o resurso às tic nas da

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Escola Superior de Educação de Castelo Branco Mestrado em Educação Especial - Domínio Cognitivo e Motor Tecnologias de Informação e Comunicação aplicadas às Necessidades Educativas Especiais O recurso às TIC nas Dificuldades de Aprendizagem - Estudo de Caso - Discentes Mariline Ferreira Susana Santos Docente Prof. Mestre Maria do Rosário Quelhas Castelo Branco Junho de 2012

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O recurso às TIC nas DA

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Page 1: O resurso às TIC nas DA

Escola Superior de Educação de Castelo Branco

Mestrado em Educação Especial - Domínio Cognitivo e Motor

Tecnologias de Informação e Comunicação aplicadas às Necessidades Educativas Especiais

O recurso às TIC nas Dificuldades de Aprendizagem

- Estudo de Caso -

Discentes

Mariline Ferreira

Susana Santos

Docente

Prof. Mestre Maria do Rosário Quelhas

Castelo Branco

Junho de 2012

Page 2: O resurso às TIC nas DA

“… as novas tecnologias oferecem, como instrumentos de educação de crianças e

adolescentes, uma oportunidade sem precedentes de responder com toda a qualidade

necessária a uma procura cada vez mais intensa e diversificada. As possibilidades e

vantagens que apresentam no campo pedagógico são consideráveis.”

Jacques Delors, (1996, p.164)

Page 3: O resurso às TIC nas DA

i

Lista de Abreviaturas

DA – Dificuldades de Aprendizagem

NEE – Necessidades Educativas Especiais

TIC – Tecnologias de Informação e Comunicação

Page 4: O resurso às TIC nas DA

ii

Índice Geral

I. Introdução ................................................................................................................. 1

II. Revisão da Literatura ................................................................................................ 2

2.1. Breve caracterização de alunos com DA ............................................................. 2

2.2. Problemas de natureza cognitiva ......................................................................... 2

2.2.1. Atenção ....................................................................................................... 2

2.1.2. Memória ...................................................................................................... 3

2.1.3. Resolução de Problemas .............................................................................. 4

2.1.4. Linguagem .................................................................................................. 4

2.2. Problemas Percetivos.......................................................................................... 5

2.3. Problemas Psicomotores ..................................................................................... 5

2.4. Personalidade e aspetos do desenvolvimento social e afetivo .............................. 6

2.4.1. Características da personalidade .................................................................. 6

2.4.2. Desenvolvimento social ............................................................................... 6

3. Dificuldades específicas da aprendizagem da leitura ................................................. 7

3.1. Conceito de Leitura – o que é ler?....................................................................... 7

3.2. Pré-requisitos para ler ......................................................................................... 8

3.3. O que mais condiciona a aprendizagem da leitura ......................................... 10

3.4. Leitura: Processos e dificuldades na sua aquisição ............................................ 11

4. O recurso às TIC nas DA ........................................................................................ 13

5. Metodologia ............................................................................................................ 16

5.1. Caracterização do Caso .................................................................................... 16

5.2. Apresentação e caracterização da Tecnologia de Apoio .................................... 18

5.3.Procedimentos ................................................................................................... 21

5.4.Resultados ......................................................................................................... 21

5.5.Pistas para o futuro ............................................................................................ 22

III. Conclusão ............................................................................................................. 23

IV. Bibliografia ........................................................................................................... 24

Page 5: O resurso às TIC nas DA

ii

Índice de figuras

Figura 1 – Apresentação da atividade …………………………………………….……18

Figura 2 – Apresentação da opção Leio ………………………………….…………… 18

Figura 3 – Apresentação da opção Aprendo ………………………………………… 19

Figura 4 – Apresentação da opção Crio ……………………………………………… 19

Figura 5 – Apresentação da opção Jogo …………………………………………...…. 20

Figura 6 – Apresentação da opção Instruções …………………….……………….… 20

Page 6: O resurso às TIC nas DA

1

I. Introdução

O presente trabalho foi realizado no âmbito da Unidade Curricular TIC aplicadas às

Necessidades Educativas Especiais (NEE), inserida no Mestrado em Educação Especial

– Domínio Cognitivo e Motor, e tem como objetivo perceber de que forma as TIC

podem ser um instrumento de apoio na aquisição de conhecimentos em crianças com

Dificuldades de Aprendizagem (DA), mais especificamente em crianças com

dificuldades de aprendizagem na leitura.

Sendo conhecida a importância da leitura no desenvolvimento global do indivíduo e

sabendo que cabe à escola elevar os níveis de literacia, promover a leitura assumindo-a

como fator de desenvolvimento individual e de progresso nacional, criar um ambiente

social favorável à leitura, inventariar e valorizar práticas pedagógicas e outras atividades

que estimulem o prazer de ler tendo em conta as características individuais de cada

aluno, e ainda o fato de vivermos numa sociedade cada vez mais tecnológica, onde uma

vasta gama de tecnologias de apoio nos circundam, torna-se importante perceber de que

forma estas tecnologias de apoio podem ajudar na aquisição de conhecimentos em

crianças com Necessidades Educativas Especiais (NEE), em geral, e particularmente em

crianças com dificuldades de aprendizagem na leitura.

Deste modo, o trabalho encontra-se dividido em duas partes. Uma primeira parte de

revisão da literatura, onde se faz uma breve caracterização das crianças com DA,

seguindo-se de uma definição do conceito de leitura e dos condicionamentos à sua

aprendizagem e, finalmente, aborda-se o recurso às TIC como instrumento de apoio à

sua aquisição. E uma segunda parte, onde se procede ao estudo de caso da aplicação de

uma tecnologia de apoio a uma criança com DA na leitura, caracterizando-se,

inicialmente, a criança em questão, seguindo-se da caracterização da tecnologia de

apoio e, posteriormente, à apresentação dos resultados.

A aprendizagem da leitura nas crianças do Primeiro Ciclo, em especial das crianças que

apresentam DA nesta área, é um tema bastante pertinente e importante, pois quando não

adquirida poderá mesmo constituir a principal causa de insucesso escolar. Com a

aplicação de uma tecnologia de apoio adequada, a criança com DA poderá, aos poucos,

ir suprimindo as suas dificuldades, podendo mesmo superá-las, tornando-se, assim,

evidente que cabe aos professores diversificarem os materiais didáticos na sua prática

pedagógica de modo a estimular ao máximo as capacidades dos seus alunos.

