvel,

    com uma arcada imvel e tpida onde ele se refugiaria, longe do incessante dilvio da

    parvoce humana. (So Paulo, Cia. das Letras, 1987. p. 36-7.).O romance de Huysmans fez escola, de tal maneira que Des Esseintes transformou-

    se no prottipo do homem do fim do sculo, aquele que recusa a luta e a ao para se dedicar a

    uma vida artificial, produto do delrio ou de uma imaginao exaltada.

    Influncias romnticas

    Esse homem tpico do fim do sculo, o decadente, o dandy, na realidade, tinha sido

    inventado durante a vigncia do Romantismo, em sua fase mais extremada. Como se sabe, a

    esttica romntica teve um momento em que os escritores procuraram levar s ltimas

    conseqncias o culto da noite, dos sentimentos, dos prazeres doentios. o que se

    convencionou chamar de "mal do sculo". Entre o poeta transtornado do "mal do sculo", que

    ama a vida bomia, que procura a morte para aliviar a dor de viver, e o decadente doSimbolismo h evidente parentesco. Mas h tambm diferenas flagrantes. O primeiro todo

    emotivo e, por vezes, procura na mulher, no suicdio, um lenitivo para a existncia. J o

    segundo frio, racional e mesmo cnico: despreza o amor e vive artificialmente.

    As semelhanas que encontramos nos anti-heris dos dois movimentos literrios

    talvez expliquem as relaes mais profundas entre Romantismo e Simbolismo. De fato, a

    esttica simbolista tem ntima relao com a romntica, ou ainda a esttica simbolista tem

    razes dentro do movimento romntico, a comear que aquele movimento recupera o

    idealismo, o espiritualismo deste. No toa que muitos simbolistas passam a criticar o

    Realismo, o Naturalismo e o Parnasianismo, porque esses movimentos negavam o sentido de

    mistrio, muito caro aos romnticos e aos simbolistas. Jean Moeras, um poeta grego radicado

    na Frana, numa entrevista dada a Geles Bret, assim se manifesta a respeito do assunto:

    Pode-se notar com alguma razo que os poetas que nos antecederam

    imediatamente, os parnasianos [...], num certo sentido, padeceram da falta de

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    smbolo: consideraram as idias, os sentimentos, a Histria, o mtico, o fato

    particular, como existente em si poeticamente. (Entrevista a Geles Bret, lixo de Paris,

    1891. Apud Les premires armes du Symbo-lisme. Texte presente et annot par

    Michael Pakenham. University of Exeter, 1973. p. 68.).

    Mallarm tambm criticar nos parnasianos a mania de falar diretamente das coisas,

    de desprezar o senso do mistrio:

    Os jovens esto mais prximos do ideal potico do que os parnasianos, que

    ainda tratam seus temas maneira dos velhos filsofos e dos velhos retricos,

    apresentando os objetos diretamente. (OEuvres completes. Paris, Gallimard, 1945. p.868.).

    Fundamentalmente, portanto, o Simbolismo tenta recuperar o idealismo do

    movimento romntico. Durante o Romantismo, segundo Ana Balakian, autora de O move-mento

    simbolista, "a poesia se apropriou do terreno do mstico como uma espcie de sucedneo da

    religio: os romnticos buscavam analogias ou imitaes do infinito". Esse idealismo

    romntico, por sua vez, apoiava-se nos princpios esotricos de Emmanuel Swedenborg. Esse

    escritor sueco, que viveu durante o sculo XVIII (1688-1772), escreveu um livro que acabariapor se tornar a Bblia tanto dos romnticos quanto dos simbolistas. De coelo et de inferno (Sobre

    o cu e o inferno) (1758) uma obra de carter mstico que tenta explicar as complexas

    relaes entre o mundo celeste e os terrenos. A essas relaes Swedenborg denominava

    "correspondncias". Apoiando-se no princpio das correspondncias, o romntico sonhava em

    pautar a vida terrestre pela celeste, a vida material pela espiritual ou ainda tentava anular uma

    em detrimento da outra, ao espiritualizar o concreto, o natural, para alcanar a plenitude junto

    a Deus. Negando o cientificismo e procurando recuperar a essncia do Cristianismo, o

    romntico privilegiou o sujeito, o esprito, enquanto recusava o mundo material. O simbolista,

    em princpio, seguiu por esse mesmo caminho em conseqncia disso, Swedenborg ser

    novamente retomado no fim do sculo XIX.

    Tambm preciso assinalar que o Simbolismo ir recuperar e intensificar a idia

    romntica de que a essncia misteriosa das coisas s possvel de ser captada pela palavra

    educadora, pela palavra que supera a limitao da linguagem comumente utilizada pelos

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    homens. O mesmo se pode dizer do senso do mistrio, to caro aos simbolistas. O romntico

    Novalis dizia:

    A Noite tornou-se o portentoso mago das revelaes para onde os deuses

    retornaram e adormecem. (Hinos noite. Trad. bras. So Paulo, Esfinge Ed., 1987.).

    Ao dizer isso, o poeta alemo acreditava que a prtica potica tinha algo a ver com a

    prtica mstica, no sentido de que ajudaria a traduzir o desconhecido, o misterioso, o invisvel.

    Mas o poeta romntico que exercer influncia fundamental nos simbolistas ser sem

    dvida nenhuma Edgar Allan Poe. Ao conceber complexas teorias sobre o verso, atravs da

    manipulao dos efeitos musicais e da criao de sugestivas atmosferas poticas, capazes de

    conduzir ao mundo do mistrio, o poeta norte-americano revolucionou a poesia romntica.

    Contudo, o que mais interessou os simbolistas na potica de Poe foram a busca da poesia pura,

    o culto da msica e da beleza e a crena na construo do poema, no controle quase que

    absoluto dos meios de expresso. Essas caractersticas causaram tanto fascnio sobre

    Baudelaire e Mallarm que ambos procuraram por todos os meios divulg-lo na Frana. O

    primeiro traduziu-lhe a obra; o segundo dedicou-lhe um soneto "O tmulo de Edgar Allan

    Poe".

    Mas por que tais caractersticas exercero tanta influencia nos dois principais poetas

    do Simbolismo francs? Em primeiro lugar, vale a pena discutir a questo da poesia pura. Num

    tempo voltado para o progresso, para o utilitarismo, Poe difundir a idia de que a poesia tem

    um fim em si mesma, e que ela no visa a nenhum fim moral, como vem expresso no seguinte

    fragmento:

    Tem-se suposto tcita e manifestamente, direta e indireta-mente, que o

    objetivo ltimo de toda a poesia a Verdade. Todo poema, diz-se, deveria inculcaruma moral, e por esta moral que deve ser julgado o mrito potico do trabalho. [...]

    Metemos em nossas cabeas que escrever simplesmente um poema pelo poema e

    confessar que tal foi o nosso desgnio seria confessar-nos radicalmente carentes de

    verdadeira dignidade e fora poticas: mas o simples fato que, se nos permitssemos

    olhar para dentro de nossas prprias almas, descobriramos imediatamente ali que,

    sob o sol, nem existe nem pode existir qualquer trabalho mais inteiramente

    dignificado, mais supremamente nobre do que este mesmo poema, este poema de per

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    se, este poema que um poema e nada mais, este poema escrito por ele mesmo. (O

    princpio potico. In: Poemas e ensaios. 2. ed. Rio de Janeiro, Globo, 1987. p. 87.).

    Se a poesia, segundo Poe, no visa traduzir valor moral algum, qual seria

    mais propriamente seu fim? Segundo ele, seria atingir a suprema beleza:

    na msica, talvez, que mais de perto a alma atinge o grande fim pelo qual

    luta, quando inspirada pelo Sentimento Potico a criao da suprema beleza.

    (Ibidem, p. 89.)

    A conquista da beleza, por sua vez, s se d atravs da msica, ou seja, atravs da

    poesia liberta de tudo que seja matria narrativa, de tudo que seja secundrio. Essa atrao pela

    arte musical ser ento retomada pelos simbolistas, que, como veremos adiante, buscaro fazer

    com que a linguagem potica se aproxime da linguagem vaga e imprecisa da msica.

    Por fim, o ltimo aspecto da teoria potica de Poe que interessar aos simbolistas dir

    respeito paradoxal inteno do poeta norte-americano de construir os poemas pelo controle

    da emoo. Paradoxal porque, como se sabe, os romnticos defendiam a arte espontnea,

    natural, que jorrasse do corao, a ponto de Lamartine, um dos expoentes mximos doRomantismo francs, dizer que os melhores poemas eram "puros soluos". Poe acreditava

    firme-mente que se deviam evitar as paixes do corao:

    A Aspirao Humana pela beleza suprema, a manifestao do Princpio

    sempre encontrada em uma exalante emoo da alma, completamente Independente

    daquela paixo que a embriaguez do Corao, ou daquela verdade que a

    satisfao da Razo. Porque a respeito da paixo, ai. sua tendncia antes para

    degradar que para elevar a Alma. (Ibidem, p. 105.).

    O desprezo da paixo faz com que Poe leve s ltimas conseqncias o sistemtico

    planejamento do poema. No ensaio "Filosofia da composio", por exemplo, ele nos mostra

    rigorosamente como concebeu seu famoso poema "O corvo", desde a escolha do tema, do

    metro, do refro, etc. Talvez por isso que Poe tenha causado tanta admirao entre os

    simbolistas. Seu romantismo sui generis, alm de conter certos caractersticos fundamentais do

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    Simbolismo como a sugesto do mistrio, o culto da musicalidade e da poesia pura , alm

    disso, evitou o exagero sentimental, o passionalismo.