Page 7: O resurso às TIC nas DA

2

II. Revisão da Literatura

2.1. Breve caracterização de alunos com DA

Falar ou escrever sobre «dificuldades de aprendizagem» é um desafio. É, como o

próprio nome indica, uma dificuldade. É um campo fértil em conceções unidimen-

sionais e em divisões conceptuais entre os diferentes profissionais que o integram,

nomeadamente, médicos, psicólogos e professores (Almeida, 1994). Para Bartoli (1990,

cit. in Dias, 1996), as dificuldades de aprendizagem não dizem unicamente respeito à

pessoa da criança, mas devem ser encaradas numa perspetiva ecológica, integrando

fatores relativos à escola, família e comunidade. O mesmo autor acrescenta ainda que,

na ecologia de cada estudante, se podem considerar vários sistemas e subsistemas em

interação: o biológico, o cultural, o sistema familiar, escolar e comunitário. O resultado

do conjunto destas interações constitui o todo.

A criança com DA caracteriza-se por uma inteligência normal (QI ≥ 80), por uma

adequada acuidade sensorial, quer auditiva, quer visual, por um ajustamento

socioemocional e por um perfil motor adequado. As suas principais dificuldades estão

relacionadas com os processos simbólicos: fala, leitura, escrita, aritmética, etc.,

independentemente de lhes terem sido proporcionadas condições adequadas de

desenvolvimento (saúde, envolvimento familiar estável, oportunidades socioculturais e

educacionais, etc.) (Fonseca, 1984).

As DA surgem ao longo do processo de escolaridade, podendo ter diferentes contornos,

consoante as variáveis aluno, professor, escola e família. Existe, no entanto, um

conjunto de características, isto é, um perfil psicoeducacional, que é comum a muitos

dos alunos com DA (Bautista, 1993), envolvendo problemas de natureza cognitiva,

afetiva, percetiva, de psicomotricidade e personalidade.

2.2. Problemas de natureza cognitiva

2.2.1. Atenção

Na escola, as crianças encontram uma série de exigências que lhes são colocadas pela

leitura, escrita, ortografia, aritmética, performance motora, comportamento social e

Page 8: O resurso às TIC nas DA

3

aprendizagem conceptual. Para todas as tarefas de aprendizagem, existe um processo

cognitivo básico essencial, a atenção. Apesar da sua relevância, definir atenção não é

fácil, uma vez que se trata de uma operação cognitiva e, como tal, não é diretamente

observável. Os professores podem, apenas, observar o desempenho dos alunos e fazer

inferências se o aluno está ou não atento. Esta é a razão pela qual os psicólogos

cognitivistas se referem à atenção como um comportamento atento ou desatento (Kirk &

Chalfant, 1984). «A desatenção pode ser motivada por carência (inatenção) ou por

excesso (superatenção)» (Fonseca, 1984, p.303). Também na da sala de aula podem

ocorrer diversos estímulos que tendem a desorganizar a criança, dos quais: «permanente

barulho exterior, proximidade de recreios e ruas agitadas, várias classes a funcionar

ao mesmo tempo, salas carregadas de estímulos nas paredes, ausência de rotinas, etc.,»

(Idem, pp.303-304).

2.1.2. Memória

As dificuldades de memorização podem apresentar diferentes sintomas, dependendo

quer da natureza e severidade das dificuldades da memória, quer da tarefa que está a ser

aprendida. Se a criança tem dificuldades no reconhecimento ou na recordação auditiva,

visual ou informação tátil, o seu desempenho será afetado em todas as tarefas em que

seja necessária a intervenção dessas áreas (Fonseca, 1984). As dificuldades em realizar

tarefas que envolvam a memória são vistas como uma inadequada utilização de

estratégias de memorização e não como um défice no próprio processo de memória.

Este ponto de vista caracteriza a criança com DA como aquela que não adquiriu as

aptidões necessárias para ter sucesso no processo de aprendizagem e, como tal, não

entende a forma de aplicar as competências que aprendeu anteriormente (Torgesen,

1984, cit. in Ferreira, 2001).

A memória tem sido definida e abordada de diferentes formas, dependendo dos

propósitos de quem faz o estudo. São reconhecidos três processos básicos e

interrelacionados: «a memória de curto termo (imediata), a memória de médio termo e

a memória de longo termo» (Fonseca, 1984, p.319).

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2.1.3. Resolução de Problemas

O pensamento envolve juízo, comparação, cálculo, raciocínio, avaliação, pensamento

crítico, resolução de problemas e tomada de decisão. Todas estas componentes do

processo de pensamento requerem a capacidade de organizar conceitos e de reestruturar

partes do conhecimento, de forma a atingir um objetivo ou a chegar a um novo nível de

compreensão. Assim, torna-se de grande importância os alunos serem capazes de

relacionar conceitos, de organizar e reorganizar esses conceitos, de modo a adquirirem

níveis mais complexos e abstratos de significação (Fonseca, 1996).

Muitos alunos com DA não conseguem sentir o desenvolvimento de situações

problemáticas, não identificando o problema. Deste modo, é importante que os alunos

com DA sejam ajudados no desenvolvimento de estratégias para a resolução de

problemas, de forma a torná-los capazes de responder, com a descoberta de ideias

únicas e novos conhecimentos, aos problemas com que se confrontam diariamente

(Correia, 2002).

2.1.4. Linguagem

Um dos aspetos mais importantes no desenvolvimento das crianças é aprender a

comunicar para compreender aquilo que os outros dizem e para expressar as suas ideias

verbalmente.

Alunos com DA podem ter dificuldades ou alterações num dos vários sistemas de

linguagem. Dado que as dificuldades de aprendizagem podem ser devidas a um grupo

heterogéneo de desordens, os alunos podem apresentar alterações num ou em vários

sistemas da linguagem.

A linguagem pode ser dividida de diferentes formas. Uma das divisões mais aceites é a

que considera a divisão em linguagem recetiva (refere-se à compreensão do que se ouve

ou lê) e linguagem expressiva (refere-se àquilo que se diz ou que se escreve). Uma outra

divisão comummente aceite é aquela que divide a linguagem nos seus diversos

sistemas: fonologia, sintaxe, morfologia, semântica e pragmática (Hallahan, Kauffman

& Lloyd, 1999, cit. in Ferreira, 2001).

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2.2. Problemas Percetivos

A criança com DA, em muitos casos, apresenta uma deficiência percetiva, por isso tem

dificuldades em formar perceções tão refinadas e organizadas como as que são

necessárias para aprender a ler.

Percebe mal a informação sensorial, subvaloriza detalhes importantes, ou

então supervaloriza pormenores que alteram a noção do todo. Compreende

aspectos do todo, mas não consegue compreender as relações das partes que

o constituem. Ouve significações, mas perde-se quando toma atenção à

estrutura da palavra. (…) Distrai-se com sinais, sons e ideias que são

interessantes e significantes para si, mas irrelevantes para o objecto

específico das tarefas ou situações do momento (Fonseca, 1984, p.306).

Deste modo, não é de estranhar que as crianças com DA sejam distraídas, inquietas,

excitadas, ruidosas, … e que o aprender numa classe regular se torne para elas bastante

complicado.

Entre os problemas percetivos mais estudados nas crianças com DA destacam-se os

visuais e os auditivos. As perturbações percetivo-visuais dificultam à criança a

compreensão de muitos dos materiais de aprendizagem. As suas dificuldades percetivo-

auditivas comprometem-lhe o apuramento de significações nas explicações e instruções

do professor (Fonseca, 1984).

2.3. Problemas Psicomotores

A criança com DA acusa algumas anomalias na organização motora de base

(tonicidade, postura, equilibração e locomoção) e, consequentemente, na organização

psicomotora (lateralização, direcionalidade, imagem do corpo, estruturação espacio-

temporal e praxias). Segundo Fonseca (1984, p. 345) “este potencial psicomotor

interfere com as aprendizagens escolares, não só porque demonstram uma insuficiente

organização perceptivo-motora, como evocam alterações relevantes no processamento

cortical da informação”.

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6

2.4. Personalidade e aspetos do desenvolvimento social e afetivo

O enfoque do ato educativo é centrado no desenvolvimento das competências

académicas, por isso, é lógico que grande parte da investigação realizada sobre alunos

com DA se relacione com características cognitivas, tais como, a memória, a

inteligência, a linguagem e a atenção. Recentemente, têm sido investigadas outras áreas

do desenvolvimento destes alunos, entre as quais os aspetos relacionados com os traços

da personalidade e com o desenvolvimento sócio-afetivo.

2.4.1. Características da personalidade

As variáveis da personalidade, também denominadas por variáveis emocionais, incluem

o auto-conceito, o temperamento, a ansiedade, a depressão/suicídio e o isolamento

(Bender, 1995).

A conduta social das crianças com DA surge com dificuldades de ajustamento à

realidade e com inúmeros problemas de comunicação. Sentimentos de exclusão, de

rejeição, de perseguição, de abandono, de hostilidade e de insucesso são características

facilmente detetadas nestas crianças, assim como os manifestos de ansiedade,

agressividade, tensão, negativismos, … (Fonseca, 1984).

Nos casos acima referidos, os dispositivos mais eficazes de mudança de comportamento

são o encorajamento, a estimulação da iniciativa e o reforço positivo. Isto porque “sem

uma atmosfera afectiva, lúdica e relacional, a interacção e a comunicação não se

desenvolvem favoravelmente” (Fonseca, 1984, p.318).

2.4.2. Desenvolvimento social

Um dos primeiros indicadores para a construção de uma escola inclusiva foi a premissa

de que a colocação das crianças com DA em classes regulares desenvolveria os skills

sociais através da observação e interação com modelos adequados (Bender, 1995). Esta

assunção resultou em numerosas áreas de estudo, incluindo a aceitação social, a

competência social e a caracterização familiar de alunos com DA.

Não se sabe ao certo a razão pela qual alunos com DA revelam mais problemas de

ajustamento social do que os outros alunos. Talvez o seu nível social baixo e os

problemas de ajustamento social tenham sido modificados devido ao seu fraco

rendimento escolar, à falta de compreensão social, ao seu comportamento inapropriado,

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7

à deficiente motivação social, à inabilidade para resistir à pressão dos pares, ou a

ambientes sociais indesejáveis (Hallahan, Kauffman & Lloyd, 1999, cit. in Ferreira,

2001).

3. Dificuldades específicas da aprendizagem da leitura

3.1. Conceito de Leitura – o que é ler?

A leitura é um bem essencial, tem uma importância fundamental na vida das pessoas e

na formação de cada cidadão uma vez que proporciona a obtenção de informação e

saber em relação a qualquer contexto e área do conhecimento, sendo também uma fonte

de formação cultural, assim como uma valiosa fonte de entretenimento.

Etimologicamente, ler deriva do latim “lego/legere”, que significa recolher, apanhar,

escolher, captar com os olhos. Com a invenção da imprensa, a leitura tornou-se uma

atividade extremamente importante para o homem civilizado.

Segundo Morais (1997) a leitura envolve, em primeiro lugar, a identificação de

símbolos impressos (grafemas) e o relacionamento destes com os seus respetivos sons.

O primeiro passo no processo de aprendizagem da leitura será a diferenciação visual,

por parte da criança, de cada letra impressa, percebendo e relacionando o símbolo

gráfico com o seu correspondente sonoro. No contacto com as palavras, a criança deve

então diferenciar visualmente cada letra que forma a palavra, associando-a ao seu

respetivo som, para a formação de uma unidade linguística significativa. Este processo

inicial da leitura chama-se descodificação. No entanto, para ler não basta apenas a

descodificação dos símbolos, é necessária a compreensão e a análise crítica do texto

lido. A compreensão é simplesmente o relacionamento das palavras descodificadas aos

seus respetivos significados. Quando não existe compreensão, a leitura deixa de ter

interesse e de ser uma atividade motivadora, pois nada tem a dizer ao seu leitor. Assim

sendo, os processos de descodificação e compreensão estão intimamente interligados

para que se possa afirmar que uma criança já sabe ler.

Na última fase da leitura, surge a análise crítica acerca do material impresso que foi

descodificado e compreendido. Ao ler-se uma frase ou um texto, o leitor deverá reagir

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8

às ideias impressas. As reações podem ser emocionais, intelectuais, ou as duas,

independentemente do tipo de recção, a análise do conteúdo lido é sempre feita partindo

de referências internas ao próprio leitor. De acordo com a sua experiência, cada

indivíduo vai construindo ideias e pensamentos que servem de base para a realização da

análise crítica.