    Com base no que vimos at agora, verifica-se que o Simbolismo aproveita do

    Romantismo algumas caractersticas fundamentais, como o senso do mistrio, o espiritualismo,

    mas rejeita o sentimentalismo, as manifestaes subjetivas exageradas e, sobretudo, as

    manifestaes poticas grandiloqentes. Devido a isso, o Simbolismo implicar uma revoluo

    potica em relao ao movimento romntico, na medida em que aprofundar alguns aspectos

    desse movimento e, por conseqncia, no cair nas armadilhas das emoes superficiais. Mas,

    para tanto, ser necessrio que reinvente a metfora potica, atravs da prtica do que se

    convencionou chamar de "smbolo".

    Uma revoluo potica

    A teoria das correspondncias

    Em sntese, eis as caractersticas simbolistas que alguns romnticos (e por vezes

    mesmo alguns parnasianos) anteciparam: a capacidade sugestiva, a musicalidade da expresso e

    o idealismo de origem platnica. Esta ltima, pedra de toque do Simbolismo, origina-se, como

    vimos, de Emma-nuel Swedenborg. Para o mstico sueco, tudo na natureza teria um sentido

    simblico e tudo manteria estreita correspondncia com o mundo celeste, como se poder

    verificar neste fragmento de sua obra:

    Todas as coisas que existem na natureza, desde o que h de menor ao que h

    de maior, so correspondncias. A razo para que sejam correspondncias reside no

    fato de que o mundo natural, com tudo o que contm, existe e subsiste graas ao

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    mundo espiritual, e ambos os mundos graas Divindade. (Du ciel et de l'enfer. Paris,

    E. Jung-Trenttel,1872.. pg. 64 )

    Esses princpios esotricos satisfizeram os romnticos devido sua ntima relao

    com os princpios cristos. Entre os simbolistas, porm, este espiritualismo, que se insurgiu

    contra os pressupostos materialistas e positivistas, circunscreveu-se aos limites da natureza

    terrena. A uma distino fundamental: enquanto o romntico sonhava em ascender a um

    paraso, o simbolista, embora tambm espiritualista, via de regra, fazia do mundo terminal a

    sua morada. Quando o poeta aoriano Roberto de Mesquita diz no poema "Universalidade II"

    que tudo animado por um ente invisvel:

    Enquanto se detm o vosso olhar

    tona dos aspectos, impotente,

    No mago de tudo, claramente,

    Eu descubro um esprito a cismar.

    (Almas cativas. Lisboa, tica, 1973. p. 30.).

    d a entender, contudo, que esse esprito est agregado s coisas e pertence ao plano

    de experincia do homem, que precisa desenvolver sua capacidade de vidncia para apreen-d-

    lo. Assim, enquanto o romntico deseja abandonar a Terra para encobrir Deus, o simbolista

    almeja encontrar a unidade do material e do espiritual aqui na Terra mesmo, de modo a

    recuperar uma tonalidade perdida.

    Essa temtica, o "evangelho das correspondncias", pois o ncleo da estticasimbolista. Ao desprezar o aparente, o visvel, o simbolista parte em busca do que se oculta

    atrs das aparncias, daquilo que constitui a essncia das coisas. Concebendo assim o mundo,

    Swedenborg descarta a idia de que os objetos do real tenham um sentido em si; na realidade,

    no passam eles de smbolos do mundo espiritual, da Divindade, como se pode ver na seguinte

    passagem:

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    Os animais da terra em geral correspondem s afeies; os que so dceis e

    teis, s afeies boas; os que so selvagens e inteis, s afeies ms. (Du ciel et de

    l'enfer, p. 67.)

    Cabe, portanto, ao homem decifrar os smbolos da realidade terrena, para que possa

    descobrir as "correspondncias" entre as coisas, a perfeita unidade entre tudo o que existe.

    Charles Baudelaire poetizou esse tema, com um soneto sintomaticamente intitulado

    "Correspondncias":

    A Natureza um templo onde vivos pilares

    Deixam s vezes sair confusas palavras;

    O homem a passa atravs das florestas de smbolos

    Que o observam com olhares familiares.

    Como os longos ecos que de longe se confundem

    Numa tenebrosa e profunda unidade,

    Vasta como a noite e a claridade,

    Os perfumes, as cores e os sons se correspondem.

    H perfumes frescos como carnes de crianas,

    Doces como os obos, verdes como as pradarias, E outros

    corrompidos, ricos e triunfantes,

    Tendo a expanso das coisas infinitas,

    Como o mbar, o almscar, o benjoim e o incenso,

    Que cantam os transportes do esprito e dos sentidos.

    (Les fleurs du mal, p. 13.).

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    A imagem inicial do templo bem significativa, no sentido de que simboliza um local

    sagrado, ponto de encontro e de integrao de todos os seres. O templo uma construo

    diferente das demais; sua funo a de unir o profano ao sagrado, ou mesmo de ser um sinalde uma realidade misteriosa, inacessvel. Na natureza tudo animado: as rvores transfiguram-

    se, assemelhando-se a pilares vivos, por onde, s vezes, escapam confusas palavras. Confusas,

    porque o homem que passa no as entende. Esse passante involuntrio o ser alienado, que

    no tem acesso realidade mgica; por isso, a linguagem da natureza soa a seus ouvidos como

    um conjunto de signos estranhos. Contudo, se para o homem a linguagem da natureza

    indecifrvel, o mesmo no se d com o mundo natural. As florestas de smbolos observam o

    homem "com olhares familiares", o que implica o reconhecimento amoroso do homem por

    parte da natureza, pois, no templo natural, tudo o que existe regido por uma harmonia

    universal, tudo se corresponde.

    Se os objetos do mundo sensvel se correspondem e se o mundo natural corresponde

    ao espiritual, de que precisa o homem para intuir tais relaes? A resposta a tal questo est

    nos tercetos do poema. Neles se fala das correspondncia e/ou fuso dos diferentes sentidos.

    Assim, o perfume que captado pelo olfato torna-se tctil como a carne fresca das crianas;

    tambm auditivo, lembrando o tom grave dos obos; e visual, porque remete ao verdor das

    pradarias. Ressalta-se, porm, que a fuso dos sentidos no se d em cadeia, numa seqnciatemporal; pelo contrario, realiza-se num s instante, como se o perfume fosse, a um s tempo,

    oloroso, tctil, auditivo e visual. Alm disso, vale a pena assinalar que o mundo espiritual

    tambm convocado, pois os perfumes despertam sensaes de corrupo, de riqueza e de

    triunfo.

    O primeiro terceto, portanto, faz referncias fuso das diferentes sensaes fsicas e

    das sensaes fsicas com as espirituais. Ora, Baudelaire deseja esta totalidade do "esprito e

    dos sentidos", visando a um estado ideal para o homem. Em outras palavras, somente poder

    ter acesso ao sentido das "confusas palavras" aquele que mostrar em si a unidade entre os

    sentidos e entre os sentidos e o esprito. O homem deveria, assim, alcanar a totalidade em seu

    exterior e interior, para poder participar do ritual no templo da natureza, depois de

    compreender e decifrar a esotrica linguagem que lhe oferecida.

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    O Poeta, um Vidente.

    A esse indivduo capaz de decifrar o enigma da natureza, o segredo das

    correspondncias, Baudelaire chama de "decifrador" e, dessa perspectiva, concebe um novo

    papel para o poeta:

    Sabemos que os smbolos s so obscuros de um modo relativo, ou seja,

    conforme a pureza, a boa vontade ou a clarividncia nativa das almas. Ora, o que

    um poeta (tomo esta palavra na acepo mais ampla) seno um tradutor, um

    decifrador? (OEuvres compltes. Paris, Gallimard, 1951. p. 1077.).

    Algo equivalente expressar Rimbaud, o discpulo de Baudelaire, em sua famosa Carta

    ao vidente":

    Eu quero dizer que preciso ser vidente, fazer-se vidente. O Poeta se faz

    vidente atravs de um longo, imenso e racional desregramento de todos os sentidos.

    Todas as formas de amor, de sofrimento, de loucura; ele procura a si prprio,

    extrai de si todos os venenos para guardar apenas as quintessncias. Inefvel

    tortura, contra a qual necessita de toda a f, de toda a fora sobre-humana, atravsda qual se torna, dentre todos, o grande enfermo, o grande criminoso, o grande

    mal-dito e o supremo Sbio! Pois atinge o desconhecido! (OEuvres compltes.

    Paris, Gallimard, 1951. p. 254-5.).

    Dentro do Simbolismo, portanto, a figura do poeta sofre uma alterao fundamental.

    Mais do que simples ser inspirado, como entre os romnticos, ele se torna agora um visionrio,

    que procura decifrar o sentido simblico do mundo, para, em seguida, revel-lo aos homenscomuns atravs da palavra potica. O portugus pr-simbolista Gomes Leal assim expressa

    essa idia do poeta visionrio em "O visionrio ou som e cor":

    Eu sou um visionrio, um sbio apedrejado,

    Passo a vida a fazer e a desfazer quimeras,

    Enquanto o mar produz o monstro azulejado

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    E Deus, em cima, faz as verdes Primaveras.

    Sobre o mundo onde estou encontro-me isolado,

    E erro como estrangeiro ou homem de outras eras,

    Talvez por um contrato irnico lavrado

    Que fiz e j no sei noutras sutis esferas.