Em suma, o ato de ler é um exercício de exploração, de reflexão crítica, de

entendimento, de captação de símbolos e sinais, de mensagens, de conteúdo, de

informações... É um exercício de intercâmbio, uma vez que possibilita relações

intelectuais e potencializa outras. Permite-nos a formação dos nossos próprios

conceitos, explicações e entendimentos sobre realidades, elementos e/ou fenómenos

com os quais nos defrontamos.

Assim sendo, entende-se que a atividade de leitura exija do sujeito determinadas

capacidades e operações cognitivas, que condicionam quer o nível de descodificação

quer o da compreensão da mensagem.

3.2. Pré-requisitos para ler

A aprendizagem escolar nunca parte do zero. Toda a aprendizagem da criança na escola,

nomeadamente no que se refere à leitura, tem uma pré-história, ou seja, todos os alunos

criam hipóteses sobre a linguagem escrita antes do início da aprendizagem formal da

leitura.

No processo de aquisição da leitura, assim como na aquisição de qualquer

conhecimento, são indispensáveis pré-requisitos tais como atitudes, comportamentos, ou

outros conhecimentos anteriores que venham facilitar e tornar possíveis novas

aprendizagens.

Os pré-requisitos necessários na aprendizagem da leitura dizem respeito ao período que

antecede a entrada na escola, pois é nessa altura, antes dos 6 anos de idade, que tem

lugar a aprendizagem dita informal que desempenha um papel importantíssimo para as

futuras aprendizagens iniciadas no ensino básico. Estas conceções, aprendizagens

informais, permitem verificar quais são as crianças que possuem pré-requisitos

essenciais à aprendizagem da leitura, sendo também possível detetar quais as que

poderão apresentar dificuldades nestas aprendizagens.

Page 14: O resurso às TIC nas DA

9

A aprendizagem formal da literacia ocorre no início da escolaridade obrigatória, por

volta dos 6 anos de idade, sendo nesta fase que a criança possui maturidade suficiente

para principiar a ler e escrever, no entanto, isto não significa que não haja crianças

precoces que possam aprender estas competências antes desta idade.

Segundo Dupont (in Rebelo, 1992), são cinco os pré-requisitos necessários na criança

para o início da aprendizagem da leitura, sendo eles: o desenvolvimento linguístico ou

vocabulário, a atenção ou poder de concentração, o reconhecimento ou capacidade de

identificação, o poder de distinção ou discriminação percetiva, a capacidade de se

lembrar ou recordar.

O desenvolvimento linguístico ou vocabulário (compreensivo e expressivo) vai permitir

à criança possuir um sistema simbólico de alusão a objetos, pessoas e pensamentos

habilitando-a para os melhor entender e referenciar, sendo capaz de dar nomes às coisas,

ter uma conversa relativa a objectos ou assuntos específicos ou abstratos.

Quanto à atenção e concentração, é através delas que a criança recebe os estímulos, faz

associações, memoriza, capta, observa o que se diz, faz e acontece à sua volta. A

atenção, concentração, memória e motivação “desempenham um papel imprescindível

em qualquer processo de aprendizagem e é através delas que se desperta interesse e se

cria motivação” (Rebelo, 1990, p.129).

O reconhecimento e identificação é o processo através do qual a criança é capaz de

identificar e reconhecer pessoas, objetos, animais, vendo-os e nomeando-os sempre da

mesma maneira.

Já a distinção leva a criança a ver, observar, dizer e apontar as diferenças. Este quarto

elemento é importante pois permite revelar se a criança adquiriu maturidade suficiente

para diferenciar o que já conhece do que é novo e se é capaz de distinguir palavras e

sons linguísticos semelhantes.

Por fim, o último elemento, a capacidade de se lembrar. Recordar permite saber se é

capaz de se lembrar do nome das coisas, de fazer a associação entre a imagem visual e o

nome, trata-se de saber se o seu funcionamento mnésico é normal.

Estes cinco aspetos, ou condições necessárias à aprendizagem da leitura, são

extremamente importantes e deverão ter lugar antes da entrada da criança no primeiro

ciclo.

Page 15: O resurso às TIC nas DA

10

3.3. O que mais condiciona a aprendizagem da leitura

Como já foi referido anteriormente, o processo de leitura é complexo e exige a

aprendizagem e a prática de várias componentes tais como a linguagem oral, o

processamento visual, a perceção e o reconhecimento de palavras escritas e a cognição.

São vários os fatores que vão influenciar o sucesso individual na aprendizagem da

leitura.

Na área da linguagem, a aquisição do vocabulário e a compreensão da linguagem oral

(elementos fonéticos, morfológicos, sintáticos e semânticos) e a sua produção

(elocução, articulação, ritmo, acentuação) são os aspetos que mais vão diferenciar os

alunos com dificuldades na aprendizagem da leitura daqueles que as não têm, de

seguida surgem fatores como a atenção, a concentração e a memória.

Rebelo (1990) reduziu estes elementos em dois fatores: concentração e verbal. A

concentração abrange a atenção, a memória e a sequenciação que levam à boa ou má

qualidade da leitura. O segundo fator revela a importância dos elementos auditivos e

verbais na produção dos resultados das provas de leitura, a discriminação auditiva de

palavras e sons linguísticos, fluência verbal, apreensão rápida de palavras e seu

complemento quando ouvidas parcialmente. Torna-se assim essencial incidir na

concentração e no desenvolvimento linguístico no início da aprendizagem da leitura,

especialmente quando for detetado na criança um atraso significativo de

desenvolvimento.

O treino da consciência linguística, através de jogos de palavras, rimas, constatação e

descoberta de que há palavras pequenas e maiores, divisão das palavras em sílabas e das

sílabas em fonemas leva a um maior sucesso na aprendizagem da leitura.

Ainda segundo o mesmo autor, os distúrbios da linguagem são de dois tipos: de

elocução (problemas de expressão ou de linguagem ativa respeitantes à voz, articulação,

acentuação, ao ritmo e à fluência) e de compreensão linguística (atrasos de compreensão

linguística, problemas vocabulares, de fraca compreensão de estruturas gramaticais,

regras, tempos verbais, voz ativa e passiva, dificuldade geral de compreender a fala). Os

distúrbios verbais linguísticos costumam distinguir-se em dois tipos, o da receção da

linguagem e o da sua expressão. Quanto à receção, ela diz respeito ao processo de

compreensão dos símbolos verbais, ou seja, incapacidade de distinguir tons de voz, sons

Page 16: O resurso às TIC nas DA

11

e de fazer a ligação dos fonemas para formar palavras (discriminação fonética);

problemas em diferenciar partes das palavras que lhes alteram o significado (distinção

morfémica); dificuldades em compreender o significado de palavras quando integradas

na frase (problemas de sintaxe e de semântica). Já os distúrbios de expressão verbal

estão relacionados com a produção da linguagem, nomeadamente a “disnomia”, défice

em se lembrar das palavras e dizê-las e a “apraxia” de linguagem, incapacidade na

movimentação dos músculos de articulação para pronunciar convenientemente as

palavras, mesmo conhecendo-as e incapacidade na formação de frases completas e

elaboradas acabando por pronunciar palavras isoladas ou frases muito curtas.

A par destes elementos mais relevantes como pré-requisitos para aprender a ler surgem

outros também eles importantes como: a perceção, discriminação e memória visual, a

atenção, a concentração, motivação e memória. Também os fatores externos, que

influenciam a aprendizagem escolar, como as atitudes e comportamentos da criança, a

sua relação com os colegas e professor, os condicionalismos físicos e humanos da

situação de aprendizagem e a situação familiar podem dificultar a aprendizagem da

leitura.

3.4. Leitura: Processos e dificuldades na sua aquisição

O ato de ler é um processo de reação individual, que varia muito de pessoa para pessoa,

visto que “cada leitor interpreta, compreende, aceitando ou não aquilo que lê, de acordo

com as experiências que possuir” (Passos e Mediano, 1976, p.48).

As dificuldades ao nível da leitura afetam negativamente o rendimento escolar e todo o

processo de adaptação à escolaridade. Ler é o problema mais comum para a maioria dos

alunos com DA. Crianças que revelam um atraso desenvolvimental quando frequentam

o jardim-de-infância são crianças que, tendencialmente, irão revelar dificuldades ao

longo do seu processo de escolaridade. A partir do terceiro ano de escolaridade, os

alunos com dificuldades de leitura apresentam discrepâncias visíveis face aos seus

pares, em todas as aquisições escolares. Em consequência das alterações verificadas ao

nível da leitura, estes alunos apresentam menos capacidade de acesso à informação, isto

é, enquanto alunos bons leitores adquirem nova informação através da leitura, os alunos

Page 17: O resurso às TIC nas DA

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com dificuldades perdem conhecimento e informação valiosa, que permite trabalhar e

desenvolver os aspetos relacionados com a cognição (Correia, 2002).

Os graves problemas de leitura são frequentemente denominados como dislexia. O

termo dislexia vem do grego, significando uma diminuição na habilidade para ler.

(Fonseca, 1979). O rótulo disléxico é, por vezes, utilizado para distinguir um indivíduo

com graves problemas de leitura de outro leitor com dificuldades, mas que não

apresenta presumíveis problemas de ordem neurológica. Este conceito – dislexia – tem

uma conotação médica, sendo utilizado, mais frequentemente, por investigadores que

defendem que os problemas de leitura são resultado de alterações biológicas,

particularmente, de base neurológica (Bender, 1995).

Compreender exatamente quais as aptidões necessárias para aprender a ler e quais as

aptidões em falta nos alunos com dificuldades de aprendizagem na leitura, é de vital

importância para a prevenção dos problemas de leitura.

Não são apenas os alunos que têm alterações ao nível do processo da leitura que

apresentam um prognóstico de aprendizagem reservado, mas estes alunos apresentam,

frequentemente, outros problemas associados. A maioria dos alunos com problemas de

leitura tem também dificuldades com os aspetos relacionados com a expressão escrita.

Eles apresentam, frequentemente, uma caligrafia pouco legível, soletram

inadequadamente palavras e constroem frases de uma forma simples e desorganizada.

(Hallahan, Kauffman & Lloyd, 1999, cit. in Ferreira, 2001).

Alunos com problemas de leitura têm, também, tendência para apresentar dificuldades

em alguns aspetos da linguagem. Faz sentido que os alunos com problemas de leitura

tenham dificuldades na expressão escrita, uma vez que estes dois processos dependem

de aspetos linguísticos comuns. Por exemplo, um aspeto da expressão escrita, a

soletração, requer alguns skills similares aos utilizados nos aspetos de descodificação da

leitura. Entre estes, estão a consciência fonológica, a combinação de sons e a

correspondência fonema/grafema. Alunos com DA têm uma fraca habilidade para

soletrar palavras e produzem mais sons irreconhecíveis do que os pares (Rebelo, 1990).

Apesar da sua importância, o papel da consciência fonológica deve ser considerado em

perspetiva, uma vez que as palavras não são identificadas simplesmente pela aplicação

de regras fonológicas. Aparentemente, as crianças usam analogias entre as diversas

palavras para derivar a pronúncia de outras palavras. Na prática, o uso de analogias é

Page 18: O resurso às TIC nas DA

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particularmente evidente quando as crianças lêem palavras que rimam. No entanto, a

consciência fonológica não prediz necessariamente a aptidão futura na leitura de

palavras por analogia, uma vez que se tornam necessários skills de descodificação para

o aluno ser capaz de ler palavras desta forma. Leitores competentes usam

provavelmente múltiplas fontes de informação, letras individuais, fonemas, grupos de

letras e palavras na globalidade, quase simultaneamente quando identificam palavras.

Processos de descodificação fluentes requerem uma grande habilidade nos aspetos

fonológicos da linguagem, pois sem estes os problemas de leitura tornam-se frequentes,

existindo muitas dificuldades na compreensão da mesma (Hallahan, Kauffman & Lloyd,

1999, cit. in Ferreira, 2001).

Os problemas de leitura em alunos com DA não podem só ser atribuídos a dificuldades

fonémicas, eles também podem ser resultado de problemas de compreensão. Os alunos

com DA podem ter problemas em associar as palavras impressas aos seus significados,

sendo este um fator de grande importância para a compreensão de um texto. Alunos

com DA utilizam menos estratégias de compreensão da leitura do que os seus pares e

revelam uma maior dificuldade em determinar os temas subjacentes ao material lido.