    A espada da Teoria, o austero Pensamento,

    No mataram em mim o antigo sentimento,

    Embriagam-me o Sol e os cnticos do dia...

    E obedecendo ainda a meus velhos amores,

    Procuro em toda a parte a msica das cores,

    E nas tintas da flor achei a Melodia.

    (Apud MOISS, Massaud. A literatura portuguesa atravs dos textos, p. 301-2.).

    O mistrio, a sugesto, a evocao

    O princpio de que h um mistrio oculto sob as aparncias, o ponto de chegada para

    toda a especulao potica, ser caracterizado dessa maneira por Mallarm:

    A poesia a expresso, pela linguagem humana que retoma seu ritmo

    essencial, do sentido misterioso dos aspectos da existncia; ela doa assim

    autenticidade nossa vida na terra e constitui a nica tarefa espiritual. (La Vogue,

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    18 de abril de 1886. Apud MICHAUD, Guy. Message potique du Symbolisme.

    Paris, Nizet, 1945. p. 715.)

    isso que leva os poetas simbolistas a rejeitar o mundo dos fenmenos, mero

    apndice do da essncia, ou a utilizar o mundo dos fenmenos como um meio de chegar ao

    esprito, ao mistrio.

    Mas, afinal, qual seria o mistrio a que se referiam os simbolistas? Na realidade, o

    mistrio a designao de algo indecifrvel, fim ltimo da poesia que, dependendo do poeta,

    pode assumir diferentes caracterizaes. Num poeta como Camilo Pessanha, um estado de

    alma indefinvel, como vem expresso no poema "Crepuscular":

    H no ambiente um murmrio de queixume,

    De desejos de amor, d'ais comprimidos...

    Uma ternura esparsa de balidos,

    Sente-se esmorecer como um perfume.

    As madressilvas murcham nos silvados

    E o aroma que exalam pelo espao,

    Tem delquios de gozo e de cansao,

    Nervosos, femininos, delicados.

    Sentem-se espasmos, agonias d'ave,

    Inapreensveis, mnimas, serenas...

    Tenho entre as mos as tuas mos pequenas,

    O meu olhar no teu olhar suave.

    As tuas mos to brancas d'anemia...Os teus olhos to meigos de tristeza...

    este enlanguescer da natureza,

    Este vago sofrer do fim do dia.

    (Clepsidra e outros poemas. Lisboa, tica, 1965. p. 213-4.)

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    O sentimento do poeta provocado por uma dor espiritual desconhecida, suscitada

    pelo crepsculo que se manifesta no s no ser humano, mas tambm em toda a atmosfera

    ambiente.Em Cruz e Sousa, o mistrio representado por entidades vagas, que inspiram a

    criao do poema:

    Formas alvas, brancas, Formas claras

    De luares, de neve, de neblinas!...

    Formas vagas, fluidas, cristalinas...

    Incensos dos turbulos das aras...

    Formas do Amor, constelarmente puras,

    De Virgens e de Santas vaporosas...

    Brilhos errantes, mdidas frescuras

    E dolncias de lrios e de rosas...

    (Antfona. In: Poesia. Rio de Janeiro, Agir, 1975. p. 16-8.)

    Em Verlaine, o sentimento provocado pela audio de um instrumento musical

    que o leva a compor um poema em que a sonoridade to importante que se torna quase

    impossvel traduzi-lo:

    Les sanglots longs

    Des violonsDe l'automne

    Blessent mon caeur

    D'une langueur

    Monotonne.

    Tout suffocant Et

    blme, quand Sonne

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    l'heure, Je me

    souviens Des jours

    anciens Et je pleure;

    Et je m'en vais Au

    vent mauvais Qui

    m'emporte De,

    del, Pareil Ia

    Feuille morte.

    (Cano do outono, OEuvres potiques compltes, p. 72-3.)

    [Os soluos/Longos dos violinos/Do outono/Ferem meu corao/De um

    langor/Montono//Todo sufocado/E plido, quando/Soa a hora,/Eu melembro/Dos dias antigos/E eu choro ;//E eu vou/Ao vento mau/Que me

    carrega/ Daqui, dali/ Parecido com/ Uma folha morta.]

    Por fim, o mistrio, em casos mais extremos, como na poesia complexa

    de Mallarm, representado por uma idia, um problema metafsico relativo ao

    vazio da existncia, esterilidade criativa, etc. o que vem expresso nos versos

    de "Brisa marinha":

    A carne triste, ai!, e eu li todos os livros.

    Fugir! para o alm fugir! Sinto que os pssaros so brios

    De estar no meio da espuma desconhecida e dos cus!

    Nada, nem os velhos jardins refletidos pelos olhos

    No reter este corao que no mar se umedece

    Noites! nem a claridade deserta de minha lmpada

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    Sobre o papel vazio que a brancura protege.

    (OEuvres compltes, p. 38.)

    Neste caso, o sentimento vago, indefinido, refere-se ao anseio de absoluto

    (representado pelo desejo de voar como os pssaros para o desconhecido) e esterilidade da

    criao potica (representada pela negatividade, pela imagem da lmpada deserta e pela

    brancura do papel).

    Mas seja qual for a imagem do fim ltimo da poesia simbolista, o seu mistrio, parece

    que, nos mais diferentes poetas, se traduz como algo que no pode ser expresso por si mesmo,sob pena de perder sua contingncia de mistrio. A conseqncia disso que esse algo nunca

    dever ser dito ou revelado, mas apenas sugerido, evocado. o que Mallarm expe no

    seguinte fragmento:

    Creio [...] que, no fundo, os jovens esto mais prximos do ideal potico

    do que os parnasianos, que ainda tratam seus temas maneira dos velhos filsofos

    e dos velhos retricos, apresentando os objetos diretamente. Penso ser preciso, ao

    contrrio, que haja somente aluso. A contemplao dos objetos, a imagem alando

    vo dos sonhos por eles mesmos suscitados, so o canto; j os parnasianos tomam

    a coisa e mostram-na inteiramente: com isso, carecem de mistrio; tiram dos

    espritos essa alegria deliciosa de acreditar que esto criando. Nomear um objeto

    suprimir trs quartos do prazer do poema, que consiste em ir adivinhando pouco a

    pouco: sugerir, eis o sonho. a perfeita utilizao desse mistrio que constitui o

    smbolo: evocar pouco a pouco um objeto pra mostrar um estado de alma, ou

    inversamente, escolher um objeto e extrair dele um estado de alma, atravs de uma

    srie de adivinhas.

    {OEuvres compltes, p. 868.)

  • 8/6/2019 +lvaro Cardoso Gomes - O Simbolismo

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    Fazer poesia implica, assim, aludir, sugerir e no mostrar os objetos diretamentecomo era o costume dos parnasianos, que eram pobres em mistrio. Com isso, Mallarm d a

    entender que a pobreza da poesia sem mistrio corres-ponde a uma limitao do trabalho do

    leitor que, num poema altamente sugestivo, cria a iluso de que tambm participa do processo

    criativo. Para os simbolistas, portanto, fazer poesia implica a tentativa de expressar a sensao

    fugidia, que merece necessariamente uma forma de expresso condizente com ela, tambm

    vaga, indecisa. por isso que eles provocam uma revoluo na linguagem potica. Traduzir as

    sensaes absolutamente originais, recuperar a essncia do potico, recusar o anedtico, a

    descrio dos objetos, a clareza, os estados de esprito perfeitamente identificveis, as paixes

    excessivas e as formas banais do lirismo amoroso foram os traos marcantes da gerao

    simbolista.

    A capacidade de sugerir, por sua vez, est diretamente ligada capacidade de evocar,

    ou seja, os seres e objetos do mundo sensvel, como constituem apenas a vestimenta da idia

    ou do mistrio, no interessam poesia seno como elementos que servem para trazer mente

    a imagem do mistrio ou da idia. Dessa perspectiva, os seres e objetos devem permanecer distncia, de maneira que se extraia deles a essncia, algo abstrato, velado, que no seria jamais

    enunciado, sob pena de perder sua condio de coisa misteriosa. Esse tipo de evocao bem

    evidente num poeta como Antnio Nobre:

    poentes verde-mar! pr-do-sol de azeite! longe de trovoadas! cu dos

    ventos suis! Vaca no ar, a mugir crepsculos de leite E roxos cardeais e amarelos e

    azuis!

    (Poentes de Frana. In S. Lisboa, Tavares

    Martins, 1968. p. 107.)

    Os dados concretos da realidade, o poente, a trovoada, o cu comparecem no poema

    no para compor uma paisagem, mas para suscitar determinado estado de esprito, ou mesmo

    para auxiliar na composio das sensaes visuais e auditivas, que criam imagens poticas

    alucinadas.

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    O smbolo

    Da sugesto e da evocao chegamos finalmente ao smbolo que constitui o ncleo

    da linguagem potica idealizada pelos simbolistas. O smbolo, na sua denominao mais

    simples, pode ser confundido com o signo, com uma coisa que representa a outra. Por

    exemplo: a palavra "mesa", que designa o objeto mesa; o sinal vermelho que significa "pare".

    Mas neste caso a relao entre uma coisa e outra sempre arbitrria; o objeto mesa, por

    exemplo, em outras lnguas, representado por um conjunto diferente de sinais (por exemplo,

    table, em ingls). Para evitar a confuso entre signo e smbolo, o lingista Saussure os

    distinguiu com base na arbitrariedade do primeiro e na motivao (ou no arbitrariedade) dosegundo:

    O smbolo tem como caracterstica no ser jamais completamente arbitrrio; ele

    no est vazio, existe um rudimento de vnculo natural entre o significante e o

    significado. O smbolo da justia, a balana, no poderia ser substitudo por um

    objeto qualquer, um carro por exemplo. (Curso de lingstica geral. So Paulo,

    Cultrix, 1969. p. 82.)

    A base na distino entre smbolo e signo reside, portanto, na motivao e, porconseqncia, na conotao. O signo, por no possuir motivao alguma,

    essencialmente denotativo ("mesa" representa mesa e nada mais); o smbolo, sendo

    motivado, caracteriza-se pela conotao ("cruz", por exemplo, se refere ao objeto

    de madeira cruz e religio que inspirou, com o sacrifcio de Cristo).

    Contudo, ainda no a esse tipo de smbolo que os simbolistas se referiam, na

    medida em que unvoco, na medida em que permite uma decifrao muito fcil,

    direta. Para o crtico Edmundo Wilson, o smbolo muito mais do que isso:

    Os smbolos do Simbolismo tm de ser definidos de maneira algo diversa do

    sentido dos smbolos comuns o sentido de que a Cruz o smbolo da

    Cristandade ou as Estrelas e as Listras o smbolo dos Estados Unidos. Esse

    simbolismo difere inclusive de um simbolismo como o de Dante. Pois o tipo familiar

    do simbolismo convencional e fixo; o simbolismo da Divina Comdia

    convencional, lgico, preciso. Mas os smbolos da escola simbolista so, via de

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    regra, arbitrariamente escolhidos pelo poeta para representar suas idias; so uma

    espcie de disfarce de tais idias. (O castelo de Axel, p. 21.)

    Concebendo o smbolo como um "disfarce das idias", os simbolistas pretendiam

    encontrar as perfeitas correspondncias entre o mundo sensvel e o mundo abstrato. Desse

    modo, o smbolo deixa de ser apenas uma palavra ou uma coisa significando outra; mais que

    isso, uma palavra ou um conjunto de palavras que serve para evocar um estado de esprito

    indefinido e cuja traduo jamais imediata.

    Em muitos casos, o smbolo elaborado com vistas a imitar a continuidade e a

    infinitude de movimentos que existem na alma de um ser. O poema no procura, atravs de

    palavras isoladas, representar indiretamente uma outra coisa; pelo contrrio, as palavras nada

    valem quando vistas isoladamente na realidade, elas se aglutinam, formando uma rede

    complexa de sons e significados, como acontece neste poema de Verlaine:

    Vossa alma uma paisagem escolhida

    Que as mscaras e as bergamscaras vo encantando

    Tocando o alade e danando e quase

    Tristes sob seus mascaramentos fantsticos,

    Cantando tudo no modo menor

    O amor vencedor e a vida oportuna,

    Parecem no acreditar em sua felicidade

    E sua cano se mescla ao luar,

    Ao calmo luar triste e belo,

    Que faz sonhar os pssaros nas rvores

    E soluar de xtase os chafarizes,Os grandes chafarizes esbeltos no meio dos mrmores.

    (Luar, OEuvres potiques compltes, p. 107.)

    O sentimento que o poeta quer expressar no poema um sentimento agridoce, misto

    de ternura e sofrimento frente hora difusa, banhada pelo claro da lua. Mas o sentimento no

    jamais dito diretamente. A expresso do estado de alma sugerida pelo uso da comparao:

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    "vossa alma uma paisagem", ou seja, para falar dos sentimentos e sensaes, o poeta descreve

    uma paisagem noturna. As danas, o alade, o luar, os pssaros, os chafarizes, objetos do

    mundo concreto, evocados no poema, no tm valor simblico em si. Esses objetos somenteso evocados para que a emoo do poeta (que no explicita) se prolongue ao mximo. Por

    outro lado, eles tm s vezes o peso equivalente ao da sonoridade que tambm muito

    importante no original francs, o verso "qui fait rver les oiseaux dans les arbres" chama a

    ateno pelo acmulo de sibilantes.

    Ao compor a paisagem simbolicamente, o poeta provoca no leitor um sentimento

    difuso, de triste nostalgia, sem que, em nenhum momento, diga o que lhe vai dentro da alma.

    A vantagem desse processo que a sensao, tornada difusa, tem a capacidade de durar por

    mais tempo, no instante em que exige do leitor um envolvimento maior com o poema.

    O Simbolismo e a msica

    A busca do impreciso, do vago, do indizvel fez com que os simbolistas procurassem

    renovar essencialmente a linguagem potica. Com o Simbolismo, a poesia torna-se mais

    fechada, s vezes at incomunicvel. Nos casos mais extremos, ela se transforma num espaoem que o poeta trabalha com a sonoridade pura, como acontece nestes versos de Eugnio de

    Castro:

    Na messe, que enlourece, estremece a quermesse. O

    sol, celestial girassol, esmorece... E as cantilenas de serenos

    sons amenos Fogem fluidas, fluindo fina flor dos fenos...

    As estrelas em seus halos Brilham com brilhos sinistros... Cornamusas e

    crotalos, Ctolas, ctaras, sistros,

    Soam suaves, sonolentos,

    Sonolentos e suaves,

    Em suaves,

    Suaves, lentos lamentos

    De acentos

    Graves,

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    Suaves...

    (Oaristos, obras poticas. Lisboa, Parceria A. M. Pereira, 1968. v. I, p. 58.)

    Ou mesmo nestes, de Cruz e Sousa:

    Vozes veladas, veludosas vozes,

    Volpia dos violes, vozes veladas,

    Vagam nos velhos vrtices velozes Dos ventos, vivos, vos, vulcanizadas.

    (Violes que choram, Poesia, p. 38.)

    O acmulo da vibrante "v" junto sibilante e a alternncia das vogais "a" e "o"

    criam a iluso de uma continuidade sonora, de maneira que ao leitor interessa mais o som que

    o sentido. O poeta imita o som de um violo ou de um conjunto de notas musicais, como se o

    poema devesse se dirigir mais aos ouvidos que mente. Conseqentemente, o poema atinge

    um grau mximo de subjetividade, no no sentido de que o poema precisa provocar, como na

    msica, em cada ouvinte/leitor, sensaes diferentes, a partir dos estmulos sonoros.

    possvel dizer, portanto, que o Simbolismo foi um movimento literrio em que os

    poetas sonharam em elevar a poesia condio de msica. Mas por que tal aproximao entre

    artes aparentemente to distintas? A msica, na realidade, a mais subjetiva das artes, porque

    no visa jamais representar imitativamente os objetos; a msica visa sempre atingir o esprito.

    Da sua universalidade. Explica-se assim a grande obsesso dos simbolistas com a msica,

    tanto na referncia explcita a instrumentos musicais a flauta, o violino, o violoncelo, a viola

    como tambm na apropriao de recursos tipicamente musicais.

    Contudo, preciso refletir sobre o seguinte: assim como o smbolo, em que houve variedade de interpretaes quanto a seu conceito, de modo idntico, as relaes entre a

    poesia.e a msica mereceram diferentes interpretaes. Reduzindo o problema a seus

    denominadores mais comuns, distinguem-se duas linhas fundamentais dentro do move-mento

    simbolista. A primeira delas, explorada por Verlaine e seguidores, a que revela uma

    aproximao entre poesia e msica de modo mais literal, como foi possvel verificar tanto no

    poema de Eugnio de Castro quanto no de Cruz e Sousa. Os fonemas imitam sons musicais; a

    agrupao de fonemas, frases musicais; o poema todo, uma melodia. Para tanto, alm de

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    recorrerem ao uso da aliterao, do eco, da assonncia, etc, os poetas dessa corrente simbolista

    fazem da repetio um recurso estilstico dos mais eficazes.

    o caso de Camilo Pessanha, que, em "Ao longe os barcos de

    flores", imita os movimentos de uma melodia, com a repetio de um

    mesmo tema e de suas variaes:

    S, incessante, um som de flauta chora, Viva, grcil, na escurido tranqila,

    Perdida voz que de entre as mais se exila,

    Festes de som dissimulando a hora.

    Na orgia, ao longe, que em clares cintila E os lbios, branca, docarmim desflora... S, incessante, um som de flauta chora, Viva,

    grcil, na escurido tranqila.

    E a orquestra? E os beijos? Tudo a noite, fora, Cauta, detm. S modulada

    trila A flauta flbil... Quem h-de remi-la? Quem sabe a dor que sem razo

    deplora?

    S, incessante, um som de flauta chora...

    (Clepsidra e outros poemas, p. 239-40.)

    Essa relao entre a poesia e a msica, ou seja, a busca da pura sonoridade, tornou-se

    quase um lugar-comum entre os simbolistas, o que levou um poeta como Mallarm a pensar

    numa relao mais complexa entre ambos. Desprezando a sonoridade pura, ele procurou

    organizar os fonemas como as notas numa pauta, dispondo as palavras de acordo com a lgica

    das sensaes ou da idia motriz de todo o poema. Com isso, conseguiu maior liberdade para

    os teremos que se libertam dos nexos lgicos e sintticos. Em seu experimento mais radical,

    "Um lance de dados jamais eliminar o acaso", o poeta encontra similaridade entre a estrutura

    do poema e uma sinfonia. Dispondo o verso "Un coup de ds n'abolira jamais l'hasard" em

    fragmentos ao longo de todo o texto, o poeta o concebe como um ncleo, ou um tema

    musical, de onde surgiro as variaes, palavras soltas, que se dispem na folha de modo

    idntico aos segmentos musicais, como no fragmento abaixo, em que a variao grfica, a

    disposio das palavras e o espao em branco adquirem tambm sentido:

  • 8/6/2019 +lvaro Cardoso Gomes - O Simbolismo

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    SOIT

    que

    1'Abime blanchi talefurieux

    sons une inclinaison

    plane dsesprment

    d'aile

    (OEuvres compltes, p. 35.)