Apesar da grande importância de fatores como a consciência fonológica para a

compreensão dos problemas de leitura, as DA não podem ser reduzidas à identificação e

à remediação de um simples fator. Os professores devem não só ensinar os skills

fundamentais para a aprendizagem da leitura, mas também, ensinar aos alunos

competências e estratégias de compreensão da leitura e de raciocínio lógico – dedutivo

(Contente, 1995).

4. O recurso às TIC nas DA

Numa sociedade em constante mudança, onde impera o desenvolvimento tecnológico, a

educação terá de corresponder às necessidades daí decorrentes e enfrentar os novos

desafios. A escola deve começar a preocupar-se em acompanhar essa evolução.

Devemos todos ser capazes de reconhecer que as novas tecnologias podem trazer à

escola uma nova ferramenta onde a aprendizagem acontece pela construção e

descoberta, e onde a sala de aula pode transformar-se num espaço apropriado a um

ensino e aprendizagem colaborativos e ao atendimento das diferenças individuais. A

Page 19: O resurso às TIC nas DA

14

transformação da escola passa, por um lado, pela mudança da postura dos profissionais

do ensino e dos próprios alunos, e por outro, pela necessidade que se impõe em repensar

os processos educacionais, devendo utilizar todos os recursos disponíveis, incluindo o

computador.

A correta utilização do computador e a consequente exploração do diversificado

software educativo podem ser instrumentos muito eficazes para melhorar o processo de

ensino-aprendizagem em diferentes áreas curriculares. O computador pode proporcionar

um ensino individualizado, facilitador da aprendizagem, sobretudo em situações de

alunos com NEE, pois pode assumir-se como o principal recurso para a recuperação

desses alunos ou ser utilizado como complemento do ensino normal, como mais um

recurso entre outros.

A introdução das TIC em educação não deve nunca ser associada à ideia de substituição

dos recursos existentes pelo computador, mas encarada como uma mudança do modo

como se aprende, das formas de interação entre quem aprende e quem ensina, do modo

como se reflete sobre a natureza do conhecimento (Schwartz, 1989).

Teodoro e Freitas (1992, p.28), afirmam que as TIC permitem:

“Disponibilizar ferramentas que ajudam a deslocar o centro do processo

ensino/aprendizagem para o aluno, favorecendo a sua autonomia e

enriquecendo o ambiente onde a mesma se desenvolve. Permitem a

exploração de situações, que de outra forma seria muito difícil realizar.

Possibilitam ainda a professores e alunos a utilização de recursos

poderosos, bem como a produção de materiais de qualidade superior aos

convencionais”.

As TIC são a quarta revolução da comunicação humana, paralelamente à linguagem

falada, à leitura e à escrita. Mas não é a simples exposição ao computador que irá

permitir alguma alteração cognitiva ou funcional de qualquer handicap. É o professor,

com a sua intervenção intencional, quem poderá desempenhar um papel crucial no

desenvolvimento do aluno (Shannon e Weaver, 1977, cit. in Fonseca, 1988).

Ponte (1992, p. 5), afirma que “quem não for capaz de utilizar e compreender

minimamente os processos informáticos correrá o risco de estar tão desinserido na

sociedade do futuro com um analfabeto o está na sociedade de hoje”. O problema surge,

sobretudo, quando os professores não possuem a preparação suficiente para utilizar os

recursos que têm à sua disposição. Por isso, é fundamental apostar na formação dos

Page 20: O resurso às TIC nas DA

15

profissionais para que compreendam a infinidade de possibilidades didáticas e de

aprendizagem que têm ao seu dipor.

O computador, graças à sua interatividade, à sua animação e às possibilidades de lidar

com questões de controlo e de domínio, intervém realmente tanto no desenvolvimento

cognitivo como no emocional e na aprendizagem da autonomia (Ponte, 1989).

Para Rodrigues (1988), o computador, enquanto utensílio pedagógico, pode contribuir

para o desenvolvimento de capacidades cognitivas, motoras, de linguagem ou pré-

aptidões para as aprendizagens escolares. Este autor defende também que o computador

pode ser um poderoso meio de luta contra o insucesso escolar porque, diz, tem-se

observado que alunos com DA no sistema tradicional ficam mais motivados quando

fazem uso do computador e revelam melhor os seus talentos.

Segundo Fonseca (1984), para que seja conseguido um desenvolvimento pleno das suas

capacidades, é fundamental fornecer às crianças com NEE uma intervenção educativa

especializada, assim como meios e cuidados especiais, que variam segundo as

necessidades específicas de cada um.

A vivência escolar dos alunos com NEE pode ser francamente enriquecida pelo recurso

às TIC. Neste sentido, Correia & Martins (2002, p.71) atribuem-lhes dois objetivos

fundamentais:

Aumentar a eficiência destes alunos, aumentando a sua integração escolar e

social;

Desenvolver capacidades para aceder e controlar tecnologias com determinado

nível de realização.

As TIC revelar-se-ão, então, um valioso instrumento, uma preciosa ajuda, pois não só

diminuirão as incapacidades e desvantagens reveladas pelos alunos com NEE como,

simultaneamente, lhes abrirão as portas à integração escolar e social.

Ponte (1992, p.133) sustenta que a generalidade dos resultados, dos estudos realizados

sobre o efeito do computador no processo de ensino-aprendizagem, apontam para

contribuições positivas “(...) globalmente, a maioria das indicações aponta para a

possibilidade de desenvolver novas estratégias cognitivas, para a criação de sentimentos

de autoconfiança, maior responsabilização do aluno pelo seu próprio trabalho, novas

relações professor-aluno e laços de cooperação e interajuda entre alunos”.

Page 21: O resurso às TIC nas DA

16

5. Metodologia

5.1. Caracterização do Caso

A escolha desta criança para a realização do presente estudo foi intencional devido às

características que apresenta no que diz respeito às dificuldades de aprendizagem da

leitura e por considerarmos que a aplicação de uma tecnologia de apoio a pode

beneficiar no seu percurso escolar.

A Matilde (nome fictício) nasceu a 13 de Dezembro de 2004 e encontra-se a frequentar

o 2º ano de escolaridade numa escola pública do distrito da Guarda, numa turma

constituída por 25 alunos.