    [Seja/que/o Abismo/embranquecido/se revele/furioso/sob uma inclinao/plana

    desesperadamente/ de asa]

    A busca do novo entre os simbolistas

    Toda essa discusso em torno das correspondncias, da sugesto, da evocao, do

    smbolo e da musicalidade visou explicitar o carter especfico da poesia simbolista. Conclui-se

    disso tudo que o Simbolismo representou um esforo, nos fins do sculo XIX, de recuperar a

    essncia da poesia, perdida ao longo dos tempos. Os simbolistas assim se tornam inimigos da

    revelao direta dos sentimentos, da declamao, dos contedos filosficos. A revelao dos

    sentimentos e sensaes privadas, ntimas, que se tornam universais graas s

    correspondncias, d-se somente atravs do smbolo, que, como vimos, assume diferentes

    aspectos.

    Ora, esse mascaramento da expresso confere poesia simbolista uma dupla

    dimenso, se a pensarmos da perspectiva no do criador mas da do leitor. De um lado, como o

    poeta procura traduzir estados indefinveis da alma, mutveis a cada instante, os smbolos

    correspondentes devem ser totalmente diferentes daqueles utilizados pela tradio potica; os

    smbolos caracterizar-se-o, s vezes, pela absoluta arbitrariedade, pela sua novidade, o que

    implicar o hermetismo e a conseqente dificuldade de o leitor penetrar num mundo fechado,

    s acessvel ao iniciado. De outro lado, independente do hermetismo, os poemas, por

    recusarem os nexos mais claros, por tentarem registrar instantneos de durao, ou do caos do

    mundo interior, tornam-se apenas o espao onde se movimentam imagens soltas, que se

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    agregam no por nexos lgicos, mas por nexos pura-mente emotivos. A conseqncia disso

    que essa poesia abolir o discurso lgico e exigir um leitor atento melodia das palavras, que

    dever se entregar a um ritmo semelhante ao da msica.

    Cronologia e expanso

    Anos de grandes polmicas

    Antes de o Simbolismo difundir-se pela Europa e pela Amrica, passou por fases de

    conflito, em que se travaram grandes polmicas, at poder-se firmar definitivamente como

    movimento literrio respeitvel. Cronologicamente o Simbolismo se inicia, como j vimos,

    comAs flores do mal, de Charles Baudelaire, em 1857, atinge o auge em 1886, com as polmicas

    travadas entre Jean Moras e Ren Ghil, e consolida-se em 1891, quando Mallarm

    homenageado num jantar a que comparecem as figuras literrias mais importantes da poca.

    O aparecimento deAs flores do mal, divisor de guas da poesia francesa, seguido da

    publicao de Parnasse contemporain, em 1866. Apesar de o ttulo se referir ao "Parnaso", a

    coletnea traz entre seus colaboradores poetas que antecipam novidades simbolistas:

    Baudelaire com "Madrigal triste", Verlaine com "Mon rve familier" [Meu sonho familiar] eMallarm com "Les fentres" [As janelas].:

    Em 1881, o crtico Paul Bourget publica um artigo intitulado "Thorie de la

    dcadence" e utiliza-se pela primeira vez do termo "decadncia" para designar a "situao da

    sociedade que produz um grande nmero de indivduos incapazes de achar seu prprio lugar

    na faina do mundo". Em 1882, Verlaine publica "Art potique", poema que faz a apologia da

    musicalidade e da sugesto em poesia:

    A Msica antes de tudo,

    E para isso prefere o mpar

    Mais vago e solvel no ar,

    Sem nada nele que pese ou que pouse.

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    preciso tambm que no vs Escolher tuas palavras sem algum desprezo:

    No h nada mais caro do que a cano cinzenta Onde o Indeciso ao Preciso

    se une.

    (OEuvres potiques completes, p. 326.)

    Verlaine tambm publica, em 1884, Poetes maudits, ensaios que divulgam os poetas

    Tristan Corbire e Mallarm. Por sua vez J.-K. Huysmans publica A rebours [s avessas],

    romance potico em que esboa o perfil do decadente, Floressas Des Esseintes, que

    influenciar toda uma gerao. Neste mesmo ano, aparece na Blgica a revista La Wallonie, que

    divulga os principais escritores do Simbolismo desse pas.

    J estabelecido como "moda", o movimento passa a sofrer crticas da imprensa

    especializada. Dentre elas, talvez a mais importante tenha sido a pardia Les dliquescences d'ador

    Floupette (1885), de autoria de Henri Beauclair e Gabriel Vicaire. Poetas medocres, tiveram,

    porm, o mrito de imaginar um poeta decadente, imitador de Veraine e Mallarm, que no s

    foi comentado em artigos, como tambm chegou a criar escola. No poema a seguir possvel

    detectar a pardia dos temas e do estilo de alguns dos principais poetas da poca:

    Mas o iniciado apaixonado pela boa cano azul e cinza, de um cinza to azul e

    de um azul to cinza, to vagamente obscura e no entanto to clara, o melfluo

    decadente cuja ntima perversidade, como uma virgem enterrada na lama confina

    ao milagre, aquele saber bem, supe-se, onde refrescar o ouro imaculado de suas

    Dolncias. (Apud CORNELL, Kenneth. The symbolist movement. New Haven, Yale

    University Press, 1951. p. 37.)

    No mesmo ano, Paul Bourde, inspirado pela stira de Vicaire e Beauclair, publica

    "Les dcadents", utilizando-se do termo "decadentes" para nomear os poetas dessa gerao.

    Em resposta a Paul Bourde, Jean Moras, contestando-o, prope a designao "simbolistas"

    em vez de "decadentes", para evitar, entre outras coisas, que se confundissem os poetas com

    simples neurticos ou excntricos.

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    Em 1886, as polmicas em torno do Simbolismo chegam ao auge. O poeta Ren Ghil

    publica o seu Tratado do verbo, em que prope para a poesia a curiosa relao entre os sons dos

    fonemas, o som de instrumentos musicais, as cores e os sentimentos, criando a subescolainstrumenta-lista. Observe-se o seguinte exemplo:

    Monotonia,

    dvida,

    simplicidade,

    Instinto

    de ser,

    de viver.

    (Trait du verbe;tats sucessifs. Textos apresentados, anotados e

    comentados por Tiziana Gorupi. Paris, Nizet, 1978. p. 172.)

    Ainda em 1886, o crtico Anatole Baju polemiza em jornais, negando que os

    decadentes cheguem a formar uma escola propriamente dita. Mas o ensaio mais

    importante que surge nesse ano "Le symbolisme", de Jean Moras, em que pela primeira

    vez se procura determinar a essncia do smbolo, da linguagem simblica:

    Inimiga do ensino, da declamao, da falsa sensibilidade, da descrio objetiva, a

    poesia simbolista procura: revestir a Idia de uma forma sensvel que no seja um fim em si

    mesma, mas que, ao servir para exprimir a Idia, a ela permanea submissa. A Idia, por sua

    vez, no se deve se ver privada das suntuosas amarras das analogias exteriores; pois o carter

    essencial da arte simblica consiste em nunca conceber a Idia em si. (Le Figaro. Apud

    MITCHEL, Bonner. Les manifestes littraires de Ia belle poque. 2. ed. Paris, Seghers, 1966. p. 27.)

    Em 1888, logo aps a efervescncia dos anos anteriores, notam-se os primeiros sinaisde desgaste do movimento. O crtico Brunetire escreve uma srie de artigos comentando a

    notria influncia de Baudelaire nos novos poetas. Jean Moras, que tanto batalhara pela

    instaurao do Simbolismo, publica o panfleto Les premires armes du Symbo-lisme, em que reavalia

    os princpios do Simbolismo, chegando, inclusive, a descrer de "muitas das coisas que pregava

    trs anos antes". Em 1891, os simbolistas se renem, para homenagear Mallarm. Se, de um

    lado, o encontro serviu para referendar o triunfo definitivo do movimento, do outro, algumas

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    deseres apontam para a exausto da escola simbolista. Neste mesmo ano, Jean Moras, seu

    maior batalhador, declara encerrado o Simbolismo e prope a fundao da "Escola Romana".

    O fortalecimento do Simbolismo em seu bero, a Frana

    Enquanto se travavam as batalhas literrias, as polemicas, os bate-bocas atravs dos

    peridicos, os grandes escritores travavam uma batalha um pouco mais silenciosa com o texto.

    Durante a vigncia do Simbolismo na Frana, destacaram-se os seguintes poetas: Baudelaire,Rimbaud, Verlaine e Mallarm. O primeiro, como j vimos, abalou seus contemporneos com

    a poesia grotesca, sombria de As flores do mal, e, desse modo, rompeu com a tradio potica

    francesa. Rimbaud, seu discpulo, o criador de uma poesia alucinada, feita a partir do

    "desregramento de todos os sentidos" e voltada para a inveno de uma nova linguagem que

    buscasse integrar os diversos tipos de sensaes, como no famoso poema "Vogais":

    A negro, E branco, I vermelho, U verde, O azul: vogais, Eu falarei um dia de

    suas florescncias latentes: A, negro espartilho veludo das moscas ruidosas Que

    voltejam ao redor de maus cheiros cruis,

    Golfos de sombra; E, canduras dos vapores e das tendas, Lanas de geleiras

    orgulhosas, reis brancos, arrepios de

    umbelas;

    I, prpuras, sangue cuspido, riso de lbios belos Em clera ou bebedeiras

    penitentes;

    U, ciclos, vibraes divinas dos mares viridentes, Paz dos pastos semeados deanimais, paz das rugas Que a alquimia imprime a grandes frontes eruditas;

    O, supremo Claro pleno de inslitas estridncias, Silncios atravessados dos

    Mundos e dos Anjos O, mega, raio violeta de Seus Olhos!

    (OEuvres compltes, p. 104.)

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    Verlaine, diferentemente, o poeta dos meios-tons, dos sentimentos vagos, difusos,

    expressos numa linguagem sutil, altamente melodiosa. Nele, tudo sugesto, evocao de uma

    nostalgia indefinida, misto de tristeza e preguia sensual. Mais intelectualizado do que ambos,Mallarm levar s ltimas conseqncias a explorao da linguagem simblica, criando uma

    poesia hermtica, nem sempre accessvel ao leitor. Preocupado em atingir a essncia do

    potico, o poeta s vezes chega ao Nada, smbolo da esterilidade potica. No toa que

    Mallarm se constituir num dos mais importantes precursores da poesia moderna.

    No plano da prosa, vale a pena referir os nomes de J.-K. Huysmans e Villiers de

    L'Isle-Adam. O primeiro o autor de s avessas, romance que pe por terra o modelo da

    prosa narrativa dos realistas e naturalistas, com a inveno da tpica figura do decadente e de

    uma linguagem plstica sugestiva. O segundo escreveu os Contos cruis (1883), dando impulso

    ao potico na narrativa curta. Tambm digno de nota seu drama esttico Axel (1890), em que

    o autor expe a filosofia decadentista da inutilidade da ao.

    O Simbolismo no resto da Europa e nas Amricas

    O Simbolismo inicia-se na Itlia por volta de 1889, com o romance potico Il piacere,

    de Gabriele D'Annunzio. Seu autor tenta resgatar a poesia italiana do Classicismo, atravs da

    importao de novidades decadentistas, criando um mundo aristocrtico, onde se manifestam

    sensaes mrbidas e sensuais. Herdeiros de D'Annunzio, mas j dentro do sculo XX, os

    "crepuscolari" (Sergio Corazzini, Guido Gozzano, etc.) expressam, em tons verlainianos, a dor

    de viver e a melancolia frente existncia.

    Na Espanha, verifica-se uma revoluo espiritual e potica que se funde renovao

    poltica, no protesto da gerao de 1898. Revelando, atravs da temtica simbolista, a

    decadncia da ptria, Unamuno e Valle-Incln viriam, de um lado, manifestar a angstia frente

    morte e, de outro, um misticismo anarquista, sob influncia dos decadentistas franceses.

    Acima destes dois est Antonio Machado, uma das maiores vozes lricas do pr-modernismo

    espanhol.

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    O Simbolismo acontece na Rssia somente no incio do sculo XX e termina

    abruptamente com a Revoluo Comunista de 1917. Sua figura mais importante Alexander

    Blok, cuja simbologia mgica, transformando-se mais tarde em arte revolucionria, nos d aexata medida do caminho percorrido pelos simbolistas russos.

    A rigor, no houve um movimento simbolista perfeitamente caracterizado na

    Inglaterra. Por volta de 1884, surge o grupo dos "pr-rafaelistas", formado por Rossetti,

    Ruskin e Morris, que se apegaram ao misticismo medieval, ao visionarismo utpico e ao culto

    da beleza. Fortemente influenciado pelo Decadentismo francs, Oscar Wilde escreve uma obra

    em que valoriza, sobretudo, o trabalho artstico em detrimento da existncia, considerada vazia,

    sem sentido. Sua obra mais famosa o romance The picture of Dorian Gray[O retrato de Dorian

    Gray] (1891), em que o autor cria uma personagem decadente, inspirada com certeza no Des

    Esseintes, de Huysmans.

    A figura mais representativa do Simbolismo alemo Stefan George, seguidor da

    sutileza musical de Verlaine. Responsvel pela divulgao do Simbolismo na Alemanha,

    escrever uma poesia rica de nuanas. J no incio do Modernismo, surge Rilke, autor de Elegias

    de Duno (1923), que explora as relaes ntimas entre o sonho e o sentimento de morte. Na

    ustria, que sempre sofreu forte influncia alem, salienta-se Hofmannsthal, cuja imensa obra

    se prende tentativa de recuperar o passado, criando um clima de decadncia e morte. Tambm nos Estados Unidos no houve um movimento simbolista, embora

    tenhamos visto que Poe foi um dos precursores da esttica. Quando muito, pode-se falar na

    gerao dos "transcendentalistas", formada por escritores como Emerson, Melville,

    Hawthorne, que receberam notria influncia de Swedenborg. Nos pases da Amrica Latina,

    diferentemente, o Simbolismo criou razes e se expandiu. Sua figura mais representativa talvez

    seja o nicaragense Rubn Daro. Alm dele, h outros nomes dignos de nota: o cubano Jos

    Mart, o argentino Leopoldo Lugones, o uruguaio Herrera y Reissig e a chilena Gabriela

    Mistral.

  • 8/6/2019 +lvaro Cardoso Gomes - O Simbolismo

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    O Simbolismo nos pases de lngua portuguesa

    O Simbolismo foi introduzido em Portugal em 1890, com Eugnio de Castro.

    Voltando de uma viagem Frana, o ento jovem poeta procurou difundir as novidades

    simbolistas francesas em seu pas com sua obra Oaristos. Mais importante que os poemas o

    prefcio onde o autor prope os rumos da nova esttica. Preocupado sobretudo com os

    aspectos formais do movimento, Eugnio de Castro acabou por enveredar por discusses

    sobre a rima, o ritmo e o vocabulrio. Para comprovar sua teoria, os poemas exploram

    exausto os principais recursos da esttica simbolista, tais como a aliterao, as palavras

    exticas, as rimas estranhas, etc, com isso criando uma poesia absolutamente artificial. No

    toa que, no final de sua carreira, Eugnio de Castro evoluiria para um no disfarado

    parnasianismo.

    Mais autntico que Eugnio de Castro o sensvel poeta de S (1892), Antnio

    Nobre. Herdando o modo coloquial de falar dos romnticos, mas com os ouvidos atentos para

    a msica das coisas, o poeta liberta a poesia portuguesa do artificialismo, da

    convencionalidade. Volitado quase que exclusivamente para a terra natal, para o passado,

    Antnio Nobre canta os anos da infncia perdida, a beleza dos campos, a pureza das figuras

    femininas, das "virgens" que passam "ao sol poente". Sua obra potica exalta em cores fortes

    as sensaes relativas a um tempo de totalidade, s recupervel pela palavra evocativa, pelo

    verso musical, sinestsico.

    Mas de todos os poetas simbolistas do perodo o mais importante foi mesmo Camilo

    Pessanha, que, com sua nica obra potica Clepsidra(1920), chegou at a influenciar Fernando

    Pessoa. Isso porque, ao contrrio de Eugnio de Castro, por exemplo, soube como levar sltimas conseqncias a revoluo simbolista em Portugal. Assim, de um lado, Pessanha o

    legtimo herdeiro de Verlaine, com seus versos musicais que exploram as ntimas relaes entre

    as sonoridades e os estados de alma mais ntimos, como vem expresso em seu poema

    "Violoncelo":

    Chorai, arcadas

    Do violoncelo!

    Convulsionadas

  • 8/6/2019 +lvaro Cardoso Gomes - O Simbolismo

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    Pontes aladas

    De pesadelo...

    De que esvoaam,

    Brancos, os arcos...

    Por baixo passam,

    Se despedaam,

    No rio, os barcos.

    Fundas soluam

    Caudais de choro...

    Que runas (ouam)!

    Se se debruam,

    Que sorvedouro...

    Trmulos astros...

    Solides lacustres...

    Lemes e mastros...E os alabastros

    Dos balastres!

    Urnas quebradas!

    Blocos de gelo...

    Chorai, arcadas,

    Despedaadas,Do violoncelo.

    (Clepsidra e outros poemas, p. 237-8.)

    Como se pode verificar, o poema equivale ao violoncelo, no sentido de

    que cada estrofe, ou melhor, cada imagem (o choro, o rio, os caudais

    de choro, o lago, o gelo, etc.) sugere os diversos movimentos de uma

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    melodia que, por sua vez, evocam diferentes estados de alma. Mas, do

    outro lado, Camilo Pessanha tambm o poeta que expressa o sofre-

    mento frente brevidade da vida, a incapacidade do homem de captar oque quer que seja da realidade circundante:

    Imagens que passais pela retina Dos meus

    olhos, por que no vos fixais? Que

    passais como a gua cristalina Por uma

    fonte para nunca mais!...

    Ou para o lago escuro onde termina

    Vosso curso, silente de juncais, E o

    vago medo angustioso domina,

    Por que ides sem mim, no me levais?

    Sem vs o que so os meus olhos abertos?

    O espelho intil, meus olhos pagos!

    Aridez de sucessivos desertos...

    Fica sequer, sombra das minhas mos,

    Flexo casual de meus dedos incertos, E

    Estranha sombra em movimentos vos.