A professora da turma, desde o 1º ano até ao ano letivo atual, afirma que o processo de

aquisição da leitura e da escrita foi lento e moroso. Não obstante, conseguiu

acompanhar o ritmo da turma devido ao apoio intensivo e exclusivo, dentro da sala, de

um professor do Apoio Educativo.

No presente ano letivo, as dificuldades da aluna começaram-se a acentuar com a

complexidade dos conteúdos abordados. Logo no 1º Período, a docente assinala que a

Matilde “exprime-se pouco oralmente. Faz uma leitura mais ou menos fluente mas com

pouca expressividade e vai interpretando o que lê. Escreve frases e pequenos textos com

erros ortográficos e com pouca imaginação. (…) É uma aluna pouco aplicada e

desorganizada, muito lenta e distraída”. Num outro registo de avaliação do 2º Período, a

docente destaca que “tem dificuldade em escrever textos com correção sintática e

ortográfica (…) apresenta dificuldades na ortografia e na escrita de textos”.

A professora do Apoio Educativo referiu que o aproveitamento da Matilde é

condicionado pela falta de autonomia e concentração na resolução das tarefas. Neste

sentido, em Janeiro do presente ano, foi elaborado um plano de recuperação e a docente

titular da turma encaminhou-a para os Serviços de Psicologia e Orientação Escolar do

Agrupamento assinalando problemas ao nível académico e comportamental. Não são

conhecidas outras estratégias para a supressão/redução das dificuldades no processo da

leitura e da escrita.

Em Abril e Maio do presente ano letivo, foi feita pela psicóloga do Agrupamento uma

avaliação cognitiva na qual se aplicaram vários instrumentos de avaliação (a escala de

Page 22: O resurso às TIC nas DA

17

inteligência de Wechsler para crianças, CBCL 4-18, T.M. Achenbach, figura complexa

de REY, teste exploratório de dislexia específica, o BAPAE) e ainda provas informais

da produção escrita e provas de cópia. O resultado dessas avaliações levou a concluir-se

que “pelas características assinaladas nos resultados das provas de avaliação realizadas

a Matilde apresenta uma dificuldade de aprendizagem específica

(dislexia/disortografia), no entanto, é relevante que seja efetuado um exame clínico

(pedopsiquiatria, neurologia)”. Nas provas informais de produção e escrita e prova de

cópia observou-se “uma leitura silábica e realizada com alguma tensão. Caligrafia

irregular em termos de forma e tamanho.” Na cópia verificaram-se erros de omissão e

ditados com muitos erros. Perante estas conclusões, a psicóloga referiu que a Matilde

deveria beneficiar de apoio pedagógico semanal mediante um plano de intervenção

adequado cuja programação visasse a melhoria da compreensão escrita e oral, assim

como as competências relacionadas com conteúdos académicos e uma pedagogia

diferenciada.

Quanto ao plano de recuperação, a docente da turma referiu “que as medidas adotadas

resultaram, embora esta aluna ainda tenha um ritmo de trabalho inferior ao resto da

turma. Trata-se de uma aluna pouco autónoma e insegura que necessita de apoio

frequentemente o que nem sempre é possível devido ao número excessivo de alunos na

turma”.

As suas dificuldades prendem-se não só com a leitura mas também com aspetos

relacionados com a “pouca imaginação, pouca criatividade e pouca autonomia na

escrita”.

Na avaliação do 3º Período do presente ano letivo, foi referido que a Matilde necessita

de um trabalho específico e orientado para a aquisição da autonomia necessária na

realização as atividades propostas, na área de Língua Portuguesa e Psicomotricidade,

assim como o desenvolvimento de técnicas e estratégias que lhe possibilitem melhorias

na capacidade de atenção/concentração e aumento da auto-estima, para que possa adotar

uma atitude mais dinâmica na sala de aula.

Page 23: O resurso às TIC nas DA

18

5.2. Apresentação e caracterização da Tecnologia de Apoio

Para ajudar a Matilde na aquisição da leitura e tendo como lema o recurso às TIC

enquanto tecnologia de apoio, decidimos criar uma aplicação em PowerPoint (Anexo 1)

que pode ser adaptada a várias tarefas e disciplinas e que pode ser uma ferramenta

didática útil, tornando-se mais aliciante e possibilitando que a criança desenvolva várias

competências, como ler, ouvir, escrever, ver, interpretar, etc., estando mais concentrada,

tornando-a mais autónoma (pois tem a liberdade de escolher o que quer fazer) e

contribuindo para o aumento da sua auto-estima.

Deste modo, a aplicação está dividida em quatro tarefas distintas: leitura, compreensão

do texto, produção de texto e jogo (Fig. 1), sendo que não há uma ordem rigída das

atividades.

Fig. 1 – Apresentação da atividade

Na opção Leio (Fig. 2), a criança tem acesso a uma história que deverá ser lida,

primeiro, pela professora e, depois, por ela. Poderá repetir a leitura da mesma as vezes

que achar necessárias.

Fig. 2 – Apresentação da opção Leio

Page 24: O resurso às TIC nas DA

19

Na opção Aprendo (Fig. 3), a criança pode consultar algum vocabulário presente no

texto cujo significado desconheça.

Fig. 3 – Apresentação da opção Aprendo

Na opção Crio (Fig. 4), a criança tem a oportunidade de criar a sua própria história,

subordinada a um tema e a partir das imagens apresentadas. Em cada imagem aparece

um determinada situação e a criança terá oportunidade de dar largas à imaginação,

colocando o que achar mais conveniente nos balões relativos a cada personagem.

Fig. 4 – Apresentação da opção Crio

Page 25: O resurso às TIC nas DA

20

Na opção Jogo (Fig. 5), criámos um jogo de rimas onde a criança deverá escolher todas

as palavras que rimem com as palavras fornecidas. Cada resposta correta é

acompanhada com um som (aplausos) e cada resposta errada também é acompanhada

com um som (trovão), de modo a incentivá-la.

Fig. 5 – Apresentação da opção Jogo

Para além destas opções, há ainda a opção Instruções (Fig. 6), onde a criança poderá

consultar os passos a seguir em todas as opções, caso tenha alguma dúvida. Por outro

lado, poderá sempre voltar atrás ou mudar de opção, caso queira.

Fig. 6 – Apresentação da opção Instruções

Page 26: O resurso às TIC nas DA

21

5.3.Procedimentos

Este recurso foi aplicado no dia 23 de Junho, pelas 16h, em casa da Matilde.