    (Clepsidra e outros poemas, p. 207-8. )

    Poeta refinado, manifestando em sua poesia o sentimento de uma dor csmica,

    Camilo Pessanha soube dar como ningum intensa fora palavra potica, explorada em todas

    as suas nuanas.

    Quanto ao Simbolismo brasileiro, antes de tudo, precisamos refletir sobre um

    problema que, em termos gerais, afetou a expanso desse movimento por aqui (como certa-

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    mente deve ter tambm afetado nos pases da Amrica Lati-na). Acontece que o Simbolismo

    foi uma esttica altamente refinada, oriunda dos pases industrializados e frios. Tanto assim

    que seus membros mais ilustres no s fizeram a apologia do artificial em arte, como tambmelegeram o Outono (de preferncia) e o Inverno como as estaes preferidas para expressar os

    estados de alma lnguidos, melanclicos. Como ento que o Simbolismo havia de se fixar

    num pas ainda agrcola e tropical?

    Com efeito, no toa que, apesar de seus muitos poetas, o Simbolismo brasileiro

    instalou-se timidamente aqui e teve curta durao. Parece mesmo que o vago, o indeciso, os

    estados imprecisos de alma, as evocaes sutis de entidades misteriosas, no coadunavam

    muito bem com o esplendor da terra tropical, com o sol a pino, com a paisagem recortada

    nitidamente no horizonte. Talvez por isso mesmo que o poeta simbolista brasileiro mais

    importante, Cruz e Sousa, tenha nascido no sul do pas, mais precisa-mente em Santa Catarina,

    regio fria, que sofreu grande influncia europia. Filho de escravos libertos, criado pelo antigo

    amo, o poeta levou uma vida extremamente atribulada e curta (1862-1898). Atormentado por

    dvidas, ainda viu a mulher morrer tuberculosa. Apesar disso tudo, num espao restrito de

    tempo, criou uma obra que evolui das pesquisas formais de Broqueis para a expresso do

    sentimento profundo de dor nos ltimos sonetos:

    Almas ansiosas, trmulas, inquietas,

    Fugitivas abelhas delicadas Das colmias

    de luz das alvoradas, Almas de

    melanclicos poetas,

    Que dor fatal e que emoes secretas

    Vos tornam sempre assim desconsoladas,

    Na pungncia de todas as espadas,

    Na dolncia de todos os ascetas?!

    Nessa esfera em que andais, sempre indecisas,

    Que tormento cruel vos nirvaniza,

    Que agonias titnicas so essas?!

  • 8/6/2019 +lvaro Cardoso Gomes - O Simbolismo

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    Por que no vindes, almas imprevistas,

    Para a misso das lmpidas conquistas

    E das augustas, imortais Promessas?!

    (Almas indecisas. Poesia, p. 75.)

    Mas o que marcou de maneira definitiva a poesia de Cruz e Sousa, fazendo com que

    ele se transformasse no mais representativo poeta simbolista brasileiro, foi a mescla de altos

    anseios espirituais ("as virgens vaporosas") com uma forte sensualidade (presente numa

    imagem como "tinhoro lascivo"). Essa mescla representar uma adaptao do estilo, da

    temtica do Simbolismo europeu s condies da realidade brasileira. O curioso contraste entre

    a alta espiritualidade e a forte sensualidade nos versos de Cruz e Sousa responsvel pela

    novidade desse poeta que, dessa maneira, criou um simbolismo todo seu, atento s pulsaes

    da natureza tropical e quem sabe mesmo s da prpria raa.

    Ainda importantes dentro do Simbolismo brasileiro so Alphonsus de

    Guimaraens (pseudnimo de Afonso Henriques da Costa Guimares), Augusto dos Anjos

    e Pedro Kilkerry. O primeiro deles procurou instalar ou mesmo transferir o Simbolismo

    europeu para a realidade brasileira, o que fica bem patente com seu livro Pauvre lire, total-mente escrito em francs e nos versos de poemas como "Primeira dor de Nossa Senhora",

    em que a alta espiritualidade, os anseios religiosos lhe do um cunho eminente-mente

    universal:

    Em teu louvor, Senhora, estes meus versos

    E a minha Alma aos teus ps para cantar-te:

    E os meus olhos mortais, em dor imersos,

    Para seguir-te o vulto em toda a parte.

    (Apud MURICY, Andrade, sel., org. e int. Panorama do

    movimento simbolista brasileiro. Braslia, Conselho Federal

    de Cultura/INL, 1973. 2 v., p. 441-2.)

    Poeta de fina sensibilidade, falando sempre em surdina, Alphonsus de Guimaraens,

    mais do que Cruz e Sousa, conseguiu transplantar de maneira bastante evidente o Simbolismo

  • 8/6/2019 +lvaro Cardoso Gomes - O Simbolismo

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    para as terras brasileiras. Mas por isso mesmo que sua poesia perde em tenso para a do

    autor de Broqueis;monocrdica, cai num espiritualismo extremado, de que "Ismlia", seu mais

    conhecido poema, o melhor exemplo. Augusto dos Anjos e Pedro Kilkerry, por sua vez, criam um simbolismo todo

    especial, j nos limites da modernidade. O primeiro mistura princpios deterministas,

    evolucionistas com as tendncias espiritualistas da poca e acaba por montar uma obra

    sincrtica, que chama a ateno s vezes pelo vocabulrio esdrxulo, mais prprio das cincias

    exatas:

    Eu, filho do carbono e do amonaco,

    Monstro de escurido e rutilncia,

    Sofro, desde a epignese da infncia,

    A influncia m dos signos do zodaco.

    (Psicologia de um vencido. Apud MOISS, Massaud. A literatura

    brasileira atravs dos textos. 16. ed. So Paulo, Cultrix, 1991. p. 312.)

    Utilizados de forma irnica, os vocbulos "carbono", "amonaco" e "epignese"

    servem para denunciar a falibilidade da cincia frente ao destino miservel do homem.

    J Kilkerry escreveu muito pouco, mas seus estranhos versos prenunciam a vinda do

    Modernismo, com suas bruscas rupturas sintticas.

    Concluindo, podemos dizer que se o Simbolismo no teve tanta importncia no

    Brasil como o Romantismo, por exemplo, pelo menos serviu para atenuar o impacto da

    instalao do Parnasianismo entre ns e mesmo para tornar mais malevel, mais expressiva a

    obra de poetas como Olavo Bilac e Raimundo Correia. No bastasse isso, o Simbolismo

    tambm teve uma influncia expressiva nos poetas da gerao modernista, como Tasso da

    Silveira, Ceclia Meireles, Manuel Bandeira e Augusto Frederico Schmidt. Em Ceclia Meireles,

    fica patente a herana simbolista no seu gosto pela msica, pelos smbolos, pela politizao de

    uma atmosfera rarefeita, que faz lembrar um Verlaine, por exemplo. J Bandeira, na primeira

    fase de sua carreira, mostra muita afinidade com certa paisagem outonia ou mesmo com a

    expresso de estados de esprito indefinidos, tpicos do Simbolismo.

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    ndice de autores simbolistas

    ANJOS, Augusto dos (1884-1914). Poeta simbolista brasileiro, autor de Eu(1912).

    BAJU, Anatole. Crtico francs, ardente defensor do Decadentismo. Autor de

    L'cole dcadente(1887).

    BAUDELAIRE, Charles (1821-1867). O introdutor da poesia simbolista na Frana

    e um dos mais importantes poetas da modernidade. Escreveu, entre outras obras, Les fleurs

    du mal(1857), Les paradis artificieis(1860), etc.

    BEAUCLAIR, Henri (1860-1900). Co-autor da mistificao Les dliquescences d'adorFloupette(1885).

    BLOK, Alexander Alexandrovitch (1880-1921). O mais importante simbolista

    russo, autor de Versos da bela dama(1905), Poesias russas(1915), etc.

    BOURGET, Paul (1852-1935). Ensasta francs da poca simbolista, autor de

    Essais de psychologie contemporaine(1883/1885).

    BRUNETIRE, Ferdinand (1849-1906). Um dos mais ferozes crticos do

    Simbolismo e, sobretudo, de Baudelaire, autor de volution de Ia posie lyrique(1894).

    CASTRO, Eugnio de (1869-1944). Poeta portugus, responsvel pela introduo

    do Simbolismo em Portugal, com a obra Oaristos(1890).

    CORAZZINI, Sergio (1887-1907). Simbolista italiano, pertencente gerao dos

    "crepuscolari" e autor de L'amaro clice[O clice amargo] (1905).

    CORBIRE, Tristan (1845-1875). Poeta decadente francs, autor de Les amours

    jaunes[Os amores amarelos] (1873).

    CRUZ E SOUSA, Joo da (1862-1898). O mais importante poeta simbolista

    brasileiro, autor deMissal(1893), Broqueis(1893) e ltimos sonetos(1905).

    D'ANNUNZIO, Gabriele (pseudnimo de Gaetano Rapagnetta) (1863-1938). O

    mais importante escritor do Simbolismo italiano, autor de II piacere (1889), // triunfo de Ia

    morte(1894), etc.

    DARO, Rubn (1867-1916). Poeta simbolista nicaragense, autor deAzul(1888).

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    EMERSON, Ralph Waldo (1803-1882). Poeta e pensador norte-americano, autor

    de Essays(1841).

    GEORGE, Stefan (1868-1933). Simbolista alemo, autor de Algabal (1890/1892),

    O stimo anel(1907), etc.