Começámos por explicar o recurso em si e quais as tarefas que a criança teria que

desenvolver. Esta mostrou-se bastante entusiasmada por experimentar algo novo.

Decidiu iniciar pela leitura, tendo um dos elementos do grupo lido primeiro, seguindo-

se a Matilde. No final da leitura, teve de consultar o dicionário da aplicação, pois não

compreendeu determinadas palavras, como “extenuada”, “caprichosos”, etc.

Em seguida, decidiu realizar o jogo, que achou bastante divertido. Por último, realizou a

produção escrita. Nesta opção, ela tinha de imaginar o diálogo entre as várias

personagens. Como não colocámos nenhuma opção de diálogo, a Matilde revelou

bastante dificuldade em imaginar possíveis falas. Numa aplicação futura, devemos

colocar várias opções de fala para que a criança selecione a fala adequada. No entanto,

com alguma ajuda da nossa parte, conseguiu concluir a tarefa.

5.4.Resultados

Ao longo da aplicação do recurso didático, a Matilde mostrou-se bastante motivada,

interessada e concentrada. Tendo em conta que esta criança apresenta traços de

desconcentração, concluímos que o fato dela ter a autonomia para gerir a realização das

diferentes tarefas e pela novidade em si contribuíram para tal.

Leitura: depois de o texto ser lido em voz alta, fluentemente e com expressividade, por

um dos elementos do grupo, a Matilde leu-o com alguma hesitação e tentou dar-lhe

alguma expressividade. Manifestou dúvidas na compreensão de algumas palavras, pelo

que necessitou de consultar o dicionário da aplicação.

Produção de texto: foi a opção em que a criança manifestou mais dificuldades,

evidenciando falta de criatividade e alguns erros ortográficos. No entanto, uma das

grandes vantagens desta aplicação é o corretor ortográfico. Outra vantagem é a escrita

em si, tendo em conta que a criança tem uma caligrafia pouco inteligível, por vezes, ao

utilizar o computador como ferramenta esse problema já não se coloca.

Jogo: foi a atividade onde a Matilde se mostrou mais confiante e concentrada. Na

primeira parte do jogo, onde tinha de descobrir palavras que rimassem, não apresentou

Page 27: O resurso às TIC nas DA

22

qualquer dificuldade. Na segunda parte do jogo, onde tinha de continuar a lengalenga,

mostrou-se um pouco mais hesitante.

Tendo em conta que o recurso por nós criado foi aplicado apenas uma vez a esta

criança, pensamos que os resultados obtidos foram positivos, pois conseguimos

estimular a sua concentração e autonomia, levando-a a concluir todas as tarefas.

Obviamente que obteríamos resultados muito mais positivos se tivéssemos a

oportunidade de aplicar o recurso de forma contínua ou de a professora da Matilde

utilizá-lo como ferramenta didática, tentando diversificar as atividades e não se

baseando apenas no manual.

5.5.Pistas para o futuro

Para a realização deste trabalho, escolhemos elaborar um recurso explorando a Língua

Portuguesa, por ser a base de todas as outras disciplinas. No entanto, qualquer disciplina

pode ser trabalhada numa aplicação como esta.

Visto que foi a primeira vez que fizemos algo do género, pensamos que poderíamos

melhorar o recurso. Aliás, as tecnologias permitem-nos isso mesmo, ou seja, estarmos

em constante atualização. Deste modo, na opção Criar colocaríamos as opções de

diálogo, como referido anteriormente, para que fosse mais fácil, numa primeira fase, a

criança organizar o seu pensamento. Posteriormente, e à medida que ela se sentisse mais

confiante, iríamos dificultando as várias atividades.

Por último, achamos que, com o vasto leque de tecnologias de apoio que estão ao nosso

dispor, é inaceitável que os professores/educadores não diversifiquem os recursos

didáticos com vista a incluir verdadeiramente todas as crianças da sala de aula. Com um

pouco de imaginação, de tempo e de boa vontade consegue-se criar algo como o que foi

exposto anteriormente.

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23

III. Conclusão

O ato de ler, longe de ser mecânico, é uma operação que implica a pessoa no seu todo:

inteligência e vontade, fantasia e sentimentos, passado e presente. A leitura converte-se,

assim, numa das mais importantes atividades humanas, porque contribui para, e reforça,

o processo de maturidade através da autonomia intelectual, sendo garantia também da

liberdade do leitor. Se acrescentarmos que o hábito de ler se alimenta e fortalece com a

prática, podemos afirmar que estamos, em definitivo, diante da possibilidade de um

enriquecimento pessoal constante, já que a leitura é uma das atividades que mais

contribuem para o desenvolvimento das diferentes facetas da personalidade.

Cabe ao professor não esquecer que aprender a ler deve ser uma experiência feliz para a

criança, pois a forma como as crianças fazem a sua iniciação à leitura é fundamental

para o seu sucesso. Por isso, achamos importante que o professor diversifique os

recursos pedagógicos utilizados e que se sirva das TIC para desenvolver as

competências necessárias da aprendizagem, promovendo a autonomia e a inclusão de

todos os seus alunos. Todos somos diferentes, todos temos necessidades, gostos,

objetivos, etc., diferentes e através das TIC temos a possibilidade de criarmos uma

Escola mais inclusiva.

Segundo Lloyd, Moni e Jobling (2006, cit. in Quelhas, 2012), as TIC aplicadas às NEE

podem ser, dependendo da situação, o único meio que os alunos NEE têm de aceder ao

currículo, representando um fator muito importante na normalização das suas condições

de vida. Além disso, para além das TIC serem uma importante ferramenta no ensino,

favorecem a autonomia, são igualmente um instrumento que proporcionam momentos

de ócio, tão importantes na vida de todos nós e incentivam a criança no seu processo de

ensino-aprendizagem, diminuindo o seu sentimento de insucesso escolar (Quelhas,

2012).

Para haver verdadeira inclusão, para além de ter de se efetuar uma reforma nas escolas e

no modelo educacional, promovendo acessibilidade para todos com eliminação de

barreiras arquitetónicas, atitudinais e programáticas, é preciso, primeiro, mudar

mentalidades, quebrando determinadas barreiras que o Ser Humano impõe a si próprio.

Page 29: O resurso às TIC nas DA

24

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