    GHIL, Ren (1862-1925). Poeta simbolista francs, autor de Trait du verbe(1886).

    GOZZANO, Guido (1883-1916). Simbolista italiano, tambm pertencente

    gerao dos "crepuscolari", autor de La via dei refugio (1906).

    GUIMARAENS, Alphonsus de (pseudnimo de Afonso Henriques da Costa

    Guimares) (1870-1921). Simbolista brasileiro, autor de Setenrio das dores de Nossa Senhora

    (1899), Kyriale(1902), etc.

    HAWTHORNE, Nathaniel (1804-1864). Transcendentalista americano, autor de

    The scarlet letter(1850), The house of seven gables[A casa dos sete patamares] (1851), etc.

    HERRERA Y REISSIG, Jlio (1875-1910). Poeta simbolista uruguaio, autor de

    Los pianos crepusculares(1910).

    HOFMANNSTHAL, Hugo von (1874-1929). Poeta e dramaturgo austraco, autor

    de O cavaleiro e a rosa(1911).

    HUYSMANS, Joris-Karl (1848-1907). Romancista francs, autor de A rebours

    (1884), L-Bas[Alm] (1891), etc.

    KILKERRY, Pedro Milito (1885-1917). Simbolista brasileiro, cuja obra esparsa

    foi reunida por Augusto de Campos em Reviso de Kilkerry(1970).

    LUGONES, Leopoldo (1874-1938). Simbolista argentino, autor de Lunario

    sentimental(1909).

    MAETERLINCK, Maurice (1862-1949). Poeta e dramaturgo belga, autor de Plleas

    et Mlisande(1892), L'oiseau bleu(1909), etc.

    MALLARM, Stphane (1842-1898). Um dos mais importantes poetas

    simbolistas, precursor das modernas tendncias poticas. Escreveu L'aprs-midi d'un faune[A

    sesta de um fauno] (1897), etc.

    MART, Jos (1853-1895). Simbolista cubano, autor de Versos sencillos [Versos

    sinceros] (1891), etc.

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    MELVILLE, Herman (1819-1891). Romancista americano, pertencente gerao

    dos transcendentalistas. EscreveuMoby Dick (1851).

    MESQUITA, Roberto de (1871-1923). Poeta simbolista aoriano, autor de Almas

    cativas(1931).

    MISTRAL, Gabriela (pseudnimo de Lucila Godoy) (1889-1957). Poeta simbolista

    chilena, autora de Desolacin(1922).

    MORAS, Jean (pseudnimo de Joannis Papadiamantopoulos) (1856-1910). Poeta

    simbolista grego, radicado na Frana, um dos mais importantes divulgadores do moviento.

    Escreveu Les certes(1884).

    MORRIS, William (1834-1896). Poeta pr-rafaelita ingls, autor de Defense ofGuenever and other poems(1858).

    NOBRE, Antnio (1867-1900). Poeta simbolista portugus, autor de S(1892).

    PESSANHA, Camilo d'Almeida (1867-1926). O mais importante poeta simbolista

    de lngua portuguesa. Escreveu Clepsidra(1920).

    RILKE, Rainer Maria (1875-1926). Poeta simbolista alemo, autor de Sonetos a

    Orfeu(1923), Elegias de Duno (1923), etc.

    RIMBAUD, Arthur (1854-1891). Poeta simbolista francs, autor de Une saison enenfer(1873), Les illuminations(1886).

    RODENBACH, Georges (1855-1898). Poeta e romancista do Simbolismo belga,

    autor de Bruges-la-Morte(1892).

    ROSSETTI, Dante Gabriel (1828-1882). Poeta pr-rafaelita ingls, autor de Ballads

    and sonnets(1881).

    RUSKIN, John (1819-1900). Esteta ingls ligado aos pr-rafaelitas, autor de The

    seven lamps of architecture(1849).

    UNAMUNO, Miguel de (1864-1937). Poeta, romancista e filsofo espanhol, autor

    de Del sentimiento trgico de Ia vida(1913).

    VALLE-INCLN, Ramn Maria del (1869-1936). Poeta e romancista do

    Simbolismo espanhol, autor de Tirano Banderas(1926).

    VERHAEREN, mile (1855-1916). Simbolista belga, autor de Les moines [Os

    monges] (1886).

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    VERLAINE, Paul (1844-1896). Um dos mais importantes poetas do Simbolismo

    francs, autor de Ftes galantes(1869), La bonne chanson(1870), Romance sans parole(1874), etc.

    VICAIRE, Gabriel (1849-1900). Poeta simbolista francs, co-autor da mistificao

    Les dliquescences d'ador Floupette.

    VILLIERS DE L'ISLE-ADAM, Philippe Auguste (1840-1889). Prosador

    simbolista francs e dramaturgo, autor de Contes cruels(1883) eAxel(1890).

    WILDE, Oscar (1856-1900). Dramaturgo, romancista e poeta ingls, autor de The

    picture of Dorian Gray(1891), Salom(1894), etc.

    YEATS, William Butler (1865-1939). Poeta simbolista irlands, autor de The Wind

    among the reeds[O vento entre os canios] (1899), etc.

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    Vocabulrio crtico

    Aliterao:recurso estilstico que se caracteriza pela repetio de uma consoante no

    incio de cada palavra de um mesmo verso, como, por exemplo, neste poema de Eugnio de

    Castro: "Fogem fluidas, fluindo fina flor dos fenos" (Oaristos).

    Analogia: no sentido comum, refere-se a alguma coisa que tem semelhana com

    outra. Entre os simbolistas, contudo, refere-se ao princpio das correspondncias.

    Correspondncias: termo que se origina da filosofia mstica de Emmanuel

    Swedenborg (1688-1772), autor de De coelo et de inferno (1758). Segundo o escritor sueco, aschamadas "correspondncias" seriam as relaes existentes entre as coisas do mundo natural

    e as do mundo espiritual: "assim, cada coisa que, no Mundo natural, existe em

    conformidade com uma coisa espiritual, chamada Correspondente". Essa concepo de

    que tudo que existe sobre a Terra corresponde a algo espiritual servir de base para a

    esttica simbolista, a partir mesmo de Baudelaire que comps seu famoso soneto intitulado '

    'Correspondncias , tendo como ponto de partida a teoria esotrica de Swedenborg.

    Crepsculo:momento do dia preferido pelos simbolistas, devido a seu carter difuso.

    Dandy:palavra de origem inglesa que designa o decadente, o homem refinado do

    fim do sculo, que se compraz em cultivar prazeres extravagantes, em distanciar-se da

    vulgaridade do mundo burgus.

    Decadncia:termo com que se designam vrios estgios da histria da humanidade

    (a do Imprio Romano, por exemplo), marcados pela anarquia moral e social. Mais

    especificamente, designa o estado da sociedade europia nos fins do sculo XIX.

    Decadente:designa o artista tpico do fim do sculo, que se caracteriza pelos nervos

    superexcitados, pela passividade frente vida ativa e pelo culto de prazeres refinados, de

    sensaes mrbidas, doentias. So exemplares tpicos do decadente as personagens Des

    Esseintes, do romanceA rebours, de J.-K. Huysmans e Dorian Gray, do romance O retrato de

    Dorian Gray, de Oscar Wilde.

    Decadentismo:denominao de movimento literrio que antecede ao Simbolismo e

    que tem como caractersticas bsicas a criao de um mundo artificial, onde vivem seres que

    se entregam a prazeres mrbidos.

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    Decifrador: termo atravs do qual Baudelaire designava o poeta: "ora o que um

    poeta [...] seno um decifrador" (L'art romantique, p. 267), no sentido de que cabia a ele

    "decifrar" o sentido das correspondncias.

    Desregramento:o termo surge de modo especfico na famosa "Carta ao vidente", que

    Rimbaud escreveu ao amigo Paul Demeny, em 1871, e refere-se provocada anarquizao

    dos sentidos, para se atingir a vidncia, a capacidade de interpretar os smbolos da realidade

    ("O Poeta se faz vidente atravs de um longo, imenso e racional desregramento de todos os

    sentidos").

    Determinismo: doutrina influenciada pelo Positivismo de Auguste Comte e

    desenvolvida por Hippolyte Taine. Baseado em princpios histricos, sociolgicos e

    antropolgicos, o Determinismo se dispunha a conhecer o homem atravs dos

    determinantes fixos da raa, do meio e do momento histrico. Assim concebida, essa

    doutrina exerceu grande influncia na poca, sobretudo no chamado romance

    realista/naturalista.

    Eco:recurso estilstico que tem como princpio a repetio de slabas no final das

    palavras de um mesmo verso. Por exemplo: "na messe que enlourece, estremece a

    quermesse" (Eugnio de Castro, Oaristos).Escola Romana: subescola criada por Jean Moras, que propunha um retorno aos

    valores poticos greco-latinos.

    Evangelho das correspondncias: metfora com que se designava o conjunto de

    preceitos das chamadas "correspondncias".

    Evocao: de evocar, chamar. Entre os simbolistas, diz respeito capacidade de

    suscitar um estado de esprito atravs da referncia a um determinado objeto ("Evocar

    pouco a pouco um objeto, para liberar dele um estado de esprito", observa Mallarm numaentrevista concedida a Jules Huret.

    Fim do sculo: final do sculo XIX. Devido ao carter peculiar desse perodo de

    tempo, alm de seu sentido histrico, tem tambm um sentido mais propriamente social e

    esttico.

    Idealismo: